UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO II
CASA DA MULHER
1
ORIENTANDA: GLAUCY HELLEN HERDY FERREIRA GOMES MATRÍCULA: 201333097 ORIENTADORA: RAQUEL VON RANDOW PORTES DEZEMBRO DE 2018
Cenrtro de referência Rosa Cabinda
INTRODUÇÃO O objetivo da realização deste trabalho surge da necessidade primordial de se estudar e entender a maneira como homens e mulheres considerando as diferenças que os papéis sociais de gênero empregam nos atores - pensam, utilizam e vivem as cidades e os edifícios.
Trazendo a questão para a cidade Juiz de Fora - local de aplicação desta Mesmo após 20 anos da criação das DEAM’s, a importância delas só foi ampliada com a criação da Lei nº 11.340/2006 - a Lei Maria da Penha - intenção projetual - a cidade conta com 52,7% de sua população total sendo do que institucionalizou as ações de combate à violência doméstica e criou sexo feminino (CENSO 2010), estando alinhada à tendência nacional de maioria dispositivos de medidas protetivas específicas para as mulheres, feminina em seus habitantes. possibilitando uma ação mais rápida e efetiva das DEAM’s às vítimas. Mais recentemente, no ano de 2015, foi sancionada a Lei nº 13.104/2015 - Lei do Feminicídio - que é um agravante do crime de homicídio nas circunstâncias que configurem as causas como violência de gênero. Desde então, os índices de violência contra a mulher tem se tornado cada Minas Gerais 47,3% vez mais apurados e as denúncias vêm aumentando. O gráfico do número 52,7% de feminicídios no Brasil desde a criação da lei específica demonstra esse População Juiz de Fora crescimento: CENSO 2010
O ‘ser mulher’ nas sociedades ocidentais e na maior parte das sociedades contemporâneas, carrega uma série de simbolismos e obrigações impostas pelo sistema patriarcal, pelo capitalismo e pela divisão do trabalho, que influenciam diretamente na maneira como as mulheres realizam suas tarefas e se locomovem nas cidades. É fato que as mulheres contemporâneas têm de se desdobrar em jornadas duplas e às vezes triplas de trabalho, sendo as grandes responsáveis pela manutenção da família e do lar. Além disso, um estudo realizado por Terezinha de Oliveira Gonzaga (2011) com mulheres paulistas refletiu que, aos serem questionadas sobre o que poderia ser feito nas cidades para que sua vida fosse afetada de maneira positiva, todas as mulheres colocaram o interesse de outros - o marido, os filhos, os pais, etc - na frente dos seus próprios, concluindo que as soluções pensadas por mulheres são majoritariamente carregadas de um viés coletivista.
812
O entendimento teórico básico que orientou este trabalho desde a pesquisa da conceituação teórica até esta apresentação final é de que a introdução da perspectiva de gênero nos estudos de arquitetura e do urbanismo resultam em espaços mais justos e igualitários para todos. Mas, seguindo também o entendimento de Judith Butler (2015) de que a liberdade para aceitação de gêneros está intrinsecamente atrelada à uma sociedade que não admita violência e discriminação, concluímos que o foco da intenção projetual deveria atingir diretamente a temática da violência contra a mulher.
2015
2016
sem dados 0 - 0,5 0,6 - 1 1,1 - 1,5 1,6 - 2 +2
2017
Dados: Monitor da Violência <http://especiais.g1.globo.com/monitor-da-violencia/2018/feminicidios-no-brasil/>. Acesso em: 02/10/2018. Feito pela autora
E é seguindo essa premissa que é criado, em 2014, o programa federal Casa da Mulher Brasileira, que visa a construção de Centros de Referência no atendimento à mulher vítima de violência contendo todos os aparatos necessários - desde o socorro primário à posterior reintegração social - dentro de um mesmo edifício: as Casas da Mulher.
X
SERVIÇOS OFERECIDOS PELA CASA DA MULHER BRASILEIRA
SERVIÇOS OFERECIDOS PELA CASA DA MULHER DE JUIZ DE FORA
Promoção da autonomia econômica
DIREITOS
Alojamento de passagem
Central de transportes
Ministério público
Acolhimento e triagem
Defensoria pública
Juizado/Vara especializados
25,40%
(650 vítimas)
(310 vítimas)
(327 vítimas)
PARDAS
20-39 anos
Ensino médio completo OU +
NEGRAS
7,50%
63,0%
21,0%
8,50%
(97 vítimas)
(811 vítimas)
(270 vítimas)
(110 vítimas)
17-40 anos
0-17 anos
64,03%
41-60 anos
61+ anos
7%
19%
18%
39%
Analfabeta -4° ano
1º-5º ano completo
5º-9º ano completo
E. médio completo
(90 vítimas)
(245 vítimas)
(232 vítimas)
(502 vítimas)
17%
Superior completo
(219 vítimas)
TIPOS DE AGRESSÃO 3087 2646 2231 1867
1702
1308
A partir da análise destes dados, podemos tirar algumas conclusões:
12,5% dos casos de violência sexual foram estupros
FÍSICA 21%
1) o perfil da mulher que vem sendo atendida pela Casa da Mulher é compatível com o perfil da mulher juiz-forana; 2) esse perfil segue também a tendência do perfil nacional de mulher vítima de violência divulgado pelo instituto Datafolha em 2017, onde temos que essa mulher é jovem (70%), escolarizada (52%), rica (52%), classe A/B (49%), preta (47%) e moradora de região metropolitana (48%); 3) temos que ter o cuidado de analisar que a mulher mais vulnerabilizada socialmente (preta, analfabeta e pobre) pode não ter expressividade nos dados por simplesmente não ter acesso à informação e/ou não saber da existência da Casa.
SEXUAL 3%
PSICOLÓGICA 45% MORAL 22%
mai/13
2014
2015
2016
2017
PATRIMONIAL 9%
ago/18
A Casa da Mulher Brasileira possui programa de necessidades padrão e segue o princípio da unidade visual e arquitetônica, que tem o objetivo de constituí-la como uma referência para as mulheres de todo o Brasil.
Delegacia especializada
Apoio psicossocial
24,10%
CASA DA MULHER DE JUIZ DE FORA
DIREITOS
Acolhimento e triagem
31,55%
2013 -2018
50,5%
BRANCAS
BRANCAS
ATENDIMENTOS CASA DA MULHER - JUIZ DE FORA
Outro ganho adquirido através da Lei Maria da Penha foi a distinção dos tipos de violência contra a mulher, que passou a ser entendida em cinco formas diferentes: violência física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. E, além de dar diretrizes para a postura institucional que o profissional da DEAM e Centros de Referência devem adotar no atendimento à mulher vítima de violência, a Lei prevê que o aparato desse atendimento deve ser completo e concentrado em um único local, para evitar a revitimização da depoente.
O Brasil é o 5º país mais violento contra as mulheres no mundo, segundo dados do Mapa da Violência de 2015, que registraram uma média de 13 feminicídios por dia. A história do combate à violência de gênero por parte do Estado brasileiro começa em 1985 com a instituição das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM’s) no estado de São Paulo, programa criado pelo poder público em parceria com representantes do movimento feminista com o objetivo criar um espaço diferenciado das Delegacias comuns e com policiais capacitados no atendimento à mulher vítima de violência doméstica.
ANÁLISES COMPARATIVA: CASA DA MULHER BRASILEIRA
TAXA/100mil mulheres - 2017
492
PERFIL MULHER ASSISTIDA PELA CASA DA MULHER DE JUIZ DE FORA (01/jan/2018 à 10/julho/2018)
57,98%
A cidade, que já contava com uma Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher funcionando no mesmo prédio da Delegacia de Polícia Civil desde os anos 1990, recebeu em 2013 - por iniciativa da Secretaria de Governo do município - a implantação da Casa da Mulher, com o objetivo de atender única e exclusivamente a Lei Maria da Penha no município, é uma instituição totalmente municipalizada que teve como referência de parâmetros de funcionamento o manual da Casa da Mulher Brasileira. Desde 29 de maio de 2013, a Casa vem atendendo as mulheres vítimas de violência no município e gerando mensalmente os números do atendimentos feitos desde então. Em agosto de 2018, a Casa totalizou 12.841 atendimentos desde sua inauguração.
Aumento de 192,28% em apenas 2 anos
946
PERFIL MULHER JUIZ-FORANA
272.223mil mulheres 244.024mil homens
Juiz de Fora
FEMINICÍDIOS NO BRASIL
Em 2018, a Casa da Mulher realizou um levantamento analítico em relação aos dados da violência contra a mulher em Juiz de Fora, separando os atendimentos realizados de 01 de janeiro à 10 julho de 2018 (um universo de 1.288 vítimas, totalizando 10,03% do número total de atendimentos da Casa desde sua inauguração) por etnia, idade e escolaridade. Para efeito de comparação, colocaremos também o perfil da mulher juiz-forana segundo os dados estatísticos disponibilizados pelo IBGE:
Brinquedoteca
Promoção da autonomia econômica
Apoio psicológico
Delegacia especializada
Auxílio jurídico
Casamento comunitário
Brinquedoteca
REVID
O fluxograma das duas segue a mesma lógica de raciocínio e de funcionamento, sendo a Casa da Mulher de JF composta por uma gama menor de serviços oferecidos e de entidades públicas ligadas devido à menor proporção do programa que foi adaptado a realidade econômica da cidade
Apesar de ter estrutura organizacional, fluxogramas e padrões de funcionamento muito bem definidos, o programa da Casa da Mulher Brasileira não apresenta previsão ou diretrizes específicas de implantação do complexo no tecido urbano.
ACOLHIMENTO E TRIAGEM
RECEPÇÃO
FICHA DE ATENDIMENTO
JUSTIÇA
DELEGACIA
X
PSICOSSOCIAL
AUTONOMIA ECONÔMICA
ALOJAMENTO
X
CENTRAL DE TRANSPORTES
X X- Serviços que não são ofertados e/ou não acontecem na mesma edificação da Casa da Mulher de JF.
Enxergar essa falha faz parte de uma mudança de olhar, com enfoque em gênero, que percebe a necessidade de entender que as falhas no planejamento urbano estão diretamente ligadas aos locais de maior vulnerabilidade às mulheres (GONZAGA, 2011). A implantação correta deste equipamento, levando em consideração as especificidades do local, podem não só potencializar o uso e garantir visibilidade, mas também criar um ponto de apoio em um local de maior suscetibilidade à violência de gênero.
ANÁLISES DE SÍTIO SETORIZAÇÃO-SERVIÇOS Rua Mister
Moore
odoro
al De
arech
Rua M
Av .P es
id
en
te
Ge
tú
lfeld ua Ha
R
atista liveir
de O
LESTE
LESTE
co an Fr ar m ta te I en id
CENTRAL 0,18 vítimas/he
15% 193 vítimas
SUDESTE
OESTE
SUDESTE
0,10 vítimas/he
0,06 vítimas/he
11% 142 vítimas
SUL
SUL
Justificativas da escolha do sítio para implantação:
0,05 vítimas/he
12% 155 vítimas
Casa da Mulher
Ÿ Região central (e adjacências) em situação crítica nos indicadores
146
0
296 vítimas
0,04
0,09
0,14
0,18 vítimas/he
0
Dados: atendimentos da Casa da Mulher, janeiro-julho/2018 por região/hectare. Acesso em: 22/08/2018. Feito pela autora.
Dados: atendimentos da Casa da Mulher, janeiro-julho/2018 por região. Acesso em: 22/08/2018. Feito pela autora.
Ÿ
LEGENDA
LEGENDA
LEGENDA 0
1
10
20
30
40
50
60 vítimas
Ÿ Ÿ
Dados: atendimentos da Casa da Mulher, janeiro-julho/2018 por bairro. Acesso em: 22/08/2018. Feito pela autora.
Ÿ
da violência contra a mulher na cidade; Facilidade de acesso através do transporte público para boa parte da população que depende deste meio de transporte; Visibilidade; Previsão da ativação de uma instituição pública de funcionamento 24h no centro da cidade; Garantia do uso social da propriedade;
CONCEITO E PARTIDO
DEAM
Acolhimento 70m² Jurídico 100m² Policial 20m² Psicológico 50m² Gestão 70m²
Delegacia Juizado Defensoria Gestão
TOTAL
TOTAL
310m²
134m² 50m² 61m² 40m²
285m²
Autonomia S. multiuso 80m² S. informática 35m² Cozinha 40m² Biblioteca 35m² Auditório 100m² Gestão 50m² TOTAL
340m²
OBS.: Pré-dimensionamento considerando apenas área útil dos espaços em questão.
DIRETRIZES DE IMPLANTAÇÃO R. Braz Bernardino
R. Braz Bernardino
DIREÇÃO
EDUCAÇÃO
LIBERTAÇÃO
R. Batista de Oliveira
OPRESSÃO
R. Batista de Oliveira
ACOLHIMENTO
1) A implantação do complexo deverá considerar a facilidade de acesso primordialmente das vítimas, priorizando os acessos através do transporte coletivo e os percursos de chegada das vítimas em situação de vulnerabilidade social-econômica.
R. Braz Bernardino
R. Batista de Oliveira
COMPREENSÃO
voz
Cultura Lazer
Administração DML’s Banheiros Copas Áreas comuns Áreas convivência
PRÉ-DIMENSIONAMENTO BÁSICO
GRANBERY
CENTRAL
11% 148 vítimas
REVID Casamento Palestras
Auditório Salas multiuso S. informática Biblioteca Cozinha
Juizado espec. Vara espec. Defensoria Promotoria
0,17 vítimas/he
18,5% 238 vítimas
OESTE
idal
scar V
Rua O
Psicólogas Advogadas Policiais
Gestão
re s
ranco
0,02 vítimas/he
Delegadas Cartórios Inspetoria Medida protet. Sala B.O. Psicóloga Advogada
Assistência Autonomia e Recuperação
Av .P
NORTE
23% 296 vítimas
to
o San
spírit
Rua E
Rio B
0,04 vítimas/he
Lima
Recepção Triagem Sala B.O. Brinquedoteca
ino
o do
NORTE
rã Av. Ba
NORDESTE
9% 116 vítimas
osa
Barb
DEAM
ernard
rás B
Rua B
NORDESTE
Rua
Acolhimento
a
ita
anta R
Rua S
Va rg a
s
Rua B
ão ão Jo
Rua S
CENTRO
lio
Acesso vítima
Acesso praça Acesso autonomia
co
R. Espírito Santo
Fluxo chegada pedestres
ar
F
m
a . It v A
co
n ra
Fluxo saída veículos
R. Espírito Santo
Casa da Mulher DEAM Área pública | Jardins internos
ar
F
m
a . It v A
co
n ra
Autonomia econômica Alinhamentos
R. Espírito SantoAcesso intimado
Assistência Acolhimento DEAM | Vara | Defensoria Área pública | J. internos
ar
n ra
F
amAcesso t I . autonomia Av
Administrativo | Serviços Autonomia econômica Percursos internos
2) Escolher terrenos que estejam localizados em áreas urbanizadas dotadas de estrutura, com proximidades aos demais equipamentos necessários ao funcionamento e encaminhamento efetivo da vítima (CRAS, Secretarias de Assistência, Casas-abrigo, Creches, Hospitais...). 3) Determinar a setorização básica da seguinte forma: Casa da Mulher, DEAM e Autonomia Econômica. Os fluxos de acesso desses setores não devem confluir-se, devendo existir a possibilidade de pelo menos um acesso separado para cada um (podendo existir ligações entre eles, desde que de acesso controlado pela administração dos edifícios). 4) O acesso à Casa da Mulher deverá ser implantado de modo que localize-se próximo de vias movimentadas e com variedade de usos. 5) A Casa da Mulher deverá contar com programa básico: Sala de acolhimento Atendimento policial Atendimento jurídico Atendimento psicológico Setor administrativo Serviços 6) A DEAM deverá contar com programa básico: Recepção/espera Salas das delegadas Cartórios Inspetoria Atendimento psicológico Administrativo/Serviços 7) O setor de Autonomia econômica deverá contar com programa básico: Auditório Salas de aula gerais Salas de informática Cozinha industrial Biblioteca 8) A implantação das edificações deverá permitir, caso possível, a conformação de pátios internos para uso administrativo e praça externa para uso público. O acesso da vítima ao primeiro contato com a Casa deverá se dar através da praça, por entrada visível mas discreta, que não possibilite total visibilidade do exterior para o interior 9) A nomeação da praça pública pertencente ao espaço da Casa deverá ser feita buscando homenagear alguma mulher de relevância para a história da cidade e de importância para a luta contra a violência de gênero 9) A implantação deverá considerar e respeitar as preexistências e o entorno. 10) Deverá ser feita uma gradação da permeabilidade visual em consonância com os espaços. Os setores ligados diretamente ao atendimento e acolhimento de vítimas deve ser pouco permeável ao externo, enquanto os setores de ascensão e autonomia devem ser bastante permeáveis. 11) Os elementos arquitetônicos deverão seguir o conceito e partido definidos neste projeto.
Autoria: Mariana Alvim da Cunha