Jornal Festivais Gil Vicente | 2013

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“A NATUREZA DO TEATRO É A PROVOCAÇÃO. O ENCONTRO ENTRE OBRA E PÚBLICO DEVE SER CONFLITUOSO. SEM CONFLITO NÃO HÁ CONHECIMENTO.”. Aproprio-me desta declaração de Angélica Liddell ao jornal Folha de S. Paulo porque ela transporta em si a essência do ato de programar. É isso que procuramos ao programar mais uma edição dos Festivais Gil Vicente - a provocação conflituosa entre obra e público como ferramenta ao serviço do conhecimento. _E ao fazê-lo estamos, cremos, sintonizados com a obra Vicentina e com o Teatro nas suas mais variadas expressões. _Gil Vicente, seguindo a tradição grega, colocava em cena a História, os conflitos humanos, sociais e políticos, retirados da própria História, plenos de atualidade em cada momento da sua própria vivência. _Já Aristóteles, no seu tratado "Poética", assinala um jogo criado com o objetivo de conduzir o público à catarse através do sofrimento e transformação do protagonista. A ideia de que os personagens de uma peça devem ligar-se ao público foi uma grande contribuição do teatro grego à tradição dramatúrgica ocidental. De forma transversal, este propósito tornou-se o alicerce da expectativa convencional quanto à relação entre a ação do personagem e a experiência do público. _Também por isso, o Teatro é uma arte nobre porque permite uma vivência e porque, como tão bem diz Peter Brook, “O público vai ao teatro por uma única razão: viver uma certa experiência, que só acontece no momento da representação”. _Esta relação; este conflito; este confronto e, em suma, esta “osmose” resulta do facto de uma obra nunca se apresentar perante o público como uma absoluta novidade mas sim como ponto de partida para uma receção sempre condicionada por informações e referências mais ou menos implícitas. Cada obra evoca outras obras; cada obra coloca o público numa determinada situação emocional e cria expectativas que podem permanecer imutáveis ou transformar-se radicalmente. _Valorizar a obra teatral como algo que se dá à perceção, e que por essa razão a torna central nesse processo, é algo que surge como natural, ao mesmo tempo que, com a mesma naturalidade, se aceita que sem o público a perceção não se corporiza, não se concretiza. Numa hipótese simplista poder-se-ia dizer que para existir uma experiência estética bastaria a existência de obra e público. Se assim fosse, então qualquer obra e qualquer público seriam por si só capazes de provocar/vivenciar a experiência estética. _Facilmente se pode concluir que para a existência de uma experiência estética, para a existência de uma obra com significação própria, para a existência de um público como elemento recetor, será necessária a junção de vários fatores que proporcionarão uma presença e uma representação em função do sensível e em função da imaginação. _É esta relação que procuramos potenciar com o programa que apresentamos nesta edição dos Festivais Gil Vicente. _Esperamos que enquanto público se possa encontrar com todas ou cada uma das seguintes obras, que serão apresentadas nos diversos espaços deste novo território cultural que é GUICUL – Guimarães Arte e Cultura: Ping Pang Qiu de Angélica Liddell _Raso Como o Chão de Ana Deus e João Sousa Cardoso (a partir da obra homónima de Álvaro Lapa) _Adalberto Silva Silva de Jacinto Lucas Pires _Atabicar o Caminho de João Martins _Rosencrantz & Guildenstern Estão Mortos de Tom Stoppard _Devagar de Howard Barker _A Africana de Cão Solteiro & Vasco Araújo (a partir de libreto de José Maria Vieira Mendes) _Um Precipício no Mar de Simon Stephens _A 20 de Novembro de Lars Norén _Ensaio Sobre o Teatro de Rui Simões (a partir da adaptação do Teatro O Bando, da obra de José Saramago “Ensaio Sobre a Cegueira”) _António, Um Rapaz de Lisboa de Jorge Silva Melo. Que o Teatro provoque um confronto conflituoso rumo ao conhecimento! José Bastos


“The nature of theatre is provocation. When the play encounters the audience, there should be a sense of conflict. Without conflict, there can be no knowledge.” I have taken the above quote from Angélica Liddell in the newspaper, Folha de São Paulo, because it embodies the essence of the act of cultural programming. And this is the object of our search for this edition of the Gil Vicente Festivals – the conflicts and provocations that take place when the play encounters the audience, and how this act as a tool at the service of knowledge. In taking this stance we believe that we are in harmony with the essence of the work of Gil Vicente and of the Theatre, in all its broadest expressions. Gil Vicente drew on Greek tradition by using the stage to represent scenes from History – the human, social, and political conflicts taken from History which were full of the themes so current to the times in which he lived. Aristotle, in his Poetics, discusses the game that is created when the objective is to lead the audience to a state of catharsis as they experience the suffering and transformation of the show’s protagonist. The idea that the characters in the play have to connect with the audience was one of the great contributions made by Greek theatre to western dramaturgy. This notion has indeed become a foundation, the common expectation brought to a show by an audience when it is presented with the story of a main character it wants to sympathize with. Also, the Theatre itself is a noble art since it allows for experiencing life and because, as Peter Brook puts it, “the audience goes to the theatre for a single reason: to have a certain experience which can only happen during a performance.” This relationship, this conflict, this confrontation – in short, this osmosis – is the result of the play’s never being presented to the public as an absolute and total novelty but rather as a ‘stepping off point’ for understanding, which is always affected by information and references that are more or less implicit. Each work evokes another work; each work puts the audience into a specific emotional state and creates expectations that can remain unchanged or which can be transformed radically. To place value on theatrical works as something that aids in understanding – and for this reason becomes the core reason for this entire process – this is something that emerges so naturally, and at the same time it is true that without an audience the notion of understanding cannot be incorporated or carried out. In a simplistic statement it can be said that for an aesthetic experience to exist, there needs only to be a play and an audience. If this were indeed true, then any work and any audience would be enough to provoke/to enjoy the aesthetic experience. It can easily be concluded that for an aesthetic experience to exist, for a work with its own meaning to exist, for an audience as receptive agent to exist, there must be a union of various factors that will provide the presence and the performance, with respect to what is felt and what is in the imagination. This is the relationship which we hope to encourage with the program we are presenting in this edition of the Gil Vicente Festivals. We hope that our audiences will be able to have an encounter with each and every one of the following works, which will be presented in a variety of settings in this new ‘cultural territory’ which is GUICUL – Guimarães Art and Culture: Ping Pang Qiu by Angélica Liddell _As Flat As the Ground by Ana Deus and João Sousa Cardoso (from the work of the same name by Álvaro Lapa) _Adalberto Silva Silva by Jacinto Lucas Pires _Cramming the Channel by João Martins _Rosencrantz & Guildenstern Are Dead by Tom Stoppard _Slowly by Howard Barker _The African by Cão Solteiro & Vasco Araújo (libretto by José Maria Vieira Mendes) _Sea Wall by Simon Stephens _The 20th of November by Lars Norén _Essay on the Theatre by Rui Simões (based on the adaptation by Teatro O Bando, of “Blindness” by José Saramago) _António, a Lisbon Boy by Jorge Silva Melo. May the Theatre provoke the type of conflict and confrontation that puts us on the road to knowledge! José Bastos

Preços com Desconto (C/D) Cartão jovem, menores de 30 anos e estudantes, Cartão jovem municipal, Cartão municipal de idoso, reformados e maiores de 65 anos, Cartão municipal das pessoas com deficiência, Deficientes e acompanhante, Sócios do CAR – Círculo de Arte e Recreio Cartão Quadrilátero Cultural Venda de Bilhetes oficina.bilheteiraonline.pt, www.ccvf.pt, Centro Cultural Vila Flor, Plataforma das Artes e da Criatividade, Lojas Fnac, El Corte Inglés, Entidades aderentes da bilheteira online Comissão Organizadora dos Festivais Gil Vicente A Oficina Câmara Municipal de Guimarães Círculo de Arte e Recreio


QUINTA 06 CCVF~GRANDE AUDITÓRIO~22H00

ATIVIDADES PARALELAS

PING PANG QIU 乒乓球

QUARTA 05 PAC~BLACK BOX~21H45

ENSAIO SOBRE O TEATRO

DE ANGÉLICA LIDDELL PREÇO 10,00 EUR | 7,50 EUR C/D

QUINTA 13 FÁBRICA ASA~BLACK BOX~22H00 SEXTA 07 PAC~BLACK BOX~22H00

DEVAGAR

RASO COMO O CHÃO

DE HOwARD BARKER PREÇO 7,50 EUR | 5,00 EUR C/D

DE ANA DEUS E JOÃO SOUSA CARDOSO PREÇO 7,50 EUR | 5,00 EUR C/D

SEXTA 14 CCVF~GRANDE AUDITÓRIO~22H00

SEXTA 07 CAR~CÍRCULO DE ARTE E RECREIO 23H30

DE CÃO SOLTEIRO & VASCO ARAÚJO PREÇO 10,00 EUR | 7,50 EUR C/D

ADALBERTO SILVA SILVA~UM ESPETÁCULO DE REALIDADE DE JACINTO LUCAS PIRES E IVO ALEXANDRE PREÇO 5,00 EUR | 3,00 EUR C/D

SÁBADO 08 A SÁBADO 15 PERCURSO PELA CIDADE C/ SAÍDA NA PAC DISPONÍVEL ENTRE AS 10H00 E AS 17H30

ATABICAR O CAMINHO~UM AUDIOwALK PARA GUIMARÃES DE JOÃO MARTINS GRATUITO, MEDIANTE ENTREGA DE DOCUMENTO PESSOAL

SÁBADO 08 CCVF~GRANDE AUDITÓRIO~21H30

ROSENCRANTZ & GUILDENSTERN ESTÃO MORTOS DE TOM STOPPARD PREÇO 10,00 EUR | 7,50 EUR C/D

A AFRICANA SÁBADO 15 CCVF~PEQUENO AUDITÓRIO~22H00

A 20 DE NOVEMBRO DE LARS NORÉN PREÇO 5,00 EUR | 3,00 EUR C/D

SÁBADO 15 CCVF~SALA DE ENSAIOS~23H00

UM PRECIPÍCIO NO MAR DE SIMON STEPHENS PREÇO 5,00 EUR | 3,00 EUR C/D

DE RUI SIMÕES ORGANIZAÇÃO EM PARCERIA COM O CINECLUBE DE GUIMARÃES ENTRADA LIVRE ATÉ AO LIMITE DA LOTAÇÃO DA SALA

DIAS 06, 07, 08, 13, 14 E 15 ESPAÇO OFICINA

OFICINA DE IMPROVISAÇÃO PREÇO 10,00 EUR

QUINTA 06 A SEXTA 14 CCVF~GRANDE AUDITÓRIO

VISITAS GUIADAS AOS BASTIDORES INSCRIÇÃO GRATUITA

QUINTA 06 A SEXTA 14 ESCOLAS SECUNDÁRIAS DO CONCELHO DE GUIMARÃES

EMBAIXADORES DO TEATRO SÁBADO 15 PAC~BLACK BOX~17H30

ANTÓNIO, UM RAPAZ DE LISBOA DE JORGE SILVA MELO ORGANIZAÇÃO EM PARCERIA COM O CINECLUBE DE GUIMARÃES ENTRADA LIVRE ATÉ AO LIMITE DA LOTAÇÃO DA SALA


Imagens Š Gerardo Sanz


A estreia em Portugal de "Ping Pang Qiu", da conceituada criadora e atriz espanhola Angélica Liddell, marca o arranque da edição de 2013 dos Festivais Gil Vicente. Vencedora do Prémio Nacional de Literatura Dramática 2012 (em Espanha), Angélica Liddell traz até aos Festivais Gil Vicente uma peça de teatro documental que aborda a sua paixão pela China.

“Ping Pang Qiu” representa a minha relação com a escrita chinesa, uma ligação de disciplina, paixão e excesso. Impor a mim própria a tarefa de memorizar os 4.000 carateres que precisava ler significava implicar metade da minha vida. Eu proponho-me a fazer tarefas colossais que me ajudam a viver com desespero. É como dizer, “quando aprenderes os 4.000 carateres serás livre”. Ping pong, o desporto nacional na China, espelha essa relação. Partindo da “Diplomacia Ping Pong” entre a China e os Estados Unidos na década de 1970, um exemplo da hipocrisia política e de como a diplomacia coexiste com a barbaridade da Revolução Cultural Chinesa, chegamos ao totalitarismo no desporto. Na China, as autoridades desportivas levam o desempenho das suas equipas tão seriamente que impuseram duros códigos de conduta a todos os seus jogadores, quer masculinos como femininos, algo que afeta também as suas relações privadas. Em suma, este trabalho analisa o extermínio da expressão e as suas consequências, por exemplo, no amor, ou na pessoa que tenta lutar contra a repressão através de um exemplo de beleza. Angélica Liddell Angélica Liddell nasceu em Figueres, Girona, no ano de 1966. Em 1993, fundou a companhia Atra Bilis Teatro, com a qual levou a palco 22 trabalhos. As suas peças foram traduzidas para variadas línguas como francês, inglês, russo, alemão, português e polaco. “La falsa suicida” (2000), “El matrimonio Palavrakis” (2001), “Once upon a time in West Asphixia” (2002), “Hysteria Passio” (2003), “Y cómo no se pudrió Blancanieves” (2005), “El año de Ricardo” (2005), “Perro muerto en tintorería: los Fuertes” (2007), “Anfaegtelse” (2008), “La casa de la fuerza” (2009), “Maldito sea el hombre que confía en el hombre: un projet d’alphabétisation” (2011) ou “Ping Pang Qiu” (2012) são alguns dos títulos. Liddell já ganhou vários prémios, entre eles o Casa de América Award 2003 na categoria de Drama Inovador pela sua peça “Nubila Wahlheim”; o SGAE Theatre Award 2004 por “Mi relación con la comida”; o Premio Ojo Crítico Segundo Milenio Award 2005 pelo reconhecimento dos seus trabalhos; o Notodo del Público Award 2007 na categoria best performance pela sua peça “Perro muerto en tintorería: los fuertes”. A peça “Belgrado” alcançou o segundo lugar no Lope de Vega 2007 Award enquanto “El año de Ricardo” ganhou o Valle Inclán Award em 2008. Liddell venceu também o Sebastiá Gasch Award em 2011. Os seus últimos trabalhos, “El año de Ricardo”, “La casa de la fuerza”, e “Maldito sea el hombre que confía en el hombre”, tiveram a sua estreia no Festival d’Avignon, Festival de Viena e no Teatro Odéon, em Paris. Recentemente, recebeu o Prémio Nacional de Literatura Dramática 2012 por “La casa de la fuerza”, atribuído pelo Ministério Espanhol da Educação, Cultura e Desporto. A sua mais recente peça, “Todo el cielo sobre la tierra: El síndrome de Wendy”, coproduzida pelo Festival de Viena, Festival D’Avignon, Teatro Odéon, Festival de Outono em Paris, deSingel Internationale Kunstcampus e Le-Parvis Scène Nationale Tarbes Pyrénées, estreou no passado dia 09 de maio no Festival de Viena. Ping Pang Qiu represents my relationship to the Chinese script, a bonding of discipline, passion and excess. Imposing on myself the task of memorising the 4,000 characters needed to read meant implicating half of my life. I give myself colossal tasks which help me to live with despair. It is like saying, “when you learn the 4,000 characters you will be free”. Ping pong, the national sport in China, fleshes out this relationship. Departing from the “Ping Pong Diplomacy” between China and the US in the 1970s, an example of political hypocrisy and of how diplomacy coexists with the barbarity of the Chinese Cultural Revolution, we come to totalitarianism in sport. In China, the Sports authorities take the performance of their squads so seriously that they have imposed harsh codes of conduct among their male and female players, which also affect their private relationships. In short, this work looks at the extermination of expression and its consequences, for example, on love, or on the person who attempts to fight against repression through an instance of beauty. Angélica Liddell

Angélica Liddell was born in Figueres, Girona in 1966. In 1993, she founded Atra Bilis Teatro, with which she has staged twenty-two works. Her plays have been translated into different languages such as French, English, Russian, German, Portuguese and Polish. “La falsa suicida” (2000), “El matrimonio Palavrakis” (2001), “Once upon a time in West Asphixia” (2002), “Hysteria Passio2 (2003), “Y cómo no se pudrió Blancanieves” (2005), “El año de Ricardo” (2005), “Perro muerto en tintorería: los fuertes” (2007), “Anfaegtelse” (2008), “La casa de la fuerza” (2009), “Maldito sea el hombre que confia en el hombre: un projet d’alphabétisation” (2011) or “Ping Pang Qiu” (2012) are some of the titles. Liddell has won several awards, amongst them the 2003 Casa de América Award for Innovative Drama for her play Nubila Wahlheim; the 2004 SGAE Theatre Award for Mi relación con la comida (My Relationship with Food); the 2005 Premio Ojo Crítico Segundo Milenio Award in recognition for her works; the 2007 Notodo del Público Award for best performance for her play Perro muerto en tintorería: los Fuertes (Dead dog in the Dry cleaner’s: The strong ones). The play “Belgrado” (Belgrade) won second place in the Lope de Vega 2007 Award while “El año de Ricardo” (The Year of Ricardo) won the Valle In

clán Award in 2008. She has also won the Sebastiá Gasch Award in 2011. Her latest works, “El año de Ricardo”, “La casa de la fuerza”, y “Maldito sea el hombre que confía en el hombre”, have been premiered in Festival d’Avignon, Wiener Festwochen and Théâtre de l’Odéon in Paris. She has recently received the National Prize of Drama Literature 2012 for “La casa de la fuerza”, awarded by the Spanish Ministry of Education, Culture and Sport. Her latest play “Todo el cielo sobre la tierra: El síndrome de Wendy”, coproduced by Wiener Festwochen, Festival D’Avignon, Théâtre de l’Odéon, Festival d’Automne à Paris, deSingel Internationale Kunstcampus, and Le-Parvis Scène Nationale Tarbes Pyrénées will be premiered in Wiener Festwochen on May 9th 2013.

Interpretação Lola Jiménez, Fabián Augusto Gómez Bohórquez, Sindo Puche, Angélica Liddell __Os resumos que são lidos são retirados de “One man's Bible”, de Gao Xingjian __A versão espanhola foi traduzida por Xin Fei e José Luis Sánchez __Agradecimentos à Editorial Planeta pela autorização para utilizar estes resumos __Texto, Cenografia, Figurinos e Encenação Angélica Liddell __Produção de figurinos Lana Svetlana __Assistência à produção Transcoliseum __Desenho de luz Carlos Marquerie __Técnico de luz Octavio Gómez __Som Antonio Navarro __Diretor de cena África Rodríguez __Direção técnica Marc Bartoló __Assistente de produção Mamen Adeva __Produção Executiva Gumersindo Puche __Produção Iaquinandi, S.L. __Coprodução Comédie de Valence, Centre dramatique national Drôme-Ardèche y Festival Temporada Alta 2012 __Com o apoio do Ministério da Educação, Desporto e Cultura – INAEM e da Região Autónoma de Madrid __Agradecimentos Stefan Kutzenberger, Gao Wenjun, María José F. Aliste, Mónica Valenciano e o seu cão Julio bem como à cadela Copla Winogradow __Agradecimentos (apresentação em Portugal) à cadela Indy e ao seu treinador Marco Silva da Academia de Formação e Educação Canina Super Cães __Duração 1h40min. aprox. s/intervalo __Maiores de 16


A RASURA, A RAZÃO, CANTO CHÃO

O lugar do teatro não tem sido o nosso espaço natural de trabalho. E é exatamente por esta razão que a Ana Deus e eu nos apresentamos em cena perante quantos nos vieram ver, ouvir e acompanhar ao longo de uma hora de leituras, canto e comentários a partir de Raso como o Chão de Álvaro Lapa. Queremos, nesta noite, desviarmo-nos das condições habituais em que cada um de nós tem investigado as possibilidades da palavra, do gesto e da imagem, e atravessar o território incómodo duma tradição alheia, desembaraçando-nos do saber construído e experimentando o limite das formas e, sobretudo, o da nossa capacidade. Na companhia de Joaquim Bravo e António Palolo, com os quais constituía o afamado “grupo de Évora”, Álvaro Lapa espraiou a sua atividade da pintura e do desenho à escrita, empenhando-se numa conquista que nos deixa em exemplo: a liberdade que a todos assiste de fazermos com as mãos, os nervos e a cabeça segundo o impulso e a ideia que nos cruzam o espírito, conquanto vejamos neles matéria traduzível e útil. Avesso às formas tradicionais de aprendizagem, contestando a habilidade técnica, a disciplina e a especialização, desconfiando do “bem feitinho”, do bom feitio e do academismo, tanto quanto das noções conformes a cada tempo do que deverá ser o vanguardismo, Lapa materializou na sua pintura (numa manifesta simpatia por Robert Motherwell) e na sua escrita (influenciado pela beat generation) os testemunhos vivos de um labor incandescente nascido da experiência desenvolta de mediações e duma atividade criativa fundamentada na vivência dos dados imediatos. Por esta razão também, o nosso Raso como o Chão é – como tinham sido O Bobo1 e A Carbonária2 – um trabalho desalinhado, autodidata e urgente. O Bobo foi um espetáculo incendiário a partir da obra homónima de Alexandre Herculano, numa reação bruta à brutalidade que historicamente o poder político reserva às artes em Portugal; enquanto A Carbonária resultou no ensaio goyesco que adaptava Porque Morreu Eanes de Álvaro Lapa, num momento em que o país debatia o regicídio e celebrava o centenário da República. A exigente experiência em torno dos textos de Lapa (descontínuos, repetitivos, labirínticos) encorajou-nos, a mim e à Ana, a recuar à obra anterior a Porque Morreu Eanes e primeira do escritor: Raso como o Chão. Publicado em 1977, Raso como o Chão é uma coleção imperfeita de textos avulsos, escritos de um só jorro pelas mesas dos cafés no Porto. E, como todas as obras iniciais, ambiciona produzir tese: Álvaro Lapa acerta contas com o país que sobrou da Revolução de 1974 tanto quanto com a história pessoal feita da memória da prisão da Évora natal, do isolamento cultural (chamar-lhe-á “o deserto”) e da castração do indivíduo pela educação, no Portugal da ditadura. Com isto e sem otimismos, Raso como o Chão é uma obra transbordante de desejo. Raso como o Chão vive de um ritmo sincopado e de sucessivas rasuras, do fio de uma voz que constantemente deriva noutras vozes contraditórias ou, ao invés, duma voz que irresistivelmente se coloca travão a si mesma, deixando ideias em aberto, interrompendo linhas de pensamento e explorando a tensão particular da sugestão, do fragmento e do inacabado. Pela natureza heteróclita dos escritos (ensaio, texto biográfico, relato anedótico e informação, num jogo associativo assente no recorte e na colagem) e pela grande resistência que oferece à oralidade, Raso como o Chão desafiou-nos a tornar a dificuldade no motor da transfiguração do texto e trazermos para o anfiteatro este “monólogo de um pastor”. Como foi nossa escolha em A Carbonária, mantemos o Lapa-pintor à distância para nos dedicarmos ao Lapa-escritor. Mesmo sabendo que as duas faces são indissociáveis, preferimos novamente a face de sombra do artista à celebrada obra pictórica e o projeto discreto duma escrita ímpar que continua por ler e reconhecer entre nós. Apesar disto, o nosso espetáculo não é uma adaptação reverencial dos textos de Álvaro Lapa. Autorizam-nos, pelo contrário, a reorganizar os elementos de origem e a relacionálos com motivos aparentemente longínquos ou com assuntos da atualidade, para melhor nos aproximarmos do núcleo vital de uma obra insubordinada que afirma um olhar frontal sobre a trivialidade do quotidiano e as vicissitudes da vida portuguesa, aspira à emancipação das formas instituídas e exalta a aventura humana da experiência direta do mundo. Raso como o Chão propõe um duelo entre as duas vozes opostas numa radicalização da polifonia do texto de Lapa. Uma cantora e um conferencista são os antagonistas e as figuras complementares do pathos (a sensação) e do ethos (a razão), respetivamente. Toda a nervura do espetáculo vive da alternância entre as duas vias de “interpretação” do texto: a leitura, a dramatização e a encarnação pela “cantora”; e a análise, a explicação e a crítica pelo “conferencista”. A mesa, que Álvaro Lapa repetia dever ser “lugar de transformação”, é uma das paragens do nosso trabalho e quase poderia ser um piano que acompanha a Ana, como o guarda-sol poderia ser o sol alentejano ou um guarda-chuva. Tanto a mesa como o guarda-sol poderiam ainda ser o monte em que se enterra a Winnie de Happy Days de Samuel Beckett. Ou talvez não. Quase sem cenografia, quase sem figurinos, quase sem sonoplastia, recorremos a um escasso número de elementos cénicos e a um rudimentar desenho de luz para que a nossa reunião com a plateia se concentre nas palavras de Lapa, ditas pela Ana e por mim, à luz do que pressentimos e imaginamos nesta Europa e no novo século. Ler um texto em cena pode também ser isto: criar as condições justas e suficientes para pensar em voz alta, expor o caminho acidentado da descoberta intelectual e sensual dos textos que temos em mãos, na alegria duma experiência que se refaz a cada noite, diante da comunidade provisória que é a assembleia de um teatro. Raso como o Chão fala de homens livres que recuam para junto de rios vivos para aí melhor verem e viverem. São comunidades de resistência cultural como a que Lapa e Bravo ensaiaram em Lagos. Hoje, as comunidades de resistência voltam a ser lugares desejados onde possamos fazer tábua rasa das ideias feitas e do medo das velhas histórias e encontrar chão arável onde possamos renascer todos os dias. Todas as noites. Esperamos, honestamente, que este Raso como o Chão – espetáculo de teatro como a Ana e eu o desejámos – seja um lugar cantante, um rio vivo que arraste consigo “uma grande razão”, como a exigida por Mário Cezariny, outro autor terrível e tão caro a Álvaro Lapa! João Sousa Cardoso

Criação e Interpretação Ana Deus, João Sousa Cardoso __A partir da obra homónima de Álvaro Lapa __Imagens e Comentário João Sousa Cardoso __Leitura e Canções Ana Deus __Produção Três Quatro Lente __Residências Artísticas KijkRuimte (Amesterdão, janeiro de 2012) e Balleteatro (Porto, abril e julho de 2012) __Estreia Teatro Carlos Alberto, 13 a 15 de setembro de 2012 __Fotografia João Tuna __Agradecimentos Regina Guimarães, José Bragança de Miranda, Jorge Silva Melo, Daniela Paes Leão e Merel Willemsen (Kijkruimte), Isabel Barros e Né Barros (Balleteatro), André Cepeda e Sara Coelho, Ana Losa (L de Luz), Violeta Lapa e herdeiros de Álvaro Lapa __Duração 70 min. aprox. s/intervalo __Maiores de 12


Imagens © Tuna_TNSJ

1. O Bobo (2006): criação e interpretação de João Sousa Cardoso, António Preto e Daniela Paes Leão, a partir da obra homónima de Alexandre Herculano. Estreia na La Générale, Paris, Dezembro de 2006. Apresentações em Paris (Universidades Paris VIII/ Saint-Denis, Paris X/Nanterre e Paris IV/Sorbonne), em Dezembro de 2006. Em Portugal, teve representações em Lisboa (Teatro Taborda), Coimbra (Teatro Académico de Gil Vicente), Porto (Estúdio Zero), Guimarães (Centro Cultural Vila Flor) e Guarda (Teatro Municipal da Guarda), entre Janeiro e Fevereiro de 2007. 2. A Carbonária (2008): criação e interpretação de João Sousa Cardoso, Ana Deus e António Preto, a partir de Porque Morreu Eanes (1978) de Álvaro Lapa. Estreia no Teatro Municipal de Bragança, em Novembro de 2008. Teve apresentações em Lisboa (Casa Conveniente), Porto (Estúdio Zero), Coimbra (Oficina Municipal de Teatro) e Santarém (Teatro Sá da Bandeira), entre Dezembro de 2008 e Janeiro de 2009.

Erasures, reason, chanting on the ground The place which is the theater has not always been our natural work space. It is exactly for this reason that Ana Deus and I are presenting an hour-long performance (for all to see and hear) of reading, singing and commentaries based on Raso como o Chão by Álvaro Lapa. For this one night, we would like to step away from those habits in which each one of us goes about investigating the possibilities of the spoken word, of gestures and images, to cross over to the uneasy territory of a foreign tradition, disentangling us from constructed knowledge, and expanding the limits of forms and especially pushing the limits of our capacity. In the company of Joaquim Bravo and António Palolo, with whom he comprised the “Évora Group”, Álvaro Lapa branched out from his painting and drawing activities to take up writing, becoming the standardbearer for a victory, left here as an example: the freedom which all of us enjoy for creating with the hands, the senses, and the mind, in accord with the impulse and the idea which the spirit arouses as when seeing translatable and useful material. Contrary to the traditional forms of learning – and defying technical skillfulness, discipline and specialization, and doubting the “nicely done” stance of the good-natured person and academician and the timebound notions of what avant-gardism should be – Lapa put into his paintings (with clear admiration for Robert Motherwell) and writings (influenced by the Beat Generation) the living testimony of a radiant work born of dexterous experiences with mediation and creative activity founded on living immediate knowledge. For this reason as well, our show As Flat as the Ground – as with O Bobo1 and A Carbonária2 – is a slipshod, self-taught and urgent work. O Bobo (The Fool) was a wild show based on the play of the same name by Alexandre Herculano, and a rough reaction to the brutality which political power historically reserves for the arts in Portugal, whereas A Carbonária emerged from a Goya-esque rehearsal which adapted Álvaro Lapa’s work Porque Morreu Eanes (Why Eanes Died) at a moment when the country was reflecting upon the assassination of the King and the Centennial of the Portuguese Republic 100 years ago. The finesse required to deal with Lapa’s texts (disjointed, repetitive and labyrinthine) encouraged both Ana and myself to return to the earlier work, Why Eanes Died, and to the writer’s first, As Flat as the Ground.

Published in 1977, As Flat as the Ground is an unfinished collection of random texts written in one spurt of energy at various café tables in Oporto. And as with all initial writings, its ambition is to produce a thesis: Álvaro Lapa wants to settle the score with the country in terms of the 1974 Revolution as much as deal with his own personal history and the memory of his days in prison in his native Évora, of the cultural isolation (he will call it “the desert”), and the castration of the individual by the educational system in Portugal during the dictatorship. Thus, without optimism, As Flat as the Ground is a work which overflows with desire. As Flat as the Ground lives the syncopated beat of successive erasures, the strand of a voice which constantly flows from other contradictory voices, or rather, from a voice which can help but slow itself down, leaving ideas open, interrupting trains of thought and exploring the special tension of suggestion, fragmentation and the unfinished. Given the unusual nature of the writings (essays, biographical texts, anecdotes and information in an associative game based on cuttings and collage) and given the great struggle they presented us in enunciating them orally, As Flat as the Ground challenged us to turn these difficulties into the driving force for transfiguring the text to bring this “shepherd’s monologue” to the stage. As it was with our decision in A Carbonária, we kept “Lapa the Painter” at a distance in order to dedicate ourselves to “Lapa the Writer.” But knowing that these two sides cannot easily be separated, we once again preferred the darker side of the artist to the celebrated pictorial works and the discreet project of a unique writer who continues to be read and acknowledged amongst us. In spite of all this, our show is not a reverent adaptation of the texts of Álvaro Lapa. To the contrary, they allow us to reorganize the original elements and relate them to his apparently distant motives or current events topics in order to better approach the vital core of an unruly work that looks daily triviality and the vicissitudes of Portuguese life in the face, and aspires to the emancipation of accepted institutional forms and praises the human adventure of direct experience in the world. As Flat as the Ground offers up a duel between two opposing voices in a radicalization of the polyphony of Lapa´s text. A singer and a conference-giver are the characters, and the complementary figures to pathos (feeling) and ethos (reason), respectively. The backbone of the show is plays with the alternating

between the two modes of “interpreting” the text: the reading, dramatization and performing by the singer and the analysis, explanation and criticism by the conference-giver. The table, which Álvaro Lapa notes should be “a place of transformation,” is one of the stops in our piece, and this table might indeed be a piano along the same lines of duality that an umbrella can shield us from the sun as well as from the rain. Both the table and the umbrella can be the place where Winnie from Samuel Beckett’s Happy Days is buried. Or maybe not. With very little stage design, props, and sound effects, we have opted for scarce few scenic elements and rudimentary lighting so that our encounter with the audience can concentrate on Lapa’s words, spoken by Ana and myself, in the light of what we feel and imagine in this Europe of ours and in this new century. To read a text on stage might also be this: to create the right and necessary conditions to think aloud, to explore a bumpy path of intellectual and sensual discovery of the texts that we have in our hands, with the joy of and experience that gets repeated every night before a short-lived gathering of a community, which is the theatre audience. As Flat as the Ground speaks of free men who step back to the lively river’s edge to understand and to live better. These are communities of cultural resistance such as the ones which Lapa and Bravo experienced in Lagos. Today, the communities of resistance have again become the desired places where we can wipe our slates clean of fixed ideas and fears of the old stories and find arable land where we can be reborn every day. Every night. We honestly hope that As Flat as the Ground – the show that Ana and I desire it to be – becomes a place of singing, a lively river that carries “a great reason” along with it, just as Mario Cezariny would have demanded, the daunting author so dear to the heart of Álvaro Lapa! João Sousa Cardoso

1. O Bobo (2006): written and performed by João Sousa Cardoso, António Preto Leão and Daniela Paes, based on the work of the same name by Alexandre Herculano. It premiered at La Générale, Paris in December 2006. Performances in Paris (Universities of Paris VIII/ Saint-Denis, Paris X/Nanterre and Paris IV/Sorbonne), in December 2006. In Portugal, performances were held in Lisbon (Teatro Taborda), Coimbra (Teatro Académico de Gil Vicente), Oporto (Estúdio Zero), Guimarães (Centro Cultural Vila Flor) and Guarda (Teatro Municipal da Guarda), between January and February 2007. 2. A Carbonária (2008): written and performed by João Sousa Cardoso, Ana Deus and António Preto based on the work Porque Morreu Eanes (1978) by Álvaro Lapa. It premiered at Teatro Municipal in Bragança, in November 2008. Performances were also held in Lisbon (Casa Conveniente), Oporto (Estúdio Zero), Coimbra (Oficina Municipal de Teatro) and Santarém (Teatro Sá da Bandeira), between December 2008 and January 2009.


Adalberto é o célebre desconhecido, o triste homem comum, um tipo que de tão normalzinho se apalhaça dos modos mais surpreendentes. Um cidadão que, neste país pobre e maravilhoso, quer juntar-se a uma cidadã para se descobrir por inteiro. Em resumo, a personagem do mais adalbértico dos anti-heróis portugueses sai agora do papel do teatro para o oxigénio da realidade.

Texto Jacinto Lucas Pires __Interpretação Ivo Alexandre __Duração 60 min. aprox. s/intervalo __Maiores de 12


O ADALBERTO QUE HÁ EM NÓS

Era um ensaio? Não sei, sei que o Ivo Alexandre e eu estávamos numa sala de ensaios do CCB. Gente boa emprestara-nos o espaço durante uns dias. Uma sala com estantes para pautas e outros vestígios de música. Havia uma mesa e duas cadeiras, não precisávamos de mais. Eu trazia quatro ou cinco páginas com um esboço de voz e o Ivo trazia-se a si próprio. Na primeira página o que primeiro aparecia escrito era: Adalberto Silva Silva. O nome de quem está a falar ou o título da peça? Uma personagem que, há uns anos, ficara encravada numa falhada produção galaico-portuguesa (juro), voltara-me com novas palavras, novas camadas, outro corpo. Sentado à secretária, o Ivo lê, só lê, o textinho mal começado. É um ator do caraças. Sabe não julgar, e espantar-se com a verdade, e pôr-se dentro da voz que fala — em vez de se deixar ficar por cima, no camarote de onde tanta gente gosta de debitar texto, “comentando” em vez de “dizer”. E depois também sabe escutar e falar, e ninguém precisa de lhe ensinar que a comédia é o trabalho mais sério do mundo. Foi assim que começou. Tínhamos vestígios de música, uma quase-personagem e a vontade de fugir para a frente, fazer-fazer-fazer. A ideia de, a partir de um teatro pobre, mínimo, criar alguma coisa nossa, minimamente original. Uma peça mesmo boa, feita sem nada! “Nada” é maneira de dizer, claro. Tínhamos um anti-herói que se apaixonava por uma desconhecida, e tínhamos o formato antiteatro da televisão. Como fazer televisão pobre, sem vídeo nem máquinas de fumo? E tínhamos o mundo que existe em nós e o outro que há à nossa volta. Isto é, todos os fantasmas e fantasias individuais num país cada vez mais pequeno e dividido. Começámos pelo telejornal da alma. O Ivo leu as primeiras páginas e rimo-nos à gargalhada. Aquela voz ia-se tornando cada vez mais — qual é a palavra? Estranha, única, justa? Nessa noite, como se o Adalberto do Ivo me segredasse ao ouvido as palavras, escrevi mais três, quatro páginas. No dia seguinte repetimos a receita. Na sala de ensaios, entre lágrimas de riso, o escritor ia mudando algumas coisas, cortando a palha, anotando todas as novas ideias que a generosa alegria do ator lhe sugeria. A certa altura, chegámos à conclusão de que precisávamos de umas quebras no meio do texto, umas escapatórias. Escrevi uma espécie de anúncios-parêntesis-canções. Um registo tototototalmente diferente. Não tinha a certeza de funcionarem. Mas o Ivo pegou nisso e chamou-lhe um figo. Agora sim, o nosso Adalberto vivia por todos os lados. Quando acabou essa semana (duas? menos?), tínhamos quase uma peça. Depois foi cada um à sua vida. A coisa adalbértica ficou de molho por uns tempos — até que decidimos voltar a ela com olhos frescos e ainda mais pica. Numa sala de ensaios do Teatro de Almada, uma sala de café-teatro que gente boa nos emprestara por uns dias, acertámos os últimos toques, afinámos tempos e texto e acrescentámos um adereço de brincar. De repente, estava feito. Estava ali. Respirava. Era uma peça? Não sei. Só sei que era da alegria, da alegria, da alegria. Jacinto Lucas Pires

UMA COMÉDIA EM FORMATO DE BOLSO SOBRE O DESEJO, O SONHO E OS CHAMADOS PROBLEMAS PRÁTICOS. É A SÉRIO, SIM, E É PARA RIR, POIS. PARA RIR A SÉRIO?

“Adalberto Silva Silva – a reality show” is the soul of Adalberto Silva Silva in television format. Adalberto is the famous ‘unknown man,’ the sadsack common man, the fellow so normal that he fumbles and stumbles in the most surprising ways. A citizen in this poor and marvelous country who longs to find a lady-citizen to get to know completely. To sum it up, the “most Adalberto” character of the Portuguese anti-heroes is coming out now, coming off the page to breathe the air of real life in the theatre. A comedy in pocket-sized format on desire, dreams and the so-called ‘practical problems.’ It’s for real, and it’s to make you laugh. To laugh for real.

Imagens com Direitos Reservados

“ADALBERTO SILVA SILVA ~UM ESPETÁCULO DE REALIDADE” É A ALMA DE ADALBERTO SILVA SILVA EM FORMATO TELEVISIVO.

The Adalberto inside all of us Was it a rehearsal? I don’t know. I know that Ivo Alexandre and I were in a rehearsal room at the CCB. Nice people had lent us the space for a few days. A room with music stands and other musician things. There was a table with two chairs, and we didn’t need more than that. I brought four or five pages with a voice sketch and Ivo brought himself. On the first page the first thing written was: Adalberto Silva Silva. The name of who is speaking or the title of the play? A character who, some years ago, had gotten stuck in a failed Galician-Portuguese production (I swear) had come back to me with new words, new layers, another body. Seated at the desk, Ivo reads (and only reads) this hardly begun little text. He’s a damn good actor. He knows not to judge and is amazed with the truth and puts himself into the voice that is speaking – instead of floating above it in the way so many people do when they “comment” instead of “say.” And he also knows how to listen and speak, and no one need to teach him that comedy is the most serious work in the world. That’s how it started. We had bits of music, an almostformed character and the will to speed forward: gogo-go! The idea was to start off with meager, minimal theatre and create something minimally original. A really good play made from nothing! “Nothing” in a manner of speaking, of course. We had an anti-hero who falls in love with an unknown woman and we had the anti-theatre form which is television. How

to do meager television without a video camera or a smoke machine? And we had the world which exists inside us and the other outside. That is, all the individual ghosts and fantasies in an ever smaller and divided country. We began with the ‘Evening News Report of the Soul.’ Ivo read the first few pages and we were laughing aloud the whole time. The voice had become increasingly – what’s the word? – strange, unique, spot-on? That night, as if Ivo’s Adalberto had whispered the words to me, I wrote three or four more pages. The next day, we repeated the recipe. In the rehearsal room, amongst tears of laughter, the writer went about changing some things, doing the cutting, taking down all the new ideas which the actor’s joy had furnished. At a certain point, we came to the conclusion that we needed some breaks in the middle of the text, some escape routes. I wrote some announcement-parenthetical-songs. A totally different register. I didn’t know if they would work. But Ivo took a look at it and called it a peach. Now our Adalberto would live all over the place. When that week was over (two? Less than that?) we almost had a play. Then each one of us went his own way. The Adalberto thing sat for a while, stewing – until we decided to return to the project with a fresh face and more spice. In a rehearsal room in the Teatro de Almada, a café-theatre which nice people had lent us for a few days, we put the finishing touches on it, tuned the tempos and text, and added some playful props. Suddenly, it was done. There he was. He was breathing. Was it a play? I don’t know. I only know it was all about joy, joy joy. Jacinto Lucas Pires


“Atabicar o caminho” resulta de um convite do Serviço Educativo de Guimarães 2012 ao músico e sonoplasta João Martins para atravessar e religar algumas das intervenções urbanas recentes em Guimarães, com particular enfoque na Zona de Couros. _Com partida na Plataforma das Artes e da Criatividade, o “audiowalk” proposto por João Martins é uma intervenção sonora sobre um percurso de (re)descoberta e exploração da envolvente urbana do Rio de Couros, cruzando e unindo alguns dos seus espaços singulares, entre as antigas propriedades das Dominicas, onde se instalaram o novo espaço da Feira Semanal e do Mercado Municipal, a jusante, e o núcleo central da Zona de Couros, onde se preservam os vestígios arqueológicos da atividade que deu o nome ao lugar e ao curso de água. _Este projeto, desenvolvido em contacto com indivíduos e comunidades que, de formas diversificadas, habitam, usam e conhecem este território, pretende refletir sobre a natureza dos processos de evolução da cidade, projetando sobre o espaço físico as alterações sociais, económicas e políticas que o conformam, assim como extratos das biografias pessoais e coletivas que lhe dão vida ao longo da história.

Conceção e criação João Martins __Apoio à dramaturgia Nuno Casimiro __Interpretação (voz off) Pedro Carreira, com participação especial de Ana Vitorino __Agradecimentos Ao Norte, AVE, Cineclube de Guimarães, CLAII/GAE e Fraterna, Eduardo Brito, Filipe Fontes, Gil Almeida, João Sarmento, Manuel Fernandes, Manuela Freitas, Paula Oliveira, Ricardo Rodrigues, Sandra Rodrigues, Virgínia Macedo e Vera Ribeiro e a todas e todos que emprestaram os seus testemunhos e vozes a este projeto, recebendo-o nas instituições, nas ruas e em suas casas. __Agradecimentos especiais a António Amaro das Neves e Carlos Poças Falcão, cujos textos inspiraram alguns momentos e expressões, a Elisabete Pinto, pelo estudo do burgo de Couros e pelo arquivo de testemunhos de trabalhadores da indústria dos curtumes __Maiores de 12


UM PASSEIO DE NATUREZA IMERSIVA, SOBRE UM PERCURSO INVULGAR, QUE CRUZA DIFERENTES VISÕES E RELAÇÕES, NA CONSTRUÇÃO DE UM OBJETO ARTÍSTICO QUE SE ASSUME COMO “UMA COMPANHIA SONORA PARA CAMINHANTES SOLITÁRIOS”.

Com o Visões Úteis desenvolvi, desde 2002, um conjunto de “audiowalk” e outros projetos de arte na paisagem, que me permitiram integrar no meu trabalho como músico e sonoplasta, uma reflexão sobre a paisagem e, especificamente, sobre a paisagem humanizada, que expandiram consideravelmente o âmbito do meu trabalho criativo, recrutando algumas das competências e interesses que me levaram ao estudo da arquitetura e do urbanismo. Com a equipa e o método do Visões Úteis, estes processos conduziram à criação de projetos teatrais, apesar do suporte, relevantes quer para as artes performativas, quer para a arte na paisagem e a evolução deste formato tem sido fértil, com ramificações e variações a surgirem em função dos territórios e das matrizes temáticas abordadas pela companhia. Em nome próprio, neste processo inaugural em Guimarães, todo o percurso que partilhei com a equipa do Visões Úteis constitui a base sólida sobre a qual construo uma proposta assumidamente pessoal e que procura recentrar-se na raiz do formato, na sua condição de “percurso guiado e sonorizado”. Sem a intenção de construir um objeto teatral e, assim, liberto de alguns constrangimentos narrativos e dramatúrgicos, a minha abordagem ao território é, em grande medida, a principal e única ferramenta de construção da experiência. Uma abordagem que se faz, também por isso, de forma mediada, recorrendo ao trabalho com comunidades como processo de identificação dos interlocutores e partilha da reflexão que os sucessivos atravessamentos e reconhecimentos dos percursos suscitam. E estes percursos assumem-se como processos de construir uma narrativa espacial, que se cruza com outras narrativas: a história dos lugares, as biografias coletivas e pessoais, as sensações e as relações a diversas escalas com outros lugares, outros símbolos e outras comunidades. O “audiowalk” será, assim, construído pela sobreposição sucessiva e ordenada das diversas camadas de descoberta, compreensão e partilha do território e sobre o território, num processo que procura envolver e implicar diferentes olhares e procurará, numa síntese final, construir sentidos a partir das divergências e convergências. As “comunidades” – grupos formais ou informais, em escolas, lares de idosos, instituições locais, ou até cafés e tascos –, serão convidadas a participar em pequenos exercícios de reconhecimento do território que habitam e/ou usam, contribuindo para a saturação do “ambiente” da experiência global. Numa analogia com os processos da curtimenta vegetal, passaremos por várias fases de trabalho que visam devolver, às memórias e impressões, a sua flexibilidade, para depois as reduzir ao essencial e assegurar a sua durabilidade e adequação ao uso. E esta analogia com a curtimenta vegetal, que está na origem do título – o “atabicar do lagar” é uma das fases mais longas deste processo, e é onde as peles são sobrepostas uma a uma e se verifica a distribuição da casca de carvalho, pele a pele –, resulta precisamente da escolha de um dos pólos do percurso na zona de Couros e do interesse vital que assumem, para a construção de uma experiência do e no território, a história das atividades humanas e a análise das suas marcas materiais e imateriais. Porque mais do que os edifícios e os espaços entre eles, as cidades definem-se pelas atividades que nelas se desenvolvem; pela forma como evoluem e como se gere esse processo contínuo de nascimento e morte – das pessoas, das funções, dos lugares, dos edifícios… – que se torna tão mais relevante quanto mais remota no tempo é a sua origem. E, nesse sentido, Guimarães é um território particularmente rico. A escolha inicial de Couros e o desenho de um percurso que, de alguma forma se articule com o complexo atravessamento do espaço urbano extra-muros pela ribeira que aqui se evidencia, sugere precisamente percursos e visões menos habituais da cidade, profundamente ligados a esse ciclo de nascimento e morte das funções urbanas. O “audiowalk” procura, assim, promover a reflexão sobre esse processo e sobre os seus vestígios, através da sobreposição no percurso e na paisagem reais, das diversas visões e impressões recolhidas e transformadas em paisagem sonora. João Martins

“Cramming the Channel” came about thanks to an invitation made to musician João Martins by Educational Services for Guimarães 2012, whose objective it was to correlate and reconnect some of the recent urban renewal projects done in the city, with particular focus placed on the Couros neighborhood in town. Beginning at the Platform for the Arts and Creativity, this “audiowalk” created by João Martins is a sound event which follows the path of (re)discovery and exploration of the Rio de Couros leather-making and tanning area, traversing and bringing together some unique spaces along the way, including the former properties of the Dominicans, which has been taken over by the Weekly Fair and Municipal Market, itself downriver from the Couros River central area where by-gone buildings and structures used in leathermaking and tanning (and which gave the name to the river and the area) have been preserved. This project, which came about due to contact with individuals and communities which once resided in, used, and know this area in a variety of ways, intends to reflect upon how Guimarães has evolved and has molded this physical space in accordance with the social, economic, and political changes which have touched our history, alongside the biographies and collective stories that have brought life to the district over the years. This is a walk which is a plunge into an uncommon area where different visions and relationships intersect in the construction of an artistic object that assumes itself as “a company of sounds for solitary walkers.” With Visões Úteis (Useful Visions) I have been able to develop the concept of an “audiowalk,” as well as other projects on landscape art, which have allowed me to integrate reflections on landscape into my work as a musician and sound creator since 2002, most specifically the concept of the humanized landscape which

has broadened the scope of my creative work considerably, and has made me call upon the skills and interests which spurred me to study architecture and urbanism in the first place. With the team and methodology used at Visões Úteis, these processes led to the creation of relevant theatrical projects whether in terms of the performing arts or in the landscape art. The evolution of such a format has been fertile, with ramifications and variations that emerge in relation to the territory and the thematic patterns used by the company. As for myself, at this inaugural moment in Guimarães, the entire experience I have had with the team at Visões Úteis has constituted a solid base on which I have built an admittedly personal project centering on the basis of the format: “the guided audio visit.” With no intention to create a piece for the theatre, and thus free from the narrative constraints of play writers, my approach to the territory was, to a great extent, the single and unique tool for constructing the experience. This is an approach which is successful when one goes into the communities to identify willing speakers to share their own reflections on the successive journeys and references which the walks will inspire. These walks are intended to be ways to construct a spatial narrative which can crisscross with other narratives: the history of places, collective and personal biographies, feelings and relationships about places experienced on a variety of levels, and other symbols and other communities. The “audiowalk” is thus built upon the successive and well-ordered juxtaposition of various layers of discovery, understanding, and sharing – of and about the territory – in a process which seeks to involve and implicate a variety of perspectives, and which strives to build up meaning from differentness and sameness in the final analysis. “Communities” – formal or informal groups in schools, retirement homes, local institutions, and even cafés and taverns – will be invited to participate

in small exercises where they will recognize the territory which they inhabit/use, thus contributing to the saturation of the global “atmosphere” experience. In an analogy with the tanning process of leathermaking, we move on to the various stages of work that must be developed, the memories and impressions, and the flexibility because later we must get to the core and guarantee the durability and appropriateness of said object for use. If the analogy of tanning and leather-making is at the origin of the title, “Cramming the Channel,” and one of the longer bits of the show, and if this is where the hides are hung one on top of another and where the oak bark is sent out, hide to hide, the result is in the choosing of an area of the city, the Couros region, and the vital interest it serves for the creation of an experience for and about the territory, a history of human activities and the analysis of its physical and intangible marks. For as much as there are buildings and spaces between them, cities are defined by the activities which they host, by the way they evolve and how they manage this continuous process of life and death – of people, of jobs, of places, of buildings – which makes it all more relevant than remote in terms of time and origin. Considered in this way, Guimarães is indeed a particularly rich land. In making the initial choice to visit Couros and enjoy a guided visit which takes us away from the urban space of the historical city center and to the river where industrial work took place, we are suggesting the less common history and vision of the city, which is profoundly liked to the cycle of birth and death in urban day-to-day life. The “audiowalk” thus seeks to promote reflection on the process and on the vestiges of such by-gone days through the placing of diverse visions and impressions collected from the sound landscape and placed on the real landscape. João Martins


Estreado no Festival de Edimburgo em 1966, “Rosencrantz and Guildenstern are Dead” constitui-se hoje, juntamente com “À Espera de Godot” de Samuel Beckett, como um dos textos centrais da dramaturgia contemporânea e do pós-modernismo no teatro. Esta peça essencial relata as aventuras, desventuras e reflexões de Rosencrantz e Guildenstern, duas personagens secundárias da obra “Hamlet” de William Shakespeare (amigos de infância do príncipe, em ação paralela com os acontecimentos de “Hamlet” como pano de fundo), procedendo a uma reflexão meta-teatral sobre as questões centrais de “Hamlet” de Shakespeare e sobre as questões do ator e da representação. Enviados numa viagem, pelo tio de Hamlet, para tentarem conter a ira do seu sobrinho e desvendar a origem da sua loucura, Rosencrantz e Guildenstern vêem-se perdidos na sua missão e incapazes de descodificar o mundo que os rodeia, bem como a geografia do local que ocupam naquela intriga – resumindo, incapazes de saberem quem são, numa magnífica reflexão sobre a espera e a inevitabilidade da morte. A presente proposta pretende simplificar os aspetos mais grandiosos subjacentes à ação de Hamlet, centrando a encenação nas três personagens centrais deste texto (Rosencrantz, Guildenstern e o Ator), refletindo sobre as várias possibilidades de existência de uma mesma personagem, sobre a unidade existencial do indivíduo (questão tão cara ao séc. XX) e sobre a instabilidade permanente da existência, num texto que se decompõe em múltiplos sentidos e se desmultiplica em divertidos jogos de palavras, numa dialética que define uma certa dimensão critica e informe da realidade. Personagens que figuram, desfiguram e refiguram a partir de um mesmo corpo, colocando-nos perante a possibilidade de elevar e expandir os elementos do real (e a mimesis da representação) construindo, em torno dos nossos protagonistas, uma imaginação muito mais vasta, entre a presença de uma representação e a ilusão de um reconhecimento.

Imagens © Tuna_TNSJ

Uma coprodução

SILÊNCIO E ROUPAS EM SEGUNDA MÃO

Não era um país para velhos, a Inglaterra em que Tom Stoppard escreveu Rosencrantz & Guildenstern estão mortos (1966) — para velhos atores, bem entendido —, e não é um país para novos, este em que Marco Martins dedica à “nova geração de atores” uma peça tão terminal quanto a de Stoppard, arrancada ao quarto dos fundos do texto mais central da história do teatro ocidental. São “tempos péssimos, terríveis”, concorda o encenador no final de um dos primeiros ensaios no Teatro Nacional São João, Porto, onde o espetáculo se estreia hoje — mas tempos em que apesar de tudo ainda é possível ir acordar Rosencrantz e Guildenstern a meio da noite, com gritos e pancadas nas portadas, e fazê-los ocuparem as suas posições nesta história antiga que Marco Martins e os seus atores (Nuno Lopes, Gonçalo Waddington, Beatriz Batarda — e ainda Bruno Nogueira, Romeu Costa, Joana de Verona, Jorge Mota e Pedro Cruzeiro) foram adiando até melhores dias. Surpresa, os melhores dias chegaram: são estes em que tudo está podre, e não apenas no reino da Dinamarca. É “um caso de extrema urgência” que traz Rosencrantz e Guildenstern aos bastidores da corte onde Hamlet vagueia como uma assombração desde a morte do pai. Também eles vaguearão nestes bastidores como assombrações (um título é só um título, mas a confiar neste eles já estão mortos quanto a peça começa, se é que a peça começa), errando os seus próprios nomes (Nuno Lopes é Rosencrantz, Gonçalo Waddington é Guildenstern, e o contrário também pode ser verdade), duvidando do que têm para fazer no mundo, falhando os papéis das suas vidas. “Demos um passo atrás em relação à peça do Tom Stoppard: onde ele tinha duas personagens à procura do seu papel, nós temos dois atores à procura das suas personagens”, diz Marco Martins. Ao contrário do dramaturgo inglês, que escreveu Rosencrantz & Guildenstern estão mortos contra uma tradição teatral, Marco Martins não tem uma agenda freudiana. “Este texto foi um statement contra o teatro britânico; nós não temos necessidade de matar o Hamlet. Mas fazer esta peça é um desejo antigo porque ela abre um espaço de reflexão sobre o teatro e sobre a representação que nos interessa frequentar”, explica. Fala no plural porque esta aventura suicida (é da morte em geral, e da morte do ator em particular, que aqui se trata) só fazia sentido com estes atores que já são da família: “A intimidade permite ir mais fundo nestas questões. A terceira parte da peça fala sobre o Nuno e o Gonçalo, não sobre o Roz e o Guil.” No sentido em que eles são atores, mas sobretudo no sentido em que eles são pessoas: “Todos somos o Roz e o Guil: na vida podemos mover-nos e improvisar, mas só dentro de certos limites. O Stoppard assume que se inspirou muito no À Espera de Godot, do Beckett, e é impossível não ver o Roz e o Guil como reencarnações do Vladimir e do Estragon, ainda que aqui, mais do que duas pessoas à espera, nós tenhamos duas pessoas à procura: um é a cabeça, o outro é o coração. O Beckett dizia de outra maneira: um cheira mal da boca, o outro cheira mal dos pés.” (…) Inês Nadais in Público Ípsilon (12/04/2013)


ESTREADO NO FESTIVAL DE EDIMBURGO EM 1966, “ROSENCRANTZ AND GUILDENSTERN ARE DEAD” CONSTITUI-SE HOJE, JUNTAMENTE COM “À ESPERA DE GODOT” DE SAMUEL BECKETT, COMO UM DOS TEXTOS CENTRAIS DA DRAMATURGIA CONTEMPORÂNEA E DO PÓS-MODERNISMO NO TEATRO.

Premiered at the Edinburg Festival in 1966, “Rosencrantz and Guildenstern are Dead,” along with Samuel Beckett’s “Waiting for Godot,” represents one of the pivotal, central texts of contemporary playwriting in the Post-modern theatre. This important play recounts the adventures, misadventures, and reflections of Rosencrantz and Guildenstern, two secondary characters in William Shakespeare’s “Hamlet” (themselves, childhood friends of the prince whose story runs parallel, with the rest of the play as a backdrop) who go on to offer meta-theatrical reflections on the core questions of the play “Hamlet” as well as issues of being an actor and acting. Sent on a journey by Hamlet’s uncle as a way to contain his nephew’s anger and reveal the source of his madness, Rosencrantz and Guildenstern get lost on their mission and are unable to decode the world that surrounds them or to discern anything of the geography of the place where the plot unfolds, in other words, they are unable to know who they are, thus offering a magnificent reflection on waiting and the inevitability of death. This performance aims to simplify the more grandiose aspects which underlie Hamlet’s actions, concentrating on the action of the three central characters of the text (Rosencrantz, Guildenstern, and the Actor), reflecting on the various possibilities of existence for the same character, on an individual’s existential unity (a question quite dear to the 20th century), and on the permanent instability of existence in a text which is decomposed in various meanings and reduced into amusing plays-on-words in dialectics which define a certain critical and shapeless dimension of reality. These are characters which are figured, disfigured and refigured from the same body, offering

us the possibility to lift and expand elements of the real (and the mimesis of performance), creating a broader sense of imagination around our protagonists between being present at a performance and the illusion of recognition. Silence and second-hand clothing It was no country for old men, that is, the England where Tom Stoppard wrote “Rosencrantz & Guildenstern Are Dead” (1966) – not for old actors, that is – and it is just the same for young actors as well, and thus Marco Martins has decided to dedicate such an important play as Stoppard’s to the “new generation of actors,” retrieving from obscurity up one of the most fundamental texts in the history of Western theatre. These “are horrible, terrible times,” the director says at the end of one of the first rehearsals at the São João National Theater in Oporto, where the show premieres today. But these are times when in spite of it all, you can still witness Rosencrantz and Guildenstern at midnight with screams and banging of doors and have them take their places in an ancient story that Marco Martins and his actors (Nuno Lopes, Gonçalo Waddington, Beatriz Batarda — and even Bruno Nogueira, Romeu Costa, Joana de Verona, Jorge Mota e Pedro Cruzeiro) have slated to perform on better days. Surprise, those “better days” have arrived: they are the ones that are rotten for everyone, and not just in the State of Denmark. There is “a case of extreme urgency” which brings Rosencrantz and Guildenstern to the backstage of the Court where Hamlet wanders about like a ghost since the death of his father. They will also wander about backstage like ghosts (a title is just a title but in believing this from the outset, they are already dead when the plays

begins, if the play really does begin), mistaking their own names, (Nuno Lopes is Rosencrantz, Gonçalo Waddington is Guildenstern, and the opposite might also well be true), doubting what they have to do in the world and failing in the roles they have for their lives. “We took a step back in relation to Tom Stoppard’s play; whereas he had two characters looking for a role, we have two actors looking for characters,” say Marco Martins. Unlike the British playwright who wrote that Rosencrantz and Guildenstern are dead in terms of theatrical tradition, Marco Martins has no Freudian agenda. “This text was a statement against British theatre; we have no need to kill Hamlet. But doing this show stems from an old desire of ours because it opens up a space for reflection on the theatre and acting, which we are interested in pursuing,” he explains. He speaks in the plural because this suicidal adventure (about death in general and the death of the actor in particular) would only make sense within this group of actors, whom he considers as family. “Our closeness allows us to go deeper into these questions. The third part of the play talks about Nuno and Gonçalo, not about Rosencrantz and Guildenstern.” Given that they are actors, but also in consideration that they are also people, he remarks, “We are all Rosencrantz and Guildenstern; in life we can all move about and improvise, but only within certain limits. Stoppard admits that he was quite inspired by Beckett’s Waiting for Godot, and it is impossible to not see Rosencrantz and Guildenstern as reincarnations of Vladimir and Estragon, yet we have more than two people waiting – we have two people searching. One is the head and the other is the heart. Becket says it in another way: one has bad breath and the other has foot odor.” (…) Inês Nadais published in Público Ípsilon (12/04/2013)

Texto Tom Stoppard __Tradução João Paulo Esteves da Silva __Encenação Marco Martins __Cenografia Artur Pinheiro __Desenho de Luz Nuno Meira __Figurinos Isabel Carmona __Música Original e Interpretação ao vivo Noiserv __Interpretação Gonçalo Waddington, Nuno Lopes, Bruno Nogueira, Beatriz Batarda, Romeu Costa, Joana de Verona, Jorge Mota, Pedro Cruzeiro e Alexandre Calçada, Ana Mafalda Pereira, Ana Maia, Carolina Amaral, Fábio Costa, Luís Puto, Maria Quintelas, Ricardo Soares, Tiago Sarmento (alunos ESMAE) __Direção de Produção Narcisa Costa __Operação de Som António Bica __Uma coprodução Arena Ensemble, TNSJ e CCB __Agradecimentos Anthony Goicolea, José Pedro Sousa, Maria Almeida, Mário Santos, Patrícia Vasconcelos, ACT – escola de atores, Arranca Corações, A Outra Face da Lua, Bambolina Teatro, ESMAE, JSVC Lda., Urso Tigre __Duração 2h30min. c/ intervalo __Maiores de 12


“Devagar” é um percurso. Acompanhamos o trajeto interior de quatro princesas que debatem o seu destino enquanto os bárbaros se aproximam do palácio da cultura decadente... O seu final está próximo e o decoro requer o suicídio. Mas para algumas delas, a possibilidade de vida é demasiado empolgante. Questionam, debatem e discordam, a partir de uma única premissa: “Temos de morrer.” _O mundo de “Devagar” sobrepõe a cultura à vida individual, e como a cultura é construída sob o legado dos mortos, isso faz com que a lealdade aos mortos seja uma maior afirmação de dignidade do que a luta pela existência. Em “Devagar” a convulsão social encontra o individualismo e a cultura para debate. Há dignidade no suicídio? Será que nos rebaixamos quando lutamos pela sobrevivência?

QUINTA 13 FÁBRICA ASA~BLACK BOX 22H00

DEVAGAR DE HOwARD BARKER


EM “DEVAGAR” A CONVULSÃO SOCIAL ENCONTRA O INDIVIDUALISMO E A CULTURA PARA DEBATE. HÁ DIGNIDADE NO SUICÍDIO? SERÁ QUE NOS REBAIXAMOS QUANDO LUTAMOS PELA SOBREVIVÊNCIA?

As Boas Raparigas têm vindo a apurar ao longo dos anos as suas escolhas artísticas: nos encenadores que selecionam, nos textos que escolhem para levar à cena, nos atores que procuram para veicular os textos. Mas nenhum dramaturgo conseguiu tornar-se tão íntimo da companhia como Howard Barker. As Boas Raparigas têm-lhe prestado reverência, sendo já quatro as encenações efetuadas a partir de textos do autor: palavras que trabalham na ideia de como os mortos podem transformar as vidas dos vivos em “Mãos mortas”, sobre a violência e as suas consequências em “Possibilidades”, soltando a energia e força libertadora que existe na versão retrabalhada do clássico de Tchekov, “Tio Vânia” e por fim em “Mulheres Profundas/ Animais superficiais” que valeu aos atores envolvidos no espetáculo a Menção Honrosa da Crítica pela Associação dos Críticos Portugueses em 2010. Em 2012, ano de todas as crises, económica, social, política, mas também moral, não queríamos deixar de fazer regressar ao Porto, Howard Barker e as suas palavras de catástrofe, textos repletos de ideias desafiadoras, de história, beleza, violência e comédia imaginativa, tudo reunido nos extremos da experiência humana para criar uma experiência teatral poderosa. Numa escolha que não é aleatória, As Boas Raparigas reúnem num só espetáculo duas das últimas obras saídas da mente de Howard Barker: “Devagar” e um texto da obra “Cinco Nomes”. Ambos procuram e lutam por encontrar um sentido dentro da matriz desafiadora da moralidade, da sexualidade e da morte, que só o teatro pode oferecer. Trabalhar e apresentar um texto de Barker num palco é garantir um espetáculo intelectualmente estimulante, emocionalmente carregado, e politicamente pertinente. As Boas Raparigas vão para o céu, as más para todo o lado é um projeto teatral de reconhecida credibilidade teatral, sob direção artística de Rogério de Carvalho, que surge no seio de uma nova geração de criadores da cidade do Porto com formação escolar na área específica em que se integram.

Imagens © Paulo Pimenta

Howard Barker nasceu em 1946, em Dulwich. Artista polimorfo, exprime-se igualmente bem através da escrita, da pintura e da poesia. Aos 66 anos tem uma obra de quatro dezenas de peças, um libreto de ópera, cenários para cinema e televisão e desenvolveu uma Teoria do “Teatro da Catástrofe” que se dirige a todos aqueles que sofrem de uma ‘imaginação deficiente’ e que sentem um ‘desejo desarticulado de especulação moral’. A sua obra é tão conhecida em Inglaterra – uma companhia, a Wrestling School, monta exclusivamente as suas peças – quanto controversa. Demasiado clássico para a vanguarda, demasiado vanguardista para o teatro estabelecido, Barker continua por classificar-se a si mesmo. “Nestes tempos – diz ele – em que o sofisma predileto da indústria e do divertimento é fazer de conta que os doidos deprimidos têm sede de canções e de esquecimento”, o seu teatro vai em direção oposta e inverte toda a verdade manifestada. O seu teatro nem é o lugar da reconciliação, nem o da consolação, não tem por fim a solidariedade, dirige-se sim à alma “onde ela sente a sua própria diferença”. Descrito pelo Times como um dos “maiores dramaturgos vivos do Reino Unido”, Barker mostra trabalho como encenador com uma estética distintamente europeia, no seu tom abstrato, visualmente não naturalista, que faz uma contribuição direta para a expressão e objetivo do seu trabalho. Ideias poéticas, poderosas e provocativas e um imaginário vívido criam uma interessante e nova forma teatral. Barker desafia as preocupações do teatro contemporâneo britânico, com temas sociopolíticos e um teatro físico capaz de manter a linguagem poética no coração do teatro. “Slowly” goes following down a path. We follow the course of four princesses who discuss their fate while the barbarians approach the decaying palace of culture…The end is near and proper decorum indicates that they should commit suicide. For some of them, however, the alternative that is to live is much more exciting. They question, debate, and disagree – all beginning, however, from the same single premise: “We have to die.” The world of “Slowly” overlays the concept of culture and one’s own life, and as culture is built upon the legacy of the dead, this makes loyalty to the dead a greater affirmation of dignity than the struggle to stay alive. In “Slowly,” convulsions in society cause the concept of individualism to clash with culture. Is there dignity in suicide? Are we lessening ourselves when we fight for our own lives? As Boas Raparigas (The Good Girls) company have been sharpening their skills in recent years with their artistic choices – in the directors they choose, in the texts they take to perform on stage, in the actors they seek out to be a vehicle for the texts. But no playwright has become more highly regarded by the company than Howard Barker. As Boas Raparigas’ esteem is seen in their four shows based on Barker’s writing: texts that take up the question of how the dead can transform the lives of the living in “Dead Hands,” a show on violence and its consequences in “Possibilities,” the liberating forces of energy and strength in a reworked version of Chekov’s “Uncle Vanya,” and finally “Deep Women/Superficial Animals,” which earned the actors a Critic’s Honorable Mention award from the Association of Portuguese Drama Critics in 2010.

In 2012, the year of all the economic, social, political and even moral crises, we could not resist going back to Oporto and revisiting Howard Barker and his words of catastrophe, texts full of challenging ideas, history, beauty, violence and imaginative comedy, all tied together in the extremes of human experience to create a powerful theatrical experience for the audience. In a very purposeful choice, the Boas Raparigas have brought together two of the most recent pieces to emerge from the mind of Howard Barker: “Slowly” and a text from the work, “Five Names.” Both works go in search of and struggle to find meaning inside the challenging matrix of morality, sexuality, and death, which only the theatre can provide. To work on and bring a piece by Howard Barker to the stage is to guarantee the audience an intellectually stimulating show, emotionally charged and politically relevant. “Good girls go to heaven, but bad girls go everywhere” – this is a Boas Raparigas theatre project of acclaimed theatrical worth, under the direction of Rogério de Carvalho, who has emerged from amongst a new generation of artists from Oporto with academic qualifications in their individual areas of expertise.

out controversy. Too classical to be avant-garde and too avant-garde for the theatre establishment, Barker continues to be a category unto himself. “In these times,” he says, “when the favorite sophism from the industry and from entertainment is to pretend that crazy, depressed people are thirsty for songs and want to forget,” his theatre goes off in another direction altogether and turns manifest truth upside down. His theatre is a place for neither reconciliation nor consolation, nor does it present solidarity as a desired end, instead, addressing the soul “where it feels its own difference.” Described by the Times as “one of the greatest living playwrights in Britain,” Barker shows his skill as a writer with a distinctively European aesthetic in his abstract tone, visually not naturalistic, which aids in the direct contribution to the expression and objective of his work. Poetic ideas, powerful and provocative, and a vivid imagination create an interesting and new theatrical form. Barker challenges what contemporary British theatre is so concerned about by offering us socio-political themes and physical theatre that is also able to uphold poetic language at the heart of the Theatre.

Howard Barker was born in Dulwich in 1946. A multi-faceted artist, he is equally at ease expressing himself in writing, painting and poetry. At the age of 66, his collection of works includes more than 40 plays, an opera libretto, and scenes for cinema and television. He has also developed a theory of “Theatre of Catastrophe” which is geared toward those who suffer from a ‘diminished imagination’ and who feel ‘a disjointed desire for moral speculation.’ His work is so well known that a company called the Wrestling School performs only his plays, yet Barker is not with-

Autor Howard Barker __Tradução Constança Carvalho Homem __Encenação Rogério de Carvalho __Interpretação Anabela Sousa, Carla Miranda, Maria do Céu Ribeiro, Sandra Salomé __Desenho de Luz Jorge Ribeiro __Cenografia Cláudia Armanda __Figurinos Catarina Barros __Sonoplastia Luís Aly __Construção de Cenário Tudo Faço __ Confeção de Figurinos Ana Maria Fernandes __Produção Executiva Cândida Silva __Coprodução As Boas Raparigas... / TNSJ __Créditos Fotográficos Paulo Pimenta __Apoios Câmara Municipal do Porto, Cabeleireiro Upgrade Productions, Flores Belo, Táxi F.G. Cargo, transportes, Lda., Tintas CIN, Oval - Gabinete de Arquitetura Planeamento e Engenharia, Lda. __Duração 60 min. s/intervalo __Maiores de 16


Espetáculo “A Africana” apresentado no âmbito da rede

Rede cofinanciada por

“A: Cheguei ao país maravilhoso. Ao desconhecido. Não estou em mim. Estou do outro lado. Sou a invenção do mundo. Sou um Grande Ó. Regressei ao paraíso. O tempo é redondo como a terra. O princípio é igual ao fim. Sou Adão e Eva e descobri o que já foi descoberto. Sou a globalização. Sou a heterogeneidade. E a imortalidade. E tanta coisa que não caibo em mim. Olho em volta e é tudo tão… é tudo tão… é tão… é tão… é tão… diferente, exato, é essa a palavra: diferente. Será que isto é um lugar-comum? Ou virá a ser? Vou ganhar um prémio. Está garantido. Tenho de voltar e contar. Que palavras é que vou utilizar? Isto não se escreve nem diz. É… é tudo tão…é tão… é tão… diferente, exato, é essa a palavra: diferente. Será que isto é um lugar-comum? Estão todos olhar para mim. Sou a minoria. Sinto-me tão... tão... tão... diferente, exato, é essa a palavra: diferente. Será que isto é um lugar...” Depois de “A Portugueza” (2010), uma masterclasse de canto tendo como objeto de análise o Hino Nacional, “A Africana” é o segundo projeto que a Companhia de Teatro Cão Solteiro realiza em parceria com o artista plástico Vasco Araújo. Neste espetáculo, tomam-se a música de L’Africaine de Giacomo Meyerbeer e o libreto de Eugéne Scribe, onde Vasco da Gama, navegador e descobridor, ambiciona um “país maravilhoso”. Partimos desta vontade para passar pelo inesgotável discurso da alteridade e do estrangeiro, pretextos para uma rescrita a pensar nas possibilidades de tais palavras nos tempos de hoje. Prossegue-se desta forma uma linha de trabalho que se centra no cruzamento da linguagem teatral com a linguagem musical e o canto.

Autoria do projeto Cão Solteiro & Vasco Araújo __Texto original a partir do libreto José Maria Vieira Mendes __Adaptação, música original e direção Nicholas McNair __Figurinos Mariana Sá Nogueira __Desenho de luz Daniel Worm __Cabelos e maquilhagem Sano de Perpessac __Mestra de costura Teresa Louro __Costureiras Maria José Baptista, Palmira Abranches __Assistente de figurinos Ricardo Santanna __Produção e fotografia Joana Dilão __Atores Bernardo Rocha, Luís Magalhães, Patrícia da Silva, Paula Sá Nogueira, Paulo Lages __Solistas Marina Pacheco, Sónia Alcobaça, Vasco Araújo __Coro Gulbenkian Ana Urbano, Anna Kássia, Ariana Russo, Beatriz Cebola, Frederico Projecto, Inês Lopes, Jaime Bacharel, João Barros, José Bruto da Costa, Luís Pereira, Marta Queirós, Nuno Fidalgo, Pedro Morgado, Sérgio Fontão, Tanja Simic, Verónica Silva __Preparação do Coro Sérgio Fontão __Ensemble do Estúdio de Ópera da ESML Catarina Távora, violoncelo, João Carvalheiro, clarinete, Tatiana Rosa, flauta __Coprodução Cão Solteiro, Maria Matos Teatro Municipal, Fundação Calouste Gulbenkian __Agradecimentos André e. Teodósio, André Godinho, Benjamim Araújo, Celeste Patarra, Culturgest, João Brandão, Jochen Pasternacki, Lúcia Lemos, Maria Ana Bernauer, Maria do Céu Araújo, Miguel Vale de Almeida, Nuno Lopes, Paulo Carcavelos __Apoios Eau Thermale Avène, Pláscart, Nestlé Waters, ESML, Montiqueijo, Sapataria Seaside, Sapataria Brunu’s __Duração 105 min. s/ intervalo __Maiores de 12


Cão Solteiro é uma plataforma de artistas de diferentes áreas que desenvolve projetos de teatro desde 1997. Estabeleceu ao longo deste tempo um processo de trabalho fortemente suportado pela construção de imagens, ao qual é inerente o cruzamento de linguagens, e a transferência de códigos entre disciplinas artísticas. Tem deste modo abordado sistematicamente as questões do Indivíduo na sua relação consigo próprio, na sua relação com o Outro, e na sua relação com o Mundo, os acidentes da procura da Felicidade, o Amor, a Morte; equacionando os limites entre Real e Ficção e repensando a cada vez as circunstâncias e os processos da criação. Trabalha em Lisboa, onde tem estabelecido regularmente parcerias com o Teatro Municipal Maria Matos, a Culturgest, e a Fundação Calouste Gulbenkian. É uma estrutura associada do Festival Temps d’Image. Apresentou ainda espetáculos em Beja, Coimbra, Estarreja, Évora, Guimarães, Marselha/França, Montemor-o-Novo, Porto, Viseu, Londres/Inglaterra, Loulé. Vasco Araújo nasceu em Lisboa, em 1975, cidade onde vive e trabalha. Em 1999 concluiu a licenciatura em Escultura pela FBAUL. Entre 1999 e 2000 frequentou o Curso Avançado de Artes Plásticas da Maumaus em Lisboa. Participou em diversas exposições individuais e coletivas tanto nacional como internacionalmente. Em 2003 recebeu o Prémio EDP Novos Artistas. O seu trabalho está publicado em vários livros e catálogos e representado em várias coleções, públicas e privadas, como Centre Pompidou, Musée d’Art Modern (França); Museu Coleção Berardo, Arte Moderna e Contemporânea, (Portugal); Fundação Calouste Gulbenkian (Portugal); Fundación Centro Ordóñez-Falcón de Fotografia – COFF (Espanha); Museo Nacional Reina Sofia, Centro de Arte (Espanha); Fundação de Serralves (Portugal); Museum of Fine Arts Houston (EUA). “A obra de Vasco Araújo tem incidido sobe a identidade como um território de confronto entre o indivíduo e o jogo social das imagens da sua representação. O artista tem apresentado diversos projetos onde a representação (…) surge encenada segundo determinadas convenções reconhecíveis numa história social ou cultural.”

Imagens © Joana Dilão

“A: I’ve arrived in a marvelous country. Undercover. I’m not here inside myself. I’m on the other side. I’m the invention of the world. I’m the Big ‘O’. I’ve come back from Paradise. Time is as round as the world is. The beginning is the same as the end. I am Adam and Eve and I have discovered what has already been discovered. I am globalization. I am heterogeneous. And immortality. And even more things that don’t fit inside me. I look around and it’s all so…it’s all so…it’s so… it’s so… it’s so…different, right, yes, that’s the word, different. Might this be a common place? Or might it become one? I’m going to win a prize. It’s guaranteed. I have to go back and tell them. What words will I use? It’s not anything you can write or say. It’s…it’s all so… it’s so… it’s so…different, right, that’s the word: different. Might this be a common place? They are all looking at me. I am in the minority. I feel so…so…so…different, right, that’s the word; different. Might this be a place…” After “A Portugueza” (2010), a master class for singers which used the Portuguese National Anthem, we have “A Africana,” the second project coming from the Cão Solteiro Theatre Company, in partnership with the artist, Vasco Araújo. In this show, the song L’Africaine by Giacomo Meyerbeer (with lyrics by Eugène Scribe) is taken up, where Vasco da Gama, navigator and explorer, endeavors to reach a “marvelous country.” We set off with a desire to travel through the unending discourse of otherness and the foreign, pretexts for a rewriting of text which will ponder the possibilities of such words when used in our world today. From here the focus turns to the intersection of theatrical language with that of music and singing. Cão Solteiro is a platform for artists from different areas which has been developing theatre performance projects since 1997. Over time, it has established an artistic rapport which has leaned heavily on the construction of images in which the intersection of languages and the transference of codes amongst artistic disciplines are crucial. It has thus systematically approached issues and questions relating to the Individual with respect to him/herself, to the

relationship with the Other and the world, and the accidents occurring as we search for meaning in happiness, love and death. These issues themselves deal with the limits between what is real and what is fiction and increasingly rethink the circumstances and processes of the creative act. The Company works out of Lisbon and has regular partnerships with the Maria Matos Municipal Theatre, Culturgest, and the Calouste Gulbenkian Foundation. It is also associated with the Temps d’Image Festival. The Company has performed nationally in Beja, Coimbra, Estarreja, Évora, Guimarães, Loulé, Montemor-o-Novo, Oporto, and Viseu, and internationally in London (England) and Marseilles (France). Vasco Araújo was born in Lisbon in 1975, the city where he lives and works. In 1999, he completed his degree in Sculpture at FBAUL. From 1999 to 2000 he attended an advanced course in the Plastic Arts at Maumaus in Lisbon. He has also participated in a variety of individual and collective shows on both the national and international level. In 2003 he received the EDP Award for New Artists. His work has been published in a wide range of books and catalogues and has been shown in various public and private collections such as the Pompidou Centre, Musée d’Art Moderne (France); the Berardo Collection, Museum of Modern and Contemporary Art, (Portugal); the Calouste Gulbenkian Foundation (Portugal); Fundación Centro Ordóñez-Falcón de Fotografia – COFF (Spain); the Reina Sofia National Museum, Centre of Art (Spain); the Serralves Foundation (Portugal); and the Houston Museum of Fine Arts (Texas, USA). “The work of Vasco Araújo has focused on identity as a territory of confrontation between the individual and the social games of images from its representation. He has presented several projects where representation (…) emerges as depicted according to certain recognizable conventions in social or cultural history.”

“A AFRICANA” É O SEGUNDO PROJETO QUE A COMPANHIA DE TEATRO CÃO SOLTEIRO REALIZA EM PARCERIA COM O ARTISTA PLÁSTICO VASCO ARAÚJO.


“DURANTE OS MEUS 18 ANOS DE EXISTÊNCIA APRENDI QUE SÓ PODEMOS SER FELIZES SE NOS DILUIRMOS NA MULTIDÃO ANÓNIMA, SE NOS ADAPTARMOS À SOCIEDADE COMO UNS IDIOTAS. MAS EU NÃO PODIA, NÃO O QUERIA FAZER.” LARS NORÉN, A 20 DE NOVEMBRO


“A 20 de Novembro” é um monólogo escrito por Lars Norén a partir do diário íntimo, publicado na internet, de Sebastian Bosse, um jovem de 18 anos que atirou sobre os alunos e os professores do seu antigo Liceu antes de se suicidar. Um texto intenso, frio e clínico. Sozinho no palco, o ator expõe os mecanismos de humilhação que levaram o jovem à vingança e ao suicídio e interroga a nossa responsabilidade.

A 20 de Novembro de 2006, na cidade alemã de Emsdetten, Sebastian Bosse, um jovem rapaz de 18 anos vestido de preto e equipado de uma máscara de gás, faca, cinturão de explosivos, espingarda de cano serrado e pistola, entra no seu antigo liceu, abre fogo sobre alunos e professores e fere 30 pessoas antes de se suicidar. Na esperança de ser ouvido, tinha deixado uns dias antes o seu diário na Internet onde descreve as suas frustrações na escola, as humilhações constantes de que foi vitima pelos colegas e a sua incapacidade em fazer amigos. Este será o seu último dia numa escola que, como ele nos diz, lhe ensinou que era um perdedor. A partir deste diário deixado pelo adolescente, Lars Norén transpõe o texto para a sua escrita dramatúrgica e escreve um monólogo onde a poesia se mistura com a narração violenta e clínica de um massacre e de um suicídio programados. Texto intenso, concreto, realista e trágico onde a memória passa como sombras na consciência, A 20 de Novembro é uma chamada de socorro mas a ajuda não chega a tempo. É um requisitório que descreve uma sociedade que esmaga os seus indivíduos mais fracos. O texto ultrapassa o faitdivers para expor o mecanismo de humilhação, a confusão de valores, o fascínio pela guerra e pelas armas, o sentimento de exclusão e desprezo vividos pelo jovem. As palavras do jovem Sebastian Bosse, reduzidas à sua expressão mais simples, são singulares e excessivas. As referências à cultura juvenil e global dos jogos vídeo e a interpretação crítica da sociedade ocidental encontram necessidade de um público mais vasto, de um público que se encontra para além das fronteiras da sua língua original impelindo-o por vezes a falar em inglês, a linguagem global, para que o mundo inteiro o compreenda. As interpelações constantes ao público, o seu diálogo com ele (num teatro de proximidade, de intervenção) tornam os espectadores testemunhas ou cúmplices desta terrível aventura pela qual ninguém pode ficar indiferente. Porque ninguém está inocente. Francis Seleck

On the 20th of November, 2006, in the German city of Emsdetten, 18-year old Sebastian Bosse, dressed in black and equipped with a gas mask, knife, explosives belt, sawed-off shotgun and pistol, entered his former high school and opened fired on students and teachers, wounding 30 people before taking his own life. In the hope of having his voice heard, just days before the shooting he put his private journal on the Internet in which he describes his frustrations at school, the constant humiliation which he was a target of, and his inability to make friends. This would be his last day in a school which, as he put it, taught him to be a loser. Using the journal left by the young man, Lars Norén transposes the text into a vehicle for the stage and writes a monologue where poetry mixes with the violent and clinically-cold narration of a planned massacre and suicide. An intense, concrete, realistic, and tragic text where memory traverses the darkness of consciousness, The 20th of November is a call for help, but the help does not arrive in time. It is an accusa-

tion of a society which crushes its weakest members. The text goes beyond the aspect of a ‘newsy tidbit’ to explore the mechanisms of humiliation, the confusion of values, the fascination for guns and weapons, and the feeling of exclusion and contempt felt by the young man. The words of young Sebastian Bosse, reduced to their simplest statements, are remarkable and extreme. References to the global youth culture of video games and the critical interpretation of western society mean that a broader audience is needed for this show, an audience that is found beyond the borders of the original language, forcing him to speak the international language of English so that the entire world will understand him. The demands for explanations made to the audience and its dialogue back with him (in the closeness of the theatre) make the audience members witnesses or accomplices to this terrible adventure, which no one can feel indifferent to. Because no one is innocent. Francis Seleck

Imagens © Jorge Gonçalves

“The 20th of November” is a monologue written by Lars Norén based on the private journal, published on the Internet, of Sebastian Bosse, an 18-year old who shot students and teachers at his former high school before committing suicide. An intense text, cold and clinical. Alone on stage, the actor describes the mechanisms of humiliation which drove the young man to the limits of revenge and suicide in a play which also questions our own responsibility in the matter.

De Lars Norén __Tradução Francis Seleck __Com João Pedro Mamede __Direção Francis Seleck __Produção Cena Múltipla/Associação Cultural O Mundo do Espectáculo __Apoio Câmara Municipal de Almada __A 20 de Novembro estreou no Auditório Fernando Lopes Graça em Almada no dia 04 de março de 2011 __Agradecimentos Catarina Pé Curto e André Pais __Duração 60 min. s/intervalo __Maiores de 16


As coisas correm bem a Alex. Ama a sua mulher, a sua filha, a sua cidade, o seu trabalho... mas por vezes a força da vida pode bater contra nós. E tudo pode ser-nos tirado. Alex nunca dá voz às palavras cruéis que pronunciou naquele dia. Mas podemos imaginá-las. Simon Stephens leva-nos subtilmente, em tom de confidência, ao ponto em que nos basta apenas preencher as palavras não ditas. Monólogo perfeito de quarenta e cinco minutos, parece a história trivial de um jovem amor, da paternidade e da família, mas com a ratoeira de uma tragédia sem sentido. Pode ser Deus responsável pela beleza da vida e também pela crueldade inexplicável?


E NO FINAL, O QUE FAZEMOS NÓS?

Há uns anos (nem muitos, 15? 20?) Um precipício no mar não seria uma peça de teatro, nem pensar. Seria um conto, daqueles a que unanimemente chamam agora short-story, porque já ninguém sabe o que foi o récit. Tem tudo o que para o conto inventou Maupassant: personagens, situações, o momento decisivo em que o destino muda e a surpreendente “chave”, a conclusão. E é contado na primeira pessoa, como em tanta da melhor narrativa anglo-saxónica, aquela primeira pessoa distanciada (pelo tempo, mas também pelo carácter), um eu-ele como só os britânicos, desde a Mansfield, conseguem. E podíamos falar de tanta gente para emparelhar este conto, Alice Munro, por exemplo. Ou Carver. Até às vezes pensei em Ana Teresa Pereira. E, mal o li, pensei em pedir a tradução a Hélia Correia, romancista, ficcionista que os britânicos abandonaram ali entre Mafra e a Ericeira. Mas não sei de nenhuma outra peça de teatro assim. Por isso mesmo, mal a li (o ano passado) a quis montar (fiel à divisa do editor Robert Voisin: “só quero editar os livros que mais ninguém quer”), para estar numa coisa que nunca vi, nem sabia que existia, um conto ao vivo. Um conto pensado como peça de teatro. Porque Simon Stephens, persistente escritor que há anos tenta “uma certa escrita de teatro” (mas hesita entre várias hipóteses, ainda – saudavelmente – não fixou a voz, nem congelou a maneira), escreveu este falso-conto (este mais-do-que-um-conto) para ser representado. Ao nosso lado, sem luz, sem cenário, ao nosso lado mesmo, aqui ao pé, por um ator igualzinho a nós. Que procura a maneira de contar uma história dolorosa, que a esconde, a atrasa, a mascara, a quebra. É a partir da dificuldade de contar – ou da possibilidade de desviar, de encobrir a dor – que Stephens consegue criar esta obra breve que será a mais original do seu teatro que já faz dois grossos volumes da coleção da Methuen e mais uns quantos textos soltos (que engraçado, ainda em 2001, vimos Herons, peça ainda juvenil na sala Upstairs do Royal Court – e agora está a ser representado em todo o mundo...) Porque o teatro agora, em 2010, depois de tantas ruturas, sacralizações, dessacralizações, radicalizações, tanto site-specific, dança e transformações – pode agora ser só isso: uma dificuldade em contar a dor, um ator ao nosso lado. E como é que vamos despedir-nos dele? Abandonamo-lo? Sozinho? Jorge Silva Melo, julho de 2010

ESTA PEÇA SOBRE A FAMÍLIA, O MEDO, O LUTO E A PERDA É COMO UM FALSO MAR CALMO DEBAIXO DO QUAL SE ESCONDE UMA CORRENTE VIOLENTA DE MÁGOA E TRISTEZA.

Imagens © Jorge Gonçalves

Things are going well with Alex. He loves his wife, his daughter, the city where he lives and his work…but sometimes the forces of life grab and tug at us. And everything can be taken away from us in an instant. Alex will never speak about the cruel words he spoke on that day. But we can imagine what they were. Playwright Simon Stephens subtly takes us, in a tone that one uses to whisper a secret, to the point in which we only need to fill in the gaps with those unspoken words. A perfect 45-minute monologue, it seems to be a trivial story of young love, and being the father of the family but a trap has been set, a senseless tragedy. Might God be responsible for the beauty of life and for unexplainable cruelty as well? This play about the family, fear, mourning, and loss is like a deceptively calm sea which underneath hides violent currents of hurt and sadness.

And in the end, what are WE doing? A few years ago – not so many, 15? 20? – Sea Wall would not have been presented as a theatrical play. It would have been a tale, one of those which is unanimously called a short story since no one knows what the back story might have been. It has everything which Maupassant invented for story-telling: rich characters and situations, the decisive moment in which one’s destiny changes, and the surprising irony provided at the conclusion. And it is told in the first person – as with so many of the best Anglo-Saxon narratives – and with the first person at a distance (in time but also with respect to personality), a ‘me-him’ aspect which only the British since Mansfield can do. And we could talk about the many people whom this story compares to, like Alice Munro, for example. Or Carver. Sometimes I even thought about Ana Teresa Pereira. And as soon as I began reading it, I thought to ask for a translation from Hélia Correia, the novelist and writer left behind by the British between Mafra and Ericeira. But I know of no other play like this one. Thus, as soon as I read it (last year) I wanted to stage it (faithful to Robert Voisin’s motto: “I only want to publish the books that no one else does.”) so that it would become something that I had never seen before nor knew existed, a short-story told live – a short story conceived for the theatre because Simon Stephens

is a doggedly persistent author who for years has been trying “a certain type of theatrical writing” to be performed on stage (but who hesitates between various options and who has, in a healthy way, not yet determined which voice to use nor has frozen his manners) right next to us without light or sets, truly right next to us, performed by an actor just like us. He is someone in search of a way to tell a painful story which hides, delays, masks, and breaks the voice. It is by starting off with a story that is difficult to tell – or one where it is tricky to deflect or disguise the pain – that Stephens is able to create this short work, which is itself one of the most original in his repertoire and part of a life’s work which comprises two volumes in a Methuen collection, in addition to various other random texts. (And how amusing that in 2001 we attended Herons at the Upstairs at Royal Court, a ‘still young’ piece at the time now being presented to the entire world.) How can it be then that in 2010 – after so many ruptures, acts of making sacred and then unsacred, and radicalizations, so site-specific, dance and transformations – we have come to this: experiencing difficulty in talking about pain with an actor by our side? And how should we say farewell to him? Do we abandon him? Alone? Jorge Silva Melo, July 2010

De Simon Stephens __Tradução Hélia Correia __Com João Meireles __Cenografia e Figurinos Rita Lopes Alves __Luz Pedro Domingos __Encenação Jorge Silva Melo __Produção Artistas Unidos __Estreia na Culturgest a 15 de julho de 2010 no âmbito do Festival de Almada __Duração 45 min. s/intervalo __Maiores de 12


ATIVIDADES PARALELAS

QUINTA 06 A SEXTA 14 ESCOLAS SECUNDÁRIAS DO CONCELHO DE GUIMARÃES

EMBAIXADORES DO TEATRO

QUARTA 05 PAC~BLACK BOX~21H45

ENSAIO SOBRE O TEATRO DE RUI SIMÕES ORGANIZAÇÃO EM PARCERIA COM O CINECLUBE DE GUIMARÃES ENTRADA LIVRE ATÉ AO LIMITE DA LOTAÇÃO DA SALA Partindo da adaptação teatral pelo Teatro O Bando, da obra literária do Prémio Nobel José Saramago “Ensaio Sobre a Cegueira”, Rui Simões realiza um longo documentário sobre todo o processo criativo, até à estreia, constituindo em si um ensaio sobre a arte de fazer teatro. É um forte e emotivo documentário, onde, numa cumplicidade única, a câmara revela o embrião de um espetáculo que, uma vez mais, demonstra que “a Arte representa as coisas de uma forma mais pertinente e acutilante que a realidade”. A apresentação do filme contará com a presença do realizador Rui Simões. Starting from the theatrical adaptation of José Saramago’s "Blindness" by Teatro O Bando, Rui Simões directs a long documentary on the whole creative process until the première. This is a true essay on the art of theatre, a strong and emotional documentary with the presence of the director, Rui Simões.

QUINTA 06 A SEXTA 14 CCVF~GRANDE AUDITÓRIO

VISITAS GUIADAS AOS BASTIDORES Durante as montagens dos espetáculos, abremse as portas do Grande Auditório do CCVF para que o público conheça os ritmos e procedimentos característicos do trabalho coletivo que é a criação teatral. Uma oportunidade única de conhecer os bastidores de um dos auditórios mais bonitos e bem equipados do país e simultaneamente de contactar com os artistas e os técnicos em plena ação.

Realização Rui Simões _Género Documentário Ano de produção 2006 _Duração 90 min.

During the preparation of the shows, the CCVF Grand Auditorium opens up the doors to the public. The rhythms and the characteristic procedures of this collective and creative work will be visible to the public. A unique opportunity to discover the backstage of one of the most beautiful and well-equipped national auditoriums and to contact with the artists and technicians while they work.

DIAS 06, 07, 08, 13, 14 E 15 ESPAÇO OFICINA

Público-alvo Maiores de 10 anos _Nº máximo de participantes 1 turma/30 pessoas _Data limite de inscrição até 48horas antes _Inscrição gratuita _As inscrições poderão ser efetuadas presencialmente, no Centro Cultural Vila Flor, ou através do e-mail servicoeducativo@aoficina.pt

OFICINA DE IMPROVISAÇÃO Esta oficina de improvisação é dirigida a não profissionais que têm curiosidade e vontade de estar em palco sem guião ou história definida e não têm medo de falhar. O improvisador encontrará no “falhanço” um amigo. Dividida em seis sessões, com um registo de diversão para formador e formandos, a oficina será preenchida com exercícios, jogos e técnicas de improviso. This improvisation workshop is dedicated to curious amateurs and to people eager to be on stage without a script or a story and who are not afraid to fail. "Failure" is a friend. Divided into six sessions, the workshop is filled with exercises, games and improvisation techniques. Horários dias 06 e 07 das 21h00 às 23h00; dia 08 das 16h30 às 18h30; dias 13 e 14 das 21h00 às 23h00; dia 15 das 16h30 às 18h30 e das 19h00 às 20h00 (sessão aberta) Formador Daniel Pinto _Público-alvo Maiores de 18 anos Nº máximo de participantes 15 _Data limite de inscrição 03 de junho _Preço 10 euros

Acompanhados por alguns dos encenadores ou atores que integram a edição deste ano dos Festivais Gil Vicente, visitaremos as escolas secundárias do concelho. Os jovens poderão saber mais sobre o percurso dos nossos convidados: descobrir o que os levou a trabalhar na área do teatro e como encaram hoje uma vida dedicada à criação artística. Accompanied by some of the directors or actors that make up this year's edition of Festivais Gil Vicente, we will visit the secondary schools of Guimarães. Young people will be able to learn more about the lives of the actors and directors: to find out what led them to work in theater and how they see a life dedicated to artistic creation.

SÁBADO 15 PAC~BLACK BOX~17H30

ANTÓNIO, UM RAPAZ DE LISBOA DE JORGE SILVA MELO ORGANIZAÇÃO EM PARCERIA COM O CINECLUBE DE GUIMARÃES ENTRADA LIVRE ATÉ AO LIMITE DA LOTAÇÃO DA SALA “António, Um Rapaz de Lisboa” começou por ser uma série de quatro episódios para a televisão, pensada a partir de um texto que já tinha sido encenado em teatro e que acabou por se transformar num filme. Escrito e realizado por Jorge Silva Melo, “António, Um Rapaz de Lisboa” é uma crónica urbana sobre a trajetória de um homem, entre os 25 e os 30 anos, com os problemas típicos da sua geração, que vão dos casos de amor complicados aos empregos frustrantes, passando pela toxicodependência. Com fotografia do espanhol José Luís Alcaíne, que filmou para Almodovar "Mulheres à beira de um ataque de nervos", e música de Jorge Palma, “António, Um Rapaz de Lisboa” conta nos principais papéis com Manuel Wiborg, Sylvie Rocha e Lia Gama. A apresentação do filme contará com a presença do realizador Jorge Silva Melo. "António, a Lisbon Boy" began as a series of four episodes for television, from a text that had already been staged and later became a movie. Written and directed by Jorge Silva Melo, "António, a Lisbon Boy" is a chronicle of the urban history of a boy, with the typical problems of his generation. Realização Jorge Silva Melo _Intérpretes Joana Barcia, Ivo Canelas, Isabel Munoz Cardoso _Género Drama _Ano de produção 1999 _Estreia nacional 18 de janeiro de 2002 Duração 116 min.




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