30
Segunda-feira 4 de agosto de 2014
Jornal do Comércio - Porto Alegre
Esportes
FUTEBOL BRASILEIRO
Após a Copa, caminhos surgem para mudanças JOÃO MATTOS/JC
André Pasquali e João Carlos Dienstmann
Mudança nas categorias de base
esportes@jornaldocomercio.com.br
O desastroso resultado do Brasil na Copa do Mundo em 2014, somado aos insucessos das duas copas anteriores, reforçou a necessidade de uma mudança profunda no futebol brasileiro. Categorias de base, gerência dos clubes, mudança nas lideranças do futebol brasileiro, entre outros pontos, serviram como base para um estudo, elaborado pela Pluri Consultoria. Dividida em 12 pontos, as mudanças abrangem todos os setores do futebol nacional, e servem como reflexão para tentar amenizar os maus resultados no esporte. Nas edições de hoje e de amanhã, o Jornal do Comércio apresenta de que forma essas mudanças são possíveis, e como podem ser realizadas.
A formação de atletas é um dos pontos mais discutidos nos últimos anos no futebol brasileiro. Com exemplos vindos da Alemanha e da Espanha, em especial do Barcelona, que reformularam a maneira de tratar as jovens promessas, no Brasil, a perspectiva de uma geração de grandes jogadores diminuiu em virtude do sucateamento dos departamentos de formação. Júnior Chávare, diretor da base do Grêmio, afirma que, desde 2012, o clube passou por uma reformulação geral nos conceitos de lapidação de jovens. “Ainda buscamos a qualidade técnica, mas hoje procuramos formar cidadãos e não só jogadores. Reduzimos em 40% a reprovação dos jovens na escola e acompanhamos todos, seja no Grêmio ou junto às famílias”, explica. Sobre a saída precoce de atletas para o exterior, Chávare observa que a pressão sobre os jogadores, que com 18 anos já são destaques em clubes do Brasil, é muito grande, e, muitas vezes, não há preparo necessário para aguentá-la “O grande craque na categoria de base, se chega ao profissional e encara uma situação de pressão sem que seja preparado, vai se deslumbrar e perder o foco. Além disso, um jogador com essa idade pode perder a identidade do futebol brasileiro com os ensinamentos que aprenderá na Europa. Isso é irreversível”, conclui.
MAURO SCHAEFER/ARQUIVO/JC
Mudar a forma de eleição para presidência da CBF
WESLEY SANTOS/FUTURA PRESS/JC
Gestão e eficiência A criação de um Centro de Governança do Esporte é uma das medidas que as pessoas ligadas ao futebol nos Três Poderes do Brasil estão procurando realizar para melhorar a gestão e a eficiência esportiva dos clubes. Com isso, seria implantado um código de melhores práticas a ser seguido pelos times, aumentando a credibilidade institucional do esporte de uma forma simples e eficiente. Segundo o deputado federal pelo Rio Grande do Sul e ex-goleiro do Grêmio, Danrlei de Deus (PSD), essa medida vem sendo estudada há alguns anos e, agora, depende de uma votação no Congresso para entrar em vigência. Algumas das ações são: melhorar a gestão financeira dos clubes, a infraestrutura das categorias de base e estimular o planejamento antecipado dos times. “É o começo de uma mudança. É fazer com que os clubes tenham uma gestão e planejem o ano antes, com o risco de serem rebaixados. Nesse caso, ficariam somente os clubes preocupados em fazer uma gestão melhor”, afirma Danrlei.
Atualmente, para se candidatar à presidência da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), é necessário que o candidato tenha pelo menos oito assinaturas de federações de futebol do País (no total, são 27), além de cinco votos dos clubes que estão na Série A do Campeonato Brasileiro. Na última eleição, que elegeu Marco Polo del Nero como sucessor de José Maria Marin, não houve sequer oposição. Andrés Sanchez, ex-presidente do Corinthians e Francisco Noveletto, atual presidente da Federação Gaúcha, não conseguiram atingir o número suficiente para concorrer. Para Fernando Ferreira, um dos autores do estudo e presidente da Pluri Consultoria, a democratização do poder é o ponto mais difícil de acontecer. “Seria saudável que houvesse uma alternância, mas quem está no poder não pretende fazer nenhuma alteração. É muito difícil mudar o estatuto. O ideal seria começar pelas federações, com novos nomes e ideias de reformulação, para depois tentar essa modificação”, frisa.
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA/DIVULGAÇÃO/JC
Reformulação nos gabinetes A busca por mudanças nas questões fiscais, como refinanciamento de dívidas dos clubes também é uma das propostas. Alguns estudos apontam que as dívidas chegaram a R$ 5 bilhões em 2013, boa parte referente a encargos federais não pagos. Conforme Fernando Ferreira, já houve contato com o governo federal para que os clubes se enquadrem na Lei de Responsabilidade Fiscal, que busca equilibrar as finanças. “Já fomos ao Congresso junto com dirigentes de clubes para conversar sobre essa possibilidade, mas não tivemos retorno. É preciso que os clubes se unam para estancar os débitos”, afirmou. Hoje, por exemplo, as dívidas de Grêmio e Internacional com a União, envolvendo Previdência, Receita Federal e Timemania chegam a R$ 161 milhões. Em julho, dirigentes se encontraram em Brasília para conversar com a presidente Dilma Rouseff e encontrar alternativas para o refinanciamento.
Fair Play Financeiro Forçar os clubes a viverem dentro das suas capacidades de pagamento, com punições esportivas às entidades e aos dirigentes que não as cumprirem poderia estancar o endividamento crescente dos clubes, causa principal da falta de capacidade de investimento no futebol. Segundo o advogado Marcelo Amoretty Souza, o fair play financeiro é uma das medidas que ajudaria a melhorar a qualidade do futebol nacional. “Isso serve para os clubes gastarem conforme recebem. O grande empecilho é verificar antecipadamente de quanto é a arrecadação deles, porque, existemosrecebimentosfixos,masoutrosquevariam”,explica.Ofairplayfinanceiro visa fazer com que os clubes não gastem mais do que recebem, sob pena de serem punidos até mesmo com o rebaixamento. Esse modelo é inspirado nas práticas dos campeonatos europeus de futebol, regidas pela UEFA, onde clubes podem ser punidos até mesmo com o rebaixamento caso não cumpram com suas obrigações.
ULISSES DUMAS/BA PRESS/FUTURA PR/JC
ANDREAS LAZAROU/AFP/JC
Atração de investimentos O futebol brasileiro vive uma crise de investimentos. Enquanto na Europa, Ásia e Estados Unidos os clubes tem receitas enormes para melhorar o seu plantel, no nosso país os times são obrigados a se desfazer de suas promessas cada vez mais cedo. Além disso, as dívidas adquiridas ao longo dos anos comprometem a aplicação de recursos na compra de jogadores e melhorias na infraestrutura. O resultado é claro: o futebol praticado no Brasil é fraco quando comparado ao de outras ligas espalhadas pelo mundo. E como fazer para aumentar os lucros dos times? A atração de investimentos é uma grande oportunidade que os clubes têm de utilizarem a criatividade para estarem melhor munidos financeiramente. A iniciativa privada surge como a principal forma de arrecadação de fundos. Dar segurança e mostrar regras claras aos investidores é fundamental para atrair ao Brasil o que vem sendo gasto no exterior. Um exemplo disso são os naming rights de estádios, onde clubes cedem o nome de suas estruturas em troca recursos. No Brasil, a Arena Itaipava Fonte Nova, localiza em Salvador, é um exemplo do uso dessa medida. Além disso, regulamentar o mercado de agentes de futebol e fiscalizar a sua atuação se tornam ações importantes para evitar que os times sejam prejudicados com a saída precoce de jogadores.