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Compreendendo um novo paradigma na gestão das organizações. Alan Melo Marinho de Albuquerque
COMPREENDENDO UM NOVO PARADIGMA NA GESTÃO DAS ORGANIZAÇÕES
Alan Melo Marinho de Albuquerque*
Resumo: Nos últimos anos, as organizações começaram a ser pressionadas e viram sua própria sobrevivência em risco a partir de mudanças, decorrentes do acirramento da competição em nível internacional, do surgimento da microinformática e do trabalho em rede, do avanço das telecomunicações, da globalização financeira, desregulamentação e das exigências crescentes dos consumidores, que se tornaram muito mais exigentes. Organizações rigidamente funcionais, estruturadas em funções verticais e hierarquizadas, não davam mais conta de uma realidade em que a flexibilidade passou a ser um dos requisitos mais importantes para o sucesso.
Palavras-chave: estratégia; processos; pessoas.
Introdução
As organizações descobriram que se administravam funcional e verticalmente, mas sempre operaram horizontalmente e seus resultados, ou seja, os produtos e serviços que ofereciam ao mercado e à sociedade, eram saí�das geradas por processos. E mais que isso, processos interfuncionais e horizontais, decorrentes do trabalho conjunto de muitas funções ou departamentos. O que era administrado verticalmente, na prática ocorria horizontalmente. Portanto, a qualidade e a competitividade do que produziam dependiam da qualidade de seus processos. E ideias que nos parecem banais e óbvias começaram a ser difundidas por teóricos da administração como grandes descobertas. “A verdadeira adição de valor aos produtos e serviços é gerada na dimensão dos relacionamentos interdisciplinares ou do fluxo horizontal das atividades” - C. G. Rutte (1990). “Sistemas horizontais não apenas melhoram a velocidade de resposta ao mercado e a capacidade da empresa em prover produtos de massa personalizados, mas também aumentam a eficiência e eficácia dos macroprocessos” - Bointon e Victor (1991).
O redesenho dos processos passou a ser, então, uma das maiores preocupações das organizações públicas e privadas. Peter Drucker argumenta que apenas quando algo está estabelecido como disciplina sistemática ou processo organizável, a ideia realmente causa impacto, mesmo que haja o perigo de que as pessoas venham a enxergar isso como a solução para todos os problemas.
A adoção do Gerenciamento dos Processos é passo definitivo para transformar a organização funcional em sistema processador de produtos e serviços, capaz de reagir e se readaptar rapidamente às mudanças no ambiente. É� elemento necessário, mas não suficiente.
A abordagem do Sincronismo Organizacional vem, muitos anos depois, estabelecer equilí�brio necessário entre as três variáveis fundamentais de qualquer organização: estratégia, processos e pessoas.
Embora o alvo principal deva ser a mudança radical do modelo de gerenciamento verticalizado tradicional, focado nas funções, para o gerenciamento horizontal das organizações, isto não pode se limitar ao redesenho dos processos.
* Alan Melo Marinho de Albuquerque: Sociólogo, Professor Convidado da Fundação Dom Cabral e sócio da RBG Consultores Empresariais S/C Ltda. Endereço eletrônico: alanmelo@terra.com.br
O ambientalista do século XIX John Muir ressaltou que cada componente do ecossistema está, de uma forma ou de outra, ligado a todos os outros componentes. O famoso caso do peixe caracol, em 1981, que acabou suspendendo a construção do reator de Clinch River, nos Estados Unidos, tornou-se icônico e não disse respeito apenas a pequeno peixe que nos afeta muito pouco. Disse respeito a mexer em pequena peça do mosaico ambiental. Cada peça removida altera, mesmo que de forma mí�nima, o equilí�brio do quadro.
Da mesma forma, nossa abordagem entende que tudo no “ecossistema” interno e externo de uma organização (clientes, produtos e serviços, sistemas de recompensa, tecnologia, estrutura da organização, processos de trabalho e assim por diante) está conectado. Para melhorar o desempenho de um desses elementos e dos indiví�duos, precisamos entender essas conexões. O mosaico atual pode não representar quadro muito bonito, porém é um quadro. O quadro só poderá ser mudado ou ampliado por abordagem holí�stica que reconheça a interdependência das Variáveis de Desempenho.
O Mapa de Contexto mostrado a seguir, no Quadro 1, descreve a organização não mais como conjunto de funções, mas como sistema integrado, visando a transformar insumos e entradas em saí�das significativas para o mercado e clientes individuais (no caso de empresas privadas) ou para comunidades, a sociedade como um todo ou cidadãos individuais (no caso de organizações públicas).
Esse enfoque oferece a chave para abordagem global da organização, através de ação conjugada nos três elementos, ou Três Ní�veis de Desempenho, que garantem a qualidade da performance organizacional – o ní�vel estratégico, o ní�vel dos processos e o ní�vel do trabalho, ou seja o desempenho das pessoas.
Quadro 1
Fonte: Do autor.
Obtemos o Sincronismo Organizacional quando os indicadores de desempenho estão integrados, ou seja, com o alinhamento entre os indicadores estratégicos, dos processos e das pessoas. E quando falamos em indicadores, nos referimos especialmente aos indicadores de prazo (t), financeiros ($) e de qualidade (q), como explicado no Quadro 2 a seguir.
O esforço para transformar sua organização num sistema sincronizado deve começar idealmente de cima para baixo, ou seja, por meio de empreendimento assumido pela cúpula da organização, que deve necessariamente formular ou revisar a estratégia, estabelecendo claramente indicadores a serem perseguidos no futuro, em horizontes de tempo determinados.
Em seguida, os processos crí�ticos, aqueles que, pelos seus resultados, efetivamente realizam na prática a estratégia formulada, devem ser analisados, mapeados, reformulados e gerenciados a partir de indicadores de desempenho alinhados e desdobrados dos indicadores estratégicos. Mas lembramos que estes processos são operados e gerenciados por pessoas, que precisam ser orientadas e capacitadas em relação às mudanças ocorridas no processo (o ideal é que sempre que possí�vel tenham participado da definição destas mudanças). Além disso, é fundamentel que essas pessoas tenham indicadores de desempenho desenvolvidos a partir dos indicadores dos processos em que atuam, garantindo desta forma o desdobramento e coerência entre os três ní�veis de indicadores (estratégia-processos-pessoas).
Sequencialmente, Quadro 3 mostra a sequência da implantação do Sincronismo Organizacional.
Sincronismo Organizacional significa na prática, de maneira simples, o modo pelo qual podemos efetivamente voltar a organização para o cliente ou usuário, garantir qualidade e produtividade nos principais processos organizacionais, obter maior agilidade e objetividade nas decisões e, enfim, transformar radicalmente nossas organizações no sentido de torná-las de fato mais competitivas ou efetivas no cumprimento de sua missão.
Quadro 2
Fonte: Do autor.
Quadro 3
Fonte: Do autor.
Compreendendo as transformações no ambiente de negócios
Não é mais novidade que as organizações precisam responder com velocidade e foco às circunstâncias e turbulências do ambiente, agindo com flexibilidade para mudar de rumo a todo instante, capacitandose a fazer cada vez mais com cada vez menos recursos, desenvolvendo o aprendizado da organização para lidar com todas essas variáveis, propiciando o crescimento individual e a potência das pessoas que nela trabalham.
Certamente, o que está por trás disso não é apenas o fenômeno das mudanças pelas quais o mundo dos negócios está passando, mas, principalmente, a natureza das mudanças que estão ocorrendo. Como sugerem, já em 1990, George Land e Beth Jarman, especialistas na questão das transformações organizacionais, não é apenas a velocidade, a complexidade, a turbulência e a imprevisibilidade que caracterizam as mudanças de hoje, em relação às de outrora. O que torna a mudança de hoje realmente diferente é que ela é impelida pelo futuro e não mais pelas circunstâncias do passado.
Torna-se necessário, portanto, rompermos com os padrões estabelecidos no passado, possibilitando repensar de maneira profunda a razão da própria existência da organização, questionando, radicalmente a sua forma de funcionamento, assumindo circunstâncias totalmente novas, de maneira prática e profunda.
Compreendendo a evolução das práticas de gestão
Durante muitos anos, nossas organizações foram orientadas para funcionar sobre a batuta de rí�gidas hierarquias, utilizadas principalmente como instrumento de controle do trabalho dos indiví�duos e, por consequência, para garantir a entrega dos produtos e serviços oferecidos aos nossos clientes.
A rigidez e a complexidade das estruturas organizacionais levaram muitas empresas a concentrarem poder em alguns poucos executivos de seu mais alto escalão e a perderem agilidade e competitividade. Sintomaticamente, Robert M. Tomasko (1994) lembra que, durante séculos, grandes organizações se estruturam em forma de pirâmides: a estrutura que os antigos egí�pcios utilizavam para sepultar seus lí�deres mortos.
De hoje e para o futuro, o controle administrativo poderá ser exercido em rede, com o suporte de sistemas informatizados e pela automação dos processos de trabalho. O que se requer das pessoas que integram uma organização é conhecimento, competência e comprometimento efetivo.
Essa abordagem metodológica considera muito relevantes quatro ideias-chave. A primeira delas é que se torna fundamental
repensar “por que a empresa faz o que faz” e também “porque faz isso desse jeito”. Aí� reside a ideia de romper com o passado e pensar como as coisas deveriam ser (Land, 1990), independentemente de como estão sendo feitas nas circunstâncias atuais. A segunda ideia básica desenvolvida é que a mudança precisa ser radical, jogando fora os paradigmas existentes e concebendo maneiras totalmente novas de realizar o trabalho organizacional. A terceira ideia é que as transformações precisam ser dramáticas, no sentido de superar ganhos marginais ou incrementais. A quarta ideia é o foco na melhoria dos processos: tudo que as organizações produzem é resultado de processos horizontais e interfuncionais e, no entanto, de modo geral elas são orientadas por funções, tarefas, estruturas, mas não por processos. Esta ideia já havia sido exposta anteriormente por Rummler e Brache (1988).
De fato, a razão fundamental que torna obsoleta a forma de administrar as organizações atualmente é a visão vertical tradicional sobre a qual ainda se baseiam suas estruturas e os organogramas.
Geary Rummler e Alan Brache (1992), consultores americanos que foram pioneiros na formulação de metodologia prática para Gerenciamento por Processos, explicam que muitos executivos não compreendem claramente seus negócios porque não entendem com o devido ní�vel de detalhe como suas organizações desenvolvem, produzem, distribuem e entregam seus produtos e/ou serviços. Isso porque, à medida em que as organizações crescem e se tornam mais complexas, os gerentes tendem a enxergar apenas o limite de suas funções e não a organização como um todo. Nesse modelo, torna-se mais difí�cil perceber como cada parte efetivamente contribui para agregar valor ao cliente. As funções tornam-se então mais importantes do que os clientes e as responsabilidades se perdem entre os departamentos.
Segundo Rummler e Brache, essa mentalidade produz “silos” dentro das organizações, de modo que os “feudos” em que se transformam os departamentos reduzem o desempenho da organização como um todo. Tentativas de “reestruturar” a empresa, mudando as “caixinhas” do organograma, geralmente resultam em esforços frustrados. A principal razão disso tudo, segundo os autores, é que “ninguém administra os espaços em branco do organograma”.
A cultura dos “silos”, na visão de Rummler e Brache, força os gerentes a resolver assuntos que poderiam ser tratados nos ní�veis mais baixos da organização, o que leva, inclusive, os subordinados a assumir menor responsabilidade do que efetivamente poderiam. A esse fenômeno os autores chamam de “remanaging”.
A abordagem inovadora está na visão horizontal dos processos organizacionais e não mais na visão vertical tradicional. A visão de processos permite determinar como a organização de fato agrega valor ao cliente, como os produtos e serviços são gerados, de que forma o trabalho é feito realmente e como o fluxo de informações e materiais acontece no tempo. Afinal, o cliente não quer saber como está organizada a Diretoria de Operações ou a Diretoria Técnica de seu fornecedor. Ele quer saber como vai ser atendido, qual a qualidade final do produto ou serviço etc.
Sincronismo Organizacional significa, portanto, voltar a empresa para seus Processos Organizacionais mais importantes, partindo de necessidades estratégicas bem definidas. Aliás, é por isso mesmo que os resultados obtidos pelo Sincronismo Organizacional costumam ser expressivos e os saltos qualitativos e quantitativos costumam ser bastante significativos em termos de produtividade e rentabilidade da organização. O foco nos Processos Organizacionais e nas interações funcionais, além do conhecimento e do comprometimento das pessoas, passa a ser preponderante em relação às rí�gidas hierarquias quando se trata de fazer as coisas acontecerem.
Como as organizações estão se redesenhando ?
Embora a maioria das abordagens passe pela transformação dos processos atuais (“Processos Como São”) em processos totalmente diferentes (“Como Deveriam Ser”), existem outros elementos importantes a considerar.
De acordo com Peter Drucker, com relação à reconfiguração de processos organizacionais completos “... isso se refere à questão fundamental sobre qual trabalho uma organização deveria fazer, em vez da questão mais simples de como fazê-lo” de maneira melhor.
Antes de focalizar os processos gerenciais e questionar porque e como fazemos determinadas coisas dentro da organização, é preciso reflexão fundamental e profunda sobre “O Que” a organização faz e “Por que” faz, isto é, o que verdadeiramente oferecemos aos clientes e porquê. Isso implica na prática em rever as estratégias e descobrir quais são as chamadas Questões Estratégicas Crí�ticas para os negócios, nas atuais circunstâncias.
Como as circunstâncias mudam com frequência e os desafios competitivos mudam constantemente, também os processos organizacionais precisam ser reconcebidos e a maneira como fazemos o trabalho na maioria das vezes também precisa mudar. Torna-se portanto necessário identificar quais são os Processos Organizacionais - Chave para aquelas circunstâncias. A tarefa então é determinar com clareza onde esses processos começam, onde terminam, como se interrelacionam etc. O grande desafio é estabelecer metas de desempenho que permitam obter um salto qualitativo e quantitativo bastante significativo em termos de resultados.
Para o sucesso de qualquer esforço de implantação do Sincronismo Organizacional, é necessário, portanto, ter em mente uma razão estratégica muito clara e definida. Tendo isso claro, a próxima pergunta, no Ní�vel dos Processos Gerenciais, é: “os processoschave são orientados pelos requisitos dos clientes e pela estratégia da organização?”. Neste ponto é que se trata, então, de identificar “Como São” os processos atuais e radicalmente repensar como os processos “Deveriam Ser”.
À� primeira vista pode parecer insuficiente pensar que o simples questionamento e redefinição dos processos de trabalho possa produzir transformação fundamental, radical e dramática na organização.
Acontece que a essência do trabalho é que ele seja efetuado por equipes interfuncionais, envolvendo de maneira coerente e planejada as várias áreas da organização que participam da execução dos processos-chave selecionados. A atribuição de poder a diferentes departamentos e a diversos colaboradores em distintos ní�veis hierárquicos para produzirem transformações radicais na empresa gera um efeito extraordinário, se bem administrado, no que tange ao comprometimento e envolvimento das pessoas na solução de seus próprios problemas.
Devido à importância dos indiví�duos nos processos e de seu comprometimento efetivo com os resultados esperados, tornase necessário aprofundar o redesenho até o Ní�vel de Cargo (Postos de Trabalho), estabelecendo-se de comum acordo com as várias equipes envolvidas na redefinição de cada processo os medidores qualitativos e quantitativos de performance das pessoas.
O estabelecimento de medidas de desempenho é essencial. Steven M. Hronec (1994) considera que elas são “sinais vitais” da organização e quantificam o modo como um processo atinge um resultado especí�fico. Esses “sinais vitais” mostram às pessoas o que elas estão fazendo e como estão se saindo. O comprometimento dos integrantes dos cargos-chave em cada processo deve produzir resultados extraordinários, principalmente porque esses compromissos não estão sendo estabelecidos apenas entre
chefe-subordinado, mas principalmente entre os indiví�duos e a organização como um todo.
Para resumir, os passos necessários para execução de esforço de implantação do Sincronismo Organizacional bem sucedido devem ser os seguintes:
1- repensar de maneira profunda a estratégia da organização, questionando o que e porque fazemos o que fazemos, estabelecendo metas e indicadores de desempenho estratégicos; 2- identificar os Fatores Crí�ticos do Sucesso e as Questões Estratégicas Crí�ticas da organização para obtermos saltos expressivos de competitividade e desempenho nas circunstâncias; 3- identificar os processos organizacionais-chave diretamente relacionados com as Questões Estratégicas Crí�ticas da empresa; 4- eleger prioridades entre os processos organizacionais-chave e escolher os mais importantes; 5- escolher as equipes interfuncionais adequadas às circunstâncias dos processos selecionados; 6- treinar as equipes para o trabalho de redesenho, fornecendo os conceitos e ferramentas necessários às atividades dos grupos de trabalho; 7- identificar e analisar “Como É� ” cada um dos processos-chave selecionados; 8- redesenhar o processo “Como Deve Ser”, eliminando atividades que não agregam valor, incluindo atividades necessárias, corrigindo as rupturas que provocam retrabalho e perda de qualidade nas saí�das do processo, automatizando atividades com a utilização adequada dos recursos de Tecnologia da Informação e estabelecendo um Sistema de Medição do desempenho do processo e das funções envolvidas com ele. 9- conduzir e sustentar a implementação das mudanças ao longo de todo o trabalho de redesenho; 10- promover a aprendizagem das equipes interfuncionais e o comprometimento da cúpula da organização durante todo o processo de redesenho, de maneira a criar cultura permanente de gerenciamento de processos organizacionais.
A tecnologia da informação como indutora de mudanças
Um dos fatores que tem impulsionado o redesenho dos processos é a possibilidade de automação de atividades, com aumento da agilidade, redução do tempo e facilidade para monitoração dos passos do processo (e, consequentemente maior qualidade no seu gerenciamento). Mas para que se possa obter todo o impacto positivo da Tecnologia da Informação, é a mudança de paradigma vigente nas organizações: a passagem do pensamento dedutivo para o indutivo.
No pensamento dedutivo, os gerentes partem do processo existente e buscam a otimização das tarefas já realizadas (foco na eficiência operacional). Com isso, automatizam-se atividades, integram-se sistemas, criam-se sistemas de medição do desempenho. No entanto, o pensamento dedutivo leva as pessoas a ignorarem os aspectos realmente importantes e a se entusiasmarem com soluções muitas das vezes triviais. O grande erro das organizações, neste caso, é ver a Tecnologia da Informação através da lente dos processos existentes. A pergunta-chave é sempre: “como podemos aproveitar as novas capacidades tecnológicas para melhorar o que fazemos atualmente?”
Já no pensamento indutivo, parte-se das novas capacidades tecnológicas disponí�veis para identificar novas formas de fazer as coisas ou passar a fazer o que não se está fazendo ainda, ou mesmo deixar de fazer atividades antes consideradas muito importantes. O foco principal é na inovação, onde a pergunta norteadora passa a ser: “como podemos aproveitar as novas capacidades tecnológicas para fazer
aquilo que não estamos fazendo ainda?” O grande poder da Tecnologia da Informação, portanto, não está em fazer antigos processos funcionarem melhor, mas em permitir que as organizações rompam com as antigas regras e criem novas formas de trabalho. Com isso, é possí�vel induzir demanda a partir de novas ofertas: as pessoas nem sempre sabem que desejam algo, até verem a possibilidade de tê-lo; aí�, elas sentem que não podem viver sem aquilo.
Nesse novo contexto do pensamento indutivo, a Tecnologia da Informação disponibiliza recursos (bancos de dados, workflow, acesso remoto, etc) que possibilitam a criação de alternativas inovadoras e a simulação dos impactos na organização.
Evitando insucessos e frustrações
Por ser tecnologia fortemente baseada na aprendizagem organizacional, dificilmente se poderia aplicar simples check-list para evitar aborrecimentos ao empreender esforço desse tipo na empresa. Contudo, alguns elementos de reflexão podem ser colocados como alerta.
A primeira consideração a fazer, de acordo com nossa experiência, não está nem na tecnologia em si, mas exatamente no reconhecimento de que o Sincronismo Organizacional deve ser efetivamente introduzido como processo de aprendizagem. Não existem soluções mágicas que possam ter efeito duradouro. É� essencial que a organização como um todo - e as equipes envolvidas no trabalho, em especial - esteja treinada e preparada para utilizar esse modelo de gestão, sob o risco de depositar sobre ela mais uma esperança de mudança organizacional com tí�midos resultados práticos.
Como ensina Peter Senge (1990), um dos mais célebres especialistas na questão da aprendizagem organizacional, algumas considerações importantes devem ser feitas nestes casos:
1- é essencial adotar visão sistêmica do processo, de modo que não faz muito sentido desenvolver esforço de redesenho para melhorar um departamento ou função especí�fica da empresa; 2- romper com os modelos mentais préestabelecidos é condição básica para que o Sincronismo Organizacional faça sentido; redefinir processos tomando como base concepções do passado certamente levará a resultados pobres e de pouca criatividade e inovação; 3- as equipes interfuncionais envolvidas no esforço de redesenho têm uma oportunidade extraordinária para obter visão compartilhada do que seja o futuro da organização e sua forma adequada de gerar produtos e serviços para superar expectativas dos clientes; 4- “a unidade fundamental de aprendizagem nas organizações é o grupo e não os indiví�duos” (Senge, 1990): a organização só será capaz de vivenciar o Sincronismo Organizacional se as equipes interfuncionais aprenderem a dialogar e a gerenciar processos em conjunto; essa é a maneira para poder fazer a organização enxergar além das perspectivas e concepções individuais de cada funcionário.
Conclusão
Na visão de Charles M. Savage (1990), a grande mudança está fundamentada na provável mudança do papel a ser atribuí�do às “caixinhas do organograma” das organizações no futuro: ao invés de identificar o poder e a autoridade das pessoas, deverão representar os centros de conhecimento e excelência da organização.
Além disso, é preciso ter claro que os bons resultados do Sincronismo Organizacional somente são obtidos quando envolvemos não apenas um, mas todos os principais processos-chave da empresa. Isso implica necessariamente partir de visão estratégica clara sobre os negócios e resolver através do gerenciamento por processos as questões estratégicas mais relevantes nas circunstâncias de cada organização.
Embora os ganhos com o redesenho dos processos possam ser substanciais, mais importante do que um grande efeito momentâneo e passageiro é a introdução de cultura permanente de melhoria contí�nua da habilidade de gerenciar a organização por processos.
Para redefinir processos é preciso adotar postura radical, criativa e inovadora. Porém isso não significa jogar fora a experiência e a cultura da organização como insumo para a aprendizagem.
Finalmente, é preciso considerar que o Sincronismo Organizacional somente se sustenta, como qualquer tecnologia ou ferramenta de gestão, se puder ser absorvida pela cultura da empresa através de processo de efetivo aprendizado (Tobin, 1993).
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Referências bibliográficas
ALBUQUERQUE, Alan; ROCHA, Paulo. Sincronismo organizacional. São Paulo: Saraiva, 2007. BRACHE, Alan; POPOFF, Frank. The seven deadly sins of process improvement. New Jersey: Rummler Brache Group, 1994. CHAMPY, James. Reengenharia da gerência. Rio de Janeiro: Campus, 1995. DAVENPORT, Thomas H. Reengenharia de processos. Rio de Janeiro: Campus, 1995. Peter Drucker dá aval a uma nova idéia ... GAZETA MERCANTIL, São Paulo, 24 jun. 1993. HAMMER, Michael; CHAMPY, James. Reengenharia: revolucionando a empresa. Rio de Janeiro: Campus, 1994. HAMMER, Michael; CHAMPY, James. Reengineering the corporation: a manifesto for business revolutio. New York: Harper Business, 1993. HARRINGTON, H. J. Aperfeiçoando processos empresariais. São Paulo: Makron Books, 1993. HRONEC, Steven M. Sinais vitais. São Paulo: Makron Books, 1994. LAND, George; JARMAN, Beth. Ponto de ruptura e transformação. São Paulo: Cultrix, 1990. RUMMLER, Geary; BRACHE, Alan. Melhores desempenhos das empresas: ferramentas para melhoria da qualidade e da competitividade. São Paulo: Makron Books, 1992. SAVAGE, Charles M. 5th Generation management: integrating enterprises through human networking. Bedford: Digital Press, 1990. SENGE, Peter. The fifth discipline: the art and practice of the learning organization. New York: Doubleday Currency, 1990. TOBIN, Daniel R. Re-educating the corporation. New London: Oliver Wight Publications, 1993. TOMASKO, Robert M. Rethinking: repensando as organizações. São Paulo: Makron Books, 1994.
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Entrevista A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO SER... DESENVOLVIDO!
William Resende de Castro Junior*
William Resende de Castro Junior, nasceu na cidade de Barra Mansa, no RJ. Tem vasta experiência, atuou como Secretário de Planejamento do Município onde nasceu, Subsecretário estadual de Planejamento no Rio de Janeiro, Coordenador do Pronasci RJ – Ministério da Justiça. Participou como técnico e coordenador em trabalhos de finanças municipais, orçamento público, transporte, meio ambiente, desenvolvimento local, segurança pública, urbanismo e assistência social. Desde 2015, tem visitado dezenas de cidades em canoa, lancha, avião e carro. Atualmente é um dos coordenadores da equipe do IBAM para a revisão do Plano Diretor de Porto Velho.
RAM - Que tipo de trabalho você tem desenvolvido no IBAM?
William - Entre 2015 e 2018, participei do Programa de Qualificação da Gestão Ambiental nos Municí�pios do Bioma Amazônia. Voltado a técnicos ambientais, secretários de meio ambiente e Vereadores, capacitou equipes de licenciamento e monitoramento ambiental descentralizado, partilhou boas práticas ambientais e de gestão, desenvolveu mecanismos de articulação técnicoinstitucionais, sensibilizou as Câmaras e Vereadores ao tema ambiental. Trabalhando em parceria com as estruturas ambientais estaduais, estive no foco das discussões sobre ambiente e desenvolvimento local.
Nestes últimos 12 meses, participei ativa e diretamente da revisão do Plano Diretor de Porto Velho, a mais extensa capital brasileira, maior que Alagoas e Sergipe. Cortada pelo magní�fico Rio Madeira, mergulhada na floresta, nasceu com a histórica Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, possuindo enormes hidrelétricas, terras indí�genas, reservas florestais, gado e produção de grãos, além de meio milhão de moradores urbanos e rurais.
RAM - O que o anima nesses trabalhos?
William - Nas viagens que realizei àquelas
William Resende de Castro Junior
cidades da Amazônia, encontrei e conversei com milhares de Vereadores e centenas de secretários e Prefeitos sobre a relação entre meio
* William Resende de Castro Junior: Engenheiro e assessor técnico do IBAM. Endereço eletrônico: bill.resende@ibam.org.br
ambiente e planejamento e desenvolvimento. Tive oportunidade de conhecer conflitos, falsos dilemas e experiências de desenvolvimento local.
Os conflitos, mais do que apenas ambientais, decorrem da disputa pelo uso e propriedade da terra amazônica. Aos que exploram a floresta respeitando seus ciclos, redescobrindo os potenciais florestais não-madeireiros, farmacológicos e gastronômicos, pode bastar a propriedade coletiva ou pública. Já à pecuária e à produção de grãos para exportação, importa a grande propriedade privada, obtida em muitos casos por grilagem de terras públicas com desmatamento ilegal, venda de madeira, inserção de gado e posterior plantio de grãos. As disputas entre esses grupos têm se mostrado sangrentas e criminosas.
Um clássico falso dilema contemporâneo contrapõe o uso da floresta em pé - que interessa a quase todos - e o desenvolvimento econômico, como se um excluí�sse o outro. Pude constatar que a extração de açaí�, babaçu, castanha, frutas nativas e plantadas, mandioca e farinha pode gerar, e gera, trabalho e renda para muitos, pois necessita de mão de obra intensiva e produz valores significativos por hectare explorado e plantado, bastando, para que floresça, de investimentos menores que os despendidos com o agronegócio exportador. A pecuária extensiva e o plantio de grãos exportáveis, ao contrário, necessita de poucos trabalhadores, gerando valores menores por hectare utilizado e que ficam concentrados apenas com o proprietário. Parece estar aí� o “X” da questão: a floresta gera mais riqueza dividida para muitos, enquanto a dupla gado/ grãos cria menos riqueza e para poucos.
O que me anima e empolga é perceber que tenho participado de processos que podem colocar em nossas mãos tudo o que precisamos para tornar real o esperado e necessário desenvolvimento local.
RAM - Quais experiências na Amazônia podem ensinar sobre desenvolvimento local? William - No oeste do Amazonas, no Vale do Rio Içana, a etnia Baniwa-Coripaco criou um Plano de Desenvolvimento Local respondendo coletivamente à seguinte pergunta: “O que a gente precisa para viver e estar bem no mundo?” Listaram os recursos necessários ao desejado estilo de vida, calcularam as quantidades necessárias a todos, resgataram as boas práticas que garantiriam a existência futura dos recursos, desenharam e escreveram tudo. E avaliam os resultados periodicamente. Eis, na prática, o verdadeiro sonho de consumo de gestores públicos não acomodados! Sonhar juntos, planejar coletivamente, implantar o planejado e monitorar o resultado.
Em Xapuri, Municí�pio do Acre, dois planos de manejo da Reserva Extrativista Chico Mendes foram construí�dos de maneira distinta. O primeiro Plano, envolvendo todos os seringueiros, ribeirinhos e indí�genas, durante meses de elaboração coletiva, era usado e relembrado quando surgia uma dúvida ou um conflito. Para solucioná-los, os moradores procuravam sua cópia já surrada, em gavetas e armários, em busca dos acordos construí�dos. Já o segundo plano, atualizado mais recentemente com método afastado da cultura local, com uso de mediadores apressados, envolvendo apenas representantes dos moradores, continua novinho, dentro da mesma gaveta, mas sem uso.
Em Porto Velho, na Resex Lago do Cuniã, conheci atividade coletiva de coleta de castanha, pesca de pirarucu e a única operação de captura legal de jacarés nativos no Brasil. Os moradores estão organizados em uma cooperativa que opera as atividades econômicas envolvendo mais da metade da população da reserva, e também em uma associação de moradores que funciona como um Conselho de Administração. Em inesquecí�vel conversa com um lí�der comunitário, impossí�vel não se emocionar ao ouvir: “No Cuniã não temos pobres!”. Quantos de nós, gestores públicos e cidadãos, podemos dizer o mesmo de nossas cidades? Ou mesmo de comunidades menores?
Temos muito a aprender com a Amazônia e seu povo. Sonhar o futuro coletivo desejado por
cada um, e não o desejado por outros; planejar coletivamente, com calma, tempo e respeito a todos; conhecer e respeitar a natureza e seus limites; partilhar o resultado obtido entre todos; implantar o planejado; monitorar sempre todo o processo.
RAM - E como essas questões Amazônicas podem servir de referências para outras cidades?
William - As cidades brasileiras, em maior ou menor escala, quer sejam da Amazônia, do Cerrado, da Caatinga ou da Mata Atlântica, possuem sempre caracterí�sticas e aspectos que agradam seus moradores e que precisam ser incentivados ou preservados. Simultaneamente, apresentam situações que merecem ser minoradas ou afastadas do seu dia a dia. Essa potencialização das boas caracterí�sticas locais e a redução das ruins pode ser chamada de Desenvolvimento Local. Uma reflexão cuidadosa sobre aquelas práticas tradicionais dos indí�genas, ribeirinhos e extrativistas aponta que desenvolvimento sustentável será possí�vel se sustentarmos o desenvolvimento local com o mesmo modo de agir amazônico tradicional, e que podemos usar em nossas cidades. O planejamento coletivo, com ferramentas e prazos adequados, de algum modo, já faz parte do cotidiano de alguns gestores, mesmo porque previstos na Constituição de 88, atualmente sob ataque. Boas práticas devem servir de inspiração, mas jamais serem simplesmente copiadas, pois desenvolvimento local não se copia; captar os sonhos coletivos é etapa essencial para se ter adesão e envolvimento; os recursos necessários devem ser cuidadosamente identificados e priorizados; os bons resultados parciais devem ser comemorados e partilhados com todos, ou com muitos; maus resultados devem levar a novas práticas. O aspecto mais desafiador para o sucesso desse modelo de planejamento do desenvolvimento consiste exatamente em saber reconhecer os limites dos recursos necessários, mas principalmente os limites impostos pela natureza. Para aqueles amazônidas, algo cotidiano. Para nós, que vivemos afastados da natureza, algo esquecido; daí� as dificuldades na sustentação do desenvolvimento. Entender e buscar novos paradigmas metodológicos, mais uma vez extraindo o que a Amazônia nos oferece, parece mais do que apenas uma alternativa. Pode ser, na verdade, a única.