O mundo ainda é jovem - Conversas sobre o futuro próximo com Maria Serena Palieri

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Do mesmo autor do best-seller O ócio criativo

DOMENICO DE MASI

O MUNDO AINDA É JOVEM CONVERSAS SOBRE O FUTURO PRÓXIMO

com Maria Serena Palieri



DOMENICO DE MASI

O MUNDO AINDA É JOVEM CONVERSAS SOBRE O FUTURO PRÓXIMO

com Maria Serena Palieri

TRADUÇÃO:

Sieni Cordeiro Campos e Reginaldo Francisco


Copyright © 2019 Domenico De Masi Copyright © 2019 Editora Vestígio

Título original: Il mondo è giovane ancora. Conversazione sul futuro con Maria Serena Palieri

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revisão

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editoras responsáveis

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capa

Diogo Droschi

editora assistente

diagramação

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Waldênia Alvarenga

preparação de texto

Sonia Junqueira

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil

Masi, Domenico De, 1938O mundo ainda é jovem : conversas sobre o futuro próximo com Maria Serena Palieri / Domenico De Masi ; tradução Sieni Cordeiro Campos, Reginaldo Francisco. -- 1. ed. -- São Paulo : Vestígio, 2019. Título original: Il mondo è giovane ancora. Conversazione sul futuro con Maria Serena Palieri ISBN 978-85-54126-49-0 1. Conversa 2. Ciências sociais - Filosofia 3. Ciência política - Filosofia 4. Palieri, Maria Serena I. Título. 19-28562 CDD-300.1 Índices para catálogo sistemático: 1. Ciências sociais : Filosofia 300.1 Maria Alice Ferreira - Bibliotecária - CRB-8/7964

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7 APRESENTAÇÃO 9 INTRODUÇÃO 13 DESORIENTAÇÃO E PROJETO 35 LONGEVIDADE E VELHICE 61 ANDROGINIA E GÊNEROS 79 DIGITAIS E ANALÓGICOS 99 TRABALHO, ÓCIO 129 MEDO E CORAGEM 167 ENGAJAMENTO E EGOÍSMO 195 CLASSE E INDIVÍDUOS 223 INTELIGÊNCIA E SENTIMENTOS 247 FELICIDADE E LEVEZA 265 ADVERTÊNCIA



APRESENTAÇÃO Roberto D’Avila

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m mais de quatro décadas entrevistando e conhecendo personalidades em todo o mundo, aprendi que nem sempre um grande artista ou intelectual renomado é uma pessoa admirável. Domenico De Masi, com quem convivo há mais de vinte anos, é daquelas pessoas peculiares, que somam as duas características. Mimmo, como é conhecido pelos seus amigos, fez de sua extensa e importante obra um estilo de vida, e posso afirmar que, entre os grandes que conheci na minha longa trajetória profissional e pessoal, ele é dos maiores. Oscar Niemeyer, um de seus queridos amigos, dizia que encontrá-lo era sempre uma imensa alegria: “O De Masi é o homem mais feliz que eu conheci”. Sociólogo de formação, Mimmo é muito mais do que um formulador e um estudioso das teorias do comportamento de países e povos. Ele é um filósofo que transita entre os livros, as pessoas e a vida com a mesma paixão e profundidade intelectual. Dono de uma memória invejável e de uma cultura enciclopédica, esse pensador original mantém o espírito livre e crítico enquanto nos ensina a melhor compreender o mundo e a viver nele com mais alegria embalados pelos mistérios da existência. Há vinte e cinco anos, desde que descreveu o O ócio criativo como uma “maneira inteligente de trabalhar e ao mesmo tempo se divertir”, ele nos ensina, na prática e na teoria, que a ética e o humanismo são os verdadeiros predicados que moldam um ser humano melhor. Como ensinar ou falar em ética se não a praticarmos no nosso dia a dia? Conviver com De Masi, professor por excelência, é aprender com os seus exemplos de dignidade e elegância de espírito. Nos ensinando seja música clássica, civilização grega, seja o Império Romano, passando pela 7


Idade Média e pelos iluministas, Domenico sempre busca nos valores humanos a razão principal do homem na História. Sempre à frente do seu tempo, e com mais de 80 anos, ele é a própria definição de Marc Chagal quando chegou aos 90: “Um menino de uma certa idade”. O seu “otimismo da razão”, descrito neste livro, é ainda maior do que a “desorientação”, maneira criativa como ele explica esta época de profundas e ao mesmo tempo efêmeras mudanças em que vivemos. Extremamente atual, este livro, uma releitura de suas observações sobre política, filosofia, história e economia, é uma forma instigante e original de tentar “compreender” o mundo fluido em que vivemos. Ao mesmo tempo que nos lembra que a maior parte dos tabus está sendo varrida, nos mostra também que a democracia como conhecemos está em risco, numa época em que a política dá lugar às finanças e os líderes se transformam em meros administradores dos interesses dos poucos grupos que dominam a economia mundial. De Masi questiona, ainda, os benefícios da tecnologia. Foi-nos prometido um mundo mais transparente e igualitário, mas agora nos deparamos com a complexidade controlada por imensos e poucos atores de um mundo interconectado. Leitura obrigatória para quem quiser fazer um extenso e agradável “voo de horizonte” pela cultura universal, O mundo ainda é jovem é uma aula magna deliciosa deste que é considerado pelos seus pares um dos mais completos sociólogos da atualidade. Leia e releia este livro muitas vezes. Além de aprender muito, você vai se tornar também uma pessoa melhor.

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INTRODUÇÃO Maria Serena Palieri

O mundo ainda é jovem. Giambattista Vico

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m seu instigante livro sobre grupos criativos, A emoção e a regra, Domenico De Masi recorre ao trecho inicial da autobiografia de Stefan Zweig, O mundo de ontem, para evocar o mundo no qual floresceu o trabalho de Michael Thonet, o mestre do design. Mais especificamente, às palavras com as quais o grande escritor austríaco descreve, em 1941, a “Austria felix”1 – de onde ele próprio fora projetado para uma paisagem nova e feroz, instável e precária –, varrida pela Primeira Guerra Mundial. Judeu, refugiado no Brasil, morreria suicida no ano seguinte. Aqui está a página: “Ao tentar encontrar uma definição prática para o tempo antes da Primeira Guerra Mundial, no qual me criei, espero acertar dizendo: foi a época áurea da segurança”. Prossegue Zweig: “Tudo na nossa monarquia austríaca quase milenar parecia estar fundamentado na perenidade, e o próprio Estado parecia ser o avalista supremo dessa estabilidade. Os direitos que concedia aos seus

“Austria felix”, forma simplificada de “Bella gerant alii, tu felix Austria nube”, que significa, literalmente: “Que outros façam a guerra, tu, feliz Áustria, casa-te”. A frase era o lema da Casa de Habsburgo, que usava a política matrimonial (em vez da guerra) como ferramenta para expandir seu poder. Tempos depois, a expressão passou a ser associada ao feliz modo de ser dos cidadãos chamados de “velhos austríacos” (cf. bit.ly/2Z4SdZf). (N.E.)

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cidadãos eram assegurados por escrito pelo Parlamento – a representação livremente eleita pelo povo –, e cada dever era delimitado com precisão. Nossa moeda, a coroa austríaca, circulava na forma de brilhantes peças de ouro, avalizando, assim, sua imutabilidade. Cada um sabia o que possuía e a quanto tinha direito, o que era permitido ou proibido. Tudo tinha sua norma, medida e peso bem determinados. Quem possuísse uma fortuna podia calcular exatamente quanto receberia por ano em forma de juros; o funcionário e o oficial, por sua vez, podiam confiar que encontrariam no calendário o ano em que seriam promovidos ou aposentados. Cada família tinha seu orçamento fixo, sabia de quanto precisaria para morar e para comer, para viajar no verão e para sua vida social. Além disso, invariavelmente, uma pequena quantia era reservada para imprevistos, para doenças e para o médico. Quem possuía uma casa considerava-a um porto seguro para filhos e netos. A casa e o negócio passavam de uma geração para a seguinte; enquanto a criança ainda estava no berço, já se depositava uma primeira contribuição para sua vida num cofrinho ou no banco – uma pequena ‘reserva’ para o futuro”. E conclui: “Nesse vasto reino, tudo era firme e imutável, e no posto mais elevado estava o velho imperador; mas, caso ele morresse, sabia-se (ou acreditava-se) que outro viria e que nada mudaria na ordem bem calculada. Ninguém acreditava em guerras, revoluções ou quedas. Tudo o que era radical e violento já parecia impossível numa era da razão. Esse sentimento de segurança era o bem mais almejado por milhões de indivíduos, era o ideal comum de vida”. Por que voltar a essa página de oitenta anos atrás? Porque, ao falar da “sua” Áustria, Stefan Zweig na verdade retratava o que, em todas as latitudes e em todas as épocas, pode ser o sonho de cada cidadão comum. Um sonho infantil? Sim, caso seja infantil o sonho de viver em um mundo sólido e estável, onde tudo contribui para o bem, sem imprevistos e sem ansiedade. Esse cenário não é o oposto daquele em que vivemos hoje? Este nosso mundo, onde não há um soberano que cuide de nós como um bom pai e onde – longe dos florins e das coroas de ouro puro! – até a moeda que usamos, o euro, mesmo tendo sido criada recentemente, amanhã mesmo pode desaparecer… 10


Em uma época distante, 1995, Domenico De Masi e eu escrevemos O ócio criativo, livro no qual o sociólogo apresenta, sob forma de conversa, sua teoria sobre a categoria do tempo na sociedade pós-industrial. O livro, fato raro, ainda é encontrado nas livrarias. E a expressão que De Masi cunhou à época passou a ser amplamente utilizada. Agora partimos para uma breve viagem ao futuro. Um futuro próximo: 2030, digamos. Como será o mundo nesse ano? Em seu último livro, Il lavoro nel XXI secolo [O trabalho no século XXI], De Masi (nascido em 1938) se apresenta assim: “Nasci em um pequeno vilarejo rural do sul da Itália onde ainda não havia energia elétrica nem água encanada. Ouvi rádio pela primeira vez aos 8 anos, assisti ao primeiro programa de televisão aos 16, fui trabalhar em uma grande siderúrgica aos 23 e, no ano seguinte, vi um computador pela primeira vez. Fui um dos primeiros italianos a comprar um fax, usar um celular, ter internet”. A confissão de um filho do século prossegue: “Portanto, tenho a inestimável sorte de ter vivenciado pessoalmente a passagem da sociedade de um milenar arranjo rural a um bicentenário arranjo industrial e a um inédito advento pós-industrial. Assim, pude provar como primórdios ou temer como ameaças todas as inúmeras novidades tecnológicas que marcaram essa transição e, com elas, todas as mutações antropológicas e sociais, inclusive a ascensão e o declínio das classes trabalhadora e média, o aumento exponencial da produção e o fracasso da distribuição, o acirramento da competitividade e a rejeição da solidariedade”. É essa a bagagem existencial que acompanha seu instrumental de sociólogo, com o qual, portanto, ele inicia seu caminho. Há um binômio, hoje proverbial, que Gramsci, em um artigo de 1920 publicado no semanário L'Ordine Nuovo, tomou emprestado do francês Romain Rolland: pessimismo da inteligência e otimismo da vontade. Na viagem de hoje a 2030 que empreendemos nestas páginas, De Masi opta conscientemente por uma terceira via: um “otimismo da razão”. É sob esse signo, claramente contra a corrente, que aqui se investiga uma série de palavras – dez conceitos e seus contrários –, opondo a inteligência sociológica ao nosso sentimento de desorientação e, às 11


“percepções” – fantasma que ronda nosso tempo –, dados objetivos sobre temas como idade e gêneros, mudanças tecnológicas e medos. É uma viagem a um futuro próximo que De Masi liga a uma palavra que todos amamos e ninguém pratica: “felicidade”. Mas pode um sociólogo ignorar os fenômenos do presente? Não. Assim, no capítulo final, uma advertência que é também uma despedida, lemos os sinais do “pré-fascismo” que ora se manifestam: avançaremos rumo à “felicidade” ou retrocederemos a uma época primitiva e arcaica? Para começar, é preciso circunscrever a plataforma de onde parte nosso ônibus espacial. Continue a ler. Aliás, aqui está o primeiro par: desorientação e projeto…

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