Boletim Orcamento 6

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6 Publicação do Instituto de Estudos Socioeconômicos - Inesc • Ano III • nº 6 • dezembro de 2004

PPA 2004/2007: uma estratégia para superar desafios? Qualquer visão que restrinja a análise do Plano Plurianual 2004/2007 à sua função constitucional teria uma perspectiva limitada. O PPA deve ser visto, também, a partir da sua capacidade de institucionalizar, em lei, os mais diversos tipos de interesses das organizações que compõem a estrutura do Estado brasileiro. Contudo, isto não significa que o Plano Plurianual seja um espaço político no qual diferentes grupos simplesmente acomodam suas reivindicações. Não é o caso de se defender uma visão irreal do PPA 2004/2007 como fórum neutro garantido pelo Estado, onde prevalecem interesses selecionados mediante embates de idéias e cujo produto final seria um todo harmônico portador da estratégia de desenvolvimento do governo Lula para o país.

E D I TOR I A L

Discurso forte e escuta fraca

O

projeto de revisão do Plano Plurianual 2004/ 2007, em tramitação no Congresso Nacional propõe um novo desenho para políticas públicas anteriormente definidas e aprovadas. De um total de 382 programas que compõem o PPA, 17 foram excluídos, 18 incluídos e outros 347 alterados. Mudança tão radical dificulta o trabalho de controle social e denota falta de continuidade em políticas sociais importantes. A realização dos Fóruns Estaduais de consulta do PPA, em 2003, parecia ser o prelúdio de uma experiência inédita no relacionamento entre o Estado e sociedade civil no Brasil. Embora a consulta estive limitada às diretrizes gerais do PPA, havia a promessa de uma gestão participativa no processo de revisão. As expectativas da sociedade civil foram frustradas pela decisão unilateral do governo. O Inesc encerra o ano de 2004 com um alerta: ainda estamos muito distantes da democracia participativa que almejamos. Este processo de construção do PPA 2004/2007 é prova concreta da necessidade de se estabelecer compromissos consistentes e assegurar o seu cumprimento. Lembramos aos nossos leitores que este número do Boletim Orçamento não trará análises da Política de Criança e Adolescente porque estas foram realizadas em produto específico da temática que pode ser acessado no site www.inesc.org.br


No processo de elaboração do PPA 2004/2007, interesses de caráter distinto são acomodados em meio ao constrangimento de regras formais (e informais), assimetrias de poder, informação e capacidade de gestão entre as organizações do Estado. No entanto, os interesses acomodados no plano vão além daqueles oriundos dos quadros da burocracia. No Brasil, o Presidente da República necessita de coalizões partidárias que sustentem suas decisões no Parlamento e, por isso, interesses que são frutos da partilha do poder do Estado também se fazem presentes na construção do PPA. Além disso, o processo de elaboração esbarra também em limitações de tempo, nas restrições relativas à própria infraestrutura da máquina pública e, ainda, como qualquer outra atividade humana, nas próprias limitações intrínsecas às pessoas envolvidas no processo. Desse ponto de vista, seria errado interpretar o PPA 2004/2007 como um documento que reflete um pensamento monolítico de governo. Isto significa dizer que o PPA pode apresentar programas e ações destoantes entre si, ao invés de trazer um conjunto de programas coerentes com uma orientação estratégica do plano. Dada a sua função constitucional de definir compromissos da administração pública para um período de quatro anos, o Plano Plurianual tem a capacidade de impor trajetórias pelas quais o país caminhará durante esse período. Isto posto, o que se pergunta é se o PPA 2004/2007 seria um bom instrumento de planejamento, isto é, o que se deseja saber é se o

PPA do governo Lula seria capaz de apresentar um conjunto de programas elaborados de forma consistente no sentido de que seus objetivos concorram para a superação dos desafios apontados pela estratégia de desenvolvimento do governo. Bases Institucionais do Plano Plurianual De acordo com a Constituição Federal, o PPA deve estabelecer, de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para despesas de capital e gastos relativos aos programas de duração continuada.1 Entretanto, no que se refere à estrutura do PPA, não se observa, ainda, um rigor institucional que oriente a sua elaboração. A Constituição transfere a responsabilidade pela organização e formatação do Plano Plurianual para uma lei complementar.2 Mas, como não há um modelo legalmente instituído para essa coordenação, a metodologia de elaboração do Plano Plurianual vem sendo definida pelo Poder Executivo e submetida à apreciação do Congresso Nacional.3 Estratégia de Desenvolvimento No PPA 2004/2007, a estratégia de desenvolvimento é entendida como a síntese lógica do programa de governo que articula, de forma consistente, o conjunto de políticas públicas — social, econômica, infra-estrutural, ambiental e regional — com vistas à transformação na sociedade no longo prazo. O papel do PPA seria conferir racionalidade e eficácia às

1 Ver § 1° do Art. 165. Isto é, a elaboração do projeto de lei do PPA tem início no Poder Executivo e o projeto deve ser enviado ao Congresso Nacional até 31 de agosto do primeiro ano de cada mandato presidencial. Sua execução tem início no segundo ano do mandato presidencial e termina no primeiro ano do mandato subseqüente. A LOA deve ser enviada ao Congresso Nacional até o dia 31 de agosto e a LDO deve ser entregue até o dia 15 de Abril pelo Poder Executivo. 2 Art. 165 da CF, § 9°. 3 O processo de reformulação do processo orçamentário foi implementado, inicialmente, pelo Decreto N° 2.829/98 e portarias a ele associadas. No caso do PPA 2004/2007, a gestão do plano foi estabelecida no Decreto da Presidência da República n° 5.233, de 6 outubro de 2004. 4 Lei n° 10. 933 de 2004, Anexo I – Orientação Estratégica de Governo, pag. 6.

Orçamento uma publicação do INESC - Instituto de Estudos Socioeconômicos com a parceria de Fundação Avina. Tiragem: 1.500 exemplares - End: SCS - Qd, 08, Bl B-50 - Salas 431/441 Ed. Venâncio 2000 - CEP. 70.333-970 - Brasília/DF - Brasil - Fone: (61) 212 0200 - Fax: (61) 212 0216 - E-mail: protocoloinesc@inesc.org.br - Site: www.inesc.org.br - Conselho Diretor: Eva Faleiros, Gisela de Alencar, Iliana Canoff, Juraci de Souza, Mariza Veloso, Nathalie Beghin, Neide Castanha, Paulo Calmon, Pe Virgílio Uchoa. Colegiado de Gestão: Iara Pietricovsky, José Antônio Moroni. Assessores: Alex Jobim, Edélcio Vigna, Francisco Sadeck, Jair Barbosa Júnior, Jussara de Goiás, Luciana Costa, Márcio Pontual, Ricardo Verdum, Selene Nunes. Assistentes: Álvaro Gerin, Caio Varela, Lucídio Bicalho. Instituições que apóiam o Inesc: Action Aid// CCFD// Christian Aid// EED// Esplar// Fastenoffer// Fundação Avina// Fundação Ford// Fundação Heinrich Boll// KNH// Norwegian Church Aid// Novib// Oxfam// Solidaridad. Jornalista responsável: Jair Barbosa Júnior (DF 976 JP) Esta publicação utiliza papel reciclado

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ações do governo federal.4 Dessa forma, a estratégia de desenvolvimento deveria se tornar referência para a elaboração de todo o restante do plano. Nesse sentido, o plano apresenta uma estratégia de desenvolvimento que se desdobra em cinco dimensões articuladas em três megaobjetivos decompostos em 30 desafios.5 O objetivo dessa estrutura é orientar a elaboração do conjunto de prograUm levantamento mas e ações do PPA, pois realizado pelo estes dois são os instru- Tribunal de Contas da mentos responsáveis por União - TCU - em materializar a ação go- relação ao projeto de vernamental com vistas à lei do PPA enviado ao transformação da realiCongresso Nacional dade. O programa, uniconcluiu que a dade central de gestão coordenação entre a do PPA, é constituído estratégia de por um conjunto de desenvolvimento, os ações (projetos, atividamegaobjetivos, os des, operações especiais) desafios e alguns que visam atuar sobre as programas era causas de um problema incompleta, ou demandas identificaprejudicando o das na sociedade. acompanhamento, a A estratégia de desenavaliação e a própria volvimento apregoada consistência da pelo governo Lula é se- orientação estratégica guinte: i) inclusão social e desconcentração de renda, com vigoroso crescimento do produto e do emprego; ii) crescimento ambientalmente sustentável, redutor das disparidades regionais, dinamizado pelo mercado de consumo de massa, investimentos e elevação da produtividade; iii) redução da vulnerabilidade externa por meio da expansão das atividades competitivas que viabilizam esse crescimento sustentado; e iv) fortalecimento da cidadania e da democracia. 6

Cabeça para um lado, pés para outro A despeito da validade desse processo de discussão, qual é o impacto da orientação estratégica na definição dos programas e ações do PPA? Os programas e as ações são consistentes? Seus objetivos estão orientados para a superação dos desafios propostos pela orientação estratégica? Por vários razões, a consistência pode ser questionada. Na prática, uma das principais falhas do plano é justamente o fato de não apresentar um mecanismo para se aferir a conexão entre os programas e os megaobjetivos e seus desafios. Isto significa que, quando se analisa a lei do PPA, não é possível encontrar referências que indiquem para qual megaobjetivo a execução de cada programa concorre. Um levantamento realizado pelo Tribunal de Contas da União - TCU - em relação ao projeto de lei do PPA enviado ao Congresso Nacional concluiu que a coordenação entre a estratégia de desenvolvimento, os megaobjetivos, os desafios e alguns programas era incompleta, prejudicando o acompanhamento, a avaliação e a própria consistência da orientação estratégica. O TCU tentou relacionar os programas e os desafios comparando os seus enunciados e constatou que inúmeros programas estavam isolados da orientação estratégica.7 Nesse sentido, a falta de conexão lógica entre a estratégia de desenvolvimento e alguns programas do plano indicam falhas na elaboração do PPA como instrumento de planejamento de médio prazo. Somam-se a isso as constantes alterações do plano no decorrer do seu período de vigência, resultando num documento em que cabeça e pés parecem não integrar o mesmo corpo. Por exemplo, a lei do PPA anuncia que o fortalecimento da cidadania e da democracia integrava a estratégia de desenvolvimento.8 Porém, no projeto de lei de revisão do PPA, o governo propôs, por exemplo, a exclusão da ação que previa

5 As dimensões são as grandes referências de atuação do governo no período de quatro anos, que se expressam em megaobjetivos da seguinte forma: Megaobjetivo I - Inclusão social e redução das desigualdades ( Dimensão Social); 2. Megaobjetivo II - Crescimento com geração de emprego e renda, ambientalmente sustentável e redutor das desigualdades regionais; 3. (Dimensão Econômica; Dimensão Ambiental; Dimensão Regional); Megaobjetivo III - Promoção e expansão da cidadania e fortalecimento da democracia (Dimensão democrática). Cada um destes megaobjetivos abarca seu próprio conjunto de desafios que traduzem o enfrentamento de obstáculos à consecução da estratégia de desenvolvimento, que deveriam ser passíveis de mensuração por indicadores que permitam a avaliação do seu grau de concretização. 6 Lei n° 10. 933 de 2004, Anexo I – Orientação Estratégica de Governo, pag. 2. 7 Levantamento de Auditoria – TCU. Diário Oficial da União – Seção 1 n° 35, quinta-feira, 19 de fevereiro de 2004, pp. 147-8. 8 Lei n° 10. 933 de 2004, Anexo I – Orientação Estratégica de Governo, pag. 2.

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dotações orçamentárias para a participação social na revisão do plano.9 Isso não significa que o desafio de fortalecer a cidadania e a democracia tenha sido abandonado, mas a exclusão dessa ação apresenta-se como sinal de incoerência do documento. Quais seriam, então, as explicações para o descompasso entre a orientação estratégica do PPA e alguns programas? Parte da explicação está nos constrangimentos internos presentes nas organizações do Estado, aos quais os indivíduos estão submetidos. Como aponta o TCU, o processo de elaboração do PPA 2004/2007 enfrentou problemas como a insuficiência de vagas e uma carga horária reduzida nos cursos de capacitação dos servidores responsáveis pela elaboração dos programas, a falta de capacitação necessária ao corpo técnico para a criação de índices de efetividade, a inexistência de fontes oficiais para efetuar mensurações necessárias, deficiências na coleta de dados, conflitos de competência e uma divergência entre a proposta de órgãos setoriais e do órgão central de planejamento.10 Entretanto, as deficiências no âmbito da burocracia são antes um sintoma de uma opção política minimalista do papel do Estado, representado pela política fiscal restritiva, do que características intrínsecas à máquina pública.11 De qualquer forma, é fácil perceber que a elaboração dos programas está longe de seguir qualquer lógica linear. A complexidade em torno da construção do plano refletiu-se no projeto de lei do PPA 2004/2007 submetido à aprovação do Congresso Nacional.12 A proposição enviada pelo Poder Executivo continha inconsistências como a inexistência

de alguns indicadores e de atributos de certos programas. Além disso, foram identificadas incompatibilidades entre dados financeiros e metas físicas de algumas atividades.13 O Projeto de Lei de Revisão Anual Em agosto de 2004, o Poder Executivo enviou ao Congresso Nacional uma proposta de revisão do PPA com a intenção de excluir 17 programas, incluir 18 novos e alterar outros 347 de um total de 382.14 As propostas de modificações contidas no projeto de lei de revisão também visam alterar valores de metas físicas, valores de metas financeiras, indicadores e o produto de alguns programas e ações. A amplitude do número de programas modificados, ainda no primeiro ano de vigência do PPA 2004/2007, apenas reafirma a dúvida a respeito da qualidade inicial do plano. Embora a revisão anual abra a possibilidade de se corrigir falhas no PPA, é evidente que alterações periódicas nos programas dificultam o controle social do plano e refletem, também, uma falha da proposta inicial como instrumento de planejamento de médio prazo do Estado. O Projeto de lei de revisão do PPA 2004/2007 trouxe novas projeções de crescimento do PIB para os anos de vigência do PPA. Enquanto a lei do PPA propunha um crescimento de 4% para 2004 e de 4,5% para 2005, a revisão do plano prevê variações de 3,8% em 2004 e de 4 % em 2005. No projeto de lei de revisão, o governo ainda diminuiu a previsão de expansão do PIB em 0,5% para cada um dos dois últimos anos do PPA. A tabela I mostra a revisão do governo para o período.

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Principais variáveis macroeconômicos - Revisão PPA 2004/2007 Crescimento do PIB Real (%) IPCA % Taxa de câmbio (R$/US$) – final de período

PPA 4,0 5,5 3,51

2004 Revisão 3,8 6,7 3,1

PPA 4,5 4,5 3,64

2005 Revisão 4,0 4,5 3,24

PPA 5,0 4,0 3,75

2006 Revisão 4,5 4,5 3,39

PPA 5,5 4,0 3,86

2007 Revisão 5,0 4,0 3,54

Fonte: Projeto de Lei de Revisão do PPA, Anexo II, Vol. IV.

9 O Projeto de revisão do PPA propôs a exclusão da ação 4546 - Processo Participativo da Elaboração e da Gestão do Plano. 10 Levantamento de Auditoria – TCU. Diário Oficial da União – Seção 1 n° 35, quinta-feira, 19 de fevereiro de 2004, pag. 142. 11 A política fiscal será abordada no decorrer do texto. 12 O projeto de lei do PPA 2004/2007chegou ao Congresso no final de agosto de 2003 e só foi aprovado em junho de 2004. 13 Levantamento de Auditoria – TCU. Diário Oficial da União – Seção 1 n° 35, quinta-feira, 19 de fevereiro de 2004, pag. 142. 14 Projeto de revisão do PPA 2004/2007, vol. II, anexo IV, pag. 3.

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Esses números não são consensuais. Segundo o relatório de mercado do Banco Central (03/ 12), a expectativa de crescimento do PIB gira em torno de 5,0% em 2004 e de 3,5 % em 2005.15 Em dezembro de 2004, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA já estimava um crescimento de 5,2% do PIB para 2004 e 3,8% para 2005.16 No que diz respeito ao IPCA, o índice de inflação oficial do governo, o projeto de lei de revisão também fez uma alteração de meta. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA acumulou 6,68% no ano, abaixo do percentual de 8,74% relativo a igual período de 2003. Este valor extrapola a meta de inflação estabelecida para o ano 2004: 5,5%, com intervalo de tolerância de 2,5 pontos percentuais para mais ou para menos. Por sua vez, o projeto de lei de revisão aumentou a previsão de inflação de 5,5% para 6,7% em 2004. Contudo, o relatório de mercado do Banco Central do dia 10/12 já indicava que a expectativa para este índice situava-se em 7,38% para o ano, um valor bem acima do número do governo.17 As previsões do governo para o IPCA em 2005 também não

estão em sintonia com as expectativas presentes no relatório do Banco Central. Enquanto o projeto de lei de revisão do PPA manteve a projeção de 4,5%, a expectativa apresentada no relatório prevê uma variação por volta de 5,78% do IPCA. O acompanhamento do IPCA é importante pois ele influencia na tomada de decisão a respeito no nível da Selic, que é a taxa de juros básica da economia. Em razão de seu aumento concorrer para a diminuição do consumo na economia, pois encarece a tomada de empréstimos, o Banco Central praticou a elevação gradual da Selic ao longo de 2004 com o objetivo influenciar no cumprimento da meta de inflação para o ano 2005: 4,5%, com intervalo de tolerância de 2,5 pontos percentuais para mais ou para menos.18 No dia 15/12, o Banco Central aumentou a Selic de 17,25% para 17,75% ano, o que repercute sobre a dívida pública brasileira, cuja composição, em grande parte, é formada por títulos remunerados por este indicador.19 O projeto de lei de revisão também ampliou as estimativas de dispêndios dos orçamentos fiscal, da seguridade social e das empresas estatais em R$ 7,2 bilhões no período 2004/2007, dos quais R$ 6,3 bilhões se referem ao orçamento de investimento das estatais.

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Execução Orçamentária da União por Grupo de Natureza da Despesa – 2004 em R$ (acumulado até 03/12)* GND 1 - Pessoal e Encargos Sociais 2 - Juros e Encargos da Dívida 3 - Outras Despesas Correntes 4 - Investimentos 5 - Inversões Financeiras 6 - Amortização da Dívida** 7 - Reserva de Contingência TOTAL

Autorizado

Liquidado

87.677.310.486,00 117.454.801.242,00 276.008.814.817,00 13.382.529.027,00 35.275.158.300,00 97.588.051.304,00 19.615.564.247,00 647.002.229.423,00

79.218.423.438,00 71.048.901.835,00 219.657.051.646,00 3.639.603.567,00 16.765.278.212,00 68.470.644.565,00 0,00 458.799.903.263,00

% execução em relação à dotação autorizada 90,35% 60,49% 79,58% 27,20% 47,53% 70,16% 0,00% 70,91%

% execução em relação ao total da dotação liquidada 17,27% 15,49% 47,88% 0,79% 3,65% 14,92% 0,00% 100,00%

* Orçamento Fiscal e da Seguridade Social ** Os valores dos programas relativos ao refinanciamento da dívida pública (907- Refinanciamento da Dívida Interna e 908- Refinanciamento da Dívida Externa) foram retirados desse grupo de despesa, pois não representam gastos efetivos do governo. Como referem-se à rolagem de dívida, esses valores são meramente contábeis dentro do orçamento. A soma dos valores autorizados desses dois programas atingiu R$ 845.991.580.032,00 , enquanto a soma dos valores liquidados chegou a R$ 341.755.060.080,00. Fonte: Consultoria de Orçamento/ CD e Prodasen

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Banco Central do Brasil - Relatório do Mercado, 3 de dezembro de 2005. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada-IPEA – Boletim de Conjuntura- Dezembro 2004. Banco Central do Brasil - Relatório do Mercado, 10 de dezembro de 2004. Resolução 3.108 do BACEN A parcela de títulos remunerados pela taxa Selic reduziu de 59,0% em outubro para 58,4% (Banco Central/Tesouro Nacional - Nota para a Imprensa Dívida Pública Mobiliária Federal Interna e Mercado Aberto, Novembro/2004, p. 6.)

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Dessa forma, a estimativa total de despesa do PPA passou de R$ 1.546,7 bilhões para R$ 1.553,9 bilhões. Entretanto, qual é a credibilidade das previsões de gasto público num contexto em que um elevado superávit primário tornou-se um dogma político? Superávit Primário O projeto de lei de revisão não traz nenhuma novidade em relação ao debate sobre o superávit primário. 20 Dado que a meta para o superávit primário em 2004 foi elevada de 4,25% para 4,5% do PIB, a dúvida que paira é se o Ministério da Fazenda manterá o mesmo patamar para os próximos anos do PPA. Assim, mesmo que atingisse uma coerência técnica ideal, a implementação do PPA é constrangida, na prática, pelas escolhas de governo que hierarquizam as diversas políticas públicas do Estado. O investimento público em infra-estrutura, apesar de ser um dos desafios

do PPA 2004/2007, revela-se baixo em relação às outras despesas da União, principalmente em relação aos gastos com a dívida pública.21 A tabela II mostra que, até o dia 03/12, os gastos com investimentos em 2004 representavam menos de 1% em relação ao total da despesa do governo. No mesmo período, o percentual de execução relacionado à dívida pública atingiu 14,92% em relação à dotação total liquidada da máquina até o dia 03/12. Ou seja, a tabela coloca em evidencia a baixa atuação da União na área de investimentos. Neste contexto, qualquer defesa do aumento do superávit primário – e, como conseqüência, a diminuição do papel do Estado na economia – não pode ser considerada uma decisão política acertada. Quando o planejamento é posto em execução, observa-se que a dimensão econômica subjuga as demais que compõem a estratégia de desenvolvimento do PPA. Nesse contexto, fica a impressão

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Execução de algumas funções do orçamento da União - 2004, em R$ (acumulado até 03/12)* GND Segurança Pública Assistência Social Previdência Social Saúde Educação Cultura Habitação Saneamento Gestão Ambiental Agricultura Organização Agrária Indústria Energia Transporte Desporto e Lazer Encargos Especiais**

Autorizado

Liquidado

3.064.178.594,00 13.240.173.915,00 163.078.477.106,00 33.593.618.102,00 14.998.403.483,00 424.988.079,00 568.613.168,00 184.960.845,00 1.526.587.872,00 12.187.946.607,00 2.619.707.844,00 3.604.337.336,00 728.233.096,00 4.429.123.906,00 383.716.265,00 316.110.246.184,00

2.040.730.237,00 11.518.731.757,00 131.492.712.838,00 27.784.638.371,00 11.097.358.823,00 189.449.043,00 180.630.723,00 7.844.447,00 776.650.347,00 6.161.980.561,00 1.447.563.945,00 972.405.027,00 273.577.153,00 1.972.447.418,00 115.452.727,00 217.990.309.104,00

% execução em relação % execução em relação ao à dotação autorizada total da dotação liquidada*** 66,60% 0,44% 87,00% 2,51% 80,63% 28,66% 82,71% 6,06% 73,99% 2,42% 44,58% 0,04% 31,77% 0,04% 4,24% 0,00% 50,87% 0,17% 50,56% 1,34% 55,26% 0,32% 26,98% 0,21% 37,57% 0,06% 44,53% 0,43% 30,09% 0,03% 68,96% 47,51%

* Orçamento Fiscal e da Seguridade Social ** Os valores dos programas relativos ao refinanciamento da dívida pública (907- Refinanciamento da Dívida Interna e 908- Refinanciamento da Dívida Externa) foram retirados desse grupo de despesa, pois não representam gastos efetivos do governo. Como referem-se à rolagem de dívida, esses valores são meramente contábeis dentro do orçamento. *** O valor total liquidado até o dia 03/12 era R$ 458.799.903.263,00. Excluiu-se os valores dos programas 907- Refinanciamento da Dívida Interna e 908- Refinanciamento da Dívida Externa, dado que esses programas correspondem apenas à rolagem da dívida pública. Fonte: Consultoria de Orçamento/ CD e Prodasen

20 Refere-se ao Setor Público Consolidado (governos Federal, Estadual, municipal, estatais e Banco Central). De acordo com o Banco Central, o resultado primário do setor público corresponde ao déficit nominal (Necessidade de Financiamento do Setor Público - NFSP) menos os juros nominais incidentes sobre a dívida interna e menos os juros externos, em dólares, convertidos pela taxa média de câmbio de compra. In: Banco Central – Finanças Públicas – Brasília, junho de 2002, pag. 92. 21 Os investimentos em infra-estrutura são mencionados no desafio n° 19 da orientação estratégica do PPA: “Impulsionar os investimentos em infra -estrutura de forma coordenada e sustentável.”

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de que o ajuste fiscal é posto hierarquicamente acima de qualquer outro desafio do plano. Dessa forma, a visão de desenvolvimento do governo fica submetida ao receituário ortodoxo. Na prática, exagera-se na convicção de que um elevado superávit primário do setor público é fundamental para a manutenção da credibilidade frente aos agentes financeiros e, por sua vez, dá-se menos ênfase ao fato de os gastos do governo constituírem uma variável Exagera-se na fundamental para o convicção de que um aquecimento da demanelevado superávit da agregada do país. 22 A primário do setor ortodoxia arma-se justapúblico é mente desse raciocínio fundamental para a para posicionar-se a favor manutenção da de um superávit primácredibilidade frente rio cada vez maior. Para aos agentes os ortodoxos, na atual financeiros conjuntura, os gastos do governo, por estimularem a economia, geram também inflação e inibem a queda dos juros. Ocorre que, para fortalecer o dogma em torno do superávit, minimiza-se o fato de que a credibilidade do governo também é diretamente proporcional à transparência em relação ao uso dos recursos públicos, ao combate à corrupção, à agilidade do Poder Judiciário, à solidez dos marcos regulatórios (instituições) e à defesa da democracia, entre outros. Qualquer desenvolvimento desejado na relação do Estado com a sociedade não pode descartar as políticas universais, os direitos das minorias e o respeito às diferenças. Na orientação estratégica do plano, a concepção de desenvolvimento do governo Lula é apresentada de forma ampla. Porém, quando o PPA se materializa por meio das leis orçamentárias, a estratégia de desenvolvimento com ênfase no acesso a direitos e garantia de liberdades é minimizada em favor dos compromissos com a

dívida pública. A tabela III mostra, de forma clara, como essa trajetória se reflete na execução de alguns grupos de despesas do orçamento da União. Até o dia 03/12, o total liquidado pela União foi de R$ 458,80 bilhões, como mostra a tabela III. Desse valor, a execução relativa à função Educação era de R$ 11,10 bilhões (2,42% do total liquidado). Outras áreas que também são termômetros da atenção dispensada pelo setor público à área social apresentam, da mesma forma, uma baixa participação em relação ao valor total liquidado. Até o dia 03/12, a execução da função Cultura foi de R$ 0,19 bilhão (0,04% do total liquidado) e a execução da função Habitação atingiu R$ 0,18 bilhão (0,04% do total liquidado). A despeito do valor nominal executado nessas áreas, esses percentuais demonstram, no mínimo, que, se existe prioridade na alocação de recursos públicos pelo Estado, a preferência não é dada à área social. Os baixos valores de execução nas áreas sociais e de infra-estrutura revelam uma trajetória de dependência do Estado brasileiro em relação ao pagamento da dívida pública. Embora o governo Lula tenha sido eleito para, entre outros objetivos, valorizar a área social, não há constrangimento na hora de abraçar os pressupostos da ortodoxia econômica. Não importa nem mesmo se o itinerário da política adotada implica baixos investimentos em estradas, escolas, saneamento urbano, casas populares, etc.

Reforma Agrária Entre o Plano Plurianual 2004/2007 e o Projeto de Lei de Revisão do PPA, observa-se que ocorreram alterações tanto em termos de recursos como em relação às metas físicas dos programas e ações no que diz respeito à reforma agrária. Em relação, por exemplo, à ação Consolidação e Emancipação de Assentamentos da Reforma Agrária do programa Desenvolvimento Susten-

22 A demanda agregada tem quatro componentes: consumo, investimento e aquisições do governo e exportações líquidas.

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tável na Reforma Agrária, nota-se que houve uma alteração no produto da ação: a unidade “assentamento” foi substituída, para 2005, pela unidade “família”. Essa mudança alterou a meta de 161 assentamentos para 19,2 milhões de famílias. Como existem somente cerca de 760 mil famílias assentadas em todo país, percebe-se que houve um erro de comando por parte dos técnicos do Ministério do Planejamento. O responsável pelo planejamento do INCRA confirmou o equívoco e declarou que já solicitou a alteração. Independentemente do erro, o montante de recursos destinados originalmente, que era de R$ 36,7 milhões, subiu para R$ 153,2 milhões. A revisão propõe, portanto, um acréscimo de 316% no total de recursos destinados a essa ação. A ação Consolidação e Emancipação de Assentamentos da Reforma Agrária visa ainda consolidar os assentamentos e emancipar projetos e, portanto, busca proporcionar instrumentos que possam auxiliar a população assentada a se organizar em unidades produtivas rurais e se colocar competitivamente no mercado local ou regional. A falta de eficácia desse tipo de ação estimula os argumentos de que a reforma agrária é uma favela rural, não só no sentido da pobreza existente nos projetos de assentamentos, mas também pelo fato de seus beneficiários ficarem dependentes dos recursos estatais. O atual governo elegeu-se com o compromisso de recuperar esses projetos e promover uma emancipação responsável da população assentada desde o governo militar. No programa Assentamentos Sustentáveis para Trabalhadores Rurais não houve nenhuma alteração de impacto entre o PPA 2004/2007 e o projeto de lei de revisão do Plano Plurianual. A principal ação desse programa, Obtenção de Imóveis para Reforma Agrária, manteve a meta de adquirir 2,9 milhões de hectares de terras e, para isso, prevê um gasto de R$ 2,9 bilhões, em quatro anos. Os grandes obstáculos para a execução dessa ação e o alcance de sua meta são os segmentos conservadores da política nacional, 8

como a Bancada Ruralista, e a aristocracia agrária regional e suas ramificações que se estendem pelos outros órgãos do Estado, como o Judiciário local. Esses laços políticos ou familiares, somados à falta de capacitação de alguns técnicos do governo em relatar as vistorias com clareza e nos termos legais, estimulam a apresentação de liminares e a impetração de outras ações judiciais no sentido de procrastinar a conclusão dos processos de desapropriação. Observou-se uma outra alteração nesse mesmo programa na ação Projetos de Assentamento Rural Implantação. No PPA sancionado, não haviam sido colocadas as metas e, ao defini-las (392 mil famílias beneficiadas), o governo precisou igualmente rever os recursos então alocados. Na lei original, foram destinados R$ 722,1 milhões para essa ação, que com a nova meta subiram para R$ 1,6 bilhão, ou seja, houve um acréscimo de 126% em relação à lei sancionada. No programa Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Semi-Árido (Conviver), a ação Construção de Cisternas, desenvolvida, até então, pelos ministérios do Meio Ambiente e da Integração Nacional, sofreu algumas alterações com o projeto de lei de revisão do PPA. A ação agora passará a ser implementada apenas pelo Ministério do Meio Ambiente e foi definida uma meta (18.585 cisternas) que não havia sido apontada anteriormente. Porém, os recursos, que eram de R$ 1,5 milhão, foram diminuídos para R$ 1,1 milhão. Essa ação, cuja paternidade pode ser atribuída à Articulação do Semi-Árido (ASA), composta por 750 organizações sociais, está sendo implementada por meio de convênios com o Estado e é vista como um dos mais bem elaborados programas de convivência com o clima do semi-árido brasileiro. O projeto de construção de um milhão de cisternas já conquistou reconhecimento nacional e respeito internacional. Até o momento, a ASA, que promove a construção de cisternas a partir da produção de conhecimento local e agrega novas possibilidades de trabalho e renda ao homem e à mulher bedezembro de 2004


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neficiados, já edificou cerca de 55.725 cisternas na região do semi-árido, beneficiando mais de 299 mil pessoas. Nesse sentido, o governo deveria assumir para si o compromisso de implementar o projeto de um milhão de cisternas não como uma política pública, mas como um compromisso junto à sociedade, provendo os recursos e facilitando a ação da ASA. O PPA 2004/2007, O que falta ainda, na que traduz o planejanossa avaliação, é o mento do governo nos governo conectar as quatro anos de mandaações dos vários to no que diz respeito à programas para questão da terra, sofreu otimizar os recursos poucas alterações nestes financeiros e dois anos finais de exehumanos cução. Em geral, as alterações foram no sentido de dar maior transparência ao plano ou de acréscimo de metas e recursos. Os programas agrários têm uma interface muito forte com as questões de meio ambiente e quase não se descolam da questão agrícola. O que falta ainda, na nossa avaliação, é o governo conectar as ações dos vários programas para otimizar os recursos financeiros e humanos.

Segurança Alimentar Para esta análise, dentre os vários programas que poderiam compor um orçamento de segurança alimentar, selecionamos algumas ações do Orçamento Federal consideradas estruturais, isto é, que impactam os beneficiários no sentido de transformar suas vidas. Os programas selecionados são os seguintes: Acesso à alimentação, Alimentação Saudável, Assentamentos Sustentáveis para Trabalhadores Rurais e Proambiente e Previdência Social. A ação Pagamento de Salário Maternidade – Área Rural constitui um direito que, após muita pressão das organizações de mulheres trabalhadoras rurais, foi acatado e desponta como uma das principais ações que beneficiam a grande podezembro de 2004

pulação de mulheres que vivem na área rural. No Plano Plurianual 2004/2007, essa ação tinha uma meta de atender mais de 112 mil mulheres com um orçamento de R$ 637,7 milhões. Essa ação não sofreu qualquer alteração com o projeto de revisão do PPA, que foi encaminhado pelo Executivo ao Congresso Nacional. Portanto, a previsão anterior foi mantida. Para este ano, foram atribuídos R$ 137,9 milhões e a execução foi de 100%. Curiosamente, para 2005 esse orçamento foi diminuído para R$ 69,7 milhões, ou seja, houve uma redução de recursos da ordem de 49,4%, para atender 24 mil mulheres rurais. A ação Apoio a Projetos de Melhoria das Condições Socioeconômicas das Famílias, do programa Acesso à Alimentação, recebeu R$ 679,7 milhões no PPA 2004/2007 para beneficiar 6 mil famílias. No projeto de revisão, a meta foi reduzida para 2,7 mil famílias e, igualmente, seus recursos foram reduzidos para R$ 251,6 milhões para os anos de 2004 a 2007. Essa redução está dissociada da proposta original do governo Lula, pois famílias menos favorecidas só podem ter a sua segurança alimentar e nutricional garantida com a garantia de acesso aos alimentos. Por outro lado, foram incluídas duas ações importantes: a ação Construção de Cisternas para Armazenamento de Água, com o objetivo de construir 175,6 mil cisternas com um orçamento de R$ 241 milhões, e a ação Apoio à Instalação de Bancos de Alimentos, que é considerada uma ação emergencial cuja meta é instalar 126 Bancos com um orçamento de R$ 14,1 milhões. De um modo geral, os Bancos de Alimentos são instalados em áreas urbanas para atender aos segmentos marginalizados, como populações de rua, ou empobrecidos, como famílias faveladas. A construção das cisternas tem por objetivo atender às famílias rurais do semi-árido brasileiro, que buscam formas criativas de conviver com a seca. A ação Apoio ao Monitoramento da Situação Nutricional da População Brasileira, do programa Alimentação Saudável, está garantida no projeto de revisão 2004/2007. O orçamento cres9


ceu de R$ 4,8 milhões para R$ 16,5 milhões. Esse aumento de recursos deve-se ao fato de a ação ter passado de “apoio” para “monitoramento”, ou seja, de ela ter adquirido um novo status no programa. Espera-se que isso se reflita na execução orçamentária de 2005, já que em 2004 a execução foi zero. Essa ação é importante, pois poderá gerar dados para a construção de indicadores que serão utilizados para elaborar políticas públicas com maior eficácia no combate das carências nutricionais de grandes segmentos da população brasileira. A ação Apoio ao Desenvolvimento de Atividades Familiares Sustentáveis em Microbacias do Semi-Árido, do programa Proambiente, sofreu um corte significativo em seu orçamento e metas na revisão do PPA 2004/2007. Para esse período, havia sido definida uma meta de mil projetos apoiados com R$ 556,3 mil. No projeto de revisão 2004/2007, a meta foi reduzida para 503 projetos e o orçamento para R$ 100 mil, deixando-nos curiosos para saber como o governo poderá promover o desenvolvimento rural integrado por meio do controle social, da gestão participativa, do ordenamento territorial, de mudanças qualitativas no uso da terra e da prestação de serviços ambientais com tão insignificante soma de recursos numa de suas ações de peso. A ação Concessão de Crédito-Instalação às Famílias Assentadas se mantém para os anos seguintes até 2007, a fim de atingir a meta de 257,6 mil famílias com um orçamento de R$ 1,8 bilhão. É necessário considerar que esse crédito é o primeiro que as famílias assentadas recebem para construírem suas casas e se estabelecerem no lote concedido nos projetos de reforma agrária. Um dos grandes gargalos deste e dos governos anteriores é executar plenamente o orçamento aprovado pelo Congresso Nacional. Esse fato se explica pela necessidade de o Executivo realizar o superávit primário para pagar os juros e os serviços da dívida pública. Até setembro, o superávit acumulado no ano estava em R$ 46,6 10

bilhões, soma que representa muitas vezes o orçamento de alguns ministérios cujos programas têm um impacto direto na segurança alimentar da população. O Inesc mantém, como uma de suas propostas, a aprovação de uma legislação que torne impositivo o Orçamento da União. Atualmente, o Congresso Nacional aprova um orçamento apenas indicando despesas que o Executivo pode ou não executar. O que a sociedade civil reivindica é que o orçamento aprovado seja executado e que possíveis alterações de metas ou recursos no decorrer do ano sejam aprovadas pelo Congresso. Dessa forma, os parlamentares poderão, antes de aprovar o orçamento para o ano seguinte, convocar o Executivo para explicar a execução realizada. Assim, teremos, de fato, um controle do legislativo sobre os recursos públicos executados pelo Executivo e a sociedade poderá acompanhar essa prestação de contas do governo.

Direitos Humanos O projeto de lei de revisão do PPA 2004/ 2007 propõe a alteração de alguns programas e a inserção de poucas novidades relacionadas às temáticas da área dos Direitos Humanos. Nas três secretarias ligadas à Presidência da República (Secretaria Especial de Direitos Humanos, Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial e Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres), observa-se que houve propostas de alterações. Porém, essas propostas representam muito pouco para uma mudança real do quadro de violação dos Direitos Humanos no Brasil. Dos 13 programas da Secretaria Especial de Direitos Humanos, quatro não tiveram aumento orçamentário. Chama atenção o fato de não haver qualquer acréscimo para as ações relativas às políticas publicas para idosos, proteção de adoção e combate ao seqüestro internacional e assistência a vítimas e testemunhas ameaçadas. Além disso, foi proposta a exclusão das atividades Concessão do Prêmio Direitos Humanos (sob dezembro de 2004


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a justificativa de que ela se tornará uma ação não-orçamentária) e Funcionamento da Rede Nacional de Informação e Combate à Tortura (que já estaria contemplada nas demais ações do programa). Por outro lado, o projeto de lei de revisão pretende incluir a ação Proteção a Defensores de Direitos Humanos, que visa atingir 305 defensores entre 2004 e 2007 com uma previsão orçamentária de R$ 3.657.600,00. O acréscimo de Foi proposta, também, programas e ações a inclusão da ação Resem prol dos Direitos gate da Cidadania da Humanos no PPA é Criança e do Adolescenrelevante; contudo, te em Situação de Risco. questiona-se o O projeto de lei de remotivo de não haver visão propõe, ainda, a inserção de políticas inclusão das seguintes públicas que dêem operações especiais: continuidade aos Apoio à Mobilização programas de para o Registro Civil de direitos humanos já Nascimento e Forneciexistentes mento de Documentação Civil Básica; Apoio a Serviços de Orientação Jurídica Gratuita, de Mediação de Conflitos e de Informações em Direitos Humanos (balcões de direito); e Indenização a Anistiados Políticos-Militares. Para a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, o projeto de lei de revisão traz acréscimos para o programa Combate à Violência Contra as Mulheres ao incluir as ações Capacitação de Profissionais para Atendimento a Mulheres em Situação de Violência, que pretende capacitar 12.998 profissionais com uma previsão orçamentária de R$ 3.655.060,00, 23 e Apoio a Projetos Educativos e Culturais de Prevenção à Violência Contra a Mulher, cujo objetivo é apoiar 56 projetos com um montante total de R$ 2.811.585,00.24 O projeto de revisão propôs aumentar a estimativa de recursos para o programa Incentivo à Autonomia Econômica das Mulheres no Mundo do Trabalho. A nova pre-

visão é de R$ 15.091.877,00. O PL de revisão propõe a criação de um novo programa chamado Educação para a Diversidade e Cidadania, que pretende combater desigualdades étnico-raciais, de gênero, de orientação sexual, geracionais, regionais e culturais no espaço escolar. O programa contempla oito ações e prevê recursos de R$ 226.768.859,00, a maior parte dos quais, R$ 105.231.046,00, destina-se à ação Apoio ao Desenvolvimento de Atividades Educacionais, Culturais e de Lazer em Escolas Abertas nos Finais de Semana. O projeto de lei de revisão traz também um novo programa, Identidade e Diversidade Cultural, que pretende garantir que os grupos e redes de produtores culturais, responsáveis pelas manifestações culturais características da diversidade, tenham acesso aos mecanismos de apoio, promoção e intercâmbio cultural entre as regiões e grupos culturais brasileiros. A proposta desse programa é importante pela amplitude de sua abrangência (gênero, orientação sexual, grupos etários e étnicos da cultura popular). A previsão orçamentária de R$ 15.570.814,00 e a expectativa de apoio a 54 manifestações culturais também não devem ser minimizadas. No entanto, o programa ainda é muito limitado. Para se ter uma idéia, apenas as paradas do orgulho GLBT alcançam o mesmo número de manifestações propostas para os quatro anos em um ano apenas. Nesse sentido, conclui-se que o governo federal carece de um esforço político maior. Os recursos para atender a essa demanda da sociedade ainda são insuficientes. O acréscimo de programas e ações em prol dos Direitos Humanos no PPA é relevante; contudo, questiona-se o motivo de não haver inserção de políticas públicas que dêem continuidade aos programas de direitos humanos já existentes, como o programa nacional de direitos humanos II, que parece ter sido absolutamente desconsiderado pela Secretaria Especial de Direitos Humanos. Essa falta de conexão com os

23 Recursos previstos para 2004 a 2007. 24 Idem 2.

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programas antigos dificulta a percepção da associação entre o discurso político e a efetivação das políticas públicas. Se a SEDH afirma que o PNDH II está defasado, que abra, então, o debate para a sua melhoria ou a construção de um novo programa, mas que faça isso logo, pois hoje as ações não apresentam qualquer intersecção. O “Brasil sem Homofobia” oferece um bom exemplo. Sua introdução apresenta a seguinte informação oficial: “O Plano Plurianual – PPA 2004/2007 definiu, no âmbito do programa Direitos Humanos – Direitos de Todos, a ação denominada Elaboração do Plano de Combate à Discriminação contra Homossexuais”. Essa ação, no entanto, não existe no PPA. Isso significa que o documento “Brasil sem Homofobia” é apenas uma carta de intenções e não um conjunto de políticas públicas para esse segmento, pois além de não existir no PPA já aprovado, o governo federal não apresentou qualquer emenda na revisão para efetivar esse programa. Será que querem reavivar a obra shakesperiana “Muito barulho por nada”? Seria esse documento apenas um produto de marketing?

Política Socioambiental O projeto de lei de revisão do PPA 2004/2007 contempla várias mudanças em relação aos programas em que a “água” é o foco da preocupação. No total, é possível identificar 20 programas com ações diretamente relacionadas com a água, sendo que três novos programas foram propostos no PPA 2004/2007 pelo projeto de revisão. O programa Vigilância Ambiental em Saúde visa contribuir para o enfrentamento dos problemas de saúde da população brasileira decorrentes das mudanças ambientais. Estão incluídas aqui a criação do “sistema nacional de vigilância ambiental em saúde” e a promoção da “vigilância ambiental em saúde relacionada à qualidade da água para consumo humano”. Em tese, esse programa deve complementar três outros programas já existentes: os programas Saneamento Rural, Saneamento Ambiental Urbano e Drenagem Urbana Sustentável. 12

O programa Saneamento Rural, por exemplo, visa ampliar a cobertura e melhorar a qualidade dos serviços de saneamento ambiental em áreas rurais. Entre as mudanças propostas pelo PL de revisão está a inclusão da ação “Abastecimento de Água e Instalações Hidrossanitárias em Escolas Públicas Rurais - Água na Escola”. Outra mudança diz respeito à especificação das comunidades remanescentes de quilombos, dos assentados em áreas de assentamento rural e dos moradores de reservas extrativistas como parte do público-alvo da ação “Implantação, Ampliação ou Melhoria do Serviço de Saneamento em Áreas Rurais, em Áreas Especiais e em Localidades com População Inferior a 2.500 Habitantes para Prevenção e Controle de Agravos”. O programa Litoral Brasileiro Sustentável almeja contribuir para o ordenamento e regulação do uso da orla marítima e atuar sobre as atividades portuárias e a disposição de resíduos em águas marinhas. Outro programa, Qualidade Ambiental – Procontrole, visa contribuir para a redução dos danos ambientais derivados dos chamados processos produtivos. Nesse programa, foram acomodadas as ações de licenciamento e de monitoramento ambiental das atividades da indústria de petróleo e gás e dos setores de energia elétrica e transporte. É sobre ele que pesam as maiores pressões para a liberação de obras como gasodutos, estradas, hidrelétricas e hidrovias, entre outras obras de infra-estrutura. Entre os programas que sofreram modificações na proposta do projeto de revisão, destacase o programa Probacias. Esse programa visa promover a regulamentação e a forma de uso das águas das bacias hidrográficas. A principal mudança promovida no programa foi a inclusão das bacias estaduais e municipais nas ações “Elaboração dos Planos de Bacias Hidrográficas” e “Fomento à Criação de Comitês e Agências em Bacias Hidrográficas”, sintonizando o programa com a Lei 9.984, de 17/07/2000, que dispõe sobre a criação da Agência Nacional de Águas (ANA) e não restringe a sua atuação aos rios de domínio da União. Nesse programa, estão incluídas dezembro de 2004


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também as ações “Implantação de Sistema de Cobrança pelo Uso dos Recursos Hídricos em Bacias Hidrográficas” e “Outorga do Direito de Uso dos Recursos Hídricos de Domínio da União” e a formação e manutenção de um “Cadastro Nacional de Usuários de Recursos Hídricos”, entre outras medidas. Esse programa merece uma atenção especial, um controle social cuidadoso, especialmente pela perspectiva mercantil que ele comporta e pelos riscos de corrupção, privatização “mascarada” da água e desvio de finalidade dos recursos financeiros arrecadados. Outro programa que recebeu propostas de modificação foi o intitulado Revitalização de Bacias Hidrográfica em Situação de O programa Cadastro Vulnerabilidade e De- Nacional de Usuários gradação Ambiental. de Recursos Hídricos merece atenção Esse programa visa reverter o processo de especial, um controle crescente degradação social cuidadoso, pela das nascentes e margens perspectiva mercantil que ele comporta e dos cursos de rios e depelo risco de mais áreas de preservaprivatização da água ção permanente e as ameaças de escassez (quantidade e/ou qualidade) resultantes da ocupação desordenada e predatória do território, da poluição gerada pelos grandes centros urbanos e industriais e dentro dos mesmos e da distribuição irregular das chuvas, como ocorre no semi-árido brasileiro. Foram incluídas no programa as ações “Apoio a Projetos de Controle da Poluição por Resíduos em Bacias Hidrográficas com Vulnerabilidade Ambiental” e “Gerenciamento Integrado das Atividades Desenvolvidas em Terra na Bacia do Rio São Francisco”, esta última em parceria com o Global Environment Facility – GEF, agência de financiamento ligada ao Banco Mundial. O programa inclui ainda obras de preservação, revitalização e recuperação, controle de processos erosivos, reflorestamento de nascentes, margens e áreas degradadas, implantação de banco de dados ambientais e gerenciamento integradezembro de 2004

do de atividades desenvolvidas em terra na bacia do rio São Francisco. O projeto de lei de revisão propõe também alterações no programa Integração de Bacias Hidrográficas, que tem como objetivos explícitos suprir as demandas de água na região Nordeste e atuar nas situações de conflito social em torno da água geradas pelo crescimento descontrolado da demanda e pela degradação ambiental. O Projeto de lei de revisão inclui nesse programa a ação “Integração do Rio São Francisco com as Bacias do Nordeste Setentrional - Eixo Norte e Leste” (resultante da fusão de duas outras ações). O PL inclui também a ação “Reassentamento da População Residente em Áreas Afetadas pela Integração do Rio São Francisco com as Bacias do Nordeste Setentrional - Eixos Norte e Leste” e, por último, uma ação voltada para a realização de um estudo relativo à “Integração entre as Bacias do Rio Tocantins e São Francisco”, o próprio nome da ação. Atualmente, está ocorrendo um debate acalorado entre, de um lado, os ministérios do Meio Ambiente e da Integração e, de outro, o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e as entidades da sociedade civil articuladas no Fórum Permanente de Defesa do São Francisco. Enquanto no governo observa-se uma clara intenção de avançar na implementação das obras previstas no Projeto de Transposição do Rio São Francisco (que no PPA 2004/2007 tem orçamento previsto de R$ 9,33 bilhões), cedendo a pressões de empreiteiros e empresários do setor agrícola e da carcinicultura, que visualizam uma oportunidade de expandir seus negócios no “corredor de infra-estrutura” a ser criado, entre as entidades do fórum e do comitê da bacia predomina a visão de que a revitalização desse rio e o apoio às atividades produtivas e de auto-sustentação das comunidades locais devem ser priorizados. O projeto de lei de revisão redefiniu os indicadores utilizados no monitoramento do programa Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Semi-Árido, concebido para promover a 13


sustentabilidade hídrica, econômica, social e ambiental do semi-árido nordestino. Além disso, foi incluída a ação “Recuperação de Poços Públicos”, que prevê a recuperação, desobstrução e substituição de componentes dos sistemas adutores, a instalação de dessalinizadores e o aproveitamento do sal gerado. O programa inclui também as ações “Capacitação para a Produção Alternativa de Alimentos para o Semi-Árido” e “Estruturação e Organização de Arranjos Produtivos Locais”. Entre outras, o projeto de lei de revisão deseja incluir no programa Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Semi-Árido as seguintes ações: “Construção de Cisternas”, “Fomento a Projetos Produtivos” e “Apoio a Projetos de Saneamento Integrado em Municípios com População de até 20 Mil Habitantes na Região do Semi-Árido, sob a coordenação do Ministério das Cidades. Essas ações vêm sendo acenadas pelo governo federal como “moeda de troca” pela aprovação da transposição do São Francisco. Outro programa, Conservação, Uso Racional e Qualidade da Água, visa reforçar as condições para o aumento dos investimentos na área de infra-estrutura, sobretudo nos sistemas de irrigação e de abastecimento urbano e industrial, considerando a necessidade da “conservação e uso sustentável da água”. Além da mudança de atributos de algumas ações orçamentárias, o projeto de lei de revisão propõe a inclusão das ações “Gerenciamento Integrado e Sustentável dos Recursos Hídricos Transfronteiriços na Bacia Do Rio Amazonas”, executada em parceria com o GEF, e “Estudo Para a Gestão Sustentável do Sistema Aqüífero Guarani”, entre outras. Não é demais lembrar que o Aqüífero Guarani é a maior reserva de água fresca subterrânea do mundo, com uma extensão aproximada de 1.190.000 Km 2 (superfície maior que a da Espanha, França e Portugal juntos), 71% dos quais dentro do território brasileiro, a qual instituições financeiras como o Banco Mundial consideram “um recurso estratégico de água potável no Cone Sul”. 14

Política Indigenista e Populações Quilombolas No tocante aos povos e comunidades indígenas, o projeto de lei de revisão do PPA 2004/ 2007 manteve as “ações orçamentárias” do governo do presidente Lula distribuídas por dois programas específicos, complementados por “atividades” de saúde e apoio à gestão territorial presentes em três outros programas. No total, são 48 ações sob a responsabilidade direta de cinco diferentes ministérios. O programa Identidade Étnica e Patrimônio Cultural dos Povos Indígenas é o que apresenta maiores inovações nessa revisão. O projeto de lei de revisão do PPA propõe a criação de várias ações novas, todas sob a responsabilidade da FUNAI: (i) Instalação de Casas de Cultura nas Aldeias Indígenas; ii) criação do Sistema Censitário das Populações Indígenas; (iii) Manutenção de Casas de Cultura em Aldeias Indígenas; (iv) Gestão e Disseminação de Informações acerca da Temática Indígena ; e, finalmente, uma ação que visa permitir à FUNAI um melhor Acompanhamento da Execução e Apoio Técnico às Ações de Saúde Indígena, a cargo da Fundação Nacional de Saúde - FUNASA. Outra mudança ocorrida no programa Identidade Étnica e Patrimônio Cultural dos Povos Indígenas foi a migração da ação Realização dos Jogos dos Povos Indígenas para dentro do programa, sob a responsabilidade do Ministério dos Esportes. Foi proposta, também, a exclusão da ação Sistema de Informação em Saúde Indígena, cuja execução encontrava-se sob a responsabilidade da FUNASA, no Ministério da Saúde. Quanto ao programa Proteção de Terras Indígenas, Gestão Territorial e Etnodesenvolvimento, a proposta de revisão do PPA 2004/ 2007 não traz mudanças significativas. O que chama mais a atenção na proposta de revisão desse programa é o crescimento do papel protagonista do Ministério do Meio Ambiente no apoio à gestão ambiental em terras indígenas, que passa a compartilhar com a FUNAI a resdezembro de 2004


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ponsabilidade pela implementação da ação “Conservação e recuperação da biodiversidade em terras indígenas”. Analisado o projeto de lei de revisão do PPA 2004/2007 à luz do “acordo de cooperação técnica” em discussão nos órgãos e ministérios acima mencionados — cujo objetivo é “estabelecer as bases político-institucionais de cooperação entre os participantes para promover e O projeto de lei de apoiar ações de segurevisão do PPA 2004/ rança alimentar e 2007 traz uma nutricional e de desenesperança em volvimento sustentável relação à formulação como foco em atividae execução de uma des produtivas” —, papolítica pública rece estar se processanespecífica para as do no atual governo comunidades de um novo fortalecimenremanescentes de to do papel da FUNAI quilombos na gestão da política indigenista governamental, que passaria a assumir novamente — senão de fato pelo menos no discurso — o papel de agência articuladora das ações da política indigenista governamental. O nível de diálogo e interação estabelecido até o momento pelo governo federal com o movimento indígena organizado mostra, infelizmente, que se mantém firme e enraizada tanto a visão tutelar no campo político e assistencial, quanto a perspectiva clientelista nas ações de caráter social. Até o projeto de revisão do PPA 2004/2007, pode-se dizer que não havia nenhuma proposta de política específica para a população quilombola no Brasil. Havia, sim, ações dispersas em seis programas, espalhadas por seis diferentes ministérios. Essa fragmentação da política dificultava, inclusive, compor o que poderíamos chamar de um “orçamento próquilombolas”. O projeto de lei de revisão do PPA 2004/ 2007 traz uma esperança em relação à formulação e execução de uma política pública especídezembro de 2004

fica para as comunidades de remanescentes de quilombos. Trata-se da criação do programa Brasil Quilombola, que congrega nove ações orçamentárias sob a responsabilidade dos ministérios da Saúde, Educação e Desenvolvimento Agrário e da Secretaria Especial da Igualdade Racial da Presidência da República, cabendo a esta o papel de coordenação. O Ministério de Desenvolvimento Agrário é o que detém a maior parcela dos recursos destinados à regularização fundiária das terras ocupadas pelas comunidades quilombolas. Outra inovação na política do governo federal para as comunidades quilombolas é a criação de uma ação específica, dentro do Ministério da Saúde, de “Atenção à Saúde das Populações Quilombolas” e de uma outra voltada para a promoção do “Etnodesenvolvimento das Comunidades Remanescentes de Quilombos” no Ministério da Cultura. Resta saber agora se, em relação às comunidades quilombolas, não se repetirão a fragmentação e os conflitos de interesse verificados ao longo da última década, como ocorreu no tocante à política indigenista, com desgastes de instituições e pessoas envolvidas, ocasionando sérios problemas para os chamados “beneficiários” das políticas e programas governamentais. Participaram desta edição os assessores Edélcio Vigna e Ricardo Verdum; os assistentes Álvaro Gerin, Caio Varela e Lucídio Bicalho; o estagiário Bruno do Valle. Contribuiu Ivone Maria da Silva Melo

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Participação social no PPA 2004/2007: discurso forte e escuta fraca Os fóruns estaduais de consulta do PPA 2004/2007, realizados nos 26 Estados e no Distrito Federal em 2003, ameaçaram ser o prelúdio de uma experiência política inédita no relacionamento entre o Estado e a sociedade civil no Brasil. Naquele momento, vislumbrou-se a possibilidade de se dar início a uma participação social contínua nas tomadas de decisão relativas à alocação de recursos do orçamento da União. Entrementes, esse processo não alcançou o que se esperava dele. Já se sabia, antecipadaEssa participação, no mente, que a efetividade das consultas estaduais seria entanto, simplesmente etérea como ferramenta canão ocorreu, isto é, paz de influenciar a alocação inexistiu qualquer orçamentária da União de fórum ampliado que forma imediata. A sociedaescutasse as de civil iniciou sua particicontribuições da pação nos fóruns estaduais sociedade civil à do PPA 2004/2007 consciproposta de lei de ente de que as discussões se revisão do PPA 2004/ dariam em torno das linhas 2007 gerais do Plano Plurianual, ou seja, sabia-se que o objeto dos debates eram as diretrizes gerais do plano e que os programas estariam excluídos das discussões. Assim, as consultas debruçaram-se sobre a “Orientação Estratégica do PPA”, formada por megaobjetivos e seus desafios. Enquanto, de um lado, a Secretaria Geral da Presidência organizava uma arena política em que as diferentes compreensões a respeito da realidade brasileira eram expostas nos fóruns estaduais, de outro lado o Ministério do Planejamento preocupava-se com os detalhes do Projeto de Lei do PPA que seria entregue aos parlamentares no dia 31 de agosto de 2003. Em outras palavras, enquanto os Fóruns Estaduais eram realizados, os programas, as ações, as metas físicas e as dotações orçamentárias do plano já estavam praticamente definidos nos órgãos e unidades orçamentárias do governo. Entretanto, o motivo para o desalento em relação ao resultado das consultas dá-se em razão de que, até a divulgação da Carta da Inter-Redes25, nada de concreto ocorreu em 2004 com vistas a dar continuidade à pro-

messa de gestão participativa do plano. Esperava-se que a inclusão da sociedade civil no processo de revisão do PPA ocorresse como uma etapa imediatamente posterior à conclusão do processo de consulta. O texto da lei do PPA 2004/2007 determina que qualquer alteração ou exclusão de programa constante do Plano Plurianual deve ser proposta pelo Poder Executivo por meio de projeto de lei de revisão anual ou projeto de lei específico, assim como a inclusão de um novo programa. Além disso, a redação do PPA determina também que o Poder Executivo deveria ter promovido a participação da sociedade civil organizada na avaliação e alterações do Plano Plurianual. Essa participação, no entanto, simplesmente não ocorreu, isto é, inexistiu qualquer fórum ampliado que escutasse as contribuições da sociedade civil à proposta de lei de revisão do PPA 2004/ 2007.26 E, como se não bastasse o descaso com a lei, a proposta de revisão ainda excluiu a ação denominada “Processo Participativo da Elaboração e da Gestão do Plano”, que previa a alocação de recursos para a realização de processos de participação do PPA. Dessa forma, as elites políticas e burocráticas ignoram que a concretude da democracia participativa, como arranjo complementar à democracia representativa, deve ser entendida como a provisão de espaços institucionalizados capazes de garantir a materialização das decisões políticas dos representantes da sociedade em alocações orçamentárias com possibilidades reais de execução. Nesse sentido, a expectativa de que a sociedade civil participasse da gestão do Plano Plurianual em 2004 tornou-se uma grande frustração política daquilo que deveria ser um marco histórico no relacionamento entre Estado e sociedade na definição de novos arranjos institucionais de poder. E, mesmo que haja uma retomada do processo participativo em 2005, as possíveis modificações no PPA 2004/2007 só teriam impacto no orçamento a partir de 2006, último ano do governo Lula. Ou seja, o governo perdeu a possibilidade de fortalecer a interlocução com a sociedade civil organizada. Lucídio Bicalho Assistente de Política Fiscal e Orçamentária

25 PPA e a construção coletiva da participação social 26 A participação da sociedade civil está prevista no art. 12 da lei que estabelece o PPA 2004/2007.

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dezembro de 2004


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