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A SOCIEDADE DE MERCADO Assim como a exata identificação do inimigo é essencial para o bom êxito da batalha, a compreensão adequada dos termos de uma pergunta é meio caminho andado na direção da resposta. Para abordar o tema proposto: a influência cristã numa sociedade de mercado, é importante formar um consenso mínimo de entendimento de termos como mercado, capitalismo e neoliberalismo. O mercado é um sistema complexo de troca de mercadorias e serviços, estruturado mediante a definição de preço e valor dos bens negociados, não apenas, mas principalmente à luz da lei da oferta e da procura. Cultura de mercado é o processo através do qual “tudo transforma-se em mercadoria: idéias, projetos, relações, objetos”, 1 e todas as relações passam a ser determinadas pelos critérios e valores da economia e satisfação de necessidades e desejos. Zigmunt Bauman denuncia nossa cultura, “que favorece o produto pronto para uso imediato, a satisfação instantânea, o prazer passageiro, resultados que não exijam esforços prolongados, receitas testadas, garantias de seguro total e devolução do dinheiro”.2 Isso ajuda a explicar porque muitas pessoas confundem a crítica ao capitalismo e ao neoliberalismo como crítica ao mercado, como se o mercado fosse intrinsecamente mau. O mercado é apenas um sistema de trocas, e existe antes mesmo do capitalismo neoliberal. O que devemos criticar não é o mercado em si, mas o que Jung Mo Sung chama de idolatria do mercado: a absolutização ou a sacralização das leis do mercado, que leva a justificar sacrifícios e 1- BETTO, Frei. Gosto de uva: escritos selecionados. Rio de Janeiro: Garamond, 2003. 2- BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004.
sofrimentos de vidas humanas em nome do mercado. 3 Existe uma diferença, portanto, entre o mercado em si, e a forma como o mercado se organiza quando segue a lógica do capitalismo neoliberal. O filósofo francês André Comte-Sponville, em sua interessante obra O capitalismo é moral?, afirma que “de um ponto de vista descritivo ou estrutural, o capitalismo é um sistema econômico baseado na propriedade privada dos meios de produção e de troca, na liberdade do mercado e no trabalho assalariado”, e também que “do ponto de vista funcional, o capitalismo é um sistema econômico que serve para produzir, com riqueza, mais riqueza”.4 O liberalismo é uma versão do capitalismo, ou uma forma de capitalismo, que se baseia em pelo menos cinco premissas: “[1] eliminação das intervenções do Estado na economia, [2] livre circulação de capitais, bens e serviços entre as nações, [3] a privatização das empresas e serviços públicos, [4] a supressão dos sindicatos e as organizações de trabalhadores em geral, [5] a desintegração de todas as formas de associação que sejam independentes das empresas”.5 Baseado no conceito de “mão invisível do mercado”, enunciado por Adam Smith em sua obra A Riqueza das Nações, 1776, a não intervenção do Estado na economia e no mercado é um dos mais caros princípios do capitalismo de corte neoliberal. Smith acreditava que o mercado livre é dotado de um sistema auto-organizativo, capaz de fazer convergir a soma dos esforços individuais motivados pela busca dos interesses particulares no maior benefício coletivo. Segundo Smith, o interesse comum é realizado no mercado capitalista quando todos os participantes do mercado se esquecem dele. Trata-se de uma “mão invisível” que transforma a orientação individual pelo próprio interesse numa orientação não intencional pelo interesse comum. Aparece, então, a imaginação de uma sociedade na qual cada um serve ao outro, e o faz tanto melhor quanto mais serve a si mesmo. A condição é que cada qual persiga seu interesse próprio no mercado capitalista, e não contra ele. É esta a mágica do mercado. 6
Analisando a lógica da “mão invisível do mercado”, e acompanhando o raciocínio de Hinkelammert, Jung Mo Sung apresenta a contradição interna da teoria de Smith: “A única forma de ser solidário é ser eficiente no mercado. A única forma de ser eficiente no mercado é ser competitivo. A única forma de ser solidário é ser competitivo”. 3- SUNG, Jung Mo. Hugo Assmann e a coragem de dizer a verdade. In http://www.adital.com. br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=3180 4- COMTE-SPONVILLE, André. O capitalismo é moral? São Paulo: Martins Fontes, 2005. 5- COMBLIN, José. Neoliberalismo: a ideologia dominante da virada do século. Petrópolis: Editora Vozes. 6- HINKELAMMERT, Franz. Pensar alternativas: capitalismo, socialismo e a possibilidade de, outro mundo. In: PIXLEY, Jorge. Por um mundo diferente: alternativas para o mercado global. Petrópolis: Editora Vozes, 2003.
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A tese de Smith se demonstrou falsa. Está claro que o mercado não é regulado por uma “mão invisível”, suficiente para promover a justa alocação de recursos e distribuição de riquezas ou promover o bem comum. A Real Academia Sueca de Ciências, por ocasião da outorga do Prêmio de Ciências Econômicas em 2007, afirmou que “a clássica metáfora de Adam Smith sobre a ‘mão invisível’ refere-se a como o mercado, sob condições ideais, garante uma alocação eficiente de recursos escassos. Mas, na prática, as condições normalmente não são ideais. Por exemplo, a competição não é completamente livre, os consumidores não são perfeitamente informados e a produção e o consumo desejáveis privadamente podem gerar custos e benefícios sociais”.7 Até mesmo George Soros afirmou que “desgraçadamente temos a idéia de fundamentalismo de livre mercado, que hoje é a ideologia dominante, e que pressupõe que os mercados se corrigem; e isso é falso porque geralmente é a intervenção das autoridades que salvam os mercados quando eles se atrapalham”.8
LUCROS E SACRIFÍCIOS A teoria capitalista elaborada por Smith nos coloca diante de um falso deus, a saber, o mercado e sua “mão invisível”. Um deus é alguém que faz exigências absolutas. E nesse sentido o mercado faz a mais absoluta das exigências: o sacrifício de vidas humanas. E justamente por isso é um falso deus. Os sacrifícios religiosos continuam sendo oferecidos aos deuses, só que o deus de hoje é uma força impessoal (o sistema de mercado global) que domina as nossas vidas cotidianas e demanda sacrifícios de vidas humanas, as dos mais pobres (...) uma das questões fundamentais do nosso tempo é que “o Império global de hoje domina por sedução”. Diferentemente de todos os impérios anteriores, o atual sistema capitalista global não tem no poder e força militar o seu principal instrumento de expansão e dominação. Usa sedução e fascinação, a ostentação do seu modo de vida (na verdade da sua elite) como sua arma de conquista (...) Fascinação, medo e ausência de alternativa são características do “sagrado”. E os ideólogos do Império sabem exploram muito bem essa aura religiosa em que está envolto o sistema capitalista atual e reforçam esse processo de sacralização do Império. 9
A sociedade de mercado privilegia o lucro acima de qualquer valor. As corporações, empresas e empreendimentos econômicos existem para o lucro de seus proprietários como o fogo existe para queimar. Jack Welch, o guru que, em sua gestão de 1981 a 2004, fez com que o valor de mercado da General Eletric saltasse de 14 bilhões para 410 bilhões de dólares, diz que ”a empresa pertence 7- COX, Adam. Trio norte-americano ganha Nobel de Economia 2007. Reuters Brasil, em 15 de outubro de 2007. 8- SOROS, George e WOODRUFF, Judy. The Financial Crisis: An Interview with George Soros. New York: The New York Review of Books, Volume 55, N° 8, maio de 2008. 9- SUNG, Jung Mo. Tarefas do Cristianismo de Libertação (I): crítica da idolatria http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=54285
aos acionistas. Eles são os donos dela. Eles a controlam. É assim que é, e é assim que deve ser (. . .) A empresa existe para servir às pessoas que elegeram o conselho de administração, que, por sua vez, escolhe os administradores que comandam a empresa. Ela existe para seus proprietários (. . .) Porque o capitalismo baseia-se no princípio de que os acionistas desejam o sucesso da empresa. Para os acionistas, o melhor dos mundos é que a companhia tenha lucro sempre”.10 Uma nova consciência vem surgindo, mas ainda insuficiente para que sejam percebidas mudanças significativas no cenário no princípio do lucro. A população brasileira, em geral, não concorda que o lucro seja a finalidade precípua de uma empresa. Questionados pelo Instituto Vox Populi sobre qual a missão de uma companhia privada, 93% dos brasileiros mencionam a geração de empregos, contrariando a opinião de 82% dos presidentes de empresas, que citam o lucro em primeiro lugar. Apesar de minoria, há exemplos de líderes de primeiro escalão das empresas que enxergam o lucro de maneira menos absoluta, como Guilherme Leal, da Natura, que acredita que “a missão da empresa é criar valor para a sociedade”, e Marcio Cypriano, do Bradesco, para quem “não é mais admissível buscar o lucro a qualquer custo, é preciso respeitar conceitos como sustentabilidade do planeta e ter preocupação com valores universais”.11 Mas ainda é hegemônico o pensamento defendido por Milton Friedman, Nobel de Economia em 1976: “a responsabilidade social da empresa é aumentar seus lucros e executivos de corporações não têm nenhum dever moral de afrouxar as condições de maximização dos lucros em nome de interesses mais amplos da sociedade”.12 O paradigma “dinheiro é mau, e pessoas de negócios são gananciosas”13 indica que existe um abismo intransponível entre a lógica do mercado e os valores defendidos por praticamente todas as tradições de espiritualidade: ambições materialistas, estilos de vida consumistas, anseio constante por maiores salários, concentração de renda, injustiça social, exploração de mão-de-obra, sistemas econômicos opressivos, e redes de corrupção são expressões que não se adéquam aos ideais de justiça, solidariedade e compaixão. Dinesh D’Souza relata que: Quando Ted Turner, o magnata da mídia, fundador da CNN, anunciou que doaria 1 bilhão de dólares às Nações Unidas, John Stossel da ABC News, perguntou-lhe porque estava doando dinheiro a um grupo que talvez nem vá empregá-lo como deveria. Por que não investir o dinheiro em suas empresas, criando mais empregos e melhorando o padrão de vida das pessoas? Turner, enfurecido, retirou-se 10- WELCH, Jack. As empresas existem para seus acionistas. Revista Exame, outubro de 2006. 11- GUROVITZ, Hélio e BLECHER, Nelson. O estigma do lucro. Revista Exame, maio 2005. 12- FRIEDMAN, Milton. The social responsability of business is to increase its profits. New York Time Magazine, em 1 de setembro de 1970. 13- NASH, Laura L. Igreja aos domingos, trabalho às segundas: o desafio da fusão de valores cristãos com o mundo dos negócios. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2003.
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do estúdio. Ele não aceitava a idéia de que suas atividades comerciais pudessem produzir mais benefícios sociais do que sua filantropia. 14
RELIGIÃO DE CONSUMO E CONSUMO DA RELIGIÃO José Comblin considera o neoliberalismo “a ideologia dominante da virada do século”.15 Define neoliberalismo “como teoria econômica, como utopia, como ética ou como filosofia do ser humano”.16 Comblin faz a crítica da cultura neoliberal denunciando a cultura do consumo, a cultura do narcisismo, e a religião privatizada.17 A privatização da religião, ou da fé, seria, portanto, uma decorrência desta cultura neoliberal. No capitalismo radical, o consumismo desenfreado passa a ser estimulado em razão da necessidade de aumento constante da produção e conseqüente acumulação de capital por parte dos controladores dos sistemas produtivos. Os bens oferecidos para o consumo são bens individuais, o que favorece e estimula o individualismo: cada um com seu carro, com sua tv, com seu i-pod. Este sistema “favorece o isolamento puro: não depender de ninguém e não ter ninguém que dependa da gente”.18 A relação entre religião, mercado, consumo e privatização da religião é bem articulada por Frei Betto em seu artigo “Religião de consumo”,19 que transcrevo na íntegra. O Financial Times, de Londres, noticiou que a Young & Rubicam, uma das maiores agências de publicidade do mundo, divulgou a lista das dez grifes mais reconhecidas por 45.444 jovens e adultos de 19 países. São elas: CocaCola, Disney, Nike, BMW, Porsche, Mercedes-Benz, Adidas, Rolls-Royce,Calvin Klein e Rolex. “As marcas constituem a nova religião. As pessoas se voltam para elas em busca de sentido”, declarou um diretor da Young & Rubicam. Disse ainda que essas grifes “possuem paixão e dinamismo necessários para transformar o mundo e converter as pessoas em sua maneira de pensar”. A Fitch, consultoria londrina de design, no ano passado realçou o caráter “ divino” dessas marcas famosas, assinalando que, aos domingos, as pessoas preferem o shopping à missa ou ao culto. Em favor de sua tese, a empresa evocou dois exemplos: desde 1991, cerca de 12 mil pessoas celebraram núpcias nos parques da DisneyWorld, e estão virando moda os féretros da marca Halley, nos quais são enterrados os motoqueiros fissurados em produtos Halley-Davidson. 14- D’SOUZA, Dinesh. Quem vai para o céu? Revista Exame, 16 maio 2001. 15- Complin, José, Neoliberalismo: a ideologia dominante da vira do século. Petrópolis: Vozes, 2001 16- Ibid. 17- Ibid. 18- Ibid. 19- Betto, Frei, Gosto de uva: escritos selecionados. Rio de Janeiro: Garamond, 2003, p. 38
A tese não carece de lógica. Marx já havia denunciado o fetiche da mercadoria. Ainda engatinhando, a Revolução Industrial descobriu que as pessoas não querem apenas o necessário. Se dispõem de poder aquisitivo, adoram ostentar o supérfluo. A publicidade veio ajudar o supérfluo a impor-se como necessário. A mercadoria, intermediária na relação entre seres humanos (pessoa-mercadoria-pessoa), passou a ocupar os pólos (mercadoria-pessoa-mercadoria). Se chego à casa de um amigo de ônibus, meu valor é inferior ao de quem chega de BMW. Isso vale para a camisa que visto ou para o relógio que trago no pulso. Não sou eu, pessoa humana, que faço uso do objeto. É o produto, revestido de fetiche, que me imprime valor, aumentando a minha cotação no mercado das relações sociais. O que faria um Descartes neoliberal proclamar: “Consumo, logo existo.” Fora do mercado não há salvação, alertam os novos sacerdotes da idolatria consumista. Essa apropriação religiosa do mercado é evidente nos shopping centers, tão bem criticados por José Saramago em “A Caverna”. Quase todos possuem linhas arquitetônicas de catedrais estilizadas. São os templos do deus mercado. Neles não se entra com qualquer traje, e sim com roupa de missa de domingo. Percorrem-se os seus claustros marmorizados ao som do gregoriano pós-moderno, aquela musiquinha de esperar dentista. Ali dentro tudo evoca o paraíso: não há mendigos nem pivetes, pobreza ou miséria. Com olhar devoto, o consumidor contempla as capelas que ostentam, em ricos nichos, os veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas sacerdotisas. Quem pode pagar à vista se sente no céu; quem recorre ao cheque especial ou ao crediário, no purgatório; quem não dispõe de recurso, no inferno. Na saída, entretanto, todos se irmanam na mesa “eucarística” do McDonald’s. A Young & Rubicam comparou as agências de publicidade aos missionários que difundiram pelo mundo religiões como o cristianismo e o islamismo. “As religiões eram baseadas em idéias poderosas que conferiam significado e objetivo à vida”, declarou o diretor da agência inglesa. A fé imprime sentido subjetivo à vida, objetivando-a na prática do amor, enquanto um produto cria apenas a ilusória sensação de que, graças a ele, temos mais valor aos olhos alheios. O consumismo é a doença da baixa auto-estima. Um São Francisco de Assis ou Gandhi não necessitava de nenhum artifício para centrar-se em si e descentrar-se nos outros e em Deus. O pecado original dessa nova “religião” é que, ao contrário das tradicionais, ela não é altruísta, é egoísta; não favorece a solidariedade, e sim a competitividade; não faz da vida dom, mas posse. E o que é pior: acena com o paraíso na Terra e manda o consumidor para a eternidade completamente desprovido de todos os bens que acumulou deste lado da vida.
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A crítica do fetiche da mercadoria data de oito séculos antes de Cristo, conforme este texto do profeta Isaías: “O carpinteiro mede a madeira, desenha a lápis uma figura, trabalha-a com o formão e aplica-lhe o compasso. Faz a escultura com medidas do corpo humano e com rosto de homem, para que essa imagem possa estar num templo de cedro. (...) O próprio escultor usa parte dessa madeira para esquentar e assar seu pão; e também fabrica um deus e diante dele se ajoelha (...) e faz uma oração, dizendo: `Salva-me, porque tu és o meu deus!’” (Is 44.13-17). Da religião do consumo não escapa nem o consumo da religião, apresentada como um remédio miraculoso, capaz de aliviar dores e angústias, garantir prosperidade e alegria. Enquanto isso, “Ele tem fome e não lhe dão de comer” (Mateus 25, 31-40).
PRÁXIS, TRABALHO E INFLUÊNCIA CRISTÃ O conceito de PRÁXIS desenvolvido primeiramente pelos filósofos gregos clássicos e depois aplicado por Karl Marx às relações econômicas e suas implicações numa cultura de mercado é resumido por Casiano Floristan: Em primeiro lugar, a práxis é ação criadora, não meramente reiterativa. Para que a ação seja criadora é necessário um certo grau de consciência crítica no agente que atua (...) A práxis criadora é inovadora frente a novas realidades e novas situações. O homem há de criar ou inventar; não lhe basta repetir ou imitar o resultado. Em segundo lugar, a práxis é ação reflexiva, não exclusivamente espontânea (...) Em terceiro lugar, a práxis é ação libertadora e de modo nenhum alienante... (O fim de toda atividade prática ou de toda práxis é a transformação real do mundo natural ou social, cuja realidade deve ser uma nova realidade mais humana e mais livre (...) Em quarto lugar, a práxis é ação radical e não meramente reformista. A práxis intenta transformar a organização e direção da sociedade, mudando as relações econômicas, políticas e sociais. 20
Também nessa direção segue Vazquez, que faz distinção entre atividade e práxis, afirmando que “toda práxis é atividade, mas nem toda atividade é práxis”.21 Em Vazquez, há quatro elementos que distinguem a atividade da práxis: consciência, conhecimento, intencionalidade e ação concreta: “a atividade propriamente humana só se verifica quando os atos dirigidos a um objeto para transformá-lo se iniciam com um resultado ideal, ou finalidade, e terminam com um resultado ou produto efetivo, real”.22 A atividade humana requer, portanto, “um conhecimento de seu objeto, dos meios e instrumentos para transformá-lo e das condições que abrem ou fecham as 20- FLORISTAN, Casiano. Teología Práctica – Teoría y práxis de la acción pastoral. Salamanca: Ed. Sígueme. 2002. 21- VAZQUEZ, Adolfo Sanchez. Filosofia da práxis. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977. 22- Ibid.
possibilidades desta realização”,23 de modo que o ideal desejado possa se efetivar concretamente como resultado da ação. Em Paul Tillich, “práxis é a totalidade dos atos culturais de personalidades centradas que, como membros de grupos sociais, atuam umas sobre as outras e sobre si mesmas. Práxis, nesse sentido, é a autocriação da vida na pessoa e na comunidade” . O trabalho pode e deve ser visto como práxis: ação através da qual o humano cria seu mundo e si mesmo. Hannah Arendt distingue labor, trabalho e ação. O labor, como atuação que visa a satisfazer necessidades vitais; o trabalho, como atuação, que visa a construir o mundo artificial sobre o mundo natural, e a ação, que instaura o completamente novo, sendo esta a dimensão da expressão da liberdade humana. O conceito de práxis redimensiona o próprio conceito de trabalho e possibilita que ele deixe de ser visto como um mal necessário ou fruto do castigo divino e passe a ser encarado como ação humana promotora da justiça e da paz social. Podemos resumir que PRÁXIS é a ação individual e coletiva em benefício do humano. 24
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BUSINESS AS MISSION O movimento cristão denominado Business as Mission (BAM), originado no contexto do Comitê de Lausanne para a Evangelização Mundial, decorre do Congresso Internacional de Evagelização Mundial, realizado em 1974, em Lausanne, Suíça, reunindo mais de 2.300 líderes cristãos evangélicos oriundos de 150 países diferentes. O Comitê de Lausanne promove, ainda, congressos em Pataya, Tailândia (1980), Manila, nas Filipinas (1989), e, novamente, em Pataya, Tailândia (2004), onde surge o grupo de trabalho denominado Business As Mission, que pode ser assim definido: BUSINESS AS MISSION é uma estratégia para o fim específico de transformação das pessoas e comunidades: espiritual, econômica e socialmente – para a glória de Deus, por meio de negócios viáveis e sustentáveis com valores, fins, perspectivas e impactos do Reino de Deus. 26
O termo Great Comission Companies, usado por Steve Rundle e Tom Steffen, está relacionado ao conceito da Grande Comissão, conforme relato do evangelho de Mateus 28.1820, no qual se define a tarefa dos seguidores de Jesus: fazer discípulos de todas as nações. Rundle e Steffen sugerem que a pobreza no mundo exige que os cristãos encarem a tarefa de fazer discípulos de todas as nações como algo muito mais abrangente que simplesmente somar adeptos para sua religião. A presença dos cristãos no mundo implica o compromisso 23- Ibid. 24- TILLICH, Paul. Teologia sistemática. São Paulo: Edições Paulinas/São Leopoldo, Editora Sinodal, 1984. 25- ARENDT, Hanna. A condição humana. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária, 2004. 26- ____________. What is business as mission. In http://www.businessasmission.com/ pages/ YWAM_toolbox3.
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de cooperação para o desenvolvimento social, econômico e espiritual, de modo que, sob a expressão Great Comission Companies, está a compreensão de que “corporações multinacionais – adequadamente motivadas – podem ajudar muito no processo de desenvolvimento ao incrementar as capacidades econômicas de um país, contribuindo para sua integração na economia global e lutando contra a pobreza e outros problemas socioeconômicos”.27 Já o termo “kingdon business” é usado por Ken ELDRED para se referir a “práticas bem sucedidas de negócio, integração entre trabalho e fé, desenvolvimento econômico, divulgação do evangelho transformando nações e vidas”.28 G. Marx oferece outra lista de definições relacionadas ao tema Business as Mission: BUSINESS AS MISSION é trazer as Boas Novas do Reino de Deus à sociedade por meio dos negócios. Negócios do Reino, como definido por Tony Black (ex-CEO da Chrysler): Alcançar pessoas reais com produtos reais ou serviços de forma que realmente impacte as suas vidas. Empreendedores do Reino são apóstolos, chamados por Deus para discipular pessoas e economias locais por meio de negócios transculturais, atendendo a reais necessidades humanas e utilizando suas capacidades em negócios como meio de ministério. Empresas do Reino são fundadas por uma visão do Reino, sendo entidades responsáveis, bem gerenciadas, lucrativas e sustentáveis, que realizam suas operações com ética bíblica para facilitar a plantação de igrejas e equipadas para multiplicação. 29
Para promover a influência cristã, em termos práticos, Business as Mission implica pelo menos os seguintes compromissos da comunidade de negócios: – Negócios que criam empregos e oportunidades para ministério prático aos marginalizados, ou pobres ou que gera ganhos para uma comunidade necessitada. – Incubação e desenvolvimento de negócios nestes contextos – a provisão de capital e treinamento para capacitor o início de um negócio (microempresa é apenas um desses exemplos em menor escala). – Negócio que, deliberadamente, incentiva a transformação social – provendo emprego, mudança social, influenciando governos/ indivíduos chave, e que fornece uma plataforma confiável para demonstrar o amor de Deus”. 30
27- TUNEHAG, Mats, MC GEE, Wayne, PLUMMER, Josie. Business as Mission Manifesto Missão Empresarial – Manifesto do Lausanne Fórum. In http://www.businessasmission.com. 28- ELDRED, Ken. God is at work. Manna Ventures, 2009. 29- MARX, G. Business as Mission Concepts - from a South African Perspective. http://www. businessasmission.com/pages. 30- _________. What is business as mission. In http://www.businessasmission.com/pages/ YWAM_toolbox3.
Business as Mission não é apenas uma estratégia missionária, o que o caracterizaria como um movimento que utiliza a “espiritualidade a serviço da religião”, ou um jeito de potencializar resultados, o que o colocaria na categoria de “espiritualidade a serviço do capital”. Expressões, como geração de empregos, empreendedorismo e transformação social, fazem com que Business as Mission seja um jeito de atuar no mercado, baseado em convicções oriundas da experiência religiosa, mas que se estendem para além das fronteiras do proselitismo e, justamente por sua origem atrelada à vivência da espiritualidade, visa mais que o mero lucro, como se pode observar nos testemunhos coligidos por Tunehag. 31 O primeiro, trata de Hans Nielsen Haug , que foi chamado “pai da democracia na Noruega”, como segue: Mencionemos, brevemente, um exemplo da Noruega, 200 anos atrás. Hans Nielsen Hauge nasceu ao final do ano 1700. em uma sociedade agrícola pobre e subdesenvolvida. Não havia democracia e a liberdade religiosa era limitada. Quando Hauge tinha 25 anos, teve um encontro com Deus. O lema da vida de Hauge foi: ‘Ama a Deus e ao teu próximo’. Ele viajou extensamente pela Noruega e levou adiante – o que hoje na terminologia moderna chamaríamos – plantação de igrejas e negócios como missão. Começou 30 companhias, incluindo indústrias de pesca, fábricas de ladrilhos, minas de sal e minerais, fábricas de papel e gráficas. Ele era um empreendedor e um catalizador de negócios. A partir de sua ação e exemplo, muitos foram inspirados para ler a Bíblia, encontrarse com outros crentes para orar e compartilhar juntos, e vários negócios começados e desenvolvidos. Mesmo historiadores seculares reconhecem, hoje em dia, o legado e a contribuição de Hauge ao desenvoolvimento da Noruega moderna. Ele às vezes, chamado de ‘o Pai da democracia na Noruega’. Ele facilitou a igualdade entre o homem e a mulher, seu trabalho levou a um despertar espiritual e a um movimento empreendedor. O legado de Hauge é, portanto, uma transformação espiritual, econômica e social. Ele não utilizou o termo negócios como missão, mas sua vida e seu trabalho ilustram algumas das metas, princípios e resultados do BAM.
O segundo testemunho de Tunaheg registra os fundamentos da visão estratégica de uma empresa de tecnologia de informação com sede na Índia: Entre a maioria das pessoas não alcançadas na Índia, existe uma companhia de tecnologia de informação que visa a fazer Cristo conhecido entre elas. Por meio das muitas oportunidades que naturalmente surgem nos negócios, o fundador pode compartilhar sua fé em palavras e atos. O plano estratégico da companhia é: Nosso propósito é servir: (1) aos nossos Clientes, com soluções criativas, inovadoras, confiáveis e da mais alta qualidade; 31- TUNEHAG, Mats. Negocios como misión. http://www.businessasmission.com/pages.
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(2) aos nossos Empregados com um trabalho significativo e desafiador, estabilidade, bons salários, desenvolvimento e um ambiente de trabalho agradável; (3) aos nossos Acionistas provendo-lhes atraentes retornos sobre seu investimento; (4) ao País, ao criar conhecimento e riqueza e contribuindo com as preocupações locais; (5) à Sociedade, ao mostrar que o êxito e os altos padrões morais podem coexistir; (6) a Deus, sendo fiéis e bons administradores.
Exceto na última expressão dessa declaração de propósitos, não há qualquer sinal de que se trate de uma empresa com orientação religiosa. O que fica evidente é que a experiência religiosa, ou inf luência da espiritualidade, fornecem a motivação e a tábua de valores, mediante os quais a empresa atua no mercado. Em nenhum momento, a opção religiosa fica evidente, destacando-se muito o fato de que se trata de uma “empresa espiritualizada”. Conforme já identificado, Business as Mission nasce no contexto do Congresso Mundial de Evangelização, Lausanne, 1974, e reflete “o espírito de Lausanne”, 32 conforme o Pacto de Lausanne,33 que resulta na corrente teológica com ênfase na missão da igreja, que se pode chamar de Evangelicalismo integral,34 Holismo,35 Evangelho Integral,36 Teologia da Missão Integral.37 A teologia da missão integral tem como eixos principais a relação entre evangelização e responsabilidade social, a encarnação de Deus em Jesus Cristo, além da “promoção dos valores do reino de Deus (contra os anti-valores das trevas) e da relação entre os poderes deste mundo e as potestades celestiais (do bem e do mal), em uma batalha espiritual e, ao mesmo tempo, concretamente histórica em suas manifestações”.38 O parágrafo do Pacto Lausanne, que define a responsabilidade social cristã serve de embasamento para melhor compreensão do que se pretende no movimento Business as Mission: Afirmamos que Deus é o Criador e o Juiz de todos os homens. Portanto, devemos partilhar o seu interesse pela justiça e pela conciliação em toda a sociedade humana, e pela libertação dos homens de todo tipo de opressão. Porque a humanidade foi feita à imagem de Deus, toda pessoa, sem distinção de raça, religião, cor, cultura, classe social, sexo ou idade possui uma dignidade intrínseca em razão da qual deve ser respeitada e servida, e não explorada (...) Embora a reconciliação com o homem não seja reconciliação com Deus, nem a ação social evangelização, nem a libertação 32- LONGUINI NETO, L. O novo rosto da missão. Viçosa: Ultimato, 2002. 33- Comissão de Lausanne para a Evangelização Mundial, The Lausanne Covenant. London, England, 1975. 34- CAVALCANTI, Robinson. A utopia possível. Viçosa: Ultimato, 1997. 35- Ibid. 36- Ibid. 37- RAMOS, Ariovaldo. Nossa igreja brasileira. São Paulo: Hagnos, 2002. 38- CAVALCANTI, Robinson. A utopia possível. Viçosa: Ultimato, 1997.
política salvação, afirmamos que a evangelização e o envolvimento sócio-político são ambos parte do nosso dever cristão. Pois ambos são necessárias expressões de nossas doutrinas acerca de Deus e do homem, de nosso amor por nosso próximo e de nossa obediência a Jesus Cristo. A mensagem da salvação implica também uma mensagem de juízo sobre toda forma de alienação, de opressão e de discriminação, e não devemos ter medo de denunciar o mal e a injustiça onde quer que existam. Quando as pessoas recebem Cristo, nascem de novo em seu reino e devem procurar não só evidenciar, mas também divulgar a retidão do reino em meio a um mundo injusto. A salvação que alegamos possuir deve estar nos transformando na totalidade de nossas responsabilidades pessoais e sociais. A fé sem obras é morta. 39
Afirmar que (1) “toda pessoa possui uma dignidade intrínseca em razão da qual deve ser respeitada e servida, e não explorada”; (2) “a evangelização e o envolvimento sócio-político são ambos parte do nosso dever cristão”; (3) “a mensagem da salvação implica também uma mensagem de juízo sobre toda forma de alienação, de opressão e de discriminação, e não devemos ter medo de denunciar o mal e a injustiça onde quer que existam”; e (4) que “a salvação que alegamos possuir deve estar nos transformando na totalidade de nossas responsabilidades pessoais e sociais”, indica que a vivência da espiritualidade cristã pode ser fator determinante do compromisso com a promoção humana em todos os segmentos da sociedade, inclusive no que tange ao trabalho, ao mercado e ao mundo corporativo.
MOVIMENTO FOCOLARE E ECONOMIA DE COMUNHÃO Business as Mission está para o contexto religioso de corte protestante reformado, quanto a Economia de Comunhão, de Chiara Lubich, fundadora do Movimento dos Focolares, para o Catolicismo Romano. O Movimento dos Focolares surge em Trento, em 1943, e envolve, hoje, mais de cinco milhões de membros espalhados em mais de 180 países, reunindo cristãos oriundos de cerca de 300 Igrejas distintas da Católica Romana, que Lubich chama de “homens e mulheres de boa vontade”.40 Iniciado como uma pequena comunidade de pouco mais de 500 pessoas, dispondo-se a partilhar seus bens espirituais e materiais, visa à vivência de uma “espiritualidade da unidade, pessoal e comunitária ao mesmo tempo”.41 Assim Lubich relata a motivação para a comunhão de bens dizendo que “com efeito, alguns senhores apareceram um dia em nosso primeiro focolare, perguntando-nos qual o segredo de tudo o que acontecia ao nosso redor (...) Apontamos um 39- Pacto de Lausanne. http://www.abub.org.br. 40- Chiara LUBICH, Economia de comunhão: história e profecia. Vargem Grande Paulista: Cidade Nova, 2004. 41- Ibid.
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crucifixo na parede; não era por sua causa que nos amávamos mutuamente a ponto de partilharmos tudo entre nós? Mas esse ‘segredo’ evidentemente não se conciliava com ideologia deles, e assim, cabisbaixos, retiraram-se”. 42 O Movimento Focolare chega ao Brasil em 1958, e reúne, hoje, mais de 250 mil pessoas. No Brasil, surge “o projeto mais característico”43 do Movimento Focolare, a saber, a Economia de Comunhão na Liberdade, resultado do amadurecimento da experiência da partilha de bens e dos ensinos baseados na Doutrina Social Cristã, principalmente por meio das encíclicas sociais, como por exemplo a primeira de todas elas. Rerum Novarum (1891), de Leão XIII, e as mais recentes, como Laborem exercens (1981), Sollicitudo rei socialis (1987) e Centesimus annus (1991), de João Paulo II, sendo esta última um resumo da doutrina social da Igreja e uma radiografia das situações socioeconômica e política do mundo atual. O aspecto essencial da espiritualidade focolare sempre visa ao socioeconômico, pois os focolarinos “dão livremente o que possuem, inclusive, mês a mês, o fruto do próprio trabalho, posto todo em comum. Os focolarinos casados dão o que podem e o que têm de pessoal. Os voluntários dão o seu supérfluos (...) Todos os membros do Movimento, de modo mais ou menos radical e sempre com liberdade, vivem a comunhão de bens”.44 Na comunidade focolare de Mariápolis Araceli, São Paulo, que origina a Economia de Comunhão, conforme relato de Lubich: Aqui, nessa cidadezinha, deveriam surgir algumas indústrias, algumas empresas, pela iniciativa dos focolarinos casados e, em particular dos voluntários (...) Tais empresas, de diferentes tipos, deveriam ser apoiadas por pessoas do Brasil inteiro, constituindo sociedades em que cada um teria uma participação própria (...) A gestão, obviamente, deveria ser confiada a pessoas competentes e capazes, que fizessem essas empresas funcionar com a máxima eficiência e, assim, obtivessem lucro delas. E aqui está a novidade: esse lucro não deveria ser repartido entre todos os que participam do capital, mas deveria ser ‘posto em comum’. Disso haveria de nascer uma ‘Economia de Comunhão’, da qual Mariápolis seria um protótipo, uma cidade-piloto”. 45
Dentro de um movimento religioso, surge uma experiência de espiritualidade que motiva a partilha de bens, a constituição de comunidades e, posteriormente, a instituição de indústrias e empresas que devem funcionar com máximo de eficiência e dar lucro. A espiritualidade é a motivação, a partilha de bens é o critério comunitário, e a atividade lucrativa é a estratégia de geração e distribuição de recursos. Lubich explica melhor: 42- Ibid. 43- Ibid. 44- Ibid. 45- Ibid.
O propósito pelo qual o lucro deve ser posto em comum é o mesmo a que se propunha a primitiva comunidade cristã: ajudar em primeiro lugar os necessitados, oferecer-lhes trabalho, estruturá-los, fazer com que não haja qualquer indigente. Depois, para desenvolver as empresas, pois se elas param, não produzem. E, finalmente, para desenvolver as estruturas da Mariápolis e, por conseguinte, a sua função de formar ‘homens novos’, porque, sem ‘homens novos’, não se forma uma sociedade nova. 46
O fim é a nova sociedade, construída pelos homens novos, que podem ser formados no contexto de uma pequena cidade onde não há indigentes. Para que tal projeto se concretize com sucesso, é mister que aqueles que nele se envolvem – empresários, dirigentes, trabalhadores e outros ligados à empresa se comprometam a: – instaurar relacionamentos leais e respeitosos, animados por um sincero espírito de serviço e de colaboração, com os clientes, os fornecedores, o poder público e até mesmo os concorrentes; – valorizar os empregados, informando-os e envolvendoos, em várias medidas, na sua gestão; – manter uma linha de conduta da empresa inspirada na ‘cultura da ética’; – reservar grande atenção ao ambiente de trabalho e ao respeito à natureza, ainda que arcando com investimentos de alto custo; – cooperar com outras entidades ou iniciativas empresariais e sociais presentes no território, atentos inclusive à comunidade internacional, com quem se sentem solidários”. 47
O projeto Economia de Comunhão tem ainda, pelo menos, cinco características essenciais.48 1. Todos os envolvidos nas empresas devem levar para sua vida pessoal os mesmos compromissos que regem sua atividade produtiva; 2. Valores como gratuidade e compaixão, normalmente associados ao universo de organizações sem fins lucrativos, devem ser aplicados ao mundo empresarial, pois as estruturas empresariais devem ser transformadas, na direção de maior expressão do estilo de vida da comunhão, ainda que respeitadas as exigências da competitividade no mercado; 3. As pessoas em dificuldade econômica não devem ser vistas meramente como ‘assistidos’ ou ‘beneficiados’ pelas empresas, mas como parte integrante de todo o projeto que será também por elas sustentado tão logo sejam libertas de sua condição de necessidade; 46- Ibid. 47- Ibid. 48- Ibid.
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4. As empresas se desenvolvem em pequenos pólos empresariais próximos às cidades testemunho do Movimento; 5. A provisão divina deve ser esperada, principalmente quando as empresas fazem escolhas contrárias ao que orienta a praxe comercial.
SAL DA TERRA E LUZ DO MUNDO O sal é um fogo arrancado das águas, disse André Chouraqui.49 Suas propriedades o fazem instrumento para conservar e proteger alimento da putrefação, como também combater a corrosão. Sua virtude, que indica proteção e purificação, faz do sal um símbolo de incorruptibilidade. Jesus utiliza a metáfora do sal para claramente indicar a relevância de seus discípulos e suas comunidades no mundo. Da mesma forma usa a metáfora da luz, aplicada não apenas ao universo, mas também a uma cidade, uma casa e uma pessoa, para afirmar que seus discípulos e suas comunidades vivem sob o sagrado encargo de representar e expressar a beleza de Deus, o Pai Celestial, no mundo. As duas metáforas, identificadas como realidades presentes na terra e no mundo, são suficientes para indicar que a experiência da espiritualidade cristã extrapola as dimensões individuais e particulares dos anseios pessoais de cada ser humano, mas afeta o horizonte coletivo, uma vez que exige a vivência comunitária da fé e a função missional na sociedade. Karl Marx poderia ter razão ao afirmar que “a religião é o ópio do povo”, mas certamente estaria absolutamente enganado caso estivesse se referindo ao Evangelho de Jesus Cristo. Vocês são o sal da terra. Mas se o sal perder o seu sabor, como restaurá-lo? Não servirá para nada, exceto para ser jogado fora. Vocês são a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade construída sobre um monte. E, também, ninguém acende uma candeia e a coloca debaixo de uma vasilha. Ao contrário, coloca-a no lugar apropriado, e assim ilumina a todos os que estão na casa. Assim brilhe a luz de vocês diante dos homens, para que vejam as suas boas obras e glorifiquem ao Pai de vocês, que está nos céus. [Evangelho de Mateus 5.13-16]
49- CHOURAQUI, André. A Bíblia: Matyah. Rio de Janeiro: Imago, 1996.
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