Resumo
O futuro do design de interiores residencial
Giovana Paula Carvalho de Lima – gpcl259@gmail.com Design de Interiores Instituto de Pós-Graduação - IPOG
Ribeirão Preto, SP, 19 de abril de 2024
Esse artigo trata sobre o futuro do design de interiores residencial, investigando o histórico da área até a atualidade para entender as tendências futuras. Assim, o artigo foi orientado pelo questionamento de como será e como evoluirá o interior das habitações do futuro. As hipóteses levantadas foram lares adaptados ao trabalho remoto, lares com design biofílico e novas tecnologias integradas ao morar. O objetivo desse trabalho é identificar as tendências do design de interiores residencial para auxiliar os profissionais da área a criarem projetos que acompanhem a evolução das necessidades da sociedade. Os métodos adotados foram pesquisas descritivas e bibliográficas feitas a partir de uma coleta documental (livros, artigos e pesquisas) que levantou dados que foram analisados por meio de pesquisas qualitativas. Os resultados encontrados indicam que as hipóteses levantadas se confirmam, além de que as habitações do futuro serão automatizadas, multifuncionais e sustentáveis; e os moradores procurarão projetos com identidade e que proporcionem bem-estar. Os resultados encontrados apontam que a história, a atualidade e o futuro do design de interiores residenciais resumem-se a busca pelo conforto e a evolução de tecnologias. Portanto, concluiu-se que as habitações do futuro serão cada vez mais confortáveis e tecnológicas.
Palavras-chave: Design. Interiores. Residencial. Futuro. Habitações.
1. Introdução
Esse trabalho aborda, dentro do universo do design de interiores, a área residencial. Como recorte temporal, essa dissertação procura investigar as tendências futuras tendo o passado como referência.
O interesse no design de interiores residencial se dá devido à morada ser o local onde buscamos abrigo e conforto, além de ser onde se passa grande parte da vida. Além disso, foi escolhido o enfoque no futuro, como uma forma de acompanhar a evolução da sociedade dentro de seus lares, além de entender quais são as necessidades futuras da comunidade para assim melhor projetar os lares vindouros. Segundo Gurgel (2018, p.18):
A casa é onde dormimos, comemos, guardamos coisas importantes para nós, recebemos amigos, ou seja, onde vivemos e nos sentimos protegidos.
O planejamento adequado dos diferentes ambientes de uma casa deve propiciar o acontecimento de todas essas atividades às quais a casa se destina. A casa não deve ser estática, pois nossa vida não o é. Somos seres em movimento e vivendo numa sociedade em constante evolução tecnológica.
A partir dessa citação entende-se que o interesse no design de interiores residencial é por a casa ser o centro das principais atividades cotidianas. Além disso, como diz a autora, a casa e a vida não são estáticas e estão sempre
evoluindo, e a partir disso entendemos a importância de estudar as tendências futuras para projetar os ambientes habitacionais. Segundo Materials (2023):
Enquanto a humanidade gasta mais tempo em ambientes internos, [...] as formas e funções que definem esses espaços internos adquiriram maior importância e valor. Experimentar com espaços fluidos, flexíveis e versáteis é uma tendência que testemunhamos há alguns anos, impulsionada principalmente pelos impactos das quarentenas ainda presentes em nossa memória. O caos e a incerteza que experimentamos nos fizeram entender a importância dos edifícios com consciência espacial e sensibilidade - aqueles capazes de antecipar e assumir a responsabilidade pelos efeitos que têm em seus habitantes. Fatores como orientação, dimensões e distribuição das salas, o uso de luz e ventilação naturais e a estética geral do espaço são essenciais. Os avanços tecnológicos adotaram o centro do palco e interromperam o design de interiores tradicional, dando origem a abordagens novas e inovadoras à eficiência e circularidade doméstica.
Entende-se que os espaços internos estão possuindo cada vez mais relevância principalmente após o período da quarentena, pois a sociedade começou a compreender melhor a importância dos locais onde passam grande parte de seu tempo. Isso mostra a relevância do tema, pois não só os profissionais da área estão entendendo como características espaciais influenciam na vida de quem passa seu tempo nos interiores das construções, mas também a sociedade está começando a compreender isso também. Além disso, essa citação coloca em evidência a importância de investigar o futuro, pois a tecnologia está trazendo inovações aos lares. Tanto Gurgel como Materials mostram que o interior das habitações está em constante evolução devido aos avanços tecnológicos.
Dessa forma, o tema desse trabalho é o futuro do design de interiores residencial. Tendo como premissa o que há atualmente nos interiores das casas e apartamentos, pesquisou-se a trajetória do interior residencial no decorrer da história, para que se possa, de forma mais assertiva, saber de que forma evoluirão os ambientes internos dos novos lares a serem projetados. Segundo Bryson (2011, p.19) “Estamos tão acostumados ao conforto em nossas vidas – limpeza, aquecimento e boa alimentação – que esquecemos que isso é recente. Na verdade, demoramos séculos para conquistar essas coisas.”
A pergunta que orientou esse trabalho é como será o interior da casa do futuro, ou seja, foi investigado de que forma o interior das habitações irá evoluir. É relevante buscar respostas para elucidar esse problema para que a sociedade seja atendida com suas novas demandas, e para que os profissionais, de forma prática, tenham uma melhor diretriz sobre o que a comunidade espera de suas novas habitações, e assim, possam escolher melhores alternativas projetuais. Como hipóteses previamente levantadas, temos lares cada vez mais adaptados às novas formas de trabalho (trabalho remoto), além da necessidade de trazer cada vez mais elementos naturais para dentro das moradas (biofilia) e, também, novas tecnologias cada vez mais integradas à experiência de morar.
Segundo Kaku (2023):
Antes da pandemia, a casa era vista como um local de passagem. Durante a crise, a vida precisou caber dentro de casa, e hoje, ela desempenha múltiplos papéis. O que as pessoas buscam agora é se sentir felizes dentro de casa, e isso significa abraçar a diversidade no morar, tanto de gerações, como de moradias solo e famílias multiespécies. Além disso, uma casa melhor é mais flexível e tem mais acessibilidade, dialoga com seu entorno e atua como um ponto de conexão entre indivíduo, comunidade e planeta.
Essa citação mostra como, após o período de reclusão da pandemia, a sociedade começou a dar mais importância para o design de interiores residencial. E para isso, arquitetos e designers de interiores buscam atender às necessidades que estão sempre mudando. Kaku, assim como Materials, nos mostra como, após a pandemia, a humanidade começou a dar mais importância aos espaços internos.
O objetivo desse artigo de entender qual é o futuro do design de interiores residencial é identificar tendências no design de interiores residencial a fim de auxiliar os profissionais da área para que criem projetos que acompanhem o desenvolvimento da sociedade. E para alcançar isso, esse trabalho possui alguns objetivos específicos, que são: abordar a história do design de interiores residencial para que compreendamos, a partir do caminho percorrido, o caminho que será trilhado; identificar quais as atuais tendências que mostram como os interiores das moradas contemporâneas irão evoluir; e descrever quais as características possíveis que estarão presentes no design de interiores das residências do futuro.
Esse tema foi escolhido por sua relevância para os profissionais designers de interiores e arquitetos, em termos práticos, para que a atividade de projetar para uma sociedade em constante evolução se torne mais assertiva e; em termos acadêmicos, para que se tenha um conhecimento acerca da evolução dos interiores residenciais. A sociedade está sempre em constante mudança e isso reflete na forma em que seu lar se estrutura, e dessa forma, esse tema é importante para que os novos lares a serem projetados atendam às novas demandas das comunidades. Portanto, o tema está dentro das realidades das habitações do cotidiano que estão sempre variando, com novas tendências e novas formas de morar e se relacionar com o entorno. Abordar esse assunto traz consequências positivas tanto para moradores quanto profissionais da área. Um dado que auxilia na compreensão do interesse e da relevância desse assunto para a sociedade é a pesquisa do Pinterest Predicts, que é um relatório anual que revela tendências futuras e que mostra o interesse em pesquisas relacionadas aos interiores das habitações, como novas estéticas de cozinha kitsch, objetos de decoração metalizada, decoração retrô e country, casas com balcões de café na decoração, entre outros.
A metodologia utilizada para o desenvolvimento desse artigo foi a partir de pesquisas descritivas e bibliográficas, a partir de uma coleta documental, ou seja, para construir o texto foi necessária a exploração de livros, artigos e pesquisas. Esses dados foram analisados por meio de pesquisas qualitativas. “Em casa, uma breve história da vida doméstica” de Bill Bryson e “O século do conforto” de Joan DeJean foram obras escolhidas devido ao caráter histórico de ambos, o primeiro possui enfoque na história dos interiores residenciais principalmente na Inglaterra; já o segundo enfoca na história dos interiores das habitações principalmente na França. Já o livro “Projetando Espaços: Guia de Arquitetura de Interiores para Áreas Residenciais” de Miriam Gurgel foi incluido no estudo por apresentar conceitos e princípios de como está estruturado o design de interiores residencial da atualidade. Já sobre os artigos e pesquisas escolhidos, todos foram incluidos devido sua abordagem sobre o futuro do design de interiores residencial. A WSGN é uma empresa de previsão de tendências sobre consumo e design. Já o ArchDaily é a plataforma de arquitetura que é grande referência para profissionais da área. Já a pesquisa da Dexco é relevante, já que a empresa é uma brasileira produtora de painéis de madeira industrializada, louças e metais sanitários, além de revestimentos cerâmicos, abarcando diversas marcas, e portanto, essa é uma pesquisa significativa por ser uma investigação sobre o mercado de interiores de uma companhia da área. Além de ter sido publicada no site da Dexco, a pequisa foi
publicada também no site da CASACOR, que é a maior mostra de arquitetura, design de interiores e paisagismo das Américas. Também foi utilizada uma pesquisa do Pinterest Predicts, que é um relatório anual de tendências dessa rede social muito utilizada pelos profissionais da área. E por fim, foi utilizado o relatório “Espaços Humanos: O Impacto Global do Design Biofílico no Ambiente de Trabalho” por Bill Browning e Sir Cary Cooper com o intuito de explicar o design biofílico.
O artigo está estruturado de forma cronológica. No início, será abordado o histórico do design de interiores residencial até a atualidade, a fim de que haja um embasamento para que sejam discutidas as tendências da composição dos interiores dos novos lares a serem projetados no futuro. Essa pesquisa irá contribuir com o tema por apresentar uma linha histórica do design de interiores para que se possa, de forma mais assertiva, entender quais caminhos seguir para projetar as moradias do futuro, acompanhando a evolução da sociedade.
2. Desenvolvimento
2.1. Método adotado
Para coletar os dados para a produção desse artigo, foi utilizada a seguinte metodologia: o tipo de pesquisa feito foi uma pesquisa descritiva. Além disso, a técnica utilizada foi a pesquisa bibliográfica, isso é, foi feita a partir do levantamento do conhecimento apresentado em livros, artigos e pesquisas para que se possa estudar e explicar sobre o interior das habitações, analisando desde seu histórico, até as tendências futuras e elucidando questões que diversos autores abordaram sobre o tema. Já análise de dados foi feita por meio de pesquisas qualitativas, o que significa que é uma pesquisa subjetiva, que exemplifica conceitos que são analisados no decorrer do artigo. Esses dados coletados são expostos de maneira narrativa de forma a descobrir tendências.
Como instrumento de coleta de dados, foi utilizada a coleta documental, dessa forma foram investigados materiais escritos sobre o tema. O período dedicado à coleta de dados foi cerca de três meses. Como livros, foram utilizados: “Em casa, uma breve história da vida doméstica” de Bill Bryson, “O século do conforto” de Joan DeJean e “Projetando Espaços: Guia de Arquitetura de Interiores para Áreas Residenciais” de Miriam Gurgel. Como artigos, foram utilizados dois artigos do Archdaily, sendo eles: “O que esperar dos interiores do futuro” por Lilly Cao e “Arquitetura à prova de futuro: como os interiores devem evoluir de 2023 em diante” por Materials; além de três artigos do WSGN que são: “Big Ideas 2024: Interiors” por Lisa Branco e Gemma Riberti, “Interiors Product Opportunities 2024” por Gemma Riberti e “CMF Trends: The Next Neutrals” por Clare Smith. E, como pesquisas, foram utilizadas a pesquisa da Dexco, descrita pela Nádia Sayuri Kaku em “Casa do futuro: estudo inédito revela 5 macrotendências para o morar” e a “Pinterest Predicts” produzida pelo Pinterest. Também foi utilizado o relatório “Espaços Humanos: O Impacto Global do Design Biofílico no Ambiente de Trabalho” por Bill Browning e Sir Cary Cooper para contextualizar o significado de design biofílico.
2.2. Design de interiores residencial: histórico até a atualidade
A história dos interiores das residências começa quando os povos deram início ao sedentarismo. Segundo Bryson (2011), as moradias do período neolítico tinham trancas nas portas, sistema de drenagem e canalização, interiores espaçosos, pé-direito de quase três metros de altura e pisos pavimentados.
De acordo com DeJean (2012) os gregos antigos foram os primeiros a unir o conceito de se sentar ao conforto, criando cadeiras com curvas. Já os romanos usavam a cadeira como símbolo de status e com o fim do Império, as cadeiras praticamente sumiram do Ocidente.
Além disso, Império Romano Antigo é conhecido por suas infraestruturas, como aquecimento, água corrente, entre outros, porém com sua decadência e a chegada das tribos germânicas, muitos desses confortos acabaram se perdendo. Como afirma Bryson (2011, p. 63): “Os recém-chegados se recusaram a viver em casas romanas, embora essas estivessem lá à disposição, solidamente construídas e superiores a qualquer moradia que eles conhecessem em suas terras natais.”
De acordo com Bryson (2011), as propriedades medievais eram muito fragmentadas e as famílias estavam sempre se mudando. Assim, tudo era projetado para ser móvel: a mobília tinha que ser mínima e os objetos deviam ser portáteis e utilitários. Essa portabilidade explica a tampa convexa de baús e arcas: eram dessa forma para escorrer a água da chuva durante as viagens.
DeJean (2012) afirma o mesmo em seu livro. Segundo a autora, as famílias da Idade Média eram forçadas a se mudar por causa de guerras, fome e doenças e por isso a decoração dos interiores deveria ser portátil.
Já no período do Renascimento, os aposentos começaram a ser separados. De acordo com Bryson (2011, p. 76) “Os quartos começaram a proliferar, quando os chefes de família abastados descobriram a satisfação de ter um espaço só para si.”
Também conforme Bryson (2011), a segregação dos aposentos não era tão rigorosa. As plantas arquitetônicas do Renascimento não possuiam os aposentos nomeados conforme um propósito fixo, já que as pessoas circulavam pela casa muitas vezes levando seus móveis consigo.
DeJean (2012) também aborda esse aspecto, segundo ela cada cômodo era multifuncional. Havia poucos móveis e quase nenhum deles ficava em lugar permanente. O espaço interior era indefinido. DeJean (2012, p.74) afirma:
Foi apenas no século XVI que isso começou a mudar de modo mais significativo. Foram criados os primeiros pequenos cômodos dedicados a apenas uma atividade, em geral espaços reservados ao trabalho ou estudo.
Em seguida surgiram espaços para armazenamento de roupas e para se vestir. Mas os cômodos grandes da casa continuavam a ser multifuncionais. No inverno, por exemplo, as pessoas dormiam onde houvesse uma lareira. Os móveis ainda eram levados de um espaço para o outro de acordo com a necessidade, em vez de terem lugares fixos. Durante todo esse tempo, portanto, o conceito de atividade privada ou individual não poderia ter um sentido verdadeiro. [...]
No início do século XVIII, a arquitetura dialogou de maneira significativa com o comportamento social que podemos chamar de desejo por privacidade.
Há uma passagem em que Bryson (2011) escreve que mais ou menos na época de William Shakeapeare, os pisos de madeira ou lajota começaram a ser comuns nas casas mais ricas, mas os tapetes eram preciosos demais para serem colocados no chão, e ficavam pendurados nas paredes, postos sobre a mesa ou guardados em arcas. Para DeJean (2012), o chão de madeira maciça de fácil manutenção era um componenente sinônimo da decoração francesa moderna.
Conforme Bryson (2011), as mesas de comer eram tábuas sobre cavaletes (ou, em casas mais humildes, eram tábuas penduradas na parede quando não estavam sendo utilizadas e apoiadas nos joelhos quando utilizadas) e os armários eram tábuas para utensílios. As pessoas se sentavam em bancos e até 1600 as raras cadeiras passavam uma imagem de autoridade e não eram confortáveis.
Segundo Bryson (2011) a grande época da construção civil na Grã-Bretanha elevou a grandeza da vida privada, mas não construiu comodidade e maciez. DeJean (2012) também diz algo muito similar, para ela os ricos e influentes pensavam em uma arquitetura suntuosa, mas não pensavam em conforto, praticidade ou privacidade. DeJean também escreve (2012, p.12):
[..] na década de 1670, os ricos e influentes só pensavam na suntuosidade. Suas moradias ficaram conhecidas pelas fachadas esplêndidas, pelos imensos espaços interiores e pelos móveis arrebatadores. Só importava a prova de status que a posse desses itens indicava, já que o principal papel da arquitetura para aqueles que podiam pagar por um projeto para suas casas era demostrar sua posição. Ninguém levava em consideração como a vida diária se desenrolaria por trás daquelas fachadas imponentes. Arquitetos praticamente não davam importância a aspectos práticos como iluminação, aquecimento e espaço de armazenamento. Ninguém jamais havia pensado no posicionamento e nos propósitos específicos dos móveis, como, por exemplo, uma mesa de cabeceira perto de uma cama. E de assentos sanitários a poltronas, todos os lugares para se sentar eram feitos de madeira nua e dura, com no máximo uma almofada removível ou uma fina capa de tecido ou tapeçaria para acolchoar. Nada nas residências era planejado para ser conveniente ou proporcionar conforto.
DeJean (2012) ainda afirma que antes que houvesse essa demanda de ambientes confortáveis, as moradias eram espaços amplos em geral não divididos nem diferenciados. Ainda de acordo com DeJean (2012, p.19):
Pela primeira vez, os mais influentes arquitetos pararam de se concentrar em fachadas imponentes, na grandiosidade externa das construções e em deslumbrantes ambientes para recepções. O foco passou a ser a arquitetura de interiores, ambientes onde se vivia o cotidiano, além de esplendores que raramente seriam vistos por quem não fosse da família. E as novas comodidades eram definitivamente esplendorosas: inicialmente o custo do encanamento interno estava ao alcance apenas dos mais privilegiados. Pela primeira vez, as necessidades particulares se tornaram prioridade para os projetistas, que passaram a desenhar as casas em torno das demandas da vida familiar, do descanso e da amizade [...]
E foi assim que, no curso da primeira metade do século XVIII, [...] Salas e quartos “confortáveis” proliferaram; o tamanho dos cômodos diminuiu e eles aumentaram em número conforme se tornaram mais especializados. Cada um desses espaços menores passou a ser reservado a apenas uma atividade, como dormir ou tomar banho, que antes acontecia em espaços semipúblicos.
Dessa forma, uma casa confortável era conceito que não existia até o século XVII. Nas palavras de Bryson (2011, p. 155) “Se tivéssemos que resumir tudo em uma só frase, poderíamos dizer que a história da vida privada é um relato do prolongado esforço de se sentir confortável.” Já DeJean afirma (2012, p. 9):
A vida voltada para o conforto de hoje é um fenômeno com poucos precedentes na história ocidental. O primeiro período desde a Antiguidade em que esse tipo de bem-estar se tornou tanto desejável quanto possível em larga escala começou em Paris no início da década de 1670. [...]. Foi então que o lar moderno tomou forma – desde os cômodos que ainda usamos e os móveis que nos cercam até opções de decoração que nos parecem óbvias, como tetos brancos. Aspectos tão diferentes quanto estofamento e encanamento ganharam um empurrãozinho [...]: invenções como o sofá e a água corrente usada na descarga dos sanitários finalmente apareceram nas residências. Pode-se dizer que arquitetos, antigos artesãos
e os habitantes de Paris desse período a que me refiro como século do conforto (1670-1765) criaram a planta baixa das residências atuais e projetaram nosso modo de viver nelas.
Dessa forma, podemos perceber que tanto de acordo com Bryson, quanto de acordo com DeJean, a busca por conforto foi um fator que mudou a história dos interiores residenciais. Conforme DeJean (2012, p. 18): “Ao definir a arquitetura moderna como aquela que proporciona conforto, [...] qualquer projeto digno da qualificação “moderno” teria de estar voltado para o conforto.”
DeJean (2012) faz diversas comparações entre o que ele chama de a era da suntuosidade e a era do conforto. Segundo DeJean (2012, p. 87):
Pequenos quartos, pequenos conjuntos de cômodos, pequenas escadas –uma das diferenças mais significativas entre a arquitetura do conforto e a anterior provavelmente era a escala. A ideia de quanto maior, melhor governou a época da magnificência. O tamanho era considerado uma prova essencial da hierarquia e do status, de modo que um tamanho exagerado era a maneira mais segura de tornar uma sala ou um quarto imponentes. E então o mundo foi arrebatado de repente pelo pequeno. Com incrível rapidez, o gosto de uma clientela para quem preço não fazia diferença mudou completamente.
Além da busca pelo conforto, a ideia de privacidade se tornou mais forte justamente nessa chamada era do conforto. Segundo DeJean (2012, p. 16):
Nas últimas décadas do século XVII, difundiu-se amplamente a noção de que determinadas atividades, como dormir, tomar banho e usar o sanitário, deveriam ter lugar e não na frente dos outros, e sim na intimidade. Arquitetos conceberam novos espaços específicos dentro da casa, cada qual apropriado a uma dessas atividades agora privadas. Criaram os primeiros quartos de dormir modernos em ambientes privados e, para algumas pessoas, passou a ser costume dormir sozinhas.
Conforme afirma Bryson (2011), com o desenvolvimento da marinha britânica, além do carvalho, (próprio da região da Grã-Bretanha, porém só adequado para móveis densos e pesados, como baús, camas e mesas grandes), os ingleses puderam trazer novas madeiras, como o mogno do Caribe, além de novos acabamentos como o verniz e a laca. O mogno era uma madeira brilhante, difícil de empenar e adaptável; e podia ser esculpida e lixada para criar formas adequadas ao estilo rococó. As pernas e braços das cadeiras podiam ter curvas fluidas.
Além disso, os fabricantes começaram a produzir os mobiliários em grande escala. Segundo Bryson (2011), os fabricantes de móveis perceberam que era mais lucrativo fabricar uma grande quantidade de móveis com um único projeto. Criaram um sistema fabril que produzia peças cortadas a partir de moldes, e depois montadas e acabadas por especialistas.
Como afirma Bryson (2011), na configuração da sala, as cadeiras normalmente ficavam encostadas nas paredes. E logo percebeu-se que as cadeiras não eram muito confortáveis, o que se alterou somente com o avanço das tecnologias têxteis. Conforme Bryson (2011, p. 182):
As melhorias nas tecnologias têxteis e de impressão também transformaram as possibilidades decorativas em outras áreas além do mobiliário. Essa época viu a introdução generalizada de carpetes, papéis de parede e tecidos de cores vivas. Também a tinta de parede se tornou disponível em toda uma gama de cores, pela primeira vez. O resultado é que, no final do
século XVIII, as residências estavam repletas de objetos que um século antes seriam luxos extraordinários.
Ainda sobre os assentos, segundo DeJean (2012), antes do fim do século XVII, havia poucos lugares para sentar nas casas e as poucas cadeiras existentes eram simples, rijas e com encostos retos. Havia bancos e banquetas ou as pessoas sentavam em almofadas no chão. A cadeira de braços só foi introduzida no século XVII e eram imponentes, símbolo de status, como se fossem um trono informal, mas não eram confortáveis. Possuiam encosto alto, estreito, duro e reto. Na década de 1670, as primeiras poltronas foram criadas. Eram articuladas e permitiam que o encosto fosse reclinado.
De Jean (2012) ainda escreve sobre outro assento derivado das cadeiras de braços duplas: o sofá. Os sofás foram os primeiros móveis estofados com tecido, acolchoados de todos os lados e planejados para o relaxamento. Por volta de 1760, todos os tipos de assento que temos na atualidade já haviam sido criados. Os modelos eram arredondados para acompanhar os contornos do corpo. Os designers também favoreciam modelos de assentos com uma leve inclinação para trás.
Houve uma busca pela criação de móveis cada vez mais confortáveis. Segundo DeJean (2012, p. 20):
Épocas anteriores davam prioridade à apresentação da mobília: as melhores peças da casa eram apenas para exibição. Na verdade, nos cômodos em que as pessoas viviam havia bem poucos móveis. Foi então que surgiram os novos cômodos de conforto, e eles pareciam pedir novos móveis, tanto em maior número quanto de modelos diferentes. [...] No século XVIII, designers [...] começaram a imaginar as vidas de seus clientes e a inventar objetos que se adequassem a suas necessidades. Os arquitetos começaram a desenhar peças especialmente planejadas para combinar com elementos decorativos e o desenho de um determinado cômodo. [...] as melhores peças de mobiliário agora eram com frequência pequenas e destinadas à comodidade mais do que a ostentação.
Ainda de conforme DeJean (2012, p. 155):
Entre 1675 e 1740, as pessoas deixaram de ter apenas alguns exemplares de um tipo de cadeira dura e sem estofamento e passaram a viver rodeadas de uma variedade estonteante de assentos bem estofados e acolchoados, arredondados e “ortopedicamente” proporcionais: de poltronas a sofás, canapés e chaises longues.
Conforme DeJean (2012), as pequenas mesas começaram a surgir para apoiar uma bebida, um livro ou uma vela ao lado de um sofá ou poltrona. A mesa de cabeceira surgiu com esse propósito por volta de 1720.
DeJean (2012) afirma que até o século XVII só havia o baú para armazenar objetos. As gavetas começaram a ser usadas na Renascença, sendo acrescentadas a mesas e outros móveis. Já a cômoda, utilizada para guardar roupas, foi criada em 1690 como uma alternativa ao baú. Dessa forma não era mais necessário tirar tudo igual quando se procurava uma roupa no fundo do baú. Segundo DeJean (2012), foram criados também os armários embutidos.
Outro elemento importante dos lares é a cama. De acordo com Bryson (2011), virar e afofar os colchões dava muito trabalho, visto que um colchão de penas possuia cerca de vinte quilos. Além disso, o estrado era um trançado de cordas que podiam ser apertadas por uma chave, mas mesmo tensas não eram confortáveis. O colchão de molas foi inventado em 1865, mas molas podiam sair do lugar e perfurar
quem a estava ocupado. O enchimento de palha era comum, mas picava através do pano do colchão. Segundo Bryson (2011, p. 348):
Durante grande parte da história a cama era, para a maioria dos proprietários, a coisa mais valiosa que possuíam. Nos tempos de William Shakespeare, por exemplo, uma boa cama com dossel custava cinco libras, a metade do salário anual de um professor primário. Por ser um objeto tão valioso, a melhor cama sempre ficava no andar de baixo, às vezes na sala, onde podia ser exibida aos visitantes [...]
Sobre o quarto de dormir, DeJean (2012, p. 245) afirma:
Nenhum cômodo mudou tanto no século do conforto quanto o quarto de dormir. Na década de 1670, o espaço em que as pessoas dormiam era essencialmente público, aberto a todos da casa. Cinquenta anos depois, um novo cômodo, o quarto de dormir, tinha se tornado o centro da zona privada do lar e tudo relacionado a ele – da disposição dos móveis à decoração, das atividades que nele se desenrolavam ao desenho da cama – foi transformado. Em menos de meio século, o quarto adquiriu sua identidade moderna como a essência da intimidade e do conforto.
A autora também fala sobre o algodão, que foi introduzido no século XVIII, e que foi colocado nas camas e nos sofás, e hoje são símbolo de conforto dentro das casas. Conforme DeJean (2012, p. 11):
O sofá [...] surgiu entre 1685 e 1710. Foi na virada do século XVIII que algodão [...] começou a ser usado tal como o usamos atualmente. Uma das divisões que nos parecem básicas em projetos residenciais, a que une banheiros a quartos de dormir particulares, foi introduzida nas primeiras décadas do século XVIII, pouco depois de ambos terem sido inventados.
De acordo com Bryson (2011), o papel de parede de lã começou a ser muito utilizado a partir de 1750, mas apresentava riscos pela toxicidade das colas e dos pigmentos utilizados. As tintas também eram tóxicas e era necessário aplicar ao menos cinco demãos devido a pouca opacidade. O acabamento mais rudimentar utilizado na época era a caiação.
Com isso, o avanço nas tecnologias de produção de papel de parede e tinta foram importantes para a saúde. Ainda sobre tintas, Bryson (2011, p. 343) afirma:
Quando as tintas caíram no gosto popular, as pessoas queriam que fossem as mais vivas possíveis. [...]
[...] as cores vivas denotavam custos altos, já que sua produção exigia uma grande quantidade de pigmento. Também é importante lembrar que à noite essas cores eram vistas à luz de velas; por isso precisavam ser mais vivas, para causar algum impacto com essa luminosidade fraca. [...]
Quando as primeiras tintas já preparadas chegaram ao mercado, na segunda metade do século XIX [...] A última moda era não só ter uma casa com cores vivas, mas também ter sete ou oito cores diferentes em um único aposento.
DeJean (2012, p. 25) afirma que o design de interiores foi uma área que foi criada em meio à era do conforto moderno: “Com o tempo, toda essa proliferação dos novos tipos de espaço, de móveis e de usos para os tecidos levou à criação de um novo campo: a decoração de interiores.” Ainda segundo DeJean (2012, p. 25): “Os grandes salões, é claro, sempre haviam sido decorados [...]. O ofício só ganhou
um nome, sua identidade moderna e um status de campo independente com o surgimento da moderna arquitetura.” Segundo DeJean (2012, p. 94):
Hoje chamamos a arquitetura e a decoração de interiores da primeira metade do século XVIII de rococó, um termo desconhecido na época. Um termo cuja conotação de algo excessivamente ornamental e cheio de frivolidade acabou desviando a atenção da importância das mudanças resultantes da revolução na arquitetura que criou as noções modernas de espaço interior e vida confortável.
DeJean (2012, p. 216) escreve também:
[...] como subconjunto da nova arquitetura da vida privada, que a decoração de interiores surgiu. [...] o interior da casa poderia e deveria ser a expressão do gosto de seu proprietário; deveria ser planejado como complemento da vida do dono da casa com seu conforto em mente. [...] Antes das décadas finais do século XVII, não havia necessidade de uma expressão como “decoração de interiores”, porque o conceito de decoração praticamente não existia. Naqueles séculos em que as famílias se mudavam constantemente, a decoração do espaço doméstico se limitava a lareiras, aos objetos pendurados nas paredes e à ornamentação do teto. No fim da Idade Média e na Renascença, a Itália reinou suprema no mundo do estilo, e os monarcas franceses mandavam buscar artistas italianos para ornamentar o interior de suas residências. Foi assim que os afrescos se tornaram uma opção padrão e os tetos ficaram mais elaborados – surgia a ideia de um projeto abrangente de decoração. [...] Pela primeira vez, objetos eram valorizados não por serem deslumbrantes, mas por sua capacidade de se adequar a um contexto e, assim, fazer de um cômodo tanto um reflexo do gosto pessoal quanto um lugar que melhorava e facilitava a vida diária. Pela primeira vez havia pessoas cujo trabalho era ajudar os outros a escolher sua decoração e criar objetos que se encaixassem nos espaços interiores de seus clientes, além de arrumá-los em suas residências.
Conforme DeJean (2012), na era da suntuosidade os tetos normalmente eram cobertos por pinturas elaboradas ou vigas que formavam painéis, que eram acabamentos muito custosos. Com a simplicidade da invenção de tetos brancos, que se tornaram muito utilizados em toda a Europa, o estilo moderno começou. Os móveis também começaram a ter um visual mais claro.
Abordando sobre banheiros, de acordo com DeJean (2012), antes do século XVIII, quase não havia banheiros, os poucos que existiam eram para exibição e raramente usados. Foi em 1715 que o banheiro para uso frequente apareceu nas mansões parisienses. O esquema do banheiro como complemento do quarto de dormir, que hoje consideramos básico, foi utilizado pelas primeiras vezes nas residências nessa época. No fim do século do conforto a sala de banho iniciou uma revolução na demanda e no fornecimento de água.
Conforme Bryson (2011) uma peça que foi bastante difícil de ser desenvolvida foi a banheira. Segundo o autor, fundir a banheira em uma só peça que não fosse muito pesada nem grossa foi uma tarefa difícil. Além disso, havia o problema de dar um acabamento resistente que não se desgastasse. As banheiras de zinco, cobre e ferro fundido não conservavam o acabamento. Apenas por volta de 1910 foi criada a porcelana esmaltada que tornou as banheiras mais duráveis.
Segundo DeJean (2012), os primeiros modelos de banheira eram redondos, de madeira e colocados na cozinha, perto de onde a água podia ser aquecida. No século XVIII, a banheira foi reinventada como um mobiliário moderno. As novas
banheiras eram feitas em cobre banhado em estanho e a banheira redonda foi substituída por uma forma mais parecida com a utilizada na atualidade, projetada para que as pessoas pudessem se alongar e afundar na água.
Outras novidades surgiram nos banheiros. Segundo DeJean (2012, p. 122):
Na virada do século XVIII surgiu um objeto revolucionário: o vaso sanitário com descarga. [...] Antes disso, havia um assento duro e malcheiroso em um lugar onde qualquer um na casa podia entrar; depois surgiu uma instalação sofisticada quanto as que temos no mercado hoje, que ficava, além do mais, em um cômodo privado gloriosamente decorado.
Ainda conforme DeJean (2012), até o século XVIII, a instalação existente para os menos privilegiados era a latrina que era ligada a uma fossa. Já pra pessoas com mais recursos, havia assentos sanitários e em um compartimento abaixo havia um penico. Além disso, não havia privacidade para a utilização de nenhuma das opções.
Sobre os espelhos, de acordo com DeJean (2012, p. 142), “A indústria do espelho francesa havia recentemente desenvolvido a tecnologia que tornava possível fazer espelhos de grandes proporções em uma só peça [...]”.
Um outro material complicado era o vidro. Como escreve Bryson (2011), o vidro era difícil de fabricar e por isso era artigo de luxo. Com exceção das igrejas e das casas mais ricas, as janelas de vidro eram raras ainda na metade do século XVII. Mesmo nas maiores casas, havia janelas apenas nos cômodos mais importantes. Apenas com a invenção da chapa de vidro pelos franceses e com o desenvolvimento de um refinamento mais barato, que era a placa de vidro, em 1838, essa situação mudou. Conforme Bryson (2011, p. 26):
[...] veio a oportuna abolição dos dois antigos impostos: o imposto sobre as janelas e o imposto sobre o vidro (a rigor, um imposto sobre artigos de luxo).
O imposto sobre as janelas datava de 1696 e era tão pesado que as pessoas realmente evitavam ao máximo colocar janelas nos edifícios. As aberturas de janelas tapadas com tijolos [...] com frequência eram pintadas para parecerem janelas.
Conforme DeJean (2012, p. 230) “Quando foi possível fazer grandes vidraças, surgiu a janela moderna.” Também de acordo com a autora, nessa época, as cortinas começaram a ser divididas ao meio deslizadas para os dois lados.
Sobre as cozinhas do século XIX, Bryson (2011) afirma que não havia pias e serviam apenas para cozinhar. As louças eram lavadas em uma área de serviços especial. Isso acarretava em muitas viagens entre os cômodos, pois na era vitoriana se cozinhava muito e se usava uma grande variedade de pratos. O autor também escreve que foi em 1900 que a iluminação elétrica se tornou mais popular e surgiram os eletrodomésticos, que são hoje tão comuns nas cozinhas.
Tratando agora sobre os interiores das áreas residenciais da atualidade, Gurgel (2018) afirma:
A importância do design, na atualidade, torna-se evidente quando percebemos que o design aplicado a qualquer elemento afeta não somente os objetos que interagem com ele e as pessoas que o utilizam, mas mais abrangentemente ainda, afeta nosso meio ambiente.
Gurgel (2018) afirma que nos dias de hoje, há diferentes propostas para as habitações, pois são diferentes soluções para famílias com particularidades distintas. Para ela, deve-se conhecer os materiais e tecnologias, garantir conforto e soluções
adaptadas a cada indivíduo e sua anatomia, além de respeitar a natureza, preservando-a e utilizando tecnologias que consumam menos energia.
Gurgel (2018, p. 51) afirma:
Fabricantes de peças sanitárias, torneiras e chuveiros, preocupados com o aumento populacional, com a crescente demanda no consumo de água e com a diminuição do volume de água em nossos mananciais, vêm desenvolvendo soluções mais adaptadas à atual realidade para de fato diminuir o consumo de água. Caixas acopladas, com consumo de água reduzido e seleção da quantidade de água a ser utilizada, bem como torneiras com acionamento fotoelétrico ou dispositivos que regulem a quantidade de água utilizada, são alguns exemplos de materiais de acabamento com preocupação ecológica existentes no mercado.
Ainda segundo Gurgel (2018), conhecer e pesquisar as tecnologias disponíveis é importante durante o processo criativo, pois viabiliza diferentes, eficientes e inovadoras soluções. Para ela, a automação residencial é uma dessas tecnologias. A autora ainda escreve que a tecnologia moderna disponibilizou no mercado equipamentos controlados e acionados por celulares.
Além disso, para a autora, o desenvolvimento tecnológico foi o que permitiu o aparecimento de novos materiais, como o acrílico, o plástico, o alumínio, etc. Conforme Gurgel (2018, p. 29), “Novos produtos, com diferentes características, possibilitam novas formas e, consequentemente, novos estilos que exploram as novas descobertas.”
De acordo com a autora, a internet também aumentou as possibilidades dentro do design de interiores. Segundo Gurgel (2018, p. 30):
A internet rompe fronteiras e abre portas para uma globalização “sem limites”. O acesso, “em tempo real”, ao que está acontecendo no mundo certamente ampliou as possibilidades criativas. O que é produzido do outro lado do mundo já pode ser visto e adquirido num acionar de teclas
2.3. Design de interiores residencial: o futuro
Alguns artigos e pesquisas discutem o futuro do design de interiores residencial. Entre eles o Estudo “O Futuro do Morar” realizado pela Dexco, em parceria com a Spark:off e descrito pela Nádia Kaku. De acordo com essa pesquisa de 2023, há cinco tendências e comportamentos de consumo que devem se manifestar nas moradias do futuro: Networked Home, Homejoy, Wellbeing at home, Biofilia Radical e Vivendo com Fluidez.
Conforme relata Kaku (2023), Networked Home significa casa conectada com a vida produtiva ou adaptada ao trabalho remoto. O conceito corresponde a casa automatizada e com tecnologias que facilitam o cotidiano dos residentes. Além de uma conexão com a sustentabilidade. O estudo mostra, pela GFK, que 57% dos brasileiros acreditam que tecnologias em smart homes ganharão mais espaço e terão mais impacto sobre suas vidas nos próximos anos. Além disso, 80% da população brasileira acredita que a segurança e o monitoramento das residências deve ser prioridade na Internet das Coisas.
A partir desses dados coletados pela GFK, podemos perceber que os próprios moradores brasileiros já entendem as casas conectadas, automatizadas e tecnológicas como um futuro próximo.
De acordo com a pesquisa da Dexco (2023), Homejoy significa moradias propícias ao entretenimento e a receber amigos e família. Formas, cores e objetos com histórias podem contribuir para gerar boas experiências, promover a
socialização e criar boas lembranças. O estudo aponta que 54% das pessoas acreditam que o mais importante do lar é a capacidade de celebrar e relaxar.
Conforme esse dado, podemos perceber que os moradores atuais e futuros entendem seu lar como um local de diversão e de relaxamento.
Ainda de acordo com a pesquisa “O Futuro do Morar” (2023), o Wellbeing at home ou bem-estar em casa é uma tendência que busca por ambientes tranquilos, reconfortantes e para acalmar a ansiedade com espaços adaptados para trazer serenidade dentro dos lares. Os ambientes devem promover o convívio entre os integrantes da casa e, ao mesmo tempo, respeitar seus espaços particulares. Há lares que acomodam várias gerações e que devem permitir um equilíbrio entre o social e o privado. Além disso, as habitações estão cada vez mais multifuncionais, podendo ser escritório e, também, lugar de confraternização. Após o período da pandemia, ficou ainda mais evidente como o lar é importante para o bem-estar físico, mental e social e que a casa mostra a identidade e a história de seus ocupantes.
Dessa forma, podemos reafirmar que os moradores estão em busca de um lar que proporcione o relaxamento, mas também que eles buscam um local que mostre suas particularidades.
De acordo com Gurgel (2018, p. 49), “Podemos dizer que a sensação de bemestar está ligada à sensação de segurança, e que conforto pode ser definido como um estado de espírito.” Assim, podemos afirmar que a busca por bem-estar dentro das habitações, é não só a busca por ambientes tranquilos e reconfortantes, mas também ambientes seguros.
Outra tendência mostrada pela pesquisa da Dexco (2023) é a chamada Biofilia Radical, que é o movimento de trazer vida para dentro das residências e vai além de trazer plantas para a decoração.
Para explicar o conceito de design biofílico, há o relatório da Human Space, e de acordo Browning e Cooper (2015, p. 10):
O design biofílico é uma resposta à necessidade humana de se conectar com a natureza e trabalha para restabelecer este contato no ambiente construído. Fundamentalmente, o design biofílico é a teoria, ciência e prática de criar construções inspiradas na natureza, com o objetivo de continuar a conexão do indivíduo com a natureza nos ambientes em que vivem e trabalham todos os dias. Nos ambientes construídos contemporâneos de hoje, as pessoas estão cada vez mais isoladas da experiência benéfica dos sistemas e processos naturais.
A pesquisa da Dexco (2023) ainda traz dados da YouGov (grupo internacional de pesquisa), em que 60% dos consumidores estão dispostos a mudar o estilo de vida para beneficiar o meio ambiente e 89% das pessoas acham importante comprar ou alugar uma casa com eficiência energética. De acordo com Crocomo, diretora de Marketing e Design da Dexco, a tecnologia está sendo importante para preservar recursos naturais como a água. Há diversos produtos no mercado como torneiras, bacias e chuveiros que economizam água e energia; além de meios de reutilizar a água da chuva. Segundo ela, a casa do futuro será uma casa racional, automatizada e com baixa manutenção.
Esses dados trazidos pela pesquisa mostram que essa tendência já começou a aparecer nas prateleiras do mercado. Como aponta Crocomo (2023) e já foi mostrada pela citação da Gurgel (2018, p. 51) que apareceu no tópico 2.2, as marcas já estão desenvolvendo torneiras, chuveiros, entre outros que reduzem o consumo de água. E isso se encaixa com a preocupação dos consumidores.
A última tendência apontada pelo estudo “O Futuro do Morar” (2023) é o Vivendo com Fluidez, que significa adaptabilidade dos espaços, que devem ser multifuncionais; com móveis versáteis, modulares, com alturas reguláveis e que permitam ajustes ergonômicos, atendendo pessoas com necessidades e idades distintas em lares multigeracionais; além de produtos de acessibilidade, como barras de apoio. De acordo com a pesquisa, entre 2012 e 2022, a quantidade de pessoas entre 25 e 34 anos que não saiu de casa aumentou em 137% nos EUA, o que é uma tendência global devido à conveniência e reforçada pelas consequências da pandemia de COVID-19. Além do crescimento dos lares multigeracionais, no Brasil, houve um aumento de moradias com um único habitante nos últimos dez anos (43,7% segundo o IBGE), o que ocasionou em uma procura por apartamentos cada vez menores. Na cidade de São Paulo, o lançamento de apartamentos de 30 m² cresceu em 21% em sete anos conforme o SECOVI-SP. Esse também é um dado que aponta no sentido de adaptar espaços e criar soluções para moradias menores.
Dessa forma, veremos, cada vez mais, espaços e mobiliários adaptados para lares que atendem diferentes gerações ou lares cada vez menores.
No artigo do Archdaily, Cao (2020) também escreve sobre as moradias menores: “[...] arquitetos vêm priorizando cada vez mais a sustentabilidade e a maximização do espaço disponível - permitindo que mais pessoas ocupem menos espaço com uma área menor.” Porém, esse lares menores parecem ser, na verdade, pelo crescimento de pessoas morando sozinhas, apontado pelos dados da pesquisa anterior e talvez, também, pelo aumento da especulação imobiliária.
Nesse artigo do Archdaily, escrito por Cao (2020), diz-se que os interiores mudarão a partir de três eixos: sustentabilidade, tecnologia e eficiência, que esses ocorrerão em conjunto. Esses eixos serão detalhados a seguir.
Cao (2020) diz que nos interiores do futuro existirão novas tecnologias e novos métodos aliados a sustentabilidade para diminuir o uso de energia e reduzir emissões. Segundo ela, uma forma seria utilizar mais materiais com baixo consumo de energia como pedra, taipa, blocos de concreto e madeira, ao invés de cimento, vidro, tijolo e aço que possuem alto consumo. Dessa forma, os interiores das residências teriam mais tons terrosos e de madeira. Outro ponto que foi expressado é utilização de materiais locais para eliminar os custos do transporte; além de considerar o clima e paisagem locais para diminuir a necessidade de aquecimento e ar condicionado.
Como afirma Gugel (2018, p. 49), “Lembre-se de que há tecnologia disponível para alterar quase qualquer característica de um ambiente. Entretanto, é bom lembrar que as condições climáticas que afetam uma edificação alteram-se no decorrer de um dia, além de variarem bastante dependendo do país, do estado e da cidade.” Além disso, essas tecnologias (ar condicionado e aquecimento) gastam bastante energia, e portanto, pensar no clima local e no conforto térmico dos espaços deve ser importante para economizar energia.
No artigo, Cao (2020) afirma que serão utilizadas cada vez mais tecnologias para otimizar energia e reduzir o desperdício na área da construção. Uma dessas tecnologias seria o BIM (Building Information Modeling) que facilita o planejamento e a execução para que se reduzam o desperdício e os custos.
De acordo com Cao (2020) “com o alto custo e o impacto ambiental de novas construções, os interiores futuros provavelmente não consistirão apenas em novos edifícios, mas também incluirão estruturas existentes adaptadas através de retrofits.” Essa tendência de reaproveitar o já existente e transformá-lo em algo novo também se mostra na pesquisa do Pinterest Predicts (2024) no tópico “sem desperdício”.
Cao (2020), assim como Gurgel (2018), fala sobre a internet e os sistemas de automação, prevendo que o interior do futuro será repleto de novas tecnologias. De acordo com Cao (2020), em 2050 a internet das coisas estará completamente integrada com as moradias, para melhorar a eficiência, limitar o uso de energia, diminuir o desperdício de alimentos e contabilizar o uso de água. Sobre os sistemas de automação residencial, eles podem desligar luzes, torneiras, fogões, ar condicionado e aquecimento. Somado a isso, podem haver novos sistemas de segurança, acionados pelo acesso móvel, no lugar das chaves e cartões-chave.
Assim como na pesquisa da Dexco (2023), o artigo escrito por Cao (2020) também aponta a biofilia como tendência. Segundo ela, o interesse pela tecnologia e natureza podem se manifestar com o uso minimalista de materiais, custo e energia e, assim, no uso de design biofílico e minimalista. Os interiores serão brancos e bege, e os móveis serão mais simples. Além disso, jardins verticais, telhados verdes e hortas também começarão a fazer mais parte do interior das residências.
Um último ponto apontado por Cao (2020), que também foi abordado pela pesquisa da Dexco (2023) foram os espaços multifuncionais. Cao (2020) descreve espaços individuais que podem acomodar várias funções por meio de integração e exemplifica essa possibilidade por meio da retração de paredes. Outros exemplos dados para possibilitar a transformação dos espaços internos seriam os móveis transformáveis, as prateleiras multiuso e armazenamentos retráteis que poderiam ser integrados à tecnologia da construção inteligente e, assim, acionados por aplicativos e automação. A pesquisa da Dexco (2023) aponta o motivo da necessidade de espaços e mobiliários multifuncionais: espaços divididos por diferentes gerações e espaços cada vez menores para pessoas que vivem solo.
Há outro artigo, também do Archdaily, porém escrito por Materials, que prevê como evoluirão os espaços internos a partir de 2023 por meio de três pontos: operações, estética e energia.
O primeiro tópico abordado por Materials (2023) é o espaço e a operação. O autor aborda os layouts flexíveis assim como Cao (2020) apontou ao exemplificar como poderiam ser os espaços multifuncionais. Para Materials (2023), a criação de espaços mutáveis e personalizáveis é uma tendência. E o desafio é maximizar e aprimorar o uso do local, permitindo a conexão entre os espaços e um fluxo de pessoas otimizado. O autor também fala sobre os avanços tecnológicos que permitem os espaços mutifuncionais. Aborda a integração da inteligência artificial ao design, que segundo ele, pode ajudar os usuários a visualizarem as intervenções em um espaço real. Além das projeções holográficas que podem alterar a experiência espacial em um ambiente e criar cenários mutáveis. E, por fim, a automação residencial; já citada por Cao (2020), Gurgel (2018) e pela pesquisa da Dexco (2023) como tendência; e que, conforme o autor, permite o uso eficiente da iluminação para modificar os espaços, fazendo-os parecerem maiores e mais abertos, por exemplo.
O segundo tópico escrito por Materials (2023) é o espaço e a estética, em que ele fala sobre o retorno modernizado da rusticidade. Isso implica na valorização dos seguintes elementos: tradição, local, riqueza de materiais, texturas, cores, ornamentos, entre outros. De acordo com Materials (2023) “Interiores sem alma, excessivamente minimalistas, não são mais desejáveis.” Os projetos devem atender às novas demandas e ao mesmo tempo possuirem significado.
Isso contradiz o que Cao (2020) havia apontado, que era uma tendência ao minimalismo. O que Materials (2023) mostra é uma rendência a interiores mais marcados pelos significados, de forma similar ao que a pesquisa da Dexco (2023) mostra: as pessoas tem o desejo que seus lares mostrem sua identidade e sua
história (Wellbeing at home). Essa tendência da rusticidade modernizada mostrada por Materials também se assemelha muito a uma tendência apontada pelo Pinterest Predicts (2024), que é a decoração retrô e country. Essa tendência pode ser uma reação ao minimalismo, e dessa forma, um retorno ao maximalismo. A estética da cozinha kitsch e o tópico “mais é mais” (filosofia maximalista, que nega o básico minimalista) apontados pelo Pinterest Predicts (2024) são um dos exemplos disso.
Retornando ao tópico de espaço e estética do artigo do Archdaily, Materials (2023) dá exemplos do retorno rusticidade como o uso da madeira laminada cruzada em edifícios altos, o desenvolvimento do bambu estrutural engenheirado e a redescoberta do ciclo de vida natural dos materiais (cobre oxidado, pedra intemperizada, madeira não tratada e, também, materiais de alta tecnologia que mudam sua aparência em resposta a estímulos externos, como vidro termocrômicos e concreto autorregenerativo).
Para Materials (2023), “os interiores serão transformáveis, modulares, mais inteligentes e (literalmente) mais verdes, mesclando a natureza com a tecnologia e consumindo recursos com eficiência.”
O último tópico escrito por Materials (2023) é sobre espaço e energia. Para ele, “Os espaços internos devem usar com eficiência a energia necessária para funcionar, além de cuidar do que é desperdiçado.” Os espaços interiores, segundo o autor, devem se preparar para a crise climática e utilizar a energia de forma mais eficiente e inteligente, reduzindo o seu consumo. Para isso, deve-se utilizar sistemas e aparelhos de baixa energia, infaestrutura verde, aproveitar a iluminação e a ventilação natural, entre outros.
Esse tópico está em conformidade com a pesquisa da Dexco (2023), que também fala sobre a tendência de casas mais eficientes energeticamente e também está em conformidade com o artigo de Cao (2020) que afirma que os interiores do futuro devem possuir tecnologias aliadas à sustentabilidade. Todos também afirmam o design biofílico como uma tendência.
Além disso, Materials (2023) aborda a Internet das Coisas, assim como a pesquisa da Dexco (2023) e Cao (2020) e também a automação residencial, como Cao (2020) e Gurgel (2018). De acordo com Materials (2023):
Se iluminação inteligente ou assistentes digitais como a Alexa já não nos surpreendem, em um futuro próximo, devemos ter acesso à integração de robótica e automação. As tecnologias de automação residencial, juntamente com a aplicação da IoT (Internet das Coisas), devem ser facilitadores de uma economia circular, promovendo um melhor uso de recursos e reduzindo o impacto ambiental. Além disso, espera-se que a robótica e a automação sejam incorporadas em nossas rotinas, não apenas revolucionando a maneira como vivemos, mas também como interagimos com o meio ambiente. Juntamente com essa enxurrada de tecnologia, também estamos vendo o quanto sentimos falta da natureza, e a tendência do design biofílico certamente continuará (e fortalecerá) olhando para o futuro.
A partir de agora serão abordados os artigos produzidos pela empresa WGSN. Primeiramente, no artigo “Big Ideas 2024: Interiors”, é mostrado um relatório com as seis principais tendências que serão os desejos dos consumidores dentro de dois anos, sendo elas: cuidar, estados fluidos, provocando protopias, mudanças no poder das pessoas, de dimensão democrática e quebra de códigos. Esses tópicos são sutentados por três temas: consciência da interdependência, anseio pela comunidade e rejeição ao “normal”.
A primeira tendência, de acordo com Branco e Ribert (2022), chamada de cuidar é sobre a cultura do cuidado, em que se deixa a cultura agitada de lado, fazendo com que as pessoas priorizem o bem-estar em detrimento do trabalho. Essa tendência está conectada ao Wellbeing at home, apontado pela pesquisa da Dexco (2023), em que as pessoas estão procurando ambientes tranquilos, reconfortantes e serenos longe da agitação. Além disso, se relaciona ao tópico “Devagar e sempre” apontado pelo Pinterest Predicts (2024), em que as mais novas gerações buscarão rituais de relaxamento para fazer em casa.
A segunda tendência apontada por Branco e Ribert (2022) é chamada de estados fluidos. Nela, os consumidores verão a importância do bem-estar e segurança online. Essa preocupação com a segurança mostra-se na automação residencial já anteriormente citada por vários autores. Além disso, essa preocupação aparece na busca pelo bem-estar (descrito pela pesquisa da Dexco), que como Gurgel (2018) afirmou, se relaciona também a viver em segurança.
A terceira tendência do artigo “Big Ideas 2024: Interiors” (2022) chama-se provocando protopias, em que se espera que as empresas façam mudanças a fim de enfrentar a emergência climática. As protopias são uma abordagem mais pragmática que as utopias. Essa preocupação pela sustentabilidade, biofilia e redução no consumo de energia foram abordados pela pesquisa da Dexco (2023) e pelos dois artigos do Archdaily, escritos por Cao (2020) e Materials (2023). Gurgel (2018, p. 31), reitera a necessidade de mudanças e segundo ela “O design de hoje deve ser um ecodesign, ou seja, um design que respeite a natureza e os recursos naturais evitando a poluição em todas as suas formas.”
Outra tendência mostrada por esse artigo da WGSN (2022) são as mudanças no poder das pessoas, em que as pessoas terão suas vozes mais ouvidas e estarão cada vez mais em busca de designs democratizados e apoiados na diversidade e dando mais atenção aos valores das marcas.
Esses valores podem ser, inclusive, os valores de sustentabilidade. E como foi mostrado na pesquisa da Dexco (2023), já há empresas que, por exemplo, estão preocupadas com a economia de água de seus produtos. Além disso, o tópico “Vivendo com Fluidez” da pesquisa da Dexco (2023) mostra o interesse por designs democratizados a partir de móveis versáteis e acessíveis.
Dimensão democrática é o nome de outra tendência descrita Branco e Riberti (2022) que se assemelha muito a inclusão da diversidade da tendência anterior e ao tópico “Vivendo com Fluidez” já citado. Nessa tendência há uma busca por designs personalizados e inclusivos que atendem a todos, recusando o tamanho único.
E, por fim, no artigo “Big Ideas 2024: Interiors” (2022) a última tendência indicada é chamada de quebra de códigos, em que os designers quebrarão códigos antigos e farão novas colaborações com participação ativa dos consumidores, tendo uma criatividade renovada pós-pandemia. A ideia é incorporar diversão nos produtos e serviços. Essa procura por diversão assemelha-se a procura por bem-estar apresentada pela Dexco (2023).
Em outro artigo da WSGN, chamado “CMF Trends: The Next Neutrals”, Smith (2023) escreve sobre as cores neutras que trarão versatilidade, durabilidade e praticidade para espaços de interiores. As cores serão para aqueles que buscam um estilo de vida em torno do descanso, equilíbrio e bem-estar. Isso se conecta com a tendência Wellbeing at home indicada pela Dexco (2023) e ao tópico “Devagar e sempre” (busca por relaxamento em casa) apontado pelo Pinterest Predicts (2024).
As cores e texturas descritas por Smith (2023) são: brancos texturais (tons mais quentes de branco com textura sentida pelo tato); o translúcido (que cria uma
sensação de calma dentro do lar); os neutros em camadas (tons de bege e marrom que podem ser sobrepostos criando uma estética atemporal); o rosa terroso (tons de rosa suaves e terrosos); o terracota quente (pode-se adotar técnicas naturais e artesanais), o bege funcional (tons orgânicos e de origem natural que constroem uma narrativa de entorno ao ar livre); madeira clara (bege cremoso como tonalidade de base); natural e não tingido (se alinham aos valores de sustentabilidade); cinzas de aterramento (minimalista) e nuances de preto e branco (combinação de cores contemporânea e impactante).
Essas cores e materiais se relacionam muito com o conceito de design biofílico, pois, por exemplo, o terracota, o bege, o natural e não tingido e a madeira podem criar ambientes inspirados na natureza, com técnicas naturais e artesanais, com materiais de origem natural e alinhados com a sustentabilidade. A pesquisa da Dexco (2023) e o artigo de Cao (2020) já haviam apontado a biofilia como tendência e Cao (2020) já havia mencionado interiores brancos, bege e com madeira. Além disso, tais cores e materiais abrem espaço para o retorno da estética rustica apontada por Materials (2023) e pela estética chamada de country e retrô apontada pelo Pinterest Predicts (2024).
O último artigo que será abordado é o “Interiors Product Opportunities 2024” também da WSGN (2022). Nesse relatório, de acordo com Riberti (2022), os reguladores são os consumidores avessos a mudanças e complicações, e que buscam conforto, praticidade, certeza, simplicidade, conveniência, acessibilidade, versatilidade, funcionalidade, eficiência e facilidade nos produtos e espaços. Os reguladores estão cansados das constantes mudanças e incertezas dos últimos anos e querem regularidade em suas vidas. Esse grupo, composto principalmente por Millennials e Geração X, quer pragmatismo e confiabilidade sem abandonar o elemento estético.
Essas incertezas dos últimos anos seriam, principalmente, a pandemia, indicada na citação de Kaku (2023) na introdução, que mostra como a casa começou a ser vista como um ambiente importante na busca do bem-estar depois dos tempos em que as pessoas tiveram que passar muito tempo dentro delas.
Segundo Riberti (2022), móveis e objetos devem ser reconfortantes, com tonalidades extraídas de elementos naturais. As peças devem ser versáteis e confiáveis, como mesas laterais que funcionam como bancos. Portanto, uma qualidade para esse grupo seria a multifuncionalidade aliada ao design universal. Além disso, os reguladores procuram um armazenamento discreto e coberto que esconde as coisas e promove uma estética organizada. Riberti (2022), exemplifica ainda uma cama que esconde compartimentos.
Essa tendência a multifuncionalidade do mobiliário e dos objetos apontada por Riberti (2022) também foi apontada na pesquisa da Dexco (2023) no tópico “Vivendo com fluidez”, no tópico “Dimensão Democrática” do “Big Ideas 2024: Interiors” da WGSN, e por Cao (2020) e Materials (2020). Isso indica que os espaços e mobiliários com diversas funções é um caminho a ser seguido.
3. Conclusão
Esse artigo se propôs a analisar a área residencial dentro do design de interiores, buscando explorar a história dessa área e, a partir disso, investigar as tendências futuras. Além disso, esse trabalho teve como objetivo entender qual é o futuro do design interiores para identificar as tendências da área e, assim, auxiliar os arquitetos e designers de interiores para que eles criem projetos de habitações com base nos interesses dessa sociedade em constante evolução.
O artigo iniciou com a abordagem do histórico do design de interiores para compreender melhor como os espaços internos das residências evoluíram e evoluirão. As moradas se iniciaram com o sedentarismo, evoluíram para o Império Romano com suas infraestruturas e confortos que se perderam com a Idade Média. Nesse período, os mobiliários eram mínimos e móveis. No Renascimento, as plantas não possuíam propósito fixo. Já na chamada era da suntuosidade, tudo era feito para afirmar um status e após essa fase, surgiu a era do conforto moderno, em que a privacidade se tornou importante e os cômodos e móveis eram feitos para serem confortáveis. Atualmente, as habitações continuam prezando pelo conforto e novos materiais e tecnologias surgem a todo instante.
O trabalho teve como resultado a identificação das tendências para os interiores lares do futuro e, além disso, descreveu as possíveis características que estarão nos interiores das residências vindouras.
Neste contexto, as habitações do futuro serão automatizadas, eficientes, tecnológicas e adaptadas ao trabalho remoto. As pessoas buscarão nos lares um local de relaxamento, tranquilidade, conforto, segurança e entretenimento. Ou seja, um local que promova bem-estar físico, mental e social longe da cultura agitada.
No futuro, as residências possuirão espaços multifuncionais, ou seja, esses espaços se adaptarão e os móveis serão confortáveis, versáteis, reguláveis, práticos e acessíveis. O design será deverá atender a uma diversidade de pessoas dentro de lares multigeracionais e, também, atender a lares menores de um único habitante.
Haverá uma rejeição ao minimalismo e as pessoas irão buscar por projetos de interiores residenciais com significado, mostrando sua identidade e história, e com uma estética inspirada na rusticidade.
Além disso, as moradias do futuro seguirão os conceitos de design biofílico e sustentabilidade de forma a considerar a crise climática. Portanto, serão cada vez mais procurados produtos e materiais locais e que economizam água e energia, e reduzam as emissões. Serão utilizadas cores neutras, além de materiais e técnicas inspirados na natureza, que remetem ao conforto que o contato com o meio ambiente promove. Além disso, o existente será reaproveitado. E os projetistas utilizarão, cada vez mais, tecnologias que auxiliem na criação de projetos sustentáveis, como o BIM.
Portanto, as hipóteses levantadas se confirmaram pelos resultados encontrados. As hipóteses eram: lares adaptados às novas formas de trabalho, elementos naturais integrados as moradias (biofilia) e novas tecnologias incorporadas nos lares.
A partir das pesquisas e discussões realizadas, podemos concluir que a história, a atualidade e o futuro do design de interiores residenciais resumem-se principalmente a busca pelo conforto e a evolução de tecnologias. Portanto, os interiores das casas do futuro serão cada vez mais confortáveis e tecnológicos.
Houve limitações para desenvolver a pesquisa na fase da coleta de dados, pois houve a dificuldade de encontrar livros a respeito de um tema tão atual. Os livros abordaram apenas o aspecto histórico. Dessa forma, para abordar o futuro do design de interiores residencial, foram utilizados artigos e pesquisas. O tema em questão pode ser assunto de novas pesquisas, pois a área está em constante evolução, surgindo novidades a todo o instante.
Referências
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