EDITORIAL
Manoel Canuto
O Culto Simples
T
emos hoje uma verdadeira batalha em torno da defesa da
homem adorá-lo. Deus sempre colocou diante do homem princípios
liberdade religiosa. Muitas entidades, até mesmo não religio-
para a pureza da adoração. Deus não pode ser cultuado segundo as
sas, buscam a defesa da livre prática das muitas crenças. E
imaginações e invenções humanas, nem através de qualquer repre-
toda esta batalha gira essencialmente em torno do modo como se
sentação visível. A ênfase é que Deus não pode ser cultuado através
presta culto à sua divindade. O mundo tem defendido, com poucas
de nenhum outro modo que não seja prescrito ou ordenado nas
exceções, que cada pessoa adore livremente ao seu deus. Alguns, e não poucos, manifestam a opinião de que não se deve condenar nenhuma religião, sob pena de incorrer em condenável crime do preconceito contra a cidadania. Todos dizem que qualquer pessoa tem o “direito” de adorar ao deus que deseja e da forma que imagina. I. G. Vos afirma que se esta palavra “direito” não for bem entendida teremos muita confusão e mal entendido. Na verdade há uma diferença entre direito civil e direito moral. O direito civil tem sua validade no âmbito da sociedade humana, mas o direito moral tem
Escrituras. Por isso o crente não pode pensar como o mundo pensa. Sua liberdade religiosa não deve ser vista como uma liberdade para fazer o que deseja, mas como uma libertação das ciladas e amarras de Satanás que o incita a adorar da maneira que ele pensa; o Cristão é liberto de seus pensamentos carnais para fazer a vontade de Deus revelada na Bíblia. Segundo as Escrituras, o culto não deve ser prestado a anjos, nem a santos, nem a qualquer outra criatura, mas somente a Deus Pai, Fi-
validade no âmbito da Lei moral de Deus. Ninguém pode impedir
lho e Espírito Santo. Deve ser um culto simples através da oração com
que um homem de muitas posses gaste seu dinheiro em orgias e
ações de graça, da leitura das Escrituras, da sã pregação da Palavra,
em práticas mundanas se esse é seu desejo. O que o governo pode
do cântico dos salmos, pela administração correta dos sacramentos e,
e deve fazer é cobrar deste homem, que ele pague seus impostos e
em ocasiões especiais, com ações de graça, jejum, votos e juramentos.
não proceda de forma a afrontar ou prejudicar qualquer cidadão.
Assim dizem os teólogos de Westminster.
No entanto, quando este homem está diante de Deus, usando des-
Somos gratos aos reformadores por redescobrirem o culto sim-
tas práticas carnais, ele tem de abandoná-las e pensar naquilo que
ples praticado no período apostólico. Dr. Pipa de Greenville ilustra
Deus determinou que não deve ser feito, sob pena de ser condenado
aos seus alunos a simplicidade do culto reformado, dizendo: “Outra
ao prestar contas no dia do juízo. Assim, podemos entender que a
maneira de pensar sobre a simplicidade do culto é o que chamo de
lei civil garante a qualquer pessoa cultuar seu deus como desejar ou até mesmo nunca cultuar, desde que alguma coisa escandalosa não seja praticada, ou não coloque em risco a vida de alguém ou não degrade a sociedade civil. Mas muitos crentes imaginam que esta lei civil de liberdade religiosa deve ser aplicada nas igrejas de hoje. Esquecem que diante da Lei moral de Deus ninguém tem o direito de adorá-Lo da forma como deseja. O homem tem uma natureza corrompida e esta corrupção o leva sempre a buscar uma forma impura de cultuar a Deus, mes-
portabilidade (de portátil) de culto. Portabilidade significa que nós podemos realizar nossa adoração em qualquer lugar. Essa é a simplicidade da adoração, nós apenas precisamos de um púlpito, uma mesa para a comunhão, um livro de louvor, um pequeno frasco de água, um pouco de vinho e um pão ― isso é o suficiente”. Quão diferente dos dias de hoje! Não preciso mencion ar as distorções cúlticas praticadas hoje quando este princípio da simplicidade é esquecido. Deus adverte no 2º mandamento: “porque eu sou o SENHOR,
mo que suas intenções sejam sinceras. Desde cedo o homem teve
teu Deus, Deus zeloso, que visito a iniqüidade dos pais nos filhos até
de aprender a cultuar ao Criador. Foi-lhe necessário adorar com fé,
à terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem e faço miseri-
para que Deus aceitasse sua adoração ― fé em alguma verdade. O
córdia até mil gerações daqueles que me amam e guardam os meus
homem tem de adorar crendo na vontade de Deus revelada. Vemos
mandamentos” (Ex 20:5-6).
em toda a Escritura que Deus sempre estabeleceu o modo correto do
REVISTA OS PURITANOS Ano XVII - Número 4 - 2009 Editor Manoel Canuto mscanuto@uol.com.br Conselho Editorial Josafá Vasconcelos e Manoel Canuto
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Boa leitura.
Revisores Manoel Canuto; Linda Oliveira Tradutores Linda Oliveira; Marcos Vasconcelos, Márcio Dória, Josafá Vasconcelos Projeto Gráfico e Capa Heraldo F. de Almeida Impressão Facioli Gráfica e Editora Ltda. Fone: 11- 6957-5111 — São Paulo-SP
OS PURITANOS é uma publicação trimestral da CLIRE — Centro de Literatura Reformada R. São João, 473 - São José, Recife-PE, CEP 52020-120 Fone/Fax: (81) 3223-3642 E-mail: ospuritanos@gmail.com DIRETORIA CLIRE: Ademir Silva, Adriano Gama, Waldemir Magalhães.
Revista Os Puritanos 4•2009
Adoração Reformada Mas a hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade, porque o Pai procura a tais que assim o adorem (Jo.4:24)
Dr. David Murray
M
Eles entenderam que nesta área da adoração, a melhor forma de se centralizar em Deus era se centralizar na
uitos crentes e igrejas, em todo mundo, estão
Palavra. Quando eles jogaram fora tudo que era feito
redescobrindo a verdade a respeito da adora-
pelo homem, isso deixou um vácuo a ser preenchido.
ção reformada. Isso é uma providência mara-
vilhosa da parte de Deus, mas na maioria das vezes essa
Dentro deste vácuo eles tinham de colocar a adoração centrada na Palavra de Deus.
verdade reformada tem se limitado apenas à doutrina
Inicialmente vamos focalizar esta área dos cânticos
da salvação. Em outras palavras esta reforma estancou
de louvor. A Reforma passou por dois estágios na re-
no ponto referente às doutrinas da graça e não foi além,
forma dos cânticos na Igreja. Em primeiro lugar, Lute-
não progrediu para outras áreas, como por exemplo, a
ro foi o pai do cântico congregacional. Ele viu que por
vida cristã e o culto cristão. Isto na verdade não é uma
mais de mil anos na Igreja os cânticos estavam nas
reforma plena porque a reforma verdadeira e plena
mãos dos corais, dos monges e das freiras e não nas
atinge todas as áreas da plenitude de vida dos cristãos
mãos do povo de Deus. Uma das primeiras coisas que
e da Igreja. Quero falar sobre o tópico da necessidade
Martinho Lutero fez em 1524 foi introduzir na Igreja
de se trazer reforma para toda a área que diz respeito
o uso do hinário. Lutero trouxe de volta ao povo de
à adoração. Gostaria de tratar de três áreas neste tema.
Deus o cântico congregacional. Eles não precisavam
Na primeira gostaria de tratar da história da reforma
mais vir ao culto vendo-o apenas como uma forma de
na adoração. Em segundo lugar tratar da regulamenta-
simples performance, mas eles vinham para partici-
ção da adoração bíblica e em terceiro lugar tratar das
par. A segunda etapa foi com Calvino. Lutero restau-
razões para termos uma adoração bíblica.
rou o louvor congregacional, mas Calvino restaurou a cântico bíblico. Calvino via que na igreja primitiva,
I) A Reforma da Adoração Bíblica → Quando os
no início do Novo Testamento, a igreja cantava os
reformadores redescobriram o evangelho bíblico, eles
salmos. Ele percebeu que o coração não apenas deve
também perceberam a necessidade da redescoberta da
ser guiado pela Bíblia, mas que a adoração deve ser
adoração bíblica. Quando perceberam a salvação em
repleta de Bíblia e que o cântico na adoração bíblica
termos de glorificar a Deus, nos termos da centralidade
não precisa apenas ser guiado pelos princípios bíbli-
de Deus, então perceberam que a adoração resultan-
cos, mas deveria ser cheio de conteúdo bíblico. Então,
te disso também deve ser uma adoração centrada em
Calvino reintroduziu o saltério na igreja de Cristo.
Deus e que O glorifique. Os reformadores viam muitas
Para Calvino a adoração a Deus deveria ser o encon-
coisas e acréscimos humanos colocados na adoração a
tro com a Palavra, a leitura da Palavra, a pregação
Deus como os altares, as vestimentas, as velas, os ou-
da Palavra, o cântico da Palavra. Tudo tinha de ser
tros sacramentos, incensos, etc. e para retornar a uma
centralizado na Palavra de Deus. Esta é uma breve
adoração centrada em Deus eles teriam de jogar fora
história da reforma na adoração bíblica.
todos aqueles acréscimos humanos. Martinho Lutero iniciou este processo. Zuínglio, Martin Bucer e Calvino
II) A Regulamentação da Adoração Bíblica →
continuaram depois dele. Cada um deles ia jogando fora
Todo cristão tem algum tipo de regulamentação acer-
mais e mais aquilo que pertencia à imaginação humana
ca da adoração. Todo crente coloca uma linha (limite)
e trazendo mais e mais aquilo que era centrado em Deus.
em algum lugar no culto. De um lado da linha há uma
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David Murray
adoração aceitável e do outro lado da
e. PRESCRIÇÃO. É a regra usada por
minou. E se os governadores humanos
linha uma que é inaceitável. Todos nós
Calvino que a descobriu na Palavra de
fazem assim, quanto mais o Rei dos
estamos de acordo que existem algu-
Deus: Somente aquilo que é ordenado
Reis e o Senhor dos Senhores. De onde
mas coisas que são boas para o culto e
na Bíblia deve ser permitido e usado
tiramos isso na Bíblia? Vejamos em
outras que não devem existir no culto.
no culto a Deus. Verdadeira adoração é
Levítico 10. 1-3:
A única questão é: Como e onde vamos
adoração ordenada nas Escrituras con-
“Nadabe e Abiú, filhos de Arão, tomaram
colocar esta “linha” demarcatória? Qual
forme a vontade de Deus. Se não for
cada um o seu incensário, e puseram
a regra que vamos seguir para saber o
ordenado, não é autorizado. A Bíblia
neles fogo, e sobre este, incenso, e trou-
que é aceitável e o que é inaceitável?
ordena dramatização, teatro, no culto?
xeram fogo estranho perante a face do
Deixe-me dar algumas regras que são
Não. A Bíblia ordena o uso de velas?
SENHOR, o que lhes não ordenara. Então,
usadas em nossos dias. Todos nós te-
Não. A Bíblia ordena o uso de vestimen-
saiu fogo de diante do SENHOR e os con-
mos alguma destas regras.
tas clericais? Não. Então, temos aqui a
sumiu; e morreram perante o SENHOR.
regra mais radical de todas. É o Princí-
E falou Moisés a Arão: Isto é o que o
a. O PASSADO. “Sempre foi assim!”, muitos dizem. E se foi suficiente para as
pio Regulador. Mas, de certa forma nós
SENHOR disse: Mostrarei a minha san-
pessoas do passado, será bom para nós
podemos dizer que todas aquelas regras
tidade naqueles que se cheguem a mim
também hoje. “Nossos pais adoraram
são “princípios reguladores”. Todas elas
e serei glorificado diante de todo o povo.
assim então, assim nós adoraremos”.
regulam o culto. Então, todos nós temos
Porém Arão se calou” (Lv 10:1-3).
Dessa forma o passado é a regra para
algum tipo de princípio regulador. As-
o presente.
sim a pergunta é: Será que este nosso
Vejamos aqui a frase-chave, no final do v. 1: “o que lhes não ordenara”.
b. A PREFERÊNCIA. Esta a regra do
princípio regulador é o Princípio Regu-
Estes homens eram religiosos e ado
que eu gosto, do que eu quero e do que
lador da Bíblia? O Princípio Regulador
radores; tinham boas intenções e prova-
eu acho agradável. Eu gosto assim; eu
bíblico, como podemos demonstrar, é a
velmente eram sinceros, mas fizeram o
me sinto bem com isso; isso está de
prescrição. Somente aquilo que foi pres-
que não havia sido ordenado por Deus.
acordo com minha personalidade; é a
crito e ordenado é permitido. Quando
minha preferência.
estamos considerando nossa adoração,
“Pois, visto que não a levastes na pri-
E também em 1 Crônicas 15.13:
c. PRAGMATISMO. Isso funciona, atrai
é esta a pergunta que devemos fazer:
meira vez, o SENHOR, nosso Deus,
pessoas e é popular? Então, vamos fa-
Deus ordenou isso? Não devemos per-
irrompeu contra nós, porque, então,
zer assim! Não fazer de outra forma,
guntar: Ele proibiu isso? Isso foi sempre
não o buscamos, segundo nos fora or-
porque não seria popular e não atrai-
feito assim? Gostamos disso? Também
denado”.
ria as pessoas. Assim, nossa regra é o
não devemos perguntar: “isso funcio-
pragmatismo: o que funciona.
na?”. E assim por diante.
Lembramos que aqui Davi e o povo de Israel tentaram levar a arca da alian-
d. PROIBIÇÃO. Tudo é permitido no
Por que Deus fez assim com o cul-
ça para Jerusalém e isto era uma coisa
culto desde que não seja explicitamente
to? Em parte é porque temos corações
boa; estavam com muita sinceridade, ti-
proibido na Palavra de Deus. Esse foi o
pecaminosos e corruptos. Nossos co-
nham boas motivações. Mas eles não fi-
princípio que Lutero usou. Ele basica-
rações não são confiáveis! E não pode-
zeram segundo as ordenanças de Deus.
mente disse: Se a Bíblia não proíbe as
mos confiar em nossos corações para
Por isso, quando Uzá tentou tocar na
velas, então podemos usá-las e assim
acharmos a forma correta de adorar a
arca, Deus o matou. Assim eles disse-
por diante. Então, se conclui, não ha-
Deus. Por isso Deus nos deu direcio-
vendo uma clara proibição, podemos
namento suficiente para que sigamos.
ram: “não o buscamos, segundo nos fora ordenado”. Podemos ver a mesma coisa
fazer. Bem, a Bíblia não proíbe em ne-
E este direcionamento é uma direção
com o Rei Jeroboão e o Rei Uzias que
nhum lugar a dramatização no culto,
externa a nós. Deus tem o direito de
foram castigados por terem adorado a
então pode-se usar o drama, o teatro e
decidir como Ele mesmo quer que
Deus de uma forma que Ele não tinha
assim por diante.
seja adorado. Pense no presidente do
ordenado. Deus tem nos dado muitas
Eu diria que estas são as quatro re-
Brasil. É ele quem decide como fun-
advertências sobre o que Deus nos fará
gras mais usadas hoje pelas pessoas
ciona seu governo, como as pessoas
se não respeitamos aquilo que Ele tem
para saber o que devem fazer no culto.
devem se aproximar dele. Ele decide
definido. Quando nós realmente abra-
Mas a pergunta a ser feita é: Elas são
o cerimonial para receber as pessoas.
çamos este princípio de que somente
Bíblicas? A resposta é: Não! Então, qual
Se nós desejamos agradá-lo, então va-
aquilo que Deus tem ordenado é legíti-
é a regra bíblica?
mos seguir tudo aquilo que ele deter-
mo no culto, o que sobra, então?
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Revista Os Puritanos 4•2009
Adoração Reformada
A Confissão de Fé de Westminster
não apenas Salmos, mas outros hinos e
para a nova dispensação, porque acom-
que inclui estes dois textos citados, no 2º
cânticos também”. Temos duas coisas
panhou a última celebração da páscoa
Mandamento da Lei e no Capítulo XXI, I
a dizer em resposta a esta afirmação:
e a primeira celebração da Santa Ceia
(Do Culto e do Dia de Repouso), afirma:
1. OS TÍTULOS DOS SALMOS DO VE-
do Senhor. Neste versículo Jesus está
“Mas a forma aceitável de cultuar o Deus
LHO TESTAMENTO → Primeiro, veja-
dizendo que estes mesmos Salmos do
verdadeiro é instituída por sua própria
mos os títulos dos Salmos do VT. Eles
Antigo Testamento são adequados e
vontade revelada, de modo que ele não
são traduzidos em grego (na Septua-
suficientes no Novo Testamento.
pode ser cultuado segundo as imagina-
ginta) usando estes três títulos coloca-
Então, como vimos antes, no Velho
ções e invenções humanas, nem segun-
dos nestes versículos citados. Quando
Testamento nós temos prescrição e exem-
do as sugestões de Satanás, sob alguma
Paulo está falando deste cantar os “sal-
plo. Mas também no Novo Testamento
representação visível, ou por qualquer
nós temos prescrição e
outra forma não prescrita na Sagrada
mos, cânticos e hinos espirituais”, ele está
Escritura” (CFW).
se referindo ao livro
tanto, como os refor-
exemplo. Vemos, por-
Veja o que lemos aqui. Nós não po-
de Salmos que con-
madores restauraram
demos adorar a Deus usando ídolos ou
tém “salmos, hinos
o Princípio Regulador
qualquer outra forma não ordenada na Palavra. Mas alguém poderia di-
e cânticos espirituais”. Esta expressão,
zer: “Eu nunca iria adorar a Deus com
“cânticos espirituais”,
ídolos”. Mas aqui a Confissão de Fé de
significa cânticos do
Westminster reúne o ensino bíblico
Espírito Santo ― Cân
sobre este assunto e diz que qualquer
ticos inspirados pelo
adoração que não encontra prescrição
Espírito Santo. Pelos
ordenada por Deus na Palavra, é idola-
títulos dos Salmos, nós
A Verdadeira adoração é adoração ordenada nas Escrituras
do culto. Sendo assim, o culto precisa ser algo ordenado hoje. Recentemente
li
uma citação de Ray Lanning que é um perito reformado neste assunto de culto e ele
tria. Não é que você está adorando ao
entendemos que Paulo
Deus errado, mas a questão é que você
está dizendo: “Salmos,
está adorando a Deus de forma errada;
Salmos e mais Salmos”.
das pelos reformado-
de uma forma não ordenada nas Sagra-
2. EXEMPLO DO
res, nenhuma foi mais
das Escrituras. Então, podemos usar
NOVO TESTAMENTO
dramática do que a
isso também na área do louvor, nos
→ A segunda coisa é
mudança do culto pú-
cânticos, porque podemos e devemos
o exemplo que temos
blico”. Calvino disse:
aplicar este princípio a todas as áreas
no NT. Por exemplo, Mateus 26.30: “E, “Todo serviço a Deus que é inventado
do culto. Do início até o fim, Deus tem
Deus sem o Seu expresso mandamen-
na isto e aquilo. E nos cânticos de lou-
tendo cantado um hino, saíram para o monte das Oliveiras”. Veja: “... tendo cantado um hino”. Aqui Jesus estava senta-
vor, o que Deus nos ordenou a usar?
do com seus discípulos na última Ceia
sérias.
ordenado esta área ou aquela; Ele orde-
dizia: “Das muitas mudanças
implementa-
pelo cérebro do homem na religião de to é idolatria”. Estas palavras são bem
Segundo o pensamento dos reforma-
Pascal e na primeira mesa da Santa Ceia.
dores, Deus nos ordenou o cântico dos
Aqui mais uma vez hino, no grego,
III. As Razões do Culto Bíblico → Por
Salmos. No Velho Testamento temos
significa Salmo. Naquela época, esta era
que tudo isso é importante? Por que
exemplos dos Salmos sendo cantados,
uma prática bem conhecida na igreja
estamos enfatizando estas coisas? Por que Deus deseja assim?
mas também no Novo Testamento. Por
judaica. Quando os judeus estavam
exemplo, Colossenses 3:16 ― “Habite,
celebrando a páscoa, eles cantavam
ricamente, em vós a palavra de Cristo;
os hinos pascais. Esses hinos pascais
Primeiro, porque seguindo este pa-
instruí-vos e aconselhai-vos mutuamen-
nós os encontramos dos Salmos 113
drão bíblico, conseguiremos ter simpli-
1º) Simplicidade
te em toda a sabedoria, louvando a Deus,
ao 118. Jesus cantou com seus discípu-
cidade. Todas as decisões sobre o que
com salmos, e hinos, e cânticos espiri-
los estes hinos. Um comentarista disse
deve existir no culto se tornam tão
tuais, com gratidão, em vosso coração”.
que o canto destes Salmos de Hallel,
simples. Não importa quantas pessoas,
Vemos também isso em Efésios 5:19. À
por Cristo e seus discípulos na noite da
sejam elas jovens ou velhas, cheguem
primeira vista, vendo estes versículos
Sua traição, marca o momento no qual
dizendo: “Esta é uma idéia ótima para
você pode dizer: “Então eu posso cantar
o saltério passa da antiga dispensação
o culto”. Nós não precisamos consultar
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David Murray
o passado, não precisamos perguntar
da aos seus próprios olhos. Um dia você
Criador, Cristo o Provedor, Cristo o Guia,
se isso vai ser popular, não precisamos
entra em uma igreja, outro dia em outra
Cristo o Defensor, e assim por diante...
perguntar se isso vai funcionar, não é
igreja, e percebe uma diferença enorme
Então cantaremos estes Salmos de uma
necessário procurar na Bíblia para ver
entre elas. Uma diferença tão grande que
forma trinitariana.
se há uma proibição, mas simplesmen-
estas igrejas nunca chegarão a se reu-
2) Em segundo lugar podemos can-
te perguntar: “Isso foi ordenado? Isso é
nir para adorar juntas. Todas aquelas
tar os Salmos de Cristo (acerca de Cris-
requerido?”. Simplicidade! Realmente
regras não bíblicas têm levado a Igreja
to). Quantos salmos estão profetizando
isso iria simplificar de forma impressio-
às chamadas guerras litúrgicas. Imagi-
sobre a vinda de Cristo a este mundo?
nante os cultos de adoração nas igrejas.
nemos se todas as igrejas no Brasil fe-
Fiz uma lista rápida. Veja o Salmo 45:6
2º) Espiritualidade
chassem as suas portas e tivessem uma
que fala da divindade de Cristo; Salmo
Um segunda razão é a espiritualida-
reunião a portas fechadas. Dissessem:
2:7 que diz que Ele é o Filho eterno; o
de. A igreja Católica Romana chegou a “Vamos abrir a Bíblia e, baseados na Pa-
Salmo 8:5 fala da encarnação de Cristo;
ter um sistema de culto tão complexo
lavra de Deus, vamos decidir o que Deus
os ofícios de Cristo como mediador no
que o povo ficava assistindo apenas
ordena para estar presente em nossos
Salmo 40:9-10 e Salmo 110:4; Salmo
aquilo que é externo na adoração. Eles
cultos; se acharmos alguma coisa que é
41:9, que fala da traição do Senhor; o
esqueceram que Deus quer ver nosso
ordenada na Bíblia, isso estará presente;
julgamento de Cristo no Salmo 35:11;
coração e que é necessário que o culto
se não acharmos uma ordenança para
a rejeição de Cristo no Salmo 22:6; o
seja espiritual. Quanto mais tornamos
determinada coisa, isso fica fora”. Não
sepultamento e rejeição de Cristo no
complexo nosso culto, mais externo,
temos dúvida de que muitas coisas se-
Salmo 16: 9-11; a ascensão de Cristo no
mais exterior ele se torna. Mas se tira-
riam colocadas fora. Mas, imaginemos
Salmo 47:5; a segunda vinda de Cristo
mos tudo que apela aos nossos olhos
se depois dessa decisão as portas fos-
no Salmo 50:3-4. Como pode alguém di-
e nossos sentidos, nossa visão, nosso
sem abertas e todos se reunissem para
zer que Cristo não está nos Salmos? Está
tato, então chegarem a ter algo bem
uma adoração conjunta. Todos eles es-
ou não está? Muitos têm a vista curta.
simples e assim podemos nos focar no
tariam no “mesmo script”. Talvez isso
Todos os Salmos que estamos entoando,
coração e não naquilo que está lá fora.
requeresse algum tempo, mas todos
cantam Cristo. Nós cantamos a Cristo e nós cantamos de Cristo.
Por isso os reformadores pintaram de
chegariam ao mesmo ponto. Isso uniria
cal todas as igrejas, por dentro e por
as igrejas de forma extraordinária e im-
3) Em terceiro lugar cantamos por
fora. Tiraram todas as janelas com
pressionante. Impressionaria o mundo,
meio de Cristo. Quando estamos ofere-
seus vitrais coloridos; aboliram todas
também. Isso impactaria o mundo mais
cendo um culto a nosso Deus, devemos
as vestimentas clericais; todos os in-
do que nossas divisões estão fazendo.
oferecê-lo pela mediação de Cristo.
censos e sinos; tudo que impressiona-
4º) A glória de Deus
4) Em quarto lugar cantamos com
va os olhos. “Vamos simplificar”, eles
Uma quarta razão é a glória de Deus.
Cristo. Que hinário Cristo usava quando
disseram “para que o povo possa nova-
Se nós dissermos: “Nós não somos con-
esteve neste mundo? Ele usava o livro
mente adorar de coração. Isso melhora
fiáveis para dizer o que é apropriado
de Salmos. Isso era o maná da Sua alma.
a espiritualidade”. Já participei de cul-
para o culto; só Deus tem o direito de
Esses foram os cânticos que sua mãe o
tos onde a adoração era bem extrava-
dizer o que é legítimo na adoração e eu
ensinou a cantar. Foram os cânticos que
gante, bem impressionante aos olhos e
me submeto a tudo aquilo que Ele orde-
Ele tinha na memória quando estava na
aos ouvidos. De fato isso tem sido de-
na”, o que isso me diz? Diz que Deus es-
Sinagoga; foram estes os cânticos que
masiado para ser provado, vivenciado.
teja em seu trono e eu esteja no pó! Isso
gradativamente lhe revelavam todas
Nestas adorações os sentidos têm sido
dá a Deus todo o seu direito e nos torna
as implicações do seu trabalho como
tão estimulados que nos faz perguntar
seus servos. Assim Deus é glorificado.
Mediador. Portanto, vemos que em
se aqui está sendo realizado um culto que parte do coração. 3º) Unidade A terceira razão é a unidade. Qual é a
Mais uma vez vamos nos focar apenas nos Salmos.
momentos críticos e importantes de sua vida, estes Salmos surgem em seu
1) Podemos cantar os Salmos a Cris- coração. Estes Salmos edificavam sua to. Quando lemos a palavra “Deus” ou própria alma. O primeiro Salmo que
conseqüência quando as pessoas estão
“Senhor” ou “Rei”, nos Salmos, podemos
uma mãe judia ensinava a seu filho era
seguindo várias regras quanto ao culto?
cantar estas coisas a Cristo o Senhor,
aquele que dizia: “Em tuas mãos entrego
A consequência é a divisão da igreja de
Cristo o Rei. Seus títulos e seus nomes
o meu espírito”. Quais foram as últimas
Cristo! Cada igreja faz aquilo que agra-
se acham em todos os Salmos. Cristo o
palavras que saíram da boca de Jesus?
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Adoração Reformada
Veja o Salmo 22 e o 69. Eles nos revelam
vilégio podermos tomar estes mesmos
homens. Ele diz: “em vão me adoram”.
tudo que estava se passando na mente e
cânticos em nossos lábios e podermos
Então, vamos ter a coragem de fazer
no coração de Jesus quando ele estava
cantar com Cristo como Ele cantou. Ele
uma reforma na adoração.
morrendo. Os Evangelhos nos revelam
cantou assim e nós cantamos também. Nós
4) Vamos tentar persuadir outras
e relatam muitas coisas dos sofrimentos
cantamos a Ele, nós cantamos Dele, canta-
pessoas. É esta a palavra correta: PER-
externos de Cristo, mas não chegam a
mos por meio Dele e com Ele.
nos informar aquilo que estava se passando no seu coração. Mas os Salmos
SUADIR. Mas não vamos agir de forma
Deixe-me encerrar com algumas colocações finais:
a destruir igrejas, mas usar de gentileza, de sabedoria, de forma gradativa, ten-
1) Por que fazemos o que fazemos?
tando ganhar as pessoas, tendo paciên-
evento da morte de Jesus estes Salmos
Qualquer que seja o modo de nosso culto
cia com elas porque por muitas vezes
profetizam e nos predizem os pensa-
é preciso que entenda-
elas foram abençoa-
mentos, temores e desejos que enche-
mos o porquê estamos
das com outros hinos
ram o coração de Jesus. Então, quando
fazendo assim. Não é
e corinhos em suas
estamos cantando os Salmos guardemos
suficiente
vidas. Você não deve
em nossas mentes o fato de que Cristo
que sempre foi feito
nos informam disso. Mil anos antes do
dizermos
cantava estes Salmos, o Senhor medita-
assim ou que todo
va neles. Onde e quando Cristo cantou
mundo faz assim ou
estes Salmos? Como Ele cantou estes
que nos agrada fazer
Salmos? Você não teria muito prazer e
assim, porque isso não
gozo em ouvir o próprio Cristo cantan-
é uma defesa contra a
do estes Salmos? Por exemplo, não seria
corrupção do nosso
prazeroso ouvi-lo cantando as palavras
coração. A única defe-
do Salmo 118.17-19?
sa contra a corrupção
“Não morrerei, mas viverei; e contarei as
obras do SENHOR. O SENHOR me cas-
do nosso culto é o seguinte: Isto Deus tem
tigou muito, mas não me entregou à mor-
nos ORDENADO! Se-
te. Abri-me as portas da justiça; entrarei
gure, entenda, exami-
Lutero restaurou
esperar que de uma forma súbita elas entendam tudo isso. De uma forma gradativa
o louvor
vamos introduzindo
congregacional,
to bíblico. Um pu-
mas Calvino o cântico bíblico
mais e mais um culritano, William Romaine, disse: “Eu sei que esta adoração é um ponto que dói, por isso eu vou tocar nele de uma forma
por elas, e louvarei ao SENHOR”.
ne e aplique este prin-
muito delicada, com
Veja o Salmo 69. 19-21:
cípio e seja capaz de
a
“Tu conheces a minha afronta, a minha
vergonha e o meu vexame; todos os meus
defender toda a parte da sua adoração à luz deste princípio.
maior
gentileza
que eu posso, na esperança de fazer algum bem”. Ninguém
adversários estão à tua vista. O opróbrio
2) Adore de verdade. Uma coisa é
se achega a um ferimento para magoá-
partiu-me o coração, e desfaleci; esperei
dar uma palestra sobre adoração. Uma
lo no intuito de curar. Mas vai, como
por piedade, mas debalde; por consolado-
coisa é lermos muitos livros sobre ado-
uma mãe ou uma amável enfermeira,
res, e não os achei. Por alimento me de-
ração, e podemos até nos tornar peritos
com muita habilidade, limpando e cui-
ram fel e na minha sede me deram a beber
no assunto de adoração. Mas você sabe
dando lentamente. Mantenha sempre
vinagre”.
adorar? Você se dobra a Deus? Em sua
na mente o grande propósito: Não ape-
São palavras muitíssimo emocionan-
vida há uma adoração real, de coração a
nas uma igreja pura e purificada, mas
coração, ao seu amado Salvador?
uma igreja unida e cheia de amor.
tes. Procure pensar em Cristo cantando estes cânticos no culto doméstico e em
3) Vamos ter a coragem de fazer
Existem duas formas eficazes para se
particular. Lemos de Cristo saindo à noi-
uma reforma em nosso culto se assim
persuadir e que são muito melhor do que todas as palestras que você possa dar:
te para o deserto para orar e clamar a
for necessário. Lembram-se do que Je-
seu Pai. Não teria Ele usado destas pa-
sus disse em Mateus 15.8-9: “Este povo
lavras em seus lábios santos? Não teria
coração.
Ele os cantou? Quando Ele os cantou?
se aproxima de mim com a sua boca e me honra com os seus lábios, mas o seu coração está longe de mim. Mas, em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos dos homens”. Notem que
Ele era o Salvador dos Salmos. Que pri-
não são os preceitos de Deus, mas de
e que essas épocas também coincidi-
cantados estes cânticos com todo sentimento e paixão? Jesus cantava aquilo que Ele mesmo iria experimentar. Como
Revista Os Puritanos 4•2009
(a) Cante os Salmos com alegria no (b) Se você é pastor pregue os Salmos. Se olhar para trás, para a história do culto bíblico, verá a época quando os Salmos caíram em desuso
7
David Murray
ram com o momento quando não se tinha a pregação de Cristo nos Salmos. Quando você estiver pregando Cristo nos Salmos será muito mais fácil persuadir o povo a cantar os Salmos para Cristo. 5) Em último lugar. Toda nossa adoração deve ser uma antecipação do céu. Deve ter um sabor do céu vindouro. Esse é o grande fim da adoração, nos levar ao céu e até trazer o céu até nós. Naquele dia quando não houver mais nenhuma divisão e nenhum argumento restar, todo propósito da adoração aqui na terra deve ser para nos dá um pequeno sabor do céu vindouro. Esperamos e oramos que esta seja nossa experiência. Transcrição da palestra proferida por Dr. David Murray na Sala de Leitura da CLIRE e do Projeto Os Puritanos em Recife e repetida no Simpósio Os Puritanos em Maragogi/AL/2009. Perguntas e respostas feitas após a palestra em Recife 1ª Pergunta: Na Bíblia existem outros cânticos. O de Maria, o de Ana, o de Simeão, nas cartas de Paulo, em Apocalipse e outros locais. Muitos argumentam contra Salmodia exclusiva afirmando que estes hinos eram cantados, e não eram Salmos. O que dizer deste argumento? Resposta: É sempre bom, em todas as áreas da vida, começar com um princípio e depois tratar dos casos mais difíceis. Mas, por exemplo, no caso do aborto, muitas pessoas começam este tema com os casos mais difíceis como incesto e estupro e concluem que devemos praticar aborto livre (para evitar esta gestação indesejada). Elas não começam com um princípio e, à luz deste princípio, olham para os casos mais difíceis. Então, a primeira pergunta a ser feita é: Isto é um princípio bíblico? Se for, então devemos começar por ele e depois olhar tudo à luz deste princípio; olhar os casos mais difíceis à luz deste princípio. Não devemos olhar para os casos difíceis e jogar fora o princípio. Como nós devemos ver estes cânticos que as pessoas alegam serem cânticos das Escrituras e que não são Salmos? Primeiro, eu acho que muitos dos cânticos que as pessoas alegam serem cânticos na verdade não são cânticos. Por exemplo, em Filipenses 2:6-11, nada indica que seja um cântico, apenas os comentaristas dizem que é um cântico. Em segundo lugar, o cântico de Maria e o cântico de Simeão, foram realmente cânticos de louvor inspirados, mas nunca foram usados no louvor público a Deus. O princípio do qual estamos mencionando fala do culto público, onde Deus é adorado de uma forma organizada e formal. Este princípio não diz que as pessoas, em seus momentos devocionais particulares, não
8
possam cantar cânticos de louvor a Deus que surgem de seus próprios corações. Não há evidência de que os cânticos de Maria e Simeão tenham sido usados de uma forma geral na igreja primitiva. Há uma ou duas evidências do uso do cântico de Maria na literatura da igreja primitiva, mas considerando a grande quantidade de literatura existente, isso não é considerado como menção. 2ª Pergunta: O que dizer de pastores que usam o livro de Apocalipse e o louvor no céu como modelo de louvor para nós hoje na igreja? Apocalipse é um princípio que devemos usar? Resposta: Aqui há uma diferença grande. Há uma diferença entre o céu e nós. Usar a adoração celestial como modelo para nós hoje é um pecado. O que é seguro para ser permitido no céu, talvez não seja seguro para ser permitido aqui na terra. Se no céu só existe santos perfeitos e glorificados, é muito mais seguro dar a eles liberdade para cantarem o que eles desejam. É muito mais seguro dá-lhes esta liberdade no céu do que a nós na terra. Se a nós, que temos corações pecaminosos, nos for dada esta liberdade, veremos exatamente o que tem sido visto no mundo inteiro. Esta é uma diferença muito grande e sem paralelo.
relutância em usar esta terminologia. Mas onde eu teria uma preocupação a enfatizar é que se você realmente souber o que é errado e mesmo assim faz e continua a fazer, isso é muito grave. Muitas pessoas, por ignorância não estão tão adiantadas nesta escala e eu não devo me aproximar destas pessoas e dizer: é fogo estranho! Devemos de uma forma gentil, sábia, num primeiro tempo, tentar empurrá-las no sentido da perfeição e chamar outros a fazer o mesmo. Há casos difíceis. Se eu tivesse dado esta palestra na Escócia ou nos Estados Unidos eu teria recebido as mesmas perguntas. Todos nós sabemos quais os casos difíceis. Mas não devemos deixar estes casos difíceis nos desviar a atenção da necessidade maior de aplicar os princípios bíblicos.
4ª Pergunta: Quando nos convidam a visitar uma igreja que tem um culto que não é bíblico, do que devemos participar? Como participar dos hinos, das orações e leitura da Palavra? Resumido, quando nos convidam a visitar uma igreja e esta é uma chance que temos de levá-las à nossa igreja como retribuição à nossa visita, como devemos participar deste culto não bíblico? Resposta: Esta é uma pergunta difícil. Depende de onde estamos e onde eles estão na escala. Vinte anos atrás eu passei um período de um 3ª Pergunta: ano no leste europeu. Eu estava ajudando o Qual o princípio que está por trás do uso de tre- pastor numa congregação bem remota na chos da Escritura para fazer cânticos de louvor? Hungria. Um grupo de garotas estava cheganDevemos ver isso como fogo estranho? do para um retiro em um convento católico Resposta: Tenho duas respostas que desejo romano, perto dali. Estas jovens disseram que dar a este tipo de pergunta. Em primeiro lu- poderiam participar do nosso culto naquele dia gar, a Bíblia contém cânticos que Deus nos se, no outro dia, nós participássemos na adodeu para que cantemos, e todo o resto da Es- ração com elas. Nossos jovens e eu pensamos: critura está lá para lermos e pregarmos. Mas o “Isso parece ser muito bom”. À noite elas participreceito para o louvor, tanto no VT como NT, param conosco no culto e durante todo o culto é o cântico dos salmos. Então, se apenas algu- pregamos a graça de Deus. Nenhuma obra, nemas partes das Sagradas Escrituras nos foram nhuma obra, nenhuma obra...! Somente Cristo... dadas para cantarmos, isso não significa que Somente Cristo...! Estávamos ali martelando todas as suas partes nos foram dadas para can- estas verdades. Mas no outro dia, ao amanhetarmos. Então, perguntamos, é fogo estranho cer, logo pensamos: “Puxa, temos hoje de ir à cantarmos o cântico de Maria no culto públi- capela católico-romana”. Então, todos nós foco? Acho que devemos ver as coisas de uma mos lá constrangidos e nunca vou me esquecer forma escalonada (gradação). Por exemplo, da sensação que tive logo ao entrar, porque vejamos o caso do homicídio. Matar alguém vi que teria de pregar debaixo de um enorme é errado. Mas se você mata cem pessoas, isso crucifixo dourado. Havia imagem de Maria, de é bem pior. E matar mil pessoas é mais grave José e, em todo lugar, havia uma imagem de ainda. Aos olhos de Deus algumas coisas são um santo. Percebi que havia tomado a decisão vistas de forma mais grave do que outras. Ve- errada, pois a Bíblia nos diz que devemos fugir jamos nossas roupas. Uma das recomendações da idolatria. Então, todos devemos nos pergunda Bíblia é a modéstia no trajar. Vejamos uma tar: Será que podemos chegar a este nível de ser escala. De um lado da escala há uma pessoa tão ofensivos a Deus? que se veste perfeitamente modesta, e do ou- Há um versículo que acredito ser relevante aqui: tro lado da escala há alguém que nem vestiu Mateus 15:8-9. “Este povo se aproxima de mim qualquer roupa, mas entre estas duas pessoas com a sua boca e me honra com os seus lábios, há alguém que está no meio. Vendo isso, va- mas o seu coração está longe de mim. Mas, em mos considerar a questão do culto. De um lado vão me adoram, ensinando doutrinas que são há um culto perfeito e nenhum de nós chegou preceitos dos homens”. Veja que há duas coia este ponto nesta terra. Olhando na direção sas erradas com este culto. Um culto que não da escala da perfeição, vemos no outro lado o tem coração e não tem ordenanças (prescribezerro de ouro ou o lado de Nadabe e Abiú. ções) divinas. Eles tinham adoração somada Isso é fogo estranho! às ordenanças dos homens. Deus está dizendo Mas há um espectro muito grande entre os dois aqui: “Era melhor fecharem suas bíblias e voltaextremos. Todos nós estamos em algum lugar rem para casa porque sua adoração é vã”. Esta nesta escala e estamos tentando nos aproximar pergunta deve estar sempre em nossas mentes: mais e mais do culto perfeito. O fato de você “Como isto pode me parecer algo muito bom ou não chegar do lado perfeito da escala, isso não lindo?”. Esta não é a pergunta correta e sim: significa que seja fogo estranho. Eu teria muita “Isto é bom aos olhos de Deus?”.
Revista Os Puritanos 4•2009
O que Fazer no Culto no Dia do Senhor? Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional (Rm.12:1).
Pr. Terry Johnson
Q
quando “apresentamos” a Deus o nosso corpo como um “sacrifício vivo e santo”. Esse é um “culto racional” (Rm
ual a importância de respondermos esta ques-
12:1). A finalidade do evangelho é tornar pecadores san-
tão? Vamos colocar desta maneira: Que impor-
tos, a fim de serem adoradores. Note como o Senhor
tância tem a adoração? Você precisa parar para
Jesus passa do tópico adoração para o de salvação no
pensar nisso por um instante, comparando a adoração
verso 22, “Vós adorais o que não sabeis; nós adoramos
com outras várias atividades da vida. E mesmo se fi-
o que sabemos porque a salvação vem dos judeus” (Jo
zermos uma consideração superficial, iremos chegar,
4:22). Ser salvo é ser liberto da ignorância e da opres-
indubitavelmente à conclusão de que, nada do que fa-
são da idolatria. Para os judeus, “saber” como adorar, é
zemos é tão importante quanto a adoração. Não, nada
possuir a “salvação”, nada menos. Talvez não estejamos
de natureza secular, como trabalho, diversão, ou mes-
acostumados a ver a coisa dessa forma, como estou
mo a vida familiar, nem mesmo as atividades de cunho
apresentando agora, mas esse é o ensino do Novo Tes-
religioso, como evangelismo, comunhão, caridade ou
tamento. A finalidade ou o propósito do evangelismo
qualquer disciplina espiritual particular é tão impor-
e de missões é criar um povo para adorar a Deus. Os
tante. Não há, portanto, pergunta mais importante a
discípulos de Cristo são “pedras vivas”, “edificados casa
ser respondida que essa!
espiritual para serdes sacerdócio santo, a fim de ofere-
No texto básico que iremos examinar, Jesus diz que
cerdes sacrifícios espirituais agradáveis a Deus” (1Pd
o Pai “procura” verdadeiros adoradores (Jo 4:23). É
2:5; Ef 2:18-22). Deus criou “um povo para si mesmo”
dessa forma que Jesus resume a atividade salvífica do
para que “proclamassem as virtudes dAquele que os
Pai. Qual o interesse do Pai na pregação do evangelho?
chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1Pd
O que Ele intenta fazer por meio do seu Filho? Qual é
2:9). Nisso se constitui a obra missionária da igreja, a
o fim último da encarnação, da expiação e de toda a
vida cristã e a vida de adoração. John Piper resume
redenção? É o Pai buscando adoradores! Que forma
bem nosso ponto:
inusitada e não habitual de Deus se dirigir a pecadores!
Missões não é o objetivo principal da igreja, mas sim a
No entanto, é assim. Robert G. Rayburn ressalta que “Em
adoração. Missões existem porque Deus é o alvo e não o
nenhum lugar nas Escrituras lemos que Deus tenha bus-
homem. Quando esta era passar e os incontáveis milhões
cado qualquer coisa dos pecadores”. A Bíblia não nos diz
de redimidos caírem com o rosto em terra diante do trono
que Deus busca testemunhas, servos ou contribuintes.
de Deus, não haverá mais missões. Trata-se de uma neces-
Ele busca adoradores. Rayburn continua, “não é sem
sidade temporária, mas a adoração existirá para sempre.2
motivo que a única vez na Escritura onde a palavra
A adoração é a nossa “prioridade máxima”, como o
buscar é usada como atividade de Deus, é em conexão
título de um recente livro declara. Cada Filho de Deus
com a busca de verdadeiros adoradores”.1
deveria saber disso.
Há, então, um sentido verdadeiro em que o Evange-
Não é apenas a Bíblia que enfatiza a importância da
lho Cristão trata da adoração. O “evangelho eterno” que
adoração; a herança Presbiteriana e Reformada faz o
pregamos é resumido pelo anjo em Apocalipse 14:7,
mesmo. Muitos historiadores modernos do período da
como: “Temei a Deus e dai-lhe glória (…) e adorai aquele
Reforma, têm feito com que a personalidade marcante
que fez o céu (…)” Como já vimos, a vida cristã é apre-
de Lutero, na sua luta pela fé, acabe obscurecendo o
sentada pelo apóstolo Paulo como um ato de adoração
coração da Reforma Suíça e Calvinista. Para Lutero e os
Revista Os Puritanos 4•2009
9
Pr. Terry Johnson
luteranos, o foco principal era a Justifi-
nham “deixado os ídolos para servirem
de Calvino e os da Igreja Anglicana
cação pela Fé. “Como pode um homem
ao Deus vivo” (1Ts 1:9).
oficial era a questão da adoração. Por
ser justo diante de Deus?” era a ques-
Em 1543, um folheto intitulado On
cem anos os Puritanos lutaram para re-
tão fundamental. Mas para Zuínglio,
the Necessity of Reforming the Chur-
formar o Livro Comum de Orações de
Calvino e a “nata dos Reformadores”,
ch (Sobre a necessidade de Reformar a
acordo com os padrões de Genebra, cul-
o tema principal não era a justificação,
Igreja), Calvino lista os dois elementos
minando com a Guerra Civil, a convoca-
conquanto reconhecessem sua impor-
que definem o Cristianismo, os quais,
ção da Assembléia de Westminster e a
tância. O foco deles era a adoração.
em suas palavras, constituem “o todo da
aprovação por parte do Parlamento do
“Como Deus deveria ser adorado?” cons-
substância do Cristianismo”. Esses dois
Diretory for the Public Worship of God
tituía a pergunta crucial. Para os lute-
elementos são primeiro “um conheci-
(Diretório do Culto Público de Deus)10
ranos, o inimigo da fé eram as “obras”.
mento de qual é a maneira certa de se
para os reinos da Inglaterra, Escócia,
adorar a Deus; e o segundo é a fonte
Gales e Irlanda.
Para os Reformados, a “idolatria”. Carlos M. N. Eire, em seu aclamado
de onde emana a salvação”.6 W. Robert
Não, de fato não estamos acostuma-
War Against the Idols (Guerra contra os
Godfrey comenta, “De forma enfática
dos a pensar na adoração dessa forma
ídolos), relembra à nossa geração aquilo
Calvino coloca a adoração à frente da
hoje. A situação presente não poderia
que os antigos historiadores já haviam
salvação em sua lista dos dois elemen-
ser mais irônica, mesmo onde encon-
percebido. “O foco central do Protestan-
tos mais importantes do Cristianismo
tramos igrejas que se identificam como
tismo Reformado foi a interpretação da
bíblico”. Eire comenta mais adiante:
herdeiras da Reforma, como a PCA, a
7
qual, em nome da liberdade, falha em
adoração (…)”. Distinguindo os lutera-
Calvino define o lugar da adoração como
nos dos zuinglianos, ele diz:
nenhum dos seus predecessores tinha
prover diretórios para a adoração. Pou-
feito antes (…) Adoração, ele diz, deve
cos têm disposição para pensar com
os zuinglianos, a proposta Reformada
ser o interesse central dos cristãos. Não
cuidado a respeito da adoração. Um
não era encontrar um Deus justo, mas
é uma questão periférica, mas a “subs-
número menor ainda vê a necessidade
em voltar-se da idolatria para o Deus
tância última” da Fé Cristã (…) alguém já
disso. Não somente muitos não vêem
verdadeiro.3
disse que esta se tornou a definição fun-
nenhuma conexão entre doutrina e
damental que caracteriza o Calvinismo.
vida prática, como também não vêem
Qual é o ponto central do estudo
conexão entre adoração e vida prática.
A diferença principal é que, para
O mesmo pode ser dito das obras de Heinrich Bullinger (sucessor de Zu-
8
ínglio em Zurique), Martin Bucer em
bíblico e teológico do evangelismo
Assim, para que regularmos a adoração,
Estrasburgo, William Farel em Neu-
e de missões, do conhecimento de
quando geralmente se presume que isso
chatel, e mais tarde João Calvino em
Deus e de toda a religião cristã? A
só serviria para dividir e é algo que não
Genebra. A Reforma se espalhou com
resposta é: a adoração. O verdadeiro
tem valor prioritário? Nós tendemos a
esses homens pregando contra a adora-
conhecimento de Deus leva à adora-
ser como os detratores de Calvino, que
ção medieval idólatra, e o povo respon-
ção correta, que por sua vez, leva ao
o acusaram de fraturar a unidade da
deu com sua fúria iconoclasta. Vitrais
viver correto. Os teólogos da Reforma
igreja com futilidades. Como esses de-
eram quebrados, relíquias eram profa-
pregaram Soli Deo Gloria em todas as
tratores, no entanto, estamos errados
nadas, estátuas despedaçadas, altares
áreas da vida, porque eles tinham em
acerca disso. Questões acerca de como
danificados e igrejas lavadas e caiadas
vista a adoração.
devemos adorar a Deus são as mais im-
novamente. Farel, diz Eire, “usava as
Fazendo da adoração o componente
portantes de todas, por direito próprio
imagens e a missa como tema dos seus
existencial necessário do conhecimento,
e por suas aplicações abrangentes.
sermões para dar curso à Reforma”.4
Calvino a torna o elo entre pensamento
Em Genebra durante os primeiros anos
e ação, entre a teologia e a sua aplicação
da Reforma, “o foco da atenção não era
prática. Foi uma teologia eminentemen-
o assunto da justificação, mas as missas
te prática que Calvino desenvolveu como
e as imagens e tudo que dizia respei-
resultado disso. Religião não é meramen-
to aos seus abusos”.5 Ambos, Farel e
te um conjunto de doutrinas, mas antes,
Calvino descreveram suas conversões,
uma forma de adorar, um estilo de vida.9
não como sendo salvos das obras de
Não somente no continente Euro-
injustiça prioritariamente, mas da ido-
peu, mas também na Grã-Bretanha, o
latria. Como os tessalonissences, eles ti-
coração da batalha entre os seguidores
10
Pr. Terry Johnson NOTAS: 1. O Come Let Us Worship, pp. 15, 16.; 2 Let The Nations Be Glad, the Supremacy of God in Missions, Grand Rapids: Baker Books, 1993; 3 Carlos M. N. Eire, War Against the Idols (Cambridge: Cambridge University Press, 1986), pp. 2, 85; 4 Ibid., p.119; 5 Ibid., p.143; 6 Ibid., p.126; (também encontrado na Selected Works of John Calvin, vol. 1, p.126); 7 Robert W. Godfrey, “Calvin and the Worship of God” (manuscrito não publicado, s.d.); 8 Carlos M. N. Eire, War Agaisnt the Idols, pp. 232, 233; 9 Ibid., p. 232. 10 Publicado pela Editora Os Puritanos – Diretório de Culto de Westminster
Revista Os Puritanos 4•2009
Os Puritanos e o Quarto Mandamento O sábado foi feito por causa do homem, e não o homem por causa do sábado. (Mc 2:27) J.I.Packer
N
do no mesmo, em seu sentido cristão, que proíba trabalho ou diversão no domingo, com prejuízo do tempo de
este ponto, os puritanos iam à frente dos refor-
culto. A maior parte dos reformadores falava no mesmo
madores. Estes últimos tinham seguido Agos-
tom. O que há de notável é que suas declarações, em
tinho e o ensino medieval em geral, negando
outros contextos, mostram que “os reformadores, como
que o domingo fosse, em qualquer sentido, um dia de
um grupo, defendiam a autoridade divina e a obrigação
descanso. Eles afiançavam que o sábado, prescrito pelo
de se observar o quarto mandamento, requerendo que
quarto mandamento, era um mandamento tipicamen-
um dia em cada sete fosse empregado na adoração e
te judaico, prefiguração do “descanso” da relação da
serviço de Deus, admitindo somente as obras de neces-
graça-fé com Cristo.
sidade e de misericórdia, em favor dos pobres e aflitos”.
Eis a explicação de Calvino:
É um quebra cabeça, porém, porque eles nunca per-
“... é extremamente apta a analogia entre o sinal externo
ceberam a incoerência entre afirmar isso, em termos
e a realidade simbolizada, visto que a nossa santificação
gerais, ao mesmo tempo em que defendiam a exegese
consiste na mortificação de nossa própria vontade... Deve-
de Agostinho sobre o domingo cristão. Podemos apenas
mos desistir de todos os atos de nossa própria mente a fim
supor que isso se deve ao fato que não queriam entreter
de que, operando Deus em nós, possamos descansar nEle,
a idéia de que Agostinho poderia estar enganado, razão
conforme ensina o apóstolo (Hb.3:13;4:3,9).
que os cegava para o fato que estavam montando dois
Mas agora que Cristo já veio, o tipo foi cancelado, e seria
cavalos ao mesmo tempo.
um erro perpetuá-lo, tal como seria um equívoco continuar a oferecer os sacrifícios levíticos.
Os puritanos, contudo, corrigiram essa incoerência. Eles insistiam, de forma virtualmente unânime que,
Calvino apelava aqui para Colossenses 2:16, que ele
embora os reformadores estivessem certos ao enxer-
interpretava como alusão ao dia semanal de descanso.
garem apenas um sentido típico e temporário em al-
Ele admitia que, além e acima de sua significação típica,
gumas das prescrições detalhadas no sábado judaico,
o quarto mandamento também ensina o princípio que
contudo, eles também percebiam o princípio de um dia
deve haver adoração pública e privada, além de servir
de descanso, para efeito de adoração pública e privada
de dia de descanso para os servos e empregados, pelo
a Deus, no fim de cada seis dias de trabalho, como uma
que a plena interpretação cristã seria:
lei da criação, estabelecida em benefício do homem, e,
Primeiro, por toda a nossa vida podemos ter por alvo um
portanto, obrigatória para o homem, enquanto ele vi-
descanso constante de nossas próprias obras, a fim de que
ver neste mundo. Também destacavam que, figurando
o Senhor possa operar em nós por meio do Seu Santo Es-
entre nove leis indubitavelmente morais e permanentes
pírito; segundo, cada indivíduo deveria se exercitar com
do decálogo, o quarto mandamento dificilmente teria
diligência em meditação devota nas obras de Deus, e... to-
uma natureza apenas típica e temporária.
dos devem observar a ordem legal determinada pela Igreja
De fato, eles viam esse mandamento como parte in-
para que se ouça a Palavra, administrando as ordenanças e
tegral da primeira tábua da lei, que aborda sistematica-
a oração pública; terceiro, devemos evitar oprimir àqueles
mente a questão da adoração: “O primeiro mandamento
que nos estiveram sujeitos.
fixa o objetivo, o segundo, o meio, o terceiro, a maneira,
Mas Calvino falava como se isso fosse tudo quanto
e o quarto, o tempo”. Também observaram que o quarto
aquele mandamento agora prescreve, nada encontran-
mandamento começa com as palavras “lembra-te...”. E
Revista Os Puritanos 4•2009
11
J. I. Packer
isso nos faz recuar até antes da institui-
que prescreve a adoração apropriada
ção mosaica. Observaram que o trecho
ao Criador), e, como tal, era perpetu-
bem sintetizada na Confissão de Fé de
de Gênesis 2:1 ss. representa o sétimo
amente obrigatória para todos os ho-
Westminster (XXI: vii-viii):
dia de descanso como o próprio descan-
mens. Assim, quando o Novo Testamen-
so de Deus, terminada a criação, e que a
to diz-nos que os cristãos se reuniam
vii. Como é lei da natureza que, em geral,
sanção atrelada ao quarto mandamen-
para adorar no primeiro dia da semana
uma devida proporção do tempo seja des-
to, em Êxodo 20:8 ss., olha de volta para
(ver Atos 20:7; cf. I Co.16:1), guardan-
tinada ao culto de Deus, assim também
aquele fato, retratando o dia como um
do aquele dia como “o dia do Senhor”
em sua palavra, por um preceito positivo,
memorial semanal da criação, “para ser
(Ap.1:10), isso só pode significar uma
moral e perpétuo, preceito que obriga a to-
observado para a glória do Criador, como dever que temos de servi-Lo, e como um encorajamento para confiarmos naquele que criou os céus e a terra. Por meio da santificação do sábado, os judeus declaravam que eles adoravam ao Deus que criou a terra...”. Assim falou Matthew
na doutrina do dia do Senhor, a qual é
coisa: por preceito apostólico, e, prova-
dos os homens em todos os séculos, Deus
velmente, de fato, por injunção domi-
designou particularmente um dia em sete
nical durante os quarenta dias antes
para ser um sábado (descanso) santificado
da ascensão, esse tornara-se o dia em
por Ele; desde o princípio do mundo, até
que os homens, doravante, deveriam
a ressurreição de Cristo, esse dia foi o úl-
guardar o dia de descanso prescrito
timo da semana; e desde a ressurreição de
pelo quarto mandamento. Os puritanos
Cristo foi mudado para o primeiro dia da
Henry, exegeta de um período posterior
notavam que essa mudança, do sétimo
semana, dia que na Escritura é chamado
aos puritanos, mas que os representou
dia da semana (o dia que assinalara o
Domingo, ou dia do Senhor, e que há de
em sua própria época ao comentar
fim da antiga criação) para o primeiro
continuar até ao fim do mundo como o
sobre Êxodo 20:11. Henry também
(o dia da ressurreição de Cristo, que
sábado cristão.
frisou que o mandamento afirma que
assinala o início da nova criação), não
Ref. Ex. 20:8-11; Gen. 2:3; I Cor. 16:1-2;
Deus santificou o sétimo dia (ou seja,
excluída pelas palavras do quarto man-
At. 20:7; Apoc.1:10; Mat. 5: 17-18.
apropriou-o para Si mesmo) e o aben-
damento, meramente determina que
çoou (isto é, “injetou bênçãos no mes- “devemos descansar e guardar, como
viii. Este sábado é santificado ao Senhor
mo, encorajando-nos a esperar bênçãos
descanso, cada sétimo dia...mas...de
quando os homens, tendo devidamente
da parte Dele, na observância religiosa
modo algum determina onde deve co-
preparado os seus corações e de antemão
daquele dia”); e também frisou que Cris-
meçar a seqüência de dias... Não há, no
ordenado os seus negócios ordinários, não
to, embora tivesse reinterpretado a lei
quarto mandamento, qualquer orienta-
só guardam, durante todo o dia, um santo
sobre o sábado, não o cancelou, mas
ção sobre como computar o tempo...”.
descanso das suas próprias obras, palavras
antes, firmou-o, observando-o Ele mes-
Portanto, coisa alguma impede-nos de
e pensamentos a respeito dos seus empre-
mo, e mostrando que esperava que seus
supor que o Novo Testamento parece
gos seculares e das suas recreações, mas
discípulos continuassem a observá-lo
requerer que foram os apóstolos que fi-
também ocupam todo o tempo em exercí-
(cf. Mt.24:20).
zeram a alteração. Nesse caso, tornara-
cios públicos e particulares de culto e nos
Tudo isso, argumentavam os purita-
se claro que a condenação (em Cl.2:16)
deveres de necessidade e misericórdia.
nos, mostra que o descanso do sétimo
do sabatismo judaico nada tem a ver
Ref. Ex. 16:23-26,29:30, e 31:15-16;
dia, era mais que um mandamento ju-
com a observância do dia do Senhor.
Isa.58:13.
daico; antes, era um memorial da cria-
Essas, em esboço, eram as considera-
ção, parte da lei moral (primeira tábua,
ções feitas pelos puritanos, com base
J. I. Packer
Catecismo Maior de Westminster P.116 → Que se exige no quarto mandamento?
O quarto mandamento exige de todos os homens o santificar ou o guardar santos para Deus todos os tempos especificados que Deus designou em Sua Palavra, expressamente um dia inteiro em cada sete; que era o sétimo desde o princípio do mundo até à ressurreição de Cristo, e o primeiro dia da semana desde então até ao dia de hoje, e há de assim continuar até ao fim do mundo; o qual é o sábado cristão, e no Novo Testamento é chamado o dia do Senhor (Domingo). Ref. Gn. 2:3; 1 Co. 16:2; At. 20:7: Jo. 26:19, 26: Ap. 1:10.
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A Natureza da Verdadeira Adoração Jesus respondeu, e disse-lhe: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus (João 3:3) Geoffrey Thomas
1
Pai. Disse Jesus: “os verdadeiros adoradores adoram o Pai”. Naturalmente, o Pai só pode ser adorado através
A verdadeira adoração é prestada a Deus somen-
do Filho e o objeto da nossa adoração é a divindade
te por aqueles que nasceram do Espírito de Deus.
como um todo: Pai, Filho e Espírito Santo. Certamente
“Aquele que é nascido da carne, é carne”, disse
nós adoramos a Jesus, mas é errado adorarmos somen-
Jesus e, portanto, toda assim chamada adoração feita
te a Jesus e torná-lo o centro de nossa adoração, negli-
por pecadores não regenerados é carnal. Somente um
genciando ao Pai.
coração regenerado pode cantar o novo cântico (Salmo 40:3).
5. A verdadeira adoração surge a partir de um contínuo andar com Deus → Um homem que difi-
2. A verdadeira adoração só pode ser realiza- cilmente pensa em Deus durante os seis dias da semana, da através do Espírito Santo → “Os verdadeiros não está apto a adorá-lo corretamente no sétimo dia. Se adoradores adoram o Pai em espírito” disse Jesus e, por- tal pessoa fala o quanto está se “regozijando” na adotanto, unicamente através da iluminação que o Espírito
ração, alguma coisa está errada com ele! Ele está se
concede às nossas mentes, e os sentimentos dela pro
entretendo ou está recebendo aquela vaga sensação de
duzidos em nossos corações é que a nossa adoração
desafio que o homem natural desfruta. Por outro lado,
pode ser edificante para nós e agradável a Deus. Os
em meio à verdadeira adoração, tal pessoa deveria sen-
dons de liderança concedidos pelo Espírito a pastores
tir quanto está afastada de Deus e sentir uma tristeza
e mestres são uma parte essencial de adoração pública.
santa por sua negligência com a glória do Senhor.
3. A verdadeira adoração é estruturada pelas Escrituras → “Os verdadeiros adoradores adoram... em verdade”, disse Jesus. A Bíblia nos revela o Deus a Quem devemos adorar e como devemos fazê-lo: “com reverência e santo temor”. As Escrituras produzem a atmosfera e
6. A verdadeira adoração requer preparação → Um homem não pode simplesmente achegar-se à presença de Deus sem qualquer preparação de coração e alma e esperar, então, por uma “adoração instantânea”. Davi disse: “Ao meu coração me ocorre: buscai a minha
fornecem os temas, as orações, os louvores e a pregação.
presença; buscarei, pois, Senhor, a Tua presença”. (Sl.
Dessa forma, possuímos um padrão para conhecer o
27:8). A verdadeira adoração, no dia do Senhor, surge
que é certo e o que é errado em tudo o que é falado e
de uma mente preparada para Deus, encorajada por
cantado. Desfrutamos, também, uma maravilhosa liber-
uma oração ardorosa pela bênção do Senhor sobre a
dade de todas as tradições e artefatos que são introdu-
noite do sábado e a manhã do dia do Senhor.
zidos por homens não espirituais, na inútil tentativa de “tornar” a adoração mais “importante” e “significativa”. A verdadeira adoração é essencialmente simples.
7. A verdadeira adoração deveria ser acompanhada pela meditação → Eis por que exortamos as pessoas a cuidarem da maneira pela qual empregam
4. A verdadeira adoração é centralizada em Deus → Não é centralizada na “inspiração”, tampouco nos
o seu tempo após o término do culto. Todo o proveito
sentimentos; nem mesmo é centralizada em Jesus ―
pode ser destruído. A graça é uma planta delicada, pode
não somos adoradores só de Jesus. Ela se centraliza no
ser facilmente danificada. Se quisermos aproveitar da
Revista Os Puritanos 4•2009
advindo da exposição e aplicação da Palavra de Deus
13
Geoffrey Thomas
adoração prestada, isso deve ser feito
fazer algo inesperado. Não, eles não
voravelmente com os argumentos bem
por meio de uma tentativa verdadeira
devem concentrar-se muito nos meios
construídos e confiantes, acoplados
de reter a principal lição da pregação.
de adoração; seus pensamentos devem
com a reverência constante observados
estar centralizados em Deus. A verda-
nas orações das gerações anteriores.
8. A verdadeira adoração é sempre um produto e uma perspectiva da grandeza de Deus e da nossa pequenez → O profeta Isaías vê a grandeza de Deus e clama: “Ai de mim! Estou perdido! porque sou homem de lábios impuros, habito no meio de um povo de impuros lábios, e os meus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos!” (Is.6:5). João, na ilha de Patmos, vê o Senhor
deixamos simplesmente que as coisas
rer. No primeiro dia da semana eles se
e nos diz: “Quando o vi, caí a seus pés,
caminhem, mas unicamente queremos
reuniam para partir o pão, ouvir a Pala-
deira adoração é caracterizada pelo de qualquer concentração no homem.
10. A verdadeira adoração tem seu clímax no dia do Senhor → A liber-
esquecimento de si mesmo e ausência O publicano permaneceu em pé, distan-
dade que o povo de Deus desfruta sob
te, abaixou sua cabeça e orou: “Ó Deus,
a nova aliança não lhes dá o direito de
sê misericordioso comigo, pecador”. Em
se reunirem somente quando se senti-
nossos cultos, dirigidos pelas Escritu-
rem conduzidos ou dirigidos a fazê-lo.
ras e dependentes de Cristo, estamos
Na Igreja apostólica, a adoração tinha
verdadeiramente adorando a Deus; não
períodos pré-determinados para ocor-
como morto” (Ap.1: 17). Qualquer coisa
adorar; nós adoramos o Deus vivo em
vra de Deus e recolher as ofertas (Atos
de novo que introduzimos na adoração,
espírito e em verdade, sabendo que o
20:7; I Co.16:2). Mesmo que eles não
que não tenha como objetivo exaltar a
Pai está buscando ativamente tais pes-
sentissem o mesmo ânimo para realizar
Deus é simplesmente uma concessão
soas que o adorem! Nós não cremos que
essas coisas naquele dia e se sentissem
ao desejo por novidade que, caracteriza
todas essas novas ênfases na esponta-
mais inclinados às coisas religiosas no
todos os homens naturais.
neidade e na condução da adoração por
terceiro dia, por exemplo, era no pri-
homens, mulheres e jovens nos estejam
meiro dia que eles deviam reunir-se
9. A verdadeira adoração sempre é aceita por Deus → Devemos ser mui-
levando a uma conscientização maior
para adorar. O mesmo pode ser dito
sobre Deus e à verdadeira adoração.
hoje. Nós não somos “Adventistas do
to cuidadosos para não abrigar pensa-
Pelo contrário, existem abundantes evi-
quinto dia”, daqueles que se reúnem na
mentos que inferiorizam a nossa ado-
dências de que a adoração se encontra
quinta feira à noite e nos orgulhamos
ração! Expressões depreciativas, tais
em declínio. Consideremos, por exem-
das bênçãos maravilhosas e da fantás-
como aquelas que descrevem a adora-
plo, a mudança em nosso modo de nos
tica comunhão quando o Senhor “real-
ção como um “sanduíche de hinos”, so-
dirigirmos a Deus, o que tem ocorrido
mente” se reúne com dez de nós. Não,
mente encorajam a atitude que revela
nos últimos vinte anos.
que nossa adoração é formal, exterior
Será que isso representa um pro-
e sem liberdade e que, se nós estivésse-
gresso e um amadurecimento no culto
mos realmente adorando, então deverí-
e oração públicos? O que será que signi-
amos ter barulho, liderança espontânea
fica essa nova linguagem utilizada para
e excitação. Na realidade, na verdadeira
orarmos: “Nós só queremos te adorar,
adoração, as pessoas não ficam sempre
Te louvar”; “Somente a Ti, Jesus, que-
sentadas na ponta dos bancos imagi-
remos adorar”? As frases truncadas e
nando quem será o próximo a dizer ou
curtas podem ser comparadas desfa-
nós devemos reunir-nos no Espírito no dia designado, o dia do Senhor e com todo o povo de Deus. Em 1994, Geoffrey Thomas era pastor da Igreja Batista Alfred Place Baptist Church em Aberystwyth, Pais de Gales. Ele também trabalhava como editor Assistente da Banner of Truth e do The Evangelical Times (Banner of Truth – Nº 153, junho/1976). *Artigo publicado no Jornal Os Puritanos, Ano II – Nº 5 – Setembro/Outubro - 1994
Catecismo de Heidelberg
P.103 → Que é que Deus requer no quarto mandamento? Primeiro, que o ministério do Evangelho e as escolas cristãs sejam mantidas1 e que eu, especialmente no dia de descanso, seja diligente em ir à igreja de Deus2 para ouvir à Palavra de Deus3, participe dos sacramentos4, para invocar publicamente ao Senhor5 e para praticar a caridade cristã para com os necessitados6. Segundo, para que em todos os dias da minha vida eu cesse as minhas más obras, deixe o Senhor operar em mim por Seu Espírito Santo, e assim começar nesta vida o descanso eterno7. 1. Dt 6.4-9; 20-25; 1Co 9.13, 14; 2Tm 2.2; 3.13-17; Tt 1.5. 2. Dt 12.5-12; Sl 40.9, 10; 68.26; At 2.42-47; Hb 10.23-25. 3. Rm 10.14-17; 1Co 14.2633; 1Tm 4.13. 4. 1Co 11.23, 24. 5. Cl 3.16; 1Tm 2.1. 6. Sl 50.14; 1Co 16.2; 2Co 8; 9. 7. Is 66.23; Hb 4.9-11..
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O Supremo Triunfo de Cristo “Ditas estas palavras, foi Jesus elevado às alturas, à vista deles, e uma nuvem o encobriu dos seus olhos” (Atos 1:9) John R. de Witt
N
― Cristo está sendo elevado ― para o céu na presença dos seus discípulos. Em vista aqui, está uma transição
o Novo Testamento, nem de longe se fala da as-
local. Cristo esteve com os seus discípulos. Jesus falou
censão o tanto que se fala da ressurreição de
com eles. Cristo passou aproximadamente trinta e três
Cristo. A ressurreição é o grande foco do ensino
anos nesta terra, mas agora Ele está conosco não mais
do Novo Testamento. A sua ressurreição dos mortos
naquele literal e físico sentido da palavra. Ele foi ele-
selou tudo o que ele fizera em obediência ao Pai. Por-
vado ao céu, recebido na presença do seu Pai e nosso
que Cristo se levantou da sepultura, sabemos que ele
Pai. Do monte chamado das Oliveiras onde Ele e seus
realizou de fato aquilo a que se propusera. Mas o Novo
discípulos se encontravam, foi tomado, recebido para
Testamento fala muito especificamente da ascensão
dentro do céu. “E uma nuvem o encobriu dos seus olhos”
do Senhor aos céus. Devemos tentar compreender um
(Atos 1:9). Frequentemente nas escrituras “nuvem” ou
pouco do que a ascensão pode e deve significar para
“nuvens”, podem ser mencionadas em relação a Deus e
nós. Além disso, pode-se dizer que a ressurreição e a as-
à sua majestade e glória. No Antigo Testamento quando Deus mostrava-se para o seu povo ele frequentemente
censão são da mesma categoria, são uma única peça de
fazia isto por intermédio de uma nuvem. Deus guiou
tecido, e não podem ser facilmente separadas.
Israel através do deserto naqueles longos e fatigantes
F.F. Bruce, em seu comentário sobre Atos, disse:
anos do seu vaguear, por meio de uma coluna de nuvem
“Na pregação apostólica a ressurreição e ascensão de Cris-
durante o dia e uma coluna de fogo durante a noite.
to parecem representar um movimento contínuo e ambos
Quando Deus se mostrou presente na dedicação do ta-
juntamente constituem sua exaltação. Mas essa exaltação à
bernáculo no deserto, a nuvem, a glória, a shekkinah (a
mão direita de Deus, aquilo que o Dia da Ascensão de Jesus
manifestação da presença do ser divino) cobriu o lugar
Cristo de fato comemora [no calendário litúrgico católico],
e depois disso permaneceu acima da Arca da Aliança
não foi adiada para o quadragésimo dia após seu triunfo
no Santo dos Santos.
sobre a morte”.
Depois, foi-nos dito também, que quando o Senhor
A verdade é que o Senhor não entrou primeiro na
Jesus Cristo foi transfigurado, quando algo da sua glória
presença do Pai, não foi primeiro assentado à mão di-
suprema brilhou através da sua natureza humana, Ele e
reita do Pai, no dia exato da ascensão. Conquanto Ele
seus discípulos com Ele foram envolvidos numa nuvem.
estivesse com seus discípulos durante os quarenta dias
Então, da nuvem Deus disse: “Este é o meu filho amado
entre a ressurreição e a ascensão, a maior parte desse
em quem me comprazo” (Mc. 17:5). Depois há a segunda
período foi passada noutro lugar. Mas como devemos
vinda: “Eis que vem com as nuvens, e todo o olho o verá,
entender esse “outro lugar”? Talvez o Senhor estivesse
até quantos o transpassaram. E todas as tribos da terra se lamentarão sobre ele. Certamente, amém!” (Ap. 1:7).
recolhido num aposento em algum lugar da terra ― numa caverna, numa casa segura, num túmulo? Ele estava e com toda a certeza estivera na presença
Podemos entender de que as Escrituras nos falam
do seu Pai e à sua mão direita, já exaltado ao mais alto
nestas passagens e em muitas outras, que “nuvem” em
grau.
relação a Deus, fala de glória, grandeza e majestade.
Você observará imediatamente, do que Lucas nos
“Nuvem”, nestas circunstâncias, pode ser teofania. E
conta nesta passagem, que a ascensão é a subida visível
quando nos é dito que o Senhor Jesus foi recebido fora
Revista Os Puritanos 4•2009
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John R. de Witt
da sua vista por uma nuvem, não deve-
Mas, se isto é verdade, se Ele está conosco
fala, portanto, da exaltação dessa pes-
mos entender que Ele subiu até que pas-
de acordo com sua própria promessa, e
soa no sentido de que nossa natureza
sou a barreira fornecida pelas nuvens
mesmo até o fim do mundo, então que
foi glorificada e elevada à posição de
e depois continuou indo para cima até
devemos entender da ascensão? A ascen-
honra à mão direita de Deus. Mas, o Se-
que seus discípulos não mais puderam
são, na natureza do caso, significa que Ele
nhor Jesus Cristo quanto à sua deidade,
vê-Io mas, ao contrário, que Ele foi re-
foi levado de nós, que Ele não está mais
sendo Deus como o é, e por essa ra-
cebido na glória celestial.
conosco, que não mais podemos falar com
zão, onipresente, está sempre conosco como prometeu que estaria.
Deus, o Pai, tornou-o à si uma vez
Ele como os seus discípulos eram acostu-
mais Deus O Filho, e assentou-o à sua
mados a fazer. Ele foi embora. Nós, porém,
Agora vamos refletir um pouquinho
própria mão direita com toda a majes-
precisamos compreender muito claro e
sobre o que isto significaria. A ascen-
tade e glória devidas
cuidadosamente em
são não é meramente uma doutrina que
a Ele como Mediador
nossas próprias men-
pode interessar aos especialistas no
e como Rei. A ascen-
tes que a ascensão
campo da Teologia Sistemática e que
são é a festa da en-
não fala do aumento
não nos toca ou move. Ao contrário, a
tronização do nosso
da glória e majesta-
ascensão do nosso Senhor relaciona-se
de dadas ao Senhor
com a minha experiência e com a sua.
Rei
Mediador,
da
sua exaltação para o lugar de honra e preeminência à mão direita de Deus Pai. Mas agora, em segundo lugar, um outro problema tem de ser tratado aqui com relação à ascensão do
É uma grande coisa ter um amigo na corte,
Jesus Cristo como a segunda pessoa da Trindade ou de qualquer mudança em seu ser. Da mesma forma
1. Devemos compreender imediatamente que a ascensão fala da aceitabilidade à vista do Pai, da obra que o seu Filho realizou → O
um que pode
devemos
falar por nós
censão não significa
prema dignidade e honra. Porque Deus
que, quanto à sua dei-
altamente o exaltou, e deu-lhe um nome
entender
Salvador completou sua incumbência
claramente que a as-
mediatória e o Pai elevou-o para su-
Senhor Jesus Cristo
dade, o Senhor Jesus
que está acima de todo nome, para que
por causa de um pos-
Cristo, a despeito da
ao nome de Jesus todo joelho deverá se
sível mal-entendido
sua própria promes-
dobrar; nos céus, na terra e debaixo da
ou de uma má inter-
sa em contrário, não
terra, e que toda língua confessará que
mais está conosco.
Jesus Cristo é o Senhor, para a glória de
pretação. Neste sentido dois problemas podem levantar-se
O que está em jogo aqui é nossa com-
Deus Pai (Fp. 2:9-11).
em nossas mentes ao pensarmos neste
preensão da exaltação da pessoa do
Eu digo que a ascensão é um atesta-
ser recebido na glória.
mediador que não é apenas Deus, mas
do de aceitabilidade da sua obra reden-
O primeiro deles é este: Por que o Se-
também homem. Ele é o homem-Deus.
tiva. Que Ele ascendeu e que governa da
nhor precisava de qualquer argumen-
Ele é Emanuel. E Emanuel signifi-
sua posição de dignidade à mão direita
tação de sua majestade quanto a que
ca “Deus conosco” ou “Deus que está
do Pai e deve significar para nós que
a ascensão lhe deu? Não era Ele desde
conosco”. Ele tomou para si mesmo a
Deus agradou-se do que Ele fez. O que
a eternidade o próprio Filho de Deus?
nossa natureza. Ele é o eterno Filho de
Ele nos diz no evangelho, no Novo Tes-
Quem pode acrescentar qualquer coisa
Deus, e é completamente apropriado
tamento, na palavra que vem para nós
à sua dignidade e poder? “No principio
que devamos nos dirigir a Ele como
de redenção, a qual é nossa em e atra-
era o verbo, e o verbo estava com Deus, e o verbo era Deus” (Jo 1:1). Desde a eter-
a deidade. “Meu Senhor e meu Deus”
vés do seu sangue, é verdadeiro. Nós
disse-lhe Tomé (Jo 20:28). Mas Ele é
podemos depender dela.
nidade, por definição, na natureza do
também um de nós. Ele é um homem.
caso, Ele já tem todo poder e toda glória.
Ele assumiu nossa natureza. Jesus tem
O outro, o segundo problema, é sim-
um corpo. Esse corpo está agora glori-
plesmente este: Antes da sua ascensão
ficado realmente; mas não é menos que
2. A ascensão de Cristo significa que nós temos um porta-voz na presença de Deus o Pai → É uma
Ele mesmo prometeu aos seus discípulos:
um corpo por conta disso. E a transição
grande coisa ter um amigo na corte,
“E eis que estou convosco todos os dias até à consumação dos séculos” (Mt. 28:20).
local que teve lugar; e a subida da ter-
um que pode falar por nós. Deixados
ra para o céu da pessoa do Mediador,
por nós mesmos na sala-do-trono de
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O Supremo Triunfo de Cristo
Deus, tendo de responder por tudo que
e começar nosso trabalho novamente
está dizendo para você? Ele está asse-
temos feito e tudo o que temos falha-
com consciências lavadas e limpas e
gurando a você ― você que crê nele e
do em fazer, nós estaríamos sem voz e
com coração cheio de grande regozijo.
cuja vida tem sido transformada pelo
sem defesa. Devemos ser cuidadosos a
Não importa quão escuro esteja o céu,
seu poder ― que porque Ele está lá
respeito de orar por justiça. Você pede
não importa quão problemática a vida
como ascendeu, o que vive e reina, você
justiça? Deus proíbe que a justiça deve
possa nos parecer algumas vezes, não
também estará lá um dia.
ser feita a mim, pois nesse caso eu devo
importa quão repleta de dificuldades e
perecer totalmente e estar para sempre
com problemas aparentemente insolú-
coberto de vergonha e confusão na face.
veis, há vitória porque o Senhor Jesus
A justiça não é feita a mim a não ser no
Cristo reina à mão direita do Pai.
sentido de que a própria justiça santa
ocorreu o Pentecostes. A Igreja recebeu
do tribunal, a sala do trono de Deus. É
3. A ascensão de Cristo significa que a ressurreição, que agora ainda está em perspectiva para nós, também já nos é uma realidade em princípio → porque o nosso Salva-
uma coisa maravilhosa saber da pre-
dor é, mesmo agora, como nós seremos
de Deus foi satisfeita através da morte, sepultamento e ressurreição do Senhor Jesus Cristo. Daí, eu não tenho que temer na sala
4. A ascensão de Cristo significa que Ele nos enviou o seu Espírito Santo → Dez dias depois da ascensão o dom do Espírito Santo em poder. O próprio Senhor disse em tantas palavras que sua ascensão significava ao mesmo tempo o dom do Espírito Santo:
do eu tropeço e caio no pecado, quando
“Mas eu vos digo a verdade: Convémvos que eu vá, porque, se eu não for, o um dia. Quando Ele levantou-se dentre consolador não virá para vós outros; se os mortos, Ele assim o fez, não como um porém eu for, eu vo-lo enviarei”. (João
eu cometo erros, quando eu falho em
espírito desincorporado, mas em carne
fazer o que devia, e quando eu faço o
e osso (Lc. 24:39). Agora Ele ascendeu
Assim o Senhor, por meio de sua as-
que não devia, eu O tenho ali. Aquele
aos céus. Além disso, Jesus provou que
censão, deu-nos uma garantia de que
que faz intercessão por mim, Aquele
ainda tinha um corpo, um corpo glorifi-
nós teremos a capacitação da qual ne-
que fala a meu favor e cuja influência
cado mesmo quando comeu peixe e mel
cessitamos. Ser-nos-á dado o comissio-
é infinita porque Ele próprio é o Filho
(Lc. 24:41-43). Agora Ele ascendeu aos
namento que devemos ter, se teremos
de Deus.
sença de Cristo ao meu lado, ali. Quan-
16:7).
céus e está à mão direita do nosso Pai
de fazer sua obra. O Espírito Santo dá
O Senhor está ao lado de seu Pai
celestial. Ele está lá como o testemunho,
vida nova; Ele é o autor da regeneração;
para nos representar e interceder por
o atestado, a evidência de que nós, um
Ele é o capacitador do povo de Deus;
nós: “Eis que estou convosco sempre”.
dia igualmente, estaremos lá.
Ele é aquele que toma a mensagem do
Ele quis que soubéssemos que, muito
Não deixe que o seu coração se
evangelho e a comprova de maneira
embora esteja à mão direita do nosso
perturbe: Vós credes em Deus, crede
convincente. Veja a ligação, a inelutável
Pai celestial e não fisicamente conosco,
também em mim. Na casa de meu Pai
ligação, entre a ascensão, por um lado,
Ele está ali como nosso Mediador e nos-
há muitas moradas: se assim não fora,
e o dom do Espírito Santo, por outro
so Rei. Por conta disso podemos dormir
eu vo-lo teria dito. Eu vou preparar-vos
lado.
à noite, podemos levantar dia após dia
lugar (Jo 14:1-3). Você ouve o que Ele
John R. de Witt
A Confissão de Fé Escocesa 10º Capítulo A Ressurreição → Visto que era impossível que as dores da morte pudessem reter cativo o Autor da vida,1 cremos sem nenhuma dúvida que nosso Senhor Jesus Cristo foi crucificado morto e sepultado, o qual desceu ao inferno, ressuscitou para nossa justificação2 e para a destruição daquele que era o autor do pecado, e nos trouxe de novo a vida, a nós que estávamos sujeitos à morte e ao seu cativeiro 3. Sabemos que sua ressurreição foi confirmada pelos testemunhos de seus inimigos4 e pela ressurreição dos mortos, cujos sepulcros se abriram e eles ressuscitaram e apareceram a muitos dentro da cidade de Jerusalém,5 e que foi também confirmada pelos testemunhos dos anjos,6 pelos sentidos e pelo julgamento dos apóstolos e de outros que privaram com ele e com ele comeram e beberam depois da sua ressurreição 7. 1. At 2:24.; 2. At 3:26; Rm 6:5, 9; 4:25.; 3. Hb 2:14-15; 4. Mt 28:4.; 5. Mt 27:52-53; 6. Mt 28:5-6; 7. Jo 20:27; 21:7,12-13; Lc 24:41-43.
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A Escolha da Pessoa do Nosso Redentor Quando Deus designou a redenção da humanidade, Sua grande sabedoria revelou-se no fato de que Ele mesmo determinou que o Seu Único Filho fosse a pessoa que executaria essa tarefa. Ele era o redentor escolhido pelo próprio Deus e, por essa razão, é chamado nas Escrituras de “O Escolhido de Deus” (Is 42.1). A sabedoria na escolha dessa Pessoa se manifesta no fato dEle ser, em todos os aspectos, a pessoa mais apropriada para executar essa tarefa. Era necessário que a pessoa do Redentor fosse uma pessoa divina. Ninguém, senão um ser divino era competente o suficiente para essa grande obra. Ela era totalmente inadequada para qualquer outra criatura. Era imprescindível que o Redentor dos pecadores fosse infinitamente santo em si mesmo. Ninguém poderia remover a infinita maldade do pecado, senão alguém que fosse infinitamente separado do pecado e contra o pecado. E em relação a esse aspecto, Cristo é a pessoa
mais adequada para ser o Redentor. Para que a pessoa fosse competente o suficiente para realizar essa tarefa, era imprescindível que ela fosse uma pessoa infinitamente digna e excelente e pudesse ser merecedora de infinitas bênçãos. E em relação a esse aspecto, o Filho de Deus é pessoa mais adequada. Era necessário que essa pessoa fosse alguém com sabedoria e poder infinitos, pois essa era uma obra tão difícil que exigia alguém com esses atributos. E em relação a esse aspecto, Cristo é a pessoa mais adequada para ser o Redentor. Era imprescindível que essa pessoa fosse muito amada por Deus Pai para que Ele concedesse um valor infinito ao acordo feito entre os dois, devido a Sua estima por essa pessoa, de modo que o amor do Pai por essa pessoa pudesse equilibrar a ofensa e a provocação causada pelos nossos pecados. E em relação a esse aspecto, Cristo é a pessoa mais adequada para
ser o Redentor. Somos aceitos pelo Pai, “no Amado” (Ef 1.6). Era imprescindível que essa pessoa fosse alguém com autoridade absoluta para agir por si mesmo; alguém que não fosse um sevo ou um súdito, pois alguém que não pudesse agir por sua própria autoridade não teria valor algum. Aquele que fosse um servo e não pudesse fazer nada além do que aquilo que era obrigado a fazer não seria digno para essa tarefa. E aquele que não possuía coisa alguma que não fosse absolutamente sua não poderia pagar o preço da redenção de outro.
E em relação a esse aspecto, Cristo é a pessoa mais adequada para ser o Redentor. Ninguém, senão um ser divino poderia ser adequado para ser esse Redentor. Essa pessoa deveria ser alguém que possuísse misericórdia e graça infinitas, pois nenhuma outra pessoa, senão alguém como Ele, poderia realizar uma obra tão difícil em prol de uma criatura tão indigna quanto o homem. E em relação a esse aspecto, Cristo é a pessoa mais adequada para ser o Redentor. Era imprescindível que essa pessoa possuísse verdade e fidelidade perfeitas e imutáveis. Caso contrário, não seria uma pessoa adequada, de quem poderíamos depender para realizar tamanha tarefa. E em relação a esse aspecto, Cristo é a
pessoa mais adequada para ser o Redentor. A sabedoria de Deus em escolher Seu Filho Eterno se manifesta não somente no fato dEle ser a pessoa mais adequada, mas também no fato dEle ser a única Pessoa adequada dentre todas, quer criadas ou não. Nenhum ser criado ― quer fosse homem, quer fosse anjo ― era adequado para realizar essa tarefa… Isso revela a sabedoria divina em saber que Cristo era a pessoa adequada. Nenhum outro, senão Aquele que possui a sabedoria divina poderia conhecer esse fato. Nenhum outro, senão Aquele que possui a sabedoria divina poderia pensar em Cristo para ser o Redentor dos pecadores. Pois, visto que Cristo também é Deus, Ele é uma das Pessoas contra Quem o homem pecou e que foi ofendida pelo pecado de rebelião do homem. Quem, senão o Deus infinitamente sábio poderia pensar em Cristo para ser o Redentor de pecadores que haviam pecado contra Ele, os quais eram Seus inimigos e mereciam o mal infinito de Suas mãos? Quem poderia pensar nEle como Aquele que colocaria o Seu coração no homem e teria amor e compaixão infinitos por ele, exibindo sabedoria, poder e merecimento infinitos pela redenção do homem?
Jonathan Edwards
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Revista Os Puritanos 4•2009
A Piedade nas Ordenanças As ordenanças fortalecem nossa fé, ajudando-nos a nos oferecermos como um sacrifício vivo a Deus Dr. Joel Beeke
C
Como crentes, precisamos constantemente de alimento. Nunca atingimos um ponto em que não preci-
alvino define as ordenanças como testemunhos
samos mais ouvir a Palavra, ou orar ou ser nutridos
“da graça divina para conosco, confirmada por um
pelas ordenanças. Temos de crescer e desenvolver
sinal exterior, com atestação mútua de nossa pie-
permanentemente. Visto que continuamos a pecar,
dade para com Ele”.1 As ordenanças são “exercícios da
porque portamos uma natureza pecaminosa, temos
piedade”. As ordenanças fortalecem nossa fé, ajudando-
necessidade constante de perdão e graça. Assim, a
nos a nos oferecermos como um sacrifício vivo a Deus.
Ceia do Senhor, juntamente com a pregação da Pala-
Para Calvino, assim como para Agostinho, as orde-
vra, nos diz vez após vez: precisamos de Cristo, pre
nanças são a Palavra visível. A Palavra pregada nos al-
cisamos ser renovados em Cristo, edificados nEle. As
cança pelos ouvidos; a Palavra visível, pelos olhos. As
ordenanças prometem que Cristo está presente para
ordenanças mostram o mesmo Cristo apresentado na
receber-nos, abençoar-nos e renovar-nos.
Palavra pregada, comunicando-O de um modo diferente.
Para Calvino, a palavra conversão não significava
Nas ordenanças, Deus se acomoda à nossa fraqueza.
apenas o ato inicial de vir à fé; também significava
Quando ouvimos a Palavra pregada indiscriminadamen-
renovação e crescimento diário no seguir a Cristo.
te, podemos indagar: isto é realmente para mim? Isto
As ordenanças nos guiam a esta conversão diária.
se aplica a mim? No entanto, nas ordenanças Deus nos
Elas nos dizem que precisamos da graça de Cristo
atinge e toca de modo individual, dizendo:
todos os dias. Temos de obter forças em Cristo, es-
“Sim, é para você. A promessa se estende a você”. Assim, as ordenanças ministram à nossa fraqueza, tornando pessoais as promessas, para aqueles que crêem em Cristo para a salvação.
pecialmente por meio do corpo sacrificado na cruz em nosso favor. Calvino escreveu: “Visto que a eterna Palavra de Deus é a fonte da vida, a carne de Cristo é o canal que
Nas ordenanças, Deus vem ao seu povo, encoraja-o,
derrama sobre nós a vida que reside intrinsecamente
capacita-o a conhecer a Cristo, edifica-o e o alimenta
em sua divindade. Na carne de Cristo foi realizada a
nEle mesmo. O batismo promove a piedade como um
redenção do homem; nela, foi oferecido um sacrifício
símbolo do fato de que os crentes estão enxertados
para expiar o pecado, e uma obediência foi rendida a
em Cristo, que são renovados pelo Espírito e adotados
Deus, a fim de reconciliá-Lo conosco. A carne de Cristo
na família do Pai celestial.2 De modo semelhante, a
estava cheia da santificação do Espírito Santo. Final-
Ceia do Senhor mostra como esses filhos adotados
mente, tendo vencido a morte, Cristo foi recebido na
são alimentados por seu Pai amoroso. Calvino gostava
glória celestial”.4 Em outras palavras, o Espírito santi-
de referir-se à Ceia do Senhor como a nutrição para a
ficou o corpo de Cristo, que Ele ofereceu na cruz como
alma. “Os sinais são o pão e o vinho que representam
expiação pelo pecado. Aquele corpo foi ressuscitado
para nós o alimento invisível que recebemos da car-
dentre os mortos e recebido no céu. Em cada etapa de
ne e do sangue de Cristo”, ele disse. “Cristo é o único
nossa redenção, o corpo de Cristo é o caminho para
alimento de nossa alma; portanto, o Pai celestial nos
Deus. Na Ceia do Senhor, Cristo vem ao nosso encontro
convida a vir a Cristo, para que, renovados pelo par-
e diz: “Meu corpo ainda é dado em favor de vocês. Pela
tir dEle, obtenhamos forças, repetidas vezes, até que
fé, vocês podem ter comunhão comigo e receber o meu
cheguemos à imortalidade celestial”.3
corpo e todos os seus benefícios salvíficos”.
Revista Os Puritanos 4•2009
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Joel Beeke
Calvino ensinava que, na Ceia, Cristo
fim alimentar nosso corpo físico, assim
uns aos outros e testemunham os laços
não nos dá apenas os seus benefícios,
também a nossa alma recebe, pela fé, o
que desfrutam com os outros crentes
Ele se dá a Si mesmo e os seus benefí-
corpo e o sangue de Cristo para alimen-
na unidade do corpo de Cristo.13
cios, assim como o faz na pregação da
tar nossa vida espiritual.
Palavra. Cristo também nos torna parte
Oferecemos esse sacrifício de grati-
Quando temos comunhão com Cris-
dão em resposta ao sacrifício de Cristo
de seu corpo, quando se dá em nosso
to por meio das ordenanças, crescemos
por nós. Rendemos nossa vida em res-
favor. Calvino não podia explicar com
em graça. Essa é a razão por que as
posta ao banquete celestial que Deus
exatidão como isso acontece na Ceia do
ordenanças são chamadas de meios de
coloca diante de nós, na Ceia. Pela gra-
Senhor, pois isso é mais fácil de ser ex-
graça. As ordenanças nos estimulam
ça do Espírito, a Ceia do Senhor nos ca-
perimentado do que de ser explicado.
em nosso progresso em direção ao céu.
pacita, como um sacerdócio real, a nos
No entanto, Calvino não disse que Cristo
Promovem confiança nas promessas de
oferecermos como um sacrifício vivo de
deixa o céu para entrar no pão. Pelo con-
Deus, por meio da morte redentora de
louvor e gratidão a Deus.14
trário, na Ceia do Senhor somos chama-
Cristo, “significada e selada”. Visto que
A Ceia do Senhor nos impulsiona
dos a elevar nosso coração ao céu, onde
as ordenanças são alianças, elas con-
tanto à piedade da graça como à da gra-
Cristo está, e a não nos prendermos ao
têm promessas pelas quais “a consci-
tidão, como mostrou Brian Gerrish.15
ência pode ser despertada à segurança
A liberalidade do Pai e a resposta de
de salvação”, disse Calvino.8 O Espírito
gratidão da parte de seus filhos são um
20
pão e ao vinho externos. Somos elevados ao céu mediante a obra do Espírito Santo em nosso cora-
capacita o crente a “ver” a Palavra gra-
tema recorrente na teologia de Calvino.
ção. Conforme disse Calvino: “Cristo
vada nas ordenanças e receber a “paz
“Devemos reverenciar grandemente esse
está ausente de nós no que se refere
de consciência” que lhe é oferecida nas
Pai, com piedade grata e amor intenso”,
ao seu corpo; mas, habitando em nós
ordenanças.9
Calvino nos adverte, “a ponto de nos de-
por meio do seu Espírito, Ele nos eleva
Finalmente, as ordenanças promo-
dicarmos totalmente a obedecer-Lhe e a
ao céu, ao encontro dEle mesmo, trans
vem a piedade por nos motivarem a
honrá-Lo em tudo”.16 A Ceia do Senhor
mitindo-nos o poder vivificador de sua
agradecer e louvar a Deus por sua graça
é a dramatização litúrgica da graça e da
carne, assim como os raios de sol nos
abundante. As ordenanças também exi-
gratidão, que estão no âmago da pieda-
revigoram por meio de seu calor vital”.5
gem que “confirmemos nossa piedade
de.17
Participar da carne de Cristo é um ato
para com Ele”. Como disse Calvino: “O
Na Ceia do Senhor, o elemento huma-
espiritual, e não um ato carnal que en-
Senhor traz à nossa memória a grande
no e o divino da piedade são mantidos
volve uma “transfusão de substâncias”.6
generosidade de sua bondade e nos ins-
em tensão dinâmica. Nesse intercâmbio
As ordenanças podem ser vistas
pira a reconhecê-la; e, ao mesmo tempo,
dinâmico, Deus se move em direção ao
como escadas pelas quais ascendemos
nos adverte a não sermos ingratos em
crente, enquanto o Espírito Santo consu-
ao céu. “Porque somos incapazes de
relação a tão profusa liberalidade; an-
ma a união fundamentada na Palavra. Ao
voar suficientemente alto para nos
tes, devemos proclamar com louvores
mesmo tempo, o crente se move em di-
aproximarmos de Deus, Ele nos orde-
adequados e celebrar [a Ceia do Senhor]
reção a Deus, por contemplar o Salvador
nou as ordenanças, como escadas”, dis-
dando-Lhe graças”. 10
que o revigora e fortalece. Nisso, Deus é
se Calvino. “Se um homem deseja pular
Duas coisas acontecem na Ceia do
até às alturas, quebrará seu pescoço na
Senhor: o receber de Cristo e o render-
tentativa; mas, se ele tem escadas, será
se do crente. Do ponto de vista de Deus,
capaz de prosseguir com confiança. De
a Ceia não é eucarística — disse Calvino,
modo semelhante, se temos de chegar
pois Cristo não é oferecido novamente.
ao nosso Deus, temos de usar os meios
Tampouco é eucarística em termos dos
que Ele instituiu, visto que Ele sabe o que
méritos do homem, pois não podemos
é adequado para nós. Deus nos deu esse
oferecer nada a Deus como sacrifício.
maravilhoso amparo, encorajamento e
No entanto, a Ceia é eucarística em ter-
vigor em nossa fraqueza”.7
mos de nossas ações de graça.11 Esse
Nunca devemos adorar o pão, por-
sacrifício é uma parte indispensável
que Cristo não está no pão. Antes, en-
da Ceia do Senhor, que inclui “todos os
contramos a Cristo por meio do pão.
deveres de amor”.12 A Ceia é uma festa
Assim como nossa boca recebe o pão a
agape em que os comungantes animam
20
glorificado, e o crente, edificado.18 Extraído do livro Vencendo o Mundo, Dr. Joel Beeke, Editora FIEL, pgs. 57-62 Notas: 1. Institutes. 4.14.1; 2. Institutes. 4.16.9. Ver também: WALLACE, Ronald S. Calvin’s doctrine of the Word and sacrament. London: Oliver and Boyd, 1953. p. 175-183. OLD, H. O. The shaping of the reformed baptismal rite in the sixteen century. Grand Rapids: Eerdmans, 1992. 3. Institutes. 4.17.812. 4. Ibid. 5. Institutes. 4.17.24,33. 6. Institutes. 4.17.12. 7. C0. 9:47,522. 8. Institutes. 4.14.18. 9. Commentary, 1 Coríntios 11.25. 10. Commentary, Mateus 3.11; Atos 2.38; 1 Pedra 3.21. 11. OS. 1:136, 145. 12. Institutes. 4.18.3. 13. Institutes. 4.18.17. 14. Institutes. 4.17.44. 15. Institutes. 4.18.13. 16. CALVIN’S eucharistic piety. In: FOXGROVER, David. The legacy of John Calvin. Grand Rapids: CRC, 2000. p. 53. 17. OS. 1:76. 18. GERRISH, Brian A. Grace and gratitude: the eucharistic theology of John Calvin. Minneapolis: Fortress Press, 1993. p. 19-20. 19. GREVE, Lionel. Freedom and discipline in the theology of John Calvin, William Perkins, and john Wesley: an examination of the origin and nature of pietism. Dissertação (Ph. D). 1975. f. 124¬-125. Hartford Seminary Foundation, 1975.
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A Igreja — Agente da Evangelização Incontestavelmente, a Igreja cristã é a agente que Deus designou para a obra de evangelização R. B. Kuiper
I
(Mateus 16.19; 18.18), autorizando-os deste modo a formular as condições para a relação de membros da
ncontestavelmente, a Igreja cristã é a agente que
Sua Igreja. É evidente que, histórica e doutrinariamen-
Deus designou para a obra de evangelização. Contu-
te, os apóstolos foram o alicerce da Igreja organizada
do, ao se afirmar isso, é bom definir o termo Igreja.
do Novo Testamento. Mudando a metáfora, os apóstolos
Neste contexto o vocábulo tem dois pontos de refe-
foram a Igreja em embrião. Conclui-se que, quando Cristo
rência que, embora inseparáveis, apropriadamente se
encarregou seus apóstolos de fazerem discípulos de todas
distinguem um do outro. Tanto a Igreja como organi-
as nações, deu essa ordem a eles e à Igreja organizada dos
zação, operando por meio dos seus ofícios especiais,
tempos subsequentes.
como a Igreja como organismo de crentes, cada um
O pentecostes não é a data de nascimento da Igre-
dos quais desempenha um ofício geral ou universal;
ja Cristã. A Igreja veio à existência no jardim do Éden.
são agentes da evangelização ordenada por Deus.
Entretanto, aconteceram algumas mudanças verdadei-
O que se segue é uma demonstração bíblica e um
ramente grandes da Igreja quando o Espírito Santo
desenvolvimento dessa proposição dupla.
foi derramado sobre ela. Como já foi dito, uma dessas
A Igreja Como Organização → Nem todas as Igre-
versalismo.
mudanças foi a transição do nacionalismo para o unijas têm o mesmo grau de organização. Umas ordenam
Outra mudança, estreitamente relacionada com a
oficiais, outras não. Nem todas as Igrejas que adotam
anterior, foi a separação de Igreja e Estado. Na velha dis-
oficiais reconhecem o mesmo número deles. Todavia,
pensação a Igreja e o estado, se bem que não identifica-
inevitavelmente, toda Igreja tem organização em algu-
dos, estavam interligados intimamente. Israel era uma
ma extensão. E a Escritura o requer. Organizar grupos
teocracia; pode-se dizer um Estado-Igreja. Agora que a
de cristãos em Igrejas era o invariável costume do mis-
Igreja se havia tornado universal, tinha que ser cortada
sionário Paulo. Na Ásia Menor, ele e Barnabé ordena-
do estado judaico. Pois foi o que ocorreu. E este é um
ram presbíteros em cada uma das Igrejas (Atos 14.23).
modo de dizer que no Pentecoste a Igreja adquiriu sua
A Bíblia ensina claramente que a evangelização é
organização próp ia e distinta. Não é impróprio afirmar
tarefa da Igreja organizada.
que, embora o Pentecoste não assinale o natalício da
Os apóstolos, a quem a Cabeça da Igreja dera o man-
Igreja cristã como tal, ele assinala o dia do nascimento
damento missionário, foram o alicerce da Igreja orga-
da organização da Igreja neotestamentária. Foi nesse
nizada neotestamentária. Quando Pedro, como porta-
sentido que a Igreja recebeu poder do Espírito Santo
voz dos doze, tinha confessado que Jesus é o Cristo,
para testemunhar de Cristo “em Jerusalém, em toda a
o Filho de Deus vivo, disse o Senhor: “Eu te digo que Judéia, em Samaria, e até os confins da terra” (Atos 1.8). tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja” Havia uma Igreja organizada em Antioquia da Síria. (Mateus 16.18). A “pedra” de que Jesus falou não era Ela recebeu esta ordem do Espírito Santo: “Separai-me nem Pedro como indivíduo, nem meramente sua confis- agora a Barnabé e a SauIo para a obra a que os tenho são, mas, sim, o Pedro confessante como representante chamado”. A Igreja obedeceu. É significativo que se diz dos apóstolos. E a “Igreja” mencionada era uma orga-
que Barnabé e Saulo foram enviados como missionários
nização, como transparece do fato de que foi adiante
pela Igreja e pelo Espírito Santo. “Então, depois que jejuaram, oraram e lhes impuseram as mãos, os despediram.
e confiou “as chaves do reino dos céus” aos apóstolos
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21
R. B. Kuiper
Enviados, pois, pelo Espírito Santo, des- ser evangelista, exercesse um segundo ceram a Selêucia e dali navegaram para ofício. Chipre” (Atos 13.2-4). Em resumo, SauEvidentemente o nome evangelista
esse título dos obreiros não ordenados
lo e Barnabé foram ordenados missio-
era dado às vezes a homens que ser-
que fazem trabalho evangelizante não
nários, divina e eclesiasticamente.
viam como pregadores itinerantes. De-
deve ser considerado como exigência
particularmente aos não salvos, bem podem ser assim denominados. Retirar
A argumentação recém apresen-
pois de pregar o Evangelho num lugar,
de princípio. E como será demonstrado
tada é incontestável. É preciso anotar
partiam logo para outro. Em rápida
a seguir, é próprio afirmar que, num
como fato estabelecido que a Igreja
sucessão Filipe foi levado pelo Espíri-
sentido real, todo cristão está obriga
como organização é agente que Deus
to para pregar em Samaria, na estrada
do a ser evangelista, por dever sagrado.
nomeou para a obra de evangelização.
de Jerusalém a Gaza, e em Azoto (Atos
O assunto recém-considerado é de
Daí, seus oficiais devem aplicar-se à
8:5,26,40). Assim o evangelista, saindo
importância relativamente menor. Res-
evangelização, ordenar missionários e
de uma dada localidade, deixava lugar
ta considerar uma questão decidida-
enviar trabalhadores para a seara. Não
para um pastor ou mestre. Talvez seja
mente importante.
se conclua, porém, que somente os seus
esta a razão porque os pastores e mes-
Desde a Reforma do século dezes-
oficiais têm o dever de dedicar·se ativa-
tres são mencionados logo em seguida
seis, o protestantismo sempre ensinou
mente à evangelização. Sob os seus aus-
aos evangelistas em Efésios 4:11.
que três marcas distinguem a verda-
pícios, direção e governo os membros
O fato de que em Efésios 4:11 a fun-
deira Igreja da falsa. São a autêntica
da Igreja em geral têm a obrigação de
ção dos evangelistas é introduzida en-
pregação da Palavra de Deus, a mi-
levar o Evangelho aos não salvos.
tre as funções temporárias de apóstolos
nistração dos sacramentos de acordo
Aqui é preciso dizer algo acerca do
e profetas e as funções permanentes
com os preceitos de Cristo, e o fiel
uso bíblico do termo evangelista. Apa-
de pastores e mestres, dá surgimento
exercício da disciplina eclesiástica.
rece três vezes no Novo Testamento.
à questão se era para os evangelistas
Em vista da incondicional exigência
Em Atos 21:8 Felipe é chamado de
servirem somente à Igreja apostólica
da Palavra de Deus de que a Igreja se
“evangelista”. Efésios 4:11: “E ele deu
ou também à Igreja das eras posterio-
aplique à evangelização, pergunta-se
uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, e outros para pastores e mestres”. Em 2 Timóteo 4:5
res. Não é difícil encontrar a resposta.
se não deveria ser acrescentada uma
Os evangelistas exerceram autoridade
quarta marca, a saber, a evangelização
extraordinária, com estreita afinidade
dos não salvos. Esta matéria merece
Paulo admoesta o seu filho espiritual di-
com a dos apóstolos. Tinham autorida-
séria consideração. Talvez se possa
zendo: “Faze o trabalho de evangelista”. À
de para nomear presbíteros (Tito 1:5) e
indagar se existe em algum lugar al-
luz destas passagens, parecem ter base
para exercer disciplina individualmen-
guma Igreja que negligencie comple-
certas conclusões.
te (Tito 3:10). Evidentemente os evan-
tamente a evangelização. Mas caso
O evangelista não ocupou um quar-
gelistas receberam autoridade especial
haja uma Igreja assim, ela está-se ne-
to ofício da Igreja apostólica em acrés-
dos apóstolos, com os quais estavam
gando a si mesma abertamente. Para
cimo aos três ofícios de presbítero
associados intimamente. Poder-se-ia
usar uma expressão um tanto banal, a
regente, presbítero docente e diácono.
dizer que eram apóstolos por delega-
evangelização é essencial, não somen-
Isso parece que devia ser uma conclu-
ção. E isto só pode significar que sua
te ao bem estar da Igreja, mas à pró-
são já evidente, pois Cristo, a Cabeça
posição na Igreja era temporária, como
pria existência dela. Evangelizar é da
da Igreja, exerce o tríplice ofício de
a dos apóstolos.
essência da verdadeira Igreja. Contudo,
rei, profeta e sacerdote, e os três ofí-
Se a palavra evangelista não pode
cios eclesiásticos mencionados acima
ser empregada hoje pela Igreja é ou-
uma quarta marca às três tradicionais.
O representam nesse tríplice ofício.
tra coisa. Tirar essa conclusão poderia
Pois a evangelização está implícita na
Dificilmente se pode pensar num quar-
demonstrar um biblicismo doentio. É
primeira e principal marca. Pregação
to ofício em coordenação com os três.
certo que no presente a Igreja já não
autêntica é pregação da Palavra de
isto não indica que deve ser adicionada
Esta conclusão é confirmada pelo fato
tem evangelistas no sentido especial e
Deus não adulterada, por certo, mas
de que Filipe, o evangelista, era diáco-
específico em voga na era apostólica.
é também pregação de toda a Palavra.
no (Atos 6:5) e Timóteo, o evangelista,
Mas isto não é razão bastante para le-
Não se pode dizer que a Igreja que
era sem dúvida presbítero (1 Timóteo
var-nos a evitar aquele nome. Por exem-
deixa por completo de evangelizar os
4:14; 1 Tessalonicenses 3:2). É impro-
plo, os pregadores ordenados pela Igre-
não salvos esteja proclamando todo o
vável que qualquer deles, em virtude de
ja organizada para levar o Evangelho
conselho de Deus. A evangelização faz
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Revista Os Puritanos 4•2009
A Igreja, Agente da Evangelização
parte integrante da pregação legítima.
Deus instituiu oficiais especiais em
Espírito!” (vers. 29). Esse foi um desejo
Quem sabe se poderia reformular a ex-
Sua Igreja. Mas a Escritura também
profético. Séculos mais tarde, o profe-
pressão verbalizada da primeira marca
ensina que há um ofício universal de
ta Joel predisse o cumprimento desse
da verdadeira Igreja de modo que res-
que participam todos os Cristãos. Todo
desejo. Deus disse por intermédio dele:
salte essa verdade.
crente em Cristo detém o tríplice ofício
“E acontecerá depois que derramarei o
Outra matéria de considerável im-
de profeta, sacerdote e rei. Esta verdade
portância precisa ser mencionada. Pau-
é afirmada sucintamente em 1 Pedro
lo ordenou ao evangelista Timóteo: “O que de mim ouviste, entre muitas testemunhas, isso mesmo transmite a homens fiéis e também idôneos para instruir a outros” (2 Timóteo 2:2). Uma implica-
2:9: “Vós,porém, sois raça eleita, sacer-
fazer provisão para o preparo de evan-
dócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz”.
gelistas, particularmente daqueles que
A Igreja é uma reale-
ção dessa ordem é que a Igreja precisa
têm em mente dedicar a vida toda à
za de sacerdotes, um
apresentação do Evangelho aos per-
sacerdócio de reis. E
didos. Neste ponto muitas Igrejas são
cada sacerdote e rei
faltosas. Quase todas as denominações
tem o dever de procla
possuem uma ou mais escolas teológi
mar as excelências do
cas para a preparação de ministros. O
seu Salvador. É sua
meu Espírito sobre toda a carne; vossos filhos e vossas filhas profetizarão, vossos velhos sonharão, e vossos jovens terão visões; e também sobre os servos e sobre as servas derramarei o meu espírito naqueles dias” (Joel 2.28,29). Essa profecia
Pregação
autêntica é pregação da Palavra de Deus, mas é também
cumpriu-se no Pentecostes, quando não só os apóstolos, mas todos os membros da Igreja de Jerusa lém estavam reunidos unânimes num mesmo lugar, e “todos ficaram cheios do Espírito Santo, e começaram a falar em outras línguas, conforme o Espírito lhes concedia que falassem” (Atos 2.1,4). Tem-
currículo de muitos desses seminários
função como profeta.
visa principalmente ― quase exclusi-
A experiência de
vamente até ― ao preparo de homens
Eldade e Medade nar-
para servirem como pastores de Igrejas
rada em Números 11
estabelecidas. Muitíssimo mais atenção
é tão instrutiva como
devia ser dada à preparação de evan-
interessante. Moisés
gelistas.
não podia levar so-
que o Pentecostes dá
zinho a carga de
lugar ao sacerdócio
pregação de toda a Palavra
se dito com acerto
A Igreja como Organismo → A Igre-
julgar os filhos de
ja organizada foi instituída por Deus.
Israel durante a sua peregrinação no
Pode-se muito bem dizer igualmente
Ele é seu fundador. Não declarou o Fi-
deserto. À ordem de Deus, foram desig-
que o derramamento do Espírito fez de
lho de Deus: “Sobre esta pedra edificarei
nados setenta anciãos como seus assis-
cada membro da Igreja um evangelista.
a minha igreja”. (Mateus l6.l8)? Por essa
tentes. Em dada ocasião, eles estavam
Assim foi no dia de Pentecoste e assim
razão os homens deviam escrupulosa
reunidos no tabernáculo, o Espírito de
continua sendo hoje. Cada cristão é um
mente tomar cuidado para não privá-la
Deus veio sobre eles, e profetizaram.
agente da evangelização, ordenado por
de suas prerrogativas. E ela não tem
Entretanto, Eldade e Medade, embora
Deus.
universal dos crentes.
prerrogativa mais preciosa do que a de
pertencentes aos setenta, estavam fora
Desta maneira, o crente dá testemu-
evangelizar o mundo.
do tabernáculo, no acampamento. Sur-
nho de Cristo aos seus vizinhos, aos
Apesar disso, não segue que todo
preendentemente, o Espírito veio sobre
seus companheiros de trabalho na loja,
empreendimento evangelístico deve
eles também, e profetizaram. Um jovem
no armazém ou no escritório, a seus
estar sob o direto e completo controle
correu a contar a Moisés esta flagran-
colegas de estudos e a seus professo-
da Igreja como organização. A Igreja
te irregularidade. Josué, filho de Num,
res, àqueles sobre os quais tem auto-
tem outro aspecto. Além de ser organi-
zeloso servidor de Moisés, exclamou:
ridade e àqueles que têm autoridade
zação, é organismo. Como organização
“Moisés, meu senhor, proíbe-os”. Que foi
sobre ele. Convida os seus vizinhos
ela opera por meio dos seus oficiais;
que Moisés fez? Repreendeu Eldade e
que não pertencem a nenhuma Igreja
como organismo ela opera por meio
Medade? Não fez nada disso. Ao invés,
a que frequentem os cultos de sua Igre-
dos seus membros, individualmente
disse: “Oxalá todo o povo do Senhor fosse
ja, reúne em casa os filhos deles para
considerados.
profeta, que o Senhor lhes desse o Seu
contar-lhes histórias bíblicas e coloca
Revista Os Puritanos 4•2009
23
R. B. Kuiper
folhetos evangélicos ao alcance de toda
são de origem humana e podem apli
de Deus, e aquela organização sentiu-se
gente em lugares públicos. Distribui
car-se à evangelização, estas devem vi-
constrangida a apelar para a ordenação
Bíblias nos lares, hotéis e motéis. Em
giar sempre no sentido de evitarem que
de missionários verdadeiramente evan-
suma, semeia a semente do Evangelho
venham a suplantar a primeira em sua
gélicos. Quando, no primeiro quartel do
onde pode e lança o pão do Evangelho
qualidade de agente da evangelização.
século atual, a Igreja Presbiteriana nos
a muitas águas. E para fazer isso tudo
Nestes dias em que ― geralmente
Estados Unidos da América caiu sob
não tem por que pedir autorização aos
falando ― a Igreja organizada não goza
o fascínio do modernismo, homens e
oficiais da sua Igreja. Cristo, seu Senhor,
tão alta estima como devia, nem mesmo
mulheres fiéis criaram a Junta Inde-
o autorizou. Não obstante, ele o faz na
por seus próprios membros, essa adver-
pendente de Missões Presbiterianas
qualidade de membro do corpo de Cris-
tência está longe de ser supérflua. Não é
Estrangeiras. Esses são exemplos de
to, a Igreja.
nem um pouco raro que missões e cam-
medidas radicais, justificadas porém
Aquilo que o crente pode fazer como
panhas evangelísticas sejam dirigidas
pelas situações de emergência ― medi-
indivíduo, pode fazer também em co-
por juntas ou comissões independentes
das dignas de louvor, verdadeiramente
laboração com outros cristãos. Grupos
do controle eclesiástico. Normalmente
heróicas. Todavia, deve-se reconhecer
ou associações voluntárias de cristãos
isto não deveria acontecer. Sabe-se
que são exceções à regra. Antes de se
podem traduzir, publicar e distribuir as
de associações dessas que costumam
darem tais passos, deve-se fazer todo o
Escrituras, transmitir o Evangelho pela
enviar evangelistas ordenados e mes-
possível para persuadir a Igreja organi-
produção e disseminação de literatura
mo costumam ordenar evangelistas.
zada a cumprir o seu dever, e a fazê-lo a
cristã, e por muitos e variados meios
Em condições normais essas práticas
contento. E, se forem tomadas aquelas
pode propagar as boas novas da salva-
devem ser julgadas completamente
medidas extremas, deverão ser postas
ção onde esta não é conhecida.
irregulares. É evidente que atividades
de lado assim que surgir uma Igreja ca-
Tem-se tentado algumas vezes traçar uma aguda linha de demarcação entre a
dessa natureza são prerrogativas da
paz e desejosa de levar adiante a obra
Igreja organizada.
de evangelização verdadeiramente cris-
atividade evangelística da Igreja como
Se as condições de uma Igreja po-
organização, e a obra evangelística ade-
dem ou não tornar-se tão anormais que
A Igreja como organização, e a Igreja
quadamente levada adiante pela Igreja
justifiquem esses modos de proceder, é
como organismo são ambas agentes da
como organismo, mas nunca se alcan-
outra questão. Quando a Igreja da In-
evangelização, agentes ordenados por
çou pleno sucesso nessas tentativas.
glaterra negligenciou as missões, mui-
Deus. Não podem entrar em conflito
Proeminentes
evangélicos
tos dos seus membros se congregaram
uma com a outra, pois são dois aspectos
chegaram à conclusão de que isto não
em sociedades missionárias. Elas se en-
do corpo uno de Cristo. Devem traba-
é nem necessário nem possível. Entre-
carregaram de fazer o que competia à
lhar harmoniosamente para apressar o
teólogos
tã.
tanto, pelo menos um ponto precisa ser
Igreja, e que esta deixou de fazer. Quan-
dia em que todas as nações que Ele fez,
estabelecido. Visto que a Igreja organi-
do, em meados do século dezenove, a
venham perante o Senhor, adorem-no, e glorifiquem o Seu nome (Salmo 86:9).
zada foi instituída por Deus e deve apli-
Igreja oficial da Holanda sucumbiu ao
car-se à evangelização, ao passo que as
modernismo teológico, alguns dos seus
associações voluntárias de cristãos, ain-
membros fundaram uma organização
Extraído com permissão de “Evangelização Teocên-
da que legítimas e bem intencionadas,
para a direção de missões fiéis à Palavra
trica”, PES - PP. 93-100
Segunda Confissão Helvética 16. Da fé e das boas obras, e da sua recompensa, e do mérito do homem Obras de escolha humana → E na verdade, obras e cultos que escolhemos por nosso arbítrio não são agradáveis a Deus. A estes São Paulo denomina ethelothreskia (CI 2.23). Desses o Senhor diz no Evangelho: “Em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos de homens” (Mt. 15.9). Portanto, desaprovamos tais obras, mas aprovamos e estimulamos aquelas que são da vontade e de mandado de Deus.
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Revista Os Puritanos 4•2009
As Escrituras — Nossa Conselheira “Com efeito, os teus testemunhos são o meu prazer, são os meus conselheiros” (Sl 119:24) Charles Bridges
O
Todavia para aqueles que fazem da Palavra seu deleite, sempre haverão de considerá-la seu conselheiro. Uma
que mais poderíamos desejar em tempos de
leitura superficial nunca nos fará compreender acerca
lutas senão conforto e direcionamento. Davi
do gozo santo e do conselho nela contidos. Ela deve
possuía estas bênçãos. Como fruto de sua “me-
ser aplicada em nossa experiência particular, em nos-
ditação nos mandamentos do Senhor”, eles eram o seu
sa conversação diária e consultada naquelas ocasiões
“deleite” na angústia e conselheiros na perplexidade.
rotineiras quando, esquecidos de nossa necessidade de
Ele não trocaria este deleite pelo maior dos prazeres
orientação divina, somos freqüentemente inclinados a
terrenos (vv. 14, 97, 103 e 127 com Sl 4:7). Tão sabia-
seguir nosso próprio conselho. O cristão é um homem
mente estes conselheiros dirigiram seus passos, que,
de fé em cada passo de sua caminhada. O uso cotidia-
não obstante “príncipes se assentaram e falaram contra
no e a familiaridade com os testemunhos de Deus (Nm
ele”, não puderam acusá-lo por nenhum motivo ou falta
9:15-23) revelar-se-ão como a coluna e a nuvem em
(1 Sm. 18:14; Sl 101:2; com Dn. 6:4, 5). Os mandamentos do Senhor foram verdadeiramente “os homens do seu conselho”. Ele se conduziu pelas
todos os reveses de sua vereda celestial. Para o cristão, a Palavra será como o Urim e Tumim — um infalível conselheiro.
ordenanças do Livro de Deus, colocadas diante de si,
Entretanto, algumas vezes a perplexidade se ergue
como recurso vindo do mais experiente dos conselhei-
em meio ao conflito, não aquele entre nossa consciên-
ros. Ou ainda quando os profetas lhe entregavam a Pa-
cia e a indulgência pecaminosa (na qual a sinceridade
lavra diretamente da boca de Deus. Desta forma, mesmo
cristã invariavelmente determinaria o rumo a trilhar),
como súdito ou como Rei, Davi possuía conselhos. De
mas entre deveres e deveres. Quando, porém, certas
um lado estava Saul e seus conselheiros (v. 23). No ou-
obrigações parecem conflitar-se entre si, o conselho da
tro, Davi e os testemunhos do seu Deus. Pensemos: qual
Palavra definirá a importância relativa delas, conexão e
estava mais bem provido daquela sabedoria que é útil
dependência, a disposição da providência, a orientação
para guiar? Posteriormente já como Rei, Davi estava
que tem sido concedida ao povo de Deus em situações
obrigado a fazer dos “testemunhos do seu Deus seus
semelhantes e a luz que a vida diária de nosso Modelo
conselheiros” (Dt. 17:18-20); e certamente através da
Maior demonstra diante de nós. A questão principal,
constante consideração à voz destes mandamentos, ele
porém, é cultivar o hábito mental que se encaixa mais
usufruiu grande prosperidade terrena.
naturalmente com o conselho da Palavra. “Caminhando
Em um mundo como este cercado de tentações por
no temor do Senhor” (veja Salmo 25:12,14) com espírito
toda a parte, precisamos principalmente de conselhos
humilde de dependência, fugindo da idolatria de tomar
sábios e sadios. Mas em nosso interior, todos nós tra-
conselho com nossos corações, não podemos material-
zemos um péssimo conselheiro e nossa tolice é dar ou-
mente errar. Deve haver uma confluência entre nossa
vidos à sua voz. Deus nos tem concedido sua Palavra
disposição e a promessa divina — uma vigilância contra
como um conselheiro infalível e “aquele que dá ouvidos
a propensão impetuosa da carne; uma consideração vi-
ao conselho é sábio” (Pv.12:15)
gorosa pela glória de Deus e uma submissão mansa ao
Pois bem, nós valorizamos o privilégio deste conse-
seu gracioso desígnio.
lho celestial? Cada progresso tem de aprofundar nosso
Se, contudo, o conselho não se mostrar infalível, a
deleite nele. Um interesse leviano impede esta benção.
falta não está na Palavra, mas na obscuridade de nossa
Revista Os Puritanos 4•2009
25
Charles Bridges
percepção. Neste caso, não precisamos
para
caminharmos
cautelosamente
tivéssemos ouvindo uma revelação di-
de uma regra mais clara ou um guia
naqueles pontos de dúvida em relação
reta dos céus. Não queremos uma nova
mais seguro, mas de uma visão precisa.
ao conselho celestial, que podem co-
revelação, ou uma voz sensível do alto
E por fim, se não pudermos definir cada
mungar com nossa inclinação natural.
para cada novo acontecimento. Basta
ato de nosso dever (já que para tal, até
No retrospecto de nossas experiências
apenas aquilo que nosso Pai nos deu:
o mundo em si mesmo “não poderia conter os livros que deveriam ser escritos”)
passadas, quantos passos equivocados
esta abençoada “lâmpada para nossos
podem ser atribuídos ao conselho de
pés e luz para nossos caminhos” (Sl 119:
mesmo assim o conselho determina o
nossos próprios corações, buscados e
105; compare Pv. 6:23).
padrão pelo qual a mais insignificante
seguidos pela nossa negligência ao con-
Deixe-me então inquirir — Qual é o
das ações da mente deve ser submetida
selho de Deus (Josué 9:14 Isaías 30:1-
conselho de Deus que me fala direta-
(1Co. 10:31 e Cl 3:17) e a postura que
3), ainda que nenhuma circunstância
mente? Se eu sou um pecador adorme-
refletirá a luz da vontade de Deus sobre
de incerteza tenha nos assaltado, mes-
cido, ele me adverte para deixar o peca-
nossa conduta (Mateus 6:22,23).
mo estando nós em espírito de humil-
do (Pv.1:24-31; Ez. 33:11); convida-me
Porém estejamos apercebidos que
dade, simplicidade, santidade, quando
ao Salvador (Isaías 55:1 João 7:37) e
qualquer desejo de sinceridade no co-
aparentemente o conselho do Senhor
me instrui a esperar em Deus (Os. 12:6).
ração (1Sm 28.6; Ez 14:2-4) qualquer
nos faltava!
Se for um mestre, ensoberbecido na for-
concessão à auto-suficiência sempre
Uma dependência exagerada do
ma da piedade, o conselho me mostra a
bloqueará as avenidas desse conselho
conselho humano (Isaías 2:22), seja
minha real condição (Ap. 3:17). Ele me
e luz divinos. Volta e meia estamos
ele de vivos ou de mortos, obstrui
educa na completa suficiência de Cris-
inconscientemente andando “nas laba- grandemente a influência completa redas do nosso próprio fogo, e entre as da Palavra. Ainda que tais conselhos faíscas, que acendemos” (Isaías 50:11). possam ser de grande valia; ainda que
da hipocrisia (Lc.12:1). Se pela graça
to (Ap.3:18) e adverte acerca do perigo sou filho de Deus, ainda necessito do
Talvez, de acordo com o que con-
possam estar bem próximos e em con-
conselho paterno para me restaurar da
cebemos, buscamos a orientação do
cordância com a Palavra, não devemos
constante apostasia (Jr. 3:12,13), para
conselho do Senhor, supondo que es-
esquecer que eles não são a Palavra,
motivar-me à redobrada vigilância (I Ts
távamos caminhando nele. Mas, no ato
mas que são falíveis. Portanto não po-
5:6 Ap. 3:2), fortalecer minha confiança
e durante a preparação para a busca,
dem ser colocados em primeiro plano
na plenitude de sua graça (Is. 26:4) e
sujeitamos nossas intenções e inclina-
ou seguidos com aquela total confiança
na fidelidade de seu amor (Hb. 12:5,6).
ções a um escrutínio severo, cauteloso,
a que somos advertidos a colocar na re-
Sempre terei motivo para agradecer e
e com uma atitude de auto-suspeita? O
velação de Deus. Por outro lado, o que é ter a Palavra
reconhecer - “Louvarei ao Senhor que me aconselhou” (Sl 16:7). Em cada passo
cruz? “Cada pensamento foi trazido cati-
de Deus como nosso Conselheiro? Não é
da minha caminhada, avançarei glorifi-
vo à obediência de Cristo”? (II Co. 10:5).
estar nele mesmo, “o único Deus sábio”?
cando ao meu Deus e Pai pela fidelidade
coração foi educado na disciplina da
Ou nosso coração não foi possuído pelo
Quando nossas Bíblias, em períodos de
de seu conselho até o fim: “Guiar-me-ás
objetivo almejado antes que o conselho
dificuldade, são buscadas em humilda-
fosse buscado da boca do Senhor? (Jr
de, oração e espírito dócil, tornamo-nos
com teu conselho, e depois me receberás na glória” (Sl 73:24) .
42). Oh! Quão cuidadosos devemos ser
tão dependentes do Senhor como se es-
Charles Bridges
Salmo 84:1-4 Quão amáveis são os teus tabernáculos, SENHOR dos Exércitos! 2A minha alma está desejosa, e desfalece pelos átrios do SENHOR; o meu coração e a minha carne clamam pelo Deus vivo. 3Até o pardal encontrou casa, e a andorinha ninho para si, onde ponha seus filhos, até mesmo nos teus altares, SENHOR dos Exércitos, Rei meu e Deus meu. 4 Bem-aventurados os que habitam em tua casa; louvar-te-ão continuamente.
1
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Revista Os Puritanos 4•2009
Não Dê Ouvidos ao Diabo “Mas Deus lhe disse: Louco! esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado, para quem será? (Lucas 12:20)
Edward Donnelly
O
se a crer no que Ele lhe diz nenhuma exibição de som e luz mudará o seu destino.
objetivo de satanás é conduzir você gentilmen-
Se você ainda é jovem, forte e saudável, o diabo pode
te para o inferno, e ele é o mestre das trevosas
indicar a você o absurdo de se incomodar agora com
artes da persuasão. Se você tem algum conhe-
a morte e com o juízo. Ora, você tem muitos anos pela
cimento da Bíblia, ele pode adotar uma abordagem teo-
frente! Haverá bastante tempo quando você ficar velho.
lógica, concitando você a esperar por uma experiência
Mas, como você sabe que viverá até à velhice? A um ho-
tipo “caminho de Damasco”, por alguma intervenção
mem que estava convencido de que contava ainda com
cataclísmica e irresistível de Deus. Aqui está satanás,
muitos anos e que dissera a si mesmo: “descansa, come
o estudioso da Bíblia, persuadindo você a raciocinar
bebe e folga”, Jesus disse: “Mas Deus lhe disse: louco,
desta maneira: “Deus é soberano, não é? Ele tem os
esta noite te pedirão a tua alma” (Lucas 12:19,20). Na
Seus eleitos, dos quais nenhum se perderá. E ninguém
memorável ilustração de Jonathan Edwards, os ímpios
poderá crer, se Deus não lhe der capacidade para isso.
são como pessoas que estão andando sobre um poço
Muito bem, pois, se eu sou um dos eleitos, que Deus
cuja cobertura apodrecida em muitos pontos está fraca
desça do céu, detenha meus passos, e me desperte e
demais para lhes suportar o peso. Mas elas não sabem
me leve à fé. Quando Ele fizer isso, vou crer. Enquanto
onde estão os lugares fracos, e cada passo está cheio
não chegar esse momento especial, continuarei como
de perigo. A qualquer momento você pode escorregar
estou”.
através da estrutura do tempo, e cair no mundo por vir.
Você se lembra do rico da parábola que queria um
Deus o está mantendo vivo até agora e, se você não é um
momento especial como esse para os seus irmãos incré-
convertido, Ele está tão irado com você quanto o está
dulos? Ele na verdade pediu que lhes fosse enviado um
com os que já estão no inferno. Esta noite você vai para
mensageiro do além. “Rogo-te, pois, ó pai, que o mandes
a cama nas mãos de um Deus irado. Que motivo você
à casa de meu pai. Pois tenho cinco irmãos; para que lhes
tem para acreditar que vai acordar? E, se não acordar,
dê testemunho, a fim de que não venham também para
onde estará você?
este lugar de tormento” (Lucas 16:27,28). Que reunião
Talvez você tenha medo de que riam de você. Você
evangelística sensacional teria sido essa! Imaginemos
sabe que deve fazer as pazes com Deus, mas, e os seus
quão dramático seria o convite impresso: “Na próxima
amigos? Eles são espertos, sofisticados, irreverentes.
semana, na Igreja Reformada Betânia - Orador Especial,
Você tem ouvido as zombarias que eles fazem da reli-
Vindo Diretamente da Eternidade. Somente uma apre-
gião, e provavelmente se juntou a eles nisso. Que diriam
sentação. Não deixe de ouvir esse visitante que vem do
eles, se você se tornasse cristão? Você já pode ouvir as
mundo futuro!” Mas a resposta de Abraão foi água fria
críticas deles, ver as suas expressões de desprezo e dó.
na caldeira: “Têm Moisés e os profetas; ouçam-nos. Se
Mas você vai deixar que outras pessoas o enviem para
não ouvem a Moisés e aos profetas, tampouco acredi-
o inferno? Vai permitir que o riso escarninho delas o
tarão, ainda que algum dos mortos ressuscite” (Lucas
mantenha fora da salvação? Que horrível paródia de
16:29,31). Para a sua conversão você não pode depen-
amizade! Quantos “amigos” amaldiçoarão uns aos ou-
der de intervenções extraordinárias de Deus. Nem pre-
tros no mundo vindouro? “Cristo Se aproximou de mim”,
cisa disso, pois EIe proveu na Bíblia toda a informação
eles rosnarão, “mas eu pensei demais na boa opinião de
de que você necessita para a salvação. Se você recusar-
vocês. Vocês me arruinaram. É em parte por causa de
Revista Os Puritanos 4•2009
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Edward Donnelly
vocês que eu estou aqui”. E se odiarão
testarão: “Senhor, Senhor, não profeti-
Que mais posso dizer? Pela Palavra
uns aos outros por toda a eternidade. A
zamos em teu nome? E em teu nome
de Deus você viu um pouco de como é
condenação eterna é um preço dema-
não expulsamos demônios? E em teu
o inferno. Não posso acreditar que você
siado alto ara pagar pela amizade.
nome não fizemos muitas maravilhas?
queira ir para lá. Todavia, se não clamar
Ou talvez você esteja gostando mui-
(Mateus 7:22,23). Certamente não va-
a Cristo para que o salve, esse é o desti-
to dos prazeres este mundo pecamino-
mos para o inferno”. Entretanto irão,
no que você estará escolhendo. Estaria
so, e reluta em abandoná-los. Há uma
pois nunca nasceram de novo, nunca
você realmente determinado a escolher
terrível ironia nas palavras de Abraão
foram feitas novas pessoas. Sua fé era
tal desgraça?
ao rico que estava no inferno: “Filho,
superficial e irreal.
E o aspecto mais estulto de todos
lembra-te de que recebeste os teus
Pode ser que, mesmo agora, você não
é que a sua condenação eterna é des-
bens em tua vida” (Lucas 16:25). “Os
creia. Você não vai deixar um pregador
necessária. Pois o Senhor Jesus Cristo
teus bens.” Como essas palavras devem
intimidá-lo com um espantalho primiti-
está pleiteando com você neste exato
ter raspado angustiosamente a alma
vo como esse. Você não aceita - nem acei-
momento. Enquanto você lê estas pa-
daquele ser condenado e atormentado!
tará - que existe inferno, ou, se aceita,
lavras, ele o está chamando a Si, orde-
“Meus bens! Sim eu achava que eram
não admite que vai para lá. Certamente
nando-lhe que abandone o pecado, que
“bens”, que eram “coisas boas” (VA). Eu
esse é o ponto de vista da maioria. Numa
só leva à destruição. Ele é infinitamente
me entreguei a elas, ao dinheiro, ao
recente pesquisa da Gallup, nos Estados
misericordioso e bondoso. Se Lhe pedir
luxo e ao egocentrismo. Eu as avaliei co-
Unidos, não mais que quatro por cento
que seja o seu Salvador, Ele o receberá e
locando-as acima de tudo mais e vendi
das pessoas consultadas achavam que
lhe perdoará. Ele o lavará e o purificará,
por elas a minha alma imortal. Contudo,
poderiam acabar indo parar no inferno.
e o tornará salvo e seguro para sempre,
que penso dessas “coisas boas” agora?”
Outrora muitas almas perdidas pensa-
e você será santo e feliz, aguardando
Haverá freqüentadores de igreja no
vam o mesmo. Não acreditavam no infer-
uma eternidade de gozo e glória no céu.
inferno. No dia do juízo alguns prega-
no. Acreditam agora porque é onde elas
“Hoje, se ouvirdes a sua voz, não endure-
dores, evangelistas e líderes estarão
estão. Mas para elas é tarde demais. Para
çais os vossos corações” (Hebreus 4:7).
diante de Cristo com anelante sorriso
você não é tarde demais - ainda. Deus lhe
no rosto, esperando receber o Seu “Bem
está dando uma oportunidade de livrar-
está”. Mas, para seu assombro e horror,
se clamando a Seu Filho para que seja o
Extraído do livro Depois da Morte — O Quê?, Editora
Ele dirá: ‘’Apartai-vos de mim”. Eles pro-
seu Salvador.
PES, PP. 68-71
Confissão de Fé de Westminster Capítulo XVII → Da Perseverança do Santos I. Os que Deus aceitou em seu Bem-amado, os que ele chamou eficazmente e santificou pelo seu Espírito, não podem decair do estado da graça, nem total, nem finalmente; mas, com toda a certeza hão de perseverar nesse estado até o fim e serão eternamente salvos1. II. Esta perseverança dos santos não depende do livre arbítrio deles, mas da imutabilidade do decreto da eleição, procedente do livre e imutável amor de Deus Pai, da eficácia do mérito e intercessão de Jesus Cristo, da permanência do Espírito e da semente de Deus neles e da natureza do pacto da graça; de todas estas coisas vêm a sua certeza e infalibilidade2. I. Ref. • Fl. 1: 6; João 10: 28-29; I Pe. 1:5, 9. II. II Tm. 2:19; Jer. 31:3; Jo. 17:11, 24; Hb 7:25; Lc. 22:32; Rm. 8:33, 34, 38-39; Jo 14:16-17; I Jo 2:27 e 3:9; Jr. 32:40; II Ts. 3:3; I João 2:19; Jo. 10:28.
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Nosso Lugar de Refúgio “E será aquele varão como um esconderijo contra o vento, e um refúgio contra a tempestade, como ribeiros de água em lugares secos...”(Isaías 32:2) Jonathan Edwards
V
quando estamos debaixo de um bom abrigo, a tempestade que deveria cair sobre nossas cabeças, cai sobre
ivemos num mundo pervertido, onde enfrenta-
o abrigo.
mos constantemente um exército de tristezas e
Cristo foi escolhido e encarregado pelo Pai para essa
problemas. Grande parte de nossa vida é gasta
obra de amparo das almas desamparadas. Jesus Cristo
em chorar os males presentes e passados ou em temer
quis que a ira do Pai fosse descarregada contra sua
os que ainda estão no futuro.
própria cabeça, e não sobre nós, miseráveis pecadores.
Ora, existe um firme alicerce de paz e segurança
Por muitas vezes, Cristo é chamado de eleito de Deus,
para aqueles que experimentam tais aflições em favor
ou Seu escolhido, por haver sido selecionado pelo Pai
de outros, ou que, pessoalmente, enfrentam tais peri-
para essa obra. Os nomes “Messias” e “Cristo” signifi-
gos. Jesus Cristo é um refúgio em qualquer situação; há
cam “ungido”, porquanto Deus O nomeou e capacitou
uma base para apoio racional e paz na Sua pessoa sem
para a tarefa de salvar o Seu povo. Cristo disse: “A von-
importar o que nos ameace. Aquele cujo coração está
tade daquele que me enviou é esta: que todo aquele que vê o Filho e crê nele tenha a vida eterna” (João 6:40).
firmado e confiante em Cristo não precisa temer más notícias. “Como em redor de Jerusalém estão os montes, assim o Senhor, em derredor do seu povo, desde agora a para sempre” (Salmos 125:2) ― assim está Cristo em
pecados, sem nos atingir. A razão do medo e do deses-
derredor daqueles que nEle confiam.
pero do pecador é a justiça e a lei de Deus. Cada letra e
Vejamos como Jesus Cristo é um alicerce suficiente para a paz e a segurança. Cristo comprometeu-se a amparar todos aqueles que O temem, contanto que O busquem. Essa é a obra
No tocante à salvação, se estamos em Cristo Jesus, a justiça e a lei passam de largo com respeito aos nossos
cada sinal da lei têm de ser cumpridos (Mateus 5:18). É mais fácil que o céu e a terra sejam destruídos do que a justiça não venha a ser executada; não há possibilidade de que o pecado escape à justiça.
na qual Ele se empenhou antes mesmo da fundação do
Mas, se a alma trêmula e desesperada, temerosa da
mundo. É o que sempre ocupou seus pensamentos e
justiça, correr para Cristo, encontrará nEle um escon-
intenções; desde a eternidade, encarregou-se de ser o
derijo seguro. “De maneira que a lei nos serviu de aio
refúgio dos temerosos.
para nos conduzir a Cristo” (Gálatas 3:24). Cristo sofreu
Sua sabedoria é tal que jamais tomaria sobre Si um en-
o golpe da justiça, e a maldição da lei caiu toda sobre
cargo para o qual não fosse idôneo. Aqueles que estão afli-
Ele; Cristo sofreu toda a vingança que se destinava ao
tos e na tormenta do medo, se vierem a Jesus Cristo, serão
pecado que cada um de nós cometeu. “Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se ele próprio maldição em nosso lugar” (Gálatas 3:13).
libertados de seus temores, pois Ele tem prometido protegêlos. Ele disse aos seus discípulos: “Não temais” (Mt.10:31). Cristo, por sua livre vontade, se tornou a garantia da-
Portanto, se Cristo sofreu pelo crente, já não é neces-
queles que nEle confiam. Espontaneamente se colocou
sário que este sofra; e por que teria o crente de temer?
no lugar deles. Por sua própria iniciativa, encarregou-
Se aqueles que temem se aproximarem de Cristo, nada
Se de ser o responsável por eles, como o bom pastor que
mais terão a temer das ameaças da lei. Ela não lhes diz
dá a vida por suas ovelhas (João 10:11).
respeito.
Se então em Cristo Jesus, a tempestade dos proble-
O amor de Cristo, sua compaixão e misericordiosos
mas recai sobre Ele e não sobre aqueles; assim como
cuidados são tais, que podemos ter a certeza de que
Revista Os Puritanos 4•2009
29
Jonathan Edwards
Ele está pronto a receber todos quantos
em paz conosco. Em Cristo, porém, há
desimpedido. Basta vir a Cristo; é sufi-
vêm a Ele. Ele é tão cheio de amor e bon-
um meio de livre comunicação entre
dade, que está disposto a nada menos
Deus e nós, a fim de que possamos
ciente sentar-se à sombra dEle, a “grande rocha em terra sedenta” (Isaías 32.2).
que nos receber e defender, se formos a
ir a Deus e de que Ele se comunique
Cristo não exige dinheiro em troca de
Ele. “O que vem a mim, de modo nenhum
conosco pelo Espírito Santo.
sua paz. Mas chama-nos para O buscar-
o lançarei fora” (João 6:37). Cristo está
mos livremente e sem preço. Ainda que
de nós. Seus braços estão abertos para
Jesus deixou isso claro, ao dizer: “Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim” (João
receber-nos. Deleita-Se quando almas
14:6).
tão-somente outorgar-lhe esse descan-
mais do que pronto a compadecer-se
desesperadas O procuram.
pobres e sem dinheiro, podemos ir a Ele. Cristo não se dá por aluguel; Ele deseja
Cristo infunde forças e um princí-
so. Como Mediador, sua obra consiste
A excelência de Cristo é mais do que
pio vital e novo na alma cansada que
em dar descanso aos exaustos. E nisso
suficiente e satisfatória para a alma. A
apela para Ele. O pecador, antes de vir
Ele se deleita.
alma busca aquilo que lhe é superior. A
a Cristo, está tão enfermo quanto um
Há em Cristo descanso e doce refri-
alma carnal imagina que as coisas ter-
homem enfraquecido e esgotado, cujo
gério para aqueles que estão cansados
renas são excelentes. Alguns dão mais
organismo tenha sido consumido por
das perseguições. A maior parte do tem-
valor às riquezas, outros têm na mais
grave enfermidade. Está cheio de dores
po, o povo de Deus tem sido perseguido
alta estima as honras, e, para outros, os
e tão fraco, que não pode andar nem
neste mundo. Há intervalos ocasionais
prazeres carnais parecem ser os mais
ficar de pé. Por isso, Cristo é comparado
de paz e prosperidade, mas geralmente
revigorosos. Porém, a alma não pode
a um médico. “Os são não precisam de
acontece o contrário.
achar contentamento em nenhuma
médico, e sim os doentes” (Mateus 9:12).
Satanás tem usado de grande malí-
dessas coisas, pois cedo descobre o fim
Quando Ele vem e profere uma palavra,
cia contra o povo de Deus, na medida
instila um princípio vital naquele que
em que esse povo procura seguir a
antes estava morto (João 11:25-26). Ele
Deus. Assim, por muitas vezes, o povo
daquilo que lhe dava algum consolo. A verdadeira excelência acha-se em Jesus Cristo, e quando os homens che-
transmite o início da vida espiritual e o
de Deus tem sido extremamente perse-
gam a conhecê-la, sua busca termina, e
começo da vida eterna.
guido, e milhares têm sido condenados
suas mentes encontram o descanso. Em
Cristo proporciona o seu Espírito, o
à morte. Satanás está sempre pronto,
Cristo, as suas mentes vêem uma glória
qual acalma o coração e é como uma
“como leão que ruge procurando alguém
para devorar” (1 Pedro 5.8).
transcendente e agradável. Percebem
brisa refrescante. Ele outorga aquela
que até então estiveram perseguindo
força mediante a qual ampara as mãos
sombras, mas que, agora, encontraram
prostradas e fortalece os joelhos débeis.
tudo aquilo de que precisamos. Neces-
a substância, a realidade. Antes, bus-
Cristo dá profundo consolo e gozo
sitamos de vestes, e Cristo não apenas
cavam a felicidade num riacho, mas
àqueles que vêm a Ele, e isso basta para
nos dá vestes, mas também a Si mesmo,
agora encontraram-na no oceano. É
que se esqueçam de toda a luta ante-
para ser a nossa vestimenta. “Porque to-
exatamente como Cristo prometeu.
rior. Um pouco de paz verdadeira, um
“Vinde a mim, todos os que estais cansa-
pouco da alegria do evidente amor de
dos quantos fostes batizados em Cristo, de Cristo vos revestistes” (Gálatas 3.27).
Cristo tem se dado a nós para ser
dos e sobrecarregados, e eu vos aliviarei”
Cristo, um pouco da esperança da vida
Em Cristo há provisão para satisfa-
(Mateus 11:28).
eterna, são todo-suficientes para com-
ção e pleno contentamento das almas sedentas e necessitadas. Cristo é “como ribeiros de águas em lugares secos” (Isa-
A manifestação do amor de Cristo
pensar toda a luta e a fraqueza e para
dá à alma satisfação abundante. Entre
apagá-las de nossa memória. Essa paz,
amigos terrenos tem havido exemplos
que resulta da verdadeira fé, ultrapassa
ías 32:2) ou em um deserto ressequido,
de grande afeição. Mas nunca houve
o entendimento e é um gozo inefável
onde há grande escassez de água e os
amor igual ao de Cristo para com os
(Filipenses 4:7).
viajantes morrem de sede.
crentes.
Considere a Cristo como um re-
Cristo é um rio de águas, pois há
Sendo Ele o caminho para o Pai, há
médio para as suas aflições. Você não
nEle uma plenitude tal, uma provisão
nEle provisão para satisfazer e conten-
precisa de asas de pomba para voar a
tão abundante, que satisfaz a alma mais
tar a alma sedenta e ansiosa. Estamos
um refúgio distante e descansar, pois
necessitada e ansiosa. Cristo é suficien-
naturalmente separados de Deus por
Cristo está bem perto.
te não só para uma alma sedenta, mas
causa de nossos pecados; e Deus está
Não é mister realizar prodígios para
também é a fonte que nunca seca, sem
longe de nós — nosso Criador não está
obter esse descanso. O caminho está
importar quantos venham a Ele. Um
30
Revista Os Puritanos 4•2009
Nosso Lugar de Refúgio
homem sedento não esgota esse rio, ao
garem a Jesus Cristo! Oh! Que sejamos
parte do Senhor Jesus por você; nada
saciar nEle continuamente a sua sede.
persuadidos a nos ocultarmos nEle!
terá de sofrer. Se alguma coisa tiver
“Aquele, porém, que beber da água que eu
Que maior segurança poderíamos de-
de ser feita, Cristo há de fazê-la. Você
lhe der nunca mais terá sede; pelo contrário, a água que eu lhe der será nele uma fonte a jorrar para a vida eterna” (João
sejar? Ele se comprometeu a defender-
nada terá de fazer, além de permane-
nos e salvar-nos.
cer quieto e olhar. “Mas os que esperam
4.14).
sar nEle calmamente. Aquiete-se e veja
Nada temos a fazer, além de descan-
Como somos felizes quando nossos
o que o Senhor Jesus fará por você. Se
corações ficam persuadidos a se ache-
tiver de haver sofrimento, esse será da
no SENHOR, renovam as suas forças” (Isaías 40.31). Fonte: Revista “Fé para Hoje”, número 15, Editora Fiel.
Como Posso livrar-me do Vício em Entretenimento? Pastor, eu creio que amo a Cristo de verdade, mas a maior parte do tempo eu prefiro passar entretendo-me do que gastá-lo na Palavra de Deus. Como eu quebro essa influência que o entretenimento tem sobre o meu coração? Essa é uma pergunta muito boa. E eu penso que ela é especialmente pertinente porque nós vivemos, eu creio, mais agora do que nunca, em dias em que coisas que entretêm estão imediatamente acessíveis. Eu estava pensando esses dias na diferença entre nossas tentações e, digamos, as tentações de 250 anos atrás, nos dias de Jonathan Edwards. Edwards escreveria sobre a tolice de pessoas jovens que se juntam para ter “conversações frívolas” ou outras coisas ainda piores. (Uma delas chamava-se “Empacotar”: ir juntos para a cama, permanecendo vestidos. Apenas apimentando a vida um pouco. A vida era enfadonha há 250 anos na Nova Inglaterra.) Hoje nós levamos em nossos bolsos, rádio, televisão, internet e jogos e qualquer coisa que seja excitante e cheia de diversão! E “diversão” é uma palavra que é usada hoje na igreja de forma desenfreada! É um adjetivo, é um substantivo, é um verbo, porque nós exercemos o ministério buscando ajustar-nos a essa mentalidade. Estou profundamente preocupado com isso. Eu quero defender a seriedade a respeito de Deus, em vez de torná-lo palatável fazendo com que Ele pareça “divertido”, transformando-O em mais uma peça de entretenimento. Assim, a pergunta é: “Como você se livra dessa dependência?”. 1. Reconhecer que ela existe é um enorme passo na direção certa. 2. Busque a Deus seriamente sobre isso. Ore como um louco para que Deus abra seus olhos para ver coisas maravilhosas na Sua lei. 3. Aprofunde-se na Bíblia, até mesmo quando você não tem vontade, suplicando a Deus que abra seus olhos para ver o que realmente está lá. 4. Entre em um grupo onde se conversa sobre coisas sérias. 5. Comece a compartilhar sua fé. Uma das razões porque nós não somos movidos por nossa própria fé como deveríamos é porque nós quase nunca conversamos sobre ela com os não-crentes. Nossa fé começa a ficar como um tipo de coisa de estufa e então começa a gerar um sentimento de irrealidade sobre si mesma. E então as forças do entretenimento começam a ter maior influência sobre nossas vidas. Portanto essas seriam algumas das coisas, mas no final das contas é um presente da graça poder sentir a glória de Deus. Uma última sugestão: pense em sua morte. Pense muito em sua morte. Pergunte a si mesmo o que você gostaria de estar fazendo no fim da vida, ou nas horas, ou dias, que antecedem o encontro com Cristo. Eu tenho feito muito isso por esses dias. Eu penso no impacto da morte e o que eu gostaria de estar fazendo e como eu me prepararia para encontrá-lO e prestar contas a Ele. John Piper. Extraído do site Desiring God. Tradução: Juliano Heyse (mail@bomcaminho.com)
Revista Os Puritanos 4•2009
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Verdadeira Educação Através da Educação Mas, avancemos expondo o que é próprio desta matéria. Paulo escreve que Cristo “deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e mestres, querendo o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo; até que cheguemos à unidade da fé, e ao conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo” [Ef 4.10-13]. Vemos como Deus, que poderia levar os seus à perfeição num instante, contudo não queria que eles crescessem à idade adulta senão pela educação da Igreja; vemos expressar-se o modo pelo qual esta educação se processa: que aos pastores foi incumbida a pregação da doutrina celeste; vemos que todos, à uma, estão sujeitos à mesma disposição, de sorte que se permitam ser dirigidos, com espírito brando e dócil, pelos mestres criados para esta função. E com esta marca Isaías assinalara outrora o reino de Cristo: “Meu Espírito, que está em ti, e as palavras que pus em tua boca, jamais se apartarão nem de tua boca, nem da boca de tua semente e de seus descendentes” [Is 59.21]. Do quê se segue que são dignos de que pereçam de fome e inanição todos e quaisquer que desprezam o alimento espiritual da alma a si divinamente oferecido pelas mãos da Igreja. Deus instila em nós a fé, mas pela instrumentalidade de seu evangelho, como adverte Paulo, de que “a fé vem do ouvir” [Rm 10.17], assim como também em Deus reside seu poder de salvar, mas, segundo atesta o próprio Paulo, o exibe e o desenvolve na pregação do evangelho [Rm 1.16]. Com este propósito Deus outrora quis que se realizassem assembléias sacras no santuário, a fim de que a doutrina proferida pela boca do sacerdote alimentasse o senso comum da fé. Tampouco visam a outra coisa esses títulos magníficos onde o templo é chamado “o lugar do descanso de Deus” [Sl 132.14], o santuário de seu domicílio [Is 57.15]; onde se diz ele estar assentado entre querubins [Sl 80.1]; donde apreço, amor, reverência e dignidade granjeiem ao ministério da doutrina celeste, aos quais, de outra sorte, derrogaria não pouco a aparência de um homem mortal e desprezado. Portanto, para que saibamos que diante de nós põe um tesouro inestimável em vasos de barro [2Co 4.7], Deus mesmo se apresenta em nosso meio; e visto que ele é o Autor desta ordem, quer ser reconhecido presente em sua instituição. Consequentemente, depois que proibiu aos seus a se devotarem a augúrios, a adivinhações, a artes mágicas, a necromancia e a outras superstições [Lv 19.31; Dt 18.10, 11], acrescenta que dará o que em tudo deva ser suficiente, isto é, que nunca estarão destituídos de profetas [Dt 18.15]. Mas, assim como não delegou aos anjos o povo antigo, pelo contrário, suscitou mestres da terra que, de fato, desempenhassem o ofício angélico, assim também quer ensinar-nos por meios humanos. Com efeito, assim como outrora Deus não se contentou com a mera lei, mas acrescentou sacerdotes que fossem intérpretes, de cujos lábios o povo lhe indagasse o verdadeiro sentido, assim também hoje não quer apenas que lhe estejamos atentos à leitura, mas ainda lhe prepõe mestres por cuja obra sejamos ajudados, coisas tais de dupla utilidade, pois, de um lado, nos prova a obediência por meio de ótimo teste, quando ouvimos seus ministros falando não de forma distinta dele mesmo; por outro lado, também nos socorre em nossa fraqueza quando, para nos atrair a si, nos prefere falar através de intérpretes, em vez de atroar em sua majestade e fazer-nos fugir dele. E de fato, quanto nos convenha esta forma familiar de ensinar, todos os piedosos sentem o pavor com que, com razão, a majestade de Deus os consterna. João Calvino, Intitutas 4.1.5
32
Revista Os Puritanos 4•2009
A Inerrância das Escrituras “Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas: não vim ab-rogar, mas cumprir”. (Mt.5:17) Morton H. Smith
P
a Palavra de Deus escrita. Isso significa que apesar de ela chegar até nós através de autores humanos (o que
ara um breve estudo do assunto da inerrância
nunca se negou), a Bíblia é também a Palavra de Deus,
das Escrituras, eu indico a vocês o ensaio que
e como Palavra de Deus ela é completamente confiável,
pode ser encontrado na internet se procurarmos
a regra infalível de fé e de prática.
por “inerrância das Escrituras” ou na “Latimer House”,
Alguns têm argumentado que a doutrina da
escrito pelo Dr. Kevin Vanhoozer, Professor Honorário
inerrância foi “inventada” no século XIX pelos teólogos
de Teologia e Estudos Religiosos em New College, Uni-
de Princeton, B. B. Warfield e A. A. Hodge. É importan-
versity of Edimburg. Considero o seu tratamento tão
te lembrar que a formulação de doutrinas particulares
útil, que estou seguindo o seu esboço a respeito desse
ocorre apenas quando há necessidade para isso. Isto
assunto.
é, uma doutrina específica pode ser formulada apenas
Quando falamos da inspiração das Escrituras, esta
quando algo que está implícito a esta fé é negado. O
mos falando da maneira pela qual Deus transmitiu a
falso ensino provoca uma repreensão explícita. Isto é
Escritura aos autores humanos. A palavra traduzida por
tão verdadeiro com respeito à doutrina da inerrância
“inspirada” em II Timóteo 3:16 significa literalmente “so-
como o foi com relação às doutrinas da Trindade, ou da
prada por Deus”. As Escrituras são tidas como “sopradas por Deus”, o que significa dizer que elas são as verda-
justificação pela fé.
deiras Palavras de Deus. Assim, a inspiração fala da “ori-
plicitamente durante toda a história da Igreja anterior
gem da autoridade bíblica”, enquanto a inerrância des-
ao século XIX. Esta visão das Escrituras consistia num
creve a sua natureza. “Por inerrância nos referimos não
reflexo da visão dos próprios autores bíblicos. Pode-
O conceito da veracidade da Bíblia era assumido im-
apenas ao fato de que a Bíblia “não contém erro”, mas
mos, dessa forma, concluir, com respeito a todo este
também a sua impossibilidade de errar.” A inerrância e
assunto do testemunho do Antigo Testamento sobre si
a infalibilidade, definidas positivamente, referem-se à
mesmo, que ele certamente reivindica ser divinamente
absoluta veracidade da Bíblia. Essa é uma propriedade
originado. Uma porção menciona outra porção como
crucial e central da Bíblia.
autoritativa. Finalmente, não há contradição entre
A base para a doutrina da inerrância bíblica deriva-
quaisquer partes do Antigo Testamento. Em virtude
se tanto da natureza de Deus como do ensino da Bíblia a
disso, alguém bem poderia supor que a visão da ins-
respeito dela própria. Em primeiro lugar, a doutrina bí-
piração sustentada pelo Antigo Testamento é a que
blica e cristã sobre a pessoa de Deus concebe-O perfeito
chamamos de inspiração plenária verbal, resultando
em todos os seus atributos. Ele é, portanto, onisciente,
numa Palavra Infalível. À medida que estudamos o
totalmente sábio e totalmente bom. Sendo assim, segue-
testemunho do Novo Testamento a respeito do Anti-
se que Deus fala a verdade. Ele não diz mentiras; Ele não
go, descobriremos que esta é exatamente a doutrina
ignora coisa alguma. Dessa forma, a Palavra de Deus
que nos está sendo apresentada por Cristo e por Seus
está livre de todo erro que provenha de engano cons-
discípulos. Que esta era a visão predominante do povo
ciente ou de ignorância inconsciente. Essa é a confissão
judeu pode ser visto na maneira pela qual as declara-
unânime do salmista, dos profetas, do Senhor Jesus e
ções de Jesus e dos seus discípulos sobre o assunto não
dos apóstolos. Em segundo lugar, a Bíblia apresenta a
provocam nenhuma reação dos judeus que não seja a
si mesma como “soprada por Deus”, sendo ela, portanto,
aceitação deste ponto de vista.
Revista Os Puritanos 4•2009
33
Morton H. Smith
O próprio Jesus diz que a Escritura
hebraico, e para a minúscula projeção
10:33-36. Jesus havia acabado de ser
não pode falhar. A visão que Ele tinha
que distingue uma letra da outra. Seria
desafiado quanto a sua reivindicação
do Antigo Testamento era a de que este
semelhante a nos referirmos ao ponto
de ser um com o Pai. Ele citou o Salmo
era verdadeiro, fidedigno, digno de con-
da letra “i” e ao traço do “t”, no portu-
82:6 em resposta ao desafio.
fiança. Os autores do Novo Testamen-
guês. O professor J. Murray diz:
É justamente esse apelo às Escritu-
to compartilhavam e refletiram essa
Haveria alguma outra maneira de estabe-
ras o eixo de toda a sua defesa. É difícil
mesma estima elevada que possuíam
lecer de modo mais conclusivo a acuraci-
achar explicação para isso em qualquer
das Escrituras. O testemunho de Jesus
dade meticulosa, a validade e a verdade da
outra base se não que Ele considerava
referente ao Antigo Testamento como
lei do que a linguagem a que Jesus atrela
as Escrituras como o irrefutável instru-
refletido em Mateus 5:17-18 é especial-
sua própria e única formula de assevera-
mento de defesa. Pois, “a Escritura não
pode falhar”.
mente relevante num
ção?... É difícil compre-
dia e numa época que
ender por que aqueles
A passagem citada era da porção das
tem presenciado uma
que aceitam a doutrina
Escrituras que pode ter sido omitida de
Por inerrância
da inspiração tropecem
Mateus 5:17 e seguintes. Aqui, ele mos-
na doutrina da inspira-
tra a mesma alta consideração por esta
nos referimos não
ção verbal. Pois as pa-
porção do Antigo Testamento como Ele
lavras são as mediado-
fez com respeito à Lei e aos Profetas.
rejeição generalizada da inspiração verbal. Primeiro, os termos “a lei e os profetas” da maneira como foi usado por Jesus aqui, re fere-se provavelmente à totalidade do An tigo Testamento. Se, entretanto,
alguém
insiste que se refira apenas às duas primeiras sessões do An tigo Testamento, não há motivo para a
apenas ao fato de que a Bíblia “não
ras do pensamento, e
Ele apela para a Escritura porque
no que diz respeito às
ela é verdadeira e intrinsecamente uma
Escrituras, as palavras
finalidade. E quando ele diz que a Es-
contém erro”, mas
escritas são as únicas
critura não pode falhar, ele está certa-
mediadoras da comuni-
mente usando a palavra Escritura, no
também a sua
cação. Se os pensamen-
seu sentido mais compreensivo, como
tos são inspirados, as
incluindo tudo o que os judeus da épo-
impossibilidade
palavras devem ser... A
ca reconheciam como Escritura, a saber,
de errar
indissolubilidade da lei
todos os livros canônicos do Antigo Tes-
se estende a cada um
tamento. Assim, é ao Antigo Testamen-
acreditar que Jesus faria qualquer distinção ou trataria a terceira porção de ma-
de seus “is” e “tils”. Tal
to que sem qualquer reserva ou exce-
indissolubilidade
ção ele se refere ao dizer que ele “não
não
seria um atributo da lei
pode falhar”... Ele afirma a infalibilidade
se esta fosse falível em algum detalhe,
da Escritura na sua totalidade e não dei-
neira diferente. Essa passagem fornece
pois se assim fosse, ela seria algum dia
xa lugar para qualquer suposição como
a visão própria de Jesus sobre o Antigo
reduzida a nada. E assim é justo dizer que,
a de graus de inspiração ou falibilidade.
Testamento, ou pelo menos, sobre uma
em cada detalhe, a lei era considerada
A Escritura é inviolável. O testemunho
boa parte dele. Ele não veio para des-
por ele infalível e portanto, indissolúvel. É
do nosso Senhor não significa nada
truí-lo. A palavra para destruir (katalu-
realmente uma estranha predisposição a
menos que isso. A natureza crucial de
sai) significa ab-rogar, demolir, desinte-
de professar a aceitação da infalibilidade
tal testemunho enfatizada pelo fato de
grar ou anular. Jesus afirma aqui que a
de Cristo e ao mesmo tempo rejeitar as
que é dado em resposta à mais séria das
sua obra messiânica não destruirá a Lei
claras implicações dos seus ensinos. Nada
acusações e é em defesa desta mais es-
e os profetas, mas os deixará intactos.
poderia ser mais claro que isso, qual seja,
tupenda reivindicação que ele sustenta
Positivamente, Ele veio para cumprir. A
que nos menores detalhes a Lei é toma-
tal testemunho.
palavra usada para cumprir (plerosai)
da por Cristo e encontra, no seu cumpri-
Além dessas passagens específicas,
fala de um cumprimento completo.
mento, sua permanente personificação e
há também uma série de materiais nos
No versículo 18, Jesus aplica essa
validade. Pela mais absoluta necessidade,
Evangelhos que nos levam a concluir
afirmação geral para os detalhes me-
existe apenas uma conclusão, qual seja,
que ele mantém esta mais alta avalia-
nores da lei. Ele veio para cumprir,
que a Lei é infalível e inerrante.
ção das Escrituras como um todo.
não apenas em termos gerais, mas até
A segunda passagem que nos mos-
mesmo as minúcias da lei. O “i” e o “til”
tra a visão particular de Jesus com re-
tação e reverência. A única explicação
referem-se à menor letra do alfabeto
ferência ao Antigo Testamento é João
para tal atitude é que o que a Escritura
34
Sua atitude é a de meticulosa acei-
Revista Os Puritanos 4•2009
A Inerrância das Escrituras
disse, Deus disse, que a Escritura era a
pode ser definida da seguinte maneira:
ou noutro lugar para que o crente mais
Palavra de Deus, que era a Palavra de
“A inerrância da Escritura significa que
simples encontre tal ensino. Quando há
Deus porque era Escritura e que era ou
a Escritura, em seus manuscritos origi-
conflito a respeito de alguma particu-
se tornou Escritura porque era a Pala-
nais e quando interpretada de acordo
lar interpretação bíblica, “ela deve ser
vra de Deus.
com o sentido pretendido, fala verdadei-
atribuída ao intérprete falível e não ao
ramente sobre tudo o que afirma”. Essa
texto infalível”.
Como já foi notado, as doutrinas particulares são formuladas com o
definição fornece duas qualificações.
propósito de refutar erros. A reforma
instrumentalidade humana dos escrito-
da doutrina da autoridade bíblica como
1) Primeira: só se afirma a inerrância dos textos originais → Se for objeta-
parte das confissões protestantes no sé-
do que agora nós não
protestante adotou o desenvolvimento
No processo de escrita, Deus usou a res. Isso incluía o uso do vocabulário e da personalidade dos escritores individuais. Ao fazer isso, ele não
culo XVI em oposição à idéia Católica
possuímos os manus-
permitiu que o erro
Romana das tradições humanas como a
critos originais, deve
adentrasse na Bíblia.
autoridade suprema na Igreja. A doutri-
ser observado que es
na da inerrância bíblica foi formulada
tudos da crítica tex
em oposição às negações da veracidade
tual têm sido capazes
da Bíblia. Essas negações surgiram com
essencialmente de re
o alto criticismo liberal do fim do sécu-
construir o texto origi-
lo XIX. Por trás desse desenvolvimento
nal. Mesmo onde for
estavam os tão conhecidos pensadores
possível haver mais
“iluministas” do século XVII. O Deísmo
de uma leitura, que
daquele século aceitou a idéia de que a
possa ser verdadeira,
fonte da verdade era a razão ao invés da
não há maiores dou-
revelação. Mais e mais a Bíblia passou a
trinas da fé cristã que
ser vista como qualquer outro livro. As
seriam
suposições naturalistas dos deístas re-
com a escolha de uma
jeitavam a possibilidade da ação divina
das leituras.
modificadas
A visão que
Ele usou as formas da linguagem
humana,
Jesus tinha
da cultura do escritor.
do AT era a de
sol se levantando é
que este era verdadeiro, fidedigno, digno de confiança.
na história. O resultado foi que a crítica
Por exemplo, falar do refletir a experiência humana. Isso não significa que tal expressão tem o propósito de afirmar o entendimento científico completo da relação do Sol com a Terra. Usar formas humanas de comunicação
não
assim abandonada. Dentro desta nova
2) A segunda qualificação é “quando interpretada conforme o sentido pretendido” → Deve-se ser sempre
analogia com a encarnação da Segunda
visão do mundo, a idéia da autoridade
bastante cuidadoso ao interpretar a Bí-
Pessoa da Trindade. Do mesmo modo
bíblica foi abandonada. Os críticos li-
blia conforme o propósito para que ela
que assumir a natureza humana não o
berais históricos argumentaram que os
foi escrita. É tentador reivindicar para
envolveu em pecado, assim também a
autores da Bíblia foram homens do seu
as interpretações de alguém a mesma
Palavra de Deus foi escrita sem prescin-
tempo, limitados pela visão de mundo/
autoridade que tem o próprio texto
dir da sua veracidade.
Bíblica procurou explicar a origem da Escritura por uma visão naturalista. A origem sobrenatural da Escritura foi
quer dizer necessariamente que há erro na comunicação. Pode-se sugerir uma
imaginário daqueles dias. Foi contra
bíblico. Se for objetado que nós não
essa generalizada rejeição da autoria
temos uma sentença definida de qual
inerrância é mal representada como
Algumas
vezes
a
doutrina
da
que a doutrina da inerrância bíblica, im-
seja a interpretação de uma passagem,
se implicasse em que todo o que a
plícita de início, foi explicitamente for-
a resposta deve ser encontrada na dou-
sustenta pratica uma interpretação
mulada (por Warfield e Hodge). A dou-
trina da perspicuidade das Escrituras,
literalista da Escritura. Deve-se fazer
trina da inerrância bíblica, entretanto,
não na doutrina da inerrância. Ou seja,
uma distinção entre verdade literal
não é uma nova doutrina teológica. É a
a Escritura não é sempre igualmente
e interpretação literal. Alguém pode
articulação do que sempre fôra a visão
clara, mas pela comparação de Escri-
apegar-se à inerrância, e por conse-
implícita e pressuposta da Igreja duran-
tura com Escritura, ela se interpreta
guinte, à verdade literal das proposi-
te a maior parte da história da Igreja.
a si mesma, de modo que tudo o que
ções feitas na Bíblia sem sustentar que
O que a doutrina da inerrância bíblica
é necessário para a salvação e para a
toda a Bíblia deve ser interpretada de
estabelece explicitamente? A doutrina
vida está suficientemente claro num
uma maneira literal, quando este não
Revista Os Puritanos 4•2009
35
Morton H. Smith
era “o propósito do autor ou da forma literária do texto”.
A pergunta que devemos fazer quan-
diferentes, e não apenas para declarar
do interpretamos a Bíblia é: “que tipo
fatos. A inerrância, então, é um deriva-
de literatura é essa? Ela visa ser histó-
do da infalibilidade: Quando o propósi-
cular deve ser considerado quando bus-
rica e cronológica, ou a ênfase está no
to da Bíblia é fazer afirmações verdadei-
camos determinar se um erro existe ou
conteúdo da mensagem do que fala? A
ras, ela o faz também sem falha. Ainda
não. Por exemplo, na conversa regular
literatura de parábolas é bem diferente
assim, os demais atos pronunciados
nós freqüentemente usamos figuras
de uma narrativa histórica, ou da litera- ― advertências, promessas, questões ―
gerais, ao invés de figuras precisamen-
tura apocalíptica. Se levantamos a ques-
te exatas. Podemos dizer que uma pa-
tão com relação a se o texto deve ser to-
O contexto de qualquer texto parti-
são infalíveis também. O próprio entendimento da Bíblia
lestra durou uma hora, quando ela só
mado literalmente, a resposta será dada
sobre a verdade destaca a questão da
durou 55 minutos. Por outro lado, se
em termos do contexto. “O sentido lite-
confiança. A Palavra de Deus é verda-
alguém estiver dirigindo um programa
ral é o seu sentido literário: o sentido
deira, pois ela é digna de confiança ―
de televisão, ele teria que ser mais pre-
que o autor tencionava transmitir, na e
digna de confiança para atentar, para
ciso ao designar a duração da palestra.
através de uma forma literária particu-
tornar verdade sua reivindicação e para
Dessa forma, o contexto determina o
lar. Inerrância significa que cada frase,
cumprir seu propósito. Podemos, assim,
tipo de precisão que deve ser esperado.
quando interpretada corretamente (de
falar das promessas da Bíblia, das suas
Em outras palavras, o erro é dependen-
acordo com o seu gênero literário e seu
ordens, advertências, etc. como sendo
te do contexto. A questão quanto a uma
senso literário), é totalmente confiável.
verdadeiras à medida que estas sejam
passagem ser interpretada de maneira
O termo mais antigo para se expres-
também dignas de confiança. Juntos, os
literal depende do seu gênero literário.
sar a autoridade bíblica — infalibilida-
termos inerrância e infalibilidade lem-
Por exemplo, quando Jesus fala de si
de—permanece útil. Infalibilidade quer
bram-nos de que a Palavra de Deus é
mesmo como sendo uma “porta” (João
dizer que a Escritura nunca falha no
totalmente digna de confiança, não ape-
10:1), ele não pretende que procuremos
seu propósito. A Bíblia cumpre todas
nas quando fala, mas também quando
pela maçaneta ou dobradiça. Devemos
as suas reivindicações da verdade. A
exemplifica a verdade.
ser sensíveis ao fato de que isto é uma
Palavra de Deus nunca leva ao erro. É
metáfora, que não se propõe a ser to-
importante relembrar que a linguagem
mada literalmente.
pode ser usada para vários propósitos
Dr. Morton Smith é Prof. de Teologia Sistemática e Bíblica no Greenville Presbyterian Teological Seminary – SC, USA
A Lei do Culto ... oferecei sacrifício de louvores do que é levedado, e apregoai ofertas voluntárias, e publicai-as, porque disso gostais, ó filhos de Israel, disse o SENHOR Deus. Am 4.5 Ao afirmar que os israelitas gostavam de fazer essas coisas, Deus repreende a presunção de inventarem por conta própria novos modos de culto; é como se ele dissesse: “Não exigi de vocês nenhum sacrifício senão os apresentados em Jerusalém, mas vocês os oferecem a mim em lugares profanos. Por isso considerem os seus sacrifícios como oferecidos a vocês mesmos, e não a mim”. Sabemos verdadeiramente como os hipócritas, quando praticam quaisquer de suas obras e cerimônias frívolas, sempre convertem Deus em devedor deles; pois acham
36
Revista Os Puritanos 4•2009
que Deus está obrigado a eles. “Vocês deviam ter me consultado e apenas obedecido à minha palavra, deviam ter atentado àquilo que me agrada, o que eu ordenei; mas vocês desprezaram a minha palavra, negligenciaram a minha lei e foram atrás do que lhes agradava e procedia das suas próprias fantasias. Assim, visto que a própria vontade é a lei de vocês, busquem a recompensa em si mesmos, pois eu não admito nada disso. O que eu exijo é submissão implícita, nada mais procuro senão obediência à minha lei; como vocês não cumprem nada disso, mas agem segundo a própria vontade, isso não é adorar o meu nome”.
Oração:
Concede, ó Deus onipotente, que assim como queres que a nossa vida seja moldada pelo preceito da tua lei, na qual nos revelaste aquilo que é do teu agrado, para não deambularmos na incerteza, mas te prestemos obediência — ó concede que nos submetamos inteiramente a ti e te consagremos não somente toda a nossa vida e todos os nossos labores, mas também te ofereçamos como sacrifício o nosso entendimento e toda prudência e bom senso que tenhamos, de sorte que, ao te servirmos espiritualmente possamos realmente glorificar o teu nome, por meio de Cristo nosso Senhor. Amém.
João Calvino. Devotions and prayers of John Calvin, 52 one-page devotions with selected prayers on facing pages. Org. Charles E. Edwards. Old Paths Gospel Press. S/d. Pags. 42 e 43. Tradução: Marcos Vasconcelos, julho/2009. E-mail: mjsvasconcelos@gmail.com; Blog: http://mensreformata.blogspot.com/
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