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introdução

Desde o alvorecer da humanidade que a busca se intensifica na demanda profícua do homem, consigo e com a sua espiritualidade.

Quem sou? De onde venho? Para onde vou? Por quê?

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Na nossa contemporaneidade temos um manancial de informação vivencial histórica que pode e deve ser utilizado para a construção de um mundo melhor, numa sociedade mais equilibrada, isenta de fundamentalismos e outros estados de alma, que não se sujeitam à evolução do indivíduo como tal.

A ligação com a sua espiritualidade, apesar das muitas intolerâncias, crenças e descrenças, não foi cortada, e o tempo se encarregará de consolidar a vontade e a lei do Criador, naturalmente.

O homem está só neste trabalho de Sísifo? Estará?

“A filosofia [ciência] está escrita nesse grande livro, o Universo, que está permanentemente aberto e ao alcance dos nossos olhos. Mas o livro não pode ser compreendido sem antes aprendermos a linguagem e os carateres em que está escrito. – Galileu”

É a reciprocidade uma lei criada para a humanidade?

A reciprocidade, na sua conceção, alimenta o conceito duo de recompensa vs castigo, causa e efeito, com o qual as ações do ser humano serão de fruto recompensador, com as alegrias do céu [se estas se inserirem no cumprimento das leis], ou de castigo perene, nas profundezas do inferno, se, porventura, houver prevaricação dessas mesmas leis.

O discurso poderá ser diferente conforme o orador, ou os conceitos das diversas organizações religiosas ou de cariz filosófico.

É de salientar, que o produto dessa lei, inevitavelmente, conduz ao equilíbrio do relacionamento do homem em sociedade, em que a posição do outro deve ser tomada em igualdade de circunstâncias e de direito.

Também regula, a não menos importante faceta do homem, liberdade, que o conduz ao exercício de livre opinião e, consequente tomada de decisão, logo, sujeita aos efeitos da lei pela ação do livre arbítrio.

“Entre todas as criaturas da Criação só o espírito humano tem livre-arbítrio…” (¹)

O conceito de recompensa vs castigo não se insere no equilíbrio natural da natureza, pois isso, como fator de instabilidade, não confere justeza à Vontade do Criador. Deus não castiga, a lei cumpre-se naturalmente, também não recompensa, pois o resultado do cumprimento da lei é automático, assim é!

“Aprendei a observar atentamente as correntezas nesta Criação e a utilizá-las direito, pois trazem em si a Vontade de Deus e com ela a Justiça de Deus em forma pura.” (²)

É a reciprocidade uma lei da natureza?

A natureza rege-se por leis automáticas que geram equilíbrio. Tudo o que está em dissonância é, por natureza, expelido ou sujeito à ação das leis para voltar à normalidade, não como castigo, mas fruto da ação do equilíbrio e do renascer. Isaac Newton definiu na sua 3ª lei, movimento, ação vs reação, a reciprocidade como uma lei da física [natural]: “As forças atuam sempre em duo, para toda a força de ação, existe uma força de reação.”

“Deus vos fala através de Sua Criação. Se, portanto, quereis progredir nela tendes antes que aprender a Sua Fala.” (¹)

Todas as leis que gerem os universos, aplicam-se naturalmente ao ser humano, como parte integrante do todo. Este está sujeito ao equilíbrio, indispensável, para uma boa atividade em sociedade e de harmonia com a natureza da coisa, todas as suas ações, sejam de modo físico ou psíquico, obtém pela reciprocidade e pela mesma via o resultado do querer. O ser humano é parte ativa e íntegra na natureza e não um mero espetador que de fora assiste a um espetáculo sem dele fazer parte.

O cumprimento das leis da natureza é um ato natural em si, sem imposição ou vontade do interveniente. No dia em que o homem se integrar no ciclo e cumprir, o sofrimento pelo desajustamento cessará e a alegria do bem viver será a sua atividade natural.

“Feliz daquele que pode denominar suas, muitas e tão fortes vivências, quer tenham sido de alegria ou de dor suas origens, pois essas impressões serão um dia o que de mais valioso uma alma humana levará consigo em seu caminho para o Além.” (³)

A gravidade, lei natural, é cumprida pelo homem inconscientemente, nem passa pela cabeça de alguém desafiar esta lei no cumprimento de um desejo próprio, sem que daí lhe advenha, por efeito da lei da reciprocidade, pesados danos e consequente sofrimento.

Se cumprimos as leis do homem, porque não cumprir as leis de Deus expressas na Criação?

Reciprocidade, com ou sem misericórdia?

No seguimento da lei natural, o curso da coisa conduzirá à reciprocidade pela ação, no entanto, onde se introduz a ação do homem, é certo e inevitável, a justiça é fria e cega e a injustiça o segue, desprovida de amor e misericórdia.

Foi por isso que Jesus apelou ao perdão, intrínseco ao amor, porque a lei aplicada pelo homem ou por ele explicada é carente de fundamento humanista e de clareza objetiva.

“Eis que já estás são; não peques mais, para que te não suceda alguma coisa pior.” (⁴)

Séria advertência, plena de amor, que Jesus dirigiu ao paralítico que tinha sido curado por força do amor, intrínseco à reciprocidade. Se ele perdoou, na agonia da crucificação, que direito tem o homem de levantar a mão e apontar o dedo ao outro, gesto acusador e reprovador, ou em indiferença olhar para o lado e descansar que a ação da reciprocidade colhe os seus frutos?

“Por isso clamo para vós mais uma vez, advertindo: vivenciai o sofrimento do próximo! (…) Sem um verdadeiro vivenciar não há amadurecimento espiritual! Obrigai-vos por isso, com toda a força para o vivenciar! Familiarizai-vos com a penúria e os sofrimentos alheios, e despertai dessa forma em vós a misericórdia.” (⁵)

Só é sujeito ao perdão o que está em falta [fruto da ação do livre arbítrio] e este mereceo, independentemente do seu estado emocional ou de rejeição, é dever intrínseco do ser humano perdoar, se se quer libertar dos liames que o prendem, pelas muitas vivências relacionais, à matéria.

É certo que as leis da natureza, automáticas e perfeitas, não estão sujeitas ao relacionamento humano, ao seu entendimento, mas sim a um poder maior de condução e atuação.

O relacionamento humano induz a lei a funcionar e é a sua condução que conduz o desfecho sobre si, seja ele qual for!

Neste caminho de remissão e criação de culpa onde começa a fronteira da reciprocidade e a da injustiça, porque até o prevaricador é vítima.

(¹) Dissertação: A Fala do Senhor – Mensagem do Graal, I vol

(²) Dissertação: Enrijecimento – Mensagem do Graal, I vol

(³) Dissertação: Era uma vez…! – Mensagem do Graal, I vol

(⁴) S. João, 5-14

(⁵) Páscoa 1932, O que a humanidade perdeu de Abdruschin

Falar da encarnação do ser humano condiciona o conhecimento do mundo de matéria fina, pois o ser humano em carne e sangue é posto como elo de ligação favorecedor entre a parte da Criação de matéria fina e a de matéria grosseira, enquanto suas raízes permanecem no espiritual. “Deus criou o ser humano segundo a Sua imagem!”

Abdruschin

“Nascemos com o conhecimento das vidas anteriores. Mas vem um anjo e mandanos guardar segredo disso. Depois põe-nos o dedo nos lábios e nós esquecemo-nos de tudo para poder entrar na vida.

O toque do anjo deixa aquele sulco entre o lábio de cima e a base do nosso nariz. Só então soltamos o nosso primeiro choro.

- Lenda talmúdica”

Momento feliz! A mãe embevecida olha para a pequena figura, de rosto cerrado pelo esforço do primeiro choro, esquecendo as dores do momento e flutuando na etérea felicidade do estado maternal. O seu legado à vida!

Uma nova vida para continuidade de um ciclo de nascimento e morte, repetido enquanto o mundo for mundo, cimentado no acervo espiritual, experiência após experiência, vida após vida, sequencial ao evoluir da natureza, estação após estação. Seguimos o fluir, qual corrente de rio murmurante no seu caminho para o mar.

Lendas povoam o imaginário profícuo do ser, desde tempos imemoriais, como património de um conhecimento experimentado. Umas belas e com sentido pedagógico, outras tantas, fantasistas e com sentido confuso.

Desde sempre as mensagens, sobre acontecimentos cósmicos e tudo o que se relaciona com a natureza, foram transmitidas por quadros exemplificativos que transmitiam o conhecimento sobre o acontecimento.

Os gregos, e outros povos da antiguidade, criaram sobre esses quadros exemplificativos, histórias que passaram para as gerações futuras como Mitologia, [religião estruturada, politeísmo, panteão de deuses, cada um com a sua missão de atuação padronizada, governados por um deus supremo no cumprimento das leis universais] mitos e lendas com valor sociológico.

Povos, como os gregos, que nos transmitiram valores civilizacionais e culturais, que ainda hoje perduram e servem de modelo ao pensamento ocidental, na filosofia e organização social têm, certamente, mais do que relatos fantásticos de relação divinohumana para emoldurar a sua religião e mitologia.

“Não deve ser difícil àquele que pensa e perscruta, encontrar nas antigas doutrinas de deuses algo mais do que apenas lendas de deuses. Há-de ver até nitidamente o fenómeno real!”

Um dos mitos, Trabalho de Sísifo, é bem um exemplo, a par de outros, do valor sociológico que nos transmitem.

Trabalho de Sísifo:

“Sísifo foi condenado, por toda a eternidade, a rolar uma grande pedra até o cume de uma montanha, sendo que toda a vez que ele estava quase a alcançar o topo, a pedra rolava novamente montanha abaixo até o ponto de partida por meio de uma força irresistível, invalidando completamente o duro esforço despendido e o ciclo repetia-se.”

A expressão "trabalho de Sísifo", é interpretada para exemplificar qualquer tarefa que envolva esforços longos, repetitivos e inevitavelmente fadados ao fracasso [algo como um infinito ciclo de esforços que, além de nunca levarem a nada útil ou proveitoso, também são totalmente desprovidos de quaisquer opções de desistência ou recusa em fazê-lo] e, ou repetição de erros sujeitos à causalidade num ciclo repetitivo até o fechar pela correção do erro.

O nascimento do ser humano está envolto em conceções perdidas na neblina do tempo, o que dá azo a interpretações, tanto mais próximas da nossa materialidade, quanto afastadas da espiritualidade.

E, no entanto, neste imenso espaço cósmico, gerido por leis automáticas e estudadas, exaustivamente, pela ciência, ocupamos o nosso lugar sujeitos a essas mesmas leis, desígnio que os deuses cumprem e os humanos se esforçam por cumprir, no ciclo das reencarnações [saber milenar que os ocidentais expurgaram da sua vivencialidade], a que o anjo nos pede para guardar segredo.

“O ponto mais inferior do espiritual é, na maturidade, semelhante ao ponto mais alto do enteal situado abaixo dele. Só é possível uma ligação nesse ponto exato de encontro. E como a matéria em seu desenvolvimento sempre se movimenta na grande circular orbital, no germinar, florescer, amadurecer e decompor pelo superamadurecimento, enquanto o espiritual se acha acima dela, esse processo só pode ocorrer sempre num bem determinado ponto, em ligação inflamadora durante a passagem rotatória da matéria. Uma fecundação espiritual da matéria que lhe vem ao encontro, preparada para isso através da atuação do enteal.

Tendo uma parte do Universo, em sua rotação, ultrapassado esse ponto, cessa então para ela a possibilidade de fecundação espiritual por germes espirituais, enquanto a que se lhe segue se coloca em seu lugar, iniciando-se para aquela, porém, uma nova fase em que os espíritos em amadurecimento podem entrar, e assim por diante.”

A nossa ciência cosmológica abrange o alcance de uma vista [enorme para o conhecimento humano, um pulsar na imensidão do Universo] tocando uma área sensível para os cientistas, o Criador! A vida repete-se em cada degrau da Criação, no mesmo sentido e beleza, as mesmas leis e organização, separadas pela constituição da estrutura da matéria, formando um todo uniforme, nada está separado, antes uniformizado e ligado. No dia em que a ciência se aventurar para além do big bang, então, terá que admitir o Criador!

Assim como a flor desabrocha na primavera e fenece no outono, repetindo o ciclo, também o primeiro choro é o desabrochar do ser, que ao longo de uma vida fenecerá no seu outono para um novo ciclo.

O primeiro choro. Documentário memorável sobre a celebração da vida. Realização e argumento: Gilles de Maistre

Dissertação: Deuses-Olimpo-Valhala, Mensagem do Graal, volume II.

“Deixai, ó vós que entrais, toda a esperança! - Dante”

Um homem chora e grande é o seu sofrimento, acontecimentos que ultrapassam as convenções sociais, erguidas ao longo do tempo, marcando gerações em gerações. A espiritualidade não se acomoda a convenções ou outros estados de alma, de nível material e convenientes, mas tão só vibra no sentido da lei. Diz-se em voz corrente, expressão dos fortes, “dos fracos não reza a História”, é verdade, mas não reza no sentido individual, reza no sentido coletivo, lembrando nos seus registos de memória acontecimentos que recordados deveriam evitar a repetição (¹).

Apesar de tudo, e de estar bem documentada, a humanidade pouco ou nada alterou o seu comportamento, que continua a orientar-se pelos mais baixos instintos de espécie primária, adaptados a um meio de sobrevivência selvática.

A História dos homens regista os grandes feitos individuais, lembra os seus nomes, mesmo pelas piores razões; eles marcaram a sua época e deixaram atrás de si um caminho cuja lembrança, muitos querem esquecer e outros lembrar na ignomínia. Perante tal cenário, choram as mulheres de Atenas e um homem também chora.

“Mostrei-lhe a gente, que por má padece; mostrar-lhe intento os que ora estão purgando pecados no lugar que te obedece. - Dante”

Sobressai neste teatro negro, nomes que brilham e engrandecem a perseverança e a misericórdia ⁽²⁾, cultivando valores que, adotados, fariam engrandecer o homem e o seu semelhante ⁽³⁾ , numa ascensão universal.

E onde os desafortunados e oprimidos labutam, sujeitos aos caprichos dos mandadores sem lei, e a leis mais elevadas, brilham crepúsculos cintilantes de indivíduos, que pela sua cultura altruísta, constroem pontes que ligam a misericórdia ao auxílio prestimoso e ao discernimento lúcido da verdadeira atuação pelo equilíbrio necessário ⁽⁴⁾ . São atitudes refrescantes num meio desprovido da dignidade, devida ao ser humano, estabelecido pela carta das Nações Unidas, símbolo de uma sociedade que se deseja construída no valor e respeito pelos direitos humanos. Escreve Abdruschin ⁽⁵⁾:

“Todos vós em conjunto dependeis da Terra. Cada qual tem aqui direito de atuar e desenvolver-se. Não só direito, como também sagrado dever! Não um em baixo do outro, mas um ao lado do outro. Prestai atenção aos sons. Cada som é indizível, permanece sozinho, não se deixa confundir. Somente no lugar certo, ao lado de sons de tonalidades diferentes, resultará a harmonia, dando melodia.”

O ser humano esqueceu-se de olhar para o lado, onde está o seu próximo, e segue ufano no consolo dos direitos adquiridos, como se tal fosse o único objetivo de sua vivência, oprimindo pela sua atuação egoística povos inteiros e degradando relações levando-as à exaustão da decadência e sofrimento:

“Aquele que estiver vivendo na riqueza ou mesmo em posição de liderança, deve servir-se daquilo que experimentara na vida, como advertência para que administre acertadamente tudo isso, no sentido das leis divinas, a fim de que resulte em benefícios para os seus semelhantes e não faça seguir mais uma vez o caminho em declive, que forçosamente terá de ligá-lo à futura existência de sofrimentos nesta Terra, mas sim o deve elevar pela gratidão daqueles que, graças à sua atividade, puderam encontrar paz e felicidade.” ⁽⁵⁾

“À glória de quem tudo, aos seus acenos, move, o mundo penetra e resplandece, em umas partes mais em outra menos. - Dante”

O homem deveria centrar a sua busca em dois valores intrínsecos: Humanismo, no respeito pelos valores e dignidade do homem, centro fulcral do universo e polinizador de mundos, capaz dos maiores feitos de abnegação e suporte de sociedades equilibradas no respeito pela diferença, “liberdade, Igualdade, Fraternidade”. Amor ao próximo, regra básica e orientativa de convivência sã. Inverter valores obsoletos e egoísticos que têm sido sustentáculo das ações humanas e criar a mudança, mudança de atitude e comportamento.

Conhecimento, a cultura alivia a carga do obscurantismo e auxilia o homem a progredir material e espiritualmente, por experiência vivencial, pesquisa e enquadramento do ser nas leis cósmicas, das quais faz parte e está sujeito, para seu desenvolvimento e felicidade. Uma sociedade é limpa se for culta, cívica, respeitadora da lei e equitativa.

Consulta bibliográfica:

⁽*⁾ Drama vivido no período da II Grande Guerra; perseguição das minorias. [Realizador: Sally Potter, 2000. Filme]

⁽¹⁾ Abusos e barbaridades que não deveriam ser esquecidos tão depressa, mas que se devia fazer voltar à memória como advertência, sempre de novo…

[Na Luz da Verdade-Mensagem do Graal, dissertação Conceito humano e Vontade de Deus na lei da reciprocidade – volume II]

⁽²⁾ Mas a sabedoria que do Alto vem é, primeiramente, pura, depois, pacifica, moderada, tratável, cheia de misericórdia e de bons frutos, sem parcialidade, e sem hipocrisia. Ora o fruto da justiça semeia-se na paz, para os que exercitam a paz.

[Bíblia, Tiago:3, 17-18]

⁽³⁾ Ouvistes que foi dito: amarás o teu próximo e aborrecerás o teu inimigo.

Eu, porém, vos digo; Amai os vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem;

[Sermão da Montanha; Mateus: 5, 43, 44]

⁽⁴⁾ Por toda a parte a harmonia é a única coisa certa. E unicamente o caminho do meio proporciona harmonia em tudo.

[Mensagem do Graal, Dissertação Aprendizado do ocultismo, alimentação de carne ou alimentação vegetal -Vol. II]

⁽⁵⁾ Autor da obra Na Luz da Verdade – Mensagem do Graal

Abdruschin

A Europa, democrática e solidária, geme sob os lamentos de Ophelia, sufocados pelo grito indignado dos injustiçados, tiranizados pelo jugo cego e egocêntrico de um liberalismo económico, carrasco do espírito social, que construiu e uniu uma Europa tirana e devastada, numa Europa moderna e social. Com o tempo que muda, também muda a humana vontade, alimentando valores ancestrais, nem sempre dignos, mas repetindo-se num ciclo vicioso, em que a experiência serve para aprimorar o que de mau foi feito para mau continuar. Os sistemas mudam, a indigência espiritual e humana mantém-se, e o ciclo da história repete-se, não nas mesmas ações, mas nos efeitos.

Assim são os ciclos económicos e os sistemas que os sustentam, erros do passado a repetirem-se numa espiral estratificada na aspereza do comportamento humano, que a tudo corrói e conduz para a destruição.

O homem é prisioneiro do sistema, organizado ao pormenor, qualquer ato de liberdade está sujeito aos parâmetros da sua lei, enredado no turbilhão do consumismo e dependência, gerador de desperdício e angústia, em verdade, o homem vive infeliz. Quem é dependente não é livre e a sociedade, através do sistema, criou essa dependência, retirando ao indivíduo a dignidade do trabalho participativo e criando o estatuto de trabalho automatizado, esforçado e obediente, autómatos numa linha de produção sistemática e repetitiva, descartável e numerada. O olhar não contempla o horizonte na busca do sonho, mas sim o vazio cinzento, nublado, num mar de incertezas e sem porto de abrigo à vista. Quem não é verdadeiramente livre, não é feliz; mas liberdade pressupõe responsabilidade e olhar altruísta para com o outro, um sopro de espiritualidade e infinidade.

O legado da Europa ao mundo deveria aprimorar-se para benefício e exemplo de uma humanidade sedenta de valores espirituais e civilizacionais; as eras que personificam o pensamento filosófico mudam ao sabor da necessidade do conhecimento, da intrínseca humanização do meio natural, na pacificação da ciência com a espiritualidade, ciclos que catapultam o homem para o cumprimento do seu destino. O planeta reage aos flagelos que a raça humana lhe inflige, o avanço urbano e demográfico, assinatura indelével de progresso, rodeado de bairros indigentes, sufocam o espaço vital das espécies autóctones, criando uma convivência perigosa para estes, já que o predador humano progressista, senhor de recursos que o outro animal não tem, sai sempre a ganhar, de vítima passa a assassino num ápice.

A poluição, a pesca intensiva e selvagem, alimento para uma indústria ávida de produto, desequilibra as espécies e cria devastação nos oceanos e seus recursos marinhos.

Salvem os oceanos!

A necessidade de alimentar tantas bocas e o sistema, criaram uma agricultura e pecuária, intensiva e reclamadora de espaço vital, de uma indústria transformadora e tecnológica altamente eficiente, tudo preparado para satisfazer os desejos de classes abastadas e criar anseio nos desvalidos. Os novelos de fumo negro e tóxico são expelidos para a atmosfera como símbolo da inteligência humana, os altos edifícios apontam aos céus os seus dedos ameaçadores, qual torre de Babel que no mundo antigo fez história, numa atitude grotesca de vaidade e soberba.

Salvem o planeta!

A política não se comove e, em nome de valores democráticos, [os antigos gregos surpreender-se-iam deste estado de coisas com o nome democracia, que eles criaram, exatamente para que o exercício da convivência pudesse ser mais equilibrado] zurzem impostos e outras taxas para o contribuinte pagar os desvarios orçamentais que eles, políticos, no passado criaram, por motivos eleitoralistas, satisfação de clientelas, corrupção, oportunismos e também incompetência. Nada de novo, pois já na república romana estes desvairados cresciam como cogumelos, venenosos e dignos de cuidados. Salvem a política!

“A origem de todo o mal provém da propriedade privada” ⁽¹⁾ , nem tanto, mas também. A posse jaz ancorada na espiritualidade humana, personifica o egoísmo, que devidamente equilibrado torna-se fruto de desenvolvimento e progresso, sustentável numa sociedade partilhada e humanista. Não é o que se passa! O anseio pelo poder e o domínio sobre o seu semelhante, leva ao desequilíbrio relacional criando eventos de tensões que descambam, mais tarde ou mais cedo, em episódios violentos e fraturantes criando épocas negras no livro do legado da História.

“Liberdade, Igualdade, Fraternidade” ⁽²⁾ , um anseio genuíno no coração de muitos, conspurcado pelo sibilar da vingança e atos menos próprios da dignidade humana, por outros. Um sopro refrescante numa sociedade balofa e desumanizada, onde o conceito de amor ao próximo se lia nos templos de maneira metódica e sem alma, como mero exercício do dever e espírito de resignação, mas arredado dos círculos nobres e burgueses, cujo olhar se focava para dentro, onde a abundância se sentava à mesa do rei.

“Considerando afinal que tudo, mas tudo mesmo, só fora erigido sobre o dinheiro, sobre o poder e os valores terrenos, chegar-se-á à conclusão de que a miséria atual nada tem de surpreendente e que o atual desmoronamento está condicionado pelas próprias leis da Criação!” ⁽³⁾

“Nem só de pão vive o homem” ⁽⁴⁾ , mas numa sociedade equitativa, em que o pão que alimenta o corpo é também o pão que alimenta a alma. A persecução da espiritualidade é uma necessidade ancestral do homem, desde o seu estado primitivo ao seu estado de intelectualidade contemporânea.

A ciência não se desassocia dessa ligação e procura-a, afincadamente, no seu pesquisar, e vão-se desenrolando os mistérios e o desconhecido, dando voz às leis naturais, como elo unificador do universo, resplandecentes no seu atuar, “a formação de todos os sistemas ordenados são contingência da vontade de Deus”⁵, demanda cósmica absorvida pelo anseio do homem de encontrar o caminho que o leva a entender a obra e a sua origem, “se as outras estrelas são o centro de outros sistemas como o nosso, tendo sido formados de acordo com o sábio conselho, devem estar todos sujeitos ao domínio do Uno.” ⁽⁵⁾

O pensamento racional e lógico a fazer a ponte para a espiritualidade, libertado de dogmas e conceitos religiosos que danificaram a imagem do ser e o libertaram para uma nova época.

“Assim, pois, é incompleta a atividade de um cérebro, essa pedra fundamental e instrumento da ciência; e essa limitação se faz sentir logicamente também através das obras que constrói, isto é, através de todas as ciências. Por conseguinte, a ciência é útil como complemento, para uma compreensão melhor, para subdividir e classificar tudo quanto ela recebe pronto da força criadora precedente, tendo, porém, que malograr incondicionalmente, se pretender se arrogar a guia ou crítica, enquanto se prender, como até agora, tão firmemente ao raciocínio, isto é, à faculdade de compreensão do cérebro.”

Numa sociedade altamente complexa, dinamizada e gerida pelo comportamento humano, a mudança nunca se fará de livre vontade, algures, o ciclo vicioso [ação, culpa, remissão] deverá ser quebrado e o equilíbrio restabelecido; enquanto a chama da fogueira se mantiver acesa, o homem anseia, o homem sonha. Senhor, falta cumprir-se a hora.

Perseguir o sonho no horizonte não é loucura, é caminhar pela eternidade!

⁽¹⁾ Jean-Jacques Rousseau

⁽²⁾ Revolução francesa

⁽³⁾ Abdruschin

⁽⁴⁾ Jesus

⁽⁵⁾ Isaac Newton

Eis que o semeador saiu a semear.

E, quando semeava, uma parte da semente caiu ao pé do caminho, e vieram as aves, e comeram-na; e outra parte caiu em pedregais, onde não havia terra bastante, e logo nasceu, porque não tinha terra funda; mas, vindo o sol, queimou-se, e secou-se, porque não tinha raiz. E outra caiu entre espinhos, e os espinhos cresceram, e sufocaram-na. E outra caiu em boa terra, e deu fruto: um a cem, outro a sessenta, e outro a trinta. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.

Jesus [Mateus 13, 3-9]

Os valores humanos não se medem pelas ações e comportamento de uma vida ⁽¹⁾ . Pessoas frívolas e com baixo índice de cultura cívica podem dar exemplos de abnegação e amor ao próximo, que muitos que praticam os bons costumes e se impõem regras de conduta não seriam capazes em tempos de guerra e outras calamidades, teatros humanos onde se despem os preconceitos e outros artifícios comportamentais; a nu está o ser humano diante da realidade efetiva! O comportamento humano é imprevisível e, por consequência, insondável, ele contém o fruto do universo, a espiritualidade, que germina nos campos da materialidade por onde peregrina ⁽²⁾, com seus afetos, criadores de emoções e sentimentos, conflitualidades inerentes ao desempenho do livre-arbítrio, misto de progresso e evolução na boa vontade, tão só, assim deveria ser! ⁽³⁾ .

A história tem exemplos aterradores de genocídios que mancharam a mácula da espiritualidade humana [e não são poucos], relegaram o homem para o nível mais baixo da Criação e viceja em campo escuro, alimentando cada vez mais esse ensejo. Nem só de pão vive o homem, mas também do alimento para a alma que o lançará para fora do lodaçal onde se envolveu, tão logo seja capaz de se livrar dos muitos liames que ainda o sufocam em questiúnculas e atitudes meramente intelectivas, imbuídas de falsa espiritualidade, hipocrisia farisaica, que domina e esconde no seu colo o sono de Morfeu, com face beatífica e atitude repousante.

Diante de situações de verdadeiro sofrimento humano, sobrepujam-se aqueles que, pela sua vida difícil e mundana [ou fácil, também os há], poderiam passar incólumes, já que a experiência da vida assim os ensinou, no entanto, detêm-se ante a dor e a necessidade de auxílio do seu próximo e agiganta-se no seu íntimo o que de mais belo têm, a espiritualidade altruísta. São estes exemplos que a história da humanidade não regista, acabam por se perder na voragem das calamidades e dos muitos martírios humanos, exemplos anónimos que valem mais do que muitas flores bem-nascidas, a que a vida reservou um berço dourado, não souberam ou não quiseram, pelo facto de terem merecido uma graça, aproveitar o seu património espiritual para auxílio e amparo do seu próximo; porque assim o Senhor clama pela misericórdia, que na consumação da lei da Reciprocidade alivia a dor e dá alento para uma nova vida a quem em verdade o ansiar, chamas bruxuleantes que brilham no caos escuro da ignomínia humana, onde tantos outros se perdem ⁽⁴⁾ .

A análise histórica ao passado do património e legado da humanidade não nos deixa dúvida quanto ao comportamento passado e futuro da mesma, já que os sentimentos e afetos prevalecem na alma humana, num misto de ansiedade e prossecução de objetivos.

É este o nosso valor e é este o nosso porvir, cumprir o destino que Deus fez num ciclo eterno de fazer e desfazer de ações e comportamentos, até que, cumprida a peregrinação sejamos absorvidos à vida eterna num misto de nirvana que nos acalentará a espiritualidade de eternidade em eternidade, em evolução permanente. Não é fácil contextualizar a sociedade humana numa simbiose de progresso e sustentabilidade, se a evolução espiritual e boa vontade assim não o entenderem. Enquanto o individuo mantiver e alimentar a sua complexa espiritualidade em desequilíbrio, jamais o altruísmo poderá exercer o papel que lhe cabe no atuar humano na compensação do egoísmo.

“A existência terrena deve ser realmente vivenciada, se é que deva ter uma finalidade. Somente o que for experimentado no íntimo de modo vivencial em todos seus altos e baixos, quer dizer, sentido intuitivamente, torna-se algo próprio ⁽⁵⁾.”

Consulta bibliográfica:

* Invasão da China pelo Japão em 1937; o massacre de Nanquim. [Realizador: Zhang Yimou, 2011. Filme]

⁽¹⁾ Essa livre resolução precedeu cada ação de retorno, portanto, cada destino! Com cada querer inicial o ser humano produziu e criou algo, no qual ele mesmo, mais tarde, em prazo curto ou longo, terá que viver. É, no entanto, muito variável quando isso ocorrerá. Pode ser ainda na mesma existência terrena em que teve início esse primeiro querer, assim como também pode ser depois de despir o invólucro de matéria grosseira, já, portanto no mundo de matéria fina, ou então ainda mais tarde, novamente numa existência terrena na matéria grosseira.

Dissertação O Destino - Mensagem do Graal, vol. II

⁽²⁾ Parábola do semeador: Mateus 13, 1-23

⁽³⁾ Cada intuição forma imediatamente uma imagem. Nessa formação de imagem participa o cerebelo, que deve ser a ponte para domínio do corpo. É aquela parte do cérebro que vos transmite o sonho. Essa parte se acha por sua vez em ligação com o cérebro anterior, de cuja atividade se originam os pensamentos, mais ligados ao espaço e ao tempo, e dos quais, por fim, é composto o raciocínio!

Dissertação Intuição – Mensagem do Graal, vol. II

⁽⁴⁾ Muitos se assustam com isso e temem aquilo que segundo essas leis ainda têm que esperar de outrora, nos efeitos retroativos. No entanto, são preocupações desnecessárias para aqueles que levam a sério a boa vontade, pois nessas leis automáticas reside também ao mesmo tempo a segura garantia da graça e do perdão!

Dissertação Destino – Mensagem do Graal, vol. II

⁽⁵⁾ Dissertação O Mistério do Nascimento – Mensagem do Graal, vol. II

A realidade é séria e inexorável. Os desejos humanos não podem, a tal respeito, provocar alterações de espécie alguma. Férrea se mantém a lei: “Aquilo que o ser humano semeia, colherá multiplicadamente!”

Abdruschin

Dois milénios de história condicionaram a humana vontade na sua evolução comportamental e civilizacional. Anseios que a história registou em clamores débeis dos desvalidos e gritos desvairados dos poderosos numa simbiose egocêntrica de evolução cultural e espiritual.

Apesar de tudo o homem evoluiu no pensamento, iluminou-se no conhecimento, desbravou o oceano largo e a sua capacidade neural, saiu da época das trevas para a época das luzes, agigantou-se na sua formação… e manteve-se em desequilíbrio!

Entranhámo-nos na Era da Religião desfiando as contas de um rosário de atitudes beatíficas, condicionámos o conhecimento e a ciência em prol da condução das almas para o caminho da construção do Reino de Deus na Terra; numa mão a espada, na outra o livro sagrado, evangelizamos povos para sustento da nossa visão religiosa e dos nossos desejos e anseios, sempre no cumprimento do dever e em boa vontade. Tornaram-se poderosas as organizações eclesiásticas deste e do outro lado, moldaramse civilizações e povos, nasceram impérios, a Terra ficou mais pequena na proximidade humana. A intolerância, em nome de uma causa justa, sentou-se no trono da ignomínia e reinou.

Mas a humanidade não se conformou e as grilhetas da história rebentaram. A Era da Razão nasceu, opulenta no seu conhecimento e filosofias e os protagonistas de outrora foram relegados para plano secundário, minimizados e com novo olhar para os novos tempos, perseguidos, mas não derrotados.

Vibra a Razão, o conhecimento, a intelectualidade, a ciência faz escola nos laboratórios, a filosofia floresce, a economia desponta em novos preceitos liberais, a tudo a luz da Razão ilumina: “Liberdade, Igualdade, Fraternidade”. Onde fica a espiritualidade?

Este grito de esperança desvanecer-se-á lentamente nas filosofias do iluminismo, liberalismo, socialismo, que não tiveram a capacidade de construir uma sociedade equilibrada para sustento do homem entre a religião e a ciência; castraram a espiritualidade do homem em nome da Razão, liberalizaram a economia em nome do progresso, socializaram em nome da igualdade, e o que resta hoje dos anseios filosóficos dos visionários do passado, prenhes de esperança e utopia?

Uma sociedade tecnologicamente evoluída e frágil, uma economia relegada ao lucro excessivo e ao poder, cheia de desperdício, um brutal atentado à natureza para satisfação de anseios egocêntricos e uma classe dirigente igual à que tinha sido destronada em nome da liberdade, da igualdade e fraternidade.

A transparência ficou ofuscada pela opacidade do ser humano intelectualizado e desprovido de espiritualidade.

Se a Era da Religião não ajudou a humanidade a encontrar o caminho do equilíbrio e bem-aventurança do homem em sociedade, tão pouco o conseguiu a Era da Razão.

A obscuridade espiritual continua o seu penoso caminho arrastando as grilhetas da sua vontade…

Dois mil anos se passaram, duas eras emolduraram a humanidade e o seu anseio de construir uma sociedade justa e equilibrada.

Virá a Era da Espiritualidade e o anseio do homem, experimentado com as suas ações do passado como património inalienável, tomará nova forma e brilhará qual farol em noite tempestuosa.

“O passado foi religioso e anticientífico; o presente é científico e antirreligioso; o futuro será religioso e científico.” ⁽¹⁾

Não se tornarão vãos e vazios de sentimento e ação os pensamentos profundos que nos conduzem ao equilíbrio, “o que semeares colherás”, “ama o teu próximo como a ti mesmo” e tantas outras asseverações que nos dias de hoje são badaladas frequentemente, sem emoção, de modo intelectivo e oportuno.

O respeito pelo meio ambiente, o trabalho em prol da comunidade, a educação cívica e intelectual, não serão uma imposição por força de lei ou de práticas egocêntricas, mas um atuar de modo natural, quão natural é o correr da vida.

O homem não pode ser separado da sua espiritualidade por filosofias religiosas ou liberais, é integrante do eu, é ele como ser espiritual que peregrina nas planícies na procura incessante do seu destino, no cumprimento do Graal!

Uma nova realidade, uma nova geração, uma nova era.

” Não está longe a hora em que os seres humanos terão que reconhecer que não será difícil viver de maneira diversa de até agora, conviver em paz com o próximo! O ser humano tornar-se-á lúcido porque lhe será tirada por Deus toda a possibilidade do atuar e do pensar errado de até agora.” ⁽²⁾

Eras foram, eras virão… e o ciclo do homem cumprir-se-á na Lei e na Vontade! ⁽¹⁾ Ernest Renan ⁽²⁾ Dissertação “Vê o que te é útil” – Mensagem do Graal, vol III

“ Enquanto houver sobre a Terra alguém que procure levantar o Céu, quer dizer, implantar um pouco de bondade e de beleza sobre a Terra, restabelecer equilíbrios, perdoar ofensas, respeitar o “Céu”, renunciar ao poder, plantar uma árvore e regá-la todos os dias, vibrar com uma cantata de Bach, arriscar a vida para matar a fome a alguém, comover-se com o riso de uma criança, sentir-se interpelado pelo mistério de Jesus Cristo no Getsémani como Aquele que carrega os pecados do mundo – enquanto houver alguém que teime em entregar-se à Vida, sem pensar em si mesmo, mas tendo em mente os seus semelhantes – não é insensato manter a esperança. “

José Mattoso

Enquanto houver esperança, o ser humano dará mais um passo na longa jornada, que é a sua vivência experiencial, no sentido da vida individual e nos equilíbrios da vida em comum.

Um manto de névoa cobre a sociedade dos homens na época atual, nada de extraordinário, já que, em tempos idos, outras épocas de nevoeiro obscureceram a nossa visão humanista e o sofrimento se abateu sobre nós; no histórico da sabedoria popular, podemos usufruir do seu património cultural e educacional, “não há mal que sempre dure nem bem que não acabe”. Sabemos ser fortes diante das muitas adversidades com que a vida nos contempla, dos muitos sofrimentos que nos afligem, das injustiças com que nos deparamos, perante situações verdadeiramente complexas, doenças, calamidades, guerras, pobreza e um rosário de outras aflições…

“No dia em que eu clamei, escutaste-me; alentaste-me, fortalecendo a minha alma.”

[Salmos 138 – 3]

A viragem do século trouxe um (des) ajustamento aos fatores socioeconómicos criando estados de tensão, suscetíveis na mudança; mudam-se os tempos, mudam-se as vontades.

A globalização dos mercados e o seu enquadramento a nível social e produtivo acentuou a fraqueza de regiões, antes prósperas e agora em crise, e o crescimento de outras, antes pobres e agora prósperas, mas não eliminou a fome, o empobrecimento e o sofrimento inerente, os fatores sociais são ajustados ao ritmo de políticas liberais e egocêntricas com a premissa de que só os capazes podem evoluir no sistema, os outros… são sustentáveis.

Qualquer mudança traz consigo o bloqueio do novo, os poderes instituídos movimentam-se no sentido de não permitir alterações ao seu status quo, só o tempo e a perseverança poderão permitir a mudança, sem violência, do velho para o novo sistema; as alterações climáticas, o controlo dos bens naturais, tal como a água e o petróleo, o controlo financeiro do dinheiro, a má repartição da riqueza, a degradação do ambiente, a violência organizada, tais são os pontos de conflito latente no milénio que ainda agora começou. As assimetrias entre povos e no próprio povo geram conflitualidades que nos conduzirão a um quadro de instabilidade social que a qualquer momento pode explodir em caos incontrolável.

As medidas de ajustamento orçamental na governação e adaptação aos novos desafios levam a criar ondas de pobreza entre os desvalidos que do pouco que têm muito lhes é tirado.

E os senhores do mundo, acantonados nos seus sistemas de gestão, analisam situações de recurso para este quadro, a fim de manter os contribuintes em estado socialmente aceitável e estável, até lá, a ignomínia permanece.

Entretanto, os senhores da política e finanças fazem os seus jogos de poder e domínio, que em tempo levaram os países ao estado em que agora se encontram, e o povo paga os desvarios dos poderosos, ontem e hoje, e o futuro?

Valerá a pena perguntar pelo futuro?

Certamente que sim, porque há esperança… e onde houver equilíbrio será restabelecida a paz e o progresso no cumprimento do dever e cultivo da beleza!

“O fruto do justo é árvore de vida, e o que ganha almas, sábio é. Eis que o justo é punido na Terra; quanto mais o ímpio e o pecador.”

[Provérbios 11-30,31]

O quadro que se depara à humanidade não tem cores bonitas, estão empalecidas pela ação do tempo, tempo apocalítico, não no sentido escatológico, mas na realidade dos acontecimentos!

Perante este quadro, sentimo-nos frágeis e abandonados, injustiçados e duvidosos... A sustentabilidade do sistema político, económico e social, deve introduzir uma nova variável na equação, o altruísmo, e o valor x, como resultado, certamente será diferente, mais equitativo e equilibrado, enquadrado nos parâmetros das leis naturais que só dando se pode receber.

No olhar de uma criança, descobrimos o futuro e sentimos esperança; ao passar a invernia, descobre-se o desabrochar da natureza e o sol brilha mais quente, sentimos esperança; no consolo do nosso semelhante, companheiro de aflição e alegrias, sentimos esperança…

Enquanto o sol raiar no horizonte, dia após dia… dia após dia sentiremos a esperança de um novo começo, de um novo dia.

“Olhai para os lírios do campo, como eles crescem: não trabalham, nem fiam; e eu vos digo que, nem mesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles. “

[Jesus]

Enquanto o homem peregrinar nas planícies da matéria com o olhar no céu, haverá esperança… e o horizonte será a meta!

“De crise em crise a Humanidade evolui e faz História!” deuses ou enteais? mito ou realidade?

O homem, por força da sua natureza, é um ser sociável, a liberdade, fruto do livre arbítrio, é a ferramenta certa para a sua evolução como ser criativo, nas artes, nas ciências, na política… a livre expressão e o caudal do pensamento permitem que o homem evolua no Conhecimento.

A espiritualidade molda o comportamento primário e aprimora-o no sentido da sensibilidade e refinamento do trato, é uma conjugação importante que define o estado do ser, a espiritualidade e o raciocínio como um todo, atuando em benefício e equilíbrio, assim fomos criados, assim seremos até ao fim dos tempos, no cumprimento da Vontade do Altíssimo.

A sobreposição de um destes estados, espiritual e material, em relação ao outro, traz consequências trágicas fruto do desequilíbrio implantado, criando sociedades totalitárias e fundamentalistas, amordaçando a livre expressão individual, seja na política ou na religião. O raciocínio frio passa a dominar, o egoísmo toma contornos epidémicos, as ações de domínio, a falta de respeito pela dignidade humana e a hipocrisia dominante de quem, “de barriga cheia, fala moralmente sobre a fome!”.

As sociedades constroem-se com modelos políticos e económicos baseados na produção e consumo, capital e trabalho, numa relação conflituosa e desequilibrada, riqueza em excesso para uns, controlo de ganhos para outros, miséria e incerteza para a maioria. Manipulação e influências, falta de conhecimento e de cultura, falta de tudo. Passo a passo, devagar, mas firme, a sociedade humana caminha para o descalabro; excedentes de produção consomem as matérias-primas, e cada vez mais a máquina do consumo exige novos produtos num ciclo interminável de satisfação altamente inflacionado. Povos industrializados alimentam-se de povos deficitários, compram as suas riquezas naturais, transformam-nas e geram riqueza, criadoras de desigualdades e beneplácito de futilidades. De crise em crise a Humanidade evolui e faz História. O passado ensina a sua história… a Humanidade não aprende com os seus erros e a História repete-se!

Entretanto, aparecem os arautos da salvação na crença; condutores de almas em alta voz apregoam os benefícios do seu culto e utilizando as modernas ciências de gestão comportamental humana, recrutam mais e mais crentes para a causa, desvalidos e necessitados de esperança, de salvação. Intolerantes, praticam uma guerra surda de influências e medos. Novamente a manipulação dos anseios e dos medos daqueles que, desorientados, procuram auxílio e estendem a mão a quem lhes oferecer ajuda, a fé, essa, vem em segundo lugar. A procura da Verdade e de valores perenes ficaram soterrados na ânsia de poder e domínio, necessidade e medo, em tudo grassa a mentira e a ilusão.

No nevoeiro dos pensamentos clamam vozes débeis… Senhor, onde estás?

A verdadeira fé está no espírito humano consoante o nível de confiança que ele depositar na sua crença. A intranquilidade espiritual absorve energias e incentiva ao confronto ideológico e intolerância, fruto da falta de confiança. Na diversidade está a diferença e na diferença a avaliação do conteúdo. Deve cada um seguir o seu caminho no cumprimento da Vontade do Altíssimo e cultivar na diferença e em respeito a sua cultura.

Em prol da paz, do conhecimento e da verdade, levantem os olhos ao alto… e peçam auxílio!

Espiritualidade é o caminho que o homem tem de seguir para alcançar a bemaventurança, o Paraíso, sua Pátria, de onde veio e para onde deve voltar. Este caminho não pode ser desvirtuado pelo homem e suas ações sem sofrer as consequências inerentes por força da Lei, ninguém foge ao seu destino. Fazemos parte da Espiritualidade porque de origem espiritual somos, é um caminho natural a percorrer em consciência, conhecimento e em Equilíbrio. Na espiritualidade cumprem-se, rigorosamente, as Leis do Altíssimo, o Reino de Deus, esse reino que na oração pedimos “Venha a nós o Teu Reino, seja feita a Tua vontade assim na Terra como no Céu”. Religião é um conjunto de ditames, dogmas e outras convenções cuja estrutura foi organizada pelo homem para regular a sua espiritualidade. Tem como pressuposto principal interpretar as Leis do Altíssimo e fazê-las cumprir. Aqui, ao invés da Espiritualidade, entram em campo os pensamentos e as interpretações próprias do ser humano para condução do seu semelhante conforme a sua vontade e proveito, seja individual ou no benefício da estrutura eclesiástica, por arrogância ou desconhecimento, dando origem a descontentamentos e dissensões cuja base está no desequilíbrio. Política é um conjunto de ações que visam regular a convivência em sociedade e a sua organização a níveis estruturais e educacionais. A organização é necessária para o bom funcionamento das instituições. O homem por si desenvolve as estruturas e cria as leis que irão regulamentar esta convivência, de ordem prática e material, fruto da sua vontade e dos interesses que, entretanto, se instalam. O homem está só nesta tarefa, por vontade própria, a espiritualidade é relegada para plano secundário e a religião, cujos interesses são semelhantes, é combatida como concorrente ao poder e, por consequência, separada do Estado pela via secular, política para um lado, religião para o outro. Assim, as leis do homem, embora com base de equidade e valores humanitários é fria, cega e permeável na sua constituição a ser defraudada pelos seus executantes em favor das classes superiores, endinheiradas digamos, mas com base legal, as classes inferiores, indigentes digamos, olham para a lei, receosas, porque esta é pesada para si e os conhecedores da lei não se dão ao trabalho da defesa consistente que deveriam ter, apesar de a lei ser tendencialmente gratuita, porque aos poderosos tudo é permitido. O mesmo se passa na saúde e na educação, imperam os valores da sociedade, dita democrática e como antes, os senhores e os plebeus ou, melhor dito, a mão-de-obra, essa mão-de-obra que cria a riqueza com as suas mãos calejadas para que os senhores possam ter brancura e finura de pele, rendas e outros predicados que os diferenciam. Se a educação e o ensino fossem de início ministrados às gerações mais novas com base na evolução cultural e cívica, essas diferenças atenuar-se-iam e a sociedade seria mais equilibrada. Mas, como no passado, porque o passado faz História, a ambição domina a alma humana degradando a sua espiritualidade e as consequências far-seão sentir duramente, como dantes.

Substituímos a espiritualidade e o amor pelo materialismo e pela ganância. Por mais democráticas que sejam as sociedades, nunca irão terminar os desmandos dos homens, pela simples razão que todos aspiram ao mesmo, dinheiro.

A separação da religião da vida política trouxe maior equilíbrio a ambas as instituições, já a separação da espiritualidade da vida do homem não lhe trouxe equilíbrio nem paz.

“ Vi por mandado da santa & geral inquisição estes dez Cantos dos Lusíadas de Luís de Camões, dos valerosos feitos em armas que os Portugueses fizerão em Asia & Europa, e não achey nelles cousa algűa escandalosa nem contrária â fe & bõs custumes, somente me pareceo que era necessario aduertir os Lectores que o Autor pera encarecer a difficuldade da nauegação & entrada dos Portugueses na India, usa de hűa fição dos Deoses dos Gentios. E ainda que sancto Augustinho nas sas Retractações se retracte de ter chamado nos liuros que compos de Ordine, aas Musas Deosas. Toda via como isto he Poesia & fingimento, & o Autor como poeta, não pretende mais que ornar o estilo Poetico não tiuemos por inconueniente yr esta fabula dos Deoses na obra, conhecendoa por tal, & ficando sempre salua a verdade de nossa sancta fe, que todos os Deoses dos Gentios sam Demonios. E por isso me pareceo o liuro digno de se imprimir, & o Autor mostra nelle muito engenho & muita erudição nas sciencias humanas. Em fe do qual assiney aqui. “

Frei Bertholameu Ferreira.

O poema épico que canta os feitos da lusitana gente, nos idos gloriosos da época dos descobrimentos, novos mares, terras e gentes, sob os auspícios da Ordem de Cristo, está imbuído de uma geração de deuses, antigos, mas vivos no imaginário do poeta, que à época se tornava heresia, não fora o censor da santa inquisição ter dado um parecer mui diplomático para que a obra não fosse censurada.

Polémica na aceitação da chamada mitologia, chamada, porque à luz da narrativa cristã o que se passava nessa mitologia era um atentado à dignidade humana, histórias que a mitologia sustentava, um eco contrário ao primeiro mandamento da Lei de Deus, “Não terás outros deuses a Meu Lado! “; assim sustentavam os seguidores dos mandamentos, ciosos dos seus compromissos para com a divindade em público, mas tolerantes no círculo da sua intimidade.

Estava mais perto o eco do “faz o que te digo, não faças o que eu faço”.

É de estranhar que a pátria da civilização ocidental, Grécia, que tanto contribuiu para o florescimento da cultura europeia e através desta, universal, no campo da democracia, organização e justiça, na filosofia, lógica e dialética, nas ciências, aritmética e astronomia, aceitassem uma religião que, paradoxalmente, contribuía com mitos e superstições na alma culta deste povo, com um panteão deveras profícuo. Também é de estranhar que a portentosa Roma que herdou e adaptou a cultura grega ao seu engenho construtivo e organizacional, professasse pelas mesmas vias essa cultura religiosa, que para muitos dos hipotéticos sabedores das novas realidades da religião não passavam de mitos obscuros de um povo sem horizontes e por tal, merecedores de evangelização.

Não pertence, contudo, à Grécia e a Roma, o domínio dos deuses, outros povos, distantes entre si, professavam os mesmos deuses, com outros nomes, mas com os mesmos conceitos, culturas diferentes e mitos diversos. É certo que o homem a tudo adultera no cumprimento do seu anseio de poder, também aqui passou o halo nefasto desse mau hábito e a deturpação do conceito de “deuses” e da sua obra foi deturpada por uns e cegamente combatida por outros.

Nem por isso o Olimpo dos Gregos ou o Valhala dos Germânicos perdeu o seu lugar na Criação e o seu esplendor no ápice das criações, logo abaixo do Paraíso espiritual, pátria dos espíritos humanos, desempenhando o destino ao qual foi ligado desde tempos imemoriais. O Olimpo permanece o que é e o que sempre foi, independentemente do querer intelectualizado ou anseio do homem, para sustento desta ou daquela via filosófica, que no tempo muda segundo a evolução do bemquerer.

O conhecimento evolui no tempo desmontando conceitos e adaptando as novas gerações a novos conhecimentos, que originam outros conceitos… e assim será sempre o ciclo do conhecimento…

Mas nem só de pão vive o homem, e os novos horizontes da espiritualidade esperaram milénios até desabrochar o conhecimento acerca dos supostos deuses que afinal não passam de fiéis servidores do Eterno, contribuindo para a sustentabilidade das materialidades visíveis e invisíveis, senhores dos elementos e da natureza, amigos do ambiente e que para ele trabalham diligentemente para que o homem possa tirar usufruto desse labor e possa ser feliz no seu meio, meio esse, que os humanos tão afincadamente destroem para sustentar as suas sociedades sedentas de consumo cada vez mais célere.

O papel do homem na Criação é destrutivo e degradativo, mais do que as histórias da assim chamada mitologia, todos os Deoses dos Gentios sam Demonios, mas o seu lugar deveria ser de hóspede amado.

Entealidade, o novo horizonte no Milénio!

O Altíssimo a tudo rege com o Seu halo de vida e sustenta todas as Suas criaturas, que no cumprimento de Sua Vontade, cumprem o mandamento, “amai-vos uns aos outros” porque no dar e receber está a sustentabilidade da vida e o desenvolvimento plural da comunidade.

Luís de Camões não era cego na sua espiritualidade e a sua obra, Os Lusíadas, é um canto de louvor a todos esses seres que povoam o imaginário dos humanos; saíram do reino da mitologia, da obscuridade, para tomar parte num teatro universal de verdadeiros acontecimentos, perfeitamente adaptados à sua realidade, cantados em poesia na história de um povo singular que os levou nas suas angústias e naufrágios, amores e conquistas, por esse mundo fora, desbravando os mares que:

“Neptuno dominava, protegidos por Vénus bela, afeiçoada à gente lusitana, e por Marte, que da deusa sustentava entre todas as partes em porfia, ou porque o amor antigo o obrigava. Mas o infortúnio também perseguia a lusa gente e o Adamastor, dos filhos aspérrimos da Terra, qual Encélado, Egeu e Centímano, cobrou em vidas a ousadia de tal gente cantada pelo poeta que assim agradecia às sereias do Tejo: e vós, tágides minhas, pois criado tendes em mim um novo engenho ardente.”

Vem do fundo do tempo o tempo da deidade, que na aspérrima humana vontade se mescla para novo tempo e que no tempo se perpetua em ciclos eternos de cumprimento da divina Vontade.

No Olimpo renasce Zeus no tempo de outrora, tomando novo alento no tempo hodierno, brilha em luz áurea a figura, que em vontade cumpre a Vontade do Altíssimo como seu servo, fulgurosos são os raios que emana para condução de seus súbditos no cumprimento de leis universais; brilha Apolo em luz etérea que ao sol confunde a luminescência; Afrodite bela no tempo de agora que em beleza a tudo ofusca em amor puro e casto; em jardins floridos as hespérides alimentam e cuidam das flores da vida, de seu néctar colhido cuidadosamente alimentam as crianças enteais que despertam, futuras almas que a humana prole em condição geram; fulgurosos são os raios de Hefesto na construção do portentoso planeta Terra para condição humana, vigorosa conduta no cumprimento da Vontade; Gaia a tudo rege como senhora do planeta Terra, é mãe e devota ao Altíssimo, na sua condução os deuses a tudo se obrigam. Passado que foi o tempo sobre os tempos, novos tempos se nos afiguram para cumprimento dos resgates do tempo de outrora.

É de realçar para consulta * sobre o tema, os livros que valorizam o sentido intrínseco dos “deuses”, numa abordagem mais séria e adaptada a uma nova realidade espiritual que percorre universos, aqui, no correr da palavra, os deuses tomam vida e o seu lugar junto aos homens é ressuscitado para uma nova era. Os enteais sempre estiveram presentes, os homens, no seu aparato religioso e intelectual, desvirtuaram o sentido e circuncisaram o conhecimento sobre estes diligentes construtores e mentores da obra Divina

Se até Jesus ordenou aos seres elementares dos ventos e do mar que se acalmassem:

“Ele lhes respondeu: Por que temeis, homens de pouca fé? Então, levantando-se repreendeu os ventos e o mar, e seguiu-se grande bonança. E aqueles homens se maravilharam, dizendo: Que homem é este, que até os ventos e o mar lhe obedecem?”

Na obra, “Na Luz da Verdade - Mensagem do Graal”, o autor, Abdruschin, refere:

“Nisso jaz a incomensurável grandeza de Deus, Seu Amor, Sua Justiça. Isto é, em Sua obra, que Ele legou às criaturas humanas, ao lado de muitos outros seres, como morada e pátria.” ⁽

A nova era desbravará o conhecimento da civilização no mais recôndito ser espiritual, num equilíbrio espirito-matéria, simbiose que se faz necessária para evolução e os caminhos dos universos não se farão desconhecidos, antes abertos por seres prestimosos que no cumprimento da Vontade a tudo conduzirão no conhecimento.

Consulta bibliográfica:

*Dissertação O Círculo do Enteal - Mensagem do Graal, vol III

*O Livro do Juízo Final de Roselis Von Sass; Da atuação dos pequenos e grandes enteais da natureza! 1ª e 2ª parte

⁽¹⁾ Lusíadas, canto I, 20;42 – Concílio dos deuses

⁽²⁾ Mateus, 8-25;27

⁽³⁾ Dissertação Culto! - vol I

Religião e ciência

Entre a tolerância e a intolerância não há conciliação possível. Deus, porém, é um só. O mesmo para judeus, cristãos e muçulmanos. Só Ele tem direito de julgar, e de salvar ou condenar. Querer tomar o seu lugar e matar em seu nome é a pior das blasfémias. A história da humanidade está cheia de blasfémias. Já é tempo de resgatarmos aquelas que os nossos antepassados cometeram.

José Mattoso

As religiões mundividentes do Livro [abraâmicas], Judaísmo, Cristianismo e Islamismo, professam a mesma crença no Deus Único, Senhor e Criador de todos os mundos, da Criação visível e invisível.

Sob diferentes conceitos, cada uma delas interpreta-O, com base nos seus interesses e conhecimento, nos ensinamentos do seu profeta (s), adaptando-os na sua capacidade e sagacidade intelectual, emoldurando-O no seu contexto de universo, ou seja, cada uma delas criou-O à sua semelhança.

Arrogância é uma palavra suave para descrever tal devaneio! Como pode um ser criado, como é a espécie humana, construir a imagem do seu Criador?

À semelhança dos nossos conceitos humano-terrenais, da nossa ciência e erudição, quisemos construir a imagem Dele, e sobre essa imagem, estudar e dimensionar a Criação até ao início dos tempos e projetar na sociedade os valores individuais de cada uma delas.

Mesmo entre os crentes monoteístas, o conceito do divino encontra-se separado por interpretações, muitas vezes impercetíveis, mas que na ação se desenvolve em caminhos muito diferentes e colapsáveis entre si, “Deus é tudo”, “Deus está em tudo”, discussões filosóficas irredutíveis, grupos que se formam, e o sentido intuitivo das asseverações perde-se na voragem do discurso dialético.

O sentimento de posse [característica humana] e exclusividade de cada religião, em relação ao Criador, condu-los para o campo hostil de defesa do seu princípio e valores, a história é fértil em episódios bélicos entre religiões e dentro de si próprias, sempre no domínio da razão e em nome Dele.

Face ao conceito de Deus pessoal, presente de modo individual para cada um e protetor, opõe-se o de Deus transcendente, em distâncias longínquas e a reger as Criações com leis, que a ciência sumamente divulga e aplica, fruto da Sua vontade e intemporalidade, leis que abrangem universos numa atividade homogénea e imutável, entre outros conceitos, que num lampejo fátuo se perdem na dobra do tempo.

“Partiram aí de uma tese errada de seu raciocínio de que Deus, de modo inteiramente pessoal, se interessa por elas, cortejando-as e envolvendo-as também protetoramente, sem pensar que elas próprias devem fazer tudo, para conseguir a ligação indispensável, o que inconscientemente, de acordo com as leis da Criação, sempre preencheram na verdadeira oração! Não quiseram acreditar de bom grado que só as leis de Deus na Criação as envolvem e que, atuando automaticamente desencadeiam cada recompensa e cada castigo.”

[Mensagem do Graal, Onipresença vol. 3, Abdruschin]

No contexto criacional, a ciência e a religião estão de acordo, duas sentenças textuais diferentes, o mesmo propósito, o início da Criação [ou Universo]:

“Haja luz”, vinda do fundo do tempo e narrada pela tradição, registada no velho testamento.

“Big bang” dizem os cientistas em teoria, cimentada em estudos e observações devidamente certificadas e como tese unanimemente aceite [até prova em contrário, a verdade na matéria é relativa, aplicável a um período temporal, não há verdades absolutas, o registo da História exemplifica-o], no entanto, a ciência ficou com uma questão pendente na fronteira: e antes do big bang? Porque existe o Universo?

Vários cientistas admitem que a resposta a esta questão, não só é complexa e presentemente muito longe de solução [não está em debate], como também teriam que admitir, como fator equacional, a existência do Criador [um passo de cada vez].

Aproximam-se mais uma vez da religião, a sentença “Haja luz” foi pronunciada pelo Criador ⁽¹⁾:

“No princípio criou Deus os céus e a terra… E disse Deus: Haja luz. E houve luz.”

[Velho testamento, Génesis]

Os cientistas também se movem pela fé, se não fora assim, como poderia o homem sonhar e a obra nascer? E a ciência admite-o para o futuro: “No entanto, se descobrirmos uma teoria completa, por fim todos nós, e não apenas alguns cientistas, seremos capazes de a perceber na sua generalidade. Nessa altura todos seremos capazes de participar na discussão das razões por que o universo existe. Se descobrirmos a resposta a essa questão, teremos obtido o triunfo máximo da razão humana, porque então conheceremos a mente de Deus.”

[A teoria de tudo, Stephen Hawking]

Muita matéria ainda há a ser discutida pela ciência e religião, no que diz respeito ao Universo e suas miríades de galáxias e outros, eventuais universos paralelos ou universos de matérias outras, que pejam os nossos céus e a nossa imaginação. O peso esmagador do espaço contrasta com a limitação da nossa presença civilizacional neste planeta, macerado pela nossa atuação, que de benéfica nada tem, em abono da verdade, poderíamos fazer melhor se, no cumprimento das leis universais, o nosso comportamento fosse direcionado, numa sociedade equitativa e evolutiva, no respeito ao outro num espírito de colaboração e evolução.

“Acredito que o homem não é o mais perfeito dos seres, mas apenas mais um, tendo por um lado, muitos graus de seres inferiores a si, e por outro, muitos graus de seres superiores a ele. Do mesmo modo, quando lanço a minha imaginação para lá do nosso sistema de planetas, além das estrelas fixas visíveis, através do espaço que, em todos os sentidos, é infinito, concebo que ele esteja pejado de sóis como o nosso, cada um com um coro de mundos rodeando-o pela eternidade, então, esta pequena bola na qual me movo, me parece… quase nada e eu próprio menos que nada…”

[Articles of belief, Benjamin Franklin]

E embora o debate não se encontre esgotado, pois que a decisão sociopolítica é uma componente da sociedade civil, pela via dos direitos humanos e liberdade de escolha, é crucial que o entendimento opcional seja animado de respeito mútuo, responsável e sério. É na diferença que o homem evolui, não no seguidismo dormente que aprisiona a alma e a sua missão.

“As democracias ocidentais e os direitos humanos são uma aquisição da cultura ocidental e do espírito cristão, embora em tensão dialética. É esta tensão que sempre existirá em Religião e Política. A História tem sempre a última palavra e, em meu entender, não houve nem haverá História sem Religião. Acredito que Deus existe.”

[Deus existe? Carreira das Neves, teólogo]

Tantas imagens e conceitos, tantos livros, profetas e erudição, conflitos que desgastam a capacidade criativa humana, numa massiva produção em série … e tudo isto para quê?

Para satisfazer o anseio que está inculcado no espírito humano, percecionar o Criador, na busca do conhecimento e origem, que tantos crentes e não crentes discutem filosoficamente, uns com intuitiva fé, outros com instinto de negação.

“Todas as coisas são redutíveis a uma consciência universal, cuja energia criativa invade e penetra todo o universo físico”

[Wang Yang-ming, filósofo confucionista]

Pessoalmente e de modo natural creio que Deus existe!

⁽¹⁾ Não se entenda neste artigo que a sentença “Haja Luz” seja equivalente ao “Big Bang” científico. Uma distância incontornável as separa, plano Divino e plano material. Só é utilizada para melhor enquadramento do contexto. Ler o capítulo 38 “Faça-se a Luz!” da obra Na Luz da Verdade – Mensagem do Graal do autor Abdruschin:

“…no plano Divino vontade e ação são sempre uma só coisa. A cada palavra segue-se imediatamente a ação, ou, mais precisamente, cada palavra já é a própria ação, porque a Palavra Divina possui força criadora, transformando-se, portanto, imediatamente em ação. Assim também na grande sentença “Haja a Luz!”

Mais alto te pretendo e mais humilde; à tolerância que envergonha substitui o cálido interesse pedagógico, o gosto fraternal de aprender e de guiar; não levantes barreiras, mas abate-as; se consideras pior o caminho dos outros vai junto deles, aconselha-os e guia-os; não os deixes errar só porque os dominarias, se quisesses; transforma em forte, viva chama o que a pouco e pouco se dirige a não ser mais do que um gelado desdém.

Agostinho da Silva

Ao longo do tempo a humanidade construiu barreiras ao livre pensamento, através da defesa de conceitos assimilados e desenvolvidos de filosofias, políticas ou religiosas, e estratégias de domínio.

A natureza não se acomoda ao entendimento humano, mas rege-se pelas leis do domínio cósmico; não se iluda o ser humano [ele é parte integrante dessas leis] pensando que o abstrato das fronteiras do ser, lhe permite seguir um caminho de irregularidades de modo impune.

Todos os conceitos são mutáveis no tempo e no evoluir do pensamento, a sua estratificação individual é um obstáculo ao desenvolvimento do ser e um retrocesso civilizacional.

“Rigidez é sempre errada, por ser inatural e também por não estar em harmonia com as leis primordiais da Criação, as quais condicionam a movimentação

Devemos ser prestimosos, tolerantes e cientes dos nossos valores e enquadrá-los nos valores do outro, sem abdicar dos nossos princípios, na base do entendimento e do respeito mútuo.

Exemplo vivo de intolerância é a hostilidade entre as diversas formas de religião, adorando o mesmo Deus, digladiam-se numa arena ilusória, na defesa dos conceitos que cada um tem do divino, cada qual estratificando-o à sua imagem; mais incoerente é, que os princípios fundamentais que defendem, não se afastam assim tanto uns dos outros e com o sentido na tolerância muitas das divisões que persistem se desvaneceriam.

Não é lícito ao homem que através desta atitude degrade a imagem do divino perante o seu semelhante.

“Fizestes de cada Mensagem de Deus uma religião! Para vossa comodidade! E isso foi errado!” ⁽²⁾

É um paradoxo, não faz sentido para um observador livre e independente esta luta…, a não ser que queiram defender o estatuto e o poder adquiridos entre os seus povos, mantendo o status-quo, já que o divino não muda uma lei à origem da construção da Criação, comumente aceite por todas, para se acomodar à vontade humana. As cúpulas de cada instituição religiosa [ou política, os efeitos são os mesmos] mantêm os seus devotos numa subserviência que danifica, de forma permanente, a espiritualidade e a sua evolução natural nos caminhos da peregrinação.

O poder da livre decisão fica toldado e, consequentemente, a liberdade de expressão e vivencialidade não desencadeiam os mecanismos do livre arbítrio, fundamental para o crescimento saudável do ser humano e emocionalmente em equilíbrio. É um erro que a individualidade seja substituída pela submissão [esta não é uma característica do ser humano] para a manutenção de determinadas correntes, antes pelo contrário, na diversidade encontra-se a riqueza do progresso e o reconhecimento de sintomas desviantes, que previamente detetados, não evoluam para o desequilíbrio.

“Já será grande a tua obra se tiveres conseguido levar a tolerância ao espírito dos que vivem em volta; tolerância que não seja feita de indiferença, da cinzenta igualdade que o mundo apresenta aos olhos que não veem e às mãos que não agem; tolerância que, afirmando o que pensa, ainda nas horas mais perigosas, se coíba de eliminar o adversário e tenha sempre presente a diferença das almas e dos hábitos;”

Na matéria não há verdades absolutas, todo o desenvolvimento se permuta entre si, criando novas formas que ondulam como a neblina ao sabor do vento; a beleza da relatividade do ser é que este tem sempre a possibilidade de evoluir no conhecimento, sem chegar nunca à assimilação do todo.

“Se descobrirmos uma teoria completa, por fim todos nós, e não apenas alguns cientistas, seremos capazes de a perceber na sua generalidade. Nessa altura todos seremos capazes de participar na discussão das razões por que o universo existe. Se descobrirmos a resposta a essa questão, teremos obtido o triunfo máximo da razão humana. Porque então conheceremos a mente de Deus.”

Há sempre um caminho para desbravar e a satisfação da descoberta, que em cada curva nos surpreende e estimula a seguir em frente, num movimento eterno, lei que fundamenta a obra da Criação.

Os espaços infindos não têm fronteiras, nem o sonho, que é perseguido no horizonte, não como loucura, mas peregrinação para a eternidade.

A experiência vivencial é um património individual indefetível, para a tomada de decisões futuras, na construção de sociedades, instituições ou de modo individual.

A história reserva-nos o seu acervo, não temos necessidade de repetir o erro por falta de informação, estamos providos de milénios de experiência histórica e individual. No entanto, a cada momento, repetimos os mesmos erros históricos, num trabalho repetido e cansativo, sempre de forma diferente, aprimorando a eficácia da sua execução, mas recebendo sempre os mesmos frutos, de início doces, amargos no fim.

“Abusos e barbaridades que não deveriam ser esquecidos tão depressa, mas que se devia fazer voltar à memória como advertência, sempre de novo, também nos julgamentos de hoje, principalmente porque os que outrora assim agiam, cometiam tais incongruências aparentando a melhor boa-fé e o mais pleno direito.” ⁽⁵⁾

Apesar das muitas contrariedades que se nos deparam no quotidiano, fruto da convivência emocional entre os seres, é perene a tecedura das relações que daí advêm e a sua inconstância ao longo do tempo.

Vale a pena não desistir da esperança, da felicidade… do sonho!

(¹) Abdruschin, escritor. “Exortações”

(²) Abdruschin, escritor. “Na luz da Verdade – Mensagem do Graal”

(³) Agostinho da Silva, filósofo, pedagogo. “Considerações”

(⁴) Stephen W. Hawking, cientista. “A teoria de tudo”

(⁵) Abdruschin, escritor. “Na luz da Verdade – Mensagem do Graal”

Tempos difíceis

Decorrente da lei eterna, uma força obrigatória de expiação inalterável pesa sobre vós, a qual nunca podereis passar para outros. O que carregais mediante vossos pensamentos, palavras ou ações, ninguém mais, senão vós próprios, podeis resgatar! Ponderai bem, pois de outro modo a Justiça Divina seria apenas uma vibração oca, reduzindo tudo o mais consigo a ruínas.

Abdruschin

A Humanidade está a passar por tempos difíceis! Os empregados perdem os seus empregos e vão engrossar as fileiras dos que dependem da Ação Social; os empregadores fecham as suas empresas aumentando o número de falências ou tomam medidas restritivas para manterem os postos de trabalho; as igrejas continuam a pregar as mesmas palavras repetitivas, clamando por mais fiéis, apáticos e chorosos, mas obedientes no cumprimento dos dogmas; os políticos procuram soluções para debelar a crise e manter a coesão social, evitando assim as manifestações populares de desagrado e indignação, mais ou menos hostis, que, indubitavelmente vão despontar.

De quem é a culpa desta crise? Do sistema ou dos que o mantém a funcionar?

” Nem empregador nem empregados têm culpa disso, nem o capital nem a sua falta, nem a Igreja nem o Estado, nem as diferentes Nações, mas tão-somente a sintonização errada das pessoas, individualmente, fez com que tudo chegasse a tanto!”

[Abdruschin] *

Os homens alimentam o sistema com ganância e despotismo e perdem o seu controlo! Os sistemas são, de base, exequíveis e bons para a sociedade, trazendo progresso e bem-estar, educação e cultura, tolerância para retificar desvios e adequá-los aos preceitos do amor ao próximo. Quando o ser humano é dominado pela ganância introduz uma variável no sistema que traz desequilíbrio e desordem. É a vontade do ser humano, individualmente e no coletivo, que faz com que o sistema progrida favoravelmente ou não; as lutas políticas que sustentam a fraude e a corrupção, com discursos humanistas e sempre a falar do bem-estar das populações, são o que de pior a hipocrisia humana consegue criar, a desigualdade e a falta de equilíbrio nas relações humanas, profissionais, políticas etc., levam a que o sistema, mais tarde ou mais cedo imploda. A culpa é do ser humano, por não procurar o sentido da vida, da verdade e do amor, se assim fora, certamente teríamos uma sociedade diferente.

O querer saber melhor do que o outro, o ter sempre razão, defender altos valores como se de um clube se tratasse, conduz o ser humano para o caminho da intolerância que tanto mal faz, tanta dor provoca e que nos priva da liberdade, bem precioso que nos foi outorgado pelo Criador no livre arbítrio.

Animem-se os desvalidos porque à responsabilidade ninguém se furta e a Justiça Divina cumpre-se inexoravelmente. Profetas trouxeram para os seus povos, em épocas certas e diferentes, uma doutrina de tolerância e amor, transmitida conforme o seu estado de evolução; que fizeram os seres humanos dessas doutrinas? Criaram religiões com os seus dogmas e introduziram filosofias e complexas teorias intelectivas que ensombram esses mesmos profetas, fecharam as suas portas uns aos outros e alimentam no seu seio a intolerância em nome do Altíssimo; sacrilégio! A História tudo regista e o tempo tudo guarda!

“Pai perdoai-lhes, pois não sabem o que fazem!” Culpados? Somos nós, humanidade. Perante o tribunal Divino, só nos podemos considerar: culpados!

* Dissertação “Pai perdoai-lhes pois não sabem o que fazem!” – Mensagem do Graal, vol II

14 Europa

A Europa jaz, posta nos cotovelos: De oriente a ocidente jaz, fitando, E toldam-lhe românticos cabelos, Olhos gregos, lembrando.

O cotovelo esquerdo é recuado; O direito é em ângulo disposto. Aquele diz Itália onde é pousado; Este diz Inglaterra onde, afastado, A mão sustenta, em que se apoia o rosto. Fita, com olhar esfíngico e fatal, O ocidente, futuro do passado. O rosto com que fita é Portugal

Fernando Pessoa

Que herança legaste ao mundo, Europa? A tua filosofia, a tua organização, a tua temeridade… de herança helénica recebeste o batismo e Europa foste chamada! Com olhos gregos filosofaste e de mãos hábeis nasceu o legado da história, cérebros romanos organizaram, legislaram e construíram impérios, ao mar te fizeste com espírito lusíada e novos rumos e terras deste ao mundo… “oh! mare nostrum, quanto do teu sal, são lágrimas dos meus olhos…”

E após, os teus filhos se espalharam pelos quatro cantos do mundo desbravando a terra que foi tua e o mar que navegaste, numa imensa teia de civilização. Hoje, Europa, que te recolheste às tuas planícies e serranias, na beleza bucólica de tuas paisagens, verdes em imensos prados no teu coração, brancas nas escarpas das montanhas a roçar o azul do céu, morenas nas planícies quentes da Ibéria que espreitam o largo oceano, na multifacetada cultura que te alimenta a alma e enriquece o folclore, tentas encontrar o caminho irmanando os teus povos numa união, que de natural nos separa pelos mundos que semeamos. Que valores? Pelos tormentos e guerras passadas. Que exemplo? Pela história e episódios alimentados.

Europa, quão de ti alimenta a minha alma, nascida e criada nas tuas entranhas! Clamas por teus filhos, clamas pelo teu passado que te pesa com o registo da História; ligado estou e separar-me não desejo, a terra clama por mim e de mim recebe a ligação que do passado me une. Renasce bem-aventurada mãe de heróis, portentosos guerreiros, cuja honra valia mais que a vida, e nos meandros do legado e na conquista de civilizações te alevantaste e soçobraste em teus devaneios de loucura e glória!

Foste cantada por poetas, filhos teus, escrita por romancistas, filhos teus, filósofos pensaram-te, filhos teus, construída por simples, homens rudes, filhos teus… que anseias hoje, Europa?

Dar novos mundos ao mundo? Já o fizeste. Espalhar cultura? Já o fizeste? Transmitir a fé? Já o fizeste. Que te falta, então?

Olhar para a tua obra no mundo, que já foi teu, e pensar até onde és digna do que transmitiste e que papel deverás assumir num teatro globalizante que de imenso se torna cada vez mais pequeno.

Consola-te, que no desespero da falta, não esqueças, que outros também participaram nesse legado, caminhos que se cruzaram, enredos que se finalizam. Não estás só!

Falta-te cumprir o desígnio há muito alimentado, por gerações e homens sós, que pela força da espada sonharam unir os teus filhos no mesmo propósito e cumprir o destino que te separou e agora une.

Em tua cultura e espiritualidade está o nosso cumprimento. Edifica o símbolo da unidade, que na história construíste no legado de Cristo, vivifica a mensagem que transmitiste ao mundo, qual farol em noite tempestuosa; no paradigma cristológico alimentaste o novo mandamento, “Amai o vosso próximo como a vós mesmos”, e o liberalismo económico e egocentrista que te levou à alimentação de um caminho tortuoso que te aproxima do abismo e que te afasta de tua prole, separando-a e alimentando o egoísmo, latente na condição humana.

Onde está a tua raiz de índole humanista e cristã, cuja unicidade foi minada por desejos megalómanos de poder e de lutas intestinas no desejo de “saber melhor”, mas que no tempo se mostraram iguais aos que lutaram contra ou [o tempo a tudo mostra a sua experiência] alimentaram novos desígnios que tão perto da verdade estão como os outros!

Estamos no limiar de uma era temporal histórica e os desafios são enormes para a sustentabilidade da dignidade humana; criar uma sociedade cujos valores civilizacionais sejam de raiz naturalmente humanista, na economia e no desenvolvimento social. Toma a dianteira e como no passado cultiva para colher no futuro, Europa.

Multiculturalidade e paradigma do conhecimento!

Cruza o tempo, cumpre o destino! Europa, mãe de Pátrias! Senhor, falta cumprir-se…

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