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Neste âmbito, a conjugação e simultaneidade de políticas de mitigação e de adaptação16 é condição para gerar benefícios mútuos e efeitos multiplicadores, com especial atenção à necessidade de apoiar países mais afetados e com menor resiliência e capacidade de resposta. A combinação da justiça ambiental com a justiça social é, igualmente, essencial para colmatar os efeitos nefastos das alterações climáticas a todos os níveis, equilibrando as dimensões ambiental, económica e social do desenvolvimento. 1.1. IMPACTO DA PANDEMIA DE COVID-19 O impacto global das alterações climáticas e das questões ligadas à ação humana sobre o ambiente na saúde pública e no bem-estar tem vindo a ser crescentemente referido por cientistas e profissionais na área da medicina. Para além do aumento da mortalidade, nomeadamente de forma direta devido a eventos meteorológicos extremos e desastres naturais, as alterações climáticas podem causar problemas de saúde, por exemplo relacionados com secas e ondas de calor, com a poluição, com a deslocação de vetores de doenças e com outras questões potenciadas pelas alterações climáticas e pelo aquecimento global17. A má nutrição causada pelos impactos na agricultura, a contaminação da água potável na sequência de catástrofes, ou a ampliação do raio de ação de vírus e doenças devido ao aquecimento global, são outros exemplos de impactos diversificados na saúde. Já neste século, a gripe das aves (H5N1) em 2003 e a gripe suína em 2009 (H1N1), o surto de vírus do grupo SARS-CoV com início na China (2003) e do MERS-CoV que causou a síndrome respiratória do Oriente Médio (2012) vieram confirmar os alertas dos cientistas e virologistas para a alta probabilidade de surgimento de novas doenças infeciosas e de uma epidemia de grandes proporções. Tal como outros surtos, a COVID-19 é uma zoonose, ou seja, um vírus que saltou de espécies aninais para os humanos, e esses saltos são muito mais prováveis quando os animais selvagens têm um contacto próximo com as populações humanas. Assim, devido à crescente expansão da atividade humana para zonas onde destrói e altera os ecossistemas e o habitat natural de outros animais, a captura de espécies selvagens para consumo humano, a domesticação e a criação de aves e mamíferos em escala industrial e de produção intensiva, ou o comércio internacional de espécies exóticas, o equilíbrio evolutivo entre as espécies é quebrado18. As próprias alterações climáticas favorecem alterações na distribuição global das espécies animais e o degelo provocado por estas encerra riscos ainda desconhecidos (dada a conservação de microrganismos nos glaciares e regiões de “permafrost”19).
A mitigação diz respeito à redução da emissão dos gases que causam as alterações climáticas e a adaptação pretende reduzir os impactos e melhorar a capacidade de resposta às alterações climáticas e suas consequências.
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A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que as alterações climáticas poderão ser responsáveis, todos os anos, por 250 mil mortes adicionais no mundo. As doenças transmitidas de outros animais para humanos causam já 700 mil mortes por ano.
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Muitos artigos científicos estabelecem esta ligação. Ver por exemplo Marques, 2020, Goudarzi, 2020 ou Settele et al (2020). Já em 2015, Bill Gates lançava um alerta para a necessidade de aumentar a capacidade de resposta global a uma potencial pandemia e apelava a um investimento anual de 4,5 mil milhões de dólares para implementar um sistema de deteção, prevenção e tratamento de potenciais doenças emergentes.
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O “permafrost” é o solo congelado de forma permanente durante o ano e que cobre 25% da superfície terrestre do Hemisfério Norte. Contém quase o dobro do dióxido de carbono presente na atmosfera. Uma parte significativa virá à superfície devido ao aquecimento global, ameaçando libertar vírus e outros microrganismos do passado, bem como milhões de toneladas de GEE, acelerando por sua vez o aquecimento global.
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