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PLATAFORMA DAS ARTES E DA CRIATIVIDADE
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A programação de 2015 do CIAJG abre sob o signo do desenho. Reunindo um conjunto de artistas que se dedicam a uma prática intensiva e, na maior parte dos casos, extensiva do desenho, “Oracular Spectacular” procura desvelar um território extraordinariamente singular do fazer artístico em que visível e invisível se revelam mutuamente e em que forma e energia se (con)fundem através de um processo ritualístico que convoca para um mesmo plano material e sensorial, consciente e inconsciente, as diferentes entidades que habitam o mundo – humana, animal, vegetal e geológica. O CIAJG reúne peças oriundas de diferentes épocas, lugares e contextos em articulação com obras de artistas contemporâneos, propondo uma re(montagem) da história da arte, enquanto sucessão de ecos, e um novo desígnio para o museu, enquanto lugar para o espanto e a reflexão.
The CIAJG's programming for 2015 opens under the central theme of drawing. “Oracular Spectacular” gathers together a group of artists who work intensively, and in most cases inclusively in the field of drawing. The exhibition aims to reveal an extraordinary and unique territory of artistic practice, in which visible and invisible dimensions reveal one another and in which form and energy are merged and (con) fused through a ritual process that
conjures up the different entities that inhabit the world – human, animal, plant and geological – towards the same material and sensory, conscious and unconscious plane. The CIAJG has brought together works from different times, places and contexts in articulation with works by contemporary artists, proposing a re(assembly) of art history, as a succession of echoes, and a new purpose for the museum – as a place for wonder and reflection.
A COMPOSIÇÃO DO AR COLEÇÃO PERMANENTE E OUTRAS OBRAS — RITUAIS COM MÁSCARAS UM FACE-A-FACE ATÉ 12 ABRIL
PARQUE NOIR RICARDO JACINTO ATÉ 12 ABRIL
CIAJG
PISOS 0 E -1 / SALAS #9-13 | GROUND AND LOWER FLOOR / ROOMS #9-13
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DANIEL BARROCA, RUI CHAFES, ALEXANDRE CONEFREY, MATTIA DENISSE, OTELO FABIÃO, JORGE FEIJÃO, RUI MOREIRA, PEDRO A. H. PAIXÃO, GONÇALO PENA, ANTÓNIO POPPE, PAULO SERRA, THIERRY SIMÕES CURADORIA NUNO FARIA COM JOÃO MARIA GUSMÃO E PEDRO PAIVA (NÚCLEO GONÇALO PENA, SALA 9)
Dar a ver, revelar, prever, trazer para o campo do visível as forças do invisível, registar, qual sismógrafo, as variações energéticas e as ínfimas alterações ou intensidades das coisas e dos corpos, projetar aquilo que ainda não existe, parece ter sido desde tempos imemoriais o papel alargado do desenho. Desenhar é, com efeito, desde a origem da humanidade e na infância de cada indivíduo, uma poderosa ferramenta para nos constituirmos, interiormente, enquanto seres viventes, e para percebermos e integrarmos as dinâmicas do meio ambiente, daquilo que nos é exterior. Desenhar está, simultaneamente, em direta articulação com o corpo, sendo por vezes pulsional, extático e fusional, sem distância reflexiva ou estruturação intelectual, e em contacto com a mente, enquanto instrumento que ordena e classifica, descreve e prescreve, projeta e designa. É tão alargada quanto específica a prática do desenho que convocamos para esta exposição. Com efeito, reunimos um plural leque de artistas que definem, com os seus trabalhos - que em alguns casos transbordam a categoria estável de desenho, declinando-se em objeto ou filme, por exemplo - um diversificado e de certa forma inclassificável conjunto de propostas. Contudo, a evidente idiossincrasia de cada um destes universos autorais deixa perpassar um poderoso lastro visionário comum, uma capacidade inaudita de produzir visões.
Ademais, há algumas características comuns a estes universos autorais que devem ser relevadas: o processo é invariavelmente mais importante que o resultado; a linguagem, omnipresente, é permanentemente posta em crise, questionada, reconfigurada, fragmentada; a energia que transportam as figuras ou as figurações sobrepõe-se sempre à forma - é mais relevante o próprio ato de aparecer, de surgir, do que aquilo que é representado. Reenviando para o título da exposição, familiar a um alargado conjunto de pessoas por ser o título de um álbum de uma conhecida banda de música pop, mas de certa forma misterioso na formulação e na terminologia, procuramos relevar o cariz ou a natureza propiciatória, divinatória, do desenho, que é tributário, por um lado, da rapidez, leveza e intuição, capacidades aliadas ao inconsciente, e, por outro lado, da minúcia, qualidade de pormenorização e de ordenação que, indiscutivelmente, possibilita. Assim, o desafio foi de revelar o modo particular como, num conjunto amplo de universos autorais, se processa, se formula o momento antes de mostrar, antes de fixar a forma ou a figura. No fundo, fazer aceder o espetador ao círculo que delimita o território interdito do ritual, o espaço do sagrado e do segredo do fazer artístico do qual o desenho participa. Oracular Spectacular convoca e faz conviver aparições, fantasmas, esconjurações, ocultações, camadas temporais e semânticas, corpos sem forma e formas sem corpo, cantos, orações e meditações, o ar e a terra, entidades humanas, vegetais e animais, num mesmo plano de significação.
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PISOS 0 E -1 / SALAS #9-13 | GROUND AND LOWER FLOOR / ROOMS #9-13
▲ Gonçalo Pena Sem Título | Untitled (ref: "the amazing vagina man"), 2008 • Lápis de cor e de cera sobre papel A4 | colour pencil and wax pencil on A4 paper • Cortesia do artista | Courtesy of the artist — António Poppe Man Sees Horse, 2004 • DVD, som | sound • Coleção | Colection Fundação Luso-Americana — Pedro A. H. Paixão Sem título | Untitled, 2007 • Lápis de cor sobre papel | colour pencil on paper • 14 x 21 cm • Coleção privada | Private colection
◀ Thierry Simões Sem título | Untitled, 2012 • Grafite sobre papel | Graphite on paper • Fotografia | Photography Pedro Tropa • Coleção | Colection Fundação Carmona e Costa
ORACULAR SPECTACULAR DRAWING AND ANIMISM Curator Nuno Faria With João Maria Gusmão and Pedro Paiva (Nucleus Gonçalo Pena, room 9)
Since time immemorial, drawing has incorporated the roles of showing, revealing, predicting, bringing invisible forces to the field of the visible, and registering, like a seismograph, energy variations and tiny changes or intensities in things and bodies - projecting that which doesn’t yet exist. Since the origin of humanity and in each person’s childhood, drawing has been a powerful tool that enables us to trace our inner identity, as living beings, and understand and integrate the dynamics of our surrounding environment. Drawing is simultaneously ecstatic and fusional, in direct correlation with the body. It is thus sometimes instinctual, without any reflective distance or intellectual structuring, that is in contact with the mind, as an instrument that sorts and classifies, describes and prescribes, projects and designates.
The practice of drawing addressed within this exhibition is thus simultaneously broad and specific. Indeed, we have brought together a wide range of artists who use their work to define a diverse and to a certain extent unclassifiable set of proposals. In some cases their works go beyond the specific category of drawing, and, for example, take the form of an object or film. However, the apparent idiosyncrasies of each of these artistic universes reveals a powerful common visionary impulse - an unprecedented capacity to produce visions. There are also some common characteristics within these artistic universes that should be identified. Firstly, the process is invariably more important than the result, Secondly, language is omnipresent and permanently undermined, questioned, reconfigured and fragmented. Thirdly, the energy carried by the figures or figurations always imposes itself above form - the very act of appearing and emerging is more relevant than that which is represented.
The title of the exhibition will be familiar to many as the title of an album by a wellknown rock band. It is also somewhat mysterious in its formulation and terminology. We thereby seek to emphasise the divinatory or propitiatory nature of drawing, which on the one hand, is dependent upon speed, lightness and intuition, i.e. skills allied to the unconscious, and, on the other hand, to painstaking detail and the intricate identification and ordering that is arguably permitted by drawing. The challenge was therefore to reveal the specific manner in which, in a wide array of artistic universes, the moment before showing something, or before setting the form or figure, is processed and formulated. Ultimately, the objective is to enable the viewer to gain entry to the circle that defines the forbidden territory of the ritual, the sacred space and the secret of artistic practice in which drawing is involved. Oracular Spectacular conjures up and brings to life apparitions, ghosts, conjurations, occultations, temporal and semantic layers, formless bodies and bodyless
forms, songs, prayers and meditations, the air and earth, human bodies, plants and animals, in the same plane of meaning. Animism (from Latin animus “soul, life”) is the worldview that non-human entities (animals, plants, and inanimate objects or phenomena) possess a spiritual essence. Animism encompasses the belief that there is no separation between the spiritual and physical (or material) world, and souls or spirits exist, not only in humans, but also in some other animals, plants, rocks, geographic features such as mountains or rivers, or other entities of the natural environment, including thunder, wind, and shadows. — Oracular adj. That which concerns the oracle; delivered in the form of an oracle. Oracle, in Ancient Greece: a Person (such as a Priest or Priestess) through whom a deity is believed to speak; the place (such as a shrine) in which a deity reveals hidden knowledge; an answer or decision given by y a deity consulted via the oracle Fig. prophecy; revelation; infallible answer; person whose advice has great authority; “to talk like an -: to speak rightly, to speak of -: to speak mysteriously. Oracular Spectacular – the second album from the American band MGMT, released by Columbia Records in 2007.
CIAJG
PISO 0 / SALA #10 | GROUND FLOOR / ROOM #10
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CURADORIA NUNO FARIA
Parque Noir é o título da surpreendente instalação que Ricardo Jacinto concebeu especificamente para o CIAJG no âmbito da exposição Parque: os cones e outros lugares. É um trabalho de charneira no percurso do artista na medida em que desenha os limiares de Parque, distinguindo entre aquilo que é da ordem da realidade e aquilo que é da ordem da representação. Define e concentra um léxico de gestos e de posições, uma disposição, dando corpo ao tema do abismo, central não só ao projeto como a todo o trabalho do autor. Introduz, ainda, um protagonista desde então omnipresente no projeto Parque, o dodecaedro, um sólido geométrico de oito faces que evoca as estruturas arquitetónicas futuristas e utópicas de Buckminster Fuller. Parque Noir é um momento particularmente relevante na evolução do projeto Parque, e também particularmente estranho, porque congela o movimento orgânico que pautava o projeto e propõe quase um ritual fúnebre – dá a ver os despojos de um combate,
reúne material utilizado nas várias peças performativas e remete para as árduas condições de trabalho e de produção a que as pessoas que nele colaboraram se submeteram durante vários anos. É uma espécie de promontório de onde se pode observar uma paisagem em voo de pássaro. PARQUE NOIR | RICARDO JACINTO Curator Nuno Faria Parque Noir is the title of a surprising installation by Ricardo Jacinto produced in the contex of the exhibition Park: cones and other places. It is a key work in the artist’s career, as it draws the limits of Parque, distinguishing between what is, in this project, from the order of reality and the order of representation. It defines and combines a lexicon of gestures and positions, a disposition, giving life to the theme of the abyss, which is central not only to the project but also to all the artist’s work. It also introduces a protagonist that has been omnipresent in the Parque project, the dodecahedron, an eight-sided geometrical solid
that evokes the futuristic, utopian architecture of Buckminster Fuller. Parque Noir is a particularly important moment in the development of Parque and is particularly strange because it congeals with the organic movement that has marked the project and proposes an almost funereal ritual. It shows the remains of a battle, includes material used in several performative pieces and demonstrates the tough working and production conditions that the people who worked on it underwent for several years. It is a kind of promontory from which we get a bird’s eye view of the landscape.
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PISO 1 / SALAS #2-6 | 1ST FLOOR / ROOMS #2-6
Máscaras da coleção de Arte Africana de José de Guimarães e dos ciclos de inverno de Trás-os--Montes da coleção do Museu do Abade de Baçal, Museu do Abade de Baçal / Direção Regional de Cultura Norte, Cinemateca Portuguesa – ANIM. Obras de: João Botelho, Catarina Alves Costa, Noémia Delgado, f.marquespenteado, José de Guimarães, Rui Moreira, Catarina Mourão, Pedro A. H. Paixão, Manuel Costa e Silva, João Pedro Vale.
◀ Rui Moreira Sem Título, 2004 • Tinta de caneta sobre papel • 121x160 cm | Fountain pen ink on paper | Col. Fundação Luso-americana
◀ Máscara | Mask • Palha; Casca de silva | straw; osier bark • Autor | Author Desconhecido | unknown • Proveniência | Source Baçal • Cortesia | Courtesy Direção Regional de Cultura Norte | Museu de Abade de Baçal, Bragança
Realizada em parceria com o Museu do Abade de Baçal, a exposição “Rituais com Máscaras: um face-a-face” estabelece uma aproximação simbólica entre o riquíssimo universo da coleção de arte africana de José de Guimarães, em espólio no CIAJG, e um importante conjunto de materiais alusivos aos rituais de inverno de várias festas transmontanas, oriundos da coleção do Museu de Abade de Baçal, em Bragança, recolhidos a partir da investigação conduzida pelo etnólogo e museólogo Benjamin Pereira entre 1999 e 2001, em colaboração com a equipa do museu bragantino. Com esta exposição, o CIAJG prossegue o escrutínio, a indagação e a apresentação de materiais recolhidos e tratados no âmbito do trabalho de campo etnográfico, uma área particularmente apetecível e familiar ao território operativo da arte contemporânea. O desafio a que nos propomos é de subverter os códigos que têm sustentado a leitura e recontextualização desses materiais, resgatando-os de um discurso disciplinar para os (re)apresentar e (re)propor no contexto indisciplinado e (a)disciplinar da arte contemporânea. Apresentamos, assim, um amplo e diversificado conjunto de objetos utilizados nesses rituais de iniciação dos rapazes bem como de materiais sonoros e videográficos, preexistentes ou originais, em diálogo com máscaras e outros objetos ritualísticos da coleção de arte africana, muitos deles produzidos para serem usados em cerimónias análogas, articulando-os, por sua vez, com obras de artistas contemporâneos que, de diversas formas, têm vindo a interessar-se pelo imaginário e, em alguns casos, a participar nas festas e nos rituais
da região transmontana, ou que partem dessa cultura ancestral para traçar paralelismos com outras culturas de outras geografias. Oscilando entre o material e o imaterial, a tradição e a contemporaneidade, o familiar e o estranho, a implicação total e o olhar distanciado e irónico, esta montagem poderá alargar o campo operativo de abordagem e entendimento da potência de um território vitalista como poucos. RITUALS WITH MASKS: FACE-TO-FACE Curator Nuno Faria Organised in partnership with the Abade de Baçal Museum, the exhibition, “Rituals with Masks: face-to-face”, establishes symbolic links between the extremely rich universe of José de Guimarães’ collection of African art, donated to the CIAJG, and an important set of materials that allude to winter rituals organized during various festivities of the Trás-os-Montes region. The latter materials have been selected from the collection of the Abade de Baçal Museum, in Bragança. They were collected during research conducted by the anthropologist and museologist Benjamin Pereira between 1999 and 2001, in collaboration with the Museum’s team. The CIAJG aims to use this exhibition in order to continue its scrutiny, investigation and presentation of materials that have been collected and processed during ethnographic fieldwork – an area that is particularly enticing and familiar to the world of contemporary art. We’ve set ourselves the challenge to subvert the codes that have sustained the interpretation and recontextualization of such materials, thus rescuing them from the discourse of their original academic dis-
cipline, in order to (re)present and (re)establish them in the undisciplined and (a) disciplinary context of contemporary art . We will thus present a broad and diversified set of objects used in these initiation rites of adolescent boys, together with pre-existing or original materials video and sound recordings. A dialogue will then be created between these items and the masks and other ritual objects chosen from the African art collection, many of which were produced for similar ceremonies. These items will be articulated with works by contemporary artists who, in various ways, have become interested in the imaginary universe of the Trás-os-Montes region and, in certain cases, have participated in the region’s festivities and rituals, or have drawn inspiration from this ancient culture in order to trace parallels with other cultures in other parts of the world. Oscillating between the material vs. immaterial, tradition vs. a contemporary outlook, familiar vs. strange, full involvement vs. a detached and ironic perspective, the assembly of this exhibition can extend the operating field of the approach and understanding of the power of a territory that has a unique vitality.
CIAJG
PISO 1 / SALAS #1-8 | 1ST FLOOR / ROOMS #1-8
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"NÃO ADMIRA QUE DURANTE MILÉNIOS O AR, QUE NINGUÉM VÊ, FOSSE IMAGINADO COMO UM SER SOBRENATURAL QUE PENETRAVA NO CORPO DOS HOMENS E LHES CONCEDIA A VIDA. UM DEUS, PORTANTO. ASSIM, FOI CONSIDERADO O AR COMO UM DEUS MUITO TEMIDO, UMAS VEZES PROTETOR, QUANDO SE DEIXAVA ASPIRAR EM HAUSTOS RECONFORTANTES, OUTRAS VEZES TERRÍVEL, QUANDO BRAMIA, SOPRAVA, ASSOBIAVA, FAZIA ESTREMECER AS ROBUSTAS ÁRVORES E AS ARRANCAVA DO SOLO, TOMBANDO-AS. UM DEUS QUE MERECIA TODA A VENERAÇÃO E RESPEITO." Rómulo de Carvalho, A Composição do Ar
CURADORIA NUNO FARIA
Representar o ar, ou seja, representar aquilo que não se vê, é, talvez desde tempos de que já não nos lembramos, uma das aspirações da prática artística. O ar é matéria e meio. É matéria (vital) sem estrutura, sopro sem corpo. É um meio: transporta coisas, engendra ideias, faz-se respirar. A tentação do ar é também uma aspiração ao voo, uma fuga ao peso, a superação da gravidade. Subir acima do horizonte para ver mais e melhor. Se pensarmos bem, o ar é aquilo que nos liga – na mais integral aceção da palavra ligação – aos corpos, às coisas, aos objetos em geral. À ínfima camada de ar, impalpável e imperscrutável, que envolve um objeto, de arte ou não, chamamos aura. Trata-se de uma qualidade inexplicável que algumas coisas transportam e que as transforma em objetos de desejo, em coisas amadas e contempladas. No CIAJG os objetos atravessam o tempo e cruzam fronteiras para estabelecerem encontros cujo sentido é mais ou menos evidente, mais ou menos visível. Porquê fazer, recolher e guardar objetos? Entre as muitas respostas plausíveis e possíveis, para além do mistério que engendra o gesto artístico ou o simples acto criador, poderíamos dizer que fazemos, recolhemos e guardamos para preservar e projetar a memória, ou seja, para sobreviver ao desaparecimento. Tanto ou mais
misterioso é saber qual o íntimo, o profundo significado de mostrar, de dar a ver. Não seria demasiado arriscado afirmar que mostramos para fundar um lugar, para nos constituirmos enquanto comunidade que partilha aspirações e temores, medos e desejos que estão para lá da nossa própria compreensão. Exumamos, escavamos, fazemos, construímos mais para compreender do que para explicar, mais para perguntar do que para afirmar. No CIAJG juntamos objetos e imagens de tempos e lugares muito distantes, por vezes sem aparente ligação, como se viessem até nós trazidos pelo vento, como se fossem sementes voadoras. Queremos refundar o museu como lugar do espanto e da reflexão, como corrente de ar e como espelho, como horizonte a perder de vista. Para isso, cruzamos diferentes linguagens e metodologias, desde a arqueologia à etnologia, passando pela história da arte; procuramos fazer conviver dimensões tantas vezes inconciliáveis como o popular, o ancestral, o artesanal, o vernacular, o conhecimento transmitido pela oralidade ou pela gestualidade; propomos lançar um olhar do lugar e do tempo em que nos encontramos sobre as mais diversas manifestações e sobrevivências materiais e imateriais da nossa cultura. Devolver ao visitante o espaço entre os objetos, as pausas para inspirar, mostrar o ar.
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PISO 1 / SALAS #1-8 | 1ST FLOOR / ROOMS #1-8
Recipiente com animal | Vessel with animal Mambila, Nigéria/ Camarões | Mambila, Nigeria/ Camaroon • Terracota | Terracotta • 46 x 24 x 32 cm CIAJG – Coleção José de Guimarães Collection José de Guimarães
Feitiço | Fetish • Bambara, Mali • Madeira, fibras, penas, tecido, camada sacrificial | wood, fibres, feathers, cloth and sacrificial layer • 196 x 21 x 28 cm • CIAJG - Coleção José de Guimarães | Collection José de Guimarães
Arte Africana, Arte pré-Colombiana e Arte Chinesa Antiga da coleção de José de Guimarães. Objetos do património arqueológico, popular e religioso. Obras de artistas contemporâneos. African Art, Pre-Columbian Art and Ancient Chinese Art of the José de Guimarães Collection. Objects of the folk, religious and archaeological heritage of the region of Guimarães. Works of contemporary artists.
Máscara Tetela | Tetela Mask • Zaire/Congo • Madeira, penas, cordas, fibras, pigmentos | Wood, feathers, cords, fibers, pigments 120 x 63 x 29 cm • CIAJG – Coleção José de Guimarães | Collection José de Guimarães
COMPOSITION OF AIR PERMANENT COLLECTION AND OTHER WORKS "It’s unsurprising that during millennia, the air - which no one can see was imagined as a supernatural being who penetrated the body of men and gave them life. A god, in effect. Thus, the air was considered to be a God who should be feared, sometimes protective, when he allows people to breathe in soothing vacuums, but at other times terrible, when he bellowed, blowed, whistled, and shook robust trees and uprooted and toppled them. A god who deserved our every reverence and respect." Rómulo de Carvalho, A Composição do Ar (Composition of Air)
Obras de / Works by Vasco Araújo Franklin Vilas Boas Otelo Fabião Jarosław Flicin´ski f.marquespenteado José de Guimarães Ricardo Jacinto Rosa Ramalho Ernesto de Sousa
To represent the air, i.e. to represent that which we can’t see, has perhaps been one of artists’ greatest aspirations, since time immemorial. Air is both matter and medium. It is matter (life) without structure, it blows but has no body. It is also a medium: it transports things, engenders ideas, enables us to breathe. The temptation posed by the air is the desire to fly, to flee from weight, to overcome gravity. To rise above the horizon and see things with greater amplitude and clarity. In fact, the air is what connects us together – in the most comprehensive meaning of the word, “connection” – it connects us to bodies, to things, to objects
in general. We use the word “aura” to describe the tiny, impalpable and inscrutable layer of air, that encompasses an object, whether an artwork or any other item. This is an inexplicable quality that some things transport and which turns them into objects of desire, into things that are loved and contemplated. At the CIAJG, objects traverse time and cross borders in order to establish encounters whose meaning is more or less clear, more or less visible. Why should we do make, collect and store objects? Amongst the many plausible and possible answers to this question, in addition to the mystery that engenders the artistic gesture or the simple creative act, we could say that we make, collect and store things, in order to preserve and project memory, i.e., to guarantee their longevity. Equally mysterious is to understand the intimate, profound meaning of showing, giving and seeing. Would it be too risky to assert that we show things in order to establish a place, to constitute ourselves as a community that shares aspirations and anxieties, fears and desires that lie beyond our understanding. We exhume, dig, make and build things more because we want to understand them, rather than to explain them, more in order to ask questions than to assert things. At the CIAJG, we combine objects and images from very distant times and places, sometimes without any apparent connection, as if they came to us brou-
ght by the wind, as if they were flying seeds. We want to refound the museum as a place of wonder and reflection, as an air stream and mirror, as an infinite horizon. For this reason, we intermingle different languages and methodologies, from archaeology to ethnology, passing through the history of art. We try to blend dimensions that are often irreconcilable, such as the popular, ancestral, artisanal, vernacular, and knowledge that is transmitted orally or by gestures. We propose to cast a gaze from the time and place in which we find ourselves, regarding the wide array of tangible and intangible manifestations and vestiges of our culture. To return to visitors the space between objects, the pauses in which they can breathe. To show the air.
CIAJG
PISO 0 / HALL CIAJG | GROUND FLOOR / HALL
f. marquespenteado • anel de catarina | catarina’s ring, 2012 • Bordado à mão e à máquina sobre tripas de animal | hand and machine embroidery on animal tripe • Coleção | Collection CIAJG
Terça a domingo, das 10h00 às 19h00, por marcação através do e-mail servicoeducativo@aoficina.pt (a última visita terá início até às 18h00) Público-alvo Maiores de 4 anos Duração 60 a 90 min. Lotação min. 10 pessoas, max. 20 pessoas Preço 2,00 eur (grupos escolares) / 5,00 eur (outros públicos)
2º sábado do mês, às 16h00 Público-alvo dos 4 aos 12 anos Duração 90 min. Lotação min. 10 pessoas, máx. 20 pessoas Preço 2,00 eur Atividade sujeita a marcação prévia com 48h de antecedência através do e-mail servicoeducativo@aoficina.pt
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“anel de catarina” faz parte de um conjunto de peças concebidas aquando da residência que o artista f.marquespenteado realizou em Guimarães durante a preparação da exposição “Para além da História” que inaugurou o Centro Internacional das Artes José de Guimarães. Partindo do tema das relíquias católicas, f.marquespenteado trabalhou com artesãos locais para realizar um conjunto de peças que estabelecem forte ressonância com alguns dos mais enraizados rituais da cidade, nomeadamente as festas dedicadas a São Gualter. Com esta peça, bordada à mão sobre tripas de animais, o artista evoca uma das mais preciosas relíquias da Igreja Católica, o prepúcio sagrado, retirado do corpo de Jesus Cristo aquando do ritual de circuncisão a que, em obediência à tradição judaica, foi submetido enquanto jovem. Esta relíquia, a que são atribuídos diversos milagres, terá sido usada por Catarina de Siena, reconhecida devota que viveu entre 1347 e 1380 (tendo morrido em Roma aos 33 anos), para assinalar o seu propalado casamento místico com Jesus, quando tinha 21 anos, em 1368.
4 aos 10 anos Desalfabeto (desenho) Trocar os pés pelas mãos (escultura) 10 aos 14 anos O avesso do volume (escultura) M/ 15 anos Superfície da pele (escultura) De 2000 a.C. a 2000 d.C. (história, artes visuais) Terça a domingo, por marcação através do e-mail servicoeducativo@aoficina.pt Duração 90 min. a 2 horas Lotação 1 turma / 25 pessoas / Preço Oficinas 2,00 eur Preço Vai e Vem (1 visita ao CIAJG + 1 oficina na escola) 2,00 eur (oferta exclusiva para IPSS e escolas públicas de Guimarães)
f. marquespenteado catarina’s ring "Catarina’s ring", is one of a set of items designed by the artist, f.marquespenteado, during his residency in Guimarães for preparation of the Beyond History exhibition, inaugurated by the José de Guimarães International Centre for the Arts. Inspired by the subject of Catholic relics, f.marquespenteado worked with local artisans to produce a set of items that establish strong resonance with some of the city’s most deeply-rooted rituals, including the festivities of São Gualter. By means of this work, hand-embroidered on animal casings, the artist evokes one of the Catholic Church’s most precious relics, the holy prepuce that was removed from the infant Jesus during circumcision, in observance of Jewish tradition. This relic - that is claimed to have worked many miracles - was worn by Catherine of Siena, a devout worshipper who lived between 1347 and 1380 (and died in Rome at the age of 33), to signal her vaunted “mystic marriage” with Jesus in 1368, when she was 21.
Centro Internacional das Artes José de Guimarães (CIAJG) Plataforma das Artes e da Criatividade
José de Guimarães International Arts Centre (CIAJG) Platform of Arts and Creativity
Horário de funcionamento terça a domingo 10h00 às 19h00 (última entrada às 18h30)
Opening hours tuesday to sunday 10am to 7pm (last visit 6.30pm)
Tarifário 4 eur / 3 eur Cartão Jovem Municipal, Cartão Jovem, Menores de 30 anos, Estudantes, Cartão Municipal de Idoso, Reformados, Maiores de 65 anos, Cartão Municipal das Pessoas com Deficiência, Deficientes e Acompanhante / Cartão Quadrilátero Cultural desconto 50% / Entrada Gratuita crianças até 12 anos / domingos de manhã (10h00 às 14h00)
Tariffs 4 eur / 3 eur Holders of the Cartão Jovem, Under 30 years, Students, Holders of the Cartão Municipal de Idoso, Reformados (Senior and Pensioner’s Card), Over 65 years, Handicapped patrons and the person accompanying them / Cartão Quadrilátero Cultural 50% discount / Free Entrance children until 12 years old / sunday morning (10 am to 2.00 pm)
Morada / Address Av. Conde Margaride, nº 175 4810-535 Guimarães Portugal Telefone / Phone + 351 253 424 715 www.ciajg.pt N 41.443249, W 8.297915
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