Be at r iz R esen de
L IMA
BARRETO e o Rio de Janeiro em fragmentos
Beatriz Resende
LIM A BA R R ETO
e o Rio de Janeiro em fragmentos 2ª edição revista (1ª edição UFRJ/Unicamp, 1993)
Copyright © 2016 Beatriz Resende Copyright © 2016 Autêntica Editora Todos os direitos reservados pela Autêntica Editora. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida, seja por meios mecânicos, eletrônicos, seja via cópia xerográfica, sem a autorização prévia da Editora. editora responsável
diagramação
Maria Amélia Mello
Guilherme Fagundes
editora assistente
Página 1: Fotografia do livro de registros do Hospital Nacional de Alienados, Rio de Janeiro, 18 de agosto de 1914. Reprodução: Bira Soares
Cecília Martins assistente editoral
Rafaela Lamas revisão
Sonja Cavalcanti Maria Theresa Tavares capa
Diogo Droschi (sobre imagem de Augusto Malta/ Coleção Gilberto Ferrez/ Acervo Instituto Moreira Salles)
Páginas 2 e 3: Hospital Nacional dos Alienados (Hospício Pedro II), Rio de Janeiro, 1890. Marc Ferrez/ Coleção Gilberto Ferrez/ Acervo Instituto Moreira Salles
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Resende, Beatriz Lima Barreto e o Rio de Janeiro em fragmentos / Beatriz Resende. -- 2. ed. rev. -- Belo Horizonte : Autêntica Editora, 2016. ISBN 978-85-8217-792-1 1. Barreto, Lima, 1881-1922 - Crítica e interpretação 2. Barreto, Lima, 1881-1922 - Visão política e social 3. Rio de Janeiro (RJ) - Usos e costumes I. Título. 15-10034 CDD-869.4 Índices para catálogo sistemático: 1. Ensaios : Literatura brasileira 869.4 apoio
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Para Ăšrsula e para DĂŠbora.
SUMÁRIO
9.
13.
PREFÁCIO Antonio Arnoni Prado INTRODUÇÃO Dentes negros e cabelos azuis CAPÍTULO 1
23.
Modernidade e cidadania no Rio de Janeiro da Primeira República
24.
O cidadão e a organização da cidade
42. Cidadania: tema da modernidade
49.
CAPÍTULO 2 Grandezas e misérias de um gênero menor
57. A crônica na transição republicana: o ceticismo de Machado de Assis 68. A crônica na Primeira República: Lima Barreto, a imprensa e o público
83.
CAPÍTULO 3 A crônica como representação da cidade
89. A cidade como paixão 95. Imagens da fragmentação 106. A cidade como teatro 112. Figurinos e papéis públicos 121. Doutores, carmens e o bandido tímido 134. A expressão das queixas do povo 146. Do hospital, eu acuso
151.
CAPÍTULO 4 Diário do hospício: a crônica da loucura
158. Negação do discurso e cidadania dilacerada 168. Os prisioneiros da passagem 174. O texto da loucura 179.
REFERÊNCIAS
PREFÁCIO
Antonio Arnoni Prado
Sobre Lima Barreto cronista, poucos estudos avançaram tanto quanto este Lima Barreto e o Rio de Janeiro em fragmentos, de Beatriz Resende. Lendo-o, o leitor interessado na obra desse libertário itinerante que o destino apagou sob a barbárie dos trópicos, tem, diante de si, o retrato inédito de um narrador moldado nas ruas pela visão dilacerada dos que não têm voz. Talvez por isso, no centro da cena que o ensaio ilumina, sejam tantos os figurantes e tão fracionados os elos entre o marginal e a metrópole, cuja modernidade a cidadania testava em suas primeiras trincheiras. Através destas, mais do que o escritor empurrado pelos conflitos que se agravavam no cotidiano das classes subalternas, é a mobilidade do cronista que Beatriz Resende fotografa como um documento de verdade entre a ficção e a história, rompendo com a limitação dos gêneros e inaugurando um espaço de investigação livre sobre a realidade do país. O dado novo em sua leitura é que não se trata mais de uma retomada da trajetória de Lima Barreto a partir de um mero olhar contrastivo, interessado apenas no perfil literário ou na personalidade intelectual do autor, tantas vezes revisitados pelos seus críticos. O Lima Barreto que este estudo desvenda é o cronista tangido pelo povo no desespero de seu cotidiano, o jornalista que faz a crítica da imprensa e recupera, nos múltiplos registros de texto, o relato vivo da cidadania 9
ameaçada, num Rio de Janeiro tumultuado com a presença cada vez maior dos pobres e desprotegidos. No curso do confronto aberto pelo desemprego, pela ameaça da imigração que fazia aumentar a massa circulante numa época de endividamento, de sublevações e de grandes reformas (lembremos o Encilhamento, o Bota-Abaixo de Pereira Passos, o Levante da Armada, a Revolta da Vacina), o foco que o ensaio persegue é o do exílio de Lima Barreto naquele “mar de analfabetos” visto pelas elites através do monóculo cívico de Olavo Bilac e recortado em dois tempos distintos – o tempo da truculência institucional da ordem em crise e o tempo da solidariedade dispersa dos figurantes anônimos que traçavam nas ruas um novo mapa da cidade. Se no percurso desta trajetória rebatem fundo alguns tantos vislumbres do anarquista romântico que o saudoso Francisco de Assis Barbosa, em sua magistral biografia, nos revelou no Lima Barreto da imprensa militante (recordo, além da Floreal, sua passagem pela Voz do Trabalhador, A Lanterna, Spartacus, A Patuleia, entre outros), agora o recorte é outro, e o leitor verá que o movimento particular do ensaio é justamente o de avaliar a modernidade latente das crônicas de Lima Barreto com vistas a enquadrá-la no movimento geral de reavaliação da cidadania e da cultura naquele ritmo vertiginoso que os novos tempos anunciavam. As referências, como é natural, são outras e as fontes teóricas recuperam de um novo ângulo a resistência e o não lugar do demônio social que blasfema sob o olhar atarantado dos grã-finos. O resultado é um Lima Barreto repensado como um dos sinais da escrita viva que reaparece, a cada passo, por entre os impasses da modernização, num contexto que Beatriz rastreia meticulosamente, vindo das distinções de Walter Benjamin, sobre o lugar social do narrador, para o Roland Barthes do prazer do texto, ou mesmo das anotações de Hannah Arendt sobre a dupla face da cidadania, sem esquecer as restrições de Marshall Berman sobre o artificialismo sustentado das grandes metrópoles. Tudo mediado, como o leitor verá, pela convicção de que, já em Lima Barreto, o tema da modernidade em arte se constituiu sempre na recusa [...] da forma fixa, entendendo-se o arcaísmo não apenas como adoção de uma linguagem e de uma gramática que não dão conta 10
do discurso que a nova ordem pressupõe, mas sobretudo como uma tenaz resistência à incorporação dos novos personagens da vida pública, do chauffeur ao favelado expulso do cortiço demolido, do flâneur ao morador do subúrbio, da aborteira à divorciada.1
Na mobilidade crítica desse cronista que funde a alusão ficcional, o registro histórico e a notação biográfica, Beatriz Resende descobre um “gramsciano avant la lettre”, dilacerado pela convulsão da cidade, mas sem deixar de amar com sofreguidão cada minuto vivido num Rio de Janeiro cuja identidade ajudou a construir. Lendo-o sob essa ótica, o leitor como que atravessa o espaço da comuna ideal para reviver, colado à cena, a miragem da modernidade desfigurante que Ángel Rama nos descreveu em sua cidade das letras. Como sabemos, é dentro de seus limites que se multiplicam, ad infinitum, os sonhos dos figurantes que contracenam à margem em busca da dignidade que lhes é negada. Por ela marchou Baudelaire fustigando a miséria dos trapeiros para que se convertessem em homens. A ela retornamos para refazer os passos de um Lima Barreto que interroga a fugacidade do novo, sacudindo o amor-próprio dos párias e canalizando as amarguras do povo.
Conferir p. 48 desta edição.
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