LUTA
RESISTÊNCIA
- UM PLANO HABITACIONAL PARA O DISTRITO DA REPÚBLICA
MOVIMENTO
LUTA
RESISTÊNCIA - TEREZA HERLING E CATHERINE OTHONDO
- GUSTAVO CASTRO
MOVIMENTO
- TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO DE ARQUITETURA E URBANISMO DA UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
- JUNHO DE 2021
Aos movimentos sociais, que lutam diariamente na construção de cidades mais dignas.
Em memória de: Ricardo Oliveira Galvão Pinheiro Selma Almeida da Silva Werner da Silva Saldanha Wendel da Silva Saldanha Francisco Lemos Dantas Walmir Sousa Santos Alexandre de Menezes que perderam suas vidas no incêndio do edifício Wilton Paes de Almeida, em maio de 2018.
AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente aos meus pais, Celso e Creusa, pelo apoio incondicional na minha formação, por confiarem aos seus filhos a educação e a oportunidade de estudar que ambos não tiveram, e por acreditarem que um menino do interior poderia se formar arquiteto na capital. A Fernando Haddad, pela implementação do Programa Universidade para Todos (PROUNI), o qual financiou integralmente a minha graduação. Agradeço a todos os meus amigos, que construíram, direta e indiretamente, a pessoa que eu sou hoje. Por me fazerem acreditar em meu potencial e por estarem sempre perto em todos os momentos. Em especial: À Mayumi, Jennifer, Julia e Fernanda, amigas
arquitetas incríveis e também autoras desse trabalho, o qual só foi possível de se construir pela colaboração e participação de tantas mãos e mentes. À Juliana e Giulia por compartilharem todos os momentos de insegurança, surtos e risadas durante o desenvolvimento desse projeto em um ano tão intenso e atípico. Por fim, agradeço às minhas orientadoras, Catherine Otondo e Tereza Herling, por enxergarem com olhos de planejadoras o potencial do meu trabalho, respeitando minhas decisões - acreditando que meu TFG poderia ser mais do que apenas desenhos técnicos - e me auxiliando no desenvolvimento de todas as etapas desse plano-projeto que vos apresento.
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INTRODUÇÃO
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SOBRE O PLANO
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A IMPORTÂNCIA DOS MOVIMENTOS NA FORMULAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS
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DINÂMICAS DO DISTRITO DA REPÚBLICA
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O PROJETO COMO POTÊNCIA OBSERVADORA
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O PLANO COMO POTÊNCIA TRANSFORMADORA
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POSSIBILIDADES PARA A POLÍTICA HABITACIONAL NO CENTRO
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ESTRATÉGIAS DE VIABILIZAÇÃO
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A LUTA CONTINUA!
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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INTROD
DUÇÃO
O presente trabalho busca propor um plano de intervenções habitacionais para o distrito da República, na cidade de São Paulo, reforçando a importância de a população marginalizada ocupar o território do Centro e ressaltando as diversas possibilidades de acesso à vida digna que podem existir. A partir disso, o texto se inicia por meio de uma contextualização, tanto da demanda que busca ser atendida, quanto da situação da habitação na região central, usando dados públicos para traçar um panorama do déficit e da produção habitacional no Centro de São Paulo. Surge então, o entendimento de que o desenvolvimento das políticas habitacionais e urbanas, bem como a manutenção da demanda atual, são soluções que vêm sendo construídas pelos 14
movimentos organizados. Constrói-se, portanto, um breve histórico dessa luta social, intercalando avanços políticos, como o Estatuto da Cidade de 2001, com experiências contemporâneas, compartilhadas através de entrevistas com mulheres integrantes da organização dos movimentos e ocupações. Essa potência de transformação é utilizada para construir os primeiros aspectos do projeto, de forma que o aprendizado compartilhado anteriormente possa ajudar a construir características que se aproximem mais das demandas sociais atuais. Surgem, então, os pilares de intervenção para o plano, e a compreensão de que esse precisa interferir não apenas na esfera habitacional, mas em diversas esferas da vida. Contudo, para continuar traçando um plano de intervenções para o
distrito da República, entendeu-se por necessário se aproximar da população que desfrutaria do plano final. Para isso, a metodologia foi a de desenvolvimento de um estudo de caso na escala do projeto arquitetônico, que ajudasse a entender as dinâmicas e necessidades em menor escala, antes que as soluções da macro escala fossem propostas. Foi usado como estudo de caso o fato que, primeiramente, despertou todo o desenvolvimento deste trabalho: o incêndio e desabamento do edifício Wilton Paes, em 2018, que desabrigou diversas famílias na região central da cidade. Para o desenvolvimento desse projeto experimental, a metodologia partiu da reconstrução das famílias (dispersas pela cidade a essa altura) com base nos dados de cadastramento social da Secretaria de Habitação. Após a
reconstrução dos núcleos familiares, pôde-se propor um programa para o edifício que fosse condizente com a população a ser atendida. Esse estudo mais aproximado proporcionou outros entendimentos das dinâmicas de vida, assim como a necessidade de uma variedade de usos que servissem como suporte à vida no território. Dessa forma, entendendo que esses espaços propostos não poderiam simplesmente ser replicados por toda a República, outra metodologia foi desenvolvida, dessa vez não mais na aproximação distrito/lote, mas sim distrito/territórios. Para isso, é necessário entender que apesar de compor um único distrito, a República possui uma riqueza nas dinâmicas de vida e ao mesmo tempo fronteiras, que limitam e caracterizam a existência de diversos territórios dentro do distrito. Assim, 15
duas grandes fronteiras urbanas foram entendidas como determinantes do espaço: a Avenida São João e a Avenida Nove de Julho, ambas estruturas que cercam ou marcam na cidade espaços distintos. “Pra cima da São João” ou “próximo à Nove de Julho” são frases cotidianamente usadas para traçar referências não só de localização, mas de segurança pública, caminhabilidade, disponibilidades de serviços, etc. Tendo como base esse cenário, e utilizando critérios como experiências urbanas individuais, concentração de usos, preço base dos terrenos, entre outros, foi possível traçar territórios dentro da República. Da mesma forma, foi possível elencar características predominantes desses territórios, usadas como critérios para a construção de programas mais específicos para os espaços da cidade. 16
Para a estruturação desses territórios foi utilizada a metodologia do placemaking, que propõe, por meio das potencialidades e características de cada local, duas frentes de intervenção: os aportes físicos e de infraestrutura (ou hardwares) e os aportes de programas de usos e atividades possíveis (ou softwares), tudo isso baseado nas três esferas de vidas compreendidas na etapa do projeto: estar, movimentar e comemorar. Após a definição de possibilidades para cada território, foi necessário estabelecer pesos para cada esfera de intervenção. Para isso, além do entendimento das dinâmicas territoriais, elencou-se quais seriam os terrenos que fariam parte do plano e definiu-se os critérios de utilização para os terrenos públicos e privados que foram levantados.
Por último, definiu-se de forma estratégica três fases de aquisição desses lotes, baseadas nas três situações existentes. As intervenções são propostas, consecutivamente, em terrenos públicos (a curto prazo), em prédios e terrenos ocupados e cortiços (a médio prazo) e em terrenos privados (a longo prazo). A categorização dos terrenos permitiu traçar, no último capítulo, esboços do custo que o plano teria, baseado na quantidade de unidades produzidas e no preço de cada uma, bem como no valor da aquisição dos terrenos da terceira fase. Este custo foi comparado com os valores médios que são investidos pelos fundos públicos, anualmente, em habitação. Assim, foi possível estimar o impacto financeiro do plano e o entendimento de que diversos fatores, além dos recursos financeiros, são necessários para a
viabilização de grandes intervenções urbanas. Dessa forma, os fluxos e metodologias desenvolvidos neste trabalho não são exclusivamente lineares. As escalas trabalhadas e etapas existentes são cíclicas, ou seja, partem do entendimento de que cada estratégia se apoia na outra, cooperando-se entre si.
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SOBRE
O PLANO
2.1 OBJETIVOS DO PLANO O plano tem como principal objetivo focar em alternativas contemporâneas de habitação que possam ser aplicadas para a área central do município de São Paulo. Além disso, servir de ferramenta política para a população, mostrando as possibilidades de ações e as diversas metodologias que podem ser usadas para viabilizar a produção e o acesso de moradia digna e cercada de infraestrutura. Da mesma forma, o plano pode orientar o estado com estratégias de atuação e viabilização das intervenções públicas. O recorte de tempo contemporâneo se estabelece com a finalidade de trabalhar com demandas atuais, e possibilidades de ofertas que possam potencializar a moradia 20
digna no centro de São Paulo para a população que já vive no território de forma precária e desamparada pelo Estado. Assim, a ideia não é propor novas estratégias de atuação ou negar as experiências passadas, mas sim trazer como referências as ações que subverteram ou tentam subverter a lógica do mercado imobiliário. Para isso, o foco das pesquisas se dá nas possibilidades desenvolvidas a partir do século XXI, mais especificamente após o desenvolvimento do Estatuto da Cidade em 2001. Esse trabalho busca destacar uma hipótese de processo, no qual os resultados obtidos não são soluções absolutas ao
território central. A ideia é desenvolver e explicitar uma metodologia que pode ser aplicada em diversas áreas, e que a partir disso, encontrará respostas e valores diferentes para a construção de propostas que se encaixem nas necessidades locais. A principal inquietação desse trabalho surgiu de um acontecimento local: o desabamento do edifício Wilton Paes, que expôs problemáticas bem maiores, de escala urbana. A partir disso, a escala das esferas de vida dos moradores das ocupações impulsionou as propostas de programas para o plano regional.
tratadas simultaneamente, de forma que a microescala do edifício alimente soluções para o distrito e estas, simultaneamente, proporcionem transformações na escala do lote. Dessa forma, o desenvolvimento do que se chamou de ‘planoprojeto’ se mostra como um método de intervenção multiescalas, que busca não carimbar tipologias, valores e usos, mas sim entender as características e necessidades do território, propondo intervenções urbanas mais específicas.
O recorte territorial é entendido como algo cíclico e não estático. Diferentes escalas são 21
2.2 QUAL É O TERRITÓRIO? O território primeiramente observado é o da região central, uma forma de analisar as ofertas e problemáticas do todo para que, posteriormente, apenas um dos distritos fosse escolhido para o desenvolvimento de uma proposta. Essa escolha de aproximação se deu, também, devido à diversidade dos distritos, de forma com que as soluções propostas para um não sejam, necessariamente, aplicadas para todos. Dessa forma, o que pode ser aplicado sem discriminação é a metodologia de atuação, mas não os resultados de sua aplicação em uma determinada área.
distritos: Bela Vista, Bom Retiro, Brás, Cambuci, Consolação, Liberdade, Pari, República, Santa Cecília e Sé, no entendimento de que estes compõem um território potencial da metrópole, com grande oferta de transporte público, intensa concentração de trabalho e equipamentos públicos. Além da infraestrutura, outro critério delimitador foi a grande concentração de ocupações e cortiços, que ressaltam questões de desigualdade social e revelam espaços potenciais de mudança, uma vez que a articulação dos movimentos pode estruturar e gerir grandes transformações urbanas.
A partir disso, definiuse o que é chamado aqui de ‘região central’ os 23
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Fonte:GeoSampa
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Fonte:GeoSampa
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Fonte:HabitaSampa
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2.3 QUEM O PLANO ATENDE?
28% ganha de 2 a 5 salários
36% possui ensino superior
68% possuem carteira assinada
3,3% vive com menos de 1 salário mínimo
A região central possui atualmente 514.631 pessoas, de acordo com dados do portal InfoCidades. A partir do cruzamento da pesquisa Origem Destino, 28% dessa população ganha de 2 a 5 salários, 36% com ensino superior completo e 68% assalariados com carteira assinada. Esse perfil de população compõe grande parte da população dos dez distritos abordados. Porém, ao mesmo tempo, 3,3% dessa população vive com menos de 1 salário mínimo, o que soma 6.448 famílias.
setembro de 2020 através da Secretaria de Habitação) sobre a população em auxílio aluguel na região central. Os dados são referentes aos parâmetros socioeconômicos registrados durante o cadastramento das famílias, e permitem traçar um perfil da população de baixa renda que mora irregularmente no Centro.
Esses dados podem ser ainda mais refinados quando observados do ponto de vista da habitação, traçando estimativas da população pobre da região central de acordo com os registros de ocupações e cortiços. Junto disso, o perfil socioeconômico pode ser traçado a partir das informações (recebidas em 31
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Fonte:SEHAB
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Sendo assim, estimase que, na verdade, 97.248 pessoas vivam em cortiços, ocupações ou foram removidas de suas casas na região central, o que totaliza mais de 34 mil famílias, considerando uma média de 2,79 pessoas por domicílio1. Nenhuma dessas famílias vive com mais de três salários mínimos e cerca de 58% destas sobrevivem com uma média de renda mensal de R$709,00, sendo nessa quantia somados benefícios como bolsa família e auxílio aluguel. 1. Dados do cadastramento municipal do auxílio aluguel (Anexo 1).
CERCA DE 6 EM CADA 10 FAMÍLIAS VIVEM COM RENDA MENSAL DE 709 REAIS
Dessa forma, uma família levaria mais de nove meses para conseguir adquirir 1m², considerando o valor do m² no distrito da república em R$6.674,83. Supondo que toda a renda mensal fosse utilizada para aquisição de terra, seriam necessários mais de 39 anos para uma família comprar um apartamento de 50m² no centro de São Paulo. O plano, portanto, se destina exatamente a essa população de baixa renda, que recebe de 0 a 3 salários mínimos e que, atualmente, mora em cortiços e ocupações ou passou por processos de remoção na região central. Essas famílias, em sua maioria, são compostas por mães solteiras que vivem com um filho, dividindo apenas um cômodo há mais de quatro anos. Menos de 0,5% da população possui acesso ao ensino superior. De acordo com os dados do auxílio aluguel, uma ocupação de 100 pessoas possui, em média, 41 crianças e adolescentes de 0 a 18 anos e 59 adultos e idosos. Quanto à atividade econômica, os dados dizem que em média 70 pessoas dessa ocupação exercem alguma atividade de trabalho. Dessa maneira, considerando um cenário onde todos os adultos e idosos
trabalham, ainda assim, 11 crianças exercem alguma atividade, ou seja, cerca de 26,8% das crianças e adolescentes contribuem na renda familiar.
2. Valor apresentado no índice FIPEZAP de 2017 (Anexo 2).
CERCA DE 11 EM CADA 41 CRIANÇAS EXERCEM ALGUMA ATIVIDADE DE TRABALHO
2.4 DE ONDE VEM A DEMANDA? A demanda vem de ocupações de terrenos e prédios, cortiços e famílias que se encontram em auxílio aluguel cadastradas em espaços no centro de São Paulo. As informações e dados vêm de observações, levantamentos e cadastros realizados pela Secretaria de Habitação na região central. Apesar da variação entre as informações, o número de pessoas em ocupações e cortiços contribui para traçar um panorama da situação atual da moradia no Centro. Dessa forma, os dados foram usados para construir estimativas da população que precisa de atendimento habitacional. Assim, o número estimado de famílias que estão em situação irregular 38
ou precária é de aproximadamente 34.410 na região central, sendo que 11.441 destas estão localizadas no distrito da República. A estimativa foi feita com base nas médias obtidas de famílias e pessoas que se encontram em ocupações de prédios, terrenos e cortiços3, além das que estão atualmente recebendo atendimento provisório. Estas últimas foram consideradas para a reconstrução das composições familiares, uma vez que estão em constante acompanhamento e atualização pela Secretaria de Habitação.
3. As informações utilizadas para o cálculo das médias são do portal HabitaSampa, sistema de dados habitacionais da SEHAB.
33,2% DAS FAMÍLIAS EM SITUAÇÃO IRREGULAR OU PRECÁRIA NA REGIÃO CENTRAL SE ENCONTRAM NO DISTRITO DA REPÚBLICA 39
2.4 QUAL A OFERTA PÚBLICA ATUAL? A oferta pública é tudo que está sendo ou pretendese viabilizar, ou seja, empreendimentos públicos que estão em construção ou possuem projeto. Para traçar essa oferta, as informações utilizadas são do Sistema de Provisão Habitacional (SPH) da Secretaria Municipal de Habitação, que tem por finalidade registrar esse tipo de recorte, separando a oferta nova da oferta de conjuntos habitacionais já ocupados.
4. A tabela com os empreendimentos está no Anexo 3.
Sendo assim, o SPH possui atualmente um registro de 56 empreendimentos na região central (31 no distrito da República). Acrescentando a esse número o novo empreendimento público proposto para o terreno do antigo Wilton Paes, o número total de unidades que o poder público está produzindo ou pretende produzir na região central é de 5.0434.
A partir da análise dos dados apresentados, é possível perceber o tamanho do problema habitacional existente na região central. Mesmo que todos os empreendimentos propostos para a área fossem entregues, o déficit habitacional continuaria sendo de 29.367 famílias, uma problemática que pode ser amenizada, principalmente, por meio de parcerias com os movimentos organizados, elementos importantes na composição do território abordado.
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Fonte:HabitaSampa
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3
A IMP DOS MO NA FOR DAS
PORTÂNCIA OVIMENTOS RMULAÇÃO S POLÍTICAS PÚBLICAS
A defesa do uso da propriedade e de medidas de planejamento como os planos diretores e conselhos de habitação são instrumentos que foram criados junto com a Constituição Federal de 1988. Porém, até o início dos anos 2000, essas ferramentas apresentavam uma grande brecha nos municípios brasileiros, sendo pouco aplicadas mesmo com a obrigatoriedade de seu desenvolvimento (FERNANDES, 2008). Antes disso, a participação popular nas políticas habitacionais era construída de forma extra-oficial por meio de coletivos e movimentos que ganharam força após a ditadura militar. Conforme ressaltou Evaniza Rodrigues em entrevista5: “eu cheguei nas ocupações de 87, 88, quando você tinha uma grande mobilização na periferia de São Paulo ocupando terra, isso foi no final 46
da ditadura, início do período democrático, então você tem uma efervescência grande de ações de ocupação de terra, especialmente nas periferias, na zona leste um grande espaço disso.”
Nesse momento, a luta pelas pautas urbanas surge junto com a conquista da terra e da casa. Ainda sem um espaço estabelecido na política, os movimentos começam a requerer seus direitos por infraestrutura urbana de todos os tipos: saneamento básico, energia elétrica, equipamentos públicos, transporte, entre outros. De acordo com Evaniza: “Então, eu acho que um componente importante, e eu sempre falo disso desde o processo da constituição, que foi resgatar a pauta urbana, porque com a ditadura você interrompeu toda uma discussão que já vinha avançando sobre a discussão das cidades
5. Entrevista dada ao autor no dia 26 de fevereiro de 2020, a transcrição completa se encontra no anexo 4.
e durante a ditadura a urbanização se acelera de uma maneira incrível. Então é claro que as primeiras mobilizações são pra responder questões muito imediatas, água, luz, posto de saúde, saneamento básico, colocar saneamento na favela, eram coisas muito concretas. Aí você teve em outras áreas que não só a questão mais de desenvolvimento urbano, mas do aumento das creches, postos de saúde (...). Pra quem tem casa talvez seja muito mais fácil olhar a cidade, porque você fala assim “ah esse lugar onde eu estou não é bom por isso, não é bom por aquilo, falta isso, falta aquilo”, quando você não tem casa você não sabe pra onde você vai, você pode ir pra qualquer lugar, ou seja, o primeiro lugar é de você se localizar e a partir daí você olha o entorno”
Vale ressaltar que grande parte dessas pautas começaram a ser defendidas por mulheres, que estão,
desde o início, à frente das lutas sociais e, atualmente, ganham cada vez mais espaço na gestão e organização dos movimentos de luta por moradia. De acordo com Evaniza: “As mulheres do movimento popular entraram na primeira reunião que ela participou na vida dela, foi por uma coisa muito concreta, [por exemplo] pela creche do filho, pelo posto de saúde. E ao longo do tempo o que a gente foi vendo foi essas mulheres assumindo o papel de liderança, assumindo o papel de condução dos processos, e tendo uma empatia melhor. Ela consegue falar melhor com outras mulheres, e como tem mais mulheres no meio, ela fala melhor.”
A participação efetiva da população nas pautas políticas passou a existir junto com o Estatuto da Cidade, em 2001, principalmente por meio dos movimentos sociais 47
e coletivos organizados. Dessa forma, estes grupos conseguem minimamente impactar na formulação ou revisão das políticas públicas, tendo como destaque a paralisação da revisão do PDE de São Paulo, em 2007, na intenção de barrar a redução de áreas de ZEIS (Zonas Especiais de Interesse Social) entre outros dispositivos que afetavam o acesso à moradia (FERNANDES, 2008). Com isso, programas habitacionais começam a surgir no cenário da participação popular. Um exemplo é o PAR (Programa de Arrendamento Residencial), desenvolvido pela Caixa Econômica Federal. O intuito do programa era ajudar municípios e estados a atenderem à necessidade de moradia da população com renda de até R$1.800,00, residentes em centros urbanos. 48
Na escala municipal, o impacto da nova participação se deu por meio do programa Morar no Centro, durante 2001 e 2004, que buscava a revitalização do centro histórico de São Paulo por meio da ocupação de imóveis ociosos e terrenos subutilizados por estacionamentos. Da mesma forma que o novo cenário abriu oportunidades e criou novos instrumentos de intervenção urbana favoráveis aos movimentos, o mercado conseguiu se apropriar de grande parte delas até hoje. Mesmo que indiretamente, o poder público abre possibilidades de comercialização da terra e da propriedade, que se constroem como impasses legais do acesso à moradia digna. Conforme Evaniza: “(...) essa disputa pelo espaço, ela acontece na cidade toda, em todo lugar que tem dinâmica de mercado.
Então essa dinâmica pode ser incentivada ou favorecida pelo próprio poder público, pelas políticas públicas, e muitas vezes são. Então o poder público meio que subsidiando esse mercado, dando mais condições desse mercado lucrar mais e da mercadoria moradia, mercadoria habitação, ficar cada vez mais cara.”
Ainda assim, o Estatuto da Cidade, principal instrumento que permitiu a participação social e coletiva dos movimentos na formulação das políticas públicas urbanas, permanece em grande parte inaplicado, colocando a participação legal dos movimentos como algo muito recente (de menos de 20 anos). De acordo com Evaniza: “Eu acho que o problema é que o estatuto da cidade em si, ele não faz nada, ele é uma ferramenta, e é uma ferramenta que pouca gente tem coragem de usar, porque ele acaba sendo uma
ferramenta com uma grande carga ideológica. Então vamos lembrar que todas as vezes que se aplicou qualquer instrumento que avança sobre a propriedade privada você teve imediatamente uma reação.”
Essa luta pode ser entendida, como trata Pádua Fernandes (2008), como um pluralismo paradoxal. Esse paradoxo se constrói uma vez que, para lutar a favor do cumprimento de direitos básicos e constitucionais os movimentos só conseguem ganhar força e lugar de fala através da ilegalidade, ocupando edifícios e terrenos vazios no Centro como forma de exigir do Estado o cumprimento da função social da terra. De baixo para cima, é preciso violar o Direito para tentar que ele seja cumprido - as ocupações (e isso as distinguiria, segundo os movimentos sociais, de simples invasões) seriam 49
o instrumento, embora formalmente ilícito, de dar efetividade ao Direito: a própria legalidade precisa ser construída de forma ilegal (FERNANDES, 2008, p. 11).
Da mesma forma, o Estado como agente responsável pelos direitos básicos, e as autoridades como agentes principais no cumprimento das normas, defendem posicionamentos contrários às necessidades da população. Essa forma de agir, de cima para baixo, tem muito fundamento nas origens da formação do Estado no Brasil, que sempre pertenceu e defendeu os interesses da elite. Assim, o Estado, como agente que fornece os instrumentos urbanísticos atuando por meio da legalidade, acaba produzindo a própria ilegalidade (FERNANDES, 2008). De cima para baixo, temos, ao contrário, a 50
recusa à efetividade do direito constitucional, bem como a violação pura e simples da legislação infraconstitucional e de tratados internacionais sobre direitos sociais pelas autoridades públicas - a produção legal da ilegalidade (FERNANDES, 2008, p. 11).
Pode-se entender, assim, que o acesso formal à habitação nunca se destinou à população marginalizada, nem no sentido do mercado privado, nem da produção viabilizada pelos programas habitacionais públicos (FERNANDES, 2008). Tudo isso, em conjunto com a frágil participação popular no campo da política, ressalta a dificuldade do acesso à moradia central, reiterando a necessidade dos movimentos como agentes importantes na construção e defesa de instrumentos e do planejamento feito de baixo para cima. Com base nisso, o movimento trouxe e vem trazendo
6. As respostas da entrevista se encontram no anexo 5.
muitas inovações no campo das políticas urbanas. As demarcações de ZEIS previstas no Plano Diretor são um exemplo disso, ou a destinação de parte da outorga onerosa municipal para a produção habitacional e regularização. Além disso, pautas como a garantia do acesso feminino a unidades de programas habitacionais também vêm sendo requisitadas pelos movimentos. O movimento vem construindo espaços inovadores do ponto de vista da organização, gestão e equidade. Isso pode ser visto na ocupação 9 de julho, por exemplo, que se tornou um equipamento para a cidade, além de coordenar propostas como a Parceria Público Popular (PPPop), um instrumento de vanguarda que surge, principalmente movido pela força feminina, em contraposição às parcerias públicoprivadas (instrumentos
legais de capitalização e privatização). Em entrevista6, uma das autoras da proposta da PPPop, Luciana Bedeschi, diz que apesar dos limites “burocráticos e orçamentários” para a implantação de uma nova política, o papel feminino abre muitos caminhos para o desenvolvimento de novas propostas devido à “capacitação das mulheres na articulação com o poder público”. Outra experiência de gestão positiva é a do Hotel Cambridge, ocupação liderada por uma figura feminina e que conquistou um espaço antes sem função social, que agora passa por um processo de retrofit para moradia definitiva das famílias. Nesse contexto, o movimento se desenvolve cada vez mais através da participação das mulheres, propondo e articulando soluções urbanas importantes e inovadoras. 51
(MULHERES DA UNIÃO EM LUTA!, 2020, p. 19)
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DINÂ DO D DA R
ÂMICAS DISTRITO REPÚBLICA
O distrito da República possui, atualmente, 33,2% das famílias moradoras de cortiços e ocupações da região central, sendo as outras 66,8% divididas entre os nove distritos do recorte. Esse percentual equivale a uma estimativa de 11.441 núcleos familiares no distrito que não possuem condições financeiras de habitar legalmente o território do Centro. 56
Ao mesmo tempo, o distrito recebe 56% das intervenções habitacionais públicas da região, que somam 2.826 unidades em prospecção ou projeto atualmente. Essa oferta, ainda que totalmente executada, não supre a demanda existente, deixando um déficit de atendimentos de 75,2% ou 8.615 famílias.
Fonte:HabitaSampa
Fonte:HabitaSampa
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7. Média realizada com base nos dados de cadastramento de auxílio aluguel referente às áreas do distrito da república (Anexo 1).
Para além do problema quantitativo, destacamse, ainda, as dificuldades de acesso das famílias devido à renda mensal (em média R$807,567), situação informal de trabalho e comprovação de renda e a metodologia de vinculação da Secretaria de Habitação, que não considera, necessariamente, o local habitado para o atendimento da demanda, mas sim o tempo de espera na lista de atendimento, em grande parte dos casos. Somado a isso, o aumento desenfreado dos aluguéis e do preço da terra, principalmente em áreas centrais, dificultam ou impossibilitam cada vez mais o acesso à moradia. Como afirma Raquel Rolnik em entrevista a Castor (2018), “A história da moradia da população mais pobre e vulnerável na cidade de São Paulo é a história da transitoriedade permanente e deslocamentos sem parar”.
Essa dificuldade de permanecer em um local está intrinsecamente ligada ao alto custo dos aluguéis e a instabilidade financeira da população de baixa renda. Dessa forma, após repetidas mudanças, várias pessoas acabam buscando abrigo nas ocupações (CASTOR, 2018). Por vezes, as ocupações passam por processos de reintegração de posse, o que insere as famílias no cadastramento habitacional para que recebam atendimento habitacional provisório, conhecido como auxílio aluguel, no valor de R$400,00 mensais. Como o valor do auxílio não subsidia um aluguel na região central, a resposta imediata é a formação de novas ocupações em prédios vazios ou subutilizados (CASTOR, 2018).
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5
O PRO COMO OBSER
OJETO O POTÊNCIA RVADORA
5.1 INTRODUÇÃO Os grandes planos e projetos de intervenções modernas vêm produzindo cidades genéricas8, com paisagens replicáveis que perdem o contato com a escala da vida e proporcionam espaços sem memória e afeto. A partir disso, o projeto como uma potência observadora é aquele que parte das pessoas e da observação da vida cotidiana para o desenvolvimento de seu programa e concepção. Dessa forma, a arquitetura se estabelece como uma ferramenta de suporte ao urbanismo, 62
proporcionando novas leituras e intervenções urbanas, contrapondo a homogeneidade por vezes atribuída ao planejamento da macroescala. Aqui o projeto é usado como ferramenta que subverte as lógicas dos grandes planos, os quais buscam resolver problemas quantitativos, carimbando soluções no território. A observação das esferas da vida em pequena escala pode orientar intervenções urbanas e políticas maiores, potencializando as possibilidades de transformação dos espaços.
8. Termo construído por Rem Koolhaas no texto "Generic City", integrante do livro "S, M, L, XL". A cidade genérica possui vários aspectos, sendo os principais a ausência de identidade, a homogeneização e replicação das intervenções.
5.2 1º DE MAIO DE 2018 O incêndio no Edifício Wilton Paes, na região central, aconteceu durante a madrugada, fazendo com que pouco mais de uma hora depois a estrutura cedesse e viesse ao chão. Em meio ao incidente, e como solução imediata, as vítimas montaram acampamento no Largo do Paissandu, onde a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS) criou um posto de atendimento para encaminhar a população para abrigos e realizar o cadastramento habitacional dos atingidos pelo desastre (DELFIM, 2018).
Foram cadastradas, inicialmente, 142 famílias no dia do incêndio, porém durante o cadastramento realizado pela Secretaria Municipal de Habitação (SEHAB), nos dias seguintes, mais famílias tiveram seu vínculo à ocupação comprovado. A partir disso, 267 famílias passaram a receber atendimento provisório de moradia (auxílio aluguel) que foi fornecido pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) durante o período de um ano, até que o atendimento migrasse para a Prefeitura Municipal (HABITAÇÃO, 2020). 63
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Mais de um ano e meio após o acidente, em dezembro de 2019, foi anunciada uma parceria entre a União proprietária do lote - e a Prefeitura Municipal, em acordo para construção de um empreendimento habitacional no terreno. Ainda em dezembro, a prefeitura, através da SEHAB, deu abertura a um processo que declarou o interesse municipal no terreno, bem como a apresentação, em janeiro
de 2020, de um projeto de habitação desenvolvido em parceria com o escritório Chá Arquitetura. A gestão municipal esclareceu que as unidades seriam destinadas, preferencialmente, aos antigos moradores do edifício, medida que foi revogada posteriormente por não condizer com a atual metodologia de atendimento da Secretaria de Habitação.
Famílias acampadas no Largo do Paissandu (Maio de 2018) Fonte: Rovena Rosa/ Agência Brasil
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O projeto, desenvolvido e apresentado pelo município, prevê um térreo comercial com cinco lojas de aproximadamente 20m² e 90 unidades habitacionais de 1 dormitório, com aproximadamente 40m², distribuídas em 15 andares. A conclusão do empreendimento está prevista para 2022 (RODRIGUES, 2020), sendo um dos empreendimentos de Locação Social que a gestão pretende viabilizar por meio do novo programa Pode Entrar (SP, 2020).
Apesar de anunciar uma forma de acesso diferenciada, o projeto ainda não atende à demanda dos núcleos familiares das ocupações, nem mesmo a demanda das famílias em auxílio aluguel cadastradas na região central, que possuem, em média, 3 pessoas em sua composição. Mesmo que as unidades atendessem a esse critério, faltariam 128 unidades para contemplar a mesma quantidade de famílias que habitavam o edifício Wilton Paes.
Proposta do novo edifício Fonte: Caderno de projeto WPA (Sehab)
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SERIAM NECESSÁRIOS 2,42 PRÉDIOS PARA ATENDER A MESMA DEMANDA DO EDIFÍCIO WILTON PAES 68
5.3 MACRO INTERVENÇÕES E AS ESFERAS DE VIDA A partir do entendimento do projeto proposto pelo poder público e da tentativa de contrapor a lógica atual do mercado, nasce um projeto piloto, que se opõe aos processos atuais, buscando experimentar e transcrever no território uma metodologia que desconstrua a ideia genérica vinculada aos grandes planos urbanos e projetos habitacionais. O levantamento do perfil socioeconômico vinculado a outros experimentos de uso do espaço, produz uma intervenção única para cada área abordada no plano urbano. A partir disso, pode-se apontar algumas características que potencializam o uso do território e transformam a ocupação coletiva em um cenário de troca de experiências.
A construção de condomínios menores e com tipologias variadas, por exemplo, adequa os espaços para receber diversas composições de núcleos familiares e facilitam a gestão ou autogestão condominial. O uso comum dos térreos e dos tetos possibilita novas formas de articulação da vida pública através de conexões pelo céu ou pela terra, seja em terraços compartilhados ou conexões com praças e parques próximos. Tudo isso margeado por um sistema de infraestrutura de qualidade, com calçadas adequadas e ciclovias que estimulem o deslocamento sustentável ou a intermodalidade de transportes (HERLING, 2018).
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POSSIBILIDADE DE DESVINCULAÇÃO DE PARTE DO NÚCLEO TERRITÓRIO Da mesma forma, buscase dimensionar maneiras de acesso e vínculo habitacional que estejam intrínsecas ao território, e não necessariamente à unidade habitacional em si. O objetivo é proporcionar outras possibilidades de se fixar na área central, sem que a unidade restrinja mudanças de vida por parte dos moradores, evitando que os apartamentos sejam 72
POSSIBILIDADE DE MIGRAR DENTRO DO TERRITÓRIO vendidos devido a fatores como a gentrificação, e o plano perca a potência de transformação. Uma família pode, por exemplo, morar por meio do auxílio aluguel em um empreendimento em uma certa localização e, com o surgimento de oportunidades em outros locais do distrito, a família poderia se mudar sem perder o vínculo com o plano, o
mesmo valeria para as unidades comerciais. Da mesma forma, se uma família decidir se dividir, e parte do núcleo sair do território, a parte que permanecer pode ter a possibilidade de continuar, criando vínculos geracionais a longo prazo, naturalizando a existência digna e legal da população pobre em áreas centrais. 73
ESTAR Além das formas de ocupação, as disputas com o mercado também precisam ser pensadas para garantir que as pessoas possam se manter nesse território, cada vez mais gentrificado. Como contraproposta à lógica do capital, a sugestão é criar um ecossistema para a vida no Centro que considere as diversas esferas de vida: moradia, trabalho e lazer. Da mesma forma, buscase subverter, através do projeto, o entendimento dessa tríade, transformando essas necessidades em experiências coletivas, as quais já vêm sendo colocadas em prática dentro dos espaços das ocupações. Nascem assim os conceitos de ‘estar, movimentar e comemorar’.
Estar pode ser permanecer ou mudar. É ter ou apresentar uma condição não permanente, encontrar-se em certo lugar. Nesse sentido, o morar não precisa ser algo imutável, mas sim confortável, que independe de lugar para ser um lar. Garantindo acessos variados à habitação para a população de baixa renda, em que o vínculo de moradia não precise estar fixo à unidade, mas sim ao território. Assim, o morador tem a liberdade de migrar pelos espaços do plano, de forma com que ele não fique preso à unidade, vínculo gerado atualmente pelo atendimento definitivo. Isso permite que a comunidade crie raízes no espaço permeado pela infraestrutura a partir das suas necessidades momentâneas.
MOVIMENTAR
COMEMORAR
Do movimento nasce a criação, a revolução. Diferente do conceito de trabalho como instrumento de fadiga, tortura ou dor, o movimento é dinâmico e animado, coloca algo em ação.
Celebrar e festejar em comunidade. Tornar o espaço público um espaço de todos, e não de ninguém. Valorizando, junto do estar e do movimentar, o espaço do ócio, da recreação sem objetivos, a partir de locais públicos e conjuntos de memória e afeto que estimulem as manifestações artísticas, culturais e políticas.
Vem no sentido de desconstruir as relações de trabalho capitalistas e gerar, a partir dos programas propostos, um polo de economia comunitária e local, que funcione como subsídio à vida da população inserida na comunidade.
5.4 ESTRATÉGIA PARA A ESCALA D
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DO EDIFÍCIO E O PROJETO PILOTO
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O Wilton Paes de Almeida é, então, um recorte do plano, que ressalta a necessidade de que os programas e os conceitos vinculados ao espaço sejam intrínsecos à população que o ocupava. Dessa forma, é possível criar possibilidades para que essas pessoas possam retomar dignamente a vida cotidiana, que foi interrompida pelo incêndio. A partir do perfil socioeconômico da população e dos dados do cadastramento municipal, é possível reconstruir uma hipótese dos núcleos familiares que moravam no edifício.
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A partir disso, o atendimento da demanda se consolida no terreno a frente do antigo edifício, onde atualmente se encontram 3 ocupações (situação atual). Dessa forma, pwara o lote do Wilton Paes seria proposta a implantação de um memorial, marcando no tecido urbano a história do acidente e a necessidade de se pensar uma política habitacional que atenda às demandas específicas de cada território e cada população. É necessário então uma proposta de ocupação que considere as especificidades do lote. Para isso, o conceito do volume do edifício considera as ocupações existentes, evitando a
remoção dessas famílias em primeiro momento. Essa intenção de projeto, assim como a proposta do memorial, marca a história da cidade na arquitetura, mantendo mesmo que indiretamente camadas de memórias no tecido urbano. Com o desenvolvimento e a consolidação de outras intervenções do plano, é possível traçar um cenário de pós-ocupação onde as famílias presentes nas 3 ocupações restantes poderão ser atendidas em outros empreendimentos, de forma com que essas construções possam ser demolidas abrindo espaço para uma nova praça e enfatizando os conceitos propostos para o plano.
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A partir do conceito pensado para o edifício e das possibilidades de ocupação coletiva dos espaços, surge então uma proposta de volume mais exata, com um programa de usos que considera as esferas de vida e as ideias construídas anteriormente. Propõe-se então espaços coletivos de cozinhas, reuniões de moradores, creche, comércio e locais de ensino como bibliotecas e salas de aula. Para o desenvolvimento do projeto também foram consideradas tipologias variadas, que atendessem os diversos núcleos familiares reconstituídos. Dessa forma a maioria das tipologias são pensadas de forma coletiva, onde mais de um núcleo familiar pode dividir os espaços de estar e as áreas molhadas, fazendo com que a demanda pudesse ser atendida completamente em ambientes salubres e confortáveis. 90
Além das tipologias, o prédio foi estruturado a partir de grandes áreas públicas e coletivas para uso dos moradores e do movimento de moradia. Para isso, oito eixos são propostos e distribuídos ao longo do edifício: I) Compartilhar: proposta de uma biblioteca pública que possa abrigar atividades de troca de conhecimento, estudo das crianças e adolescentes, cursos de idiomas para moradores estrangeiros e eventos culturais que podem acontecer com o suporte da praça central. II) Educação: implantação de uma creche para as famílias do edifício que possa garantir o desenvolvimento seguro das crianças, tendo em vista o grande número de mães e pais solteiros que precisam de um local para deixar os filhos durante o horário de trabalho. Assim como a biblioteca, a creche também se conecta com a
praça, de forma com que o espaço público se torne o pátio das crianças, além de abrigar eventos como festas juninas ou gincanas. III) Família: proposta de uma espaço para reuniões menores entre os moradores, com suporte de piscina, mesas e cozinha coletiva, para abrigar eventos como churrascos, festas de aniversário, almoços de domingo e etc. IV) Bem-estar e saúde: proposta de academia e espaço para exercícios externos, onde podem acontecer atividades coletivas para os moradores, como aulas de dança, zumba, funcional, yoga e etc. V) Descanso: implantação de um solário, com ducha, redes, mesas e bancos. É um espaço destinado principalmente à terceira idade, onde pode-se descansar, tomar sol e bater papo.
VI) Brincadeira e cultura: proposta de um amplo terraço aberto para as crianças e adolescentes, onde podem acontecer apresentações de teatro e exibição de filmes ao ar livre. O espaço também possui alguns brinquedos fixos, bancos, e uma extensa área de laje que pode servir como um pipário. VII) Educação e alimentação: criação de uma horta coletiva que pode abrigar, por exemplo, atividades educativas para as crianças da creche ou cursos do MST sobre educação alimentar e plantio de orgânicos. VIII) Encontro: proposta de um grande salão de eventos que pode sediar eventos do movimento de moradia, palestras, reuniões de moradores e grandes festas.
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implantação
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corte AA
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O PLANO POTÊNCI TRANSFO
O COMO IA ORMADORA
É necessária a compreensão de que o projeto apresentado anteriormente não é uma receita pronta. O desenvolvimento do projeto para as famílias do edifício Wilton Paes foi um experimento, uma possibilidade de aproximação das famílias e das dinâmicas de vida na escala do lote. Essa observação é um suporte ao desenvolvimento do plano, uma maneira encontrada para testar aspectos propostos para a escala urbana, evitando propor, indiscriminadamente, características e
intervenções genéricas do ponto de vista do atendimento das demandas de vida da população que o plano busca atender. A partir da estruturação das estratégias de atuação apresentadas acima, o próximo passo foi observar mais de perto as dinâmicas da República. Para isso, é necessário entender que, apesar de compor um único distrito, a área possui uma diversidade de dinâmicas de vida e, ao mesmo tempo, barreiras, sendo estas últimas limitadoras de acontecimentos e características urbanas. 129
Assim, duas grandes fronteiras urbanas foram entendidas como determinantes do espaço, a Avenida São João e a Avenida Nove de Julho, ambas infraestruturas que cercam ou marcam na cidade espaços distintos. “Pra cima da São João” ou “próximo a Nove de Julho” são frases cotidianamente usadas para traçar referências não só de localização, mas de segurança pública, caminhabilidade, disponibilidade de serviços, entre outros fatores. 132
Tendo como base essas grandes avenidas, e utilizando critérios como experiências urbanas individuais, concentração de usos, preço base dos terrenos, entre outros, foi possível traçar, ao todo, oito territórios dentro do distrito da República. Da mesma forma, foi possível elencar características predominantes desses locais, usadas como critérios para a construção de programas menos genéricos para os espaços da cidade.
Para a estruturação de um programa de usos e atividades para cada território, foi utilizada a metodologia do placemaking9, que busca propor, através das potencialidades, necessidades e características de cada local duas frentes de intervenção: os aportes físicos e de infraestrutura
(ou hardwares) e os aportes de programas de usos e atividades possíveis (ou softwares). O desenvolvimento do programa de usos também foi baseado nas três esferas de vidas compreendidas na etapa do projeto: estar, movimentar e comemorar.
PLACE MAKING • bares • restaurantes • casas de show • teatros • apoios ao comércio de rua • hostels • praças • coberturas • iluminação pública • bebedouros • banheiros • pontos de wi-fi • mobiliário urbano • arborização • bicicletários • palcos • deques • balizadores • ruas peatonais • mercados de orgânicos • lojas • cozinhas coletivas • creches 136
• batalhas de rima • festas • rodas de leitura • shows • saraus • encontros políticos • cinema ao ar livre • festivais de música • espetáculos de dança • apresentações de teatro • feiras de artesanato • feiras gastronômicas • feiras de orgânicos • cursos profissionalizantes • aulas de circo • aulas de dança • aulas de yoga • formação de lideranças • cursos de economia doméstica • gincanas • competições esportivas
9. Placemaking é um processo de planejamento para formação e gestão de espaços públicos, estimulando a interação entre as pessoas, criando lugares mais agradáveis e atrativos para a comunidade.
Para o desenvolvimento da estratégia apresentada, alguns recortes foram feitos para elencar quais os espaços/lotes são possíveis de receber as intervenções propostas: I) as propriedades públicas, entendendo essas em terrenos, prédios, garagens e outros espaços que já pertencem ao poder público, mas estão subutilizados ou não representam um potencial de uso da região central.
10. Dado extraído do índice FIPEZAP de 2017 (Anexo 2).
Esses espaços foram selecionados no entendimento de que a aquisição de espaços na região central é um dos aspectos mais caros para a produção habitacional, tendo em vista, por exemplo, que o preço do metro quadrado no distrito da república é 55% mais caro que o de Itaquera10, dessa forma, utilizar as propriedades públicas facilitaria o desenvolvimento do plano a curto prazo.
Contudo, para que o desenvolvimento dos empreendimentos e equipamentos iniciais permeie de maneira adequada o território, é necessário antes um levantamento técnico e socioeconômico das ocupações no centro. Dessa forma, é possível obter as informações para construção do perfil das famílias que cada prédio vai receber, evitando que, com a continuidade do plano, esses locais percam a potência da ocupação inicial. II) as ocupações, que podem ser percebidas do ponto de vista dos prédios e terrenos ocupados e dos cortiços, ou seja, espaços com uma lógica de organização pautada em movimentos sociais de luta por moradia. Dialogar com essa população se torna mais fácil partindo do entendimento que do contato entre os movimentos e o Estado surjam parcerias. 137
Essa segunda fase parte do princípio de que os empreendimentos em propriedades públicas (I) já estariam viabilizados, de forma com que a população das ocupações e cortiços não precisassem entrar em medidas de atendimento provisório, mas já tivessem um espaço para estar. Os terrenos ocupados se tornam espaços potenciais de transformação e proposição, onde os edifícios podem passar por processo de retrofit para voltar a receber a população que ali ocupava ou então atender uma nova demanda. Durante essa fase, as informações técnicas das ocupações (obtidas no censo inicial) permitirão classificar a situação dessas propriedades, deixando claro as possibilidades de adaptação desses prédios, e a possibilidade de 138
reformas menos estruturais em alguns, evitando a desapropriação total do prédio para que o retrofit aconteça. Nesse cenário, a aquisição da terra pode ser feita por meio do usucapião coletivo, citado em 1988 na Constituição Federal e com diretrizes estabelecidas no Estatuto da Cidade, em 2001. A prática foi revista em 2017 junto com a revisão da lei de regularização; a partir daí os prérequisitos foram alterados, sendo eles agora: (i) presença de núcleos urbanos informais; (ii) posse ininterrupta e sem oposição por cinco anos; (iii) posse sobre unidade habitacional ou comercial, por cada titular, inferior a duzentos e cinquenta metros quadrados; (iv) inexistência de propriedade de outro imóvel urbano ou rural. Outra solução que pode ser aplicada nesse caso
é a REURB-S, também alterada na revisão da lei de regularização em 2017, e que possibilita a transferência de imóveis públicos para particulares. A alteração da lei permite que prédios ocupados por movimentos de moradia solicitem, junto ao Ministério Público, o início do processo de regularização que, após aprovado, atribui as responsabilidades e apoio necessários ao poder público (SAMPAIO; CAMPOS, 2019). Além disso, atualmente, um novo mecanismo em desenvolvimento é a Parceria Público Popular (PPPop), uma alternativa às parcerias públicoprivadas que vêm sendo desenvolvidas pelo Estado. A proposta é de que o poder público inicie parcerias com os movimentos sociais, ao invés de ceder a gestão e propriedade para o mercado privado. Com isso, os movimentos
sociais e associações ficam responsáveis legalmente pela gestão do empreendimento, administração e manutenção física dos condomínios. O investimento nesses casos seria o de reforma e adequação dos edifícios, melhorando a segurança do prédio. Em entrevista, Luciana Bedeschi, uma das autoras da proposta, diz que o objetivo da PPPop não é eliminar a demanda habitacional existente, mas sim amparar novas formas de atendimento. “Creio que a PPPop tem como objetivo suprir parte da demanda habitacional e abrir novos meios para a política. Não creio que supre [totalmente] porque o déficit é enorme, mas a PPPop pode ser mais uma opção de atendimento. Sobretudo para ocupações organizadas e consolidadas.” 139
III) os espaços notificados pelo instrumento da PEUC ou áreas subutilizadas, entram como ações a serem pautadas na terceira fase do plano. São locais que envolvem a aquisição da terra pelo poder público, ou seja, intervenções caras visto que o metro quadrado no distrito da República custa em torno de R$6.674,8311.
sua desapropriação feita com pagamento em títulos da dívida pública, medida que já pode ser aplicada, visto que o instrumento formaliza um prazo de seis anos para o proprietário apresentar uso do imóvel. A partir de 2020 esse prazo passa a ser viável, uma vez que a prática das notificações tiveram início no PDE de 2014.
Dessa forma, pode-se pensar em outras formas de utilização desses espaços, parcerias entre os proprietários e o poder público através de incentivos provenientes da Operação Urbana Centro ou termos de compromisso e concessão da terra por determinados períodos de tempo. Além disso, o município pode incentivar propostas de dação em pagamento, em troca da redução ou quitação de grandes dívidas de IPTU.
Caso seja inviável a utilização de instrumentos ou a promoção de parcerias, o município pode adquirir o terreno ou prédio com dinheiro dos fundos públicos ou do tesouro. O FUNDURB, por exemplo, tem 30% de seus recursos destinados à aquisição de terrenos em alguns perímetros de intervenção urbana, dentre eles a Macroárea de Estruturação Metropolitana, a qual abrange todo o distrito da República.
Os espaços notificados pela PEUC também podem ter 140
11. Valor apresentado no índice FIPEZAP de 2017 (Anexo 2).
Além disso, foi necessário definir alguns filtros qualitativos para esses terrenos, de forma que as possibilidades de implantação resultem em um edifício com qualidade espacial e conforto arquitetônico para as famílias ocuparem. Para isso, dois critérios foram traçados para a definição das possibilidades de uso dos terrenos: I) Área dos terrenos: terrenos individuais maiores que 250m² ou terrenos que, quando aglutinados, resultem em uma área maior que 250m² podem receber intervenções de uso habitacional; os terrenos menores são, então, locais potenciais para o desenvolvimento das outras esferas trabalhadas no plano, como Movimentar e Comemorar.
com 250m² ou mais, também deverão ter seus usos destinados ao Movimentar e ao Comemorar; assim, os terrenos individuais ou terrenos que, quando aglutinados, somem 8m ou mais de fachada, poderão receber intervenções de uso da esfera do Estar. A definição de critérios de uso, o entendimento das dinâmicas urbanas em cada território, bem como os hardwares e softwares, permitiram que fossem atribuídos pesos às intervenções das esferas do movimentar e comemorar. Já para a esfera do estar, a estratégia é que ela seja aplicada a todos os terrenos possíveis de recebê-la. Dessa forma foi possível chegar em cenários mais completos de cada território.
II) Largura da fachada: os terrenos com menos de 8m de fachada, mesmo aqueles 143
O POTENCIAL CONSTRUTIVO DO PLANO PROPOSTO EQUIVALE A MAIS DE 17 PRAÇAS DA REPÚBLICA
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POSSI PARA HABIT NO CE
IBILIDADES A POLÍTICA TACIONAL ENTRO
Este capítulo busca apresentar, de forma objetiva, diferentes instrumentos legais, e a revisão de alguns destes, como possibilidades de acesso à terra e à moradia pública. Dessa forma, não foram destacadas todas as possibilidades de acesso disponíveis atualmente, mas apenas aquelas que dialogam com as propostas do plano desenvolvido e com a realidade dos movimentos de luta por moradia.
O principal mote é apresentar métodos ainda pouco praticados ou experiências que não necessariamente estejam vinculadas à aquisição da terra ou das unidades habitacionais. Atualmente as questões legais e financeiras para compra de terrenos e imóveis privados pela população pobre, na região central, é uma grande barreira para o atendimento habitacional.
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7.1 INSTRUMENTOS DE AQUISIÇÃO DE PRÉDIOS E TERRENOS AQUISIÇÃO PELO ESTADO Dação em pagamento A dação em pagamento é um acordo feito entre credor e devedor, em que o credor concorda em receber do devedor um pagamento diferente do que é devido. A dação em pagamento é uma espécie de substituição. Em vez de receber o dinheiro devido, o credor concorda em receber um outro bem material, podendo ser um imóvel, um terreno, por exemplo. 166
Aquisição com Títulos da dívida pública Aquisição com títulos da dívida pública são aquisições de prédio ou terrenos pagos com títulos de dívida emitidos pelo Governo Federal através do tesouro direto.
Desapropriação Desapropriação é o ato pelo qual o Poder Público, mediante aviso prévio e indenização, em razão de uma necessidade ou utilidade pública, ou ainda diante do interesse social, retira alguém de sua propriedade e a toma para si.
DESTINAÇÃO PARA AS FAMÍLIAS CDRU A Concessão de Direito Real de Uso (CDRU) é um direito previsto na legislação nacional, instrumentalizado por meio de um contrato; trata-se do direito real sobre bem público ou privado, em que o bem é destinado à utilização privativa, devendo sua utilização se enquadrar nas hipóteses estabelecidas pela legislação.
Usucapião coletivo Usucapião coletivo é um instrumento regulamentado pelo Estatuto da Cidade, no qual as áreas urbanas com mais de duzentos e cinquenta metros quadrados, ocupadas por uma população de baixa renda para moradia (por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição) onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada família, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os integrantes não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.
Propriedade coletiva A propriedade coletiva é uma forma jurídica de propriedade que privilegia a propriedade coletiva em vez da propriedade individual, como uma concessão de uso coletivo. Em todo caso, ela não é uma concessão de uso tradicional, pois a propriedade não é pública ou privada, mas coletiva. Nesse caso, a gestão do território é feita por uma associação de moradores ou cooperativa. Exemplos dessa prática podem ser vistos em duas cooperativas do Rio de Janeiro, Herbert de Souza e Shangrilá, que adquiriram e gerem coletivamente a área da comunidade.
Reurb-s Instrumento que possibilita a transferência de imóveis públicos para particulares, de forma que os movimentos de moradia solicitem junto ao Ministério Público o início do processo de regularização dos prédios que ocupam, o qual após aprovado atribui as responsabilidades e apoio necessários ao poder público. 167
7.2 PROGRAMAS DE ACESSO E POSSIBILIDADES DE GESTÃO As possibilidades de acesso são as formas de vínculo com a unidade habitacional em si. A seguir foram destacados apenas instrumentos inovadores ou que precisam ser aplicados em maior escala pelo poder público.
Parceria com movimentos organizados É a concessão de uso e administração condominial às ocupações, investindo inicialmente na manutenção do edifício. Para isso, o município firma um termo de compromisso com o movimento (em casos de edifícios públicos) ou com o movimento e o proprietário (em casos de edifícios privados). Esse método pode ser visto atualmente na formulação da PPPop (Parceria Público Popular), que vem sendo desenvolvida a partir da ocupação Nove de Julho e apresentada como uma parceria entre a gestão municipal e o movimento de moradia. 168
Habitação emergencial Aluguel de imóveis privados ociosos para subsidiar habitação emergencial, geralmente demanda de remoções que estão em andamento. É uma alternativa territorializada ao auxílio aluguel. Para isso, é necessário um levantamento técnico dos edifícios ociosos do Centro que podem ser locados pelo município. O proprietário pode estabelecer com o município um termo de compromisso com prazo e valor estipulado.
Provisão por autogestão A Promoção de Moradia por Autogestão é a modalidade de atendimento em que o principal agente são entidades sem fins lucrativos como associações, movimentos organizados, cooperativas habitacionais, entre outros, que desenvolvem ou contratam projetos e obras, organizam a demanda e administram os recursos financeiros, em articulação com agentes de assistência técnica e com a Prefeitura.
Locação social A locação social é a oferta de unidades habitacionais com valores acessíveis de aluguel para o atendimento prioritário da população de baixa renda. A utilização desse instrumento pode ser feita em empreendimentos habitacionais públicos (construídos ou reformados), ou empreendimentos privados mediante parceria entre proprietário e poder público para concessão das unidades. Um exemplo recente da aplicação desse programa é o empreendimento 7 de abril no distrito da República, que propõe tanto o retrofit como a construção de novas unidades habitacionais, disponibilizadas por meio do programa de locação social.
Locação social em parque privado É a destinação de uma parte das unidades de um empreendimento privado para locação social. Pode ser feito mediante a concessão de aumento de potencial construtivo, dispensa de garagens e outros incentivos urbanísticos e fiscais aos empreendedores privados.
Carta de crédito
Locação social por autogestão
O programa Carta de Crédito Municipal destinase a viabilizar o acesso a unidades habitacionais para pessoas e famílias de baixa renda, que habitam locais objeto de intervenção habitacional pela Prefeitura, por meio da oferta de financiamento para a aquisição de um imóvel residencial.
Seria a destinação da gestão condominial de um empreendimento de locação social para entidades sem fins lucrativos como associações, movimentos organizados, cooperativas habitacionais, entre outros.
Destaca-se, portanto, a necessidade de uma flexibilização do instrumento, com valores de financiamentos que possam ser diferentes e equivalentes à composição de cada núcleo familiar. 169
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ESTRA VIABIL
ATÉGIAS DE LIZAÇÃO
O desenvolvimento de uma estratégia de viabilização financeira para o plano se constrói como um entendimento das possibilidades de construção das etapas pensadas (curto, médio e longo prazo). A partir disso é possível traçar um panorama de fragilidades e potencialidades do plano, entendendo quais são suas barreiras financeiras com base nos fundos públicos. Os valores discutidos e abordados aqui são médias traçadas a partir das 172
informações e balanços anuais disponibilizados por cada fundo, e dizem respeito aos dados disponíveis para os anos de 2017, 2018 e 2019. Os recursos considerados para o desenvolvimento desta etapa do plano são oriundos das seguintes fontes: I) FUNDURB (Fundo de Desenvolvimento Urbano); II) FMSAI (Fundo Municipal de Saneamento Ambiental e Infraestrutura; III) Tesouro Municipal e IV) FMH (Fundo Municipal de Habitação)12.
12. Os valores trabalhados buscam uma média fixa para desenvolvimento de um cenário de planejamento, porém a arrecadação do fundo está vinculada à receita variável de outorga onerosa anual.
8.1 INVESTIMENTOS PÚBLICOS
30% da arrecadação do FUNDURB destinada a habitação
13. Os dados utilizados são dos relatórios anuais disponibilizados pela secretaria municipal de desenvolvimento urbano.
I) FUNDURB: O Fundo de Desenvolvimento Urbano (FUNDURB) é um fundo vinculado à Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDU) cujos recursos são aplicados em prol dos objetivos, diretrizes, planos, programas e projetos urbanísticos e ambientais integrantes ou decorrentes do Plano Diretor Estratégico. A arrecadação do FUNDURB é realizada a partir da receita da outorga onerosa do direito de construir municipal anual, tendo algumas destinações específicas, como, por
exemplo, 30% de destinação para investimento em aquisição de imóveis para construção de habitações de interesse social e 30% para melhorias no sistema de transporte público, ciclovias e calçadas. A arrecadação total do FUNDURB no período trabalhado é de R$1.286.636.105,25, ou seja, uma média de R$428.878.701,75 por ano13. Sendo deste valor 30% investidos em habitação, o FUNDURB possui uma média de R$128.663.610,52 que podem ser aplicados nessa área anualmente. 173
II) FMSAI: O Fundo Municipal de Saneamento Ambiental e Infraestrutura (FMSAI), instituído junto à Secretaria Municipal de Habitação (SEHAB), é destinado a apoiar e suportar ações de saneamento básico e ambiental e de infraestrutura no Município. Seus recursos são provenientes dos repasses efetuados pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – SABESP à gestão municipal, tendo também destinações a setores específicos de intervenções na cidade, sendo um deles a habitação de interesse social e regularização fundiária. O repasse do FMSAI é referente a 7,5% da arrecadação da Sabesp com o serviço de abastecimento de água e coleta de esgoto. Apesar de possuir temas de aplicação específicos, não existem porcentagens estabelecidas para cada área de atuação, sendo a habitação um entre 174
seis temas existentes: habitação de interesse social e regularização fundiária; limpeza, despoluição e canalização de córregos; parques e unidades de conservação ambiental; melhoria na mobilidade em área de assentamento precário; drenagem e eliminação de riscos de deslizamentos; e construção de cisternas em equipamentos públicos. Dessa forma, para se pensar em uma média fixa de valores, buscou-se estabelecer uma porcentagem igual de aplicações para cada eixo de ação, de forma com que o repasse para a habitação seja 16,67% da arrecadação do fundo.
16,67% da arrecadação do FMSAI destinada a habitação
De 2017 a 2019, os valores totais arrecadados pelo FMSAI foram R$1.447.432.625,53, o que resulta em uma média anual de R$482.477.541,8414. Ou seja, dentro do parâmetro estabelecido para a habitação, a média de investimentos seria de R$80.412.923,64 por ano.
14. Os dados utilizados são dos balanços orçamentários disponibilizados pela Secretaria de Habitação.
15. Em média R$122.869.383,33 dos gastos com habitação são para auxílio aluguel. Os dados utilizados são das execuções orçamentárias disponibilizadas pela secretaria da fazenda. 16. Os dados utilizados são das prestações de contas semestrais disponibilizadas pela Secretaria de Habitação.
0,9% dos gastos so Tesouro são destinados a habitação
III) Tesouro Municipal: São todos os recursos financeiros municipais, que têm sob responsabilidade da gestão a Secretaria da Fazenda, mais especificamente a SUTEM (Subsecretaria do Tesouro Municipal). É dessa fonte, por exemplo, que saem os pagamentos de auxílios aluguéis e os investimentos, parciais ou integrais, em programas habitacionais. Entre 2017 e 2019, os gastos totais do Tesouro tiveram uma média de R$ 45.169.461.977,73, sendo os gastos com a função ‘habitação’, discriminados nos arquivos da execução orçamentária, com uma média de R$409.065.412,92 por ano15.
IV) FMH: Fundo Municipal de Habitação, é um fundo gerido pela SEHAB e executado pela COHAB, que busca desenvolver uma política integrada de habitação voltada à população de baixa renda. De acordo com a prestação de contas exercida pelo Conselho Municipal de Habitação, durante o período de 2017 e 2019, o fundo arrecadou R$97.904.484,39 o que corresponde a uma média de R$32.634.828,13 por ano16. A partir disso, é possível estimar uma média de investimentos em habitação dos principais fundos públicos.
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176
Tendo em vista que o plano possui duas principais frentes de investimento: viabilização das unidades habitacionais e aquisição de terrenos privados, pode-se chegar a uma média do custo das intervenções. Tendo como base o valor do
metro quadrado para o distrito da República em R$6.674,83, estabelecido pelo índice Fipezap de 2017, e considerando que a terceira fase de desenvolvimento do plano se daria apenas por meio da aquisição dos lotes, o custo estimado seria de:
Da mesma forma, considerando a viabilização de todo o plano, e traçando uma média para a unidade habitacional de 47 m², seria possível disponibilizar 8.220 unidades17 por todo o território. Para o
custo das unidades foi utilizado como referência os valores médios do metro quadrado do edifício 7 de Abril, empreendimento de locação social que está sendo viabilizado na região central 18. Assim:
17. A quantidade de unidades leva em conta o potencial construtivo atribuído a cada terreno pelo plano diretor, bem como o entendimento de que toda a área dos térreos, ou seja, 1x o CA dos terrenos passíveis de receber unidades, seria destinado para usos não residenciais. 18. Os dados referentes ao empreendimento (anexo 6) foram disponibilizados pela Secretaria de Habitação.
Considerando os valores médios de arrecadação e a estimativa de custo do plano como um todo, é perceptível a inviabilidade da execução de um grande programa financiado apenas pelo poder público. Para que as soluções passem a se tornar possíveis é necessário o movimento de diversos setores sociais e econômicos, empréstimos internacionais e parcerias com o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e o BM (Banco Mundial), focando em soluções que não dependam expressamente da aquisição dos lotes, mas permeiem outros aspectos legais da terra, como: Reurb-s, pagamento com títulos da dívida pública, dação em pagamento e parcerias de concessão de uso. Para que o plano seja viabilizado sem parcerias ou propostas alternativas à aquisição, seria necessário que todo o investimento habitacional
anual, proveniente dos grandes fundos públicos, fosse direcionado por aproximadamente 6,5 anos apenas no desenvolvimento de uma intervenção no distrito da República, ignorando quaisquer outras problemáticas vinculadas às outras regiões do município. Isso ressalta a necessidade de parcerias com diversas esferas da sociedade, de proprietários de terra a movimentos organizados, para que uma mudança significativa possa ocorrer. Viabilizar esse ou qualquer outro plano sob um ponto de vista exclusivamente econômico é, de certa maneira, uma forma de invisibilizar problemáticas sociais que estão conectadas a histórias de vidas difíceis, que se constroem cotidianamente dentro e fora do território central.
177
9
A LUTA
CONTINUA!
A escolha por um plano de habitação público no Centro não parte apenas da necessidade do morar. Propor uma política de moradia que atende à população pobre nesse território é inseri-la legalmente em um meio repleto de conveniências e infraestrutura, garantindo acesso fácil a oportunidades de trabalho, espaços de lazer e atividades culturais e educacionais. A defesa dos movimentos sociais é imprescindível nesse processo de construção de uma cidade mais digna. A moradia na região central é uma das problemáticas que se destacou e tentou se solucionar neste trabalho, o que de forma alguma exclui outros problemas urbanos, principalmente no território da periferia. Investir durante mais de seis anos, e em apenas um distrito, toda a verba de habitação municipal, não parece ser a coisa certa a se fazer em meio a tantos outros problemas urgentes, agora escancarados pelo cenário da pandemia de Covid-19. Tudo isso deixa claro o papel que o Estado tem de planejar, organizar e pesar as prioridades 180
de seus recursos e intervenções. Este trabalho se conclui como uma forma de mostrar a necessidade de desenvolver outras metodologias na solução de problemas tão antigos. Para que as milhares de Marias e Joãos que precisam da atenção do Estado tenham alternativas de vida que equilibrem a desigualdade histórica do Brasil. É urgente a necessidade de se investir em censos demográficos contemporâneos, que abranjam diversos cenários econômicos e sociais, com o objetivo de obter insumos para o desenvolvimento de políticas públicas inclusivas e atuais ao seu tempo. Em meio a isso, a importância de uma gestão clara e transparente dos dados públicos também precisa ser posta em prática, para garantir a participação popular nas discussões de forma concreta e amparada em informações e na legalidade. O paralelo com a ilegalidade que foi traçado no texto é uma forma de mostrar as inconsistências da gestão pública, não legitimando
a ausência do Estado, mas sim a necessidade de um processo de construção coletiva deste. É necessário permitir que os processos de construção das políticas e direitos sejam legais. Para que planos como o desenvolvido aqui, aconteçam, ainda há muito o que caminhar, talvez não em relação às ferramentas e instrumentos urbanos, mas em relação às dinâmicas culturais e a representatividade no poder. Oportunidades precisam ser criadas e reforçadas para que pessoas sem acesso à educação e informação possam compor os espaços de discussão política, contribuindo com histórias de vida, compartilhando as necessidades de quem vive inteiramente as questões da cidade. As discussões econômicas, da mesma forma, precisam envolver vontades coletivas que não sejam traçadas em função de uma classe privilegiada, mas sim nas necessidades da população socialmente marginalizada, onde possam ser possíveis parcerias entre os movimentos sociais e o poder público, entendendo o mercado privado como
uma força que, de certa forma, depende dessas transformações. Precisamos de revolução e evolução, mudanças culturais sobre o entendimento de saúde, educação, transporte, habitação e etc. Os movimentos são, nesse sentido, forças inovadoras e resistentes, defendendo pautas imediatas como a luta contra a criminalização, corte de água nas ocupações, falta de saneamento, incêndios e desabamentos, ao mesmo tempo que criam espaços de transformação social por meio da cultura, da educação, da festa, da alimentação. A academia também precisa apoiar essas transformações coletivas, e os acadêmicos, cada vez mais, descerem do pedestal do conhecimento e pesquisarem soluções para problemas reais, desigualdades sociais e pautas urbanas. A educação tem que contribuir para ressignificar e dignificar o papel dos movimentos sociais. Enquanto isso: A LUTA CONTINUA!
181
?
10
REFER BIBLIO
184
0
RÊNCIAS OGRÁFICAS
CASTOR, Caio. Raquel Rolnik: “O bolsa-aluguel é o verdadeiro combustível para novas ocupações”. Apublica. São Paulo. 7 jun. 2018. Disponível em: https://apublica. org/2018/06/raquel-rolnik-o-bolsa-aluguel-e-o-verdadeirocombustivel-para-novas-ocupacoes/. Acesso em: 17 abr. 2021. DELFIM, Rodrigo Borges. Largo do Paissandu vira acampamento para sobreviventes de incêndio em São Paulo. 2018. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ cotidiano/2018/05/madrugada-no-largo-do-paissandu-temmobilizacao-e-solidariedade.shtml. Acesso em: 20 abr. 2020. FERNANDES, Pádua. Pluralismo paradoxal e os movimentos sociais: democracia participativa e o estatuto da cidade. 2008. 15 f. Defensoria Pública do Estado de São Paulo, São Paulo. HABITAÇÃO, Secretaria Municipal de. OCUPAÇÃO ANTONIO DE GODOY 32/33 - POLÍCIA FEDERAL. 2020. MULHERES DA UNIÃO EM LUTA!. São Paulo: Umm, dez. 2020. Disponível em: https://sp.unmp.org.br/wp-content/ uploads/2020/12/REVISTA_MULHERES_DIGITAL.pdf. Acesso em: 17 abr. 2021. HERLING, Tereza. DIÁLOGO INTERNACIONAL OUTRAS PROPRIEDADES: função social das cidades e modelos alternativos de propriedade imobiliária. São Paulo: Cities Alliance, 2018. 62 p. 186
RODRIGUES, Artur. SP fará prédio de 15 andares para moradia social no lugar de edifício que caiu. 2020. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ cotidiano/2020/05/sp-fara-predio-de-15-andares-paramoradia-social-no-lugar-de-edificio-que-caiu.shtml. Acesso em: 17 abr. 2021. SAMPAIO, Celso Aparecido; CAMPOS, Marcelo Bonilha. A APLICAÇÃO DE REURB-S EM EDIFÍCIOS OCUPADOS NO CENTRO DA CIDADE DE SÃO PAULO: edifício nove de julho, 584. In: CHIARELLO, Felipe; PIRES, Lilian Regina Gabriel Moreira. Novos paradigmas da regularização fundiária urbana: estudos sobre a lei n. 13.465/2017. São Paulo: Almedina, 2019. 256 p. SP, G1. União formaliza doação de terreno de prédio que desabou no Largo do Paissandu para Prefeitura de SP. 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/ noticia/2020/05/04/uniao-formaliza-doacao-de-terreno-depredio-que-desabou-no-largo-do-paissandu-para-prefeiturade-sp.ghtml. Acesso em: 17 abr. 2021.
187
ANEXOS Anexo 1: Dados do cadastramento do auxílio aluguel na região central (set/2020) espaco_habitado DS_República municipes_ativos_bloqueados
218
307
63
19
17
11
total_pessoas
477
914
169
60
36
49
52
media_componentes_familiar
2,19
2,98
2,68
3,16
2,12
4,45
2,00
26
media_n_comodos
1,10
2,22
1,35
0,89
1,12
1,09
1,15
media_tempo_moradia_meses
30,63
62,47
146,27
24,00
50,41
1,27
29,77
sexo_feminino
243
450
86
34
15
26
24
sexo_masculino
234
454
83
26
21
22
28
sexo_sem_info
0
10
0
0
0
1
0
estado_civil_solteiro
299
540
97
38
23
24
32
estado_civil_casado
35
105
26
5
1
7
3
estado_civil_divorciado
9
18
7
1
0
0
5
estado_civil_viuvo
2
8
1
0
0
0
0
estado_civil_uniao_estavel
6
0
0
0
0
0
0
126
243
38
16
12
18
12
alfabetizacao_sim
357
26
142
7
23
0
36
alfabetizacao_nao
115
4
27
3
13
0
16
alfabetizacao_sem_info
5
884
0
50
0
49
0
instrucao_nunca_estudou
106
2
25
3
11
0
13
estado_civil_sem_info
instrucao_fundamental_i
97
8
49
2
10
0
13
instrucao_fundamental_ii
135
8
45
2
10
0
17
instrucao_medio_incompleto
47
3
24
0
3
0
3
instrucao_medio
65
1
22
3
2
0
5
instrucao_superior_incompleto
3
0
0
0
0
0
1
instrucao_superior
8
0
0
0
0
0
0
instrucao_supletivo_fundamental
1
0
0
0
0
0
0
instrucao_supletivo_medio
0
0
0
0
0
0
0
instrucao_sem_info
15
892
4
50
0
49
0
trabalho_nao_trabalha
142
261
62
17
6
16
17
trabalho_privado
31
116
28
10
0
2
1
trabalho_autonomo
18
160
136
35
11
18
9
trabalho_privado_sem_carteira
5
54
3
1
0
2
3
trabalho_domestico_sem_carteira
8
19
3
2
0
2
0
trabalho_domestico
0
5
0
0
0
0
0
trabalho_publico
0
1
0
0
0
0
0
trabalho_empregador
0
1
0
0
0
0
0
trabalho_outro
1
24
0
0
0
0
1
trabalho_sem_info
130
297
38
19
12
18
12
faixa_etaria_0_6
85
152
20
14
7
9
12
faixa_etaria_7_18
114
229
38
14
11
18
5
faixa_etaria_19_59
260
424
105
30
16
18
34
faixa_etaria_60
18
27
6
0
2
0
1
faixa_etaria_sem_info
0
82
0
2
0
4
0
renda_familiar_menos_1sm
152
189
32
4
0
6
0
renda_familiar_1sm_3sm
63
115
29
15
0
5
0
renda_familiar_mais_3sm
0
0
0
0
0
0
0
17
0
26
3
3
2
0
media_renda_familiar_recad (R$)
807,56
946,33
984,64
1.068,99
966,01
media_renda_beneficios_recad (R$)
19,37
44,43
53,03
54,68
23,45
renda_familiar_sem_info
188
Polícia Federal Prédio Rua da Cristina Casa Ponte Orestes Viaduto Alcantara Moinho /Wilton Paes Independência Tomas 80 Amarela Quércia Machado Sim Não Não Não Não Não Não
Anexo 2: Valores de venda do m² (Índice FIPEZAP de 2017) Bairros Ibirapuera
Preço de venda do m² 20811,1
Bairros Santo Amaro
Preço de venda do m² 8193,67
Jardim Europa
19002,79
Vila Gumercindo
8145,63
Vila Nova Conceição
17821,82
São Judas
8058,22
Itaim Bibi
15457,86
Bosque da Saúde
8008,16
Vila Olímpia
12978,66
Ipiranga
7911,39
Jardim América
12384,73
Jardins
11702,9
Vila Mascote
7759,56
Conceição
7645,12
Jardim Paulista
11664,66
Centro
7639,98
Alto de Pinheiros
11635,95
VIla Monumento
7502,03 7329,84
Moema
11552,23
Santana
Vila Madalena
11293,64
Tatuapé
Cidade Monções
11131,46
Água Rasa
7208,37
Paraíso
11067,66
Vila São Francisco
7198,19
7324,7
Cerqueira César
11033,46
VIla Buarque
7190,15
Pinheiros
11024,88
Panamby
7183,37
Brooklin Paulista
10892,01
Indianópolis Brooklin
10843,7 10642,45
Liberdade
7093,96
Mooca
7042,06
Casa Verde
6979,17
Chácara Klabin
10422,06
Jardim Marajoara
6952,19
Berrini
10389,74
Cambuci
6852,69
Campo Belo
10306,31
Real Parque
Brooklin Novo
10249,74
República
Higienópolis
10073,97
Sumaré
9970,12
6846 6674,83
Vila Maria
6673,45
Jaguaré
6545,66
Vila Mariana
9926,27
Jabaquara
6513,04
Vila Clementino
9875,78
Lauzane Paulista
6494,75
Consolação
9706,67
Vila Carrão
6485,31
Vila Romana
9699,83
Campos Elíseos
6478,77
Perdizes
9688,06
Vila Prudente
6433,88
Pompeia
9619,99
Vila Guilherme
6429,35 6396,12
Planalto Paulista
9613,67
Vila Formosa
Vila Pompeia
9577,63
Vila das Mercês
Alto da Lapa
9472,78
Vila Sônia
6386,8 6383,34
Vila Leopoldina
9426,17
Mandaqui
6359,48
Granja Julieta
9347,78
Belém
6332,17
Vila Ipojuca
9284,65
Jardim Guedala
9263,9
Vila Santa Catarina
6295,78
Tucuruvi
6259,29 6254,64
Água Branca
9221,18
Campo Grande
Chácara Santo Antônio
9021,81
Interlagos
Chácara Inglesa
9012,75
Freguesia do Ó
6178,39
Jardim Anália Franco
8757,69
Morumbi
6153,06
Alto da Boa Vista
8749,39
Limão
6148,95
Bela VIsta
8708,97
Vila Andrade
6106,92
6242,3
Lapa
8696,17
Brás
6034,87
Aclimação
8636,78
Butanã
6021,04
Anália Franco Barra Funda
8528,5
Bom Retiro
5856,54
8511,13
Vila Suzana
5822,79
Jardim Aeroporto
8353,83
Pirituba
Santa Cecília
8335,46
Sacomã
Saúde Mirandópolis
8282,8 8245,64
5742,4 5526,63
Penha
5377,47
Itaquera
4292,57
189
Anexo 3: Empreendimentos públicos na região central
Nome Policia Federal - Wilton Paes EDIFICIO MILITAO AZEVEDO - ANTONIO DE GODOI EDIFICIO GREGORI WARCHAVCHIK EDIFICIO FERRIGNAC EDIFICIO ROBERTO BURLE MARX
Localização Rua Antonio de Godoi Rua Antonio de Godói 65 Rua Quintino Bocaiuva, 307 Avenida São João, 247-253 Rua Cons. Crispiniano, 140
EDIFICIO SALOMONE EDIFICIO ARCANGELO IANELLI EDIFICIO PLINIO SALGADO EDIFICIO REPUBLICA EDIFICIO MENOTTI DEL PICCHIA EDIFICIO HERRERIAS EDIFICIO LUIZ ARANHA EDIFICIO SANTA LEONOR EDIFICIO MAUA
Avenida Duque de Caxias, 401
47
Não
Rua Doutor Penaforte Mendes, 30 Rua da Mooca, 416-418-424 Praça da República, 250 Rua José Bonifácio, 367-379-383 Avenida São João, 1492 Rua Sete de Abril, 351-353-355-361-365 Rua Sete de Abril, 176 Rua Mauá, 342
25 36 29 53 18 91 40 112
Não Não Sim Não Não Sim Sim Sim
Rua Aurora, 424 Rua Aurora, 519 Rua São Francisco, 77-81-85 Rua Cônego Vicente Marinho x Rua Cruzeiro Praça da Bandeira, 31-39-47 Rua Prestes Maia x Brigadeiro Tobias R. das Palmeiras, 58
60 34 18 302 41 283 176
Sim Sim Não Não Não Sim Não
Av. Nove de Julho, 216 Rua Marconi, 138 Praça da República, 242 Avenida São João, 407 Rua Cons. Furtado, 90-96 Rua Conselheiro Nebias, 314 Rua Cons. Carrão, 202 Rua Dom José de Barros, 329-333-337
121 96 43 43 43 84 30 101
Sim Sim Sim Sim Não Sim Não Sim
Rua Artur Primavesi / Rua Joaquim de Araujo Novais Avenida Ipiranga, 908 Praça Princesa Isabel, 87 R. Backer, 79/87 RUA GENERAL RONDON, 52 a 82
154 52 31 25 131
Não Sim Sim Não Não
RUA JOSÉ BONIFACIO,237
66 170
Não Sim
90 64
Sim Sim
274 120 96 77 133 91
Não Não Sim Sim Sim Sim
Rua Luis Gama, 554 Av. Nove de Julho, ao lado do 1138 Av. Nove de Julho, entre 1187 e 1217
140 39 52
Não Não Não
EDIFICIO MARIO DE ANDRADE EDIFICIO CONSELHEIRO CRISPINIANO EDIFICIO IPIRANGA- DANDARA EDIFICIO VILA LOBOS - IRMAOS GONCALVES CONQUISTA
Rua Jose Bonifacio, 137 Rua Vitória, 100/104 e 106/108
76 34 72 120 18 27
Não Sim Sim Sim Não Sim
NOVO HORIZONTE EDIFICIO NOVE DE JULHO 584 EDIFICIO TACITO DE ALMEIDA
Rua Brigadeiro Tobias, 258 Av. Nove de Julho, 584 Rua Assunção, 104-112-116-120
63 117 59
Sim Sim Não
MARIA DOMITILA
Av. Rangel Pestana; R. Maria Domitila, 228/232
245
Não
EDIFICIO DEMONIOS DA GAROA EDIFICIO PAULO VANZOLINI EDIFICIO ADONIRAN BARBOSA BARRA FUNDA 1 - CONEGO - RUA DO BOSQUE EDIFICIO GRAO PARA EDIFICIO PRESTES MAIA EDIFICIO LORD HOTEL EDIFICIO CAMBRIDGE EDIFICIO SAO MANOEL EDIFICIO PAULO AUTRAN EDIFICIO ARTE PALACIO EDIFICIO VILANOVA ARTIGAS EDIFICIO ALMEIDA JUNIOR EDIFICIO OSWALD DE ANDRADE EDIFICIO JOHN GRAZ BARRA FUNDA 2 - CONEGO - RUA DO BOSQUE EDIFICIO ANITA MALFATI EDIFICIO VIRGINIO PASINI BACKER GENERAL RONDON EDIFICIO JOSE BONIFACIO QUADRA 69 QUADRA 77 EDIFICIO SAO JOAO 588 - HOTEL COLUMBIA QUADRA 37 PROJETO REDENCAO QUADRA 38 PROJETO REDENCAO QUADRA 75 REPUBLICA A TERRENO REPUBLICA B TERRENO ALVARO DE CARVALHO LT B TERRENO NOVE DE JULHO L7 E 8 TERRENO LUIS GAMA 554 TERRENO NOVE DE JULHO, ao lado do nº 1138 TERRENO NOVE DE JULHO, entre os nº 1187 e 1217 ALMIRANTE MARQUES LEAO
190
Total de Unidades 90 201 29 51 110
DS_República Sim Sim Não Sim Sim
Anexo 4: Transcrição da entrevista com Evaniza Rodrigues
projeto para as famílias que sofreram do incidente no edifício Wilton Paes.
Gustavo: Bom, então eu vou te dar um contexto bem rápido sobre o meu trabalho, que eu acho que eu dei um pouco no whatsapp, eu estou desenvolvendo no tcc de arquitetura do mackenzie junto com a Tereza, um plano de habitação para o distrito da república. Seria uma espécie de PMH mesmo, mas a ideia é trazer todas as formas de acesso e viabilização que são novidade ou que são pouco utilizadas pelo poder público e explicitar isso no trabalho para que o movimento tenha acesso a esse conteúdo depois e possa também exigir algumas modalidade que o poder público nunca trabalha né. O bolsa aluguel, por exemplo, que é muito pouco hoje em dia, é uma questão que eu trabalho seria a revisão dele também.
Evaniza: Você já tem o contato com elas?
Dentro disso eu tenho dois recortes, que é o recorte do distrito onde eu desenvolvo o plano dentro de 3 principais questões que é a questão da habitação, do lazer e trabalho e a questão da escala menor do projeto que é uma coisa que o mackenzie cobra da gente, e eu escolhi desenvolver um
Gustavo: Não, não tenho. Eu fui estagiário da sehab por 2 anos e aí quando aconteceu o acidente eu estava trabalhando na sehab já e eu acompanhei… Evaniza: Não, eu perguntei isso porque a maioria até onde eu sei tá dispersa né, não tem uma organização mais de uma articulação com essas famílias, então não sei como é que você faria isso né, uma proposta pra elas sem localizá-las. Gustavo: Eu to reconstruindo muito o perfil socioeconômico delas baseado no cadastro que a sehab fez das família e baseado em entrevistas coisas desse tipo. eu tenho acesso a esses dados mas não seria correto utilizar a informação dos munícipes tão diretamente assim pra poder entrar em contato com eles. Evaniza: É, porque até onde eu sei, a grande… teve uma parte das pessoas que foram atendidas de forma provisória mas o restante até onde eu sei não tem nenhuma articulação, mas posso tar errada né. Gustavo: Não, que eu 191
saiba também, realmente não teve uma articulação posterior ao incêndio. Acho que o desastre foi maior e as pessoas não conseguiram manter essa articulação em volta disso, tanto que eu questiono também o projeto que está sendo desenvolvido pro terreno atualmente pela prefeitura, que eu acho que é uma questão muito grande o número de habitações a forma de acesso, enfim, e aí isso é uma das pautas do meu trabalho também, questionar esse espaço. E aí, tenho alguma perguntas pra fazer pra você que eu acho que me ajudariam a construir o meu trabalho de uma forma menos acadêmica, eu queria trazer esse contato do movimento com a realidade porque eu acho que a gente tem pouca produção dentro da academia sobre isso e acho que toda vez que a gente entra um pouco nesse assunto o academicismo toma conta um pouco da verdadeira realidade que acontece dentro das ocupações. Então a gente tem pouco trabalhos que buscam mostrar mesmo como acontece de verdade as coisas, como a luta do movimento fez a política habitacional se desenvolver ao longo dos anos, e a gente acaba jogando isso como uma vitória, as vezes, do poder público 192
e eu acredito que não necessariamente é, eu trato isso no meu trabalho como uma questão de produzir a legalidade por meio da ilegalidade, que através das ocupações e das manifestações o movimento consegue fazer com que os direitos e as políticas de habitação se desenvolvam. E aí só um recorte de tempo, o meu trabalho ele trata do estatuto das cidades pra frente, então é de 2001 pra frente que eu venho contando essa trajetória da luta do movimento. E aí a minha pergunta pra você é saber como iniciou o seu contato dentro do movimento, como você chegou onde você tá hoje. Evaniza: Bom, eu sou da zona leste, so militante do movimento de moradia da zona leste, meu trabalho de base continua sendo são mateus, sapopemba que é a região que eu sempre atuei e eu cheguei nas ocupações de 87, 88, quando você tinha uma grande mobilização na periferia de São Paulo ocupando terra, isso foi no final da ditadura, inicio do período democratico, então você tem uma efervescência grande de ações de ocupação de terra, especialmente nas periferias, na zona leste um grande espaço disso.
E eu já era da igreja católica, da comunidade eclesial de base, então muitas das ações foram apoiadas pela igreja católica, pela sebes, pelas pastorais e eu entro por aí, pela militância minha dentro da sebes e a partir daí eu começo a atuar num grupo de base, que é a nossa metodologia até hoje, a atuação por grupos de base territoriais em cada bairro. Começo a participar de um grupo desses, nesse grupo começo a participar e representar o grupo na região, que é uma instância importante que existe até hoje, depois da região eu sou eleita pra representar o grupo na coordenação estadual que é junto a UMM e daí pra frente vamo embora, isso a partir de 88, 89. Gustavo: Então você pegou bem antes do estatuto das cidades né que você tá no movimento. E o que você traria como conquista do movimento, ou como avanço, nas políticas que o movimento conseguiu despertar desde o estatuto das cidades. Evaniza: Então, eu acho que um componente importante, e eu sempre falo disso desde o processo da constituição, que foi
resgatar a pauta urbana, porque com a ditadura você interrompeu toda uma discussão que já vinha avançando sobre a discussão das cidades e durante a ditadura a urbanização se acelera de uma maneira incrível. Então é claro que as primeiras mobilizações são pra responder questões muito imediatas, água, luz, posto de saúde, saneamento básico, colocar saneamento na favela, eram coisas muito concretas. Aí você teve em outras áreas que não só a questão mais de desenvolvimento urbano mas do aumento das creches, postos de saúde, então essas coisas foram as que, digamos, levantaram a periferia transporte, levantaram a periferia na década de 80 com uma organização mais forte, só que a soma dessas coisas todas não significava cidade, então você podia ter conquistado a água mas continuava não tendo bairro, então esse assunto ele vai tomando conta. É claro que pras pessoas, eu vou falar sempre do ponto de vista do movimento popular ta gustavo, então claro que você tem uma construção acadêmica uma construção inclusive da gestão pública, mas no ponto de vista do movimento 193
popular a gente brinca que o movimento de moradia faz a luta da casa pra cidade, porque a gente começa olhando a casa, depois você olha a cidade. Pra quem tem casa talvez seja muito mais fácil olhar a cidade, porque você fala assim “ah esse lugar onde eu estou não é bom por isso, não é bom por aquilo, falta isso, falta aquilo”, quando você não tem casa você não sabe pra onde você vai, você pode ir pra qualquer lugar, ou seja, o primeiro lugar é de você se localizar e a partir daí você olha o entorno, então a gente faz essa caminhada. Então o assunto da questão urbana ele vai entrando na pauta e a emenda constituinte, a emenda da reforma urbana, ela é muito importante. Aliás, por conta dessa comunidade que eu participei eu até reli a emenda e é muito legal né, é muito inovador você pensar que ela foi feita em 86. E depois a trajetória até a aprovação do estatuto das cidades não foi só uma trajetória de discussão legislativa, foi principalmente a experimentação de algumas ferramentas. Então se você for pensar as ZEIS não foi pensado pelo estatuto das cidades, nem pela lei federal, foi 194
uma experiência concreta de recife que começa a demarcar de forma diferente, territorialmente no ordenamento jurídico local uma forma diferente de se marcar aquela região. Se você for pensar em operação urbana hoje, tem os antecedentes também em instrumentos inovadores, tem uma série de instrumentos que vão [surgindo] IPTU progressivo, ou seja, uma série de ferramentas que depois vão tar no estatuto das cidades são construídas com propostas legislativas mas também com práticas, e essas práticas às vezes, inclusive, questionadas judicialmente, então vamos lembrar que a Luiza Erundina quase levou um torpedo na cabeça por causa de IPTU, porque em 92 você não tinha esse conceito por exemplo que “uma área não edificada ou uma área melhor localizada, melhor provida, deveria pagar mais imposto que uma área menos provida”, então esses conceitos foram meio que sendo empurrados pra ele entrar. E pro movimento essas questões começam a mostrar como que, simplesmente, ocupar um terreno, picar os lotes e construir casa era insuficiente pra dar respostas ao que a gente
precisava. A gente não precisava só de um terreno picado com uma casa em cima, a gente precisava de uma inserção urbana com mais clareza, com mais qualidade, então esse processo vai continuamente sendo alimentado pelas experiências das prefeituras, pelas experiências das lutas dos movimentos, e aí essa pauta entra na pauta do movimento, essas questões entram na nossa pauta então já não tamo reivindicando só terra, mas terra bem localizada, nós não tamo só ocupando terreno que sobra na periferia, passamos a fazer ocupações em áreas melhor localizadas, sendo que melhor localizadas não é necessariamente no centro, então você vai ter também uma leitura melhor da dinâmica urbana, de utilização de áreas que já são urbanizadas ainda que não seja no miolo, mas que são tão ou mais difíceis até de conquistar do que o centro. Uma vez a gente no plano diretor de… na época da Marta, a gente tava fazendo indicação de ZEIS, e a gente indicou o terreno que era da SPU na época (depois SPU vendeu) que ficava em frente o shopping Anália Franco, uma área pública, enorme,
provida de infraestrutura, vazia. E eu lembro que um dos técnicos botou as duas mãozinhas na cintura e falou assim “Evaniza, provocação não né”, porque assim, você pode até pegar um prédio velho pra você aí no centro mas na Anália Franco tá querendo demais, no Anália Franco que justamente é o símbolo da classe média emergente, de empreendimentos imobiliários infinitos. E aí que tá, não é uma questão de preconceito digamos abstrato, é muito concreto “esse terreno aqui na mão da especulação imobiliária tem uma valor que vocês não tão sabendo, que você não tem nem como calcular, vocês não tem noção”, então eu acho que é essa a coisa. E uma outra questão, que eu acho que isso acaba vindo muito mais pro fim, já na década dos anos 2000, que é a expansão do que o mercado chama de mercado econômico, eu odeio essa expressão, é que nem carro popular né, carro popular você sabe o que que é né, o que é um carro popular? Gustavo: não. Evaniza: é a expressão dentro da produção automobilística que carro popular é um carro 1.0, sem acessórios, tudo é 195
o tal do carro popular. Mercado econômico de habitação é o que eles chamam de empreendimentos de baixo custo mas que tem viabilidade de venda, só que é isso, ou seja, no fim existe uma maioria de pessoas excluídas do mercado, não importa se o apartamento vai custar 180 mil ou 1 milhão ele tá fora do mesmo jeito. E esse tal desse mercado popular ele não tem preconceito não, então ele vai ocupando a onde tiver alguém pra comprar ele vai indo, vai ocupando essas áreas. Então ótimo, se o mercado consegue produzir um apartamento de 40 metro e vendê-lo por 500 mil ele vende, mas se ele conseguir fazer o de 40 metros e só conseguir vendê-lo por 200 ele faz do mesmo jeito, não tem preconceito “ah não eu quero só vender pra classe média alta”, não, ele quer vender. Inclusive você vai tendo as próprias empresas incorporadoras que vão segmentando a sua atuação, a Gafisa tem uma empresa subsidiária, que ela não escreve Gafisa se não vai ficar feio colocar aquele apartamento de 26 metros como Gafisa, mas ela tem uma subsidiária que chama vivaz. Olha aqui, eu sou colecionadora, mas ela é da Gafisa. Gafisa? Acho que é Gafisa sim, depois eu vejo 196
certinho. Que tá fazendo apartamento de 26 metros quadrados que não tem a grife Gafisa obviamente. Então, ou seja, dei uma volta danada pra falar isso, que essa disputa pelo espaço ela acontece na cidade toda, em todo lugar que tem dinâmica de mercado. Então essa dinâmica pode ser incentivada ou favorecida pelo próprio poder público, pelas políticas públicas, e muitas vezes são. Então o poder público meio que subsidiando esse mercado, dando mais condições desse mercado lucrar mais e da mercadoria moradia, mercadoria habitação, ficar cada vez mais cara. Gustavo: Sim, com certeza. Você acha que o estatuto das cidades então funciona também como uma chave pro mercado? Evaniza: Na verdade, a gente tem falado o seguinte: a gente tem um cortador de grama lá no nosso terreno. A gente tem um terreno que a gente conquistou e a gente tá mantendo ele até conseguir financiamento, então a gente tem um cortador de grama, só que tem vários problemas. Primeiro, a maioria das pessoas não sabe mexer com cortador de grama, então o cortador de
grama tá lá guardadinho, mas a gente acaba usando muito pouco porque a gente não sabe mexer nele, e muitas vezes quando a gente vai mexer nele, ou alguém que não sabe vai mexer nele, acaba estragando o cortador de grama, porque não sabe ligar, não sabe abastecer, não sabe regular e tal. Eu acho que o problema é que o estatuto da cidade em si ele não faz nada, ele é uma ferramenta, e é uma ferramenta que pouca gente tem coragem de usar, porque ele acaba sendo uma ferramenta com uma grande carga ideológica. Então vamos lembrar que todas as vezes que se aplicou qualquer instrumento que avança sobre a propriedade privada você teve imediatamente uma reação. E às vezes se você fosse fazer a conta, uma vez um empresário falou isso “eu não posso falar isso em público”, ele falou em uma reunião fechada “mas essa mudança não vai me tirar um centavo de lucro”, em um determinado caso, “mas eu tenho que me posicionar sobre ela, contra ela”, então qualquer medida: IPTU progressivo, redução de coeficiente, pagamento de outorga onerosa, todas essas medidas, na minha opinião, funcionariam, só
que cada vez que qualquer gestor vai colocá-la em prática ele recebe uma carga, uma reação forte das elites empresariais, do mercado imobiliário, e aí eles se dividem, eles não são todos homogêneos não, mas inicialmente de uma maneira ideológica “isso é um avança sobre a propriedade privada, isso é cercear o direito do proprietário, isso é o estado que está querendo ser mais importante do que o cidadão”, então você vai ter uma série de pensamento que na prática significa que esse mercado sempre tá querendo que o estado dê mais condições pra ele ter mais lucro, não necessariamente que aquela medida em si seria ruim ou perversa. Pra você ter uma ideia, uma das gritas pra rever o plano diretor agora tá sendo falar que tá muito caro, que a outorga tá muito pesada, que é muito caro pagar outorga em São Paulo, então que isso prejudicaria o próprio mercado e prejudicaria a geração de emprego, a construção e geração de empregos e tal. Tudo bem, o ano de pandemia a gente não vai levar em consideração porque ele é atípico e a gente não tem com o que comparar, mas o 197
ano anterior foi o ano que estourou a boca do balão de pagamento de outorga, de lançamento imobiliário, mesmo na crise econômica, então ué, porque que esse empresário não foram pra outro lugar produzir em outro lugar que não tinha a outorga onerosa tão cara que nem São Paulo com um plano diretor tão maléfico para os seus interesses? Porque não é verdade, é que eles queriam ganhar mais dinheiro, eles tavam ganhando muito dinheiro e queriam ganhar mais dinheiro, e essa lógica que é a lógica perfeitamente aceitável pelo capitalismo liberal ela acaba sendo meio irrefutável, “ah mas seu eu tivesse menos outorga eu estaria gerando mais emprego ainda”, a ta bom, se minha andasse de bicicleta ela tinha chegado em outro lugar. Então são coisas que o tempo todo, todas as ferramentas vão sendo demolizadas pra um lado, ou demolizadas ou apropriadas, desvirtuadas e apropriadas. Eu tenho minha sina, não sei se você já ouviu, que eu tenho minha sina aqui sobre a questão do uso das ZEIS, eu tenho uma… não tenho capacidade talvez de uma formulação tão elaborada, jurídica e tal, mas de que é o seguinte: o que se faz hoje em São Paulo 198
é um descumprimento da lei, porque? Porque a prefeitura de São Paulo não acompanha, não fiscaliza, não monitora, use a palavra que você quiser, se aquele empreendimento construído numa ZEIS está cumprindo o que diz a lei. A lei diz que lá naquele lugar tem que morar tantas famílias de 0 a 3, tantos porcentos de famílias de 3 a 6, e assim, a prefeitura de São Paulo não checa. Você conhece o filme das domésticas? brasileiro? Gustavo: Aham. Evaniza: Você lembra da história do sofá? que a mulher tinha um marido, vagabundo, e aí depois ele morre, ela arruma outro namorado, e o namorado fica no sofá, aí ela vai lá e joga fora o sofá, porque o problema era o sofá. A sehab fez isso, a sehab tinha um termo lá de adesão, um termo de compromisso lá que as empresas assinavam com a sehab, e aí ela falou “ah isso aqui não serve pra nada”, então ela pegou e extinguiu o termo e agora é uma coisa que você diz, você como promotor vai lá em SEL, SMUL agora, e você declara “eu declaro que eu tô sim fazendo”, e a resposta sempre quando a gente cobra isso é que
a prefeitura não teria competência legal pra ter as informações que são de sigilo bancário, por exemplo, dos compradores dos imóveis. E assim, a gente tem mil ideias de como isso pode ser revertido se houver interesse, quer dizer, eu tô te dando um troco aí certo? você não vai pagar outorga, você não vai fazer isso você não vai fazer aquilo por ser HIS, então pra eu te dar esse troco você tem algumas contrapartidas, que no mínimo é me dar informações, seria o mínimo. Gustavo: com certeza Evaniza: Mas então, ou seja, as Zeis pra nós... nos dois últimos planos nós varamos noite, eu trepei muro pra poder demarcar ZEIS, não tinha drone essa época, olha só, to pensando que esse ano a gente vai arrumar drone pra fazer marcação de ZEIS, mas nos outros a gente mobilizou muita gente pra marcar ZEIS, tanto de vazios na periferia quanto de vazios em áreas centrais, tinha gente disfarçada indo visitar prédio, a gente fez o diabo pra conseguir um volume enorme de áreas pra demarcar como ZEIS. Inicialmente teve algumas tensões de algumas áreas
“essa não quer que marque como ZEIS, essa quer que marque”, vereadores que chegavam lá com as suas pastinhas e dizendo “Olha tenho um amigo aqui que pediu pra não marcar essa área como ZEIS”, até que parte do setor imobiliário descobriu, que dependendo da região, era uma puta de uma chance de negócio ter a área marcada como ZEIS porque aí você não precisa pagar outorga, você pode usar a legislação de HIS, você pode usar uma série de benefícios pra produzir e depois ninguém vai te perguntar nem por quanto e nem pra quem você vendeu aquele empreendimento. Então é um exemplo de uma ferramenta que foi consagrando nesse processo da legislação urbana mais progressista, mas que ela já foi absolutamente apropriada, na minha opinião, pelo mercado. E até ouvindo gente do mercado, tem divergências entre eles mesmos, então por exemplo, tem um segmento que diz que essa coisa de fazer um monte de apartamento pequenininho, isso canibaliza o mercado, então gente que podia um apartamento maior, pra negócio ou pra seja o que for, acaba comprando esses menorzinhos e isso acabaria utilizando o mesmo dinheiro que seria pra um setor 199
melhor, maior. Então eles mesmos têm divergências, mas na prática eles estão usando toda legislação no limite. A gente sempre brincava, isso no Minha Casa Minha Vida, a gente tinha uma briga com o ministério sobre os parâmetros de enquadramento das unidades, metros quadrados, até a altura do pé direito, nós chegamos a brigar por causa disso. Porque quando a gente fala o mínimo é tanto, na nossa cabeça é isso “o mínimo é tanto e nós faremos o máximo possível”, quando você lê isso de um outro ponto de vista a palavra mínimo é igual máximo. Gustavo: Sim, com certeza. Evaniza: Então a última briga que teve em CAEIS, não sei se foi a última, mas no ano passado, foi se computava varanda como área mínima. Então assim, eu não quero que ela seja computada quando eu tenho que pagar outorga, e logo quando termina a varanda a primeira coisa é colocar aquele blindex de banheiro pra fechar a varanda e aumentar [a área]. Eu acho que todo mundo se sente num grande banheiro fica aquele monte de blindex, mas então a primeira coisa que se faz é isso, se produz um empreendimento que é pro mercado, se 200
faz com varanda pra não computar, varanda gourmets enormes, quase maior que o apartamento, depois se fecha pra incorporar isso na área. Só que aí quando é HIS, e portanto não paga outorga, eu quero que isso conte como área mínima pra eu dizer que eu estou atendendo a legislação. É muita cara de pau, fala a verdade, assim é muita cara de pau Não é simplesmente uma “estratégia do mercado”, é cara de pau nível básico. Então na verdade o que eu tô falando é isso, você tem uma série de ferramentas, essas ferramentas são importantes. Acho que a outorga, por exemplo, ela é hoje a única ferramenta concreta que a gente consegue tirar da produção econômica recursos pra reverter pra desenvolvimento urbano de verdade, é a única ferramenta na prática acaba não tendo… ela tem que funcionar. Só que elas acabam sendo apropriadas, e acompanha-se a isso, que o problema também das nossas legislações é que elas são quase que um cardápio, você chega no boteco e fala “Ah hoje eu quero caipirinha, eu não quero cerveja” e assim, os gestores escolhem o que eles aplicam ou não, então o governo Dória-
Covas passou praticamente toda a gestão passada sem notificar um imóvel, notificou os primeiros quando a equipe ainda tava montada no comecinho da gestão, ainda vindo do Haddad, e no final do ano passado deu uma notificada pra não ficar muito feio. Mas então, ou seja, ele escolheu, “Ah tem essa lei, mas essa aqui eu não gosto muito não, essa outra aqui é mais legal. Essa eu posso fazer eu não posso fazer”. Então também acaba que… bom, tudo pra falar o que né? Que as ferramentas legais e institucionais, elas também precisam de certa pressão social pra funcionar porque senão pode ser que usa, pode ser que não usa. Eu acho que de fato é importante usar os mecanismos de judicialização, eles têm sido importantes, mas meu medo sempre acaba sendo que a gente se apoie de maneira muito exclusiva neles. A gente não consegue parar na mobilização, aí vai parar no judiciário, e aí no judiciário você também delega pra algum terceiro que não necessariamente tem muito compromisso com isso. Tipo assim, a gente entra com as coisas no MP e fica torcendo pra que promotor vai cair, é ridículo, daí tem que desenvolver técnicas: vela
preta pra cair pra um, vela vermelha pra cair no outro, sei lá né. Porque é totalmente ingovernável, você manda um negócio e você coloca pra um sistema, e que na prática se você olhar o conjunto das coisas tudo bem, tem gente mais progressista, tem coisas que a gente já conseguiu bastante via judicial, mas no conjunto é um judiciário que atua de maneira muito mais conservadora do que progressista. Então também botar a sorte da cidade inteira, ou dos pobres da cidade inteira, na mão de um juiz, acaba sendo muito arriscado, e pouco efetivo porque depois eles vão lá e mudam. Então o que aconteceu foi isso, a gente parou a revisão do zoneamento via judicial, aí no final do ano fizeram um tanto de mudança em portaria de HIS, portaria daquilo, e várias mudanças que eles queriam fazer na lei de zoneamento eles fizeram de forma infralegal e a gente não conseguiu segurar, o bicho passou correndo pelas pernas. Então acho que tem essas “questã”. Gustavo: Sim, com certeza. Eu acho que eles usam essa justificativa legal né, pra fazer o que eles querem. Evaniza: É exatamente, 201
então se pudesse … a mudança na lei, agora, por exemplo, tem essa história, vai fazer a mudança no plano diretor e qual é o nível de profundidade de revisão que se pode fazer nesse momento? pode rever tudo? pode fazer ajustes? Mas mesmo assim né, o que que é ajuste pra mim, o que que é ajuste pro CECOV? Talvez existam algumas diferenças no conceito, então essas palavras pouco precisas servem pra essas coisas. Mas ao mesmo tempo você pega a composição da câmara, voce vai pegar uma serie de … que tem muito menos a ver com a legislação em si e muito mais com a política da cidade, que no final das contas é sobre o que nós estamos falando, como fortalecer que a população mais pobre, mais sub representada tenha mais força política na tomada de decisão dos rumos da cidade, tudo isso é só sobre esse assunto. Mas vamos lá que eu viajo muito Gustavo, me pega no cabresto. Gustavo: Não, tá levando de uma forma ótima. Eu queria que você comentasse um pouco também sobre questões fundiárias, eu acho que talvez na zona leste isso tenha sido uma questão muito forte, talvez 202
mais que no centro ainda. Eu li sobre algumas práticas que vem acontecendo no mundo sobre vínculos coletivos com a terra, enfim, coisas que fazem com que a terra não vire esse produto e as pessoas não fiquem em busca do consumo da terra, que outras questões surjam no meio da produção habitacional. Aí que queria saber se você algum caso de vínculo coletivo com a terra, que existe no brasil ou que vem acontecendo, se vocês estão tentando algo inovador nesse sentido, se tem alguma legislação que apoia esse tipo de prática. Evaniza: Primeiro antes de falar de produção eu vou falar um pouco das ocupações, das favelas né. A possibilidade, por exemplo, de concessão de direito real de uso ela tá na nossa legislação a muito tempo, meu marido que pé o advogado da casa ele sempre fala isso, isso tá previsto, ou seja, você passar o direito de uso sem transferir propriedade está previsto no nosso instituto legal desde a constituição de 40 e pouco, sei lá quando que é. Agora, acabou que o modelo escolhido, o modelo adotado, e isso tem a ver com os formatos tanto de
pensar a mercantilização da terra quanto também uma questão ideológica de fortalecer a ideia do proprietário, você ser o dono da sua casa, ser proprietário ser a coisa mais importante da sua vida. Esses dois mecanismos vieram ao longo do tempo fazendo com que o sonho da casa própria, que essas imagens fossem as coisas que o tempo todo são a forma com que se responde essa demanda. Então se você for pensar toda a produção de habitação feita pelas cohab, no final de tudo, até que o final possa ter levado 40 anos, no final de tudo é pra cada um ter um título individual registrado no cartório de imóveis, dentro da legalidade institucional, que possa ser disposto como propriedade. E ai vamos lá pro artigo da constituição da propriedade, esquece todos os demais de sociais e volta lá praquele da propriedade. Então acho que é uma construção que foi feita sobre isso né, “ah é natural que as pessoas queiram propriedade individual”, não tem nada de natural, teve anos de consolidação desse pensamento. A gente sente o tempo todo a dificuldade de quebrar esse modelo,
o tempo todo, e com muitos motivos. Então as experiências promovidas pelo poder publico nao sao muito boas, então a gente já teve favela que tinha o título de posse concedido que depois foi removida, então a mesma prefeitura, em momento diferentes, deu um título e depois disse “esse título não vale bosta nenhuma” fazendo com que as pessoas falem assim “tá vendo, se isso aqui fosse um registro de propriedade”, e não é verdade porque a prefeitura pode remover também. Mas desde as ações do poder público… o poder público não é confiável, as pessoas não confiam no estado, e não tem razão nenhuma pra confiar. Acho que um dos exemplos melhores é do edifício São Vito. No São Vito a polícia não tirou ninguém dali de dentro, no São Vito todo mundo saiu pela porta da frente em acordo, porque o município falou “saia, pegue suas coisas, vá que eu vou te dar bolsa aluguel e você vai voltar a morar aqui quando eu reformar o prédio”, e todo mundo saiu pela porta da frente, ninguém saiu debaixo de catete. Passou anos, mudou a gestão, a mesma gestão disse “mentira, vocês não vão 203
voltar aqui nada, eu vou botar o prédio no chão”. Então assim, as pessoas não têm confiança nesse estado que o tempo todo muda de opinião, muda de gestão, de linha política, ou então passa por cima das suas próprias legislações, determinações, dos seus próprios contratos, então quem mais não cumpre contrato, não cumpre acordo é o próprio poder público. Tem uma dificuldade das pessoas acreditarem em mecanismos que não estejam em formatos, digamos, que elas estão acostumadas a ver, que é a propriedade individual. Por outro lado, isso por exemplo, tá no campo das ideias, porque no campo da vida real, eu não sei hoje percentualmente, mas milhares de pessoas, milhões de pessoas, vivem de forma que não atende a esse nível de regularidade. Eu brincava com a minha sogra, minha sogra falava assim “você não vai casar minha filha?” e eu falava “ah não sogra, todo mundo é irregular, não precisa de papel não”, e é assim que acontece né. Ontem apareceu meu tio aqui em casa porque nós descobrimos que não foi feito o inventário do meu avô que tinha uma casinha lá numa vila, e meu avô 204
morreu sei lá a quantos anos. Por que não fez? Porque não precisou gente, quando meu avô morreu meu tio continuou morando lá, ele cuidava do meu avô e pronto, continuava lá. Ninguém se preocupou com essa questão porque a vida da gente é assim mesmo. Então, também, achar que tudo vem pra um espaço de mercado… provavelmente agora eles querem vender o terreno e não conseguem vender porque não não tem [o inventário], se não o filho dele continuaria vivendo lá, o neto dele continuaria vivendo lá e tava tudo bem né. Então eu acho que é isso, o tempo todo a gente vê a chegada desse formato, desse modelo de propriedade mercantilizada, registrada e tal tomando conta dos espaços. Tanto que, também, a possibilidade de fazer usucapião coletivo, por exemplo, também já existe na legislação a muito tempo e é pouquíssimo utilizada, no meio urbano é pouquíssimo utilizada, acho que no meio rural é um pouco mais, mas no meio urbano pouquíssimo utilizada, também por causa disso… e aí tem uma outra coisa também de necessidade de fortalecimento dos coletivos, então o tempo
todo também, se você pegar.. dá um google, quando o noticiário fala de movimento, associação, cooperativa, qualquer forma coletiva, é sempre pra falar uma denúncia: alguém que roubou dinheiro, alguém que não cumpriu algum estabelecido, alguém que violou alguma coisa, então novamente há uma construção sistemática pra desmontar e desacreditar os coletivos. Então todas as vezes que nós tentamos, e foram várias ao longo desses 30 e tantos anos, falar por exemplo de propriedade coletiva, que é uma das bandeiras que a gente tem no movimento, baseado no cooperativismo uruguaio, na propriedade coletiva da moradia, do conjunto, a gente tem enormes dificuldades. Tem a dificuldade institucional, ou seja, ninguém dá muita bola pra gente, quando a gente fala é “aham, aham, aham” e a gente coloca todas as nossas propostas, todos os nossos documentos… levamos pro Minha Casa Minha Vida “olha, ao invés de fazer no final cada um ter uma casinha vamos todo mundo ser [proprietário]?”. Então não há uma cultura institucional pra isso, mas também não há uma cultura popular pra isso, e eu acho que tem a ver com essas coisas que eu
falei: fortalecimento da casa própria, falta de confiabilidade nas instituições e falta de confiabilidade no próprio coletivo. Há experiências pequenas que acho que são importantes, no Rio nós temos duas cooperativas, uma que chama Herbert de Souza e outra que chama Shangrilá, que são de propriedade coletiva. Qual a característica das duas? Foram feitas sem recursos públicos. Porque nenhuma política apoiou, nunca, qualquer tipo de coisa como essa, tanto na produção habitacional quanto na regularização fundiária de áreas já ocupadas. Eu acho que sim, a gente precisa insistir muito nessas questões, inclusive como os uruguaios, que a gente ouve muito em relação a esse assunto, eles falam pra quebrar uma das questões mais importantes que é a questão da segurança. Porque as pessoas falam assim “Eu quero ter uma propriedade, um imóvel registrado no meu nome, pra deixar pros meus filhos. Pra que ninguém nunca me remova daqui de forma arbitrária”, e aí eles mostram o contrário, quem faz isso são os bancos, ou seja, tem gente que já perdeu casa porque não 205
pagou o financiamento, tem gente que já perdeu o apartamento porque não pagou o condomínio, tem gente que já perdeu casa porque a prefeitura passou uma avenida por cima e não indenizou adequadamente. Então não é o outro, não é o seu vizinho que vai tomar sua casa, quem toma casa são os grandes, os grandes poderes econômicos, e esse é um dos assuntos importantes mas difíceis de tratar. Gustavo: Eu acho que tem todo sentido tudo que você falou, realmente é uma construção social que a gente precisa ir revertendo aos poucos. É um papel muito difícil. Eu tenho uma última questão agora, pra não tomar seu tempo o dia inteiro, queria que você comentasse um pouco o papel da mulher dentro do movimento e como você enxerga a mulher como um impulsionador dos avanços nas políticas sociais. Evaniza: Você sabe que esse assunto de fato tá sendo muito relevante nos últimos tempos, depois eu te mando, nós acabamos de fazer uma publicação bem bonita sobre trajetórias concretas de mulheres que foram trazendo a questão pra dentro do movimento. 206
Acho que tem algumas questões: tem a ação das mulheres no movimento, tem a ação do movimento na mudança de vida das mulheres e tem as pautas de gênero na questão urbana. Acho que são três coisas e três planetas. Porque é isso, o movimento de moradia sempre teve mais mulher do que homem, sempre, a vida inteira, desde as primeiras reuniões de bairro, de ocupações, de comunidades. Tem a ver historicamente com o papel que a mulher desempenha muito mais responsável pelo doméstico, pelo privado, apesar da palavra ‘dona de casa’ não querer dizer ‘proprietária da casa’, mas é que as mulheres são em última forma responsáveis e preocupadas em ter um lugar pra estar, pra estar com seus filhos. Eu sempre brinco com isso, não to generalizando, mas de forma geral, uma mulher não pode ‘sair andando’, assim “ah, cansei. Vou pegar minhas coisas e vou embora hoje”. Não acontece isso, porque ela tem que saber onde é que ela vai levar os filhos, levar as coisas dos filhos, o remédio do filho, a escola do filho, a creche do filho e acaba que ela não ‘sai andando’. O homem pode, o homem de uma certa forma a
sociedade permite, admite, que o homem simplesmente saia de casa. Olha que expressão interessante, é muito difícil você falar “minha mulher saiu de casa” e é muito comum falar “o homem saiu de casa”, normalíssimo alias. Então acho que tem a ver com esse papel, só que claro, você tem uma sub representação política no mundo público, na esfera pública, de que as mulheres ocupam muito menos espaço. Então eu acho que uma coisa importante do movimento de moradia é que acaba sendo uma forma mais efetiva das mulheres entrarem na esfera pública. Quando elas tão tratando da sua luta por moradia, por casa, por creche, por saneamento, por água e esgoto, contra o despejo, seja lá o que for, ela tá justificada, ela pode entrar. O homem pode entrar na política por prazer, por querer participar mais, por querer opinar, querer levar suas ideias, a mulher acaba tendo aí uma justificativa. "Por que você tá entrando nisso?”, pra defender minha casa, pra defender minha família, pra defender as condições de vida da minha família. Então isso acaba sendo uma porta de entrada pra muitas mulheres que não começaram sua militância nem no
sindicato, nem no movimento estudantil. As mulheres do movimento popular entraram na primeira reunião que ela participou na vida dela, foi por uma coisa muito concreta, [por exemplo] pela creche do filho, pelo posto de saúde. E ao longo do tempo o que a gente foi vendo foi essas mulheres assumindo o papel de liderança, assumindo o papel de condução dos processos, e tendo uma empatia melhor. Ela consegue falar melhor com outras mulheres, e como tem mais mulheres no meio, ela fala melhor. Não que o machismo não exista, ao contrário, muitas vezes ele é reforçado até em atitudes internas da própria organização e que ao longo do tempo vão sendo desmontadas, estão sendo desmontadas. Se pensar de quando eu comecei pra hoje, é muito diferente, mas ainda, tanto internamente quanto de fora, você percebe que as pessoas se referenciam nos homens. A gente tem uma brincadeira dentro do canteiro lá do Florestan Fernandes na Tiradentes, porque lá tem a coordenadora de obra que é a Cristiane, têm a arquiteta que é a Renata, tem mais uma funcionária que é administrativa, tem 207
a técnica social que é a Dani, então quem manda lá são essas quatro pessoas digamos num processo de hierarquia. Aí lá dentro tem um menino que é almoxarife, tem o técnico de segurança que é um homem, podia ser uma mulher, mas é um homem. Aí quando chega alguém desconhecido, pode ser alguém do poder público, pode ser um fornecedor, ele vai falar com um dos homens. Ele olha na sala e na cabeça dele identifica que um desses homens é quem tá mandando ali. E aí isso ficou tão escancarado que virou uma piada, agora a gente faz de sacanagem mesmo, quando chega alguém novo a gente não se mexe, deixa ver onde ele vai e cai na gargalhada quando vai no cara errado. E na representação também com o poder público, com autoridades, então eu acho que essa transformação tem sido feita e hoje há um reconhecimento maior dessas mulheres. E nas ocupações do centro é impressionante, porque olha, sinceramente, a maioria dos coordenadores homens fizeram muita merda. Não to generalizando, você tem coordenadores importantíssimos, tem o Sidnei, tem o GG, figuras importantes, mas assim, 208
se você pegar todos os que deu merda lá no Cine Marrocos, no Wilton Paes de Almeida. Porque assim, coordenar ocupação é uma merda, é foda, porque você fica vivendo no limite, no limite das condições físicas, no limite das condições de sobrevivência mesmo. Se você pegar dois baldes de água vai faltar um balde de água pra alguém, e aí precisa de um nível de consciência enorme, mas ao mesmo tempo um nível de organização que fale “meu filho, você não pode pegar dois baldes de água, se você pegar dois baldes de água vai ficar uma família sem”, você não pode… a sua conduta, por exemplo… “eu tenho um filho pequeno e quero colocar um chuveiro no meu quarto”, não você não pode, senão você vai estorar a energia inteira do prédio, a rede elétrica é uma bosta. Não é que seu filho não merece um banho quente, mas é que não pode. Então é preciso uma ação cotidiana que é muito difícil, e não é só ela. Então você tem que brigar pro cara não pegar dois baldes de água e brigar com a polícia que quer levar preso por causa do furto de energia, e aí é pesado, é muito pesado. Então as condições das ocupações… e no prédio eu
falo que é o que a gente tem numa ocupação de favela concentrado, então você comprime, amarra e bota num prédio todas as tensões. Em ocupação de terra é a mesma coisa, como é que você explica pro cara que ele não pode esticar o terreno dele mais dois metros, senão ele vai inviabilizar a urbanização da área depois. Como é que você explica pro cara que ele não pode chutar a marcação do terreno que a outra família fez, que aquela família ainda não começou a fazer o barraco porque ela tá com dificuldade e ele tem que ajudar ela a fazer o barraco. Então todas essas formas da relação da precariedade acaba sendo muito difícil mesmo e que às vezes consome mais o dia a dia do que o próprio enfrentamento à grande questão que é: porque que essa porra dessa sociedade não garante moradia pra todo mundo.
209
Anexo 5: Respostas da entrevista com Luciana Bedeschi Gustavo: Como se iniciou seu contato com o movimento? Luciana: Se iniciou em 2000, no movimento sem terra, MST, no noroeste do estado do Paraná. Em 2002, ingressei no centro Gaspar Garcia de direitos humanos, centro de São Paulo, quando conheci os movimentos da região central. Gustavo: Quando e onde surgiu a ideia da PPPop? Luciana: Surgiu como uma alternativa à PPP (parceria público privada) desta vez com os movimentos populares. Gustavo: Quais legislações estruturam a defesa da PPPop como um programa habitacional? Luciana: A Constituição Federal, marco legal das ONGs e a Lei Municipal da autogestão. 210
Gustavo: Como é a relação dos órgaos públicos no desenvolvimento dessa parceria? Luciana: Há muitos limites burocráticos e orçamentários, porém os órgãos públicos recebem com interesse a proposta. Gustavo: Já existem práticas como a PPPop sendo desenvolvidas em outros lugares do Brasil ou do mundo? Luciana: Entendo que todo trabalho social em que há parceria e autonomia pode ser considerada uma prática de PPPop. Gustavo: O vínculo legal gerado pela PPPop é para com o movimento como um todo ou com a ocupação específica em que a parceria se desenvolve? Luciana: Depende do grupo e de cada caso concreto. Gustavo: Existe algum levantamento ou uma expectativa quantitativa de atendimento habitacional
por meio da PPPop a curto ou longo prazo? Luciana: Numa expectativa quantitativa não faço ideia e não vejo a PPPop numa perspectiva quantitativa, mas sim qualitativa. Gustavo: A PPPop tem como objetivo suprir a demanda habitacional ou abrir novos meios para a política habitacional? Luciana: Creio que ambos. Não creio que supre porque o déficit é enorme, mas a PPPop pode ser mais uma opção de atendimento. Sobretudo às ocupações organizadas e consolidadas. Gustavo: Como você enxerga o papel das mulheres para o avanço das políticas habitacionais e manutenção dos movimentos sociais? Luciana: Elas abrem muitos caminhos e são muito capacitadas. Têm ótima desenvoltura para articular com o poder público e sensibilidade no tratamento da sua demanda. 211
Anexo 6: Valores e dimensões das unidades habitacionais do empreendimento 7 de Abril
212
PVTO 1 1 1 1 1
ID_T APTO E11 E12 E13 E14 E15
AREA m² 33,11 29,10 41,46 48,67 47,41
TIPOLOGIA QUITINETE QUITINETE 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO
VALOR DA UH R$ 240.354,43 R$ 211.244,75 R$ 300.969,33 R$ 353.308,67 R$ 344.161,99
PNE Não Não Não Não Não
1 1 1 1 2
N11 N12 N13 N14 E21
54,45 54,45 37,53 37,53 44,69
2 2 1 1 1
R$ R$ R$ R$ R$
Não Não Não Não
2 2 2
E22 E23 E24
28,50 44,23 49,89
QUITINETE 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO
R$ 206.889,19 R$ 321.077,51 R$ 362.164,97
Não Não Não Não
2 2 2 2 2
E25 N21 N22 N23 N24
37,88 54,45 54,45 37,53 37,53
QUITINETE 2 DORMITORIOS 2 DORMITORIOS 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO
R$ R$ R$ R$ R$
274.981,14 395.267,25 395.267,25 272.440,40 272.440,40
Não Não Não Não Não
3 3 3
E31 E32 E33
33,11 28,50 44,23
QUITINETE QUITINETE 1 DORMITORIO
R$ 240.354,43 R$ 206.889,19 R$ 321.077,51
Não Não
3 3 3
E34 E35 N31
49,95 37,86 42,80
1 DORMITORIO QUITINETE 1 DORMITORIO
R$ 362.600,53 R$ 274.835,96 R$ 310.696,75
Não Sim Não Não
3 3 3 4 4
N32 N33 N34 E41 E42
42,80 30,60 37,53 44,69 28,50
1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO QUITINETE
R$ R$ R$ R$ R$
310.696,75 222.133,66 272.440,40 324.416,77 206.889,19
Não Não Não Não Não
4 4 4
E43 E44 E45
44,23 49,89 37,88
1 DORMITORIO 1 DORMITORIO QUITINETE
R$ 321.077,51 R$ 362.164,97 R$ 274.981,14
Não Não
4 4 4 4 5 5 5 5 5 5 5
N41 N42 N43 N44 E51 E52 E53 E54 E55 N53 N54
42,80 42,80 37,53 37,53 44,69 28,50 44,23 49,89 37,88 37,53 37,53
1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO QUITINETE 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO QUITINETE 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO
R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$
DORMITORIOS DORMITORIOS DORMITORIO DORMITORIO DORMITORIO
395.267,25 395.267,25 272.440,40 272.440,40 324.416,77
310.696,75 310.696,75 272.440,40 272.440,40 324.416,77 206.889,19 321.077,51 362.164,97 274.981,14 272.440,40 272.440,40
Não Não Não Não Não Não Não Não Não Não Não Não
PVTO
ID_T APTO
AREA m²
TIPOLOGIA
VALOR DA UH
PNE
6 6
E61 E62
37,11 28,50
QUITINETE QUITINETE
R$ 269.391,51 R$ 206.889,19
Não Não
6 6
E63 E64
44,23 49,92
1 DORMITORIO 1 DORMITORIO
R$ 321.077,51 R$ 362.382,75
Não Sim
6 6
E65 N61
37,88 42,80
QUITINETE 1 DORMITORIO
R$ 274.981,14 R$ 310.696,75
Não Não
6
N62
43,13
1 DORMITORIO
R$ 313.092,31
Não
6 6
N63 N64
30,60 37,53
1 DORMITORIO 1 DORMITORIO
R$ 222.133,66 R$ 272.440,40
Não Não
7
E71
44,68
1 DORMITORIO
R$ 324.344,18
Não
7 7
E72 E73
28,51 44,23
QUITINETE 1 DORMITORIO
R$ 206.961,78 R$ 321.077,51
Não Não
7 7
E74 E75
49,93 37,88
1 DORMITORIO QUITINETE
R$ 362.455,35 R$ 274.981,14
Não Não
7 7
N71 N72
42,80 42,80
1 DORMITORIO 1 DORMITORIO
R$ 310.696,75 R$ 310.696,75
Não Não
7 7 8
N73 N74 E81
37,53 37,53 44,68
1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO
R$ 272.440,40 R$ 272.440,40 R$ 324.344,18
Não Não Não
8 8
E82 E83
28,51 44,23
QUITINETE 1 DORMITORIO
R$ 206.961,78 R$ 321.077,51
Não Não
8 8 8
E84 E85 N81
49,94 37,88 42,80
1 DORMITORIO QUITINETE 1 DORMITORIO
R$ 362.527,94 R$ 274.981,14 R$ 310.696,75
Não Não Não
8 8 8 9 9 9 9 9 9
N82 N83 N84 E91 E92 E93 E94 E95 N91
42,80 37,53 37,53 33,10 28,51 44,23 49,93 37,88 42,80
1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO QUITINETE QUITINETE 1 DORMITORIO QUITINETE QUITINETE
R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$
310.696,75 272.440,40 272.440,40 240.281,83 206.961,78 321.077,51 362.455,35 274.981,14
Não Não Não Não Não Não Não Não
9 9 9 10 10 10 10 10 10 11
N92 N93 N94 E101 E102 E103 E104 N101 N104 E111
43,13 30,60 37,53 44,72 27,64 50,02 68,44 42,80 37,53 45,07
1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO QUITINETE 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO 1 DORMITORIO
R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$
310.696,75 313.092,31 222.133,66 272.440,40 324.634,55 200.646,22 363.108,68 496.824,43 310.696,75 272.440,40 327.175,29
Não Não Não Não Não Não Não Não Não Não
11 TERREO TERREO TERREO
E112 E1 E2 E3
50,64 100,24 47,08 80,89
1 DORMITORIO AREA CONDOMINIAL AREA COMERCIAL AREA COMERCIAL
R$ 367.609,43 não se aplica não se aplica não se aplica
Não Não Não Não Não
213