Guimarães Arte e Cultura | CIAJG | jornal 2º ciclo expositivo 2015

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PLATAFORMA DAS ARTES E DA CRIATIVIDADE

Neste novo ciclo expositivo convivem as obras de dois artistas de diferentes gerações, mas cujo trabalho tem incidido e de certa forma traduzido, de maneiras bem distintas, as relações que se constroem num mundo marcado pelo advento do colonialismo. Assim, é sob o signo da alteridade – os encontros e desencontros, as simetrias e as assimetrias, as identificações e as representações com e do outro, o diferente, o distante ou o exótico – que abordamos estes dois universos autorais, num contexto particularmente propício a tal reflexão. O CIAJG reúne peças oriundas de diferentes épocas, lugares e contextos em articulação com obras de artistas contemporâneos, propondo uma re(montagem) da história da arte, enquanto sucessão de ecos, e um novo desígnio para o museu, enquanto lugar para o espanto e a reflexão.

The CIAJG's programming for 2015 opens under the central theme of drawing. “Oracular Spectacular” gathers together a group of artists who work intensively, and in most cases inclusively in the field of drawing. The exhibition aims to reveal an extraordinary and unique territory of artistic practice, in which visible and invisible dimensions reveal one another and in which form and energy are merged and (con) fused through a ritual process that

conjures up the different entities that inhabit the world – human, animal, plant and geological – towards the same material and sensory, conscious and unconscious plane. The CIAJG has brought together works from different times, places and contexts in articulation with works by contemporary artists, proposing a re(assembly) of art history, as a succession of echoes, and a new purpose for the museum – as a place for wonder and reflection.

A COMPOSIÇÃO DO AR COLEÇÃO PERMANENTE E OUTRAS OBRAS — RITUAIS COM MÁSCARAS UM FACE-A-FACE ATÉ 05 JULHO


CIAJG

PISO 0 / SALAS #9-11 | GROUND FLOOR / ROOMS #9-11

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CURADORIA NUNO FARIA

O trabalho de Vasco Araújo (Lisboa, 1975) tem incidido de forma sistemática sobre a história do colonialismo europeu e sobre os seus efeitos tragicamente duradouros, do ponto de vista das dinâmicas relacionais de poder e de submissão entre homens de lugares e culturas diferentes. Após décadas de silenciamento, o período colonial tem sido objeto de um escrutínio crítico abrangente e consistente, com origem na academia mas também no campo das artes ou da literatura. Contudo, em Portugal, aquilo que terá mudado com a presente geração, que surgiu na década de 70 e depois, é um interesse que tem origem em inquietações também de ordem biográfica, que se ancora em vivências pessoais e que reage a um ensurdecedor silêncio e a uma prolongada amnésia que marcaram e ainda marcam a memória desse período que tantos traumas deixou por tratar. De facto, aquilo que torna particular a investigação do artista em torno desta temática é o seu interesse nas relações domésticas, íntimas, não confessadas, entremuros, à volta da mesa e na cama – relações tanto mais problemáticas, e consequentemente difíceis de circunscrever, quanto difusas, turvas, que misturam o exercício de poder, de controlo e de domínio com uma tessitura de relações humanas, de ordem afetiva ou sexual.

O artista traz para o seu terreno de investigação ferramentas e dados usados e recolhidos por outras disciplinas, tais como a história, a antropologia, a sociologia, para construir narrativas que se materializam em vídeo, escultura, pintura e fotografia. A exposição, produzida especificamente para o CIAJG, cruza diversas fontes, visuais ou de texto, recorre à história oral ou de proximidade, à literatura, ao património visual, da pintura de história à história da fotografia. Vasco Araújo constrói um discurso plural, sobrepõe planos de representação, o texto à imagem - não tem pudor no uso das palavras, das imagens ou dos objetos, faz-nos confrontar, por excesso e por defeito, com as nossas escolhas, as omissões, a preguiça da linguagem que usamos no quotidiano, com anos de autocensura, com o adiamento de um exame de consciência, a sós, perante nós próprios. Afinal, a história do colonialismo implica-nos, fazemos parte dela por herança, de memória, porque ouvimos falar, porque a vivemos ainda no dia-a-dia, por imperativo ético. Com a exposição individual de Vasco Araújo, “Demasiado pouco, demasiado tarde”, o CIAJG continua e aprofunda a sua vocação de perscrutar e revisitar, sob um ponto de vista simultaneamente poético e crítico, empático e distanciado, as tensões, os desejos, os afetos ou as angústias que os objetos corporizam e transportam e aquilo que revelam dos homens e da história que construímos.


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PISO 0 / SALAS #9-11 | GROUND FLOOR / ROOMS #9-11

▲ Vasco Araújo · “É nos sonhos que tudo começa”, 2014 · Pintura | Painting · Tinta negra sobre tecido impresso | Black paint on printed fabric · 180x120cm

VASCO ARAÚJO TOO LITTLE, TOO LATE Curator Nuno Faria The work of Vasco Araújo (Lisbon, 1975) has systematically focused on the history of European colonialism and its tragically long-lasting effects, from the perspective of the relational dynamics of power and submission between peoples from different places and cultures. After decades of silence, the colonial period has recently been subject to comprehensive and consistent critical scrutiny, that began in both academia and the arts or literature. However, in Portugal, the main aspect that has changed for the present generation, which emerged from the 1970s onwards, is an interest rooted in concerns which are also of a biographical nature, anchored in personal experiences and in reaction to a deafening silence and prolonged amnesia that has marked, and still marks, the memory of this period, that has left so many untreated traumas. In fact, what distinguishes the artist’s research in this field is his interest in domestic, intimate, unconfessed relationships, engendered behind closed doors, around the table and in the bed. Such relationships are even more problematic, and consequently difficult to circumscribe, the more diffuse and cloudy they are, given that the exercise of power, control and domination interweaves with a complex fabric of emotional or sexual human relationships. Vasco Araújo brings tools and data to his field of research that are normally used and collected by other disciplines – such as history, anthropology, sociology – in order to construct narratives that he materializes using video, sculpture, painting and photography. The exhibition, produced specifically for the CIAJG, intersects various visual or textual sources and draws on oral stories or proximity to literature, visual heritage, ranging from historical paintings to the history of photography. The artist thereby builds a plural discourse, in which he overlaps different planes of representation, from the text to the image – and unreservedly uses words, images or objects, to force us to confront, through excess, and by default, our choices, omissions, and the lazy language that we use in everyday life, which reflects years of self-censorship, postponing an examination of our conscience, on our own, before ourselves. After all, the history of colonialism involves all of us by ethical imperative - we form part of it, by inheritance, through our memories, and because we hear other people talk about it and still experience it in our day-to-day lives. With Vasco Araújo’s solo exhibition, “Too little, too late”, the CIAJG continues and furthers its vocation to scrutinise and revisit – from a simultaneously poetic and critical, and empathetic and distanced perspective – the tensions, desires, affections or anxieties that different objects embody and carry with them, and explore what they reveal about mankind and human history. ▲ Vasco Araújo · Capita 4, 2012 · Instalação | Installation · 14 Fotografia Digital a Cor | 14 Colour Digital Photographs · Dimensões variáveis | Variable dimensions


CIAJG

PISO -1 / SALAS #12-13 | LOWER FLOOR / ROOMS #12-13

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CURADORIA NUNO FARIA

No contexto da obra heterogénea de José de Guimarães, a pintura emerge como o principal continente, o território de onde tudo parte e aonde tudo chega. Trata-se de uma produção imensa, plural nos formatos e suportes, marcada pelas diversas incursões que o artista tem feito pelas mais distantes regiões do mundo. Uma produção porosa, aberta à experimentação, em que se pode discernir com nitidez as diferentes conquistas, as influências, os processos de maturação, a reinvenção formal, a proliferação dos materiais, a construção de um imaginário povoado de bestiários e marcado pela sucessão de diferentes alfabetos ideográficos. Apesar de ter sido na gravura que JG se iniciou e em que produziu os seus primeiros trabalhos mais relevantes, como ficou bem patente na exposição “Provas de Contacto”, que o CIAJG dedicou em 2014 aos processos de transferência da imagem na obra do artista, a pintura surge como a disciplina onde, por excelência, se processam, sintetizam e consolidam os métodos e características da obra. A exposição dará particular destaque ao período angolano, um dos mais estimulantes de todo o percurso de JG, reunindo um conjunto de trabalhos produzidos entre 1967 e 1974 que remetem para uma prática expandida da pintura, em termos de suportes, técnicas e materiais, mas sobretudo pelo seu forte pendor experimental e crítico, operando, então, uma inédita e idiossincrática síntese entre a arte pop europeia e os signos que aprendia no seu contacto com a cultura africana.

Neste contexto, mostramos vários trabalhos que faziam parte da mítica exposição que realizou no Museu de Luanda, em 1968, seguramente a primeira mostra relevante do autor, e as séries “feitiços” e “máscaras”, realizadas no início da década de 70, entre 1971 e 1973, já claramente marcadas pelos novos códigos linguísticos que seriam plasmados no seu “alfabeto africano”, realizado no mesmo período, e que viriam a ser apresentadas, respetivamente, na Galeria do CITA, em Luanda, e na galeria Dinastia, em Lisboa e no Porto, em 1973 e 1974. Contrastando com os pequenos e médios formatos apresentados neste primeiro núcleo, a segunda parte da presente exposição é constituída por pinturas de grandes dimensões reunidas sob o signo do desastre e sob o tema “Impérios do Fim”. São pinturas que questionam o sentido da história, que marcam um desencanto com o rumo sociopolítico do mundo, que denunciam os nefastos e duradouros efeitos do colonialismo europeu e dos imperialismos que lhe sucederam. “2004”, “Cartago” e “Pátria”, apresentadas em 2004 na SNBA, em Lisboa, estão entre as mais poderosas pinturas realizadas pelo artista, impressivas pela escala monumental e pelo particular processo de montagem que as constitui, como se o artista tivesse operado como um cineasta documentalista que remonta e nos reapresenta os acontecimentos a partir dos estilhaços da história.


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PISO -1 / SALAS #12-13 | LOWER FLOOR / ROOMS #12-13

▲ José de Guimarães · Pátria | Homeland, 2001-2002 · Técnica mista sobre tela | Mixed technique on canvas · CIAJG - Coleção José de Guimarães | José de Guimarães Collection

Com mais uma exposição monotemática dedicada ao trabalho de José de Guimarães, o CIAJG prossegue uma das linhas da sua missão: revisitar, reler e reapresentar a obra de um autor central do panorama artístico em Portugal, a partir do significativo espólio reunido nas suas reservas.

JOSÉ DE GUIMARÃES PAINTING: MONUMENTAL SUITES AND VARIATIONS Within the context of José de Guimarães’ heterogeneous oeuvre, painting emerges as the main continent – the land from which everything sets forth and to which everything arrives. It is an immense oeuvre, that uses multiple formats and media, marked by several incursions by the artist in the most distant regions of the world. His oeuvre is porous, open to experimentation, it which it is possible to clearly discern the different achievements, influences, maturation processes, formal reinvention, proliferation of materials, and the construction of an imaginary universe populated by bestiaries and marked by a succession of different ideographic alphabets. Although José de Guimarães initially began working in the field of engraving and produced his most relevant initial works in this medium, as highlighted in the 2014 exhibition, “Provas de Contacto (Contact Sheets)”, that the CIAJG dedicated to the image transfer processes used in the artist's oeuvre, painting nonetheless emerges as the discipline in which, par excellence, he processed, summarized and consolidated the methods and characteristics of his works.

This exhibition will place special emphasis on the Angolan period, one of the most exciting phases in his overall career, encompassing a collection of works produced between 1967 and 1974 that indicate an expanded practice of painting in terms of the media, techniques and materials used, and above all a strong experimental and critical outlook, which at the time achieved a unique and idiosyncratic synthesis of European pop art and the signs that he discovered through his contact with African culture. In this context, we display several works that were shown within the mythical exhibition at the Museum of Luanda in 1968, undoubtedly the artist’s first major exhibition, and from the series “spells” and “masks”, produced in the early 1970s, between 1971 and 1973, that were already clearly marked by the new linguistic codes that were later embodied in his “African Alphabet”, produced in the same period, presented, respectively, in CITA's gallery, in Luanda, and in Dinastia gallery, in Lisbon and Porto, in 1973 and 1974. In contrast to the small- and mediumsized formats presented in this first set of works, the second part of this exhibition consists of large-scale paintings collected under the sign of disaster and the theme of “Empires of the End”. They are paintings that question the sense

▲ José de Guimarães · Formas Africanas | African

Forms, 1972 · Acrílico sobre tela | acrylic on canvas · 200 x 149 cm · Fotografia | Photography Atelier José de Guimarães · CIAJG – Coleção | Collection José de Guimarães

of history and reveal disenchantment with the planet’s current socio-political trajectory, denouncing the harmful and lasting effects of European colonialism and its subsequent imperialist movements. “2004”, “Carthage” and “Fatherland”, presented in 2004 in the SNBA, in Lisbon, are among the most powerful paintings made by the artist, impressive in terms of their monumental scale and their specific assembly process – as if the artist had worked as a documentalist filmmaker who returns and re-presents events from the shards of history. By means of another monothematic exhibition dedicated to José de Guimarães’ oeuvre, the CIAJG is hereby pursuing one of the axes of its mission: to revisit, re-read and re-present the work of a key artist in Portugal’s art scene, using its significant collection of his works.

▲ José de Guimarães · Fim | End, 1968 · Serapilheira pintada | Painted

hessian · 252 x 110 cm · Fotografia | Photography Atelier José de Guimarães · CIAJG - Coleção José de Guimarães | José de Guimarães Collection


CIAJG

PISO 1 / SALAS #1-8 | 1ST FLOOR / ROOMS #1-8

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◀ Rui Moreira Sem Título, 2004 • Tinta de caneta sobre papel • 121x160 cm | Fountain pen ink on paper | Coleção Fundação Luso-americana

◀ Máscara | Mask • Palha; Casca de silva | straw; osier bark • Autor | Author Desconhecido | unknown • Proveniência | Source Baçal • Cortesia | Courtesy Direção Regional de Cultura Norte | Museu de Abade de Baçal, Bragança

Realizada em parceria com o Museu do Abade de Baçal, a exposição “Rituais com Máscaras: um face-a-face” estabelece uma aproximação simbólica entre o riquíssimo universo da coleção de arte africana de José de Guimarães, em espólio no CIAJG, e um importante conjunto de materiais alusivos aos rituais de inverno de várias festas transmontanas, oriundos da coleção do Museu de Abade de Baçal, em Bragança, recolhidos a partir da investigação conduzida pelo etnólogo e museólogo Benjamin Pereira entre 1999 e 2001, em colaboração com a equipa do museu bragantino. Com esta exposição, o CIAJG prossegue o escrutínio, a indagação e a apresentação de materiais recolhidos e tratados no âmbito do trabalho de campo etnográfico, uma área particularmente apetecível e familiar ao território operativo da arte contemporânea. O desafio a que nos propomos é de subverter os códigos que têm sustentado a leitura e recontextualização desses materiais, resgatando-os de um discurso disciplinar para os (re)apresentar e (re)propor no contexto indisciplinado e (a)disciplinar da arte contemporânea. Apresentamos, assim, um amplo e diversificado conjunto de objetos utilizados nesses rituais de iniciação dos rapazes bem como de materiais sonoros e videográficos, preexistentes ou originais, em diálogo com máscaras e outros objetos ritualísticos da coleção de arte africana, muitos deles produzidos para serem usados em cerimónias análogas, articulando-os, por sua vez, com obras de artistas contemporâneos que, de diversas formas, têm vindo a interessar-se pelo imaginário e, em alguns casos, a participar nas festas e nos rituais

da região transmontana, ou que partem dessa cultura ancestral para traçar paralelismos com outras culturas de outras geografias. Oscilando entre o material e o imaterial, a tradição e a contemporaneidade, o familiar e o estranho, a implicação total e o olhar distanciado e irónico, esta montagem poderá alargar o campo operativo de abordagem e entendimento da potência de um território vitalista como poucos. RITUALS WITH MASKS: FACE-TO-FACE Curator Nuno Faria Organised in partnership with the Abade de Baçal Museum, the exhibition, “Rituals with Masks: face-to-face”, establishes symbolic links between the extremely rich universe of José de Guimarães’ collection of African art, donated to the CIAJG, and an important set of materials that allude to winter rituals organized during various festivities of the Trás-os-Montes region. The latter materials have been selected from the collection of the Abade de Baçal Museum, in Bragança. They were collected during research conducted by the anthropologist and museologist Benjamin Pereira between 1999 and 2001, in collaboration with the Museum’s team. The CIAJG aims to use this exhibition in order to continue its scrutiny, investigation and presentation of materials that have been collected and processed during ethnographic fieldwork – an area that is particularly enticing and familiar to the world of contemporary art. We’ve set ourselves the challenge to subvert the codes that have sustained the interpretation and recontextualization of such materials, thus rescuing them from the discourse of their original academic dis-

cipline, in order to (re)present and (re)establish them in the undisciplined and (a) disciplinary context of contemporary art . We will thus present a broad and diversified set of objects used in these initiation rites of adolescent boys, together with pre-existing or original materials video and sound recordings. A dialogue will then be created between these items and the masks and other ritual objects chosen from the African art collection, many of which were produced for similar ceremonies. These items will be articulated with works by contemporary artists who, in various ways, have become interested in the imaginary universe of the Trás-os-Montes region and, in certain cases, have participated in the region’s festivities and rituals, or have drawn inspiration from this ancient culture in order to trace parallels with other cultures in other parts of the world. Oscillating between the material vs. immaterial, tradition vs. a contemporary outlook, familiar vs. strange, full involvement vs. a detached and ironic perspective, the assembly of this exhibition can extend the operating field of the approach and understanding of the power of a territory that has a unique vitality.


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PISO 1 / SALAS #1-8 | 1ST FLOOR / ROOMS #1-8

CURADORIA NUNO FARIA

"Não admira que durante milénios o ar, que ninguém vê, fosse imaginado como um ser sobrenatural que penetrava no corpo dos homens e lhes concedia a vida. Um deus, portanto. Assim, foi considerado o ar como um deus muito temido, umas vezes protetor, quando se deixava aspirar em haustos reconfortantes, outras vezes terrível, quando bramia, soprava, assobiava, fazia estremecer as robustas árvores e as arrancava do solo, tombando-as. Um deus que merecia toda a veneração e respeito." Rómulo de Carvalho, A Composição do Ar

— Representar o ar, ou seja, representar aquilo que não se vê, é, talvez desde tempos de que já não nos lembramos, uma das aspirações da prática artística. O ar é matéria e meio. É matéria (vital) sem estrutura, sopro sem corpo. É um meio: transporta coisas, engendra ideias, faz-se respirar. A tentação do ar é também uma aspiração ao voo, uma fuga ao peso, a superação da gravidade. Subir acima do horizonte para ver mais e melhor. Se pensarmos bem, o ar é aquilo que nos liga – na mais integral aceção da palavra ligação – aos corpos, às coisas, aos objetos em geral. À ínfima camada de ar, impalpável e imperscrutável, que envolve um objeto, de arte ou não, chamamos aura. Trata-se de uma qualidade inexplicável que algumas coisas transportam e que as transforma em objetos de desejo, em coisas amaCOMPOSITION OF AIR PERMANENT COLLECTION AND OTHER WORKS "It’s unsurprising that during millennia, the air - which no one can see was imagined as a supernatural being who penetrated the body of men and gave them life. A god, in effect. Thus, the air was considered to be a God who should be feared, sometimes protective, when he allows people to breathe in soothing vacuums, but at other times terrible, when he bellowed, blowed, whistled, and shook robust trees and uprooted and toppled them. A god who deserved our every reverence and respect." Rómulo de Carvalho, A Composição do Ar (Composition of Air)

To represent the air, i.e. to represent that which we can’t see, has perhaps been one of artists’ greatest aspirations, since time immemorial. Air is both matter and medium. It is matter (life) without structure, it blows but has no body. It is also a medium: it transports things, engenders ideas, enables us to breathe. The temptation posed by the air is the desire to fly, to flee from weight, to overcome gravity. To rise above the horizon and see things with greater amplitude and clarity. In fact, the air is what connects us toge-

ther – in the most comprehensive meaning of the word, “connection” – it connects us to bodies, to things, to objects in general. We use the word “aura” to describe the tiny, impalpable and inscrutable layer of air, that encompasses an object, whether an artwork or any other item. This is an inexplicable quality that some things transport and which turns them into objects of desire, into things that are loved and contemplated. At the CIAJG, objects traverse time and cross borders in order to establish encounters whose meaning is more or less clear, more or less visible. Why should we do make, collect and store objects? Amongst the many plausible and possible answers to this question, in addition to the mystery that engenders the artistic gesture or the simple creative act, we could say that we make, collect and store things, in order to preserve and project memory, i.e., to guarantee their longevity. Equally mysterious is to understand the intimate, profound meaning of showing, giving and seeing. Would it be too risky to assert that we show things in order to establish a place, to constitute ourselves as a community that shares aspirations and anxieties, fears and desires that lie beyond our understanding. We exhume, dig, make and build things more because we want to understand them, rather than to ex-

das e contempladas. No CIAJG os objetos atravessam o tempo e cruzam fronteiras para estabelecerem encontros cujo sentido é mais ou menos evidente, mais ou menos visível. Porquê fazer, recolher e guardar objetos? Entre as muitas respostas plausíveis e possíveis, para além do mistério que engendra o gesto artístico ou o simples acto criador, poderíamos dizer que fazemos, recolhemos e guardamos para preservar e projetar a memória, ou seja, para sobreviver ao desaparecimento. Tanto ou mais misterioso é saber qual o íntimo, o profundo significado de mostrar, de dar a ver. Não seria demasiado arriscado afirmar que mostramos para fundar um lugar, para nos constituirmos enquanto comunidade que partilha aspirações e temores, medos e desejos que estão para lá da nossa própria compreensão. Exumamos, escavamos, fazemos, construímos mais para compreender do que para explicar, mais para perguntar do que para afirmar. No CIAJG juntamos objetos e imagens de tempos e lugares muito distantes, por vezes sem aparente ligação, como se viessem até nós trazidos pelo vento, como se fossem sementes voadoras. Queremos refundar o museu como lugar do espanto e da reflexão, como corrente de ar e como espelho, como horizonte a perder de vista. Para isso, cruzamos diferentes linguagens e metodologias, desde a arqueologia à etnologia, passando pela história da arte; procuramos fazer conviver dimensões tantas vezes inconciliáveis como o popular, o ancestral, o artesanal, o vernacular, o conhecimento transmitido pela oralidade ou pela gestualidade; propomos lançar um olhar do lugar e do tempo em que nos encontramos sobre as mais diversas manifestações e sobrevivências materiais e imateriais da nossa cultura. Devolver ao visitante o espaço entre os objetos, as pausas para inspirar, mostrar o ar. plain them, more in order to ask questions than to assert things. At the CIAJG, we combine objects and images from very distant times and places, sometimes without any apparent connection, as if they came to us brought by the wind, as if they were flying seeds. We want to refound the museum as a place of wonder and reflection, as an air stream and mirror, as an infinite horizon. For this reason, we intermingle different languages and methodologies, from archaeology to ethnology, passing throu-

gh the history of art. We try to blend dimensions that are often irreconcilable, such as the popular, ancestral, artisanal, vernacular, and knowledge that is transmitted orally or by gestures. We propose to cast a gaze from the time and place in which we find ourselves, regarding the wide array of tangible and intangible manifestations and vestiges of our culture. To return to visitors the space between objects, the pauses in which they can breathe. To show the air.


CIAJG

HALL CIAJG | HALL OF THE CIAJG

▲ f. marquespenteado • anel de catarina |

catarina’s ring, 2012 • Bordado à mão e à máquina sobre tripas de animal | hand and machine embroidery on animal tripe • Coleção | Collection CIAJG

Terça a domingo, das 10h00 às 19h00, por marcação através do e-mail servicoeducativo@aoficina.pt (a última visita terá início até às 18h00) Público-alvo Maiores de 4 anos Duração 60 a 90 min. Lotação min. 10 pessoas, max. 20 pessoas  Preço 2,00 eur (grupos escolares) / 5,00 eur (outros públicos)

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“anel de catarina” faz parte de um conjunto de peças concebidas aquando da residência que o artista f.marquespenteado realizou em Guimarães durante a preparação da exposição “Para além da História” que inaugurou o Centro Internacional das Artes José de Guimarães. Partindo do tema das relíquias católicas, f.marquespenteado trabalhou com artesãos locais para realizar um conjunto de peças que estabelecem forte ressonância com alguns dos mais enraizados rituais da cidade, nomeadamente as festas dedicadas a São Gualter. Com esta peça, bordada à mão sobre tripas de animais, o artista evoca uma das mais preciosas relíquias da Igreja Católica, o prepúcio sagrado, retirado do corpo de Jesus Cristo aquando do ritual de circuncisão a que, em obediência à tradição judaica, foi submetido enquanto jovem. Esta relíquia, a que são atribuídos diversos milagres, terá sido usada por Catarina de Siena, reconhecida devota que viveu entre 1347 e 1380 (tendo morrido em Roma aos 33 anos), para assinalar o seu propalado casamento místico com Jesus, quando tinha 21 anos, em 1368.

4 aos 10 anos Desalfabeto (grafismo, pintura, conto) Trocar os pés pelas mãos (escultura, figura, cartão) 10 aos 14 anos O avesso do volume (escultura, moldes, barro) GLOBO – rota do corpo à imaginação (desenho, corpo, geografia) M/ 15 anos Superfície da pele (escultura, moldes, cera) De 20000 a.C a 2000 d.C. (história, artes visuais) Fora do papel (desenho, arquitetura, espaço)

09 maio, 06 junho e 11 julho Horário 16h00 Público-alvo dos 4 aos 12 anos Duração 90 min. Lotação min. 10 pessoas, máx. 20 pessoas Preço 2,00 eur Atividade sujeita a marcação prévia com, pelo menos, 48h de antecedência através do e-mail servicoeducativo@aoficina.pt

Terça a domingo, por marcação através do e-mail servicoeducativo@aoficina.pt Duração 90 min. a 2 horas Lotação 1 turma / 25 pessoas / Preço Oficinas 2,00 eur Preço Vai e Vem (1 visita ao CIAJG + 1 oficina na escola) 2,00 eur (oferta exclusiva para IPSS e escolas públicas de Guimarães)

f. marquespenteado CATARINA’S RING "Catarina’s ring", is one of a set of items designed by the artist, f.marquespenteado, during his residency in Guimarães for preparation of the Beyond History exhibition, inaugurated by the José de Guimarães International Centre for the Arts. Inspired by the subject of Catholic relics, f.marquespenteado worked with local artisans to produce a set of items that establish strong resonance with some of the city’s most deeply-rooted rituals, including the festivities of São Gualter. By means of this work, hand-embroidered on animal casings, the artist evokes one of the Catholic Church’s most precious relics, the holy prepuce that was removed from the infant Jesus during circumcision, in observance of Jewish tradition. This relic - that is claimed to have worked many miracles - was worn by Catherine of Siena, a devout worshipper who lived between 1347 and 1380 (and died in Rome at the age of 33), to signal her vaunted “mystic marriage” with Jesus in 1368, when she was 21.

Centro Internacional das Artes José de Guimarães (CIAJG) Plataforma das Artes e da Criatividade

José de Guimarães International Arts Centre (CIAJG) Platform of Arts and Creativity

Horário de funcionamento terça a domingo 10h00 às 19h00 (última entrada às 18h30)

Opening hours tuesday to sunday 10am to 7pm (last visit 6.30pm)

Tarifário 4 eur / 3 eur Cartão Jovem Municipal, Cartão Jovem, Menores de 30 anos, Estudantes, Cartão Municipal de Idoso, Reformados, Maiores de 65 anos, Cartão Municipal das Pessoas com Deficiência, Deficientes e Acompanhante / Cartão Quadrilátero Cultural desconto 50% / Entrada Gratuita crianças até 12 anos / domingos de manhã (10h00 às 14h00)

Tariffs 4 eur / 3 eur Holders of the Cartão Jovem, Under 30 years, Students, Holders of the Cartão Municipal de Idoso, Reformados (Senior and Pensioner’s Card), Over 65 years, Handicapped patrons and the person accompanying them / Cartão Quadrilátero Cultural 50% discount / Free Entrance children until 12 years old / sunday morning (10 am to 2.00 pm)

Morada / Address Av. Conde Margaride, nº 175 4810-535 Guimarães Portugal Telefone / Phone + 351 253 424 715 www.ciajg.pt N 41.443249, W 8.297915

Organização

Central de Informação | 2015


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