Hip Hop Produção de Conhecimento

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Ficha Técnica Idealização: Thiago Negraxa Transcrição: Karime Nivoloni Revisão: Marcos Bragato Projeto Gráfico: Liz Diamante Diagramação: Liz Diamante Fotografia: Tools Art

Idealização:

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Realização:


Índice Apresentação.................................................pág. 5 DJs..................................................................pág. 7 MCs.................................................................pág. 23 Grafite.............................................................pág. 35 Dança..............................................................pág. 43 Produção de eventos.......................................pág. 52

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apresentação Este dossiê é um documento escrito, baseado nos diálogos realizados nas mesas de conversa do projeto Hip Hop Produção de Conhecimento, que reuniu diferentes artistas que vivem da cultura Hip hop. Convidamos estes profissionais para uma conversa organizada a partir das quatro linguagens da cultura, ou elementos, que foram os temas de discussão: Dj, Grafitti, MCs, e as *Danças da Cultura Hip Hop, que neste caso foi dividida em dois temas, o primeiro: organização de eventos; e o segundo: pesquisa e criação. Cada mesa foi integrada por dois artistas de diferentes gerações, com formações distintas dentro da cultura. Na mesa de DJs, estavam KLjay e Dj DanDan; na mesa de Grafitti: Tinho e Magoo Ilegal, na mesa de MCs: Tássia Reis e Kamau, nas mesas da Dança, com o tema Pesquisa e Criação estavam Lakka e Marcio Greyk, e no tema organização de eventos estavam Bispo SB, Jaspion, Kico Brown e Warley Alves. Há muita diferença entre cada linguagem da cultura (elementos) assim como na trajetória de cada artista convidado, a época em que estes começam a atuar e os tipos de recursos e informações, o surgimento de novos cenários, assim como dificuldades que surgem e outras que permanecem as mesmas. Esta cultura conecta diferentes conhecimentos totalmente vinculados as trajetórias dos indivíduos, onde a capacidade de realização destes saberes o “Fazer” tem força agregadora, de transformação, de aguçar a percepção da realidade e de ressignificação. É algo recente o olhar para a produção de conhecimento do Hip Hop, este projeto tem a intenção, mesmo que de modo embrionário, dar luz a estes saberes, e partido desta perspectiva foram apresentadas as questões as mesas: de como se toraram “profissionais” e o que é ser um profissional? Com isso abriram-se outras questões, sociais, artísticas, de produção e muitas histórias. Que estas histórias tragam novas questões e que possamos cada vez mais expandir os meios de produção da cultura Hip Hop.

* Definição utilizada no livro “As Danças da Cultura Hip Hop e Funk Styles” que diz que o Breaking não é a única dança do Hip Hop.

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18/02/2016

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DJs - DJ KLJay e DJ DanDan

tou aqui para compartilhar de alguma forma essa vivência com vocês.

• Thiago: Boa noite. Meu nome é Thiago Negraxa. Este é o projeto chamado HIP HOP Produção de conhecimento. Convidamos alguns artistas para conversar sobre o desenvolvimento, a história e os modos de fazer da cultura Hip Hop. Hoje falamos sobre a prática do DJ. O projeto está dividido em três partes: a primeira, é a conversa, e dela será gerado um documento que será disponibilizado na internet, acompanhado com arquivos escritos, fotos e vídeos da cultura Hip Hop. Teremos, também, o material escrito que será publicado, disponibilizado e distribuído em centros culturais, bibliotecas, pontos de cultura e alguns coletivos da cultura hip hop. Esta é a primeira edição. Vocês nos ajudam a construir a primeira etapa do projeto. Infelizmente, tivemos um imprevisto porque teríamos dois convidados, mas temos apenas um deles. Teremos primeiro a fala do artista DJ Dandan, e depois abrimos para a plateia. Por gentileza, “cola aí” DJ! • DanDan: Boa noite. Sejam bem-vindos a mais um projeto ousado da nossa cultura. Apesar da presença do termo debate, vim trocar ideia, trocar conhecimento e aprender muito; acho que aprendo mais do que transmito. Quero dizer, desde já, que dentro dos padrões artísticos existentes, em especial quando ligamos a tevê, prefiro me despir do rótulo de artista e dizer que sou um arteiro, dentro dessa cultura maravilhosa chamada Hip Hop.Enfim, Sou o Dj Dandan, o Anderson Cassiano Barbosa de Sena. Tenho outros apelidos como Black Dantas, Tio Danda e Dandan “odéodará” . Adotar apelidos sempre teve uma importância que vem de uma importância ancestral, africana. Que quando nasce uma criança africana ela ganha o nome com significado daquele momento que a família vive. E quando se introduz esses apelidos dentro do Hip Hop, é por conta disso também. Por exemplo: a Queen Latifah cuja tradução é “rainha gentil”; a Lia, significa “a exaltada”. Estou aqui para trocar ideias e informação. O imprevisto impede a chegada do camarada Kleber. Não sou o dono da razão; apenas tenho uma vivência e es8

[aplausos] • Thiago: Como acontece essa sua relação com a prática dos Djs, com os toca-discos, com a música, como e quando começa e como foi essa caminhada? • DanDan: Nasci em 76, no meio da ditadura, e no período, meu Pai, Edson, e Meu Tio, o Zé Banana, tinha uma equipe de baile, e sempre há um som “rolando” no barraquinho lá de casa. Com 4 anos de idade, tinha o hábito de ficar do lado do toca-discos, antes conhecido como vitrola, e com a mania de catar e colocar o palito de fósforo em cima do rótulo do disco. Ficava ali longas horas e as músicas me envolviam, ficava a viajar. E meu pai falava: “moleque o que você está faz aí sentado?” Curtia observar o fósforo a girar, girar. Nos anos 1980, com a novela Partido Alto, muitas pessoas se veem estimuladas a iniciar a vida na dança. Um outro tio mais novo, o Dudu, com a moda do breakdancing, começa a dançar break, também. Fazia-se aquelas filinhas, com luvinha branca e tal, minhoquinha no chão! Esse meu tio que dançava ia aos bailes e trazia muito som para casa. É o período da chegada do Funk falado, e mais tarde descobrimos que o Funk falado tem parentesco com o Rap. Meu pai, defensor do Funk Soul da geração anterior, debatia sobre o novo Funk. Mas meu tio, novão, curtia som de moleque! Vivi nesse ambiente familiar moldado pela música. Deve-se falar também sobre a importância das emissoras de rádio, como a Band FM que promove com equipes os bailes aos sábados e aos domingos. Havia os programas das equipes. Tinha o programa da Chic Show, Zimbabue, Black Mad. Tínhamos um longo período, a partir das 10h da manhã. Tínhamos a mania de gravar nas fitinhas porque os Djs do período tocavam na rádio e a gente gravava nas fitinhas. Nessa época, aos 11 anos de idade, passo a frequentar os “bailinhos da quebrada”, mas quando um amigo, o Edson, mais velho três anos, passa a frequentar os bailes grandes, ele passa, também, a me levar. Nesse momento, vivemos a fase do Função, uma dança com gingado mais malandro, no projeto Leste Um, que acontece no maior salão da Amé-

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rica Latina do período, em São Bernardo do Campo. Aos sábados em outro salão, o Choppapo, havia a dança do Função até a chegada da Lagartixa, quando se começa a mexer a cintura. Aí numa dessas noites, que na maioria era de sábado, ia pra Leste Um, a gente foi curiar uma roda... os cara dançando... os cara pulava pro alto, girava no chão, fazia uns negócio loco... a gente começou a olhar, meu... “pára de ficar fazendo passinho no bagulho... olha o que os maluco faz, velho...” aí o Edson conhecia... o primo do Edson conhecia o Bruno que dançava pro Sampa Crew... e esse primo dele que era o Fábio, morava no Jabaquara, e esse Bruno morava também no Jabaquara... então a gente foi lá, falar com esse primo dele “a gente viu uma roda ali... tal tal tal...” ai o Fábio falou “mano, esses cara que você viu lá vai todo sábado na São Bento”... “esses maluco vai todo sábado na São Bento... aí apresentou o Bruno que dançava pro Sampa Crew e tal... [aplausos] Fomos apresentados ao Bruno que nos avisa sobre a São Bento, e no sábado seguinte lá estamos e nos encontramos com a galera que frequenta o projeto Leste UM com um look sofisticado para o nosso padrão. Nos sentimos acanhados! Descobrimos, também, que na periferia de Diadema havia um movimento parecido. Tudo isso nos estimula: O Edson toma a iniciativa de querer ser Dj, quando compra alguns discos. Ficávamos a mexer no Três e Um para retirar uns barulhos estranhos. Quando o Edson começa a fazer um curso com Dj Guiná, passo, então, a condensar mais informação. Em casa, nesse período, tem um aparelho de som Três em Um, nele insiro as fitas cassetes, e, ao mesmo tempo, coloco o disco para rodar no prato. Tento realizar do mesmo modo que faço na gravação das fitas nos bailes, e partir daqui começo a experimentar a mixar. Quando um amigo adquire uma melhor aparelhagem de som, ficávamos a treinar o dia inteiro. A partir daqui, passo a prestar atenção, também, nas músicas dos meninos da São Bento, os mesmos que frequentam as rodas do projeto Leste Um. Elas dançam com músicas que não são as mesmas que se ouvem nos bailes. Começamos a descobrir um outro universo musical, começamos a querer ser Dj porque queríamos tocar aquelas músicas para

dançarmos, fazer as festas para os dançarinos “colarem”, para as pessoas dançarem o som nos bailes. Assim, inicia-se minha vida de DJ. [aplausos] • Thiago: Agradeço a presença do Kleber. Dividimos a conversa em partes. Pedimos ao Dandan como começa e em qual ambiente se inicia a trajetória como DJ, com a aparelhagem? Agradeço se puder seguir a mesma trilha.

• KLJay: Boa noite. Sou Dj há 30 anos, período que cobre as fases amadora e profissional. Tudo começa com as emissoras de rádio FM: os mais velhos com 18 e 19 anos, eu com 12 nos, com quem jogo bola na rua, vão às baladas e contam as histórias dos bailes, e que as músicas que tocam no baile são as músicas da FM. Na época, as grandes são a Eldorado, Antena 1, Alfa e Manchete. Temos a Antena 1 e a Alfa até hoje a operar com músicas dos anos 1980. E aí passo a ficar interessado a sintonizar na FM, mas minha mãe ouve apenas a AM, que tem som mais limitado, música muito mais popular. É interessante que as histórias são semelhantes, que estamos próximos da faixa etária e os mesmos equipamentos. Mas meu pai tem um rádio gravador da Sony, que o mantem com zelo; aliás, e nunca entendi porque ele guarda o rádio numa toalha dentro da na cômoda, e ouve somente aos domingos. Quando descobri o lugar que ele guarda, passo a poder ouvir a FM e descubro o Funk. De pronto, identifico-me com a música. Puxa: “Como esses caras conseguem fazer uma música assim”. Havia os grupos grandes como o One way, Shalamar, Cheek e o Angie, entre tantos outros. Como não podia sair para as baladas, sempre que posso ouço a FM. Assim, entro em contato com as ideias dos mais velhos, e, também, na escola. É um período de muitos bailes aos domingos e bastantes festas em casa de família. Nesse período, a cultura Hip Hop começa a aparecer nas emissoras de televisão em alguns programas, como no programa Fantástico. Não como uma moda, mas como um feito de uma nova geração que mostra a cara, e o Hip Hop toma conta do mundo. Começo a acompanhar os moleques mais velhos, a trabalhar no centro da cidade, a ir para a rua. O universo de expande: é no centro que vejo pela primeira vez o Nelsão ,

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os caras das crews, do break; os encontros acontecem primeiro começam na confluência da rua 24 de maio com a Dom José de Barros e, depois, desloca-se para São Bento e lá se estabelece. Quando aluno do colegial, conheço o Edi Rock, que estuda em outra escola, distante um quarteirão da minha, e formo uma parceria com ele para fazer baile. O, colégio, funciona, à tarde, como um local de encontros de jovens que gostam de jogar bola, dançar e ouvir música. Motivado começo a comprar equipamentos; meu pai ajuda a comprar um três e um, equipamento com rádio, toca-discos e tape-deck. A outra motivação vem do programa Big Apple Show, na rádio Jovem Pan, apresentado pelo Julinho Mazzei, aos domingos. Um programa incrível: duas horas com todos os lançamentos do Funk dos anos 1980. Conheci e aprendi muita música através desse programa. Ao mesmo tempo, acontece aqui no brasil o que já ocorre nos EUA: a transição do Funk para o Hip Hop, a mesma transição do dia para a noite, não escurece de uma vez, escurece aos poucos. Então, o Hip Hop começa, aos poucos, a substituir a música funk. Acompanho essa transição e me volto rápido para o Hip Hop. Lá na São Bento conheço as grandes figuras como o Mc Jack, Thaíde, Dc Brown, Finado, as gangues de break Back Spin e Companhia, Dj Um, o agitador cultural Milton Sales, e, também, o meu companheiro de 26 anos no Racionais, o Mano Brown. No período, há o Clube do Rap, na Brigadeiro Luiz Antonio, uma festa de Rap com show, organizada pelo Giba, do Região Abissal, e pelo Dj Gé Rodrigues; aliás, toco no clube dele há 14 anos, o Dj Club. E no Clube do Rap faço a minha primeira apresentação com o Edi Rock; e, nesse dia, estavam lá o Fish, o Jack e o Brown. Ele conta essa história até hoje: “ô meu, vi vocês lá”. O primeiro contato com o Racionais é com o Brown, e vice-versa. Depois apresento para ele o Edi Rock e ele me apresenta o Blue. Isso se dá porque somos de dois grupos diferentes: Edi Rock e KLJay da Zona Norte, Brown e Ice Blue, BB Boys da zona sul. O encontro com o Brown se dá na São Bento. Nos identificamos assim que passamos a trocar ideias. Como está desempregado, arrumo trabalho para ele na empresa que sou office-boy. Assim, passamos a nos ver de segunda a sexta-feira. Aí em um fatídico dia ele diz: “arrumei um nome para o nosso grupo”. Já andávamos juntos e a tocar nos bailes da Zimba10

bwe. Fazíamos também shows separados porque atuo como Dj do Edi Rock e do Blue, mas também toco para ele. No intervalo do café da empresa ele diz: “Racionais”. Ao que respondi: “Racionais é esquisito, mano”. Estava acostumado com nomes como Run DMC e África Bambaataa. Mas ele retruca: “Não, mano. Racionais. Raciocínio. Raciocinar”. No dia seguinte, depois de pensar, disse para ele: “Mano, Racionais é foda”, e aí fica Racionais. Então basicamente a história é essa: antes do Racionais eu já sou Dj. Racionais tem 27 anos de existência e eu tenho 30 de Dj. Aprendi muito com eles e com o Brown, inclusive musicalmente, e eu trouxe o meu conhecimento para o grupo também, e eles me ajudaram. Minha carreira se desenvolve desse modo: o Dj de entretenimento, de festa, juntamente com o trabalho de DJ com dos Racionais. Para mim, é um privilégio poder fazer parte dos dois mundos. Quis e sempre me esforço para seguir a minha carreira solo. Poderia me acomodar sendo Dj dos Racionais, mas não quis e quero continuar a tocar em qualquer lugar que tenha espaço. A história parece longa, parece que estico o chiclete, mas esse é um resumo. [aplausos] • Thiago: Obrigado pelos relatos. Mas como vocês se entendem como profissionais nessa trajetória? Porque tem uma relação muito forte a prática do Dj com o entretenimento, com o prazer, com o vínculo familiar, a coisa dos parentes, de escutar. Como existem modelos de profissão, como as de ser advogado, médico, professor, como e quando se entendem como exercendo uma profissão ou quando percebem imersos em uma atividade depois de tanto exercitarem e como entendem a profissão de DJ?

• DanDan: : No início, é emoção! É a felicidade de você manusear uma música. É muito louco! Você vê um cara tocar um instrumento e fazer miséria com aquele instrumento, a criar notas, e outras coisas, e você com dois discos tenta fazer a mesma coisa. Lembro que o público é capaz de perceber o desenvolvimento do DJ quando parece que você estica a música e a deixa maior, mas é outra a música que ali está. É uma emoção fazer isso. É uma arte. E cada um tem uma forma de apresen-

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tar essa arte. Lembro que criamos uma equipe para fazer festinhas e uns bailinhos na “quebrada”. Fazíamos “caixinha” com vaquinha e pegava emprestado para ter o material, mas o som não é bom; assim, as pessoas gostam. Fazíamos sem cobrar. Não havia a noção da cobrança. Mas quando abrimos um salãozinho, para 200 pessoas, numa rua na “quebrada” chamada 14, criamos uma festa, a Forte Night Club. Mas há também equipes que fazem festas nas escolas, que são maiores, como a Jump Dance, a Black Prince e Sonic Power, e essas equipes trazem também os grupos também de rap. Com a festa do nosso salãozinho, passo a ter uma renda e a começar a comprar discos. Esperava ansioso a segundafeira para ir à Galeria do centro, na Discomania, comprar discos e, também, calças. Adorava comprar calça colorida! Na época, não tenho a noção de investir. Começo a ter noção da coisa profissional em 1996 quando toco pela primeira vez em uma festa forte, a Soweto. A galera vem e me diz: “Quanto você cobra para tocar em tal lugar?” “Não entendo esse mercado”, respondo e, aliás, não entendo até hoje. “Ah, mano, peça esse tanto ou acordamos um teto nosso” “Nosso teto é esse. Vamos discutir e ver até onde podemos chegar”. Tem pessoas que dizem “Ah, é esse teto? “É esse tanto que vocês cobram? Então, é isso”. Nos anos 1990, a turma da música eletrônica é quem mais ganhava. Chegam a ganhar três mil enquanto, na época, consigo no máximo 320 nos bailes cheios no Forte Night Club. O habitual chega em torno de 150 a 200 por um fim de semana. Íamos, às vezes, às festas da música eletrônica e víamos a estrutura: som, iluminação e portaria cara. Percebemos nesse instante a existência de um ativo mercado que há uma galera a ser bem remunerada. Houve-se sim música rap nos anos 1990, na Toco, na Overnight, em festa de boy o Hop Base, e há canções do Public Enemy, embora a maioria dos sons do Public Enemy não tocasse nos bailes black. Mas com o acesso ampliado que se tem agora do rap, há um público pagante. No entanto, ao se crescer nessa cultura se aprende uma coisa: o que você aprende você divide de alguma forma com a sua comunidade, e essa é a minha posição. Sou do tipo que ganho com quem tem dinheiro para me pagar. Todo mundo tem que ganhar dinheiro mesmo e está tudo certo, mas eu tenho uma coisa com a cultura que é muito sério:

ela vem em então em primeiro lugar. Não cobro do irmãozinho que faz um evento na “quebrada”, não cobro o mesmo valor que cobro de alguém que tem uma casa noturna. Adapto à realidade de cada um, também, e sempre pergunto quantas pessoas cabem, qual é o tipo de som e o tipo de público, e qual é a frequência de preços de portaria. A partir disso, estipulo o cachê. Muitos eventos de Breaking, em escolas, chego a aceitar por R$ 100,00. Sempre pergunto: “como é que é a realidade de vocês na “quebrada”? E a partir disso defino o valor; muitas vezes fiz o show apenas pelo transporte. Paga minha condução, vou lá, e realizo o show! É importante o contato com a comunidade Hip Hop e o que essa molecada vivencia hoje. E dividir um pouco do que sei com eles para mim também é muito importante. Então essa coisa do mercado e de ser do profissional estamos a aprender. Se estou disponível e um irmãozinho lá da “quebrada” que organiza um evento me chama vou pelo transporte para carregar os discos. Porque só toco com vinil. Os outros equipamentos, como o serato, por exemplo, uso apenas no show com o Criolo ou quando vai fazer alguma gravação de estúdio; mas para discotecar, gosto de fazer com vinil. Então, não entendo exatamente essa coisa do profissional porque cada um tem seu jeito de ser profissional, e esse é o meu jeito de ser profissional, [aplausos] • KLJay: A pergunta é muito boa e as histórias são muito parecidas. No começo, toco porque gosto, como hobbie, e quando toco em uma escola ou em alguma casa de família faço por um preço irrisório de R$50 reais nos valores atuais; ou mesmo pelas cervejas. A noção de profissionalismo chega quando passo a ser chamado porque até então peço para tocar nos lugares. Quando as pessoas começam a querer me ver tocar começo a pensar: “Querem me ver! Cobra-se na bilheteria e se gasta no bar”. É como diz o Dandan: aos poucos se aprende a negociar o valor em relação ao que você representa e o que é esse mercado. As histórias são parecidas: o cachê precisa ser flexível; caso se estipule apenas um valor, como infelizmente muitos artistas fazem, você se limita a um tipo de público e não vai “rodar” o mundo. O Bra-

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sil são vários países dentro somente de um. Estamos em São Paulo, são várias cidades dentro de uma. Então, você tem que ter também a mente aberta para poder circular em todos os meios. Isso leva tempo para se perceber porque acho que muitos de nós ficamos presos com sentimento de culpa: “ah, num vou lá porque lá é uma classe que tem mais dinheiro. Não vou lá porque lá o público é todo branco, é todo classe média alta, e preciso ficar na minha comunidade”. Muitos de nós estão presos nessa mentalidade. Comparem o Rap, a música, com o futebol: o futebol é o esporte que o país ama e, no estádio, estão pretos, brancos, ricos, pobres, classe média. Aí eu começo a pensar: “por que não mostrar a minha arte para todos e continuar a ser a mesma pessoa e a tocar do meu jeito? Eu posso fazer isso! Quem quiser me contratar que contrate! Quem não gostar, que não me contrate! E isso se leva anos para se aprender, e é desse modo que começo perceber o que é ser profissional assim. Hoje, o KLJay não é somente um Dj profissional, o KLJay é uma empresa. É uma empresa que têm gastos, têm lucros, têm pessoas que trabalham para o KLJay. Quem fecha as discotecagens do KLJay é ele mesmo que é a minha empresa. Preciso cuidar da minha empresa. Se eu colocasse na mão de uma pessoa com a mente mais aberta, mais flexível, eu também não irei em muitos lugares tocar. Eu vou tocar por R$ 300 reais, e, às vezes, é gratuito. As pessoas dizem assim: “posso dar uma garrafa de whisky, mas não cobramos; é todo mundo pobre, o “bagulho” é osso! E você tem a chance de mostrar sua arte e pode acontecer de alguém admirar o que se ali toca e ser um grande produtor de festa daqui há cinco anos e pagar o cachê de cinco mil, 10 mil reais. E ser profissional também não é apenas saber lidar com o seu cachê. É saber negociar, ter o fone de ouvido, seus toca-discos, seu mixer, seu par de shell , seu par de agulha, seu par de filtro, seu serato, seus cabos, sua régua, o seu AC, ali com as entradas para as tomadas. Isso impõe o respeito quando você chega organizado e quando outro dj vê que na sua mochila tem tudo isso. Muitas vezes somos nivelados por baixo por muitos outros djs que não gostam do nosso estilo, tem inveja do que somos. Então você já tem que chegar na casa noturna preparado para diversas situações. 12

Vejo djs consagrados que não tem fone, não leva o serato para a festa, e, por diversas vezes, vi djs deixar de tocar porque outro dj maldoso desliga o serato dele. Infelizmente existe competição. Não é na maioria dos casos, mas ela existe, ela é presente, ela tem uma boa porcentagem. Então você tem que cuidar da sua empresa. Precisa depositar o dinheiro antes em sua conta. Se dizem que o seu cachê está caro, você precisa negociar e diminuir um pouco porque existem muitos lugares que se gera uma grande bilheteria, e, às vezes, não recebe nem a metade do que você merece. Precisa-se informar com os outros Djs, e negociar e insistir no seu valor. Saber quem você é e quanto você vale. E isso não é se vender, aliás, isso não é se corromper, isso é se vender mesmo, vendo o meu trabalho: o KLJay. Sei a posição que ocupo: sou o KLJay, não sou o Crazy, não sou o Jazzy Jeff, não sou o Kevin, não sou o Dandan. Preciso saber quem sou e quanto cobrar, o que fazer. Acho que devemos saber o que somos e o que representamos. Vejo hoje como o KLJay empresa. É uma empresa séria que tem lucro e tem gasto, mas não vai ter prejuízo porque existe uma outra questão que é a questão da educação financeira, também. Temos que saber lidar com o dinheiro, não ter medo do dinheiro. Gostar de ganhar dinheiro, de trabalhar, de fazer com dinheiro muitas outras coisas acontecerem. A pobreza e a miséria não são coisas boas. O que é bom é a prosperidade. É ter dinheiro, ajudar os demais, e isso é bom. E é isso que quero ser. E o melhor está por vir: empresa, empresa! [aplausos]

• Thiago: Como vocês entendem um modo de fazer mais refinado ou de desenvolver de uma maneira mais avançada no trabalho do dj? No caso do grafite é possível observar uma diferença no traço e na dança o modo como os dançarinos se relacionam com o domínio da técnica. O que para vocês é o refinamento ou como é o modo do dj profissional erguer um trabalho de “ponta” na hora de tocar? • DanDan: No percurso, tento melhorar as influências. Os primeiros djs que observo são os do meu bairro. O Guiná é um deles e outro é o Celsi-

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nho, maravilhoso para a minha formação como dj de baile: ele ficava ao meu lado com uns discos “da hora”. E ajuda a molecada nova que começava a tocar; e ele diz assim: “Dandan, toca essa música.”; “eu tenho certeza?”; ele: “pode tocar”. Aí toco e a pista “bomba”; em outra situação, ele diz: “agora você decide qual música você vai tocar aí vejo se aprovo ou não essa música”. Então, ele me ensina como olhar a galera e apresentar aquela música porque a forma que você empreende define o seu perfil. O KLJay toca a música do Criolo de uma forma dele e eu toco de outra forma. Cada um tem seu jeito particular, e uma fortes influências chega com o Gran Master Duda, e até hoje não o conheço pessoalmente até hoje e me arrepia lembrar dele porque eu lembro que quando se inaugura o projeto Radial eu estava lá. Lembro-me de como me vesti: um camisão de meu tio, queimado na ponta, um Bruno Minelli do período; tinha vergonha de me apresentar com o camisão, e na cabeça um bonezinho azul que quando a luz incide sobre ele mostra as manchas e a sujeira. Nessa noite, com a queima de um dos toca-discos, o Duda faz o restante do baile apenas com um microfone e um toca disco só. Agita a galera somente na voz. Puxa: “mano, esse cara é bom demais”. E aí você já tem a cultura do antes, dos djs que falam muito no microfone. Procuro trazer isso comigo. Quem me viu tocar vê que às vezes falo bastante. É por conta dessa influência porque sempre me concentro nesse tipo de comunicação, ter essa troca; às vezes, você pode apresentar uma música de uma forma que não se consegue transmitir determinada emoção; porque, às vezes, determinada música pode trazer lembranças do seu tio, do seu pai, de sua mãe, e daquela sua prima nega velha que dança um samba rock bem louco e não está mais entre você. Então, temos a responsabilidade de trazer uma carga emocional que pode fazer lembrar de episódios que havia esquecido. Acredito que o dj ele tem que ser um cara ousado. Por exemplo: não é simplesmente soltar o Chaves e não saber apresentar aquele Chaves; é importante que aquele público se envolva a partir daquela sonoridade. Cada dj tem seu jeito de fazer isso. Procuro em minha relação com o vinil desenvolver de uma forma mais humana. Tocar, girar, virar e pegar um disco, e, às vezes, muito envolvido com aquela música, e ela está para terminar e eu ainda não

escolhi uma outra. É fruto da vivência dos muitos bailes do Chic Show, dos caras Black Mad, Neon Disco Club, Gisela. Trato com muito sentimento porque amor com aquilo que você faz é muito importante. Pode ser que vai vir outras tecnologias que vai me engolir, tá ligado? Mas sabe o que é o mais loco... quando chega um moleque que viu você tocando e faz um bagulho mais foda que você, mano... cara, é bem loco isso, mano... por que a maior alegria do professor é ver o aluno superar ele, tá ligado? Que o moleque entendeu memo qual é a do bagulho, sabe? Então tipo eu... lógico que eu quero viver o resto da vida tocando, fazendo essas coisas e tal... mas também se não rolar de eu fazer isso, mano, eu entendo que eu já cumpri um papel pra nossa cultura, tá ligado? De alguma forma, tá ligado? Como olhar o Deeper ali, e o Mofi (?) tá ligado? E uma vez o Mofi, o Tano faltou na oficina, eu fui cobrir a oficina do Tano... e quem foi lá fazer a oficina? Foi aquele moleque ali... e ele já tinha uns discos na casa dele porque o tio dele fazia baile e aí ele começou a manusear os discos e aí eu falei “mano, cê tem todo o jeito pra fazer o bagulho, você já tem ritmo, já tem o bagulho e tal e num sei o que lá...” e falou “porra, o moleque vai tocar”, “o moleque toca pra caralho hoje...” O Deeper... o Deeper ele passava na rua, lá na minha rua, e eu já tinha lá o bagulho e tal e o Deeper ele passava na rua que ele levava o sobrinho dele pra escola... ele passava na minha rua... e aí tinha um evento na quebrada que era o... na quebrada não... era um evento que um parceiro meu fazia que é o Paulinho Correria. Quem escuta 105 fm naquele programa de reggae, é um moleque da minha quebrada, aquele sem vergonha... ele fazia uma festa chamada Hip Hop Futurista... e ele fazia sempre uns baile lá no Okinawa, lá em Diadema e tudo mais... e aí o Deeper ia muito nesses baile... aí certo dia o Deeper passou na rua e ele falou assim: “mano, me arruma uma camiseta pra mim? Uma camiseta lá”. Eu “Passa aqui em casa que eu te dou a camiseta”... e ele entrou e eu comecei a apresentar os discos pra ele, tá ligado? E ele passava toda a mão lá na rua porque ele levava o sobrinho dele pra escola... primo, né, primo... era primo, né? Primo pequeno seu... e mano, hoje também um puta dj,

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tá ligado? Tá tocando... os dois tem um projeto junto chamado Caixa Preta, tá ligado? E eles também participa de um evento lá em Diadema que chama a festa da gangue... e mano, só desses dois já tarem desenvolvendo o bagulho pra mim já uma vitória, tá ligado? Porque de alguma forma eu contribui, tá ligado? Eu dei um start, eu fiz alguma coisa, tá ligado? E pra mim é uma alegria, é um orgulho... tá ligado? E eu acabei fugindo do baguio, desculpa... porque é emoção, tá ligado? é... Eu entendo que ser dj é transmitir uma emoção... ser dj você educa as pessoas musicalmente, tá ligado? Eu disse isso até no camarim pra você, que você... eu sou um cara que eu não me prendo às dez melhores da billboard, tá ligado? Porque eu entendo que tipo, é... o cara lançou um disco, tá ligado, e tem aquele negócio: a música de trabalho. Legal. Mas se eu ouvir aquele disco e eu ouvir uma outra música que eu acho mais foda ainda, eu vou tocar aquela música... ou seja, é o dj que faz a pista, tá ligado? É o dj, mano. O dj faz a pista, o dj faz aquela música pegar, mano... Quantas músicas a gente já ouviu... que o KLJay tocou, que não tocava em outros lugar... que o Kleber tocou... “Caralho! O Kleber toca um som que é foda!” e todo começou a tocar aquele bagulho... é mano, é foda!... cê apresenta um bagulho, é a forma com que ele apresentou a parada... é a forma... então a gente pode educar musicalmente sim. A gente pode educar, tá ligado? A gente pode ser um militante dj também, tá ligado? Pode lançar um som de ideia de revolução, de transformação, de querer mudar memo o bagulho, entendeu? A gente curte também as música de festa, de sabe... então tipo, é a forma que você apresenta, mano, é como você olha no olho da pessoa, tá ligado? E como você entende a nossa cultura... isso é muito importante como você entende a cultura, tá ligado? Olho no olho... entender que você tá atrás de um par de toca disco, mas você tá ali, ó... eu sou o tipo do cara que eu gosto de toca-disco no chão... eu gosto de me sentir ali, ó, igual... tá ligado? O tempo todo... aí o Criolo fica meio... a gente pega uns palco alto, e a gente debate porque “Porra”... eu falo “mano, eu gosto de palco baixo, mano, que eu gosto de sentir a galera perto, a galera pulando junto ,fazendo bagunça... eu gosto disso mano... eu gosto de sentir essa energia, tá ligado? E discotecar é a mesma coisa pra mim... eu gosto de sentir, tá ligado? Sentir a galera per14

to, tá ligado? Ver o malucão bebo esbarrando no toca-disco... “ê mano, carai... cê...” e aí vô lá, treto com o maluco “o mano, cê é loco, tio?”... mas aí é a emoção do momento, tá ligado? É bem loco também... agora bem loco... tem aqueles que fica “porra mano, toca aquela música lá... cê tem aquela música?” “num tem.” “Pô, cê tem aquela música otra...” “num tem.” “Porra, mano, cê tá zoado... não tem nada, irmão...”. Cola esses malucão, mas é da hora velho, porque o maluco pediu um som que você, porra, mano, devia ter esse som aqui também, tá ligado? E é isso, mano... é o meu jeito de tocar, meu jeito de viver isso, tá ligado? De sentir isso... é... é importante ter tudo isso que o Kleber falou do equipamento, cê tê todo o seu equipamento … isso é essencial, velho. Essencial. Cê ter todo o seu equipamento é importante... a gente entende que o acesso é cada vez, ainda mais agora com a alta do dolar aí, a gente entende que o acesso tá cada vez mais difícil... ô irmão, desculpa, to falando pa caramba, né, mano... perdão... a gente entende... a gente entende que o acesso é mais difícil, mas acho que é devagar, né, mano... eu fui comprar meu primeiro par de toca-disco foi agora em 2005... é... meu primeiro par de toca-disco foi 2005... já faz 10 anos... mas pra quem toca desde os 15 ano... ahahah... é... eu pegava sempre toca-disco emprestado com a galera, né... mas é isso, mano... se você acredita, e isso é pra cultura inteira, tá ligado? É pra cultura inteira, mano. Seja pro cara, pra mina da dança, seja pro pessoal do grafite, o pessoal que rima... é isso, mano. É acreditar e fazer o bagulho, mano... E sempre tem uma parada, mano. KLJay, ele era officeboy, mano, mas tava ali fazendo os baguio dele, tá ligado? Entender a história aqui é isso... ele era officeboy, mas tava ali... discotecando em alguma festinha ali... comprando um disco, fazendo alguma coisa, tá ligado? E é isso. Mantendo aquele sustentozinho, acreditar no seu sonho e correr atrás, mano, correr atrás, né... porque a gente sabe que na quebrada, muita coisa impede a gente de sonhar, né, mano... Então se a gente consegue nos permitir a sonhar, então vamo aproveitar esse sonho e tentar realizar ele de alguma forma, né? [aplausos]

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• KLJay: Uau! Sensacional!! Olha, tem a pergunta sobre a técnica... • Thiago: Sobre o que você entende como refinamento... • KLJay: Sim. Eu tenho... eu peguei a inspiração e a técnica vendo os djs e pondo o meu estilo, né? Vamos dizer assim... é... eu tentei pegar alguma coisa que cada dj que eu vi, fazia... tentei pegar uma técnica, um jeito de pegar no disco, um jeito de pegar no toca-disco, um equipamento que cada um deles usava... tentei ir pegando esses elementos de cada um deles e somar ao meu estilo, ao meu jeito, né? Então, ele falou do Duda... O Duda é o cara que tinha o baile inteiro na mão dele... porque ele era comunicativo, ele sabia mixar, ele tinha um puta bom gosto musical... Então eu ia nos bailes que o Duda tocava e ficava olhando pra ele assim e falava “Caralho, se algum dia eu for tocar eu vou tentar também me comunicar com as pessoas” porque... o lance da comunicação é foda... o dj quando fala com as pessoas, dá a impressão que ele tá lá no público, não dá a impressão que ele tá lá em cima, tocando... parece que ele tá no meio das pessoas curtindo. O ser humano, o cliente, o público, ele precisa dessa comunicação, né? Ele precisa de se sentir igual ao artista... O público, ele fica muito mais à vontade quando isso acontece. Os djs poderiam falar “boa noite”... “oi, eu sou o dj tal” e tocar. Ele poderia falar alguma coisa. “Hello!”, sabe? Então eu peguei inspiração do Duda, peguei inspiração do Dj Toc... achava loco o jeito que ele tirava o braço quando ele trocava de disco porque ele tava aqui tocando, aí ele mixava um som... pra tirar o disco e por outro, ele não pegava no shell e fazia assim... ele ia lá no braço, no final do braço e levantava assim, fazia assim com o braço... ele fazia isso de um jeito muito leve... eu achava loco o jeito que ele fazia isso... por exemplo, né, eu acoplei isso à minha troca de disco... porque realmente é mais fácil... o risco de você tirar a agulha e riscar o disco é muito menor... não hoje, porque hoje existem agulhas que não riscam o disco. Você pode passar ela de ponta a ponta que num acontece nada, mas antigamente não tinha isso... às vezes, se você não tivesse uma sensibilidade pra tirar a agulha do disco, você riscava a faixa, certo? E pra comprar outro... ele tirava assim, ó... então,

então eu fui pegando... um jeito de virar de um... um jeito de fazer scratch de outro, mas sempre criando o meu estilo, o meu jeito, porque não adianta você querer copiar o Crazy... você não vai ser o Crazy... Não adianta você querer tocar igual o Jazzy Jeff, não vai tocar, entendeu? Tocar igual o Way Tech , igual o Dandan... ou igual a qualquer outro dj... o Cia, o King... cada um tem o seu jeito... e eu fui me aperfeiçoando... e esse aperfeiçoamento, ele é constante, entende? É constante. É complexo... é um contexto, né? Você saber o que tocar, conversar com as pessoas, olhar para o público... estar ali no momento, independente do problema que você tem... saber avaliar o público, se tem... se a casa tá cheia, se tem mais mulher, se tem mais homem, se tem mais preto, se tem mais branco... se o ambiente, se o clima tá favorável, ou se não tá... tem lugar que cê chega que é pesado, super pesado... tem lugar que é leve... tem lugar que cê já entre cê fala “nossa, eu vou arrebentar... precisa nem tocá muito, véi...”, só sua presença já... entende? Cê tem que ser um psicólogo também... tem que avaliar tudo. E eu, pra mim, a discotecagem hoje é um jogo, é igual um jogo... você treina, você é... faz um suposto set, uma suposta seleção de músicas... mas na hora tudo pode mudar... quando você entra, sobe no toca disco, pode tá tudo diferente, entende? Então pra mim é sempre improviso. Sempre. Claro que junto ao meu improviso, ao meu jeito improvisado de tocar, eu faço algumas viradas iguais porque são muitas pessoas, são muitos lugares que você vai, então muita gente ainda não viu aquela virada especial que você faz e que todo mundo fica louco, entende? Eu vi um dj japonês falar isso quando ele tocou no Instituto Thomie Othake, ele falou: “a minha discotecagem é improvisada, e junto a esse improviso eu somo coisas que eu venho fazendo por aí e esse improviso acaba sendo um treinamento também... e eu me identifiquei muito com isso que ele falou, né? Então o KLJay é a soma de vários djs, de várias atitudes... moldadas ao meu jeito de ser. Cada um toca de um jeito, é o que ele falou. E o lance de você por a energia na música, isso é super importante... o Eisntein falava isso: “tudo é energia”... né? O jeito que a gente tá aqui falando... o jeito que a gente tá sentado, quando você cumprimenta uma pessoa... então... eu vou repetir as palavras dele, muitas pessoas já me falaram “porra, Kleber, você

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gosta de R&B, né? Cê só gosta de Rythm and Blues”... “Porra, eu não gosto, cara, mas eu vejo você tocando os Rythm and Blues, eu passo a gostar”... porque é o jeito que você toca a música... é convincente. É energia, entende? Você põe a energia na música e a música, ela é tocada, e aí ela é ouvida diferente... Isso é uma coisa invisível, que você tem que saber... é uma coisa espiritual, entende?... o amor faz isso também, né?... quando você gosta do que está fazendo, aquilo é feito de um jeito que brilha, entende? Tudo é importante. Eu falo pra todos os djs, não adianta ter técnica. Eu vejo djs sensacionais, que tem uma puta técnica, fazem performances incríveis... mas quando ele sobe na pista, ele entra no toca-disco e vê um monte de gente, ele não sabe o que fazer... porque ele se dedicou à técnica. Então é um conjunto de coisas... é a técnica, somada à atitude, somada ao gosto musical, somada ao improviso, entende? Eu sempre falo do Neymar... Olha o Neymar jogando... Inacreditável! Você não sabe o que ele vai fazer nunca, entende? Ele faz gols que cê fala “péra, péra...”... alguém viu aquele último gol que ele deu o chapéu por fora... Ele chapelou o cara por fora, e deu a volta e fez o gol... que que é aquilo? É mágica?? entende? Então é... tudo é importante. Praticar... e inclusive, estar no ambiente, ir no baile , ir na festa, porque na festa você vai ver outro dj, e mesmo que das cem música que ele toca você não gostar de noventa e nove, ele vai tocar uma que cê vai falar “cara, que som loco, mano”. Esse som eu vou acoplá-lo ao meu set. Tudo é aprendizado, é constante, entende? E isso você vai se aperfeiçoando cada vez mais... é a mesma coisa os atores [tosse]... eu também falo um montão, falo muito... já está na hora de parar... é igual atores que você vê com 80, 90 anos atuando de um jeito sensacional... então é... o aprendizado é constante, você vai melhorando, vai melhorando, nunca achar que você é o melhor de todos, nunca criticar o outro... temos o direito de falar que não gostamos de tal pessoa, de tal set... mas que pare por aí, né? Você também ficar fora da competição, fora da fofoca, fora desse jogo que tem, que a humanidade faz de um querer derrubar o outro, te ajuda muito profissionalmente... te ajuda muito como artista você não querer fazer parte da competição, entende? E aí só a última coisa que eu quero dizer é... que eu comecei a falar e num fui mais a fundo... você 16

chega num lugar às vezes pretendendo tocar um tipo de som, com várias músicas pra tocar e o dj toca 5, 6 delas... e você tem que ter várias cartas na manga pra substituí-las, pra fazer uma outra performance... e é tudo aqui. A gente tem que treinar o cérebro muito... meu hd já tá fora... eu não gosto nem de ficar ouvindo mais música, é muita música na mente... e às vezes realmente você se confunde, você se perde, entende? Improvisar. Muita... muitos djs que tocam antes de você, eles fazem questão de tocar as músicas mais famosas, as mais quentes pra... justamente ofuscar você... aí você bem e toca uma música que não tem nada ver e a pista fala”. O leque é muito grande, entendeu? O gosto musical, o dj que tem o gosto musical... não é apurado... o cara que gosta de muita coisa... me ajudem... eclético, né?... que gosta de vários tipos de música, ele nunca vai se dar mal numa discotecagem porque ali num baile, por exemplo, de Hip Hop, tem muita gente que gosta de samba, que gosta de musica brasileira, que gosta de Drum and base, gosta de House, Trip House, entende? Que gosta de Jazz... e você sempre pode surpreender... então é... entenderam o contexto? A complexidade? Não pode ficar preso num ritmo só... E tem uma frase do Frank Master Flex que eu nunca vou esquecer. Eu queria encontrá-lo pra agradecê-lo. Uma frase de uma entrevista que ele fez pra The Source a, sei lá, 15 anos atrás... que ele disse “eu não sou só um dj de Hip Hop... eu sou dj... eu falei “UAU!!!!”. Frank Master Flex, você vai pra Nova York você fala “quem é o pica?”, cê espera vim um cara novo, falado... um cara novo... todo mundo fala “o pica é o Frank Master Flex porque quando ele toca, ele arrebenta. Ele é demais!”. É isso... basicamente... é muitas histórias... vou ficar até seis horas da manhã... [aplausos] • Thiago: De acordo com a programação a gente não tem muito mais tempo... mas a proposta é esta. • DanDan: Eu posso abrir um parênteses rapidinho [Thiago diz “vai, vai...”]. Uma das noite... uma das noites mais locas pra mim, tocando... foi uma que tocou KLJay, Dj Primo e eu... lembra dessa? no Hotel Cambridge?

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• KLJay: Lembro!! Vou até falar o que aconteceu... fala, fala, fala.. • DanDan: Uma noite desafiadora: o Primo toca primeiro, depois eu toco e, em seguida, o KLJay. Mas com a super performance do Primo, imagino-me em uma enrascada. • KLJay: imagina eu depois dos dois... • DanDan: O interessante é o desafio. Lembro-me de uma outra noite que toquei no Hotel Cambrigde quando um Dj chega atrasado com meia dúzia de disco debaixo do braço justamente na minha vez de tocar. Ele tão empolgado começa a tocar e o Zico diz assim: “você vai deixar ele tocar”? “ Deixa ele tocar”, digo para o Zico. Como está com um número reduzido de discos começa a pegar na primeira bag que ele encontra. É a minha bag: pega um disco, e pega outro disco, e pega sei lá sei o quê. Mas ele arregaça! • DanDan: É um desafio e você precisa aceita-lo caso queira ser Dj porque pode aparecer alguém e tocar tudo o que você imagina tocar. Ele vai tocar antes de você toda a trilha que você toca. E aí você precisa ter as cartinhas na manga.

da parada foi que foi o primeiro disco de vinil, e eu que tenho essa paixão com o vinil, que tinha meu nome, que tem meu nome, tá ligado? Tá lá skratch Dj Dandan, lá ligado? Isso pra mim foi um bagulho loco, a gente lançou com a comunidade aí, tá ligado?... aí foi, mano, foi uma emoção muito grande pra mim porque foi, tipo, cê querendo ou não, por mais que a geração dos anos 90 não tinha tanta pretensão, que a gente era tão de boa, né, mano, que não tinha pretensão de disco, de num sei o que lá, de glamour, não sei o que... a gente queria só levar nossa ideia, fazer show, cantar, tocar, tá ligado? Não tinha tanta pretensão, tinha um som... quem sabe, né, mano, vira o bagulho... e aí, quando aconteceu isso, velho, de ter o meu nome num disco de vinil, cara... foi foda, foi de chorar... foi de chorar... aí depois veio o clip, veio os bagulho, mano, foi só emoção. • KLJay: Para mim, são dois os momentos marcantes: a primeira vez que ouvi “Pânico na Zona Sul” na Radio Bandeirantes e a primeira vez que vi a capa Holocausto Urbano, do Racionais, no instante que eu caminho para o viaduto na Praça da Bandeira vejo discos numa vitrine de uma loja: “Uau! Ali sou eu também”. São momentos que nunca vou esquecer. • Thiago: mais alguém tem alguma...

• Thiago: Precisamos de objetividade senão não conseguiremos dar conta do tempo que ainda temos. Alguém quer fazer pergunta sobre a discotecagem? PERGUNTAS DO PÚBLICO Fernando: Lembram quando e como foi a sensação de ouvir pela primeira vez uma música do grupo de vocês? Você com o Criolo, e você com os Racionais, numa emissora de rádio ou televisão? • DanDan: primeira vez que eu chorei com o trabalho do Criolo foi quando a gente foi lá no Grajaú... tinha um projeto dos meninos chamado Dialeto... e a gente lançou o vinil, que era o single, que tem o duas de cinco e o Grajaú ex... foi quando a gente foi apresentar este disco pra aquela comunidade... mano, foi uma emoção, eu chorei muito porque, tipo assim, a emoção maio

Espectador: eu queria saber, pra vocês assim, que vieram de outra geração, que tem uma caminhada do caramba, vocês falando de tempo de bailinho, assim... meu pai conta essas histórias pra mim... é o que eu não vivi, mas é que eu sinto a emoção toda vez que ele me conta e vocês falando, vocês que viveram isso e passaram por toda essa transição que a música viveu, que o Hip Hop viveu... vocês viram a cultura nascer e se tornar esse monstro que é hoje... hoje a gente estando em outros espaços, não só o Rap... a gente como negro, a gente como periferia, ocupando outros espaços e a necessidade... não a necessidade, mas é... como vocês enxergam isso sem se perder entre essa relação de indústria e essa relação de militância, da gente fazer algo com essência... saber mesclar os dois de alguma forma...

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• DanDan: Eu lembro que no início, você... é... você ir pra lugares tipo... por exemplo, ir pra clássica televisão, era se vender. Eu lembro que você gravar numa gravadora multinacional, era se vender... é... mas aí você olhando, por exemplo, pro Public Enemy, ou até mesmo o NWA, que gravou em gravadora, que os caras estourou no mundo inteiro, a concepção do... do... do... do se vender, na época... acredito que foi meia confusa... porque você tem um produto. Você... A tua música, as pessoas consomem a tua música. Tua música acaba sendo um produto... se as pessoas consomem, ela é um produto. Ela precisa vender, né, precisa vender, esse produto precisa ser vendido. As pessoas precisam conhecer e ter acesso a esse produto, né? e... acredito que o... pra mim, a ideia do se vender é quando o cara vira pra você e fala “mano, a sua música é boa, cara. A sua música é boa pra caramba mas, mano, bota uma saia, que vai ficar bem melhor... e... tipo... muda o seu jeito de andar... ou... muda tua letra. Você é bom. Mas muda a tua letra.” Aí, você na... na empolgação pega e muda... você muda toda a concepção da ideia que você tinha, tá ligado? É... eu acho que isso é o vender pra mim... E é lógico que quando você num tempo, com o tempo, né, como a gente tá tantos anos, em grupos de anos... e tal, num sei o quê... a gente entende que durante... o tempo pode mudar a gente também, né? De repente, começou de um forma... vc pega um Beach Boys... os cara só falava besteira pra caramba, tal, e depois de um tempo começaram a lançar umas ideias mais foda, tá ligado? Porque os caras mudaram. Os cara viram que era oba-oba o que eles faziam e depois mudaram prum baguio mais ideológico... né, mano... preocupado mais com o mundo e tudo mais... então, porque? Os cara vão ficando adulto, né, velho? KRs One costumava dizer que tipo existe o Hip Hop dos meninos e Hip Hop dos homens, né... Os meninos quer falar de maconha, quer falar de num sei o que lá. Os homens quer dar uma ideia foda e tal, né, velho. Mas também rola o vice-versa pra porra também, né, mano...hahahah... rola pra caramba também... porque eu acho que é o seguinte, mano, nos anos 90, mano, a gente subia no palco, véio, falava a realidade, colava os homem, tirava a gente do palco e dava umas porrada na gente, tá ligado?... Hoje, a galera vivencia um momento maravilhoso é... com os seus defeitos, é lógico... com os vene18

nos de hoje são outros, né... são outros... não se compara o veneno que se passava nos anos 90, né?... final dos anos 80, 90... não se compara. Mas é... os venenos hoje são outros e a galera hoje usufrui de coisas que os que antecederam eles correram atrás o tempo todo... é... como falar do preconceito que a playboyzada tinha com a gente, tá ligado? Não que deixou de ter, existe ainda, tá ligado? Mas antigamente era um preconceito muito maior, tá ligado, era um preconceito muito mais foda, tá ligado? A gente não podia frequentar clubes, tá ligado? Não podia passar com um bonezinho da Socks , bonezinho quadrado, andar de preto.... passar na porta daquele clube, mano? Olhava torto pa nóis, tá ligado? E hoje, os cara já não olha tão torto pra gente... a gente toca naqueles clube hoje, tá ligado? Toca naqueles clube... porém foi uma conquista, né? Não deixa de ser uma conquista, né? É... A gente meio que arrombou esta porta mesmo, tá ligado? Só que eu entendo também que os caras trocam de herói, né? Hoje a gente pode ser o herói dos caras, vamos dizer que é... é... é uma galera que tava precisando existir algum tipo de ideologia e que hoje ouve Rap pra ter essa ideologia. Então se você quer ganhar uma nova ideologia, compra o seu próximo cd de rap, tá ligado? Mas antes da gente era o Forreagge , era o Reagge, o Forreagge, esses bagulho aí, né, mano. E... e agora é a gente e depois vai ser outros, mano... só que quem acredita na sua ação de comunidade, acredita nisso... mano... a gente tem que agradecer que o Hip Hop já é algo enraizado na comunidade, tá ligado? Cê pede prum moleque de quatro, cinco anos, cê fala “dança um break aí!”, o moleque faz isso aqui ó [mostrando movimentos com o corpo]. O moleque tem quatro, cinco anos. Como é que ele sabe que tem uma dança chamada brake que faz isso aqui? Aí cê fala “Ô, bota um Rap aí!”, o molequinho já cantando, tá ligado? O moleque já sabe fazer um baguio, o moleque... cê faz um beat box pro moleque, o moleque faz assim ó. [mostrando movimentos], tá entendendo? Então, isso já tá nas comunidade, tá ligado? Isso já tá. E por mais que ele... ele possa sair, as classes de hoje num... não possa escutar mais a nossa música, não possam mais ter acesso às artes, à discotecagem, à num sei o quê... eles num queiram mais isso... a gente vai tá sempre nas comunidades, mano. Só que a gente tem que ficar atento que a gen-

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te aprendeu e precisa devolver pra comunidade, pra gente se fortalecer entre nós. Quando a gente fala de dinheiro, mano, a gente não tem que ter medo de ter dinheiro, mano... a gente tem medo de ter dinheiro, mano! A gente fala assim: “ganho dinheiro...”, vou contar uma do Criolo. O Criolo logo quando bombou uma na orelha e tal queria comprar uma televisão, televisão da hora, ele queria comprar. Ele falou assim “mano, será que eu vou tá ostentando se eu comprar essa televisão, velho?”, “Puta, eu queria ter uma televisão dessa mas será que os cara vai achar que eu tô ostentando?”. Olha, mano, a gente tem medo, mano... Os cara implantou uma cultura na gente, que a gente tem medo até de comprar uma televisão da hora, tio. Imagina o irmãozinho ganhando dinheiro quiser comprar um carro da hora? O cara “pô, se eu chegar com esse carro na quebrada os cara vai falá que eu tô boy”. Os cara implantou essa medo na gente, tá ligado? E por que? Pros cara é natural... os cara tem dinheiro, compra outro carrão e continua andando lá nos jardins, num sei aonde... os cara continua, tá tudo certo, mano, tá ligado? Nóis não... quando nóis tem um bagulho mais embaçado, a gente tem medo de como a nossa comunidade vai pensar da gente, tá ligado? No Hip Hop tem que se prender disso, que também tem uma coisa no Hip Hop que é o seguinte: quanto você... você tá ali, ó, vai mano... você vai virar... você vai virar mano... aí o maluco virou... aí quando o maluco virou cê fala “ah... o maluco agora tá tirando, mano... tá pagando de boy agora...”. Ô mano... cê tá ligado? Você apoiou o tempo todo pro cara virar e quando o cara vira cê quer brocar o cara, mano? Né, mano, então, essa coisa de falar “o cara tá ganhando dinheiro pra caramba”, a gente ter que ficar prestando conta do dinheiro que a gente ganha, mano, pra galera do Hip Hop... Acho que tem que se desprender disso, mano. Eu acho que tipo, mano, tem que aplaudir quando o irmãozinho de quebrada vira, mano, tem que aplaudir sim. Se ele tá dando ideia torta, tio, se ele tá dando ideia torta, vai chegar um momento que ele vai se ligar que ele deu ideia torta pa caramba... se ele deu ideia torta, vai chegar uma hora que o bagulho não vai virar como tá virando pra ele... vai chegar uma hora que, mano... tudo é... tem que ter consciência que tudo é passageiro, mano... e que a gente tem que entender que o maior respeito que a

gente tem que ter, tá ligado? Nós.. é da nossa comunidade, mano... porque, eu realmente, eu quero chegar na minha quebrada, tá ligado? Por isso que eu sempre vou lá às vezes... quando eu tenho um tempo eu colo... sabadão tem... tem.. tem Hip Hop, tem basquete com Rap lá na quebrada que é um som que a gente coloca lá nas quadra lá e faz um barulho... vou colar lá... vou tocar, sabe... então, tipo, manter esse contato, porque mano, se um dia acaba, eu quero apertar a mão dos irmão e ouvir falar assim pra mim “mano, você foi foda! Você representou nóis!”. Caralho! Brigado! [aplausos] • KLJay: Hoje não tenho mais a culpa: a culpa de ter medo de se ganhar dinheiro, a culpa de não divulgar o trabalho em outros lugares, de possuir um carro, uma roupa legal; não tenho mais isso e muito menos o medo de tocar Drumm & Base e House; muitos outros sons fazem hoje parte do meu set hoje. Desde o começo de minha carreira, estive preso na ideologia do Rap do Brasil; vamos dizer Do Brasil: país religioso, dramático, com a mentalidade de pobre. Mas continuo a ser o mesmo Kleber, o mesmo KLJay de 30 anos atrás. Continuo a toca do mesmo jeito agressivo em qualquer outro lugar que vou e continuo a tirar foto e dar atenção paras as pessoas seja preto, branco, classe média, rico, pobre, mendigo. Troque as folhas da árvore, mas não troque a raiz dela. Hoje estou muito melhor, muito mais experiente, muito mais tranquilo e muito mais seguro do que me imaginava anteriormente. Existem as críticas; existem as pessoas invejosas que querem atacar você. Foda-se! Claro que não deixo de prestar atenção no que elas falam porque, às vezes, pode ter fundamento e a linha é muito tênue. A linha que você caminha é muito fina: para você passar para o outro lado e cair é rápido. Mas acredito no meu potencial e no que eu sou. Faço somente o que gosto, toco somente o que gosto. E vejo a minha profissão como uma arte. Como uma arte que é para ser mostrada para qualquer um, mas eu não posso mudar o meu jeito de tocar, de ver o mundo, de andar somente para ser aceito. Hoje me aceito muito mais do que antes!

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• Thiago: Obrigado. Quero dizer que estamos transbordando o horário. Preciso repetir: esse projeto se chama Hip Hop Produção de Conhecimento em sua primeira edição. O propósito é o de reunir diferentes profissionais, em diferentes dias, para podermos aqui trazer e descortinar os diferentes episódios e o desenvolvimento das trajetórias vinculadas à história dos profissionais que sentam nessa mesa para falar. Quero, antes de agradecer a presença dos profissionais, agradecer a Aline que foi quem media o contato para se conseguir trazê-los até aqui. Quero, também, agradecer a Karime que nos ajuda no registro das falas porque a partir delas elaboraremos um documento para ser disponibilizado na internet para que as pessoas possam conferir o que aqui se relata; afinal, o conhecimento é da humanidade. A conversa é a primeira das etapas do projeto. Quero agradecer o pessoal da equipe Tools, que é a Mari e o Renato. Quero agradecer a Jaqueline Amanda, que também é design do projeto. Ao Telmo Rocha pela produção, e ao Centro Cultural São Paulo. Aos DJ KLJay e DJ Dandan: não tenho nem palavras para agradecer a presença de vocês aqui hoje. e dizer que amanhã temos o encontro também com Kamau e Tássia. No sábado, teremos encontro com Magoo e o Tinho. E no domingo tem uma mesona com o pessoal da dança que é dividido em duas partes, em dois períodos. Obrigado pela presença hoje. •

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MCs - Tássia e Kamau • Thiago: Boa noite. Sejam bem-vindos. Agradeço a presença de vocês. Estamos no segundo dia do projeto Hip Hop Produção de Conhecimento com o formato de diferentes mesas de conversas e debates sobre diferentes práticas da cultura Hip Hop. Ontem, tivemos a presença do Dj KLJay e o Dj Dandan com a discussão sobre a prática dos Djs. Hoje, aqui com o Kamau e Tássia Reis. O objetivo do projeto é documentar a posição dos que têm erguido, desenvolvido e refinado a cultura Hip Hop, a partir de São Paulo. Para começar, como se inicia e desenvolve a trajetória de vocês na prática do Rap, do Mc com a música? • Tássia: Tenho trajetória mais curta... • Kamau: Não é por isso, não! • Tássia: Boa noite, tudo bem? Para quem não me conhece, muito prazer. Sou a Tássia Reis. Conheci a cultura Hip Hop por meio das danças urbanas, na minha cidade, em Jacareí, no interior de São Paulo, e me encanto por tudo: pela estética, pelo discurso político, pelas músicas, e a cada momento dessa trajetória me aprofundo cada vez mais. Inicialmente, é superficial: quero apenas dançar. Ouvia os clips e achava aquilo maravilhoso “ah, eu quero dançar!”, mas conforme me envolvo tenho a possibilidade de participar de eventos que trazem os quatro elementos, e isso desperta curiosidade. Em Jacareí, havia muitos eventos de rua diurnos em bairros e em centros culturais e isso acaba por compor minha formação no Hip Hop. Como gostava de se divertir “zoava” na rua com as amigas e tínhamos um grupo somente de meninas que se chamava “Estilo Gueto”. Havia também uma crew, a Soul Diva Crew, composta por garotas. Brincávamos de rimar uma fazia troça com a outra, até que um belo dia fomos a uma jam na Galeria Olido, uma jam especial de aniversário com alguns shows como o do Kamau e do Funk Como le Gusta. No meio do show do Kamau, ele chama duas pessoas para rimarem, uma garota e um garoto. E as minhas amigas começaram a gritar meu nome. Naquele dia, em especial, fizemos o trajeto de Jacareí até Mogi das cruzes de ônibus que é mais barato do que o da viação Pássaro Marrom, que é o ônibus que faz o trajeto 24

direto e que tem ar condicionado. [risos]. O ônibus para Mogi das Cruzes é intermunicipal e cumpre um trajeto com o dobro do tempo: três horas para vir para São Paulo; de Jacareí para São Paulo, o trajeto dura uma hora. E de Mogi até São Paulo a viagem é de trem, e nele rimamos todo o percurso como “gente grande”. Zoamos: “ah, nós vamos rimar lá no evento”. Quando o Kamau chamA minhas amigas, elas me empurram para frente e fazem coro de “Tássia, Tássia” e, eu que nunca havia rimado num microfone, “morta de vergonha”, senti um “chamado” naquele momento em uma das experiências mais loucas de minha vida porque não estava preparada, mas, ao mesmo tempo, eu podia estar. Sempre gostei de escrever; as minhas poesias sempre trazem ritmo; uma professora dizia que é música o que faço, e eu não acreditava. A partir daí, como meu habitat natural já é o Hip Hop, acabo por compor Raps. • Kamau: O meu primeiro contato com o Hip Hop se dá pela música aos 12 anos de idade. E não sei exatamente qual a primeira música que ouvi, o que me chama a atenção, mas quando percebi me encontro engajado com a tarefa. Tenho o privilégio no período, digamos, de ter um amigo com quem eu começo a andar de skate, aos 12 anos, que o irmão tem um grupo de Rap. O irmão dele que é DJ KLJay, que esteve aqui ontem, tem no grupo dele algumas pessoas que começam com os Racionais MCs. E eu estava ali, na casa do meu amigo, a andar de skate, e a atrapalhar os ensaios, mas com atenção prestando no que ali acontecia e me entendia cada vez mais como pessoa. Com 15 anos escrevi uma rima e um colega de classe também escreve sua rima, e participamos de um festival da canção no Liceu de Artes e Ofícios. Fizemos um duo; ele era punk. Ficamos em antepenúltimo no festival, mas não tínhamos a pretensão de alçar voo, e interessante porque pudermos falar e dá um cenário diferente para o Liceu. Os que ganham o festival são do samba; eles disseram sobre a nossa participação: “pô, muito legal... tem um pedaço lá dos Racionais...”. É lógico que ocorre influência, mas não é um pedaço, necessariamente. Não havia a pretensão de rimar. E depois de um período a ouvir música em inglês, e por conta também do skate, acaba um pouco por aprender a língua. Es-

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tava com 20 anos; o KLJay pergunta: por que não faz a rima dos brasileiros se consegue rimar em inglês? Parece fácil, mas não é necessariamente. Hoje, tem tutorial no Youtube e é possível acompanhar o bass alive, o spinard. Não havia Karaokê e eu não tinha experiência, mas resolvi criar um grupo com dois amigos, o Ajamu e o Sagat. Eles estavam resistentes com a ideia, mas depois cederam. O Ajamu atuava como DJ, o Sagat escrevia e eu gosto de música. A primeira parceria resulta na gravação de uma fita. Comprávamos vinil com instrumental de Rap em inglês e cantávamos sobre ele. Em 1997, realizamos a primeira apresentação do grupo, o Consequência, em meio ao show do Posse Mente Zulu. O segundo show da minha vida foi para cinco mil pessoas na abertura do show do Taíde DJ 1. Ao sair de casa para o show, meu pai oferece a filmadora: “você não vai levar a filmadora, filho?” Não quis levar porque como estaria no palco não poderia, e aí eu respondi “não pai, a MTV vai estará lá...”, e ela estava lá, e é a minha primeira entrevista para um canal de televisão. “Nossa, vocês são revelação...”, e eu não sabia como falar exatamente, porque é tudo novo. E de lá para cá, continuo a tentar construir fazer música. [aplausos] • Thiago: São diferentes períodos e diferentes relações que se estabelecem até vocês conseguirem efetivamente cantar e rimar. E dentro dessa trajetória como se dá a transição de modo mais efetivo? Como que vocês veem essa transição de se identificarem como profissionais? Porque a ideia de profissão carrega um estereótipo do que é trabalho e do que é mercado de trabalho, como, por exemplo, as profissões de médico, advogado, professor e outras, e, de alguma maneira, esse lado profissional dentro da cultura Hip Hop. Como vocês se entendem como profissionais nesta trajetória, nessa transição? • Tássia: Continuo de onde parei para agregar na resposta. Depois que meus amigos descobrem que componho músicas, umas rimas, uns raps e tal, começam a me chamar para participar dos encontros. Fiz primeiro da XXL no vale do Anhangabaú e com o pessoal no interior do estado da região do Vale do Paraíba: Mc Ralph,

Mc Du, Safari, entre outros, entre 2010 e 2013. E assim, não paro de escrever, a produzir, até gravar umas coisas, mas sem lançamentos. Então, meu nome trabalho aparece um pouco, mas ainda não é nada conciso; mas, ao mesmo tempo, as pessoas me conheciam por causa da dança porque participava de muitas ocasiões de dança com a minha turma: fazíamos as rodas, tumultuávamos no bom sentido, assim num sentido maravilhoso. Isso estimula minha curiosidade e lanço meu Rap Jazz quando o Esquina da Gentil chama para participar de uma mix tape para mulheres, em março de 2013. Escolhi um beat, mas muitas delas não conseguem acompanhar porque para elas que criam Rap é muito mais difícil porque muitas são mães e tem dupla jornada, entregar-se para um trabalho é complicado. Aí decido: “vou lançar um separado para não perder o material”. Ele lança minha música no canal dele e se converte num boom do período; ele nunca tinha tido tantos acessos, um recorde para nós: 3.000 acessos em dois dias. A partir daí, faço minha página no facebook: “somente serei uma artista de verdade se tiver uma página no facebook [risos] mas é um começo. Não tinha dinheiro, obviamente, para ir a uma produtora e dizer “faz a minha vida aí? Contrata uma assessoria de imprensa, explica-me o que devo fazer para me tornar uma artista”. Quando vim morar aqui em São Paulo, pela primeira vez, vim estudar design de moda e isso ajuda no processo de composição e no entendimento do visual das coisas. • Kamau: Barroca, Renascentista... • Tássia: A barroca, a única, a exclusiva... [risos]... e aí confiro um o look com coisas minhas e de minha mãe que tenho em casa. Hoje, olho a foto e acho que está maravilhoso aquele ensaio; fizemos um ensaio fotográfico para a página do Facebook. • Kamau: Até hoje, também olho e acho que está maravilhoso. [risos] • Tássia: Tenho xodó pela página. Tinha foto, e se insere um soundclou e compõe um flyerzinho escrito “Tássia Reis, Rap Jazz”; sobe no sound, sobe no Youtube. Boom! Agora sou uma artista! Não é bem assim, mas é o primeiro passo e o primeiro

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estalo que tive para pensar: mas não, não é isso apenas!. Então, tomo a música e lanço o single. A partir daí, começa a ser ouvido em diversos lugares de Rap quando o Bruno Conz, lá de Jacareí, parceiro da XL, propôs a feitura do clip e o fizemos no mesmo ano. Boom, perdeu, né? [risos]. Criamos uma equipe com nossos amigos: maquiadora, as minhas amigas que são bailarinas performers e hoje são produtoras também, a Isis e a Natasha, fizemos o figurino e encontramos um lugar para gravar. Ao invés de 3.000, agora são 10.000 acessos e no mesmo ano do single. E aí “opa! No mesmo ano!! Que evolução, subimos uma escada”. Começamos a entender o funcionamento, mas o processo de ser um artista independente, que não tem um apoio, que não tem uma estrutura, é muito louco porque é um aprendizado cotidiano: a cada micro degrau que você sobe aprende que precisa fazer uma coisa diferente para estruturar sua carreira. Há três anos atrás não sabia o que é uma assessoria de imprensa porque senão as pessoas não saberão que a música está lançada. Nesse processo, percebo que queria fazer música e que eu não iria trabalhar com outra profissão. Quando termino a faculdade, antes do meu Rap Jazz, saio do emprego e retorno para Jacareí. Disse: “chega! Não quero mais fazer isso! Isso não me contempla, não estou feliz, estou triste, arrasada, isso não combina comigo porque sou maravilhosa”. Boom! [risos]. Sentimos medo ante a dúvida de como será o amanhã! Quem me garante? Em um país onde não tem estrutura cultural: tento ser dançarina, mas eu não consegui ser profissional: “nossa, e agora?” e “se eu não arriscar, ninguém vai arriscar por mim, pegar em minha mão para fazer”. Esse é o start do “eu tenho que ser isso” O estalo de profissional eu tive com o EP quando resolvo fazer uma coisa mais séria que desenvolvo mais músicas e envolvo uma estética e há, nesse momento, um público a esperar por alguma coisa já, também. Senti a responsabilidade de “ preciso fazer um trabalho digno, porque amo isso acima de tudo, e, também, preciso também viver disso. E vai ter que dar certo! Ainda estou na busca porque a cada dia é um novo desafio como quando, participar do show do Rashid, preciso de uma carteira porque sem ela não se atua no Sesc • Kamau: Somente serve para isso... 26

• Tássia: Somente serve para isso. É a carteira da Ordem dos Músicos do Brasil. Tem até uma licitação se você entra com advogado, você consegue não pagar e fazer, mas é melhor pagar o negócio do que o advogado, né? • Kamau: O problema é que, às vezes, o Sesc não aceita muito essa parada aí, né? • Tássia: Não, não queremos ficar ruim com o Sesc, jamais! • Kamau: É amigo nosso... • Tássia: É bem amigo nosso... então, tipo, “quer dizer que para eu tocar ali, naquela estrutura que é super-legal, as pessoas verem um show incrível, com luz, com banda, temos que fazer isso?”. Então temos que fazer isso! Mas não apenas porque tem muita burocracia... e aí vamos indo indo indo.... • Kamau: Boom! Interrompi minha fala no começo da carreira em 1997. Também curso uma graduação em Rio Claro porque não havia tantas escolhas, e me encontrava no momento de ter outras perspectivas. No entanto, todo final de semana estava em São Paulo. No período, tenho patrocínio e competi bastante no skate, que pratico desde os 12 anos. Estava próxima minha profissionalização como skatista, e, ao mesmo tempo, escrevia e participava em shows. É “louco” prestar atenção no que a Tássia diz porque também um produtor chama para fazer uma música, o EP e o clip. No período, não há tanta perspectiva. Imaginávamos que produzia quem tinha material e estúdio. Não havia a perspectiva da home estúdio, mas por volta dos anos 2000 surge o fruity loops e o Soundforge que ajuda a elaborar o que achava que pode ser a base das minhas músicas. Desde então, desde 97, o show ocupa o papel de ajuda no desenvolvimento artístico, mas, também, os shows são escassos. Por isso, íamos para os eventos de rua nos bairros com os nossos discos em baixo do braço e com as nossas rimas decoradas. Não havia show de meia hora. O KLJay dizia: “não conhecem você. Vá e faz uma ou duas e arregaça porque depois as pessoas irão querer que você volte para mostrar mais”. Carrego essa fala desde lá! Havia shows inteiros de

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meia hora, mas não se conhecia quem os participava, e você vê alguém que não conhece durante meia hora, a esperar o show de seu amigo, acaba por se tornar chato. A não ser que o cara seja um fenômeno e aí você ali fica meia hora “Caramba, quem é esse maluco?” Desperta interesse. Havia uma rede: fazíamos o show em um lugar, as pessoas viam e nos convidavam para outro evento. Isso acontecia sem ter alguma música gravada. O produto que é o grupo Consequência é resultado dos shows. E eu sempre muito cuidado com o show, como realizar uma introdução; assistia diversos vídeos e estava preocupado no modo de

Vi o Max B.O. e o BBS em um período que eu ainda não rimo: “é legal isso aí! Se eu quiser ser Mc eu tenho que saber fazer isso”. O freestyle abre portas que em um período no qual as “batalhas” são esparsas. Passamos a frequentar a festa Class e na conversa com o Dj pedia um instrumental. O Max era carudo? “vamos aí, Kamau?”: o amigo quer ir, mas ele não quer ir sozinho, tipo, se der “merda” dará “merda” para todo mundo. E aí começa a surgir o momento do microfone aberto no class por conta de que eu e o Max fazemos de modo aleatório, sem pretensão, e a ideia gira também por conta do freestyle. Não sabia que eu

como íamos nos apresentar, como com o figurino de show. E as coisas acontecem de modo rápido, e acho que estou no lugar certo e na hora certa, mas, obviamente, se não temos como sustentar isso não adianta porque havia pessoas que estão no mesmo lugar e na mesma hora que e acaba por não acontecer. Isso para quem mostra potencial e qualidade e realmente agarre à oportunidade. E, com 21 anos, já me vejo como alguém com a postura de profissional mesmo sem remuneração, em 1997. O freestyle me ajuda bastante no meu desenvolvimento como Mc foi o freestyle.

sabia. Então, há o grupo Consequência e o meu freestyle e o freestyle do Max, e, também, de outras pessoas. Logicamente não posso afirmar que fomos os primeiros; o Max começa antes como, há outras pessoas; Porque “ah, eu faço, também!”; sabe quando você estimula a pessoa a se apresentar? Então, isso começa a acontecer no Class quase toda semana. E aí jogam o microfone para nós e diz assim “comanda aí!”. Não sabíamos como fazer. Isso acontece entre os anos de 1998 e 1999 quando organizamos a Academia de Rimas. Numa batalha

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da Academia – com Max, Akin, Marechal e Paulo Nápoli - contra o pessoal da Casa de Hip Hop de Diadema - com o Auri, o JL, o Black Alien, Rossi do Pavilhão 9 e Sombra. Tentamos! E depois o Thaíde, que fez parte da academia, e o Tio Fresh estão conosco, em 1999, quando fomos convidados para abrir o show do De La Soul, talvez o grupo de maior longevidade no Rap; aliás, o De La Soul e o Racionais são duas das minhas maiores referências. E ali a oportunidade para conhecer outros profissionais, e digo para o pessoal do De La Soul que sou fã deles e que aprendi inglês por conta disso.

anos é possível saber o que se quer da vida porque com 13 anos você diz “ah, quero rimar!”; com 14 anos diz “não, não goste.”; com 15 anos diz: “aquilo não pegava mais nada”. Hoje, canto as minhas músicas de 2002 como se fossem atuais porque elas ainda fazem sentido.

• Tássia: Nossa! Boom!

• Tássia: Você estava lá muitas vezes.

• Kamau: O Boom foi depois; primeiro foi o “well”. Fiz um freestyle metade em inglês para que os caras do De La Soul pudessem entender o que falo no palco, e outra metade em português para os que assistiam também entenderem. Não tem filmagem. A única pessoa que diz que grava imagens diz: “vou te entregar essa fita, Michael”; nosso amigo Dengue. “Eu vou te entregar essa fita, Marcão”; outro diz que fica sem bateria. Subi ao palco com o grupo que é referência para mim e me apresento para cinco mil pessoas, 100 pessoas, 10 pessoas, 2 pessoas. Não sou remunerado, mas nesse show do Sesc tínhamos outras condições: camarim grande, mesa farta. E eu saí tão extasiado com o De La Soul que quase não comemos. O show dura meia hora. Quando voltamos ao camarim, bem pobrezinhos, enchemos a mochila de sanduíches: “mano, que da hora! Tinha sanduíches para nós”! Eu ainda estava no ida e volta da faculdade. Em 2002, começamos a receber cachês, mas eram baixos. Nesse processo, conseguimos realizar um disco independente. Gravamos em alguns estúdios o EP Prólogo do Consequência, em 28 de agosto de 2002, e apresentamos no show do Afrika Bambaataa. A partir daí, não retorno à faculdade e com esse CD penso: “vou ter que me virar!”. Graças a Deus tenho uma estrutura familiar boa; como não preciso contribuir tanto em casa isso me ajuda. Passo, então, a viver com o trabalho do skate e com a música, mas sempre a sustentar o que faço com a música, e, também, de certa forma, com o skate porque você precisa de manutenção como a compra de tênis. Mas dali vi que não havia retorno. Com 21

• Kamau: Sim. Caçapava, Taubaté.

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• Tássia: Posso falar uma “coisinha”: Eu também começo a fazer show antes de lançar o meu Rap Jazz, um ano antes; é pocketzinho, assim: pista de skate, lá em São José dos Campos, no Vista Verde. • Kamau: Vista Verde? Toquei lá.

• Tássia: Tinha as músicas, mas quem as conhecia? Fazia “cover”; um pouco mais abusada antes, um pouquinho... • Kamau: Mas ainda bem que você canta porque eu não podia fazer cover. [risos]; às vezes as pessoas perguntam: “você canta Racionais?”, “Não. Não canto Racionais. Quem canta Racionais é o Racionais”, e o Dexter hoje também. • Tássia: Tem versões dos Racionais por aí... • Kamau: Tem um monte! Versão de Racionais é o que mais há [risos]. • Thiago: A se pensar nessa transformação em quando vocês se tornam profissionais, quando se entendem como profissional, há uma relação que é com o valor do profissional? Como se ter uma postura profissional? E são diversas as questões que envolvem se tornar um profissional nesse meio. Nesse sentido, o que vocês entendem esse “ser” profissional quando se pensa tanto no mercado como no Brasil que precisamos viver? O que vocês consideram como grandes dificuldades ou situações que precisam ser desenvolvidas para que vocês possam ainda assim viabilizarem um trabalho melhor? Vocês consideram a existência de um lugar que é mais difícil do que outro? O que que vocês consideram prejudiciais ao trabalho de ser MC?

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• Kamau: : O que dificulta bastante é exatamente o que a gente escolhe porque fazer Rap é mal visto para algumas pessoas ainda é mal visto por mais que mais coisas aconteçam no entorno. O Emicida, desde 2005, tem me ajudado a refletir sobre a aceitação do Rap. Ele dizia assim: “porra, os caras querem que vamos tal lugar só que não querem que eu leve o meu Dj. Não querem que eu leve o meu Dj, mas vocês levarão uma banda de rock; eles pedem para não se levar o guitarrista porque tem um guitarrista bom lá onde eles moram? Não. Eles pedem para o Fundo de Quintal não levar o instrumentista que toca o reco-reco porque tem alguém lá que toca reco-reco que é tão bom quanto o do grupo?” Não. Mas somos obrigados a diminuirmos nossa equipe? Não tem como vir somente você? Vem um dia antes a aí ensaia com um Dj daqui”; mas não é apenas soltar as bases. E aí, como diz um pessoal antigo de lá onde meu pai vem, “vareia, né?”, porque não é apenas soltar as bases. Como prezo muito pelo meu show, faço ensaios semanais quando o Dj pode também porque estou sempre mudo a alterar. Como um jogador de futebol: mudo as jogadas e quero as jogadas ali no esquema para, se precisar, estarmos despertos. Precisa-se de cumplicidade, e eu Dj temos uma cumplicidade, uma sintonia. Por isso, não é possível realizar com outro Dj. Também ouço comentários de pessoas em determinadas festas: “você pode tocar em minha festa, né? Mas faz um cachê “da hora porque a festa está começando”. A amiga diz exatamente a frase: “Faça um cachê beneficiente!” [risos]. Respondi: “A festa está começando, mas eu não!” Boom! [risos] [aplausos] • Kamau: Se cedermos o trabalho pode não sair a contendo. São essas as dificuldades que aparecem para o profissional. Isso no aspecto do show. No aspecto da difusão da música, não temos hoje canais de comunicação, e as pessoas enxergam aquilo que elas encaram como um padrão de pessoas com quaçl vão se identificar. Então, se surge alguém como a Tássia que, eventualmente, atua mais perto do padrão que elas gostam, como diz o Dj Quialat, aí não precisa falar quem é; se aparece alguém que faz o que ela faz, no padrão que eles gostam, aumentará as aparições. Exemplo:

a Nicki Minaj atua há muito tempo, mas não é um trabalho tão amplamente aceito até o surgimento da australiana Iggy Azalea da Austrália, do mesmo jeito, ganha prêmios, mas rima pior que a Nicki Minaj. Boom! Mas esse Boom não é legal. • Tássia: Nem fiz... • Kamau: Nem fiz![risos]. Isso é um exemplo de uma coisa que situação de lá que tem paralelo com aqui. Essa é outra dificuldade que ainda existe. É importante gostarmos do que produzimos localmente do que a gente é, mas não é legal ser a gente... É legal gostar do que a gente faz, mas não é ser legal ser a gente... É legal fazer o que a gente faz, mas não é legal ser a gente... se for a gente, fala “bom, espera um pouquinho...”, ainda tem esse “espera um pouquinho”, essa ainda é uma dificuldade. E infelizmente é uma coisa que está enraizada no país e a gente tá tentando cortar essa raiz aí. E plantar a nossa mais fundo, que foi cortada bem antes, quando não deixaram trazer a cultura da África pra cá, não deixaram as manifestações culturais acontecerem aqui, não deixaram falar a nossa linguagem, não deixaram usar o nosso nome... e colocaram o sobrenome Silva em todo mundo, que inclusive é o meu... desde lá, já tão dificultando... e ainda continua. Tem mais outras coisas, mas isso aí, acho que é a pior parte da dificuldade. [aplausos] • Tássia: Pego carona na conversa: sinto-me como uma artista com muita dificuldade enquanto produção cultural porque a gente não tem, por exemplo, educação financeira. Não ganhei mesadinha para descobrir a mexer com dinheiro. • Kamau: Rio da “mesadinha”. O meu pai diz assim: “você quer mesada, cadeirada?”[risos] • Tássia: Não recebi porque não havia o que receber. Mas isso é histórico: Jogaram o nosso povo negro, em sua maioria, nas periferias, e nos mandaram a se lascar por lá! Então, não é possível ter educação financeira. • Kamau: “Vocês estão livres! Virem-se!”

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• Tássia: É livre do quê cara pálida! Então: educação financeira para podermos estruturar o trabalho. E aula de artes, sabe? Nunca havia feito aulas de canto. Trabalhamos muito no feeling em tudo o que fazemos enquanto trabalho artístico. É claro: tem a ancestralidade que grita quando sentimos uma forte batida musical com o tambor; podemos antever uma imagem, aquilo toca, dá vontade de chorar, são muitas as sensações. Passamos por muitas sensações para a feitura de arte, mas imaginem se tivéssemos educação artística e financeira nas escolas. Não íamos nos segurar! Sinto muita dificuldade em estruturar o trabalho porque o tempo que o tempo que se perde, até que se faça, é muito longo, entendeu? Porque seria possível estar mais pronta. São muitas as dificuldades; enfim, dinheiro não temos. Mas: “ah... não posso fazer porque eu não tenho dinheiro”. Por isso, inventamos. Dinheiro vem e vai: o caso dos cachês muito “louco” porque você precisa definir os valores de seu trabalho; isso é muito delicado porque como alguém pode dizer: “meu cachê é um milhão de reais”. Como é que a pessoa pode responder que não é, entendeu? • Kamau: Nesse momento é possível entender o Kanye West. • Tássia: É claro que meu cachê não é de um milhão de reais. • Kamau: É de 500 mil reais? Então, pode contratar. [risos]

um par de toca disco custa no mínimo no mínimo, se você conseguir de alguém que tá, num perreio, é possível comprar mais barato e de quem já não tá mais precisando. Mas quem quer ser Dj vai comprar um par de toca-disco, vai comprar disco. Hoje em dia, vai comprar o computador e o serato. É um dinheiro. Fala “eu vou cantar”, o microfone, onde cê vai, ele tem. O pessoal tem que ter, pelo menos. “ah, não... mas se podia ser produtor”, “produtor tem que fazer o quê?”, “ah, não, isso aí é chato”, “as mina não vão me vê”, “os cara não vão me ver se eu for produtor”. Como é que vai fazer?. Não há tanto interesse em ser Dj porque, talvez, também não tem formação para isso. Tenta-se, mas a formação não é profissional, direcionada. E as pessoas não veem que isso como uma parte que realmente contribui. As pessoas acham que quem contribui para cultura é somente quem produz o produto cultural, digamos assim. Não quem estrutura isso e quem faz tudo isso acontecer. Fazemos música; sem as outras pessoas a música não se visibiliza. Se não houver assistência, não há para quem produzir. Precisamos de todo, e as pessoas tem que saber que elas são importantes. Vocês são importantes por aqui estarem. Obrigado. Muito obrigado! • Tássia: É bem isso. Tem a estrutura da produção. Não é somente o produtor. Tem o técnico de som e o iluminador se falarmos de um espetáculo maior. • Kamau: O vendedor do CD.

• Tássia: Estamos bem no comecinho e bem humilde, mas não tanto para cachê beneficente. [risos]. Você percebe que as festas não têm estrutura alguma como uma caixa de som decente para se cantar. Isso é o mínimo. Assim, você vai no lugar para cantar, para as pessoas ouvirem seu som, para mostrar a música e não se consegue; acaba por ter raiva. E nos bastidores há muito a se realizar porque muitos querem ser artistas, mas não tem apoio na produção. • Kamau: : Se você vai dançar, você tem que ter uma estrutura corporal, entender o seu corpo, treinar, e se dedicar. Se você for para o grafite você tem que comprar tinta, dar um jeito de arrumar tinta, e saber desenhar. O toca disco, chapa, 30

• Tássia: Tem o merchand (merchandising) que é uma realidade quando é você quem vende seus produtos. Aliás tem CD aí... • Kamau: Sempre tenho CD na mochila. • Tássia: São problemas que podem estar interligados, cujo resultado é o mesmo: deficiência, déficit na cultura, na estrutura. É essa questão que ele levantou de ter uma pessoa como eu, num padrão mais aceitável, faz parte do racismo estrutural da nossa sociedade que ama a cultura negra mas não ama os negros, como disse o Will Smith, se eu não me engano. E é verdade! Todo mundo concorda. E isso dificulta muito. No programa do

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Ronald , ele me pergunta: “como é que é ser mulher negra no Rap?”. Uma pergunta recorrente, e eu respondo com outra pergunta: “quantas mulheres negras que você conhece na música, não me refiro somente ao Rap, mas no mainstream da música?” Diga cinco nomes!”. Aí ele diz: conheço umas duas”. Mas aí pergunto: “Quantas mulheres negras você conhece que estão na cena independente, fazendo um monte de som muito louco?, “conheço um monte!”. Então é isso, né. • Kamau: Como o KLJay que em um programa no Y.O, sobre o dia da Consciência Negra, perguntou ao diretor na frente da câmera: “quantos funcionários tem na MTV?”, “200...”, “quantos são pretos?”, “5”, “quantos são apresentadores, quantos são diretores?”, “Apresentador apenas você e diretor?” O cara quase pediu desculpa para ele. Eu tenho quase certeza que quando desligou a câmera o cara falou “desculpa”. • Tássia: Complicado. • Kamau: Olha aí: não boicota o dançarino. Não desliga o microfone do menino. • Thiago: Tenho uma dúvida sobre o que deve estar intrinsecamente relacionado com tudo o temos dito. Faço a última pergunta e, depois das respostas, abrimos para as perguntas da plateia. Sobre a questão do profissionalismo: quando tenho uma noção de que é ser bem sucedido é relativo em relação ao que cada um escolhe para si na vida. Mas tem-se muito uma noção de sucesso vinculada à uma grande difusão da imagem de que a pessoa é uma celebridade, e acho que tem muita diferença da celebridade do artista e, às vezes, as duas coisas frequentemente caminham juntas, mas a questão é: quando acontece como, por exemplo, de um artista como o Criolo e o Emicida terem grande difusão, isso deve ser entendido como uma exceção? É sorte? É uma porta que se abre? É uma conjunção, como você disse: “ estava na hora certa, com a coisa certa”? Como funciona? Porque não é frequente isso no Rap, se a gente pensar os fenômenos brasileiros que a gente tem no Rap; quem gosta de Rap conhece os trabalhos que são de qualidade e que são de profissionais que estão circulando. Mas para haver uma grande difusão fora desse circuito, como vocês entendem que isso acontece?

• Kamau: Acho que a palavra correta não é exceção: é bom trabalho, bem executado porque a exceção é afirmar que eles tiveram sorte; e eles tiveram no caso do Emicida porque acompanhamos de perto. Vimos como se desenvolve a formação do grupo, consequência direta do trabalho dele. O Criolo, que há muito fazia seu trabalho, e quando ele decidiu parar e fazer coisas que talvez achasse que não podia fazer Rap, foi quando se transformou para ele, mas aparece a colaboração o Daniel GanjaMan e a Biba Berjeaut que tinha sua produtora dela. Une-se, então, o trabalho do Ganja, da Beatriz e o do Criolo, que eram trabalhos que já aconteciam, e desse modo se realiza. Em relação à difusão do Rap, sinto que tem um adequado número de vagas. O problema é se esse número se expande somente quando alguém resolve “meter o pé na porta”. Por muito tempo a vaga tem sido para os Racionais, principalmente porque o Racionais não queria dar atenção a tudo que queriam falar e fazer com eles. É como aquele caso de que quando a pessoa ignora você quer saber o motivo. “Não, mano. Pelo amor de deus, fala comigo aqui, mano. Por que? Não, Mano Brown! Hoje, é uma outra pessoa: os filhos estão criados, viajam para o exterior, dirigem, comem bem, gordos... [risos], como ele fala. Sinto, também, que existe certo número de vagas. Diz assim: “você é tão bom quanto esse cara? Se você for melhor que esse cara, você preenche a vaga e esse aqui desce”. E isso é muito ruim porque sempre vão procurar o próximo Mano Brown, o próximo MvBill. Quando o Emicida aparece, não há alguém como ele do jeito que ele ali chega. E agora eles procuram o próximo Emicida. Tudo é comparado ao Emicida. Nós, que estávamos antes dele, quando queremos fazer alguma coisa, alguém diz assim: “você faz um trabalho parecido com o Emicida?!” Mas aí respondo: “faço do meu jeito”. Temos que passar por essa situação. Temos que explicar o tipo de Rap que fazemos. Não é ruim ser comparado ao Emicida, ou a qualquer outro; isso é ótimo porque lembra pessoas que nos ajudaram aqui estar, mas não nos deixar ser o que queremos ou o que podemos ser ou o que somos? Essa é a parte ruim! • Tássia: Não vou dizer que discordo sobre a existência da sorte, mas pode estar relacionada com o racismo e o machismo, no caso das meninas. Diz

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respeito à questão das vagas que estão interligadas porque com tantas facilidades quantos rapazes poderiam haver com o Emicida. Mas não irão vingar porque a vaga não está lá para eles. Então, não que seja sorte do Emicida, que seja sorte sua, seja sorte minha, mas é tipo aquele Clack Boom no sistema de ter contrariado a estatística. • Kamau: Exatamente. Inegável! Não se pode ignorar. • Tássia: No Brasil, tem essa mania de cultuar a celebridade e de não entender que um trabalho artístico não precisa estar diariamente na televisão. Quando se divulga o trabalho tem sempre a pergunta: “quando você vai aparecer na televisão?”. É tipo o raso das profissões e das coisas. Há um trabalho conciso, independente, na estrada há tempos a viver dele aí vem uma matéria e diz que eu sou uma promessa. Não estou a prometer! • Kamau.: Nesta semana, uma matéria afirma sou revelação da nova escola... [risos]. Eu tenho 19 anos de Rap. [risos] Eu sou o reitor dessa porra. [risos] • Tássia: É muito raso. As pessoas não conseguem ter o acesso à cultura porque não chegam as informações de como funciona uma cena independente e trago a responsabilidade para nós, também. Acho que enquanto artistas independentes precisamos nos estruturar mais em rede. Não se trabalha tanto em rede. Nas ocasiões nas quais conseguimos fazer isso, subimos mais um degrau. Mas foram poucas as vezes, e é muito simples: intertextualizar a dança com o Rap, o Rap com o Grafite ou com qualquer outra coisa, não necessariamente dentro do Hip Hop. Não devem haver limites do tipo “você tem que fazer esse Rap como homem, quadrado, que possa lembrar os Racionais”; Não: temos que trabalhar e em conjunto porque, como diz o Kamau, ser independente é depender de nós. Precisamos melhorar para podermos melhor entender quais são os mecanismos que dificultam nossa expansão. “ah! Todo mundo vai estourar! Todo mundo vai passar na TV”, não é isso. Devo a internet a difusão do meu trabalho, que, caso não houvesse, se o meu Rap Jazz não estaria tão facilmente nas casas das pessoas. 32

− − Alessandro de Guararema, interior aqui de São Paulo, caminho de Jacareí... eu ia perguntar, não sei se vai dar tempo e tal, mas... a respeito do lance da... é uma parte mais técnica, que é a produção,né? Que nem vocês estavam falando que sente essa falta de profissionalismo nas pessoas e tal, de estarem atrás do artista, de tá tendo esse aval, né, de poder... Eu queria saber de vocês, isso. Como é que isso pode ser vencido? E a outra coisa é no sentido dessa oportunidade que as pessoas tem, é uma coisa muito da seleção natural da vida, né... porque, se você está fazendo sucesso, é porque você batalhou pra isso... e vocês tão batalhando pra isso... [Tássia diz “vareia”] Vareia? Então... é nisso aí. • Kamau: Tem pessoas que batalharam muito mais do que nos que a gente e não conseguiram chegar aqui porque em algum momento a vida dá um “rodo” que não é possível levantar, mas não é que falta profissionalismo. Tem pessoas que são profissionais. Tem pessoas que têm vontade de aprender, ainda não são profissionais, mas são pessoas de índole boa que podem chegar no melhor resultado, e tem outras que não sabem trabalhar com o que podemos ser, e aí isso atrapalha. Temos que trabalhar com o produtor em mão dupla e o produtor não necessariamente me levará a ser como “fulano de tal”. O produtor tem que ser o profissional que traz o seu melhor resultado e que faz as coisas acontecerem, nesse caso. Acho que devemos ter a oportunidade de formar pessoas que são parecidas conosco, que entendem o que somos, mas que possam aprender a extrair esse resultado. Esse é um jeito! Existem cursos que oportunizam aperfeiçoar a vontade de ser produtor, mas devemos entender que ele faz parte do time, e que o nome que está no flyer é uma vitória do time. Ontem, teve o anúncio do lançamento do disco do Rashid. Vi toda equipe dele comemora como se fosse ele porque é assim que as coisas acontecem lá. No Laboratório Fantasma, da mesma forma: tem pessoas que chegam e saem, mas quem está ali no núcleo sente a vitória do Emicida como se fosse sua. Sinto as vitórias do Emicida como minhas vitórias porque estou por perto; não porque faço parte agora do Laboratório Fantasma como artista, mas porque sou amigo dele; e desse mesmo modo como o Rashid, o Emicida, o Thiago, também o Projota;

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falávamos: “você é nós lá!”, “Se você chegar lá, é que chegamos!”, “seu eu chegar lá, é porque chegamos!”. Haverá um momento no qual todos chegarão.

− Você acha que isso é um processo individual ou coletivo?

são tão superficiais, que passam tão rápido que algumas coisas não fazem mais sentido e investimos a vida nisso. Muito obrigado por se interessarem por essa parte, também. E o mais importante para mim é que eu possa continuar a fazer música. Muito obrigado por permitirem que isso aconteça. • Tássia: Posso agradecer?

• Kamau: Coletivo porque precisamos incentivar as pessoas e motivar o impulso. Podemos apontar se a pessoa está no caminho certo ou errado. Às vezes, a pessoa fala “ah, é assim? Está bom, firmeza!”, e aí você a abandona lá e ela continua a achar que está certa. E ela não vai entender porque ela foi abandonada ali. • Tássia: Eu concordo em boa parte, mas não acredito na seleção natural partindo do princípio que vivemos em uma sociedade racista, machista, homofóbica, misógina etc etc etc. E que todas as pessoas que aí estão é ultrapassaram essas barreiras. − Jogador de futebol, por exemplo. Temos vários craques e muitos não têm sucesso. • Kamau: Mas isso não quer dizer que eles não batalharam. • Tássia: Não batalharam o tanto quanto! • Kamau: O Neymar estava no lugar certo e na hora certa. Têm pessoas que são rejeitadas num clube e se transforma em estrela no outro. É uma questão de batalhar! • Tássia: É muito relativo porque os mercados são diferentes. • Kamau: Quero agradecer o convite. É sempre bom trocar e mostrar, às vezes, de onde as coisas partem porque o que muitos esquecem hoje é que antes de mim, vieram outras pessoas. Agradeço todas as vezes por essas pessoas terem lutado, terem existido. Meu pai e minha mãe terem vindo do interior e tentado a vida aqui, se encontraram e fizeram com que eu também estivesse aqui. E também por terem pessoas aqui interessadas em tudo isso porque, às vezes, as coisas

• Kamau: A melhor é a Tássia sempre! Eu sei porque e vocês saberão! [risos] Ela faz um trabalho sério e fala assim “ai, que legal, né?” [risos] Lembra do show do Belenzinho? “Nossa, gente!” • Tássia: É o meu jeitinho! • Kamau: Mas é isso que é o charme. Não estou a “zoar”! • Tássia: Agradeço a presença de todos e agradeço a oportunidade de aqui estar para contar conforme vivemos coisas diferentes percebemos, e que estamos todos numa grande “evolução” que se chama vida [risos]. Mas dou risadas por sua causa... [falas paralelas] Obrigada, de verdade, para todos que aqui estão por prestarem. Desculpem-me pelas piadinhas porque sou meio engraçadinha, mas tenho um bom coração, e que todos voltem para casa, bem; ou para um bom “rolê”, a se divertir; Voltem para casa depois. E sucesso para nós, e que consigamos conversar e construirmos coisas juntos; para podermos trabalhar precisamos de vocês, e poder servir um bom trabalho; aa melhor maneira da palavra servir, é claro. E sem público, sem pessoas que gostam do que fazemos não serviremos. Muito obrigada! • Thiago: Quero agradecer o Centro Cultural São Paulo, a Andréia Tomioka, a Karime Nivoloni, o Renato Lopes, da Tools Art e a Mari Turco que fazem a fotografia e a filmagem, o Tj, que está na produção, a Jacqueline Amanda Morais que fez a identidade do projeto, e todos vocês que vieram aqui hoje, ao pessoal da produção do CCSP responsável pelo ar condicionado, a luz e o som. E obrigado, também, ao PROAC. Amanhã teremos mais. Voltem por gentileza. •

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Grafite - Tinho e Magoo • Tinho: Agradeço o convite da organização e do Centro Cultural São Paulo. Começo a fazer grafite em 1988; anteriormente fazia pichação desde 1986. O skate é o responsável por ter me levado às ruas, para outros lugares, e a conhecer outras pessoas, desde 1982, e no período a informação era uma coisa difícil de se arrumar; não havia internet; imaginávamos como tudo poderia ser e trocávamos entre nós (vários nomes... pegar depois). Havia uma geração anterior com o Alex Vallauri, mas não considero que se fazia grafite; stencil é o nome mais apropriado porque o grafite é um movimento do Hip Hop. Precisávamos roubar a informação porque não havia dinheiro para comprar as caras revistas dos EUA e da Europa. Fazíamos “uns esquemas”: roubava e dividia; traduzíamos e depois passava a informação. Não tínhamos conhecimento da língua inglesa. Aprendi a falar graças às traduções; trabalhava duro. E não havia matérias disponíveis; o fat cap, por exemplo: pegava uma agulha quente, tirava a parte colorida do bico, aumentava, devolvia, e depois a parte que entrava no spray abria com um estilete; nem sempre furava certo; apertava a bolinha colorida e, finalmente, saía. Não havia o squeeze marcador; então fazia uso das bisnagas de pigmento de engraxar sapato, feltro de exaustor e punha com silver tape e com um canetão marcava. Improvisámos e fomos crescendo, e começamos a trocar cartas com os gêmeos e a ter acesso ao material. Os “gringos” vendiam para nós; eles fizeram a Fix, a primeira revista especializada e feita por quem era do movimento. Ensinavam na revista como é que se confeccionava essas coisas que falei; salvo engano, estávamos em 1995. Estava com 12 anos e copiava, escrevia paz, amor, qualquer coisa. Desconhecia que escreviam seus nomes tipo pichação. A partir daí, comecei a fazer associação do grafite com a pichação; para a polícia e para a mídia grafite e pichação era uma mesma cosia; eles não gostavam. Houve um período que comecei a fazer uns grapixo; levava os moleques da pichação comigo; fazer a mesma letra do picho, mas colorida. Eles não se acostumaram porque era trabalhoso, gastava muita tinta. Com 10 latas de tinta picho a cidade inteira; mas não havia mais quem pintasse e os do estencil também pararam de pintar. 36

Restava apenas eu; o Espeto, os Gêmeos, o Binho, o Vitché, todos outros pararam. Pensávamos que o movimento fosse ser extinto, então a responsabilidade fica por nossa conta. Passo a desenhar anjinhos como os desenhos de criança porque a galera ficava tímida para pintar porque já lidava com uma técnica boa. Quando passo a realizar de modo mais simples a adesão se torna maior para realizar as letras do picho. Há quem discorda porque é cópia, mas para a época considero que o processo é produtivo. Quando a Luisa Erundina se torna prefeita passamos a ser apoiados ao se abrir as primeiras oficinas de grafite. Surge a segunda geração com ............ Em seguida, transferi-me para o Japão. De lá, trocava mensagens com os Gêmeos, e eles me alertavam para interromper o expediente da escada porque embaixo não tinha havia mais espaço. Na época tinha o site Fotolog, site de fotografias, e sua existência ajuda as pessoas a pintar; fazia-se uma foto do dia de trabalho e postava; obrigava-se a se deslocar pela cidade para pintar e depois postar. Com isso, conheço muitas pessoas de outros estados e países. No site, podia-se realizar 10 comentários; copia-se todos e cola em um e apaga os outros para caber mais comentário. Fase legal! Acho que se entra na época do Magoo. • Magoo: Quero agradecer o convite. Imaginava que teríamos histórias bem diferentes, mas acho que existem traços bem parecidos nas trajetórias. Sou de Guarulhos, do bairro dos Pimentas. Imaginava que eu tinha inventado o grafite pela quantidade de informação que ali havia. Sempre estive interessado em quadrinhos e capa de disco de vinil. Estamos nos anos 1990: queria desenhar e não conseguia; não tinha papel vegetal; pus manteiga na folha e meu irmão descobre; nesse momento, decido desenhar do meu jeito, e, aos poucos, desenvolvo um estilo de traço. O Brown (meu irmão) desenhava e eu era o ajudante; ficava ali na contenção. Fizemos o muro atrás de casa de uns dois metros. Ficamos ali durante um mês pintando com a tinta duco. Criamos uma superfície lisa de tanta demão e escrevemos com caneta; na época eu assinava “cruel”, mas meu irmão disse que como fazíamos juntos devemos assinar “ilegal” juntamente com o outro irmão mais velho nove anos. Depois partimos para o comic, mas quando vi uma parede dos Gêmeos fico

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frustrado por não ter ela inventado. Em São Miguel Paulista, havia um dos Piratas no Tiete meu irmão me arrumou uns canetões e disse: vamos pichar a escola e começamos a fazer o “canetão”. Tenho o Tinho como uma grande referência. Com o Metal formamos uma “gangue e fizemos o primeiro trabalho fora de minha casa quando a diretora de uma escola liberou látex. Meu irmão tinha se acostumado à aventura pela cidade, mas achava “muito louco”, mágico até. Estamos em 1997 e tenho 12 anos, mas não havia a responsabilidade para pintar. Ela começa quando conhecemos o André e passamos a frequentar sua casa que passa a ser uma locadora de grafite. Fazíamos reuniões, distorcíamos letras e copiávamos bastante coisa, e conheci o trabalho dele: somente color gin do calhambeque vermelho. Hoje é o paraíso, mas na minha época a situação é precária, embora houvesse uma geração abre caminhos. (as galeras da pichação e do grafite). Em 1998, conheci o VHS e é a primeira vez que entro no estúdio: o André fazia as captações da turma que pintava. Hoje, meu irmão se dedica mais como DJ e eu continuo a pintar, mais à animação do que ao grafite; mas me dedico à arte educação levado por essa falta de conhecimento. • Tinho: Para complementar: esse lance do “rolê” era muito legal nessa época porque se quisesse

ver o trabalho de alguém precisava se deslocar pela cidade, e aí aproveita, também, para pintar. Hoje, isso não mais existe. Isso tem importância não apenas para os que pintam, mas também para os que querem fotografar. • Magoo: Esquema para realizar a panorâmica... emendava uma foto na outra. • Thiago: São diversas as estratégias artísticas que envolvem quando vocês se entendem como profissionais e aspectos que fazem essa relação profissional com a prática. • Tinho: Para mim é complicado: ainda não sei se sou profissional. No começo havia uma sensação de liberdade e de adrenalina. É uma época inicial da pichação e queríamos nos destacar. Por volta de 1997 e 1988 quando os moleques sobem no Terraço Itália, pintam os paralelepípedos na 23 de maio, aqui perto do centro cultural; via-se a letra gigante do outro lado e os moleques mandava de skate na janela redonda. É a fase inicial quando se explora a cidade. Para pintar apenas com a letra faço em 1 minuto ou dois no máximo; faz e sai, mas para fazer letra de grafite tem que ficar um tempo maior e a polícia pode chegar mais rápido; ao mesmo tempo é um procedimento que não se entendia, mas a letra se coloria. São

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Paulo vivia uma recessão, pouca oferta de trabalho, mendigo pedindo esmola, criança vendendo doce. Começo a pintar criança por causa disso; a gente pintava e todo mundo achava que era pichação. Fomos pesquisar e começamos a roubar as revistas. Escrevia-se frases que não sabia o que significava. Não imaginava que pudesse ser remunerado com pichação; não conseguia imaginar uma situação de alguém chamar um cara para pichar a casa dele. Aí se começou a fazer uns bonecos e a criar cenários, e a tinta era cara. Acontecia, às vezes, de pintar o muro de alguém e quando chegava ao invés de ficar bravo ele gostava e promovia um churrasco e o negócio ia ficando gostoso. A verdade é que o muro dele precisava de uma pintura, mas ele não tinha dinheiro. Dávamos um trato: raspagem, inseria látex e pinta.

pizza; triste quando terminou o crédito. Quando aceitava um trabalho usava dinheiro para comprar tinta e devolvia esse dinheiro para rua; e pintava com mais tranquilidade. Não era rico. Não tenho quase registro algum desse período porque teria que comprar máquina, filme, e gastar com revelação. Deixava os outros tirarem as fotos; às vezes me arrependo. Os anos bons os de 1997 e 1998; as agências que faziam o stand de feira de exposição descobriram o grafite e nos chamavam a gente para os diversos tipos de feiras. Não havia o plotter, a impressora gigante, aí nos chamavam para feira a ser montada num espaço de cinco dias: marca um território, instala as paredes, e no terceiro dia tudo estava tudo pronto para pintar. Os que não chamavam, o espaço ficava cru, no máximo alguns banners. Conseguí-

Fazia-se a reforma para ele que pouco se importa se está bom, o importante é que muro está impermeabilizado.

amos reprodução fotográfica em pintura gigante; chamava bastante a atenção. Havia remuneração, mas vivia numa época “torta”, e não consegui fazer meu “pé de meia”.

• Tinho: Deixa terminar de lacrar: o primeiro trabalho foi com um cabeleireiro. Ele perguntou: você quer ir lá pintar os cabelos? Pedi R$ 500 para ele desistir, mas ele propõe escambo por funilaria, mecânica, pizzaria; trocamos por pizza porque não pagaria em espécie. Todo dia tinha 38

• Magoo: Igualmente à fala do Tinho, também não sei se me via como um profissional do grafite. Gastava a tinta por prazer; não pensava em profissionalização do grafite; penso sim como ilustrador, mas não no grafite. Dois momentos

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marcantes: um, quando chamaram o “Magoo Ilegal” para pintar e outro, quando uma marca quis me patrocinar. Estava montando um time e queria patrocinar uma galera da rua. A marca – que é a etines... - infelizmente a marca não vingou. Mas fiz diversos trabalhos: trabalhei para diversos cabeleireiros, para alguns comerciantes e até na troca de som automotivo, mas considero quebragalho, não é trabalho profissional. • Thiago: Quando fomos fazer o lançamento do livro “As Danças da Cultura Hip Hop e Funk Styles”, conversamos com djs, mcs, grafites, dançarinos, e nos dá impressão que o pessoal do grafite precisa se explicar sobre o que é ser ou não profissional, quando fazem um Grafite remunerado ou dizer por exemplo que os Gêmeos não fazem mais grafite. Mas ser remunerado pelo trabalho em salão de cabeleireiro ou pelo avião da FIFA isso não é o trabalho do grafite? • Tinho: Grafite é uma coisa ilegal. Se chego aqui para pintar pode desafiar porque você é o responsável pelo lugar. Isso é grafite! Se você chamar é um trabalho comercial que pode ter estilo, criação dentro do estilo do grafite, mas está autorizado. Entendemos que assim não é grafite; é uma coisa fake. Quem na rua observa não vai saber qual é ou qual não é autorizado. Se há autorização não é grafite; se você joga a tinta independe se gostarão ou não. • Thiago: A 23 de Maio, um dos maiores corredores grafitados e você me diz que não é grafite! • Tinho: Para nós, que somos de dentro, não é; apenas o que é ilegal. É válido ser chamado para pintar em outro país porque é através disso que conseguimos comprar material e pintar na rua sem autorização. É oportunidade de estar na rua e pintar sem nossos recursos. É uma maneira de estar no mundo. Chamamos isso de street arte, mas em outros lugares é proibido. Aqui é proibido, mas a lei não funciona. Lá fora se você disser que faz arte vai pegar cadeia. O respeito existe quando se está autorizado, mas apenas se ganha respeito quando se faz alguma intervenção que não faça parte daquele projeto; assina-se com outro nome para não se associar com você. Estive em Minsk, capital da Bielorrússia, e lá não

tem grafite, apenas no interior, na costa da fábrica onde não se pode ver. Aí realizam um projeto na capital do pais, chamam pessoas de outros países, para um projeto gigante. Se acontecesse aqui eu ficaria “puto” em chamar pessoas de outros países. A minha maneira de compensar isso é a troca de informação e fazer do jeito deles; o que também é produtivo. Fazer grafite, pichação; cria-se um vínculo que é tipo droga, e você sente e quer fazer; tipo b.boy: bateu no coração, o corpo quer mexer. Queremos manter essa essência. • Magoo: Eu compartilho com o que o Tinho falou sobre a subversão, por isso assinamos “ilegal”; e para complementar, grafite é “ilegal”. Mas o trabalho com os cabeleireiros é uma técnica do grafite porque quando chamam não querem o grafite em si. O grafite tem compromisso com a diversão e com a alegria, e isso é o que eu mais conquistei com grafite: os amigos, MCs, Bboys, DJs. • Tinho: Acho que tudo que vem da rua e tem uma essência que não pode se perder. Quando se transforma em profissional e começa a ser remunerado isso é muito fácil se perder. No começo achava engraçado pensar em ganhar dinheiro: fui bboy, tocava disco, cantava, fazia duas ou três coisas do movimento. Era comum realizar diversas atividades; tinha que fazer as crew e tinha que ter os quatro elementos: a gente faz por amor, muito louco, fazer uns robozinhos, uns lock, saber rimar, botar uns discos. Começa-se quando se é moleque com 12 ou 13 anos de idade, e você não pensa em ganhar dinheiro. Quando passa a ser remunerado somente fará por cachê; somente cantará se houver cachê. Como se encontra o Hip Hop hoje aqui? Na época da São Bento, no começo do movimento havia muita união, as pessoas se conheciam todo mundo; conheço o Andrezinho, o Ney. Passei a conhecer indistintamente do que realizavam. Qual bboys dos conheço? Nenhum! • Thiago: Como é o lugar da transição entre o período que se iniciam e hoje? Como consideram o que as começam a entender esse ambiente, ou melhor, o que vocês acham que pode ser a evolução do do espaço e da população que habitaram e habitam o grafite? Hoje, o grafite é mais refinado? O que há hoje que não havia anteriormente?

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• Tinho: Pergunta boa e difícil: o grafite é da rua mesmo e tem se alterado bastante por causa da tecnologia. Hoje, tem uma série de instrumentos que facilitam pintar como usar o computador: faz um tag no prédio, projeta e fica aquela coisa gigante ou mecanismo que instala duas roldanas ligada com cabo e o spray reproduz a imagem do computador na parede. Mas não vejo isso como evolução do grafite porque não tem como ser uma coisa “ilegal”. Acho que o grafite evolui conforme a lei: quanto mais se proíbe mais se encontra a encontra maneira de burlar. Sou contra a legalização do grafite. Se legaliza não há o que que driblar e não há “aquela” adrenalina. Veja o caso do Banksy: na Inglaterra a lei funciona muito mais do que aqui, tem dinheiro e câmera, e você se demorar a polícia pega fazer, mas fazer stencil lá é tão quanto fazer aqui grafite; entrar na National Galery e trocar os quadros, as plaquetinhas com o nome dele é um modo dele burlar o sistema; quanto mais se aperta mais diminui a adesão, mas os farão com “mais sangue no olho”! • Magoo: É na própria rua e bem individual o que cada um pretende com isso. Mas pintura em avião não é grafite, mas há respeito e reconhecimento ao se chamar alguém para realizar um trabalho. Mas evolução como técnica é uma construção e uma desconstrução do processo. Eu não sou o mesmo Magoo, mas a essência permanece. Eu brigava mais pelo grafite. Queria um propósito mais coletivo. Minha evolução foi pintar e, agora, acabou. Envolvi-me em crews, desavenças, alguns egos, e agora realizo apenas o que eu gosto. O grafite é uma vivência. Existe uma evolução constante na rua; pintar de escada é uma evolução... • Thiago: Quero abrir para perguntas da plateia − Quando você fez a relação da legalização do grafite com a relação do artista britânico da Inglaterra que busca outras formas de burlar, que podemos nomear como uma arte política, você não encontraria outros “buracos” para fazer as críticas sociais ou outros trazer elementos? • Tinho: Penso que eu e uma galera que vem de uma história quererão manter a essência sempre; se você entra num jogo com um tipo de regra deve 40

jogar dentro daquela regra. Quem se engaja em nova regra fará dentro dela. Se se quer criticar o sistema quando é tudo legalizado a tendência é ficar uma coisa meio “florzinha” para ganhar dinheiro, ao invés de provocar. Pode virar moda do tipo “quero pintar também”. Isso tem relação com o número de mulheres que pintam; hoje o número é maior. As mulheres têm medo de encarar a polícia, e com razão, porque a polícia é truculenta; vão “meter a mão”, mesmo. Mas como hoje não há mais essa situação tem um número grande de meninas que começaram a pintar. Acho que deve ficar entre aspas, não pode oficializar. • Magoo: Talvez seja um modo de combater o próprio grafite. Como se vai combater? Façamos uma oficina, uma vivência de como funciona. A moçada anda de skate na calçada, mas as pessoas não gostam e para combater criam uma pista. Acho que é assim que funciona um pouco a legalização do grafite. • Thiago: Acho que tem um lugar na cultura Hip Hop que é o modo de se expressar, dançar, rimar. Mas isso, também, diz respeito ao desenvolvimento humano de difusão e comunicação que é o lugar daquele ser humano na prática: como ir a um lugar para tirar uma foto, um lugar do “fazer”. Quando se legaliza aumenta um outro tipo de fazer porque com a legalização pode ocorrer a ampliação no terreno artístico. • Tinho: Tem esse lugar da transgressão: vou fazer uma pintura aqui porque é “ilegal”, e o que eu quero é transgredir. A motivação mora na transgressão. Vai se estudar o sistema e a política, quando começa a entrar por esse lado, a pessoa vai rebater... não posso sair xingando todo mundo porque eu quero xingar... xingar o lula ou o Fernando Henrique... tenho que estudar história pra colocar argumento pra poder rebater... vamos chegar numa discussão em outro lugar... Quando se retira a transgressão se autoriza e legaliza. Como transgredir uma coisa que não tem proibição? Ou vou encontrar uma forma em outro lugar ou a pessoa que estava acostumada a jogar daquele jeito encontra outra regra. Isso pode resultar num afloramento artístico que possibilita as pessoas sair a pintar na rua, mas vai pintar sem tanta consciência. O que vou provocar? Somente

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fazer uma coisa bonita, mas a coisa bonita nem sempre leva à reflexão e ao espirito transgressor. Havia um período que tinha que vir com a escada, mas aí chegou a lei cidade limpa... ....existia uma coisa de uma evolução artística... já não tinha tanto espaço pra pensar... punha o trabalho do lado do outro cara... tem que ter alguma coisa que destaque... pra pessoa lembrar de mim.. existe uma cidade de evolução... quando vem a cidade limpa e tira tudo... eu vou lá e só tem o meu... só aí você já diminui a necessidade de evolução... e outro lado... o cara que pinta gasta 3 latas de spray... quer fazer alguma coisa bem trabalhada, cheia de detalhe... aí o cara pinta e vem a prefeitura e apaga... meu, dos Gêmeos... aí você pensa... vou fazer um trabalho que vou gastar essa quantidade de tempo pra ser apagado, não, vou meter um bomb. Aí um monte de gente que pintava, parou essa evolução e começou a cair no vandalismo... e começou a entrar nessa guerra com a prefeitura... quanto a prefeitura vai ter que gastar pra pintar esses muros... gastam dinheiro com isso... e as ruas esburacada... hospital sem grana... e a prefeitura botando dinheiro pra pintar muro de tinta, e não vai durar... é um espaço nosso que a gente conquistou e que não vai abrir mão... a opinião pública pode ir contra... acho nocivo a sociedade ir contra a pixação mesmo sendo feio... você censura a pixação, vc censura a sociedade... só pode falar coisa bonita? Tipo os mcs... não fala palavrão... pode dançar mas não pode fazer movimentos meio pornográficos...

mais a rua é pichada. O grafite tem uma lógica diferente, tem uma escolha estética: às vezes um muro ou uma árvore ou um carro velho abandonado como o lugar que se prefere pintar, num lugar que não há circulação, mas porque aquele muro é um lugar que ele quer usar para pintar. O grafiteiro escolhe o muro. O pichador escolhe o lugar, às vezes pela dificuldade, guarita da polícia, na frente da delegacia ou de difícil acesso. Assim é como o pichador se torna grafiteiro. É uma mudança de comportamento e de pensamento. Muitos que participam das oficinas de grafite promovidas na gestão da Erundina voltam à pichação porque tem mais união e os points semanais, toda quinta à noite, uma coisa ritualística; com grafiteiro isso não acontece. Quanto faz a gente (eu, o ilegal) não se encontra? se o cara gosta disso ele será pichador, mas, também, diz respeito à idade: quando você fica velho não quer mais ser preso e não tem facilidade pra subir muro. • Magoo: Tem o lugar da visibilidade que chamam de agendas: o tijolinho, o mármore, difícil de limpar... e a técnica de limpeza já surgiu... eles fotografam... muros que duram com tijolinhos e mármore é uma alegria porque sabe que ali estará.

• Magoo: Acho que surgirão novos meios. A essência será sempre essa e se um dia for só essa nova regra vão inventar um outro nome e acho que eu nem vou estar mais vivo para saber. − Tinho, você disse que o processo de iniciação foi começar pichando. Percebo que está na essência que não pode ser ceifada. Se ceifar isso, morre essa produção. Minha casa é pichada. Fui presenteada com isso Como vocês se percebem? Sair de uma pichação e querer transformar, dar exemplo de pichar essa parede porque achei legal. • Tinho: A lógica da pichação é diferente a do grafite. Não se tem muita escolha: na pichação se espalha o nome; quanto mais movimento há a rua, Hip Hop Produção de Conhecimento

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Dança - Márcio Greyk e Lakka

• Thiago: Para a rodada da discussão com a dança no Hip Hop, proponho um diálogo sobre pesquisa e trabalho cênico, como convergem e divergem na prática da feitura coreográfica. Por isso, trago Márcio Greyk e Vanilton Laka dois excelentes profissionais de origens e propósitos diferenciados com a materialidade coreográfica das street dances, embora saibamos da existência de outros na cena da dança no hip hop. Como se configura a prática de vocês em dança com relação às danças urbanas e outras danças, e em que momentos se percebem profissionais da área, ou seja, a trajetória entre começar a dançar e passar a conferir materialidade profissional?

Começo a dançar aos 12 anos de idade, em Uberlândia, quando a passo a residir em outro bairro da cidade, um lugar que se privilegia a dança, e, no período, havia muitos bailes em clubes. Esse é o momento de minha adolescência; importante para a definição como pessoa. Começo a dançar em festas e nas praças; aliás, as pessoas dançavam muito. Havia muitos grupos de dança de rua que também se nomeava como jazz de rua porque se utilizava da hibridação de movimentos de outras danças e porque essa nomenclatura foi definida pelos estudiosos da dança que freqüentavam a cidade naquele momento. É curioso observar um número grande pessoas a dançar, e os grupos também passam a fazer uso das quadras de esportes. Nesse período, há, também, a efervescência do Festival de Dança de Uberlândia; mas como prevê competição precisa se inserir nas modalidades ofertadas à concorrência. Não havia a modalidade de dança de rua; não é uma diferença só conceitual, mas é uma diferença prática. Como o festival de dança catalisa e ocupa um lugar importante no

• Lakka: Tenho formação inicial no Hip Hop, mas tenho um trânsito em outras danças, e sempre quando volto é uma felicidade conseguir discutir esse universo que se “modifica o tempo todo”.

período, o pessoal de dança de rua passa a concorrer na modalidade da dança jazz, e na década de 90, tentavam mesclar para poder participar. Como o jazz era um movimento muito forte aca-

Márcio Greyk. Diretor e dançarino do grupo paulista Zumb.boys, e arte educador no Núcleo Luz. Vanilton Lakka. Dançarino e coreógrafo mineiro, graduado em Ciências Sociais, é professor do Curso de Dança da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

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ba por se mesclar face a essa questão institucional. O festival escolhe o grupo e aprovado passa a abrigar mais pessoas. Se formos levar a discussão para a fonte de financiamento, é preciso lembrar que o modelo de financiamento determina muito as escolhas que as pessoas fazem: em solo ou em grupo. No período, o grupo Dança de Rua (Santos/ SP) passa a se tornar hegemônico nos festivais amadores de dança e nos programas de televisão com um mix de balé e jazz, e quem carrega esse tipo de informação ganha os festivais. Havia um entendimento de que a dança de rua não tinha técnica de dança. Hoje, isso está findo; mas ter vivenciado esse momento me fez transferir para outras danças, que se mesclam em minha trajetória. Após o contato com outras danças não queria mais criar coreografias da dança de rua vigente naquele momento, e também não estava interessado no balé. Estamos em 1996 quando começo a estudar sobre dança contemporânea. A ideia não era fazer um trabalho de dança contemporânea com dança de rua, mas também não queríamos abandonar as informações que estavam no corpo, como dança contemporânea entendemos que podíamos fazer uso de nossa biografia, e daí passamos a se voltar para temas coreográficos acrobáticos. Criamos o Werther Pesquisa de Dança até 2002, um grupo composto apenas por homens; viemos em 1998 para o Masculino da Dança aqui no Centro Cultural São Paulo. Em 2003, passo a atuar em solo com Dúbio que é uma síntese da informação de dança que tinha até aquele período. Havia praticado balé e muito de release; também apresento em O Masculino na Dança. Retorno a São Paulo em 2004 com outro solo nos Solos, Duos e Trios; aliás, o corpo é a medida da dança. Em seguida, crio um trio aprovado no Rumos Itaú Dança; a partir daí estou no universo da dança contemporânea com uma média anual de 60 apresentações, mas sempre com a presença da informação da dança urbana. As discussões que aparecem em meu trabalho são questões como técnica de movimento; não discuto a violência; alguns usam o conteúdo social do Hip Hop; uso o conteúdo de movimento. Durante o período, fiz graduação em ciências sociais e, em seguida, pós em artes, atuei na Universidade Federal de Viçosa e, agora, estou na UFBA, e estou estudando como é juntar esse universo

com a universidade. • Márcio: Vim do Ceará e moro na Zona Leste. Dirijo e atuo no Zumb.boys. Sou arte educador no Núcleo Luz... trabalho lá a uns oito anos... abarca quase 100 adolescentes... muitas pessoas que já fizeram aula, já discutiram... geralmente prefiro estar atrás, meio escondidinho... mas acho legal estar compartilhando, estar fazendo um trabalho em arte é um erro que está dando certo... foram as oportunidades que foram aparecendo... Em meu corpo está uma trajetória não somente do break, mas também da capoeira angola, que começo a praticar aos 12 anos de idade, e a estudar música. Nela, é rotina a prática dos apoios no chão. Aproximei-me do hip hop quando em uma oficina um amigo propôs uma batalha na aula de capoeira e eu respondi com o “rabo de arraia”; acho que ele ganhou a batalha. Isso fez com que me aproximasse desse mundo com o Bruno Bacck Spin, em 2002. Em 2003, o coreógrafo e professor Ivaldo Bertazzo procurava jovens para ensinar a jovens na tentativa de conferir autonomia na condução do conhecimento de práticas corporais. Ele esteve na ONG em que praticava capoeira de angola. Fui aceito na audição como educador e imaginava ensina algumas coisas de bboy ou música, mas aí começo a entender reeducação de movimento, ocupação do espaço. Nesse percurso, ensino no Vocacional e na Fábrica de Cultura. Em quatro anos, aprendi a técnica de reeducação do movimento e, também dança indiana. Mas o que me fez ali ficar são os 300 reais que recebia pelo trabalho. Imaginava mais instigante estar no Master Crew porque o garoto que ali estava não queria estar; de qualquer modo faço minhas associações: enxergava o esqueleto, como se tratava composição e iluminação. Em seguida, atuo com o Omstrab na cena de dança contemporânea independente, e isso me ajuda a entender como funcionam os editais e as questões de políticas públicas como o Fomento; são duas experiências, com o Ivaldo Bertazzo e Omstrab, que me fomentam ideias e levantam dúvidas. Ajuda-me a enxergar em qual lugar quero estar com a dança break tanto nas questões artísticas quanto as das políticas públicas.

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• Thiago: Como vocês se entendem no lugar de um profissional da dança - o da pesquisa cênica, o de estar no palco ou na pesquisa pedagógica, na direção do coletivo ou no da academia? • Lakka: Em meu histórico, perpassa o traço da pressão à profissionalização que em certa medida tem consequências ruins como o conflito da escolha. A profissionalização requer outro modo de gerir sua vida. Presenciei amigos terem filhos muito jovens. Vejam: muitos poderiam atuarem de forma mais madura. São muitos os que interrompem e não conseguem se manter na área. Quando passo atuar na dança contemporânea percebo que ampliei minhas chances de remuneração, pois as possibilidades de financiamento na Dança Contemporânea estão mais claras. Mas isso passa pela capacidade que você tem de viver do que faz, e isso está implicado diretamente na capacidade de gestão da sua carreira. Na medida que minha carreira toma proporção consegui aprovar projetos em editais da Petrobrás e do Rumos Itaú, mas nunca fui aprovado no Klauss Vianna, ou seja, é necessário ter uma organização administrativa para conseguir enviar e executar projetos. Acredito que circulação é um mecanismo poderoso porque cria rede de contatos e uma cadeia produtiva. Construí minha carreira morando em Minas Gerais. Para isso, fiz parceria dancei bastante na América Latina e na Europa; a saída é fazer uso das redes sociais que estabeleceram uma rede de espaço. Há alguns anos seria impossível. Por isso, temos que estar muito atento a esses mecanismos, mas conseguir viver do seu trabalho implica no feeling da negociação ou alguém tomar essa dimensão administrativa. O importante é estar consciente de todas as parcelas da cadeia produtiva; entender essa cadeia produtiva como um todo... • Márcio: Tomar conhecimento dessa produção é esse o ponto que me faz dar continuidade ao trabalho em companhia de dança contemporânea. Mas a informação não circula de maneira igualitária; atinge mais uma pessoa do que outra. Estamos aqui em um evento que fala de produção de conhecimento ainda assim não estamos com o teatro lotado, ainda assim com a utilização das ferramentas do Facebook. Entendo que 46

ser profissional é estar alinhado com aquilo que estuda, o tempo que se dedica e proporcionar que essa informação circule. Quanto mais pessoas souberem melhora a cadeia de informação. Estamos aqui evento que trata do Hip Hop, mas não fazemos uso do Proac Hip Hop, por exemplo; premiam10 projetos de 40.000,00 com qualquer assunto relacionado ao Hip Hop, dança, vídeo, grafite, vídeo que fala de dança, MCs. Precisamos discutir e aprender, e tenho tentado entender; aprender com as pessoas, na internet: avisa seu brother! Troque a informação; acho que é assim que nos tornamos profissionais. • Thiago: Com a experiência que vocês carregam, como podem definir a pesquisa cênica; no caso do Márcio do Zumb.boys como funciona essa pesquisa que adentra a cena, e no caso do Lakka, como considera essas informações que vem para o corpo, como funciona essa configuração, inclusive nos âmbitos do ensino informal e formal, o da dança na universidade? • Lakka: A palavra pesquisa tem ganho uma dimensão forte e é preciso entender como isso aconteceu. Precisamos avaliar o momento político: o projeto REUNI do governo Lula criou condições para a expansão do numero de graduações de dança na universidade, e a comunidade que em geral está relacionada a dança na universidade é à da dança contemporânea, pois foi essa comunidade que trabalhou para a expansão da dança na universidade através de confrontos políticos e criando os currículos, em decorrência desse processo histórico as demais matrizes como Hip Hop e outras ainda tem pouca inserção e é preciso alterar essa realidade. Mas, assim mesmo, a dança continua como a prima pobre das artes na universidade; e percebam que as artes tentam seu reconhecimento na universidade a partir dos parâmetros das ciências naturais, e por isso se desenvolve uma idéia de pesquisa em artes que guarda muito dos parâmetros dos requisitados pelas Ciências Naturais. Essa ideia de “pesquisa” está também presente no mercado da dança. Por isso, “pesquisa em dança” se transforma em sinônimo de “coisa boa”, os coreógrafos reconhecem no uso da palavra “pesquisa” um mecanismo que vai colocar você “bem na fita”. É importante estar atento à

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essa atualização dos conceitos, assim como seu uso, e no ambiente da dança no Brasil o termo pesquisa muitas vezes tem sido usado apenas como uma palavra de efeito capaz de te inserir em um mercado. O problema da arte na universidade são os seus parâmetros de “pesquisa continuada”: a ideia é que continue uma linha de raciocínio, mas nas artes não é certo que isso vai acontecer porque pode existir descontinuidade, e, às vezes, a universidade não dá conta desse jeito descontinuo de trabalhar; acho mesmo que mais marcante no processo de feitura das artes é a descontinuidade do processo e a universidade pede uma coisa formatada e continuada. • Márcio: Começamos participando de campeonatos, e somente depois nos voltamos ao espaço cênico, a partir de 2007, para trazer algo para compartilhar. O elenco do Zumb.boys é da zona leste: a pesquisa começa ali na construção desse corpo, joga bola, empina pipa, corre; eu morava na vila Santa Inês, um espaço que é um caldeirão, construída cheia de becos, confeccionada nessa estrutura. O corpo recebe informações de seu entorno e faz delas material de construção de dança. Sabemos o que desenvolvemos corporalmente, mas precisamos afinar a argumentação do discurso; isso é difícil porque temos poucas

referencias. Temos quatro trabalhos. Beco e Correios – trabalho de intervenção urbana, a pessoa escolhe a carta o trabalho trabalha com a entrega da frase, da dança, de um abraço... a entrega de um instante. A técnica que desenvolve como base que é o break e o bboy associado a outros assuntos, e por isso o corpo se transforma; o break se transforma: kung fu, frevo, maracatu, salsa; uma dança feita por muitas pessoas, e, também, é um jeito de investigação e pesquisa. • Lakka: A ideia de pesquisa na nossa fala passa pela ideia de que tipo de material levar para o teatro, como o power move. Em conversa com o Back Spin ele reclama de que todo mundo em São Paulo queria fazer power move; entenda que ele pega uma geração que construíram muitas maneiras de ensinar... não só descobriram o jeito de fazer, mas o jeito de ensinar a fazer o flare por exemplo . A informação serve para o Márcio, mas não serve para o Negraxa porque precisa encontrar outra informação, e tudo isso é pesquisa. Muito do que fazemos é informação e é pesquisa; na universidade recebe em um tipo de formato, no Itaú é outro tipo; mas o conhecimento é construído a todo momento. Na universidade, às vezes o que não entendem é que é a pesquisa, é a própria cultura essas as informações que são reorganizadas no

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corpo o tempo inteiro; produzimos conhecimento a todo tempo • Thiago: Existem diversas frentes na profissionalização nessa trajetória em relação aos diferentes tipos de mercado na produção de conhecimento na cultura Hip Hop. Vocês se consideram exceção? Vocês acham que não fazem parte de uma maioria? • Márcio: Eu não me vejo exceção...

− Ao nosso amigo Márcio... a gente trouxe a questão da palavra pesquisa, e acho interessante que ela exista, a execução sempre existiu, nas danças urbanas primeiro se movimenta/dança e depois pesquisa, muitos veem o videoclipe e copiam e surge muitas possibilidades, ser bailarino, como buscar informação, ser professor, os méritos da pessoa sem faculdade, a pessoa que fez essa concepção de dança e chegou naqueles movimentos que popularizou... a pessoa que foi pra faculdade e trouxe pra dança urbana outro modo de produzir a dança, qual é o mais importante?

• Thiago: Por que você acha que existe essa configuração? • Márcio: Acho que existe uma maioria que recebe uma mesma informação, os mesmos estímulos e constroem a trajetória em acordo; pode ser que as minhas informações sejam uma exceção. O Criolo (Rapper) diz: dê oportunidade para “galera da quebrada” para ver o que sai; é um momento bacana, e eu recebi uma oportunidade. Acho que se todo mundo tivesse oportunidade, as mesmas ferramentas, acho que a exceção seria diferente. • Lakka: Tive oportunidade de conhecer outros campos e, também, tive a curiosidade e sorte para procurar lugares interessantes e encontrar pessoas e eventos como aqui no Centro Cultural São Paulo. Em 2006, recebi o Prêmio Apca como melhor intérprete; até aquele ano a Apca premiava apenas bailarinos que tinham formação e dançava balé. Quando fui premiado os críticos queriam discutir essa realidade, ou seja, qual a formação possível na atualidade para formar um bailarino/ dançarino profissional? E foi essa discussão um dos responsáveis pela minha premiação. Claro tive competência, mas também tive sorte. Se por acaso eu tivesse freqüentado uma escola que conseguisse perceber essa minha vocação para a dança, eu teria aprendido mais coisas de matemática, física e biologia por exemplo, tudo ancorado nesse meu interesse pela dança, acho que a exceção passa também por criar oportunidades pra receber outras pessoas. Ou seja, é preciso criar condições reais de profissionalização da dança e romper com a idéia de exceção. • Thiago: Abramos para as perguntas.

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• Márcio: AAcho que não há nível de importância. Estamos a comentar sobre quais são as instituições que vão legitimar seu trabalho; têm instituições que legitimam: o indivíduo participou do festival e isso pode parecer que ele é o melhor, mas, de fato, não é. O que o ZumBoys faz é um jeito; existem outros jeitos de pesquisar, construir, e é importante que exista essa pluralidade. É importante: em 2010, ganhamos o PROAC. A galera tem interesse em usar espaço público; faz o dançarino varar muro de trem para o extremo no qual onde ele mora; ele tem desejo de mos-

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trar o trabalho, mas teatro está vazio. Talvez falte a construção de uma agenda maior do que ele quer assistir... e isso é diversidade... ampliar essa possibilidade de escolha bloco original dança de rua... a gente não estava falando se era melhor ou pior, mas criava bloco que circulava por vários lugares. Palestra, o ZB, e jam... circulava o bloco numa agenda... acho complicado dizer melhor e pior, mas tem lugares que legitima... mas eu digo que não tem melhor nem pior...

− Sou o Jonatam... bboy e sou arte educador... minha pergunta é nesse campo. Pesquisa pedagógica dos conteúdos e a formação desse currículo, pra poder ensinar... precisa ensinar algo... o que acontece, como acontece, como é passado... como ir além da técnica, de arte, cultura, sociedade, política... a gente é excluído socialmente e sinto necessidade de passar isso pra uma próxima geração... o preconceito com arte periférica... se vocês já produzem esse tipo de conhecimento e como...

• Lakka: Não há melhor nem pior.

• Thiago: Quero dizer que existe um valor; por exemplo: um recebe um incentivo e o outro não; uma comissão entendeu que esse merecia e o outro não. E se cria um valor sobre isso, mas esse valor que se coloca sobre um prêmio que se recebe faz com que esse lugar apareça. É como se as pessoas diminuíssem para caber em algum lugar. Parece que precisa diminuir tudo para caber num edital. O caminho é a discussão para que se possa fortalecer o trabalho um do outro, para, também, às vezes, poder entender a reformular o mercado.

• Lakka: Na UFBA, o currículo tem uma proposta que não é disciplinar, dessa forma não há disciplinas como dança clássica de salão ou afro; tem o núcleo de Estudos do Corpo com conteúdos de informação de dança seja qual for de acordo com o conhecimento do professor; tem um outro bloco que são os Estudos Críticos Analíticos responsáveis pela formação conceitual e um terceiro bloco denominado de Estudo de Processos Criativos. A graduação em dança é em dança, não em dança A B ou C. Tenho alunos que vem da dança do ventre, dança de salão, da biologia. A ideia é a experiência que cada um tem para se ter uma discussão mais geral; Gosto de lembrar que na década de 1990, o Cref (Conselho de Educação Física) queria regular a dança, e se isso tivesse acontecido, se a lei tivesse sido aprovada com a leitura que Cref propunha, não interessa com quem você treinou ou estudou, todos envolvidos em dança teria que fazer graduação em Educação Física e pagar o Cref. Nesse momento houve um movimento do pessoal da dança pra que isso não acontecesse, e os profissionais que estavam nos cursos de graduação em dança nas universidades foram estratégicos para impedir o avanço da Educação Física representados pelo Cref. Nas graduações em dança há o entendimento que a produção de conhecimento e formação em dança não se dá apenas na universidade. O professor tem que usar a experiência que tem pra falar de dança a sociedade, essa experiência é bem vinda nas escolas, e a experiência em danças urbanas hoje em dia é muito bem-vindo. Professores de dança, mas também de disciplinas como sociais como História ou biológicas e exatas, percebem que a informação de cultura Hip Hop é um bom mecanismo pra acessar o jovem

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hoje em dia. A graduação em dança não te impede de dar aula de Hip Hop em projeto social em grupos e lugares similares, mas quando pensamos na possibilidade de dar aula em escolas formais como parte do currículo, só a formação em danças urbanas não é o suficiente, e aí é preciso passar por outros processos educacionais, já que na escola você irá dar aula de dança e não de danças urbanas. • Márcio: Aula de dança da Beyoncé... quando falou A B ou C... onde dou aula no Núcleo Luz... a dança é um meio pra gente tratar de outros assuntos... tem aula de escuta... vem da linguagem do palhaço... da percepção do outro quanto ser, quanto indivíduo... as vezes não quer ouvir... traz outros assuntos, jogos... que tem oportunidade de tratar desses assuntos... é bastante coisa... Kiko Brown − − Estive na Espanha em 2003, tem uma coisa bem interessante que aqui não tem que é um ensaio geral de medicina esportiva pra qualquer modalidade... um módulo de 2, 3 meses... acho que isso mudaria bastante a prática... estudando entendendo na prática sem ter formação acadêmica... xxxx... a gente tem que traçar mea culpa... todos os campos de criação artística... abrir estrutura desse campo pro prático... traçar linha simples... cuidado na prevenção de lesão sem ter que fazer faculdade.... tem o Drt, mas muita gente sem Drt dá aula... tem que levar pra pesquisa, ou algo mais acessível que é arte educação nesse sentido... − tem que entender quanto tempo a gente existe, quanto tempo existe cultura Hip Hop... a gente fala do universo celular da dança... mas avaliando, é dança contemporânea. Meu histórico... ele vinha de 5 anos de ginástica olímpica, ia dar um trabalho no Sesc Itaquera... uma série de outras pessoas que tem estudo... fizemos aquecimento de ginástica olímpica... não tem meio formado, não tem gente que nos representa... acho normal ser recente... não acho normal ficar na cadeira e pensar essa coisa tá errada, vamos organizar... o nosso mal é a sociedade diz que a gente tem que sobreviver... pra que todas essas coisas aconteçam tem que sentar na mesa e abrir nosso próprio futura... quando falar em cultura 50

Hip Hop.. em danças urbanas... não existe ninguém que represente todo mundo... pessoas, fórum... pessoas de um grupo que ascendeu... vai se reunir... tá errado, tem que fazer desse jeito... tem coisa do ego... mas hoje estamos conversando bem... a gente tem que começar a estabelecer metas... não só o poder público, mas toda a sociedade... • Lakka: A cultura é muito mais rápida que a política. Na política criamos mecanismos/ formas/ modelos para mediar a relação entre as pessoas, por exemplo: um edital, um crachá ou uma proposta de currículo. Uma forma existe no modelo x porque quer mediar a relação entre as pessoas, mas as pessoas mudam seu jeito de se relacionar muito mais rápido do que os modelos... por exemplo, neste caso da Espanha, o país quer qualificar o cara com um modelo especifico que é diferente do adotado no Brasil, pode ser mais interessante, mas é preciso discutir com a sociedade, chegar a um modelo mais adequado ao Brasil, mas de qualquer forma a cultura é sempre mais rápido que qualquer modelo, a cultura é mais dinâmica que a política. • Thiago: Encerramos uma etapa da discussão: políticas públicas, academia, experiências estéticas. Teremos outra sobre produção de eventos. Agradeço a presença de todos.

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Produção de Eventos - André Luis K.(Jaspion), Bispo Street Breakers, Kiko Brown e Warley Alves • Warley: Vejo-me como produtor cultural há 13 anos. Começo distante dos elementos do Hip Hop com as danças brasileiras, e isso me ajuda a ser um paulista diferente, e São Paulo é complicado com o nordestino. Depois vou para o circo e estudar clown, importante para minha construção pois o palhaço se coloca para ser ridicularizado, e sabemos quantas pessoas são ridicularizadas por suas escolhas. Quando conheci os bboys, que ensaiavam no mesmo espaço que ensinava clown, percebi o quanto é importante levar a cultura para periferia; levar teatro, balé, cinema porque algumas dessas coisas são distantes, e ao se velar as pessoas passam a sentirem próximas. Isso me encanta e é muito bonito. Aproximo-me do Hip Hop quando participo de um debate com o André, o Triunfo e o Bispo e Kiko do Master Crew. Havia demanda, mas não havia produção suficiente. Havia muitos dançarinos produzindo seus próprios encontros, mas a incapacidade de escrever um projeto, muitos dos encontros morreram. Lidar com projeto não é fácil, por isso fui estudar produção cultural, e o brasil, por incrível que pareça é mais fácil produzir do que nos EUA. Quando organizo a batalha na vila, que acontece na Vila Rubi, havia visto muitos eventos e as coisas que não funcionavam. Consegui estabelecer uma diretriz, mas, depois de quatro edições, percebi que não queria mais produzir novamente, isso desde 2013. Precisamos nos reeducarmos para valorizar o que é do outro; naquele momento vingava o funk. Hip Hop não é cultura de nicho e não é somente para quem pratica. Há temas para toda a sociedade. Os político e empresários não tem essa compreensão. A mudança de 2013 para cá é bem gritante. No ano passado, assinei um manifesto onde garantia minha palavra onde somente havia mulheres presentes. Devemos temo que devemos alterar uma cena machista; coincidentemente hoje temos duas efemérides de dois civis americanos importantes: a Nina Simone faria aniversário e o Malcom X morria. Para finalizar: meu histórico passa por colocar situações de determinados agentes públicos. Encontro vulnerabilidade nessa periferia; o Nordeste é a periferia do brasil. Temos muita responsabilidade com esses lugares e muito a construir. 54

• Jaspion: Sou membro do True Scholl Crew e Fanáticos Brasil. O primeiro evento se chama Batalha no Topo que começa a ser produzido em 2006. Depois aparecem o Blockout e o Hip Hop Park Jam. • Bispo: Street Breakers Crew; primeiro evento que vem à mente cabeça é Street Breakers. A ideologia faz outras coisas acontecerem: essa necessidade de realizar a próxima etapa. Para Street Breakers, a primeira estratégia foi a de existir unida à vontade de realizar o que ainda não existe. Hoje, não há a preocupação com a informação e evolução de conhecimento. Surge como necessidade de realizar algo especial para nós quando duas pessoas com auxílio da crew, em Maringá no Paraná realizamos um Fanzine, porém, faltava um ponto de encontro: o Master Crews, desde 2002, não é um campeonato, mas um encontro anual de Hip Hop obviamente não com tudo como queríamos. Hoje está melhor formatado. • Kiko: Boa tarde. Sou mais conhecido como Kiko Brown. Tenho formação em Educação Física. Danço desde sempre, e começo com break e popping. Na adolescência, transferi-me para Campinas, uma cidade grande, mas que no período não havia eventos na área. Passei a estudar e entender o ambiente, e por isso, em 1999, cria-se o Campinas Street Dance Festival. Não existia eventos específicos de dança de rua. Os dançarinos participavam de eventos de danças gerais. Curiosamente é o mesmo ano em que é criado a batalha final do Rony. Ao criar, também participo dos primeiros grupos de dança de lá; criamos o grupo com nome aberto para poder viajar nos processos de criação, como o Wanted Posse, uma coisa que ainda não existe na América do sul, e o Culture Shock, grupos em vários lugares dos EUA. Usamos como norte para trabalhar nossa capacitação, nossos sentidos, e pensar como adulto nossa profissão. A partir do festival, são criados diversos grupos e surgem diversos dançarinos, mas a situação financeira sempre difícil. O desafio é o de como fazer um caminho para os dançarinos poderem ser respeitados e conseguir pagar suas contas para que tenham respeito de seus pais. Como você dizer que sobrevive da dança se não consegue pagar suas contas. Face a isso, partimos para a criação de eventos e da companhia Eclipse, e da patente que vem da Europa Battle of the Year.

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• Thiago: Quais ações vocês desenvolvem na produção de eventos? Como se dão as etapas e quais são as questões? • Bispo: Sempre é uma questão histórica para se chegar a esse ponto. Eu sou um empresário. Eu tenho um CNPJ: a pessoa precisa de uma produção, mas não contrata somente o artista. Antes fazia uso de CNPJ de outra pessoa. É o modelo do que a sociedade diz que devemos ser. A cultura Hip Hop tem ideologia, mas não se sobrevive de ideologia. Dá para sobreviver de cultura, como o exemplo do Lollapalooza. Não se enriquece somente com o Hip Hop: o grafiteiro atua também como designer. No afâ de fazer, a nossa crew street breakers, acabamos por realizar produções e ir descobrindo como fazer, por isso realizamos o evento com isso aprendemos e depois também precisamos ganhar dinheiro, Anteriormente, apenas queria realizar bem feito. O Master Crew tem como meta sempre realizar uma edição ao ano, mas tem que captar dinheiro senão não se consegue realizar direito. Tem um compromisso. O que acertou tem que cumprir. O Master Crew já deu prejuízo, tive que tirar do bolso. A gente foi evoluindo. Existe uma oficina no Cedeca (Ong na zona leste paulistana), na qual se trabalha produção cultural voltada à formação de novos produtores. Aprende coisas que aprendi na “raça”. • Jaspion: O Bispo disse sobre a questão da produção e do CNPJ. Sou de Franca e lá trabalhamos como pessoa física. Citei três eventos principais (Block Out, Hip Hop Park Jam e Batalha no Topo), mas realizava ações pontuais. Alguns poucos devem se lembrar porque não havia internet. Divulgava-se o encontro com flyer enviado por carta. Começamos por aí: com eventos pequenos e flyers enviados pelo correio no início dos anos 2000; a referência é a Batalha Final do Rony, e, logo em seguida, o Master Crew no que deveria ser um evento de Hip Hop ou de break; o som se transmitia ao se dar o play no aparelho de CD comum. O meu grupo que é um grupo de pessoas mais velhas, e temos grande interesse pela pesquisa. Chegamos uns 10 anos depois da Back Spin, mas nos organizamos gente sem internet com e com mais limitações porque estamos no interior do estado. A Batalha no Topo se inicia como uma batalha de break, e fomos aos poucos

passamos a ter a noção de que é o trabalho podia ser maior ao que imaginávamos. Para nós, o Hip Hop é o break. Criamos um evento somente de break que passa a envolver os MCs, o grafite e os DJs. Passamos, também, a traduzir a gente começa a traduzir uma série de textos principalmente sobre as danças: o funk style, Michal Jackson, breaking, popping e locking. No período, são tratados do mesmo jeito. Havia bastante difusão de conhecimento errôneo. Tentamos empreender o caminho inverso ao tentar corrigir o monte de baboseira que se observava. O Block Out é um evento focado em conhecimento, baseado nessa pesquisa que víamos realizando. Comumente, o bboy se inicia aos 15 e 16 anos e chega até aos 20 anos quando interrompe o percurso. A falha de gerações antigas é a deixar para trás informações que são importantes para se construir uma história. Produzimos os eventos com o foco em trazer os dançarinos que são “lendas” para tentar entender o desenvolvimento da dança e da cultura como um todo. O Block Out carrega firme nos quatro elementos – dança, Mc, Grafite e Dj - e os trata de modo bem distribuído para se entender que o Hip Hop é um aglomerado de iniciativas. O Hip Hop estava na competição, mas não estava na periferia, não estava na rua. Começamos a realizar o evento na rua, com diversos elementos à vista do público do bairro, especialmente para a molecada para desenvolver novas gerações; os de 40 anos dançavam soul, break, James Brown. • Warley: Não existe uma técnica, o fundamento, mas alguns pontos me pegaram. Basicamente na minha história saí da posição de artista para a da produção. Imaginava ser necessário a mudança. Quando estava em produção havia poucas oportunidades. Dedico-me minha vida para produzir para as pessoas. Deixar de fazer a Batalha na Vila, nesse sentido fui conhecer sobre construção de ferramentas de produção, participei da construção do Catarse, esse método vai ser o grande método do sec. XXI. A pessoa banca o que se identifica, nada mais justo que isso. Tenho participado dos debates de cinema, quando as pessoas que financiam isso (cidadãos contribuintes) não vêem o filme porque em suas cidades não tem sala de cinema, criação de condições, tem lobby sobre tudo de cultura do nosso país.

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O caminho no Brasil que eu acredito, além da batalha na vila, dois caminhos que visualizo são os incentivos quando as plataformas de financiamento coletivo e precisa estudar pra fazer isso, Rock in Rio x produtores pra captar, Lei rouante só 30 por cento consegue captar, sendo que 20 estão no sudeste, estou no momento em Brasília pra transformar a lei rouanet em pro-cultura, posso falar sobre isso depois. • Kiko: A ideia de produção no Campinas Street Dance Festival décimaé a de se adaptar ao espaço seja universidade, casa de eventos. Estamos na 14ª. Edição, e se passou por uma metamorfose. Anualmente, no mês de janeiro, tem encontro para se pensar o que fazer para desenvolvermos formulas e receitas. A edição internacional custa em média três milhões de euros. Cometemos uma falha quando generalizamos as danças urbanas do trabalho social com eventos. Temos o trabalho social durante o ano e tem o evento competitivo que leva, com tudo pago, oito dançarinos para a Europa. Neste ano, ainda não sabemos se acontecerá porque o dólar está a R$ 4,00. Tanto na Europa como nos EUA usam isso como uma escola pois o dançarino se capacitará e se criará mercados diferentes. Não temos isso no Brasil. Não existem trabalhos nas vertentes de danças urbanas. Muitos artistas das danças urbanas dançam em shows com Cláudia Leite, Ivete, até de sertanejos. ... mais um feixe pra gente participar e atuar... exige educação, respeito, disciplina... é outra exigência... saber o que você identifica... o que é a cara do seu grupo... quem produz tem que saber porquê faz... saber esse respeito mais acentuado... você não vai responder tal crítica? O Emicida fala muito isso... eu vou dar explicação das minhas coisas por quê? Não pagam minhas contas... a pior coisa de um evento é o cara chegar e falar... então... posso depositar depois... às vezes no edital... vou te dar só tal parte... os dançarinos sabem cobrar essa parte... • Thiago: Têm algumas falas que não conseguiram se completar. Precisamos direcionar a fala, por isso penso no que seria um refinamento no modo de produzir evento, naquilo que pode se realizar melhor.

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• Bispo: Produtores diferentes, eventos diferentes. Thomas Hergenröther (Fundador do Battle of the Year (BOTY) não está aqui; não gosto do formato do “Boty” porque considero confuso, e por isso faço o Master; não preciso brigar, porque alcanço até onde o meu braço possibilita. O Master trabalha com bilheteria e com a Lei Rouanet. Não o considero um símbolo de sucesso. É um símbolo de como somos pequenos. Quando vou fazer uma competição pego um papel e anoto: quantos competidores? Local? Quais espaços existem? somente o CEU ?; vocês reparam que somos relegados ao CEU, e eles não nos pagam. Precisa de recurso financeiro para acontecer porque o som não sai do teatro. A partir daí se estuda as formas de captação do recurso. A bilheteria não consegue financiar o evento. Formamos público! Mas é perigoso manter apenas a competição porque se constrói o que as pessoas irão consumir. É importante que se planeje em detalhes porque o orçamento pode se tornar mais complexo. Existe um cadastro para se capacitar como o PROAC, mas pergunte quem se inscreveu, como que se faz a inscrição? As pessoas não sabem. Precisamos de detalhamento para que nossos eventos cresçam. Não é para fazer críticas. Precisa-se saber o que se realiza e quem são as pessoas.... o Alam Beat do Sampa Crew,..... esse é o Bispo.... ele é um grande captador (dizem)..... Não sou um grande captador porque se fosse meus eventos estariam em outro nível. Os eventos são realizados junto à iniciativa privada do modo que pedem e definem como cultura urbana. A ideia é fazer uso da legislação, trabalhar com as pessoas com 100% de confiança. O momento é trabalhar no coletivo porque R$ 40.000 não paga um evento grande. Precisamos realizar o evento no CEU. Tem “pancadão” da prefeitura com orçamento de dois milhões. É necessário ficarmos mais antenado e buscar atuar de forma coletiva. Hoje se consegue mais recurso na iniciativa privada do que no poder público para o Master Crew. Imaginem os outros! • Thiago: E a questão sobre o refinamento da produção? • Jaspion: Todo produtor cria o formato no qual acredita, e, nessa “toada” de correr pelo que acredita, vejo alguns formatos como mais fáceis de se

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produzir como festival competitivo É mais tranquilo porque infelizmente ou felizmente a maior parte das pessoas gosta de competir. o povo tem um predisposição maior de se dirigir...ir pra Alemanha... as competições que a gente faz difere um pouco disso... a questão do recurso também é uma questão que se enfrenta... às vezes até um administrador vai conseguir... mas precisa saber dos requisitos... na eliminatória Red Bull os caras tinham um chão muito ruim pra dançar... • Jaspion: Ele é profissional, vai produzir, mas esquece da necessidade do público que vai comparecer ao evento... que é o bboy... o chão e a música são as coisas mais importantes pro cara dançar... claro, tem toda a estrutura pra fornecer isso... o nó é o dinheiro. Se você tem, você consegue arrumar pro cara... esse lance de conseguir o dinheiro... acho que muitos de nós já tivemos esse prejuízo e pôr do bolso... ou o cara faz em forma de edital... ou faz captação... ele aprova e você vai mendigar... e a terceira é a iniciativa privada... nós atuamos na primeira e na segunda... pra não cobrar... a gente nunca conseguiu captação... faz edital... e quando não consegue faz com o dinheiro do bolso... e a patroa fica brava em casa... cada evento você ter uma equipe capacitada... todos produtores... auxiliam o que tem que ser feito... você ter essa equipe com você... pra te amparar, é um alívio muito grande... quinze meses resolvendo milhares de coisas... eventos pequenos... o cara chega no fim... fica doente... paga em pizza... nesses pontos técnicos vai da necessidade de cada modalidade... tem outros elementos. Se pega um evento de grafite... você produzir um evento de Hip Hop são problemas em 4 frentes... tinta, som, chão, microfone... e um par de techniques... acho que é isso aí... viajei... • Warley: Pra mim, refinar é tanto aprender... em SP a gente batalha alguns editais pra que profissionais vão nas regiões dar curso... o refinamento pra mim passa por isso, mas também entender quais as condições eu tenho que criar para o público do meu evento. Quando você busca, se você não quer ter responsabilidade social, você não deve pegar incentivo público... e eu vou ser o primeiro a cobrar na sua porta... tem outros mecanismos pra isso... é ter consciência de que você tem que devolver para o maior número de pesso-

as pra isso... cobrar pra inscrição... até cinema... tem que voltar gratuitamente para o público. Ele já pagou. Não adianta colocar evento no centro sabendo que seu público é periférico... por isso estou neste embate com a lei rouanet... é criada a muito mais de 10 anos e tem falha... sabemos que esses mecanismos... sabemos que vão contribuindo pra quilo... tem que ser mais democrática... é ridículo centralizar as captações em SP e no RJ... sabe que quem consegue captar é quem faz lobby e trás Cirque du Soleil... transformar em pro-cultura como fundo, que destina para os que mais precisam... talvez o melhor projeto consiga se sustentar... talvez eu teria mais chance com a lei rouanet do que com o pro-cultura, mas tem que democratizar... Da mesma forma que bboy chama outro pra perguntar de dança, pode chamar a gente pra conversar de produção... tem que trabalhar no sentido do coletivo. Concordo com o Bispo. Tem que dar mais atenção nas coisas que nos colocam no mesmo caminho. Estamos num momento de conquista... do nosso povo, da cultura Hip Hop... tem que se unir... quer comida, mas quer lazer e cultura... buscar as ferramentas pra produzir... se não gosta do evento, produza algo que vá na sua linha de pensamento. Quem produz culturalmente, só 10 por cento participa do debate onde estão sendo criados os mecanismos de produção. • Jaspion: Esses projetos financiados com dinheiro publico... R$40.000 não produz os custo totais... ai você vê a lista dos aprovados pra acompanhar... as vezes é na sua cidade. Já aconteceu e ninguém viu... às vezes, faz um evento pra 15 pessoas... • Bispo: Vi um que era o ensaio do grupo...e aprovou... • Jaspion: Esse foi um dos motivos, em Ribeirao... uma coisa que na minha linha de evolução não tinha nada a ver com Hip Hop e aí começamos a fazer o Blockout... o poder público não acompanha.... se o dinheiro público está sendo direcionado pra população... • Bispo: Quando é feito captação de recurso, cada uma funciona de um jeito. Lei rouanet é recurso oriundo de imposto. Ele fala, o governo, exis-

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te um valor, as empresas vão dizer esse projeto é legal, o dinheiro do meu imposto vai pra ele... aí vc faz um projeto, inscreve no rouanet e aprova... todo mundo contente... aprovou mas não captou... posso escrever até um milhão... tô rico... mas tem que captar... tem que ir até a empresa... mas quem a empresa vai achar mais bonitinho pra colocar o dinheiro dela... o Master Crew ou da Xuxa, da Ivete Sangalo... estou falando da amplitude democrática... pessoas famosas que já tem condição pra fazer isso... no rouanet não pode colocar a marca dela... o imposto é de todo mundo... aí o Bradesco criou a fundação Bradesco... que não é o Bradesco... e advinha quem vai financiar? Esse buraquinho faz com que seja muito difícil conseguir esse dinheiro... mas é muito diferente do Proac Hip Hop ( que não é o Icms)... o Proac é um prêmio, que você não fica entregando nota fiscal de tudo que fez... não tem quem fiscaliza... mas tem quem escolhe, e a gente chama de panela... outro segmento que é ponto de cultura, que é o ensaio deles... eles estão lá tocando... pro poder público tem atividade rolando... mas está ali... colocam uma etiquetinha... tem que entender esse mecanismo... melhorar esse mecanismo... se querem trabalhar com cultura, não dá pra ser só dançarino, cantor... vai ter que se virar pra aprender... • Kiko: Esse assunto é delicado. Já fui convidado pra avaliar alguns e usei isso como aprendizado. Primeiro, não querem apoiar trabalhos continuados... “não da pra bancar todo ano... vocês já são consolidados” . Na cabeça do governo, são eventos pontuais... e a parte do dinheiro... o Bispo citou que 40.000 não banca o evento... mas nosso amigo diz “se entrou dinheiro público, não pode ter cobrança”... mas entrou dinheiro que não cobre... tem que achar outra forma de fazer, cobra menos... vê no rodapé trocentos patrocínios... mas não é essa conta... meus amigos que estão ajudando no evento, nem que seja ajuda de custo... tem que ajudar... aí casou, a esposa trabalha de graça... temos que ter vários cuidados... tem custo pra tudo lado... tenho cia. de dança que já ganhou Klaus Vianna, participou da copa... mas tem que ter patrocÍnio direto. Sem lei de incentivo... nunca captei nada... se depender disso pra viver, sabe que para. Não dá pra depender de editais. Tem que conseguir essa subsistência... mas a 58

empresa não está acostumada a fazer patrocínio direto... Caso da Itália... no Brasil a gente não tem esse apelo... filmes chega pra alugar no telecine... na minha cidade campinas tem o mos, que faz show... o outro, que faz batalha... mesmo que vão todos os dançarinos, não paga... pra trazer gringo, tem que pagar alimentação hotel... se jogar 100 reais, não banca o evento... com dignidade... linha tênue e complicada, que a gente faz mais por amor do que por profissionalismo... • Warley: Tem uma problemática que é produzir pros amigos... que é essa intenção do Master... algo que a gente está caminhando pra isso... trazer um público que não seja desse segmento mas que assista àquele evento. Não acho que o Hip Hop é uma cultura de nicho. Uma grande roda de conhecimento, universidade contempla isso também... tem que entender que nossa cultura influencia o mundo inteiro e vê a potência disso... o “lamark” que fez performance no Grammy... não consigo separar o Hip Hop do social, de responsabilidade social para com o público... ficar chocado com a Beyoncé e a questão do racismo... ela é mulher negra... eu não produzo mais nada que não tenha responsabilidade social com o público que está indo assistir. A gente sabe que a mulher tem menos direito, que o negro tem menos direito. Tem que abordar esse tema... tem que educar o povo nesse sentido... somos empresários que tem que aprender a produzir. Tem o cara que viaja... tem que colocar o pé no chão e ver o que é possível com os recursos que a gente tem. • Thiago: Como a gente pode discutir de outra maneira essas mesmas questões... a dificuldade é uma premissa... quando tem mentes pra pensar outras possibilidades de encaminhamento, sobre as questões levantadas do projeto do poder público... tem que cobrar ele... é como se desse um passo além... nem todo mundo pode preencher as 10 vagas... como podemos criar outros mecanismos... construir no coletivo as capacidades que temos como classe... não vai caber todo mundo naquela vaga...talvez a gente tenha que construir junto... o que como coletivo pode ser isso... a Tássia falou da construção em rede... e quando o Emicida chega... todos os produtores sabe que é uma construção... (…)... parece que sou otimista iludido, mas quando vejo profissionais como vocês

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que insistem, a gente consegue vislumbrar uma nova situação... a gente vai se organizar? A remada é difícil... eu não consigo mensurar... a gente fala sobre a dança... mas parece que a dança tem uma construção menos como coletivo... tem muitas conexões com o que foi dito... se colocasse todos os elementos juntos no mesmo dia... não teriam tempo... mas tem muita conexão... que público a gente está buscando... • Warley: Dentro do Hip Hop tem a criminalização da vitória. Eu não tenho compromisso com a derrota. Não vou aceitar quem criminaliza o funk; pega o marido com outra mulher no sofá e culpa o sofá... • Thiago: fala do Dandan... e da relação com o dinheiro... nosso labor, o que nos move... ele falou, vai virar, vai virar... o cara vira.. aí não é mais da comunidade... • Warley: Compromisso atávico com inviável... ele nunca quer vencer... • Bispo: Pessimismo... resumindo... senão vocês não vão entender... já que estamos só nós... discurso só discurso é ruim... o Hip Hop tem ideologia sim... sai do discurso e vai pra prática... se a maioria das pessoas que falam vai ser mais do que beneficiado... tem que sair do discurso... e fazer as coisas acontecerem. • Kiko: Se é Hip Hop, é social e tem que ser tudo de graça; nosso maior cuidado. Quando tive que vender o carro para pagar o prêmio, saiu boato que tinha comprado um terreno. Se tivesse comprado tinha que ser mérito, mas aí é que explorou a gente mesmo... − É uma pena que esses debates caem na dificuldade... qual conhecimento que vocês visam criar no evento que produzem e como incentivam os participantes a participar... os bboys quanto mais ganham mais dançam... o encontro que vai fazer o conhecimento, a troca... a gente sabe que o modelo de show é só pra ir pra batalha... • Bispo: Só falar que é encontro não dá... tem que ter prática. A resposta mais fácil é falar dos debates, dos Workshops... lembra daquele papo..

a nossa dança é resultado do nosso corpo... engatinhar faz parte do nosso corpo... desconstruir como, você morreu?? adoro meus amigos contemporâneos... as pessoas que estão no Master Crew são do meu trabalho... contar a história do garoto mais novo... mas posso contar a história do Mister Fê, que tem que mudar pra Maringá, e cai no cultural, continua em contato pelas cartas... a gente vai evoluindo no lance de design... a gente faz o evento pra evoluir a revista... tem as oficinas todas gratuitas e o dinheiro vem do meu bolso... quero ver falar na minha cara que eu tiro dinheiro da cultura Hip Hop... eu coloco... cada um, as pessoas sejam multiplicadores... cansei de ouvir pessoas que não querem ouvir o que eu estou falando... vamos começar alcançar elas de vagarzinho... vamos manter o lugar limpo... e fala no microfone... e todo mundo joga... essas construções passam pelo meu corpo... as conversas, como é tratado na portaria... puxa, perdi meu óculos, onde? A gente manteve intercâmbio... ramificação que vai vir disso... do primeiro trabalho cultural... street breake pra mim é a melhor coisa que eu falo... e pra minha esposa é a Marininha... que vai dançar comigo... • Kiko: Começamos dando murro em ponta de faca. Hoje tem muito mais... tem muita coisa gratuita ou a baixo custo... dá pra entender antes... fazer o evento de acordo com a perna de cada um... pequenos comércios... antes a gente idealizava e depois não dependia de mais nada... para as novas gerações.. quero entender como monta desmonta... trabalhamos com voluntários pra passar por esse processo... a gente acha que é demérito... em outros países faz parte da cultura... tem que aprender a se doar, pra evoluir, pra produzir o evento do tamanho que quiser... aprendendo... pra quando se propor a fazer saber de toda a estrutura... • Jaspion: Todos os eventos produzem conhecimento... visa produzir conhecimento pro público do bairro... Dandan... ficou falando de assuntos diversos... faz na Park Jam... uma mesa... e o Blockout trabalha o conhecimento bem na educação do que é o Hip Hop e os seus elementos... o Hip Hop do Blockout é uma coisa... no x... é outra... traz as pessoas que criaram o Hip Hop... ele representa esse momento... como eu considero o

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Hip Hop uma cultura tradicional... a gente trabalha trazendo as pessoas do começo... quando começamos no Bronx era assim assim assado... aulas, workshops... a parte dança quase sempre é um negócio idiota, vazio... você quer aprender dançar lock... tem que fazer... não é uma hora com o Jonh Campbel... tem que ouvir as histórias... isso é o bacana na nossa produção de conhecimento... o Blockout são tem interessante pois vamos pegando mão de obra de todos os lados... monta aquele negócio pra mim... se chegar cedo... vai passando a entender o tanto de coisa que tem que ser feito... aprenderam ajudando a gente a fazer o nosso.Hop uma cultura tradicional... a gente trabalha trazendo as pessoas do começo... quando começamos no Bronx era assim assim assado... aulas, workshops... a parte dança quase sempre é um negócio idiota, vazio... você quer aprender dançar lock... tem que fazer... não é uma hora com o Jonh Campbel... tem que ouvir as histórias... isso é o bacana na nossa produção de conhecimento... o Blockout são tem interessante pois vamos pegando mão de obra de todos os lados... monta aquele negócio pra mim... se chegar cedo... vai passando a entender o tanto de coisa que tem que ser feito... aprenderam ajudando a gente a fazer o nosso. • Warley: Isso que fiz deixar de fazer o Batalha na Vila... a gente ensinou o jovem como chegar no CEU, fazer... o projeto chamava Protagonismo Juvenil da Vila Rubi... e aí virou só um evento de competição... e pensou qual é o nosso papel nas danças urbanas... eu produzo se tenho algo pra oferecer de legal... aí chegou em um outro modelo de projeto... completamente diferente... e a gente vai se adaptando... já produzi vários eventos grandes (exemplos)... agora está no processo de retomar a importância da Batalha na Vila... tenho visto que no Brasil tem um evento de trazer 30 coreógrafos onde cada um da uma aula e cada um paga 300 reais... isso não é... o youtube é mais interessante que pode voltar o video varias vezes... Estamos num processo de democratização... de transformação da rouanet em pro cultura... e pro município reconhecer os grandes mestres do Hip Hop de notório saber... se quiser procurem a gente.•

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Hip Hop Produção de conhecimento São Paulo - 18 a 21/02 de 2016

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