MARVEL COMICS A TRAJETÓRIA DA CASA DAS IDEIAS NO BRASIL
© 2021 Alexandre Morgado da Silva Neto Todos os direitos reservados. Nenhuma parte da presente publicação pode reproduzida armazenada ou transmitida por quaisquer que sejam os meios, mecânico, eletrônico, digital ou fotocópia sem a prévia autorização do autor. O autor e a editora reconhecem e respeitam os direitos de propriedade destes personagens pela Marvel Comics e suas publicações no Brasil pela Panini Comics. Este livro não tem o caráter meramente de exploração comercial da marca ou dos personagens da Marvel. Trata-se de um trabalho de cunho jornalístico e acadêmico, de análise crítica e de mera expressão de ideias e de opiniões sobre o seu conceito artístico. Todas as imagens referem-se à divulgação do trabalho dos desenhistas e seus criadores.
Preparação de texto e diagramação: Guilherme "Smee" Sfredo Miorando Revisão ortográfica: Marcos Eduardo Massolini Capa e projeto gráfico: VAM! Preparação de imagens: Adão de Lima Jr. Impressão: São Paulo 2021
“Together we stand, divided we fall”* *Juntos nós resistimos, separados nós caímos. Trecho de “Hey You”, do álbum “The Wall”, da banda inglesa Pink Floyd.
Dedicado aos amores da minha vida, minha esposa Camila Sanabio e o meu filho Igor Morgado.
Em memória da minha querida mãe, Maria Molina. Amo-te, um dia a gente se vê.
AGRADECIMENTOS Agradecimentos especiais aos amigos Renato Frigo (do grupo Colecionadores de HQs, do Facebook), pelo incentivo para eu escrever este livro, e ao Toni Rodrigues, pela incrível ajuda na idealização deste projeto. Sem a ajuda de vocês, seria impossível a obra ser feita. Mais agradecimentos aos profissionais que trabalharam com as publicações no Brasil - e aos diversos colecionadores, que ajudaram, de um jeito ou de outro, na confecção deste livro. Muitas das informações aqui presentes são frutos de conversas com esses profissionais e colecionadores. Menções para o editor e cartunista Otacílio Assunção, o Ota; ao grande colecionador Marcos de Moraes, proprietário da antiga loja Gibimania, no Rio de Janeiro; ao pessoal da Confraria do Gibi, do Rio de Janeiro, em especial a Denílson Borges (o louco por Bloch), Ranieri Andrade e André Luiz Garcia Aurnheimer (quando crescer, eu quero ser igual a você), Tony Fernandes e para o desenhista Edno Rodrigues, irmão do editor do período Bloch, Edmundo Rodrigues. Aos editores da RGE, Mario Amiden, Felipe Ferreira e o coordenador de redação Jorge Mendes Martins. Aos editores do período da Editora Abril, Hélcio de Carvalho, João Paulo Lian Branco Martins (Jotapê), Sérgio Figueiredo (Figa), Leandro Luigi Del Manto, Marcelo Alencar, Marco Moretti e ao tradutor Mário Luiz C. Barroso. A Manoel de Souza, editor da Editora Heroica. Aos amigos e editores da Editora Pipoca e Nanquim, Daniel Lopes, Alexandre Callari e Bruno Zago. Ao editor da Mythos, Fernando Lopes; ao editor e escritor Roberto Guedes; a Levi 9
Trindade, ex-editor da Panini, e agradecimentos especiais ao Marco Lupoi, gerente administrativo a Panini Itália, ao Vitor Donofrio, ex-coordenador da Editora Novo Século, ao jornalista da Folha de São Paulo, Thales de Menezes, à letrista Lilian Mitsunaga, Sérgio Campos, editor do site Universo Marvel 616, ao amigo Fernando Chakur da Mythos, Luiz Cláudio Garcia da Costa, a editora e roteirista Carol Pimentel e ao atual editor da Marvel no Brasil, Leonardo Camargo. A Edson Diogo, do site Guia dos Quadrinhos; e aos grandes colecionadores deste país: Wilson Simonetto, Renan Anselmo, Célio Cecare; ao editor da MSP Sidney Gusman; a Paulo Langer (administrador do grupo Quadrinhólatras, do Facebook); a Flávio Luiz, “O Cabra”; Lucas Sawaris, Janaína de Luna, da Editora Mino; a Vitor Cioccari, Charles Izumi, o maior fã do Homem-Aranha do mundo; a Jesus Nabor Barbosa; André Ornelas, Lauro Larsen, Nikki Nixon, Marcos Massolini, Laíse Rodrigues, Sandro Santos de Almeida, Alan Guedes, Peter Mihajlovic, Eduardo Bhaltasar, Gerson Fasano, Paulo Victor, Roberto da Silva Rodrigues, André Moreira, Ben Santana, Tony Fernandes, Bruno Porto, Guilherme Miorando, Gonçalo Junior, Francisco Ucha, André Luis Silvestre Souza, Odair Braz e Franco de Rosa. Aos meus pais, Irineu Morgado e Maria Molina. Às minhas irmãs, Priscila e Patrícia. À minha avó materna Maria. E a todo o “Clã” da família Morgado: Neide, Otávio, Dalete, Neusa, João, Adauto, Andrea, Viviane, Vivian, Antônio, Rafael, Luani, Vinicius, Gustavo, Arthur, Carol, Rude, Fábio, Karen, Tobias, Augusto, Carlos Alberto, Meire, Willian, Guilherme, Mara Couto, Erick (Tuti), Duda e Bernardo. Isaias (Bolinha), Vanessa, Isabella Miguel e Marlene Aritiano. E também para Vera Lúcia, Célia Sanabio, Isaura Sanabio, Edson, Isabella, Vinícius, Maria Eduarda, Lucas Motta, Fernanda, Nilton Junior e Milena, Nilton Mota e Cléo Prado. Aos meus cunhados Eduardo Mota, Letícia, Alexandre Brigadeiro, Igor e Sabrina. Aos amigos Marcelo Campos, Fábio Campos, Ricardo Biri, Paulinho Soberbo, Zuinha Liberato, César Cemente, Samuel Viviani, Hudson Teodoro, André Latino, Tico Maurício Franga, Fábio Servilha, Heber Mariano, Renato Guigui, Juliano Emerici, Fabiano Emerici, Márcio Marciano, Ricardo “Leta”, Gabriel Casulo, Paulo Zanetti, Samuel Viviane, Marco Aurélio, Orivaldo Luli, Luciana Nunes, David Tadeu, Emiliana Soares, Amanda Basso, Paulo Castro, Roberto Nogueira, o “Robertones”, Marlene, Aremildo Zelante, Flávia Zelante,
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Fernando Pereira, Karina Bacci, Clovis (Up the Iron), Vagner Caldas, Thais Caldas, Robson Burga, Valério Vieira, Renato Hernandez, Rodrigo Jardini, Hildevandro de Brito, Ricardo Bastos, Cristiano Carvalho, Wilson Santos, Paulo da linda, Alessandro Almeida, Dudu 40, Anderson Garcia, Anapaula Antunes, Vinícius Henrique, Ítalo Orlando, Analigia, Dr. João Roberto de Oliveira Lima e Matheus Gallias. Às meninas, Talita Brito Iurovschi, Carolyne Costa, Ilcia Carvalho, Cristiane Perrone, Renata Servilha, Gisele de Lima, Juliana Petinelli, Aline Guerreiro, Alessandra Ramos e Raquel Neves. E aos casais Luciana Queiroz e Cristiano Nascimento, Janaína Cazorla e José Luís, Patricia Sanches e Rogerio, Juliana e Marcelo, Andreia e Alexandre Moro, Karina e Isael Junior, Milene e Renato, Laíz e Silvio, Cristina e Leandro, Renata Luchiari e Alexandre Pedra, Renata Boselli e Fabio, Rose e Eduardo, Patrícia e Marcelo, Amanda e Pedro.
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SUMÁRIO 1. PREFÁCIO 2. PRÓLOGO 3. NO PRINCÍPIO
O INÍCIO DA MARVEL, FASE TIMELY
4. A EBAL DE ADOLFO AIZE.
O FIM DA ATLAS E O COMEÇO DA MARVEL COMICS
5. A MARVEL TRADICIONAL CHEGA AO BRASIL 6. A MARVEL ENTRE A EBAL E A BLOCH EDITORA GEP EDITORA TRIESTE MINAMI & CUNHA EDITORES O LIVREIRO JOTAESSE/ REGIART EDITORA DADO/SIGNO EDITORA GEA PALADINO/SABER GRAÚNA EDITORA ROVAL/KULTUS GORRION
7. SURGE A BLOCH EDITORES 8. RGE, UMA NOVA CASA PARA A MARVEL UMA BREVE HISTÓRIA SOBRE A EDITORA ABRIL
9. CONSOLIDAÇÃO E EXPANSÃO DA ABRIL 10. GUERRAS SECRETAS, A GRANDE CONFUSÃO 11. AS EDIÇÕES ESPECIAIS E AS MINISSÉRIES DE LUXO GLOBO DÁ AS CARTAS NOVAMENTE
12. PLANO COLLOR, O INIMIGO DOS QUADRINHOS A CRISE CRIATIVA DOS ANOS 1990 OS ENCONTROS ENTRE MARVEL, DC E IMAGE
13. A MYTHOS EDITORA E OS NOVOS RUMOS NO BRASIL O TESTE COM A EDITORA PANDORA BOOKS
14.A LINHA PREMIUM E O FINAL DA MARVEL COM A ABRIL 15. A PANINI ASSUME NO BRASIL OS 40 ANOS DA MARVEL NO BRASIL
16 A GUERRA CIVIL DA MARVEL AS EDIÇÕES EM CAPA DURA
17. AS COLEÇÕES DA SALVAT 18. A NOVA MARVEL 19. AS NOVAS GUERRAS SECRETAS E O FIM DA MARVEL COMO CONHECEMOS 20. O NOVO SÉCULO DA MARVEL E ALGUNS LIVROS TEÓRICOS SURGE A BOOK ONE EDITORA
21. MAIS UMA VEZ...UM NOVO (RE)COMEÇO
22. A QUEDA DA ABRIL E O FIM PRECOCE DA MARVEL PELA SALVAT 23. A CRISE DO MERCADO NACIONAL DE QUADRINHOS 24. CENSURA NA BIENAL DO RIO DE JANEIRO 25. CONSIDERAÇÕES FINAIS
PREFÁCIO
por Alexandre Callari
Conheci o Alexandre Morgado há muitos anos, por intermédio do meu amigo Daniel Lopes, que sempre foi uma pessoa muito mais bem relacionada e extrovertida do que eu. O Pipoca & Nanquim ainda era um canal pequeno, a editora, um sonho distante, e eu ainda não tinha voltado a morar em São Paulo. O Morgado fez a incrível gentileza de me convidar para um churrasco em sua casa, mesmo sem me conhecer pessoalmente. Agora, uma postura dessas, já diz muito acerca da personalidade de alguém, afinal, ele estava abrindo as portas da sua intimidade para um estranho, numa situação em que estaria cercado de outros amigos e pessoas conhecidas. Oras, e se eu fosse um completo mala, do tipo estraga-festas? Mas ele me deu um voto de confiança e eu correspondi, comparecendo ao evento – onde, a propósito, conheci diversas outras pessoas do meio dos quadrinhos, mas isso é outra história. Ao chegar na casa do Morgado, ele logo me deixou à vontade, atuando como um genuíno anfitrião, e fomos então ao que interessa: conhecer a coleção de quadrinhos. Devo dizer que, pela primeira vez na vida, tive a reação que as pessoas costumam ter quando conhecem a minha coleção, pois o Morgado 15
possuía uma tão grande quanto, se não maior. Com certeza havia itens lá que eu não tinha, incluindo alguns importados incríveis. O Daniel Lopes ficou babando pelo Homem-Máquina original, do Jack Kirby. Eu quase enfiei na minha bolsa o Hartan, que só consegui adquirir anos depois. Cada um dos presentes segurava um item diferente e ficava de queixo caído. Foi algo bonito de ser visto... Na época, eu estava um pouco desanimado com a proposição de manter uma coleção de milhares de quadrinhos, visto o trabalho que isso implica, mas ao ver o carinho que Morgado destinava ao quartinho customizado que montara para guardar seus tesouros, voltei a sentir uma lufada fresca de fôlego encher meu peito. Colecionismo é uma forma de arte, uma paixão, uma maneira de preservar a memória individual e coletiva, entre outras coisas, e, naquele dia, fui lembrado disso. Conversamos muito, eu e o Morgado, e descobri que tínhamos mais coisas em comum além do amor pelos quadrinhos e o mesmo nome. Ele também tocava bateria, assim como eu. Gostos similares para filmes, séries, música... Foi uma tarde bem bacana. Depois daquele dia, nos encontramos em diversas ocasiões, e os bate-papos sempre foram interessantes. É ótimo quando você conversa com uma pessoa e a síntese dessa conversa é sempre um crescimento individual. Cada vez que nos encontrávamos, era assim que me sentia. Anos depois, o Morgado compareceu a diversos lançamentos das HQs do Pipoca, sempre presente, sempre prestigiando, sempre dando uma baita força, principalmente no difícil começo. Por tudo isso, quando soube por intermédio do Daniel (de novo ele) que o Morgado estava escrevendo um livro sobre a história da Marvel Comics no Brasil, refleti que não havia pessoa mais adequada, afinal, em sua própria casa ele dispunha de quase todo o material para fazer a pesquisa necessária. Além disso, em todos os nossos encontros, sempre vi seus olhos brilharem ao falar de quadrinhos, em particular, os da Marvel. Claro, ainda 16
restava verificar a qualidade do texto que ele viria a desenvolver, o nível da escrita em si, pois uma coisa é ter vontade de fazer e outra bem diferente é conseguir executá-la, mas devo dizer que o Morgado acertou na mosca. Este livro é o resultado de uma paixão, e isso transborda em cada página. Claro, dá pra sentir que há um trabalho de pesquisa minucioso por trás do texto, a bibliografia é extensa e elucidativa, as ilustrações agregam às palavras, mas o que mais me capturou foi realmente o fato de ser um projeto apaixonado. Nada funcionaria sem isso. Marvel Comics – A Trajetória da Casa das Ideias no Brasil é um trabalho único, que ganha aqui uma nova roupagem e é, mais uma vez, tornada acessível para o público brasileiro, amante de quadrinhos de super-heróis, nesta nova edição. E já não era sem tempo, pois este é o tipo de livro que não deveria ficar fora de catálogo nunca. Resta saber o que Morgado fará a seguir. De minha feita, já estou ansioso. Alexandre Callari Maio de 2020.
Alexandre Callari é apresentador e editor do programa /editora Pipoca & Nanquim, além de tradutor e autor de diversos livros. Seu último trabalho foi o livro “A Floresta das Árvores Retorcidas” de 2019, publicado pelo Pipoca & Nanquim. 17
"Superaventuras Marvel" nº 29, de novembro de 1984, pela Editora Abril. primeira revista em quadrinhos do autor do livro.
PRÓLOGO Qual é a lembrança mais antiga da sua vida? Qual foi o primeiro registro que a sua mente gravou e que você se lembra até hoje? Bom... É difícil saber qual foi a minha. Talvez uma conversa dos meus pais direcionada a mim, ou quem sabe um momento de fascinação com algum dos meus brinquedos. Mas se você perguntar qual foi a primeira revista em quadrinhos que li, a lembrança mais antiga volta aos meus seis anos de idade, no mês de novembro de 1984. Esse mês, em específico, foi o que definitivamente mudou toda a minha infância e o resto da minha vida. Naquele longínquo mês de 1984, a Editora Abril mandava para as bancas a edição n°29 do gibi "Superaventuras Marvel". Essa foi a primeira revista em quadrinhos que tive. A edição, em especial, vinha com a estreia das histórias da personagem Viúva Negra, com os belos desenhos de George Pérez. Outro personagem era o Shang Chi - O Mestre do Kung Fu, de Mike Zeck, um desenhista que eu gostava muito. Mas o que mais chamou minha atenção foi a terceira história que compunha a revista. Era a quarta parte de uma aventura dos X-Men, chamada A Saga de Fênix Negra, da dupla Chris Claremont e John Byrne. Foi essa história que me pegou, de fato. Lembro até hoje 20
de ter ficado maravilhado com os desenhos de John Byrne - um dos meus artistas favoritos de todos os tempos. Completava a revista Sonja, a Guerreira, de Roy Thomas e Frank Thorne. Meu pai sempre foi um grande colecionador de livros, e para estimular a minha leitura, começou comprando os formatinhos Marvel desse período. Peguei tanto gosto pelos gibis, que lia tudo o que saía. Com o tempo, construí minha pequena coleção particular, e com o apoio dos meus pais, não foi difícil consegui-los. Conforme o tempo foi passando, corri atrás das edições que não tinha. Começava a minha caçada pelos sebos de São Paulo, pelas revistas que já tinham sido publicadas. "O Incrível Hulk", da Editora Abril, foi a primeira coleção que completei, e após isso, fui completando, uma a uma, cada coleção. Foi quando descobri, para minha surpresa, que a Editora Abril não tinha sido a primeira a publicar esses personagens. Outras editoras já tinham prestado seus serviços, bem antes. E com o tempo, também fui atrás dessas outras publicações. Cresci, estudei, comecei a trabalhar, casei e a paixão pelos quadrinhos continuou. No começo de 2016, finalmente consegui completar TUDO da era Marvel publicado no Brasil. As edições mensais, os especiais, almanaques, as Graphic Novels, os álbuns de luxo, minisséries e tudo o mais que possamos imaginar. A ideia deste livro ocorreu a partir daquela ocasião. Com todas as revistas bem na minha frente, eu poderia contar a história da Marvel no Brasil. Não seria uma tarefa fácil, mas seria muito prazeroso reunir todos os meus “velhos” gibis para contar a história de cada editora no país. Além das revistas, conversei com diversos profissionais da área, estudiosos do assunto, colecionadores e com editores que trabalharam e trabalham diretamente com as publicações. Tudo para deixar a pesquisa a mais completa possível. Optei por começar pela década de 1940, quando a Marvel era chamada de Timely. Até porque, afinal de contas, a Timely foi o embrião da Marvel. A pesquisa tem início com as 21
primeiras edições publicadas pelo jornal O Globo e O Diário da Noite, passando pelas principais editoras, como Ebal, Bloch, RGE e Abril –sem deixar de incluir as intermediárias, como GEP, GEA, Trieste, Minami & Cunha, até a chegada da Panini, das coleções da Salvat e dos livros da Editora Novo Século. Passando pelo formato americano em preto e branco, seguimos pelo formatinho colorido até a chegada das edições de luxo, com acabamentos primorosos - sua trajetória conheceu todos os períodos do nosso país. A Marvel Comics passou por inúmeras editoras brasileiras e pelas mãos de diversos editores. Enfrentou várias crises econômicas, teve seus altos e baixos, mas sempre se manteve firme em suas publicações. Este livro é uma memória de fã e colecionador. Lembranças de um entusiasta no assunto, que ainda vibra com cada gibi lido. Uma pequena homenagem à Casa das Ideias e a todas as editoras brasileiras que publicaram esse fantástico universo em nosso país. Os personagens Marvel conquistaram definitivamente o imaginário popular, não só no Brasil, mas em todo o mundo.
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"Gibi Mensal" nº 142, de abril de 1940, pela Editora do Jornal O Globo, marca a primeira publicação da Marvel, na época Timely, no Brasil. O personagem na capa é Namor, o Príncipe Submarino.
NO PRINCÍPIO Se os quadrinhos publicados no Brasil, assim como todo o mercado editorial, devem alguma coisa para alguém, sem dúvida esse alguém é Adolfo Aizen. O título de “o pai das publicações de quadrinhos no Brasil” é mais do que justo. Aizen é um dos mais importantes nomes da nona arte, responsável direto por estabelecer o mercado de quadrinhos no Brasil. Além também de ter sido um dos fundadores da Ebal, em 1945, uma das editoras mais marcantes do nosso país - responsável por ter sido a primeira editora a publicar os quadrinhos do Universo Marvel tradicional. Adolfo Aizen nasceu na Rússia, na província de Iekatriboslav, em 1907, e chegou ao Brasil junto com sua família, em 1910. Morando por um curto tempo em Salvador, no estado da Bahia, logo a sua família se estabeleceria no estado do Rio de Janeiro, onde iniciaria sua vida profissional. A partir daí, começaria a sua carreira bem cedo. Trabalhando em várias empresas e em vários segmentos diferentes, até se envolver com Histórias em Quadrinhos. Aizen trabalharia com algumas revistas na década de 1920 e com alguns jornais da época, até ser editor da revista "O Malho" e da revista "O Tico-Tico", a primeira a publicar histórias em quadrinhos no Brasil. 24
Após uma viagem aos Estados Unidos, no começo dos anos 1930, Aizen conheceu de perto os famosos Comics americanos. Importou de lá a ideia de publicar os suplementos que acompanhavam os jornais. Esses suplementos eram diversificados em vários temas, como estilo, comportamento etc. Mas as histórias que mais chamaram a sua atenção foram as infantojuvenis. Aizen perceberia que esses suplementos que acompanhavam os jornais faziam com que as vendas subissem a níveis estratosféricos. Empolgado com a cultura de grande parte dos americanos em acompanhar as aventuras dos personagens estampados nos suplementos, Aizen se apaixonou pelos Comics americanos e importou essa ideia para o Brasil. Na sua volta, dedicou-se a pôr em prática a publicação desses segmentos. Em 1933, Adolfo Aizen trabalhava no jornal O Globo, empresa administrada pelo jornalista e empresário Roberto Marinho. Mostrando o seu projeto dos suplementos para Roberto, a princípio o mesmo não se interessou, e fez com que Aizen levasse suas ideias para outro lugar. Aizen conseguiu ajuda no jornal A Nação, administrado por João Alberto Lins de Barros (parte importante do movimento tenentista, homem do presidente Getúlio Vargas e interventor em São Paulo, perseguiu um monte de pessoas, inclusive Assis Chateaubriand). No jornal A Nação, Aizen trabalharia nas suas primeiras publicações e como era de se esperar, fez um enorme sucesso. Batizada de Suplemento Infantil, a publicação fez a sua estreia em março de 1934. Aizen traria para o Brasil personagens considerados verdadeiros ícones dos quadrinhos, como Flash Gordon, Mandrake, Príncipe Valente, Tarzan e muitos outros. Após o sucesso com os suplementos, Aizen criaria o Grande Consórcio de Suplementos Nacionais, para editar as suas novas publicações. Logo, mudaria o nome do Suplemento Infantil para Suplemento Juvenil, e abriria o leque, publicando mais dois novos títulos: "Mirim" e "O Lobinho". A revista "O Lobinho" teve duas séries - a primeira, iniciada 25
em 1938, foi publicada até 1940, com 95 edições. A segunda série, iniciada em abril de 1940, foi a que contou com as estreias de vários personagens no Brasil da DC Comics (nessa época a DC era chamada de National Periodical). Batman fez a sua estreia na edição n° 7, em novembro de 1940. Outros personagens da DC Comics também foram publicados: Joel Ciclone (o primeiro Flash da editora), Falcão da Noite (Gavião Negro), Homem Borracha e Superman. Falando no Superman, como curiosidade, o personagem criado em 1938 por Joe Shuster e Jerry Siegel não teve a sua estreia nem no "O Lobinho" e nem no "O Globo Juvenil". Sua estreia no Brasil aconteceu no suplemento A Gazetinha nº 448, de dezembro de 1938, produzido pelo jornal A Gazeta de São Paulo, administrado pelo jornalista Cásper Líbero. A Gazetinha n° 448 foi lançada apenas seis meses após a estreia do Superman, em Action Comics nº 1, de junho de 1938. O Suplemento Juvenil fez um grande sucesso entre os jovens, tendo a sua publicação lançada duas vezes na semana – e em 1935 chegando a três vezes semanais. Cada edição passava dos cem mil exemplares. O suplemento era um sucesso absoluto! Roberto Marinho, por sua vez, estava arrependido de ter rejeitado o projeto de Aizen e assistindo o sucesso que o Grande Consórcio estava tendo, decidiu entrar no jogo. Logo mandaria para as bancas o seu primeiro jornal em Histórias em Quadrinhos, chamado "O Globo Juvenil", lançado em junho de 1937. Inspirado no Suplemento Juvenil, Roberto Marinho iniciaria suas publicações, mesmo a contragosto de Aizen. O Jornal carioca O Globo foi fundado em 1925 por Irineu Marinho, pai de Roberto. Com o falecimento de seu pai, alguns dias depois do lançamento do jornal, Euclydes de Matos, amigo de Irineu, assumiria o comando da empresa. Somente seis anos depois, em 1931, Roberto Marinho viria a herdar o jornal, após a morte de Euclydes. Dava-se início, assim, ao seu poderoso império. A maioria dos quadrinhos que chegava ao nosso país no começo dos anos 1940 vinha através das agências de distribui26
ção dos produtos editoriais. As agências compravam pilhas e pilhas de histórias das editoras americanas e traziam para o país em provas de fotolito ou, em alguns casos, nos próprios filmes. Eram revistas e mais revistas, em lotes completos. Os acordos de publicações não aconteciam entre as editoras brasileiras e as editoras americanas, e sim com as agências de distribuição. A princípio, as negociações eram com os representantes dos syndicates (responsáveis pela distribuição) aqui no Brasil. Logo depois, algumas agências foram surgindo. O Grupo Editorial Record, fundado por Alfredo Machado e Décio de Abreu em 1942, foi o primeiro a fazer esses trabalhos. Em seguida, surgiria a APLA (Agência Periodística Latino-Americana), fundada por Luiz Rosemberg. Eram elas que negociavam diretamente com as editoras americanas e renegociavam com as editoras e gráficas do nosso país. Em boa parte dos casos, as páginas eram vendidas por preço já fixado pelas agências. As editoras geralmente escolhiam o que queriam publicar. Foi por esse fato que muitos personagens e os mesmos licenciadores saíam em várias revistas, por editoras diferentes, no Brasil. Super-Homem, por exemplo, após a sua estreia pela "A Gazetinha", migraria para as páginas de "O Lobinho", de Adolfo Aizen. Mais tarde, seria publicado em "O Globo Juvenil", de Roberto Marinho, dividindo espaços com personagens tanto da Timely quanto da Centaur Comics - entre outras editoras e personagens distintos.
O INÍCIO DA MARVEL - FASE TIMELY
Muito tempo antes de Adolfo Aizen fundar a Ebal e trazer para o Brasil, em 1967, os novos super-heróis que a editora americana Marvel Comics tinha criado no começo dos anos 1960, com a estreia de Fantastic Four n° 1, havia os quadrinhos da Timely. A Marvel Comics, no começo de tudo, antes de ser a Marvel que conhecemos, era chamada de Timely Comics, empresa fundada por Martin Goodman, em 1939. Martin Goodman 27
nasceu em 1908 nos Estados Unidos, na cidade do Brooklyn. Sua experiência com publicações começou como representante de uma pequena editora chamada Eastern Distributing, onde trabalhava com os pulps, as tradicionais revistas de bolso, com histórias de ficção. Em 1933, montou a sua própria companhia, onde testou vários nomes para as suas publicações. Até chegar ao definitivo Timely Comics, em 1939. Aproveitando a crescente onda das publicações nas tiras de jornais e com as criações dos novos super-heróis do momento pela DC Comics, como Superman e Batman, Goodman viu que também poderia investir nesse gênero. Martin Goodman publicaria, em outubro de 1939, a revista Marvel Comics nº 1 - a primeira edição com os personagens do universo Marvel. Essa publicação vinha com as estreias de Namor, O Príncipe Submarino, o primeiro Tocha Humana, o Anjo, além do “caubói” Cavaleiro Mascarado e Ka-Zar, o senhor da selva (personagem dos pulps, e não o atual do universo Marvel). A capa, representada pelo Tocha Humana, foi desenhada pelo artista Frank Paul, veterano desenhista dos pulps. Após o lançamento, não tardaria para que Namor e o Tocha Humana caíssem nas graças dos leitores. Dos personagens que estrearam, foram os que mais chamaram a atenção dos americanos. Tanto que foram os que mais fizeram sucesso também aqui no Brasil. Alfredo Machado, antes de fundar a Record, já acumulava uma boa experiência com as publicações das Histórias em Quadrinhos. Trabalhou ao lado de Adolfo Aizen no Suplemento Juvenil durante cincos anos, de 1934 até 1939. Percebendo a ascensão que o jornal O Globo estava tendo, mudaria de emprego, e logo começaria a trabalhar no jornal de Roberto Marinho. Machado perceberia que os trâmites dos serviços entre as editoras estrangeiras com os editores brasileiros deixavam a desejar. Pelos atrasos das revistas, que demoravam muito a chegar ao nosso país, e com todos os problemas burocráticos que imperavam naquela época. Com isso, Machado teve uma ideia 28
brilhante: criar uma agência de distribuição – em que compraria os lotes diretamente das editoras americanas e forneceria às editoras brasileiras, tornando-se o intermediário entre ambas as editoras. Depois de visitar uma das bancas de jornais, tarefa que tinha como hábito, deparou-se com um dos exemplares da revista Marvel Comics. Essa edição com o Tocha Humana na capa, chamaria a sua atenção. Entrando em contato com a Timely, para poder licenciar suas histórias no Brasil, logo a editora americana responderia a sua carta. Para a sua surpresa, a Timely enviaria as primeiras revistas dos novos super-heróis criados há pouco tempo, e junto com as revistas, o preço para licenciá-las. O negócio seria mais fácil, e bem mais em conta do que pensava. Junto com o seu cunhado Décio de Abreu, criariam a Record, em 1942. O primeiro material da Timely publicado no Brasil, comprado pela Record, seriam os mais novos personagens criados pela editora americana: Namor, o Príncipe Submarino e o Tocha Humana. Ambos os personagens foram fornecidos pela Record à empresa de Roberto Marinho. Depois do lançamento de "O Globo Juvenil", Roberto Marinho mandaria para as bancas uma das revistas que marcariam para sempre todo o mercado das Histórias em Quadrinhos publicadas no Brasil. Era a revista "Gibi"1, de março de 1939. E foi nessa publicação que os personagens da Timely/Marvel fariam a sua estreia no Brasil. A primeira aparição dos personagens no Brasil aconteceu na edição nº 142, de abril de 1940, com as histórias publicadas originalmente em Marvel Mystery Comics nº2, com o personagem Namor, o Príncipe Submarino, criado pelo artista Bill Everett, inspirado em aventuras marítimas e baseando-se nas histórias de Atlântida, o reino perdido. Após uma missão no Continente Antártico, Leonard McKenzie, um capitão da Marinha americana, provoca uma destrui1 A palavra Gibi, que significa “moleque” ou “negrinho”, acabaria tornando-se sinônimo para revista de histórias em quadrinhos no Brasil 29
ção com explosivos, causando danos à civilização de Atlântida. O imperador atlante chamado Thakorr envia a sua filha, a princesa Fen, para investigar o caso. Chegando à superfície, a princesa Fen se envolve com o capitão Mckenzie e após retornar para Atlântida, descobre que está grávida. Tempos depois nasce Namor - filho de uma atlante com um humano. Essa história da origem do personagem é a que foi publicada na edição de Marvel Comics n° 01 pela Timely, em 1939. No Brasil, essa história foi publicada na edição de "Gibi" nº210, em setembro de 1940. Namor é o primeiro mutante da história da Marvel. Na edição de "Gibi" nº 168, de junho de 1940, mais uma estreia, com a primeira aparição do Tocha Humana em história extraída de Marvel Comics nº 01. Criação do artista Carl Burgos, conta a história do professor e cientista Phineas Horton, que desenvolve um androide sintético, que ao ter contato com o oxigênio, se inflama e se transforma no Tocha Humana. O outro personagem que completava a revista americana era o Anjo, criado por Paul Gustavson. O Anjo era um detetive sem nenhum superpoder, que combatia o crime com as próprias mãos. No Brasil, o personagem teve a sua estreia publicada na revista "Mirim" nº 352, em julho de 1940. Depois, iria aparecer em algumas edições de "O Globo Juvenil" e o "Guri", do jornal Diário da Noite. Cavaleiro Mascarado seria lançado pela "Mirim", na edição n°422, em 1940. Ka-Zar foi publicado pela primeira vez em "Gib"i n° 155, de maio de 1940. Com o universo dos quadrinhos em expansão, não tardou para que os personagens se encontrassem. Tanto Namor, quanto o Tocha e o Anjo, habitavam o mesmo universo. Era a Timely se moldando. E seria inevitável o encontro entre os personagens. A principal característica da editora era essa: a criação e a interação de seus personagens, criando um universo sólido e coeso. Namor, o Príncipe Submarino, não era um herói propriamente dito. Crescendo no reino de Atlântida, onde ouvia muitas histórias dos “seres da superfície”, Namor desenvolveu e decretou ódio aos humanos, pelas mazelas contra o seu reino. O Prín30
cipe Submarino nasceu mais com a aparência de um humano do que de um atlante. Além da força sobre-humana, Namor possui asas em seus pés, fazendo com que seja capaz de voar. Com o começo da 2ª Guerra Mundial, após a cidade de Atlântida sofrer um ataque devido aos combates entre os navios envolvidos no conflito, Namor invade a cidade de Nova York, decretando guerra aos humanos. E é nessa investida que surge o androide Tocha Humana. O personagem tinha adotado o nome de Jim Hammond e acabara de entrar para o departamento de polícia. Com a chegada de Namor, a luta seria iminente. O combate entre os dois seria o primeiro encontro entre os personagens da editora. Após o confronto e a intervenção de Betty Dean, uma amiga do Tocha e agente da polícia, Namor percebe que os verdadeiros inimigos seriam os nazistas. E assim, os heróis da Timely participaram da Segunda Grande Guerra Mundial em suas histórias. O primeiro encontro entre Namor e o Tocha Humana foi publicado no Brasil na edição nº 238 da revista "Gibi", em novembro de 1940. Martin Goodman, vendo o enorme sucesso que suas novas publicações estavam tendo, investiria em novos personagens. Goodman trouxe para a Timely o roteirista e ex-cartunista de jornal, Joe Simon, que logo se tornaria editor na empresa e criaria novos personagens a pedido de Goodman, como Máscara Ardente (Fiery Mask) e Corvo Vermelho (Red Raven), que tiveram vidas curtas. Simon, assim que chegara à editora, traria para a Timely o artista que mais tarde seria conhecido como “O REI”, e que mudaria para sempre o mercado de quadrinhos mundiais. Seu nome era Jack Kirby. Joe Simon e Jack Kirby seriam uma das melhores duplas do período da Era de Ouro dos Quadrinhos. Juntos, criariam mais alguns personagens, como Marvel Boy e Vision (Visão da Era de Ouro). Mas o melhor estava por vir. Com o mundo vivendo um grande trauma por causa da guerra, os dois artistas mandariam para as bancas um personagem para liderar os Estados Unidos 31
contra os nazistas. Surgia assim, entre as bombas na Europa e os ataques à base de Pearl Harbor, o personagem Capitão América, criado no berço da guerra, em 1941. O personagem é Steve Rogers, que a todo custo queria servir ao seu país na luta contra o nazismo. Após ser recusado em seu alistamento pela sua fraca saúde, um major do exército, percebendo a vontade do frágil rapaz em querer de alguma forma ajudar o seu país, convida-o para participar de um experimento secreto, chamado “Projeto Supersoldado”. Esse projeto era focado na criação de soldados com poderes e habilidades sobre-humanas. Steve Roger, após ingerir a fórmula do Supersoldado e ser banhado com raios Vita, vê o seu corpo franzino se transformar num corpo de um verdadeiro atleta. Após o experimento, porém, um inimigo infiltrado acaba matando o cientista da fórmula do Supersoldado. Com isso, a experiência acaba se perdendo junto com o seu criador para sempre, já que a mesma, até então, não tinha nenhum registro por escrito. Após o incidente, Steve Rogers acaba sendo o único com o soro do Supersoldado, transformando-se no Capitão América, ao lado de seu parceiro mirim, Bucky Barnes. E então os Estado Unidos entrariam na guerra. No Brasil, tanto os quadrinhos de O Globo ("O Globo Juvenil" e "Gibi Mensal"), quanto os do Grande Consórcio ("Mirim" e "O Lobinho") estavam disputando “palmo a palmo” cada espaço do mercado editorial de quadrinhos. Melhor para os leitores e colecionadores, que tinham mais opções. E opção não iria faltar nos próximos meses daquele ano de 1940. Em maio, chegava às bancas a revista "O Gury". A partir da edição nº 25 seria "O Guri", com letra "i". A publicação era do jornal Diário da Noite, comandado pelo empresário Assis Chateaubriand, uma das personalidades mais influentes do Brasil. O poderoso Chateaubriand comandava um conglomerado de comunicação que envolvia jornais, rádios, TV e publicações de revistas. Atento nas investidas de Roberto Marinho e de Adolfo Aizen nas publicações de quadrinhos, não iria ficar de fora 32
dessa. Investiu na qualidade das suas publicações, fazendo da revista "O Guri" uma edição multicolorida. O responsável pelos lançamentos dos quadrinhos seria Leão Gondim, primo de Chatô. Os primeiros números da revista vinham com as histórias da editora americana Fiction House, empresa que contou com os talentos de Will Eisner e Jack Kirby. A revista "O Guri" viria a ser a primeira a publicar as histórias do Capitão América no Brasil. A sua estreia foi na edição nº73, em junho de 1943. História extraída do título original Captain America Comics nº 16. O jornal Diário da Noite não publicou a fase da dupla Simon/Kirby. Optou por começar pela fase posterior, com as histórias desenhadas por Al Avison, Syd Shores e Vince Alascia. "O Guri" seria a casa do Capitão durante os próximos anos. E foram publicadas, também, algumas histórias da revista All-Winners Comics, edição que reunia todos os heróis da editora: Capitão, Bucky, Tocha, Namor, Anjo, Destroyer e Ciclone. No Brasil, a equipe recebeu o nome de Esquadrão Vitorioso. Além do título Captain America, foram publicadas histórias da revista U.S.A Comics, com mais algumas aparições do Capitão América. Algumas histórias do personagem Anjo também foram publicadas em "O Guri". Young Allies, revista formada pelos parceiros mirins Bucky e Centelha (mutante parceiro do Tocha Humana, que tinha o mesmo poder de se inflamar) também ganharia algumas histórias. Miss América, uma das primeiras super-heroínas da Timely, também fez a sua estreia em "O Guri". A personagem é Madeline Joyce, que após fazer uma visita em um farol durante uma forte tempestade, recebe uma descarga elétrica poderosa do equipamento, desencadeada pela tempestade. Joyce, milagrosamente, sobreviveu ao acidente. A descarga, no entanto, fez com que a personagem ganhasse superpoderes. Miss América foi criada por Otto Binder e Al Gabriele e fez a sua estreia no Brasil em "O Guri", na edição nº116, no ano de 1945. 33
Com o crescimento das publicações na Timely, Goodman precisou aumentar a sua equipe. Um jovem chamado Stanley Martin Lieber, com apenas 17 anos, foi contratado. Na verdade, Stanley era primo de sua esposa, e para dar uma força ao jovem rapaz, Goodman o contratou. Após escrever algumas histórias (a sua primeira foi escrita na edição Captain America n°04), tornou-se editor da Timely. Stanley adotaria o pseudônimo de Stan Lee, nome que seria uma das referências dentro da editora nos próximos anos. Um dos primeiros personagens criado por Stan Lee foi Destroyer, o Demolidor, personagem do período da 2ª Guerra, que também teve algumas histórias publicadas na revista "O Guri". As histórias publicadas foram extraídas do título original, Mystic Comics. Após tomar um soro similar ao do Capitão América, o personagem Keen Marlow ganharia superpoderes e se tornaria mais um combatente contra os nazistas. Em "O Guri" n° 80, de setembro de 1943, foi publicada uma das primeiras histórias criadas por Stan Lee, chamada “The Imb”, com histórias cômicas de piratas e contando com desenhos de Chad Grothkopf. Assis Chateaubriand, aproveitando o sucesso de uma de suas revistas chamada O Cruzeiro, decide criar uma editora com o mesmo nome. A editora O Cruzeiro foi fundada nos anos 1950, passando então a ser a editora para as publicações das suas Histórias em Quadrinhos. Uma das publicações produzidas pela O Cruzeiro foi uma revista pulp chamada "Detective", que depois mudaria a grafia para "Detetive". Essa revista continha histórias de contos policiais dos anos 1930, mas de vez em quando aparecia alguma História em Quadrinhos. Após o sucesso com as revistas em quadrinhos, a publicação viria com algumas histórias do Capitão América. Algumas delas foram extraídas dos títulos Captain America, U.S.A Comics e All-Winners Comics. "O Guri" ganharia uma nova série. A primeira, publicada pelo Diário da Noite, se encerraria na edição n°354, em dezembro de 1953. A segunda série se iniciaria em janeiro de 1954 e eventualmente publicaria 34
mais algumas histórias do Capitão América. Após 317 edições, a revista seria cancelada em dezembro de 1962. Nesse tempo das publicações de "O Guri", Adolfo Aizen e Roberto Marinho continuavam mandando para as bancas as suas publicações. Do Consórcio, a segunda série de "O Lobinho "com os heróis da DC Comics continuava de vento em popa. A publicação, iniciada em 1940, iria ser publicada até setembro de 1954. A revista "Gibi" foi publicada de 1939 até 1950, em um total de 1.739 edições. Durante os anos 1940, O Globo criaria outra publicação, chamada "Gibi Mensal", e os personagens da Timely seriam publicados nessa nova revista. Em janeiro de 1941, "Gibi Mensal" chegava às bancas com as aventuras de Namor e Tocha Humana, dando sequência às histórias publicadas na revista Gibi. Algumas histórias das edições originais Human Torch e Sub-Mariner Comics foram as publicadas pelo jornal carioca. Essa série contou, também, com as histórias do Capitão Marvel (Shazam), personagem que, na época, pertencia à Editora Fawcett. A publicação duraria até fevereiro de 1953, com a última edição de nº 143. Depois da revista "Gibi Mensal", O Globo mandaria para as bancas a sua mais nova publicação. A nova revista era "O Globo Juvenil Mensal", em novembro de 1940, com material da editora americana Centaur Publications, contando também com algumas histórias da família Marvel e alguns personagens da DC Comics. Da Timely, algumas edições de Daring Mystery Comics foram publicadas com histórias de alguns personagens obscuros, como Falcão, Dínamo e Homem Tigre. A partir da edição n°23, Superman, o Homem de Aço, faria a sua estreia na revista. Na edição n°32, tivemos uma curiosidade: o desenho da capa mostrava o Superman e o Tocha Humana juntos. Naquela época, era comum que os mixes das revistas tivessem vários licenciadores, de editoras diferentes, já que as editoras compravam o que queriam publicar, e publicavam do jeito que achavam melhor. Era natural, portanto, que os personagens estivessem 35
juntos nas capas das revistas. Mesmo com os personagens juntos, eles não se encontraram de fato. Diversas publicações apresentavam os personagens da Timely, da DC e da Fawcett juntos, porém nas histórias, isso não acontecia. Mas toda regra tem a sua exceção. Uma dessas exceções aconteceu com o Tocha Humana, no "Almanaque do O Globo Juvenil", de 1964. O personagem se encontrou em uma história não oficial com o Capitão Marvel (Shazam). Essa história foi feita exclusivamente no Brasil, e não faz parte da cronologia dos personagens. O Tocha já tinha sido incorporado ao Universo Marvel tradicional e o Capitão Marvel na época pertencia à Editora Fawcett Comics. Nos Estados Unidos, os “crossovers”2 entre personagens de editoras diferentes ainda não aconteciam. Cada editora cuidava de seus próprios personagens. Acontece que o Capitão Marvel, durante boa parte dos anos 1950 até o começo dos anos 1970, ficou sem ser publicado. E para continuar com as suas publicações, algumas histórias foram encomendadas aos artistas brasileiros. Essa história pirata foi feita no Brasil pelo desconhecido desenhista brasileiro Rodriguez Zelis. Devido às baixas vendas nos Estados Unidos, o personagem foi cancelado pela Fawcett. O primeiro personagem a ostentar o nome de Capitão Marvel foi o jovem Billy Batson, criado por Bill Parker e Charles Clarence Beck em 1940 na revista Whiz Comics, pela editora americana Fawcett Comics. Quando o jovem Billy gritava a palavra “Shazam”, se transformava no mortal mais poderoso do planeta. O sucesso entre os leitores não demoraria a acontecer. O Capitão Marvel foi um dos raros personagens que rivalizava diretamente com o Superman em plena era de ouro dos quadrinhos. E tal rivalidade traria alguns problemas tanto para a Fawcett quanto para a DC Comics (na época chamada de National Publications). Superman foi o início do mito dos Super-Heróis 2 Crossover é um evento em que dois ou mais personagens distintos, sem nenhuma relação entre si, se encontram. 36
nos quadrinhos, e muito dos personagens que viriam após o Homem de Aço, seriam galgados em cima da sua mitologia. A National, ao contrário dos leitores, não ficou nada feliz com as histórias do Capitão Marvel, e acabaria entrando em uma grande batalha jurídica com a Fawcett. A acusação era direta: segundo a National, o Capitão Marvel era um plágio do Superman. No ano seguinte à criação do Capitão Marvel, após começar a perder nas vendas, a National entrou com um processo contra a Fawcett em uma das primeiras batalhas entre as editoras de quadrinhos, numa guerra que duraria 12 anos até se encerrar definitivamente em 1953. Os argumentos da National eram em cima dos poderes similares entre os dois: superforça, resistência e voo. Além da cor do cabelo e também pela “calvície” entre seus arqui-inimigos, Lex Luthor e Dr. Silvana. A Fawcett contra-atacou, com o argumento de que ambos os personagens eram baseados nas lendas de personagens das civilizações antigas da nossa História, como Hércules, Salomão, entre outros. O início dos anos 50, período em que os quadrinhos de super-heróis entrariam em declínio, acabaria ajudando a National de certa forma em sua disputa. O Capitão Marvel não seria mais publicado e a National acabaria levando uma quantia alta referente ao processo (cerca de U$400.00,00). E assim, a Fawcett encerraria sua história nos quadrinhos americanos. Após o seu cancelamento, os direitos do personagem seriam adquiridos pela própria DC, em 1973. Só que dessa vez o personagem não poderia mais usar o nome de Capitão Marvel, já que a Marvel Comics registrara o nome Capitão Marvel. O personagem viria a ser chamado simplesmente de Shazam!. Em 1952, Roberto Marinho resolveu criar uma empresa específica para editar os seus quadrinhos. O nome Editora Globo foi pensado, porém não poderia ser usado. Tudo porque já existia uma livraria e editora no Rio Grande do Sul, que possuía o registro com esse nome. Por isso, Marinho criaria em 1952 a 37
RGE (Rio Gráfica e Editora). A nova editora retomaria o título "Gibi Mensal" a partir da edição n°154. Assim como "O Globo Juvenil Mensal", a partir do n°219. Um dos carros-chefes da RGE seria o gibi do personagem Fantasma, da King Features. Pela primeira vez com sua própria revista, o Fantasma seria uma das publicações mais vendidas da nova editora de Marinho. A revista Marvel Comics n°1 vendeu cerca de 900 mil exemplares, na época do seu lançamento, assim como a primeira edição de Captain America (com a famosa capa em que o herói dá um soco em Adolf Hitler), que bateu na casa de1 milhão de exemplares vendidos. Ao longo da guerra, a média vendida pela editora era de 25 milhões de exemplares por mês. Com o término da 2ª Guerra, os personagens da Timely foram perdendo a sua popularidade. Com isso, muitos dos personagens criados nesse período foram sendo aos poucos descartados. Anjo, Miss América, Ciclone, Destroyer e Centelha caíram no limbo, e demoraram para sair de lá. Namor era o único que ainda estava sendo publicado. O Tocha Humana havia sido desativado, e com o Capitão América ainda seria pior – o Supersoldado e o seu parceiro Bucky estavam encostados. Já que o personagem foi criado para ser o representante americano contra os nazistas, com a vitória dos aliados, ele ficou sem ter o que fazer. Namor também daria as caras novamente em algumas edições de "O Globo Juvenil Mensal", antes do término da revista, em março de 1959, com a edição nº 218. O jornal ainda publicaria mais dois títulos com histórias da Timely/Marvel. Eram as revistas "Biriba" (com 79 edições lançadas) e "Biriba Mensal", entre 1948 e 1952, com histórias do Namor, Tocha Humana, Centelha e Capitão América. "Biriba Mensal" foi iniciada pelo O Globo, publicada até a edição n° 33. A partir da edição n° 34, seria editada pela RGE, se estendendo até a edição final de nº 61, em dezembro de 1954. Outra revista lançada por Marinho foi "Shazam", do Capitão Marvel da Fawcett. Essa publicação contou com algumas histórias de Namora, outra atlante, prima de Namor, em sua revista pró38
pria, chamada Namora Comics. A turma da 2ª Guerra também apareceria novamente: Namor, Tocha Humana e Capitão América, em alguns números. Ainda na revista "Shazam", O Globo publicaria o Defensor Mascarado (Bill Dinamite), originalmente publicado na revista Two-Gun Kid. Criado por Stan Lee e Jack Kirby em 1948, Bill Dinamite tinha como principal característica carregar consigo um par de revólveres, focado nas histórias de faroeste do período Timely. No Brasil, o personagem seria publicado esporadicamente pela RGE nas revistas "Don Chicote", "Almanaque de Rocky Lane" e "Gibi Mensal". Sua estreia no Brasil foi na revista "Shazam" n° 10, de 1949. Após chegar à edição n°72, em dezembro de 1955, as revistas "Shazam" e "Biriba" se fundiram, tornando-se "Biriba-Shazam", continuando do número 73 e terminando na edição n°100. "Biriba-Shazam" contaria com mais algumas histórias do Namor no período pós-guerra. Na edição n°167 de "O Globo Juvenil Mensal", a editora publicaria a última história do Capitão América feita nos Estados Unidos. A edição original Captain America n° 78 seria a última publicada pela editora americana, em setembro de 1954. Essa última edição da revista do Capitão América foi produzida por Stan Lee e John Romita. A Timely havia colhido ótimos frutos, explorando ao máximo os seus personagens com as histórias da 2ª Guerra. Mas a guerra tinha acabado e a febre dos heróis também. Ao contrário dos personagens da DC, que faziam muito sucesso - principalmente por causa da série televisiva do Superman, estrelada por George Reeves em 1953. Com o declínio dos personagens da Timely, Martin Goodman tentou reviver a “trindade” Capitão América, Namor e Tocha Humana. Após algumas edições, as publicações seriam canceladas novamente. Goodman, então, redirecionou as publicações para outros gêneros, como Terror, Ficção Científica e Western. Dessa vez mudaria a alcunha da editora - o nome Timely ficaria para trás. 39
As novas publicações vinham, então, com o selo Atlas. Muitas das histórias publicadas nas revistas Biriba e Biriba Shazam, do Capitão América, Tocha Humana e Namor, já correspondiam ao período Atlas. Alguns desses materiais da Atlas viriam a ser publicados no Brasil por algumas editoras de São Paulo. Uma das primeiras a publicar essas histórias foi a Editora La Selva, uma empresa fundada por Vito La Selva na segunda metade da década de 1940. A La Selva foi a primeira editora paulista a editar Histórias em Quadrinhos. Vito La Selva foi um dos milhares de imigrantes italianos que chegaram ao Brasil no início do século 20. Teve como ofício a venda de jornais pelas ruas de São Paulo. Depois de algum tempo, por causa do serviço militar, retorna para a Itália – anos depois, estaria de volta ao Brasil. E na sua volta, Vito adquiriu uma pequena banca de jornal no centro da cidade. Em seguida, montaria uma distribuidora de revistas, junto com outros imigrantes italianos, iniciando o processo de distribuição de diversas revistas. Com os negócios prosperando, Vito decide publicar revistas em quadrinhos. Algum tempo depois, criaria a Editora La Selva, uma empresa localizada na Rua Pedro de Toledo, nº 231, no bairro da Vila Mariana em São Paulo. Uma das primeiras publicações de sua nova editora seria a revista chamada "Cômico Colegial", com histórias do personagem Black Terror, que pertencia à Standard Comics. A revista era um mix de vários personagens e histórias diversas. Muitas histórias de Western foram publicadas nesta revista. A publicação incluía personagens como Bill Kid e até John Wayne, com histórias baseadas no ator norte americano - que ajudou em muito na popularização do gênero nos quadrinhos. Kid Colt, personagem do período Atlas/Marvel, publicado na revista original Kid Colt Outlaw teve algumas de suas histórias espalhadas por várias editoras no Brasil. Kid Colt é um dos personagens do gênero mais famosos desse período de bang-bang. Criado por Stan Lee, com dese40
nhos de Pete Tumlison, o personagem já tinha feito a sua estreia no Brasil pela RGE, na revista "Novo Gibi", de 1950. A RGE ainda publicaria em 1968 o "Almanaque do Far West" em três edições com histórias de Kid Colt e em 1975 com outro "Almanaque do Far West" - 2° série, em apenas uma edição, com histórias de Kid Colt, Ringo Kid, Wyatt Earp, todos com argumentos de Stan Lee. Kid Colt foi publicado em alguns números de "O Globo Juvenil" e também pelo "Suplemento Última Hora", em 1952. Esse suplemento era uma publicação do jornal carioca Última Hora, fundado pelo jornalista Samuel Wainer em 1951. Kid Colt foi também publicado em algumas edições pela Ebal como "Super-X" e "Aí Mocinho". Pela Globo/RGE, Kid Colt foi publicado nas revistas "Júnior", "Rocky Lane", "Campeões do Oeste" e "Gibi Mensal", sem periodicidade, aparecendo sempre que podia entre uma revista e outra. Pela La Selva, Kid Colt foi publicado em algumas edições de "Cômico Colegial" e de "Seleções Juvenis" e na revista "Emoção", título especializado em contos de mistério, que a partir de 1962, começou a publicar HQs. A revista "Emoção" teve 127 edições publicadas pela La Selva. Na La Selva, outra revista que faria muito sucesso foi a publicação "O Terror Negro", considerada como pioneira no gênero, com temas variados, reunindo histórias policiais, de terror e com alguns personagens obscuros da chamada Era de Ouro. O título da revista foi baseado no personagem The Black Terror criado pela editora americana Nedor Comics em 1941. Muitas das capas de "O Terror Negro" foram desenhadas pelo artista português radicado no Brasil Jayme Cortez. Alguns materiais do período Atlas foram publicados em "O Terror Negro". Reuniam histórias de terror e também outras, como as famosas sobre monstros do trio Stan Lee, Jack Kirby e Steve Ditko, que antecedem o universo Marvel tradicional, extraídas das revistas originais Journey Into Mystery, Tales of Suspense e Tales to Astonish. "O Terror Negro" teve 223 edições, publicadas no período 41
de 1950 a 1966. A revista "Sobrenatural", com mais algumas histórias desse mesmo material da Atlas, teve 148 números, publicados entre 1954 e 1967. A La Selva publicaria várias revistas de terror. Uma delas, que contava com histórias de diversas editoras, inclusive a Atlas, foi a revista "Contos de Terror", com algumas histórias publicadas de Marvel Tales, World of Suspense e Journey Into Mystery. "Contos de Terror" foi publicada entre 1954 e 1964, em um total de 114 edições. Speed Carter Spaceman, de 1954 - no Brasil chamado de Capitão Radar - com histórias de ficção científica da Atlas, também foi publicado em alguns números de "Seleções Juvenis". Ainda em "Cômico Colegial" e também em "Seleções Juvenis", foram publicadas histórias de ficção científica da revista Spaceman. Outra publicação lançada pela La Selva foi a "Histórias de Terror", edições especiais de "Sobrenatural" apresentando as melhores histórias de terror, com sagas de Tales of Suspense, Marvel Tales, Strange Stories of Suspense, com desenhos de Jack Kirby. A publicação teve 83 edições, entre 1960 e 1967. Outra empresa desse período que publicou algumas histórias da Atlas foi a Editora e Gráfica Novo Mundo, comandada por mais um imigrante italiano, Victor Chiodi. Depois de fazer alguns trabalhos pela La Selva, Chiodi se interessou por publicar suas próprias revistas. Antes da Novo Mundo, Victor criou a Editora Chiodi, por um curto tempo no início dos anos 1950. Pela Chiodi foram publicadas duas revistas, a primeira chamada "Corações", com histórias de romance do período Atlas, extraídas das séries Love Romances, My Own Romance e Secret Story Romances. A coleção durou apenas seis edições. A outra foi a série, "Seleções em Quadrinhos", um compilado com algumas histórias da Atlas espalhadas por algumas das revistas, entre eles Kid Colt. Seleções teve 70 edições publicadas entre 1954 e 1955. Depois da Chiodi, Victor criou a Novo Mundo, em 1952. A Novo Mundo ficava localizado em São Paulo, na Rua Carneiro Leão, n° 123 no bairro do Brás. Ela incorporou as publi42
cações da Chiodi e publicou algumas histórias de terror, continuando com mais alguns materiais do período Atlas. A editora relançou uma nova série para "Seleções em Quadrinhos", com o título de "Conquistadores do Espaço", apresentou algumas histórias de Strange Tales, Journey Into Mystery e Tales to Astonish. Dentro da coleção Seleções, fugindo um pouco das histórias de terror e de ficção, a Novo Mundo publicaria a personagem Lili, a Garôta Atômica (Milie the Model, no original). Lili, a Garôta Atômica foi uma das poucas personagens que foram criadas no período Timely e que manteve as suas publicações durante a fase Atlas, até chegar à Marvel. Direcionada mais para o público feminino, Lili é uma modelo que vive várias histórias na agência em que trabalha. Suas histórias com muito humor e romance fizeram muito sucesso no Brasil. A repercussão foi tanta que algumas dessas histórias foram produzidas exclusivamente no Brasil pela Novo Mundo, assinadas pelos artistas Nico Rosso e Gedeone Malagola. Algumas histórias de Kid Colt, com o título de Texas Kid, também foram publicadas nessa coleção. "Seleções em Quadrinhos", que abrangia várias histórias de diversos licenciadores, teve 319 edições, publicadas de 1956 até 1967. A Novo Mundo publicaria ainda uma revista chamada "Gato Preto" - revista que era focada no gênero terror. Algumas edições de "Gato Preto" apresentavam histórias de Journey Into Mystery e Adventures Into Weird Worlds. "Gato Preto" foi publicado de 1955 até 1964, com 58 edições. Ainda nesse gênero, a editora publicaria mais uma revista, com o lançamento do "Mundo das Sombras", em 1955. "Mundo das Sombra"s seria mais uma publicação com diversas tramas de terror e com mais algumas histórias do período Atlas - foi publicada até 1967, num total de 64 edições lançadas. A gráfica de Victor Chiodi ainda foi a responsável por imprimir todo o material de outra editora dos anos 1950, chamada Júpiter. A Júpiter era uma pequena editora que publicava material nacional, com Gedeone Malagola como editor. A editora era administrada por Auro Teixeira, e devido 43
a diversos problemas, duraria apenas alguns anos. A única revista da Júpiter com material da Atlas foi a "Sepulcro", em apenas uma edição, publicada em janeiro de 1954, com histórias da Stan Lee, Joe Maneely e Dick Ayers. As histórias publicadas pela La Selva e pela Novo Mundo, juntamente com todas as editoras “nanicas” paulistas daquele período, não seguiam uma linha na estrutura das revistas. As histórias eram compradas das agências, e a seguir, publicadas sem muito critério. O mix das revistas era editado conforme o que se tinha para publicar. Eram histórias nacionais e estrangeiras, publicadas juntas. Muitas das histórias não vinham com os créditos de quem escrevia e desenhava, e as editoras não se preocupavam com isso. Até hoje, é muito difícil saber quem fez o quê, principalmente com as histórias nacionais, produzidas nos anos 1950 e 1960. Anos depois, a La Selva compraria a Novo Mundo e alguns títulos publicados pela Novo Mundo foram incorporados pela editora. Os últimos anos da La Selva foram marcados por conflitos financeiros entre Vito e seus filhos, que não se entendiam sobre o rumo que a editora deveria tomar. Em 1965, a editora sofreu perdas com uma grande enchente, que destruiria grande parte de seu depósito, perdendo praticamente tudo o que havia por lá. Três anos depois, em 1968, Vito La Selva viria a falecer, e seus filhos continuariam com o seu legado de editor. O filho mais novo de Vito, Estevão La Selva, logo inauguraria uma nova editora, chamada Trieste, que com a chegada do Universo Marvel ao Brasil, publicaria o personagem Nick Fury, desenhado por Jim Steranko. Um dos mais novos personagens criados por Stan Lee e Jack Kirby na nova Marvel. O gênero western foi um dos tipos de quadrinhos com mais sucesso no Brasil. A RGE publicou um dos primeiros personagens da Atlas, chamado Black Rider. Batizado no Brasil como Cavaleiro Negro, o personagem foi criado pelo artista Syd Shores, em 1948, com história publicada do título original 44
“The Legend of The Black Rider” na revista All-Western Winners nº 2. Cavaleiro Negro era Mathew Masters, mais um fora da lei daquele período pós-guerra que usava de dupla identidade para intimidar seus inimigos. Cavaleiro Negro Já tinha feito a sua estreia no Brasil na revista "Gibi Mensal". Depois, migraria para as revistas "Biriba Mensal" e "Shazam". Somente em 1954 ganhou revista própria, pela RGE. Além das histórias do Cavaleiro Negro, foram publicadas as aventuras de Tex Dawson, da revista original The Western Kid, com desenhos de John Romita, outro personagem de destaque do gênero. A publicação teve 245 edições, entre 1952 e 1973. Com o cancelamento da revista nos Estados Unidos, a RGE publicou algumas histórias de um personagem espanhol chamado Gringo, e adaptou como se fossem do Cavaleiro Negro, onde boas partes dos desenhos foram refeitos. Como a revista vendia bem, a editora deu um jeito de continuar com as suas histórias. Outro personagem da Atlas, chamado Texas Kid (Daring Mystery Comics), também foi publicado no Brasil pelo O Globo, no suplemento "O Globo Juvenil "n° 21. Outras histórias menores da Atlas foram publicadas nessa época, como “Lorna, A Rainha da Selva”, do título original Lorna, The Jungle Girl. Criada por Don Rico e Werner Roth, a personagem estreou no Brasil pela La Selva, em "Cômico Colegial " n° 132 e posteriormente com algumas histórias publicadas pela RGE, nas revistas "Fantasma" e "Biriba-Shazam". E Jane da Selva ( Jann of the Jungle), com mais uma heroína das selvas. A personagem foi publicada no Brasil pela RGE e pela Garimar (Estúdio Gráfico Garimar S.A), na revista “Valor” em 1958. A Garimar foi uma pequena editora carioca que funcionou entre final dos anos 1950 e início dos 1960.
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"Almanaque dos Super-Heróis", de 1969, pela Editora Brasil-América LTDA. (EBAL).
A EBAL DE ADOLFO AIZEN Com novas editoras surgindo, e com tantas revistas chegando às bancas, o que estaria Adolfo Aizen fazendo entre 1940 e 1950? Adolfo ainda estava no Grande Consórcio de Suplementos Nacionais, mandando as últimas edições de O Lobinho para as bancas. Diferente de Roberto Marinho e de Assis Chateaubriand, que estavam em ascensão, com títulos e mais títulos, conquistando cada vez mais o mercado nacional. Aizen encontraria alguns problemas dentro do Consórcio. Um deles era o fato de não conseguir aumentar o seu leque de publicações por causa da crise do papel daquele período, onde houve racionamento por causa da Segunda Guerra Mundial e também por causa do governo, que tentava inviabilizar boa parte da imprensa que era oposição. Alguns jornais foram comprados pelo governo do presidente Getúlio Vargas e com o Consórcio não seria diferente. Após a compra em 1942, Aizen trabalharia por mais algum tempo no Consórcio. Mas já estava decidido a ter a sua própria editora e logo já pensaria em novas alternativas. Aizen recorreu, mais uma vez, ao seu amigo João Alberto, o mesmo que lhe aju48
dou na época do jornal A Nação. E mais uma vez, João Alberto ajudou o seu estimado amigo: com mais um grupo de empresários, se juntaria na sociedade para criar uma nova empresa. Aizen reuniu uma equipe de pessoas que tinham trabalhado no Grande Consórcio e que eram de sua confiança. Além de um investimento de capital em torno de dois milhões de cruzeiros (hoje por volta de R$ 72.000,00), Adolfo Aizen estava pronto para dar início ao seu mais novo empreendimento. A Ebal (Editora Brasil-América Ltda.) foi fundada em 18 de maio de 1945. Aizen não tinha tanta certeza se publicaria histórias em quadrinhos, tanto que iniciou sua nova editora com publicações de livros, que acabou não dando muito certo, pois não tivera um bom retorno financeiro. Com isso, não demoraria em voltar aos quadrinhos. Aizen logo faria uma parceria com César Civita, da Editorial Abril argentina (que já estava arquitetando o braço de sua editora no Brasil) e juntos publicariam a revista Seleções Coloridas, com histórias de Walt Disney. Em seguida, Aizen mandaria para as bancas a revista chamada "O Heroi" (assim mesmo, sem acento), que faria muito sucesso na época de sua publicação. Além disso, para alegria geral, Aizen retomaria alguns personagens da época de "O Lobinho". Eram os personagens da DC Comics, com Superman, a primeira revista com o título do homem de aço no Brasil. Superman nº 1 chegou às bancas em novembro de 1947, juntamente com os outros heróis da DC. Na revista, além do Superman, temos histórias do Batman e do Flash. A publicação de Superman seria mantida ininterruptamente pela Ebal até 1983. A Ebal, expandindo o mercado com as suas novas publicações, logo teria a sua própria sede: o famoso prédio localizado à Rua General Almério de Moura, nº 302-320, no Rio de Janeiro. A partir dali, a Ebal se tornaria referência nas publicações de histórias em quadrinhos, aumentando os números de publicações para todos os gêneros, como HQs de Faroeste ("Roy Rogers" e "Reis do Faroeste"), infantil ("Mindinho", "Papai Noel"), até a 49
adaptação do Velho Testamento de "A Bíblia em Quadrinhos". Completavam o pacote histórias com "Zorro", "Tarzan" e muitas outras publicações. Em 1953, Batman, outro personagem da DC Comics, também ganharia a sua própria revista. A Ebal seria a nova casa dos dois principais personagens da editora. Além dos títulos próprios, Superman e Batman ganhariam seus almanaques - alguns em tamanho gigante, além das suas edições bimestrais: "Batman Bi" e "Superman Bi". Superboy também teria sua própria revista, contando as aventuras do Superman quando garoto. Com a consolidação de sua editora, Aizen finalmente gozava do prestígio que tanto sonhava.
O FIM DA ATLAS E O COMEÇO DA MARVEL COMICS
Com o fim da guerra, os super-heróis da Timely estavam sem popularidade. Os números de vendas de anos atrás não mais se refletiam e nesse período pós-guerra, toda a indústria de quadrinhos ganharia outro vilão contrário. Algumas entidades, como escolas, igrejas e parte da mídia, eram contra os comics americanos. Elas acreditavam que as histórias influenciavam negativamente toda a juventude que consumia essas revistas. Logo depois, esse discurso ganharia ainda mais força, quando um psicólogo alemão chamado Fredric Wertham começou a fazer duras campanhas contra os quadrinhos. Para Wertham, todos os jovens delinquentes eram consumidores de quadrinhos. Wertham promovia palestras sobre o tema, derramando o seu discurso de ódio contra toda a indústria. Não tardou muito para o psicólogo publicar um livro chamado “Seduction of the Innocent” - A Sedução dos Inocentes, em tradução livre, nunca publicado no Brasil. Nesse livro, o autor criaria um tremendo desconforto entre as famílias americanas, propagando contra as publicações de histórias em quadrinhos em todo o país. Uma de suas alegações era a de que quem lia os gibis poderia ter pesadelos, ou então, as crianças poderiam sair por aí, assassinando umas às ou50
tras, após lerem histórias de terror. Entre muitas de suas sandices, dizia que os quadrinhos causavam “asma” em seus leitores. Alegou que a personagem Mulher-Maravilha era vidrada em bondage, que Batman e Robin eram homossexuais e que o Superman era fascista. Algumas cidades promoviam queima de revistas em praças públicas. Quantas edições de Action Comics n°113 não devem ter ido parar nas fogueiras? O que se sabe é que o estrago já tinha sido feito. Todos esses acontecimentos fizeram com que as editoras criassem um selo chamado “Comics Code Authority”, como forma de autocensura e controle em suas publicações. Como a maioria dos quadrinhos vinha dos Estados Unidos, aqui no Brasil não tardou para que os editores criassem algo parecido. A frase “Aprovado pelo Código de Ética” vinha estampada nas capas dos gibis. Somando tudo isso, e mais a queda de popularidade dos heróis, o editor Martin Goodman mudaria então o rumo de suas revistas, a fim de injetar novos tipos de quadrinhos. Outro fator que contribuiu para a queda das revistas foi a ascensão da televisão, que vinha em uma constante alta. Muitos quadrinhos produzidos naquela época caíram pela metade em seu consumo, com as editoras pagando cada vez menos aos seus colaboradores. Os estragos feitos pelo Dr. Wertham eram inevitáveis. Depois de perder o contrato com a distribuidora que fazia a distribuição das revistas da Atlas, Goodman ficou a ver navios. Estava com as revistas prontas, mas não tinha quem as distribuísse. Conseguiu um novo contrato com a empresa chamada Independent News, porém com certas ressalvas. A Independent pertencia à DC Comics, uma de suas rivais, e por isso a Atlas não podia exceder mais do que oito títulos por mês. Com a equipe reduzida, com vários artistas sendo despedidos, sem um futuro certo e com um limite de apenas oito revistas mensais - Goodman sairia de férias, deixando a editora nas mãos de Stan Lee. O único funcionário que ficou na editora, desde o início. 3 Action Comics nº 1, de 1938, apresentou a primeira aparição do Superman nos quadrinhos. Uma edição em excelente estado foi leiloada em 2014 pelo site eBay por US$ 3,2 milhões de dólares. 51
Stan precisava fazer algo acontecer, pois a editora em que trabalhava há mais de 15 anos estava minguando. Lee convidou Steve Ditko, desenhista que já tinha feito alguns pequenos trabalhos, e que estava atrás de trabalhos maiores. Outro que retornaria era Jack Kirby. Logo depois do sucesso com o seu Capitão América, Jack Kirby e Joe Simon saíram da Timely, após alguns desentendimentos com Martin Goodman. Kirby fez alguns trabalhos na DC, além de diversas outras editoras, e após 17 anos desde a sua saída da Timely, o REI estava de volta. As histórias de “monstros” que antecedem o universo Marvel já davam um panorama do que estava por vir. A DC tinha sido a pioneira nas criações dos super-heróis, e a Timely sempre vinha na onda. Uma das histórias mais famosas do mundo dos quadrinhos, sobre o início da era Marvel, é o fatídico encontro entre o editor da Marvel com os da DC, em uma partida de golfe. Alguns pesquisadores dizem que tal encontro nunca ocorreu. Ou que o fato aconteceu de outra forma. Mas no documentário “Stan Lee’s Mutants, Monsters & Marvels”, onde um dos criadores do Universo Marvel é entrevistado pelo cineasta e roteirista Kevin Smith, o próprio Stan confirma o ocorrido. A história é a seguinte: em meados de 1961, Martin Goodman teria participado de uma partida de golfe com o dono da DC Comics Jack Liebowitz. Nessa partida, Liebowitz contaria que a revista que mais fazia sucesso era a da Liga da Justiça, revista que reunia os pesos pesados da editora: Superman, Mulher-Maravilha, Batman, Lanterna Verde e Flash. Goodman, não perdendo tempo, retorna ao escritório e pede para Stan Lee fazer uma nova revista com um grupo de heróis. Stan Lee já estava desanimado, pois não via com bons olhos o futuro da editora aonde trabalhava. Afinal estava ali desde os 17 anos. Stan Lee estava cansado nesse momento e via com desconfiança o futuro dos quadrinhos americanos. Uma figura importante e que de certo modo ascen52
deu sua confiança e acabaria se tornando fundamental em sua próxima criação seria sua esposa Joan Lee. Em uma certa noite, Joan disse a Stan para que criasse uma história nova de seu jeito. Já que estava desanimado, Stan poderia criar uma nova revista e escrever o que realmente queria fazer. Com o pedido de Goodman de criar uma nova revista, Stan Lee, com 38, Jack Kirby, com 44 e Steve Ditko com 34 anos de idade, juntaram o que foi a Timely e a Atlas e deram o pontapé inicial no que viria a ser o Universo Marvel. O início do Universo Marvel tradicional se dava ali, com a primeira edição da revista Fantastic Four nº 1 (Quarteto Fantástico), que chegava às bancas em novembro de 1961. Ao contrário do que Goodman tinha pedido à dupla, Stan Lee e Jack Kirby não criaram uma revista imitando a Liga da Justiça. Muito longe disso. Indo na contramão do esquema dos “superamigos”, o grupo é liderado por Reed Richards, um dos maiores gênios científicos do planeta. Reed foi designado pela agência espacial NASA para trabalhar em um novo programa espacial. Mas para sua infelicidade, Richards não foi autorizado a participar do lançamento da aeronave. Decidido em conquistar o espaço antes da antiga União Soviética, Reed resolve então fazer por conta própria a sua viagem para o espaço. Para isso, recruta seu velho amigo Ben Grimm para pilotar a aeronave, sua noiva Susan Storm e o irmão dela, Johnny Storm. Os quatro secretamente invadem o local do lançamento e partem para o espaço. Porém, uma chuva de raios cósmicos atravessa a aeronave, fazendo com que todos sejam expostos à radiação. Com os comandos da aeronave danificados, o grupo volta à Terra, fazendo um pouso forçado e, em seu retorno, os quatro tripulantes percebem que, de alguma forma, os raios cósmicos alteraram as suas estruturas genéticas. Reed Richard consegue fazer com que seu corpo se torne maleável, fazendo com que ele estique qualquer parte de seu corpo. Susan ganha a habilidade de ficar invisível. Ben Grimm se 53
transforma num monstruoso ser de pedra, O Coisa. E por fim, Johnny Storm consegue inflamar seu corpo, transformando-se no novo Tocha Humana. A partir dali, se tornariam o Quarteto Fantástico, vivendo várias aventuras galgadas na ficção-científica. A revista do Quarteto Fantástico logo cairia nas graças do público. Conforme as edições iam chegando às bancas, era nítida a evolução das histórias. A cada edição que a dupla Lee e Kirby produzia, mais leitores a editora angariava. E não tardou para o universo se expandir. Apenas seis meses após o lançamento do Quarteto Fantástico, em maio de 1962, era a vez de O Incrível Hulk fazer a sua estreia na editora. Stan Lee e Jack Kirby se inspiraram no conto de Robert Louis Stevenson, “O Médico e o Monstro”, e no monstro de “Frankenstein”, de Mary Shelley, para a criação do novo personagem. O Dr. Robert Bruce Banner era o responsável em testar uma nova bomba, baseada em radiação gama. Após perceber que na área de teste se encontrava um rapaz chamado Rick Jones (personagem que viria a ser o companheiro do Hulk), Dr. Banner corre para salvá-lo. Porém, a bomba continuaria em sua contagem regressiva, até ser detonada. E toda a sua radiação é absorvida pelo Dr. Banner. Essa radiação, no entanto, acaba não o matando, mas provocando uma alteração em sua estrutura celular. Isso faz com que aflore o seu lado selvagem, toda vez que Banner fica irritado. Dessa forma, ele se transforma em um monstro esmeralda, chamado Hulk. O personagem fez a sua estreia em sua própria revista, chamada "The Incredible Hulk" nº 01. Na sua primeira aparição, o personagem não tinha a cor verde, e sim a cor cinza. A cor foi alterada porque a gráfica não conseguia acertar o tom, e perceberam que o verde ficava bem melhor no papel. Após o trauma sofrido pela radiação Gama, toda vez que ele se transformava no Hulk, Banner não conseguia domar o seu lado selvagem, tornando-se um monstro desgovernado, perseguido pelo exército americano. Outro personagem que seria introduzido no 54
Universo Marvel era Namor, O Príncipe Submarino. Ele estava desaparecido desde o período Atlas. Dessa vez, o personagem voltaria na edição número 04 da revista original do Quarteto Fantástico. Com o novo universo crescendo, e com os sucessos dos novos personagens, a Marvel mandaria para as bancas, em agosto de 1962, a revista "Amazing Fantasy" nº 15, com a primeiríssima aparição do Homem-Aranha - o personagem que talvez seja o símbolo máximo da Marvel Comics. Criado por Stan Lee e Steve Ditko, o personagem é Peter Parker, que, após ser picado por uma aranha radioativa, adquire os poderes proporcionais de uma aranha - além de uma super força. No começo, Peter Parker tenta ganhar dinheiro com os seus novos poderes. Após uma apresentação no estilo “luta livre”, Peter se recusa a deter um bandido que estava fugindo de um policial. Mas infelizmente, o destino vinha ao seu encontro. Logo que chega à sua casa, Peter descobre que seu Tio Ben fora assassinado. Sedento por vingança e enfurecido pelo fato ocorrido, Peter Parker parte em busca do assassino. Assim que consegue encontrar o responsável pela morte de seu tio, percebe que o assassino é o mesmo bandido que tinha passado por ele, e que tinha se recusado a deter. O Homem-Aranha foi o personagem que os leitores mais se afeiçoaram. Pelo fato de Peter ser um jovem nerd, sem dinheiro e tímido com as meninas, não seria difícil fazer com que os leitores se identificassem com seu personagem - que logo ganharia sua revista própria. Assim, "Amazing Spider Man" n° 01 chegava às bancas, em março de 1963. Na sequência veio Thor, o Deus do Trovão, em sua primeira aparição na revista "Journey Into Mystery" nº 83, em agosto de 1962. Criado por Stan Lee e Jack Kirby, inspirado na mitologia nórdica, Thor é filho de Odin, Deus de Asgard, uma das divindades do Universo Marvel. Thor possui o poderoso martelo Mjolnir, que só pode ser erguido por ele, ou por alguém que for digno e de alma nobre. Thor se tornaria um dos protetores no planeta Terra, 55
ou Midgard, como é chamada em Asgard. Em março de 1963, na revista "Tales of Suspense" n°39, era a vez do Homem de Ferro dar as caras. O homem por trás da armadura é Tony Stark: cientista, gênio, bilionário, playboy e filantropo, que durante o conflito no Vietnã sofre um acidente devido a uma explosão de uma granada. Sofrendo um duro golpe por causa dos estilhaços que se alojaram próximo ao seu coração, é capturado e forçado a criar uma arma para os seus inimigos. Ao invés disso, Stark desenvolve uma armadura para ajudar a bombear e proteger o seu coração. Construindo a armadura, Tony Stark consegue derrotar seus inimigos e fugir do seu covil. Depois disso, criaria inúmeros modelos de armadura (a primeira versão acinzentada, passando pela amarela, até adotar a amarela e vermelha). Tony Stark a partir dali se tornaria o Invencível Homem de Ferro. O personagem foi criado por Stan Lee e Jack Kirby. Mas as suas primeiras histórias foram desenhadas por Don Heck. Depois de todos esses lançamentos, a dupla Lee e Kirby reuniria os mais novos personagens Hulk, Thor, Homem de Ferro, mais o Homem Formiga e a Vespa, para o lançamento de um novo gibi. Era a reunião dos Vingadores, em "Avengers" n° 01, de setembro de 1963. A primeira revista unindo os novos personagens. Na estreia, os Vingadores enfrentariam o meio irmão de Thor, Loki, o Deus da mentira. Na edição Avengers nº 04, de março de 1964, é apresentada a volta do Capitão América, reintroduzindo o personagem ao novo universo. Com o fim da guerra, o Capitão América tenta capturar um inimigo nazista chamado Barão Zemo, que estava fugindo em um avião. Após pular sobre o avião e ficar segurando em uma de suas asas, a aeronave inimiga explode no ar, fazendo com que todos pensassem que o Capitão América tinha morrido. Na verdade, ele foi arremessado ao mar. Esse fato fez com que o Capitão América ficasse congelado em um bloco de gelo, por vários anos. Essa foi então a explicação que a Marvel deu aos leitores para que o personagem fosse introduzido ao novo universo. 56
Nos anos 1950, a Timely ainda publicaria algumas histórias do Capitão. (Na realidade, esse Capitão América não era o “verdadeiro” Capitão, e sim um impostor que assumiu o manto do Capitão América original, após o verdadeiro ser dado como morto). Mas isso só foi explicado anos depois na era Marvel. Nesse período, em suas publicações, era apresentado como sendo o Capitão América original. Já que a editora resolveu trazer o personagem de volta, alguma explicação teve de ser criada para a cronologia ter fundamento. Mas a grande sacada da editora em torno do personagem foi o ter colocado como um homem fora do seu tempo. Afinal de contas, Steve Rogers ainda sentia o drama da guerra, e dessa vez tinha que encontrar um novo caminho. Por algum tempo, o personagem enfrentaria os seus fantasmas do passado, até se tornar um dos líderes dos Vingadores. Ainda no mês de abril de 1964, mais um personagem faria a sua estreia. Era a vez do Demolidor, criado por Stan Lee e Bill Everett. O personagem é Matt Murdock, filho de Jonathan “batalhador” Murdock, um boxeador decadente, em fim de carreira. Certo dia, enquanto estava andando pela rua, Matt percebeu que um caminhão desgovernado estava vindo em alta velocidade. Percebendo que uma pessoa estava na direção do caminhão, Matt corre e consegue evitar que o veículo atropelasse essa pessoa. Porém, o caminhão carregava um material radioativo. O motorista acaba perdendo o controle e o carro tomba, liberando o composto que atinge direto o rosto de Matt, fazendo com que ele sofresse uma grave lesão, tornando-o cego para sempre. Em contrapartida, todos os outros sentidos de Matt Murdock ficaram ampliados, com ele ganhando ainda um tipo de radar com o qual consegue perceber as formas das pessoas e dos objetos à sua volta. Após seu pai ser assassinado por se recusar a entregar uma luta, Matt Murdock parte em busca dos assassinos. Logo, capturaria os responsáveis pela morte de seu pai. A partir dali, Matt Murdock se tornaria o Demolidor, o Homem 57
sem Medo. Atuando na Cozinha do Inferno, localizada na cidade de Nova York, combatendo o crime em sua cidade. O grande trunfo da Marvel, em especial de Stan Lee, foi que as novas criações não eram super-heróis perfeitos. Todos eles tinham crises de identidade e sofriam muito com os dilemas do nosso dia a dia. No caso do Quarteto Fantástico, o Coisa estava sempre se estranhando com o Tocha Humana. E pelo fato de ter se transformado em um monstro de pedra, Ben Grimm sempre ficava amargurado por não conseguir retornar à sua forma humana. Peter Parker, o Homem-Aranha, além de ser muito jovem, e com a morte de seu tio Ben, tinha que se virar para arrumar dinheiro para ajudar a sua tia May, que sempre estava doente. O Hulk não era bem um herói. Afinal, o Dr. Banner não tinha controle quando se transformava no incrível monstro verde. Thor, após viver mais na Terra do que em Asgard, arranjou problemas com seu pai Odin, por querer se relacionar com uma mulher chamada Jane Foster, e não com alguém de Asgard. Tony Stark, o Homem de Ferro, era convencido e alcoólatra. E não pensava duas vezes em entornar o caldo. Os personagens Marvel estavam em maior conexão com o mundo real. Além de explorar a corrida espacial nas histórias do Quarteto, e os efeitos das armas nucleares com o Hulk, a editora colocaria o Homem-Formiga e o Quarteto Fantástico enfrentando comunistas, e o Homem de Ferro enfrentando alguns guerrilheiros vietcongs em suas histórias. Se a DC criou os super-heróis perfeitos, a Marvel foi um pouco além, desconstruindo todo o mito dos superseres, trazendo, para os leitores, personagens com que todos se identificassem. Outra fórmula de sucesso foi a dos encontros entre os personagens. Nas primeiras histórias, o Homem-Aranha logo se encontraria com o Quarteto Fantástico. O Hulk também entraria em combate com o Coisa. Quarteto Fantástico e os Vingadores, assim como os X-Men, também se encontrariam. Namor voltaria a dar as caras nas histórias do Quarteto Fan58
tástico, e o Demolidor sempre se esbarrava com o Homem-Aranha pelas ruas de Nova York. A Marvel fez renascer o gênero dos super-heróis no início dos anos 1960 - dando novas diretrizes para o mercado das Histórias em Quadrinhos. E foi nesse período que a Marvel aterrissou no Brasil.
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