Guimarães Arte e Cultura | CIAJG | jornal 4º ciclo expositivo 2014

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O primeiro ano da programação regular do CIAJG encerra com a inauguração de duas inéditas e distintas exposições que, contudo, se estruturam em torno de um mesmo eixo: a arquitetura entendida ou proposta como campo alargado de tematização e encenação de modelos relacionais, existenciais e percetivos. Por um lado, o projeto “Parque” que Ricardo Jacinto agora retoma após sete anos de intensa atividade criativa e comunitária, entre 2001 e 2007, onde se cruzam arquitetura, música e escultura, por outro lado, “Escola do Porto: lado B”, que revisita, em forma de história oral, um conjunto de propostas de intervenção não-conformistas e indisciplinadas que, entre 1968 e 1978, no seio da ESBAP, questionaram radicalmente o modelo dominante e que, sendo algumas extraordinariamente atuais, encontram agora o lugar certo para serem reconsideradas. Apesar da paralaxe temporal e geracional, e de operarem em territórios disciplinares e em contextos socioeconómicos e ideológicos distintos, as duas mostras veiculam projetos com princípios de intervenção comuns: são modelos coletivos de criação, partilham uma conceção utópica e transgressiva do projeto enquanto potência de transformação e operam uma diluição das fronteiras entre fazeres e saberes para procurar novas formas de articular a vida e a arte. O CIAJG reúne peças oriundas de diferentes épocas, lugares e contextos em articulação com obras de artistas contemporâneos, propondo uma (re)montagem da história da arte, enquanto sucessão de ecos, e um novo desígnio para o museu, enquanto lugar para o espanto e a reflexão.

The CIAJG’s first year of regular programming now ends with the opening of two distinct exhibitions both of which are structured around the same axis: architecture understood or proposed as a broad field of thematisation and of staging of relational, existential and perceptual models. On the one hand, the project, “Park”, that Ricardo Jacinto has now resumed after a seven year period of intense creative and community activity, between 2001 and 2007, which intersects architecture, music and sculpture; and on the other hand, “Porto School: B side”, which revisits, in the form of an oral history, a series of non-conformist and undisciplined intervention proposals that took place between 1968 and 1978, within the Faculty of Architecture of Porto, and which radically questioned the dominant model and have now found the perfect place to be reconsidered in view of their topical relevance. Despite the temporal and generational parallax, and the fact that they operate in distinct disciplinary territories and socioeconomic and ideological contexts, both exhibitions convey projects that share common intervention principles. They are both collective models of artistic creation. They share a utopian and transgressive conception of the architectural project in terms of its power for transformation. And they both blur the boundaries between activities and knowledge, in order to seek new ways to articulate life and art. The CIAJG has brought together works from different times, places and contexts in articulation with works by contemporary artists, proposing a (re)assembly of art history, as a succession of echoes, and a new purpose for the museum - as a place for wonder and reflection.


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CURADORIA NUNO FARIA

A presente exposição revisita “Parque”, o mais amplo e complexo projeto de Ricardo Jacinto (Lisboa, 1975) realizado até à data, e investe o território inexplorado que ficou desenhado quando o extenso coletivo de artistas e músicos que se reuniu em torno do autor se desmembrou. Nela, encontramos ou reencontramos, sob formas diferentes, as várias peças e muitos dos elementos que compõem o projeto, mas também descobrimos novas peças e instalações, especificamente reconfiguradas ou originalmente concebidas para esta nova etapa. Constituindo-se seguramente como uma das mais fascinantes obras produzidas no contexto da arte contemporânea portuguesa na última década, “Parque” define-se como um espaço de criação coletiva e comunitária e desenvolveu-se praticamente sem interrupções entre 2001 e 2007, articulando um conjunto de três peças performativas principais com um conjunto de apresentações mais informais que documentavam as fontes, os materiais e os conceitos que consubstanciaram o projeto. Podemos situar o trabalho do artista na exata intersecção entre arquitetura, música e escultura, três áreas disciplinares em que desenvolveu formação específica. Essa confluência de linguagens confere ao seu trabalho uma complexidade reflexiva que elabora sobre o espaço e o tempo enquanto dimensões propriamente materiais da perceção, e sobre a performatividade enquanto veículo para a construção de uma retórica de apresentação ou de presentificação, o terreno em que

se dá o encontro, onde autor e/ou intérprete e espetador partilham física e mentalmente um espaço comum. As três obras acima referidas – Peça de embalar, Atraso e Os – pertencem a uma linhagem claramente definida no trabalho do artista: são peças performativas que põem em cena um espetáculo com uma audiência e com executantes, diferenciando-se portanto dos trabalhos concebidos e apresentados enquanto instalações. Os instrumentos/instalações/dispositivos que Ricardo Jacinto concebe e constrói são performativos, na medida em que engendram/inventam e interpretam/ possibilitam a sua própria linguagem (ou melhor, estão na génese da sua própria linguagem) a partir das suas características singulares e únicas. Mais do que se proporem como máquinas autorreferenciais que elaboram sobre o seu mecanismo, são dispositivos que inventam um espaço, as condições de habitabilidade desse dado espaço, e que propõem modos de perceção complexos. Em suma, são peças informadas por princípios de construção próprios da escultura, dispositivos que elaboram sobre a arquitetura, instrumentos musicais/sonoros que se geram a partir de princípios sinestésicos, sobrepondo sempre pelo menos duas dimensões sensoriais (visão e audição). Sete anos volvidos desde as últimas ações em torno de “Parque”, é de uma revisitação que se trata, um olhar já distanciado sobre algumas paisagens mais ou menos conhecidas, mais ou menos habitadas. De facto, a exposição tem a particularidade de lançar


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Ricardo Jacinto • Cone, 2008 • SLS pintado | painted SLS • 12 x 6 x 6 cm • Fotografia | fotography DMF

esse olhar retrospetivo, por um lado, e de demandar toda uma porção de território que havia sido apenas enunciada: o lugar dos Cones. Esse olhar é o olhar do antropólogo, do investigadorviajante, que anota, recolhe e reflete sobre os dados observados e que depois os comunica em forma de epístolas. Estas cartas, dirigidas a uma personagem denominada W., escritas por um dos cúmplices que partilharam e construíram o “Parque” com Ricardo Jacinto, Hugo Brito, dão o mote para o manto de obscuridade que cobriu o projeto durante estes anos mas são também, de certa forma, o mapa possível para esta fascinante viagem de regresso. Não por acaso, a ressaca do longo e intenso período foi curada pelo mentor e autor do projeto através de um conjunto de gravações em que compôs e instrumentalizou um conjunto de canções a partir das letras das cartas a W. – o chamado The Cones Folk Songbook, um surpreendente e divertido desvio musical ao trabalho que, enquanto compositor e intérprete, Ricardo Jacinto vem fazendo. A exposição devolve esse ambiente mas lança sobre ele um olhar renovado e revitalizado. Há, seguramente, ainda espaço para a aspiração que “Parque” transportou – a de um empreendimento utópico, coletivo, em que a autoria se partilha e em que uma visão comunitária procura sintonizar a arte com a vida ou propor aquela quimera que tantos artistas almejaram: tornar a arte uma possibilidade real de viver melhor e mais intensamente a realidade.

RICARDO JACINTO / PARK: CONES AND OTHER PLACES Curator Nuno Faria This exhibition revisits “Park” - the broadest and most complex project developed to date by Ricardo Jacinto (Lisbon, 1975). It explores the unexplored territory created after the break-up of the extensive collective of artists and musicians working with the author. The exhibition enables us to find or rediscover, in different manners, the project’s various works and many of its constituent elements while at the same time discovering new works and installations that have been specifically reconfigured or originally designed for this new exhibition. PARK is undoubtedly one of the most fascinating oeuvres produced in the context of Portuguese contemporary art over the last decade. It was a space for collective and community artistic creation that functioned almost continuously between 2001 and 2007, articulating three main performance works – “Peça de embalar”, “Atraso” and “Os” - with a set of more informal presentations that documented the project’s sources, materials and concepts. We can situate the artist's work in the precise intersection between architecture, music and sculpture, and he has specific training in each of these three disciplinary areas. This confluence of languages endows his work with a reflective complexity that explores time and space as material dimensions of perception, and addresses performativity as a vehicle for building a rhetoric of presentation or presentification.

The encounter engendered by the exhibition will occur in this terrain, where the author and/or performer and the spectator physically and mentally share a common space. The three aforementioned performance works pertain to a clearly defined line of enquiry within the artist's work: they create a spectacle involving the audience and performers, and in this manner are distinguished from the works that are designed and presented as installations. The instruments/installations/devices that Ricardo Jacinto designs and builds are performance-based, to the extent that they engender/invent and interpret/enable their own language (or rather, underpin their own language) through their singular and unique characteristics. Rather than being self-referential machines that unwind around their own mechanism, they are devices that invent a space and its respective living conditions, and which propose complex modes of perception. In short, they are inspired by the intrinsic construction principles of sculpture, architectural devices and musical/sound instruments that are generated via synaesthetic principles, which always overlay at least two sensory dimensions (vision and hearing). After a seven-year interval since “Park’s” last interventions, this exhibition is a revisitation, a chance to look back at some of the landscapes that are more or less well known, more or less inhabited. In fact, the exhibition has the particularity of launching this retrospective gaze while simultaneously demanding an entire portion of the territory that was only previously announced: the place of the Cones. This gaze is that of an anthropologist or researcher-traveller, who notes, collects and reflects about the observed data and then communicates them in the form of letters. These letters, addressed to someone called W., were written by Hugo Brito - one of the accomplices who shared and built PARK with Ricardo Jacinto. They set the tone for the cloak of darkness that covered the project during these past years but are also, to a certain extent, a possible map that enables us to chart this fascinating journey back home. It’s no accident that the fallout from this long and intense creative period was cured by the project’s mentor and author through a series of recordings, in which he composed and performed a set of songs based on the texts of the letters to W. The songs are called The Cones Folk Songbook and constitute an amazing and fun musical deviation in relation to the work developed by Ricardo Jacinto as a composer and performer. The exhibition re-enacts this environment, but also casts a renewed and revitalized gaze towards it. There is certainly still room for the aspiration transported by “Park” – that of a utopian, collective, enterprise in which creative authorship is shared and there is a community vision that seeks to ensure that art stands in tune with life or which proposes that chimera which so many artists have aspired to: to transform art into a genuine opportunity to lead a better life and experience reality more intensely.


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CURADORIA PEDRO BANDEIRA

A “Escola do Porto” tem uma história oficial que começa em Carlos Ramos, é estruturada por Fernando Távora, e internacionalizada primeiro por Álvaro Siza e depois por Eduardo Souto de Moura. Diz-se que nasceu do encontro da arquitetura moderna com a arquitetura popular (e não o contrário). A escola do “Inquérito”, da “Reforma de 57”, a escola que parece redescobrir o desenho e o projeto na urgência do compromisso social do arquiteto espelhado no processo SAAL (Serviço de Apoio Ambulatório Local). É a escola do “neorrealismo”, do “socialismo realista”, do “regionalismo crítico”; a escola que se afirma na aparente ausência de ruturas, numa história linear, simplificada, que recusa ser pós-moderna porque nunca chegou a ser moderna. Uma história contada e repetida vezes sem conta, em sincronia mitificadora. Esta é a escola dos vencedores ou pelo menos esta é a narrativa predominante. Na sombra desta “Escola do Porto” existe um “Lado B”, um lado outro, de estórias que escaparam às teses e aos livros. São estórias esquecidas, estórias secundárias, algumas inconsequentes outras rasuradas, es-

tórias que tentámos pensar com um conjunto de entrevistas nem sempre concordantes entre si e que, no seu desacordo, evidenciam uma realidade mais complexa, com posições mais marginais. Desacordos que põem em causa a linearidade da história oficial e a imagem homogeneizadora da ideia de “Escola do Porto”. Estas estórias oscilam entre dois polos: entre a utopia social e política fortemente influenciada pelo Maio de 68; e a utopia formal e disciplinar que caracterizou o pensamento radical na década de 70. A narrativa proposta centra-se na geração que iniciou os estudos na ESBAP em 1970, e que opôs marxistas, leninistas, ou maoistas a trotskistas, situacionistas ou anarquistas. E se começamos com a assumida ambição de contribuir para uma visão mais complexa da “Escola do Porto”, poderemos desde já adiantar, que em paralelo temos a ambição dissimulada de questionar este conceito apaziguador, enfatizado na década de 80 e 90 à sombra da internacionalização de Álvaro Siza Vieira. Propomos dar atenção a outras narrativas, menores seguramente, mas representativas de uma contracultura, de uma pedagogia radical, ou de


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Fernando Barroso e Mário Ramos • Organização Insurreccional do Espaço | Insurrectional Organization of Space, 1975 • Fotomontagem | photomontage • 8 x 21,5 cm

percursos autodidatas identificados com uma crítica do quotidiano e evidenciados em projetos, em ações interventivas, em gestos performativos, e na insurreição ou na ironia. Propomos neste “Lado B” o percurso que vai da “ilusão à desilusão” no antes e depois da Revolução de Abril e que teve como consequência, o afastamento voluntário e involuntário de algum dos alunos e professores da ESBAP. Esta estória começa com a saída de Carlos Ramos da direção do curso de Arquitetura da Escola Superior de Belas Artes do Porto (ESBAP) em 1967, com a demissão coletiva do corpo docente por questões de indefinição contratual, e com o aumento da contestação ao regime sob influência do Maio de 68 e da revolta estudantil de 69, que empurraram o curso de Arquitetura da ESBAP, sob a aparente abertura da “primavera marcelista”, para o chamado “regime experimental” – uma reforma que os jornais da época iriam apelidar de “inovadora” e “radical” pela gestão paritária entre alunos e professores, pela ausência de cadeiras no sentido convencional do termo, pela ausência de faltas, de horários, tudo isto em prol da integração de várias matérias estruturadas em tornos de um núcleo central: o projeto de arquitetura (tido num âmbito alargado). Este regime de ensino, estruturado em grupos e temáticas e não em anos letivos, defendia a avaliação contínua igualmente participada por docentes e discentes. Não durou muito tempo mas, voltar atrás, à “Reforma de 57”, era algo que apesar de desejado pela direção “reacionária” da ESBAP (imposta pelo ministério), seria rejeitado pela maioria dos estudantes e professores. O ambiente de permanente contestação política, com perseguições e processos a alunos e professores, paralisou a escola em vários momentos. Entre 1969 e 1974 o ano escolar iniciava-se em abril e prolongava-se até setembro. A grande maioria dos alunos frequentou apenas os escritórios dos professores fazendo desta prática a prática do seu ensino. A Revolução de 1974, e o consequente processo SAAL (1974-76), encontraram os arquitetos a rua: manifestações, ocupações e o “direito à cidade”. A escola continuou “vazia”.(…)

PORTO SCHOOL: B SIDE / AN ORAL HISTORY (1968-1978) Curator Pedro Bandeira The ‘Porto School’ has an official history that begins with Carlos Ramos, is then structured by Fernando Távora, and had its first internationalisation with Álvaro Siza and then with Eduardo Souto de Moura. It is said that the Porto School was born from an encounter between modern architecture and popular architecture (rather than the other way around). The school of the ‘Inquest', the '57 Reform'. The school that seemed to rediscover drawing and project in the urgency of the social commitment of architects, as reflected in the SAAL process (Local Ambulatory Support Service). The school of ‘neo-realism’, of 'realist socialism', of 'critical regionalism'. The school that affirmed itself in the apparent absence of discontinuities, in a linear simplified history, that refused to be postmodern because it never became modern. A history that has been told and repeated on countless occasions, in mythmaking synchronism. The school of winners - or at least that’s the predominant narrative. However in the shadow of the ‘Porto School’, there’s a ‘B Side’, another side, with stories that haven’t been covered in academic theses and books. They are forgotten stories, secondary stories, some of which are inconsequential, others deleted. Stories that we try to think about with a set of interviews, that don’t always stand in harmony with each other and that, in their disagreement, highlight a more complex reality, that involves more marginal positions. Disagreements that undermine the linearity of the official history and the homogenizing image of the ‘Porto School’. These stories oscillate between two poles: between a social and political utopia strongly influenced by May 1968; and the formal and disciplinary utopia that characterized radical thinking in the 1970s. The narrative proposal focuses on the generation of students who began their studies in the School of Fine Arts of Porto (ESBAP) in 1970, involving oppositions between Marxists and Leninists, Maoists and Trotskyists, anarchists and situationists. If we commence with the ambition to contribute to a more complex view of the 'Porto School’, we can already state that, in parallel, we have the dissimulated ambition to question this pacifying concept, that was emphasized in the 1980s and 1990s, in the shadow of the internationalization of Álvaro

Siza Vieira. Indeed, we propose to focus on other narratives, certainly smaller, but that represent a counterculture, a radical pedagogy, or self-taught trajectories identified with a critique of everyday life and demonstrated in projects, in interventional actions, in performative gestures, and in movements of insurrection or irony. In this ‘B Side’, we propose a trajectory that ranges from 'illusion to disillusionment', before and after the April 1974 Revolution, which resulted in the voluntary and involuntary distancing of some of the students and teachers of ESBAP. This story begins with the departure of Carlos Ramos as director of the Architecture course in the School of Fine Arts of Porto (ESBAP) in 1967, followed by collective resignation of the faculty, due to reasons of contractual uncertainty, and increasing challenge to the regime, under the influence of May 1968 and the student revolts of 1969. These developments pushed ESBAP’s Architecture course, under the apparent open spirit of the 'Marcelist Spring’ towards the socalled 'experimental regime'. At the time, newspapers described the experimental regime as 'innovative' and 'radical', due to shared management between students and teachers, the absence of conventional disciplines, the absence of records of non-attendance, of schedules, all of which aimed to promote the integration of the various topics structured around a central core: the architectural project (viewed from a broad perspective). This system of education - divided into thematic areas and groups rather than academic years - advocated continued assessment, that involved both teachers and students. It didn’t last long but, stepping back, the '57 Reform' was something that although it was coveted by the ‘reactionary’ management staff of the ESBAP (imposed by the ministry), it was rejected by most students and teachers. The environment of permanent political contestation, with persecutions and processes initiated against students and teachers, paralysed the school at various times. Between 1969 and 1974, the school year began in April and extended until September. The vast majority of students only visited the professors’ offices and this practice became the basis for their teaching practice. The 1974 Revolution and the consequent SAAL process (197476), meant that the architects went into the streets: attending demonstrations, occupations and the 'right to the city’. The school remained 'empty'(...)


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"NÃO ADMIRA QUE DURANTE MILÉNIOS O AR, QUE NINGUÉM VÊ, FOSSE IMAGINADO COMO UM SER SOBRENATURAL QUE PENETRAVA NO CORPO DOS HOMENS E LHES CONCEDIA A VIDA. UM DEUS, PORTANTO. ASSIM, FOI CONSIDERADO O AR COMO UM DEUS MUITO TEMIDO, UMAS VEZES PROTETOR, QUANDO SE DEIXAVA ASPIRAR EM HAUSTOS RECONFORTANTES, OUTRAS VEZES TERRÍVEL, QUANDO BRAMIA, SOPRAVA, ASSOBIAVA, FAZIA ESTREMECER AS ROBUSTAS ÁRVORES E AS ARRANCAVA DO SOLO, TOMBANDO-AS. UM DEUS QUE MERECIA TODA A VENERAÇÃO E RESPEITO." Rómulo de Carvalho, A Composição do Ar

CURADORIA NUNO FARIA

Representar o ar, ou seja, representar aquilo que não se vê, é, talvez desde tempos de que já não nos lembramos, uma das aspirações da prática artística. O ar é matéria e meio. É matéria (vital) sem estrutura, sopro sem corpo. É um meio: transporta coisas, engendra ideias, faz-se respirar. A tentação do ar é também uma aspiração ao voo, uma fuga ao peso, a superação da gravidade. Subir acima do horizonte para ver mais e melhor. Se pensarmos bem, o ar é aquilo que nos liga – na mais integral aceção da palavra ligação – aos corpos, às coisas, aos objetos em geral. À ínfima camada de ar, impalpável e imperscrutável, que envolve um objeto, de arte ou não, chamamos aura. Trata-se de uma qualidade inexplicável que algumas coisas transportam e que as transforma em objetos de desejo, em coisas amadas e contempladas. No CIAJG os objetos atravessam o tempo e cruzam fronteiras para estabelecerem encontros cujo sentido é mais ou menos evidente, mais ou menos visível. Porquê fazer, recolher e guardar objetos? Entre as muitas respostas plausíveis e possíveis, para além do mistério que engendra o gesto artístico ou o simples acto criador, poderíamos dizer que fazemos, recolhemos e guardamos para preservar e projetar a memória, ou seja, para sobreviver ao desaparecimento. Tanto ou mais

misterioso é saber qual o íntimo, o profundo significado de mostrar, de dar a ver. Não seria demasiado arriscado afirmar que mostramos para fundar um lugar, para nos constituirmos enquanto comunidade que partilha aspirações e temores, medos e desejos que estão para lá da nossa própria compreensão. Exumamos, escavamos, fazemos, construímos mais para compreender do que para explicar, mais para perguntar do que para afirmar. No CIAJG juntamos objetos e imagens de tempos e lugares muito distantes, por vezes sem aparente ligação, como se viessem até nós trazidos pelo vento, como se fossem sementes voadoras. Queremos refundar o museu como lugar do espanto e da reflexão, como corrente de ar e como espelho, como horizonte a perder de vista. Para isso, cruzamos diferentes linguagens e metodologias, desde a arqueologia à etnologia, passando pela história da arte; procuramos fazer conviver dimensões tantas vezes inconciliáveis como o popular, o ancestral, o artesanal, o vernacular, o conhecimento transmitido pela oralidade ou pela gestualidade; propomos lançar um olhar do lugar e do tempo em que nos encontramos sobre as mais diversas manifestações e sobrevivências materiais e imateriais da nossa cultura. Devolver ao visitante o espaço entre os objetos, as pausas para inspirar, mostrar o ar.


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Recipiente com animal | Vessel with animal Mambila, Nigéria/ Camarões | Mambila, Nigeria/ Camaroon • Terracota | Terracotta • 46 x 24 x 32 cm CIAJG – Coleção José de Guimarães Collection José de Guimarães

Vasco Araújo • Botânica #3 | #5, 2012-14 Esculturas | Sculpture • Mesas de madeira, fotografias digitais, molduras de madeira e metal | Wood table, digital photographs, wood and metal frames • 100 x 100 x 120cm Cortesia do artista | Courtesy of the artist

Arte Tribal Africana, Arte préColombiana e Arte Chinesa Antiga da coleção de José de Guimarães. Objetos do património arqueológico, popular e religioso. Obras de artistas contemporâneos. African Tribal Art, Pre-Columbian Art and Ancient Chinese Art of the José de Guimarães Collection. Objects of the folk, religious and archaeological heritage of the region of Guimarães. Works of contemporary artists.

Máscara Tetela | Tetela Mask • Zaire/Congo • Madeira, penas, cordas, fibras, pigmentos | Wood, feathers, cords, fibers, pigments 120 x 63 x 29 cm • CIAJG – Coleção José de Guimarães | Collection José de Guimarães

COMPOSITION OF AIR PERMANENT COLLECTION AND OTHER WORKS "It’s unsurprising that during millennia, the air - which no one can see was imagined as a supernatural being who penetrated the body of men and gave them life. A god, in effect. Thus, the air was considered to be a God who should be feared, sometimes protective, when he allows people to breathe in soothing vacuums, but at other times terrible, when he bellowed, blowed, whistled, and shook robust trees and uprooted and toppled them. A god who deserved our every reverence and respect." Rómulo de Carvalho, A Composição do Ar (Composition of Air)

Obras de / Works by Vasco Araújo Franklin Vilas Boas João Botelho Otelo Fabião Jarosław Flici´nski José de Guimarães f.marquespenteado Rosa Ramalho Ernesto de Sousa Ricardo Jacinto

To represent the air, i.e. to represent that which we can’t see, has perhaps been one of artists’ greatest aspirations, since time immemorial. Air is both matter and medium. It is matter (life) without structure, it blows but has no body. It is also a medium: it transports things, engenders ideas, enables us to breathe. The temptation posed by the air is the desire to fly, to flee from weight, to overcome gravity. To rise above the horizon and see things with greater amplitude and clarity. In fact, the air is what connects us together – in the most comprehensive meaning of the word, “connection” – it connects us to bodies, to things, to objects

in general. We use the word “aura” to describe the tiny, impalpable and inscrutable layer of air, that encompasses an object, whether an artwork or any other item. This is an inexplicable quality that some things transport and which turns them into objects of desire, into things that are loved and contemplated. At the CIAJG, objects traverse time and cross borders in order to establish encounters whose meaning is more or less clear, more or less visible. Why should we do make, collect and store objects? Amongst the many plausible and possible answers to this question, in addition to the mystery that engenders the artistic gesture or the simple creative act, we could say that we make, collect and store things, in order to preserve and project memory, i.e., to guarantee their longevity. Equally mysterious is to understand the intimate, profound meaning of showing, giving and seeing. Would it be too risky to assert that we show things in order to establish a place, to constitute ourselves as a community that shares aspirations and anxieties, fears and desires that lie beyond our understanding. We exhume, dig, make and build things more because we want to understand them, rather than to explain them, more in order to ask questions than to assert things. At the CIAJG, we combine objects and images from very distant times and places, sometimes without any apparent connection, as if they came to us brou-

ght by the wind, as if they were flying seeds. We want to refound the museum as a place of wonder and reflection, as an air stream and mirror, as an infinite horizon. For this reason, we intermingle different languages and methodologies, from archaeology to ethnology, passing through the history of art. We try to blend dimensions that are often irreconcilable, such as the popular, ancestral, artisanal, vernacular, and knowledge that is transmitted orally or by gestures. We propose to cast a gaze from the time and place in which we find ourselves, regarding the wide array of tangible and intangible manifestations and vestiges of our culture. To return to visitors the space between objects, the pauses in which they can breathe. To show the air.


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HAL L C I AJ G | HALL O F THE C I A J G

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“anel de catarina” faz parte de um conjunto de peças concebidas aquando da residência que o artista f.marquespenteado realizou em Guimarães durante a preparação da exposição “Para além da História” que inaugurou o Centro Internacional das Artes José de Guimarães. Partindo do tema das relíquias católicas, f.marquespenteado trabalhou com artesãos locais para realizar um conjunto de peças que estabelecem forte ressonância com alguns dos mais enraizados rituais da cidade, nomeadamente as festas dedicadas a São Gualter. Com esta peça, bordada à mão sobre tripas de animais, o artista evoca uma das mais preciosas relíquias da Igreja Católica, o prepúcio sagrado, retirado do corpo de Jesus Cristo aquando do ritual de circuncisão a que, em obediência à tradição judaica, foi submetido enquanto jovem. Esta relíquia, a que são atribuídos diversos milagres, terá sido usada por Catarina de Siena, reconhecida devota que viveu entre 1347 e 1380 (tendo morrido em Roma aos 33 anos), para assinalar o seu propalado casamento místico com Jesus, quando tinha 21 anos, em 1368.

f. marquespenteado • anel de catarina | catarina’s ring, 2012 • Bordado à mão e à máquina sobre tripas de animal | hand and machine embroidery on animal tripe • Coleção | Collection CIAJG

f. marquespenteado catarina’s ring "Catarina’s ring", is one of a set of items designed by the artist, f.marquespenteado, during his residency in Guimarães for preparation of the Beyond History exhibition, inaugurated by the José de Guimarães International Centre for the Arts. Inspired by the subject of Catholic relics, f.marquespenteado worked with local artisans to produce a set of items that establish strong resonance with some of the city’s most deeply-rooted rituals, including the festivities of São Gualter. By means of this work, hand-embroidered on animal casings, the artist evokes one of the Catholic Church’s most precious relics, the holy prepuce that was removed from the infant Jesus during circumcision, in observance of Jewish tradition. This relic - that is claimed to have worked many miracles - was worn by Catherine of Siena, a devout worshipper who lived between 1347 and 1380 (and died in Rome at the age of 33), to signal her vaunted “mystic marriage” with Jesus in 1368, when she was 21.

Centro Internacional das Artes José de Guimarães (CIAJG) Plataforma das Artes e da Criatividade

Mesa redonda com Eduardo Jorge Fernandes, Gonçalo Canto Moniz, Jorge Figueira e Raquel Paulino Perspetivas sobre a Escola do Porto nos anos ‘70 Apresentação do catálogo da exposição "Escola do Porto: Lado B / Uma história oral (1968-1978)"

Round table with Eduardo Jorge Fernandes, Gonçalo Canto Moniz, Jorge Figueira and Raquel Paulino Perspectives on the Porto School in the 1970s

Presentation of the exhibition catalogue, “Porto School: B Side / An oral history (1968 -1978)”

Há conversa com… Pedro Bandeira e Joaquim Moreno Conversation with… Pedro Bandeira and Joaquim Moreno

Caroline Maniaque Benton conversa com Joaquim Moreno Contracultura nos anos ‘60 a ‘80 Caroline Maniaque Benton talks with Joaquim Moreno Counterculture between the 1960s and 1980s

José de Guimarães Provas de contacto Do stencil ao digital: processos de transferência da imagem Contact sheets | From stencil to digital: image transfer processes Galeria do Teatro Municipal da Guarda De 27 de setembro a 31 de dezembro From September 27 to December 31 Organização Teatro Municipal da Guarda e Centro Internacional das Artes José de Guimarães

Terça a domingo, das 10h00 às 19h00, por marcação Público-alvo Maiores de 4 anos / Duração 60 a 90 min.  / Preço 2,00 eur (grupos escolares) / 5,00 eur (outros públicos)

Horário de funcionamento terça a domingo 10h00 às 19h00 (última entrada às 18h30) Tarifário 4 eur / 3 eur Cartão Jovem Municipal, Cartão Jovem, Menores de 30 anos, Estudantes, Cartão Municipal de Idoso, Reformados, Maiores de 65 anos, Cartão Municipal das Pessoas com Deficiência, Deficientes e Acompanhante / Cartão Quadrilátero Cultural desconto 50% / Entrada Gratuita crianças até 12 anos / domingos de manhã (10h00 às 14h00)

José de Guimarães International Arts Centre (CIAJG) Platform of Arts and Creativity Opening hours tuesday to sunday 10am to 7pm (last visit 6.30pm)

Visita à exposição "Escola do Porto: Lado B / Uma história oral (19681978)" por Matilde Seabra, seguida de conversa com Jacinto Rodrigues e Eduardo Jorge Fernandes Visit to the exhibition, “Porto School: B Side / An oral history (1968-1978)” by Matilde Seabra, followed by a discussion with Jacinto Rodrigues and Eduardo Jorge Fernandes

Tariffs

Concerto PARQUE: Wsongs Ricardo Jacinto

2º sábado do mês, às 16h00 Público-alvo dos 4 aos 12 anos Duração 90 min. Preço 2,00 eur

PARK: Wsongs

Visita à exposição e apresentação do catálogo "Ricardo Jacinto / Parque: Os Cones e Outros Lugares", com Nuno Faria, Delfim Sardo e Rui Horta Visit to the exhibition and presentation of the catalogue, “Ricardo Jacinto / Park: Cones and Other Places”, with Nuno Faria, Delfim Sardo and Rui Horta

4 aos 10 anos Desalfabeto (desenho) Trocar os pés pelas mãos (escultura) 10 aos 14 anos O avesso do volume (escultura) M/ 15 anos Superfície da pele (escultura) De 2000 a.C. a 2000 d.C. (história, artes visuais)

4 eur / 3 eur Holders of the Cartão Jovem, Under 30 years, Students, Holders of the Cartão Municipal de Idoso, Reformados (Senior and Pensioner’s Card), Over 65 years, Handicapped patrons and the person accompanying them / Cartão Quadrilátero Cultural 50% discount / Free Entrance children until 12 years old / sunday morning (10 am to 2.00 pm)

Morada / Address Av. Conde Margaride, nº 175 4810-535 Guimarães Portugal Telefone / Phone + 351 253 424 715 www.ciajg.pt N 41.443249, W 8.297915

Terça a domingo, por marcação Duração 90 min. a 2 horas Preço Oficinas 2,00 eur Preço Vai e Vem (1 visita ao CIAJG + 1 oficina na escola) 2,00 eur (oferta exclusiva para IPSS e escolas públicas de Guimarães) Atividades sujeitas a marcação prévia através do e-mail servicoeducativo@aoficina.pt Organização

Apoios da Oficina

Central de Informação | 2014


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