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TERRENCE REAL
prefácio de Bruce Springsteen
tradução de Elisa Nazarian
Como criar conexões mais profundas e fortalecer seus relacionamentos
Copyright © 2022 Terry Real
Copyright do prefácio © 2022 Bruce Springsteen
Copyright © 2023 Editora Vestígio
Título original: Us: Getting Past You & Me to Build a More Loving Relationship
Todos os direitos reservados pela Editora Vestígio. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida, seja por meios mecânicos, eletrônicos, seja via cópia xerográfica, sem a autorização prévia da Editora.
Embora este seja um trabalho de não ficção, os indivíduos descritos neste livro são composições de muitas pessoas com as quais o autor trabalhou ao longo dos anos. Qualquer semelhança com qualquer pessoa viva ou morta é inteiramente acidental e coincidente.
direção editorial
Arnaud Vin
editora responsável
Bia Nunes de Sousa
revisão
Claudia Vilas Gomes
Samira Vilela
capa e projeto gráfico Diogo Droschi
diagramação
Christiane Morais de Oliveira
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil
Real, Terrence
Nós : como criar conexões mais profundas e fortalecer seus relacionamentos / Terrence Real ; tradução Elisa Nazarian ; prefácio Bruce Springsteen. -- 1. ed. -- São Paulo : Vestígio, 2023.
Bibliografia
Título original: Us : Getting Past You & Me to Build a More Loving Relationship.
ISBN 978-85-54126-87-2
1. Casais - Psicologia 2. Conflito interpessoal 3. Relacionamento - Homemmulher
4. Pessoas casadas - Psicologia I. Springsteen, Bruce. II. Título.
23-145333 CDD-306.7
Índices para catálogo sistemático:
1. Amor : Relacionamentos homem-mulher : Sociologia 306.7
Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129
A VESTÍGIO É UMA EDITORA DO GRUPO AUTÊNTICA
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Para minha querida família, Belinda, Justin e Alexander. Vocês são a luz no meu firmamento.
E em memória do Grande Apreciador, um dos melhores companheiros do mundo, Rich Simon.
PREFÁCIO
“Este mundo não nos pertence. Pertencemos um ao outro.”
Terrence Real
No início dos meus 30 anos, me dei conta de que, do jeito que as coisas andavam, jamais teria o que queria. Uma vida plena, um lar, ser uma pessoa plena, ter uma companhia e um lugar numa comunidade de vizinhos e amigos, tudo isso parecia estar fora do meu alcance. Eu não tinha a perspicácia, a coragem ou a habilidade para fazer acontecer uma vida real. Era um dos músicos de maior sucesso do planeta, mas trabalho é trabalho, vida é vida, e não são a mesma coisa. Ainda mais frustrante, o que me fazia ser bom no meu trabalho – minha tolerância tranquila e certa avidez pelo isolamento da criatividade, minha capacidade de ficar à vontade para me conectar de modo profundo comigo mesmo e transferir toda a minha energia para o trabalho durante dias, semanas, anos – condenou minha vida pessoal ao fracasso. Eu levava uma existência solitária, mas que parecia segura. Então, aos 32 anos, me deparei com um impasse emocional e percebi que estava perdido numa floresta escura, em grande parte cultivada por mim mesmo, sem um mapa. Assim, tiveram início quarenta anos de tentativas para encontrar meu caminho em meio a árvores sombreadas até o rio de uma vida sustentável. Com ajuda, no começo da maturidade, me dei conta de que estava sujeito a um legado passado de geração a geração na minha
família ítalo-irlandesa. Uma transmissão lenta e persistente de doença mental e disfunção se manifestou na minha vida como uma depressão profunda e recorrente e uma paralisia emocional. Tinha medo de expor minha vida íntima a qualquer um, sem contar os 20 mil estranhos no palco mais próximo. A democracia do olho no olho, do verdadeiro amor adulto, provocava medo e insegurança no fundo do meu coração. Enquanto isso, sentia o relógio da minha vida assinalar as coisas que queria fazer e o que queria me tornar.
Então, como transformar tal legado? Como se rompe a cadeia do trauma e da doença, cujo preço é agravado a cada geração seguinte? Como Terry diz: “A patologia familiar é como um incêndio na mata, derruba tudo o que existe à frente até que alguém enfrente as chamas”. Aos poucos, comecei a enfrentar aquelas chamas, sobretudo porque não podia suportar a ideia de falhar com meus próprios filhos, minha família, da maneira que sentia que outros tinham falhado comigo. E, no fim das contas, o modo como honramos nossos pais e seus esforços é prosseguindo com suas benesses e fazendo o possível para não transmitir suas dificuldades e seus defeitos para nossos próprios filhos. Os pecados dos nossos filhos devem ser deles mesmos. Apenas através do empenho na transformação é que nossos familiares, aqueles que vieram antes de nós, deixarão de ser os fantasmas que nos assombram e passarão a ser os ancestrais que amamos e de quem precisamos para andar ao nosso lado. Trabalhar um tantinho disso levou um longo tempo na minha vida, e ainda hoje é um trabalho diário. Meus filhos terão muito trabalho a ser feito por eles mesmos, mas todos nós temos o que aprender para conquistar nossa própria maturidade. Sob um ponto de vista mais amplo, o preço que pagamos como sociedade pelo nosso individualismo e patriarcalismo tóxicos é nosso permanente distanciamento uns dos outros. Se não consigo me conectar com você, não consigo me conectar conosco. Seja por racismos, diferenças de classe, seja por qualquer das inúmeras pragas sociais, o custo é sempre o mesmo: um sistema fragmentado e disfuncional que nos impede de reconhecer o outro e de nos importar com ele, mesmo que façamos isso com um coração imperfeito, mas
pleno. Terry escreve com amor e generosidade, inteligência e força, e seu livro é lindo e importante, em especial no momento que estamos vivendo, porque nos ajuda na condução de um caminho para uma sociedade mais forte e nobre no que se refere a amor, justiça e respeito. Terry estabeleceu um processo pelo qual podemos começar a entender nosso lugar na nossa família e na sociedade. Fiz muito esforço e tive sorte. Com o passar dos anos, encontrei alguns guias muito bons em meio àquela floresta escura a caminho daquele rio de vida. Para mim e minha esposa, Patti, Terrence Real tem sido um desses guias, e este livro é um mapa através daquelas árvores.
Cuidem-se e sigam em frente, Bruce Springsteen
QUAL DAS SUAS VERSÕES APARECE NO SEU RELACIONAMENTO?
Você já se sentiu como se fosse um passageiro involuntário nas suas próprias interações? Você diz consigo mesmo, uma dúzia de vezes, que dessa vez não vai perder o controle com seu filho, colega, familiar ou cônjuge, mas no calor do momento, ai, ai, ai, lá vai: a grosseria, a voz alterada, a enxurrada de coisas que você pensa “de verdade”.
Talvez você não seja do tipo explosivo. Em vez de atacar, você se fecha, ou por estar desgostoso (Não preciso disto!) ou sobrecarregado (Não posso lidar com isto!), ou os dois ao mesmo tempo.
Talvez você não seja agressivo nem retraído. Talvez, em grande parte, você seja moderado, equilibrado e sensível – só que seu companheiro não é.
Bem-vindo à humanidade.
O que você deseja, no fim das contas, é que o entendam ou que ao menos o deixem em paz. Mas as rédeas foram arrancadas das suas mãos, e você se vê galopando para a beira de um despenhadeiro.
Às vezes, você vê tudo acontecer, sabendo que está errado, sabendo que não quer fazer isso. Em outros momentos, abandona suas boas intenções, pula nas costas do cavalo e puxa as rédeas ainda com mais força. Grita mais alto. Se fecha de um jeito ainda mais impenetrável.
Mais cedo ou mais tarde – em alguns minutos, horas, dias, até semanas –, você volta a si. E aí é hora de reparar os danos. Ou simplesmente de varrer tudo para debaixo do tapete e seguir em frente. Até acontecer de novo.
Você não se cansa disso tudo? Não se arrepende? Aposto que não é assim que quer viver, e você vive se prometendo que dessa vez será diferente, ou os outros estarão diferentes. E de fato as coisas ficam bem por um tempo, talvez até por um bom tempo – até que o outro se afaste com frieza e sem amor, ou até que seja desrespeitoso e volte a tomar liberdade. Você só quer que te compreendam, você tem o direito, você precisa que te ouçam! Ou talvez você só queira que não te perturbem. Por que não podem apenas aceitar como você é? É um relacionamento, não um curso de autoaperfeiçoamento permanente!
Dizem que, no mundo, existem dois tipos de casais: aqueles que brigam e aqueles que se distanciam. 1 Eu acrescentaria um terceiro: aqueles que fazem as duas coisas. Um critica, enquanto o outro se fecha.
Especializei-me em relacionamentos há muito tempo. Já dei palestras e workshops sobre relacionamentos superlativos em empresas, para o público em geral e também para psicoterapeutas por todo o mundo. Por mais de três décadas, milhares de profissionais em saúde pública e coaches corporativos praticaram um modelo de terapia que criei chamado Terapia de Vida Relacional, e inúmeros indivíduos e casais se beneficiaram disso.
Se você se vê, com frequência, brigando com seu companheiro, se sente que ninguém te ouve, ou se sente frustrado, menosprezado ou demasiado controlado, excluído, isolado e solitário, ou apenas maltratado, este livro oferece uma maneira supernova de se relacionar. De mudar a forma como você se vê em relação ao seu companheiro para que sua vida não seja nem um deserto, nem uma batalha. Neste livro, peço que você faça algo bem revolucionário, algo que exigirá mudar algumas partes fundamentais da sua identidade – para muitos de vocês, para começo de conversa, exigirá mudar até o que pensam sobre si mesmos como ser humano.
E prometo que valerá a pena – na verdade, é a única maneira de acabar com o embate. Muitos casais têm uma briga atrás da outra, sem resolver grande coisa, ou um ou os dois recuam e começam a viver “sozinhos juntos”. Aqui você aprenderá como se reconectar, primeiro consigo mesmo, com seus sentimentos, suas necessidades e seus desejos, porque os ótimos relacionamentos começam com seu relacionamento consigo mesmo. Depois, você aprenderá as habilidades de uma tecnologia de relacionamento sofisticada e prática criada para ensinar como obter mais do que você quer no seu relacionamento com os outros, como ir além daquelas árvores sombreadas até o rio sustentável da vida.
Não será fácil, como imagino que já saiba. Porque, se estiver lendo este livro, é provável que tenha experiência em primeira mão com uma verdade básica: os relacionamentos podem ser um inferno. No combate íntimo dos relacionamentos pessoais, perdemos com frequência, em maior ou menor escala, repetidas vezes. Esquecemos que a pessoa que estamos trucidando ou isolando é aquela com quem mais nos importamos. Olhamos para nosso companheiro pelo lado errado de um telescópio, e ele parece lamentável, opressivo ou ambos. É aí que alguém como eu entra. Tenho orientado casais, colegas de trabalho e líderes empresariais e sociais em grande parte da minha carreira. Sou um sujeito da reviravolta. As pessoas me procuram quando estão à beira do desastre, quando ninguém até então foi capaz de ajudar. Sou um terapeuta de casal especialista em psicologia masculina, questões de gênero, traumas e poder.
A Terapia de Vida Relacional é conhecida por produzir de forma rápida uma mudança profunda e permanente nos indivíduos e nos seus relacionamentos. Ela ensina homens, mulheres e pessoas não binárias a viver, com qualidade, uma vida relacional de conexão radicalmente honesta, destemidamente assertiva e entusiasmada com eles mesmos e com aqueles que amam. Os terapeutas de vida relacional quebram muitas das regras que aprendemos na faculdade. Por exemplo, não somos neutros. Quando se trata de responsabilidade, nem todos os problemas são uma divisão igual meio a meio.
Tomamos partido. E não nos escondemos atrás de uma máscara de profissionalismo. Fazemos questão de sermos pessoas reais, compartilhando, quando for o caso, nossa própria jornada em direção à completude e à intimidade.2
Este livro é um convite, o mesmo convite que eu e outros terapeutas de vida relacional oferecemos aos nossos clientes todos os dias. É um convite para de fato dominar um conjunto sofisticado de habilidades, uma tecnologia. É custoso, não vou mentir, mas, depois que você aprende, ele tem o poder de fazer você e seu companheiro chegarem a um nível de proximidade, confiança, solidez e alegria que deixa as normas da nossa cultura no chinelo. Você gostaria de ser ouvido? E também conseguir satisfazer a necessidade do outro de ser ouvido? Gostaria de se lembrar que, mesmo no calor do momento, ou em momentos de distanciamento, vocês estão do mesmo lado?
LEMBRANDO O AMOR
Antes que você afie sua língua, antes que se feche ainda mais, me deixe lembrar que você ama essa pessoa. E é aí que está o problema, meu amigo e minha amiga. Você se lembra, de verdade, naquele momento acalorado, quando o medo ou a raiva justificada correm pelas suas veias, que você ama essa pessoa? Você se lembra disso quando seu corpo se fecha, e, por mais que tente, mal consegue soltar uma ou duas palavras? A resposta seria, se você for bem honesto consigo mesmo, não. No auge da discussão, a ternura entre vocês, a sensação de serem um time que enfrenta o mundo junto, a sensação de nós, fica quase impossível de localizar.
A boa notícia é que o amor continua ali. A má notícia é que ele foi guardado em partes do seu cérebro, corpo e sistema nervoso que, naqueles rápidos momentos, você já não ocupa. Seu sistema endócrino está em alerta máximo, bombeando estimulantes na sua corrente sanguínea. Seu sistema nervoso autônomo – bem abaixo da sua consciência – está em luta ou fuga, estimulando-o ou fechando-o. As funções mais importantes do seu cérebro (o córtex pré-frontal,