9 Publicação do Instituto de Estudos Socioeconômicos - Inesc • Ano V • nº 9 • março de 2006 E D I TOR I A L
Pseudo-verdades e a mercantilização da cidadania.
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avaliação da execução orçamentária de 2005 denota que o distanciamento entre a economia e a política é cada vez maior. E com vantagens para a primeira que se impõe como alicerce e esteio de um governo eleito justamente com o discurso de priorizar o social. A política econômica, ortodoxa e financista, tem sido a razão da impossibilidade de se priorizar as políticas sociais que promovam, minimamente, o resgate da imensa dívida social brasileira. Procuram nos vender a idéia de que só pela economia poderemos combater as desigualdades. Em outras palavras o mercado que resolve tudo. Não há mais espaço para a política. Isso é uma pseudo-verdade. Questionar essa pseudo-verdade, imposta pela corrente neoliberal e que mercantiliza a vida, é papel fundamental da sociedade civil. Governar para o mercado e não para a maioria da população brasileira é desconsiderar o recado das urnas em 2002. Nunca o sistema financeiro apresentou lucros tão exorbitantes. E graças a esse quadro, o Brasil continua como um dos recordistas mundiais em desigualdade. Embora tenha havido uma pequena inversão no processo de concentração de renda, ele ainda é insuficiente para promover crescimento e inclusão social significativos. Neste primeiro número de 2006 do Boletim Orçamento e Políticas Públicas, o Inesc avalia que, por ser um ano de eleições majoritárias, a sociedade civil organizada deve se articular para inserir na agenda dos futuros candidatos os direitos humanos, econômicos, sociais, culturais e ambientais como norteadores de políticas e da gestão administrativa. O combate às desigualdades deve estar na centralidade da construção da Nação e não o mercado e a mercantilização da cidadania e da vida.
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Dilema Político: entre o econômico e o social As análises que o Instituto de Estudos Socioeconômicos - Inesc vem desenvolvendo nos seus boletins ao longo dos três anos do governo Lula têm demonstrado que os gastos públicos oriundos dos recursos orçamentários são insuficientes para enfrentar os problemas cruciais existentes e para resgatar a imensa dívida social do país. Para piorar, muitos programas e ações propostos e aprovados no Plano Plurianual - PPA 2004/2007, ficaram para trás, não foram executados ou o foram de forma insuficiente. Em contrapartida, o pagamento dos serviços da dívida e o superávit primário foram regiamente executados. Este último ultrapassando com folga as metas estabelecidas nas Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDO) do período.
Além da política econômica, altamente restritiva ao desenvolvimento sustentável, podem-se constatar outros pontos de estrangulamento para que se promova o combate às desigualdades sociais. A opção que o governo federal fez de combate à fome e às desigualdades por meio de políticas públicas de caráter focalizado, em detrimento daquelas de caráter universal, “Para entender a tem se mostrado insuficiinaceitável extensão entes para, pelo menos, todo 0,573, car nas estruturas geradocorrespondente ao ras de iniqüidades. nosso Gini, não Os dados da Pesquisa precisa ser gênio: Nacional por estamos mais Amostragem de Domicípróximos da perfeita lio - PNAD/IBGE, publiiniqüidade do que da cados em 2005, e analiperfeita igualdade” sados em um estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV)1, foram motivo de euforia no governo e na mídia por revelarem que a miséria no Brasil está em queda, que o número de pobres diminuiu e, mais, que a “desigualdade desencalhou”. Os dados de renda domiciliar, captados pela PNAD e trabalhados pela FGV, revelam que de 2003 para 2004 houve melhoria na distribuição de renda e diminuição do número de pessoas pobres, na medida em que dois milhões de brasileiros saíram da condição de muito pobres ou indigentes. “A taxa de variação anual de miséria captada em 2004 (-8%), quando comparada a períodos selecionados, é superior àquela observada no período todo de 1993 a 2004 (-2,9%)...” 2 Essa velocidade da 1 2 3
variação na queda da miséria dá ao autor do estudo a certeza de que os resultados encontrados são robustos e que o país consegue, pela primeira vez nos últimos anos, modificar a vida das pessoas em situação de miserabilidade. Para Marcelo Néri, isso se deve aos aumentos reais do salário mínimo, que, além de beneficiar os trabalhadores que o recebem, causam impacto nos benefícios a ele referenciados, tais como aposentadorias, pensões, benefícios de prestação continuada e ainda — e principalmente — aos programas de transferência de renda. Com relação à desigualdade, é bom lembrar que o estudo trata apenas da questão da desigualdade e alta concentração de renda no país. Os resultados da mesma pesquisa apontam para uma diminuição dessa concentração. A análise da queda do índice de Gini de 0,585 para 0,573 mostra um aspecto redistributivo, considerado um evento raro no histórico das séries sociais brasileiras. Os dados mostram também que os 10% mais ricos tiveram diminuição na apropriação da renda de 2003 para 2004 e que os 50% mais pobres se apropriaram de uma parcela maior da renda. Apesar do reconhecimento de que os dados apontam para avanços tanto no combate à miséria quanto à desigualdade de renda, o próprio autor diz que “para entender a inaceitável extensão do 0,573, correspondente ao nosso Gini, não precisa ser gênio: estamos mais próximos da perfeita iniqüidade do que da perfeita igualdade” 3. Fica o desafio de saber se a baleia da desigualdade que, segundo Néri parece que desencalhou, conseguirá nadar em ritmo favorável e necessário à grandeza do problema.
“Miséria em Queda: Mensuração, Monitoramento e Metas”, coordenado por Marcelo Néri, disponível no sítio www.fgv.br/ibre/cps Idem, página 2. Idem, pagina15.
Orçamento e Políticas Públicas Orçamento uma publicação do INESC - Instituto de Estudos Socioeconômicos com a parceria de Fundação Avina. Tiragem: 1.500 exemplares - End: SCS - Qd, 08, Bl B-50 - Salas 431/441 Ed. Venâncio 2000 - CEP. 70.333-970 - Brasília/DF - Brasil - Fone: (61) 212 0200 - Fax: (61) 212 0216 - E-mail: protocoloinesc@inesc.org.br - Site: www.inesc.org.br - Conselho Diretor: Caetano Araújo, Eva Faleiros, Fernando Paulino, Gisela de Alencar, Iliana Canoff, Nathalie Beghin, Paulo Calmon, Pe Virgílio Uchoa, Pr. Ervino Schimidt. Colegiado de Gestão: Iara Pietricovsky, José Antônio Moroni. Assessores: Alessandra Cardoso, Caio Varela, Edélcio Vigna, Eliana Graça, Francisco Sadeck, Jair Barbosa Júnior, Luciana Costa, Márcio Pontual, Ricardo Verdum, Selene Nunes. Assistentes: Álvaro Gerin, Lucídio Bicalho. Instituições que apóiam o Inesc: Action Aid// CCFD// Christian Aid// EED// Fastenoffer// Fundação Avina// Fundação Ford// Fundação Heinrich Boll// KNH// Norwegian Church Aid// Novib// Oxfam// Solidaridad. Jornalista responsável: Jair Barbosa Júnior (DF 976 JP) Esta publicação utiliza papel reciclado
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Orçamento e Políticas Públicas
Não resta a menor dúvida de que houve no governo Lula um aumento real do salário mínimo, uma transferência de renda por meio do Programa Bolsa- Família para mais de oito milhões de famílias e uma diminuição da taxa de desemprego formal. Mas é também verdade que os bancos apresentaram lucros recordes em 2005, que atingiram a cifra de R$ 28,3 bilhões4, “Na gestão da política monetária no Brasil, fruto da transferência de na definição das suas renda por meio da taxa de juros mais alta do mun- metas e instrumentos, está presente uma do, sustentada com recurassimetria de poder sos públicos. Com certeem favor do capital za, os muito ricos não ficaram mais pobres. Os es- financeiro, sancionada pelo governo Lula” tudos precisam, portanto, ser aprofundados para que se chegue a resultados conclusivos sobre as origens dessas mudanças captadas pela PNAD. Alguns estudiosos, como Marcio Pochmann e Wilson Cano, fazem severas críticas a esse estudo da FGV, mostrando inclusive o uso ideológico e político que, no caso, é feito dos dados, tanto pelo governo quanto pelo autor. Para eles, as estatísticas mostram e escondem muita coisa. Depende de quem as analisa. A questão essencial para o aprofundamento desse debate é que tanto a erradicação da pobreza quanto o combate à desigualdade exigem uma visão multidimensional sobre tais questões. Olhar para esses fenômenos somente com o viés da distribuição de renda é não enfrentar as causas que as estruturam. A pobreza e a desigualdade, em especial na América Latina, têm raízes em fatores como as discriminações de gênero, raça, etnia, de condição socioeconômica, de orientação sexual, religiosa, entre outras. Dessa forma, não é possível falar de pobreza, miséria e desigualdade sem considerar essas outras condicionantes na formulação e na execução de políticas. Em outras palavras, a construção de políticas públicas deveria ter como princípio estruturante a definição dos direitos econômicos, soci4 5 6
ais, culturais e ambientais contidos nos DHESCA. Outro aspecto importante que estrangula o combate à desigualdade é a falta de vontade política do governo no enfrentamento dos interesses dominantes há mais de 500 anos no país. A correlação de forças políticas ainda é muito desigual, não permitindo o enfrentamento de algumas questões cruciais. A opção por programas focalizados, por exemplo, não altera os interesses da estrutura econômica, social e política vigentes. O caso da reforma agrária parece emblemático. A escolha política em privilegiar as ações de fortalecimento da agricultura familiar, assim como concentrar os assentamentos em áreas públicas em detrimento das áreas desapropriadas, pode estar na raiz da pouca atenção dada às ações efetivas de promoção da reforma agrária, que levariam à democratização do acesso à terra. Seria falta de força política para enfrentar o latifúndio? Segundo dados apresentados por José Juliano de Carvalho Filho5, “das 127,5 mil famílias consideradas assentadas em 2005, apenas 45,7% o foram em áreas de reforma agrária. O restante, 54,3%, refere-se a assentamentos ou reordenação de assentamentos em terras públicas”. Ele afirma ainda que, de acordo com informações do Banco de Dados de Luta pela Terra, apenas 25% das famílias foram assentadas em terras desapropriadas durante os três anos do governo Lula. Para José Juliano, “a reforma agrária no governo Lula não tem capacidade de alterar a estrutura fundiária. Sua política é inócua ao latifúndio. Não atinge o monopólio da terra”. A questão da correlação de forças políticas se observa também na definição de parâmetros macroeconômicos. Segundo Ricardo Carneiro6, “não há, por fim, como não concluir que na gestão da política monetária no Brasil, na definição das suas metas e instrumentos, está presente uma assimetria de poder em favor do capital financeiro, sancionada pelo governo Lula”. Para ele, vários aparelhos importantes do Estado brasileiro foram capturados pelo capital financeiro. Carneiro cita como exemplo a atual composição da diretoria do Banco Cen-
Levantamento do Banco Central com dados de 104 instituições financeiras Artigo intitulado “O governo Lula fracassou na reforma agrária”, publicado pelo informativo Letra Viva, MST Informa nº107– 20/01/2006. Artigo intitulado “Por que o governo Lula capitula ante os interesses dominantes”, publicado em www.agenciacartamaior.uol.com.Br, no dia 8/11/2005. Ricardo Carneiro é economista da UNICAMP.
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tral do Brasil: “... ela expressa um loteamento de cargos entre as principais instituições financeiras privadas brasileiras. Por que não concluir, a partir dessa constatação, que a prática de juros tão elevados no Brasil está de alguma forma relacionada à entrega do Banco Central aos banqueiros?” 7 A análise desenvolvida por Ricardo Carneiro nos leva a concluir que são esses interesses dominan- O neoliberalismo tem nos jogado na cilada tes que ditam as regras da intensidade ou não da do pensamento único e de que a economia aplicação das receitas neoliberais no Brasil. Ele se define sozinha, sem os parâmetros da ressalta que outros países política, que não (Argentina, Chile, temos mais a Venezuela, como exemdiferença entre a plos na América Latina), esquerda e a direita, com heranças mais malque tudo isso são ditas que as nossas e com conceitos usados diferenças estruturais pelos jurássicos. também marcantes, souberam aproveitar as condições externas e se saíram muito melhor do que o Brasil. Até mesmo os que estão em situação estrutural pior do que a brasileira tiveram melhores desempenhos de suas economias. Outra conclusão que se impõe é a de que a autonomia da economia em relação à política é só para “inglês ver”. Trata-se de um discurso para encobrir a existência de interesses políticos que dominam as decisões econômicas. E que cabem em qualquer plataforma de campanha. Só que não podemos esquecer que a experiência dos três anos de governo Lula demonstra como os compromissos assumidos na campanha não puderam ser cumpridos exatamente pelas restrições impostas pela política econômica. O modelo de desenvolvimento proposto é incompatível com o compromisso de enfrentar as questões sociais. O neoliberalismo tem nos jogado na cilada do pen-
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samento único e de que a economia se define sozinha, sem os parâmetros da política, que não temos mais a diferença entre a esquerda e a direita, que tudo isso são conceitos usados pelos jurássicos. Já não explicam a realidade. O que fica é um perigoso fosso entre o mundo da política e o mundo econômico com a hegemonia do segundo. O mundo neoliberal pretende desqualificar a política como o espaço de construção dos pactos e mudanças necessárias à efetivação dos paradigmas dos direitos humanos. Para aqueles que têm um compromisso com a construção de um outro mundo, fica o desafio de romper com essas amarras. Elas nos obrigam a pensar que a inflação tem que ser de tal nível e que os juros têm que ser altos para conter o consumo. Que tem de haver contenção dos gastos públicos, superávit primário, diminuição da relação dívida/Produto Interno Bruto - PIB - senão o mercado fica nervoso, o risco país sobe, e aí será o caos. Esse círculo vicioso, que aprisiona o pensamento e não permite criar alternativas, precisa ser rompido. O ano de 2006 vai exigir dos movimentos sociais atenção especial, pois o discurso do pensamento único, de só termos uma saída, da necessidade da autonomia da economia com relação à política, vem ganhando força e se instala cada vez mais como dominante. É imprescindível exigir que o modelo de desenvolvimento, com a sua conseqüente proposta de política econômica, seja colocado em discussão pelos candidatos nas próximas eleições. Para nós, do Inesc, fica o desafio, neste Boletim, de inserir na nossa análise sobre a execução do orçamento de 2005 considerações sobre as mudanças que julgamos urgentes em cada política pública acompanhada. É preciso que se diga o que é realmente fundamental mudar na política de direitos humanos, de crianças e adolescentes, de meio ambiente e questão indígena, de reforma agrária e de segurança alimentar.
Artigo intitulado “Por que o governo Lula capitula ante os interesses dominantes”, publicado em www.agenciacartamaior.uol.com.Br, no dia 8/11/2005. Ricardo Carneiro é economista da UNICAMP.
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Orçamento e Políticas Públicas T abela 1
Execução do Orçamento da União em 2005 por Função- Exceto Refinanciamento da Dívida Pública* (Fechado em 21/01/2006) Função
Dotação Inicial
LEGISLATIVA JUDICIARIA
4.253.845.897 11.673.635.411
4.359.106.715 12.323.334.087
3.806.780.934 10.674.599.871
(subelemento) 3.806.780.934 10.674.598.981
2.668.191.248 12.016.437.719 14.586.613.384 3.378.053.293 1.437.801.594 15.961.400.416 180.307.473.922 36.684.557.843 12.149.702.035 17.309.499.813 584.669.367 1.047.377.781 2.679.303.620 720.555.355 196.907.038 2.512.078.823 3.867.239.533 11.729.712.974 4.024.094.592 1.482.398.036 3.879.897.417 972.751.695 766.260.787 8.186.588.113 631.346.916 293.240.865.339 21.618.689.006 0 670.567.948.967
2.758.989.686 10.873.096.521 16.574.264.268 3.773.532.830 1.707.926.921 16.061.704.394 189.575.391.612 39.000.368.842 13.056.635.466 18.408.140.932 621.162.145 1.052.190.781 3.162.243.529 720.555.355 191.255.823 2.716.319.025 3.900.791.898 12.007.181.901 4.100.226.592 1.864.811.608 3.677.111.981 999.063.132 819.266.091 8.881.435.405 685.109.961 306.275.327.888 18.828.142.695 0 698.974.688.084
2.330.828.210 9.085.397.242 15.422.406.287 3.018.051.167 1.528.533.613 15.806.089.728 188.505.524.167 36.483.267.398 12.716.915.604 16.187.695.350 494.098.178 828.656.979 2.111.421.447 569.926.911 88.265.176 1.992.018.223 3.274.462.858 8.328.364.486 3.583.243.450 1.494.760.420 2.843.570.724 481.222.355 470.954.353 6.722.945.939 423.069.816 257.683.731.963 0 1.080 606.956.803.928
2.330.828.210 9.085.397.242 15.422.398.740 3.018.051.167 1.528.533.622 15.806.087.874 188.505.524.820 36.483.267.398 12.716.914.013 16.187.695.350 494.098.178 828.656.979 2.111.421.447 569.926.911 88.265.176 1.992.004.466 3.274.462.389 8.327.650.275 3.583.195.450 1.494.755.484 2.843.568.076 481.222.355 470.954.353 6.722.945.939 423.069.816 257.683.419.486 0 0 606.955.695.132
ESSENCIAL A JUSTICA ADMINISTRACAO DEFESA NACIONAL SEGURANCA PUBLICA RELACOES EXTERIORES ASSISTENCIA SOCIAL PREVIDENCIA SOCIAL SAUDE TRABALHO EDUCACAO CULTURA DIREITOS DA CIDADANIA URBANISMO HABITACAO SANEAMENTO GESTAO AMBIENTAL CIENCIA E TECNOLOGIA AGRICULTURA ORGANIZACAO AGRARIA INDUSTRIA COMERCIO E SERVICOS COMUNICACOES ENERGIA TRANSPORTE DESPORTO E LAZER ENCARGOS ESPECIAIS RES. DE CONTINGENCIA NÃO APLICÁVEL TOTAL
Autorizado
Empenhado
Liquidado
Liquidado /Aut. (%)
Liquidado em relação ao total Liquidado 87,33% 0,63% 86,62% 1,76% 84,48% 83,56% 93,05% 79,98% 89,50% 98,41% 99,44% 93,55% 97,40% 87,94% 79,54% 78,76% 66,77% 79,10% 46,15% 73,33% 83,94% 69,36% 87,39% 80,16% 77,33% 48,17% 57,48% 75,70% 61,75% 84,13% 0,00% 86,84%
0,38% 1,50% 2,54% 0,50% 0,25% 2,60% 31,06% 6,01% 2,10% 2,67% 0,08% 0,14% 0,35% 0,09% 0,01% 0,33% 0,54% 1,37% 0,59% 0,25% 0,47% 0,08% 0,08% 1,11% 0,07% 42,46% 0,00% 0,00% 100,00%
* O valor que corresponde ao refinanciamento é meramente contábil, pois se refere a rolagem de títulos da dívida pública. Ou seja, não representa despesas públicas de fato. O valor do refinanciamento (liquidado)em 2005 foi de R$ 499.835.036.073,8 (R$ 499,85 bilhões) Fonte: SIAFI/SELOR Elaboração: INESC
Os grandes números da execução de 2005 Em 2005, o valor liquidado no Orçamento da União foi de R$ 606,96 bilhões.8 Ao se analisar a execução orçamentária em 2005 por Função, observa-se que do total autorizado pelo Legislativo, o governo gastou 86,84%. Esse percentual, apesar de ser maior do que o verificado em 2004 (84,08%), 8
é menor do que o nível de 2003 (88,01%). Como em anos anteriores, a função “Saneamento” tem a menor taxa de execução entre as demais. Somente 46,15% dos recursos autorizados pela lei orçamentária foram executados em 2005: R$ 88,26 milhões, o que representa apenas 0,01% do valor total liquidado. Essa relação atingiu a baixíssima proporção de 26,05% em 2003 e foi de 39,58% em 2004. A função “Assistência Social”, cujas despesas são obrigatórias, apresenta
Os valores que contam da execução do orçamento da União, mas que correspondem ao refinanciamento de títulos da Dívida Pública, isto é, à rolagem da dívida, foram retirados do valor total executado. Esses valores, apesar de aparecerem na contabilidade oficial não representam despesas de fato, pois são meramente contábeis dentro do orçamento.
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uma execução próxima dos 100%, equivalente a 2,60% do total liquidado. Já na “Educação”, que também possui despesas obrigatórias, só 87,94% dos recursos autorizados foram aplicados, ou 2,67% do total liquidado. Vale observar a concentração existente em duas funções em relação ao percentual de execução: Previdência Social, com 31,06%; e Encargos Especiais, com 42,46% do total. Impressiona também a ínfima participação das outras funções em relação ao total executado. Os Encargos Especiais, depois de retirado o montante referente ao Refinanciamento da Dívida, incluem, além dos gastos com pagamento de juros e amortização das dívidas interna e externa, as despesas com transferências constitucionais e legais a estados e municípios, além de ressarcimentos e indenizações. Ao abrir a função por programa, observa-se que cerca de 54% do total gasto em encargos especiais foi com serviços da dívida interna e externa. Apenas 35% dos recursos dessa função foram para atender às transferências. Em valores constantes, isto é, corrigidos pela inflação, o orçamento executado em 2005, R$ 606,96 bilhões, superou os montantes executados
nos dois primeiros anos do governo Lula: foram executados R$ 562,19 bilhões em 2003 e R$ 581,19 bilhões em 2004.9 Constata-se que grande parte do aumento da execução orçamentária ao longo dos anos advém do crescimento dos gastos com Despesas Correntes. Nessa categoria econômica, estão incluídos os gastos com pessoal, previdência, despesas com a manutenção da Administração Pública, e também, os gastos com juros e encargos da dívida pública. Ano após ano, o valor liquidado do Orçamento da União destinado ao pagamento de juros e encargos da dívida pública é cada vez maior: enquanto em 2003 foram R$ 74,85 bilhões, em 2005 foram liquidados R$ 89,83 bilhões. Esses gastos representaram 13,31% do total liquidado no Orçamento da União em 2003; atingiram 13,68% em 2004 e alcançaram, em 2005, o patamar mais elevado nos últimos três anos: 14,80%. A indignação com esse quadro é indisfarçável justamente porque o pagamento de juros a uma pequena elite detentora dos títulos da dívida pública, na prática, é um verdadeiro mecanismo de concentração de renda. Segundo estudo realizado por
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Execução do Orçamento da União em percentual do PIB Categoria Econômica e Grupo de Natureza da DespesaExceto Refinanciamento da Dívida Pública Categoria Econômica/GND DESPESAS CORRETES PESSOAL E ENCARGOS SOCIAIS JUROS E ENCARGOS DA DIVIDA OUTRAS DESPESAS CORRENTES DESPESAS DE CAPITAL INVESTIMENTOS INVERSOES FINANCEIRAS AMORTIZACAO RESERVAS RESERVA DE CONTINGÊNCIA TOTAL
2003 Liquidado
2004 Liquidado
2005 Liquidado
24,67% 5,07% 4,22% 15,37% 7,04% 0,41% 1,51% 5,12% 0,00% 0,00% 31,71%
24,89% 5,06% 4,21% 15,62% 5,89% 0,62% 1,22% 4,06% 0,00% 0,00% 30,78%
26,83% 4,87% 4,65% 17,31% 4,57% 0,90% 1,13% 2,55% 0,00% 0,00% 31,40%
* O valor correspondente ao refinanciamento da Dívida Pública é meramente contábil dentro do orçamento público, pois se refere a rolagem de títulos da dívida pública. Ou seja, não representa despesas públicas de fato. O valor do refinanciamento (liquidado) em 2005 foi de R$ 499.835.036.073,8 (R$ 499,85 bilhões) Fonte: SIAFI/SELOR - Siga Brasil; Banco Central Elaboração: INESC
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Valores corrigidos pelo IPCA médio, tendo o ano de 2005 como o Ano Base. Entrevista concedida por Marcio Pochmann ao repórter Igor Felippe Santos e publicada no Diário Vermelho do PCdoB - http://www.vermelho.org.br/diario/ 2006/0208/0208_pochmann.asp
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Orçamento e Políticas Públicas
Pochmann10, 80% dos títulos da dívida pública são de propriedade de 20 mil clãs de famílias. A pesquisa também mostra que cinco mil clãs de famílias controlam 40% da riqueza nacional. Já em relação à categoria econômica “Despesas de Capital”, observa-se que o total liquidado tem diminuído desde 2003. Como mostra a tabela, as Despesas de Capital eram 22,20% do total liquidado em 2003 e atingiram 14,57% em 2005. Entre os grupos de gastos que contribuíram para a diminuição das Despesas de Capital, chama atenção a redução dos valores destinados à amortização de títulos da dívida pública: a quantia relativa executada passou de 16,15%, em 2003, para 8,12% em 2005. Ou seja, tem diminuído o montante investido para reduzir o valor do principal da dívida pública. Longe de representar um avanço significativo, a execução orçamentária inscrita no grupo “Investimentos” ainda é muito baixa para um país com tamanhas carências sociais e de infra-estrutura. Só a título de comparação, na esfera federal, o superávit
primário do Governo Central (Tesouro, Previdência e Banco Central) ficou em R$ 52,48 bilhões — 2,72% do PIB. Os gastos relativos ao grupo de investimentos alcançaram apenas a soma de R$ 17,33 bilhões, o que corresponde a 0,9% do PIB. Como se vê, o superávit primário do Governo Central é muito superior aos gastos que são destinados aos investimentos no Orçamento da União. Em compensação, este foi mais um ano em que a “economia” feita para pagar os serviços das dívidas interna e externa, ou seja, o superávit primário ultrapassou as expectativas. Segundo dados do Banco Central, o do Setor Público Consolidado (governo federal, estados, municípios e empresas estatais) superou a meta de 4,25% prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO, atingindo 4,84% do PIB. Ou seja, estava previsto economizar R$ 82,75 bilhões e o ano foi fechado com o montante de R$ 93,50 bilhões. Foram quase R$ 11 bilhões a mais para pagar os juros da dívida. Na prática, o elevado superávit primário passou
Setor Público Consolidado* Dívida Líquida X Superávit Primário
* Os dados aos quais fazem referência este texto e as tabelas temáticas estão disponibilizadas no site do Inesc: www.inesc.org.br Fonte: SIAFI/SELOR - Siga Brasil; Banco Central Elaboração: INESC
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Superávit Primário do Governo Central em 2005 - milhões
*Tesouro Nacional, Previdência Social (RGPS) e Banco Central Fonte: STN - Resultado do Tesouro Nacional Elaboração: INESC
a ter uma função psicológica de transmitir tranqüilidade ao mercado financeiro. Contudo, tem-se mostrado ineficaz como mecanismo capaz de fazer diminuir significativamente a relação Dívida Líquida/PIB. É o que mostra o gráfico abaixo. Essa relação, que era 51,7% do PIB em 2004, fechou o último ano em 51,6% do PIB. Isso significa que essa proporção ficou praticamente estável. 11 Assim, apesar de o governo economizar para baixar a dívida, os juros astronômicos não permitem que ela sofra redução significativa. Aqui é importante lembrar da disputa entre o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, e a Ministra Chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, quando ela se voltava contra a inexistência de recursos para aplicação nos programas sociais e para os investimentos em infra-estrutura. O resultado foi uma gastança, no final do ano, que levou a registrar dezembro como o único mês do ano com déficit primário da ordem R$ 4 bilhões. No mesmo mês de 2004, o resultado negativo ficou por volta dos R$ 3,7 bilhões. Nada como a vontade política de gastar, ou a proximidade de ano eleitoral. A concentração de gastos nos últimos dias do ano
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é uma constante na administração pública brasileira, o que nos leva a refletir sobre a qualidade da gestão desses recursos. É impossível se gastar bem tanto dinheiro no afogadilho do final do ano. A tabela, que compara os gastos dos programas em dois períodos, ilustra bem o que aconteceu em 2005. Durante os dois meses de novembro e dezembro, houve uma inversão total no nível de execução dos programas. Em 31 de outubro, havia um pouco mais de 42% dos programas com execução na faixa de 0 a 15%. Já em 21 de janeiro, refletindo a despesa até dezembro, essa mesma faixa foi verificada em apenas 21% do total dos programas. Tal fenômeno se observa em todos os níveis: há uma diminuição dos percentuais dentro dos patamares de baixa execução e um aumento para os dos de alta execução. O ultimo intervalo, com execução acima de 90%, passou de 2% para 20%. Constata-se, portanto, que a concentração de liberação de recursos no final do ano é evidente, comprometendo a eficácia dos programas e das ações governamentais. Isso tem a ver com o nível de contingenciamento dos recursos orçamentários. Um dos mecanismos utilizados para se alcançar o superávit primário é o contingenciamento de dotações orçamentárias rea-
Os valores nominais do Superávit Primário e da Dívida Líquida do Setor Público encontram-se disponíveis no site do INESC.
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Execução Orçamentária da União 2005 - Número de programas por percentual de execução % de Execução
0% a 15% 15,1% a 30% 30,1% a 45% 45,1% a 60% 60,1% a 75% 75,1% a 90 % mais de 90% TOTAL
N° de programas 31/10/05 189 61 73 55 52 11 5 446
% sobre n° total de programas
21/01/06 94 12 21 45 66 117 91 446
31/10/05 42,38% 13,68% 16,37% 12,33% 11,66% 2,47% 1,12% 100,00%
21/01/06 21,08% 2,69% 4,71% 10,09% 14,80% 26,23% 20,40% 100,00%
Fonte: SIAFI/SELOR - Siga Brasil; Consultoria de Orçamento e Prodasen. Elaboração: INESC
Análise da execução de políticas selecionadas lizado logo no início do ano. O Decreto n.º 5.379, de 2005, retirou do limite de gasto do governo federal o montante de R$ 15,9 bilhões. Sobretudo no decorrer do segundo semestre, e mais intensamente no mês de dezembro, foram editados decretos de liberação dos limites de gastos. Direitos Humanos A perspectiva com a qual o Inesc tem trabalhado ao longo dos últimos anos é a dos direitos humanos, econômicos, sociais, culturais e ambientais (DHESCA). Esse olhar é válido não só no sentido da produção de análises, mas, principalmente, da sua intervenção em articulações, fóruns e redes que tratam da defesa dos direitos humanos. Quando se analisam as políticas sob a ótica orçamentária, é fundamental considerar a perspectiva da conquista e da defesa dos direitos dos cidadãos e cidadãs. É lógico que neste boletim não se abordam todos os programas que compõem o II Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH), mas algumas políticas nele contidas. Não se faz também uma análise exaustiva de todos os programas de cada política acompanhada pelo Inesc e sim são eleitos aqueles que são estruturantes dentro de cada uma delas12. Para efeito deste boletim, chamamos a atenção 12
para a situação da execução orçamentária de três secretarias especiais, com status de ministério, localizadas na Presidência da República. São elas: de Direitos Humanos, de Políticas para as Mulheres e de Promoção da Igualdade Racial. Para o desenvolvimento da política nacional de direitos humanos, a Secretaria Especial de Direitos Humanos teve autorização para gastar, em 2005, R$ 82,45 milhões, dos quais foram executados 73,92%. Aqui não trataremos dos programas que dizem respeito aos direitos das crianças e adolescentes. Esses serão abordados, exclusivamente, a partir de uma análise da política de educação. Dos dez programas restantes, o que mais recebeu recursos foi o de Direitos Humanos, Direitos de Todos, no entanto com uma execução bem aquém do que era esperado, 62,76%. Dentro desse programa, algumas ações chamam a atenção. A ação do Disque Direitos Humanos, proposta para receber denúncias de violação dos direitos humanos, além de contar com a irrisória quantia de R$ 50 mil, não gastou um centavo sequer. Já a de Assistência Técnica para Ouvidoria de Polícia e Policiamento Comunitário, que recebeu o maior volume de recursos do programa — R$ 8,25 milhões —, apresentou uma baixa execução: 68,48%.
Para uma análise mais aprofundada do PNDH II o INESC pretende publicar uma Nota Técnica ainda neste semestre. *Os valores foram deflacionados pelo IPCA/ IBGE, índice oficial de inflação do governo.
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Apesar de ter executado a quase totalidade dos recursos autorizados (97,64%) e do alarde do caso da irmã Doroty, a ação de Proteção a Defensores de Direitos Humanos não conseguiu impedir novas mortes de pessoas que defendem os direitos humanos no estado do Pará. Não poderia ser outro o resultado, haja vista que a esmagadora maioria dos recursos foi liberada nos últimos meses do ano. Outro programa que merece destaque é o de As mulheres terão Proteção Social à Pessoa que aguardar muito Idosa, cuja única ação de tempo se o governo Apoio a Serviços Integracontinuar a caminhar dos de Prevenção a Vioa passos de tartaruga lência e Maus Tratos conno combate à tra Idosos gastou somendesigualdade de te 32,13% do montante gênero. autorizado. No caso da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, apenas 78,30% dos R$ 24,55 milhões alocados foram gastos. A Secretaria tem sob sua responsabilidade somente cinco programas, sendo que dois deles é de apoio administrativo. Vale a pena analisar o Combate à Violência contra as Mulheres, dada à importância que tem para os movimentos feministas e ao discurso oficial que confere prioridade a essa questão. Do total de R$ 10,13 milhões, foram executados 87,95%. A ação que mais recebeu recursos foi a de Apoio a Serviços Especializados no Atendimento às Mulheres em Situação de Violência e obteve também o maior índice de execução: 94,86%. Em compensação, a ação que vem em segundo lugar no montante de recursos alocados, Capacitação de Profissionais para Atendimento a Mulheres em Situação de Violência, não conseguiu gastar nem a metade do autorizado: 48,05%. Além da violência contra a mulher, chama a atenção o programa de Gestão da Política de Gênero, que, dos minguados R$ 5,155 milhões, só conseguiu gastar 63,53%. Se levarmos em consideração o discurso oficial de que o papel da Secretaria é transversalizar a questão de gênero nas políticas de governo, a quantia é, de fato, irrisória. Contar com a qualificação dos servidores na questão de gênero 10
é fundamental para o êxito das políticas públicas. Não será destinando os pífios R$ 146.256,00, e executando irrisórios R$ 20.609,00 (14,09%), que serão alcançados os objetivos pretendidos. As mulheres terão que aguardar muito tempo se o governo continuar a caminhar a passos de tartaruga no combate à desigualdade de gênero. A Secretaria de Promoção da Igualdade Racial, encarregada de coordenar as iniciativas do governo de combate ao racismo, teve autorização para gastar R$ 20,22 milhões, dos quais executou somente 73,33%. Mais uma vez fica a pergunta: o que daria para fazer com esses parcos recursos para resgatar, ou pelo menos iniciar, o resgate de uma dívida de mais de cinco séculos de discriminações? Ao examinar os dois principais programas a cargo da Secretaria, a situação se agrava. O de Gestão da Política de Promoção da Igualdade Racial teve autorizado o montante de R$ 13,59 milhões, dos quais só 74,71% foram gastos. Destaca-se a ação de Apoio a Iniciativas para a Promoção da Igualdade Racial, que executou 55,60% dos quase R$ 3 milhões autorizados. Mais uma vez, a capacitação dos servidores públicos merece reflexão. Nada foi executado na Capacitação de Agentes Públicos em Temas Transversais. Nesse caso, o que foi dito para o combate à discriminação de gênero vale para o combate ao racismo. Não se executou nada de quase nada, pois a ação recebeu a mísera quantia de R$ 175.400,00. Se considerarmos que os agentes públicos precisam ser colaboradores efetivos no processo de mudança, é essencial investimento nessas ações. O outro programa, Brasil Quilombola, executou 70,52% dos R$ 6,62 milhões alocados. Desse total, R$ 900.000,00 foram totalmente gastos na Capacitação de Agentes Representativos das Comunidades Remanescentes de Quilombos. Já a outra ação que compõe o programa, Fomento ao Desenvolvimento Local para Comunidades Remanescentes de Quilombos, apresentou um índice de execução da ordem de 65,89% do montante alocado. Política Agrária O orçamento da reforma agrária para 2005 foi de R$ 3,339 bilhões e foram executados R$2,884 março de 2006
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bilhões (86,39%). O índice de execução, aparentemente, é bom, mas foram deixados de lado nada menos do que R$ 454,5 milhões. Se esses recursos pudessem ser utilizados para o Grupo B do Pronaf — que atende agricultores familiares, inclusive remanescentes de quilombos, trabalhadores rurais e indígenas, com limite de empréstimo de R$ 500,00 —, poderiam ter sido beneficiadas 909 mil famílias. O programa Assentamento Sustentável de Fica evidente que o Trabalhadores Rurais é Estado precisa considerado o mais imrepensar a política de portante para o processo reforma agrária, uma de reforma agrária, pois vez que qualquer uma de suas ações é a de esforço diante de arrecadar terras. A ação uma demanda Obtenção de Imóveis reprimida há anos Rurais é, também, a que ainda é insuficiente mais recebeu recursos. para recompor o Em 2005, foram déficit social com os alocados R$ 754,7 mitrabalhadores e as lhões e, antes do final do trabalhadoras rurais. ano, já haviam sido executados na sua quase totalidade. Com os protestos dos movimentos sociais de que o governo ainda não havia cumprido a meta estabelecida para o ano, o Ministério do Desenvolvimento Agrário empenhou-se junto ao presidente da República e conseguiu um crédito extraordinário de mais R$ 700 milhões. Do total alocado, 91,39% foram executados. Fica evidente que o Estado precisa repensar a política de reforma agrária, uma vez que qualquer esforço diante de uma demanda reprimida há anos ainda é insuficiente para recompor o déficit social com os trabalhadores e as trabalhadoras rurais. Em um universo de 4,5 milhões de famílias sem acesso à terra, o assentamento de 400 mil a 530 mil famílias significa beneficiar entre 8,89% e 11,78%, respectivamente, do total. Meta insignificante frente ao tamanho do problema fundiário no Brasil. O Programa Nacional de Educação para a Reforma Agrária – Pronera é considerado também, pelos movimentos de defesa da reforma agrária, um dos mais importantes, pois possibilita ao homem e à março de 2006
mulher do campo uma mudança comportamental. Esse programa não pode servir apenas como aprendizado formal, mas deve capacitar pessoas para que se apropriem das novas tecnologias necessárias ao avanço da produção e da cidadania no meio rural. Para ele foram alocados R$ 43 milhões, sendo executados 80,5%. Essa iniciativa tem duas ações: uma que favorece a formação de jovens e adultos e outra que permite a concessão de bolsas de capacitação profissional em assistência técnica. A primeira recebeu R$ 14,56 milhões, dos quais foram executados 99,87%. Já a segunda gastou 91,81% dos R$ 3,7 milhões liberados. Segurança Alimentar Quanto à política de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), foram selecionados os programas de Abastecimento Alimentar, de Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Semi-Árido (Conviver) e de Acesso à Alimentação. Foram considerados principais devido aos seus impactos estruturantes junto aos beneficiários. Esses três programas juntos somam um orçamento de R$ 4,578 bilhões, sendo que o de Abastecimento Alimentar é responsável por 91% da totalidade dos recursos. Em seguida, vem o Conviver com 5% das verbas. O programa Abastecimento Alimentar possui 27 ações, sendo seis administrativas e 21 finalísticas ou com impacto direto sobre as famílias ou indivíduos, incluindo sete de operações oficiais de crédito. Para as ações finalísticas, foram destinados R$ 3,892 bilhões, dos quais foram executados apenas 75,74% dos recursos. Esse total abrange as operações oficiais de crédito que tiveram autorização para gastar R$ 1,482 bilhão e executaram 97,64% desses recursos. O Abastecimento Alimentar é responsável, grosso modo, pela segurança alimentar da Nação. Responde pela formação de estoques públicos, pela sua fiscalização, pela compra de produtos para comercialização, pela aquisição de alimentos provenientes da agricultura familiar e pela operacionalização de estoques estratégicos de segurança alimentar. Entre as diversas ações, duas devem ser mencionadas. A primeira, que trata da formação de estoques públicos, recebeu maior soma 11
de recursos (R$ 1,985 bilhão), dos quais foram executados 57,37%. Esse percentual está abaixo do esperado para uma iniciativa tão importante. A segunda é a de aquisição de produtos da agricultura familiar (PAA). Recebeu R$ 264,1 milhões e executou 97,53%. O programa está cumprindo seu objetivo de incentivar a produção de alimentos pela agricultura familiar, permitindo a compra, sem licitação, de mercadorias, A ação que trata do até o limite de R$ desenvolvimento 2.500,00 por agricultor/ sustentável para os ano. As aquisições destiassentamentos da nam-se à formação de esreforma agrária no toques e à distribuição de alimentos para pessoas em semi-árido é uma das que mais receberam situação de insegurança recursos: R$ 16,8 alimentar. milhões, dos quais O programa Conviver foram executados possui 42 ações finalísticas 82,14%. Essa ação e apenas duas administrapode ser classificada tivas. Para a como estruturante, implementação das ações, em geral, foram destina- pois deveria impactar as relações de poder dos R$ 230,9 milhões, regional, alterando o dos quais foram executaprecário sistema de dos 87,56%. Para as finalísticas, foram alocados segurança alimentar e nutricional existente R$ 210,1 milhões, dos nessa região. quais foram executados 88,16%. A ação que trata do desenvolvimento sustentável para os assentamentos da reforma agrária no semiárido é uma das que mais receberam recursos: R$ 16,8 milhões, dos quais foram executados 82,14%. Essa ação pode ser classificada como estruturante, pois deveria impactar as relações de poder regional, alterando o precário sistema de segurança alimentar e nutricional existente nessa região. Já o programa Alimentação Saudável possui seis ações. Para isso, recebeu R$ 16,6 milhões e executou 85%. Dentre os programas selecionados, esse é o que é mais focado na questão nutricional e alimentar da população. Ações como Apoio a Pesquisas sobre Alimentação e Nutrição, com enfoque na
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recuperação nutricional e alimentação saudável, receberam apenas R$ 3,7 milhões e executaram 96% dos recursos. A que trata de Prevenção e Controle das Carências Nutricionais por Micronutrientes teve R$ 6 milhões e executou 66,34%. A de Promoção de Hábitos de Vida e de Alimentação Saudáveis para Prevenção das Obesidades e das Doenças Crônicas, que contou com R$1,6 milhão e os executou intregralmente, deveria receber maior consideração por parte do Executivo e do Parlamento. O programa Acesso à Alimentação poderia ser conceituado como uma iniciativa de caráter assistencial, já que se encarrega de criar restaurantes populares e distribuir alimentos a grupos populacionais específicos em situação de insegurança alimentar e nutricional, tendo como exceção a construção de cisternas para armazenamento de água. Esse programa recebeu, para as ações finalísticas, uma dotação orçamentária de R$ 154,9 milhões e executou 93,51%. A ação de construção de cisternas foi a com maior soma de recursos, R$ 68,7 milhões, sendo que destes foram executados 93,52%. É importante considerar que essa ação, em particular, tem sido monitorada pela Articulação do Semi-Árido – ASA, que reúne cerca de 700 organizações não-governamentais regionais. Criança e Adolescente Para efeitos deste boletim, não vamos nos ater ao orçamento global para a política de crianças e adolescentes, mas sim à análise do gasto em educação frente ao de transferência de renda direta às famílias. O objetivo é verificar qual é a estratégia do governo no combate às desigualdades sociais que atingem crianças e adolescentes e que prioridade é dada a esses programas. Para tanto, procura-se demonstrar a relação do gasto entre a educação básica, composta pelos programas de Desenvolvimento da Educação Infantil, Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Desenvolvimento do Ensino Médio, e as políticas de transferência de renda às famílias, como o programa Bolsa-Família e as ações de Concessão de bolsas para jovens e crianças, como o Agente Jovem e o Peti,
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assim como os serviços de concessão, manutenção, pagamento e interrupção desses benefícios. Dessa forma, é possível avaliar o nível de gasto do governo com políticas focalizadas de transferência de renda frente às políticas universais de educação que promovem a formação cultural e social e uma melhora na qualidade de vida das crianças e dos adolescentes. Essa é uma luta de vários movimentos sociais e pessoas Dessa forma, é envolvidas na defesa despossível avaliar o nível se grupo social. de gasto do governo O Bolsa-Família é um com políticas programa de transferênfocalizadas de cia de renda destinado às transferência de famílias em situação de renda frente às pobreza, com renda per capita de até R$ 100 políticas universais de educação que mensais/mês, que associa promovem a à concessão do benefício formação cultural e financeiro o acesso aos direitos sociais básicos — social e uma melhora na qualidade de vida saúde, alimentação, edudas crianças e dos cação e assistência social. adolescentes. Essa é O governo Lula unificou uma luta de vários todos os benefícios sociais (Bolsa-Escola, Bolsa- Ali- movimentos sociais e mentação, Cartão Ali- pessoas envolvidas na defesa desse grupo mentação e o Auxílio social. Gás) da administração federal em um único programa. O autorizado em 2005 para os programas de transferência de renda chegou a R$ 7,3 bilhões, sendo que destes, R$ 11,5 milhões foram destinados à Gestão dos programas e Publicidade de Utilidade Pública, consideradas atividades meio. A execução orçamentária dos programas e ações finalísticas selecionadas no ano de 2005 chegou a 95,4%. Já a situação da Educação Básica, composta pelos três programas citados acima, é bem diferente. Para se ter uma idéia, foi autorizada a quantia de R$ 1,4 bilhão, incluindo distribuição de material
didático, transporte escolar e funcionamento das unidades. Além desses três programas, a ação de Apoio ao Desenvolvimento da Educação Básica contribuiu com mais R$ 85,1 milhões. A execução orçamentária do conjunto ficou em cerca de 93,0%. Com a ampliação do número de alunos matriculados no Ensino Fundamental e a carência de escolas para o atendimento da nova demanda, o poder público foi obrigado a alugar novos espaços para o funcionamento de salas de aula adicionais, chamados de “anexos”. Tal fato veio agravar ainda mais os problemas estruturais constatados em nossas escolas, dificultando o cumprimento da exigência legal de um padrão mínimo de qualidade. Para piorar esse cenário, observamos que a execução dos recursos na área de educação foi realizada em sua quase totalidade nos últimos meses do ano. Como, então, enfocar a qualidade de uma política se os recursos que deveriam ser gastos em 12 meses são concentrados no último trimestre do ano? O Bolsa-Família é um dos poucos programas que apresenta desembolsos mensais de execução. É explicita a priorização, por parte do governo, dos programas de transferência de renda frente aos de educação. Vale ressaltar que o governo federal gastou quase 20% a mais em distribuição de bolsas do que em educação básica em 2005. Para 2006, a tendência é ainda mais grave. O programa de Desenvolvimento da Educação Infantil, por exemplo, apresentou uma queda de 65,8% para 2006 em relação a 2005, e o de Desenvolvimento do Ensino Médio registrou uma queda de 63,3% no mesmo período*. Já o Bolsa-Família teve seus montantes incrementados para 2006 — um aumento de aproximadamente 20% em relação a 2005*. Esse aumento está diretamente ligado à migração para o Bolsa-Família do Peti (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil), programa de transferência direta de renda do governo federal para famílias de crianças e adolescentes envolvidos em trabalho precoce. As discussões acerca da migração do Peti para o Bolsa-Família fizeram os movimentos sociais compre-
* Os valores foram deflacionados pelo IPCA/ IBGE, índice oficial de inflação do governo.
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enderem que se trata de um avanço. Isso porque o Bolsa-Família proporciona um maior controle e fiscalização dos gastos públicos por meio de políticas de transferência de renda coordenadas e gerenciadas. Política Indígena e Ambiental Ao considerarmos a íntima relação entre a situação dos povos indígenas no Brasil e o tratamento dado pelo governo aos temas biodiversidade e flo- O programa Nacional restas da agenda de Florestas, também a cargo do MMA, socioambiental, optamos executou 73,03% do por tratá-los de forma intotal autorizado. Em tegrada. Ao lado da degra11 de setembro, sua dação e do avanço da execução estava em mercantilização da natuapenas 8,76%. Ou reza, sintomaticamente seja, mais de 60% do chamada de “recurso” ou total liquidado “capital” natural, os povos indígenas são tratados de aconteceu nos últimos meses do ano. forma generalizada, como um empecilho ao crescimento econômico ou como objeto ou fonte para o mercado de bens e serviços ambientais e produtos derivados da biodiversidade em expansão. O programa de Proteção de Terras Indígenas, Gestão Territorial e Etnodesenvolvimento é um exemplo da falta de prioridade e capacidade de gestão. Em 2005, teve um orçamento total autorizado de apenas R$ 77,742 milhões e acabou liquidando cerca de 72,46% até 21 de janeiro passado. A Fundação Nacional do Índio - Funai teve um baixo desempenho nas seguintes ações: (i) Fomento a Projetos Especiais Voltados à Proteção das Terras e Populações Indígenas, que liquidou 10,46% do irrisório orçamento de R$ 100 mil e (ii) Regularização e Proteção de Terras Indígenas na Amazônia Legal (Programa Piloto), que liquidou 35,61% do orçamento de R$ 7,480 milhões. Mas o baixo desempenho mesmo foi do Ministério do Meio Ambiente - MMA: na ação de Fomento à Gestão Ambiental em Terras Indígenas, liquidou 0,44% do orçamento de R$ 1,5 milhão; na de Fomento a Projetos de Gestão Ambiental dos Povos Indígenas da
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Amazônia (Programa Piloto), liquidou 6,74% do orçamento autorizado de R$ 12,917 milhões. No programa Comunidades Tradicionais também houve problemas, pois foram liquidados apenas 71,17% dos R$ 16,30 milhões autorizados. Chama a atenção o baixo desempenho nas ações de Fomento a Projetos de Desenvolvimento Sustentável de Comunidades Tradicionais, que liquidou 8,92% do montante de R$ 1,4 milhão autorizado e de Apoio às Organizações Extrativistas da Amazônia, que liquidou 54,73% de um orçamento de R$ 5,439 milhões. Fazendo uma retrospectiva da situação do programa em 11 de setembro, espanta o fato de que nessa data havia sido liquidado apenas 13,10% do orçamento. Para o programa Prevenção e Combate ao Desmatamento, Queimadas e Incêndios Florestais, foram autorizados R$ 41,30 milhões. Em 11 de setembro, tinham sido liquidados 44,86% e, em 21 de janeiro passado, o percentual chegou a 96,65%. Ou seja, mais de 50% do total liquidado aconteceu nos últimos meses do ano. Na ação Manutenção de Brigadas de Prevenção e Combate a Incêndios Florestais, que teve orçamento de apenas R$ 368 mil, nada foi gasto em 2005. Outro programa que teve um baixo desempenho orçamentário foi o Amazônia Sustentável. Do montante autorizado ao MMA de R$ 65,623, somente 41,80% foram executados até 21 de janeiro. Quatro ações desse programa se destacam pelo baixo desempenho: (i) Apoio à Estruturação do Sistema de Gestão de Recursos Naturais na Amazônia, que liquidou 51,48% do orçado; (ii) Fomento a Projetos Demonstrativos de Desenvolvimento Sustentável e Conservação na Amazônia, que liquidou 15,89%; e Fomento a Projetos de Gestão Ambiental e Desenvolvimento Sustentável na Amazônia, que nada gastou. O programa Nacional de Florestas, também a cargo do MMA, executou 73,03% do total autorizado. Em 11 de setembro, sua execução estava em apenas 8,76%. Ou seja, mais de 60% do total liquidado aconteceu nos últimos meses do ano. Ações que puxaram o desempenho orçamentário para baixo: (i) Publicidade, que liquidou 25% do total
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Orçamento e Políticas Públicas
orçado; (ii) Implantação do Sistema Nacional de Informações Florestais, que liquidou 37%; (iii) Apoio à Gestão dos Recursos Florestais, que liquidou 40,13% do total orçado; (iv) Gestão e Administração do Programa, que liquidou 41,68%; (v) Fomento a Projetos de Extensão Florestal, que liquidou 48,57%; (vi) Manejo de Florestas Públicas, que liquidou 58,71%; e (vii) Pesquisa e Desenvolvimento Florestal, que liApesar de quidou 59,96%. No tocante ao progra- importante, a criação das três secretarias ma de Áreas Protegidas especiais do Brasil, o MMA execuanteriormente tou 76,20% dos recursos autorizados, com uma referidas, que tratam especificamente do concentração de gastos tema dos direitos nos últimos meses do ano. humanos e das As ações que tiveram um questões raciais e de desempenho baixo são: (i) gênero, ainda é Regularização Fundiária insuficiente para das Unidades de Conserenfrentar os desafios vação Federais, com para os quais foram 8,54%; (ii) Criação de Unidades de Conservação criadas. Muitas vezes, lhes faltam Federais, com aproximaorçamentos e poder damente 37,04%; (iii) político para Fomento a Projetos Orientados ao Manejo e influenciar as decisões governamentais. Consolidação de Áreas Protegidas, com 52,89%; (iv) Conservação e Manejo do Patrimônio Espeleológico, 53%; e (v) Apoio à Criação e Gestão de Unidades de Conservação, 60,56%. Considerações finais Depois de analisar as diversas políticas com as quais o Inesc trabalhou durante o ano de 2005, pode-se concluir que há muito a fazer para se obter um combate decisivo às desigualdades sociais, à violação dos direitos humanos e promover o desenvolvimento sustentável do país. Desde uma mudança qualitativa na gestão dos recursos, com uma liberação contínua dos 13
montantes autorizados pela lei orçamentária, até uma inversão de prioridades que passa pelo resgate da dívida social em vez de se contentar com as sobras do pagamento das dívidas financeiras. Apesar de importante, a criação das três secretarias especiais anteriormente referidas, que tratam especificamente do tema dos direitos humanos e das questões raciais e de gênero, ainda é insuficiente para enfrentar os desafios para os quais foram criadas. Muitas vezes, lhes faltam orçamentos e poder político para influenciar as decisões governamentais. O que elas vêm desenvolvendo são apenas políticas focalizadas, sendo abandonada a perspectiva da interdependência e da indivisibilidade dos direitos. Os direitos humanos ainda não são entendidos como um modo de olhar as políticas e como um paradigma que deveria perpassá-las. Há muito que mudar também nas prioridades que realmente vêm sendo dadas às políticas específicas aqui analisadas. No caso da reforma agrária, é urgente a efetivação das formas de democratização do acesso à terra, de enfrentamento do latifúndio para que se consiga assentar as milhares de famílias que hoje estão à beira das estradas acampadas, aguardando um pedaço de chão para plantar. A desapropriação tem que ser o principal instrumento de acesso à terra, sendo crucial para a consolidação da democracia no país e a erradicação da pobreza rural. No que diz respeito à Segurança Alimentar e Nutricional, muitos problemas foram apontados e requerem uma solução imediata. Além do baixo investimento nessa política, há uma urgente necessidade de sua normatização. Uma importante iniciativa do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (CONSEA) é o projeto de lei sobre a política de segurança alimentar e nutricional – LOSAN, que está em tramitação na Câmara dos Deputados. É essencial a aprovação dessa lei, que implica na criação de uma legislação específica para sanar os problemas que impedem o Brasil de ter uma política universal e efetiva que garanta segurança aos cidadãos e cidadãs em termos de combate à fome e à desnutrição.
Márcio Pochmann em entrevista concedida ao repórter Igor Felipe Santos, publicada no Diário Vermelho, do PCdoB, http://www.vermelho.org.br/diario/ 2006/0208/0208_pochmann.asp
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Segundo Marcio Pochmann, “para fazer políticas universais, é preciso comprometer recursos significativos. O país apresenta pobreza universalizada e querem combatê-la com políticas focalizadas. O modelo econômico não permite as políticas sociais decentes e universais que o país precisa”.13 Nas observações sobre a política para crianças e adolescentes, em que a educação joga um papel fundamental, as palavras do professor Pochmann se encaixam perfeitamente. Impõe-se a necessidade de incremento na alocação de recursos para a educação, como política universal de qualidade, da mesma forma que foram Não devemos incrementados os monsubmeter nossas tantes para a política de reivindicações ao transferência de renda. A calendário eleitoral, educação é de extrema remas 2006 é uma boa levância para alterar estruoportunidade política turalmente o quadro drapara colocar no centro mático de desigualdade da discussão temas hoje existente, assegurancruciais para a maioria do um futuro digno para da população: o as crianças e adolescentes. modelo de A análise orçamendesenvolvimento e a tária dos programas censua conseqüente trais na questão política econômica. ambiental e indígena — particularmente os relacionados com a proteção da biodiversidade —revela um dos impasses vividos pelo governo atual, parcialmente refém do agronegócio, do setor financeiro, das grandes empreiteiras e dos setores conservadores, que não arredam pé da idéia de que “os índios têm muita terra”. Como priorizar uma intervenção decisiva em questões cruciais como a promoção de um ambiente saudável e a garantia dos direitos dos povos originários da terra sem irritar os senhores da Casa Grande? As análises elaboradas neste Boletim levam à conclusão de que muito há que ser feito para enfrentar a posição de um dos países mais desiguais 14 15
do planeta. Não devemos submeter nossas reivindicações ao calendário eleitoral, mas 2006 é uma boa oportunidade política para colocar no centro da discussão temas cruciais para a maioria da população: o modelo de desenvolvimento e a sua conseqüente política econômica. O economista e professor Fernando Cardim14 resume bem essa dicotomia entre política econômica e questão social: “O caminho para a superação do papel ‘residual e subsidiário’ da questão social perante a política econômica é o mesmo. Tecnicamente, basta submeter as decisões de política econômica — isto é, a política fiscal, a política monetária, a política cambial, etc. — a critérios de custo/ benefício que identifiquem também a incidência destes em termos de grupos sociais, superando a fantasia ideológica de que existe um interesse ‘nacional’ acima do interesse das pessoas que constituem esta nação”.15 Participaram desta edição os assessores Caio Varela, Edélcio Vigna, Eliana Graça, Francisco Sadeck, Ricardo Verdum; os assistentes Álvaro Gerin, Lucídio Bicalho; e os estagiários Bruno Ambrósio Catharina Mafra
Entre a política econômica e a questão social, artigo publicado na revista Observatório da Cidadania 2005. Idem, pág.34
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