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José Celso da Cunha
4 J o s é C e l s o d a Cu n h a
JOSÉ CELSO DA CUNHA, mineiro de Caratinga, sempre foi um apaixonado pelas construções e sua história desde a infância. Graduou-se, em 1975, em Engenharia Civil pela Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (EE-UFMG); em 1985 tornou-se doutor em Mecânica dos Solos/Estruturas pela École Centrale de Paris (ECP) e pelo Centre Expérimental de Recherches et d’Edudes du Bâtiment et des Travaux Publics (CEBTP), Paris, França. Foi professor na EE-UFMG de 1978 a 2004 das disciplinas de Estruturas de Concreto no curso de graduação em Engenharia Civil e no mestrado em Engenharia de Estruturas. Atualmente, é professor e pesquisador no Departamento de Engenharia Civil do CEFET-MG, no curso de Engenharia de Produção Civil e no mestrado em Engenharia Civil. Profissional de engenharia, com várias obras especiais projetadas, pesquisador e orientador de trabalhos de pesquisa nas áreas de Estruturas de Concreto, Engenharia de Recuperação de Estruturas e História das Construções, possui inúmeros trabalhos publicados. É autor do livro Palace II – A implosão velada da engenharia (Autêntica, 1998). Foi homenageado, em 2002, no 44o Congresso Nacional do Concreto, com o Prêmio Luiz Alfredo Falcão Bauer, pelo IBRACON. Foi membro da Comissão Nacional de Engenheiros, formada pelo COBRACON/CB-2 da ABNT, responsável pela revisão da Norma Brasileira de Projeto Estruturas de Concreto (NBR-6118), de 1993 a 2003. Atualmente, é membro de comissões destinadas a revisões normativas em comitês da ABNT e diretor da regional de Belo Horizonte do IBRACON. Pesquisador e interessado pela história das construções desde a década de 1970, percorreu inúmeros sítios arqueológicos em vários países do mundo nos últimos 30 anos, buscando subsídios técnicos, gráficos e fotográficos para compor esta série de livros sobre o tema.
ria-se um elo instigante na arquitetura entre o Renascimento de Michelangelo, o Barroco de Bernini e de Hardouin-Mansart e a construção bem-sucedida da Catedral de São Paulo, de Christopher Wren, de concepção clássica e barroca com presumíveis implicações na obra neoclássica de Soufflot em Paris. E todo o saber na arte das construções em pedra foi reunido na obra de Germain Soufflot, na sua igreja dedicada à padroeira de Paris, Santa Genoveva, que viria a ser, finalmente, o Panteão de Paris. Nessa construção, o gênio do arquiteto francês, incitado pela necessidade imperativa de contribuir para o cumprimento de uma promessa do rei Luís XV – numa época em que a corte francesa era influenciada pela cortesã Madame de Pompadour –, vislumbraria caminhos possíveis para a arquitetura e a engenharia de estruturas jamais imaginados. A verdadeira conquista que prenunciaria o despertar para uma nova era da construção.”
A H I STÓR I A DA S
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DO PANTEÃO DE ROMA AO PANTEÃO DE PARIS Quarto e último volume da série A História das Construções, este livro identifica o surgimento de novas técnicas construtivas que alavancaram o avanço da arquitetura e da engenharia, partindo, desta vez, das construções monumentais da Roma Antiga, onde seus
A HISTÓRIA DAS CONSTR UÇÕES
FOTO: LEONARDO LARA
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LEIA TAMBÉM A História das Construções Vol. 1 - Da pedra lascada às Pirâmides de Dahchur A História das Construções Vol. 2 - Das Grandes Pirâmides de Gisé ao Templo de Medinet Habu A História das Construções Vol. 3 - Das construções olmecas, no México, às revelações de Pompeia
inventivos construtores criaram diversos processos e mecanismos altamente sofisticados, como as técnicas do arco romano e do concreto como base estrutural para a edificação de obras arquitetônicas colossais. Posteriormente, apresenta as soluções empregadas pela civilização maia, na Mesoamérica, passando pelos povos andinos, dos aimarás de Tiwanaco, na Bolívia, até os incas, no Peru – esta última considerada a civilização que mais soube reunir e explorar toda a utilidade da engenharia e da arquitetura herdadas do passado na América pré-colombiana. Finalmente, o livro desvenda as construções que se desenvolveram na Europa depois da queda do Império Romano do Ocidente, os estilos arquitetônicos e os processos construtivos da região, a partir da Igreja de Santa Sofia, em Constantinopla, na entrada da Idade Média, até a arquitetura neoclássica da Igreja de Santa Genoveva, o Panteão de Paris, no entardecer do século XVIII. Esta série, apresentada por José Celso da Cunha em quatro volumes, é fruto de uma dedicada pesquisa do autor, que passou mais de 30 anos viajando por diversos países para descobrir e compartilhar, por meio de registros fotográficos, desenhos, mapas, textos e comentários reveladores, a rica história das construções, da enge-
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nharia e da arquitetura, desde as primeiras ferramentas, na Idade da Pedra Lascada, até o final do século XVIII.
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Apresentação da série
A busca dos procedimentos construtivos de interesse na história das construções, que surgiriam de tempos em tempos ao longo da trajetória da humanidade, norteia os capítulos desta obra, nos seus três volumes11. Busca-se identificar aqueles que contribuíram de forma positiva com a evolução das construções a partir da Idade da Pedra, sem registro histórico, mas que se tornaram evidentes no que ficou adormecido sob camadas sedimentares de terra e sob a areia do tempo. Observa-se que civilizações ou grupos humanos diferentes, habitantes de terras antigas ou novas, vizinhas ou distantes, célebres ou desconhecidas, ou mesmo perdidas da memória humana, encontraram soluções equivalentes para problemas semelhantes e, não raro, soluções idênticas para os mesmos problemas. 1 Inicialmente, haviam sido previstos apenas três volumes para esta História das Construções. Contudo, a variedade e amplitude do material coletado para o terceiro volume, que compreenderia a investigação das soluções em engenharia e arquitetura desenvolvidas desde a civilização olmeca, que floresceu na região do México a partir de 1500 a.C., até as inovações técnicas trazidas peos engenheiros franceses do século XVIII, conduziram-nos à realização de mais um volume, o quarto e último desta série.
Os seres humanos mais primitivos iniciaram sua trajetória em direção ao norte em algum canto no sul do continente africano, há mais de 100 mil anos, como ensinam os pesquisadores especializados. Desses indivíduos surgiria o Homo sapiens, por volta de 80 mil anos atrás, nosso ancestral direto, que não demandaria mais de 40 mil anos para apresentar manifestações protoartísticas. Seus resultados transcendiam à manutenção da sobrevivência física ou fisiológica, para dar lugar ao pensamento simbólico, introspectivo e reflexivo, distanciando o homem cada vez mais do seu passado rude, tornando-o definitivamente um ser diferenciado das demais criaturas da terra. As primeiras manifestações do pensamento simbólico observadas na confecção de pingentes ornamentais ou de pequenas estatuetas surgiram no momento em que se iniciava o desenvolvimento da cultura humana, quando o virtual e o representativo substituíram a experiência presencial, possibilitando que os conhecimentos e as experiências pudessem ser transmitidos tanto pelo acompanhamento da execução da tarefa como pela instrução oral ou representativa. Tais expressões de arte
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e de conhecimento demonstram o estágio avançado de grupos humanos que habitavam as montanhas do atual Iraque e as planícies do Irã em tempos concomitantes, assim como de outros povos aglomerados da Península Ibérica às planícies mais orientais da Ásia. Desde o surgimento das primeiras civilizações humanas, um dos desafios da arquitetura e da engenharia, ao introduzir modificações na natureza, consistiu na solução dos problemas que envolvem a sustentação de vãos entre dois extremos com o mínimo de esforço e material, visando à conquista de espaços internos utilizáveis ou mesmo a interligar caminhos interrompidos por algum acidente geográfico evidente. Além disso, era necessário compreender a interação da construção com a terra, a sua base, e dominar o equilíbrio das forças e o caminho percorrido por elas em direção às suas fundações. Surgiram processos construtivos os mais variados, em consequência desse e de outros desafios e como resultado da necessidade de vencer as dificuldades surgidas em cada época, em que se acrescentava, definitivamente, algo de novo, experimentado e dominado sobre algum conhecimento precedente. Dessa forma, com a necessidade básica de se garantir moradia, refúgio ou abrigo, surgiram as primeiras construções feitas pelo homem. De tempos em tempos, o homem se vê obrigado a avançar por outros campos, através de caminhos ou trilhas próprias, na busca de regiões mais fartas e promissoras. Nessa migração, algumas técnicas construtivas rudimentares de abrigos já se iniciavam, como a construção de palhoças feitas de galhos de árvores entrelaçados, servindo
de esteios, amarrados com cipós e fibras vegetais, posteriormente cobertos com folhas e cascas de árvores. Nas regiões mais frias, era também utilizada uma técnica que consistia em empilhar e ordenar ossos de grandes animais, como o mamute e o gibão, para a construção de abrigos e refúgios. Esses ossos eram entrelaçados ordenadamente, em forma de abóbada de baixa altura, revestida de placas de pedra colmatadas com uma mistura de barro com palha e cascas de árvores, resultando, assim, numa espécie de pequena caverna artificial. Mais tarde, os descendentes dos povos do Oriente Médio, que viviam entre os Rios Tigre e Eufrates, dominariam técnicas e ferramentas agrícolas que lhes possibilitariam criar instrumentos e artefatos com diversos tipos de material, além de controlar o ciclo sazonal das plantações e das colheitas, entre outras habilidades características do Período Neolítico. Surgiam, assim, as primeiras civilizações humanas nessas regiões privilegiadas da Terra. A fartura e o excedente obtido no cultivo de cereais, na domesticação de animais e no consequente comércio com outros povos ribeirinhos, de leste a oeste da Mesopotâmia, favoreceram as condições para o desenvolvimento das artes, das ciências, da medicina e da engenharia. A escrita não tardaria a chegar, para o controle das mercadorias e dos negócios com povos vizinhos e distantes. A partir de 5 mil a.C., regiões como o Elam, situado a leste da foz dos Rios Tigre e Eufrates (hoje, parte do Irã), floresciam com as primeiras construções permanentes, resultantes de uma engenharia incipiente e determinada. Nessa fase, com base no
Apresentação
conhecimento da construção com tijolos de barro, já não bastava construir apenas para as primeiras necessidades de refúgio ou moradia. Dava-se início a uma construção diferenciada, que deveria também expressar força, poder e encantamento pela sua magnitude sobre os observadores. A engenharia pura e determinada nesse lado do mundo cederia lugar ao pensamento simbólico na construção com o nascimento da arquitetura, que passaria a comandar a obra com objetivos superiores aos que levaram o homem a construir até então. Em tempos anteriores ao desenvolvimento dessas primeiras civilizações do Ocidente e do Oriente, o homem migrava para as mais diferentes regiões da Terra, seja através dos continentes, pelos campos, pelos rios e pelas florestas; seja pelos mares, por meio de embarcações toscas e errantes, mas vitoriosas depois de séculos de tentativas frustradas. Estima-se que as últimas migrações em direção ao continente americano, ainda feitas por terra – através do Estreito de Bering entre a América do Norte e a Ásia, com o recuo dos mares –, teriam acontecido até a última era glacial, por volta de 15 mil anos atrás, por indivíduos provenientes da Mongólia e da Sibéria em busca de novas oportunidades para a sobrevivência dos seus grupos. Outros pesquisadores admitem que migrações humanas em direção às Américas também teriam ocorrido através da Terra do Fogo, no sul do continente, por povos navegadores aborígenes provenientes das ilhas do Pacífico. E que tais grupos humanos, independentemente da sua origem, do norte ou do sul do continente americano, permaneceram isolados durante milênios, desenvolvendo cultura e conhecimentos originais em todos os
campos, favorecendo, em consequência, o desenrolar de suas próprias civilizações, com seus costumes e experiências. Soube-se agora, no apagar das luzes do século XX, que civilizações medraram nos vales dos rios da costa do Peru, dando início a experiências na construção monumental urbana – simultaneamente às primeiras manifestações dessas mesmas ciências do outro lado da Terra, nas margens ocidentais do Rio Nilo, como que espelhados nos mesmos propósitos de mostrar ao mundo suas conquistas. Isso ocorreu em meados do quarto milênio a.C., às margens do Rio Supe, um rio de pequeno caudal, localizado 180 km ao norte de Lima, mas não menos generoso do que aquele que corre na África em direção ao Mediterrâneo, criando, ambos, vales férteis no meio do deserto. Ruínas desses primeiros povos das Américas – originários de civilizações criativas e fascinantes, contemporâneas das primeiras pirâmides de Saqqarah – ficaram adormecidas e desconhecidas durante milênios, para somente agora serem descobertas; como Caral-Supe, no Vale do Rio Supe. Caral é considerada agora, depois de numerosos testes de carbono 14 em fibras orgânicas utilizadas em cestos ou shicras, como o primeiro e o mais importante centro civilizatório das Américas, com suas construções magníficas e simbólicas, sobretudo pirâmides, praças e templos, projetados e construídos na mesma ocasião do surgimento das primeiras pirâmides do complexo funerário de Saqqarah, no Egito. Esse é um contraponto analisado nesta obra, mostrando que civilizações isoladas, sem qualquer contato com outras mais avançadas, podem chegar a soluções idênticas ou equivalentes para os mesmos
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problemas de construção, motivados pelas necessidades humanas de apresentar grandeza e poder pelo conhecimento. Do legado direto desses povos primitivos provenientes de migrações do norte ou do sul das Américas ou daqueles que permaneceram no Velho Continente, na África ou na Ásia, no que diz respeito às técnicas construtivas de qualquer natureza, não há registro histórico consistente anterior a Vitruvius, engenheiro e arquiteto romano, em sua De Arquitetura, no século I a.C.; a não ser representações isoladas, gravadas em alguns monumentos funerários no Egito, por exemplo. Entretanto, considera-se que o conhecimento prático do homem sobre a arte de construir, ainda que de forma rudimentar, atravessou a fronteira dos tempos a partir dos ensinamentos de pai para filho, ao longo das gerações, cumulativamente, sedimentando na mente dos povos primitivos as bases indestrutíveis do conhecimento nesse domínio, uma conquista da própria espécie humana. Dessas técnicas rudimentares aos nossos dias, em que se experimenta um enorme desenvolvimento tecnológico no uso de material e sistemas estruturais e arquitetônicos alternativos, o homem evoluiu gradativamente na criação e no domínio das construções, passando pelos mais fascinantes desafios. Na expectativa de apresentar uma análise sobre a história das construções, esta obra (resultado de pesquisas e conferências do autor), ainda que muitas vezes baseada em observações e argumentos qualitativos, pretende traçar a trajetória da construção da humanidade a partir da observação de suas técnicas e do estudo das iniciativas que permitiram a realização das primeiras construções, seus avanços e
suas dificuldades, até a invenção do concreto armado. Dessa forma, procurou-se identificar a introdução de novas técnicas e procedimentos construtivos que possibilitaram, no decorrer dos séculos, depois da pedra lascada, sustentar o avanço da arquitetura e da engenharia na criação de espaços mais amplos, internos ou externos, consolidando, assim, o império da cultura e do conhecimento, elementos inseparáveis das civilizações criadoras e dos povos dominantes. Grande parte do material fotográfico e dos apontamentos apresentados aqui foram obtidos nas viagens de pesquisa e estudo feitas pelo autor, nos últimos 27 anos, a países da Europa, da África e da América. Destacam-se, sobretudo, as viagens realizadas nos últimos três anos a países como França, Inglaterra, Itália (incluindo a Sicília), Egito, Grécia (incluindo Creta), México, Guatemala, Argentina, Bolívia e Peru, como parte de um projeto de pesquisa patrocinado pela ArcelorMittal em convênio com o Cefet-MG, numa cooperação cultural público-privada que viabilizou o aprofundamento das pesquisas e a publicação deste trabalho em três volumes. O primeiro volume apresenta as construções primitivas, as construções com barro, as construções megalíticas no Ocidente e o nascimento da arquitetura em pedra no Vale do Rio Nilo, em Saqqarah, pelas mãos do rei Djoser e de seu estimado arquiteto Imhotep, vizir e conselheiro. Encerra-se com o estudo das construções posteriores aos complexos funerários de Saqqarah, do final da III Dinastia, das obras de Meidum e de Dahchur, em que o faraó Seneferu define as bases que resultariam nas conquistas técnicas consolidadas das grandes pirâmides de Gisé.
Apresentação
O segundo volume apresenta uma análise das construções das grandes pirâmides; o despertar das construções com o uso da pedra nas Américas; os construtores lendários de Creta e da Grécia Continental, encerrando-se com as construções dos reis divinos do Novo Império egípcio. O terceiro volume aborda as construções olmecas, nas terras baixas do Golfo do México, a cidade sagrada de Teotihuácan e os avanços construtivos dos zapotecas, em Monte Albán. Discorre também sobre as grandiosas construções na Pérsia e na Grécia Clássica, finalizando com as revelações de Pompeia e Herculano, no Golfo de Nápoles. Por fim, o quarto volume se dedica a analisar as construções romanas, voltando-se, também, para as soluções empregadas pela civilização maia, na Mesoamérica, e pelos povos andinos, dos aymarás de Tiwanaco, na Bolívia, aos incas, no Peru, e encerra-se com a análise das construções que se iniciaram a partir da Igreja de Santa Sofia, em Constantinopla, na entrada da Idade Média, para finalizar com a arquitetura neoclássica de Germain Soufflot, no entardecer do século XVIII, com considerações sobre a Igreja de Santa Genoveva, o Panteão de Paris. Espera-se que a leitura desta obra seja conduzida pela curiosidade do leitor em trechos isolados ou em capítulos completos, ao sabor da abertura de suas páginas, sem qualquer exigência ou necessidade de conhecimento nessa área. Procurou-se uma continuidade relativa e proposital na apresentação dos temas, mostrando a evolução do conhecimento humano na arte de construir, sempre com citações e costuras dessa evolução com técnicas equivalentes de povos de outros continentes, mas não necessariamente
justificadas com alguma concomitância cronológica ou temporal. Pretende-se fazer uma elegia às ciên cias da arquitetura e da engenharia, sobretudo como intérpretes das manifestações humanas ocorridas depois da Idade da Pedra, inseparáveis nesta série que visa a abranger seu universo íntimo na história. Esse aspecto permite realçar o paradoxo e o paralelo entre o conhecido, a história, e a não história no universo das construções da humanidade. Enquanto na primeira procura-se compreender esse universo pelos instrumentos da linguagem (enquadrada ou não dentro de regras precisas), pela palavra escrita, a não história necessita de outros sinais e de outros conhecimentos não verbalizados, deixados pelo homem, que somente interessam às ciências da engenharia e da arquitetura (e mais recentemente da arqueologia e da antropologia) e que somente elas podem perceber. Esse período da não história nos ensina, na visão dessas duas ciências, mais do que se esses seres humanos do passado já dispusessem de outros meios de comunicação como a escrita. Espera-se que esses conhecimentos sejam de interesse de todo tipo de leitor, independentemente de sua formação acadêmica ou cultural, já que foram registrados numa linguagem aberta, dirigida a qualquer um de nós, curiosos em saber como os nossos antepassados conseguiram realizar os prodígios que hoje descobrimos através da arqueologia científica. Isso sem prescindir do necessário rigor na análise de assuntos relacionados com as construções, talvez dada a formação desse engenheiro e professor de estruturas, amigo da história, da geografia, das artes e das ciências e, sobretudo, encantado pelos avanços conquistados pelo homem nesse campo ao longo dos séculos.
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Introdução
Introdução
O presente livro, quarto e último volume da série A História das Construções, começa com as construções monumentais da Roma Antiga. As construções no mundo romano eram, muitas vezes, a forma que os governantes tinham de ocupar e dar serviço e dignidade ao povo comum das ruas e dos campos, ou mesmo aos seus soldados entrincheirados. Era uma maneira de gastar, em Roma e além dela, a fortuna conquistada ou pilhada dos povos vencidos sob suas espadas. Dessas construções, surgiram processos construtivos os mais variados, resultado da criatividade dos seus construtores, que dispunham das mais avançadas técnicas de construir com segurança e confiabilidade. Registra-se, aqui, que das mãos dos arquitetos romanos, impulsionados pelos imperadores construtores, surgiram obras de arquitetura colossal, em que o uso do concreto era, de modo geral, a base estrutural; e que o arco romano, agora também constituído de concreto, contribuiu diretamente para o sucesso dessas grandes obras. Como será mostrado, de todos os grandes imperadores construtores, nenhum deles foi mais criativo e mais produtivo que o grande Adriano, que soube sintetizar, em suas obras, todo o saber acumulado pela arquitetura do Mediterrâneo, em Roma e nas províncias.
Também neste último volume serão apresentados os construtores das Américas a partir dos maias, senhores da engenharia e da arquitetura da região oriental da Mesoamérica, herdeiros de construtores mais antigos, como os olmecas, os teotihuacanos e os montealbanos. Os maias souberam interagir com povos de um vasto território, dos quais absorveram conhecimentos técnicos que resultaram nas mais curiosas e fantásticas arquiteturas em pedra, sobretudo com o emprego do concreto à base de cal e areia e do seu processo construtivo singular: o arco maia. Enquanto as construções do Ocidente tinham como base o arco romano e o concreto pozolânico, nas suas mais diversas aplicações, os maias utilizavam seu próprio arco, artifício que possibilitou criar ambientes arquitetônicos os mais diversos, com sistemas construtivos que lhes permitiram realizar importantes obras. Tudo isso sem nenhum conhecimento das práticas ocidentais de construção, tendo em vista que o continente americano ficou isolado do mundo ocidental desde a última era glacial, há mais de 15 mil anos, até a chegada dos espanhóis, no início do século XV. Tais técnicas evoluíram do simples emprego de pedras lamelares empilhadas, ganhando espaço
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no avanço propiciado pelo seu assentamento, para a composição estrutural e arquitetônica em que o uso do concreto especial, cuja base era a cal misturada com areia e pedregulhos, resultou em composições arquitetônicas de obras especiais e de rara beleza. Da mesma forma, na sequência observada em toda esta história das construções, serão também apresentadas as grandes realizações dos construtores andinos, desde a civilização tiwanaco, na Bolívia, desenvolvida a partir do século II a.C., próximo às margens do lago Titicaca. Os construtores tiwanacanos são considerados herdeiros das técnicas provenientes da cidade sagrada de Chavín de Huántar, no Peru, localizada ao norte, no coração da Cordilheira dos Andes. Nessa época, deu-se início à urbanização, ainda que modesta, da cidade de Tiwanaco, para ingressarem definitivamente como senhores construtores a partir do final do século IV d.C., quando começaram a surgir as primeiras construções monumentais em pedra polida, marcando o início do emprego desse material nas construções nessa região dos Andes. Com vistas a identificar em Tiwanaco a continuidade histórica que permitirá compreender o considerável avanço técnico do grande Império Inca no campo das construções em pedra, serão apresentados alguns monumentos, como a Pirâmide de Akapana; o grande cercado de Kalasasaya; o fosso conhecido como Templete, onde há dezenas de cabeças esculpidas, como gárgulas, semelhantes às de Chavín de Huántar; e a famosa Porta do 1
Sol – um monumento instigante, um monólito em forma de um grande portal –, ligando em detalhes a continuidade histórica perseguida neste trabalho. Será mostrado que, segundo a lenda, das águas do Lago Titicaca, próximo a Tiwanaco, situado a mais de 3.800 m de altitude, por volta do final do século XII d.C., nasceria o fundador do império inca: o legendário Manco Cápac. O deus Sol, Inti, ordenou que Manco Cápac e sua esposa e irmã, Mama Ocllo, considerada uma deusa da fertilidade, nascessem do fundo das águas do Lago Titicaca com a predestinação de fundar a cidade de Cuzco. Nessa nova cidade, Manco Cápac deveria construir um templo dedicado ao deus Sol. A construção do que é hoje parte do suposto Templo do Sol em Cuzco, o Koricancha, atual Convento de São Domingos, apesar de originalmente saqueado e destruído em grande parte pelos espanhóis no século XVI, ainda guarda surpreendentes detalhes técnicos do uso da pedra na arquitetura. Será mostrado, também, que duas dinastias, uma legendária e outra histórica, foram responsáveis pela formação e condução do Império Inca, e que a segunda dinastia, a considerada histórica, teve início no mesmo ano da morte do último legendário soberano inca, em 1350. Pouco menos de cem anos depois, com a subida ao trono do imperador conhecido como Pachacútec-Inca-Yupanqui (14381463),1 em 1438, iniciaram-se as expansões imperiais incas com forte presença nas construções monumentais em pedra.
Pachacútec, considerado aquele que verdadeiramente fundou o Império Inca, a partir de sua ascensão ao trono, tomado de seu pai em 1438, criou as bases de uma verdadeira política expansionista apoiada por uma administração centralizada muito forte, que foi sistematicamente seguida por seus sucessores.
Introdução
Observa-se que, apesar de o grande desenvolvimento expansionista do Império Inca ter ocorrido somente a partir do século XV d.C., com Pachacútec, as bases necessárias para se garantir tecnicamente essa expansão tiveram suas origens nos conhecimentos do passado, de que os incas se beneficiaram como seus verdadeiros herdeiros. Os incas foram – assim como também foram os romanos, no Mediterrâneo, dois mil anos antes –, beneficiários de conquistas técnicas desenvolvidas ao longo de milênios na América do Sul. Considera-se que os incas foram, certamente, a civilização que mais soube reunir toda a utilidade da engenharia e da arquitetura herdadas do passado na América pré-colombiana. As primeiras mostras de construções criativas nas Américas envolvendo ações de engenharia e de arquitetura coordenadas, ainda no terceiro milênio a.C., nasceram no mesmo Peru, às margens do Rio Supe, na cidade sagrada de Caral-Supe, como apontaram os estudos mostrados nos dois primeiros volumes desta série. De Caral-Supe, próxima à costa do Pacífico, a Chavín de Huántar, localizada no meio da Cordilheira dos Andes, onde se considera ter nascido a arquitetura neolítica das Américas, decorreram mais de mil anos. De Chavín de Huántar a Tiwanaco, passando por outras culturas desenvolvidas na costa do Pacífico, ao sul e ao norte do Peru, mais de mil anos fluíram até que, séculos mais tarde, nascesse uma civilização especial, que deixaria para o mundo o 2
encantamento das construções em pedra de forma diferenciada, reinventando o conhecido com segurança, harmonia e beleza. Será mostrado que a força, a técnica e a criatividade dos construtores incas ficaram preservadas da destruição e dos saques dos colonizadores na cidade perdida de Machu Picchu, construída por Pachacútec no coração dos Andes peruanos. Ao não permitir que os invasores tomassem conhecimento da localização de Machu Picchu, os filhos do Sol, como eram chamados os incas, legaram ao mundo e à história das construções a maior de suas maravilhas, a sua verdadeira joia, que somente viria à tona no alvorecer do século XX. Voltando às construções do Ocidente, e finalizando o estudo das construções a partir do século III d.C., o último capítulo da série mostra como os arquitetos romanos ainda empregavam grossas paredes constituídas de tijolos queimados, assentados com argamassa de cimento pozolânico, à base de cinzas vulcânicas, cal e areia. E que na construção das coberturas das Termas de Caracalla, em formato de grandes e médias cúpulas e semicúpulas, foi também utilizado concreto pozolânico, com as mesmas características construtivas e técnicas empregadas por Adriano um século antes, em Roma. Será mostrado que, do conturbado imperador Caracalla (211-217) até a ascensão do imperador Constantino I2ao trono de Roma, no início do século IV, pouca coisa se construiu que pudesse ser considerada como inovação ou avanço em
Caius Flavius Valerius Aurelius Constantinus, imperador romano (306-337). Convertido ao cristianismo, mandou construir uma basílica no local onde havia o Circo de Nero, local em que São Pedro foi martirizado e morto, entre os anos 66 e 67 d.C.
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relação aos conhecimentos já adquiridos. Tal situação perdurou até que a presença instigante dos cristãos – perseguidos pela maioria dos imperadores, que os consideravam uma ameaça ao governo de Roma – se tornasse forte a ponto de influenciar o imperador em suas decisões, culminando no Édito de Milão, um documento proclamado por Constantino I garantindo a liberdade de culto e reconhecendo a Igreja Cristã como um corpo legal. Em decorrência disso, e por outros interesses que afloravam na conturbada Roma, Constantino I viria a se tornar o único imperador romano do Oriente e do Ocidente, com a derrota de Licínio, em 324 d.C., considerado o augusto do Oriente. Assim, Constantino I decidiria deslocar o centro administrativo de Roma para a cidade de Bizâncio, localizada na margem europeia do Estreito de Bósforo, onde construiria, segundo ele, uma Nova Roma, iniciada em 324 d.C., que após a sua morte passaria a se chamar Constantinopla, na atual Turquia. Será assinalado que, para vencer tamanho desafio, o imperador levaria consigo seus principais colaboradores de outras empreitadas, como arquitetos, engenheiros e mestres construtores, artesãos e artistas, geômetras e matemáticos, conhecedores das técnicas construtivas que se solidificaram na Escola Romana, acostumados e familiarizados com as vontades do soberano. Constantino I fincaria as bases para a construção da primeira igreja cristã no coração da nova cidade, dedicada à Sabedoria Divina – do grego hagia sophia –, finalizada pelo Imperador Justiniano entre 527 e 565 d.C. Será registrado que, sob Justiniano, a nova igreja, ampliada e modificada nos mesmos moldes que ainda hoje podem ser contemplados na atual Istambul, na Turquia, resultaria na maior e mais bela de todas as igrejas cristãs da Antiguidade, a última manifestação humana na arte de construir antes da porta de entrada da obscura Idade Média. A partir da análise da construção dessa igreja de Constantinopla, apesar das dificuldades enfrentadas pelo mundo ocidental nos campos da ciência, das artes e do conhecimento técnico em decorrência das perseguições da Igreja em toda a Idade Média, são apresentadas as construções que se valeram de uma arquitetura possível no início dessa era, com outra solução criativa e bemsucedida, baseada em uma engenharia bem fundamentada, aplicada nas construções góticas a partir do século XII. O mundo ocidental assistiria, a partir da Igreja de Santa Sofia, ao nascimento e ao desaparecimento de diversas correntes arquitetônicas que predominariam nas grandes construções na Europa, voltadas, sobretudo, para a edificação de igrejas, abadias, monastérios e castelos, num mundo em que a religião viria a dominar o trabalho dos arquitetos
Introdução
e dos engenheiros. O conhecimento da engenharia se aperfeiçoaria sob as rigorosas regras da estabilidade das construções e atenderia completamente aos avanços requeridos pelas novas arquiteturas, na medida em que surgiam as demandas. Dentre essas correntes arquitetônicas, será apresentada, inicialmente, as arquiteturas carolíngia e otônica, da época de Carlos Magno, que seriam substituídas pela arquitetura românica. Posteriormente, serão mostradas as arquiteturas gótica, renascentista, barroca e neoclássica, esta surgida no final do século XVIII, quando a construção em pedra lavrada e polida, iniciada há mais de 4.500 anos no complexo funerário de Saqqarah, começaria a ceder a uma nova tecnologia revolucionária, introduzida em meados do século XIX. Finalmente, a partir do Renascimento italiano, no último capítulo desta série, será possível mostrar a conexão existente entre a obra do Panteão Romano, a construção da Catedral de São Pedro – iniciada por Bramante em 1505 e continuada, após a sua morte, em 1514, por vários outros arquitetos e construtores, entre eles Rafael Sanzio e Michelangelo Buonarotti, responsável pelo projeto e construção da cúpula da Catedral –, e a construção da Igreja de Santa Genoveva, em Paris, construída pelo arquiteto francês Jacques-Germain Soufflot na segunda metade do século XVIII. As conexões apresentadas entre a Catedral de São Pedro e a igreja de Paris, última construção analisada nesta série, mostram os importantes trabalhos dos arquitetos responsáveis pela construção da Igreja de São Paulo, em Londres, Sir Christopher Wren (1632-1723), da Igreja dos Inválidos, em Paris, HardouinMansart (1646-1708), e uma passagem surpreendente envolvendo o grande Gian Lorenzo Bernini (1598-1680). Cria-se um elo instigante na arquitetura entre o Renascimento de Michelangelo, o Barroco de Bernini e de Hardouin-Mansart e a construção bem-sucedida da Catedral de São Paulo, de Christopher Wren, de concepção clássica e barroca com presumíveis implicações na obra neoclássica de Soufflot em Paris. E todo o saber na arte das construções em pedra foi reunido na obra de Germain Soufflot, na sua igreja dedicada à padroeira de Paris, Santa Genoveva, que viria a ser, finalmente, o Panteão de Paris. Nessa construção, o gênio do arquiteto francês, incitado pela necessidade imperativa de contribuir para o cumprimento de uma promessa do rei Luís XV – numa época em que a corte francesa era influenciada pela cortesã Madame de Pompadour –, vislumbraria caminhos possíveis para a arquitetura e a engenharia de estruturas jamais imaginados. A verdadeira conquista que prenunciaria o despertar para uma nova era da construção.
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