DIREITOS, CIDADANIA E ORÇAMENTO PÚBLICO
Desenho coletivo. Escola Classe 17 de Taguatinga
O relato de uma experiência
© INESC, 2008. Projeto Protagonismo Juvenil: direitos, cidadania e orçamento público. Escolas Participantes Centro de Ensino Médio Asa Norte Centro de Ensino Médio 4 Guará Escola Classe 17 Taguatinda Facilitadores
Márcia Acioli, Lisandra Arantes Carvalho, Francisco Sadeck, Jair Barbosa, Leyberson Pedrosa, Alexandre Ciconello e Lila Rosa Ferro Registro da experiência
Jair Barbosa Jr., Lucídio Bicalho e Alexandre Ciconello Fotografia
Lila Rosa Ferro
DIREITOS, CIDADANIA E ORÇAMENTO PÚBLICO
Apoio
Débora Denoffre
Protagonismo Juvenil: direitos, cidadania e orçamento público. O relato de uma experiênciana
O relato de uma experiência
Sistematização e Projeto gráfico
Lila Rosa Ferro Edição
Alexandre Ciconello
INESC Conselho Diretor
Armando Raggio Caetano Araújo Fernando Paulino Guacira César Jean Pierre Leroy Jurema Werneck Luiz Gonzaga de Araújo Neide Castanha Pastor Ervino Schmidt Colegiado de Gestão
Atila Roque Iara Pietricovsky José Antônio Moroni Assessoria
Alessandra Cardoso Alexandre Ciconello Edélcio Vigna Eliana Graça Evilásio Salvador Jair Barbosa Jr. Luciana Costa Lucídio Bicalho Ricardo Verdum Assistentes
Ana Paula Felipe Lucídio Bicalho
Revisão
Jair Barbosa Jr. Apoio Técnico
Ivone Maria da Silva Melo Realização
Parceria
Impressão
Gráfica Athalaia Parceria
Apoio
Instituto de Estudos Socioeconômicos/INESC. Protagonismo juvenil: direitos, cidadania e orçamento público. O relato de uma experiência. Brasília, 2008. 128 p.:il ISBN 978-85-87386-11-3 1. Brasil, políticas públicas. 2. Brasil, política e governo. I Título. CDU:
Apoio
APRESENTAÇÃO
SUMÁRIO
É com grande prazer que o Instituto de Estudos Socioeconômicos - Inesc, em parceria com a Cáritas Brasileira e com o apoio da agência alemã Kinder Not Hilfe (KNH), apresenta a publicação Protagonismo Juvenil: direitos, cidadania e orçamento público. O relato de uma experiência.
Introdução
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A ESCOLA
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A publicação é fruto de ações de formação e sensibilização de crianças e adolescentes de escolas públicas no Distrito Federal para o tema dos direitos humanos, protagonismo, cidadania e orçamento público que foram realizadas no segundo semestre de 2007. Na introdução da publicação, apresentamos o contexto em que o projeto foi desenvolvido e, na seqüência, a sistematização dos trabalhos realizados durante as oficinas de formação: a metodologia utilizada, os temas abordados e os debates travados pelas crianças e adolescentes.
Centro de Ensino Médio Nº 4 do Guará
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CIDADANIA
E SUJEITOS DE DIREITOS 7
TEXTOS DE REFERÊNCIA ECA
Procuramos refazer e descrever os passos da oficina a fim de que o leitor/a possa acompanhar a metodologia e os materiais utilizados, a proposta pedagógica e o resultado das dinâmicas propostas a partir da reação dos/as participantes.
Desejamos que essa publicação possa ser um instrumento reflexivo sobre a metodologia e a experiência realizada, tanto para o acúmulo institucional do Inesc e de outras organizações da sociedade civil participantes em processos de formação com crianças e adolescentes, como para os próprios participantes envolvidos. Boa leitura!
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Escola Classe Nº 17 de Taguatinga
OFICINA I
A publicação contém, também, alguns textos explicativos e provocativos sobre os temas tratados nas oficinas: O Estatuto da Criança e do Adolescente, Controle Social, Participação, Orçamento Público e A Escola.
Centro de Ensino Médio da Asa Norte
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Oficina 1 Cidadania e Sujeitos de Direitos
OFICINA II E III
ESTADO PODER DEMOCRACIA
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e Orçamento Público
TEXTOS DE REFERÊNCIA Orçamento Público
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Oficina II Povo, Território e Poder
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Oficina III Orçamento Público e democracia
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INTRODUÇÃO
Sobre o Inesc
OFICINA IV E V
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TEXTOS DE REFERÊNCIA Participação Controle Social
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ORÇAMENTO PÚBLICO PARTICIPAÇÃO POPULAR e COMUNICAÇÃO
O Instituto de Estudos Socioeconômicos - Inesc é uma organização pioneira no trabalho com o Orçamento Público, como um instrumento essencial para a efetivação de direitos. Desde 1992, o Instituto tem se colocado como uma referência para a sociedade civil, para o Parlamento e para órgãos públicos, no acompanhamento de políticas públicas com enfoque orçamentário.
Oficina IV Orçamento Público e Educação
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Orçamento Público e Merenda Escolar
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Oficina V Comunicação e Participação
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Encontro no Congresso Nacional
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O que levamos para casa e o que fica na escola 126 Referências
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O monitoramento dos efeitos das políticas destinadas à criança e ao adolescente sempre foi uma estratégia do Inesc. A atuação nessa área iniciou-se em 1992, a partir de um enfoque estratégico de garantir a efetivação dos direitos previstos no Estatuto da Criança e Adolescente (ECA). O instituto também privilegiou nas suas estratégias a contribuição para a formação e fortalecimento do sistema de garantia de direitos, no sentido de estimular a criação de Conselhos de Direitos da Criança e Adolescente, fundos orçamentários, Conselhos Tutelares e o sistema judicial de garantia de direitos, como as promotorias da criança e adolescente e o tratamento especial conferido aos adolescentes em conflito com a lei. O Inesc sempre pressionou os órgãos públicos e o Parlamento para que se cumprisse o disposto na Constituição Federal e no
INTRODUÇÃO ECA, de destinação privilegiada de recursos públicos para as áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. Para isso desenvolveu várias metodologias de influência e acompanhamento da execução orçamentária, que culminou no desenvolvimento do Orçamento Criança, denominado OCA. Sobre a importância do Protagonismo juvenil para ampliar a cultura do controle social e da participação Para além do controle social e influência das políticas de criança e adolescente, a partir do enfoque orçamentário, cada vez mais o Inesc tem sido desafiado a desenvolver estratégias para promover a ampliação da cultura do controle social e da participação. A participação de crianças e adolescentes na elaboração e no controle social das políticas públicas é ainda algo insipiente no Brasil, apesar do compromisso assumido pelo Estado brasileiro com a ratificação da Convenção Internacional sobre os direitos da Criança. Em seu artigo 12, a Convenção dispõe que: “Os Estados-partes assegurarão à criança, que estiver capacitada a formular seus próprios juízos, o direitos de expressar suas opiniões livremente sobre todos os assuntos relacionados com a criança, levando-se em consideração essas opiniões, em função da idade e da maturidade da criança”.
Sobre o Inesc O Instituto de Estudos Socioeconômicos - Inesc é uma organização pioneira no trabalho com o Orçamento Público, como um instrumento essencial para a efetivação de direitos. Desde 1992, o Instituto tem se colocado como uma referência para a sociedade civil, para o Parlamento e para órgãos públicos, no acompanhamento de políticas públicas com enfoque orçamentário. O monitoramento dos efeitos das políticas destinadas à criança e ao adolescente sempre foi uma estratégia do Inesc. A atuação nessa área iniciou-se em 1992, a partir de um enfoque estratégico de garantir a efetivação dos direitos previstos no Estatuto da Criança e Adolescente (ECA). O instituto também privilegiou nas suas estratégias a contribuição para a formação e fortalecimento do sistema de garantia de direitos, no sentido de estimular a criação de Conselhos de Direitos da Criança e Adolescente, fundos orçamentários, Conselhos Tutelares e o sistema judicial de garantia de direitos, como as promotorias da criança e adolescente e o tratamento especial conferido aos adolescentes em conflito com a lei. O Inesc sempre pressionou os órgãos públicos e o Parlamento para que se cumprisse o disposto na Constituição Federal e no
A abertura de espaços para colocar os/as jovens em situação de diálogo, ou seja, dar a possibilidade de acesso a espaços de discussão, escuta, expressão das diferentes opiniões e troca de experiências é uma necessidade constatada pela maioria das organizações e pesquisadores/as que se debruçam sobre o tema da juventude. Sobre a Iniciativa Nesse sentido, em 2007, o Inesc, em parceria com a Cáritas Brasileira e apoiado pela agência alemã Kinder Not Hilfe (KNH), iniciou uma experiência piloto de capacitação e formação política para crianças e adolescentes cujo propósito era desenvolver e reforçar o protagonismo na defesa dos direitos. Este trabalho foi desenvolvido em três escolas públicas do Distrito Federal: - CEAN Centro de Ensino Médio da Asa Norte - Brasília - Escola Classe 17 Taguatinga - Centro Educacional 04 - Guará Foram realizadas ao todo 14 oficinas de quatro horas de duração. Nas escolas do Guará (CEM 04) e Taguatinga (EC 17) foram realizadas cinco oficinas. No CEAN foram realizadas quatro oficinas. Na realização das oficinas, contamos também
com a parceria do Centro Dandara de Promotoras Legais Populares e do Projeto de Comunicação Comunitária da Universidade de Brasília. O processo formação foi articulado e impulsionado pelo 3º Concurso “O Direito de Participar: acompanhe as verbas da merenda na sua escola” promovido pela Cáritas Brasileira, com o apoio do Inesc e da UNICEF em diversas escolas brasileiras. O concurso abrangeu as seguintes unidades da federação: Alagoas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Santa Catarina e Sergipe. O objetivo do concurso era estimular que alunos/as, comunidade escolar, equipe pedagógica de escolas públicas do ensino fundamental e ensino médio desenvolvessem um projeto de acompanhamento da aplicação dos recursos da merenda escolar registrado em forma de cartilha. As escolas vencedoras receberiam um prêmio de R$ 3.000,00 cuja aplicação deveria ser determinada democraticamente pela comunidade escolar. As oficinas foram desenvolvidas a partir de uma metodologia participativa e com técnicas de arte-educação, a fim de incenti-
var o protagonismo e a criatividade dos/as jovens envolvidos/as. A equipe de facilitação e sistematização contava com duas arte-pedagogas que muito contribuíram para a adoção dessa abordagem. O projeto envolveu por volta de 80 crianças e adolescentes de forma permanente. Foram realizadas dinâmicas diferenciadas, com abordagens pedagógicas distintas sobre os mesmos temas devido às diferentes faixas etárias dos/as jovens envolvidos/as. Trabalhamos com grupos de adolescentes de 15 a 19 anos do ensino médio, em duas escolas, o Centro de Ensino Médio da Asa Norte - CEAN e Centro de Ensino Médio 4 do Guará:18 adolescentes, no CEAN e 20 adolescentes no CEM 4 Guará. Na Escola Classe 17 Taguatinga, trabalhamos com 36 crianças de 10 a 12 anos, da quarta série do ensino fundamental. A metodologia interativa e a abordagem artística empregadas nas oficinas permitiram que as crianças e adolescentes se sentissem estimulados/as a aprofundar o debate sobre a efetivação de seus direitos, principalmente no espaço escolar. Também ficaram estimulados/as a conhecer a realidade de outras escolas, a interagirem com outros adolescentes e a iniciarem um processo de mobilização para promoverem seus próprios direitos.
Os temas desenvolvidos nas oficinas
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Oficina I - Cidadania e sujeito de direitos: - Art. 4º do ECA: responsabilidade do Estado, da família e da comunidade de assegurar a efetivação dos direitos da criança e do adolescente - Crianças e adolescentes como sujeitos de direitos e deveres - Sistema de garantia de direitos - Interdependência dos direitos Oficina II - Estado, Poder e Democracia: - Poder, Estado, Povo, território - Executivo, Legislativo, Judiciário - Direito à participação política - Espaços de participação e controle social de políticas públicas Oficina III - Orçamento Público: - Orçamento doméstico x orçamento público - De onde vêm os recursos que compõem o orçamento? - Orçamento público e priorização de despesas Oficina IV - Priorização no Orçamento Público e Participação no
A escola é uma assembléia permanente que reúne crianças e adolescentes todos os dias. Imaginemos uma estrutura extensa o suficiente para incluir, em suas atividades, milhões de jovens e crianças e ocupar parte de suas vidas durante anos.
Processo Decisório - Retomada e aprofundamento sobre o tema do gasto público: - Instâncias responsáveis pela proposição e acompanha mento do orçamento. - Exercício de priorização dos gastos públicos - Ciclo da merenda escolar nas escolas (de onde vem o recurso, volume dos recursos, quem decide, quem é responsável pela sua aplicação) - Possibilidades de acompanhamento da merenda escolar pela comunidade escolar Oficina V - Comunicação, Protagonismo e Mobilização: - Como e por que se comunicar? Comunicação como um instrumento de reivindicação - Como mobilizar os/as alunos/as e a comunidade escolar sobre questões que afetam a todos/as? - Técnicas de roteirização para elaboração de um projeto/ ação conjunta (exemplo do concurso da Cáritas Brasileira “O Direito de Participar” voltado para alunos/as de esco las públicas) - Técnicas de mobilização e reivindicação por meio da comunicação (exemplos de rádio comunitárias e rádio escola; internet, blog, orkut, e-groups, rádio web; jornais, fanzines; vídeo etc.)
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O potencial mobilizador e participativo da escola não para por aí. Incorpora uma teia de relações que extrapola seus “muros” e se estende à comunidade. A palavra-chave da escola é o encontro. O caminho mais fértil, o diálogo. Os sujeitos se encontram para um diálogo cujo objeto compartilhado é o mundo. Os sujeitos dialogam para torná-lo melhor. Do diálogo nasce, em primeiro lugar, o exercício da socialidade, que possibilita a construção e reconstrução do conhecimento, a consciência cidadã , o desejo e a prática participativa. Nasce o questionamento sobre as nossas mazelas, daquilo que, não estando remediado, se repete.
Lila Rosa
"...antes de situar uma pessoa em seu 'lugar', comecemos por reconhecê-la em seu ser, em sua qualidade de pessoa complexa, dotada de liberdade e de imaginação criadora" René Barbier
Identidades, afinidades, intersubjetividade. A escola é viva. Pessoas e grupos interagem numa dimensão espaçotemporal, repleta de acontecimentos, determinada pela dinâmica das histórias e tendências pessoais, das bagagens intelectuais e da vida afetiva. Sem o reconhecimento do outro, a produção de sentido, a esfera simbólica, a linguagem e as identidades deixam de existir. O espaço escolar é constituído, e sua singularidade desmonta a lógica de um sistema burocrático que determina funções e tarefas para executar seus objetivos. Há sempre uma brecha para realizar o potencial humanista da comunidade escolar. Mesmo em situações de grande coerção, ela encontra suas formas de escapar do controle e tecer suas próprias saídas. Escola desejada nos sonhos da criança que nela está chegando. Encantamento e promessa. Essa escola que perseguimos
desde sempre, quando está pronta, já é hora de mudar. Escola mutante que se ajeita, se contorce e se modela aos desafios que o mundo revela e impõe.
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Mas de que escola estamos falando? De todas e de nenhuma. Estamos falando de uma utopia e, como tal, sua finalidade é configurar um sonho nem sempre provável, mas possível. A utopia da escola nova, da escola cidadã, da escola integradora, a escola do presente, do futuro... Quantas promessas já surgiram em busca dessa utopia? Se não for assim que vivenciamos o espaço escolar, resta-nos a escola como um reflexo da sociedade, aquela que reproduz qualidades e defeitos do processo social, principalmente os defeitos. E mais, atua para a manutenção do modelo social e fornece o ser-objeto, treinado para a subserviência.
O coração da escola, que é uma assembléia permanente, é a possibilidade cotidiana de realizar sua utopia.
Quanto mais autoritárias forem as relações sociais, mais excludente será essa escola. A utopia, nesse caso, é vivenciada como algo inalcançável, apenas uma “utopia”. O coração da escola, que é uma assembléia permanente, é a possibilidade cotidana de realizar sua utopia. A utopia é o que é possível fazer: voltar os olhos para as singularidades locais, reconhecendo a heterogeneidade, a diversidade de linguagens e a pluralidade das experiências e do conhecimento, no contexto social, sempre permeado pelo exercício da afetividade. A escola sonhada e a escola reflexo da sociedade injusta convivem na escola real. Compartilham dos projetos pedagógicos, das rotinas escolares e das relações políticas e precisam de mediadores para romper com a oposição e partir para o diálogo.
CEAN Centro de Ensino Médio da Asa Norte
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O Centro de Ensino Médio da Asa Norte - CEAN - possui uma proposta que estimula a participação dos alunos, alunas e da comunidade escolar nos processos político-pedagógicos da escola, com temas voltados para a promoção da cidadania. O Professor Clerton acompanhou com muito interesse a realização das oficinas do Inesc junto aos seus alunos e alunas. Alunos/as participantes: Aline Maia, 17; Camila Dutra, 16; Débora Oliveira, Elisa Ribeiro, 17; Emanuela Alves Reis; Gabriela Salata Mayoli, 16; Isabel Kelly D. Amorim, 16; Isabela Gonçalves, 15; João Nogueira da Silva, 19; Juliane Santos Lima, 17; Karina Krol Fincato, 18; Leonardo A. Teixeira, 17; Lucas Brito de Lima, 16; Maria Carolina Martins, 17; Mariana Souza Batista, 16; Olga Chiode, 18; Pedro Henrique C. Torres, 15; Péricles B. Pereira, 15; Poti Alves Picanço, 15; Radamés Roriz, 15.
CEM 4 Centro de Ensino Médio 4 Guará
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As formas de participação da comunidade escolar, como um todo, ainda são potenciais no CEM 4 do Guará. Seu projeto pedagógico ainda não prevê estratégias para estimular o protagonismo de alunos e alunas no cenário político escolar, embora exista uma grande disposição de todos/as nesse sentido. O CEM 4 atende a moradores/as do Guará e da Vila Estrutural. A desigualdade social entre esses dois contextos se desdobra no meio escolar e, na falta de mediação, essa diversidade precisa ser trabalhada, a fim de iluminar seus aspectos positivos. Alunos participantes: André Júnio Tavares Barbosa, 19; Carmen P. da Silva, 17; Caroline Maria Lopes, 18; Daniela Lopes, 16; Diomar L. de Oliveira, 19; Francisca Rayanne, 16; Henrique dos Santos, 18; Hesdras da Cruz Barros; João A. A. Sá, 18; Juliana de O. Soares; Kákyla Daiane, 16; Karen Tolentino Carvalho, 16; Laryssa Maciel Sousa, 16; Laiane Andréa da Silva, 17; Lucas de Souza Marques, 19; Mário Sergio R. Lima; Maura Fernanda R. Camilo, 15; Patrícia Souza dos Santos; Pedro Vinícius P. Neves, 16; Raíssa Sampaio Santos, 16; Raquel Rodrigues Ferreira, 18; Vanessa Araújo Freires, 15.
ESCOLA CLASSE 17 Taguatinga
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No início do ano de 2007, a Profª. Francisca decidiu mobilizar sua turma para a realização de um projeto. Sua intenção era levar seus alunos a observarem o mundo com mais atenção, motivando-os para a participação, para práticas solidárias e cooperativas, em busca de autonomia, no exercício de seus direitos e deveres. Embora restrito a uma turma, o projeto “Olhar Cidadão” mudou o ambiente escolar e, em outubro do mesmo ano, foi selecionado pelo Ministério da Educação como um dos 20 melhores trabalhos nacionais do Prêmio Professores Brasil. Alunos participantes: Angélica Fukushi, 11; Asafe Bruno,11; Brenda Rafaela, 10; Breno Menezes,11; Carolina da Silva, 11; Cleiton Viana, 10; Daísa Wellareo, 11; Fellipe Lopes, 10; Francisco Cleiton,13; Ítalo de Almeida, 11; Jéferson Moura, 10; Jéssica Rosa, 10; Jéssica Miranda, 10; João Marcos, 10; Jônatas Cordova, 10; Karine Freitas, 10; Lauane Rocha, 9; Letícia Farias, 10; Lucas de Oliveira, 10; Lucas Veiga,13; Luísa Wellaceo, 10; Maílson da Paixão, 10; Mateus Santos, 12; Micaela Gonçalves, 10; Nalberth Brandão, 10; Natália Mendes, 11; Nathália Suzano, 10; Pedro Ricardo Mendes, 10; Rayane Moreira, 10; Rayra Santana, 10; Ricardo da Cruz, 11; Shaylane dos Santos, 10; Thiago Felipe, 11; Victor Hugo da Silva, 10; Victória Celestino, 11; Vinícius Luis Nonato, 11; Yuri da Silva, 11.
OFICINA I Participantes Adolescentes, alunos e alunas do Ensino Médio. Crianças, alunos e alunas da 4ª série do Ensino Fundamental.
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Objetivos da Oficina Discutir os direitos da criança e do adolescente, apresentando a diferença filosófica e política entre o ECA e o Código de Menores. Com base na indivisibilidade dos Direitos Humanos, elucidar o conceito de exigibilidade e apresentar o Sistema de Garantia dos Direitos.
TEXTO DE REFERÊNCIA
CIDADANIA
E SUJEITOS
DE DIREITOS
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No dia 13 de julho de 1990 nasce o Estatuto da Criança e do Adolescente, popularmente conhecido como ECA. Um novo modelo de pensamento substitui o paradigma da Situação Irregular do Código de Menores: a Proteção Integral. Toda lei é baseada numa visão de mundo, que defende uma determinada noção de justiça. O Código de Menores, a lei que regulava a vida das crianças e adolescentes no Brasil, baseava-se numa visão de mundo em que meninos e meninas que viviam alguma forma de vulnerabilidade (abandono, negligência, exposição à ambiente impróprio...) estavam em “situação irregular”, o que dava direito ao juiz, sem maiores explicações, de recolhê-los a uma Fundação do Bem-Estar do Menor - FEBEM. A lei responsabilizava e penalizava o próprio indivíduo pelo abandono em que vivia, ou seja, as instituições adultas (família, escola, igreja, poder público) que cometeram o abandono, a negligência ou a violência física, moral, institucional ficavam isentas de qualquer responsabilidade. O Código de Menores tratava meninos e meninas pobres como irregulares pela própria condição. Por isso, o termo “menor” consagrou, no imaginário popular, a conotação de marginalidade ou de transgressão, vinculado
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Márcia Acioli
O ECA explicita a sua filosofia com o paradigma da proteção integral, aponta responsabilidades, descentraliza o poder, municipalizando as políticas e instituindo Conselhos Tutelares e Conselhos de Direitos.
às populações mais jovens, pobres e, portanto, mais vulneráveis e desprotegidas. Na década de 80, no período da Constituinte, os movimentos sociais se organizaram para propor e exigir uma mudança radical na legislação referente às crianças e adolescentes. O artigo 227 da Constituição Federal de 1988 é resultado dessa luta e o ponta-pé inicial da elaboração do ECA, ricamente detalhado e promulgado em 1990. O ECA considera criança e adolescente pessoas de direitos e em fase de desenvolvimento, sendo prioridade absoluta. Identifica as responsabilidades da família, da comunidade, da sociedade e do Estado, que devem assegurar-lhes a proteção integral. A lei passa a valer para todas as crianças e adolescentes, reconhecendo-os como sujeitos de direitos a serem protegidos e garantidos os seus direitos na condição prioritária. A proteção integral significa que cada criança e adolescente do país deve ser “abraçada” pelas políticas públicas, que lhes assegurem o desenvolvimento pleno em condições dignas. Os direitos relacionados no artigo 4º do ECA, estão quase que de forma idêntica no artigo 277 da Constituição Federal: "É dever da família, da comunidade, da sociedade em
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geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.” Os direitos são interdependentes. Brincar, fazer esporte, fazer arte e ter acesso à cultura é tão importante quanto estudar, ter saúde e morar com uma família... A perspectiva da indivisibilidade defende o conjunto de direitos como algo inegociável. Os debates sobre Direitos Humanos no mundo trouxeram outro conceito importante, o da exigibilidade, ou seja, os direitos existem, podem e devem ser exigidos, por meio de instâncias e mecanismos criados para isso. O Brasil teve de parar para pensar: como executar algo tão diferente? A escola, a família e o poder público foram convocados para dar respostas e buscar soluções articuladamente e, assim, garantir a proteção integral de crianças e adolescentes. O Sistema de Garantia dos Direitos, SGD, que o ECA instituiu é uma forma de articular e sintonizar família, comunidade e o poder público num sistema coerente. Os três eixos que o compõem - defesa e responsabilização,
A perspectiva da indivisibilidade defende o conjunto de direitos como algo inegociável.
controle social, e promoção de direitos - se distribuem em todo o cenário social. O eixo da responsabilização tem o objetivo de responsabilizar os que se omitem ou violam os direitos de crianças e adolescentes e é composto por Judiciário, Ministério Público e Conselhos Tutelares. O eixo de controle social é responsável pela vigilância do cumprimento das leis, por meio do controle externo do poder público. É o espaço de ação da sociedade civil organizada. O eixo da promoção de direitos prioriza as necessidades básicas da criança e do adolescente, por meio das políticas de saúde, educação, habitação, lazer e assistência social. É formado por instâncias do Executivo e Conselhos de Direitos, entre outros. Diferente do que muitos imaginam, o ECA não veio dar cobertura a meninos travessos que transgridem a lei, é um instrumento que garante a todas as crianças e adolescentes um desenvolvimento seguro, saudável, com chances igualitárias de formação e acesso aos bens culturais. O ECA veio marcar diferença e tem sido referência para outros países, interessados em consolidar a prática dos direitos humanos das crianças e adolescentes.
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OFICINA I ANTES DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, ECA, PREVALECIA O CÓDIGO DE MENORES, REGULADO PELO PARADIGMA DA SITUAÇÃO IRREGULAR. IRREGULAR NÃO É A CRIANÇA QUE ESTÁ DESPROTEGIDA, MAS A SOCIEDADE QUE NÃO A PROTEGE.
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Art. 4º do ECA É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.”
Desenvolvimento da oficina Ensino Médio 1) Preparação do material Tinta - mistura de tinta PVA com bisnagas xadrez, para fazer as cores básicas, mais o branco e o preto. Papelão - cortes em tamanhos similares, com dimensões próximas ao formato A4. Sobre cada pedaço, está escrito o nome de uma parte do rosto: olho, nariz, boca, sobrancelha, orelha. Podem ser incluidas outras partes do rosto, de acordo com o número de pessoas nos grupos. 2) Preparação do espaço de trabalho Jornais para forrar, recipientes com água, pincéis, papéis toalha, tintas e papelões já preparados. 3) Reunião na grande roda Sentados em roda, os facilitadores fazem
uma breve apresentação de nomes, idade, interesses. Depois, apresentam o objetivo da oficina “Cidadania e Sujeitos de Direitos”: discutir os direitos da criança e do adolescente, apresentando o ECA e, com base na indivisibilidade dos Direitos Humanos, elucidar o conceito de exigibilidade e apresentar o Sistema de Garantia dos Direitos. 4) Início dos trabalhos Os pedaços de papelão são sorteados entre os participantes de cada grupo. Cada adolescente observa o seu colega da esquerda para desenhar aquela parte indicada no pedaço de papelão. Olho, boca e sobrancelha devem ser desenhados na posição horizontal, nariz e orelha na vertical, utilizando toda a extensão do pedaço de papelão. Enquanto todos desenham e pintam, a facilitadora sorteia, em cada grupo, o gênero do personagem (menino ou menina) e a raça/etnia (negro, branco, indígena, oriental). Depois de pintados, olhos, sobrancelhas, narizes e bocas são recortados. O contorno de um rosto é desenhado numa folha de papelão maior. Sobre ele, são coladas as partes pintadas e recortadas
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O ECA SURGIU PELA PRESSÃO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS, QUE CONSEGUIRAM GRANDES AVANÇOS NA LEI, MAS A MENTALIDADE DA POPULAÇÃO MUDA LENTAMENTE. MESMO ASSIM, COM UM INSTRUMENTO LEGAL, É POSSÍVEL RECORRER AOS DIREITOS E USAR OS MECANISMOS DE PROMOÇÃO, PROTEÇÃO E GARANTIA.
anteriormente. Alguns acabamentos são feitos, olho que faltava, cabelos, cor da pele etc. 5) Criação do personagem Os grupos criam uma história para seus personagens, relacionando-a com os direitos previstos no ECA. 6) Apresentação dos grupos e debate Os grupos apresentaram, na grande roda, as histórias de seus personagens: No Centro de Ensino Médio da Asa Norte 32
“HÁ MUITAS CRIANÇAS QUE VIVEM SITUAÇÃO DE PRIVAÇÃO DE DIREITOS HÁ VÁRIAS GERAÇÕES. COMO É QUE O ESTADO CONCRETIZA SEUS DIREITOS? POR MEIO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS.”
Cada grupo recebe, por sorteio, três direitos, inscritos no artigo 4º do ECA. As histórias desses personagens devem expressar a falta desses direitos . Grupo 1 Direitos ausentes: esporte, lazer, profissionalização. José Silva, “Berinjela”, 17 anos, filho de Maria e José. Aos 15 anos saiu de casa para trabalhar numa carvoaria. Com problemas de bronquite, foi para São Paulo procurar um hospital. O médico o aconselhou a praticar natação. Procurou aulas de natação em espaços públicos, mas não encontrou. No trabalho, seu salário foi descontado pelas faltas que teve por causa de seus problemas de saúde. Ele
não tinha tempo para o lazer e a educação. Morreu de bronquite. Grupo 2 Direitos ausentes: educação, convivência familiar e comunitária, respeito e dignidade. Emanuel dos Santos, 16 anos. Sua mãe tinha apenas 17 anos quando ele nasceu. Pai desconhecido. Emanuel tem três irmãos e sua mãe espera mais um. Mora na Zona Leste de São Paulo. Parou de estudar na quarta série do ensino fundamental. Fez testes em clubes de futebol, mas não conseguiu um lugar para treinar. Um dia, estava jogando futebol quando alguém se aproximou e o convidou para trabalhar para o “grupo”. Lá, executou tarefas ilegais e ganhou diamantes na transação. Passou diversas vezes pela Febem. Grupo 3 Direitos ausentas: saúde, alimentação e cultura. Maria das Dores nasceu em Águas Lindas. A mãe, um dia, resolveu fugir por causa dos maus-tratos do marido e deixou Maria das Dores com o pai. Aos cinco anos ela era obrigada pelo pai a vender balinhas na rua. Tudo que ganhava, seu pai gastava com bebidas e máquinas de caça-níquel. Mal alimentada, sofreu de subnutrição.
“NUNCA É FÁCIL CONQUISTAR DIREITOS E ELES NUNCA ESTÃO PRONTOS. A CONQUISTA DOS DIREITOS SÓ SE DÁ POR MEIO DA ORGANIZAÇÃO DAS PESSOAS. A POLÍTICA PÚBLICA É MENOR DO QUE OS DIREITOS QUE ESTÃO SUJEITOS A ELA.”
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A FALTA DE UM DIREITO IMPLICA NA FALTA DE OUTRO. SEM ALIMENTAÇÃO NÃO HÁ SAÚDE, E ASSIM POR DIANTE. OS DIREITOS SÃO INDIVISÍVEIS, ISSO É O QUE FUNDAMENTA O PARADIGMA DA PROTEÇÃO INTEGRAL QUE FUNDAMENTA O ECA.
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Quando ficou mocinha, sofreu abuso sexual do pai e discriminação em seu meio social. Seu universo cultural reduzia-se à televisão aberta e às revistas de fofoca. Era ela quem colocava comida em casa e cuidava do pai. Ela não é a única. Existem muitas Maria das Dores por aí. Debates Quem leu o Estatuto da Criança e do Adolescente? Essa pergunta foi feita ao grupo do CEAN, para começar uma conversa conclusiva. Apenas três participantes afirmaram ter folheado, porém sem um estudo mais aprofundado. Uma reflexão sobre o exercício de direitos das crianças e adolescentes foi iniciada enfatizando-se a distinção entre o ECA e o antigo Código de Menores: o paradigma da situação irregular é substituído pelo da proteção integral. O conceito de exigibilidade fortalece o ECA, que vai saindo do papel por meio do Sistema de Garantia dos Direitos - SGD. Os instrumentos do SGD apresentam uma forma concreta de promover a igualdade entre os seres humanos, tão propagada pelos discursos da religião e do direito. O debate aprofundou-se. Meninos e
meninas lembraram o quanto é difícil manter a igualdade com a influência da mídia sobre a sociedade, com suas mensagens de consumo e seus efeitos padronizantes sobre a visão de mundo. Os comentários também abordaram as questões raciais, as diferenças de classe, as discriminações sociais. Como viver em estado de igualdade se vivemos em condições diferentes? As mudanças na vida de alguém não acontecem de repente e as oportunidades contam tanto quanto a determinação da pessoa. Sonhos pessoais realizados em situação adversa são casos isolados e, quando faltam os direitos, ficamos à mercê da sorte. A felicidade é uma busca humana. Podemos encontrá-la nas coisas simples como conviver com pessoas boas, em lugares saudáveis. Nós somos levados pela mídia a ver as favelas apenas como locais de violência. É preciso destacar as situações de solidariedade e afeto nas vivências das comunidades pobres. Todo mundo quer ser feliz, porém a felicidade não é mágica, é uma construção, muitas vezes, de idas e voltas.
Como viver em estado de igualdade se vivemos em condições diferentes? Lucas
O ECA INSTITUIU O SISTEMA DE GARANTIA DE DIREITOS, QUE É UMA FORMA DE ARTICULAR E SINTONIZAR A FAMÍLIA, A COMUNIDADE E O PODER PÚBLICO NUM TODO COERENTE. O PODER JUDICIÁRIO, O MINISTÉRIO PÚBLICO E OS CONSELHOS TUTELARES SÃO PARTE DESSE SISTEMA.
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Comentários Gerais No CEAN, os segmentos da comunidade escolar estão organizados - a associação de pais, o grêmio e o Conselho Escolar de forma que, no âmbito local, as decisões são compartilhadas, num permanente exercício de participação. O grupo considerou o encontro uma oportunidade para aprofundar idéias e práticas que já estão presentes no projeto político pedagógico da escola que prevê a realização de oficinas permanentes de cidadania. No Centro de Ensino Médio 4 do Guará 36
OS DEBATES SOBRE DIREITOS HUMANOS NO MUNDO TROUXERAM O CONCEITO DA EXIGIBILIDADE. OS DIREITOS EXISTEM, PODEM E DEVEM SER EXIGIDOS. EXISTEM INSTÂNCIAS E MECANISMOS PARA ISSO.
Cada grupo recebe, por sorteio um direito que deve ser o ponto de partida para a criação do personagem e de sua história de vida. Dentre todos os direitos constantes no Artigo 4º, Cultura, Educação, Dignidade, Liberdade foram sorteados para os quatro grupos que se formaram. Grupo 1 Mote: Liberdade. Paulo é um jovem de 16 anos que mora com os pais. Seu apelido é Batata. É muito vigiado pelos pais, que só querem o seu bem, afastando-o das drogas. Contudo, ele quer curtir a vida. Assim, fugiu de casa e foi a uma festa. Nessa
festa, aconteceu um incidente e ele foi gravemente ferido. Assim, ele aprendeu que a liberdade não é simplesmente realizar seus impulsos e desejos. Grupo 2 Mote: Dignidade. Moradora do morro do Jacarezinho no Rio de Janeiro. Sua vida é muito difícil por ser negra e viver em uma sociedade que convive com o racismo. Nasceu em uma cidade pobre e enfrentou muitas carências sociais. Seu sonho era ser modelo. Embora tudo isso tenha tornado sua vida muito difícil, ela se esforça muito e tem muitos princípios e ideais. Conseguiu progredir, passar por cima de tudo e realizar o seu sonho. Grupo 3 Mote: Educação Tevis tem 16 anos e nasceu em uma comunidade pobre. Trabalhava catando latinha de alumínio desde os 8 anos de idade, com a família que era catadora. O sonho dele era ter uma boa educação. Aos 12 anos ele fez uma prova na escola em que estudava e se destacou. Recebeu uma bolsa de estudos que permitia a ele só estudar na vida. Hoje, está cursando o ensino médio.
A PROTEÇÃO INTEGRAL SIGNIFICA QUE TODAS AS CRIANÇAS E ADOLESCENTES DO PAÍS DEVEM SER ’ABRAÇADAS’ PELAS POLÍTICAS PÚBLICAS QUE LHES ASSEGUREM O DESENVOLVIMENTO PLENO EM CONDIÇÕES DIGNAS.
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“A cultura ainda é muito cara. Você precisa ter muito dinheiro. Se os nossos pais pagam imposto, nós deveríamos ter acesso a cultura” Diomar Oliveira, 19
Debates A história dos personagens foi apresentada a todos e, depois, iniciou-se um debate geral. O debate partiu da idéia de correlação entre os direitos, tomando-se como exemplo os direitos sorteados nos grupos de trabalho, para a criação dos personagens: cultura, educação, dignidade e liberdade. O conceito de correlação entre os direitos desdobrou-se nas idéias de indivisibilidade, interdependência e universalidade dos direitos humanos, presentes no ECA.
Os/as participantes mencionaram a falta de incentivo às várias formas de vivência cultural dentro e fora da escola e a dificuldade de acesso aos espaços dedicados à cultura, restritos a uma minoria da população. Por outro lado, eles/as destacaram a existência de um preconceito às manifestações culturais próprias dos contextos mais pobres da nossa sociedade, como o hip hop, por exemplo, que não são aceitas em espaços institucionalizados como a escola. As reflexões sobre a cultura como um direito, a consciência das desigualdades sociais, do preconceito e da discriminação racial foram discutidas, tendo como exemplo, as experiências vividas pelos próprios participantes. Porém, foi o ambiente escolar que mais despertou o interesse dos/as adolecentes. Nos comentários sobre o cotidiano escolar, foi apontada a falta de diálogo como a maior razão do empobrecimento das relações entre alunos, alunas, professores e direção. A queixa geral é de que a voz dos alunos e alunas não é considerada nos planejamentos e atividades que ordenam o dia a dia na escola. De fato, é comum, na maioria dos projetos político pedagógicos escolares, não conter, efetivamente, em
“Eu moro na Estrutural. Quando alguém de lá vai procurar um emprego, tem de falar que mora em outro lugar.” Diomar Oliveira, 19 Foto Arq. Of. CEM 4
O ECA E A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA AFIRMAM QUE CRIANÇAS E ADOLESCENTES SÃO PRIORIDADES ABSOLUTAS. A ELABORAÇÃO E EXECUÇÃO DO ORÇAMENTO PÚBLICO DEVE CUMPRIR O QUE ESTÁ PREVISTO NA LEI.
Grupo 4 Mote: Cultura Lia nasceu na África. Aos sete anos, seu pai morreu e ela teve de vir para o Brasil. Foi morar na Rocinha, em uma barraco com mais seis irmãos. Sua mãe trabalhava na lanchonete Bobs. Tinha uma vida difícil. Aos 14 anos ela foi descoberta por um olheiro, que lhe convidou para ser modelo. A partir de então, desenvolveu uma carreira de sucesso. Em uma viagem à Índia, ela abandonou sua carreira e se dedicou ao resgate das culturas. Hoje ela tem 18 anos, é voluntária e viaja pelo mundo, em projetos de proteção às culturas tradicionais.
COM A SOCIEDADE VIGILANTE E PARTICIPATIVA, A PRÁTICA DA CORRUPÇÃO SERIA MÍNIMA, OS DESVIOS DE VERBAS PÚBLICAS SERIAM QUASE QUE IMPRATICÁVEIS.
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A PARTICIPAÇÃO TEM MAIS EFICÁCIA QUANDO SE ESTÁ ORGANIZADO COMO UM COLETIVO, MAS ISSO NÃO SIGNIFICA QUE TODA A PARTICIPAÇÃO ESTÁ ENQUADRADA EM ALGUM MODELO PREVISTO.
seus objetivos, a discussão política, a participação e o exercício da cidadania, embora a cidadania, a ética, a consciência negra e outros temas de caráter político sejam abordados como temas transversais, de forma teórica e distanciada.
pessoas que não tinham muita convivência. A dificuldade inicial da interação entre elas, porém, foi se modificando ao longo de trabalho, motivada por um visível desejo e disposição da turma em participar.
Os facilitadores fizeram alguns esclarecimentos sobre a construção sociohistórica do conceito de raça, disseminado pelos colonizadores europeus, como forma de manter e justificar a submissão dos povos dominados. A nossa herança histórica e política explica porque mudam as leis, mas a mentalidade racista se mantem entre nós.
A divisão em pequenos grupos para a criação dos personagens facilitou a aproximação entre os participantes e a comunicação realizou-se plenamente. “Essa oportunidade da gente falar, dar nossa opinião, sermos ouvidos foi ótima. Em geral não é assim aqui na escola. A gente só escuta o que eles falam”.
Depois, o caráter histórico da cultura foi mencionado, lembrando que há caminhos para a promoção de mudanças no atual quadro cultural e educacional, desde que a sociedade se organize e participe do processo de formulação e execução das políticas públicas. Os avanços nas leis produziram alguns instrumentos legais para ampliar a voz da sociedade. Cabe a nós exercermos o direito de participar. Comentários Gerais A estratégia que a escola utilizou para a formação do grupo selecionou adolescentes de várias turmas, portanto,
HISTORICAMENTE, AS CRIANÇAS E ADOLESCENTES FORAM EXCLUÍDAS DE QUALQUER POSSIBILIDADE DE MANIFESTAR IDÉIAS SOBRE ALGUM ASSUNTO RELACIONADO A SEUS INTERESSES, COMO SE FOSSEM INCAPAZES.
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Os alunos e alunas do CEM 4 do Guará surpreenderam a todos nós pelas colocações cheias de experiências vivas e pela esperança que têm de vivenciar um ambiente escolar democrático, compartilhado através do diálogo, a despeito das limitações de comunicação que o CEM 4 ainda não superou. Numa conversa informal, depois de finalizadas todas as oficinas do Projeto Inesc/Cáritas, alunos, alunas e direção deram a entender que o próximo passo do CEM 4 deverá ampliar a participação em todos nos processos decisórios da escola.
“A idéia de criar o personagem foi muito legal, a gente colocou as nossas histórias neles.” Raquel Ferreira, 18
Na Escola Classe 17 de Taguatinga A CULTURA MUDA POUCO A POUCO REVELANDO QUE A SOCIEDADE SÓ TEM A GANHAR QUANDO EFETIVADA A PARTICIPAÇÃO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO CENÁRIO SOCIAL.
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Desenvolvimento da Oficina Ensino Fundamental 1) Apresentação da proposta de trabalho aos meninos e meninas. 2) O que há numa cidade? Com essa pergunta, a turma começa a relacionar os elementos de uma cidade: casas, prédios, parques, circo, clube, shopping, trabalho, sorveteria, ruas, luz, rede de esgoto, padaria, teatro, cemitério, rodoviária, aeroporto, cabelereiro, dentista, praça...A facilitadora vai escrevendo no quadro todos os elementos mencionados pelos alunos e alunas. 3) Preparação do espaço de trabalho. Os grupos são formados, juntam-se as carteiras em grupos de cinco ou seis. A sala de aula foi montada no pátio interno da escola. 4) Depois de acomodados, uma grande folha de papel branco e lápis são distribuídos em cada grupo para a realização do desenho coletivo de uma cidade. A facilitadora passa pelos grupos, lembrando que é preciso desenhar todos os elementos da cidade que foram listados. Depois do desenho a lápis, a
meninada recebe pincéis atômicos para finalizar o desenho e dar maior visibilidade às formas. Toca o sinal do recreio. 5) Depois do recreio, a turma é reunida na sala de aula ainda vazia, numa grande roda, no chão. Os alunos chegam agitados do recreio, por isso, é preciso fazer exercícios de concentração para reiniciar o trabalho. A facilitadora propõe a “palma de salva”, que consiste em bater uma só palma coletiva. As repetições, aos poucos, tornam a palma uníssona. Depois, um segundo exercício, “o segredo da mão”. Com o grupo de mãos dadas, cada pessoa passa o número de aperto de mão a outra do lado, até que a volta esteja completa. Terminados os exercícios, a turma está pronta para dar continuidade às atividades. 6)Os desenhos das cidades já estão prontos. Cada grupo apresenta o seu no centro da roda. As cidades estão completas? Os itens das cidades, mencionados inicialmente, são checados e faltam alguns. No final das apresentações, as cidades são unidas de modo a formar uma só.
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NOVOS MECANISMOS VÃO SURGINDO E JÁ SE TEM GARANTIDA A PARTICIPAÇÃO DE ADOLESCENTES NAS CONFERÊNCIAS MUNICIPAIS, ESTADUAIS E NACIONAL DE DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.
Três perguntas são formuladas para a turma: 1) Quais são os direitos das crianças e adolescentes? 2) O que é cidadania? 3) As pessoas dessa grande cidade estão felizes, com seus direitos garantidos?
familiar e comunitária. O que significa você ter um direito e não os outros? Os direitos têm de andar juntos porque são indivisíveis. Mas, alguém tem de garantir os direitos. Quem garante? - O Estado, os pais, a constituição, são respostas que surgem do grupo.
Debates As respostas da primeira pergunta são dadas por cada grupo: Grupo 1: educação, vida, saúde, moradia, família, lazer, cultura.
- Se o pai e mãe estão desempregados, eles vão dar conta? Não. Então eles têm de ser atendidos, nos seus direitos, pelo poder público. A resposta da turma sobre o conceito de cidadania, é unânime: cidadania é o exercício de direitos e deveres.
Grupo 2: lazer, esporte, educação, amor, moradia, família, saúde.
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Grupo 3: estudo, esporte, amor, moradia, saúde, amizade, respeito, liberdade. Grupo 4: moradia, alimentação, lazer, educação, carinho, roupas, saúde, respeito. A PARTICIPAÇÃO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES GANHOU O NOME DE PROTAGONISMO COMO PERSPECTIVA DE ATUAÇÃO CONSCIENTE EM SEUS ESPAÇOS DE CONVIVÊNCIA.
Grupo 5: educação, moradia, transporte, lazer, carinho, saúde, família e vida. Grupo 6: família, vida, transporte, cultura, alimentação. A facilitadora dialoga com a turma: Amor, carinho estão no direito à vida
PARA APRIMORAR A ATUAÇÃO NO CENÁRIO POLÍTICO E SOCIAL É NECESSÁRIO QUE SE CONHEÇA MECANISMOS DE PARTICIPAÇÃO E PARA ISSO É ESSENCIAL QUE OS PROJETOS DE EDUCAÇÃO ASSEGUREM A FORMAÇÃO DE NOVAS CONSCIÊNCIAS E SENSIBILIDADES.
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A facilitadora lembra que sempre que falamos em direitos, tem um dever coladinho. Quando se diz que uma criança tem direito ao respeito, ela tem o dever de respeitar também. Quando se diz que alguém tem direito à vida, ela tem de respeitar sua própria vida e a vida das outras pessoas. O grupo volta ao trabalho, já realizado, para identificar as carências das cidades criadas. Na análise das cidades imaginadas, a turma aponta uma carência: a segurança pública. - De quem é a responsabilidade daquilo que falta na cidade? Pergunta a facilitadora.
É IMPORTANTE QUALIFICAR A HABILIDADE DE FAZER LEITURA DA REALIDADE, A ANÁLISE DE CONJUNTURA E A ANÁLISE SOBRE O QUE SE PASSA À SUA VOLTA.
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- Do governo, respondeu um menino. - Como o governo pode resolver essa carência? - Com dinheiro. Com esse diálogo, a facilitadora introduz o conceito de Orçamento Público, que é o tema do próximo encontro com o grupo. Comentários Gerais A participação das crianças na dinâmica proposta foi de muita qualidade. No desdobramento do trabalho, os desenhos foram pintados e utilizados como ponto de partida para a realização do encontro sobre Orçamento Público. A cidade deverá eleger um prefeito ou prefeita observando raça/etnia, gênero e proposta política. O trabalho da Profª Francisca junto à turma é notável pela desenvoltura com que as crianças abordaram os temas propostos. No início do ano, ela observou que seus alunos e alunas tinham potencial para aprender e realizar algo além do que propõem as matérias convencionais. Então, ela promoveu uma discussão com a sua turma que deu origem ao projeto
Olhar Cidadão, tendo a política como tema gerador de suas atividades. O objetivo do Olhar Cidadão foi motivar alunos e alunas a observarem o mundo com mais atenção, enfrentando-o como cidadãs e cidadãos participativos, cientes de seus direitos e deveres. Todos os temas lançados pelo Projeto Olhar Cidadão estavam diretamente ligados ao universo político. Pude então perceber o interesse das crianças em querer compreender esse sistema, com o desejo de participar de forma mais atuante, explicou a Profª. Francisca. O Projeto estimulou a curiosidade da turma em relação ao universo político. Por meio de abordagens cuidadosas, que combinaram o desenvolvimento dos diversos subtemas com as atividades curriculares de contrução do conhecimento, o Olhar Cidadão tirou do papel a palavra cidadania, definindo-a como Aprender a viver junto, desenvolver a compreensão do outro e a percepção das interdependências - realizar projetos comuns e preparar-se para gerir conflitos no respeito pelos valores do pluralismo, da compreensão mútua e da paz.
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DESENVOLVER A CAPACIDADE EXPRESSIVA NAS DIVERSAS LINGUAGENS É IMPORTANTE PARA QUE A EXPRESSÃO DÊ CONTA DE SINTETIZAR A VISÃO DE MUNDO, ASSIM COMO DE ESTABELECER UMA COMUNICAÇÃO CLARA.
OFICINA II E III
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Participantes Adolescentes, alunos e alunas do Ensino Médio. Crianças, alunos e alunas da 4ª série do Ensino Fundamental. Objetivo das oficinas Sensibilizar o grupo para pensar e emitir opiniões sobre o Orçamento Público, conhecendo as estruturas do Estado e as formas de participação da sociedade civil em seus processos decisórios.
ESTADO PODER DEMOCRACIA
e Orçamento Público
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TEXTOS DE REFERÊNCIA
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Você já se perguntou por que não existe uma quadra de esportes perto da sua casa? Por que as escolas públicas não são bonitas, não têm bons computadores e os banheiros estão quebrados e sujos? Por que, em algumas ruas da cidade, há esgoto e lixo correndo a céu aberto? Por que outras partes da cidade são mais bonitas, com asfalto, árvores e jardins com flores? Por que a população rural e as comunidades indígenas têm menos acesso ao atendimento hospitalar do que quem mora nas grandes cidades? Muitas dessas dúvidas poderiam ser respondidas se nós conhecessemos bem o que é o orçamento público. O orçamento público é o principal instrumento que os governantes utilizam para colocar em prática as políticas públicas. Ele é um reflexo da ação governamental: por meio dele, podemos perceber quais são as prioridades do governo, quem está sendo lembrado ou esquecido, quais regiões estão sendo atendidas. Pelo orçamento, percebemos também se os políticos estão buscando cumprir ou não as promessas que fazem durante as campanhas eleitorais. A maior parte do dinheiro brasileiro usado em ações públicas é arrecadada por meio de impostos, taxas e contribuições do/a
Instituto de Estudos Socioeconômicos
O orçamento público é o principal instrumento que os governantes utilizam para colocar em prática as políticas públicas.
cidadão/ã comum. Todos/as nós pagamos tributos. Isso acontece quando compramos comida, uma peça de roupa ou recebemos salário. Esses recursos são públicos. O dinheiro público deve ser utilizados em prol da sociedade, ou seja, a sua aplicação deve garantir os direitos de cidadãos e cidadãs declarados nas leis. Porém, não é tão simples assim. A decisão de como e onde gastar envolve grandes batalhas políticas e, muitas vezes, os principais problemas da população acabam não sendo priorizados. Em outras palavras, a destinação do dinheiro do povo depende da decisão dos políticos que elegemos. São os poderes Executivo e Legislativo, federais, estaduais e municipais, que definem onde serão aplicadas as riquezas do país. Os políticos eleitos são obrigados a administrar com responsabilidade esses recursos. Inclusive, o salário de todo funcionário público também vem do bolso da população. Como são arrecadadas as receitas do orçamento Como dito acima, a maior parte do dinheiro que o governo arrecada e administra sai do nosso bolso, isso acontece direta ou indiretamente. Por exemplo, pagamos licos.
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tributos indiretos quando compramos um pãozinho, um quilo de arroz, ou quando pagamos a conta de luz, a conta de água, etc. Isso ocorre porque os tributos indiretos estão embutidos nos preços das mercadorias e das tarifas de serviços públicos. Há também os tributos diretos, como o imposto de renda, que é pago automaticamente quando as pessoas recebem seus salários. Os tributos diretos também são pagos quando as pessoas prestam serviços para uma empresa ou para outra pessoa. No Brasil, a arrecadação de tributos contribui para aumentar a desigualdade ao invés de combatê-la. Isso ocorre porque o governo, na hora de tributar as pessoas, não diferencia quem possui uma renda alta de quem possui uma renda baixa. Dessa forma, os pobres acabam pagando, proporcionalmente, mais do que os ricos. É o que chamamos de “injustiça fiscal”. Entenda o orçamento Para construir uma cadeira, o marceneiro usa serrote, martelo e pregos. Para erguer as paredes de uma casa, o pedreiro usa cimento, tijolos e ferramentas. O orçamento público também é um instrumento de trabalho. Só que, neste caso, ele deve ser utilizado para a construção de uma nação
O orçamento público também é um instrumento de trabalho. Só que, neste caso, ele é utilizado para construir uma nação mais igualitária, mais fraterna e mais justa.
igualitária, fraterna e justa. Ele pode transformar o bairro onde moramos em um lugar melhor para se viver. Nesse sentido, funciona como uma ferramenta que o governo utiliza para decidir sobre a distribuição dos recursos: o quanto de dinheiro vai ser destinado para resolver os problemas e as reivindicações da sociedade. O orçamento é organizado por um conjunto de documentos. São muitos números que, para um olhar desatento, parece uma confusão. Mas, não tem nada de bagunça. Esses documentos integram uma lei por meio da qual os governos deixam claro onde, como e quando pretendem gastar os recursos arrecadados da sociedade. A cada ano, prefeitos/as, governadores/as e o presidente da República são obrigados a enviar aos respectivos órgãos legislativos a proposta orçamentária para o ano seguinte. Depois de discussões e debates no Parlamento, isto é, nas Câmaras Municipais, nas Assembléias Legislativas e no Congresso Nacional, é criada a Lei Orçamentária, que autoriza o Executivo a aplicar os recursos arrecadados. Senadores/as, deputados/as e vereadores/as podem incluir no orçamento a previsão de verbas para a construção de hospitais, de escolas, de um posto policial em uma comunidade, por exemplo.
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Se o orçamento é uma lei, isso significa que os governos municipais, estaduais e federal só podem gastar o que foi autorizado nessa Lei. Fora algumas exceções, nem um centavo a mais pode ser gasto sem que o Legislativo autorize a mudança. Mas eles não são obrigados a usar tudo o que foi escrito e estabelecido na lei. O orçamento serve para definir um teto para os valores que os governos podem aplicar em determinada ação. Quer dizer, o governo não é obrigado a gastar tudo o que está previsto. É importante ressaltar que essa destinação de recursos não é dada pelos governantes sem disputas e acordos. Enquanto alguns grupos querem a construção de escolas, por exemplo, outros querem a melhoria em transportes. Os políticos também querem levar benefícios para suas regiões. Ao decidir entre interesses diferentes, os governantes fazem escolhas políticas, definem prioridades de governo e, ao mesmo tempo, atendem a grupos de interesse aos quais estão ligados. Além disso, como há muito dinheiro em jogo, é comum que alguns desonestos queiram se apropriar das verbas que pertencem a todas as pessoas. É o que chamamos de casos de corrupção. Por essa razão, o orçamento é alvo de disputas. É uma arena que reúne diversas
É importante ressaltar que essa destinação de recursos não é dada pelos governantes sem disputas e acordos. Enquanto alguns grupos querem a construção de escolas, por exemplo, outros querem a melhoria em transportes.
pessoas e diferentes interesses. Exatamente por isso, é preciso que a sociedade participe do processo de definição dos gastos públicos e esteja atenta à execução do que foi previsto no orçamento. Isso, para que os gastos do governo tenham realmente o caráter público e que sejam feitos para reduzir as desigualdades do país, contribuindo para que todos tenham melhor qualidade de vida. Monitorando os gastos públicos Executar o orçamento significa gastar aquilo que o Legislativo autorizou o Executivo a gastar. Depois que o Parlamento aprova o orçamento, a prefeitura, os governos estadual e federal já estão autorizados a construir praças públicas, áreas de lazer, asfaltar as ruas. A sociedade tem de ficar bastante atenta para que seja aplicado da melhor forma o dinheiro dos impostos que todos nós pagamos. Se aparecer no orçamento que o governo comprou computadores para sua escola, mas o laboratório de informática continua vazio, você pode questionar as autoridades. Se for constatado algum caso de corrupção, é preciso denunciar. As denúncias podem ser encaminhas para o Ministério Público. O Ministério Público é o
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protetor da sociedade e pode ajudar quando a população descobre alguma coisa errada no orçamento. O Tribunal de Contas também investiga qualquer desvio que acontece no orçamento público e pode receber as denúncias da população.
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Orçamento Criança e Adolescente - OCA Não é só uma frase bonita dizer que a criança e o adolescente são prioridades da família, da sociedade e do Estado. Essa afirmação consta na Constituição Federal de 1988 e é reafirmada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. Priorizar as crianças e adolescentes na distribuição dos recursos do orçamento é uma obrigação legal e também um passo importante para garantir o futuro da sociedade. O conjunto de ações e despesas do orçamento público voltado para projetos e políticas de proteção e desenvolvimento infanto-juvenil é chamado de Orçamento Criança e Adolescente - OCA. A metodologia, criada pelo Inesc em parceria com a Abrinq e o Unicef, analisa ações e programas de governo cujos beneficiários são crianças e adolescentes em três áreas: educação; saúde e assistência social; e direitos de cidadania.
O conjunto de ações e despesas do orçamento público voltado para projetos e políticas de proteção e desenvolvimento infanto-juvenil é chamado de Orçamento Criança e Adolescente, OCA.
Todas as iniciativas que contemplam o bemestar de meninos e meninas são consideradas na hora de somar o total de recursos destinados às crianças e adolescentes dentro do orçamento público: a educação e a saúde infantil, o combate à exploração sexual de crianças e adolescentes, o apoio a adolescentes capturados pelo crime e os programas destinados às famílias, como a bolsafamília, que garante auxílio em dinheiro para melhorar a qualidade de vida e manter as crianças na escola. O Orçamento Criança não é um documento e nem um conceito oficial. É uma iniciativa que demonstra e analisa o gasto público com crianças e adolescentes. O Inesc, por exemplo, calcula e monitora o OCA federal. Os dados são utilizados por diversos setores da sociedade interessados em saber o quanto o governo gasta com nossas crianças e adolescentes. Podemos, por exemplo, comparar o montante dos recursos aplicados, de um ano para o outro, avaliar essas variações e traçar estratégias de atuação política para ampliar o investimento em políticas a favor de crianças e adolescentes no orçamento federal.
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ARTIGO 5 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL “TODOS SÃO IGUAIS PERANTE A LEI, SEM DISTINÇÃO DE QUALQUER NATUREZA, GARANTINDO-SE AOS BRASILEIROS E AOS ESTRANGEIROS NO PAÍS A INDIVISIBILIDADE DO DIREITO À VIDA, À LIBERDADE, À IGUALDADE, À SEGURANÇA, À PROPRIEDADE....”
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OFICINA II Povo, Território e Poder Desenvolvimento da oficina Ensino Médio 1) Apresentação do grupo e facilitadores. Formação dos grupos. 2) Distribuição do material: revistas, tesoura, cola e uma folha de papel pardo. 3) Sorteio dos temas - POVO, TERRITÓRIO e PODER - entre os grupos. Cada grupo deve pesquisar nas revistas textos e imagens relacionados ao seu tema e fazer uma colagem na folha de papel pardo. Se for preciso, desenhos e frases escritas podem ser feitos para completar os sentidos do trabalho. O resultado deve ser a expressão do grupo sobre o tema. A facilitadora escreve no quadro o artigo 5º da Constituição Federal como referência para as reflexões e conceitos a serem elaboradas pelos grupos. 4) Apresentação dos grupos 5) A facilitadora distribui uma série de tarjetas onde estão escritos os elementos que formam as estruturas do Estado. Na parede, ela monta um quadro com linhas e colunas. Na horizontal, os poderes
do Estado, Legislativo, Executivo e Judiciário. Na vertical os níveis de abrangência dos poderes públicos, federal, estadual e municipal. À parte, mas presente como instrumento de poder, o Ministério Público. Os participantes devem encaixar as tarjetas, localizando a linha correspondente ao nível de abrangência, e a coluna de acordo com o poder público a que pertence aquele elemento. No Centro de Ensino Médio da Asa Norte Grupo 1 TERRITÓRIO Os participantes explicam o sentido das imagens, dos desenhos e do mapa do Brasil, colados no cartaz. O território delimita o exercício do poder. Há uma ligação entre território, povo e poder. Um exemplo disso é a dificuldade para um país subdesenvolvido de fazer comércio com um país rico. Como penetrar no território comercial de um país rico e romper com a relação de poder que existe entre eles? Grupo 2 POVO O gupo representou etnias, classe social, religião. São várias pessoas com destinos
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POVO É UMA COMUNIDADE HUMANA QUE VIVE SOB A MESMA ORDENAÇÃO JURÍDICA E COMPARTILHA DE INTERESSES COMUNS.
e vidas diferentes. A cultura de massa tenta colocar todo mundo no mesmo padrão. O facilitador pergunta se o povo consegue se organizar em torno de um único objetivo. O grupo responde que não. Há uma relação de exploração entre as classes sociais. Uma elite impõe a exclusão dos invisíveis. Por não ter espaço de expressão, eles ficam invisíveis. As pessoas em nossa sociedade, para aparecerem, têm de estar no topo. Apenas os poderosos têm acesso à mídia. Para ter voz, o povo tem de ter o domínio da mídia. Falta espaço para a maioria se comunicar e aparecer.
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“O povo é composto de várias pessoas com destinos e vidas diferentes, mas a cultura de massa tenta colocar todo mundo no mesmo padrão.” Lucas de Lima, 16
Grupo 3 PODER O poder é organizado: político, religioso, econômico, porém vai além do poder institucional, está nas relações pessoais, de trabalho, entre colegas de escola, amigos, na família. Há o poder do atleta nos esportes de elite, bancado pelos grandes patrocinadores, o poder dos assassinos, poder paralelo, o poder tecnológico, poder econômico, capitalista, o poder de resistência, o terrorismo, o poder de sedução. A mídia apóia quem está no poder, porque ela tem interesse na troca de favores. Interessa o exercício do poder .
Em si, ter poder não é prejudicial, mas a personificação do poder sim. Debates As leis são os instrumentos para imposição do poder, porém, se não tivéssemos determinadas regras não conseguiríamos viver em sociedade. A facilitadora faz comentários sobre a Constituição, a lei basilar para todas as demais regras e propõe uma reflexão sobre os artigos 5o e 6o, que tratam dos direitos sociais, civis e políticos. O que podemos fazer para mudar as práticas distorcidas ou fora da lei? A participação é o caminho para garantir os direitos previstos nas leis. A participação se torna mais eficaz quando a sociedade civil se organiza. Organizados, os cidadãos têm mais força para garantir os direitos previstos nas leis. Porém, não basta se organizar, é preciso conhecer e utilizar os caminhos institucionais que colocam o Estado democrático em movimento. Comentários gerais Conhecer as estruturas do Estado é muito importante para orientar as iniciativas de participação. Porém, há um consenso entre os participantes de que as interações entre o Estado e os espaços institucionais
O TERRITÓRIO É UM ESPAÇO DELIMITADO E CONTROLADO, ATRAVÉS DO QUAL SE EXERCE UM DETERMINADO PODER, NA MAIORIA DAS VEZES, RELACIONADO AO PODER POLÍTICO DE ESTADO. ¹
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PARA UNS, O TERRITÓRIO É CONSTRUÍDO MUITO MAIS NO SENTIDO DE UMA ÁREA-ABRIGO E FONTE DE RECURSOS. PARA OUTROS, INTERESSA ENQUANTO ARTICULADOR DE CONEXÕES OU REDES DE CARÁTER GLOBAL. ²
de participação e de controle social merecem uma reflexão aprofundado pela complexidade e desafios que apresentam.
poder de escolher seus representantes. Aqueles que o fazem com consciência, podem cobrar o desempenho dos seus representantes.
No Centro de Ensino Médio 4 do Guará Grupo 1 POVO O grupo cola a imagem de muita gente no cartaz. Adultos, crianças, adolescentes, negros, brancos, índios. Porém, os idosos não são contemplados. “O povo constitui a nação.” Quem é o povo brasileiro? Por constituir uma nação, as pessoas são sujeitos de direitos e deveres.
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Grupo 2 PODER O grupo associou a idéia de poder com o presidente do país, com um faraó, com o dólar. Citou a mídia como fonte de um poder, exercido sobre a sociedade. Porém, outras formas de poder se configuram no espaço social: as manifestações populares. Será que o poder que vem do povo existe? O poder popular já mostrou sua força no impeachment do presidente Collor. Onde está concentrado o poder do país? Nas mãos dos homens brancos e ricos. As eleições democráticas dão ao povo o
Grupo 3 TERRITÓRIO A idéia de território se desdobrou em território urbano, ambiental e cultural. Está associado ao povo e ao poder. É possível ter um território sem o povo? Existem povos sem território, como os ciganos e palestinos, e povos, cuja posse de seus territórios é virtual, como os índios brasileiros, pois suas terras pertencem à União. O Brasil é um país rico em territórios culturais. É preciso ampliar a participação das minorias no exercício do poder. Debates Para chegar ao poder é preciso estar preparado. A elite não aceita que qualquer pessoa rompa a barreira da invisibilidade e participe do espaço do poder. A mídia manipula a opinião pública para defender seus interesses. Como tem poder de penetração, atinge a todo o território nacional, integrando-o num ponto de vista comum, padronizando também o território cultural.
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O PODER É FRUTO DE RELAÇÕES E, PORTANTO, NÃO É UM FATO QUE PODE SER ISOLADO COMO UMA COISA QUALQUER, MAS É ALGO RELACIONAL, QUE FAZ PARTE DAS RELAÇÕES HUMANAS. ³
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O ESTADO É UMA SOCIEDADE POLÍTICA ORGANIZADA, O QUE IMPLICA A EXISTÊNCIA DE UMA AUTORIDADE PRÓPRIA E DE REGRAS DEFINIDAS PARA A CONVIVÊNCIA DE SEUS MEMBROS.
Comentário geral O grupo visualiza as estruturas do Estado com grande interesse. São informações que, sistematizadas num quadro, ganham sentido para os participantes, que ampliam seus conhecimentos e lhes permitem fazer analogias com as vivências locais.
diponibilizado na internet, parece um amontoado de números, siglas e códigos difíceis de entender. Os participantes concordam com o facilitador sobre a importância do orçamento público, assunto que poderia se tornar uma disciplina curricular.
OFICINA III Orçamento Público e democracia Desenvolvimento da oficina Ensino Médio
2)Uma dinâmica é proposta para a simulação de um orçamento doméstico. Tanto no CEAN, quanto no CEM 4, os participantes se dividem em grupos para discutirem e definirem o orçamento mensal dos personagens, criados na primeira oficina.
1)Os participantes são levados a assistirem o filme “Cidade dos homens”. Em seguida, o facilitador propõe uma reflexão sobre os conteúdos do filme, cujo enredo mostra a circulação do dinheiro no comércio, no pagamento dos impostos e as dificuldades dos personagens para manter seus orçamentos. Relatos pessoais são feitos para ilustrar as dificuldades orçamentárias das famílias, a carga tributária dos trabalhadores e trabalhadoras, e a má administração dos gastos públicos em obras superfaturadas. O facilitador explica as diversas formas de arrecadação de impostos executadas pelo Estado, como os orçamentos públicos são elaborados, efetivados e disponibilizados à população. Porém, os participantes lembram que o orçamento público,
A INSTÂNCIA MÁXIMA DE ADMINISTRAÇÃO EXECUTIVA DE UM ESTADO É O GOVERNO. O ORÇAMENTO PÚBLICO É O PRINCIPAL INSTRUMENTO QUE OS GOVERNANTES UTILIZAM PARA COLOCAR EM PRÁTICA AS POLÍTICAS PÚBLICAS.
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3) Os facilitadores fazem o papel do poder público, recolhendo impostos para executar o orçamento proposto pelo Poder Executivo e aprovado pelo Poder Legislativo. Os grupo separam 1/3 de suas rendas para o pagamento dos impostos. No CEAN, os itens de despesa do orçamento são representados por frascos transparentes contendo líquidos coloridos. Quanto maior o gasto mensal com um item de despesa, maior a quantidade de líquido dentro do frasco. 4) Os participantes dosam os gastos de acordo com as prioridades de cada personagem. Cada personagem recebe
POR MEIO DO ORÇAMENTO PÚBLICO, PODEMOS PERCEBER QUAIS SÃO AS PRIORIDADES DO GOVERNO, QUEM ESTÁ SENDO PRIORIZADO OU ESQUECIDO, QUAIS REGIÕES ESTÃO SENDO ATENDIDAS.
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uma quantidade de líquido colorido correspondente a uma renda de R$ 500,00. No CEM 4, pequenas cédulas são distribuídas aos grupos para a elaboração de um orçamento doméstico. A facilitadora faz uma comparação entre o orçamento doméstico e o orçamento público, a partir da definição de prioridades e da distribuição dos recursos nos diversos itens que os compõem. 5) Entram em cena os personagens da primeira oficina, Paulo, Tevis, Camila e Lia, agora, como trabalhadores de uma fábrica de chocolate, recebendo um salário de R$ 500,00. 6) No papel dos poderes públicos, em ambas as escolas, os facilitadores definem os itens do orçamento público, com os investimentos correspondentes, oriundos dos impostas arrecadados nos grupos. Essa proposta de orçamento deverá ser analisada e modificada pelo grupo no final da oficina. No Centro de Ensino Médio da Asa Norte Grupo 1 Beringela mora sozinho. Os itens de seu orçamento doméstico são: educação, lazer,
aluguel, telefone, cultura, alimentação e gás. O aluguel é o item mais caro. Mesmo com um orçamento apertado, Beringela ainda consegue economizar R$ 10 para uma caderneta de poupança. O grupo concluiu que a vida do personagem é muito difícil por causa de seu orçamento apertado. Beringela fica dependendo do invenstimento do Estado em políticas públicas para garantir direitos (lazer, saúde, por exemplo) que estão fora de suas condições financeiras. Grupo 2 Maria das Dores dividia sua renda em moradia, educação, alimentação, transporte, cultura e lazer. A educação é o item que mais pesa no orçamento de Maria. Não estão previstos gastos com saúde, vestuário, higiene, por exemplo. Com uma renda de R$ 500 não é possível ter filhos. Como uma família consegue viver com essa renda? Grupo 3 Com um orçamento de R$ 500, Emanuel só conseguia pagar seus gastos com alimentação, saúde, educação, transporte e um pouco de lazer. Mesmo assim, sempre reservava algum para uma poupança. Para completar seu orçamento, recebia recursos das políticas públicas de assistência social.
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A MAIOR PARTE DO DINHEIRO BRASILEIRO USADO EM AÇÕES PÚBLICAS É ARRECADADA POR MEIO DE IMPOSTOS, TAXAS E CONTRIBUIÇÕES DOS CIDADÃOS E CIDADÃS. TODOS/AS NÓS PAGAMOS TRIBUTOS. ISSO ACONTECE QUANDO COMPRAMOS COMIDA, UMA PEÇA DE ROUPA OU RECEBEMOS SALÁRIO.
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A DECISÃO DE COMO E ONDE GASTAR O DINHEIRO PÚBLICO ENVOLVE GRANDES BATALHAS POLÍTICAS E, MUITAS VEZES, OS PRINCIPAIS PROBLEMAS DA POPULAÇÃO ACABAM NÃO SENDO PRIORIZADOS.
Debates Após a apresentação dos grupos, a facilitadora, que fazia o papel de gestora, chefe do executivo, convidou a todos para analisarem a distribuição, no orçamento público, dos recursos arrecadados com os impostos (1/3 da renda de cada grupo). Chamou a atenção para o fato de que ninguém foi conferir os gastos públicos, no momento em que eles ocorreram. Os grupos discordaram veementemente da forma como o orçamento foi executado. Em seguida, propuseram uma mudança radical em prioridades e montantes. A pressão dos grupos, impondo à gestora os interesses coletivos, modificou o orçamento inicial. O facilitador explicou que a oficina havia simulado uma situação real. As ações das forças sociais pressionam os governos para direcionarem recursos para aquilo que consideram mais importante, embora isso não seja tarefa fácil. O facilitador lembrou que o Estado tem obrigação de destinar recursos para a promoção dos direitos pevistos na Constituição Federal. Ao final, os participantes se organizam numa roda para fazerem a avaliação da atividade. O facilitador solicita ao grupo que cada uma das pessoas resuma a sua
experiência em uma palavra. A roda vai girando e as palavras elucidação, construção, direito, conhecimento, instrumento, conscientização, interessante, saber, aprendizado, participação, mobilização sintetizam o resultado dos trabalhos. No Centro de Ensino Médio 4 Grupo 1 A Lia mora sozinha num pequeno quarto, num “muquifo”. Tem uma vida muito corrida e ganha muito pouco para suas necessidades. Ela sai cedo para o trabalho, onde fica o dia todo. Do trabalho vai direto para a faculdade, que é pública. Seus gastos são aluguel, energia, transporte, alimentação e lazer. Nos domingos, ela se diverte nos bares da cidade, tomando uma bebidinha junto com seus amigos. Grupo 2 Teves sustenta seus pais e irmãos. Todo seu dinheiro é gasto com moradia, transporte e alimentação. Não pode investir em educação, por isso, estuda à noite em escola pública, fazendo o ensino médio. A vida de Teves é muito difícil. Com uma renda tão pequena é improvável que seu futuro melhore. As oportunidades ficam reduzidas porque ele não pode investir em
A CADA ANO, PREFEITOS/AS, GOVERNADORES/AS E O PRESIDENTE DA REPÚBLICA DEVEM ENVIAR AOS ÓRGÃOS LEGISLATIVOS A PROPOSTA ORÇAMENTÁRIA PARA O ANO SEGUINTE. DEPOIS DE DISCUSSÕES E DEBATES NO PARLAMENTO, É CRIADA A LEI ORÇAMENTÁRIA, QUE AUTORIZA O EXECUTIVO A APLICAR OS RECURSOS ARRECADADOS.
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SE O ORÇAMENTO É UMA LEI, ISSO SIGNIFICA QUE OS GOVERNOS MUNICIPAIS, ESTADUAIS E FEDERAL SÓ PODEM GASTAR O QUE FOI AUTORIZADO NESSA LEI.
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educação. Teves está sempre dependendo das políticas públicas de assistência ao trabalhador. Grupo 3 Paulo vive com seus pais, por isso, suas despesas básicas estão garantidas. Seu salário fica mais livre e Paulo investe bastante em sua educação. Assim prepara sua vida profissional, especializando-se em cursos que ampliem suas oportunidades. Sua vida é tranquila. Se tiver algum problema inesperado, seus pais estão ali para ajudá-lo. Grupo 4 Camila trabalha muito e gasta pouco. O seu salário é curto, mas ela sabe dividir bem seu orçamento para sobreviver. É impossível contar com seu salário para resolver problemas inesperados. Nesse caso, é preciso contar com a ajuda de outras pessoas. Debates Os participantes se reúnem para avaliar e modificar a proposta de orçamento público feita pela facilitadora, no papel de gestora. As mudanças mais importantes foram feitas nos investimentos em saúde, educação e segurança, refletindo as experiências do grupo nessas áreas.
Para concluir, a grande pergunta é: - Como se pode decidir democraticamente sobre o orçamento público? Pergunta a facilitadora. - A estratégia é reunir todo mundo para ouvir e formar uma opinião coletiva sobre as prioridades e os gastos. Os grupos sociais apresentam uns aos outros seus projetos para serem aprovados por todos. Depois é ir lá cobrar dos gestores, respondeu João. - O orçamento público não é suficiente para resolver tudo. É preciso estabelecer prioridades e ir solucionando os problemas passo a passo, lembrou o facilitador. - Mas sempre ouvindo a população, completou a facilitadora. O orçamento público é sempre um campo de disputas. Os grupos sociais têm interesses diversos , que nem sempre coincidem uns com os outros. - No jogo político, os aliados ajudam a realizar os seus interesses. É sempre bom ter aliados nas esferas governamentais, disse o facilitador. - Aqueles grupos mais atentos, que cobram mais, acabam levando, diz o André. Comentários gerais A oficina possibilitou ao grupo fazer a relação entre políticas públicas e orçamento e refletir sobre a participação
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O ORÇAMENTO SERVE PARA DEFINIR UM TETO PARA OS VALORES QUE OS GOVERNOS PODEM APLICAR EM DETERMINADA AÇÃO. QUER DIZER, O GOVERNO NÃO É OBRIGADO A GASTAR TUDO O QUE ESTÁ PREVISTO.
O ORÇAMENTO PÚBLICO É ALVO DE DISPUTAS. POR ISSO, É PRECISO QUE A SOCIEDADE PARTICIPE DO PROCESSO DE DEFINIÇÃO DOS GASTOS PÚBLICOS E ESTEJA ATENTA À EXECUÇÃO DO QUE FOI PREVISTO NO ORÇAMENTO.
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social na elaboração e no controle das decisões governamentais nessas áreas. Para viver com um orçamento doméstico tão reduzido, a maioria dos brasileiros deveria contar com políticas públicas que compensassem essa deficiência, com ofertas de programas culturais, saúde e educação de qualidade, atentas à formação para o trabalho e habitação popular.
4) Uma conversa é iniciada pela facilitadora sobre os diversos elementos que compõem aquela cidade. Espaços físicos, pessoas e instituições públicas são identificados para iniciar um debate sobre povo, território e poder. Igrejas, escolas, shoppings, mercados, boates, casas, parques e outros são apontados como territórios distintos na cidade.
Na Escola Classe 17 de Taguatinga
Homens, mulheres, crianças, adolescentes, idosos com suas diversidades raciais e étnicas, negros, indígenas, brancos, morenos, pessoas com deficiência, pessoas e suas orientações sexuais, são identificados nos diversos espaços da cidade, formando um único conjunto, o povo.
Desenvolvimento da oficina Ensino Fundamental 1) Apresentação da proposta de trabalho aos meninos e meninas. 2) A facilitadora inicia a oficina, solicitando aos alunos e alunas que reapresentem os desenhos das cidades, feitos pelos grupos na oficina 1. Naquela ocasião, ficou combinado que os grupos deveriam completar e pintar seus desenhos. Isso foi feito, sob a orientação da Profª Francisca. Meninos e meninas juntam os desenhos no chão para formar uma única cidade. 3) Todos são convidados a formar uma roda, sentados no chão, em torno do conjunto de desenhos.
Para abordar o conceito de poder, a facilitadora busca o exemplo no sitema de poder do Distrito Federal: um governo central e suas regiões administrativas. Um governador ou governadora deve ser eleito/a pelo povo para representá-lo na realização de seus interesses. Segundo as crianças, numa democracia representativa, o governador deve ser honesto, responsável, respeitar as diferenças, não se comprometer com as coisas que não pode fazer, ser gentil,
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O GRAU DE PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA REFLETE DIRETAMENTE NA QUALIDADE DE VIDA DE SEU POVO, POIS É POSSÍVEL SE MEDIR O QUANTO QUE AS POLÍTICAS SÃO DESTINADAS (OU NÃO) A ATENDER ÀS REAIS DEMANDAS DA POPULAÇÃO.
alegre, amigo, respeitar a população, saber governar, ser organizado, ser fiel e não desviar o dinheiro público. 5) Levando em consideração todas as qualidades de um/a governante, a facilitadora propõe uma eleição para escolher um/a representante para governar a cidade criada pelos meninos e meninas. Ela coloca em votação algumas características da pessoa que deverá ser eleita para esse cargo. O perfil mais votado é uma mulher jovem, de origem oriental. A facilitadora aproveita a oportunidade para informar que, no Brasil, a maioria dos ocupantes de cargos públicos é do sexo masculino e de cor branca.
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CONTROLE SOCIAL É COMO SE DENOMINA O PROCESSO DE ACOMPANHAMENTO CRITERIOSO E SISTEMÁTICO SOBRE AS POLÍTICAS DE GOVERNO, SEJAM ELAS MUNICIPAIS, ESTADUAIS OU FEDERAIS.
6) Eleita a governadora, os alunos e alunas são organizados em grupos, de acordo com a formação inicial que produziu os diversos desenhos da cidade. Os grupos constituem-se como subprefeituras de regiões administrativas. A facilitadora sorteia, em cada grupo, problemas de ordem pública para serem solucionados. As soluções criadas deverão ser acrescentadas nos desenhos da cidade em forma de imagem.
Soluções dadas pelas crianças Os grupo discutem seus problemas e desenham as soluções nas respectivas regiões administrativas. Os facilitadores perguntam se os grupos estão prontos para apresentarem. Os grupos montam novamente a grande cidade e começa a apresentação. Grupo 1 4Joana comprou uma TV que não funcionava. Joana deveria procurar um advogado ou uma advogada para defendê-la, porém, na falta de recursos próprios, por sugestão da facilitadora, poderia procurar a Defensoria Pública. 4Os pais de uma criança desejam batizála. Os pais da criança que desejavam batizála foram encaminhados a uma igreja, com a ajuda da subprefeitura. 4Crianças não têm opção de atividades no turno contrário da escola. Uma programação de atividades foi criada para receber crianças no turno contrário da escola. Grupo 2 4As praças estão abandonadas e não existe uma lei que regule a ação do governo sobre o problema.
O CONTROLE SOCIAL, QUANDO EFETIVAMENTE EXERCIDO, PROMOVE UMA AMPLIAÇÃO DA ESTRUTURA DE PODER, CONTANDO COM MAIS SUJEITOS POLÍTICOS CAPAZES DE ORIENTAR E FISCALIZAR AS AÇÕES DO ESTADO. ESTA É UMA FORMA DE PARTICIPAÇÃO DIRETA QUE FORTALECE A CULTURA DEMOCRÁTICA.
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“Perto da minha casa tem uma quadra toda arrebentada. O governo foi lá e fez outra. Tá lá, bonitinha. Mas, ao invés de reformar a velha quadra, não, fez outra. Eu acho isso errado.” Aluno da EC 17
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A subprefeitura organizou eventos para arrecadar recursos e recuperar as praças e construir quadras de esporte. 4A região administrativa sofre uma epidemia de dengue. Agentes de saúde deverão ser contratados para orientar a população para defenderse do surto de dengue. Uma dedetização e limpeza da cidade deverá ser providenciada pelo poder público. Grupo 3 4Há uma denúncia de que Moacir, de dez anos, tem sofrido maus-tratos pelos próprios pais. Com a denúncia de que Moacir sofria maus-tratos em sua própria casa, foi criado um Conselho Tutelar, que passou a acompanhar sua convivência doméstica. A facilitadora lembrou que o Ministério Público também poderia acolher essas denúncias na vara de família. 4Uma turma de alunos, numa escola da região administrativa, está sem professor há 30 dias. A escola que está sem professor deverá receber um substituto imediatamente. 4Ana caiu de uma escada e foi levada ao hospital, porém, não pôde tirar uma radiografia porque a máquina de raio-x está quebrada. A família de Ana foi procurar a
governadora para que liberasse recursos para o conserto do aparelho de raio-X. Grupo 4 4Cães e gatos estão soltos pelas ruas ameaçando os moradores com as doenças que podem transmitir, atacando pessoas e sujando as ruas. Uma associação de defesa dos animais foi criada para abrigar e cuidar dos animais soltos pelas ruas. 4A sorveteria foi roubada em R$ 500 e o dono quer justiça. Melve, o rapaz que roubou a sorveteria deverá prestar serviços à comunidade como pena pelo seu crime. O facilitador propõe a criação de uma organização em defesa dos direitos humanos, contra tratamentos desumanos aplicados aos infratores da lei. Sua iniciativa é motivada pelo rigor com que as crianças tratam a questão do roubo, ao sugerirem que Melve seja preso e acorrentado. 4Um jornal veiculou uma notícia de superfaturamento na obra pública de construção de uma ponte. Uma passeata é organizada contra a corrupção e o superfaturamento das obras públicas. Uma faixa traz os dizeres “abaixo a governadora”. A facilitadora lembra que as denúncias
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FICAR DE OLHO NO ORÇAMENTO PÚBLICO DIFICULTA A CORRUPÇÃO. CONHECER O ORÇAMENTO E ACOMPANHAR A SUA EXECUÇAO É DIREITO DE QUALQUER CIDADÃO E DE QUALQUER CIDADÃ, EM QUALQUER IDADE.
devem ser apuradas, porém, as manifestações populares sempre apressam as investigações. Comentários gerais Meninos e meninas, mais uma vez, demonstraram que possuem liberdade e motivação para buscar soluções quando seus direitos estão ameaçados. Em suas soluções, mesmo as mais ingênuas, é possível perceber que superaram atitudes conformistas e apáticas, e são capazes de discutir seus problemas coletivamente. Orçamento Público e democracia. 78
Desenvolvimento da oficina Dinâmica 1 Priorizando as necessidades da família
COMO O ORÇAMENTO DIZ RESPEITO AOS MEUS DIREITOS? O DESVIO DOS RECURSOS INVIABILIZA O EXERCÍCIO DOS DIREITOS PORQUE COMPROMETE A REALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS QUE CONCRETIZAM TAIS DIREITOS.
1) Para sensibilizar a meninada, a facilitadora começa a oficina cantando, acompanhada de um pandeiro, a música de Paulino da Viola, Pode guardar as panelas. A letra da música foi distribuida para todos , que juntos, cantaram o refrão. Você sabe que a maré Não está moleza não E quem não fica dormindo de touca Já sabe da situação Eu sei que dói no coração
Falar do jeito que falei Dizer que o pior aconteceu Pode guardar as panelas Que hoje o dinheiro não deu Dei pinote adoidado Pedindo emprestado e ninguém emprestou Fui no seu Malaquias Querendo fiado mas ele negou Meu ordenado apertado, coitado, engraçado, Desapareceu Fui apelar pro cavalo, joguei na cabeça Mas ele não deu Você sabe que a maré Não está moleza não E quem não fica dormindo de touca Já sabe da situação Eu sei que dói no coração Falar do jeito que falei Dizer que o pior aconteceu Pode guardar as panelas Que hoje o dinheiro não deu Para encher a nossa panela, comadre Eu não sei como vai ser Já corri ora todo lado Fiz aquilo que deu pra fazer Esperar por um milagre Pra ver se resolve essa situação Minha fé já balançou Eu não quero sofrer outra decepção.
SE APARECER NO ORÇAMENTO QUE O GOVERNO COMPROU COMPUTADORES PARA SUA ESCOLA, MAS O LABORATÓRIO DE INFORMÁTICA CONTINUA VAZIO, VOCÊ PODE E DEVE QUESTIONAR AS AUTORIDADES.
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O CONJUNTO DE AÇÕES E DESPESAS DO ORÇAMENTO PÚBLICO VOLTADO PARA PROJETOS E POLÍTICAS DE PROTEÇÃO E DESENVOLVIMENTO INFANTO-JUVENIL É CHAMADO DE ORÇAMENTO CRIANÇA E ADOLESCENTE, O OCA.
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Os facilitadores comentam com as crianças o significado da letra da música, fazem perguntas e buscam exemplos. 2) Em seguida, a facilitadora distribui balões vazios para a turma. Para cada aluno e aluna entrega um papelzinho dobrado onde está escrito um item de despesa de um orçamento qualquer, que deve ser colocado dentro do balão. Feito isso, a turma enche os balões e os entrega ao facilitador. Com todos os balões cheios, a turma é convidada para ir ao pátio da escola. Lá, cada criança recebe um balão. Os facilitadores estimulam todos e todas a brincarem com os balões. Depois de alguns minutos, os balões começam a estourar. À medida que o balões são estourados, as crianças pegam os papéis que estavam dobrados no seu interior. 3) Quando todos os balões são estourados, os facilitadores convidam alunos e alunas a voltarem para a sala. Os grupos são formados para iniciar uma outra etapa da atividade. Os facilitadores solicitam a cada grupo
que coloque em ordem de prioridade os itens de despesa que recebeu. 4) Apresentação dos grupos Grupo 1 Livros, lanchonete, salgadinho, show e óculos escuros. Grupo 2 Curso de língua, aluguel, dentista, pasta e escova de dente, corte de cabelo e sorvete. Grupo 3 Água, sabonete, remédio, óculos de grau, refrigerante, doce, TV a cabo e cinema. 81
Grupo 4 Cofre, produtos de limpeza, fliperama e brinquedo. Grupo 5 Biscoito, transporte, curso de música, ingresso para o jogo, telefone fixo e merenda fora da escola. Grupo 6 Material escolar, uniforme, shampu, telefone celular, roupa, CD/DVD. À medida que os grupos se apresentam, os comentários vão surgindo. Tem que comer primeiro. Vai comprar livro no lugar da comida?
TODAS AS INICIATIVAS QUE ATINGEM DIRETAMENTE MENINOS E MENINAS, BEM COMO O APOIO ÀS FAMÍLIAS SÃO LEVADOS EM CONSIDERAÇÃO NA HORA DE SOMAR O TOTAL DE RECURSOS QUE SÃO DESTINADOS PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES DENTRO DO ORÇAMENTO PÚBLICO.
AS FAMÍLIAS, TODOS OS MESES, PRIORIZAM CERTAS DESPESAS, A PARTIR DAS NECESSIDADES DE SEUS MEMBROS E DA DISPONIBILIDADE DE RECURSOS. ASSIM, TAMBÉM AGEM OS GOVERNOS.
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Se escovar os dentes todos os dias, não precisa gastar muito dinheiro com dentista. O aluguel é mais importante do que o curso de línguas. É preciso morar primeiro. Mas saber outra língua é muito importante para o trabalho. O remédio é mais importante do que o sabonete. O cinema, a gente tem que pagar. O facilitador pergunta: - Existe o certo e o errado nas prioridades de um orçamento? O que é mais importante para uma família, para a outra já não é tanto. Não tem uma regra, apenas o bom-senso. Os temas do orçamento, comida, transporte, telefone, livros foram gerando diversos comentários, buscando-se a relevância de cada item para a vida. Os orelhões são mais baratos que os telefones fixos, que são mais baratos que os celulares. Se entra ladrão em casa, é possível chamar a polícia. Como se chega ao trabalho sem o transporte? As coisas mais importantes primeiro, educação, higiene pessoal, depois o lazer. - O que seria mais importante que tudo? Pergunta o facilitador.
- Água, depois comida, depois remédio, depois material escolar, responde um aluno. Debates O facilitador lembra que o exercício de escolher as prioridades do orçamento doméstico é feito constantemente pelo nosso pai e pela nossa mãe. Dentro da mesma família existem interesses diferentes e, com o dinheiro contado, não é fácil chegar a um acordo. A facilitadora explica que o primeiro momento da atividade foi uma introdução para se pensar em necessidades e prioridades. Agora, é preciso definir os itens do orçamento doméstico e de um orçamento público na atividade seguinte que será realizada depois do recreio.
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Dinâmica 2 Do orçamento doméstico ao orçamento público Reunidos os alunos e alunas novamente, os facilitadores iniciam as atividades. 1)As crianças organizam-se em grupos, formando as famílias 2)Cada grupo/família recebe um conjunto de copos graduados transparentes, que
APESAR DO ECA DIZER QUE OS GOVERNOS DEVEM APLICAR PRIORITARIAMENTE OS RECURSOS PÚBLICOS EM POLÍTICAS DE PROMOÇÃO DE DIREITOS DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES, ISSO NÃO ACONTECE.
O ORÇAMENTO CRIANÇA NÃO É UM DOCUMENTO E NEM UM CONCEITO OFICIAL. É UMA INICIATIVA QUE DEMONSTRA E ANALISA O GASTO PÚBLICO COM CRIANÇAS E ADOLESCENTES.
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representam os itens do orçamento doméstico, a serem definidos pelos participantes. 3) Uma garrafa pet contendo uma quantidade de líquido colorido, representando a renda da família, foi entregue a cada grupo. 4) A facilitadora, representando a governadora eleita, passou em cada grupo/família recolhendo 35% do líquido colorido, a título de impostos. Com a arrecadação dos impostos, iniciou a elaboração do orçamento público da cidade. 5) Depois de definidos os itens do orçamento de cada grupo/família, os copos graduados foram etiquetados e o líquido colorido distribuído dentro deles, de acordo com os gastos mensais de cada item. 6) Cada grupo/família apresenta seu orçamento doméstico, seguido das observações dos ouvintes. 7) A facilitadora apresenta o Orçamento Público que ela elaborou, no papel de governadora. Itens e distribuição de recursos foram bastante criticados. As
festas e os carros oficiais foram praticamente abolidos pelos meninos e meninas que alteraram toda a proposta oficial. O dinheiro é nosso, ela que faça festas com o seu dinheiro, não o nosso. Os recursos devem ser divididos com igualdade. Igualdade e justiça para todos. O orçamento público deve considerar que há desigualdades entre as regiões e que, por isso, é preciso investir nos lugares mais pobres para se fazer justiça. No Distrito Federal, os deputados distritais são responsáveis por fiscalizar a execução do orçamento. A população pode se mobilizar e fazer uma passeata para manifestar sua indignação e exigir mudanças. Comentários gerais A realização das atividades da 2ª oficina foi uma oportunidade de por em prática os conhecimentos que a professora Francisca vem desenvolvendo com seus alunos ao longo do ano. As simulações do orçamento doméstico e do orçamento público são questões concretas, em que aprendizados e atitudes podem ser exercitados de forma lúdica e avaliados através da expressão dos alunos e das alunas.
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PRIORIZAR AS CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA DISTRIBUIÇÃO DOS RECURSOS DO ORÇAMENTO É UMA OBRIGAÇÃO LEGAL E TAMBÉM UM PASSO IMPORTANTE PARA QUE A SOCIEDADE E O PAÍS TENHAM DESENVOLVIMENTO NO FUTURO.
OFICINAS IV E V
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Participantes Adolescentes, alunos e alunas do Ensino Médio. Crianças, alunos e alunas da 4ª série do Ensino Fundamental. Objetivos Aprofundar a temática dos gastos públicos, identificando instâncias responsáveis pela elaboração e aprovação do orçamento público, com foco na educação (no Centro de Ensino Médio da Asa Norte) e merenda escolar (no Centro de Ensino Médio 4 do Guará e Escola Classe 17 de Taguatinga). Utilizar as diversas linguagens da comunicação como instrumento de ação política.
ORÇAMENTO PÚBLICO
PARTICIPAÇÃO POPULAR e COMUNICAÇÃO
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TEXTOS DE REFERÊNCIA
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Todo mundo gosta de ser ouvido/a, de ter a sua opinião levada em consideração no plano coletivo. Até os/as mais tímidos/as, que dificilmente falam, gostam de saber que, de alguma forma, a sua voz é ouvida. No entanto, historicamente as crianças e adolescentes foram excluídos de qualquer possibilidade de opinar sobre o que lhes afeta, ou mesmo de manifestar idéias sobre algo relacionado aos seus interesses, como se fossem incapazes. O que é um enorme equívoco. As pessoas mais indicadas para falar sobre determinados assuntos são as próprias interessadas, os sujeitos da ação, aqueles envolvidos diretamente no debate em questão. O que era polêmico passa a ser assumido pelos movimentos sociais, revelando que a sociedade só tem a ganhar quando efetivada a participação de crianças e adolescentes no cenário social. A participação ganhou o nome de protagonismo, como perspectiva de atuação consciente em seus espaços de convivência. O termo passou a ser adotado de norte a sul do país, sugerindo
Artigo 12 Os Estados Partes assegurarão à criança que estiver capacitada a formular seus próprios juízos o direito de expressar suas opiniões livremente sobre todos os assuntos relacionados com a criança, levando-se em consideração essas opiniões, em função da idade e da maturidade da criança.
CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO CENÁRIO COMUNITÁRIO E SOCIAL
Márcia Acioli
Nalberth, 10
Artigo 13 A criança terá direito à liberdade de expressão. Esse direito incluirá a liberdade de procurar, receber e divulgar informações e idéias de todo tipo, independentemente de fronteiras, de forma oral, escrita ou impressa, por meio das artes ou de qualquer outro meio escolhido pela criança.
uma abordagem pedagógica muito clara: a formação de crianças e adolescentes para a participação política, social e comunitária. Com a Convenção Internacional dos Direitos da Criança e do Adolescente de 1989, ratificado por todos os países membro da ONU, com exceção dos Estados Unidos da América e da Somália, a participação sai do campo do desejo para o campo dos direitos. A participação tem mais eficácia quando está expressa por um coletivo, mas isso não significa que toda participação deve estar enquadrada em algum modelo previsto. Os/as jovens têm vários modos de falar ao mundo e realizar seus projetos. A juventude é um momento da vida marcado pela inquietação, que se manifesta em desejos de transformação permanentes. Portanto a capacidade de se indignar e não se conformar com a situação imposta é intensa.Desconhecer esse aspecto pode conferir ao comportamento do/a jovem uma condição de transgressão ou de marginalidade, uma vez que a ordem
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deve ser mantida, e qualquer movimento de protesto ameaça o poder estabelecido. Atualmente, o diálogo entre as instâncias de gestão pública com crianças, adolescentes e jovens é restrito. Porém, novas oportunidades têm modificado esse cenário. As conferências municipais, estaduais e nacional de Direitos da Criança e do Adolescente hoje contam com a participação ativa de adolescentes. Projetos como Monitoramento do Orçamento Criança e Adolescente têm apresentado resultados interessantes. Grupos de jovens são convocados a debater e participar das ações de prevenção à violência e exploração sexual. Essas experiências promovem maior aproximação entre o poder público e a população infanto-juvenil. Os projetos de educação propiciam a ampliação dessas experiências, na formação de novas consciências e sensibilidades. Dois ingredientes são fundamentais: 1) Qualificar a habilidade de fazer leitura da realidade, fazer análises de conjuntura, análise sobre o que se passa à sua volta.
Jéssica, 10
Considerando que a democracia é o sistema de múltiplas vozes, é preciso fazer repercutir aquelas que historicamente foram silenciadas.
Yuri, 11
2) Desenvolver a capacidade expressiva em qualquer linguagem. É importante que a expressão dê conta de sintetizar a visão de mundo, assim como de estabelecer uma comunicação clara. A comunicação pode ser feita por meio da imagem, da música ou da palavra. Todos os recursos expressivos são importantes e se somam ao tratar de uma denúncia, de manifestação ou de proposição. Considerando que a democracia é o sistema de múltiplas vozes, é preciso fazer repercutir aquelas que historicamente foram silenciadas. Assim, se faz necessária atenção especial para que as meninas tenham as mesmas chances de proferir a palavra, assim como é essencial observar a participação da diversidade humana, garantindo às pessoas negras e indígenas oportunidades iguais. É claro que muitas vozes proferidas refletem muitas posições, interesses, visões de mundo e desejos que ora são conflitantes, ora concordantes. Portanto, o conflito faz parte da experiência democrática, na qual a diversidade é uma de suas essências.
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Controle Social é como se denomina o processo de acompanhamento criterioso e sistemático sobre as políticas de governo, sejam elas municipais, estaduais ou federais. Constitui-se em um dos recursos políticos mais relevantes para a democracia brasileira, uma vez que seus mecanismos garantem que a sociedade participe da gestão das políticas públicas, desde a formulação, ao gerenciamento, o monitoramento até a avaliação em todas as instâncias governamentais. Em outras palavras, Controle Social é o recurso de que as pessoas dispõem para ficar de olho nas ações de governo, que, por sua vez, deve considerar a participação popular na sua gestão. A Constituição Brasileira de 1988, conhecida como a Constituição Cidadã, foi elaborada em um momento de “virada do jogo”. O período constituinte, etapa que antecedeu a convocação da Assembléia Nacional Constituinte, eleita em 1986, foi caracterizado pela ampla participação da sociedade, que exigia o fim do sistema autoritário imposto pelo
regime militar e a democratização do país. A nova constituição, conforme o desejo popular, apresentou os princípios da sociedade democrática. No seu artigo 1º, Parágrafo único diz: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição” e explicita a criação de mecanismos para a descentralização do poder a exemplo dos Conselhos de Políticas Públicas.
Márcia Acioli
Portanto, o Controle Social, quando efetivamente exercido, promove uma ampliação da estrutura de poder, contando com sujeitos políticos capazes de orientar e fiscalizar as ações do Estado. Esta é uma forma de participação direta que fortalece a cultura democrática. O grau de participação democrática reflete diretamente na qualidade de vida de seu povo, pois é possível medir o quanto as políticas são destinadas - ou não - a atender às reais demandas da população. Com a sociedade vigilante e
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participativa, a prática da corrupção será mínima, os desvios de verbas públicas serão quase impraticáveis. O exercício do Controle Social se torna mais eficaz quando a sociedade está organizada em grupos atuantes. Movimentos sociais, grêmios estudantis, fóruns, sindicatos, comitês, entidades de classe, dentre outros, cumprem um importante papel de acompanhar e fazer denúncias, intervenção ou pressão, para que se garanta as políticas públicas em favor da maioria. 94
Há grupos engajados nas variadas questões da vida social: saúde, educação, moradia, trabalho, reforma agrária, meio ambiente, orçamento público, políticas internacionais etc. Hoje os Conselhos de Políticas Públicas são fóruns privilegiados para o Controle Social, pois estes reúnem a sociedade e o governo para pensar, deliberar e fiscalizar as variadas políticas públicas, favorecendo a descentralização do poder. Além destes, os Fóruns - organizações que agregam entidades em torno de um tema
O exercício do Controle Social se torna mais eficaz quando a sociedade civil está organizada em grupos atuantes.
específico - atuam nos cenários nacional, estaduais e municipais. Podemos citar o Fórum Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil, Fórum Nacional de Direitos Humanos, Fórum Brasileiro de Orçamento, Fórum Permanente de Entidades Não Governamentais de Defesa de Direitos da Criança e do Adolescente, Fórum da Reforma Agrária, entre muitos outros. Os Fóruns atuam em consonância com os Conselhos e se reúnem para dialogar com a sociedade sobre assuntos pautados nos Conselhos. O exercício democrático requer conhecimento de sua dinâmica, e nem sempre o consenso prevalece. As disputas são salutares e refletem o contexto social, onde os interesses ora entram em acordo, ora entram em disputa. É preciso considerar que quanto mais pessoas estiverem atentas às ações de governo, quanto mais organizada estiver a sociedade e maior o seu conhecimento e domínio dos mecanismos de poder, maiores serão as chances de um mundo igualitário.
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O ORÇAMENTO PÚBLICO VOLTA A SER TEMA NAS DUAS ÚLTIMAS OFICINAS. NA ESCOLA DA ASA NORTE, ELE FOI RELACIONADO COM A DISCUSSÃO E ACOMPANHAMENTO DA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO. NAS ESCOLAS DO GUARÁ E DE TAGUATINGA, FOI RELACIONADO COM OS RECURSOS DESTINADOS À MERENDA ESCOLAR.
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OFICINA IV No Centro de Ensino Médio Asa Norte Orçamento Público e Educação Desenvolvimento da oficina Ensino Médio 1) Os facilitadores apresentam os objetivos da oficina. Uma introdução sobre o tema do orçamento estimula os/as participantes a manifestarem opiniões gerais sobre os gastos com as políticas de educação. Em seguida, são formados os grupos de trabalho. 2) Os facilitadores listam os diversos itens que já constam nas políticas em educação: alfabetização, livro didático, capacitação de professores, acervos bibliográficos, alimentação e transporte escolar, acessibilidade e permanência, educação escolar indígena, de populações rurais, entre outros.
Debates Os grupos se apresentam mostrando as prioridades que surgiram das discussões. Os alunos e alunas buscaram no cotidiano da escola os elementos para a elaboração de suas políticas educacionais: a dificuldade de acesso aos materiais didáticos, a falta de laboratórios e a exclusão digital, as limitações da biblioteca e da videoteca, a falta da merenda escolar para o ensino médio, a educação continuada de professores, reformas curriculares e a autonomia da escola, com descentralização do sistema através da gestão democrática. 97
4) Uma grande folha de papel é entregue a cada grupo para anotar as suas conclusões.
Questões relacionadas ao sistema de educação também foram mencionadas. A acesibilidade e permanência no sistema educacional como direito de crianças e adolescentes é um tema que motiva alunos e alunas a refletirem de forma ampla sobre a educação brasileira, que ainda deixa do lado de fora milhares de crianças e adolescentes. A qualidade da escola e do ensino público surge como um desafio para a sociedade como um todo.
5) Os facilitadores percorrem os grupos para contribuir com a discussão e com a sistematização das idéias.
Comentários gerais A realização da oficina coincidiu com um dia de manifestação dos alunos do CEAN
3) Cada grupo deve formular políticas públicas em educação.
OS ALUNOS/AS DEVEM PARTICIPAR DA AVALIAÇÃO E APRIMORAMENTO DA POLÍTICA PÚBLICA DE EDUCAÇÃO, ASSIM COMO TODA COMUNIDADE ESCOLAR. É NA ESCOLA QUE A FALTA DE RECURSOS E OS ACERTOS OU ERROS DESSA POLÍTICA SÃO PERCEBIDOS.
contra as mudanças no projeto político pedagógico da escola, impostas pela Secretaria de Educação. Naquela manhã, os alunos e alunas se organizavam para uma passeata pelas redondezas da escola, com estratégias de abordagem do público, palavras de ordem, num esforço de conscientização e de protesto, em resumo, de participação política. A movimentação dos alunos ao mesmo tempo que reforçou a discussão da oficina, no final, apressou a sua conclusão, já que parte de suas lideranças estavam sendo solicitadas para ocuparem seus lugares na manifestação.
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No Centro de Ensino Médio 4 do Guará Orçamento Público e Merenda Escolar A PARTICIPAÇÃO E O PROTAGONISMO DEVEM SER ALMEJADOS EM TODO PROCESSO DE FORMAÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS, COMO CONTEÚDO E COMO MÉTODO. ASSIM, APRENDESE O SEU VALOR NAS DECISÕES COLETIVAS E NA FORMULAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS.
1) A oficina começa com uma questão: onde realizá-la, dentro de uma sala sem ventilação ou buscar um espaço alternativo ao ar livre? Após uma conversa com várias sugestões, o grupo resolve se reunir debaixo de uma bela árvore, nos fundos da escola. 2) Os facilitadores fazem um balanço das duas primeiras oficinas, avaliando seus
objetivos e a importância do debate sobre temas como direitos, participação, orçamento, educação, merenda escolar. Em seguida, os facilitadores citam a oportunidade, que se apresenta ao grupo, de inscrever-se no concurso “O direito de participar”, promovido pela Cáritas Brasileira. Participar do concurso pode ser um exercício do grupo de construir um projeto coletivo e fortalecer seus vínculos internos. 3) Com o propósito de estimular alunos e alunas à participação e avaliar seus interesses, os facilitadores propõem fazer um debate sobre a merenda escolar e, assim, dar continuidade ao conteúdo da oficina anterior sobre o orçamento público. Qual a importância da merenda escolar? Por que o ensino médio não a recebe? Quanto custa para o Estado prover a merenda? Que entidades regulam a distribuição da merenda? Quem fiscaliza? O debate, à princípio, foi respondendo a essas perguntas, mas, esgotando-se o assunto “merenda”, estendeu-se para as questões locais, ao que parece, bastante urgentes e fonte de dúvidas e incertezas por parte dos alunos e alunas: a reforma
A PARTICIPAÇÃO POLÍTICA É UMA AÇÃO QUE SE REALIZA EM SOLIDARIEDADE COM OUTROS, NO ÂMBITO DE UM ESTADO OU DE UMA CLASSE, COM VISTAS A CONSERVAR OU MODIFICAR A ESTRUTURA (E PORTANTO OS VALORES) DO SISTEMA DE INTERESSES DOMINANTES. ¹
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PARA QUE OS INDIVÍDUOS SEJAM CAPAZES DE PARTICIPAR EFETIVAMENTE DO GOVERNO DE UM ESTADO NACIONAL, AS QUALIDADES NECESSÁRIAS A ESSA PARTICIPAÇÃO DEVEM SER FOMENTADAS E DESENVOLVIDAS EM NÍVEL LOCAL, POR MEIO DA DEMOCRATIZAÇÃO DAS ESTRUTURAS DE AUTORIDADE EM TODOS OS SISTEMAS SOCIAIS E POLÍTICOS. ²
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da escola que não sai do papel, a composição do Conselho Escolar e suas atribuições, a participação dos alunos/as no Conselho de Classe, a ausência de um grêmio estudantil, sobre a idéia de uma escola democrática e aberta à comunidade. A questão da participação política dos alunos no contexto escolar veio à tona como síntese de todas as suas considerações e críticas. A liberdade de ouvir e ser ouvido motivou alunos e alunas a continuar e aprofundar a discussão sobre suas vivências no CEM 4.
interagir com a sala de aula e compartilhar conhecimentos e experiências em temas como a nutrição e a dimensão ecológica do alimento. Eu gostaria de ser ouvida sobre as definições da merenda, disse Roberta, afirmando seu desejo de participação. O grupo que entrevistou Roberta não a conhecia, mas passou a respeitá-la pela sua capacidade de articulação e de proposição positiva, pelo seu compromisso em melhorar os serviços que a escola oferece.
4) O facilitador pede um tempo no debate e propõe ao grupo um exercício de participação: criar um roteiro para acompanhar todas as etapas da merenda na escola.
Grupo 2 O diretor da escola informa sobre os esquemas de distribuição da merenda. O grupo de entrevistadores fica sabendo que o cardápio é definido na Secretaria de Educação. O grupo teve dificuldade de visualizar os caminhos da merenda antes de chegar à escola porque são informações que necessitam da compreeensão de trâmites institucionais, siglas, entidades, assuntos que os dirigentes locais normalmente não compartilham com a comunidade escolar.
5) Os/as participantes organizam-se em grupos menores. Cada grupo percorre a escola para buscar as informações sobre a merenda escolar. O diretor da escola, a merendeira, dois professores e dois alunos são entrevistados. 6) Apresentação Grupo 1 Roberta, a merendeira, surpreende seus entrevistadores com seu depoimento crítico e a visão de que seu trabalho pode
Grupo 3 Joelma, a professora de educação física afirma não ter muitas informação sobre a merenda escolar, mas atribui a má
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O CONSELHO DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR - CAE, COMPOSTO POR MEMBROS DO PODER PÚBLICO, REPRESENTANTES DE PROFESSORES/AS, PAIS/ MÃES DE ALUNOS E REPRESENTANTE DA SOCIEDADE CIVIL É O ÓRGÃO RESPONSÁVEL POR VERIFICAR SE OS RECURSOS DA MERENDA ESTÃO SENDO APLICADOS CORRETAMENTE E SE OS ALIMENTOS COMPRADOS SÃO DE BOA QUALIDADE.
qualidade da merenda ao próprio governo. Os entrevistadores perguntam a uma outra professora como a comunidade escolar pode influenciar nas definições da merenda escolar: Vocês têm ilusão de que isso vai acontecer? Grupo 4 Os alunos entrevistados dão mostras ao grupo de pesquisadores de que sabem da responsabilidade do governo sobre a merenda escolar e que a origem dos recursos provêm dos impostos que pagamos.
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ABRIR UM ESPAÇO PARA O DIÁLOGO, ESTIMULANDO OS/AS JOVENS A DEBATEREM QUESTÕES RELACIONADAS AO AMBIENTE ESCOLAR, MUITAS VEZES GERA RESULTADOS INESPERADOS, COMO O QUESTIONAMENTO DAS ESTRUTURAS DE AUTORIDADE PRESENTES NA ESCOLA. Fotos desta página: participantes da Oficina V
Debates Esse exercício simples de buscar informação a respeito da merenda escolar despertou nos participantes uma dúvida: há espaço na escola para a participação? Além da falta de oportunidade, a gente não tem incentivo. Os alunos mesmos não estão interessados. Às vezes a gente quer agir, mas não sabe como. Os alunos deveriam ter mais consciência. A conversa voltou ao tema da merenda
sobre a possibilidade da escola receber os recursos e administrar a compra, a elaboração e a distribuição da merenda. Esse recurso vai chegar na escola e é importante acompanhar. Quando o aluno sabe o que está acontecendo na escola tem uma outra consciência. Comentários Gerais O grupo se sente mais unido com a realização das oficinas porque alunas e alunos agora compartilham as inquietações provindas das dificuldades políticas do ambiente escolar. Para mudar, não basta só os alunos que estão envolvidos no projeto, mas todo mundo da comunidade. Ao mesmo tempo, discutem e vislumbram as possíveis interações no convívio entre alunos/as, professores/as, direção e corpo administrativo da escola. O grupo percebeu que o ambiente escolar pode revelar oportunidades, soluções e novidades que a rotina da grade horária esconde ou que estão esquecidas nos projetos pedagógicos.
“A gente fala, mas eles não ouvem. Se eu falar alguma coisa e o professor falar outra, quem ganha? É o professor.” Reclamou um dos participantes
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“O projeto trouxe uma esperança a mais de como lutar pela escola. A gente querendo pode fazer tudo o que a gente quer”. Laiane Andréia da Silva, 17.
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Na Escola Classe 17 de Taguatinga Orçamento e merenda escolar Objetivo da oficina Aprofundar a temática dos gastos públicos, com foco na merenda escolar, identificando as instâncias responsáveis e suas atribuições e fazer um exercício propositivo, considerando possíveis intervenções sociais nesse processo. Desenvolvimento 1) Apresentação dos objetivos da oficina A equipe de facilitadores propõe a realização de um teatro para encenar o caminho da merenda escolar até a sua chegada à escola. As instâncias responsáveis pela merenda escolar foram identificadas e suas atribuições foram descritas: o Conselho Escolar, para fiscalizar a qualidade e a distribuição da merenda; a direção e a secretaria da Escola, para solicitar a merenda e informar sobre o número de alunos; a Secretaria de Estado de Educação, para organizar os dados das escolas e enviá-los às instâncias federais; o Conselho de Alimentação Escolar, para definir o cardápio e acompanhar a compra e distribuição da merenda às unidades escolares e o Ministério da Educação, responsável pelos recursos.
Os facilitadores atuam como representantes dessas instâncias, respondendo às questões pertinentes a elas e dando encaminhamento ao processo de aquisição e distribuição da merenda escolar. 2) Enquanto o teatro se desenrola, uma salada de fruta é feita na cantina da escola para ser distribuida em seguida. 3) A cena começa com a contagem dos alunos feita pela secretaria da escola. A contagem não é feita com rigor pelo personagem. Os alunos reclamam, mas concordam que isso pode acontecer. Com os dados na mão, a Secretaria da Escola dirige-se à Secretaria de Educação e informa a demanda da merenda daquela unidade escolar. Depois de receber os dados de todas as escolas do Distrito Federal, a Secretaria de Educação se dirige ao MEC para informar a quantidade de merenda necessária e solicitar a liberação dos recuros. Este, por sua vez, não libera os recursos imediatamente. Antes forma um processo que deve tramitar para ser analisado. Feito isso, os recursos liberados são enviados para a Secretaria de Educação. Entra em cena o Conselho de Alimentação Escolar para definir o cardápio e
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APONTAR AS FALHAS ENCONTRADAS NO MONITORAMENTO DOS RECURSOS DA MERENDA ESCOLAR É UMA DAS PRINCIPAIS ATRIBUIÇÕES DO CONSELHO DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR - CAE
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“O dinheiro vem dos impostos. O dinheiro é nosso”. Lembrou um aluno
acompanhar a aquisição e distribuição da merenda às escolas. Ao chegar nas escolas, a qualidade da merenda deve ser avaliada pelo Conselho Escolar. Qualquer reclamação dos alunos/as deve ser encaminhada, seja através da professora, dos pais e mães, da direção da escola ou diretamente numa reunião do Conselho.
E reclamam: O governo federal é pão-duro. O restante da salada de frutas chega na sala e é servido para os alunos e alunas que ainda não haviam recebido. Os facilitadores calculam os custos da salada de frutas e constatou-se que, com R$ 0,22 por aluno/dia não seria possível servir salada de frutas todos os dias.
Os comentários foram surgindo à medida que a encenação prosseguia. As crianças não conheciam o cronograma de reuniões do Conselho Escolar, nem suas atribuições relativas à merenda. Por fim, o facilitador pergutou ao grupo de onde vinham os recursos da merenda escolar, e alguém respondeu: O dinheiro vem dos impostos. O dinheiro é nosso.
5) Dando continuidade, a turma é dividida em grupos, sempre seguindo a configuração das oficinas anteriores. Cada grupo recebe a tarefa de fazer um cardápio para a merenda diária. Eles discutem durante cerca de meia hora. Depois, se organizam para apresentar suas propostas.
4) Depois da encenação e dos comentários, a salada de fruta é servida aos alunos e alunas. Porém, a quantidade não é suficiente para todos. Esse fato gera uma discussão sobre o montante de recursos que o poder público investe no programa de merenda escolar. Os facilitadores explicam que a divisão dos recursos pelo número de alunos chega ao resultado de R$ 0,22 por aluno/dia. Só isso? Alunos e alunas ficam surpresos.
6) Apresentação dos grupos A apresentação dos grupos suscita senso é Grupo 1
2ª feira
3ª feira
4ª feira
5ª feira
6ª feira
Feijoada e suco de laranja
Baiãode-três
Sucrilhos com leite
Sopa de legumes com suco de uva
Cachorro -quente com H2O
2ª feira
3ª feira
4ª feira
5ª feira
6ª feira
Pão com manteiga com leite achocolatado
Sucrilhos de chocolate
Baião-dedois com suco de laranja
Salada de frutas
Cachorro quente com suco de morango
Grupo 2
NÃO É O PREFEITO/A, GOVERNADOR/A OU O SECRETÁRIO/A DE EDUCAÇÃO QUE ESCOLHE OS CONSELHEIROS/AS DO CAE. PROFESSORES/AS E PAIS E MÃES DE ALUNOS DEVEM ESCOLHER OS/AS REPRESENTANTES DA SUA CONFIANÇA.
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Grupo 3
VOCÊ JÁ PAROU PARA PENSAR NA QUALIDADE DA MERENDA ESCOLAR DA SUA ESCOLA OU DA ESCOLA DE SUA COMUNIDADE? OS ALIMENTOS SÃO DE BOA QUALIDADE? O CARDÁPIO PODERIA SER DIFERENTE?
2ª feira
3ª feira
4ª feira
Cachorro -quente e suco de uva
Sopa de legumes com pão
Arroz com carne e suco de laranja
5ª feira
6ª feira
Salada de frutas
Pão com manteiga e leite com toddy
Grupo 4
2ª feira
3ª feira
4ª feira
5ª feira
Sanduíche saudável
Salada de frutas e suco de caju
bolo natural com leite
Maçã, banana e suco de maracujá
2ª feira
3ª feira
4ª feira
5ª feira
6ª feira
Sopa de legumes
Arroz com sardinha e suco de uva
Canjica
Salada de frutas
Cachorro quente com suco de morango
6ª feira Sopa
Grupo 5
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comentários em todo o grupo. Os cardápios são criticados e são propostas modificações. O consenso é construído, considerando as informações sobre o valor nutritivo dos alimentos e os recursos federais disponíveis. As crianças concordam que os cardápios elaborados pelos grupos são muito parecidos com aquele que é servido diariamente na escola. Portanto, o esforço deve ser dirigido à fiscalização da qualidade da merenda e à abertura do diálogo com a esfera pública sobre o aumento do investimento e a gestão dos recursos. O caminho é a participação da
comunidade escolar nessas discussões, cabendo a ela acionar o Conselho Escolar e as outras instâncias públicas envolvidas no programa da merenda escolar. 7) Os facilitadores propõem um exercício para comunicar as reflexões e propostas que surgiram na oficina. A linguagem utilizada é o desenho. A idéia é ilustrar o caminho da participação comunitária nas esferas públicas de modo a intervir nos processos decisórios referentes à merenda escolar. A atividade começa com um aquecimento para o desenho. Uma folha de papel é distribuída para cada aluno/a. A facilitadora pede que todos/as dividam essa folha em quatro partes, sem usar réguas, nem dobrar o papel para marcar as medidas do centro da folha. A intenção é preparar a turma para se expressar sem a preocupação com o “erro”. Deixar os traços fluirem livremente. A facilitadora pede que os alunos e alunas desenhem pedrinhas no primeiro quadrante da folha. No segundo, apenas capim, alto e denso. No terceiro, nuvens e, no quarto quadrante, pedras, capim e nuvens para compor uma paisagem. A facilitadora esclarece que não existe desenho feio ou desenho errado. Todo desenho é bonito e certo, desde que seja
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Sou eu que vou seguir você Do primeiro rabisco Até o be-a-bá. Em todos os desenhos Coloridos vou estar A casa, a montanha Duas nuvens no céu E um sol a sorrir no papel... Trecho da música Cadernos de Toquinho/Mutinho
“A ESCOLA NÃO MUDA A SOCIEDADE, MAS PODE, OFERECER AOS ALUNOS A OPORTUNIDADE DE SE APROPRIAREM DE CONHECIMENTOS QUE SERVIRÃO DE INSTRUMENTOS PARA REFLETIR E MUDAR SUA PRÓPRIA VIDA, E FAVORECER O DESENVOLVIMENTO DA AUTONOMIA E O APRENDIZADO DA COOPERAÇÃO E DA PARTICIPAÇÃO SOCIAL EFETIVA.” Profª Francisca Oliveira Projeto Olhar Cidadão
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feito do jeito que sai da mão de cada um. Esse princípio deixa as crianças bem à vontade para fazer a imaginação fluir, despreocupados com os resultados formais. Depois do aquecimento, a facilitadora inicia a atividade para o desenho final. O mote para esse desenho é uma pequena história, em que os personagens Pedro e Bia, vizinhos e estudantes da escola Classe 17, participam de uma discussão sobre a merenda escolar. Os desenhos ilustram uma seqüência de fatos que começa quando Pedro e Bia chegam à escola. Desenhem aí, Pedro e Bia na frente da escola, com muitos detalhes. Disse a facilitadora, que continua a contar a história, depois que todos terminam o primeiro desenho. Bia e Pedro chegam na sala e a professora informa que, naquele dia, o assunto da aula será a merenda escolar. A professora explica que a merenda não tem qualidade e que era preciso discutir isso no coletivo. Depois da discussão, a turma escolhe uma representante dos alunos para ir, junto com a professora, procurar o Conselho Escolar para fazer uma reclamação. Desenhem aí a professora com seus
alunos conversando sobre a merenda escolar, solicitou a facilitadora. Feito isso, a facilitadora solicita que os alunos desenhem a participação da professora e da representante da turma numa reunião do Conselho Escolar, convocada para discutir a qualidade da merenda. A história vai criando o caminho que os personagens devem percorrer para caracterizar a participação da comunidade no controle da merenda escolar. À medida que a história se desenrola, os desenhos vão sendo elaborados. As cenas desenhadas são aquelas que dão sentido visual à história e que marcam o diálogo da comunidade com os representantes das diversas instâncias responsáveis pela merenda: a Secretaria de Educação, o Conselho de Alimentação Escolar e o Ministério da Educação. Os personagens vão percebendo que outras escolas estão fazendo a mesma discussão e encaminhando suas reivindicações às instâncias competentes. A história termina com uma grande manifestação popular a favor da melhoria da merenda escolar. Debates A facilitadora lembra que a qualidade da merenda depende, em grande parte, do
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“O IMPORTANTE NA EDUCAÇÃO EM QUALQUER MOMENTO, EM QUALQUER LUGAR É O DESEJO QUE MOVE O PROFESSOR EM COMPARTILHAR A BUSCA PARA MUDANÇA DO OLHAR. LEVAR O ALUNO A COMPREENDER O SIGNIFICADO DO MUNDO.” Profª Francisca Oliveira Projeto Olhar Cidadão
“A PERSPECTIVA EDUCACIONAL DEVE PROMOVER UM ESPAÇO DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL EM QUE SE EVIDENCIEM A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO UNIVERSAL DE CIDADANIA,PERMITINDO A TODOS SEREM SUJEITOS NA SUA PRÓPRIA APRENDIZAGEM.” Profª Francisca Oliveira. Projeto Olhar Cidadão
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montante de investimento destinado a ela. Se aumentarem as reclamações das escolas brasileiras, as pressões sobre as esferas públicas aumentarão, assim como as chances de mudança nos padrões atuais da merenda. A hipótese de enviar os recursos da merenda para a própria escola administrar está sendo citada nas rodas de discussão sobre o tema e, nesse caso, a participação da comunidade deverá ser efetiva para que seja garantido o bom uso do dinheiro. Comentários gerais A oficina de comunicação ofereceu aos alunos e alunas a oportunidade para fazer um ensaio para a elaboração de uma cartilha ilustrada sobre os caminhos da merenda escolar. A identificação de todas as instâncias responsáveis, com suas atribuições, possibilitou aos alunos e alunas elaborarem seus argumentos para serem utilizados em possíveis diálogos com os poderes públicos. O grupo, como sempre, demonstrou um grande apreço pelos processos políticos participativos e confiança nos seus resultados positivos.
OFICINA V Comunicação e Participação Objetivo da oficina Entender os processos de comunicação como um instrumento de mobilização e reivindicação da comunidade, através do exercício de técnicas de roteirização e criação de projetos/ação conjuntos. Desenvolvimento 1) A oficina teve início com a apresentação de um vídeo curto chamado “MIDIATRIX”, sobre o monopólio da comunicação no Brasil. A partir de uma paródia do filme Matrix, o video mostra a influência da grande mídia sobre o comportamento e o pensamento da população. O objetivo do video foi demonstrar ao grupo o poder que tem a comunicação de transformar a realidade. 2) Os facilitadores propõem que cada participante identifique um problema da escola e o escreva numa tarjeta. Em seguida, as tarjetas são tocadas aleatoriamente dentro do grupo. Os /as participantes são solicitados a propor uma solução para aquele problema que recebeu. 3) O conjunto de problemas e soluções identificados pelos/as participantes gerou um painel:
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“A mídia é parcial e não aborda todos os pontos de vista. Reforça posições a partir de casos isolados para manter posições conservadoras”. João nogueira, 19
EMBORA A CONCESSÃO DE RÁDIOS E TVS NO BRASIL SEJA PÚBLICA, O SISTEMA DE COMUNICAÇÕES É CONCENTRADO E IMPEDE A MANIFESTAÇÃO DA DIVERSIDADE E DA PLURALIDADE DA SOCIEDADE BRASILEIRA. É COMUM, AS EMISSORAS PROMOVEREM A CRIMINALIZAÇÃO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS, IMPONDO UMA AGENDA POLÍTICA QUE LHES INTERESSA.
Estrutura, ventiladores, paredes, portas, banheiros...
Levar todos esses problemas para a direção, caso não resolva, fazer uma manifestação, para que o governo tome alguma providência.Conscientização dos alunos e de toda comunidade escolar. Fazer um manifesto dos alunos em frente à escola e chamar a imprensa para mostrar os problemas da escola.
INTERVOZES COLETIVO BRASIL DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
Reforma da escola em geral
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Relação com os professores e direção
Mobilizar a comunidade escolar para apressar a reforma. Manifesto dos alunos pela reforma da escola. Tirar fotos e fazer cartazes com essa situação, para assim ter uma conscientização maior por parte dos alunos. E depois fazer uma revolução. Levar a sério a opinião dos alunos. Dar mais atenção ao que eles dizem, respeitando o ponto de vista da comunidade escolar como um todo.
Relação aluno/ Fazer dinâmicas que envolvam professor/servidor todos os segmentos da escola. Falta de voz dos alunos Fazer uma rádio na escola para veicular a opinião dos alunos, divulgar informações. Ampliar a participação dos alunos no Conselho de Classe. Organizar um grêmio.
4) Comunicação comunitária Os facilitadores, convidados do Projeto de Comunicação Comunitária da Universidade de Brasília, mostram ao grupo as possibilidades da comunicação no momento de mobilizar a comunidade para pensar e propor soluções para seus problemas. Alguns exemplos são mencionados: o blog, orkut, rádio web, as mídias impressas como o fanzine, jornal, mural etc. Os facilitadores mostram os equipamentos para uma oficina de rádio e outra de vídeo e fazem uma rápida demonstração de como se pode fazer uma rádio comunitária, elaborar roteiros e filmar. Em seguida dois grupos de trabalho são formados. Um para criar um programa de rádio e o outro para criar um vídeo. Os roteiros são elaborados pelos grupos e os equipamentos são distribuídos. 5) Apresentação Grupo 1 Um programa é criado e apresentado pela Rádio JC, jovens capazes. Grupo 2 O grupo filmou seu roteiro e o resultado foi o vídeo “Assim não dá!” O vídeo e o
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“O banheiro da escola é um grande descaso com os alunos. Além de o banheiro ter mau cheiro, ele está todo pichado. Isso é uma grande falta de conscientização dos alunos, que não tem respeito por si próprios”. Opinião de uma aluna, no vídeo Assim não dá.
programa de rádio estão disponíveis no site do Youtube (http://br.youtube.com). Debates O painel inicial gerou comentários sobre a situação de precariedade física da escola, responsabilizando os gestores da educação pelo abandono e os alunos pelos atos constantes de depredação. Já vi alunos arrebentando fios de propósito. Segundo os/as participantes, as iniciativas de mudança devem partir da comunidade escolar: provocar o debate, chamar a atenção dos alunos, pressionar as autoridades. Somos nós que temos de correr atrás. Parte da comunidade escolar está indiferente e não pretende fazer nada. É preciso mobilizar todos os segmentos dessa comunidade: pais, professores, alunos e servidores, inclusive utilizando recursos da Associação de Pais e Mestres (APM).
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“Muitas vezes, pixar é uma maneira da galera de protestar, deviam levar mais a sério nossa opinião”. Comentou um dos participantes
Segundo os/as participantes, desde que foi construída, a escola nunca foi reformada. Todos os anos ela é apenas maquiada. A situação dos banheiros é o maior exemplo do descaso com a escola. O negócio está assim é porque nós deixamos.
E mais, Se uma reforma for feita nos banheiros, o pessoal vai detonar. Por isso é preciso fazer um trabalho sério de conscientização com os alunos.
“Depois da conscientização vem a revolução”. Gritou uma jovem.
Formar um grêmio estudantil forte e atuante é o sonho dos alunos mais conscientes, porém, é preciso romper as resistências que existem a essa idéia. A convivência democrática exige tolerância, participação e transparência. São essas as conquistas que a comunidade escolar precisa fazer para avançar em seus projetos políticos. 117
Ao que parece, comunicação no dia a dia da escola precisa ser incrementada, abrir novos canais e utilizar uma linguagem mais atraente ao jovem. Vejo que a galera não está preparada. Quando se fala em conscientização, acha que é apenas evitar vandalismos. Se falarmos de rádio, de comunicação de idéias, pode ser um caminho mais fácil de atingir a galera do que falarmos em conscientização. A gente estava pensando em fazer um curta sobre a escola. A nossa escola tem muitos assuntos: discriminação social em relação
“Para mudar não basta só o envolvimento dos alunos que participaram do projeto ou a galera do colégio, mas sim o envolvimento da comunidade, do Guará”. Diomar de Oliveira, 19, em depoimento à rádio JC - jovens
capazes
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ao pessoal da estrutural, racismo, situação física da escola... Segundo o relato dos alunos, havia um projeto de jornal da escola, elaborado com o apoio da professora de português que não foi incrementado por falta de apoio da direção da escola. Como fazer um jornal que critica a falta de participação dos alunos e as atitudes da direção, se eu tenho que pedir autorização a essa mesma direção? As dificuldades de diálogo na comunidade escolar criam barreiras para a participação política dos diversos segmentos nos seus processos internos. Essa falta de interação inviabiliza possíveis e necessárias mudanças. Se essa situação perdura e vira tradição, a comunidade fica engessada num clima de desconfiança e conflito, sempre abafado por atos de autoritarismo. Comentários gerais Segundo os comentários dos alunos e alunas participantes, as oficinas abriram espaço para uma reflexão ampla sobre os principais problemas da comunidade. Quando a gente foi na primeira oficina, a gente nunca esperava por isso. Esse
projeto abriu um leque de oportunidades dentro da nossa cabeça. A falta de esperança de participar, gerada por anos de silêncio ou indiferença, deu lugar a um vislumbre. O projeto trouxe esperança de como lutar pela escola. A gente querendo pode melhorar o que quiser. Além do vislumbre, projetos já podem ser delineados. A gente se sente estimulado a fazer coisas e mudar. Estou me sentindo poderosa, para mudar um monte de coisa na escola. 119
O potencial de solidariedade e de espírito coletivo do grupo é notável. Uma postura madura, reflexiva e disponível para o diálogo foi percebida pelos facilitadores logo no início do trabalho. São qualidades que devem ser estimuladas e aproveitadas pela escola. A chave é o diálogo e a abertura para a participação de todos/as. Não é uma tarefa muito fácil porque exige paciência, tolerância, persistência e habilidade para lidar com as diferenças. Porém, o exercício participativo, com todas as suas dificuldades, sempre promove a qualidade de vida nas comunidades.
“O projeto serviu para trazer as ferramentas necessárias para a gente poder lutar pelos nossos direitos dentro da escola. Melhorar o que a gente quer melhorar. Parar só de reclamar. Ter uma atitude... A gente vai melhorar essa parada”. Depoimento de Lucas de Souza, 19, ao programa de rádio produzido na oficina.
ENCERRAMENTO DO PROJETO PROTAGONISMO JUVENIL: DIREITOS, CIDADANIA E ORÇAMENTO PÚBLICO 120
Participantes Alunos do Centro de Ensino Médio da Asa Norte e do Centro de Ensino Médio 4 do Guará
ENCONTRO NO CONGRESSO NACIONAL
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Em dezembro de 2007, as oficinas do Projeto Protagonismo Juvenil: direitos, cidadania e orçamento público estavam concluídas. Um encontro dos alunos e alunas participantes num espaço público de decisão estava previsto, e o local escolhido pelos grupos foi o Congresso Nacional.
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A Casa do Legislativo é o locus das decisões políticas de promoção dos direitos da criança e do adolescente, dos esforços permanentes de parlamentares e da sociedade organizada na busca e garantia desses direitos. Ali, o Orçamento Público é votado e os recursos destinados à merenda escolar são definidos. Enfim, todos os temas desenvolvidos nas oficinas estão presentes na pauta do Congresso Nacional. A visita foi marcada para o dia 07 de dezembro, com os alunos e alunas do CEAN e do CEM 4, já que as crianças da EC 17 Taguatinga não puderam comparecer, em virtude da uma agenda carregada de final de ano.
Para preparar a atividade, o Inesc fez um contato prévio com os gabinetes da Senadora Patrícia Saboya (PDT-CE), do Dep. Eduardo Barbosa (PSDB-MG) e da Dep. Maria do Rosário (PT-RS), membros da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, comissão responsável pela articulação da Câmara e no Senado na promoção e defesa dos direitos da criança e do adolescente. No Congresso Nacional, o grupo fez uma visita guiada nos espaços da Câmara e do Senado Federal e participou da simulação de uma audiência pública. Essa “audiência” foi realizada no plenário nº. 13 do anexo II da Câmara dos Deputados, espaço destinado para essa finalidade. Todos os procedimentos de uma audiência pública real foram observados. A mesa foi composta por um moderador, dois assessores parlamentares da Câmara - Rosa, assessora do Dep. Eduardo Barbosa, e Márcio Sanchez, assessor da Senadora
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Patrícia Saboya -, Lucas Brito de Lima, representante do CEAN e André Tavares Barbosa, representante do CEM 4 do Guará.
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Os assessores parlamentares falaram sobre o funcionamento do Congresso e seus espaços de participação popular. Explicaram como a Frente Parlamentar pela Criança e pelo Adolescente desenvolve suas ações e o trabalho dentro dos gabinetes. Os representantes das escolas, com assento na mesa, manifestaram suas inquietações e dúvidas sobre a atuação do Congresso Nacional nas questões da criança e do adolescente e a falta de participação da juventude em espaços privilegiados como aquele. Depois das apresentações, o debate foi aberto para todos/as integrantes da plenária. Os participantes dirigiram-se à mesa para formularem suas perguntas e fazerem seus comentários, possibilitando a todos/as experimentar um mecanismo de participação do Congresso Nacional. Na seqüência, os alunos e alunas das
duas escolas iniciaram uma conversa em que compartilharam as experiências que tiveram durante as oficinas, manifestando a curiosidade de conhecerem a realidade de suas escolas, de socializarem idéias e aprendizados. Um acerto de visitas mútuas ficou no ar. Porém, o ano letivo estava no final e, como sempre, as provas ocuparam todo o tempo disponível. As férias chegaram e os alunos e as alunas dispersaram-se. Para a equipe de realizadores/as do Projeto Protagonismo Juvenil na defesa de direitos, a conversa animada dos alunos e alunas mostrou que, na hipótese de continuidade do Projeto, a articulação das escolas e o intercâmbio sistemático entre elas será um passo importante para ampliar a experiência, socializar aprendizados e estimular a auteridade nos processos da mobilização de crianças e adolescentes na busca de seus direitos.
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O que levamos para casa e o que fica na escola. Lila Rosa Alexandre Ciconello
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Há sempre um espaço reservado para as novidades dentro de uma escola. Uma brecha na grade horária, uma turma que se forma além das listas de chamada, um encontro para um debate numa grande roda, um convite à participação. Gente diferente que chega, novas abordagens e estratégias para envolver e interessar a todos/as. O diálogo se desdobra e os visitantes se sentem em casa. Meninos e meninas revelam suas competências e histórias de vida que a escola, com as salas cheias e envolvida com seus objetivos curriculares, não tem tempo de apreciar. As atividades do Projeto Protagonismo Juvenil, Direitos, Cidadania e Orçamento Público, promovido pelo Inesc em parceria com a Cáritas, alteraram a rotina e desmontaram algumas resistências. A presença da visita é sempre uma oportunidade para demonstrar boa educação. A Escola aprende que crianças e adolescentes têm muito a contribuir com novas imagens de temas eternos. Aprende que há um mundo lá fora que a observa, a valoriza e aplaude suas iniciativas cidadãs e vislumbra as pontes, tão necessárias para conectá-la ao mundo e dar sentido aos conhecimentos de sala de aula. Os visitantes descobrem na escola uma rede de subjetividades e sensibilidades e, mergulhando nesse universo, recriam atitudes e ampliam suas visões, para fortalecer a cultura democrática, objeto de todo seu esforço.
Meninos e meninas, passageiros que são da escola, podem reforçar em suas histórias atitudes participativas, com chances para uma vivência social plena de pertencimento e cooperação. Ambientes escolares e iniciativas como essa é uma combinação ainda incipiente na vida brasileira, dado que a grande extensão da rede escolar exige mudanças na própria política de educação, que pode ser mais aberta ao diálogo com a comunidade e com as organizações da sociedade civil. As mediações e pontes, que o Projeto ajudou a construir, impulsionam o exercício da cidadania e o interesse dos/as jovens pela coletividade e pela esfera pública, que é um espaço de todos/as, mas que ainda não foi conquistado, pela falta de oportunidades e de diálogo. Estimular o protagonismo no espaço escolar é contribuir para a alteração desse espaço, torná-lo vivo, dinâmico e cheio de possibilidades. A escola é um microcosmo da sociedade. Por meio dela, podemos ampliar a consciência cidadã, fortalecer o controle social e a participação popular. É nisso que apostamos: na mudança da cultura política por meio da participação e da solidariedade. É isso que observamos em nossa viagem pelas três escolas participantes do projeto, a possibilidade de uma mudança de consciência, o despertar de um potencial de transformação e criatividade.
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Referências
OFICINA II e III Estado, Poder, Democracia e Orçamento Público ¹ COSTA, Rogério Haesbaert da. O mito da desterritorialização: do "fim dos territórios" à multiterritorialidade. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2004, p.40 apud SALES, Luís Gustavo at al. O território como um dos conceitos-chave para o entendimento da relação sociedade/natureza. III Encontro da Anppas. Brasilia/ DF, paper 2006, p. 9. 128
www.anppas.org.br/encontro_anual/encontro3/arquivos/TA177-06032006-164221.PDF.
²Idem, p. 6. ³ LUCENA, Ricardo de F. O poder e tudo mais: uma breve discussão sobre o poder para Norbert Elias. Centro de Memória do Esporte/DEF/UFPE, paper, p.1. www.fef.unicamp.br/sipc/anais8/Ricardo%20de%20F.pdf
OFICINA IV e V Orçamento Público, Participação Popular e Comunicação. ¹PIZZORNO, Alessandro. Introducción al estudio de la participación política. In: KAPLAN; PIZZORNO, Alessandro; CASTELLS. Participación y Cambio Social em la problemática contemporânea. Buenos Aires: Siap-Planteos, 1975, p. 39. ²PATEMAN, Carole. Participação e teoria democrática. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992, p.51.