Elogio da escola

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Jorge Larrosa (Org.)

Elogio da escola

Este livro vem acompanhado de um DVD contendo três documentários e registro de duas exposições.



Coleção Educação: Experiência e Sentido

Organização

Jorge Larrosa

Elogio da escola


Copyright © 2017 Jorge Larrosa Copyright © 2017 Autêntica Editora

Todos os direitos reservados pela Autêntica Editora. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida, seja por meios mecânicos, eletrônicos, seja via cópia xerográfica, sem autorização prévia da Editora.

coordenadores da coleção

revisão

educação: experiência e sentido

Lívia Martins

Jorge Larrosa Walter Kohan

capa

Rejane Dias

Alberto Bittencourt (sobre quadro Na porta da escola, de Nikolai Petrovich Bogdanov-Belsky, 1897)

editora assistente

diagramação

Cecília Martins

Larissa Carvalho Mazzoni

editora responsável

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Elogio da escola / organização Jorge Larrosa ; tradução Fernando Coelho -- 1. ed. -- Belo Horizonte : Autêntica Editora, 2017. -- (Coleção Educação : Experiência e Sentido) ISBN 978-85-513-0287-3 1. Educação - Filosofia 2. Educação - Finalidade e objetivos 3. Escola 4. Professores - Formação I. Coelho, Fernando. II Larrosa, Jorge. III. Título. IV. Série. 17-08245

CDD-370.1

Índices para catálogo sistemático: 1. Educação : Filosofia 370.1

Belo Horizonte Rua Carlos Turner, 420 Silveira . 31140-520 Belo Horizonte . MG Tel.: (55 31) 3465-4500

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APRESENTAÇÃO DA COLEÇÃO

A experiência, e não a verdade, é o que dá sentido à escritura. Digamos, com Foucault, que escrevemos para transformar o que sabemos e não para transmitir o já sabido. Se alguma coisa nos anima a escrever é a possibilidade de que esse ato de escritura, essa experiência em palavras, nos permita liberar-nos de certas verdades, de modo a deixarmos de ser o que somos para ser outra coisa, diferentes do que vimos sendo. Também a experiência, e não a verdade, é o que dá sentido à educação. Educamos para transformar o que sabemos, não para transmitir o já sabido. Se alguma coisa nos anima a educar é a possibilidade de que esse ato de educação, essa experiência em gestos, nos permita liberar-nos de certas verdades, de modo a deixarmos de ser o que somos, para ser outra coisa para além do que vimos sendo. A coleção Educação: Experiência e Sentido propõe-se a testemunhar experiências de escrever na educação, de educar na escritura. Essa coleção não é animada por nenhum propósito revelador, convertedor ou doutrinário: definitivamente, nada a revelar, ninguém a converter, nenhuma doutrina a transmitir.


Trata-se de apresentar uma escritura que permita que enfim nos livremos das verdades pelas quais educamos, nas quais nos educamos. Quem sabe assim possamos ampliar nossa liberdade de pensar a educação e de nos pensarmos a nós próprios, como educadores. O leitor poderá concluir que, se a filosofia é um gesto que afirma sem concessões a liberdade do pensar, então esta é uma coleção de filosofia da educação. Quiçá os sentidos que povoam os textos de Educação: Experiência e Sentido possam testemunhá-lo.

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Jorge Larrosa e Walter Kohan* Coordenadores da Coleção

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Jorge Larrosa é Professor de Teoria e História da Educação da Universidade de Barcelona e Walter Kohan é Professor Titular de Filosofia da Educação da UERJ.


APRESENTAÇÃO

Elogio da escola: o desafio de pensar uma forma sem função Karen Christine Rechia, Geovana Mendonça, Lunardi Mendes, Ana Maria Hoepers Preve

E a arte de apresentar não é apenas a arte de tornar algo conhecido; é a arte de fazer algo existir, a arte de dar autoridade a um pensamento, um número, uma letra, um gesto, um movimento ou uma ação e, neste sentido, ela traz este algo para a vida. (Masschelein; Simons, 2015, p. 135)

É na atmosfera de fazer algo existir, que apresentamos este livro. Tentamos, dessa forma, aproximar os leitores de uma discussão sobre o que é a escola, fundamentalmente a partir da obra Em defesa da escola: uma questão pública, dos filósofos da educação Jan Masschelein e Maarten Simons (2015). Pretendemos, com esta constelação de textos que orbitam, mais ou menos próximos à obra acima citada, deslocar a discussão acerca da função ou do papel social da escola, para pensar seus elementos constitutivos. Ao envolver os leitores nessa atmosfera, temos claro que essa configuração de textos, à semelhança do livro dos autores, pode ser apropriada tanto pelos que defendem a escola, como pelos que a condenam. No entanto, para além do binarismo 9


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que comporta tanto a defesa quanto a condenação, gostaríamos que esses escritos fossem tratados muito mais como exercícios de pensamento, no sentido de “trazer ao mundo” aspectos da escola, do estar na escola, do ordinário da escola, de uma memória escolar em suas atualizações, do chiaroscuro no cotidiano escolar, do repetitivo na escola, enfim, de tudo o que a compõe e a faz existir como lócus para o espaço e o tempo livres. Todavia, isso não seria possível sem as proposições fundamentais, as articulações, a montagem, a disposição de cenários, a reunião de personagens tão inspiradores, enfim, sem “a presença” do educador e filósofo Jorge Larrosa. Portanto, oferecemos aos leitores um livro coletivo, cuja centralidade é a escola e seu caráter público, comum e de igualdade, mas cuja materialidade só foi possível devido ao trabalho atento, insistente e amoroso de Jorge Larrosa. Os textos que compõem este livro foram produzidos a partir das atividades de um grande projeto denominado “Elogio da Escola”, que aconteceram entre agosto e novembro de 2016, em Florianópolis, ilha de Santa Catarina, no sul do Brasil. Toda a mobilização intensiva em torno de ideias, exercícios e escritas partiu de uma proposição de Larrosa: Elogio. Do latim elogium e do grego elegeíon. Com raiz indo-europeia leg, remete a uma inscrição, normalmente um dístico, feita sobre uma tumba ou sobre uma imagem com a intenção de louvar ou elogiar o defunto ou o personagem. Daí seu parentesco semântico com “epitáfio” (formada pelo prefixo epí, “sobre”, e o substantivo táphos, “tumba”) e etimológico com “elegia” (composição poética, normalmente escrita em dísticos, para lamentar a perda de algo ou de alguém). Escola. Do grego skholé, literalmente “tempo livre”, traduzido para o latim como otium, “ócio”. O termo latino 10


Apresentação

schola designa o lugar ou o estabelecimento público destinado ao ensino. Poderíamos dizer que a palavra escola remete, fundamentalmente, ao tempo (livre) e ao espaço (público) dedicado ao estudo. A ideia então era pensar o lugar da escola, ou melhor, o que compõe uma escola, num mundo que parece se preocupar apenas com sua função ou sua dissolução. Em certa medida, a provocação de Larrosa é esta: elogiar a escola também pode ser cantar o seu fim. Ao mesmo tempo, ao nos trazer a raiz e o sentido grego da palavra, nos lança dois pilares fundamentais que perpassam a maior parte dos textos aqui apresentados: tempo livre e espaço público. Na verdade, esses dois argumentos trabalhados por Jan Masschelein e Maarten Simons, na obra Em defesa da escola, fizeram com que esta fosse, ao mesmo tempo, referência e interlocução para todas as atividades propostas neste projeto e que culminaram no livro aqui apresentado.1 Não podemos deixar de dizer que a escolha da referida obra não foi aleatória. Em realidade, está calcada justamente em seu caráter aparentemente controverso e contundente. Porém, como afirmam nossos autores, “nós nos recusamos firmemente a endossar a condenação da escola. Ao contrário, defendemos sua absolvição. Acreditamos que é exatamente hoje – em uma época em que muitos condenam a escola como desajeitada à realidade moderna e outros até mesmo parecem querer abandoná-la completamente – que o que a escola é e o que ela faz se torna evidente” (2015, p. 10). Destarte, é fundamentalmente

É importante destacar que uma discussão em torno das ideias do livro citado foi realizada num seminário organizado por Inés Dussel, intitulado “Seminario Internacional – El futuro de la escuela: debates en torno a la educación pública”, que ocorreu na Cidade do México, nos dias 9 e 10 de outubro de 2014.

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Coleção “Educação: Experiência e Sentido”

nessa recusa que encontramos motivos para insistir em colocar a escola “sobre a mesa”, mais uma vez. Por conseguinte, os vários movimentos realizados no que denominamos Elogio da Escola procuraram estabelecer uma leitura atenta da obra por grupos de pessoas interessadas, em diversos momentos e lugares. Nesses espaços-tempos criados – como as Derivas, o Seminário preparatório para o Seminário Internacional, o Ciclo de Cinema, a Exposição sobre um desenho de Escola – foram promovidos debates, exercícios, leituras e escrituras em torno, substancialmente, do que é o “escolar”.2 Tal como propuseram nossos autores em seus escritos, nós nos debruçamos exaustivamente sobre suas “questões”: de suspensão, de profanação, de atenção e de mundo, de tecnologia, de igualdade, de amor, de preparação e, finalmente, uma questão de responsabilidade pedagógica. Em suma, os intensos debates e exercícios de pensamento gerados ao longo de todo esse percurso estão aqui impressos. Assim, na primeira parte deste livro, os autores, de distintas maneiras, versam sobre um “Elogio da Escola”, na forma de uma linguagem e uma voz pedagógica ( Jan Masschelein e Maarten Simons), de uma vida feita escola (Walter Kohan), de uma precariedade da escola (Inés Dussel) e de uma capacidade de skholé ( Jorge Larrosa e Marta Venceslao). Na segunda parte, “Em defesa da escola: notas à margem”, o leitor pode acompanhar as proposições feitas aos pedagogos Jan Masschelein e Maarten Simons, em torno de sua obra Em defesa da escola: uma questão pública. Os autores respondem aos argumentos desenvolvidos por Inés Dussel, Walter Kohan e Maximiliano López, assumindo o desafio de contestar alguns referenciais da obra citada e, ao mesmo tempo, de elucidar as Programação disponível em: <https://www.elogiodaescolaudesc.com/2016>. Acesso em: 27 ago. 2017.

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Apresentação

críticas que fazem com que seu texto provoque reações tão ambíguas. Nesse sentido, a última seção desta parte é composta por dez perguntas formuladas por participantes do curso “A escola: formas, gestos e materialidades”, ministrado por Jorge Larrosa. O curso teve como finalidade ler, discutir e propor um diálogo com nossos autores de referência. Como pensar a escola em sua materialidade e, por conseguinte, como materializar essas formas dá o tom dos escritos em “Exercícios de pensamento sobre a escola”, que compõem a terceira parte. No texto “Filmar a escola: teoria da escola”, Maximiliano López escreve sobre o filme homônimo, produzido pelo Núcleo de Estudos em Filosofia, Educação e Poética (FEP) da UFJF, sob sua direção. A escola é ali apresentada em imagens em movimento. Daina Leyton, em “Curar uma exposição sobre a escola: um exercício de pensamento”, escreve sobre uma exposição no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM) com obras de arte escolhidas e outras produzidas com este tema, obras que convidam ao exercício. Ter a escola, e mais especificamente a educação, como matéria-prima.3 O último texto dessa parte é coletivo: “Desenhar a escola: um exercício coletivo de pensamento”. Jorge, Eduardo, Karen, Luiz, Juliana e Caroline contam ao leitor sobre um intenso exercício de desenhar uma forma para a escola. Através de derivas no espaço urbano, os grupos envolvidos acionaram, sob a orientação de Jorge Larrosa, noções de tempo, espaço, matérias, atividades e tecnologias para esboçar o que cabe numa escola. Por meio de protocolos preestabelecidos e conversações, o grande grupo materializou toda esta proposta 3

Com curadoria conjunta de Felipe Chaimovich, curador do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), e Daina Leyton, coordenadora do setor educativo, a exposição Educação como matéria-prima aconteceu em 2016 no MAM. 13


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na forma de uma exposição, presente no DVD encartado neste livro. Na quarta e última parte intitulada “Mirar a escola: uma mostra de cinema”, os escritos giram em torno de filmes que trazem a escola, suas formas, sujeitos e situações como leitmotiv. A seleção não diz respeito a filmes que falam sobre a escola, ou tão somente sobre temas pedagógicos, não se refere a aspectos educacionais independentes do espaço no qual se articulam, mas a películas que mostram a escola, a colocam em evidência. O primeiro filme é Zero de conduta (1933), de Jean Vigo, cuja trama se passa em um colégio interno. Acompanhamos seu cotidiano até culminar em uma rebelião dos garotos contra o controle dos adultos. David Oubiña, ao afirmar que o filme “é um ensaio poético da liberdade versus a autoridade”, descreve algumas das características vigorosas de Jean Vigo em seu cinema. Caroline Jaques Cubas e Karen Christine Rechia se aventuram a cotejar dois documentários catalães, Elogi de l’escola (2010) e Escolta (2014), ambos filmados no espaço escolar. O interesse das autoras é justamente o de pensar a escola, na escola, sobre a escola, através do cinema. No texto seguinte, a autora Patrícia de Moraes Lima busca certa topologia das infâncias presentes no espaço institucionalizado da escola, ao analisar o filme Ser e Ter (2002), cuja narrativa versa sobre uma pequena escola multisseriada numa cidade rural francesa. A essas quatro partes soma-se um DVD, que contém o filme de Maximiliano López, Teoria da Escola, e os documentários catalães Elogi de l’escola (2010), de Cinema en curs e A Bao A Qu, e Escolta (2014), de Pablo García Pérez de Lara, constituindo-se uma expressiva trilogia sobre o espaço, o tempo e as materialidades escolares. Somado a essas obras audiovisuais, há um registro da exposição do Museu de Arte 14


Apresentação

Moderna de São Paulo (MAM), A educação como matéria-prima, e do processo da exposição das derivas urbanas intituladas Desenhar a escola: um exercício coletivo de pensamento, em Florianópolis, expostas no Museu da Escola Catarinense (MESC) e realizadas no Instituto de Documentação e Investigação em Ciências Humanas (IDCH) do Centro de Ciências Humanas e da Educação (FAED/UDESC). Por fim, afirmamos que a ideia de elogio é diferente da de defesa, celebração, ou apologia da escola. Tomamos elogio no sentido grego de mostrar o que é, ou seja, de mostrar as virtudes da escola. O leitor por certo perceberá que os textos, filmes e exercícios não buscam idealizá-la, mas tão somente mostrá-la. Asseguramos, assim, que a escola segue existindo a cada vez que é apresentada, pois, como enuncia nossa epígrafe, “a arte de apresentar não é apenas a arte de tornar algo conhecido; é a arte de fazer algo existir”. De certa maneira, na sua “forma”, a escola é mais potente que em sua “função”.

Referência MASSCHELEIN, J.; SIMONS, M. Em defesa da escola: uma questão pública. Tradução de Cristina Antunes. 2. ed. 1. reimp. Belo Horizonte: Autêntica, 2015. (Coleção Educação: Experiência e Sentido.)

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