Maggie Shayne Serie Asas da Noite 07
Sombras na Noite Disponibilização/Tradução/Pesquisa: Yuna, Gisa, Mare e Rosie Revisão/Formatação: Joelma Revisão Final: Sky Era o desejo de qualquer mulher, entretanto seguia sozinho. Seu mundo estava cheio de segredos e solidão, escuridão e perigos. Mas então uma mulher encontrou seu diário e começou a desvendar seus segredos. Quando a roteirista Morgan Da Silva descobriu aqueles velhos diários, ficou apanhada pelo sedutor mundo de um homem morto que acreditava ser um vampiro. E embora a história a tivesse tornado rica e famosa, ela sentia que estava se consumindo por dentro. De noite sonhava com ele, suas fantasias eram tão reais que podia ver as marcas que lhe deixava no pescoço e sentir o sangue emanando de seu corpo. Tudo parecia tão real... Ele ia a ela de noite. Observava-a. Desejava-a. Sabia que com um beijo poderia salvar-la da maldição de seu destino e dos inimigos que espreitavam a ambos. Mas para salvá-la, teria que lhe confiar sua vida, seu amor… e
sua imortalidade.
CAPÍTULO I Supunha-se que os meninos estavam dormindo... Mas despertamos, respondendo a uma chamada silenciosa. Arrastamo-nos até a entrada das tendas e carroças, atraídos como traças às chamas da fogueira do acampamento e às sombras escuras e cambiantes que projetava aquela estranha mulher enquanto dançava. Não havia música. Eu sabia, mas me parecia que a ouvia enquanto observava à mulher. Girava como um redemoinho e seus lenços a seguiam como fantasmas coloridos. Seu cabelo, negro como a noite, brilhava a luz do fogo. Arqueava-se, retorcia-se e dava voltas sobre si mesma. Depois ficou imóvel, e seus olhos, ardentes como duas brasas, fixaram-se nos meus. Seus lábios vermelhos se curvaram em um terrorífico sorriso, e me apontou com o dedo. Eu tentei tragar saliva, mas tinha um nó na garganta. Umedeci os lábios e olhei às tendas e carroças dos meus, e vi que os outros meninos também estavam observando-a. Alguns dos meus primos eram maiores que eu, e outros menores. Todos nos parecíamos: tínhamos a pele cítrica, os olhos muito grandes e redondos e o cabelo comprido e negro como as plumas de um corvo. Éramos ciganos, e estávamos orgulhosos de sê-lo. A mulher que dançava... também era cigana. Sabia por seu olhar. Era uma dos nossos. E me apontava com o dedo. Dimitri, três anos mais velho que eu, olhou-me com superioridade e me sussurrou: —Vai para ela! Não te atreves? Só para demonstrar que era mais valente que ele, erguime, saí da tenda de minha mãe e caminhei descalço sobre o chão frio para ela. Enquanto me aproximava, outros, animados por meu exemplo, começaram a sair também. Lentamente, todos nos reunimos ao redor da bela estranha como pecadores que fossem adorar a sua deusa. E quando o fizemos, ela sorriu ainda mais. Levou um dedo aos lábios para nos indicar que guardássemos silêncio e se sentou em um tronco, ao lado do fogo. —Quem é? —perguntei ao Dimitri em voz baixa. —Tolo, é que não sabe nada? É nossa tia. Chama-se Sarafina — sussurrou, sem apartar o olhar dela, fascinado—. Vem às vezes... embora você seja muito pequeno para recordar sua última visita. Entretanto, supõe-se que ela não deveria estar aqui. Quando se inteirarem os mais velhos haverá confusão... —Por quê? —eu também olhava fascinado à misteriosa estranha enquanto ela se sentava no tronco, estendia suas saias coloridas a seu redor e abria os braços para dar boasvindas às crianças, nos aproximávamos ainda mais para poder sentar muito perto dela, no chão. Eu fui o que se sentou mais perto, justo a seus pés. Nunca tinha visto uma mulher tão assombrosa. Mas também havia algo nela... algo que não era terrestre. Algo que dava medo. E seguia me olhando. Havia um segredo em seus olhos negros, mas eu não o entendia. —por que diz que haverá confusão? —perguntei ao meu primo, sem deixar de sussurrar. —Porque a expulsaram da família! Eu arqueei as sobrancelhas. Estava aponto de perguntar por que, mas a mulher, minha tia Sarafina, a quem nunca tinha visto em toda minha vida, começou a falar. E sua voz era como uma canção. Hipnótica, profunda, fascinante.
—Venham, pequenos. Oh, quanto falta senti de vocês — seu olhar passou pelas caras de todos os meninos, cheio de emoção—. Mas a maioria de vós não me recordam, verdade? — vacilou-lhe o sorriso—. E você, pequeno Dante. Quantos anos tem? —Sete — respondi eu, quase sem voz. —Sete anos — replicou ela, com um suspiro—. Eu estava aqui o dia que nasceu, sabia? —Não. —Não importa. Oh, meninos, tenho tantas coisas que lhes contar... Mas primeiro... — abriu sua bolsa, e dela começaram a sair coisas estupendas. Doces que nunca tínhamos provado, envoltos em papéis coloridos. Quinquilharias e caderninhos... Pedras brilhantes, de todas as cores, esculpidas em forma de animais. A que me deu era um morcego. Estremeci-me ao sentir a forma fria na palma da mão. Quando sua bolsa se esvaziou e os meninos ficaram em silêncio de novo, começou a falar. —Vi tantas coisas, pequenos... Coisas que não acreditariam. Viajei as terras do deserto, e vi pirâmides tão grandes como montanhas, feitas com pedras maiores que as carroças, suaves e perfeitas. Não se sabe quem as construiu, nem quando. Uns dizem que sempre estiveram ali. Outros dizem que são as tumbas dos reis do passado, e que seus corpos ainda descansam ali, rodeados de magníficos tesouros... —nós escutávamos boquiabertos, e ela assentiu com força. Seus cachos negros se balançaram e seus compridos pendentes tilintaram—. Cruzei o mar, para o sul, e vi criaturas com o pescoço tão largo como aquela árvore, douradas e com manchas negras, e com pequenos chifres na cabeça... Eu sacudi a cabeça. Não podia acreditá-lo, aquilo tinham que ser contos para crianças. —Oh, Dante é verdade — disse ela. E seu olhar sustentou o meu, e falou só para mim, eu estava seguro—: Um dia, você também verá essas coisas. Eu mesma lhe mostrarei isso, algum dia —se inclinou para mim e acariciou meu cabelo, sussurrando ao meu ouvido—: Você é um menino muito especial, Dante. Entre você e eu há laços mais fortes que os que o unem a sua própria mãe. Recorda minhas palavras. Voltarei por ti um dia. Quando me necessitar, voltarei. Eu estremeci sem saber por que. Então, fiquei rígido por ouvir um grito de minha avó. —Pária! — uivou, saindo de sua tenda como uma exalação, e fazendo gestos a Sarafina como se fosse o demônio, com o dedo do meio e o anular dobrados e o índice e o mindinho muito estirados para ela. Enquanto a apontava, fazia um som sibilante com os dentes e estalava a língua. Os meninos se levantaram e se afastaram. Sarafina se levantou lentamente, e só eu fiquei frente a ela. Quase sem pensar, levantei-me também e me voltei para ver a cara de minha avó, como se quisesse proteger à encantada Sarafina. Como se pudesse. Eu estava de costas à mulher, e quando ela me pôs as mãos sobre os ombros, senti-me como se tivesse crescido dez centímetros de um golpe. Então minha avó me olhou fixamente, e pensei que poderia me reduzir ao tamanho de um grão de areia. Nem sequer tolera minha presença depois de tantos anos, velha bruxa? —perguntou-lhe Sarafina. Sua voz já não era encantadora, nem suave, nem amável. Era profunda, clara e... ameaçadora. Não tem nada que fazer aqui! — espetou-lhe minha avó. —Sim — replicou ela—. Vós sois minha família. E, você goste ou não, eu sou a sua. —Você não é nada. Está maldita. Parte!
De repente estalou-se o caos a nosso redor, quando nossas mães, acordadas decido o barulho, saíram das tendas e se apressaram a tomar a seus filhos pelas mãos e levar-lhes. Comportavam-se como se tivesse aparecido um lobo assassino no acampamento, em vez daquela mulher que era nossa tia, muito bela e marginalizada, que nos trazia presentes exóticos e nos contava fantásticos contos. Minha mãe também se aproximou correndo para mim, mas eu tive tempo de esconder o pequeno morcego de ônix na manga. Ela se deteve ante a Sarafina antes de tomar-me nos braços e a olhou aos olhos. —Por favor — lhe disse. Houve um momento de silêncio, enquanto algo passava entre as duas mulheres. Alguma mensagem sem palavras que deixou a minha mãe muito triste e com olhos cheios de lágrimas. Sarafina se inclinou e apertou seus lábios frios contra minha bochecha. —Nos veremos de novo, Dante. Não o duvide. Mas, no momento, vai com sua mãe - me empurrou brandamente e me soltou os ombros. Eu me aproximei de minha mãe, odiando-a naquele momento por me obrigar a deixar a aquela misteriosa Sarafina antes de ter a oportunidade de aprender seus segredos. Agarroume com força o braço e correu para nossa tenda, tão rápido que me levantou os pés do chão. Dentro, fechou o tecido da porta e tomou minha cara nas mãos, ajoelhando-se ante mim. —Te tocou? —gritou—. Marcou-te? —Sarafina nunca me faria dano, mamãe. É minha tia. É boa, e muito bonita. Mas minha mãe não me escutava. Inclinou-me a cabeça de um lado a outro, me apartando o cabelo para olhar a pele do meu pescoço. Cansei-me muito em breve, e me retorci para me liberar. —Não te aproxime dela nunca mais! Ouviste-me, Dante? Se voltar a vê-la, tem que vir ao meu lado imediatamente. Prometa-me isso. —Mas por que, mamãe? Então me deu uma bofetada muito forte. Doeu-me tanto que me teria caído para trás caso ela não estivesse me sujeitando o braço com a outra mão. —Não me pergunte! Prometa-me isso Dante! Prometa-me isso por sua alma! Eu baixei a cabeça com a bochecha ardendo e balbuciei minha resposta: —Prometo-lhe isso — lhe disse, envergonhado pelas lágrimas que ardiam nos meus olhos. Aquelas lágrimas eram devidas mais à surpresa que à dor. Minha mãe nunca me tinha pego nem me tinha demonstrado sua ira. Não entendia por que o tinha feito aquela noite. Pôs as mãos nos meus ombros e aproximou sua cara à minha. —É uma promessa que deve guardar, Dante. Sim a rompe, porá em perigo sua alma — então tomou ar profundamente, suspirou e me beijou a bochecha que acabava de esbofetear —. E agora, à cama — parecia que estava algo mais acalma, e sua voz se aproximou de seu tom normal. Eu, entretanto, estava longe de sentir calma. Algo me tinha acelerado o sangue nas veias aquela noite. Meti-me na cama e me cobri. Depois tirei o pequeno morcego da manga e acariciei a superfície suave da pedra com o dedo indicador, sob a manta, para que minha mãe não visse. Mamãe me observou durante uns momentos. Depois apagou a vela e se deitou também, mas não em sua cama, a não ser no chão ao lado da minha, com uma manta por colchão. No silêncio, eu me voltei para o lado da tenda e me aproximei do pequeno buraco que
tinha feito no tecido para poder observar aos, aos mais velhos quando se reuniam ao redor do fogo pelas noites. Por aquele pequeno buraco olhei e escutei a minha avó, a mulher mais velha e venerada da família, enquanto enfrentava à mulher mais bela que eu tivesse visto em minha vida. —Por que nos atormenta vindo aqui? —perguntou-lhe a avó, com as chamas refletidas no rosto. —Por quê? Você, minha própria irmã, e me pergunta por quê? —Sua irmã! —disse a avó com desprezo, e cuspiu ao chão—. Você não é minha irmã, a não ser um demônio. Pária! Maldita! Eu sacudi a cabeça, sem entender nada. O que queria dizer Sarafina? Irmã? Ela não podia ser a irmã de uma velha... —Me diga por que vieste, demônio! Sempre procura os meninos quando volta. É por um deles, verdade? Passaste sua maldição a um dos meninos! Não é certo? Não é certo? Sarafina sorriu muito lentamente, com uma expressão angelical e demoníaca ao mesmo tempo, com o rosto banhado pela luz da fogueira. —Venho porque vós são tudo o que tenho. E sempre voltarei, velha. Sempre. Muito depois de que você tenha se convertido em pó, seguirei vindo, trazendo presentes aos pequenos, para encontrar em seus olhos e em seus sorrisos o amor e a aceitação que meus próprios irmãos me negam. E não há nada que possa fazer para impedi-lo. Antes que Sarafina desse a volta, seus olhos passaram de comprimento à avó e se cravaram em mim. Como se durante todo o tempo tivesse sabido que eu estava ali, observando-a do pequeno buraco do tecido da tenda. Não podia ver-me, e, entretanto, tinha que ter me visto. Seus lábios se curvaram ligeiramente, e sua boca se moveu. Embora não emitiu nenhum som, eu soube qual era a palavra que tinha pronunciado. Recorda. Depois se virou e desapareceu na noite. Vi as cores de seus lenços atrás dela durante um segundo. Então, o negrume da noite se fechou onde ela tinha estado, e já não a vi mais. Descansei a cabeça sobre o travesseiro e estremeci de medo. Era eu. Minha tia tinha ido por mim. Sabia no mais profundo de meu ser. Não entendia o que queria de mim, mas estava seguro de que tinha uma razão poderosa para enfrentar-se com tanto ódio. E aquela razão... era eu. Lenta, lentamente, a fumaça do acampamento cigano se dispersou. A luz das chamas se apagou, e o calor, tão real que tinha podido senti-lo no rosto, converteu-se em frio. Morgan da Silva saiu daquela fantasia. Já não estava observando a fogueira de um acampamento cigano através dos enormes olhos negros de um menino. Estava sentada no chão de uma água-furtada poeirenta, olhando as páginas amareladas de um velho diário manuscrito, com a capa de couro, tão antigo que era suave como a manteiga sob as pontas de seus dedos. A visão que tinham pintado aquelas palavras tinha sido vívida. Tinha sido... real. Tão real como se ela tivesse estado no acampamento cigano muito tempo atrás, em vez de na costa do Maine em mil novecentos e noventa e sete. Morgan passou a página lentamente, ansiosa por continuar com a leitura... Entretanto, o som do telefone a impediu. Com um suspiro de resignação, fechou o diário e levantou para guardá-lo de novo no velho baú. Ao fechar a tampa, o pó se expandiu pelo ar. Ela sacudiu as mãos nos jeans e baixou as levantadas escadas da águafurtada de dois em dois.
Ao subir ali, não tinha esperado encontrar outra coisa que teias de aranha e pó. Em realidade, explorar aquela casa desmantelada não tinha sido devido à curiosidade, a não ser a seu próprio trabalho. Se não fosse por ele, nunca teria se incomodado de percorrer aquele edifício antigo e abandonado. E teria sido uma autêntica lástima. Pensou, enquanto descia os últimos degraus sem fôlego, que se era outro cobrador de faturas ou outro advogado o mandaria passear. A larga escada terminava em um enorme vestíbulo que devia ter sido glorioso em outros tempos, mas naquele momento não continha nada mais que ecos de sons e cordas e cabos pendurados do teto e dos quais certamente teria pendido algum magnífico candelabro. Além daquele vestíbulo estava seu refúgio. Seu... escritório. No momento, ao menos. Mas só até que recuperasse sua fortuna e voltasse para Los Angeles como uma vencedora. Exatamente o contrário de como teve que partir. Quando chegou ao final da escada, seu coração pulsava rapidamente pelo esforço e se sentia ligeiramente enjoada. Era ridículo que uma mulher de vinte anos se cansasse por tão pouco, mas assim era. Nunca tinha tido boa saúde e sabia que nunca ia ter a. Mas ao menos, sua condição física não tinha começado a piorar ainda. Era muito cedo e tinha muitas coisas que fazer. Por fim, Morgan respondeu a chamada. O telefone era tão antigo como o resto da casa. O fone devia pesar um quilograma, mais ou menos. Todo aquilo parecia uma brincadeira a seu gosto pela alta tecnologia. Se sua voz ao responder soou irritada, era porque estava morrendo de vontade de seguir lendo aquele diário na água-furtada, para averiguar mais coisas sobre seu autor. Era possível que estivesse a ponto de admitir que fosse uma escritorazinha sem nenhum talento, mas ainda reconhecia algo bem escrito quando o lia, e o que tinha estado lendo era bom. Muito bom. —Morgan? Por que demoraste tanto? Estava preocupando. Sua irritação se dissipou quando ouviu a voz do David Sumner. Seu tio honorário, um título que tinha deixado de usar fazia muito tempo, era a única pessoa que não lhe tinha dado as costas quando ela tinha passado de ser a filha rica e malcriada à órfã arruinada em questão de horas. Era a única pessoa a que não lhe importava ouvir naquele momento. —Olá, David - lhe disse—. Estava... explorando a casa. Este lugar é muito grande, sabe? —Não, não sei, nunca o vi. Parece que não tem fôlego. —Será pelos dois lances de escadas que desci correndo. Morgan notou que titubeava. Tinha a tendência a preocupar-se com ela mais do que deveria. —Como é a casa? —perguntou-lhe ao fim. —Parece uma ruína — lhe disse ela, em tom zombador. Em parte, estava tentando tranqüilizá-lo, e em parte, gostava de zombar dele —. O que é bem empregado por comprar sem ver primeiro. Quem faria uma coisa assim? Quase podia lhe ver a cara com o cenho franzido, as rugas dos olhos, o cabelo loiro. David tinha sido o melhor amigo da família desde fazia tanto tempo como ela recordava. Seus pais o tinham chamado assim, um amigo da família, mas a Morgan sempre tinha parecido que se limitava a tolerá-los. É obvio, ele sim conhecia a verdadeira vida de seus pais desde fazia muitíssimo tempo. Ela só se inteirou fazia muito pouco tempo, através das manchetes da imprensa
sensacionalista e dos abutres, nos tribunais. —Comprei-a por sua situação, e sabe —lhe disse David—. E confio em meu agente para este tipo de assunto. O edifício está muito mal, de toda forma. —Sim. Ele ficou em silêncio durante um instante. —Realmente está tão mal? Ela teve vontade de esbofetear-se. Algumas vezes era uma pequena egoísta... —Não, não o está - disse rapidamente—. Só estava zombando — e olhou a seu redor, pela sala que tinha escolhido habitar. Tinha sido a biblioteca ou o escritório de alguém, fazia muitíssimos anos. Recordou ao menino sobre o qual tinha estado lendo, e se perguntou se teria sido dele. Possivelmente, quando já era um ancião e tinha decidido escrever suas memórias. —Descreva-me isso — lhe estava dizendo David. —O que? —A casa. descreva-me —Pois... uma vez devia ser incrível. A embocadura da lareira é de madeira nobre e está esculpida, e embora agora esteja danificada, é esplêndida. As janelas são muito altas e os tetos tinham molduras das que agora faltam muitos partes... Este lugar tem... não sei. Algo. —Entretanto, não se aproxima de nada do que você está acostumada — disse David. —Sim, bom, não é Beverly Hills, mas se fosse não conseguiria trabalhar nada... —Está conseguindo? Adiantaste algo? Morgan observou a tela azul de seu computador, que tinha se salvado dos credores só porque o tinha na universidade quando seus pais se mataram e tinha saído à luz da verdade a situação econômica da família. Estavam arruinados, e tinham tantas dívidas que Morgan apenas podia assimilar as cifras. Ao princípio não tinha podido entender. Seu pai era um diretor de cinema de êxito, e sua mãe era uma atriz que, fazia uma década, tinha alcançado o topo, e que na atualidade fazia papéis menores, mas que parecia contente com sua vida. Ou isso era o que pensava Morgan. Logo soube que tinham estado vivendo em uma ilusão. O nível de cocaína que tinham em sangue na noite do acidente era tão alto que o forense perguntou-se como tinham se arrumado para conduzir. Eram drogados, e todo seu estilo de vida era uma grande mentira. A casa e todas as demais posses tiveram que ser vendidas para cobrir uma parte da dívida, e Morgan tinha tido que deixar a universidade. Já deviam a matrícula e vários pagamentos. E aparentemente, seus amigos eram tão falsos como David sempre tinha tentado lhe dizer, porque uma vez que souberam da verdade, tinham-na abandonado como ao guarda-roupa do ano anterior, enquanto que aqueles aos que ela tinha considerado inferiores estavam divertindo-se em segredo com seus problemas. Nos últimos dias no campus, Morgan tinha encontrado páginas dos periódicos e as revistas penduradas nos quadros de avisos de todos os corredores, revelando todos os detalhes da vida secreta de drogados de seus pais, que, entretanto, pareciam que tinham tudo. O pesadelo atrás do conto de fadas, e a pobre menina rica ficou completamente só e arruinada. Tinha saído da universidade e de Los Angeles com o rabo entre as pernas, e tinha chamado ao David. Ele tinha ajudado a vender as poucas coisas que ficavam, como seu Maserati, que, graças a Deus, estava no seu nome, e a comprar um carro de segunda mão guardando a diferença. Quando lhe havia dito que necessitava de um lugar onde esconder-
se e lamber suas feridas, tinha respondido que podia fazê-lo naquele lugar do Maine, grátis, durante tanto tempo como necessitasse. E não seria muito, pensou ela silenciosamente. Sempre tinha tido a intenção de converter-se em uma grande escritora de roteiros, só que ia ter que começar a tentá-lo um pouco antes do que tinha pensado. David era produtor. Ele a ajudaria a fazer os contatos precisos e possivelmente produzira o filme ele mesmo. Tinha-lhe prometido que lhe daria uma oportunidade. Que a ajudaria em tudo o que pudesse. Só necessitava... o material. —Morgan? —a voz do David a tirou de sua cisma—. Ouviste-me? Perguntei que tal vai o roteiro. —Muito bem. Estupendamente — tão bem que tinha decidido ir explorar a casa em vez de seguir brigando com a tela vazia. A única tecla que estava apertando uma e outra vez era a de apagar. Desde que tinha chegado ali, só tinha escrito tolices. —Sabe? É normal que tenha algum problema na hora de começar — lhe disse David —. Não pressione a ti mesma, passastes por muitas coisas, e necessitas tempo para digerir tudo. Morgan encolheu os ombros. —Não é isso — lhe disse. —Não? —É obvio que não. Já passaram seis meses. Superei por completo. —superaste completamente perder a seus pais, sua fortuna, sua casa, sua educação e tudo o que pensava que era sua identidade? —disse ele, e estalou a língua—. Não acredito. —Bom, pois é certo. E, para ser sincera, averiguar que foi adotada me facilitou as coisas. Refiro-me a que... já sabe que meus pais nunca estiveram de tudo... implicados emocionalmente. —Era a cocaína, carinho. Não a adoção. Não foi você. Ela pigarreou ao notar que sua garganta se fechava e obrigou-se a reagir. —E quanto ao resto, vou recuperar tudo, David. Tudo o que perdi. E mais ainda. —Não o duvidei nem por um momento. —Nem eu tampouco — respondeu ela, observando a tela vazia e sentindo que as dúvidas que estava tentando negar a asfixiavam. Demônios, por que escrever um roteiro de êxito não era tão fácil como ela sempre tinha acreditado? Havia visto muitos filmes e tinha pensado que poderia fazê-lo melhor, inclusive dormindo. —E para quando terá o roteiro? — perguntou-lhe ele. Ela umedeceu os lábios. Oxalá soubesse. —Uma obra de mestre requer tempo. É algo imprevisível. —Necessito de um projeto para o outono. Estou te reservando um oco, Morgan. Três meses. Necessito o material em três meses. Poderia fazê-lo? Poderia escrevê-lo durante o verão e me entregar em setembro? Ela levantou o queixo, tragou saliva e disse: — Sim. Terei terminado em setembro. Não há problema. —Estupendo — lhe disse David—. Vais fazer-lo muito bem, Morgan. Poderá com isso. —É obvio. —Necessita algo? Está bem de dinheiro? Morgan se obrigou a mentir. Tinha deixado suas contas à zero, seguindo o conselho do David, antes que os credores se lançassem sobre elas, e tinha o dinheiro do carro. Mas
embora ali não tivesse que pagar o aluguel, havia outros gastos: o telefone, a eletricidade, a água... e tinha que comer. A verdade era que o dinheiro estava acabando. —Estou bem — lhe disse. —De acordo — disse David brandamente—. Bem, avise se necessitar de algo. —Farei, David. Ele ficou silencioso durante um momento. —E que tal está de saúde? Ela tomou ar e depois o deixo escapar com um suspiro. — Já sabe que eu não gosto nada que me tratem como se fosse um ser doentio. —Acaso te disse que era? —Não. —E que tal está? Ela apertou os lábios. —O ar fresco e limpo daqui está fazendo maravilhas — mentiu. O que ia dizer-lhe? A verdade? Não podia dizer que se ressentia da umidade e do frio daquele lugar, embora já estivessem em abril—. Bom, David, tenho que te deixar — disse, tragando saliva de novo para tentar desfazer o nó que tinha na garganta—. Se quiser terminar isto antes do outono, tenho que continuar. —De acordo, carinho. Chame-me se necessitar algo. —Farei, David. Obrigado. Morgan desligou o telefone e mordeu o lábio inferior. Virou a velha cadeira para a tela do computador e se sentou. Pôs ambas as mãos sobre o teclado e se disse que tinha que escrever algo aquele mesmo dia, ou deixá-lo e buscar um trabalho. O problema era que não sabia fazer nada. Escrever era a única coisa que tinha querido fazer, e na única que tinha sido boa... Ou ao menos, isso acreditava. Na universidade, seus ensaios sempre tinham muito boas notas dos professores. O grupo de teatro inclusive tinha representado alguma de suas obras. A todo mundo tinha encantado, aos críticos do campus, aos dos periódicos locais... Mas isso tinha ocorrido quando ela era Morgan da Silva, a brilhante filha de um aclamado diretor e de uma famosa atriz. Naquele momento não era mais que Morgan da Silva, desgraçada, sem dinheiro e sem lar, virtualmente expulsa de sua cidade e com um futuro muito mais negro e vazio do que nunca tivesse imaginado. Além disso, não sabia se seu talento era real ou se simplesmente tinha conseguido todo aqueles louvores por seu sobrenome. Já não sabia nada, nem quem era, nem o que estava fazendo, nem por que tinham deixado de lhe chegar às palavras. Era como se o poço de que tinham brotado tivesse secado ao acabar-se sua ilusão. Lá fora, o vento uivava. A luz se foi e voltou em um instante. A velha casa grunhia quando o vento soprava forte. Provavelmente, se ela fosse tão velha também gemeria, pensou. E então se perguntou quantos anos teria aquilo. Aquele diário, aquelas memórias não tinham data, mas era evidente que fora escrito fazia muitos, muitos anos. Ao menos, um século atrás... ou dois. Aquele pensamento lhe recordou o escritor, Dante. Teria vivido ali quando adulto? Teria estado naquela mesma sala, possivelmente passeando frente ao fogo, pensando enquanto sua pena descansava naquele mesmo escritório? Teria esperado a sua musa igual a ela, frustrado quando não lhe chegavam às palavras? Como se uma mão invisível a arrastasse, subiu à água-furtada e acendeu um par de
velas. Depois levantou a tampa do baú e tirou o primeiro volume das memórias que tinha estado lendo. Abriu o tomo cuidadosamente e começou a ler. E, uma vez mais, perdeu-se na história.
CAPÍTULO II
Passaram treze longos anos antes que voltasse a ver a Sarafina. Treze longos anos, nos quais aprendi muitas coisas. Aprendi que, fôssemos onde fôssemos, sempre seríamos mal acolhidos. Que apesar de ser honestos sempre nos chamariam ladrões, inclusive pessoas estranhas que não sabiam nada de nós. Por isso aprendi também a tomar o que queria e a mandar a todos ao inferno. Pensei que estaria bem desfrutando dos frutos do me atribuíam. Se me apanhavam, pagaria por aqueles crimes embora não os tivesse cometido. Era melhor pagar por meus próprios delitos que pagar pelos de algum parvo que fingia ser honesto, porque sempre havia algum cigano perto a quem carregar com as culpas. Mas, apesar de ter aprendido muitas coisas, havia um mistério que não tinha conseguido decifrar. Quem era Sarafina? Por que tinha relação conosco? E por que a tinham expulsado de nossa família? Tampouco tinha conseguido averiguar qual era a maldição que levava, conforme diziam todos. Não soube até a noite em que minha vida esteve a ponto de terminar. Até a noite em que minha vida realmente terminou tal como a conhecia, e começou uma nova. Era outono de mil oitocentos e quarenta e oito. Eu era jovem, um jovem exaltado e temerário. Minha família estava a ponto de recolher o acampamento e empreender a marcha de novo, não porque se cansaram do lugar no que viviam, mas sim porque os aldeãos nos tinham acusado de roubar gado, e sabíamos que a lei viria por nós rapidamente. Antes de partir, decidi que conseguiria um pouco de carne dos animais daqueles que nos acusavam. Aquela noite havia lua nova; só se via um fio de prata no céu. Entrei no estábulo de um granjeiro. Não me importava o que encontrasse ali, sempre e quando pudesse roubar algo. Era para me ressarcir pelas injúrias para mim e para meus. O primeiro animal que vi foi um bode. Pus uma corda ao redor do seu pescoço e puxei-o brandamente. O animal se deixou levar até que chegamos à porta do estábulo; então, de repente, cravou as patas no chão e emitiu um balido comprido e queixoso. Seu grito ressonou na metade da noite. Eu devia ter deixado que o bode voltasse para seu lugar, mas o orgulho de um homem jovem algumas vezes é muito forte, e, além disso, em mim se combinava com a fúria e a frustração, assim continuei puxando a corda e arrastando o animal pela erva. O granjeiro nem sequer avisou. Em um momento, eu estava puxando o maldito animal, e no momento seguinte, estava de barriga para baixo no chão, com o som do disparo me retumbando nos ouvidos. Uns segundos depois comecei a sentir a dor e o assombro. Durante uns instantes, notei a bala, como se fosse de fogo, e depois o sangue cálido me empapando a roupa. Mas então senti algo muito pior. O intumescimento se estendeu por meu corpo: primeiro as pernas, e depois o ventre, o estômago, os braços... Depois não senti nada. Não podia me mover. Nem sequer senti que
o granjeiro me virou com a ponta da bota e me deixou de barriga para cima. —Malditos ciganos — disse, e me cuspiu. Depois tomou seu pode e partiu. Não me tinha matado. O alívio, entretanto, transformou-se muito em breve em desespero, ao me dar conta de que morreria sozinho em poucos minutos. Notava que o sangue escapava do meu corpo, e me dava conta de que cada vez estava mais fraco pela perda. Estava sentindo... que morria. Ouvi os passos do granjeiro enquanto se retirava. Depois ouvi o ruído da porta do estábulo ao fechar-se. E depois não ouvi nada mais que o suave som do vento da noite, sussurrando entre as árvores. Sussurrava meu nome. —Oh, doce Dante — disse uma voz muito perto de mim. Aquela vez não era o vento — Fez com que este momento chegasse muito mais cedo do que eu gostaria. Abri os olhos. Sarafina estava a meu lado. Sua silhueta se recortava no negrume da noite, como se fosse a de um anjo escuro. Eu tentei falar, mas as palavras eram tão suaves que soube que não poderia me ouvir. Ela se ajoelhou a meu lado e eu reuni todas minhas forças para lhe dizer: —Sarafina... estou morrendo. Sua mão suave me apartou o cabelo da frente. —Não, Lhe dêem. Sabe muito bem que eu não o permitiria. —M... mas... —Shhh. Já quase chegou a hora. Quase sangraste. Será questão de um momento. Eu abri muito os olhos de pânico. —Sarafina! Por favor! Confia em mim, querido. Não morrerá. Escute: agora tem que fazer uma escolha, e não tem tempo para deliberar. Quer morrer, aqui e agora? Ou viver, embora isso signifique viver no exílio, como eu? A família te odiará e te jogará de seu lado. Eu me sentia muito débil, e não entendia suas palavras. —Vida ou morte, Dante? Me dê sua resposta. Se demorar, perderá a oportunidade de escolher. Morrerá. Diga-me isso agora: vida ou morte? Eu lutei por pronunciar a palavra, mas não ouvi que emergisse de meus lábios. Tudo o que pude fazer foi pensar que queria pronunciá-la. Vida. —Muito bem. Ela se moveu. Eu tinha a visão imprecisa, assim não pude ver o que fazia. Depois apertou algo contra meus lábios, e eu senti uma assombrosa necessidade. Fechei a boca sobre a fonte que ela me tinha dado e chupei dali como um bebê que mamava de sua mãe. Comecei a sentir que a vida se estendia de novo por meu corpo, junto com uma fome que nunca tinha experimentado antes. Movi os braços e agarrei aquele obséquio, sujeitando-o contra a cara, enquanto mamava o líquido que se derramava por minhas veias. —Já é suficiente! Sarafina me agarrou pelos cabelo para prender minha cabeça e puxou com força. E só então me dei conta de que o que eu tinha estado chupando era seu pulso, e o que tinha bebido com aquela sede era seu sangue. Horrorizado, notei que meu estômago dava um tombo, e levantei a mão para limpar a boca. —Não aconteceu nada, Dante. Assim é como compartilhamos o dom. Eu olhei minhas mãos, manchadas de sangue. Mas estava vivo. Forte. Movi os dedos. Apertei os punhos.
—O que é isto? — perguntei-lhe brandamente —. O que significa? — enquanto falava, notava que meu corpo já não estava intumescido. Notava a brisa na pele e via com mais precisão da que nunca tivesse visto. Notava a força pelas veias. Incorporei-me, e então, ela me arrancou a camisa e a fez tiras. —É um presente, jovem Dante, embora alguns o chamem de maldição. É um dom que eu te concedi. Nunca morrerá. Nunca envelhecerá. E embora sua família se volte contra ti, nunca estará sozinho como eu estive. Porque sempre estarei contigo. Sempre. Eu a estava olhando por cima de meu ombro, porque estava a minhas costas, colocando tiras de tecido na ferida, o que causava uma imensa dor. Não entendia nada. Ela atou várias tiras ao redor do meu peito para manter os pedaços de algodão em seu lugar, e depois me ajudou a me pôr de pé. Então, vi o granjeiro justo detrás dela. Abri a boca para avisá-la. Antes que tivesse podido dizer uma palavra, a mulher bela e graciosa que me tinha deixado fascinado virou-se e pegou ao homem pela gola da camisa. E antes que eu pudesse reagir, atirou-se a sua garganta. Ouvi os sons... E vi, claramente, na escuridão, o que estava fazendo Sarafina. Estava... bebendo-se seu sangue. Estava abarrotando-se em seu pescoço. No princípio, o granjeiro deu murros nas costas dela, e chutes. Depois, simplesmente, rendeu-se. Ouvi como suspirava e vi como a abraçava. Deixou que sua cabeça caísse para trás, e vi como apertava seus quadris contra Sarafina enquanto ela bebia. E depois, já não havia vida nele. Ela soltou a camisa e o corpo caiu ao chão. Morto. Completamente seco. Sarafina limpou os lábios delicadamente com um de seus lenços e virou-se para me olhar. Eu não podia pronunciar nenhuma palavra. —Não te assuste, Dante. É que acaso acaba de te dar conta? Mmm? Somos Nosferatu. Não podemos morrer, lambeu os lábios, inclinou a cabeça e sorriu para mim ligeiramente—. Vampiros —sussurrou, e me pareceu que o vento recolhia a palavra e a repetia mil vezes com vozes diferentes. Vampiros. Uma brisa que provinha de alguma parte fez que a chama da vela vacilasse. Morgan apartou os olhos das páginas e olhou para trás. Mas, é obvio, não havia ninguém. Não havia nada. Aquilo não era real. —Oh, Meu Deus —sussurrou —. Isto não é... não são umas memórias. É ficção. É uma ficção incrível, impressionante! Oh, possivelmente não o tivesse sido para o homem que o tinha escrito. O artista que, com uma loucura deliciosa, tinha criado aquele conto e que, certamente, tinha acreditado. Um homem que tinha acreditado de verdade que era um vampiro. Um homem que tinha vivido ali, com toda probabilidade. Naquela mesma casa. De repente, algo fez um ruído contra a janela. Morgan se assustou e levou uma mão ao peito, no lugar no qual seu coração tinha dado um salto. Só tinha sido o ramo de uma árvore, dobrada pelo vento, que tinha raspado o vidro. Não uma criatura da noite que se chamava Dante a si mesmo, que havia voltado para exigir que ela entregasse suas memórias. É obvio que não. Os vampiros não existiam. O repentino movimento e o susto a tinham deixado enjoada, e tinha o coração acelerado. Esperou que passasse e respirou fundo. Ao olhar a hora, deu-se conta de que
levava horas sentada naquela água-furtada poeirenta, perdida no mundo imaginário de um louco, quando deveria ter estado trabalhando em seu próprio roteiro. Deus, como ia ser capaz de escrever um bom roteiro, um que David pudesse vender, em apenas três meses? Sobre tudo a partir daquele momento, depois de ter lido aquela incrível historia. Vagamente, perguntou-se quanto tempo teria demorado o imaginativo Dante para escrever suas memórias. Não muito, pensou... se todos os volumes daquele baú estivessem cheios. Não entendia como era possível que o tivesse feito durante sua curta vida. Entretanto, estava morto. Tinha que estar, porque ela tinha encontrado, finalmente, uma data... E suas palavras, suas histórias, estavam ali, intactas. Tão vívidas, tão maravilhosamente escritas, que era quase penoso que não as compartilhasse com o resto do mundo. Se ela tivesse escrito tão bem como aquilo e ninguém o tivesse visto, teria sido... Oh. Deus, acabava de lhe ocorrer... Aquilo poderia ser seu trabalho. Ninguém mais sabia, assim poderia ser sua própria obra. Quem ia notar a diferença? —Não — sussurrou em voz alta—. Não estaria bem. Realmente não estaria bem? Acabava de pensar que era um crime que aquele trabalho permanecesse oculto. Acabava de reconhecer que, se ela fosse a autora, teria passado a eternidade lamentando que ninguém o tivesse encontrado. Ao fim e ao cabo, a palavra escrita é feita para ser lida e compartilhada por todo mundo. Experimentada. Ajoelhou-se junto ao baú aberto. Que dano poderia fazer? Dante tinha morrido fazia muito tempo, e não era possível que ninguém conhecesse a existência daqueles volumes. De outro modo, não estariam ali, comidos pela umidade. E havia tantos! —Meu Deus —sussurrou—. Isto é uma mina de ouro. Estou sentada sobre uma mina de ouro. Aquilo era algo mais que um baú cheio de histórias. Era o caminho para tudo o que desejava, a chave para recuperar tudo o que tinha perdido. Riqueza, poder, fama. Seu retorno triunfante a Los Angeles. Aquilo era um presente que lhe tinha deixado um louco, morto fazia muito tempo, que se chamava a si mesmo Dante e que acreditava ser um vampiro. Pegou o primeiro volume cuidadosamente e o apertou contra o peito. Levantou-se e desceu para o escritório. E naquela ocasião, quando pôs as mãos sobre o teclado, as memórias de Dante estavam abertas junto ao teclado. As palavras fluíram.
CAPÍTULO III
Maxine Stuart estava vendo JFK pela décima oitava vez na pequena televisão de seu quarto, com um cachorro-quente no colo e uma lata de refresco meio vazia na mesinha de cabeceira, quando ouviu as sirenes, levantou-se rapidamente e foi para a janela. No céu da noite, ao sul, viu um brilho avermelhado no horizonte. Um Jipe fez a curva do caminho para sua casa e, um segundo depois, ouviu que se abria a porta dianteira e que sua mãe falava com seus melhores amigos. Desligou a televisão e saiu de seu quarto. Os encontrou no corredor e se deu conta de que ocorria algo grave. Jason não tremia
facilmente, e estava tremendo. Storm, que em realidade se chamava Tempest, mas que odiava seu nome, estava completamente pálida. A mãe do Maxine os seguia. —O que ocorre? O que é que está queimando? — perguntou Max. —Spook Central —respondeu Jason—. E não parece que tenha remédio. —É horrível —disse Stormy, com os olhos, azuis e brilhantes como duas jóias, cheios de lágrimas—. Não acredito que ninguém saia vivo. Spook Central. A Central dos Espectros. Aquele era o nome preferido da Maxine para aquele centro governamental, um conjunto de barracões enormes que havia nos subúrbios da cidade, e que não tinha denominação oficial. O edifício principal era imenso, e estava bem afastado da cerca, muito alta, eletrificada e rodeada de câmaras de vigilância. Tudo estava envolto em mistério. O que a maioria da gente pensava era que se tratava de um laboratório de investigação onde se trabalhava para encontrar uma vacina contra o SIDA, uma cura para o câncer, coisa do estilo. Algo muito elevado para dedicar-se a bisbilhotar. Quem ia questionar uma missão tão sagrada? Maxine tinha suas próprias teorias, como na maioria dos casos, e naquele momento esperava que sua versão estivesse equivocada. Sempre tinha pensado que aquele lugar era um laboratório militar e que ali se investigava sobre armas biológicas e químicas. Entrou de novo em seu quarto, pegou sua jaqueta e voltou a sair ao corredor. — Vamos. —Ir? Aonde? —perguntou-lhe sua mãe. Nenhum dos três respondeu, e Ellen os rodeou enquanto caminhavam para a porta para lhes cortar o passo—. Max, não vão. Atrapalharão o trabalho que estejam fazendo, e é provável que saiam feridos. —Vamos, mamãe. Tenho vinte anos. Não vou incomodar os bombeiros. Só quero saber o que é que está ocorrendo. —Então, leia no jornal de amanhã, como todo mundo. —Deus, como pode ser tão inocente? Ellen Stuart suspirou, preocupada, mas também resignada. Ninguém tinha sido capaz de fazer que Maxine Stuart trocasse de opinião a respeito de algo, e sua própria mãe o tinha tentado desde dia em que lhe levaram a órfã de três meses a sua casa. —Tomem cuidado. —Sempre tomamos cuidado —respondeu sua filha, e pegou sua pequena mochila do cabide da entrada. Quando os três amigos estavam sentados no carro, Maxine disse: —Olhem. Vê-se o fogo daqui. Olhem. Stormy estremeceu e baixou os olhos. Jason ficou olhando-o fixamente, e depois ligou a rádio e procurou pelo dial. —Sabia que quereria ir —disse—. Eu me inteirei por meu irmão. Se ele não fosse bombeiro voluntário, provavelmente não saberia ainda. —Não foi dito nada pela rádio, Jay? —perguntou-lhe Stormy, bastante nervosa. Ele seguiu movendo o dial, e depois sacudiu a cabeça, lentamente. — Acreditava que fossem dedicar lhe um especial, alguma porcaria dessas, mas não dizem nenhuma palavra. —Dirão o que lhes ordenem que digam —disse Maxine—. Apesar do que minha mãe pensa sobre os jornais, estou segura de que não falarão disso, porque isto tem que ser alguma missão secreta do governo. Stormy encolheu seus ombros e desviou o olhar. Aqueles temas sempre faziam que
se sentisse incômoda, mas Maxine não se sentia incômoda falando deles. Sentia-se mais incômoda por ter vivido virtualmente à sombra daquele enorme complexo misterioso e bem protegido, e não ter sabido nunca o que havia dentro. Sim sabia uma coisa com certeza: aquilo não era um laboratório de investigação contra o SIDA, e era possível que depois daquele incêndio ninguém soubesse o que era na realidade. Quando chegaram ao ponto da estrada onde os veículos de emergência estavam estacionados, detiveram-se. Havia cercas que lhes cortavam o caminho, assim desceram do Jipe e observaram as chamas muito altas que subiam pelo céu noturno. Max sentia o sabor da fumaça na boca cada vez que respirava. —Por aqui —disse, e caminhou pelo lado direito da estrada, além dos veículos estacionados. Seus amigos a seguiram. Chegaram à entrada do complexo, onde havia bombeiros por toda parte, completamente concentrados em seu trabalho. Maxine se agachou detrás de uma ambulância, e puxou o Jason e a Stormy. Os carros de bombeiros tinham entrado dentro do complexo. A guarita de vigilância estava vazia, e a porta estava aberta. A cerca e o alambrado estavam quebrados à esquerda e à direita, e as câmaras feitas pedaços. Os bombeiros voluntários, vestidos com trajes amarelos, dirigiam grandes mangueiras conectadas com os tanques de água dos carros. Cada vez que conseguiam que as chamas retrocedessem um pouco, os veículos se adiantavam mais, e os homens se aproximavam mais do inferno. —Não entendo como suportam o calor. Deus, eu o sinto daqui — disse Storm, apertando a palma da mão contra a bochecha. —Surpreende-me que não tenham fundido suas mangueiras —disse Jason—. Se aproximarem-se mais... —Se aproximarem-se mais —terminou Maxine—, poderemos entrar. —O que? —perguntou-lhe Jason, enquanto Storm a olhava boquiaberta —. Tem que estar de brincadeira, Max. Não podemos entrar aí. —Não há ninguém vigiando a entrada. Todos estão concentrados no fogo. Podemos entrar sem problema. —Max, sei que podemos entrar. O que queria dizer é que não devemos fazê-lo. Então, foi ela que os olhou assombrada. —Estão loucos? Desde que me dei conta de que essa estúpida história do laboratório de investigação sobre o câncer e o SIDA era uma mentira, estive morrendo de vontades de atravessar essas portas. —O qual significa desde que tinha seis anos — murmurou Stormy. —Mas, é que não se dão conta? Esta é nossa oportunidade. Não há guardas, e por fim podemos saber o que há detrás dessa mentira. —E crê que vai ficar algo para ver, Max? As chamas estão devorando tudo — apontou Jason. —Não saberemos se não entrarmos. Ele suspirou, baixou a cabeça e passou uma mão pela cabeça barbeada. Nenhum dos três falou de novo durante um bom momento, enquanto seguiam ali agachados, olhando. Finalmente, Max se levantou e saiu correndo para as portas. Seus amigos duvidaram, mas a seguiram. Os três passaram diante da guarita e se esconderam atrás das árvores que bordeavam o caminho. —Bom, conseguimos — disse Max.
—Se nos pegarem aqui, vão nos fichar. —Não pense, Jason. Vêem aquele mastro? —perguntou-lhes, o apontado. Jason e Stormy olharam o mastro, e depois a olharam de novo—. Uma vez que cheguemos até ali, podemos rodear o edifício e entrar pela parte de atrás. —E então, a parede em chamas pode derrubar-se sobre nós, nos esmagando e nos assando ao mesmo tempo — disse Storm, com o reflexo do fogo dançando nos olhos. Max tragou as dúvidas que tinha sobre se devia arrastar a seus dois melhores amigos àquilo, dizendo-se que era por uma boa causa. Além disso, não sofreriam nenhum dano. Ela não o permitiria. Maxine Stuart cuidava de seus amigos. Então saiu disparada até o final do caminho, onde terminavam os pinheiros, e eles a seguiram. Depois correram para a parte traseira do edifício. Era um montão do qual saíam chamas por toda parte, embora a maior parte do fogo transladou-se à parte dianteira, e estava acabando com ela. Havia cinzas e fumaça. Haveria também gente ali? - perguntou-se Max. Corpos? Max olhou a seu redor. —Vêem aqueles arbustos? Estão afastados do fogo — lhes disse, apontando-os —. Me espere ali. Prometo-lhes que não demorarei. —Não, Max —lhe advertiu Jason. Parecia que estava zangado—. Não o faça. —Cinco minutos. Só cinco minutos. Isto só ocorre uma vez na vida, Jay — e não esperou que ele replicasse. Simplesmente, pôs-se a correr. Fazia muito calor, e a fumaça lhe queimava o nariz. Correu até que chegou à parede traseira, tossindo e entrecerrando os olhos para conseguir ver algo através do fogo e das quebras de onda de calor insuportável. No chão a havia caixas quebradas, computadores destroçados, queimados, feitos migalhas. Acaso alguém os teria atirado pela janela em um esforço para evitar que se destruíssem? Ou possivelmente para destruí-los? Max deu um pontapé em um. Teria dado algo para conseguir algum daqueles discos rígidos. Só Deus sabia o que poderia encontrar ali. Agachou-se para tentar pegar algo de uma pilha de escombros, mas as partes estavam tão quentes que lhe abrasaram os dedos e retirou a mão de um puxão. — Demônios! Levou os dedos queimados aos lábios, soprou-os e os sacudiu no ar enquanto seguia caminhando. Seu pé se chocou contra algo que rodou, e quando olhou para baixo, se aproximando, deu-se conta de que estava inclinada sobre um antebraço e uma mão carbonizados. — meu deus! Sua respiração se acelerou, e embora seus pulmões recolhessem mais e mais fumaça cada vez que inalava, não podia evitá-lo. Continuou sua busca, e viu outros restos humanos entre o desastre. Mais e mais. Corpos. Partes de corpos. Era como se estivesse andando pelo inferno. Jesus, por que ninguém tinha podido sair vivo? Que demônios teria ocorrido ali? Aquilo era uma estupidez. Tinha sido parva ao ir ali. Começou a virar-se para voltar para o Jason e Stormy, quando um movimento lhe chamou a atenção. Ficou imóvel, com os olhos entrecerrados. Pouco a pouco, o movimento tomou forma. Um homem com a roupa queimada e com a pele tão enegrecida que Max não soube se era branco ou negro. Estava curvado e caminhava instavelmente, se inclinando e erguendo uma e outra vez. Parecia como se estivesse recolhendo coisas, escapando do inferno sem querer deixar nada para trás. Ela
estava a ponto de lhe oferecer ajuda quando ouviu que alguém gritava seu homem da distância. O homem também ouviu a voz do Stormy, e voltou à cabeça para onde procedia o grito. Uma chama saltou em algum lugar próximo a ele e iluminou seu rosto durante um instante. Ele tinha queimado por completo o cabelo de uma parte da cabeça, e tinha um lado do couro cabeludo e da cara completamente abrasados. Max tentou memorizar seus traços, sua cara redonda, a forma de seu queixo. Ele colocou o que tinha tirado do chão nos bolsos, e correu como pôde, vacilante, para a Maxine. Ela se agachou e conteve o fôlego, obrigando-se a permanecer imóvel. Não sabia com segurança se aquele homem era perigoso, mas se estivesse fazendo algo positivo, não fugiria. Possivelmente era só um intrometido, como ela. Mas provavelmente não. Tinha estado dentro do edifício em chamas. Aquilo era evidente. Quando ele passou coxeando a seu lado nem sequer se incomodou em olhá-la. Passou tão perto que Max sentiu o aroma de carne queimada e lhe deu um tombo no estômago. Do homem caiu algo da jaqueta. Em realidade, duas coisas. Entretanto, ele não se deu conta, e seguiu coxeando até que se perdeu entre a fumaça. Maxine tragou saliva e tomou ambas as coisas. Uma delas era um CD-ROM, e a outra, uma espécie de placa de identificação. Notou que suas mão tremiam enquanto os metia no bolso. Incorporou-se e pôs-se a correr para o arbusto onde estavam seus amigos, sem olhar de novo o açougue que encontrou a seu caminho. Ao chegar, caiu de joelhos sem fôlego. — Graças a Deus que já voltaste! —disse-lhe Storm. Agachou-se a seu lado e lhe pôs a mão sobre as costas, acariciando-a—. Está bem? O que aconteceu ali? —Encontraste algo? O que viu? —perguntou-lhe Jason. Maxine levantou a cabeça e os olhou. —É... havia... havia corpos. —Oh, Deus —disse Stormy, fechando os olhos. Max se agarrou ao antebraço do Jason, e ele a ajudou a levantar-se. —Vamos daqui, de acordo? — disse-lhe Jason. Ela assentiu e se levantou. Os três caminharam juntos, e quase tinham chegado à porta quando ouviram os sons de uns motores e chegaram uns veículos rugindo por toda a rua. Detiveram-se na entrada. Ao menos um dos caminhões tinha montada uma metralhadora em um tripé na parte de atrás. Em um segundo, várias dezenas de soldados armados desceram dos furgões e se estenderam por todo o terreno. A uns metros deles havia um policial de costas para eles, observando os movimentos com a cabeça inclinada de um lado. «Minha polícia», pensou Maxine, com certo alívio. Jason também o viu e apertou o braço de Max, lhe sussurrando: —Um policial. —Não passa nada. É Lou Malone. Jason a olhou com o cenho franzido. —Dá aulas no curso de defesa para mulheres que estou fazendo. —Tem que te lembrar, Jay — disse Storm—. Trabalhava nas festas do instituto. É esse por quem Max sempre esteve apaixonada. —Ah, sim. Esse — e olhou a Max para lhe perguntar se ainda gostava, mas ela se limitou a pôr os olhos em branco e olhar para outra parte. De repente, alguém começou a falar por um megafone, e os meninos se
sobressaltaram. —Estas são instalações governamentais e, portanto, esta é uma operação militar. Os bombeiros locais cessarão toda atividade imediatamente, e ninguém abandonará o lugar sem autorização. Por favor, formem uma fila ordenada perto da porta principal e serão escoltados fora da zona. Isso é tudo. —O que está ocorrendo, Max? —perguntou-lhe Storm, agarrando-a pelo braço—. Têm armas. —Não as vão usar — disse Jason, tentando que sua voz soasse confiante —. Quero dizer que são soldados, e têm que levar armas. Entende? Então observaram como os soldados separavam aos bombeiros dos caminhões tanque e tratavam de lhes tirar as mangueiras. Alguns obedeceram, mas aqueles que não se moveram o suficientemente rápido foram revistados ali mesmo e depois conduzidos até a porta. Alguns soldados revistavam os caminhões. —Não entendo nada —disse o oficial Malone para si mesmo—. O que é isto? Maxine se aproximou dele e pigarreou. Ele se voltou rapidamente e ficou olhando atônito. Ela o queria. Tinha-o querido do instituto, e não lhe importava que tivesse uma cara áspera e com rugas, ou que fosse dezoito anos mais velho que ela. Nem sequer importava que a considerasse uma cria pesada com muita imaginação. —Mas bom, se for Mad Maxie Stuart, minha ruiva favorita — disse, sacudindo a cabeça brandamente—.. por que demônios não estou surpreso de verte aqui? —Olá, Lou. Só queria ver o incêndio. — Mm, mm — disse, ao ver seus dois amigos—. É que não têm o suficiente sentido comum para não deixar que lhes arraste em seus planos? Eles encolheram os ombros e não disseram nada. —Lou, eu não gosto disto —disse Max—. O dos soldados. Estão revistando a todo mundo. —Sim, já o vejo. —É só uma desculpa para colocar as mãos nas garotas —disse Storm—. Se acreditarem que vão pôr as mãos em cima de mim, estão muito enganados. Maxine observou o olhar do Lou enquanto escutava a Stormy, e soube que seu amiga tinha escolhido a tática correta. —Tampouco eu gosto da idéia de que esses me coloquem as mãos, Storm — enquanto falava, um soldado golpeou a um bombeiro que resistiu e o pôs contra a guarita. Lou o viu e piscou. —Tenho medo, Lou. Quero sair daqui — lhe pediu Max. Lou Malone apertou os lábios enquanto pensava. Finalmente, assentiu. —Não é que vós, umas crianças, sejam precisamente uma ameaça para a segurança nacional. Estes tios estão sendo muito meticulosos, parece-me. Olhem, há um buraco na cerca, justo detrás daqueles pinheiros. Vêem-no? Está ao lado da árvore mais alta. Saiam por ali. Eu não lhes vi. —Obrigado, Lou. Ele assentiu com preocupação. Impulsivamente, Max ficou nas pontas dos pés e lhe deu um beijo na bochecha. —Vão diretamente para casa, Mad Max. Não quero que se meta mais em assuntos de adultos, entendido? —Prometemos —disse ela. Depois os três saíram correndo na direção que ele lhes
tinha mostrado. Quando Jason e Storm partiram para casa, Max tirou a placa de identificação e o disco rígido do bolso da jaqueta. Não havia dito nada a seus amigos sobre os troféus que tinha encontrado; não queria que nada pudesse lhes pôr em perigo, ou lhes converter em cúmplices se o que tinha feito era um crime. Aquela noite, muito tarde, limpou a placa, parcialmente derretida, para estudá-la. Tinha a fotografia de um homem, e dizia: Frank W. Stiles. Nível de Segurança: Alfa. DIP. Ela sabia o que significava nível de segurança alfa. Tinha-o averiguado na primeira vez que tinha tentado descobrir a verdade a respeito dos óvnis e das manobras do governo. Alfa era a palavra que se usava para indicar as autorizações de segurança de alto nível que concediam a certas agências que estavam sob as proteção da CIA. Mas em todos aqueles anos de investigação, nunca tinha encontrado com nenhuma referência sobre alguma agência ou operação chamada DIP. Deus, o que seria o que tinha encontrado? Estava quase tremendo quando tirou a fuligem do CD-ROM e o colocou no computador, rogando que o calor não o tivesse destruído. E não o tinha feito. Quando acessou a seu conteúdo, a tela ficou negra e apareceram umas letras em vermelho.
DOCUMENTOS DE ALTO SEGREDO DA DIVISÃO PARANORMAIS. EXPEDIENTES DOS CASOS D 145.9-H376.51
DE
INVESTIGAÇÕES
Ao ler aquilo, ficou rígida e teve que dar-se ânimos para continuar. Pressionou o botão do mouse, e na tela apareceu uma lista de nomes.
Damián, pseudônimo Nantar. Damián, pseudônimo Gilgamesh. Daniels, Matthew. Daniella. Dante. Devón, Josephina. Evidentemente estava ordenada alfabeticamente, e a lista começava na letra d e terminava na letra H. Havia mais ou menos uns trezentos, calculou depois de ter percorrido todas as páginas do documento. Voltou ao princípio, e de repente seus olhos se fixaram em um nome que captou por completo sua atenção. Drácula, Vlad (ver a biografia completa). «Que demônios...». Fez um clique sobre o nome e apareceu um desenho. Era o retrato de um homem moderno, com o cabelo negro e comprido e os lábios estranhamente vermelhos.
O mais conhecido de toda a espécie, nasceu nos Cárpatos e foi transformado, segundo nossas investigações, pouco depois de completar os vinte anos. Apadrinhado por um soldado inimigo desconhecido, provavelmente um turco. A última vez que foi visto foi em maio de mil novecentos e noventa e dois, em Paris. «A última vez?», perguntou-se ela, piscando enquanto olhava a tela e tentava assimilar o que estava lendo. «Em noventa e dois?». Sob o retrato havia mais títulos para escolher: Assassinatos, Sócios, Guaridas, Biografia completa. «O que é isto, no nome de Deus?». Fez clique em outro dos nomes da lista, e de novo apareceu na tela outro retrato, naquela ocasião uma fotografia com a etiqueta de tomada antes da transformação. Josephina Devon. Nascida no Brooklin, Nova York, em mil novecentos e sessenta e dois. Transformada no verão de seus trigésimo aniversário, junho de mil novecentos e noventa e dois. Apadrinhada por R-532, pseudônimo Rhiannon. O vampiro foi capturado pelos investigadores da Divisão em dezembro do mesmo ano. Foi transladada ao quartel geral da DIP no White Plains, Nova Iorque. Morreu em cativeiro em mil novecentos e noventa e cinco. De novo, oferecia mais informação, mas naquela ocasião com um aplique importante: Análise e provas realizados sobre o sujeito. Resultados. Aquilo não podia ser real. Quando fez clique sobre Biografia, encontrou um documento de mais de duzentas páginas, com detalhes que fizeram que sua mente girasse ao redor da impossibilidade de todo aquilo. Quando abriu o expediente que tratava os experimentos e as provas, pensou que ia vomitar. Aquela pessoa, aquela mulher, tinha sido um rato de laboratório. Tinham experimentado com ela naquele edifício, em sua própria cidade. Mas não. Não tinha acontecido, porque não era real. Os vampiros não existiam. E muito menos existia uma agência governamental dedicada a investigar sobre eles. Entretanto, ali tinha uma prova de que sim existiam. E que demônios se supunha que ela tinha que fazer? No dia seguinte soou o timbre da porta, mas quando Max abriu, não havia ninguém. Só um envelope marrom a seus pés. Sua mãe já tinha ido ao trabalho. Maxine pegou o envelope olhando a ambos os lados da estrada no caso de vê algum veículo suspeito. Nada. Nenhuma palavra, nenhuma etiqueta, nem um selo. Entrou na casa, fechou a porta e rasgou o envelope. Continha três fotografias Polaroid. A primeira era do Jason, dormido profundamente, em sua própria cama! A segunda era da Stormy, de costas, enquanto tomava banho. A terceira era de sua mãe, saindo do carro, no estacionamento do hospital onde trabalhava como enfermeira. Enquanto estava olhando as fotografias, com o cenho franzido e o coração acelerado, soou o telefone. Desprendeu o fone e o levou a ouvido. —Você gosta das fotografias, Maxine? Aquela voz era um sussurro tão frio que fez que lhe gelasse o sangue. —Quem demônios é? —Maxine se aproximou da secretária eletrônica e pôs a
gravadora em marcha. —Essas fotos foram feitas durante as últimas doze horas, sabe? —Por quê? —agarrava com tanta força o telefone que tinha os nódulos brancos. Desejava que fosse o pescoço daquele desgraçado. Como se atrevia? Deus, tinha estado na habitação do Jason. Na ducha da Stormy. E naquele estacionamento escuro, a sós com sua mãe. —Para te demonstrar o fácil que me resulta saber tudo a respeito de ti, e o rápida e facilmente que posso chegar até as pessoas a que quer. Para dispará-los. Esta vez foi com uma câmara, mas... —Se mete-se com minha família ou meus amigos, o matarei. Entende-me? —Essa é uma boa ameaça, vindo de uma menina que acaba de sair do colégio — ele soltou uma gargalhada rouca e baixa, que degenerou em uma tosse. Max apartou o telefone e o olhou, ao dar-se conta de que aquele homem era ele. Era o indivíduo que tinha visto sair do edifício em chamas com a cara queimada. Devia havê-la visto, depois de tudo. Quando deixou de tossir, ela aproximou de novo o telefone. —Por que me chamou? O que quer de mim? —Quero que esqueça tudo o que viu ontem à noite. Que atue como se nunca tivesse estado ali. Que não o diga a ninguém. —Bem. Encantada. Se me disser o que ocorreu. —Estou-te oferecendo um bom trato, Maxine. Esquece que me viu. —Mas... —Me escute, estúpida intrometida! —ela se sobressaltou ao ouvir a reação furiosa do homem—. Se chegar a mencionar a alguém que me viu naquele incêndio, a seguinte coisa que encontrará à porta de sua casa será um cadáver. Ou uma parte. Escolherei uma das fotografias ao azar. Entende-me agora? —Sim! Sim, eu... olhe, não sei nada. Não sou nenhuma ameaça para você. E eu sou a única que o viu. Não o disse a ninguém. Eles não sabem de nada — disse, tremendo. Teve que apoiar-se na parede. —Assim está melhor. Procure que tudo siga assim. Estarei te vigiando, Maxine. E tenha por seguro que sei como fazê-lo. Vou escutar tudo o que diga e ver tudo o que você veja. Não me ponha a prova. —Não o farei. Ele desligou. Ela tragou saliva e desligou também. Esteve a ponto de cair ao chão. Sentia-se exposta e vulnerável. Estaria vigiando-a? Estaria vendo-a naquele momento? Teria posto câmaras e microfones em sua própria casa? Se aquele tipo era da CIA, seguro que sabia como fazê-lo. Disse-se a si mesma que tinha que tranqüilizar-se e pensar. Estava claro que, tinha tido tempo e forças para vigiar ao Stormy, ao Jason e a sua mãe, depois de haver-se queimado a cara e a cabeça no incêndio, poderia vigiar a ela com toda facilidade. Entretanto, não era provável que tivesse conseguido plantar câmaras em sua casa ainda. Bem. Tirou a gravação da secretária eletrônica e foi para seu quarto. Ali guardou o conteúdo do CD-ROM em seu disco rígido e colocou o CD, junto com a placa de identificação daquele tipo e a fita da secretária eletrônica em sua mochila. Não resultaria nada estranho que fosse à universidade em um dia como aquele. Ao fim e ao cabo, tinha aulas.
Não podia seguir com aquele assunto e pôr em perigo a vida de sua mãe e a de seus amigos. Não tinha nenhuma dúvida de que aquele homem cumpriria suas ameaças. Deus sabia que o governo tinha cometido atrocidades desse tipo e nunca se soube. Sobre tudo, se o conteúdo daquele CD-ROM era verdadeiro. Mas não esqueceria. E se asseguraria de fazer suficientes cópias daquelas provas e as esconderia em diferentes lugares. Porque, algum dia, seria adulta e estaria em posição de tirar de baixo dos panos. Algum dia, quando estivesse estabelecida, com o curso de direito terminado e um doutorado em seu currículo, e com influências, pediria respostas. Mas não podia fazê-lo ainda. Naquele momento, só era Mad Maxie Stuart, a estudante de universidade de vinte anos com uma grande imaginação. «É imaginação uma droga, imaginação», pensou. Se alguma vez tinha necessitado de prova de que o governo estava fazendo algo sujo em sua própria cidade, já a tinha. E se aquele desgraçado do telefone pensava que suas ameaças iam fazer que perdesse o interesse, estava enganado. Suas ameaças eram como uma prova do que tinha lido e visto. Não estava louca. Tinha razão. Sempre tinha tido razão. E saberia ser paciente.
CAPÍTULO IV
Cinco anos depois: Dante despertou para ouvir os sons das chamas e perceber o aroma da fumaça. Pensou que era um pesadelo, mas ao sentir o calor e o ardor nos olhos, soube que o fogo era real. Incorporou-se rapidamente na cama e se deu conta, sonolento, de que ainda não era noite. Ainda se sentia fraco pela frouxidão do sono do dia, e notava os membros pesados. Levantou-se, completamente nu, e sentiu na planta dos pés a suavidade do luxuoso tapete. Encaminhou-se para a porta do quarto, mas não chegou até ela. As chamas rangiam do outro lado, e a superfície da madeira estava começando a suar. Seu nariz ardia por causa da fumaça e tinha a cabeça cheia de perguntas. Aquilo não era uma coincidência. Voltou-se para a janela e abriu as cortinas, mas teve que se separar porque os raios do sol chamuscaram sua pele nua. Se saísse à rua, assaria. Se ficava na casa, também. A porta rugiu e inchou até que estalou e as chamas entraram na habitação. A fumaça entrou como um enorme fantasma negro, e ele notou que sua carne queimava. Grunhindo, pegou uma das pesadas cortinas e se envolveu nela. Depois se atirou pela janela. O impacto contra o chão fez que os ossos rangessem. Rodou, levantou-se como pôde e pôsse a correr envolto no sudário, às cegas, enquanto notava que os raios do sol queimavam sua pele através do veludo. Deu uma batida tremenda contra algo que certamente seria um carro, e depois ouviu um buzinada e uns insultos. Continuou movendo-se. Tinha que chegar ao mar. Estavam começando a formar-se ampolas na sua pele. Seguiu correndo pelo pavimento, e de repente ouviu um som e algo se cravou no
seu braço. Ficou imóvel ao sentir a incomensurável dor, tomando ar sob a cortina, apalpou o ombro e notou um dardo, como uma espiga, e o sangue quente e espesso emanando da ferida. —Acertei! —gritou alguém. Era a voz de um homem. «De um homem morto», pensou Dante, com ferocidade. Obrigou-se a seguir movendo-se, e aos poucos passos notou a água nos pie. A fria sensação era todo um alívio em sua pele ardendo. Deus, estava cozendo. Uns poucos metros mais à frente, inundou-se. O frescor acalmou sua pele, mas não a dor do braço. Deu-se conta que a água a seu redor estava cor rosa; olhou-se a ferida, e viu que estava perdendo muito sangue. Aquele maníaco tinha disparado com uma mola de suspensão. Dante levantou o braço e viu a flecha se sobressaindo por de lado. Fantástico. Agarrou a flecha com uma mão e a tirou de um puxão, apertando os dentes com força. Deus, os mortais nunca conheceriam a dor da mesma forma que os vampiros. Nunca. Soltou a flecha no oceano. Tinha que tapar a ferida de alguma forma, antes de sangrar-se. Aquela ferida só fecharia durante o sono do dia, se sobrevivesse até então. Pegou areia e a colocou em ambos os orifícios, e depois fez uma espécie de bandagem com umas algas. Sentia-se fraco pela dor, e os pulmões pediam ar. Sabia que não morreria por não respirar, mas era quase impossível obrigar-se a não inalar. Quando olhou para cima de novo, o céu estava escuro. Lenta, muito lentamente, começou a subir para a superfície, e quando emergiu, tomou ar profundamente. Sentiu que cabeça se esclarecia. Separou o cabelo da cara e seguiu a orla com o olhar. —Terá que sair, mais cedo ou mais tarde. Dante viu o homem que tinha falado. Estava movendo uma lanterna para iluminar a água, mas muito afastado do lugar onde ele se encontrava. —Se sair agora, matará aos dois —disse o outro homem. —Mas... —Fracassamos. Tem que aprender a admitir a derrota e partir, Raymond. Do contrário, não sobreviverá para tentar de novo. Depois do anoitecer, eles têm o controle. Não entende? A noite é nossa inimiga. Olhando através da escuridão, Dante viu o segundo homem que estava na orla. Tinha o lado esquerdo da cara enrugado e cheio de manchas, e a pele puxada do olho, conferia-lhe uma expressão grotesca. Mais acima tinha uma mancha rosa, e o cabelo não crescia. —Apaga a luz — disse o homem das cicatrizes a seu companheiro. O outro obedeceu. —Como é possível que resista tanto tempo sob a água? Não acreditava que pudessem respirar como se fossem peixes, ou algo assim. —Não podem. Mas demorariam muito para morrer por falta de oxigênio. Dante começou a nadar silenciosamente, ansioso por cravar suas presas na garganta e deixá-los secos. Ele tinha perdido uma boa quantidade, e poderia recuperá-la a suas custas. Aqueles dois estavam verdadeiramente cultivando toda sua ira. Entretanto, antes que pudesse alcançá-los, correram para o carro e partiram. Então, Dante nadou rapidamente para a orla, sem preocupar-se de não fazer barulho. Saiu da água, completamente nu e frio como uma pedra, e olhou para trás, para a tocha que ardia na
metade da noite. Aquele tinha sido um de seus lares favoritos. —Vou ter que matar a esses dois, sejam quem seja. —Dante? Ele reconheceu aquela voz, e esperou ali, jorrando água, até que Sarafina saiu de entre as sombras. Estava tão bela como sempre, com seus lenços de seda coloridos e seus maravilhosos cachos negros. Aproximou-se, pegou pelos ombros e o beijou nas bochechas e nos lábios. Ele sentiu seu calor e notou em seu fôlego que acabava de alimentar-se. —Está bem? —perguntou-lhe, quando finalmente o soltou. —Tenho um buraco no ombro, mas curará. Esses desgraçados queimaram a casa. —Viu-os? — Sim. Partiram. Se não, já estariam mortos. —Havia um que tinha a cara queimada? Olhando-a com toda sua atenção, Dante assentiu. —Conhecia-os? —Ao da cara queimada sim. Seguiu-me uma noite em Paris. Teria lhe destroçado a garganta, se não se desse conta de que o tinha descoberto e tivesse fugido como um coelho. Dante suspirou. —Esse homem é a peste. —Esse homem está pedindo a gritos que o matem. Dante olhou ao céu e sorriu, a pesar da dor que estava sentindo. —Você crê que terá que matar a todos os mortais. —Trinta dos nossos morreram assassinados enquanto dormiam, Dante. E houve outros incêndios como este que estiveram a ponto de acabar com a vida de outros tantos. Alguém conhece nossos segredos. Ele se estremeceu. —Vamos a algum lugar onde possa me secar — disse a Sarafina—. Falaremos ali. — Sim. Vais atrair a uma multidão, se continuar aqui nu. Ela pegou-o pelo braço e o conduziu para uma limusine negra que estava estacionada em uma curva da estrada. Os dois entraram no assento de atrás, e Dante quase sorriu ante a extravagância. O condutor não disse nada nem pareceu sentir saudades ao ver que sua chefa tinha pescado a um homem nu no oceano. Nem sequer a olhou diretamente nos olhos quando ela se dirigiu a ele. Estava muito bem instruído, pensou Dante. Possivelmente muito bem. Sarafina apertou o botão para abrir um pouco o vidro que os separava dele e lhe disse: —nos leve para casa, querido. E ponha a calefação aqui detrás. O chofer se limitou a assentir brandamente enquanto o vidro voltava a fechar-se. Depois, o carro começou a andar. Sarafina começou a secar a Dante, seus ombros, o peito e o cabelo com um xale negro. —Acredito que é essa horrível DIP — disse—. Têm que estar detrás disto. Dante a olhou significativamente, e depois sinalizou com a cabeça ao homem que conduzia. —Não seja tolo, querido. Não pode nos ouvir com o vidro fechado, e inclusive embora pudesse, não repetiria nenhuma palavra. Dante olhou ao chofer de novo. Estava muito magro e muito pálido, e tinha o olhar
vazio. Não podia ver sua garganta, mas o fato de que levasse um pulôver de pescoço alto sob a jaqueta azul marinho falava por si só. Dante voltou a olhar a Sarafina. —Supõe-se que não deveria usá-los como escravos, Fina. É de má educação. Ela encolheu seus ombros. —Ao menos não os Mato no ato, a menos que me desagradem. Deixa de trocar de tema. O que fazemos com esta organização? Ele sacudiu a cabeça lentamente, pensando em terminar com a tristeza daquele pobre mortal quando terminasse o trajeto. Mas, do que serviria? Sarafina encontraria outro a quem pudesse dirigir a seu desejo, quanto mais freqüentemente bebia um vampiro de um mortal sem matá-lo, mais viciado ficava o humano, até que não era mais que um verme servil, como o chofer, que só desejava sentir as presas de sua senhora na jugular. —O complexo da DIP foi destruído faz cinco anos, e o governo deixou de financiar a organização. Já não existe. —Então, quem se dedica a caçar vampiros? Ele encolheu seus ombros e desviou o olhar. —E ainda seria mais interessante saber quem lhes está proporcionando a informação sobre nós. Sabem onde descansamos, onde caçamos e onde vivemos. Nem sequer a DIP, com todas suas investigações, tinha tanta informação sobre nossas vidas — deixou o xale úmido no assento, entre eles, e continuou — Essa é a pessoa a que temos que encontrar, Dante. Seja quem for, temos que matá-la... lentamente, acredito. Eu gostaria de ver como se murcha um pouco, primeiro. Apertou o botão do cristal e o abriu. —Seu pulso, querido. Sua senhora tem fome. Sorrindo fracamente, o condutor lhe cedeu seu braço e ela levantou a manga da jaqueta e do pulôver. Depois afundou as presas no pulso e esteve alimentando-se dele durante um comprido momento. Dante olhou para o outro lado, mas não pôde negar que tinha começado a sentir fome. Ela levantou a cabeça e lambeu os lábios manchados. —Não quer um pouco, Dante? Está delicioso. —É cruel, Sarafina. Mata-o e termina com isto. Ela arqueou as sobrancelhas, como se aquelas palavras a tivessem feito mal, e disse ao homem: —Já chegamos, meu amor. Para o carro. Ele assentiu e freou. Depois saiu do veículo e abriu a porta da Sarafina. Estavam em uma auto-estrada. O tráfico passava a toda velocidade a seu lado. Sarafina não se levantou. Sem olhá-lo, disse-lhe: —Quero que faça algo por mim, amor. —Algo —sussurrou o homem. —Quero que se volte e caminhe para o centro da estrada. O condutor a olhou, mas não aos olhos, a não ser um pouco mais abaixo. —Sarafina... —começou a dizer Dante. —Faz agora — disse ela. Dante fechou os olhos e soltou um juramento entre dentes. O condutor virou-se e saiu para o tráfico. Quando o atropelaram, o corpo saiu rolando uns metros mais à frente. Entretanto, mais então, Sarafina já tinha posto o carro em movimento e estava afastando-se. Nem sequer olhou para trás.
—Simplesmente, não entendo por que não volta para Los Angeles, Morgan. Tem tudo o que queria. Poderia voltar triunfante, exatamente como sempre tinha querido. —Eu gosto de estar aqui — respondeu ela—. Vamos, David, tem que admitir que tenho feito maravilhas deste lugar em cinco anos. —Estou começando a me arrepender de haver lhe vendido — murmurou ele entre os dentes. Sentou-se em uma poltrona antiga e passeou o olhar por aquele enorme salão. Ela sabia que estava admirando o que via. Morgan fizera que restaurassem as molduras dos tetos, e quatro querubins os observavam de cada esquina superior. Ela se sentou em frente do David e lhe estendeu um copo de água com gás. Seu próprio copo parecia idêntico, mas junto à água também tinha servido vodca. Necessitava forças. Queria muito ao David, mas, demônios, preferiria que partisse. Já não lhe importava nada mais que voltar para os livros de Dante. Deus, só idéia de passar uma hora sem deleitar-se em suas fantasias era insuportável. Nunca havia tornado a afastar-se da casa. Não queria. E quando dormia... Oh, Deus, quando dormia era muito melhor. Porque ele era muito mais real em seus sonhos. — Eu acreditava que tudo estava decidido — continuou David—. Que irias te esconder aqui durante um tempo, para lamber suas feridas, escrever seu grande sucesso e depois de fazer fortuna, irias voltar e reclamar tudo o que tinha perdido. Se tivesse sabido tudo isto, não te teria deixado vir, em primeiro lugar. Morgan apartou o olhar. —David, não poderia escrever em outro lugar. Não da mesma maneira. Aqui encontrei mi... inspiração. Não poderia trabalhar em outro lugar, David. —Isso são tolices. Não. Não eram. Dante estava ali. Ela o sentia ali. Suas memórias lhe haviam devolvido a vida, mas também lhe tinham roubado a mente e a alma de alguma forma escura que ela não entendia. Dante era real para ela. Era muito mais que um lunático que tinha morrido fazia muito tempo e que tinha escrito todas suas fantasias de louco. Era real. Vivia... dentro dela, de algum jeito. Naquela casa. Mas não podia explicar nada daquilo ao David. Em vez disso, ficou olhando a grande arranha que tinha comprado e tinha feito pendurar no salão. Perguntou-se se seria parecida com a que havia ali quando Dante estava vivo. Não tinha sido fácil restaurar a casa. E não tinha sido barato. Mas graças ao êxito de bilheteria de seus dois primeiros filmes, tinha podido permitir-se fazer exatamente o que queria. Tinha contratado a peritos no período para que a assessorassem e para que tudo resultasse o mais exato possível. Embora muito mais luxuoso. Seu terceiro filme tinha saído fazia dois meses, e já tinha convertido a Morgan em uma mulher tão rica que estava muito além de todas suas expectativas. E ao David, também. E só restava esperar para ver o que outros sonhos seriam capazes de cumprir. Morgan olhou seu relógio. —Já não é a hora? —Quase. Vamos — David se levantou e tendeu sua mão para ajudá-la—. Deus, Morgan, tem que engordar algo. Não é atriz, sabe? Ela sorriu, tentando dissimular a debilidade que sentia, e o ligeiro enjôo que sofria sempre que se levantava de uma cadeira muito depressa. —Nunca se está muito magra nem se é muito rica —replicou—. Além disso, se tudo for bem, tenho que estar em forma para poder pôr um vestido de algum desenhista, em
poucas semanas. Claro. Como se fosse sair de sua casa, nem sequer para aquilo. Entraram em seu escritório. A lareira tinha sido substituída por uma de gás, e o primeiro que fez Morgan foi acendê-la. O chão era de taco de madeira castanho, e estava coberto de tapetes orientais. O escritório também tinha sido restaurado, e o computador era de última tecnologia. As paredes estavam cobertas de retratos de Dante que ela mesma tinha feito a lápiscarvão. Não tinha posto fotografias dos filmes; o ator que fazia o papel de Dante tinha feito um grande trabalho, mas não era ele. Ela conhecia Dante. —Isto é horripilante — disse David, estremecendo-se enquanto caminhavam através da enorme estadia e se sentava frente à televisão—. Alguma vez te cansa dele? Morgan se deteve ante um dos desenhos e ficou olhando-o. —Conheço todos os traços de sua cara — sussurrou. Depois para romper o silêncio que seguiu a suas palavras, sorriu forçadamente e disse—: É obvio, isso é impossível. É o que minha mente criou do material que havia lá mesmo... em meus roteiros. Mas parece real. Vejo-o em meus sonhos, tão claramente como se fosse real. Inclusive conheço o som de sua voz. —Escritores —balbuciou ele. Apertou um botão e se abriram as portas da réplica de um armário antigo, onde havia uma grande tela de televisão. Ligando-a e procurou o canal —Eu me fartaria dele. Real ou não. —Eu poderia me inundar nele e não me cansar absolutamente. Algumas vezes, acredito que é isso o que estou fazendo: afogar-me nele. David não respondeu, e ao olhá-lo, ela se deu conta de que a estava observando com estranheza. Morgan deixou escapar uma suave gargalhada para acalmar sua preocupação. —Já sabe que os criativos são excêntricos. Não franza o cenho dessa maneira. Vai ficar com rugas. Ele desviou o olhar com um suspiro, e seus olhos ficaram cravados na tela da televisão. Tomou o controle remoto e subiu o volume. — Aqui está! O famoso casal que falava do estrado estava lendo uma lista. Morgan pensou que aquilo seria longuíssimo Tomou um gole de sua bebida e esperou que chegassem à parte que lhe interessava. —Na categoria de melhor roteiro original, os classificados são... Pareceu-lhe que um zumbido enchia sua cabeça e os ouvidos. Já não ouvia nada do que estavam dizendo, mas de repente viu seu nome na tela, com os outros cinco. —Morgan da Silva, pelo Twilight Hunger. David ficou em pé de um salto, rindo, e a abraçou. Morgan se rendeu à escuridão que invadiu sua mente, e se desmaiou em seus braços. Quando abriu os olhos de novo, estava deitada no sofá. David estava a seu lado, lhe dando golpezinhos na mão. — Shh. Tranqüila... Suponho que isto significa para ti mais do que eu tinha imaginado. —Não é isso... —começou a dizer Morgan. Deus... Tinham-na classificado como candidata para receber o prêmio mais importante de toda a indústria cinematográfica por um trabalho que não era dela. Nunca teria acreditado que aquilo iria tão longe. Entretanto, era certo. As histórias eram muito boas para que outros não a reconhecessem. Havia algo... transcendente nelas. Algo que
comovia ao público. —Estais melhor? Ela assentiu, mas não fez gesto de incorporar-se. Aquilo era muito estranho, supunha-se que devia sentir-se... exultante naquele momento. Então, por que se sentia tão vazia? —Agora sim vais ter que vir comigo a Los Angeles — disse David, passando uma mão pelo cabelo loiro dourado, que começava a ficar branco nas têmporas—. Haverá entrevistas, festas... tem que ser vista. Ela sacudiu a cabeça, tentando controlar o pânico. —Não posso partir agora. —Mas... —O novo roteiro está em um momento muito delicado, David. Não posso deixar de trabalhar e perdê-lo. E não posso trabalhar em nenhum outro lugar, assim tenho que ficar aqui. Ele fechou os olhos lentamente, tentando assimilar o significado daquelas palavras. —Terminarei quando se celebrar a cerimônia de verdade. Irei então. Prometo-lhe isso. Ele abriu os olhos. —Mas... precisa de um vestido, e de arrumar o cabelo, e... carinho, as pessoas passam meses preparando-se para essa noite única. Deus, se isto tivesse ocorrido à garota que eu conhecia faz cinco anos, teria querido ir a Paris para comprar um traje. E provavelmente, teria comprado três antes de tomar a decisão definitiva. Ela se incorporou muito lentamente e o olhou aos olhos. —Já não sou essa garota. —Não — disse ele—. Não o é, mudaste, Morgan. E não para melhor. Converteste-te em uma ermitã. Ela tentou controlar sua ira. David tinha razão. Se ela dissesse o que queria na realidade, pediria que partisse para casa, para poder voltar para sua reclusão. Arrastar-se entre a escuridão aveludada do mundo de Dante, para poder tocar suas memórias em linhas e frases que pudessem converter-se em realidade na tela. Era quase como se estivesse tentando ressuscitá-lo. Mas não era suficiente. Nunca era suficiente. —Zangaste-te comigo — disse David. —Não, não. Só estou... aflita — respondeu, sorrindo—. Bom, vais levar-me para comer por aí para celebrar, ou não? Ele arqueou as sobrancelhas e deixou escapar um suspiro. —É obvio que sim. Quanto demorará a te arrumar? Ela tentou aparentar que estava feliz, que estava ansiosa por celebrar seu êxito. Entretanto, a verdade era que não podia esperar estar a sós com aquele homem que não existia, mas que a obcecava de noite e de dia. Dante estava de posse da sua mente, de seu coração, de sua alma. Dante, o homem que tinha escrito suas memórias em primeira pessoa, e que certamente, teria acreditado até a última palavra do que escrevia. O tinha acreditado que era um vampiro. E ela quase desejava que tivesse sido certo.
CAPÍTULO V
Dante estava fora, na escuridão da noite. Chovia, e o vento enredava seu cabelo úmido. As ondas rompiam com força nas rochas, justo debaixo da casa. Sua casa. Ou ao menos, a que tinha sido sua casa uma vez. Agora havia alguém lá dentro. Ele sentia e saboreava sua presença da mesma maneira que percebia a chuva. Era uma mulher. Quando tinha decidido voltar não estava seguro do que estado a encontraria. A última vez que a tinha visto, estava quase em ruínas. Entretanto, agora estava completamente restaurada, pintada... Alguém tinha tomado grandes moléstias em reabilitála. Aquele lugar parecia quase novo. Havia dois carros em frente à porta, no caminho de cascalho. Os duas eram de uma marca estrangeira, e caros. Naquele momento, o dinheiro vivia naquela casa. Uma mulher rica e jovem. Ele cheirou aquilo no vento, também. Havia um homem. Velho, robusto, forte, ao contrário da mulher, que levava a debilidade nela. Dante não cheirou sexo no ar, assim supôs que a relação era platônica. Tinha que admitir que sentia curiosidade. Estava ansioso por ver o que tinham feito dentro da casa. Além disso, não podia partir. Desde que tinha tido seu último encontro com o homem queimado, tinha encontrado todas suas guaridas vigiadas. Aquele homem conhecia seus segredos, inexplicavelmente. Assim Dante tinha tido que voltar ali, depois de um século, para encontrar segurança e paz, até que pudesse pensar no que faria. Era evidente que tinha estado afastado daquela casa durante muito tempo. Entretanto, não tinha importância. Rodeou a casa e encontrou o salgueiro na parte de atrás, enorme, grandioso. Deus, como passava o tempo. Ele mesmo tinha plantado aquela árvore fazia mais de cem anos. Com facilidade subiu pelo tronco e pelos ramos e baixou ao balcão do quarto principal. Naquelas janelas havia cortinas branquíssimas, finas, o suficientemente finas para poder ver através delas o que ocorria no dormitório. A mulher estava dormindo em sua cama com dossel. Tinha o cabelo da cor da canela, exuberante e comprido, estendido pelo travesseiro. Sua pele era branca, pálida, e o pescoço comprido e esbelto. Dante lambeu as presas e sentiu que despertava o desejo. Não tinha costume de provar sangue de inocentes. Ele matava, sim. Poderia viver de sanguefrio, guardado em bolsas de plástico, como faziam alguns. Mas não chamava a aquilo de viver. Assim matava, mas só aqueles indivíduos que realmente o mereciam. Em outras ocasiões, pagava para que seus desejos fossem satisfeitos. Havia mulheres discretas, especializadas em casos como aqueles. Se lhes pagava o suficiente, eram perfeitas. Entretanto, aquela mulher não era assim...Mas se sentiu miserável por ela. Desejavaa. Estava tão perto das janelas que seu fôlego, embora frio, formava bafo no vidro. Limpou-o e seguiu olhando-a, desejando que tirasse o lençol para poder vê-la por completo. Queria saber com segurança se seu corpo estava coberto por algo mais. Quase antes que aquele pensamento se completasse, a mulher levantou a mão até a parte superior do lençol e o baixou. Estava completamente nua, tal e como ele tinha
suposto. E, por um momento, tudo o que pôde fazer foi beber sua beleza. Tinha os seios pequenos, e os mamilos cor de rosa. Estava muito magra, tanto que lhe notavam as costelas sob a pele. O pêlo de entre suas pernas era da mesma cor loira avermelhada que o de sua cabeça. Passeou o olhar por seu corpo e seus olhos se fixaram em seus seios. Pensou em como seria saboreá-los, e imediatamente, os mamilos da mulher se endureceram. Dante ficou assombrado e franziu o cenho. Era possível que ela percebesse seus pensamentos, de alguma forma? Sabia que podia exercer controle mental sobre um mortal de vontade débil, mas ao menos deveria estar tentando-o... Observou sua cara, e se perguntou o que ocorreria se pensava em que suas pernas brancas se separavam para ele... Ela as separou. Dante se estremeceu de desejo e de fome, e também de medo. De repente, entendeu as sensações que estava experimentando. Aquela mulher era um deles. Era um dos escolhidos. Dante se separou da janela e voltou a descer pelo salgueiro até o chão. Durante uns momentos ficou ali, olhando a seu redor e depois por volta do mar, como se ali pudesse encontrar respostas. Se tivesse algum outro lugar no mundo para ir-se, partiria alegremente. Mas o sol sairia logo, e aquele lugar era o único refúgio que tinha. Poderia criar outros, mas isso levaria tempo. Não. No momento, não podia fazer outra coisa que ficar ali. Entretanto, evitaria por todos os meios encontrar-se com a mulher. Nunca tinha experimentado aquele tipo de conexão mental com um mortal. Nunca. Nem sequer o tinha experiente com os de sua própria espécie. Que demônios significava aquilo? Caminhou para o escarpado e olhou para baixo, uns metros mais abaixo. Havia um saliência na rocha, camuflada por matagais que ele mesmo tinha plantado fazia muito tempo. Esperava que o passadiço não tivesse caído. E esperava que a estadia escondida sob a velha casa não tivesse se converteu em pó depois de tanto tempo. Estava sonhando com Dante de novo. Ele estava de pé ao lado da cama, olhando-a. Não disse nada, nem a tocou. Ela ficou olhando-o e tentou falar, mas se deu conta de que não podia, assim seguiu olhando-o. Era estranho que conhecesse tão bem seu rosto, pensou. Era anguloso e cruel. Tinha uma mandíbula aguda e o nariz aquilino, e o olhar tão profundo que parecia que provinha diretamente de sua alma. Ele queria vê-la e ela queria agradá-lo. Levantou uma mão e apartou o lençol e a manta sem nenhum pudor, e ficou ali, completamente nua, enquanto seus olhos escuros e intensos lhe queimavam a pele. «me acaricie», pensou. «Pelo amor de Deus, me acaricie». Então piscou, e ele já tinha partido. Morgan despertou e se incorporou de repente. As mantas estavam no chão, e sentia o corpo vivo. Mas estava sozinha. Deus, aqueles sonhos estavam tomando vida própria. Possivelmente tivesse que pensar em submeter-se a algum tipo de terapia. Aquela vez, o sonho tinha sido completamente real. Levantou-se e colocou a camisola, um objeto de cetim cor marfim, e caminhou para o balcão. Abriu as portas e saiu, inalando profundamente a brisa que provinha do mar. Era deliciosa. Então ficou petrificada. Havia um homem ao lado do escarpado, sacudido pelo vento igual a ela, olhando
por volta do mar. Ela não podia lhe ver a cara, mas tinha a sensação de que havia algo familiar nele. A queda de seu cabelo. Sua postura. Algo. Sentiu como se um punho se fechasse ao redor do estômago quando as nuvens se abriram e a luz da lua lhe iluminou o rosto. «Dante...». E, como se ele tivesse ouvido, voltou-se para ela e a olhou. —Não pode ser —Morgan fechou os olhos e respirou fundo enquanto notava como seu coração golpeava loucamente o peito—. Não pode ser. Abriu os olhos de novo. Os escarpados, o mar, o céu e nada mais. Não havia ninguém mais ali.
CAPÍTULO VI
Maxine estava em seu escritório, frente ao computador, quando a porta se abriu e entrou Stormy. Levava uma bolsa marrom na mão. — Hora do descanso! —disse—. Trouxe calorias e hidratos de carbono. Max suspirou e se levantou. Aquela era sua antiga sala, que tinha sido transformada em escritório. Havia estantes cheias de pastas e arquivos, e mesas cheias de computadores. Muitos computadores. Stormy abriu a bolsa, repleta de donuts com todo tipo de cheio, e Maxine foi à cozinha a servir duas xícaras de café recém feito. —Alguma vez te perguntaste quão inútil devo ser para continuar na mesma cidade, na mesma casa, no mesmo caminho, depois de tanto tempo? -Não. Max sorriu ao ouvir o som da palavra, porque lhe chegou amortecido pelo donut. Sentou-se junto a sua amiga, estendeu sua xícara de café e tomou um dos pães-doces. —Importar-te-ia de me dar uma resposta um pouco mais elaborada, por favor? Stormy tragou e se lambeu os lábios. —Quem não estaria nesta casa? Demônios, Max, sua mãe lhe deu isso. Teria estado louca se não tivesse aceitado. E pelo resto, agora dirige dois negócios, e devo acrescentar que os dois dão benefícios. —Não muitos — balbuciou Maxine. Suspirou e molhou seu donut no café. Deu-lhe um bocado e quando tragou, soltou a seu amiga uma das duas explosões. —O desenho de páginas Web está começando a resultar muito aborrecido, Stormy. Para ser sincera, estou pensando em deixá-lo. Stormy piscou. —Deixá-lo? —Stormy deixou a xícara sobre a mesa e ficou de pé—. Por quê? Com isso é que ganhas a maior parte de seu dinheiro. —Sim, mas nunca foi o trabalho de minha vida. Refiro-me ao que eu gosto, e sou boa nisso, mas não é o trabalho de meus sonhos. Nunca foi. —Mas eu acreditava que seu outro trabalho satisfazia a bisbilhoteira que leva dentro de você Max. Não o conseguiu? —Não. O que único consegui foi acrescentar minha curiosidade.
Max tinha entrado no mundo das investigações sobre crimes em Internet quase por acaso. Um de seus clientes de páginas Web lhe tinha pedido conselhos sobre a melhor forma de enfrentar um tipo que o tinha acossado pela Internet um ano atrás. Depois, tinha ajudado a descobrir a outra meia dúzia deles, supostamente anônimos e impossíveis de localizar devido a seus apelidos na Rede. Inclusive tinha colaborado com a polícia no desmantelamento de várias redes de estelionatários, que publicava na Internet todo tipo de mentiras sobre fenômenos paranormais e caça de fantasmas, e depois se dedicavam a assustar e enganar a pessoas que pensavam que necessitavam de ajuda para defender-se de ameaças sobrenaturais e contratavam seus serviços. Tudo aquilo tinha dado a Max a oportunidade de estar em contato com seu policial favorito de vez em quando. —O que te pareceria se dissesse que estou pensando em começar outro negócio? Stormy a olhou cautelosamente. —O terceiro? —vou deixar de fazer páginas Web, assim, em realidade, só seria um segundo negócio. E, de fato, seria me dedicar mais a fundo a outro que já tinha começado. —O que pensaste? Max limpou o açúcar dos dedos nos jeans e foi para seu escritório. Abriu uma gaveta, tirou uma folha de papel e a tendeu ao Stormy. —Olhe isto e me diga o que te parece. Storm pegou e o leu em voz alta. —Maxine Stuart, Investigadora Privada com Licença... Desde quando? —Chegou-me hoje. Enviei a solicitação faz meses. —Maxie... —Olhe, sei. Parece uma loucura, mas se pensar, o estivemos fazendo até agora. Só que no ciber espaço, em vez de fazê-lo na vida real. —Mas no ciber espaço não lhes atiram — disse Storm, pondo os olhos em branco e olhando ao teto—. Quem mais sabe? Max se encolheu de ombros. —Maxine Stuart, quem mais sabe? Max baixou os olhos. —Bom... Lou sabe. —Lou. Lou Malone. Já imaginava. Provavelmente, inclusive te animou, verdade? —Bom, ele... ajudou-me com o processo de solicitação. Foi uma de minhas referências. —Já. —Olhe, sou boa nisto. E Lou já tem uns quantos casos que me encarregar. —Demônios. Não sei por que não te lança sobre ele e termina com tudo isto, Max. —É minha intenção, mas tenho que esperar o ter encurralado — Stormy abriu uns olhos como pratos e Maxine sorriu encantada—. Mas uma coisa não tem nada que ver com a outra. Se estivesse fazendo isto só para me aproximar do Lou, seria policial. Teria sido muito mais fácil. —Sim, claro. Não se supõe que esse velhote vai se aposentar dentro de muito pouco tempo? Alguém pigarreou atrás delas, e as duas se viraram e viram o velhote na porta. Max não soube quanto tempo tinha estado ali, e se tinha ouvido a conversa. —Estou interrompendo algo?
—Não... não. Entra, Lou — disse Max—. É que cheiraste os donuts? Ele não sorriu nem lhe devolveu a brincadeira como fazia normalmente. —É... algo um pouco delicado. Maxine caminhou até ele com o cenho franzido. Ele não a esperou, mas sim, virou-se e se dirigiu ao alpendre da casa. Quando ela estava ao seu lado, Lou fechou a porta atrás deles, e lhe disse: —Convido a um café. Podemos falar ali. Parece-te bem? —Parece muito grave. —Sim. Necessito sua ajuda em um assunto. É algo que te interessará Max, ou nunca te pediria isso. —Por que não? —Por que não o quê? —Por que alguma vez me teria pedido isso? Ele tomou ar e depois suspirou. —Porque é novata nisto, e tinha a intenção de te dar um algo mais simples para começar. —Tem muita fé em mim, não, Lou? —É uma criança. —Tenho vinte e cinco anos. —Como já disse... —Cale-te, Lou — disse Maxine, enquanto abria a porta do carro e se sentava no assento do co-piloto. Lou conduziu até uma cafeteria e pediu dois cafés para levar. Quando os pegaram, dirigiram-se ao estacionamento mais próximo e ele desligou o motor e se voltou para a Max. —Olhe Lou, se queria me levar a um estacionamento, possivelmente tivesse sido melhor que tivesse escolhido um lugar mais discreto. Ele se ruborizou. —Sim, claro. —Este é o lugar ao que vinha toda a gente do instituto. Sabia? Ele evitou olhá-la aos olhos. —Claro que sabia. —Mmm. Assim estiveste aqui. —Sim. Dando luz as crianças que deveriam ter mais sentido comum e ir para casa com seus pais. E agora, quer falar de algo sério ou quer brincar, Max? Ela queria brincar com ele. Naquele mesmo momento. Mas era evidente que ele se irritava quando ela paquerava com ele, embora só fora um pouco. —Está bem. Adiante — disse, apoiando-se no respaldo de seu assento e dando um sorvo no café. —De acordo. Tenho uma amiga. Uma boa amiga. Chama-se Lydia Jordão. Dirige Haven House. Max tentou controlar o ataque de ciúmes e assimilar aquela informação. —A casa do abrigo para garotas? Ele assentiu. —Mas eu acreditava que a dirigiam um par de ex-prostitutas. De novo, ele assentiu.
Ela arqueou as sobrancelhas e o olhou fixamente. —Essa amiga tua é prostituta? —Era. —E como demônios é possível que você a conheça tão bem? —perguntou, sem se importar como soava seu tom de voz. Ele sorriu. —Demônios, Maxie, se não tivesse idade para ser seu pai, diria que está ciumenta. —Você não é tão velho para ser meu pai — replicou ela. Tecnicamente, sim era, mas Maxine não estava disposta a admiti-lo. Ele suspirou e sacudiu a cabeça. —Conheci a Lydia na primeira vez que a prendi por exercer a prostituição. Eu era um novato, e ela não teria mais de dezoito anos. Devo havê-la metido no calabouço uma dúzia de vezes durante vários anos, até que da profissão. Não conhecia a Kimbra tão bem como a ela, mas sei que elas duas se tornaram amigas nas ruas e se ajudaram para começar uma vida nova. —Essa é a sócia? A outra metade do dueto dinâmico? Ele assentiu. —Conseguiram trabalhos legais, estudaram, e uma vez que estavam juntas para cuidar a uma da outra, decidiram ajudar a outras garotas como elas. Acredito que as duas passaram uma temporada no Haven House antes que começassem a dirigi-la. De toda formas, isso já não importa. — É obvio que importa. Até que ponto é amigo desta Lydia, Lou? Ele lhe lançou um olhar que Max tinha visto muito poucas vezes. Um olhar de aborrecimento, que indicava claramente que estava transpassando a linha e tinha que dar marcha ré. Ela suspirou e olhou para outro lado. —Kimbra Sykes está morta. Assassinaram-na. E Lydia chegou à conclusão, não sei de que maneira, de que há forças sobrenaturais envoltas. Maxine não parecia muito impressionada. —Tomou muitas drogas quando era jovem? —Não acredito que isto tenha nada que ver. É muito supersticiosa. Max teve vontades de perguntar por que demônios pensava que ela devia se importar do quanto supersticiosa fosse uma ex-prostituta. Tinha começado a odiar a aquela mulher instantaneamente. —E por que pensa que posso fazer algo para ajudá-la? Ele pôs uma mão sobre seu ombro. —Max, fiz algo para que te zangue comigo? —Não — respondeu ela, sem olhá-lo. — Então, por que te ficaste enrugada como uma passa no assento? —perguntou-lhe, e ao ver que não respondia, deixou escapar um suspiro—. Só pensava que... bom, você sabe muitas coisas destas. Lembra-te daquela mulher que pensava que sua casa estava encantada, e que contratou a aquele caça fantasmas pela Internet? —E resultou que o que estava encantando a casa era ele mesmo? Sim, lembro-me. —Você soube o que passava em seguida, e foi capaz de convencer à mulher, porque sabia muito daquele assunto. Explicou-lhe que um fantasma de verdade nunca se comportaria como o que ela acreditava que tinha em casa, lembra-te? Tinha-a comendo em sua mão! Ela encolheu os ombros, animada por sua adulação.
—E também conhece este outro assunto. Você, com sua mente cética, sempre tem que chegar à verdade das coisas que não lhe parecem coerentes. Sempre aprende tudo o que pode sobre o tema e depois consegue resolver o caso. Ela encolheu os ombros. —Não é que não creia nos fenômenos paranormais, mas sei que noventa e cinco por cento dos fantasmas, gnomos, videntes e médiuns são estelionatários. Acredito naquilo que sou capaz de ver com meus olhos, não no que me diz as pessoas. E, inclusive quando o vejo com meus próprios olhos, não acredito muito do que diz o governo, ou outra figura da autoridade. Se isso significar que sou cética, é que sou. —Sim. Ela encolheu os ombros. —Ainda não entendo o que é que quer que faça... por sua amiga. —Quero que a convença de que a sua melhor amiga não foi assassinada por um vampiro. Maxine levantou a cabeça muito lentamente e o olhou nos olhos para descobrir um olhar zombador. Entretanto, não lhe estava tirando sarro. —Um vampiro? — Sim. É a maior maluquice que alguma vez ouviste? Ela assentiu fracamente, mas sua mente tinha voltado para aquele edifício que se acendeu cinco anos atrás, com os soldados, a luz do fogo. Demônios. Sempre tinha sabido que voltaria a topar-se com aquilo. Sabia coisas que não deveria saber. Coisas que ninguém deveria saber. —Quando posso conhecer a tal Lydia? —Então, está disposta a fazê-lo? —perguntou-lhe Lou. Ela o olhou nos olhos e tragou saliva. —Por ti? Claro, Lou. Sabe que não posso te dizer que não. Entretanto, eu gostaria que te aproximasse de mim para pedir algo mais divertido, alguma vez. Ele riu com certa insegurança, deu-lhe um golpezinho em um ombro e separou o olhar. Depois arrancou o carro e a levou a casa.
CAPÍTULO VII
Dante despertou na escuridão de sua tumba e olhou a seu redor, observando tudo. Realmente não era uma tumba. Não exatamente, embora só faltasse um par de corpos decompondo-se para que fosse. Era uma estadia de cimento sem janelas nem ventilação. Só havia nela uma lanterna de querosene sobre uma pequena mesa e um ataúde. Embora lhe resulta-se ridículo dormir seguindo aquele clichê, tinha suas vantagens. A primeira era que desanimaria qualquer um que encontrasse o lugar a seguir investigando, a não ser que fossem uns caça-vampiros. Em segundo lugar, os ataúdes eram feitos para durar muito, e aquele se conservara a perfeição; o forro de seda e o enchimento não se danificaram pela umidade, e resultavam confortáveis. E a terceira vantagem era que sob o féretro havia um segundo túnel. Nunca tinha tido que utilizar o alçapão que se abria no fundo do ataúde, mas era bom saber que podia fazê-lo quando necessitasse.
Aquele lugar era seguro, mas só era uma última opção, nada mais. Viu-se obrigado a retirar-se ali para pensar no que faria. Tinha que averiguar quem eram aqueles caçadores de vampiros e saber de onde tiravam a informação. Tinha que detê-los. Alisando-as rugas da roupa, observou a escada em caracol que conduzia ao teto. Ali havia um alçapão que era invisível do piso de acima. Mas quando havia tentando abri-lo aguilhoado pela curiosidade de ver a mulher que ocupava sua casa, tinha encontrado uma barreira de madeira. Parecia que haviam posto novos tablados de madeira sobre o velho chão de seu escritório. Ele poderia tê-lo destroçado sem esforço, mas o último que queria era anunciar-se daquela maneira. Já era bastante inconveniente que ela o tivesse visto naquela primeira noite, justo antes do amanhecer. Tinha lhe olhado diretamente e sussurrado seu nome. Ele a tinha ouvido com claridade apesar da distância. Seus sentidos estavam aguçados por séculos de imortalidade e, pensou também, por alimentar-se de sangue. O sangue vivo era o poder para os de sua raça. Ela havia dito seu nome, e ele tinha ouvido. Aquela chamada tinha despertado um intenso desejo nele. Mas aquilo não tinha sentido; nem sequer conhecia aquela mulher. Embora, aparentemente, ela sim o conhecia ele. Perguntou-se como era possível. Não entendia. Teria visto seu nome em algum papel que tinha encontrado na casa? Não. Quando ele vivia ali usava um nome falso. E embora tivesse lido seu nome em algum lugar, aquilo não explicava por que tinha estabelecido a conexão entre ele e aquele homem ao que tinha visto de longe, em um escarpado, em plena noite. Tinha-o reconhecido, embora fosse inexplicável Ela era um dos escolhidos, aquele reduzido número de mortais que levavam o estranho antígeno Beladona no sangue. Era o mesmo antígeno que levavam os vampiros. Eram os únicos mortais que podiam ser transformados com êxito, e atraíam aos vampiros como as moscas ao mel. Muitos deles sentiam que era uma honra proteger aos escolhidos. Para Dante, aquilo era uma estupidez. Deixar-se atrair pelos mortais e preocupar-se com eles só fazia com que os vampiros se debilitassem. Dizia-se que era virtualmente impossível que os vampiros lhes fizessem mal, a menos que estivessem loucos ou enlouquecidos de paixão. Da luxúria do sangue, possivelmente. Ele sabia que tinha que averiguar tudo sobre aquilo e sobre a mulher que havia em sua casa. A pesar do fato de que já sentia a legendária atração entre sua raça e a dela, teria que controlar-se. O que precisava era informação. Provavelmente, ela não sabia nada do antígeno que a fazia diferente do resto dos mortais. Nem sequer ele sabia muito, exceto se estabelecia uma forte conexão, e que os vampiros podiam inclusive cheirá-lo. Ele mesmo estava percebendo naquele momento! Ouviu passos no chão que havia sobre sua cabeça e olhou para cima, escutando com atenção. Era ela. Sentiu-a. A mulher caminhou e se deteve justo onde devia estar à lareira. Incapaz de resistir, Dante ficou exatamente embaixo dela e levantou os braços sobre a cabeça para pôr as Palmas da mão contra o teto. Fechou os olhos e abriu a mente. Morgan se agachou no momento as admirando. Então, de repente, sentiu que lhe encolhia o estômago e que lhe acelerava o coração. Estremeceu-se. Apoiou os braços na embocadura da lareira e tentou controlar a respiração. —Que demônios foi isso? —sussurrou.
Ficou imóvel e volto-se muito lentamente. —Quem está aí? Ninguém respondeu. A casa estava vazia, em silêncio. David tinha partido pra Los Angeles umas horas antes, entretanto, Morgan notava que não estava sozinha. Disse-se que não eram mais que imaginações e se obrigou a sentar-se ante o escritório. Ligou o computador e abriu o documento. Trabalhava muito melhor de noite que de dia. Não era de estranhar, dado o tema do roteiro. A cena que escreveu a sentiu em cada célula de seu corpo. Tinha-a vivido ao lê-la nas memórias, e a reviveu ao transferi-la ao computador, exceto que naquela ocasião a narrou do ponto de vista da mulher, a vítima de Dante. A mulher tinha visto o estranho observá-la na escuridão da noite. Havia algo perigoso nele, entretanto, também exercia nela uma atração irresistível. Ele a arrastou, falou com ela, tentou-a a deleitar-se em pensamentos impuros sem que ela pudesse remediá-lo. Quando foi vê-la, naquela noite, ela estava dormindo em sua cama. Sua boca sobre ela foi o que a despertou, embora não estivesse realmente acordada. Uma voz em sua mente lhe dizia que aquilo só era um sonho ao qual era incapaz de resistir. Ela respondeu de bom grado, inclusive ansiosamente a suas carícias, a suas ordens. Aquilo não era real, e pela manhã só o recordaria como um sonho culpado, e nada mais. Enquanto escrevia aquela cena, Morgan se transformou na mulher mentalmente. Sentiu cada carícia que descrevia sua língua invadindo-a, a umidade fria de sua boca enquanto percorria sua mandíbula e seu pescoço e seguia descendendo. Ofegou quando ele fechou os lábios sobre seu seio, sem lhe tirar a camisola. Por um momento, sentiu o impulso de separá-lo dela, sentiu a vergonha e a culpabilidade... Entretanto, aquilo não era mais que um sonho. O prazer a percorreu feito ondas quando ele a chupou e lhe cravou ligeiramente o mamilo com em presa. Seguiu na cama, paralisada em seu estado de sonho, enquanto Dante lhe tirava a camisola habilidosamente e lhe acariciava todo o corpo, brincando em lugares nos quais nunca outro homem tinha tocado. Ele invadiu todos seus lugares secretos. E ela desfrutou. Queria mais. Então, ele dirigiu seus dedos para úmida suavidade entre suas pernas, e seu polegar encontrou a parte mais sensível. Pressionou-o e o acariciou enquanto seus dedos entravam e saíam dela, uma e outra vez. Ela abriu as pernas e ele seguiu enganando-a sem piedade enquanto seu corpo inteiro se retorcia em suas mãos. Ele separou os lábios e lhe beijou a garganta, e brandamente, mordeu. Suas presas se afundaram no pescoço, e o orgasmo se estendeu por ela. Morgan deixou escapar um grito e sentiu que o corpo inteiro tremia. Levou a mão ao pescoço, jurando a si mesma que sentia uma boca que estava se alimentando dela. O coração pulsava com força e estava úmida, embora ninguém a tivesse tocado. Tomou ar e ficou em pé cambaleando-se, afastando-se do computador. Deus, aquilo tinha sido real. Havia sentido as presas mordendo-a. Havia sentido sua boca, suas mãos, seus dedos... —Deus, o que ocorre? O que está me acontecendo? Olhou o relógio e se deu conta de que o tempo tinha passado rapidamente. Ao aproximar-se de novo do computador, deu-se conta de que tinha escrito doze páginas de erotismo escuro, impossível de levar para tela. Revisou-as uma e outra vez, mas finalmente as selecionou com o mouse e lhe teclou à tecla de apagar. Em seu lugar, escreveu instruções para que os atores e o diretor construíssem a cena.
Têm uma intensa relação sexual sem penetração. Ele se alimenta dela. Ela recorda como um sonho pela manhã do dia seguinte. Quando terminou, guardou as mudanças e desligou o computador. Não podia fazer outra coisa que perguntar-se o que era o que a havia possuído aquela noite. Estava úmida, e tinha a pele ardente e seios firmes e sensíveis. O pulso tinha acelerado. Subiria as escadas e tomaria um bom banho frio antes de deitar-se. Devia estar mais frustrada sexualmente do que tinha pensado. Dante se moveu quando ela se moveu, apertando as mãos no teto de seu esconderijo, tinha ficado sob o lugar onde ela se sentou, com a mente aberta. O que tinha encontrado ali tinha feito que ficasse totalmente imóvel. Ela estava imaginando a si mesma. E como se via claramente em seu sonho, ele também podia vê-la. Em sua mente, não estava tão pálida nem tão magra como ele a conhecia em realidade. Estava mais saudável. Tinha o cabelo igual, ruivo e espesso. E os olhos, que ele não tinha visto nunca, eram duas esmeraldas brilhantes. Viu-se claramente de pé ao lado de sua cama, observando-a. Espiou seu próprio rosto, e embora se movesse escondido entre a névoa de sua imaginação, quando ela se concentrou, aquela neblina desapareceu e Dante se viu com precisão. Fazia muito tempo que não se olhava em um espelho e aquilo foi exatamente como se o estivesse fazendo. Ele tinha esquecido o quanto sua cara era sombria. Quão profundos eram seus olhos. Quão grande era sua boca. Então, a mulher se estremeceu ele voltou a fixar sua atenção nela e a inundar-se em sua visão. Viu a si mesmo despi-la, e se ouviu dizer-lhe que aquilo só era um sonho e que não tinha a culpa do que estava acontecendo. Pediu-lhe que dobrasse com sua vontade e que se entregasse, e ela se deixou despir, incapaz de resistir. Ele assistiu aquela cena hipnotizado, apanhado, incapaz de apartar sua mente enquanto o fantasma de Dante tocava e acariciava todo o corpo daquela mulher. E quando se viu cravar os dentes em seu delicado pescoço, por um momento saboreou seu sangue na boca e notou a liberação daquela mulher enquanto gritava seu nome. Então, a fantasia se fez pedacinhos. A mulher ficou de pé de um salto, e ele ficou ali abaixo, sem ver nada mais, tremendo. Apoiou-se no muro de cimento e lutou para recuperar o fôlego. O que estava fazendo aquela mulher? Como era possível que conhecesse seu rosto e sua voz, e muito menos os poderes que ele possuía? Como podia saber quem e o que era ele? Sentia-se excitado e faminto. Muito faminto. Sabia muito pouco a respeito daqueles mortais escolhidos e de sua conexão com os vampiros. Entretanto, deu-se conta de que era muito mais poderoso do que tinha imaginado. Tinha que averiguar mais coisas. E tinha que alimentar-se, mas não podia fazer isso com dela. Deus, se a fantasia tinha sido tão poderosa, como seria a realidade? Poderia matá-la. Se a acariciasse, perderia o controle e tomaria tudo o que lhe oferecia. Seu corpo, seu sangue e sua vida. Desfez-se das imagens daquela mulher e caminhou para a saída de habitáculo. Depois, encaminhou-se para a cidade para alimentar-se. Morgan encheu a banheira de água fria e se inundou nela, tentando tirar da mente aquelas imagens de Dante. Embora tivesse sonhado muitas vezes com ele, acordada e dormindo, sabia que naquela ocasião tinha sido algo mais que um sonho. Havia-o sentido.
Havia sentido suas mãos na pele, sua respiração no pescoço, seus dentes lhe atravessando a carne, sua boca sugando. Tinha sido real. E tinha sido incrível. Suspirando, afundou-se mais na água, fechou os olhos e tentou pensar em outra coisa. A cerimônia dos prêmios. O vestido que ainda tinha que escolher. O tempo que teria que passar em Los Angeles. O menor tempo possível. Ali estava ocorrendo algo, e tinha que explorá-lo completamente antes de poder entendê-lo. Não ia a nenhum lugar até que o entendesse. Que demônios. Bem podia começar naquele mesmo momento. Fechou os olhos e visualizou a cena que acabava de apagar de seu computador. Encolheu os joelhos até que se sobressaíram da água, deslizou a mão entre as coxas e começou a acariciar-se, pensando que era a mão de Dante que o fazia. Estremeceu e sussurrou seu nome. —Dante... Podia viajar muito rapidamente quando a necessidade o assediava, como aquela noite. Em menos de uma hora estava no Bangor, caminhando pelas ruas, vigilante. Encontrou-a com facilidade. Ela não precisava trabalhar, não com o que generosamente lhe pagava para que estivesse disponível. E aquela noite não tinha tempo de procurar uma vítima que merecesse morrer. Aquela noite precisava sentir algo gratificante com rapidez. Ela abriu a porta e sorriu. —Fazia muito tempo. Ele assentiu, entrou e fechou a porta. —Vêm aqui. Ela se aproximou dele, pôs as mãos no seu peito e deixou cair a cabeça para trás. Dante não titubeou. Mordeu-a. Ela ofegou, ficou rígida, mas imediatamente se relaxou e se derreteu contra ele. Seu sangue se deslizou pela língua do vampiro, enchendo-o e lhe dando calor. A vida lhe percorreu as veias, e sentiu que o desejo sexual despertava, e deslizou suas mãos até os quadris da mulher para pegá-la a seu corpo. Deus, ansiava aquilo. Seu sangue entrava na boca com cada pulsar de seu pulso, mas de repente, começaram a fazer-se mais lentos. Ele se sentiu alarmado e levantou a cabeça, lambendo lábios. A cabeça da mulher loira caiu para um lado, e ele se deu conta de que estava muito pálida. Deus, a teria matado? —Belinda? Vamos, acorda — a sacudiu brandamente e lhe deu uns tapinhas na bochecha. Suas pálpebras tremeram, mas não abriu os olhos. Ele a tomou nos braços e a levou para o sofá. Depois a cobriu com uma manta. Ela despertou, sorrindo fracamente. —Demônio, faz-me bem —sussurrou. —Como te encontra? Inalando lentamente, ela foi se recuperando. —Enjoada. Muito enjoada. Isto nunca me tinha acontecido antes — suas palavras soavam ligeiramente desfiguradas, como se estivesse bêbada. Ele tinha tomado muito.
—Sinto — lhe disse—. Foi minha culpa. Eu... não voltará a ocorrer. Ela sorriu de novo. —Eu gosto, mas eu gostaria que, além disso, fizesse amor comigo. Por que não quer?
—Isso não é parte do trato — disse ele, suspirando—. Estará bem. Dorme, de acordo? Tem que descansar. —O que você diga, carinho. Você é o chefe — fechou os olhos e dormiu imediatamente. Dante ficou de pé e deixou dez mil dólares sobre a mesa. Dinheiro extra para Belinda. Antes vendia seu corpo, mas um dia, quando ele a tinha encontrado, tinha começado a lhe vender seu sangue e ganhava muito mais. Era sua prostituta pessoal. Ele tinha tomado a determinação de não aproximar-se muito dela, de não tocá-la mais do que o necessário. E só se alimentava dela algumas vezes ao ano. Tinha mais mulheres como aquela por todo o país, e na Europa. Mantinha-as em luxuosos apartamentos e lhes pagava generosamente. Elas nunca se queixavam. Tinha-as encontrado na rua, na sarjeta. E quando se tirava alguém daquela pobreza, ninguém tinha nenhuma queixa, só gratidão e lealdade. As pessoas não podiam confiar em alguém que tivesse nascido rico. Ao menos, essa era sua opinião. Aquela mulher, em sua casa no Maine, tinha nascido rica. Podia cheirá-lo. Não confiava nela. Uma vez que teve satisfeita sua fome, pensou que o mais seguro era voltar lá. Olhar com mais atenção aquela mortal que sabia tanto sobre ele. Tinha que começar a tarefa de conhecer todos seus segredos.
CAPÍTULO VIII
Aquela noite, ele foi de novo a ela. E de novo, ela soube que só era um sonho. Quando tinha deitado, depois do banho, deixou as portas do balcão abertas, quase como um desafio. Quase como se alguma parte ridícula de sua mente aceitasse a idéia de que ele poderia ser de alguma forma, real. Os personagens de ficção não criavam vida e visitavam seus criadores, disse-se. Então, por que se tinha escovado o cabelo até que lhe doesse o braço e pôs uma camisola preta e transparente? Era uma parva. Estava obcecada, apaixonada por um homem que não existia. De fato, provavelmente nunca tinha existido. Era produto da imaginação de um escritor. Entretanto, aquela noite ficou acordada durante muito tempo, pedindo em silêncio que fosse a ela. Finalmente, dormiu. E então sentiu uma suave brisa que vinha do balcão e soube que ele estava ali. Em seu sonho, abriu os olhos e o viu, observando-a, e também soube que aquele sonho não era igual a outros. Se não soubesse que era impossível, teria acreditado que era real. —Dante — sussurrou. Ele levantou as sobrancelhas como se estivesse surpreso. —A maioria das mulheres reagiriam de uma maneira muito diferente se
despertassem e encontrassem a um estranho as olhando enquanto dormem. —Você não é um estranho. Conheço-te. —Isso me pareceu — sua voz era exatamente tal e como ela tinha sabido que seria. Profunda e muito suave. Erótica—. O que quero saber é como? Ela se incorporou e apartou o lençol. Queria que a visse. E ele respondeu como ela desejava. Seu olhar se deslizou por sua pele, detendo-se ligeiramente nos seios, visíveis através do fino tecido. —Como chegaste a me conhecer? —perguntou-lhe ele de novo. Ela fechou os olhos e sentiu que seu corpo reagia sob seu olhar como se fora uma tocha. —Nem sequer eu mesma estou segura. É como se me houvesse possuído por completo — abriu os olhos e os fixou nele—. Ou simplesmente, que quero que isso ocorra. —De verdade? Ela assentiu. —É estranho. Nunca senti nada parecido a isto por nenhum outro homem. E você só é uma fantasia. Só um sonho — o olhou e continuou—. Suponho que isso é o melhor. Assim ninguém se machuca. Ele inclinou a cabeça para um lado. —Assim sou um sonho. Ela assentiu. Ele sorriu um pouco. —É isso o que quer que seja? Um sonho? Como o que tiveste esta tarde? Ela abriu muito os olhos e sentiu uma quebra de onda de desejo e de medo. Não respondeu, mas ele se aproximou da cama e atirou o lençol, deixando à vista as pernas de Morgan. —Me diga o que quero saber, e é possível que sinta prazer sentou a seu lado e fez que ela se reclinasse na cabeceira. Acariciou-lhe o seio com o dorso da mão, lhe roçando o mamilo com os nódulos—. Começando com seu nome. —Morgan. Morgan da Silva. —Isso está bem — disse ele, e lhe deu um suave beliscão. Ela ofegou de prazer. —Pergunto-me, Morgan, se seria tão permissiva se eu fosse real — lhe perguntou, lhe atirando brandamente o mamilo. —Se fosse real, me faria como você. Aquelas palavras o deixaram assombrado. Deixou de lhe acariciar o seio por um momento e a olhou diretamente aos olhos. —Por que acredita que faria isso? —Porque fomos feitos o um para o outro, Dante. Você é parte de mim, e eu sou parte de ti — ela baixou os olhos—. Fantasia, sim. Mas se fosse real, estes sentimentos também o seriam. E não poderia resistir a eles mais que eu. Por um instante, lhe pareceu que havia medo em seus olhos. Então lhe cobriu a mão que tinha sobre seu seio com a sua. —Mas não é real. Embora esta fantasia minha converteu-se em algo um pouco mais real do que nunca tinha sido — disse, e olhou a mão de Dante sobre seu seio—. Sinto-te. Ele interrompeu suas delicadas carícias. —Quero senti tudo contigo, Dante. Tudo o que imaginei. Ele separou sua mão.
—Impossível. —É obvio que é possível. Tudo é possível em um sonho. —Tenho que partir — levantou, mas antes que tivesse dado um passo para o balcão, ela se levantou também e lhe pôs uma mão sobre o ombro. Ele se voltou, a contra gosto, e ela tirou as alças da camisola dos ombros e deixou que deslizasse até o chão, ficando nua ante ele. Dantem percorreu seu corpo, inspecionando desavergonhada mente todos os lugares. Ela o pegou pela mão e o levou para cama de novo. Deitou-se e lhe pediu: —Tome, Dante — apartou o cabelo do pescoço—. Prove-Me. Quero sentir de novo o que senti antes. Quero que possua meu sangue, minha alma e meu corpo. Ela viu como tremia, mas ainda tinha sua mão presa, e puxou brandamente. Ele voltou a sentar-se na borda da cama. Morgan se incorporou e o beijou, lhe rodeando o pescoço com os braços. Devolveu-lhe o beijo, alimentou-se de sua boca, absorveu sua língua e a cravou brandamente com suas afiadas presas, fazendo brotar diminutas gotas de sangue. Ao fazêlo, deitou-a na cama e apertou seu corpo contra o dela enquanto devorava sua boca. Colocou um de seus joelhos entre as pernas de Morgan, e ela sentiu sua ereção através da barreira de seu jeans, apertando seu sexo nu e aberto. Ela alcançou o zip de suas calças, mas lhe afastou a mão com delicadeza. —Te Faria mal. —Não. Este é meu sonho. Ele se incorporou, recuperou o fôlego e sussurrou: — Fecha os olhos, Morgan, e te darei o que quer. Ela fez o que lhe tinha pedido. Ele se inclinou e lhe aproximou os lábios ao ouvido. —Se renda — lhe sussurrou—. Abre-te para mim. Deixe-me entrar em ti, dentro de sua mente. — Sim — sussurrou ela. Separou as pernas, mas ele não a tocou. Entretanto, sim o fez. De alguma forma, sem tocá-la, estava acariciando-a. Eram como os dedos de um fantasma, que não a roçavam, mas estava lhe acariciando todo o corpo de uma vez. Ela o via em sua mente, sentia-o como se fosse real, mas sabia que ele não se moveu. Estava sentado na mesma posição, olhando-a. —Assim — sussurrou ele—. Abandone-Te e me sinta, Morgan. Estou dentro de ti e ao redor de ti. Sente-me? -Sim! —Estou te possuindo, sou seu senhor. Seu corpo é meu e obedece minhas ordens. Ela assentiu, retorcendo-se na cama, ansiando mais, muito mais. —Vamos, Morgan — lhe sussurrou muito perto do ouvido. O orgasmo explodiu em seu corpo. Gritou seu nome e o abraçou, apertando-o contra ela. E então o sentiu. Notou que ele abria a boca e suas presas se cravavam no seu pescoço, e que a chupavam deliciosamente. —Sim, sim, sim... —sussurrou, enquanto o clímax se repetia uma e outra vez, intensificado pelo fato de que ele estivesse bebendo dela. Imediatamente, ela desmaiou completamente perdida nele. Dante lambeu o sangue dos lábios e separou a cabeça. Não deveria tê-la provado. Demônios, ele não queria fazê-lo os braços da Morgan se deslizaram de seus ombros à cama. Colocou-lhe a cabeça sobre o travesseiro e a cobriu. Depois se voltou e fechou os
olhos. Só tinha querido lhe dar prazer com a força de sua mente. Mas Deus, aquilo tinha tido um efeito tão potente nele como nela. E quando ela o tinha atraído a seu pescoço, ele se perdeu no seu aroma. O sangue, debaixo da pele, suas mãos atraindo-o, seu pescoço arqueando-se para sua boca. E ele tinha tomado. Tinha afundado as presas em sua carne. Só tinha sido um pouco, e o poder que aquilo tinha exercido sobre ele resultava incompreensível. O fazia tremer por dentro. O fazia desejar mais. Levantou-se da cama e deu dois passos para o balcão, antes de se obrigar a si mesmo a voltar. Não. Não podia ir-se. Ela estava dormindo, e tinha a oportunidade de averiguar mais coisas. Abriu a porta e se dirigiu ao escritório, observando, enquanto caminhava pela casa, o mobiliário e o trabalho de restauração. Aquela mulher o conhecia: tinha escolhido peças muito parecidas com as que ele tinha comprado originalmente, no período medieval. Estudar aquele tema sempre tinha sido uma afeição para ele. Quando chegou ao escritório, abriu a porta dupla. Aquele tinha sido uma vez, seu refúgio contra o mundo. Quase estava temeroso de entrar, mas o fez. Era como se tivesse penetrado no passado de novo. A lareira e os móveis tinham sido restaurados, e havia um computador em cima do escritório que parecia estar deslocado. Ali era onde ela tinha estado na noite anterior, quando tinha lido sua mente. Ali tinha fantasiado com ele, e havia sentido que tudo o que imaginava era real. Naquele momento, viu algo que apanhou por completo sua atenção. Os desenhos das paredes. Havia uma dúzia deles... e todos eram retratos dele. Ficou assombrado e se aproximou deles contra sua própria vontade para examinar cada um dos traços que formavam o contorno de seu rosto. Resultava-lhe antinatural poder, ver-se daquela maneira, quando fazia tanto tempo que não via sua própria imagem. Séculos. Era sua cara tão angulosa? Tinha os olhos tão afundados e tão sombrios? Deus, parecia que estava enfeitiçado. Como tinha chegado àquela mulher a conhecê-lo? Como? A sala lhe pareceu de repente muito pequena, e sentiu que lhe faltava ar. Seria o choque, supôs, de haver-se visto retratado com tanta precisão. Abriu todas as gavetas do escritório, mas não encontrou nada. E não sabia nada sobre computadores, assim procurar em seu conteúdo seria difícil. Mesmo assim, teria que tentar. Entretanto, primeiro precisava tomar ar. Ainda não tinha podido assimilar tudo àquilo por completo. Aproximou-se da janela e a abriu. Então aspirou profundamente a brisa da noite. Um assobio agudo rompeu o silêncio e fez pedacinhos sua recém recuperada compostura. Demônios, era um alarme. Tampou os ouvidos com as palmas das mãos e saiu pela janela aberta. Depois correu afastando-se da casa. Escondeu-se atrás de uns arbustos para decidir o que ia fazer quando ela apareceu no balcão. Morgan despertou com o alarme e tinha ido diretamente ao escritório. Como se tivesse sabido. Deus, a conexão entre eles era muito forte. Ela ficou parada, olhando para escuridão, com uma expressão completamente confusa e vulnerável. Só podia recordar seu encontro como um sonho, entretanto, parecia que sabia que alguém tinha estado na casa pela forma que olhava para a escuridão, esquadrinhando como se tivesse a esperança de vê-lo, em vez de sentir medo. Aquela mulher não conhecia o tipo de poder com o qual estava brincando. Não
tinha nem a mais mínima idéia. Ele fez um gesto de partir dali, mas então viu que se movia, e algo na expressão de sua cara captou sua atenção. Ela estava voltando, olhando no vidro da janela, e colocou uma mão no pescoço. Oh, Deus, o reflexo. Viu as pequenas feridas daquela noite, que teriam desaparecido com o primeiro toque do sol sobre sua pele. Viu as duas perfurações, e o diminuto filete de sangue em sua carne branca. Viu, e soube.
CAPÍTULO IX
—Pessoalmente — disse Lou—, acredito que Lydia esteve vendo muitos filmes. Estas tolices paranormais estão muito na moda. —De verdade? —Max lhe jogou um olhar do assento do co-piloto. Foram no velho carro do Lou. —Sim — respondeu ele—. É que não sabia? Eu imaginava que veria todos os filmes de monstros no minuto da estréia. —Eu não gosto dos que são mal feitos —replicou ela—. Já não é o que era. Não há mais que navalhadas e golpes, e nenhuma classe. Entende-me? —Sim, claro. —Além disso — continuou ela—. Eu não gosto de ir ao cinema sozinha. E não é que tenha exatamente um batalhão de homens dispostos a sair comigo. Ele sacudiu a cabeça. —Não entendo porque não. —Não? Bom, isso é muito agradável der sua parte, Lou. Mas a verdade é que não sou muito bonita. —Bom, possivelmente seja bonitinha —se arriscou—. Mas bonitinha não é o mesmo que sexy. Os homens não me vêem como alguém sexy. Ele soltou um grunhido e lhe disse: —É uma droga que não. Max voltou a cara, fingindo que olhava pelo guichê, para que ele não pudesse ver seu sorriso perverso. —Os cegos, possivelmente. Ela sorriu ainda mais, mas depois se obrigou a dissimular, arqueou as sobrancelhas como se estivesse surpreendida e se voltou para olhá-lo. —Quer dizer que você pensa que sou sexy, Lou? —Eu? —fechou a boca, franziu o cenho e então se deu conta de que lhe estava tirando o sarro—. Sabe? Não deveria te burlar de um velho. Não fica bem. —Eu não... —Olhe, já chegamos — disse, e deteve o carro para estacionar—. E agora recorda, carinho. Esta senhora é uma velha amiga minha, muito querida. Importa-me muito. Acaba
de perder sua melhor amiga e tenho que te dizer que não é a única coisa que perdeu na vida. Assim te leve bem. Estou falando de suas maneiras, Maxie. Demonstre respeito. —Eeeh. Parece que acreditas que vou entrar e cuspir no chão, ou algo assim. — Só quero que a tranqüilize. Isso é tudo. Quero que a convença de que não há nada de vampiros, e que seja eloqüente. De acordo? Ela baixou a cabeça, levantou o olhar e bateu as pestanas. —O que você diga, Lou. Lou olhou ao céu como se estivesse pedindo resignação, e saiu do carro. Tinham ido a uma cafeteria enorme que tinha vários ambientes e que estava bastante vazia no meio da amanhã. Max imaginou o motivo pelo qual Lou tinha escolhido aquele lugar. Os dois subiram as escadas que levavam a porta principal, que estava aberta, e entraram. Havia uma mulher sentada em um sofá junto a uma mesinha, que esquadrinhou rapidamente a Max e que, quando viu Lou, levantou-se e esboçou um sorriso débil, tremente. Max, provavelmente, haveria sentido certa simpatia por qualquer pessoa que tivesse sorrido como ela, mas aquela mulher era uma loira tingida e peituda que estava sorrido assim para seu policial. Max reprimiu o impulso de fazer cara feia enquanto Lou a acompanhava até ali. —Lydia — disse Lou—. Como está, carinho? — disse-lhe, e lhe deu um carinhoso abraço, que fez Max senti o sangue lhe golpeando nas têmporas. —Estou bem. Obrigado por vir, Lou — disse. Depois olhou a Maxine. —Lydia, esta é Maxine Stuart, a garota sobre a qual te falei. Maxie, Lydia Morgan. O sorriso da Lydia não vacilou, não se transformou em um forçado e tenso, como Max esperava. Certamente pensava que Max era muito jovem para representar uma ameaça para ela. Bem, pois já podia pensar melhor. —Não posso explicar quanto agradecida estou que tenha vindo, Maxine — disse Lydia, e pegou uma mão da Max entre as suas—. Lou diz que você sabe mais a respeito deste tipo de coisas que nenhuma outra pessoa. E necessito da opinião de alguém como você, alguém em quem possa confiar por completo. Max piscou um pouco surpresa. Assim Lou tinha estado adulando-a, não é? Estupendo. Estava muito bem saber isso. Jogou um olhar ao Lou, mas ele a evitou e olhou a uma cadeira. Max sentou em um extremo do sofá, Lou no outro e Lydia no meio. Fantástico. Depois apareceu uma garçonete que lhes deixou os menus sem dizer uma palavra e partiu. —Vá, que faladora — comentou Max. —Disse-lhe que necessitávamos privacidade — explicou Lydia, tragando saliva como se tivesse um nó na garganta. Olhou a Max nos olhos e continuou—: Acredito que Lou já te contou algo. Minha companheira... mi... minha melhor amiga, Kimbra Sykes... foi assassinada quando voltava para casa de noite, faz duas semanas. —Lou me mostrou suas anotações sobre o caso — disse Max, em voz baixa, no caso de alguém os estar escutando. Não quereria por nada do mundo que Lou se metesse em problemas por aquilo—. Encontraram seu corpo à manhã seguinte, em um beco. Lydia assentiu. Levava muita maquiagem, pensou Max com crueldade. As mulheres mais velhas acostumavam fazer aquilo. Era um esforço por dissimular as marcas do tempo. —Lou vai se zangar muito comigo por isso, Max, mas... —Lydia tirou um envelope de uma maleta de couro negro que tinha a seus pés e o deu—. Consegui cópias das fotografias da cena do crime e do relatório da autópsia antes que o FBI se encarregasse do caso.
— Oh, Por Deus, Lydia! Como demônios...? —disse Lou; enquanto Max começava a abrir o envelope e Lydia levantava a mão para lhe indicar que esperasse. —Eu vou à outra sala para descansar, e assim lhes darei tempo para que vejam tudo isto com mais tranqüilidade. —Oh, sinto muito, não me tinha dado conta... —desculpou-se Max, detendo-se. —Não importa. Afinal, isso é o que eu queria — levantou e foi para o outro ambiente da cafeteria. —Não sabia que tinha isto? —perguntou - Max ao Lou enquanto tirava os documentos e as fotografias do envelope. —Não, não tinha nem idéia. Os do FBI chegaram, levaram as provas e destruíram todas as cópias que havia. Max o olhou fixamente. —De verdade? —Sim. Ocorreu assim. Ocorre algo estranho, Max, mas não sei o que pode ser. Minha teoria é que deve haver um assassino em série solto, que tem este modus operandi. Mas se disser uma palavra disto, eu negarei. —Graças a Deus que o Grande Irmão mantém a opinião pública bem informada balbuciou ela. Deixou que o conteúdo do envelope se estendesse sobre a mesa e olhou as fotografias. Nelas aparecia uma mulher de uns quarenta anos, deitada no chão. Vestia calças marrons, uma camiseta verde e o cabelo recolhido em um coque. —Não despenteou nem um fio do cabelo —murmurou Max—. E olhe a roupa, Lou. Não está suja nem rasgada. E sua maquiagem, nem sequer borrou o batom. —Sei. Depois olhou as fotografias da autópsia, que incluíam primeiros planos do pescoço da mulher. Havia duas perfurações diminutas em sua pele branquíssima. Max tomou o relatório da autópsia e o leu. —A mulher morreu por perda de sangue — disse ao Lou—. Aqui diz que ficou uma quantidade de sangue ínfima, mas que não tinha nenhuma só ferida em todo o corpo. Nem um corte, nem um hematoma, nenhuma lesão interna... nada, exceto estes dois pequenos pontinhos no pescoço. E tampouco havia uma gota de sangue na cena do crime. Levantou o olhar e o cravou nos olhos do Lou. Então, mais à frente, viu que Lydia se aproximava lentamente, e colocou os papéis e as fotografias no envelope. Ninguém deveria ver sua melhor amiga daquela maneira. —Bem? —perguntou Lydia, detendo-se perto da mesa—. Qual é sua opinião? —Posso ficar com isto? —pediu-lhe Max, mostrando o envelope—. Eu gostaria de estudá-lo mais a fundo. —Sim. Tenho umas cópias. Mas... o que pensa, Maxine? Crê que estou completamente louca por pensar que pôde ser...? —Não está louca absolutamente. Ou alguém estar tentando a sério que isto parecesse o trabalho de um vampiro, ou o foi em realidade. —Maxie... —Lou a olhou como se quisesse estrangulá-la. —Sinto muito, Lou, mas tem alguma teoria melhor? — Centenas! Demônio, Max, trouxe-te para que melhorasse as coisas, não para que as piorasse. —Não lhe fale assim — disse Lydia. Seu tom de voz era suave, mas firme—. Queria que me desse sua opinião mais honesta, e o fez a pesar do fato de saber que você se
zangaria, Lou. Deixa-a — e voltou sua atenção de volta a Maxine—. O que acredita que eu deveria fazer agora? Maxie sentiu-se crescer um pouco. Aquela mulher lhe estava pedindo conselhos como se ela fosse alguém cuja opinião importava. E em realidade, era certo. Ninguém poderia ajudar a Lydia melhor que ela. Mas, demônios, aquele era um tema sobre o qual tinha tido a secreta esperança de que nunca teria que envolver-se de novo. Ao menos, não ainda. Recordou ao homem desfigurado, e o som de sua voz enquanto ameaçava às pessoas às que ela queria pelo telefone. Sentiu um calafrio e se deu conta de que Lydia estava esperando uma resposta. —O primeiro e o mais importante é que não diga a ninguém nada disto. A ninguém. Tem que fingir que acredita em todas as histórias que lhe contem a respeito da morte da Kimbra. Dê-lhes obrigado e não pergunte nada. Prometo-te que isso é vital. Lydia parecia surpresa, mas assentiu com veemência. Enquanto, Lou olhava a Max com os olhos entrecerrados como se estives louca. —Além disso, segue com sua vida normal. Não saia à rua de noite e fecha bem as portas de sua casa. Alguma companhia não seria má idéia. Só no caso de... —Sim, claro — disse Lou—. Suponho que também vais sugerir que pendure réstias de alhos e crucifixos ao redor de sua cama, verdade, Max? Jogou-lhe um olhar desdenhoso. —Não acredito que funcionem muito. Ele pôs os olhos em branco e suspirou. —Lydia, vai para casa e esqueça desta reunião. Deveria ter tido sentido comum e não ter trazido a Mad Maxie Stuart como se fora a razão personificada. Deixa que as autoridades se ocupem disto e te prometo que terá respostas no seu devido tempo. Só precisa ter paciência — depois se voltou—. Quanto a ti... —Lou, por favor — disse Lydia. Max se afundou no sofá. —Não passa nada, Lydia — disse—. Vá, siga com sua vida normal. Eu me ocuparei disto — e depois suspirou—. Possivelmente deveria ir agora. Acredito que Lou quer me gritar a sós durante um momento. Lydia há olhou um instante e depois assentiu. —Parece que pode dirigi-lo. —Sim. —Obrigado, Maxine. Obrigado. Ligarei pra você. Max tirou um cartão do bolso e o deu a Lydia. —É uma dos antigos. Ainda não fiz os novos. Lydia voltou a assentir, guardou o cartão. Depois deu um abraço no Lou e partiu. Max ficou de pé. —Vamos, Lou. —Aonde? —perguntou ele. —A minha casa. Quero que veja algumas coisas. E se ainda quiser me gritar depois de ver o que vou te mostrar, é livre para fazê-lo. Mas se não, tem que me ajudar a investigar sobre isto. —Não há nada que possa me mostrar que me convença de que fez um favor a esta mulher, Max. Nunca lhe perdoarei isso. —Sim o fará.
Ele estendeu o braço para pegar o seu envelope na mesa, mas ela foi mais rápida. —Isso é material classificado — disse Lou. —Sei — respondeu Max—. Tenho muito mais em minha casa, assim isto não estará desconectado. Ele a olhou, esperando que soltasse a bomba, mas ao ver que não o fazia, arqueou as sobrancelhas interrogativamente. —Vamos — disse ela—. Explicarei-lhe isso quando chegarmos ali. Lou tinha ficado atônito quando Max tinha colaborado com as especulações da Lydia, em vez das demolir. Max era selvagem, sim. Impetuosa, também, Irreverente e um pouco egocêntrica. Mas, demônios, ele nunca tivesse pensado que ia lhe falhar quando a necessitasse. Estava muito aborrecido, mas tinha que ter pensado que ela era uma menina. O que se podia esperar? Entretanto, cada vez estava mais preocupado. Quando tinham saído da cafeteria, comportou-se como se alguém os estivesse vigiando. Olhou acima e abaixo na estrada, debaixo do carro antes de entrar, comprovou que não havia nada estranho no assento traseiro e durante todo o trajeto esteve atenta aos espelhos retrovisores. —Que demônios ocorre? —perguntou-lhe. Ela o olhou e sacudiu a cabeça. —Para no banco. Preciso recolher uma coisa. —No caixa? —Não, na caixa forte. Aquilo fez que Lou se estremecesse. Em que demônios se colocou Max? Estacionou enquanto ela rebuscava em sua bolsa e tirava uma chave. Depois ambos entraram no banco, e ao segui-la, sentiu-se totalmente alerta por seu comportamento. Tinha-a visto comportarse cínica, cética e ridiculamente, mas nunca a havia visto paranóica. Entretanto, havia uma parte dele, muito pequena, que pensava que possivelmente pudesse ter razão. Comportouse como se ela fosse sua colega de trabalho e acabassem de entrar em uma sala cheia de assassinos. Ela se deu conta, e então ele notou que seus olhos desprendiam carrinho e agradecimento. Tinha uns olhos enormes, verdes e brilhantes. Ficavam bem com seu cabelo vermelho. Era uma mulher em tecnicolor, física e espiritualmente. Max piscou um dos olhos e esboçou um sorriso hermético enquanto o empregado do banco a guiava para o depósito de segurança. Lou apertou os dentes e se aproximou, apoiando-se na porta pela qual ela acabava de desaparecer, tentando não prestar atenção no seu pulso, ligeiramente acelerado. Deu-se conta que Maxie não tinha nem idéia do que lhe fazia quando paquerava com ele daquela maneira. Constantemente. Ela acreditava que ele era muito velho para reagir, que não representava um perigo nenhuma ameaça. Demônios, aquilo não era precisamente adulador, mas para ser sincero, Lou gostava que ela se sentisse segura com ele. Estava envergonhado pela maneira que reagiam seu corpo e sua mente, que nem sempre podia evitar. Preferia que o disparassem antes de admiti-lo ante ela. Não queria que pensasse que era outro velho imaturo. Havia dezoito anos entre eles. Tecnicamente, poderia ser seu pai. Um pai jovem, mas de toda forma... Ela voltou, e ele não viu que levasse nada nas mãos. Entretanto, sua bolsa estava mais cheia do que estava quando tinha entrado. Estava sendo muito cuidadosa.
Quando voltaram para carro e ele ligou o motor, disse-lhe: —Já pode me dizer o que ocorre, Max? —Você é a única pessoa no mundo em quem confio o suficiente para falar disto, Lou. Ninguém pode sabê-lo. Ninguém. Nem sequer disse a minha mãe, nem a Stormy... A ninguém. —Entendido —respondeu ele. —Queria lhe dizer isso faz muito tempo, mas estava preocupada que te pudesse colocar em problemas. Além disso, poderia resultar perigoso. Ele assentiu. —Vamos a sua casa, de acordo? A minha não é segura. Storm sempre está ali, e, além disso, eles sabem onde vivo. —Quem sabe onde vive? Por Deus, Maxie, está começando a me assustar. —Tem computador em casa? Com leitor de CD-ROM? Ele assentiu. Havia algo que tinha realmente assustado a Max, e ela não era tola. Lou não acreditava que pudesse exagerar tanto por algo insignificante. —É isso o que tinha no banco, Max? Um CD-ROM? — E um cartão de identificação. Ele arqueou as sobrancelhas. —Que tipo de cartão? —Parecido com a teu, mas em vez de dizer Polícia Local, tem as siglas DIP. —Nunca o tinha ouvido antes. —Estou segura de que era uma unidade secreta dependente da CIA, e que tinha seu quartel geral aqui mesmo, no White Plains, antes que se queimasse claro. Ele ficou silencioso durante uns instantes, processando tudo o que lhe tinha contado. Então o entendeu. —Refere a esses laboratórios de investigação contra o câncer que queimou faz cinco anos, mais ou menos? Ela assentiu. —Sim. Mas não estavam investigando sobre o câncer. Ele estacionou frente a sua casa e se voltou a olhá-la. — Aquela noite, você estava ali, bisbilhotando. Lembro-me de que me pediu que... —interrompeu-se ao entender tudo—. Pegou essas coisas do incêndio naquela noite, verdade, Max? Por isso necessitava que te ajudasse a sair sem que lhe revistassem. —Agora entendeste. E a coisa ainda melhora, Lou. Alguém, além de ti, viu-me bisbilhotando por ali aquela noite. —Quem? —O tipo a que pertencia o cartão de identificação, acredito. —Deus santo... —E isto é só a parte acreditável da história. Vamos. Que lhe conto o resto, me internará em um sanatório mental antes que possa escapar. Tem que ver isto por ti mesmo. Abriu a porta do carro, saiu e pegou sua bolsa. Lou saiu também. A cabeça lhe dava voltas. Não podia acreditar que Max tivesse roubado documentos secretos de uma agência governamental. As pessoas iam para o cárcere por coisas muito menos graves que aquela. Pegou pelo braço e a guiou até seu apartamento. —Não sei em que demônios te colocastes esta vez, Max —lhe disse brandamente—. Só espero que possa te tirar.
CAPÍTULO X
Morgan trabalhava incansavelmente até muito tarde pelas noites, pelas noites, teclando em seu computador, ou passeando e falando consigo mesma, enquanto Dante vigiava todos seus movimentos. Ele nunca viu que comesse. Limitava-se a beber vodca com qualquer refresco que tivesse à mão. Fosse o que fosse o que estava escrevendo, tinha-a obcecado. E ele pressentia que tinha algo que ver com ele. Não queria acreditar que também tivesse que ver com quem estava revelando seus segredos a seus inimigos. Sua visita noturna tinha piorado as coisas, pensou. Poderia não havê-lo feito se ela não tivesse visto a prova de seu beijo de posse com seus próprios olhos. Teria desaparecido no dia seguinte, e ela teria acreditado que tinha sonhado tudo. Mas era evidente que Morgan sabia que não. Ele não podia entrar naquele maldito escritório para averiguar no que estava trabalhando ela sem que o alarme disparasse e avisasse a Morgan e à polícia. Embora tivesse podido entrar, encontrar o que queria seria difícil. Tinha a observando, noite pós noite, escrevendo febrilmente. Ela tinha guardado tudo nos CD-RONS e o tinha armazenado em uma caixa forte que havia por trás de uma estante. Naquela noite a viu teclar freneticamente, como cada noite. Ele tinha tentado de novo, pondo as mãos sob o lugar onde ela se sentava, conectar com sua mente, mas não tinha conseguido. Ela tinha erguido barreiras de algum tipo. Ao menos, enquanto estava acordada. Mas, demônios, ele tinha medo de voltar a visitá-la enquanto dormia. Tinha medo de perder o controle. Quase o tinha perdido a última vez... Ela trabalhou durante a noite, e quando o deixou, apoiou-se no respaldo da cadeira como se estivesse completamente consumida. Deus, era bonita. Sua pele era de alabastro, e tinha o cabelo comprido, cor de cobre, brilhante, como se tivesse luz própria. Estava muito magra. Fazia três dias desde que tinha estado na mesma habitação que ela, acariciando-a, e estava decidido a não voltar a fazê-lo. Limitar-se-ia a observá-la de fora, e cedo ou tarde ela esqueceria de conectar o alarme ou pôr o ferrolho, ou possivelmente saísse da casa. Sua oportunidade chegaria. Mas não naquela noite. Ela se levantou, por fim, e olhou a hora. Ele sentia a proximidade do amanhecer, como todo o vampiro, assim sabia que deviam ser mais ou menos duas da madrugada. As pernas de Morgan tremiam. Dante estava começando a pensar que ela estava doente. De fato, parecia que a debilidade que ele tinha notado na primeira noite estava se incrementando no momento, como sua palidez. Inclusive embora se sentisse muito mal, Morgan recordou que tinha que pegar o CD-ROM e guardá-lo na caixa forte. Era frustrante não poder ver os números da combinação do seu lugar de observação, tão frustrante como não poder ler o que ela estava escrevendo. Mas nenhuma das duas coisas era tão desesperadora como estar tão perto dela e não poder acariciá-la de novo, e sentir que estava doente, mas não saber por quê. Morgan desligou o computador e subiu a seu quanto. Ele rodeou a casa e subiu na árvore do lado de
seu balcão para seguir observando-a pela janela. Provavelmente, Sarafina riria dele se soubesse que estava se comportando daquela forma. Atribuiria suas tolices infantis à luxúria, e não estaria totalmente enganada. Mas havia mais que desejo em tudo aquilo. Existia aquele vínculo que ele queria negar, mas que, entretanto, sentia fortemente. Tinha que saber como aquela mulher tinha chegado a conhecê-lo. Ela entrou em seu quarto e depois ao banheiro. Abriu as torneiras da banheira e se sentou na borda, como se tivesse ficado exausta só com aquele pequeno esforço. Não tinha fechado a porta do banheiro. Nunca a fechava. Por que o faria? Certamente, nunca lhe teria ocorrido que alguém poderia estar espiando-a aquela árvore. Queria ficar e ver como se banhava, mas se o fazia, era provável que rompesse o vidro e fosse para ela, apesar de sua determinação de não fazê-lo, assim saltou ao chão e desceu até a praia, para tomar um banho no mar e um passeio pela areia, raciocinando consigo mesmo e lutando contra seu próprio desejo. Quando voltou para o balcão, esperava que ela estivesse já na cama, dormindo. E estava profundamente adormecida, mas não na cama. Seguia na banheira, completamente pálida, desmaiada, com a cabeça inclinada para um lado. Ele pensou que estava morta quando abriu de um golpe as portas do balcão e correu para o banheiro. —Morgan? Ela não respondeu. Ele a tirou da banheira nos braços e a envolveu em uma toalha para levá-la à cama. Estava viva. Soube imediatamente porque sentiu vida nela. Morgan levantou a cabeça fracamente. —Dante? — Sou um sonho. Só um sonho — sussurrou ele. Ela relaxou em seus braços, enquanto ele a deixava na cama e enquanto a secava com suavidade. Colocou-a entre as mantas procurando não olhar sua pele. —Por que está tão doente Morgan? Ela sorriu brandamente. —Estou-me morrendo. Não sabia? Ele ficou rígido e a olhou aos olhos. —Morrendo? —Tenho um tipo de sangue muito estranho —lhe disse ela—. Os médicos dizem que todo aquele que o tem morre jovem, mas ninguém sabe o motivo. —O antígeno Beladona. —Exatamente — confirmou ela, e afundou a cabeça no travesseiro—. Não esperava que piorasse com tanta rapidez. —Sinto-o — sussurrou Dante—. Não sabia que era mortal. —É obvio que sabia. Você vive dentro de mim. Sabe tudo sobre mim. —Isto não. Ela sorriu lentamente. —Estou tão cansada... —seus olhos fecharam—. Espero que não seja esta noite. Espero ter algumas semanas mais. Tenho que terminar... e depois os prêmios... Então se deixou levar pelo sono, murmurando palavras que não tinham sentido para Dante. Ele tentou entrar em sua mente uma vez que ela dormiu, mas embora já não estivesse fechada para ele, Morgan estava tão exausta que não havia nada que ver. Dormia como os mortos.
Dante tentou sentir a força da vida nela para averiguar quanto tempo restava. Era muito débil. Demônios, não queria fortalecer o vínculo que já havia entre eles, mas se sentia obrigado a ajudá-la. Ela estava desvanecendo. Podia senti. E se deu conta de que não queria deixar que partisse. Arregaçou a camisa e se mordeu na munheca para atravessar a veia, embora não muito. Apertou a pequena ferida e a aproximou de Morgan nos lábios para lhe dar de beber. E ela bebeu. Separou os lábios e os fechou sobre as perfurações, quentes e úmidos. Ele sentiu o desejo como uma descarga elétrica. Morgan chupou, tragou, sugou com mais força. A respiração de Dante se acelerou, e sentiu que se excitava cada vez mais. Finalmente, com os dentes apertados por uma espécie de angústia doce, sustentoulhe a fronte com uma mão e lhe tirou a munheca dos lábios. Tomou um lenço que havia na mesinha de cabeceira, e ao fazê-lo atirou um livro no chão. Recolheu-o e leu o título: Defesa psíquica. Não achou estranho que, se Morgan tinha estado pondo em prática aquelas táticas, ele não tivesse podido entrar em sua mente. Atou o lenço no pulso. Aquilo serviria até o amanhecer. Não restava muito tempo, de fato. Observou a Morgan. Sua pele tinha uma cor mais rosada, e estava mais cálida. A manhã seguinte, estaria muito mais forte. Entretanto, ela não podia saber o motivo. Tinha que recordar tudo aquilo como se tivesse sido um sonho. Além disso, ele tinha que seguir tentando averiguar por que conhecia seus segredos. Possivelmente fosse uma médium, e por essa razão era capaz de evitar seus intentos de penetrar em sua mente. Possivelmente ela tivesse podido recolher algum rastro que ele tinha deixado na casa. De novo a olhou. Tinha marcas de sangue nos lábios. Dante se inclinou e a beijou para lhe tirar as gotas. Ela abriu os olhos. — Como é possível que esteja apaixonada por um homem que não existe? —sussurrou ela —. Sabe que é certo. Quero-te, Dante. Ele sentiu medo. —A última mulher que me disse isso esteve a ponto de me fazer pagar por isso com a vida. —Sei — disse ela, deitando-se sobre seu flanco e fechando os olhos de novo—. Laura Sullivan, a moça do Dunkinny. Dante ficou totalmente rígido. —Como sabe seu nome? —perguntou-lhe, mas ela não respondeu—. Morgan? — Dante não pôde fazer nada. Teria que despertá-la completamente se quisesse obter respostas, e então nunca poderia a convencer de que tudo era um sonho. Era muito arriscado. Em vez de despertá-la, pô-lhe as mãos na fronte e se concentrou em sua mente, procurando. E a encontrou. Bela, sã, olhando diretamente aos olhos de um homem, os seus, e sussurrando: «Nunca te trairei como fez Laura Sullivan, Dante». Depois viu uma tela detrás deles, iluminada com imagens que se moviam e que voltavam a contar a história. Viu a mulher a quem tinha amado, a única mortal em que tinha acreditado. Viu-a, e era igual a que tinha sido então. Liderava um grupo de aldeãos que levavam tochas acesas e lhes gritava: — É uma besta! Tentou beber meu sangue e admitiu ante mim o que é. Temos que o destruí! Então, os outros gritaram:
—Fogo, fogo, fogo! E lançaram suas tochas contra o castelo no qual vivia. A tela ficou em negra. Na mente da Morgan, uma vez mais, só estavam os dois. «Já estou pronta para saber o que é Dante. Quero-te». E o beijou. Dante saiu de sua mente em estado de choque. Era certo. Ela conhecia todos seus segredos. Todos.
CAPÍTULO XI
Morgan dormiu profundamente até meio-dia. Quando, finalmente, despertou, incorporou-se rapidamente e se levou uma mão à fronte, esperando a debilidade que sentia sempre que subia muito rápido as escadas, ou sempre que ficava de pé de um salto. Entretanto, não a sentiu. Encontrava-se... melhor. Estava bem. Franziu o cenho e ficou de pé, provando seu equilíbrio, e esperando de novo a debilidade. Deu-se conta de que não recordava como tinha chegado à cama a noite anterior. De fato, a última coisa da que se lembrava era o banho e... e depois o sonho. Fechou os olhos lentamente. Dante. Tinha ido a ela de novo, nos sonhos. Tentou recordar os detalhes, mas não viu nada com claridade. Só recordava sua voz profunda e aveludada, acalmando-a. Sua mão fria sobre a cara. Sua cercania e sua realidade. Oh, e seu sabor! Deus, realmente tinha sonhado aquilo? Estava enlouquecendo. Estava completamente imersa na vida de um homem que não existia. Vivia suas histórias de dia, e sonhava com ele de noite. Ela era uma escritora muito famosa e aclamada, e entretanto, não lhe importava nada. O único que lhe importava era ele. Um homem que não existia! Foi para o banheiro e ficou olhando a banheira, que ainda estava cheia de água. — Que estranho. Era mais que estranho, disse uma voz de advertência. Era algo totalmente impróprio dela deixa a banheira cheia de água. Era muito meticulosa com respeito a sua casa, porque para ela era a lápide de Dante. Seu monumento. Ela a adorava. Supôs que seria outro sintoma de seu ataque de nervos. Por que demônios teria dormido durante todo o dia? Demônios, não deveria queixar-se, porque se encontrando tão bem, poderia recuperar o tempo perdido durante a noite. Decidiu sair um momento à rua. Vestiu uns jeans, um pulôver e umas sapatilhas, e desceu correndo as escadas, com uma impaciência que não podia explicar. Ao descer o último degrau se deteve, recordando-se que logo estaria sem respiração se não o fazia. Entretanto, o coração nem sequer lhe tinha acelerado. Possivelmente estivesse melhorando. Possivelmente fora a brisa do mar, ou os suplementos de vitaminas que tomava por fim estivessem sortindo efeito... Saiu da casa e desceu pela colina verde até o escarpado, e se deteve para sentir o vento, cada vez mais fresco à medida que o sol se ia pondo no horizonte, tingindo o mar turquesa de cor púrpura e dourada. Ficou ali um bom momento observando o pôr-do-sol até que as primeiras estrelas começaram a brilhar no céu. Com um suspiro prazeroso, aspirou o ar da noite. Era delicioso. Ainda não gostaria de voltar para casa, assim desceu à
praia e seguiu pela orla até o povoado. Easton era um povoado pequeno. Era pitoresco, mas não o suficiente para converterse em um parque turístico, ao menos, não ainda. Subiu ao passeio marítimo e o percorreu, olhando as vitrines das lojas, a maioria das quais já estava fechada. Uma multidão lhe chamou a atenção, e ao enfocar a vista se deu conta de que estavam formando uma fila para pegar as entradas no pequeno cinema do povoado. Olhou a marquise e não pôde evitar sorrir. Estavam projetando seu último filme, e sob o título as luzes coloridas formavam uma mensagem que passava repetidamente: Morgan da Silva, vizinha de Easton, escolhida para concorre ao melhor roteiro original! Veja o filme esta noite! Sentiu-se contente. Inclusive parecia que era uma celebridade no povo. Era estranho que ninguém se apresentasse em sua casa e a tivesse incomodado, embora na realidade, ela era muito discreta quando saía. Seu número de telefone não aparecia na lista e tinha alarme. Quem sabe também se não podia dever-se ao fato de que as pessoas, naquele pequeno povoado, respeitavam a privacidade dos outros. Mas tinha que haver algo mais. Uma parte dela sabia, mas o resto se negava a reconhecê-lo. Era uma tolice pensar que as pessoas evitavam aproximar-se daquela casa porque ainda emanava a energia do depredador que uma vez a habitou. Decidiu ficar na fila do cinema, e quando o fez, notou uma respiração fria na nuca e se voltou rapidamente. Entretanto, não havia ninguém atrás dela. Havia uma pessoa na outra calçada. Era um homem. Não podia vê-lo bem porque estava nas sombras, e entretanto... sua postura... sua silhueta, pouco mais que uma sombra escura na noite... Não. Estava deixando que sua imaginação tomasse o poder de novo. —Senhorita? Voltou-se e se deu conta de que tinha chegado à bilheteria. —Sinto muito. Por favor, uma na última fila. Deu o dinheiro na bilheteira, Virou-se e entrou na sala. Sentou-se silenciosamente e se dispôs a ver os trailers. Morgan tinha pensado que seria a última a entrar, mas as comportas se abriram em poucos minutos e alguém mais entrou. De novo, ela sentiu aquele frio dançando pelas suas costas, e se virou para ver quem era. Ele já se encaminhava para o extremo oposto da sala, mas também tinha pedido uma entrada na última fila. Vestia um casaco muito comprido com o pescoço erguido e óculos escuros. Era uma tolice pensar em Dante ao ver aquele estranho. Dante não existia. Nunca tinha existido. Só porque ela tivesse aquelas fantasias tão vívidas, tão reais... Só porque tivesse alucinado com aquelas marcas diminutas em seu pescoço... «Estavam ali!», insistiu sua mente. «Comprovei-o no espelho do quarto, e estavam ali». Entretanto, quando tinha despertado não tinha notado nada estranho, recordou a si mesma. Como ia ser capaz de pensar que não tinham sido outro sonho? —Dante não é real — sussurrou a si mesma—. E não está sentado neste cinema, vendo este filme. E por que, então, sentiu que se afundava mais e mais no assento quando começou o filme, e os créditos disseram ao público que ela, Morgan da Silva, tinha criado aquela história?
CAPÍTULO XII
Quando Lou viu o que Max tinha naquele CD-ROM, ficou muito tempo sentado frente ao computador, inclusive depois que ela tivesse fechado o arquivo e tivesse tirado o disco do leitor. —Acreditas que se olhar à origem do Bill Gates conseguirá encontrar a forma de que tudo isto tenha sentido? Ele a olhou vagamente. —Acredite, não funcionará. Passei duas horas olhando a tela de meu computado, como você, quando li o que havia no CD-ROM. Não me ajudou em nada. —É uma loucura. É uma brincadeira. —O homem que vi na noite naquele incêndio não era uma brincadeira, Lou. Era de verdade. E foi dele que caíram o CD-ROM e o cartão de identificação no chão enquanto saía dali. Naquele lugar, o suposto laboratório de investigação, sim era um laboratório de investigação, mas sobre vampiros. Ele sacudiu a cabeça. —Ainda não te contei o que ocorreu na manhã seguinte ao incêndio. Enviaram-me um envelope. —E o que continha? —perguntou-lhe ele, com o cenho franzido. —Fotografias de meus amigos. Jason Beck dormido em sua própria cama e Stormy na ducha. E também havia uma de minha mãe no estacionamento do trabalho. Tinham-nas feito aquela mesma manhã. —Havia alguma nota? —Não. Chamou-me por telefone. —Chamou-te por telefone? Maxine assentiu. Lou havia ficado furioso. Ela sabia que aquilo ocorreria. Era o tipo mais tranqüilo do planeta até que lhe faziam mal ou ameaçavam às pessoas que lhe importavam. Então se tornava perigoso. E se importava com ela, embora fosse muito obtuso para dar-se conta. —É o mesmo tipo que te viu aquela noite? —Acredito que sim. Tem que ser ele. —O que te disse, Maxie? Sabia que tinha tomado estas coisas do chão? Ela negou com a cabeça, lentamente. —Não, mas sabia que o tinha visto ali. Deixou claro que podia chegar até meus amigos e minha mãe quando quisesse, e me disse que esquecesse que tinha estado ali e que o tinha visto, e que se contasse a alguém que o tinha visto ou que tinha estado naquele lugar a noite do incêndio, saberia e faria que o lamentasse. —Disse que faria mal a sua mãe. Ela assentiu. —Sim, e eu acreditei. Ainda acredito. E tenho a fita dessa chamada, Lou. Pode escutá-la você mesmo. Tirou a fita do envelope e a pôs na secretária eletrônica do Lou. Depois a pôs em marcha.
Lou balbuciou umas quantas maldições entre dentes e quando a fita terminou, disse: —Necessito uma cerveja. —Também me viria bem uma —Maxine foi à cozinha e levou duas cervejas ao salão. Estendeu-lhe uma e abriu a sua. Depois lhe deu um bom gole. Lou estava olhando-a com estranheza enquanto tragava. —O que? Ele encolheu os ombros. —Nunca te tinha visto beber antes. —Faz anos que é legal que beba, Lou. —Claro. Simplesmente, nunca tinha pensado em ti desta maneira. —Não me tinha dado conta — disse ela, carregando suas palavras de tanta ironia como foi possível. Ele ficou silencioso durante um comprido momento, tomando sua cerveja e estudando-a enquanto ela bebia a sua. —Deve ter ficado muito assustada, Max. Ela encolheu os ombros. —Sim, um pouco. —Deveria ter me contado isso. —E o que podia ter feito , Lou? Preencher um relatório? Esse tipo trabalha para a CIA Ele suspirou. —Inclusive se isso fosse certo... —É certo. E se lhe tivesse contado isso, ele teria se informado. Se tivesse feito um relatório, ele o teria sabido, e possivelmente você também teria recebido ameaças, ou algo pior. Ele deu um passo para trás. —Estava me protegendo. —Não só a ti. Ao Jason, a minha mãe, a Stormy... —E a mim. Ela encolheu os ombros e desviou o olhar, porque era certo. —Possivelmente seja porque não confio nos policiais. —Sei que não confia nos policiais. Mas sim confia em mim. Maxine esboçou um ligeiro sorriso. —Sim, e você confia em mim, não? Ele apertou os lábios. —Confia em mim —insistiu ela—. Assim confie em mim nisto também. Não há nenhuma pessoa sensata em toda a cidade que acredite que existem vampiros. Mas se não existirem, por que o governo tem investigações abertas sobre eles? Por que os conhece por seu nome e sobrenomes, e têm suas histórias armazenadas? Isto é real, Lou. Existem. Ele sacudiu a cabeça. —Não consigo que minha mente o assimile, Max. —Conseguirá. Demônios, a mim custou cinco anos. Por desgraça, você não tem tanto tempo. A amiga da Lydia foi morta por um deles, Lou. Não há dúvida disso. —Era mais que sua amiga. E não pode contar a Lydia nada disto, apesar disso. —Por que não? Que sentido tem mantê-lo em segredo? —Não sei, mas tem que ter sentido, ou o governo não teria tomado tantas moléstias
em ocultá-lo. Ela abriu muito os olhos e arqueou uma sobrancelha, incrédula. —Demônios, Maxine, me deixe pensar, de acordo? —Está bem —ela terminou a cerveja, recostou-se no sofá e pegou distraidamente um jornal que havia sobre a mesinha. Tirou o dominical e o folheou. No momento, algo em uma das páginas captou sua atenção. —Falando do rei de Roma. —O que? Com um sorriso irônico, mostrou ao Lou o artigo. Um filme sobre vampiros consegue a ansiada nomeação ao melhor roteiro. Ele pôs os olhos em branco e sacudiu a cabeça, enquanto ela lia o artigo a toda pressa. Falava sobre a escritora, uma mulher que vivia encerrada em sua casa na Costa Este, e também incluía uma sinopse do argumento do filme. —Não é... Lou? —Ainda estou pensando. —Sim, bom, pois pensa também nisto. Não era Dante um dos nomes que havia no CD-ROM? —Acredito que sim. Por quê? —Possivelmente deveríamos dá outra olhada a esse. e...êh...possivelmente deveríamos sair. Ir ao cinema, por exemplo.
Na tela do cinema, um jovem tirou a bandagem e o jogou no chão, junto a sua camisa ensangüentada. Já não estava débil, mas sim sua força havia voltado e lhe percorria o corpo. Olhou a sua tia Sarafina, cujos olhos negros brilhavam na noite. Sarafina não era humano. Sua pele era muito suave, imaculada. Seus lábios eram muito vermelhos, e seu cabelo tinha o mesmo brilho que seus olhos. Havia algo mais. Involuntária e instintivamente, ele inclinou a cabeça ligeiramente para trás e percebeu sua essência, inclusive sem farejar o ar. Algo exótico e acre, como uma mescla de sexo e sangue. Seu aroma. —E o teu também — disse ela com suavidade. Ele se deu conta de que lhe tinha lido o pensamento e abriu imensamente os olhos, surpreso, assombrado. Depois se voltou e pôsse a andar para o bosque. —Onde acredita que está indo, Dante? —Para casa. Ao povoado. Ao lugar ao qual pertenço. —Já não pode voltar —ela não o seguiu, ficou onde estava, e entretanto, não teve que gritar para que ele a ouvisse. Não entendia. Seguia ouvindo-a, não importava o muito que se afastou dela. —É um pária, igual a mim. — Está mentindo! Quando chegou ao povoado, Estranhou não ouvir nenhuma música. Era sua última noite naquele acampamento. Todas as coisas estavam recolhidas, e aquela noite teria que haver uma enorme fogueira com música e baile, e com histórias de aventuras do passado. Entretanto, só percebeu o silêncio. Ouviu o crepitar das chamas da fogueira e a cheirou muito antes de chegar. Quase ninguém falava. Só ouvia sussurros dispersos, e o suave som do tecido quando sua gente caminhava de um lado a outro no povoado.
Saiu do meio das árvores e se deteve observando a sua família. Sua avó estava ajoelhada ante um caldeirão, moendo ervas em um morteiro. Seus primos não corriam nem brincavam. Estavam sentados ao redor da avó com os olhos úmidos e os ombros afundados. Os homens estavam agrupados no final do acampamento com caras de ira, murmurando maldições. Dante se perguntou por que motivos teriam se enfurecido assim. Parecia que estavam planejando violência. As mulheres estavam formando redemoinhos ao redor de sua própria tenda. E, além de todas elas, Dante ouviu o pranto e os soluços de sua mãe. Ele se aproximou. —Mãe? —disse—. O que ocorreu? Todas as cabeças se voltaram imediatamente para ele Ouviu sua mãe pronunciar seu nome entre soluços, e depois a viu abrir passo entre todas as mulheres. A avó se interpôs entre eles. —Quieto! —ordenou-lhe a Dante, e manteve as mãos elevadas, com o mindinho e o índice estirados para ele, vaiando e repetindo o gesto—. Disse que fique quieto! Dante a olhou atônito. —Avó... o que te ocorre? Sou eu, Dante. O que...? Sua mãe apartou à velha e se aproximou dele. —É realmente você, meu filho? Dimitri disse que lhe mataram. Disse que lhe atiraram quando tentava roubar uma cabra. —Se tiver mentido nisto... —disse-lhe em tom ameaçador o pai do Dimitri a seu filho. —Não menti! Dispararam-no. O velho lhe atirou com um rifle. —Você nem sequer estava ali! —disse Dante, negando instintivamente a verdade. Sabia que se admitia o que tinha ocorrido, sua família acreditaria que era uma espécie de demônio. Um vampiro, como havia dito Sarafina. Mas não era certo. Não era certo! —Segui-te, Dante —disse Dimitri. Tinha os olhos cravados nele, e seu olhar era desconfiado, inclusive temeroso—. Sabia que tinha saído de aventura, e queria me unir a ti. Então vi como o homem saía da casa e ativara. Vi-te cair. —E depois se pôs a correr, não? —perguntou-lhe Dante, aferrando-se a aquela idéia com desespero—. Admite-o. Ouviu o tiro, saiu correndo e me deixou sozinho. —Saí correndo —admitiu Dimitri, envergonhado, e baixou a cabeça. —Vêem? — Dante forçou um sorriso nervoso enquanto olhava a sua mãe e a sua avó, e também aos homens, que tinham se aproximado. As mulheres tinham reunido a seus filhos e estavam afastando-os dele tanto como era possível. Todos aqueles olhos negros estavam cravados nele —. Não ficou o suficiente para ver que o disparo não me alcançou. Só me assustei e caí. Nem sequer me atingiu, e muito menos me matou. Vários deles olharam ao Dimitri para que lhes confirmasse aquela versão. O moço elevou a cabeça e olhou a Dante. —Vi o sangue. Você é meu irmão, Dante, e te quero, mas vi o sangue. Dante estremeceu, sabendo o assustado que tinha que ter estado Dimitri ao presenciar tudo aquilo. Olhou aos outros homens procurando apoio, mas só encontrou a suspeita em seus olhos. E vários deles nem sequer estavam ali. —Volte-se, Dante — disse sua avó—. Deixe que te veja as costas. —Não vais encontrar nada. —Volte-se! A gente não podia desobedecer à avó. Dante se voltou, rezando para que tivesse
podido tirar todo sangue e que não ficasse nenhum rastro. Todo mundo olhou. Ele torceu o pescoço para ver o que ocorria a suas costas e viu que sua avó o estava inspecionando minuciosamente. —Não tem nenhuma ferida—disse—. E não vejo sangue, embora haja muita sujeira para estar segura. —Por que não confiam em minha palavra? —perguntou Dante—. Dimitri se confundiu. Mãe estava chorando porque acreditava que estava morto. Não pode te alegrar agora que me vê com vida? Ela o olhou com a esperança lhe brilhando nos olhos. Tremendo, elevou a mão para lhe acariciar a cara, e Dante fechou os olhos esperando seu roce quente. Entretanto, a suas costas apareceram vários homens que saíam do bosque. Quando o viram, ficaram boquiabertos como se fosse um fantasma. Dante olhou a sua mãe. —Enviamo-los para que trouxesse seu corpo para casa, filho —lhe explicou. —Nos digam—lhes ordenou a avó—. O que encontrastes na granja? O mais velho do grupo, Alexi, mostrou algo que levava nas mãos. Desenroscou um tecido, e Dante se deu conta imediatamente do que era. Sua camisa ensangüentada e a bandagem. Não pôde fazer nada para evitar que Alexi o mostrasse a todos. —O granjeiro estava morto — disse Alexi, em voz baixa—. Tinha dois buracos aqui —e destacou o pescoço com dois dedos. Dante recordou que tinha visto a Sarafina lançar-se ao pescoço do homem. —Nosferatu! —gritou a avó. Agarrou à mãe de Dante e puxou-a para afastá-la. Depois começou a gesticular de novo para afugentar a Dante—. Deixe-Nos em paz, demônio! Vai-te, segue seu caminho! Como se fossem um, todos os membros do acampamento se afastaram dele, caminhando para a fogueira. Ele sacudiu a cabeça e levantou uma mão para eles, lhes rogando. —Por favor! Eu não sou um demônio! Sou exatamente igual à antes. Sou Dante — entre toda a multidão, encontrou os olhos de sua mãe—. Sou seu filho! —Meu filho está morto—as palavras foram baixas, profundas, cheias de dor. —Não! —Foi Sarafina, verdade, filho? —perguntou-lhe a avó—. Chegou a seu lado quando estava agonizando. Passou-te a maldição, verdade? —Não! A avó cuspiu no chão. —Já o veremos, jovem demônio. O sol está a ponto de sair. A alma de nosso Dante descansará em paz quando seu corpo se queimar. A mãe de lhe Dêem se voltou para o este e olhou o céu, cada vez mais pálida. Depois correu para ele e lhe pôs as mãos no peito. —Vai-te, Dante! Vai-te correndo. Não poderia suportar te perder duas vezes. —Mãe? Eu... —Vai-te! Tem que te cobrir! —Não lhe faça favores, filha—murmurou a avó. Então, Dante sentiu algo que nunca tinha experimentado. Um calor insuportável que lhe abrasava a pele à medida que os primeiros raios de sol atravessavam o céu, disparados como flechas do horizonte, atravessando-o ali mesmo.
—Ah! —agachou-se e apertou os dentes. De seu corpo começaram a sair pequenas espirais de fumaça. —Corre! Corre ao bosque, Dante! Tem que procurar um refúgio! —gritou-lhe sua mãe. O calor era insuportável. Dante virou-se e correu. As árvores lhe deram alívio, mas só durante uns segundos, enquanto corria para vegetação espessa com o coração acelerado e a mente em um torvelinho, meteu-se sob um montão de folhas caídas, cobrindo-se por completo. Ali ficou imóvel, esperando que a dor se fosse. Tinha que pensar. Tinha que entender o que lhe estava acontecendo. Entretanto, sentiu a cabeça pesada, e seus olhos, cheios de lágrimas, começaram a fechar-se ele lutou por manter-se acordado. Deus, como era possível que dormisse quando todo seu mundo acabava de derrubar-se? Mas não podia resistir o sono. De fato, não era sono. Era, pensou aterrorizado, era como morrer... Morgan se levantou e saiu correndo do cinema. Dante, que tinha estado vendo os eventos de sua própria vida recriados em uma tela, completamente atônito e cada vez mais furioso, viu-a partir e se levantou lentamente para segui-la. Ela tinha feito aquilo. De alguma forma, tinha conhecido seus segredos e os tinha contado ao mundo inteiro. Ia pagar por isso. Aquela noite. Lou tinha lido o arquivo completo do DIP sobre o suposto vampiro, Dante, antes de ver o filme que Mad Maxie tinha tanta vontade de ver, estreou fazia dois meses, mas naquele momento, com a nomeação para o prêmio de melhor roteiro, quase não havia nenhuma poltrona livre. Maxie tinha arrumado para conseguir duas entradas em um cinema próximo a casa do Lou enquanto ele ficava em casa lendo, e ela havia retornado para lhe dizer que ainda restavam duas horas até que começasse o filme. Durante esse tempo, tinham estado repassando juntos o arquivo, assim quando viram o filme, sabiam que era a mesma história. Não tão seca como na versão oficial, em realidade. Muito mais fascinante. Entretanto, no principal ambas as versões coincidiam. Um moço cigano que recebia um tiro mortal e que era transformado em vampiro por uma tia exótica que nunca envelhecia. A única diferença era que o filme transmitia compreensão pelo vampiro. Aparecia como um ser ferido e solitário, maldito e açoitado. O arquivo o retratava como um animal vicioso que tinha que ser exterminado. Lou sabia que nunca poderia convencer a Max de que ambas as versões eram idiotices. —Agora te dá conta do que estou falando, Lou? Ele caminhava a seu lado enquanto saíam da sala. —Do único que me dou conta é de que sua informação secreta não é tão secreta, ao fim e ao cabo. —Se isso fosse certo, seria do domino público. Algum repórter de investigação teria dado com este relatório. Lou, isto é real. Temos os mesmos fatos contados por duas fontes diferentes. A escritora do roteiro sabe muito mais que nós a respeito de tudo isto. Temos que falar com ela. Quando entraram no carro, Lou se voltou para ela. —Não quero falar mais contigo sobre isto. Amanhã pela manhã, vou pedir uns
quantos favores que me devem. —Não. —Tenho um amigo que trabalha para a CIA Não é um peixe gordo, mas de todas as formas saberá a quem pode perguntar sobre isto... Sobre este lixo do DIP. —Lou, não. —Sou policial, Max. Não vou engolir este conto. Não posso fazê-lo, sem provas. Então tomou sua cara entre as mãos e se aproximou muito a ele. Tanto, que Lou sentiu sua respiração. Cheirava a pipocas quentes, e era igualmente tentadora. —Não diga a ninguém, Lou, por favor. É muito perigoso. Ele se fixou naqueles aqueles enormes olhos verdes que refletiam medo. E não tinha visto a Mad Maxie Stuart assustada muito freqüentemente. Quando aquilo ocorria, significava algo. Demônios, oxalá não se aproximasse tanto dele. Suspirando, levantou uma mão e lhe revolveu o cabelo carinhosamente, afastando sua cara dele no processo. —Está bem. De acordo. Não direi nada. —E temos que procurar à escritora. Morgan da Silva. E falar com ela. Ele suspirou, pôs em marcha o motor e conduziu até casa da Maxie. —Pensarei — disse quando se despediram. —Farei contigo ou sem ti, Lou. —Escuta Maxie. Tem que ter paciência me dê alguns dias para revisar tudo isto - e brandiu o dedo indicador ante seu nariz, como se fosse seu pai—. E nenhuma palavra a Lydia enquanto isso, entendido? —Nenhuma palavra a Lydia sobre o que, Lou? —perguntou uma voz. Ele virou a cabeça e viu Lydia em pessoa, ao lado do carro. Parecia que tinha estado esperando que Maxie chegasse a casa. —Vêm comigo, Lydia — disse Maxie enquanto saía do carro e se encaminhava para sua casa—. Explicarei-lhe isso tudo. Vemo-nos logo, Lou. —Mas... —Até mais tarde, Lou — lhe disse Lydia. Lou sacudiu a cabeça, perguntando-se como era possível que tivesse perdido tão rápido o controle da situação. —Escuta Lydia, diga o que disser, não são nada mais que conjeturas. Lydia pôs-se a andar detrás de Maxie sem lhe emprestar atenção. — Não façam nada sem me chamar primeiro! Entendido? Maxie olhou para trás por cima de seu ombro enquanto abria a porta. —É obvio que não. Não seria divertido sem ti. As duas entraram na casa e a porta se fechou. Lou não foi para casa. Voltou para a delegacia de polícia, porque ali era onde guardava todos os telefones dos contatos que tinha. Chamou a seu amigo e lhe pediu que averiguasse o que pudesse sobre uma suposta agência secreta da CIA, chamada DIP. Então voltou para casa da Maxie e estacionou perto para vigiar o lugar durante toda a noite.
CAPÍTULO XIII
Morgan sentiu que uma mão posava no seu ombro com suavidade enquanto estava sentada na praia, chorando. —Por que chora? Era a voz de uma mulher, profunda e rica, com um ligeiro acento. Morgan levantou a cabeça e secou as lágrimas das bochechas. Quase não via a mulher. Era uma visão imprecisa de alguém alto e esbelto. Tinha o cabelo negro e levava um casaco de cor vermelha escura. —Oh, Deus, deve você pensar que sou idiota. —Não. Também me afetou muito o filme. Não tanto como a ti, entretanto — disse, e se sentou na areia, junto ao Morgan. —Estava você no cinema? —Mmm. Vi-te sair correndo, chorando, e me preocupei. Finalmente, a Morgan lhe esclareceram olhos e pôde ver a mulher. O casaco lhe chegava quase até os pés, e levava umas botas de couro negro e luvas da mesma cor. Tinha o cabelo espesso e encaracolado, e estava muito maquiada, muito, para o gosto da Morgan. Estava olhando ao mar. —Por que saíste correndo do cinema, dessa maneira? Morgan baixou a cabeça e a sacudiu lentamente. Parecia que a mulher não sabia quem era ela, e preferia que as coisas continuassem assim. —A história me parece muito real. Vi-a uma dúzia de vezes — e mais, em sua mente —. E cada vez, reajo da mesma forma cada vez que sua família o rechaça dessa forma. Enviam-no sozinho a um mundo de escuridão. Suponho que me afeta em algum sentido. —Mmm. A mim também. Minha família me tratou da mesma forma — virou-se e olhou a Morgan nos olhos—. Suponho que a ti também, verdade? —Sim —respondeu ela, sem querer. Como se a mulher lhe tivesse tirado as palavras. Tinha uns olhos assombrosos, negros, brilhantes. Fazia tempo que tinha anoitecido, e as ondas rompiam com suavidade na orla, sob o céu cheio de estrelas. —Conta-me - disse a mulher, com a voz baixa e suave. Persuasiva. —Eu... nunca tive uma relação profunda com meus pais. Só depois de que morreram soube que era adotada. —Ahh —disse a mulher, deixando escapar um suspiro—. Pobrezinha. E você se perguntou pela sua família real. Por seu sangue —enquanto falava, apartou- o cabelo do ombro ao Morgan, e seguiu com seu olhar a linha do queixo até o pescoço. Morgan sentiu que a pele ardia. — Sim — respondeu—. Pergunto-me como eram. —Possivelmente é por sua história pelo que sente tanta empatia com Dante, o vampiro do filme. —Ou possivelmente seja porque vivo em sua casa. A mulher abriu muito os olhos. Sua voz já não soou suave, a não ser um pouco crispada. —O que quer dizer com isso, criatura? No que estava pensando? Deus, um desdize como aquele poderia terminar com toda sua carreira. Nunca admitiria que o protagonista de seus filmes fosse à criação de outra pessoa, e muito menos que ela vivia em uma casa que tinha sido de Dante. Se o fazia, todo o resto se saberia também, saberiam que tinha plagiado suas divagações e sua loucura para
criar seu trabalho. Tentou sorrir, e sacudiu a cabeça. —Refiro-me a que a casa de um dos filmes se parece muito com minha, isso é tudo. —Oh. Morgan teve a sensação de que a mulher não tinha acreditado, ficou de pé e sacudiu a areia das calças, voltando-se para a mulher enquanto o fazia. —Deveria ir, está ficando tarde... Não havia ninguém. Morgan piscou e olhou em todas as direções, inclusive para a água, mas não viu ninguém. Deus, teria imaginado também a aquela mulher morena? Colocou uma mão na fronte e fechou os olhos. —Possivelmente seja preciso sair daqui durante uma temporada. Só uma temporada. Mas, inclusive enquanto o dizia a si mesmo, sabia que aquilo não era possível. Não podia partir. Não era só uma questão de querer fazê-lo. No momento em que pronunciou aquelas palavras, sentiu-se doente, presa do pânico. Não podia... deixá-lo. —Que demônios acreditas que estava fazendo com essa garota, Sarafina? — perguntou-lhe Dante, e seu tom era duro. Muito duro, possivelmente, porque fez que Sarafina arqueasse as sobrancelhas interrogativamente. —Então, conhece-a. Mmm. O que é para ti? —Nada — soltou a resposta sem olhá-la, para que não se desse conta—. O que está fazendo aqui? Não podia acreditar quando senti sua presença no cinema. Sarafina encolheu os ombros inocentemente, embora ele soubesse muito bem que não havia nenhuma pingo de inocência nela. —Vim a verte. Não pude evitar sentir que estava na sala quando passava por ali, assim entrei. Imagine minha surpresa quando vi nossa história na tela. Ele fechou os olhos, incapaz de responder aquilo. Ficou em estado de shock quando tinha visto sua vida no cinema. Parecia-lhe que era outra traição, especialmente, ao ter averiguado a verdade. Era Morgan. Ela tinha escrito o roteiro. Uma vez mais, uma mulher que dizia que o queria o tinha traído contando seus segredos a seus inimigos. A todos. Ao mundo inteiro. —Parece que também tinha um efeito inquietante na moça, quem quer que fosse. Notei pela forma em que saiu correndo do cinema — Sarafina cravou seus olhos nele—. Perguntarei-lhe isso de novo. O que é ela para ti, Dante? —É uma mortal inocente, e nada mais — não lhe disse que tinha estado muito perto, escutando cada palavra da conversação que tinha tido com a Morgan. Tinha acreditado que teria que intervir. —Oh, é muito mais que uma mortal comum. Muito, muito mais — disse ela, e o pegou pela mão. Passearam pela praia, a dois quilômetros do lugar no qual Sarafina tinha estado falando com a garota—. Mas já chegaremos a isso, porque me interrompeste quando estava tendo uma conversação tão esclarecedora com a moça? —Para evitar que saltasse a seu jugular, querida tia. É daqui, e sentiriam falta dela. Para falar a verdade, ele tinha estado seguindo a Morgan com a mesma idéia, destruí-la. Mas quando tinha visto Sarafina, sedenta de sangue, a seu lado, havia sentido uma punhalada de medo e o instinto irresistível de protegê-la. Tinha gritado a Sarafina com a mente, e ela tinha respondido indo a seu lado com tanta rapidez que o olho humano não
teria podido detectá-lo. —Isto demonstra o quanto mal te ensinei — disse ela—, e o isolado que estiveste durante todos estes anos. Não poderia lhe haver feito mal embora tivesse querido. Ela é uma escolhida. Ele assentiu. —Isso já deduzi por mim mesmo. Mas tenho que admitir que sei muito pouco sobre isso, além do fato de que compartilham o mesmo antígeno que nós, e de que podem converter-se no que somos. Suspirando, Sarafina assentiu. —Eu sabia que estava no cinema antes que tivesse passado um segundo — disse. Deteve-se quando chegaram a uma grande rocha, e se sentou em cima como se fosse uma rainha sentando-se em seu trono. Dante ficou a seu lado, olhando-a, enquanto ela olhava o mar—. Nós sentimos sua presença. Isso já sabe. E não podemos lhes fazer dano. —Não podemos? —ele refletiu sobre aquilo durante uns instantes—. Acreditava que não nos sentíamos inclinados a fazê-lo. O que ocorreria, por exemplo, se o tentássemos? Ela o olhou rapidamente. —Tem alguma razão para querer machucar a essa garota? —Quase não a conheço —respondeu ele, desviando o olhar. Sarafina encolheu os ombros de novo. —Se o tentássemos... bom, não estou segura do que ocorreria. A verdade é que nos sentimos obrigados a protegê-los, quando nos cruzamos com eles. Aquilo explicou seu impulso de interpor-se entre o Morgan e sua tia. —E vivem muito pouco tempo, sabe? Ele ficou surpreso. Morgan havia dito, mas ele não tinha acreditado. —Não, não sabia—mentiu ele. Não queria dizer a sua tia o muito que ele e Morgan se comunicaram. —Mmm. Não vivem mais de trinta anos mortais, na grande maioria dos casos. Parece que ela está se deteriorando muito. —E o que se pode fazer? —perguntou-lhe, olhando na sua cara. —Nada. Transformá-la, ou deixá-la morrer. É uma escolha muito fácil, na realidade. Dizem que para cada vampiro existe um escolhido com o qual o vínculo psicológico é mais forte. Eu sempre pensei que isso é uma estupidez. É romantismo, e nada mais. —Oh, de verdade? Está me dizendo que seu vínculo comigo não era assim? —Meu vínculo contigo não era nada disso, Dante. Você é de minha família. É meu sobrinho. O único de meu clã que tinha conexão comigo. Eu te queria por essa razão — disse ela, olhando ao mar de novo. O vento lhe apartou os cachos dos ombros—. Não. Dizse que este outro vínculo é muito mais forte, e que os vampiros podem inclusive comunicar-se mentalmente com seus escolhidos. Também se cria um extremo apetite sexual entre os dois, e se intensifica quando compartilham o sangue. Ela olhou a Dante e ele apartou o olhar. —Está vivendo em sua casa, Dante? Ele controlou sua expressão e dissimulou seus pensamentos. —Sim. —Então, onde está vivendo você? Ele não queria que Sarafina visse o interior da casa de Morgan, daria conta de que era ela a que estava escrevendo os roteiros dos filmes. Embora aquele segredo não pudesse ser mantido durante muito tempo, se Sarafina ficasse no povoado. Entretanto, quanto mais tempo se mantivesse, melhor. Dante pensou que se
alguém era capaz de passar por cima do instinto de proteger aos escolhidos, essa era Sarafina. E o faria, se averiguava a verdade. Mataria a garota, sem se importar com conseqüências. —Em uma cova. Nada que te resultasse agradável. Ela arqueou uma sobrancelha. — Aluga-se uma casa muito perto daqui. Quer que a consiga? Ele assentiu ligeiramente, pensando em quanto desejava ver a Morgan aquela noite, perguntando-se como demônios ia se liberar de sua tia. —Essa será nossa missão esta noite —disse ela—. Amanhã de noite veremos o filme de novo, inteiro. E temos que averiguar quem está contando a história aos produtores, e como conseguiu a informação. Parece que é deste povoado, embora certamente o homem já se mudou para outra cidade mais glamurosa. —O homem? —perguntou Dante, franzindo o cenho. —Morgan... não se o que. Amanhã lerei o nome completo — disse, e sorriu—. Mas esta noite temos que conseguir essa casa. É bastante isolada. Podemos ficar ali hoje, e ninguém saberá. Dante assentiu lentamente, pensando. —Você vai primeiro — sussurrou—. Eu irei de madrugada. Tenho que... alimentarme. —Está bem. A casa estará preparada. Está ao norte do povo. É uma casa vitoriana, que agora pintaram de um horrível amarelo. Ele assentiu. Sabia exatamente a que casa estava referindo-se Sarafina. —Francamente, surpreende-me que a estas alturas não a tenha alugado para ti. E para que ia fazer isso? Tinha estado vivendo sob os pés da mulher que seu corpo ansiava. E já sabia por que a desejava tanto, embora aquilo não servisse para aplacar seu apetite. —Eu necessito muito pouco para estar cômodo, Sarafina. Ela se aproximou, agarrou-lhe o pescoço e o beijou nos lábios. —Vem antes do amanhecer, amor, ou sairei para te buscar. —Farei. Então, partiu. Ele esperou até que seus sentidos não puderam perceber sua presença nas cercanias, e foi procurar a Morgan. Já não podia jogar mais com ela. Necessitava respostas, naquele mesmo momento. Eram quatro da manhã quando soou o celular do Lou, e o pegou do que tinha sido um pouco parecido a um cochilo. Tinha estado sentado no carro durante toda a noite, vigiando a casa da Maxie. Pensou que possivelmente Lydia tivesse dormido ali, porque ainda não tinha partido. E, demônios, não a culpava, se era que Maxie lhe estava contando as histórias de vampiros que tinha ali. Ele respondeu à chamada. —Sim? —Malone, onde demônios está? Ele franziu o cenho para ouvir a voz familiar de seu companheiro. —Denny? —estive te procurando por toda parte, Lou. Escuta, será melhor que venha aqui, e rapidamente. —Jesus, não estou de serviço... —olhou de novo o relógio.
—Não me refiro à delegacia de polícia. A sua casa, Lou, entrou alguém, e... não é nada bonito. Ele notou uma opressão na garganta. Pelo tom de voz do Denny soube que não lhe diria nada mais por telefone, assim não se incomodou em perguntar. —Vou agora mesmo. —Sim... êh... estiveste com alguém esta noite, será melhor que venha contigo. Lou piscou, separou-se o telefone da orelha e ficou olhando-o. Depois voltou a aproximar-lhe à cara. —Está me dizendo que necessito um álibi, Denny? —Pode que não seja má idéia. Lou soltou um juramento. —Que demônios está acontecendo ali? Muito tarde. O sargento Dennis Kehoe já tinha desligado. Alguém deu uma batidinha no guichê do carro do Lou, e ele deu salto que quase bateu com a cabeça no teto. Só era Maxie, sorrindo e lhe mostrando uma xícara de café que tinha na mão, guardou o telefone e baixou o guichê. Se queria passar a noite inteira me vigiando, Lou, poderia ter dito. Não ia objetar nada. Mas seria mais divertido se o fizesse de mais perto. —Assim sabia que estive aqui toda a noite? Ela sacudiu a cabeça. —Toda a noite não. Saíste durante vinte minutos ao princípio, não te lembra? —Demônios — claro que se lembrava. Tinha ido à delegacia de polícia chamar seu amigo da CIA. —O que aconteceu, Lou? —Onde está Lydia? —Está dormindo, por quê? —Entra em carro. Tenho que ir a minha casa um segundo. —Está bem, está bem, Lou — Maxie rodeou o carro e entrou—. Não tem muito bom aspecto. Encontra-te bem? —Contarei isso quando chegarmos a minha casa. Resultou que nada ia bem. Soube assim que chegou a sua casa e nem sequer pôde entrar no estacionamento porque estava lacrado. Havia um cordão policial em todas as entradas, e uma ambulância estava partindo naquele mesmo momento. —Que demônios? Lou pôs uma mão no ombro da Maxie para acalmá-la. Parou o carro e saíram. —Será melhor que espere aqui. Virei se te necessito. —Não —respondeu ela, aproximou-se dele e lhe agarrando pelo braço enquanto caminhava a seu lado. —Malone — disse o capitão Howard Dutton, o chefe do Lou, levantando a fita para que pudessem entrar—. Preciso saber onde estiveste esta noite. Toda a noite. —Esteve comigo — Maxie soltou as palavras antes que Lou pudesse abrir a boca—. Quem ia à ambulância? O capitão piscou. Lou sabia que não estava acostumado a que lhe fizessem perguntas, e muito menos uma moça como Maxine Stuart. Voltou a olhar ao Lou. —Esteve com esta mulher toda a noite?
—Não — respondeu Lou—. A deixei em casa por volta das dez. Fui à delegacia de polícia a procurar uma coisa que tinha deixado no escritório, e depois voltei. Foram uns vinte minutos. —Viu-te alguém durante esse tempo? Há alguém que possa verificar que não voltou aqui, ao apartamento? Lou notou que lhe encolhia o estômago. —Não. — Sim, capitão—cortou Maxie de novo. Os dois homens a olharam com cara de poucos amigos. Max encolheu os ombros—. Lou admitiu. Acreditava que te tinha escapado para ir ver outra... —A outra? —de que demônios estava falando? —Assim te segui. Vi-te entrar na delegacia de polícia e esperei que saísse. Depois voltei para casa. —E o oficial Malone não a viu senhorita? —Eu... estacionei e entrei por detrás. Ele não se deu conta de que tinha saído — disse, e cruzou os braços sobre o peito—. E agora, por favor, poderia nos dizer o que ocorreu? Quem estava nessa ambulância? O capitão suspirou e se dirigiu de novo ao Lou. —Viemos porque nos chamaram para nos dizer que havia alguém em seu edifício, Lou. Quando chegamos, a porta de seu andar estava aberta, tudo estava destroçado e atirado pelo chão, e havia uma mulher no chão. Tinham atirando na sua cabeça a queimaroupa. Encontramos uma pistola do calibre vinte e dois no chão, ao lado. Não havia rastros — se voltou—. Denny, onde está a arma? — Aqui, senhor — Dennis levantou a bolsa da prova. —É minha — disse Lou ao vê-la—. É a de reserva. Guardo-a no armário. —Pensei isso — disse o capitão, voltou-se e os conduziu pelas escadas, para o piso —. Necessitamos que dê uma olhada, se por acaso falta algo. Lou assentiu. Caminhou atrás do capitão, com a Maxie a seu lado. —E o que aconteceu com a mulher? —perguntou—. Está morta? —Vão tentar salvá-la, mas não acreditam que sobreviva a esta noite. Acreditam que esteve aqui durante cinco ou seis horas. Não encontramos ao intruso, mas um vizinho disse que ouviu algo como um tiro às dez da noite. Acreditou que era o motor de um carro e não lhe deu importância. A carteira de identidade da vítima diz que se chama Tempest Jones. Conhecem-na? Max deixou de andar. Lou se voltou para olhá-la enquanto processava o nome, que lhe resultava vagamente familiar. Então esqueceu tudo, quando viu a cara da Max, pálida, sem poder articular uma palavra. Ela o agarrou fortemente pelo braço e seus olhos encheram-se de lágrimas. —Stormy —sussurrou. Stormy. A melhor amiga da Maxine. Max caiu de joelhos e ele a agarrou rapidamente para evitar que caísse de tudo. O capitão se virou. —Então, conhecem a vítima? —É uma amiga —disse Lou. Max o tinha abraçado pela cintura para sustentar-se, e tinha enterrado a cabeça em seu ombro. Ele sentiu a umidade de suas lágrimas ali. Ela estava chorando silenciosamente.
—Escute chefe, não poderia vigiar o andar e deixar a um homem vigiando? Eu preciso levar a Maxie ao hospital. O capitão pôs má cara, mas assentiu. — Sim, claro. Mas me diga uma coisa, Lou. até que ponto conhecia você a essa garota, a Tempest Jones? Ele sacudiu a cabeça. —O suficientemente bem para compartilhar café e donuts com ela. Não o suficientemente bem para reconhecer seu nome legal à primeira. Serve-lhe isso? O capitão suspirou e inclinou a cabeça. —Prossiga. —Obrigado —Lou se separou um pouco da Maxie e a guiou para o carro, abraçando-a, e a ajudou a entrar no assento do co-piloto. No caminho, Maxie lhe perguntou, entre suaves soluços: —Que demônios ocorreu? Por que ia Stormy a sua casa? —Não sei. Não tenho nem idéia, Max — respondeu. Depois baixou a cabeça. Não gostava de pensar no que estava pensando, mas tudo aquilo tinha ocorrido depois que ele fiz essa ligação a seu amigo da CIA e Stormy Jones era uma das pessoas às que esse tipo tinha ameaçado cinco anos atrás. Max o havia dito. Não podia ter relação. Deus, não podia.
CAPÍTULO XIV
Quando Dante chegou à casa de Morgan aquela noite, começou a lhe picar a pele, mas naquela ocasião não era pela atração que sempre sentia quando se aproximava dela, mas sim de alerta. Olhou a seu redor e viu um carro estranho. Não cheirava a fumaça no ar, assim devia ter parado certo tempo. A pessoa que estava com a Morgan tinha estado esperando que ela voltasse. Fechou os olhos e afinou os sentidos, como sempre, a essência da Morgan era clara e fácil de localizar. A outra era mais difícil de perceber. Custou-lhe um esforço, como se aquela pessoa, um homem, tivesse construído um muro ao redor de sua mente. Havia algo naquele estranho que desagradou a Dante. Sentiu que era... perigoso. Aproximou-se da casa e pôs as Palmas das mãos nos muros para tentar entrar na mente da Morgan. Ao encontrar resistência, sussurrou-lhe: «te abra a mim, Morgan. Só sou eu, me deixe entrar». E ela o fez imediatamente. Com um suspiro, relaxou e lhe abriu sua mente e sua alma. Ele se encontrou vendo com seus olhos e escutando com seus ouvidos. Não tomou o controle; nem sequer estava seguro de consegui-lo se o tentava. Aquele não era o propósito de aproximar-se tanto a ela. Queria protegê-la, o que era estranho, considerando que se pôs o suficientemente furioso para matá-la. O homem estava de pé, a costas da Morgan, observando a casa e assentindo falsamente. —É muito agradável o que tem feito você com esta velha casa. —Eu gosto dela —replicou ela—. Mas disse que tinha vindo me entrevistar sobre
meu trabalho, senhor Stiles. —Por favor, me chame Frank. Dou-me conta que deveria ir ao grão. Nunca a teria incomodado às quatro da manhã se não a tivesse visto entrando em casa. Não tenho dúvida de que esteja cansada, foi muito amável de sua parte me deixar entrar. —Bom, você já disse que conduziu durante seis horas para chegar a tempo para fazer a entrevista e poder incluí-la na tiragem desta semana. Mas, tal e como lhe disse, tem que ser breve. Quer sentar-se? Não lhe ofereceu nada de beber, e ele tampouco o pediu. Volto-se e se sentou em uma poltrona. Dante viu sua cara através dos olhos do Morgan e sentiu que o coração lhe dava um salto no peito. Ou era o coração do Morgan? O lado esquerdo da cara do homem estava enrugado e rosa, como se fora um boneco de borracha derretido. Não tinha cabelo nesse lado da cabeça, e tinha a pálpebra caída e a orelha desfigurada. O homem queimado sorriu para Morgan, e ela, fazendo jus a sua educação, devolveu-lhe o sorriso. Mas ela também estava sentindo algo desagradável no homem, e não era devido a sua aparência. Sentia que havia algo mau sob sua aparência, da qual ele não tinha culpa. —Deve estar muito entusiasmada por sua classificação—lhe disse—. A merece. —Obrigado. Sim, estou contente, e de uma vez aflita porque o filme tenha tido uma acolhida tão boa. —É um bom filme —pegou uma caderneta e uma caneta como os que se supunha que levaria um repórter, mas aquilo não enganou a Dante—. Mas houve outros dois antes, por que pensa que este teve muito mais êxito? —Os dois primeiros tinham muito menos orçamento —respondeu Morgan—. Mas, inclusive assim, também tiveram um público alto que esteve muito além de nossas expectativas. Isso, é obvio, facilitou-nos o fato de poder fazer o terceiro com muitos mais meios. O homem assentiu. —Haverá um quarto? —É obvio. O homem assentiu de novo, escreveu e sorriu, enquanto a Dante faziam nós no estômago. —Acredito que estes filmes têm um realismo de que carecem os outros filmes de vampiros. O personagem de Dante... é completamente verossímil. Muito real. Morgan tragou saliva, incômoda. «Ele é real», sussurrou sua mente. E em alto, disse: —Bom, essa é a chave da boa ficção, a verossimilhança. — É obvio — disse o repórter—. Mas isto está além do acreditável. É... bom, quase como se fora uma história real. E quando soube que sua casa tinha sido uma vez de um homem chamado Dante, bom, tenho que admitir que sentisse muita curiosidade. Morgan ficou tensa. — Do que está falando, senhor Stiles? —Oh, vamos, é do domínio público. Ela sacudiu a cabeça lentamente. —Não, não o é —então, recuperou a compostura—. Não sei de onde tirou essa informação, mas é incorreta. Esta casa foi abandonada por seu proprietário anterior, o senhor Daniel Taylor. O Estado a reclamou quando ele morreu sem herdeiros, e meu tio
David a comprou. —Daniel Taylor é um dos muitos pseudônimos que o vampiro Dante usou durante seus anos de vida. —Meu Deus, você tem uma grande imaginação — disse ela, pondo cara de estar contemplando a um louco. —É uma realidade. Exatamente igual aos fatos que se contam em seus filmes são reais também. Ela ficou de pé. —Está você mal da cabeça se pensar que os vampiros existem de verdade, senhor Stiles. E eu não gosto de entreter a estranhos instáveis em minha casa em plena noite. Já é hora de que parta. —Eu acredito que já é hora de que você me diga a verdade. Os vampiros são reais, senhorita da Silva. Você sabe, e eu também. E ele vai se zangar muito quando souber que você esteve fazendo filmes com seus escuros segredos. Ela cruzou a sala, dirigiu-se à porta principal e pôs a mão sobre o trinco. O homem a seguiu e pôs sua mão sobre a da Morgan no pomo. —Não sou jornalista —disse—. Trabalho para o governo. Passei a vida estudando a criaturas como Dante, senhorita da Silva, e sei o suficiente para lhe advertir de que está correndo um grave perigo. Se ele a encontrar... — Saia —disse ela, e abriu a porta apesar de que ele a estava sujeitando—. Agora, Stiles! —Como conseguiu toda essa informação sobre ele? —Se não partir, vou chamar à polícia. —Eu não vou o permitir. Sua mão se moveu, rápida como um raio, e pulsou os números no painel da parede antes que ele pudesse reagir. —Já está. A polícia chegará em cinco minutos. —Estou tentando ajudá-la. É um monstro, senhorita Da Silva. A encontrará e a matará, a menos que me deixe ajudá-la. Ela se inclinou para ele e o olhou aos olhos. —Os vampiros não existem —sussurrou, e depois sorriu ao ouvir o som de uma sirene—. Mmm, mais rápido do que eu tinha pensado. O homem deixou escapar um suspiro de frustração e saiu correndo da casa. Ela viu o carro afastar-se e memorizou a placa. Depois fechou a porta e jogou o ferrolho. Depois, lenta, muito lentamente, começou a pensar no que lhe havia dito o homem. Que Dante era real. Que ficaria furioso com ela por compartilhar seus segredos com o mundo. Que a mataria. Mas ele não podia matá-la, pensou vagamente. Ele a queria. Não, corrigiu-se, ela o queria a ele. Se fosse real, ele a corresponderia, porque não se podia negar o poder daquele vínculo. Mas Dante não era real. Não existia, assim não a queria. E certamente, não podia lhe fazer mal. Dante se retirou de sua mente e começou a sentir seu próprio corpo de novo. Abriu os olhos e moveu as mãos, apertando os punhos várias vezes. O som da sirene estava aproximando-se. Fazia uns minutos que Stiles tinha partido, mas a polícia estava se aproximando e a aurora também. Entretanto, ele não se foi para a Sarafina, nem à casa que ela, sem dúvida, tinha preparado. Não foi para longe.
—Disse-me que era jornalista — explicou Morgan ao policial. Era um homem amável e corpulento, que se chamava Sandy Gray. —Assim você lhe deixou entrar — disse Sandy—. Mostrou alguma identificação? Ela sacudiu a cabeça e explicou ao policial que o homem se identificou como Frank Stiles e lhe contou parte da conversação que tinham mantido. —Assim —lhe perguntou Sandy ao final—, não lhe fez mal, nem o tentou? —Não. —E não levou nada? —Não. —Então, vejo que realmente não se cometeu nenhum crime aqui. Não partir exatamente no momento em que você o pediu não é exatamente um comportamento criminal. —Suponho que não —admitiu Morgan, com um suspiro—... Mas não é uma situação comum. Não é que tenha má intenção contra ele, mas eu sou famosa, e acredito que quer algo e que voltará. Ele a olhou fixamente. —Acredita que é um fã obcecado? Algo assim? —Pois é possível, não? Pareceu que aquilo funcionava muito melhor que qualquer outra coisa que lhe houvesse dito. O policial assentiu. —Por que não me dá uma descrição detalhada, senhorita? Farei que circule entre os agentes e que mantenham os olhos bem abertos. Ela descreveu ao Frank Stiles com precisão, mas não mencionou que lhe havia dito que trabalhasse para o governo, nem aos vampiros, nem suas acusações de plágio. —Também...êh... memorizei o número de sua placa quando partia. —De verdade? Ela assentiu e o disse. O policial tinha anotado tudo em sua caderneta, e quando anotou o número ficou pensando. Depois a olhou. —É de Maine? —Não, de Nova Iorque. —Hmm. Estará você bem o resto da noite, aqui sozinha? Teve o estranho pressentimento de que não estava sozinha, mas isso não tinha sentido absolutamente. Não entendia de onde tinha saído àquela idéia. —Estarei perfeitamente. Tenho o sistema de segurança, e desta vez não deixarei entrar nenhum estranho. —Esse é um bom plano —disse o policial—. Faremos que passe um carro patrulha por aqui algumas vezes esta noite, de acordo? —Muito obrigado, oficial Gray — disse, e fechou com chave depois de que ele partiu. Depois foi a seu quarto, deu-se uma ducha rápida, colocou uma camisola e se meteu na cama com outro dos volumes dos diários de Dante. Entretanto, não podia concentrar-se aquela noite. As palavras de outro homem, o homem queimado, lhe repetiam na mente uma e outra vez. «Os vampiros são reais... Dante é real, e vai ficar furioso quando averiguar que...» Suspirou e tentou voltar para a leitura. De repente, umas palavras lidas ao azar
captaram sua atenção. Alçapão... Sob a casa... Ataúde... Estremeceu. Aquilo era algo que podia verificar facilmente. Fechou o livro, saltou da cama e desceu as escadas para o que tinha sido o escritório de Dante. Sua estadia favorita, e a de Morgan, também. Tragou saliva e tirou o tapete oriental que havia frente à lareira. O piso estava perfeito. Não havia dobradiças nem a marca de um alçapão, nem nada parecido. Entretanto, recordou que ela tinha feito instalar um soalho novo no chão. Além disso, muitas vezes tinha tido a sensação de que Dante estava perto dela, de que a acariciava, de que entrava em sua mente. Quantas vezes durante as últimas semanas? E, sobre tudo, quando estava naquela sala. Pegou o atiçador da chaminé e começou a dar batidinhas no chão. Tap, tap, tap, toe... deteve-se, gelada, perguntando-se se tinha ouvido algo diferente ou se só o tinha imaginado. Começou a dar batidinhas de novo e o som voltou a mudar no mesmo lugar, no lugar aonde se supunha que estava o alçapão. Morgan se ajoelhou e colocou a ponta do atiçador entre as pranchas. Fez alavanca com todas suas forças e se apoiou com todo seu peso sobre o atiçador. Finalmente, uma das taboas cedeu e se levantou. Sem fôlego, suando, Morgan ficou ali, olhando sob o tablado. Havia uma tabela mais velha, podre, e com um só golpe do atiçador a rompeu e fez um oco que dava diretamente ao negro vazio que havia sob a casa. Quase sem poder respirar, Morgan procurou uma lanterna e voltou para iluminar em baixo. Havia uma escada em caracol justo debaixo dela. Ficou de pé e notou que o coração pulsava tão forte que parecia que ia explodir lhe no peito. —Meu Deus, será certo? É possível que seja real? Dante? —sussurrou. Pegou de novo o atiçador e levantou várias taboas. Depois rompeu a madeira podre, até fazer um buraco o suficientemente grande para poder entrar. Tragou saliva, tomou o atiçador e a lanterna e desceu pela escada. Morgan não estava em seu quarto quando Dante olhou pelas vidraças do balcão. Estava furioso com ela, sim, ansioso por enfrentar a ela e desatar sua raiva pelo que tinha feito. E igualmente ansioso, entretanto, por lhe fazer o amor com sua mente, inclusive embora fosse uma tortura para seu corpo. Tinha fome dela, embora também quisesse estrangulá-la até sossegá-la para sempre. Mas ela não estava na cama, esperando suas carícias ou sua fúria vampírica. Tampouco estava no banheiro, deixando que a água escorregasse por sua pele de alabastro na banheira para que ele pudesse vê-lo, ou afogá-la. De fato, seus sentidos lhe disseram que estava longe daquela parte da casa, e agitada ao extremo. Pensou no encontro que Morgan tinha tido com o homem queimado, e se sentiu preocupado. Parecia-lhe idiota, mas todas as células de seu corpo lhe doíam por ir com ela, por protegê-la e salvá-la. Ele já não sentia a presença do homem, mas sabia que Stiles não se renderia. Era o homem que tinha estado tentando caçar a Dante e aos de sua raça durante anos. Tinha que ser o filme o que lhe tinha conduzido a Morgan. Stiles a usaria para chegar até ele se o necessitasse. A Morgan ocorria algo mau. Dante sentiu uma dor terrível no estômago, que não era dele, notou que lhe cortava a respiração, notou que o medo o deixava petrificado. Não, o terror.
Não havia tempo para ser precavido. Respondeu a seu instinto e entrou por sua habitação. Baixou as escadas correndo e chegou ao escritório. Ali viu os tablados quebrados e o buraco junto ao tapete enrolado... —Oh, Meu deus, não... Dante não soube o que fazer. Ficou gelado durante uns instantes, e então ouviu seu grito.
CAPÍTULO XV
Morgan desceu as escadas com cautela até que se encontrou em uma sala escura, fria, e úmida. Moveu a lanterna para iluminar diferentes lugares: o teto era de madeira e as paredes de pedra. A estadia continuava por um arco e se abria a outro ambiente menor. Pareceu-lhe estranho que não houvesse teias aranha enquanto caminhava, quase nas pontas dos pés para o arco. Entrou na pequena sala, quase mais escura que a anterior, e viu uma lanterna de querosene e uns fósforos no chão. O farol estava limpo, e Morgan se aproximou e se agachou para acendê-lo. Quando se incorporava, viu como a luz amarela alagava a salinha. No outro extremo, sobre uma espécie de plataforma que a mantinha elevada do chão, havia uma caixa de madeira tão escura que parecia negra, com asas de prata brilhante nos flancos. Ficou ali a olhando, enquanto sua mente recusava-se a processar a informação que estavam recolhendo seus olhos. Entretanto, finalmente não pôde deixar de admitir a verdade: era um ataúde. Um grito de terror lhe escapou dos pulmões, ricocheteou nos muros e voltou a esconder-se em seus ouvidos. Mordeu o lábio inferior para silenciar-se e tentou controlar os batimentos do coração desbocado de seu coração. A tampa do ataúde estava fechada. Parecia antigo. Quanto tempo levaria ali? Deus, estaria ele dentro? Queria sabê-lo. Uma parte de sua mente lhe pedia que se aproximasse, que abrisse a tampa e que o visse... Dante. O resto lhe dizia que corresse. Entretanto, seu corpo não podia fazer nenhuma das duas coisas. Tremiam-lhe tanto as pernas que estava a ponto de cair. «Isto não é real. É outro de seus sonhos. Isso é tudo». Mas não. Em seus sonhos ela era forte, vital, cheia de energia. Nunca sentia medo. E em seus sonhos, ele a queria. Deus, seria possível que o homem queimado tivesse razão? Seria real a história que se relatava nos volumes de autobiografia? Seria possível que Dante estivesse descansado ali, naquele ataúde? Estaria perfeitamente conservado. Entre a vida e a morte. Imortal. —Possivelmente não — murmurou—. Certamente, fez que o enterrassem aqui em segredo. Possivelmente só seja isso, o ataúde de um lunático rico e excêntrico que morreu faz cem anos. Reduziu-se a ossos e pó. Isso é tudo. E quando visse a prova de que Dante só tinha sido um homem normal com uma
imaginação extraordinária e um grande talento para escrever, possivelmente isso fosse suficiente para romper o feitiço que a obcecava. Tomou ar e se aproximou do ataúde. Pôs as mãos com suavidade sobre a tampa, e se disse a si mesma que tinha que abri-lo. —Não o faça —a voz que pronunciou aquelas palavras era rica, profunda, inquietantemente familiar. Ele estava detrás dela. Morgan ficou imóvel e fechou os olhos. Ele tinha entrado silenciosamente. Ela não tinha ouvido uma pegada, nem um som. Nada. —Deixa-o, Morgan. Não há nada que precise ver aí dentro. Com os olhos ainda fechados, sussurrou: —Dante? — Eu... —a voz titubeou, e Morgan abriu os olhos. Soube que qualquer coisa seguinte que dissesse seria uma mentira. Notou como passava o tempo enquanto ele tentava inventar algo convincente—. Sim, sou Dante. Mas não sou o que você pensa. Ele era meu tataravô. —E está enterrado aqui — disse ela, continuando em seu lugar. —Foi sua última vontade. Ela assentiu. —E por que está você aqui? —Para verte. O filme que você escreveu era tão real, tão parecida com as ilusões daquele velho que quando soube que vivia na casa que ele tinha construído, soube que tinha conhecido suas fantasias, de algum modo, e que as tinha transformado em um roteiro. Ela não se virou para olhá-lo. Não podia. Ainda não. —Está dizendo que não são reais? Ele forçou uma risada, a mais falsa que ela tivesse ouvido nunca. —É obvio que não são reais. —E você pode entrar em minha casa sem chamar? —Estava a ponto de fazê-lo quando ouvi seu grito. —Lá de fora. —Sim. —E não se ativou o alarme quando entrou? Ele não respondeu. Morgan tragou saliva, e seguindo um impulso levantou a tampa do ataúde. Estava vazio, forrado de cetim amarelado pelos anos. A tampa ficou levantada quando ela a soltou e se virou, lentamente, para olhar a cara do amante de seus sonhos pela primeira vez. Vestia uns jeans e uma camisa preta, sem gravata nem jaqueta. Era muito moreno. Tudo nele era escuro, exceto sua pele branca. Tinha os rasgos afilados e os olhos afundados, de ébano. Fez que lhe cortasse a respiração, porque o amava. Estava unida a ele de uma forma que não entendia. Era exatamente como ela o tinha imaginado. Familiar. Amado. Era dela. —É real — sussurrou. Ele a olhou em silêncio. Ela o sentiu, tentando penetrar em sua mente, para deixar ali a certeza de que tudo aquilo era só outro de seus sonhos, para obrigá-la a acreditá-lo. Morgan abriu muito os olhos e sacudiu a cabeça. —Deixa-o. Não é um sonho. Não conseguirá me convencer. —Por que está tão segura?
—Não vale a pena que o tente, Dante. Embora pudesse fazer o que quisesse em minha mente, quando despertasse encontraria o tablado do escritório, levantado e quebrado... não poderia arrumá-los antes que se fizesse de dia. Ele a observou com os olhos entrecerrados. — Ou é muito valente ou muito estúpida, Morgan. Não sabe o quanto estou furioso pelo que tem feito? Deveria te matar. —Então, faz. Morgan se deu conta de que ele estava impressionado, mas não se deteve, baixou a gola da camisola, jogou a cabeça para trás e fechou os olhos. —Faz Dante. Seu pulso disparou em resposta à sensação que lhe produziu sentir seus olhos no pescoço. Queria algo que não podia nomear. Sabia que, de toda forma, estava morrendo, e se tinha que morrer, por que não o fazer da maneira que ele havia descrito com tanto erotismo em sua autobiografia? Por que não podia morrer em um êxtase, enquanto ele apanhava sua essência? E, de repente, ele a abraçou com força. Fechou a boca sobre seu pescoço e a mordeu sem lhe romper a pele, e sugou. Ela arqueou seus quadris contra ele e sentiu sua excitação. Morgan nunca havia sentido tanto fogo. Entrelaçou-lhe os dedos no cabelo e se retorceu entre seus poderosos braços, apertando seu corpo contra ele, arqueando a garganta contra sua boca faminta. Sentiu seus lábios, úmidos e quentes. Sua língua, acariciando-a e saboreando-a. A espetada suave e deliciosa de seus dentes mordendo-há um pouco, só um pouco. Então, ele se separou dela com tanta violência que Morgan caiu ao chão sem fôlego. ficou ali, olhando-o aos olhos, que brilhavam com uma estranha luminescência. Tinha uma expressão de angústia infinita. —Não tem nem idéia do inferno com o que está brincando, Morgan —lhe disse, com a voz rouca e tremente. —Sei —respondeu ela, lutando por respirar—. Conheço-te melhor do que nunca te tenha conhecido ninguém, Dante. Ele ficou imóvel. —Como? Ela fechou os olhos e desabou. De repente, encontrava-se muito débil. Todo aquilo era muito. Ele soltou um suave juramento e se aproximou para tomá-la em braços. Subiu as escadas com ela e passou com cuidado pelo buraco na madeira do chão ao escritório. —Está doente — disse. Ela assentiu e apoiou a cabeça em seu peito enquanto subiam pela escada para seu quarto. — Sim. Mas não quero que mude de tema. —Seriamente? —Sim. Queria saber como cheguei a te conhecer. Ele se inclinou para deixá-la sobre a cama. Sua cara estava a uns centímetros da de Morgan. Assentiu. —Tenho que saber. —Então, me faça amor, Dante, e lhe direi isso. Cravou-lhe um olhar ardente nos olhos.
—Não posso fazer isso, Morgan. Está muito fraca. —Não para isso —ela levantou um pouco a cabeça e o beijou nos lábios—. Por
favor... Ele grunhiu brandamente. Devolveu-lhe o beijo e a atraiu contra seu peito. Acariciou-lhe os lábios com a língua e ela abriu a boca para recebê-lo, enquanto suas respirações se aceleravam. Saboreou-a e depois percorreu com a língua a linha de sua mandíbula e baixou até o pescoço, onde tinha estado antes, para beijá-la. Depois a soltou. —Não posso. —Tem-no feito antes. Tem-no feito. Sei que era real, que não foi um sonho. Maldito seja Dante, estiveste comigo, noite pós noite. —Não era real. Só estava em nossas mentes. —Então, faz realidade! Ele estava tremendo. Olhou para a janela e se deu conta de que ia amanhecer. —Não diga a ninguém o que viu esta noite. Juro-lhe isso, Morgan: se disser uma palavra, morrerá. Entende? Não terei escolha. —Realmente pensa que te trairia? Meu deus, Dante, nunca o faria... —Já o tem feito. Ela piscou e se deu conta de que ele se referia aos filmes. —Não é o que pensa. —Contaste meus segredos ao mundo, Morgan Alguns de meus melhores amigos morreram pelo que você revelou sobre minha raça em seus roteiros. Tentaram me caçar muitas vezes. O homem ao que conheceste esta noite me perseguiu desde muito perto. Ela abriu muito os olhos, assombrada, aterrorizada. —Não sabia. Dante, eu nunca teria feito se tivesse sabido que era real! Tem que acreditar! Ele ficou de pé e foi para a janela. —Tenho que partir. Ela se levantou também, embora estivesse débil e exausta, e o agarrou pela camisa. —Então, volta. Dante me prometa que virá para ver-me esta noite. Contar-lhe-ei isso tudo, juro isso. —Ou possivelmente terá aqui ao homem, me esperando... —Deixaria que me matasse, primeiro... —então caiu de joelhos, sem poder sustentarse mais—. Morreria antes de te trair, Dante —disse em um sussurro. Dante se ajoelhou a seu lado e a abraçou contra seu peito. Depois tirou algo do bolso de sua calça. Era uma pequena navalha afiada, e se fez um corte no pescoço, deixando escapar um grunhido de dor enquanto o fazia. Morgan ofegou e fixou o olhar nas gotas de sangue que brotaram. A essência chegou ao nariz, e sentiu uma luxúria feroz no ventre. Aproximou-lhe a cabeça a seu pescoço, mas Morgan não necessitava que o fizesse. Sabia o que necessitava. Enterrou a cabeça na curva de seu pescoço e fechou a boca sobre o corte. Sugou com força, lambendo ansiosamente as gotas que lhe escapavam. Em um instante de loucura, lutou contra ele quando Dante tentou separá-la, apertando-se contra seu corpo, lhe cravando as unhas na mão, tentando roubar mais droga da que ansiava. Poderia lhe haver destroçado o pescoço com seus próprios dentes. Poderia havê-lo matado. Ele a separou com facilidade, entretanto. Quando Morgan o olhou, viu em seus
olhos a mesma fome e o mesmo brilho feroz. Deus, ele queria a devorar da mesma forma. Como um animal. Como um depredador. Levou-a rapidamente à cama, foi para o balcão e desapareceu. Morgan ficou ali deitada, ofegando. Seu corpo se sentia vivo, palpitante, forte. Aquilo, pensou, devia ser só um reflexo do que se sentia sendo... o que era Dante. Um vampiro. Ela queria sê-lo. De repente, queria sê-lo com todas suas forças. Queria ser uma vampiresa, e se perguntou se bebendo seu sangue chegaria a ser como ele. Dante se dirigiu à casa que Sarafina tinha preparado a toda pressa. Encontrou-a ali, esperando-o. Saudou-a brandamente, sem deter-se em seu caminho para o porão. —Onde estiveste? Por que demoraste tanto? Jesus, é seu sangue o que estou cheirando? —Um pequeno acidente. —Não é certo! —agarrou-o pelo ombro para detê-lo, mas ele continuou andando e subiu à caixa que ela tinha preparado para ele. Ela pegou a tampa para impedir que ele se cobrisse e conseguisse evitar suas perguntas. Sabe muito bem que podemos sangrar com muita facilidade, Dante. Por que foste tão descuidado? —Tive um encontro com nosso caça vampiros desfigurado — mentiu. Não podia lhe dizer a verdade. Se o fazia, ela explodiria. E nada, nem sequer o vínculo que Morgan tinha com eles, conseguiria a proteger da fúria de Sarafina. Sua tia era incrivelmente possessiva, não só com os escravos que mantinha, mas também com ele. Ele era a única família que tinha, e aquilo significava muito para a Sarafina. —O homem queimado? Está neste povoado? —Sim, assim tome cuidado — Dante lhe pediu a tampa—. Quanto antes durma, antes sanará a ferida, Sarafina. Suspirando, e obviamente cheia de perguntas, Sarafina colocou a tampa sobre ele. Depois subiu a sua própria caixa e se cobriu também. Ele fechou os olhos e esperou. Entretanto, o sono demorou a chegar. E inclusive quando finalmente chegou Dante não pôde evitar que as imagens lhe invadissem a mente. Imagens dele e da Morgan, nus, entrelaçados. Seu corpo fundo no dela, seus dentes afundados em seu pescoço, seu sangue fluindo para suas veias. Deus desejava-a. Queria possuí-la inteira, sua alma, sua carne, seu sangue. E sabia que a partir daquele momento, seria pior. Ela tinha bebido duas vezes dele, e ele a tinha provado, e sabia muito bem que voltaria a fazê-lo se não tomasse cuidado. Se fizesse o amor, beberia seu sangue, e possivelmente todo. Não seria capaz de deter-se. E no estado tão fraco em que se encontrava Morgan, a mataria. Não queria matar a Morgan da Silva. Queria... queria amá-la. Mas havia um obstáculo insolucionável: ele era incapaz de amar alguém.
CAPÍTULO XVI
Maxine e Lou estavam sentados na sala de espera do hospital. Levavam quatro horas ali, e já estava amanhecendo. Os pais de Stormy tinham sido avisados, e depois os tinham conduzido a uma sala privada para que esperassem ali as notícias, mas ninguém tinha ido falar com eles até o momento. Aquilo era a pior forma de tortura que ocorria ao Lou. Ter aos pais de uma moça ferida encerrados em uma sala sem lhes dizer como estava sua filha. —Deveria avisar ao Jay. Jason Beck — disse Max—. Certamente quereria saber. Lou não gostava de ver Max daquela maneira. Estava pálida e tremente. Recordou a menino a que estava se referindo. Tinha sido a terceira parte do trio inseparável que tinham formado durante todo o instituto e a universidade. —Sabe como localizá-lo? Ela sacudiu a cabeça lentamente e ficou imóvel durante um momento. Depois, finalmente, falou de novo. —Provavelmente, é melhor assim. E ao Lou custou um momento dar-se conta de que ainda estava falando do Jason Beck. Perguntou-se vagamente como teria arrumado Max para perder o contato com alguém com quem tinha estado tão unida. Mas o tempo passava, e aquelas coisas ocorriam. —por que diz isso? —Vamos, Lou. Sabe de onde isso vem tão bem quanto eu. Averiguaram que te contei o que sabia sobre a DIP. Ele desviou o olhar. —É o único que tem sentido. Matam a Stormy e lhe incriminam. É uma mensagem para mim. Uma lição. Serve para assegurar de que não o direi a ninguém mais. Destroem a duas das pessoas às que... que me importam. É exatamente o que Stiles me disse que faria. A questão é, como sabe ele que lhe contei isso? Lou umedeceu os lábios e a olhou aos olhos. —Ontem à noite fiz uma chamada. Ela ficou imóvel e não disse nada. Simplesmente o olhou, lhe rogando com os olhos que não lhe dissesse o que estava pensando. —Chamei meu amigo da CIA lhe pedi que averiguasse o que pudesse sobre a DIP. Disse-lhe que suspeitava que fosse uma agência que tinha tido uma missão secreta no White Plains até que seu quartel geral pegou fogo faz cinco anos. Não mencionei a ti, nem ao homem que a viu. —Não tinha que fazê-lo —disse ela tragando saliva—. Disse-te que não contasse a ninguém, Lou. Como pudeste fazer isto? —Êh, Max. Vamos. Não podia saber que o resultado seria algo como... como isto. —Não podia sabê-lo? Dei-te minha palavra. Disse-te que ele tinha ameaçado a meus amigos e a minha mãe, e você vai diretamente e... —interrompeu-se—. Oh, Deus. Minha mãe. Levantou-se e foi correndo para o telefone público. Lou ficou ali sentado, fundo, e passou a mão pelo cabelo. Ela tinha razão. Toda a razão. Se tivesse sido outro policial que lhe tivesse pedido que mantivesse silêncio, o teria feito. Mas ele tinha subestimado a Max. Mad Maxie, a teórica da conspiração, que sempre via problemas onde não havia. Muito bem. Possivelmente, por uma vez, ela não estava tão desencaminhada. De repente se abriram as portas do elevador e Lydia foi correndo para ele. —O que ocorreu? Lou está bem? Onde está Max?
—Não se preocupe. Estamos bem os dois — ele se levantou e lhe deu um bom abraço.
—Quando despertei esta manhã, não havia ninguém na casa da Max, assim chamei a sua casa e um policial me disse que estavam no hospital. Jesus, Lou, assustei-me muitíssimo. Naquele momento, Max se aproximou, e Lydia caminhou para ela e a abraçou como se fossem amigas desde fazia muito tempo, embora só se conhecessem desde fazia muito pouco. —Oh, carinho, tem muito mau aspecto. —Não me encontro muito bem. —Que tal está sua mãe, Max? —perguntou-lhe Lou. —Bem. Possivelmente na Califórnia esteja a salvo. Possivelmente não saibam onde está. Ou possivelmente não têm o poder suficiente para atuar ali e aqui ao mesmo tempo. Pode ser que só seja o homem que vi —e passou uma mão pelo cabelo—. Deus, nem sequer sei com o que nos estamos enfrentando. Não sei a quem temer mais, se aos vampiros ou aos caçadores de vampiros. Lydia a soltou e deu um passo para trás, olhando-a, enquanto Lou se certificava de que não havia ninguém perto que tivesse podido ouvir o comentário. —Fala mais baixo, quer apareça alguém com um bilhete de ida para o manicômio se te escuta dizer estas coisas? —Algum dos dois poderia me dizer o que ocorreu? —perguntou Lydia. —É minha amiga Stormy, minha sócia. Encontraram-na em casa do Lou com uma bala na cabeça. Deixaram-na ali acreditando que estava morta, mas não estava. Destroçaram a casa do Lou, e usaram sua pistola para atirar nela. Arrumaram tudo para que parecesse que tinha sido ele. —meu deus — disse olhando ao Lou—. Espera um minuto. Stormy? Deixou uma mensagem em sua secretária eletrônica. Esta manhã, quando despertei, vi a luz das mensagens acesa e pensei que seria um teu, me dizendo onde estava, assim que o pus. —Não olhei as mensagens da secretária ontem à noite — Max tomou as mãos de Lydia—. O que dizia? Lydia olhou a seu redor e baixou a voz. —Dizia que tinha recebido uma ligação muito estranha do Lou lhe pedindo que fosse a sua casa, e que queria lhe dizer isso no caso dele estar metido em alguma confusão. Disse que lhe parecia divertido — acrescentou, sacudindo a cabeça—. Acredito que isso era tudo, mas ainda está na fita de sua secretária eletrônica. —A fita também grava a hora da chamada. Recorda a que hora foi isso? —As nove —disse Lydia. —Não era Lou. Lou estava comigo, vendo um filme no cinema, e depois vigiando para casa enquanto nós estávamos dentro. Alguém a chamou. Enganou-a para que fosse ali e a recebeu com o tiro de uma pistola do calibre vinte e dois. —Graças a Deus que só era uma vinte e dois. Outro maior a teria matado. —Mas, por quê? Por que fez isso? —Tem que ver com... —Max se interrompeu ao ver que um médico saía da sala de cuidados intensivos onde estava Stormy. Ao mesmo tempo, uma enfermeira se aproximava com os pais do Stormy. Todo mundo se formou redemoinhos na sala de espera. —Está viva —disse o médico—. Mas está em estado de coma.
—É morte cerebral, doutor? Diga-nos a verdade — perguntou o pai, destroçado. —Não. Tem atividade cerebral. Embora seja mínima, está aí. —Quanto tempo estará em coma? —perguntou Max, dando um passo adiante e tomando a mão da senhora Jones—. Um dia? Uma semana? —Não podemos saber. Nem sequer sabemos se sairá do coma — respondeu o médico—. Mas sempre e quando houver atividade cerebral, há esperança. Todos esperaram que lhes dissesse algo mais. Lou sabia o que queriam ouvir. Quanta esperança, exatamente? Quando se poderia saber algo com certeza? Viu na cara do homem que não tinha as respostas que queriam. —Olhem — disse o médico, brandamente—, tive casos assim nos que o paciente esteve em coma durante meses, inclusive anos. Algumas vezes despertam, outras não. Quanto mais tempo permaneça em estado comatoso, as possibilidades de recuperação serão menores. Entretanto, houve pessoas que despertaram depois de períodos muito compridos e que se recuperaram. Não podemos saber. —E o que acontecerá quando despertar? —perguntou à senhora Jones—. Terá danos cerebrais? —Tampouco podemos sabê-lo, senhora. Depende do tempo que permaneça em coma. Como já lhes expliquei quanto antes desperte melhor. —Despertará — disse Max. O disse ao médico, e depois aos pais, do Stormy—. Despertará e estará bem. Dizem que a gente em estado de coma pode ouvir o que lhes dizem. É certo, doutor? Ele assentiu. —Em alguns casos. Vi reações nos encefalogramas quando pessoas queridas de pacientes em coma falaram com eles. —Então, isso é o que temos que fazer — disse Max—. Acredito que alguém deveria estar com ela todo o tempo, lhe falando. E se ninguém puder estar, poremos sua música favorita, ou vozes falando. Não deixaremos que se vá. —Pode ser uma boa idéia — disse o médico—. Mas recordem que também devem deixar que descanse. —Se quer descansar, que desperte — disse Maxine, com os olhos cheios de lágrimas. A senhora Jones lhe acariciou a bochecha. —É uma boa garota, Maxine. E uma boa amiga — depois olhou ao Lou e baixou os olhos. —Tem que saber Jane, que Lou estava em minha casa ontem à noite. Não estava mentindo quando lhe disse isso. Você sabe o muito que quero a Stormy. Não lhe mentiria nisto. Alguém quis incriminá-lo. A senhora Jones assentiu. —Conhecemos o oficial Malone há muito tempo —disse seu marido—. Não seria mais do que nos disseram para que acreditássemos que não é capaz de fazer algo assim. —Agradeço — disse Lou ao homem—. E lhe juro que vou fazer todo o possível para que esse miserável vá ao cárcere por toda a vida. —Sim. E eu também — acrescentou Maxie, olhando ao Lou enquanto o dizia. E ele soube que o dizia de verdade. Iria fazer aquilo a sua maneira. Com sua ajuda ou sem ela, Max ia encontrar a aquela escritora e lhe tirar toda a informação que pudesse a respeito de... Deus, quase não pôde conter o sorriso ao pensá-lo, os vampiros. —É possível que necessite outra transfusão de sangue, senhora Jones —disse o
médico, mas assim que a mãe começou a ficar de pé, ele elevou uma mão—. Não, senhora. Você não pode doar mais hoje. Temos reservas, não se preocupe. —Preferiria conhecer a fonte — disse a mulher—. Já sei que hoje em dia as reservas de sangue são mais seguras que nunca, mas de toda forma... —Eu sou A positivo — disse Maxie. — Eu também —acrescentou Lydia. O médico sacudiu a cabeça. —Não é o que necessitamos para ela, embora doações nunca venham mal. Alguém tem A negativo? Lou levantou a mão como um menino no colégio. —Você é o eleito — o doutor mandou o Lou a doar sangue acompanhado de uma enfermeira, e ele pensou que era bastante irônico que estivesse rindo da idéia de que os vampiros fossem reais, quando lhe iam tirar um litro de sangue. —Podemos vê-la? —perguntou a mãe do Stormy. —É obvio —disse o médico, e ficou de pé para acompanhar aos pais. Max notou uma dor aguda no estômago quando viu como o senhor Jones abraçava a sua mulher a seu lado, mas ao mesmo tempo, apoiando-se nela, como se necessitasse algo de sua força. Suspirou e se voltou para a Lydia. —Temos que falar. —Pobre —Lydia.. abraçou-a de novo—. Sei pelo que está passando. Quando Kimbra morreu, eu... —Ela era algo mais que sua melhor amiga, verdade? Lydia a olhou durante um momento e sorriu com tristeza. —É tão evidente? —Vi a foto que tem na carteira quando há abriu outro dia. Estão as duas juntas abraçadas. Fixei-me em como a olhava. —Queria-a —disse Lydia, brandamente—. Era minha vida inteira. E, inclusive embora não seja o mesmo, dou-me conta de que você quer muito a Stormy. Vejo a dor em seus olhos. Max se secou as lágrimas. —Não temos tempo para fazer uma cena de tristeza. Temos que fazer que nossas histórias sobre ontem à noite concordem. E depois temos que nos desfazer dessa fita de minha secretária eletrônica. Lydia franziu o cenho. —Fazer que as histórias concordem? —Lou esteve sentado em seu carro fora de minha casa durante toda a noite —lhe explicou Max, e ela assentiu. —Sim. Lembro que comentou que o tinha visto. Pareceu-me muito doce de sua parte. —Exatamente. Assim já somos duas que podemos declarar que nunca o perdemos de vista. —Mas sim o fizemos —disse Lydia—. Não te lembra? Depois de te deixar em casa, foi durante um momento. Foi muito pouco, mas... —Sim, e o muito parvo o disse à polícia. Tenho que pensar depressa, porque eu os disse que quando Lou se foi eu o segui. Inventei um conto de que o estava seguindo porque
acreditava que o ia pegar com outra, e confirmei o que ele disse que tinha ido à delegacia de polícia e depois havia voltado diretamente a minha casa. Lydia assentiu lentamente. —Não sabia que Lou e você estivessem juntos. —Não o estamos. —Assim mentiste para polícia. —Sei que não o fez. E você sabe também. Lydia se voltou, tomou ar e finalmente deixou escapar um suspiro. —É obvio que sei — disse, e olhou a Max de novo—. Depois de tudo, eu estava ali quando você partiu para segui-lo. Tentei te convencer de que Lou é homem de uma só mulher, mas você tinha que se assegurar. Max mordeu o lábio. —Podia ter estado dormindo, sem te dar conta de nada. —Duas testemunhas são melhor que uma. Sobre tudo, se supurem que é a amante do suspeito, Maxine. —Obrigado. —De nada. Tenho - muito carinho ao Lou. Somos amigos há muito tempo. Uma coisa mais, tem que apagar a mensagem da secretária eletrônica. —Sim... mas também poderia nos servir como prova. Deveríamos guardar uma cópia, ou pôr uma fita nova, e fazê-lo rápido, antes que a policia decida revistar minha casa. —Eu me ocuparei disso. Você fica aqui para ver sua amiga. Max assentiu. —Paga à vista com dinheiro. E compra a fita em algum lugar muito concorrido, como Wal-Mart, onde não possam te recordar depois. E não faça que seu aspecto seja muito memorável. Lydia mordeu o lábio e franziu o cenho com preocupação. —Só me diga com o que nos estamos enfrentando, carinho. —Com o governo. Com uma parte da CIA, acredito. Uma agência secreta que já não existe. O homem que atirou na Stormy fazia parte dela. —Chamou-os... caçadores de vampiros. —Isso é exatamente o que eram. Possivelmente ainda o sejam. Olhe, contarei tudo o que sei, mas não pode dizer a ninguém. Por isso é a razão de atirarem na Stormy. —Está bem. Entendido. Mas não agora. Este não é o melhor lugar. Ocuparei-me da fita e falaremos logo. —Nos veremos na delegacia de polícia — disse Max—. Certamente teremos que fazer declarações juradas. —Ao meio-dia? —De acordo. —Então, até mais tarde. Depois que Lydia partiu, Max esperou até que Lou voltou da doação do sangue com um esparadrapo no braço. Ele a olhou como se estivesse tentando averiguar como estava suportando tudo aquilo. E, embora sua metade de mulher independente pensasse que aquilo era antiquado, o resto dela adorou a idéia de que ele se preocupasse. —Estou bem — disse, antes que ele se incomodasse em perguntar. —Não, não está. Onde está Lydia? —perguntou, olhando a seu redor.
—Tinha coisas a fazer. Vai à delegacia de polícia ao meio-dia, para que façamos as declarações. —E depois, o que? Ela encolheu os ombros. — Eu vou para casa gravar fitas com minha voz para que a mãe da Stormy as ponha, e pegar CDs e o reprodutor. Depois vou fazer a bolsa. —A bolsa? —Não quero me separar da Stormy, Lou. Porém pelo que pude encontrar na Internet, essa escritora vive em Maine, e temos que falar com ela. É a única pista que temos, além do Stiles, e a ele não podemos encontrar. —Se souber algo desses filmes, certamente também o encontraremos em Maine. —Encontraremos? Quer dizer que vais vir comigo? —Sim. —Deixarão que o faça antes que este caso esteja resolvido? —Não. Terei que escapar. Menos mal que tenho a uma perita para me ajudar — lhe disse, e esboçou um sorriso, triste e torcido, mas real. Ela teve vontade de abraçá-lo, mas os pais da Storm se aproximavam pelo corredor para eles. Ela estava chorando em silêncio, e ele a abraçava. —Vai você agora, Maxie —lhe disse o pai—. Nós dois pensamos que lhe fará muito bem ouvir sua voz, e falamos com o médico. É o quarto duzentos e sete. —Está bem. Vocês precisam descansar e comer algo. Sei que querem estar aqui, mas também precisam descansar. Depois de tudo, se ficarem doentes não poderão ajudar a Stormy. —Estaremos bem. Agora vá vê-la. Ela olhou ao Lou. —Vamos, Maxie. Tome seu tempo. Eu estarei aqui te esperando. Max assentiu em sinal de agradecimento e foi ao quarto duzentos e sete. Quando entrou, pareceu-lhe por um momento que se confundiu. Aquela que estava deitada na cama não se parecia com o Stormy. Entretanto, fez-lhe caso ao sentido comum e se aproximou. Sua amiga estava pálida e imóvel. Tinham-lhe tirado o piercing da sobrancelha, e lhe tinham raspado a cabeça. Não ficava nem sinal de seu cabelo curto e loiro sob as vendagens. Entretanto, a cara de duende era a de Stormy. Estava conectada a várias máquinas e a um dispensador de soro. A enfermeira do quarto sorriu para Max. —Bom, Tempest, tem visita. Que agradável, verdade? —Chame-a Stormy —disse Max com firmeza—. E diga às outras enfermeiras também. Não responderia no nome Tempest nem que estivesse completamente acordada. A enfermeira assentiu. —E eu que pensava que o nome de Tempest é fantástico! Eu adoro! —disse, e encolheu os ombros—. Embora Stormy também seja bonita —se inclinou para a cama para ajustar os lençóis e continuou falando com o Stormy como se a moça pudesse escutar cada palavra do que lhe dizia. Max gostou da enfermeira. Gostou de sua atitude e o carinho que se refletia em seus olhos. —Meu nome é Maxine —lhe disse. —E não tem nenhum apodo que você goste mais, também?
—Mad Max, mas não o diga a ninguém. A enfermeira riu, e deu uma tapinha no ombro da Stormy. —Ouviste isso? Mad Max. Menina, cai-me bem suas amigas. Bom, sente-se, Mad Max, e lhes deixarei sozinhas um momento. Max se sentou e a enfermeira saiu do quarto. Os apitos constantes dos monitores eram quase hipnóticos. —Parece-me que vamos ter que lhes pedir que desliguem o som de todos estes aparelhos, Stormy. Não te parece? —aproximou-se mais e pegou sua mão—. Sou Max, carinho. Estou aqui, e sei o que ocorreu. Sei que não foi Lou. Não quero que se preocupe por isso. Não houve resposta. Stormy seguiu completamente imóvel e silenciosa. —Sei que está aí, Stormy. Sei que pode me ouvir — então começou a falar em voz mais baixa e mais firme—. Tudo vai bem. Seus pais estão bem, e eu também. E o homem que te fez isto vai pagar. Ouve-me? Nada. Só os monótonos apitos das máquinas. —Têm que concentrar todas suas energias em despertar. Ouve-me, carinho? É nisso no que tem que pensar. E tem que saber que não terá um momento de tranqüilidade até que o faça. Vou trazer teus CDs favoritos, e sempre vai haver alguém aqui, te falando e te martelando os ouvidos até que desperte. Ninguém vai te deixar sozinha. Entendeste? Então, o ritmo dos apitos mudou. Pareceu que se aceleravam um pouco. Max olhou as máquinas, e se deu conta de que algo tinha agitado a Stormy. Tinha sido o que acabava de dizer? «Ninguém vai deixar sozinha». —Assusta-te ficar sozinha? De novo, o ritmo se acelerou. —Ninguém vai deixar-te sozinha. Sempre vai haver alguém vigiando a porta, e alguém mais contigo aqui dentro, as vinte e quatro horas do dia. Prometo-lhe isso. Está a salvo aqui. De acordo? Não soube se aquilo teria tranqüilizado a Stormy, mas os apitos recuperaram seu ritmo normal. A enfermeira voltou e disse a Max que tinha acabado o tempo da visita. Max assentiu. —Tenho que ir um momento, carinho, mas te prometo que não lhe deixaremos sozinha. Prometo-lhe isso — se voltou para a enfermeira e lhe perguntou—: Poderia ficar aqui até que volte sua mãe? —É obvio que vou ficar. Não se preocupe. —Não te assuste, Stormy — lhe disse—. Até mais tarde. Voltarei logo, de acordo? A enfermeira assentiu em sinal de aprovação e Max saiu do quarto. Voltou para a sala de espera e apoiou a cabeça no peito do Lou, com a esperança de que ele não se queixasse. Não o fez. Abraçou-a. —Temos que pôr guardas na porta de seu quarto, Lou. Se averiguar que está viva, é possível que volte. —Não teria nenhuma razão para fazê-lo. —E se o viu? —Maxie, você também o viu. Sabe como é e como se chama. Não ser identificado não está entre suas preocupações, por algum motivo. —Mesmo assim...
—Está bem. Providenciarei. Ela fechou os olhos. —Temos tempo de tomar o café da manhã? —Sim. Liguei à delegacia de polícia e disse que estaríamos ali ao meio-dia para fazer as declarações. Ainda resta um par de horas — pegou pelo braço e foram juntos para o elevador.
CAPÍTULO XVII
Morgan dormiu até muito tarde aquele dia, mas despertou sentindo um delicioso bem-estar. Estirou-se e abriu os olhos lentamente. Notava uma deliciosa sensibilidade no pescoço, e se levantou rapidamente para examinar-lhe no espelho. Tinha um pequeno hematoma e as marcas de suas presas, mas não feridas. Não. Ele não tinha provado seu sangue, mas a tinha alimentado com o seu. Notava seu sabor na língua. O que significava aquilo? - perguntou-se. Como se convertia em um vampiro, se era possível? Estaria ela mudando? Não sabia se a vitalidade que sentia era uma parte daquela transformação ou só um efeito temporário do fato de ter bebido dele. Só sabia que foi se debilitando cada vez mais até que ele tinha ido a ela. Naquele momento se sentia mais forte. Pensou que era muito possível que tivesse morrido sem a intervenção de Dante. Sem seu sangue. Ele a mantinha com vida. Mas, até quando? Tinha que sabê-lo. E sabia onde encontrar as respostas. Nos diários de Dante. Ainda ficava um par de volumes que não tinha lido por completo. Isso era o que ia fazer durante o resto da tarde, pensou. Tirou a camisola rasgada, vestiu o roupão de cetim branco e desceu ao escritório, onde tinha os diários na caixa forte. Entretanto, quando abriu a porta da estadia viu as madeiras rotas e o buraco do chão. Aquele era o passadiço que ela mesma tinha feito a noite anterior. Se for certo que o homem queimado queria apanhar a Dante, e se voltasse e visse aquilo... —Maldito seja — sussurrou. Tinha que arrumá-lo. Tomou banho e se vestiu rapidamente e depois voltou a descer ao escritório e pegou uma das pranchas. Foi ao povoado e, em um centro de bricolagem, comprou taboas da mesma madeira, uma serra, um martelo e pregos para arrumar o buraco. Normalmente, aquele tipo de trabalho físico teria sido muito duro para ela, e teve suas dúvidas sobre se poderia fazê-lo; entretanto, ao final da tarde tinha desencravado as pranchas rotas, tinha serrado e pregado as taboas e tinha reparado o buraco. O chão não ficou perfeito. As taboas que tinha colocado eram mais claras e se notava que eram novos; além disso, não estavam tão bem colocados como o resto. Mas aquilo era o melhor que podia fazer no momento. Só restava uma hora para que se pusesse o sol. Morgan se deu conta de que estava suarenta e de que tinha o cabelo e a roupa cheia de serragem. Não queria que Dante a visse assim, se voltasse. —Tenho que me arrumar — sussurrou—. Para ele.
Quase não teria tempo de ler nada. Entretanto, era importante que o fizesse. Meia hora depois voltou para o escritório, recém tomada banho, com o cabelo limpo e perfumado de lavanda, solto sobre os ombros. Vestia o roupão branco de cetim, ia descalça e fez um bule de chá de ervas que, supostamente, dar-lhe-ia energia. Acendeu a lareira, tirou um volume da caixa forte e se sentou em uma poltrona frente ao fogo. Serviu-se uma xícara de chá e começou a ler. Em um instante estava imersa nas histórias do vampiro, as escutando com tanta claridade como se as estivesse narrando a voz rica e profunda de Dante. Sarafina tentou me advertir. —Nunca se mescle com os mortais. Nunca — me disse ao princípio de minha educação—. Nossa raça deve viver sozinha. —E o que acontece com os escolhidos? Eu conhecia a palavra, e acredito que aquilo a deixou surpresa porque eu não a tinha ouvido de seus lábios. Estávamos sentados ao lado de uma fogueira, como o tínhamos feito em nossas vidas mortais. Acredito que, a princípio, isso era o que Sarafina tinha desejado. Um bando de dois... vampiros ciganos, vivendo como o tinham feito antes. Acredito que estava tentando recuperar algo do que tinha perdido quando tinha perdido a sua família e a seu clã. Mas, é obvio, aquilo era impossível. Eu o tinha aceitado fazia muito tempo. —Escolhido são humano que têm uma conexão conosco —me respondeu—. Sabemos quais são porque o sentimos. Sentimo-nos atraídos para eles, e algumas vezes, eles para nós. Mas não devemos nos deixar conhecer, Dante. Deve entender e aceitar isso. Não devemos fazê-lo. —Podem converter-se em vampiros. Como nós —disse eu. —Sim. E sabe o que ocorre quando se transformam? Eu sacudi a cabeça. —voltam-se loucos. Disse-o como se fora um fato inevitável. —Todos? —perguntei-lhe eu, embora soubesse que não era certo. Eu não havia me tornado louco, nem Sarafina tampouco. —Alguns se voltam tão taciturnos que se negam a alimentar-se até que seus corpos se convertem em cascas que jazem como se estivessem mortas durante séculos, com suas almas apanhadas dentro. Outros ficam tão aturdidos com o descobrimento de seus novos poderes vampíricos que se entregam a orgias insaciáveis de morte e deixam tantos cadáveres em seu despertar que os humanos se dão conta do que está acontecendo e nos caçam como animais vingativos. Eles também morrem. Nós mesmos os matamos se é que não o fazem antes os humanos. Eu estava ali sentado, escutando-a absorto. —Outros se limitam a abri as veias e a sangrar-se até morrer. Outros entram deliberadamente em uma fogueira como esta e se queimam. Eu a observei durante um comprido instante, admirando como o reflexo das chamas dançava em seus olhos. —Eu era um dos escolhidos. Você o sentiu e me transformou. —Não tinha escolha. Estava morrendo. —Sim tinha escolha. Podia ter deixado que morresse.
Ela apartou o olhar e encolheu os ombros como se minhas palavras não tivessem sentido. —Acredito que sempre teve a idéia de me converter, Sarafina. Por isso voltou para a família e me escolheu. Ela cravou seus olhos em mim e me transpassou com o olhar. —Possivelmente seja certo que o desejasse, Dante, mas não o teria feito sem pensá-lo cuidadosamente. Esta não é uma vida fácil. Sei que pode parecer isso neste ponto, mas não o é. —De verdade crê que esta vida me parece fácil? Perdi tudo o que amava Sarafina. A minha mãe, a minha família, minha forma de vida. Tudo o que conhecia perdi naquela noite. Sou muito difícil, entretanto, eu não me tornei louco nem me suicidei. —Far-se-á mais duro e difícil. Eu refleti sobre aquilo durante um momento. Havia-o dito com total convencimento. Era ela tão infeliz, então? Comecei a me dar conta de quão sozinha devia ter estado durante todos aqueles anos antes que eu me tivesse unido a ela. —A maioria dos mortais não suporta o shock que supõe a mudança. A perda que supõe. Inclusive entre aqueles que se adaptam e o aceitam, há alguns que não o conseguem. Em um século, ou possivelmente dois, quando a realidade da vida eterna se revela tal e como é, com tanta maldição como bênção, com tanta dor como prazer, muitos decidem não continuar. —E o que fazem os que decidem continuar? Ela ficou silenciosa durante um momento. —Esses... suponho que finalmente, encontram uma maneira de estar em paz com o que são. Deixam de lutar contra isso. Deixam de esperar que exista uma cura que os convertam em mortais de novo. Deixam de procurar razões que expliquem sua existência ou que a justifiquem. E, simplesmente, assumem. — Você o conseguiu? —perguntei-lhe. Ela olhou nos olhos e sacudiu a cabeça. —Não. Mas vi essa aceitação nos olhos de alguns mais velhos. Ouvi-os falar disso. E estou decidida a sobreviver, a minha maneira, até que o consiga. Eu pensei que o conseguiria. Mas no momento, procurava sem descanso essa paz da que falava, e possivelmente algo mais. Eu não podia sabê-lo. —Então, o que faz, Sarafina? —perguntei-lhe—. Para ter... companhia. —Temo um ao outro. —Não me refiro a isso —tive que olhar a outro lado. Sentia-me incômodo com os aspectos luxuriosos do que eu era, e não o entendia naquele estágio tão cedo de minha vida imortal. Não podia olhá-la enquanto falava—. Quando me alimento dos humanos... especialmente das mulheres, embora algumas vezes também com os homens, sinto... bom... —Desejo —disse ela, terminando a frase por mim—. Já entendo o que é que precisa saber. Como saciá-lo. Eu assenti, com os olhos fixos no fogo. —Não te envergonhe, Dante. Somos criaturas sensuais. Está em nossa natureza. Todas as sensações se intensificam até um ponto que os humanos não poderiam suportá-lo. Sentimos as coisas mil vezes mais que antes. A dor, sim. Até um ponto em que pode nos paralisar. Mas o prazer também. Deus, a forma em que experimentamos o clímax físico está além de toda compreensão.
Secou-me a garganta, e senti que o desejo despertava em mim. —A luxúria do sangue e a do sexo está intimamente ligada em nossa raça — continuou ela—. Não pode experimentar uma sem a outra. Se tentasse ter relações sexuais com uma mortal, acabaria por mordê-la profundamente e beber todo seu sangue. O êxtase de beber o sangue realça o êxtase sexual, e vice-versa. A combinação de ambos é um prazer tão poderoso e entristecedor que alguém se abandona totalmente à sensação. Faz-lhes mal, e finalmente as matas. Eu a observei com os olhos entrecerrados. —Não acredito. —Não? —Não. Certamente, acredito que algo do que está dizendo é certo, mas não que esse prazer físico poderia conseguir que não me controlasse. Isso não. —Possivelmente — disse ela, lentamente—. É muito menos provável que matasse a um dos escolhidos, embora exista o risco. Será melhor que te limite ao sexo com outros vampiros, ou que te faça algumas amantes. —Amantes —repeti a palavra com desprezo. Ela sempre tinha alguns escravos ao seu dispor. Eram mortais, não da casta dos escolhidos. Convertia-os em zumbis completamente dedicados a ela. Bebia-se seu sangue até que estavam a ponto de morrer, e depois lhes administrava uma módica quantidade do seu. O fazia uma e outra vez, mantendo-os prisioneiros até que o vínculo ficava forjado e sua existência só estava destinada a agradá-la. Não sei como arrumava para manter relações sexuais com aqueles indivíduos sem matá-los. Acredito que sempre terminava fazendo-o, ao final, mas como os mantinha vivos enquanto isso não entendo. Não suportava a presença daqueles seres, e não tinha nenhum desejo de saber o que fazia com eles. Quanto a mim, conhecia minha própria alma. E sabia que nunca poderia me embebedar tanto de prazer para matar a um inocente. —Não acredito — disse—. Acredito que só está me dizendo isto para me manter afastado de outros, para que esteja sempre contigo. Ela arqueou as sobrancelhas. — De verdade? —Sim. Possivelmente você não tenha o controle necessário para manter relações sexuais e não matar a seu companheiro, mas eu sim. —Bem. É muito bom saber isso. Eu não me dava conta então, mas minha querida benfeitora tinha um plano em mente para me ensinar de uma vez por todas qual era a verdade. Tudo ocorreu semanas depois. Éramos hóspedes de um homem mais velho e muito rico, que estava totalmente apaixonado por Sarafina. Eu não gostava de me mesclar daquele modo com os mortais, mas não lhe importava absolutamente. Escondia-se detrás de uma fachada de mentiras e brincava de ser sua amiga e convidada. Não sentia nada por eles, nem tampouco se alimentava deles. Entretanto, eu estava seguro de que tinha estado caçando camponeses no povoado ao lado. Tinham desaparecido três pessoas desde que tínhamos chegado ali. Eu não gostava de pensar que minha tia estivesse caçando inocentes, mas aquela era sua escolha. Eu não podia me intrometer em sua vida; ela teria que enfrentar a sua própria culpa, a seu carma, ou a seu pecado, ou a qualquer que fossem os resultados de suas ações. Uma noite estava pensando naquelas coisas quando alguém chamou brandamente a minha porta. Não me incomodei em abrir minha mente e reunir impressões, um engano
que cometia freqüentemente em meus primeiros dias, temo-me. Simplesmente assumi que seria Sarafina que estava chamando, e disse: —Entre. A porta se abriu e entrou uma faxineira jovem que eu tinha visto várias vezes durante os jantares que compartilhávamos com nosso anfitrião e seus demais convidados. Noite pós noite, em festas que pareciam não terminar nunca. A moça vestia tão somente uma camisola tão fina que cada milímetro de sua cálida carne mortal era visível a meus olhos. Levava um castiçal. Tinha o cabelo espesso, loiro cor de mel, brandamente encaracolado, e o levava solto pelos ombros. Seus lábios estavam úmidos e separados. Seu corpo era arredondado e exuberante. Obriguei-me a lhe olhar na cara e perguntei: —O que quer de mim? —Você entendeu mal, milord. Vim lhe fazer a mesma pergunta. —Temo não te entender. Ela entrou no quanto o e deixou o castiçal sobre uma escrivaninha. Depois fechou a porta e me olhou com calma. —Dei-me conta de como me olhe, milord. Cansei de esperar que me peça algo, e pensei que poderia me atrever a oferecer-lhe. Era certo. Aquela moça levava uns decotes tão pronunciados que era impossível não olhar o que se sobressaía de seus peitos por cima do tecido de seu uniforme. E ela se assegurava de me pôr isso bem perto do nariz enquanto me servia. Senti-me tentado e intrigado, de uma vez. —Você não é tímido, verdade, milord? —Não. Não o sou. —Dar-se-á conta de que eu tampouco — e me demonstrou isso. aproximou-se, e enquanto cruzava o quanto para mim, deslizou as alças da camisola pelos ombros e deixou que deslizasse até o chão. Ficou orgulhosamente nua a uns centímetros da poltrona onde eu estava sentado, frente ao fogo. Eu senti todas suas essências. Estava limpa, recém banhada para mim, pensei. Seu cabelo cheirava a henna, e sua pele a aloe. E cheirei também sua excitação, e soube que estava úmida. E nem sequer a tinha acariciado. Lambi-me os lábios de impaciência. Deus sabe que fazia anos que não tinha estado com uma mulher. Tinha bebido o sangue de muitas delas, sim, em pequenas quantidades que sempre me deixavam faminto e tremendo de desejo. Ia a elas de noite, e lhes ordenava que me recordassem como um sonho. Sarafina me havia dito que não poderia fazer nada mais sem as matar. Eu não acreditava. Certamente podia tocá-la. A moça ficou de joelhos frente a mim, acariciou-me e sentiu minha ereção. Sorriu e me desabotoou a calça para me acariciar. Eu estremeci de prazer, e ela se aproximou para tomar em sua boca úmida e cálida. Pô-me os braços ao redor da cintura. Eu senti que a luxúria do sangue me invadia como uma fome escura que se acrescentava com o prazer que ela me proporcionava. Ouvia o sangue correr por suas veias. Cheirava-a. Segurei-a pelo cabelo e a obriguei a separar-se de mim e a levantar-se para que sentasse escarranchada em meus joelhos. Segurei pelos quadris e me afundei profundamente nela, tão profundamente que gritou, não sei se de dor, ou de prazer, ou de ambas as coisas de uma vez - Começou a mover-se sobre mim. Eu tinha em mente sua
garganta, sua doce jugular, mas seus peitos movendo-se frente a minha cara fizeram que trocasse de opinião. Estirei o pescoço e tomei um com a boca para lamber-lhe Ela gritou de prazer, e eu lhe cravei uma das presas na ponta e suguei com força o fiozinho de sangue que brotou. Assim que tocou minha língua, estive perdido. A sensação de necessidade, a fome que aflige qualquer indício de lógica me invadiu o pensamento e mordi mais forte para tirar dela tudo o que queria, fazendo caso omisso de seus gritos. Levantei-me, ainda dentro dela, com suas pernas me rodeando a cintura e seu mamilo sangrando em minha boca e caminhei para a cama. Deixei-me cair sobre ela e soltei seu peito para entrar nela com tanta força que a cama se moveu com minhas investidas. Ela estava gritando alto da paixão, e temi que a ouvissem. Tampei-lhe a boca com a mão e afundei as presas em seu outro peito, mordendo sem controle, sugando tudo o que brotava. Empurrei com força, grosseiramente, e mordi sua carne deliciosa uma e outra vez até chegar à garganta. Minhas presas afiadas se afundaram em seu pescoço como se fora de manteiga, rompendo a cartilagem e atravessando a veia. Afundei-me nela por completo enquanto seu coração bombeava seu sangue para que eu bebesse seu sacrifício. Devorei-a e alcancei o clímax, e foi mil vezes mais intenso que todos os clímax que tinha experimentado quando era humano. Um milhão de vezes. Meu corpo esteve a ponto de fazer-se pedacinhos. Fiquei cego por uns momentos. Surdo. Meu ser estava por completo apanhado nos dois pontos de união com ela, pelo sexo e pelo sangue. Sentia dois arcos de eletricidade, como raios. Era um prazer tão intenso que parecia uma agonia. Gritei, liberando sua garganta, jogando a cabeça para trás para poder rugir em um êxtase selvagem. Quando a sensação se desvaneceu por fim, fiquei ali em cima dela, adorando a sensação de sua vida me percorrendo as veias e a satisfação do clímax sexual. Sentia o calor de seu sangue me dando poder. Pouco a pouco fui consciente do som rítmico de uns aplausos lentos detrás de mim. Levantei a cabeça, enfoquei os olhos e vi a Sarafina do outro lado do quarto, aplaudindo. —Bem feito, Dante. Muito bem feito. Olhei à mulher que tinha debaixo de mim. Tinha os olhos completamente abertos e fixos. Eu tinha lhe destroçado a garganta. Tinha-lhe aberto a carne e a veia, arrancado o músculo e deixando seu interior à vista. Levantei-me e me joguei para trás, e então vi com claridade minha obra. Tinha feridas menores nos seios, braços, ombros, inclusive na mandíbula. Tinha sangrado, mas só um pouco. Eu tinha deixado escapar muito poucas gotas do néctar que corria por suas veias. Levei uma mão à boca, em estado de shock, mas a retirei com sangue. Tinha pela cara. Sabia que me tinha enterrado naquela ferida para tentar tirar mais e mais dela. As provas estavam em meu peito e em minhas mãos. Voltei-me para a Sarafina, horrorizado, e lhe sussurrei: —por que não me deteve? Por quê? —Te deter? —ela sacudiu a cabeça—. Eu a envie, Dante. Há algumas lições que só se aprendem com a prática. Agora já sabe o que ocorre quando compartilha sua paixão com uma mortal. Será melhor que guarde isso. As únicas opções válidas que ficam são os escravos ou outros vampiros se está decidido a não matar. Embora também pudesse trocar sua opinião nisso, agora que comprovaste quanto é bom. —Eu não Mato.
—Agora sim. Como um lobo, ou como um tubarão, ou como qualquer depredador, provaste-o, Dante. E voltará a fazê-lo. Somos depredadores. É o que somos. Mas deixemos a discussão para mais tarde. Agora temos que sair daqui antes que descubram isto. Envolve a moça em um lençol e vá lavar-se. Eu recolherei nossas coisas. —Mas... —Mas nada. Provavelmente não se darão conta até que alguém entre aqui, amanhã. A ela não buscarão. Escreveu uma nota dizendo que fugia com um moço dos estábulos. Disse-lhe que, uma vez que provasse seu corpo, lhe quereria levar conosco —jogou a cabeça para trás e riu delicadamente—. Seriamente, Dante, não sabia que fosse semelhante garanhão. —Te cale, Sarafina —disse envergonhado e espantado, e subi as calças rapidamente —É minha tia, pelo amor de Deus. —Deus não tem nada que ver com isto, menino. E não sou só sua tia, mas também sua mãe, senhora e irmã. Os laços de sangue do passado já não significam nada. Agora somos outra classe de família. E eu poderia suportar tudo o que deste a ela e mais, sem nenhum dano. Eu a olhei com frieza. —Os laços de sangue do passado sim têm significado para mim, Sarafina. Prometote que nunca estaremos juntos desta maneira. Eu vi a dor e a ira em seus olhos. Possivelmente ela estava morta em vida tanto tempo que tinha perdido a noção do que era aceitável segundo o código dos mortais. Mas eu não. Fiz-lhe mal com minhas palavras, mas era o que pensava e o que sentia. E embora odiasse o que me tinha feito aquela noite, tive que reconhecer que tinha aprendido uma lição muito importante. Não podia ter relações sexuais com os mortais. Morgan fechou o livro, espantada. Havia exceções. Tinha falado algo sobre escravos, o qual não parecia nada apetecível a Morgan. E algo sobre «os escolhidos», que entendia ainda menos. E outros vampiros. Nada de como um vampiro transformava a outro. Nada útil, exceto que tinha averiguado por que Dante se negou a deitar-se com ela. Não queria matá-la, e ela, certamente, não queria que a matasse. Olhou-se e se deu conta de que tinha que trocar-se. Rapidamente ficou de pé, colocou o volume na caixa forte e colocou a falsa estante em seu lugar. Depois sai do escritório e subi correndo as escadas. Tinha que vestir outra coisa, porque não queria tentálo e que... que... que lhe fizesse aquilo mesmo. Entretanto, no mesmo momento em que fechou a porta de seu dormitório, ouviu-o. Ouviu-o dentro de sua mente. «Morgan». Não prestou atenção nele, e abriu uma gaveta da cômoda. «Morgan!». As portas do balcão se abriram, empurradas por uma rajada de vento. Ela se virou, assustada. Entretanto, ele não estava ali, como esperava. Morgan apareceu e então, viu-o. Estava embaixo, a meio caminho entre a casa e o escarpado. Estava-a olhando. «Sai aqui. Vem comigo». Realmente era possível que estivesse ouvindo-o sem um som? Pensou em lhe dizer
que só demoraria um minuto, mas ouviu a palavra final. «Agora». Sentiu-se arrastada. Não pôde convencer-se a não obedecer e saiu da casa. Caminhou descalça pela erva úmida até que esteve frente a ele. Dante deslizou o olhar por seu corpo. Ela sentiu a carícia e estremeceu. — Agora temos tempo. De fato, temos a noite inteira. E vais me dizer, Morgan, como é possível que saiba tantas coisas de mim. Ela o olhou nos olhos e se deu conta de que era incapaz de pensar com coerência. Não havia nada mais que submissão em sua cabeça. Obediência. Custou-lhe um tremendo esforço apartar seu olhar do dele para evitar que lhe obrigasse a dizer tudo o que sabia, mas o conseguiu. Olhou por volta do mar. Sua mente lhe sussurrou que se lhe falava dos volumes que havia na casa, ele os levaria. E, Deus, não podia perder seu único vínculo com ele. —Como o tem feito? —perguntou-lhe em um sussurro. —O que? Chamar-te para que viesse aqui? —perguntou-lhe, e quando ela assentiu, ele suspirou—. Sou um vampiro. Dos velhos. —Aprendeste a controlar a mente com os anos? —Até certo ponto, sim. —Então, poderia chamar a qualquer um e fazer que viessem, inclusive se não quisessem? —perguntou-lhe, olhando para o chão. Tudo para evitar seus olhos. Levantou-lhe o queixo brandamente com um dedo. —Você sim queria. Ela estremeceu. —É mais difícil convencer a alguém de que faça algo que não quer. Mas me dá a impressão, Morgan, de que poderia te convencer a fazer algo que eu quisesse. —Eu... Ouvi sua voz em minha mente, quase tão claramente como se estivesse a meu lado, me falando. Ele assentiu. —Isso ocorre também com todo mundo? Naquela ocasião, foi ele quem apartou o olhar. —Vim aqui fazer perguntas, não às responder. —Mas eu também tenho perguntas, e necessito as respostas tanto como você. Ele ergueu os ombros. —Então, suas condições mudaram. —Eu não... —Ontem à noite me ofereceu contar isso tudo se tomava. Hoje já está pronta para intercambiar essa informação em troca de sexo. Quando ele pronunciou as palavras «se tomava», a mente do Morgan se encheu de imagens. «Se tomava». Aquilo implicava submissão, disposição. Implicava que ele teria a autoridade e seria dono dela de qualquer forma que desejasse. Ela desejava tudo aquilo, e mais. Suas mãos lhe sujeitando os pulsos, sua boca movendo-se por seu corpo, beijando-a, provando-a e mordiscando-a, saboreando sua carne e seu sangue enquanto ela gemia de dor e de prazer. — Basta! Sua voz, rouca e profunda, tirou-a de seus pensamentos. Ele se virou e tinha os dedos apertados contra as têmporas e os olhos fechados.
—Vejo seus pensamentos tão claramente como você, e tenho que te advertir que meu controle tem um limite. —Sinto muito. Ele ficou imóvel durante um momento, recuperando sua compostura. Finalmente, tomou ar e se ergueu de novo, encarando-a. —Rogo-te que me conte o que sabe agora. Quanto mais tempo passo perto de ti, mais perigo corre. Ela controlou o sentimento de medo. —Perigo do que, Dante? De morrer? É um risco pequeno, na verdade. Estou morrendo de todas as formas. Não sei se teria sobrevivido hoje se você não me houvesse... —recordou como tinha bebido de seu pescoço e rapidamente apagou a lembrança de sua cabeça—. Preciso saber umas quantas coisas antes. —Para poder as usar em seu próximo roteiro? Ela baixou a cabeça. —Quando escrevi o roteiro, não sabia que era real. Acreditava que estava usando as ilusões de um velho louco que provavelmente tinha morrido fazia muito tempo. Suspirando, ele se voltou e começou a andar para o escarpado. Seus passos eram poderosos e largos, e ela teve que dar dois por cada um de Dante. —Tem que acreditar Dante. Nunca te trairia. Já não. —E por que não? —Porque estou apaixonada por ti. Chegaram ao bordo do escarpado e ele se deteve quando ela pronunciou aquelas palavras. Ficou ali, olhando-a fixamente. —Não me conhece. Não sabe o que sou na realidade. Sua mente de escritora criou uma fantasia de um mito banhado de romantismo que não tem nada que ver com a realidade. Tem que fixar isto em sua mente mortal, Morgan. Os vampiros são depredadores. Assassinos. E os mortais são nossas presas. —Foi assim com a Laura Sullivan? Ela também era sua presa? Dante lhe lançou um olhar frio. —Eu era jovem e estava apaixonado. Acreditei que poderia controlar minhas tendências naturais com ela. Felizmente, voltou-se contra mim antes que tivesse a oportunidade de averiguá-lo —disse ele—. Aquela foi a segunda parte de uma lição vital, Morgan. Os vampiros e os mortais são inimigos mortais. Crê que uma cobra e uma mangosta poderiam amar-se? Seu amor estaria fadado ao fracasso. Um deles destruiria ao outro. Ela tragou o medo. —O que significa ser um eleito? —perguntou-lhe. —Onde ouviste o termo? —No mesmo lugar onde averigüei as demais coisas sobre ti. Sei que certos humanos são chamados os escolhidos. E sei que há algo em seu sangue que faz que os vampiros o sintam e sejam protetores para eles. —Então, já sabe o mesmo que eu. —Não acredito. —Isto é uma perda de tempo. Parto — disse, e se voltou. —Sou um deles? Significa que não tenho que morrer? O ficou em silêncio.
Ela se aproximou e pôs as mãos nos seus ombros. —Quando você me alimentou de seu corpo, Dante, senti-me... viva. Meus sentidos se aguçaram e me senti viva e forte. Mas não durou. Quero me sentir assim durante todo o tempo. Quero ser o que você é. —Assim já chegamos à essência da questão. Vê a entrada no mundo dos imortais. Isso é o que significam em realidade todas essas declarações de amor e de desejo. Não tem a força de caráter suficiente para agüentá-lo, Morgan. Estaria morta em menos de um ano. —Isso é um ano mais do que tenho agora. —Não o farei —disse ele, sacudindo a cabeça—. Não quero curar esta loucura com outra. —Então, é possível. Sou uma escolhida! Ele suspirou frustrado e exasperado. — Sim, maldita seja, sim. Tem o antígeno Belladonna no sangue. Por isso está morrendo tão cedo. Todos os de sua casta morrem jovens. Ela assentiu, processando a informação e revisando a história que tinha lido em sua mente. Era pouco provável, segundo o que lhe tinha contado sua demoníaca tia, que fizesse mal a uma escolhida. —Como se faz? Seus olhos brilharam na escuridão. Estava zangado com ela por lhe obrigar a seguir seu jogo, mas ao mesmo tempo se sentia excitado com a perspectiva. Seu olhar se posou na garganta do Morgan. —Afundo as presas em seu pescoço branco, Morgan, e bebo seu sangue. Bebo até que esteja à beira da morte. Se tomar muito, morrerá. Depois, quando está te debatendo entre a vida e a morte, eu te alimento com meu sangue. Bebe de minhas veias, e tragas minha maldição. O vento soprou com força desde mar. —E isso é tudo? —Depois, dorme. Desperta. Alimenta-te. E o ciclo está completo. Ela assentiu firmemente. —Muito bem. Então, faz apartou o cabelo do pescoço e dos ombros e inclinou a cabeça para trás, lhe oferecendo a garganta. Ele a olhou com um brilho feroz nos olhos. Com o dedo indicador, percorreu brandamente a pele de seu pescoço e gruiu muito baixo, como um animal da noite. — Sim, quer fazê-lo. Sabe que queres —lhe sussurrou. A respiração de Dante era entrecortada, como se estivesse lutando com ela, com sua própria fome e com seu desejo. Naquele momento recordou o que tinha lido: que o desejo sexual e a fome de sangue eram uma mesma coisa para os mortos em vida. Ele virou a cara para não olhá-la. Então, Morgan desabotoou a camisola a toda pressa e o vento a arrancou dos ombros. Ficou nua, sentindo o vento gelado no corpo. O olhar de Dante voltou a posar-se nela. Morgan se aproximou e lhe rodeou o pescoço com os braços. Depois o beijou. Com um suspiro, tremendo, lhe devolveu o beijo, sustentando seu corpo com ternura. Percorreu-lhe a mandíbula com os lábios e chegou ao pescoço, onde a beijou e a lambeu. Com um grande esforço, levantou a cabeça. —Por favor, não me obrigue a te fazer mal. Não poderia suportar, não entende? E
sei que te farei mal. — Comigo será diferente. Sou uma escolhida. Quero-te, e sei. Não deixarei que me faça mal, Dante. —Não poderia me deter. —Não tenho nada que perder. Por favor, Dante, por favor... Grunhindo, ele abriu a boca e afundou as presas em seu pescoço. Morgan sentiu uma dor aguda e, quase imediatamente, quebras de onda de êxtase enquanto ele se alimentava em seu pescoço. Houve um som, um assobio no ar e um golpe. Dante gemeu de dor e a soltou, cambaleando para trás. Morgan caiu ao chão, enjoada e débil. — Te peguei, maldito! —gritou uma voz. Morgan olhou para cima e viu um dardo aparecendo no ombro de Dante. O sangue brotava ao redor da ferida. Depois, olhou para o outro lado e viu o homem das cicatrizes aproximar-se correndo com uma pistola de suspensão na mão. —Morgan... —Estou bem. Corre, Dante. Vai. Agora! E ele o fez. Desvaneceu-se em um só movimento, um salto pelo escarpado. Quando saltou, Morgan gritou de puro instinto. E então, o caçador se ajoelhou a seu lado, olhando para baixo. Ela também apareceu, mas Dante não estava ali. Ela ficou de joelhos e deu um golpe débil no homem. —Imbecil! Que demônios está fazendo? O homem passeou seu olhar por seu corpo nu na escuridão, tanto como quis. Então, ela se levantou e viu sua bata atirada no chão a uns metros de distância. Tomou e a pôs. —Acabo de lhe salvar a vida! —gritou o homem, andando detrás dela. —Atirou no meu namorado, e provavelmente o matou — lhe soltou ela—. Vou chamar à polícia. —Não vai chamar a ninguém! —pego-a pelo ombro e a obrigou a volta-se. Ela se envolveu no roupão, agarrando bem o pescoço para cobri-se—. Ao menos, até que não me tenha mostrado a garganta. —Já teve a oportunidade de ver o que quis — replicou ela—. Deveria havê-la aproveitado. —Estava bebendo seu sangue. E você o estava permitindo. Desgraçada! —Você está louco — Morgan começou a andar para a casa, mas os joelhos lhe falharam e teve que apoiar-se no tronco de uma árvore para tomar ar. —Ele tomou muito — disse o homem—. A teria matado se eu não tivesse chegado. —Estou em estado de shock, por ter visto como você atirou no meu namorado com uma pistola de suspensão e ele caía pelo escarpado, lunático! —então, Morgan acreditou ouvir o ruído de um carro e de uma porta que se fechava. Ao segundo viu claramente as luzes. Ele a agarrou de novo pelo braço. —Me diga a verdade, maldita seja! —Êh! O que está ocorrendo aqui? —gritou a voz de um homem, enquanto se aproximavam três figuras—. Sou policial, senhor, e será melhor que solte à senhorita antes que eu decida lhe colocar um balaço no traseiro. O homem das cicatrizes a soltou, voltou-se e saiu correndo.
O recém-chegado balbuciou uma maldição e saiu a persegui-lo. As outras duas pessoas eram mulheres. Elas se aproximaram da Morgan e lhe perguntaram se estava bem. Ela não pôde levantar a cabeça. Manteve o roupão bem fechado para evitar que elas vissem as marcas que tinha no pescoço. —Não sei quem são, mas estou contente de que tenham chegado tão oportunamente — murmurou. —Nos diga onde está a porta mais próxima — disse uma delas—. A levaremos dentro. Ela assentiu e mostrou a porta traseira, a da cozinha, e as mulheres a levaram quase nos braços. Morgan não ergueu a cabeça e manteve a o roupão bem agarrado a seu pescoço. —Me esperem aqui, por favor. Necessito um minuto... Arrastou-se pelas escadas a sua sala. Encontrava-se muito fraca. A interrupção daquele miserável podia significar o fim de tudo. Tirou o roupão e vestiu um pijama de seda e um pulôver de pescoço alto negro por cima. Quando ficou frente ao espelho, viu uma mulher pálida e frágil. Baixou um pouco o pescoço do pulôver e viu as duas marcas, diminutas, vermelhas. Tragou saliva e colocou a gola do pulôver em seu lugar. Depois escovou o cabelo, enquanto se perguntava quem seriam aqueles estranhos. Teria que descer as escadas e falar com eles em questão de minutos. Como, se nem sequer era capaz de manter-se de pé? Teria que conseguir. Com os olhos cheios de lágrimas, aproximou-se da janela e olhou ao céu da noite. —Deus, Dante, está bem? Diga-me que está vivo. Diga-me algo. Se tiver morrido por minha culpa... «Morgan». Ouviu sua voz claramente na mente, e ao mesmo tempo sentiu uma dor insuportável. apertou-se as mãos na cabeça e caiu de joelhos. «Voltarei». Era uma promessa, feita com outro golpe de dor. —Dante, onde está? —disse em voz alta—. Deixe-Me te ajudar. Deixe-me fazer algo. Mas não houve resposta. Nada. E ela soube que não lhe diria nada mais, porque cada vez que lhe enviava seus pensamentos, também lhe enviava sua agonia. Como podiam estar tão conectados? Possivelmente o fato de que tivesse bebido dela aquela noite tivesse algo haver. —Quero-te, Dante — sussurrou—. Juro-te que não sabia que esse homem ia vir. Juro-lhe isso. Eu o matarei para te proteger. Farei — Deus, não podia suportar que ele acreditasse que ela tinha planejado todo aquilo para matá-lo. Caíram-lhe lágrimas pelas bochechas. Entrou de novo no quarto, deixando as portas do balcão abertas no caso dele querer voltar. Depois volto-se , ergueu os ombros e se dispôs a enfrentar-se com os estranhos.
CAPÍTULO XVIII
Maxine caminhava pela enorme cozinha da Morgan da Silva observando todos os detalhes da decoração e o mobiliário. Havia uma ilha no meio com uma pia e quatro
tamboretes, e Lydia ocupou um deles. Max não podia sentar-se. Não enquanto Lou estivesse lá fora na metade da noite, tentando caçar a Deus sabia o quê ou quem. —Viu o mesmo que eu? — perguntou-lhe, embora estivesse segura que a Lydia sim o tinha visto. —O que? —perguntou-lhe a mulher. —No pescoço do roupão que vestia. Lydia a olhou sem compreender, e depois sacudiu a cabeça. —Sangue, Lydia. Só um pouco, uma ou duas gotas. Mas estava aí. Por isso ela apertava a bata ao redor do pescoço. —Eu pensei que tinha frio, ou medo. Possivelmente as duas coisas. Max agitou a cabeça com veemência. —Estava escondendo algo. Não viu a rapidez que correu para escapar daqui? — Estava aflita, Maxine. —Aposto o que queira como vai descer com algo que lhe cubra o pescoço — caminhou para a porta de atrás de novo e apartou a cortininha para ver algo—. Deus, oxalá já houvesse retornado —disse com um suspiro de frustração, agarrando o pomo—. Demônio. Vou buscá-lo — e justo quando abriu a porta, Lou estava subindo as escadas, ofegante. Max se controlou para não abraçá-lo, mas o olhou bem para assegurar-se de que não tinha sofrido nenhum dano. —Apanhaste-o? —foi-se. Não há nem rastro dele. —Maldito seja. Lou se deixou cair em um dos tamboretes, mas levantou-se pouco segundos depois, ao ver que a mulher a que tinham resgatado sem querer entrava na cozinha. Max olhou diretamente a seu pescoço e viu o pulôver negro de pescoço alto. Então lançou a Lydia um sorriso auto-suficiente. Entretanto, Lydia não estava olhando-a. Ela e Lou estavam olhando à mulher como se tivessem visto um fantasma. Com o cenho franzido, Max voltou a olhá-la. Então piscou, boquiaberta. —Meu Deus... —Quem é? O que é isto? —perguntou a mulher, olhando a Max com cara de perplexidade. Max a compreendia, porque ela tinha as mesmas perguntas. — São idênticas! —disse Lou, como se ninguém se desse conta. «Não, não somos», pensou Max. Morgan da Silva estava pálida como um fantasma, muito magra e tinha o cabelo muito comprido, suave e brilhante. Maxine não era assim. Levava o cabelo curto, e se o deixava crescer um pouco, frisava-se. E ela tinha cor na cara, ao menos, o suficiente para distingui-la de um cadáver. Mas além daquelas diferenças... aquela mulher poderia ser sua irmã gêmea. Max se sentou em um tamborete e a palavra «gêmea»- repetiu como um eco em sua cabeça. Deus, seria possível? —É Morgan da Silva—disse Lou, afirmando-o. —Sim. Mas não entendo do que trata tudo isto. Por que...? O que... —Senhorita da Silva, por favor, isto é uma surpresa tão grande para nós como para você—disse Lou, brandamente, e ao ver que estava tremendo, agarrou-a pelos braços da maneira que ele o fazia, agradável, sem ameaçar.
—Venha sente-se—lhe disse, e ela o fez. Então ele olhou a Max, sem saber se era para animá-la a que dissesse algo ou para certificar-se de que estava bem. Possivelmente um pouco das duas coisas. Ela o olhou sem saber o que dizer. Lou o entendeu, e começou a falar ele mesmo. —Meu nome é Lou Malone—disse a Morgan—. Sou policial, do White Plains, Estado de Nova Cork. Ela é Maxine Stuart, e ela Lydia Jordão. São amigas minhas. Olhando a Max sem piscar, Morgan lhe perguntou: —Você também é policial? —Investigadora particular—respondeu ela. —É adotada? —Sim. E você? Morgan assentiu. —Quando nasceu? —Em quatro de maio de mil... —Novecentos e setenta e sete—terminou Morgan. Max viu pela extremidade do olho que Lydia estava levantando, assimilando com a única parte de seu cérebro que era capaz de assimilar algo mais que à mulher que tinha em sua frente. —Lydia?—perguntou Lou. —Isto é um pouco privado, Lou. Deveriam estar sozinhas. Assentindo, Lou pôs uma mão no ombro da Max e o apertou. —Vamos dar um passeio, dêem um grito se nos necessitarem. Ela assentiu vagamente. Quando a porta se fechou, estava a sós com aquela mulher pálida e frágil que poderia ser sua gêmea. Que possivelmente o era. —Não posso acreditar. Eu sabia que era adotada, mas ninguém se incomodou de me dizer que tinha uma irmã gêmea por aí. Morgan a olhou. —Quer dizer que esta visita surpresa não é a culminação de algum tipo de busca? Demônios, tinha um tom de voz um pouco hostil. —Não, não é a culminação de nada. Até que te vi a cara não sabia nada. —Alguma vez me tinha visto antes? —Não, é a primeira vez que venho a Maine. —Refiro aos jornais e a televisão. Então Max o entendeu. —Ah, claro. Agora deve ser famosa, com o a classificação. —Um pouco—disse ela, desdenhosamente. Parecia que estava tentando adotar uma postura autoritária, muito erguida, com a cabeça muito alta e os olhos cravados nela. Mas Max notava que lhe estava custando muito esforço, o que danificava o efeito. —Então, se não sabia nada de mim, o que está fazendo aqui? —Deus, isso tem importância? —Max se levantou e se aproximou dela. Levantou uma mão e roçou a cara de Morgan com as pontas dos dedos—. Somos irmãs. Não posso acreditar, é... Morgan baixou o olhar. —Compartilhamos um útero durante nove meses. Não é para tanto. Max deixou que a mão caísse ao lado do corpo. —Não significa nada para ti?
—Obviamente nossa mãe não pensou que tivesse importância. Por que demônios nos teria dado em adoção e, além disso, separadas, se não? É só uma coincidência biológica. —É uma bruxa sem sentimentos, não? Morgan atravessou a Max com o olhar. —Por que não me diz o que quer de mim para que possamos ir diretamente ao grão? —O que quero de ti? A mulher pálida arqueou as sobrancelhas com uma atitude de expectativa. Max pôs os olhos em branco. —Oh, já o entendo. Tem dinheiro. Êxito. Pensa que estou aqui por isso, que quero tirar algo. —Acabo de ser nomeada para um grande prêmio, publicou-se em todos os jornais e revistas. É quer que acredite que isso não tem nada que ver com seu repentino interesse por mim? —Já disse que não sabia que existia até que te vi —Max disse aquilo com tanta firmeza como pôde, mas sem gritar—. A razão pela que vim não tem nada que ver com sua maldita nominação. Deus, quem demônios te criou? —Um par de toxicômanos de Hollywood, embora não seja de sua incumbência — fechou os olhos e a cabeça lhe caiu para frente. Não tentou levantá-la—. Uma vez mais, para que vieste? —Porque minha melhor amiga está no hospital, com uma bala no cérebro, em coma, e provavelmente não se recupere. E quero saber quem é que a pôs aí. Morgan piscou. Parecia que finalmente Max tinha conseguido penetrar na dura couraça que rodeava a alma daquela mulher. —Sinto muito. Mas não entendo o que isso tem haver comigo. —Tem haver com os vampiros, Morgan. Ela estremeceu, e Max notou, embora houvesse tentando dissimular. —Isso é ridículo. Os vampiros não existem. —Não estou falando de vampiros de ficção. Estou falando dos de verdade, como o de seu filme. —Hoje tive um dia muito difícil —disse Morgan, brandamente—. Não quero ser mal educada, mas tenho que te pedir que parta. Aquela mulher não se encontrava bem, era evidente. —Partirei assim que te tenha contado uma história muito curta, de acordo? Morgan assentiu, olhando a Max nos olhos durante um segundo. — Sempre e quando for curta... —Tão curta que ainda não tem final. Em minha cidade havia uns edifícios do governo, onde se dizia que havia uns laboratórios que investigavam sobre enfermidades como o SIDA e o câncer. Era um complexo fechado que estava ali desde que eu tive uso da razão. Entretanto, faz cinco anos ardeu por completo. Eu penetrei no incêndio sem que me vissem os bombeiros, com a esperança de conseguir uma pista que me dissesse o que se esteve fazendo em realidade naqueles edifícios. Morgan a interrompeu. — E por que pensava que havia algo estranho ali, além dos laboratórios de investigação? —Porque havia guardas armados, câmaras de vigilância, veículos com matrículas do governo há todas as horas... As cercas tinham alambrados eletrificados, e havia cães.
Quando entrei, encontrei duas coisas: um cartão de identificação e um CD-ROM cheio de informação sobre vampiros. Alguém se chamava Dante, e a informação sobre sua vida que encontrei no disco era muito similar a de seu filme. Morgan a estava olhando com muita atenção. Já não parecia que estivesse sofrendo ao ter que escutar aquela historia para livrar-se de sua narradora. Estava absorta. —E o cartão de identificação? —Era de um tipo chamado Frank W. Stiles, um agente da Divisão de Investigações Paranormais, que acredito que é uma agência secreta da CIA. —Frank W. Stiles —sussurrou Morgan. —A razão pela que encontrei aquelas coisas foi que caíram de um homem que tinha estado no incêndio e que tinha a cara e a cabeça muito queimadas. Quando tentei sair, o lugar estava rodeado pelos militares, mas consegui escapar com as duas coisas. Entretanto, o homem me viu. No dia seguinte, alguém me telefonou para dizer que se alguma vez repetisse algo do que tinha visto, mataria a meus melhores amigos e a minha mãe. A minha mãe adotiva. —E essa garota a quem atiraram é sua melhor amiga? —Sim. —E crê que tem relação? Disse que esse incidente ocorreu faz cinco anos. —Há mais. Recentemente, houve um assassinato em nossa cidade. Morreu uma mulher muito próxima a Lydia, Morgan. Parecia o trabalho de um vampiro, e me dei conta de que não podia seguir ocultando a informação que tinha. Não, se havia gente que estava morrendo. Assim disse ao Lou o que sabia e lhe mostrei o CD-ROM. O Seguinte que ocorreu foi que encontraram a minha amiga no apartamento do Lou. Tinham-na disparado na cabeça com uma pistola que ele guardava de reserva em sua casa. Sei que Lou não o fez, mas está bastante claro que alguém tentou incriminá-lo. Sei que foi Frank Stiles. Sei. —Quando ocorreu isto? Max se perguntou que importância podia ter aquilo. —Ontem à noite, entre as nove e às dez da noite. Por quê? —E quanto se demora para vir de carro até aqui? Veio de carro, verdade? —Sim. Umas seis horas, mais ou menos. Morgan assentiu lentamente. Parecia que já não tinha tanta vontade de livrar-se da irmã a quem acabava de encontrar. —Então, a quem está perseguindo? Ao vampiro que matou a essa mulher ou ao homem desfigurado que atirou na sua amiga? Max ficou perplexa. —Eu não disse que estava desfigurado. Morgan baixou a cabeça, sacudindo-a rapidamente. —Não, mas disse que se queimou muito. É o mesmo. —Não é. —Eu acreditei que... —Viu-o. Demônios, é obvio que o viu. Provavelmente, ele fez a mesma conexão que eu quando viu o filme. —Está pondo palavras em minha boca. Eu nunca disse... —Só quero saber a verdade. — Eu não sei a verdade! —disse Morgan, e cambaleou. Teve que agarrar-se ao armário para não cair.
—Parece que não te encontra bem, Morgan. Está doente? —É... algo crônico. Tenho um antígeno no sangue, a Belladonna. Embora, se somos gêmeas, supõe-se que você também deveria o ter. —Não. Eu sou do grupo A positivo. Tudo normal. —Isso é possível? —Não sei—respondeu Max—. Suponho que teremos que perguntar a um médico, ou algo assim —baixou a cabeça de novo para olhá-la, e depois perguntou—: Quem era aquele que te estava atacando? Era Dante? Morgan sacudiu a cabeça lentamente. afastou-se de Max tremente, arrastando os pés. —Era Stiles. Como você, ele pensa que Dante é real e que eu posso lhe conduzir até ele. E, embora o fosse... Então, enquanto desabava, Max a tomou nos braços para que não caísse ao chão. —Você sabia, verdade, Lou? Ele olhou a Lydia à cara enquanto caminhavam pela borda do escarpado. Embora sua cara tivesse perdido o viço da juventude, continuava sendo uma mulher muito bonita. Aspirou o ar do mar y_ sentiu a umidade na cara. Gostava do oceano ali. Era selvagem. —Suspeitava —admitiu, finalmente—. Do Maxie. Por isso lhes apresentei. Sinceramente, não acreditava que fosse a apoiar a teoria dos vampiros como o está fazendo. Era só uma desculpa para que se conhecessem e se dessem conta do que para mim era óbvio. —E Morgan? —perguntou ela. —Não sabia nada dela, Lydia. Juro. —De toda forma, tinha que ter me dito da Maxie. —Pareceu-me que era algo que tinham que descobrir vocês mesmas—lhe pôs um braço sobre os ombros—. Sinto havê-lo feito mal, carinho. Sabe que quero o melhor para vocês. —Sei. —vais dizer-lhes. Ela suspirou. —Não sei. Preciso pensar. Os dois se voltaram para a casa para ouvir que Max os chamava. Lydia agarrou ao Lou pelo braço. —Haverá tornado? —Vamos —disse Lou, e ambos puseram-se a correr. Quando entraram pela porta da cozinha, viram a Morgan inconsciente no chão e a Max ajoelhada a seu lado, muito assustada. —O que ocorreu? — Acaba de desmaiar! Lydia se aproximou e se ajoelhou junto a Max. —Está gelada —disse, tocando a cara de Morgan. —Acredito que está doente —disse Max—. Lou, poderia levar à cama? Vou ver se encontro o número de telefone de algum médico, ou algo assim. Lou assentiu e tomou a Morgan nos braços. Pesava como uma pluma. Depois subiu as escadas com ela e começou a procurar o quarto.
Max se sentou junto à cama daquela estranha mulher e a observou. Eram duas da madrugada. Lou tinha ido dormir em um dos quartos, e Lydia em outro. Naquela casa havia uns doze quartos, todos preparados, que aparentemente não se usavam muito. Não havia sinais de que sua irmã tivesse muita companhia. Tudo era muito estranho. Max seguiu observando sua cara, pensando que necessitava respostas, e que uma delas estava sob o pescoço alto da Morgan. Umedeceu os lábios com nervosismo e se inclinou para frente, muito devagar. Seus dedos roçaram o tecido negro. «Com cuidado», disse-se a si mesma. «Não lhe toque a pele, ou despertará. Cuidado...» Beliscou o tecido com dois dedos e puxou ele tão brandamente como pôde. Inclinouse ainda mais para poder ver o que havia debaixo. Ali estavam. Exatamente como ela tinha imaginado que seriam. Duas marcas diminutas de cor vermelha. —Dante, nooo —gemeu Morgan, em sonhos. Max se sobressaltou tanto que soltou o pescoço do pulôver de repente e deu um passo para trás. —Te afaste! —disse Morgan, com aspereza. Começou a mover a cabeça pelo travesseiro—. Não, Dante, não venha —então começaram a cair as lágrimas. Max não pôde evitar sentir uma dor nas vísceras. Aquela era sua irmã, a que um vampiro tinha atacado. Max não sabia por que demônio Morgan insistia em negá-lo, mas as provas estavam ali, nas marcas de seu pescoço até os pesadelos nos quais pedia ao monstro que não voltasse. —Não, não! Max se inclinou para ela de novo e pegou a pelos ombros. —Tranqüila. Não passa nada, está a salvo. A mulher deixou de lutar. ficou imóvel e sua respiração começou a acalmar-se. —Não passa nada —sussurrou Max. Morgan piscou e abriu os olhos. Custou-lhe um momento recordar quem era Max. Aquele breve instante de shock foi seguido de uma pergunta: —Ainda está aqui? —Desmaiaste no andar de abaixo. Lou te trouxe aqui acima e te deitou. Ela assentiu, enquanto fechavam os olhos. —Estou bem. Já pode ir. —Isso não é o que disse seu amigo David. Ela abriu muito os olhos de novo. —David? Falastes com ele? Mas... como? —Estava tentando encontrar um número de telefone de um médico, ou de algum membro de sua família, ou algo, e não estava tendo muita sorte, quando soou o telefone. Era um homem chamado David Sumner, que parecia muito preocupado contigo. Expliqueilhe o que tinha passado... —Não tinha por que havê-lo feito —sussurrou Morgan. —Chegará aqui amanhã pela manhã. Pediu-me que ficássemos aqui até que ele chegasse. Assim o fizemos. —Não necessito que me vigiem.
—Sei o do Dante—disse Max. —E eu também. É um personagem de ficção. —Refiro-me ao Dante de verdade, que te deixou as marcas no pescoço. Morgan colocou a mão no pescoço para ocultá-lo, mas quando sentiu o pescoço alto, franziu o cenho. —Não tenho... —Deixa-o, irmãzinha. Olhei-o. Com um profundo suspiro, Morgan disse: —Não o entende. —Por que não me explica isso? Morgan se incorporou lentamente e se sentou. Max a ajudou a colocar o travesseiro nas costas e quando seus olhos se cruzaram, sentiu uma conexão, pela primeira vez. —Não tem que enfrentar a isto só nunca mais —disse—. Tem família. Isso significa algo para mim, embora para ti não seja nada. É minha irmã, e não vou permitir que ninguém te faça mal. Morgan se recostou no travesseiro e baixou os olhos. —Para mim também significa algo. É só que... estava assustada. Não queria ser fria. —Tinha tido uma noite difícil. —Mas não foi Dante. Ele não me faria mal. —Não? —Max tentou não demonstrar seu júbilo porque, ao fim, Morgan tivesse admitido que Dante fosse real. —Não. É o homem desfigurado. Ele é o inimigo. Ele é quem me atacou. Tinha... — então se deteve para conter um soluço—. Tinha uma pistola de suspensão. —Deve ter sido horrível. —Foi. Deus, eu tinha muito medo. E ainda não sei se... —deteve-se e se mordeu o lábio. —Não sabe se o que? Se vai voltar? Não tem por que preocupar-se disso. Tem um policial, uma investigadora particular e uma conselheira de adolescentes em sua casa. Entre todos poderemos enfrentar ao que ocorra. Ele não vai se aproximar mais a ti. Morgan olhou a Max durante um momento, quase como se quisesse discutir, mas se limitou a assentir. —Não quer tirar nada de mim, verdade? —Não. Não quero—Max pegou uma das mãos geladas de Morgan entre as suas. Morgan lhe devolveu o apertão. —Agora descansa. Se sentirá melhor pela manhã. Assentindo, Morgan fechou os olhos e se afundou no sonho.
CAPÍTULO XIX
Aquela manhã, alguém entrou no quarto e Max despertou assustada. Entretanto, não era nenhum vampiro, nem o homem das cicatrizes que se aproximou brandamente dela. Era Lou, e estava com um homem muito alto, loiro, que olhava a Max como se não pudesse acreditar no que estava vendo.
—Maxie, este é David Sumner—disse Lou, em voz muito baixa. Assentindo, Max se levantou da cadeira em que estava e se deu conta de que tinha agarrado a mão da Morgan. Cuidadosamente, colocou-a em cima da colcha e olhou a sua irmã antes de voltar-se por volta dos dois homens. —Vamos falar lá embaixo. Está profundamente adormecida, e não quero despertála. Lou assentiu e se voltou para a porta, mas Sumner não o fez. Aproximou-se da Morgan, inclinou-se sobre ela e a olhou com a preocupação refletida nos olhos. Acaricioulhe a bochecha com ternura, posando sua mão ligeiramente. Ela suspirou, mas além daquilo, não houve mais resposta. O homem sacudiu brandamente a cabeça, voltou-se e saiu da habitação. Max o seguiu e fechou a porta do quarto atrás dela, e foi todo um acerto, porque assim que estiveram fora, Sumner começou a fazer perguntas imediatamente. —O que lhe ocorreu? Por que está tão pálida? Meu Deus, tem a cara tão fria que parece de gelo. E... —Uma pergunta depois de outra, senhor Sumner — disse Max, lhe fazendo um sinal com a palma da mão para que se detivesse, e apertando fronte com a outra—. Ainda não tomei nenhum café, e não dormi muito esta noite. Sumner assentiu, desculpando-se. —Sinto muito. Deus. Não posso acreditar como é parecida. O oficial Malone... —Lou. Meu nome é Lou. —... falou-me de ti quando cheguei, mas... não posso acreditar. Max entendeu aquela reação perfeitamente. —Estive olhando a Morgan durante toda a noite, e eu tampouco posso acreditar nisso—digo—Não sabia que tinha uma irmã, e muito menos que fosse gêmea. —Eu tampouco—admitiu Sumner. Chegaram à cozinha, onde Max cheirou o café que estava no fogão, e se dirigiu diretamente para ele. Não viu Lydia em nenhuma parte, e se perguntou onde estaria. Os dois homens se sentaram à mesa, e Max se serviu de uma xícara de café e se uniu a eles. —Sinto muito, mas ainda não entendo muito bem qual é sua relação com a Morgan, êh... David, não? —Sim, David. Sou, bom, seu padrinho. Conheço-a desde que tinha um ano. Quando os pais de Morgan morreram... eu era o único que restava. —E também produziste seus filmes —observou Lou, tomando seu último gole de café. — Sim, também. Tenho que dizer que a princípio não esperava que fossem tão bons. Mas quando vi o primeiro roteiro, disse-lhe que tinha que oferecer-lhe a mais gente, e ficar com a melhor proposta. Mas ela não o fez. Queria que eu produzisse seu primeiro filme. E já chegamos ao terceiro. Lou assentiu lentamente. —E que tal estava ela a última vez que a viu? —Não como agora —disse David, olhando seu relógio—. Não podemos dar com seu médico até as dez. Chamaremo-lo então. —Então, esteve doente? —insistiu Lou. David tomou ar. —Escute, a estrela do Morgan está começando a subir. Não quero que isto se saiba.
—Não estamos procurando uma historinha para vender aos jornais sensacionalistas, David. Se isso fosse verdade, seria suficiente contar que somos irmãs as gêmeas. Há algo que não concordo em tudo isto, e eu... nós só queremos ajudá-la. —Temo que não se possa fazer muito por ela. Sua saúde não é boa. Tem um antígeno estranho no sangue, que deixa aos médicos confusos. Ninguém sabe por que, mas os indivíduos que o têm começam a debilitar-se aos vinte anos, e raramente sobrevivem mais de trinta. —Isso quer dizer que... ? — perguntou-lhe Max, olhando-o aos olhos. —Sinto muito. Sei que isto deve ser todo um shock. Ela sabe desde que era uma adolescente —continuou, baixando o olhar—. Por isso é tão inflexível em seu trabalho. Por isso queria fazer um filme tão jovem, porque sabia que não tinha muito tempo. Max o estava olhando fixamente. Ardiam-lhe os olhos e a cabeça dava voltas. —Não pode ser verdade. —Max — disse Lou. —Não pode ser, Lou! —disse-lhe, e olhou de novo ao David Sumner—. Está dizendo que vai se morrer? —Não esperávamos que piorasse tão rápido, mas... —Oh, Deus —murmurou Lou. Max ficou ali sentada, cada vez mais furiosa. Finalmente, deu um murro na mesa. —Isto não tem nenhum sentido. Olhe, não sei o que é o que lhe ocorre, mas a razão pela qual está neste estado é que um vampiro a atacou ontem à noite. David Sumner ficou em silêncio, olhando-a, depois olhando ao Lou, e depois a ela de novo. —Isso não tem graça. —Vi-lhe as marcas no pescoço. Olhei-as enquanto ela estava dormindo, e quando despertei, ela admitiu ante mim —falava muito depressa, e se deu conta de que estava assustando muito ao Sumner—. Dante é real. Ela mesma o admitiu! Embora também insistisse em que não é nenhuma ameaça para ela. Sumner ficou de pé muito agitado. —Possivelmente agora que estou aqui, vocês dois deveriam partir. Estou muito agradecido por sua ajuda, mas... —Agora acredita que somos um par de loucos, Maxie. É que alguma vez ouviste que terá que ser sutil? Ela cravou os olhos no Lou. —trouxeste o CD-ROM, não? —Sim. —Pois o mostraremos. Lou assentiu e levantou da cadeira. —Só será meia hora. Se ainda pensar que somos um par de lunáticos quando lhe tivermos mostrado isso, partiremos. Sem incomodar mais. De acordo? —Está bem. Tenho um computador portátil no carro. Morgan não gosta que ninguém entre em seu escritório —disse Sumner com um pouco de insegurança. —Muito bem. Vamos pega-lo —disse Lou, e olhou ao Max—. Será melhor que você te deite um momento. Vi que a cama de seu quarto não estava desfeita. Ela assentiu. Estava muito cansada. —Possivelmente o faça —disse—. Onde está Lydia, a propósito? —Saiu muito cedo. Foi ao povoado para comprar comida, disse-me. Voltará depois.
Max franziu o cenho e pensou em ir dar uma volta pelos arredores. Possivelmente o ar fresco a despertasse. Entretanto, suas pálpebras e seus músculos não aprovaram o plano, assim se serviu de outra xícara de café. Não tinha intenção de dormir.
Morgan despertou débil. Sentia um tremendo vazio que emanava de suas vísceras. Sentia um desejo entristecedor por Dante. Estava mais à frente do amor humano. Era uma dor, uma necessidade desesperada e interminável. Apertou os dentes contra aquele esvaziou, levantou-se e, ao dar-se conta de que a luz do dia se derramava no quarto através das finas cortinas da habitação, amaldiçoou-a em silêncio. Dante não poderia ir vê-la. Não durante o dia. Arrastou-se cansadamente até o banheiro tomou uma ducha, apoiando-se na parede e quase sem poder levantar a cabeça. Deus, não poderia passar todo o dia daquela forma... Necessitava... Sabia o que necessitava. Necessitava a lhe Dêem. Necessitava-o dentro dela, seu fogo lhe percorrendo as veias e lhe dando a vida. Ele tinha tomado muito dela. Sabia que não tinha sido para feri-la, mas sim ele tinha querido fazer o que lhe tinha pedido. Beber seu sangue e depois preenchê-la com sua própria vida. A interrupção do Stiles lhe havia custado muito caro. De repente ouviu um som. Havia alguém mais na casa? Acaso os estranhos da noite anterior ainda estavam ali? Tinha que admitir certa debilidade pela mulher que dizia ser sua irmã. Mas ninguém que quisesse machucar a Dante podia ser seu amigo. Ela o protegeria. Não importava quanto tivesse que lutar. Saiu da ducha e se secou. Depois vestiu uma camisola de cetim vermelho, com a esperança de que aquela cor lhe desse algo de sua energia. Estava pálida, magra, débil. Não entendia como era possível que Dante a desejasse naquele estado. Olhou-se no espelho para buscar as marcas de suas presas. Entretanto, não havia marcas, sós dois diminutos pontinhos rosa que se desvaneceram quando ela os estava observando. —Foi real —sussurrou—. Sei que foi. Escovou o cabelo e, embora estivesse exausta, desceu as escadas para enfrentar aos intrusos. Tinha que os convencer de que estava bem e livrar-se deles. Do contrário, Dante não poderia ir vê-la de novo. No final das escadas, Morgan se deteve e viu que as portas de seu refúgio estavam abertas. Deu-lhe um tombo o coração e cruzou como uma flecha o vestíbulo para entrar no escritório. Maxine estava ali, bela e cheia de vida. Estava olhando os desenhos de Dante que havia nas paredes, sem tocar nada, sem procurar, só olhando. —Estas portas estão fechadas com chave por uma razão —disse Morgan em voz baixa, controlando sua ira. Max se sobressaltou e a olhou com os olhos muito abertos. —Tem razão. Sinto muito, eu... não pude remediá-lo —então se aproximou dela e lhe pôs uma mão sobre o ombro—. Não deveria ter levantado. Ainda está muito fraca. —Estou bem —disse, e lhe apartou o braço, obrigando-se a permanecer furiosa e a não sentir nada por aquela mulher—. Este é meu escritório privado. Ninguém pode entrar.
—Disseram-me isso. Por isso entrei — encolheu os ombros—. Sei que invadi sua privacidade, mas pensei que possivelmente encontrasse algo aqui que pudesse te salvar a vida. Morgan não pôde sustentar o olhar da Max porque a sinceridade que viu em seus olhos a comoveu, e não queria sentir aquilo. —Nada pode conseguir isso. Nada. —Tem que ter mais tempo —disse Max—. Tem que o ter, Morgan. Acabo de te encontrar. Morgan se voltou e negou a pontada de dor que aquelas palavras lhe tinham causado. —Durante muito tempo pensei que isso podia ser verdade, mas só me conduziu à decepção, Maxine. Não quero desejá-lo de novo. Aceitei os fatos —e era certo, pensou. Mas não os fatos tal e como os conhecia sua irmã. Morgan sabia que não poderia viver uma vida normal. Tinha pensado que só podia aceitar a morte, entretanto, tinha terminado por encontrar outra opção: uma vida de noite, interminável. Poderia ser possível. Se pudesse viver o suficiente para obtê-lo... Max ficou em silencio durante um comprido instante. Quando falou de novo, tinha a voz áspera. —Estes desenhos são assombrosos. Morgan se voltou a olhá-la. —Obrigado. É exatamente o que minha imaginação me ditou sobre o personagem. —Vamos, Morgan. Ontem à noite admitiu que fosse real. Não te lembra? Eu te as marcas. Com uma expressão inocente na cara, Morgan levantou o queixo e separou o pescoço de sua camisola. —Que marcas? Max franziu o cenho e se aproximou dela para lhe inspecionar o pescoço. —Mas... mas estavam aí. Maquiaste isso. Percorreu com o dedo o lugar onde tinham estado as marcas, mas quando olhou os dedos não encontrou nenhum vestígio de maquiagem. —Não o entendo. —Não tem que entender. —Morgan, se esse vampiro... estar se alimentando de ti, o tempo que ainda resta será mais reduzido, não entende? David me disse que a última vez que te viu, estava... -David? David? —Não te lembra? Ontem te disse que ia vir. Morgan franziu o cenho, tentando ordenar a confusão de sua mente. —Está aqui — disse Max—. Na salinha que há ao lado do vestíbulo, com o Lou. Morgan foi para a estadia, mas se voltou para pegar a mão da Maxine e levá-la com ela. —Como entraste no escritório? —perguntou-lhe. Timidamente, Max tirou uma chave do bolso dos jeans. —Estava em sua mesinha. Morgan tomou a chave e fechou as portas do escritório. Depois cruzou o vestíbulo e entrou na sala em que estavam aquele policial e seu querido David. Quando entrou, os dois homens estavam concentrados na tela do notbook do David, e os dois a olharam. —David —disse ela, forçando um sorriso carinhoso.
— Oh, carinho —ele se levantou e lhe deu um forte abraço—. Carinho, como está? Quando cheguei, parecia muito doente e... —David, tenho que falar contigo. A sós —disse, e se voltou para o Maxine—. Por favor. —É obvio Morgan. Não somos a Gestapo. Queremos o melhor para ti. Lou se levantou e saiu da sala coma a Max. Morgan fechou a porta e se voltou para o David. Sabia que ele faria algo por ela. Algo. Olhou-o nos olhos e lhe disse: —Quero que partam. Max ficou assombrada quando David, com expressão de culpabilidade, pediu-lhes que partissem. Morgan havia voltado diretamente para seu quarto, quase sem olhá-la, e David lhes havia dito que tinham que ir-se. Lou assentiu ligeiramente. —Entendo. —Eu não! —disse Max ao homem, desdenhosamente—. E você tampouco deveria, David. Não, se é que ela te importa. Meu Deus é minha irmã. A irmã que nem sequer sabia que tinha. É minha gêmea, Por Deus. —Sei. Sinto muito, Maxine. É o que ela quer. —De verdade pensa que é ela que está falando? Não o é —insistiu Max—. É ele. O vampiro. Tem-na sob uma espécie de... —Max, vamos —Lou a cortou brandamente—. Estou de seu lado, mas inclusive me parece que isto é um pouco exagerado. —Você crê? —Tenho que admitir —disse David— que as provas que têm são convincentes. Não estou dizendo que o creia, mas entendo por que vós sim. Entretanto, Morgan- está muito excitada, não é ela mesma. —Vá, pergunto-me por que —balbuciou Max. — Acredito que, dado seu estado, seria melhor que a agradássemos nisto. Ao menos, até que possamos chegar ao fundo do que está ocorrendo aqui. Max deixou de franzir o cenho e arqueou as sobrancelhas lentamente. —Parece que realmente não quer que partamos. —Em realidade não. Ela está muito doente, e não acredito que pudesse enfrentar ao que lhe está ocorrendo sozinho. —E mesmo assim, está-nos jogando. —Da casa, sim. Mas eu gostaria que ficassem um par de dias. Poderiam fazer isso? —ao ver que Max ia negar se, levantou uma mão e continuou—: Eu pagarei os gastos. Alojar-lhes-ei no povoado. Há alguns hotéis muito agradáveis. Max sentiu um pouco de alívio. —Aceitarei a hospedagem, mas nada do resto. —Aceitará tudo —cortou Lou. —É minha irmã —disse Max. —E é rica. Você vai atirando, eu estou a ponto de me aposentar e Lydia tampouco está boiando em dinheiro. E onde está Lydia, a propósito? —Não voltou ainda. Teremos que encontrá-la antes de partir —disse Max, preocupada—. vais ter que vigiá-la com muita atenção, sobre tudo as noites. Se quiser, poderíamos voltar para ajudar, nos mantendo a certa distância da casa.
David tomou ar e olhou para cima das escadas. —Eu não gosto da idéia de espiá-la. Entretanto... estou preocupado —suspirando, continuou—: Não quero traí-la. Eu a vigiarei. Possivelmente o doutor lhe receite algo manhã, algo como um sedativo para que durma bem de noite. Max quis protestar, mas Lou a parou. —Vamos, então. Por favor, nos chame se necessitar algo. E além disso, tenha em conta que não podemos ficar aqui indefinidamente. Max sacudiu a cabeça. —Eu não gosto disto. —Eu tampouco, para ser sincero —respondeu David—. por que não sobe a lhe diz adeus, Max? — Se quisesse me dizer adeus, ela o teria feito enquanto estava aqui —olhou aos dois homens, e depois deixou escapar um suspiro de exasperação—. Tentarei. David começou a explicar ao Lou onde estava o hotel no qual ele se alojava algumas vezes quando ia ao povoado, enquanto, Max começou a subir as escadas. Quando chegou à porta do quarto, chamou brandamente. —Morgan, sou eu Max. vou entrar —esperou uns segundos e abriu a porta. Morgan estava sentada em uma cadeira ao lado do balcão, olhando pela janela. Max cruzou o quarto e se aproximou dela. —Há uma vista muito bonita daqui —lhe disse. via-se uma enorme pradaria verde e depois, o mar, e mais à frente, o céu azul com algumas nuvens branquíssimas que passavam flutuando. Morgan não respondeu. —Vou, Morgan. David nos disse que quer que partamos, assim vamos. Só subi para me despedir. Nada. Nem sequer a olhou. —Suponho que te importa um cominho, verdade? Não sei por que me incomodei em subir —disse, dando a volta e encaminhando-se à porta. —Sinto muito, Maxine. Ela se deteve. —De verdade? —ao ver que Morgan não respondia, voltou-se lentamente—. E por que nos está enxotando da casa, Morgan? Morgan olhou os olhos da Max durante um segundo, e depois desviou o olhar rapidamente. —Quem lhes criou? —perguntou-lhe, ao fim. Max ficou surpresa, mas respondeu. — John e Ellen Stuart. O casal de classe média, mais encantador do mundo. Morgan assentiu ligeiramente. —E que tal foi sua vida com eles? —Maravilhosa. Fomos uma família. Queriam-me. O único mau que ocorreu foi que meu pai morrera. Ocorreu no ano em que comecei a universidade. Foi um ataque do coração. —E eles estavam... envolvidos em sua vida? —Minha mãe ia a todas as reuniões do colégio, aos bailes algumas vezes, íamos à excursão... Meu pai nunca perdeu uma partida de basquete e nenhuma peça de teatro — disse, quase sorrindo—. Sim, estavam interessados em minha vida. Eu sempre soube que era adotada. Não era nada secreto. Queríamo-nos. — Eu também queria a meus pais —disse Morgan, escolhendo cuidadosamente as palavras—. Mas ainda não estou segura do por que me adotaram. Não tinham tempo para mim. Era quase como se eu fosse um acessório que tinham comprado para completar sua imagem. Tinha babás e tutores, e tinha ao David. Mas meus pais nunca estiveram realmente aí. Viajam sem mim. Tentavam compensar me dando dinheiro, presentes caros, carros, roupa. Tive meu primeiro cartão de crédito antes de completar os quatorze.
—Sinto que fosse tão duro —disse Max. —Diz com sarcasmo? —Não. Digo de verdade. Sinto por ti. —Não quero sua compreensão. Só estou tentando te explicar por que a palavra família não tem as mesmas conotações para mim que para ti. —Possivelmente não. Eu pensaria que alguém que não teve uma família de verdade necessitasse uma de verdade. Mas já vejo que não é assim. —O momento não é o mais apropriado —disse Morgan—. Estou morrendo. Realmente, não tem sentido que... comecemos algo agora. —Agora é o único momento que temos. Morgan fechou os olhos e baixou a cabeça. —Tenho algumas coisas que resolver, e preciso fazê-lo sozinha. —Pois será melhor que o faça depressa, Morgan, porque se pensar que vou afastarme, está enganada. Parto por agora, mas não vou longe, e voltarei. E seguirei voltando. Não me importa as vezes que tente me jogar. Entende-me? Morgan levantou a cabeça lentamente. —Não, —Não? Nunca tiveste a ninguém perto dessa forma, verdade? —Só ao David, e acredito que é porque eu lhe dava pena. Não tenho a ninguém mais. —Possivelmente ele tenha estado perto de ti porque realmente lhe importa —lhe disse Max—. Como a mim—ficou olhando a sua irmã durante um comprido momento, e depois, com um suspiro, saiu do quarto. Lydia observou a seus dois companheiros afastar-se. Morgan estava sentada ao lado da janela, olhando o mar. David Sumner saiu da casa, sentou-se em uma cadeira e acendeu um charuto. Lydia ficou muito ereta e se aproximou dele, caminhando lentamente. Ele a viu aproximar-se e a saudou com a mão para lhe dar boas-vindas. —Você deve ser Lydia — disse. Ela assentiu e continuou caminhando. —Eu sou David. —Já sei. —Maxine e Lou se foram ao povoado, a um hotel. Disse-lhes que te levaria se voltasse aqui. Ela assentiu. —Pensavam que tinha ido ao povoado. Acredito que tinham a esperança de encontrar-se contigo e... Então ficou calado, até que ela se deteve a dois passos dele. Entrecerrou os olhos e franziu o cenho. —Olá, David. Passou muito tempo. —Oh, Meu Deus. Meu Deus.
CAPÍTULO XX
Morgan estava deitada em uma maca com uma camisola de papel e com uma veia do braço, conectada a uma bolsa de soro. Entretanto, sabia que aquilo não a ajudaria. Sabia o que necessitava, e não era soro por via intravenosa. O doutor Hillman entrou no quarto muito sério. David estava sentado ao lado. Tinha saído durante o exame, mas havia voltado a entrar imediatamente. Morgan não tinha tido ânimos suficientes para enxotá-lo. Ela o queria, e sabia que ele a queria também. Tinha a molesta sensação de que estava tramando algo, embora soubesse que devia confiar nele. De fato, era a única pessoa em que confiava, além de Dante. Entretanto, tinha visto o David aquele dia, falando com a Lydia, a mulher loira. Tinham estado juntos durante muito tempo, falando, e a atmosfera que se criou ao seu redor desprendia uma intensa energia. Morgan não sabia por que. Tinha ouvido o motor do carro depois da emocionante despedida da Maxine, e tinha pensado que ao descer as escadas encontraria ao David sozinho. Entretanto, tinha-o encontrado com a Lydia, e os dois ficaram silenciosos quando a tinham visto. Aquilo ainda incomodava a Morgan. Do que teria estado falando David com aquela estranha? David se levantou quando apareceu o doutor. —Bem? O doutor Hulmán tomou ar e depois suspirou. —Sinceramente, Morgan, eu gostaria de te internar. —No hospital? —perguntou ela, piscando. —Só para te observar. Tem anemia e não está bem. —Não me podem fazer uma transfusão de sangue e me mandar para casa? Ele intercambiou um olhar com o David. —Se pudéssemos encontrar um doador apropriado, sim. Mas sabe que tem um tipo muito estranho de sangue. —Sim, já sei. Sabe? Tenho uma irmã. Uma gêmea. Entretanto, ela não tem o antígeno. Como é possível? Ele a olhou muito surpreso. —Uma irmã? Está segura de que é gêmea, ou pode que seja gêmea? —Somos idênticas. —Às vezes, os irmãos gêmeos são muito parecidos também. Está segura de que não tem o antígeno? —Está muito sã. Robusta. Ele baixou a cabeça e a sacudiu lentamente. —Não entendemos a Belladonna, Morgan. Não se comporta como outros antígenos. Ela assentiu. Já esperava aquela resposta. —Olhe, doutor, se ficar no hospital, o único que vai ocorrer é que me ponha pior do que estou. Quero ir para casa. Quero estar em minha casa. Preciso estar ali. O médico entrecerra os olhos e se inclinou sobre ela. Tirou-lhe o soro do braço e lhe pôs um esparadrapo com uma atadura. —Por quê? —Se for morrer, é o lugar onde quero estar. E se não morrer, quero passar o tempo que resta ali. —De verdade, Morgan —disse David—, se for só durante uma noite...
—É minha vida. Quero ir para casa —disse, e ficou de pé—. Não podem me obrigar a ficar no hospital. Sou uma adulta, e parto aproximou do armário onde estava sua roupa e a pegou—. Se quiserem, podem ficar aqui olhando como me visto, ou sair. —Está bem, está bem —o médico e David saíram pela porta enquanto ela já estava pondo as calças. Assim que ficou a sós, agarrou-se ao armário para não cair. Estava enjoada e fraca. Demônios, levantou-se muito rapidamente. Lentamente, recuperou o equilíbrio e o enjôo remeteu o suficiente para que pudesse enfocar sua atenção ao que estavam dizendo os dois homens do outro lado da porta. —... algo para dormir? —estava perguntando David. —Darei-lhe um sedativo. Demônio. Não ia dormir, e muito menos durante a noite. A noite era o que tinha estado esperando. Tinha que ver Dante e lhe demonstrar que não o tinha traído. —Me diga a verdade, doutor. Quanto tempo acredita que resta? —Sabe que não posso saber com segurança. —Mas terá uma idéia. Vamos, doutor, meses? — houve uma pausa—. Semanas? O doutor continuou em silêncio. —Meu Deus, dias? —perguntou David brandamente. — Possivelmente. Sinto muito, David. Sei o muito que a quer. —Tem que haver algo que possamos fazer. —Teríamos que encontrar um doador —disse o médico—. Isso lhe daria um pouco mais de tempo. —Então, isso é o que temos que fazer. —Mas... só estaríamos ganhando um pouco de tempo. Ao final... —Sei, mas não posso aceitá-lo. Não posso. A dor da voz do David atravessou o coração de Morgan. O médico suspirou. —Farei tudo o que possa para prolongar o tempo que resta, David. Prometo. Max tentou falar com voz alegre enquanto explicava os últimos acontecimentos pelo telefone. —É algo terrível, Stormy. Parecia que queria que ficasse, mas ao mesmo tempo, não podia esperar para livrar-se de mim. Digo-te que você é para mim uma irmã de verdade, muito mais que ela —fez uma pausa—. De toda forma, Lou e eu viemos ao hotel que Sumner nos recomendou. Ele telefonou com antecipação, e deve ter influência, porque deveria ver o lugar, Stormy. É uma suíte com duas camas, um salão e uma quitinete. E a vista... pfff, nunca tinha visto nada igual. Tem umas janelas enormes que dão ao mar. Vejo as ondas rompendo no escarpado. Há navios e gaivotas. Espera, vou colocar o fone pela janela para que as ouça —lhe disse, e o fez. Sentiu a brisa fresca e salgada na pele ao sair Ouviste? —perguntou, sabendo que não haveria resposta—. Você e eu vamos voltar aqui quando estiver melhor. Vamos-nos ficar neste hotel. Embora não é nada comparado com a casa de minha irmã, mas é muito bonito. E quando viermos, conhecerá a Morgan. Não imagina como se parece comigo. É mais magra e mais bonita, e é muito rica, mas está sozinha e não é feliz. Não sei se o foi alguma vez. E estava doente, pensou Max. Doente, e possivelmente morrendo. Exatamente igual a Stormy. Naquele momento, sentiu uma pressão enorme nos ombros e no pescoço, pesada,
lhe esmagando. Resultava-lhe difícil respirar. —Bom —continuou, com a voz mais rouca—. Finalmente, Lydia apareceu e David a trouxe para o hotel. Depois ele partiu porque tinha que acompanhar a Morgan A... uma entrevista. Estava tendo muito cuidado de não mencionar nada negativo nem preocupante. Não só pela Stormy, mas também porque sabia que sua mãe estaria ouvindo a maior parte da conversa enquanto sustentava o telefone a sua filha junto ao ouvido. Não queria desgostar à mulher. E, sobre tudo, não queria mencionar a razão pela qual estava em realidade no Maine. —Amo-te, Storm. Quero que desperte. Sabe? Assim poderia me responder e me dar conselhos, puxar meu cabelo por causa do Lou. Não é justo que eu esteja falando durante todo o tempo. Será melhor que desperte antes que volte para casa. De acordo, Stormy? Desperta... Naquele momento, teve que deter-se. As lágrimas estavam caindo pelas bochechas e lhe doía a garganta. Tentou controlar-se e tomou ar um par de vezes. —Tranqüila, Maxie, tranqüila —Lou pôs as mãos, grandes, ásperas, sobre os ombros brandamente. Ela olhou para cima e o viu. Não o tinha ouvido entrar. Deu-lhe uma ligeira massagem. Aquele era todo o contato físico que ela tinha conseguido dele. Foi um pouco para trás e apoiou as costas em seu peito firme e quente. Quase queria absorver algo daquela solidez para lutar contra a debilidade e o frio que sentia. Como ia suportar perder a sua irmã e a sua melhor amiga ao mesmo tempo? —Maxine? Sobressaltou-se, assustada para ouvir a voz que vinha do outro lado da linha. Durante um momento pensou que... Mas não. Era a mãe do Stormy. —Jane, que tal está? De verdade não houve nenhuma mudança? Houve uma pausa. —Não piorou. «Mas tampouco melhorou», pensou Max. —Crê que está me escutando? — Sei que sim, Maxine. —De verdade? notaste algum movimento enquanto eu lhe falava? —Não preciso notar nada. Sou sua mãe e sei. Você significa muito para ela, e sei que esteve escutando tudo o que dizia. Max assentiu e se secou uma bochecha com o dorso da mão. —Não estarei durante muito mais tempo aqui. Um dia ou dois mais, no máximo. —Faz o que necessite. Eu... ouvi o que contaste a Tempest sobre que encontraste a sua irmã. Isso foi a mão de Deus, jovenzinha. Conduziu-te até ali. Não o duvide. —Não duvido. Jane suspirou. —Pomo-lhe as fitas com sua voz, e a música que trouxe Maxine. E esta noite poremos a televisão um momento. No seu programa favorito. ligue-nos de novo quando puder filha. —Farei —Max se despediu e desligou o telefone. —Que tal está? —perguntou-lhe Lou. —Não houve nenhuma mudança —disse ela, e se voltou lentamente. Abraçou-o
pela cintura e apoiou a bochecha em seu peito. Ele a abraçou e a balançou com suavidade. —Só passou um dia. —Cada dia que passe é pior —disse ela contra o tecido da camisa—. Vou perder duas irmãs de uma vez, Lou. Não estou segura de que possa agüentar. —É forte, Max. A garota mais forte que conheci. E estou aqui contigo, para te apoiar. Sabe, verdade? Ela assentiu. —Lydia está te preparando um bom banho quente e uma xícara de chá. Quero que te meta na banheira e tome a infusão. Depois quero que tire uma sesta. Ela levantou a cabeça. Sentia que lhe ardiam os olhos, e pensou no quanto estaria feia naquele momento. —Quando anoitecer... —Vamos voltar para casa da Morgan e vigiar — disse ele—. Embora David e ela não queiram. Max assentiu. —Pensa que me conhece muito bem, verdade? —E tenho razão? —Sim. —Por isso sei que precisa descansar neste momento —disse ele, e lhe passou a palma da mão pelo cabelo. Depois tomou a cara pelo queixo com ternura—. Eu não gosto de verte assim, Maxie. Eu não gosto nada. Ela sorriu cansadamente. —Isso é porque está louco por mim, embora seja muito obtuso para te dar conta —se inclinou em volta dele e o beijou brandamente durante um instante. Depois se virou e entrou no banheiro. Lou suspirou enquanto se sentava no sofá do quarto. Lydia estava tomando um chá, dando batidinhas no chão com a planta do pé, nervosa. —Ela te necessita, sabe? —disse-lhe. Lydia o olhou, preocupada. —O que está acontecendo é muito ruim, e não o merece. É uma boa garota. —Sei que é. —Tem que dizer-lhe. —E crie que lhe beneficiará em algo saber que sua mãe era uma prostituta? Êh? —Vamos, Lydia, isso não é o que você é. —Fui. —Era uma criança, estava sozinha no mundo. Agora é uma heroína. Ela pôs os olhos em branco e olhou para cima. —Crê que não? Saiu da sarjeta e em vez de te afastar da realidade, começou a ajudar a outras garotas a sair também. Uma atrás da outra, as tira do mesmo barro no que você esteve e lhes dá uma casa, um lugar seguro. Um lugar que você mesma criou. Depois se volta e retorna por mais. Segue e sofre no processo, mas isso não te detém. Segue e segue. Ela tinha os olhos cheios de lágrimas. —Isso era o que dizia Kimbra. Via o que fazíamos como algo nobre. Para ela era como uma espécie de chamada divina. — E é. O que você faz por essas garotas as quais não conhece é algo nobre. E agora tem a oportunidade de fazer algo por ti mesma, por suas meninas.
—Já não são umas meninas, Lou —disse ela, e pôs a xícara sobre a mesinha. Ele se encolheu de ombros. —Necessitam a sua mãe. Max sente que está perdendo tudo o que lhe importa, e Morgan... Deus, essa garota não tem a ninguém além do Sumner. Se não o diz agora, é possível que não tenha a oportunidade de fazê-lo. Ela apartou o olhar, certamente para ocultar as lágrimas, pensou Lou. —Ela nem sequer quis abraçar a sua irmã gêmea. O que te faz pensar que eu lhe importaria algo? —Não saberá nunca se não tentar, Lyd. — Se arrumaram sem mim durante toda sua vida, Lou. —Agora estão a ponto de caírem. Ela se mordeu o lábio, e ele se sentiu mal por pressioná-la tanto. Decidiu ceder um pouco. —Ao menos, dei-te algo em que pensar. —Está bem. vamos deixar no momento. Será melhor que descanse. Maxie quer passar toda a noite perto da casa de sua irmã, e sei que você não vai ficar aqui. —Você tampouco —replicou ela. —É obvio que não —ele se levantou e se dirigiu à cozinha para servir uma xícara de café. —Ela te quer. Sabes, verdade? As palavras da Lydia o deixaram seco no lugar. Pensou que tinha parado o coração, mas não era certo. Pulsava-lhe tão forte que parecia que ia escapar, e lhe enviava todo o sangue à cara. Então, disse: —Pensa que me quer. Mas só acreditará até que chegue a uma determinada idade e a volte louca. Até então, eu fingirei que não me dou conta de nada. —Por seu próprio bem? —E pelo meu. —Porque pensa que os dois acabariam se machucando no ao final? Ele não respondeu. Limitou-se a seguir caminhando para a cozinha e servisse uma xícara de café. —Sabe? Algumas vezes penso que se tivesse podido conhecer o futuro e saber que me apaixonar pela Kimbra ia causar-me esta dor que me corrói as vísceras, possivelmente lhe tivesse dado as costas no dia em que a conheci. Possivelmente não tivesse me arriscado. Ele assentiu. —E então me dou conta —continuou ela— de que teria sido o maior engano de minha vida. Deus, quando recordo toda a alegria que compartilhamos... Os dias e as noites... —deteve-se, e quase soluçou—. Não. Sofreria algo em troca do amor que compartilhamos. Algo. Não o trocaria nem que toda esta dor se desvanecesse sem deixar rastro. Lou deu um sorvo no café e fingiu que aquela mensagem não era para ele. É obvio, sim lhe afetava. Em cheio. Mas podia fingir o contrário.
CAPÍTULO XXI
—Mas se nem sequer anoiteceu. —Sei —disse David brandamente—. Mas Morgan, está esgotada —seu tom, seus olhos, seu rosto, tudo refletia preocupação e amor. E entretanto, ela sabia que estava ocultando algo. E era algo mais que o fato de que estivesse tentando droga-la para que dormisse aquela noite. Não permitiria que o fizesse. —Vamos, carinho. Tome o chá e depois vá para cama. Tem que descansar. Ela olhou a xícara. Certamente, a infusão estava misturada com a droga que o doutor Hilman lhe tinha dado. Deus, se ele soubesse que sua vida dependia de que pudesse ver Dante aquela noite, e de que voltasse a o convencer de que a fizesse imortal... Levantou a xícara e fingiu que bebia. Depois voltou a deixá-la sobre a mesa e limpou os lábios com um guardanapo. —Farei o que me diz, David, se me explicar o que era o que estivestes falando você e essa mulher loira. Ele a olhou fixamente. —Já lhe disse isso. Estava-lhe dizendo onde estavam seus amigos e me oferecendo a levá-la ao povoado para eles. —Parecia um pouco mais que isso. Ele encolheu os ombros para fingir despreocupação, mas não a olhou nos olhos. —Não era fácil explicar que tinha enxotado a sua irmã de casa, Morgan. Se parecia algo mais, era porque estava tentando encontrar algum modo de justificar seu comportamento. Aquilo queria ser um sarcasmo, e deu no branco. Doeu-lhe um pouco que a única pessoa que nunca lhe tinha feito mal a atacasse de repente daquele modo. Ele se levantou e a pegou na mão. —Não queria te machucar, amor. É só que pareceu impróprio de ti ser tão pouco amistosa. —Tampouco é próprio de ti te voltar contra mim —sussurrou ela. —Oh, Morgan, não. Nunca me voltaria contra ti. —Então, sobre o que estavam conspirando essa mulher e você? Ficaram calados quando entrei. Estavam falando sobre algo que não queriam que ouvisse. —Só era porque não queria te desgostar estando tão doente como está. Não queria que te pedisse explicações, e não queria que você tivesse que dar-lhe Isso é tudo. Ela piscou para evitar que as lágrimas lhe derramassem dos olhos, dizendo-se que não importava que seu amigo mais querido estivesse tentando lhe mentir. Não o necessitava. Só necessitava a Dante. —Beba o chá, querida. E lhe ofereceu a xícara. Ela tomou a xícara e assentiu. —Acredito que seguirei seu conselho de me deitar. Levarei isso para cima e tomarei na cama. —É uma boa idéia. Ele a ajudou a ficar de pé e a acompanhou até a escada. Subiram os dois juntos e David lhe deu um beijo na porta de seu dormitório. —Boa noite, carinho. Descansa —se deteve, abriu a porta e lhe cedeu o passo.
Devolveu-lhe um beijo na bochecha, entrou e fechou atrás dela. Suspirando, olhou a cama. Pensou que teria que fazê-lo convincente, porque David não era tolo. Sem perder um segundo, deixou a taça na mesinha, tirou a roupa e vestiu o roupão branco de cetim. Depois colocou um dos travesseiros sob as mantas e os cobriu. Moveu-se para porta para ter o mesmo ponto de vista que David quando aparecesse para comprovar que ela estava bem. Perfeito. Parecia que estava dormindo aconchegada de costas à porta. Finalmente, pegou um xale do armário e o pôs nos ombros, e colocou também umas sapatilhas de veludo. Depois teve que deter-se para que sua respiração se acalmasse. Era muito acelerada e sonora para passar despercebida. Só com o que tinha estado fazendo durante os cinco últimos minutos já quase não podia respirar. Cada vez estava pior. Esperou recuperar um ritmo normal e abriu a porta do dormitório. Onde estaria David? Não o ouvia, nem tampouco o via de acima. Começou a descer as escadas lentamente, e quando chegou ao vestíbulo ficou imóvel. Então escutou pisadas no piso de cima. David ia pelo corredor para a escada, certamente para descer ao vestíbulo, assim antes que aparecesse, Morgan correu para a porta de seu escritório, abriu, entrou e voltou a fechar sigilosamente. Em um segundo tirou da caixa forte três dos volumes de Dante e o disquete que continha a única cópia do novo guia, no que ela tinha estado trabalhando durante meses. Fechou os olhos e tentou controlar a respiração de novo. Estava fazendo o correto. Ela tinha lido a história escrita pelo Dante, de como a mulher em que tinha acreditado o tinha traído e tinha estado a ponto de conseguir que o matassem. Ela tinha que provar que não ia fazer o mesmo. Aquele gesto... o demonstraria. Saiu e correu para a cozinha. Na porta de atrás se fixou em que o painel do alarme tinha a luz vermelha acesa. David tinha conectado o alarme. Ela não conseguia recordá-lo naquele momento de nervosismo. Quando demônios lhe havia dito o código? Demônios, embora não fosse muito difícil para ele deduzi-lo. Era a data do aniversário da Morgan. Bem, seu aniversário. Apertou os botões e a luz vermelha trocou pela verde. David estava aproximando-se para a cozinha. Morgan ouvia seus passos cada vez mais perto. Abriu a porta e saiu sem fazer o menor ruído, com os três livros apertados contra o peito. Esperou escondida ao lado da porta para ver se David abria para ver o que estava ocorrendo. Mas ele não o fez. Nem sequer a tinha visto. Suspirando de alívio, afastou-se da casa e caminhou para o lugar onde tinha visto Dante pela última vez. Reviveu a cena da noite anterior em sua cabeça. Ele tinha ficado tenso pela dor. Tinha começado a lhe sair o sangue a fervuras da ferida, e depois tinha caído, desabou-se para o vazio. Teria sobrevivido? Mas ele não era humano. Em realidade não estava vivo. Mordeu-se um lábio e olhou para baixo. E ali viu algo que não tinha visto antes na escuridão. Uma saliência na rocha, um balcão natural sobre o mar. Ele devia ter caído ali. Franziu o cenho, olhou a seu redor e escolheu um ponto. Depois se deixou cair da borda, sujeitando os jornais e o disquete com todas suas forças, e aterrissou na Saliência. Ali, pensou. Ele também devia ter caído ali. Percorreu a rocha com as Palmas das mãos, como se ainda pudesse senti-lo. Mas não podia. Seriam as manchas que via sobre a pedra o sangue de Dante? Também poderia ser de água salgada, ou de chuva, ou do respingo. —Onde foi, Dante? —olhou a sua esquerda e a sua direita, mas não viu nada.
Abaixo só estavam as rochas e o mar. Não era possível que ele tivesse caído no mar, verdade? Suspirando, perguntando-se se poderia conseguir para subir, deteve-se e se fixou em um matagal e em um oco que havia detrás. —Uma cova —suspirou. Separou os ramos com uma mão e entrou pela abertura. Ali só havia escuridão e frio. Envolveu-se bem no xale e começou a andar, sentindo a pedra fria e dura através de suas sapatilhas. Teve a sensação de que ali encontraria seu fim, de uma ou outra maneira. Com cada passo que dava, pensava que a terra ia afundar embaixo ela, mas não foi assim. Sua cabeça continuava lhe dizendo que voltasse, mas ela só podia obedecer à entristecedora necessidade de alcançar a Dante. Não havia nada a temer, disse-se. O que era de pior que podia lhe passar? Podia morrer? Já estava morrendo, de toda forma. Apoiou a palma da mão na parede do passadiço para guiar-se pelo tato, e se deu conta de que a pedra se curvava para formar uma área maior. Ela se deteve para orientarse, e decidiu seguir a parede com os dedos. Respirou fundo, e aos poucos passos seus dedos tocaram algo diferente à pedra. Era madeira. Uma enorme porta que tinha um aro de ferro. Morgan soube que não ia ser fácil, mas puxou com todas suas forças até que, sem fôlego, conseguiu que se abrisse o justo para poder deslizar-se à outra parte. Então, lentamente, tentando acalmar os batimentos do coração de seu coração, sentiu algo. Algo como... uma presença. Estava perto de Dante. Ele estava ali, em algum lugar. Levantou a cabeça, buscando-o com a mente, percebendo-o com mais força. —Dante —sussurrou com o coração na garganta. Seguiu andando, apalpando a parede, e notou de novo que a parede se curvava e que naquela estadia o aroma era diferente. Bateu a coxa em algo e se deteve. Era uma mesa pequena. E ainda por cima havia... uma lanterna. Então, tinha que estar em... Sim, ali havia uns fósforos. Acendeu a lanterna e a colocou sobre a mesa enquanto a luz o alagava tudo. O ataúde estava ali. Vazio? Tragou saliva e se aproximou. Deu-se conta de que havia sangre no chão. Deus, ele tinha perdido muito. Apoiou as mãos na tampa da caixa e fechou os olhos. Respirou fundo para reunir coragem e a levantou. As dobradiças, oxidadas pelo tempo, chiaram. Dante estava dentro, convexo, imóvel, completamente branco. Seu rosto não tinha vida. —Dante... —disse enquanto lhe acariciava a carne geada com as gemas dos dedos. Estaria morto? Teria morrido ali sozinho, sangrado? Seus olhos se encheram de lágrimas e apartou o olhar de sua cara. Tinha uma vendagem no braço, à altura do ombro. —Oh, Dante, por favor. Necessito-te. Necessito-te — lhe sussurrou aquelas palavras tomando a cara entre as mãos, e o beijou. Suas próprias lágrimas lhe umedeceram as bochechas, mas ele não respondeu. As palavras que ela tinha lido em seus diários lhe chegaram flutuando à mente. Havia poucas coisas que causassem a morte de um vampiro. Uma delas era a perda de sangue. Sua ferida tinha que ter se curado, durante o dia. A menos que Dante tivesse morrido antes.
Morgan lhe desatou a vendagem do braço e comprovou que não havia ferida, só sangue seco. Tinha sanado. Os livros diziam a verdade. Então também devia ser correta a noção de que o sangue que ele tinha perdido só podia ser substituído de uma maneira. —De mim —sussurrou ela—. Sim, de mim. Sei que você não me deixaria morrer, Dante. Sei que você faria o que está certo, me converteria no que você é não deixaria que me desvanecesse e morresse. Confio em ti —se inclinou para ele e lhe beijou a fronte. Depois se incorporou e colocou a mão em um de seus bolsos. Ali encontrou o que estava procurando: uma diminuta navalha com a manga de ônix. Abriu-a e a observou enquanto pensava que não devia correr o risco de sangrar-se ela mesma. Tinha que tomar cuidado. Não podia cortar o pulso, nem o pescoço. Tomou ar e apertou com força o punho ao redor da navalha. O fio se cravou na palma de sua mão e ela sentiu que a dor se estendia por todo seu corpo até lhe fazer gritar. Abriu a mão e a sangue brotou em abundância, e Morgan observou a Dante. Tremeram-lhe as extremidade do nariz e as mãos. —Está bem, meu amor. Está bem —então ela fechou o punho de novo para evitar que o sangue se derramasse e o aproximou do rosto de Dante , deixando cair umas gotas em seus lábios. Ele as apanhou com a língua, e imediatamente, suas mãos agarraram com força p pulso de Morgan. antes que ela pudesse dar-se conta, ele tinha fechado os lábios sobre o corte de sua mão e estava sugando com força na ferida, bebendo seu sangue. Ela teve de novo a sensação de estar viva, e uma luxúria desconhecida lhe percorreu as veias. Sentiu as presas de Dante e sua língua lambendo cada gota. E de repente, abriu os olhos. Abriu-os por completo, mas não via nada. Só havia neles um brilho feroz, de depredador. Sem separar a mão de Morgan de sua boca, de um salto, ficou de pé a seu lado. Atraiu seu corpo contra o dele apertou seus quadris contra seu corpo, percorrendo seu pescoço com a boca, lhe acariciando a pele com os dentes, mordiscando-a e atraindo o sangue. Aquela dor era uma doce tortura, e ela se arqueou contra ele. Com uma mão, conseguiu desatar o laço do roupão e ele o abriu e lhe despiu os ombros. —Toma o que necessite de mim, Dante. Então ele a empurrou com seu corpo até que os dois caíram no frio e duro chão. Pegou-a pelas coxas, as colocou ao redor da cintura e entrou nela, enchendo-a enquanto lhe afundava as presas no pescoço. Os golpes de prazer e de dor se estenderam pelo corpo e a mente de Morgan, até que gritou enquanto chegava ao clímax, tremendo pela insuportável força de sua liberação, e enquanto, ele continuava sugando e bebendo a vida de suas veias. Ela se pendurou dele e lhe sussurrou que o queria e que morreria por ele, e então temeu que estivesse a ponto de demonstrar. Lou e Maxine estavam sentados no carro, a uns quantos metros da mansão da Morgan. Era um bom ponto de observação. Tinham uma boa vista da esplanada de grama que chegava da parte de atrás da casa até o escarpado, de um lateral e da fachada do edifício. Max não acreditava que ninguém pudesse chegar ou partir sem que eles o vissem. O céu estava púrpuro pelo horizonte, e se fazia mais escuro segundo o olhar ascendia. As cores se refletiam na superfície do mar. —Que horas são? —perguntou ao Lou.
—Vai amanhecer em pouco tempo. —Disso já me dou conta —disse ela. Algo captou sua atenção e olhou para a fachada da casa. Lydia acabava de chegar, e quando Sumner abriu a porta, falou com ela durante um segundo e se apartou para deixá-la passar—. entrou —disse Max. —Crê que tem algum problema? Max se encolheu de ombros. — Sumner disse que não viéssemos para deixar tranqüila a Morgan. Não acreditava que acolhesse a Lydia com os braços abertos. —É uma mulher muito bonita —respondeu Lou. —Sim, mas não gosta dos homens. —Toda uma pena —murmurou Lou. Max lhe deu um murro em um ombro, possivelmente um pouco mais forte do que o tivesse feito se só tivesse estado brincando. —Refiro-me a que é uma pena para o Sumner, Max. Shh —disse, esfregando o ombro. —Aposto dez dólares a que Lydia sairá dali em cinco minutos —disse ela, trocando de tema brandamente. —Te aceito a aposta. Ela o olhou com cara de poucos amigos. —O que há entre vós, de todas as maneiras? —Entre quem? Entre a Lydia e eu? Ela assentiu. —Alguma vez...? —Não gosta dos homens. —Mas antes sim —replicou Max. —Como sabe? —Disse-me que tinha tido um bebê com um tipo — disse, e Lou ficou muito surpreso —. É que não sabia? —Claro que sabia. Mas não sabia que ela lhe havia isso dito. Ela encolheu os ombros. —Que mais te disse? —Nada —respondeu Max, e soube, pelo olhar do Lou, que havia algo mais—. Deus, Lou, me diga que não foi você. —O que? —ele piscou duas vezes e sacudiu a cabeça—. Não. Eu não tenho nada que ver com esses bebês. —Bebês? Eram mais de um? Ele se umedeceu os lábios nervosamente. —Isso não é nosso assunto, Max. Se quer saber algo do passado da Lydia, pergunte a ela. —Está bem, mas não se ponha na defensiva, de acordo? Só queria saber se tinha tido algo com ela. Ele a olhou com impaciência. —Não. —Não é que seja meu assunto. —Isso é certo.
—Porque nós tampouco temos nada fixo. —Nem fixo, nem nada absolutamente. —Bom, a noite é jovem, Lou. Não dê nada por sentado. Lou jogou a cabeça para atrás e deu uns golpezinhos contra o repouso para cabeças do assento. Max voltou à cara para que ele não pudesse ver seu sorriso malvado. Deus, adorava irritar aquele homem. Sabia que lhe causava excitação, sem que pudesse evitá-lo. E tinha a intenção de irritá-lo tudo que fosse possível. Aquela era uma oportunidade muito boa para deixá-la passar. Estavam sozinhos no carro. O que faria ele, perguntou-se Max, se lhe pusesse uma mão sobre o regaço? Provavelmente, sairia do carro e se poria a correr pelas colinas. Olhou-se a mão que tinha apoiada no assento, entre eles, e a aproximou um pouco da perna do Lou. —Quem demônios é esse? —perguntou ele, olhando a alguém com os olhos entrecerrados. Ela resistiu o impulso de soltar um juramento e notou algo como um alerta por toda a costa. Volto-se e viu uma figura escura que se dirigia a casa. Quando passou ao lado de uma das luzes, sua cara se iluminou durante um segundo. — É o homem queimado! —disse Max. —É o mesmo homem que viu a noite do incêndio? —Não sei. Isso foi faz cinco anos, não te lembra? —a soltou—. Bateu na porta. Vamos, será melhor que nos movamos. Abriu a porta do carro e saiu. Lou saiu rapidamente e ficou a seu lado. —Fique detrás de mim, Max. Ela não respondeu, mas não estava disposta a usá-lo como escudo humano. Estavam chegando à porta justo quando Sumner abria. —Quem demônios é você? —É o homem que estava atacando a Morgan a noite que chegamos —disse Max. Os dois homens dirigiram o olhar para eles. Lou tinha a pistola na mão. Não apontava a ninguém, mas se assegurou de que a vissem. —Acredito que já é hora de que falemos senhor Stiles. O homem assentiu, mostrando as mãos com as Palmas para cima. —Sou Frank Stiles —disse—. E vim para isso: para falar —olhou ao Sumner—. Com todos vocês. Não acredito que saibam com o que se estão enfrentando. Sumner olhou ao Lou. —O que opina? Lou se aproximou até o homem. —Levante as mãos, amigo —o homem levantou as mãos um pouco mais e Lou deu a arma a Max para poder revistá-lo. Depois de comprovar que não ia armado, tomou a arma de novo—. Sumner quer ouvir o que este tipo tem pra lhe dizer? —Acredito que deveríamos, não? Lou assentiu a contra gosto. — Se tentar algo, não duvidarei. Entende-me? —Não vim a machucar ninguém —disse Stiles brandamente—. Só quero ajudar. Então Sumner lhes abriu passagem e todos entraram no vestíbulo. —Ajudar? —perguntou-lhe Max—. Era isso o que estava fazendo com minha irmã quando eu cheguei à outra noite? Ajudá-la? —Estava comprovando se a tinham mordido.
Max baixou a cabeça enquanto todos foram para uma pequena sala que havia no outro lado do salão. Ela imaginou que seria para que Morgan não os ouvisse se por acaso descia as escadas. —Onde está Lydia? —perguntou Max quando todos se sentaram. —Acaba de subir para ver como está Morgan —disse Sumner, e se voltou para o Stiles—. Se tiver alguma explicação para atacado a essa garota, senhor, sugiro-lhe que nos dê isso quanto antes. —Tenho que começar pelo princípio. Se me derem cinco minutos, poderei fazer que entendam... —Seguro? —perguntou-lhe Max—. Vai conseguir que entenda por que colocou uma bala no cérebro da minha melhor amiga? Stiles a olhou. —Eu estava ali, é certo, mas não fui o quem atirou na sua amiga. Foi ele. —Quem? —Dante. O assassino ao qual estou tentando apanhar. —Os vampiros não atiram nas pessoas, Stiles. —Sim o fazem, se estão tentando incriminar a alguém. Como a mim. —Assim Dante incriminou a você? Pois é divertido, porque a polícia pensa que Lou foi quem o fez. Ele foi à pessoa a que incriminaram. —Ele é um policial. Eles souberam que não o tinha feito quase imediatamente. A seguinte opção fui eu —a expressão da Max era de incredulidade, mas Stiles continuou—. Por favor, me escute. —Está bem —disse ela. —Durante vinte anos fui agente da Divisão de Investigações Paranormais da CIA, uma agência secreta. Nosso quartel general estava do White Plains. Nossa missão era apanhar e eliminar vampiros. Max assentiu. Ela já sabia tudo aquilo. Sumner ficou completamente assombrado. Olhou ao Lou, e depois outra vez ao Stiles. —Meu Deus, quer dizer que tudo isto é real? —O que estou dizendo é certo. Os vampiros atacaram o quartel e o queimaram, e mataram grande parte de nossos agentes. Aquilo ocorreu faz cinco anos. Foi um desastre. Retiraram-nos da investigação e a Divisão se fechou. Alguns agentes que sobreviveram se ocultaram rapidamente, como eu. —Por quê? —perguntou Max. —Para evitar ter que dar parte de nossa missão. Nós sabemos muitas coisas, e o governo não pode arriscar-se a que se façam públicas —continuou, olhando ao Max—. Por isso a ameacei aquela noite. Não podia permitir que ninguém se inteirasse de que eu sigo vivo. —E quando eu o disse a alguém, inclusive embora tivessem passado cinco anos, você se inteirou de algum modo. —Ainda tenho alguns contatos na CIA. Um de meus conhecidos me disse que o oficial Malone tinha ligado. —Assim foi à casa do Lou, enganou a minha amiga para que fosse também e lhe atirou para me ensinar uma lição. — Não! Fui a sua casa para tentar averiguar o que ele sabia. O vampiro estava ali,
esperando. E a garota estava inconsciente no chão, antes que eu pudesse fazer algo, lhe disparou. Depois me sorriu como um demônio e partiu —sacudiu a cabeça lentamente e continuou—. Sabia que viria pelo Morgan depois, e por isso vim diretamente vê-la. Para lhe advertir. —E por que ia fazer Dante algo assim? —perguntou ela. —Ele sabe o que estive fazendo —respondeu Stiles—. estive procurando os membros da DIP que sobreviveram e tentando reagrupá-los para formar uma unidade de elite peritos caçadores de vampiros — suspirou e baixou a cabeça—. Dante quer me tirar do meio. Imaginou que se me incriminava no assassinato de sua amiga, você e o oficial Malone conseguiriam me colocar no cárcere. Max se apoiou no respaldo de sua cadeira, tentando digerir tudo o que tinha ouvido. —Isso não explica o que fazia Dante no apartamento do Lou, em primeiro lugar. O homem sacudiu a cabeça e disse: —É que não o entende? Você e Malone estavam tentando encontrar ao assassino da amiga da Lydia Jordão. Deve ser Dante. Devia ter medo de que o descobrissem e o denunciassem. —Um pouco enrolado —disse Max, suspirando enquanto pensava em todo aquilo. —O que não entendo é por que quer você seguir matando vampiros —disse Lou. Ao ver que todo mundo ficava um pouco surpreso, continuou—. Se forem como Morgan os retrata em seus roteiros, não são tão maus. —Morgan está sob o controle de um poderoso vampiro, oficial Malone —respondeu Stiles—. Confie em mim, sei do que é capaz. Tem-na completamente hipnotizada. Ela fará tudo o que ele diga inclusive voltar-se contra a gente a quem quer para protegê-lo. —Isso não entendo —disse Max—. Como é possível? — Sua irmã tem um antígeno chamado Belladonna no sangue —disse Stiles—, e isso a está matando lentamente. —Como sabe isso sobre ela? —perguntou Sumner, ficando de pé. —Quando o antígeno se identificava no sangue de qualquer pessoa mortal, essa informação se transmitia aos relatórios da DIP. Não há muita gente com o antígeno, mas aqueles que o têm atraem aos vampiros como o mel às abelhas. Alimentam-se deles e lhes roubam a vida. Por isso sempre morrem jovens. Não é o antígeno, a não ser o vampiro ao que atraem que os mata. E, a menos que matemos ao vampiro, continuará alimentando-se de sua irmã até que morra. Se o detivermos, ela viverá. Sumner apartou o olhar, mas Max viu as lágrimas em seus olhos. —O médico diz que é seu sangre o que a está matando. —Mas não sabe por que, nem como. Todo aquele que tem este tipo de sangue morre jovem e os doutores não sabem por que, Sumner. É porque são vítimas dos vampiros. Max o olhou fixamente. —Está-me dizendo que se pode salvar? Que pode melhorar? —Sim. Mas teríamos que protegê-la do vampiro. Piscando, Max olhou ao Lou, lhe pedindo em silêncio que lhe dissesse que podia acreditar naquele homem. Deus, queria acreditar. Mas Lou fez um gesto negativo quase imperceptível. antes que pudesse falar, entretanto, Lydia entrou correndo na habitação, sem fôlego. —Não está! —gritou—. Morgan se foi!
CAPÍTULO XXII
O corpo Dante despertou com prazer, mas não com vigor. Tinha uma sensação estranha. Sentia-se satisfeito, mas enjoado, fraco. Possivelmente só tinha sonhado os prazeres da posse... Levantou a cabeça e tentou esclarece a vista. Estava no chão, com o braço apoiado no muro de pedra. E a lanterna estava acesa. Não recordava havê-la aceso, nem haver despertado. Não levava camisa, e tinha as calças desabotoadas. Sentia o sabor do sangue na boca. E então a viu, nua, deitada no cetim branco. —Morgan! —Dante ficou de pé, mas voltou a cair de joelhos devido ao enjôo. aproximou-se dela arrastando-se—. Deus, Morgan —tomou-a pelos ombros e lhe deu a volta, deitando-a sobre as costas. Viu, horrorizado, que estava totalmente pálida e que tinha os olhos fechados. Seus olhos se encheram lágrimas. Lágrimas. Não recordava a última vez que tinha chorado por alguém, e muito menos por um mortal. Na garganta, Morgan tinha as marcas de seus dentes. E havia mais. Em seus peitos, nos ombros, inclusive no ventre. Tinha-a tomado por completo, tinha tomado seu corpo e seu sangue. —Morgan, o que tenho feito? Não é possível que te tenha feito isto. Por favor, acorda —disse, e escutou perto de seu nariz, espetando ouvir sua respiração. Era débil, mas respirava. Ela abriu os olhos e esboçou um sorriso. —Oh, meu amor... —Shh. Não tente falar. Deus, Morgan, sinto muito. —Te... trouxe algo. Ele sacudiu a cabeça sem entender o que dizia, mas então seguiu sua mão e viu uns livros sobre a mesa. —Seus Diários. —Meus Diários... —procurou em sua memória—. Deixei instruções a um advogado... O baú ia ser guardado em um armazém... Oh, demônios, o que importa isso agora? —Sim importa —sussurrou ela. Apertou a mandíbula e tragou saliva—. O roteiro também está aí. Destrua-lhe, Dante. Ele a olhou, sacudindo a cabeça. —Tem que saber que pode confiar em mim. Trouxe-lhe isso para lhe demonstrar. —Está preocupada se por acaso não confio em ti? Olhe o que te fiz Morgan. —Fez o que eu te pedi que fizesse —sussurrou ela. Fracamente levantou uma mão e lhe acariciou—. Lágrimas? Está chorando? Suas mãos tremeram em seu cabelo ao aproximar sua cabeça e apoiar-lhe no regaço, sem poder conter sua angústia. —Como pode perguntar isso? Meu Deus, Morgan, sinto-o muitíssimo —lhe quebrou a voz e não pôde seguir falando pela emoção enquanto a abraçava. —Arruma-o —disse ela—. Dê-Me de seu sangue. faça-me imortal, como você. Dante inclinou a cabeça para trás, apertando a mandíbula.
—Dante, por favor. Não me deixe morrer. Sei que não o faria. A ele escorregou uma lágrima pela bochecha quando baixou a cabeça para olhá-la. —Não posso fazê-lo agora, Morgan. Estou muito fraco. Não sobreviveria, e se por algum milagre o fizesse, só seria um zumbi sem a capacidade de pensar. Ela deixou escapar um suspiro tremente. —Não o entendo... Eu acreditava... —Converter a alguém requer que um vampiro seja forte. Inclusive então fica muito débil. Ontem à noite estive a ponto de me sangrar antes que pudesse me curar com o sono do dia. —Mas bebeste que mim. Ele baixou a cabeça. —É porque estou doente, verdade? Meu sangue já não tem vida. É isso, verdade? Ele assentiu. —Vi o que ocorre quando se transmite o dom com sangue débil, Morgan. Os novos vampiros são corpos sem razão, sem pensamento nem personalidade e que só existem para alimentar-se. São monstros de verdade. Não posso te amaldiçoar e te condenar a essa existência. Não estou disposto. Sinto muito, Morgan. Seriamente o sinto. —Bem, tem-no feito de novo, não, carinho? Sarafina se aproximou deles pelo passadiço da cova. Dante a olhou. Levava uma saia vermelha até os pés, um casaco negro e jóias suficientes para agradar a uma rainha. —Fina. Graças a Deus. —Não dê graças a Deus por mim, Dante. Não tem nada que ver com minha existência —entrecerro os olhos ao olhá-lo à cara—. É lágrima isso que vejo? Meu Deus, te olhe, ficaste reduzido a chorar por uma mortal. —Tem que ajudá-la —disse Dante. Notava a ira da Sarafina, envolvendo-a como uma nuvem quente, mas tinha que tentar—. Morrerá, a menos que você a transforme. Ela soltou o ar que tinha nos pulmões e moveu desdenhosamente a mão, fazendo que os braceletes soassem em seu braço. —Se a desejas tanto, faz você mesmo. —Não posso. Estou muito fraco. —Oh, vamos, Dante. Também a quereria se fosse uma imbecil. Obedecer-te-ia em tudo, seria sua amante, inclusive muito melhor que uma mortal. Caçaria para ti e te serviria. Você não gostaria disso? Ele levantou a cabeça orgulhosamente. —É tu quem gosta dos idiotas, não eu. —Não, mas parece que você é o mais propenso a manter relações sexuais com os mortais até matá-los. Quantas vão até a data, dois? —Não está morta. —Estará em uma hora. —Por que não quer me ajudar? Sarafina arqueou as sobrancelhas. —Porque me voltou às costas, Dante. Se realmente quer minha ajuda, me deixe matar a essa por ti. Desfrutaria muito bebendo o que tenha deixado de sangre em seu corpinho débil e pálido. Carrancudo, Dante deixou brandamente a cabeça de Morgan no chão e se levantou para encarar-se com a Sarafina.
—Antes te matarei. Ela estremeceu de dor. Ele o viu. Foi um relâmpago em seus olhos. —E isso demonstra o que disse. Mataria sua companheira na vida, por ela. —Você não é minha companheira. Nem minha mulher, nem minha amante. —Eu te fiz —sussurrou ela. —E por isso é minha proprietária? Ela ficou tensa e rígida, e depois lhe disse: — Maldito seja por me trair, Dante! Maldito seja e o resto de minha raça! Não necessito a nenhum! —e girou em um redemoinho de tecido. Voou para a porta e desapareceu. O suspiro suave, mas desesperado de Morgan atraiu sua atenção. Não podia prestar atenção à dor da Sarafina, embora também lhe doesse. Não podia dedicar-se ao sofrimento de sua mãe escura. Só podia dedicar-se a Morgan. —Isto é tudo... por minha culpa —sussurrou ela. —Por que fez isto, Morgan? por quê? Ela sacudiu a cabeça. —Estava muito débil, e acreditei que poderia morrer. —E não te ocorreu que você poderia morrer muito mais facilmente que eu? —então se ajoelhou de novo a seu lado e a abraçou—. Não. Você pensou que eu não deixaria que ocorresse. E não vou permitir. Então a tomou nos braços e a levou pelo passadiço para a saída. —Os diários —sussurrou ela—. Deve trazê-los, Dante. E tem que ir a casa pelos outros. —Podemos fazê-lo juntos, quando estiver bem. —Estão na caixa forte, no escritório. A combinação é o ano em que te encontrei. Mil novecentos e noventa e sete. —Não vou deixar que morra, Morgan —se sentia muito débil, mais e mais a cada segundo que passava, mas tinha que salvá-la. —Não é tua culpa, Dante —murmurou Morgan. Ele saiu da cova e conseguiu subir até a esplanada de erva como pôde, com ela nos seus braços. Depois começou a andar para a casa. —Dante? Não! Não me leve para eles. Quero ficar contigo. —Morrerá sem ajuda, Morgan. —Então, morrerei em seus braços. Tomarei meu último fôlego contra seus lábios. Dante, não me leve ali... Ele se deteve e olhou à mulher que tinha arriscado sua própria vida para salvá-lo e que tinha acreditado nele, entregando-se por completo. Nunca tinha acreditado que ninguém pudesse o amar daquela forma. Sua própria família havia lhe virado as costas, e tinha vivido sua vida sem confiar em ninguém. Entretanto, sim confiava nela, e se deu conta, muito tarde, de que sabia que podia fazê-lo muito antes que lhe entregasse os diários, antes que se deixa a vida tentando salvar a ele. Queria-a. Inclinou-se e a deixou no chão. Brandamente, com ternura, beijou-a. —Vive, por mim, Morgan. Só uma noite, para que possa me alimentar e me fortalecer de novo. Depois voltarei por ti, juro-lhe isso. Ninguém poderá impedir isso. Beijou-a de novo, mas se deu conta de que ela tinha perdido o sentido. Então ouviu as vozes de seus amigos, que saíam da casa com lanternas, chamando-a. Levantou a cara e
os chamou: — Aqui! Está aqui! E começou a andar para o escarpado. A três passos, sentiu uma flecha na perna, e uma dor insuportável o derrubou ao chão. Notou que o sangue lhe escapava pela ferida, e em poucos segundos, alguém o sujeitou pelo ombro. O homem das cicatrizes o olhou e sorriu.
—Oh, Deus —disse Max, ajoelhada ao lado de sua irmã. Morgan jazia no chão, envolta em seda branca, com duas marcas no pescoço. —Vêem-nas? Estão as vendo? A seu lado, Lydia assentiu e gaguejou: —As... vejo. Não posso acreditá-lo, mas as vejo. David não podia dizer nada. O medo não lhe deixava falar. Lou tinha o pulso da Morgan entre os dedos. Olhou para cima e assentiu. —Está viva. Max começou a soluçar de alívio, sem poder conter-se. —Vamos a levar para casa. Lou olhou mais à frente, à grama, franziu o cenho e se levantou. —Leva-a, David. Será um segundo. Max seguiu seu olhar até onde estavam Frank Stiles e o homem escuro que tinha feito aquilo a Morgan. Lou se aproximou, e Max o seguiu. —Fica com ele —disse a Lydia, e pôs-se a andar. Stiles estava dizendo: —Por fim te tenho. E esta vez não vai escapar. Quando Max olhou além da horrível careta do Stiles, ficou sem respiração. Aquele homem era exatamente igual às imagens que Morgan tinha desenhado e que estavam na parede de seu escritório. —É Dante? Ele assentiu, mas era evidente que estava sofrendo muito. Olhou-lhe a perna. —Deve lhe haver dado na artéria. Meu Deus, está-se sangrando... —Os de sua raça se sangram muito rápido. Morrerá em poucos minutos —disse Stiles, lhe cuspindo. —Se morrer, Morgan também morrerá —disse Dante. —Não te atreva a ameaçar a minha irmã —disse Max, em um sussurro raivoso. — Não acredito que seja uma ameaça, Maxie —disse Lou. Ajoelhou-se, agarrou a flecha e olhou a Dante. Ele assentiu uma vez, e Lou empurrou a flecha com força até que a tirou de sua perna. Quando o fez, Dante jogou a cabeça para trás e uivou de dor. Depois, Lou lhe fez um torniquete na coxa com seu próprio cinturão. —Não entendo por que está ajudando-o —disse Max—. por que, depois do que fez a Morgan? —Não, não, Lou tem razão —disse Stiles, brandamente—. Será muito útil para minha gente vivo. Dante olhou ao Lou, e Max se surpreendeu de ver o medo em seus olhos. Lou captou sua atenção, entretanto, ao começar a falar. —Trouxe-nos para a Morgan e nos chamou para que viéssemos procurá-la. Ao fazê-
lo, recebeu um tiro na perna com esse artefato dele. De onde tirou isso, Stiles? Revistei-o na casa. —Estava em meu carro. Peguei quando soubemos que Morgan não estava na casa. —Ele a trouxe de volta —disse Lou—, e não tinha por que fazê-lo. Se estivesse tentando matá-la, para que teria se incomodado? Stiles soltou um juramento e apartou o olhar. —Não importa. Agora é meu prisioneiro. Vou levar-lo. A vocês não voltará a incomodar mais. —Não vai o levar a nenhuma parte, Stiles —disse Lou—. Vai para casa com outros, ou vá embora. —Este é meu projeto, Malone. Sou um agente federal. —É um ex-agente federal. Eu, entretanto, sou policial da ativa, e a menos que queira acabar sendo meu prisioneiro, sugiro-lhe que deixe dirigir este assunto. Max viu que Lou a olhava. Então pegou ao Stiles pelo braço e puxou ele para a casa. Ele não resistiu muito, ela estranhou. —Se der uma oportunidade a essa besta, matará a sua irmã. Exatamente igual fez com sua amiga. —Por que não se vai e nos deixa dirigir isto? —Oh, não. Não vou parti para nenhum lugar. —Se ficar, terá que jogar segundo nossas regras. Do contrário, Lou não terá que prendê-lo, porque eu farei algo pior. Entende-o? Ele a olhou depreciativamente e assentiu. —Obrigado —disse o vampiro. —Não me dê obrigado. Não posso deixar que se vá e sabe. —Tem que me deixar. Lou sacudiu a cabeça. —O que queria dizer com que se você morrer, ela também morrerá? O vampiro o olhou tentando ler a expressão de sua cara. —supõe-se que vai acreditar no que eu lhe diga? —Não acredito em nada disto, mas quero ouvi-lo. Dante ficou em silêncio, pensativo. Depois lhe disse: —Eu sou o único que pode salvá-la. —Como? —perguntou Lou. —Não posso dizer-lhe Só posso lhe dizer que preciso me curar, me alimentar de novo e recuperar minha força para ajudar a Morgan. —Tem que ir-se morder a outro inocente e deixá-lo como a Morgan, ou pior? Eu não posso fazer isso —lhe disse, enquanto o ajudava a levantar-se para ir para a casa. Deu-se conta de que estava sofrendo muito. —Eu não Mato. —E se o fizesse, admitiria ante mim? Dante se estremecia de dor com cada pequeno movimento. —Não. Suponho que não. —Tenho a responsabilidade de mantê-lo sob custódia —disse Lou, raciocinando enquanto caminhavam—. Parece bastante claro que você atacou a Morgan, assim é meu principal suspeito. Ao menos, tenho que mantê-lo encerrado em um lugar onde não possa
fazer mais dano até que pense em algo. Dante suspirou, mas Lou não soube se foi por desespero ou por docilidade. —O único que têm que fazer é mantê-la com vida —disse. —Dá-se conta do quanto está doente? Embora sobrevivesse esta noite, não duraria muito mais... O vampiro fechou os olhos. —me prometa que a manterão com vida... Lou assentiu. —Farei tudo o que possa. O vampiro assentiu. Depois, disse: —Você parece um homem decente, para ser um mortal. Isso faz que o sinta ainda mais... Lou franziu o cenho. —Sentir o que? —então sentiu algo como um punho, pensou, embora lhe parecesse uma bala de canhão, na cabeça, e caiu ao chão sem sentido. Todos estavam ao redor da Morgan, que, deitada no sofá do salão, gemia e murmurava coisas sem sentido, e mencionava o nome de Dante a cada instante. A Max estava rompendo o coração. Olhou para o vestíbulo para ouvir que a porta se abria. Lou entrou, sozinho. —Lou? —Sinto-o —disse, esfregando-a cabeça—. conseguiu escapar. Uma enxurrada de maldições invadiu a habitação, e Max cravou os olhos no Stiles, que tinha estado sentado nas sombras, observando-o tudo. Tomou sua pistola de suspensão do chão e se dirigiu para a porta. Lou se interpôs em seu caminho. —Não é coisa sua —lhe disse. —Ele voltará a matar se o permitimos. Tem que fazê-lo, porque do contrário, ele mesmo morrerá. Já viu quão débil estava. —Não acredito que vá matar a ninguém —disse Lou. Olhou ao Max e continuou—: Poderia ter matado a Morgan, e poderia me haver matado agora mesmo, se tivesse querido. —Lou, e o que acontece se está confundido? —sussurrou-lhe Max. —E se não? —perguntou-lhe Lou—. Max, diz que pode salvá-la. O que acontece se ele é o que está dizendo a verdade? —Oh, pelo amor de Deus. De verdade crê? Acredita na palavra de uma besta antes que na minha, que sou de sua raça? — Senhor Stiles, não acredito que ninguém desta habitação seja de sua raça —disse Lydia. David Sumner a olhou, e depois olhou de novo ao Stiles. —Lydia, não pode estar d lado do vampiro nisto. Deus, olhe a Morgan. —Estou olhando-a, David. E estou escutando-a, também. Ela o quer. Está nutrindose, e só pode pensar nele. Isso não te diz nada? —Diz-me que está em transe, como Stiles nos explicou. —Ou que Stiles está mentindo e Morgan sabe a verdade —replicou Lydia. David ficou de pé de um salto. —Fez-lhe dois buracos no pescoço de sua filha, Por Deus, Lydia! Ela sacudiu a cabeça e abriu muito os olhos. Max acreditou que seu coração tinha parado. Não podia deixar de olhar ao David e depois a Lydia, e outra vez ao David. —O que disse? —perguntou ao Lou—. O que... disse?
David se cobriu a cara com as mãos. —Sinto muito. É só que... sinto muito. Max se aproximou da Lydia e a olhou atentamente, estudando seus rasgos. Eram inclusive mais viçosos que os seus, mas de repente, encontrou similaridades. —Você... você é nossa mãe? —Não queria que soubessem. —Por quê?—perguntou Max. Lydia fechou os olhos e sacudiu a cabeça rapidamente. —Oh, vamos. É esta sua fantasia, Maxine? Inteirar-se de que sua mãe era uma adolescente que se vendia na rua para sobreviver? Ao Max lhe encheram os olhos de lágrimas. —Isto é muito de uma vez. Não posso com tudo —piscou e se secou os olhos—. Jesus, onde está essa maldita ambulância? — aproximou-se da janela, apartou a cortina e olhou. Depois se voltou para a Lydia—. Você sabia? Por isso fez que Lou nos apresentasse? Lou falou antes que Lydia o fizesse. —Ela não sabia Max. Eu... eu tinha a suspeita. Sabia que seu aniversário era o mesmo dia em que Lydia acende uma vela e passa o dia chorando pelos bebês que teve que dar em adoção. E por isso lhes apresentei, para que pudessem deduzi-lo por vocês mesmas. Max o olhava com as lágrimas lhe correndo pelas bochechas. —Tinha que me ter dito isso, Lou. Como pudeste não me dizer isso —Bom, tudo isto é muito comovedor —cortou Stiles, aproximando-se da porta—, mas quanto mais fique aqui escutando esta novela, mais se afastará essa besta de mim —e continuou andando. Lou lhe cortou o passo de novo. —Tire-se de meu caminho, Malone. —Dê-me a pistola de suspensão. Stiles esboçou um sorriso malvado e sacudiu a cabeça. —Tome-a, se puder. Sem lhe dar tempo a que dissesse nada mais, Lou tirou sua pistola e a pôs no estômago do homem com um movimento suave. —Posso. dê-me isso. Stiles pôs as mãos por cima de sua cabeça e Lou lhe tirou a pistola de suspensão de uma delas. Então, Stiles o olhou fixamente, mas voltou para seu lugar. Naquele momento, ouviu-se uma sirene distante, e aos poucos segundos, a ambulância tinha chegado à porta da casa. Lou guardou a arma e abriu a porta para que pudesse entrar a equipe médica. Max ficou ali, observando como ocorria tudo, mas sem ver nada. Estava desorientada, confusa e furiosa. E Lou se aproximou dela para abraçá-la. —Parece que está em estado de shock. —Deveria ter me dito isso, Lou. —Já tinha o suficiente. —Não me diga tolices —respondeu ela. Mentalmente, repassou os acontecimentos dos últimos dias. Tinha descoberto que tinha uma irmã gêmea que estava morrendo. Tinha visto sua melhor amiga em coma por um tiro. Tinha descoberto que sua mãe natural era uma ex-prostituta com o coração de ouro. E aquela mesma noite tinha conhecido a um vampiro.
—Vai para o hospital com sua irmã, e a protege dele. —De Dante ou do Stiles? —Dos dois. Melhor dizendo, não se preocupe pelo Stiles. O manterei a meu lado. —Aonde vai? —Procurar a Dante. O médico e os enfermeiros tinham posto Morgan em uma maca e ia levá-la à ambulância. Max os observou durante um momento, e disse: —Lou, acaba de impedir ao Stiles que vá pelo Dante, algo pelo que poderia te dar um chute. E agora vai você mesmo atrás dele, e levar ao Stiles? —Eu não quero que Stiles o cace como a um animal, e que o mate, ou algo pior. Isso não é o que eu vou fazer. —Não, vais o apanhar como a um ser humano, verdade? Vais ler seus direitos. Lou baixou a cabeça. —Sim, algo assim. —Tentou matar minha irmã, e não é um ser humano. —Sei. —Pois também tem que saber isto —lhe disse ela, lhe tirando a pistola de suspensão das mãos enquanto a equipe médica tirava a Morgan pela porta—. Pode protegê-lo se quiser, mas se tenta aproximar-se da Morgan outra vez, matarei eu mesma. E não deixarei que ninguém me impeça. Nem sequer você. Depois volto-se e tropeçou com o Stiles. Ele assentiu aprovando e lhe pôs um cartão de negócios na mão. —Meu número do celular. É a única que vê as coisas com claridade. É possível que me necessite. Ela o apartou e foi para a porta. No caminho, pegou uma jaqueta do cabideiro da entrada e envolveu a pistola de suspensão para escondê-la, e depois se enfiou o cartão do Stiles no bolso dos jeans. No último momento se voltou e disse a Lydia: —Você e David venham detrás, no carro, de acordo? Eu quero ir com ela na ambulância. Lydia ficou assombrada, e com um sorriso de alívio, respondeu: —Iremos justo detrás de vocês. A meio caminho para a ambulância, Max se voltou e disse: —Lou? Tome cuidado, de acordo? Não lhe dê as costas a essa serpente do Stiles nem um segundo. Nem a Dante, tampouco. —Não tinha intenção de fazê-lo. Ela o olhou aos olhos. Odiava-o por ter deixado que aquele animal escapasse. Não, não o odiava em realidade. —Senhorita? Max apartou o olhar, voltou-se para o médico que lhe sustentava as portas da ambulância e entrou no veículo. Lou observou como partia sentindo-se muito mal. Tinha falhado a Max. Ela tinha acreditado que ele ficaria de seu lado, que vingaria a sua irmã. Demônios, uma parte dele queria fazê-lo, mas não passou vinte anos trabalhando de policial para fazer caso omisso naquele momento de tudo o que tinha aprendido. O instinto lhe dizia que Stiles não era de confiança. Dante tinha algo que não
encaixava no perfil que o homem das cicatrizes se empenhava em desenhar ante eles. O instinto lhe dizia que o monstro era, em realidade, um bom tipo. Não tinha sentido, mas assim era. Quando a ambulância e o carro da Lydia e David desapareceram pela estrada, Lou entrou na casa de novo. Mas naturalmente, Stiles tinha partido fazia um bom momento.
CAPÍTULO XXIII
Em circunstâncias normais, Dante teria viajado muito rápido a pé. Mas aquela noite necessitava de um carro. A pesar do torniquete, continuava sangrando muito, e a dor que sentia era cegadora. Percorreu a calçada em busca de um carro que o dono tivesse tido o descuido de deixar as chaves postas. Não teve sorte. Parecia que o destino estava conspirando contra ele, por tudo o que lhe estava ocorrendo. De repente, apareceu um Ford Mustang branco. O casal adolescente que o ocupava ia ligeiramente embriagado, e a Dante resultou fácil entrar na mente do menino para intensificar sua pressa por levar a garota a seu apartamento. No momento, que o menino estava fora do carro, tinha rodeado, rindo, e tinha posto o braço da garota sobre os ombros enquanto se afastavam do carro alegremente. Dante se retirou da mente do jovem sem fôlego. Aquele simples uso de sua energia o tinha deixado exausto. Aproximou-se arrastando a perna ferida e abriu a porta do carro. As chaves estavam postas. Subiu ao veículo e o pôs em marcha. Necessitava sangue e necessitava que lhe costurassem a ferida para evitar sangrar-se antes que chegasse o dia. Sarafina o tinha abandonado, embora certamente, segundo seu ponto de vista, ele a tinha abandonado primeiro. Tinha que chegar a casa de Belinda, a mulher do Bangor. Demorou uma hora para chegar a seu apartamento. Ele tinha o cartão de entrada do edifício, e a do apartamento. Quando chegou a seu andar, apoiou-se sem forças na porta e golpeou brandamente com o punho. Ela não respondeu, assim ele abriu e entrou cambaleando. Belinda estava deitada no sofá. Estava vestida de vermelho e lhe deu boas- vindas com um olhar de morte. Não. Não levava nada. Tinha os pulsos abertos e seu sangue tinha alagado o chão e o sofá. Inclusive tinha manchado as paredes. E era sangue velho, sangue morto. Perdida. —Acreditava que não sabíamos nada dela, Dante? Dante volta-se rapidamente e esteve a ponto de cair. Stiles estava ali, sorrindo com aquela cara de maldade. —Não podia deixar vivo a seu banco de sangue humano. Necessitava-a muito. Sabia que viria aqui esta noite. —Ela era inocente. Deus, é um miserável sem coração —Dante tentou lhe dar um
murro, mas não o alcançou, e teve que agarrar-se a uma mesa para não cair. —O fim justifica os meios, entretanto. O que você não sabe é que reagrupei a alguns dos homens que trabalhavam para a DIP. Oh, não somos muitos, só um punhado. Os sobreviventes daquele famoso incêndio no White Plains. Dante sacudiu a cabeça. —O governo... —Não tem nada que ver conosco. Somos financiados por mãos privadas. Os de sua classe deveriam ter mais cuidado na hora de alimentar-se, Dante. Os ricos gostam da vingança, e podem permitir-se o luxo de pagá-la. E quando não nos pagam, fazemos apenas por diversão —Stiles entrou no piso com outros três homens armados. Um tinha uma pistola, outro uma pistola de suspensão e o terceiro uma estaca. Dante fechou os olhos e sacudiu a cabeça ao ver o terceiro com aquele clichê nas mãos. — Vejo que tem a um novato na equipe. Stiles soltou uma gargalhada suave e perigosa. — Alegra-me comprovar que tem bom humor em um momento como este —disse—. Não, Dante, não é um novato. A estaca foi tratada com um novo produto químico que, segundo nossos estudos, terminará com os de sua classe. Mas, é obvio, não saberemos com segurança até que o provemos —se aproximou de Dante lhe levantou o queixo com a mão —. Quem crê que vai ser nossa cobaia? Dante usou todo o poder que ainda restava para cravar o punho no estômago do Stiles. Stiles se dobrou e cambaleou para trás, e os outros três homens deram um passo para frente. —Quietos aí. Lou Malone, o policial, estava na soleira com sua pistola na mão, e os homens ficaram imóveis. — Atirem isso ao chão! —gritou-lhes Lou. As armas caíram ao piso. —E agora, contra a parede. Vamos, movam-se. As mãos detrás da cabeça e as pernas separadas. Assim, muito bem. Fez-lhe a Dante um gesto com a cabeça. Dante assentiu e caminhou coxeando para a porta. No meio do caminho se deteve e se agachou com dificuldade para agarrar a estaca. Assim que fechou a mão ao redor da madeira, a pele começou a queimar, e a soltou. agarrou o braço e observou assustado que saía fumaça da pele abrasada. Ficou de pé e seguiu coxeando até o vestíbulo. — Tenho um carro lá fora —disse Lou—. Ponha em marcha e espera dentro. Eu sairei em um segundo — Lou tomou o telefone e marcou o número da polícia. Dante saiu. Lou deu um golpe na cabeça dos homens com a culatra da arma. Depois lhes pôs as algemas a dois deles e as sujeitou ao radiador. Fechou a porta e desceu ao carro, supondo que aquilo daria tempo suficiente à polícia local para chegar e encontrá-los ali. Tempo suficiente como para que ele pudesse levar a seu prisioneiro sobrenatural são e salvo. Supunha também que teria que seguir a Dante de novo, mas ao menos Stiles não os incomodaria. Entretanto, ficou surpreso ao ver que o vampiro não tinha fugido e estava esperando-o no carro. Conduziu a toda pressa até o hotel e levou Dante ao quarto sem que ninguém os visse. Entrou diretamente no banheiro e deixou o vampiro no chão, apoiado na parede. Estava imóvel. Possivelmente tivesse morrido. Demônios, ele não sabia como
certificar-se. Tinham pulso os vampiros? Encontrou umas tesouras e uma agulha e fio no nécessaire da Lydia. Ao menos, poderia lhe costurar a ferida. O sangue que lhe escapava já tinha formado um atoleiro no chão do banheiro. Com uma tesoura, Lou lhe cortou os jeans justo debaixo do torniquete, e ao ver a ferida, levantou-se para pegar um par de garrafas do mini-bar. Whiskey e vodca. Deu-lhe um gole de whiskey e derramou um pouco de vodca pela ferida. Dante grunhiu de dor e abriu os olhos. —Estava começando a pensar que estava morto. —Que demônios me está fazendo? —Me corrija se me equivocar, mas está te sangrando. Acredito que isso é mau, inclusive para um vampiro. —Especialmente para um vampiro —disse Dante, fechando os olhos de novo. —Isso me pareceu —Lou tomou a agulha e o fio, e o empapou de vodca. —Isso não é necessário —disse lhe Dê—. Não vai se infectar. — Nunca se sabe —disse Lou, encolhendo os ombros—. Lá vou — ao dar o primeiro ponto, o vampiro soltou um uivo de dor—. Demônios, nem sequer eu gritaria assim. Acreditava que era mais duro. Entre dentes, Dante lhe disse: —As sensações são muito mais... intensas em minha raça. —Oh. Não sabia —Lou observou seu rosto desencaixado de dor—. Quer que pare? —Não. Aquela vez, quando atravessou a carne do homem com a agulha, ao Lou também doeu. Deu quatro pontos bem tensos e fechou a ferida. Depois assentiu, satisfeito. —Há outro igual... no outro lado —conseguiu dizer Dante. —Deus —Lou tomou a garrafa de vodca, tomou o que restava ajudou a Dante a virar-se. Era agonizante infligir aquela dor a qualquer ser, vampiro ou não. Lou estava a ponto de vomitar quando terminou, e seu paciente não era mais que um montão tremente. Entretanto, os pontos resistiram, inclusive quando Lou o ajudou a meter-se na banheira para tirar o sangue como pôde. Depois o secou com uma toalha e o levou a cama. Imaginou que se Dante sobrevive-se aquela noite, estaria bem. De sua conversação anterior tinha chegado à conclusão de que os vampiros se curavam durante o dia, enquanto dormiam. Ele foi se limpar no banheiro e depois se acomodou em uma cadeira ao lado da cama, com a intenção de velar ao vampiro até que saísse o sol; Ia ser uma noite muito longa. Suspirando, chamou o hospital e pediu que lhe pusessem com a Max. Sua voz, quando respondeu, soava afogada. Cansada e velha. Muito velha para ser a de uma garota tão jovem. Queria lhe dizer algo que a fizesse sentir-se melhor. Queria confortá-la, mas não sabia como. —Que tal está Morgan? —quando formulou a pergunta, deu-se conta de que era uma estupidez. Como ia estar? —Estão dando soro, mas não podem lhe fazer uma transfusão porque não encontram doadores. E o necessita, ou morrerá —disse, e lhe quebrou a voz. —Sinto muito, Max. —Encontraste-o?
—A Dante? Sim. Tampouco está muito bem. Fiz o que pude. Agora está descansando. —E Stiles? —Ele e seus amigos passarão a noite com a polícia local, se tudo foi como eu planejei. Não acredito que nos incomodem, ao menos, até manhã pela manhã. Possivelmente mais tempo. —Assim minha irmã está a salvo esta noite. —Que eu saiba, sim. Houve um silêncio no outro lado da linha. —Max... Sinto te haver falhado. Ela não respondeu. Ele baixou a cabeça, tentando pensar em uma forma de romper o silêncio. Finalmente, ele disse: —Estou na suíte. Tem o número, verdade? —Sim. —Eu vou vigiar a Dante até que se faça de dia. Conforme tenho entendido, de dia não será nenhum problema, verdade? —Pelo que li nos relatórios, não. —Então, o deixarei no escuro enquanto pensaremos o que fazer depois. De acordo? —De acordo. —Se necessitar algo, me chame. —Não necessito nada. Aquilo lhe doeu. Parecia que já não confiava nele, como se ao lhe falhar tivesse caído de seu pedestal. —Bom —ele tomou ar e suspirou. —Boa noite, Lou. O silêncio lhe pareceu asfixiante. Suspirando, ele pendurou o fone no telefone. Depois se voltou para suíte, assegurando-se de que a porta e as janelas estavam bem fechadas. Depois pegou as duas garrafas de álcool vazias e as pôs frente à porta. Se alguém abria, cairiam e se golpeariam uma contra a outra, e despertariam se dormia. Finalmente voltou para o quarto, sentou-se em uma cadeira junto ao vampiro ferido e fechou os olhos. —Está sendo muito dura com ele, sabe? Maxine deu a volta na bancada das enfermeiras da UCI e viu que Lydia estava olhando-a fixamente. —É um conselho maternal ou uma opinião? Lydia se estremeceu. —Suponho que, da sua perspectiva, mereço isso. Max suspirou ao sentir uma pontada de culpabilidade. Entretanto, tentou lhe fazer caso omisso. —Como está Morgan? —Igual —disse Lydia, e baixou os olhos. Entretanto, Max se deu conta de que os tinha avermelhados, como se tivesse estado chorando toda a noite—. Deus, espero ter a oportunidade de... contar-lhe. —Que você é sua mãe? —perguntou-lhe Max—. Já teve a oportunidade, Lydia, mas não nos disse nenhuma palavra. Nem a Morgan, nem a mim. A mulher levantou a cabeça.
—Espero ter a oportunidade de lhe dizer que a quero. Isso é tudo. Não tinha intenção de lhes dizer o resto. Max se tragou o nó de culpabilidade que tinha na garganta. —Por quê? —Acreditei que já lhe tinha explicado isso. Como se sente ao saber que sua mãe era uma prostituta? Naquela ocasião, quem estremeceu foi Max. Foi como se a mulher a tivesse esbofeteado com suas palavras. —Está envergonhada do que foi. —Não, não estou envergonhada. Mas sabia que você e sua irmã sim o estariam se soubessem. —Conhece-nos tão bem para sabê-lo, embora só tenham passado uns dias? Naquele momento, uma enfermeira se aproximou, e as duas ficaram silenciosas enquanto ela ordenava uns papéis. —Se importaria de me passar às chamadas do telefone da sala de minha irmã a partir de agora? —Sinto muito, não há telefones na sala da UTI. Mas há um telefone na sala de espera, e também uma televisão. Está justo ao final do corredor do quarto de sua irmã. Ela assentiu. —Se receber outra chamada, me poderia passar isso ali? —Claro. Max olhou a Lydia, inclinou a cabeça e se dirigiu para a sala de espera. Quando passaram pela sala da Morgan, através do vidro, viram o David lhe sujeitando a mão e falando com ela. —Mesma cena, diferente hospital —murmurou Max. —Aqui é. Max olhou a Lydia, que estava segurando a porta da sala. Entraram, e Max viu uma máquina de café, uma televisão e uma rádio. Também havia um telefone, várias cadeiras e dois sofás, e uma mesa de centro. Max se sentou em um dos sofás, e Lydia jogou umas quantas moedas na máquina de café. Depois esperou que o copo de plástico se enchesse. —Disse-me que não está envergonhada pelo que fez para viver faz tantos anos — disse Max, brandamente—. Tenho curiosidade sobre isso. Lydia tomou o copo cheio, deu-lhe um sorvo e fez um gesto de desagrado. —Fiz porque não tinha escolha. Max esperou, mas não parecia que Lydia tivesse vontades de continuar. —Vamos, Lydia, não te parece que tenho direito de saber sua história? Lydia se aproximou de uma das cadeiras e se sentou. Tomou outro sorvo de café e o deixou sobre a mesa. —Suponho que sim, mas não é nada bonita. —A verdade não acostuma ser. Assentindo, Lydia começou a contar-lhe. —Quando tinha dez anos, meu pai morreu. Quando tinha onze, minha mãe voltou a casar-se. Meu padrasto era um homem violento. Max pensou que aquilo soava frio e clínico. —Te batia? —Batia e abusava de mim. Fez-me mal de todas as formas possíveis, e a minha mãe
também. Ela não podia deixá-lo, mas eu sim. —Saiu de casa? Quantos anos tinha? —Quatorze. Esse foi o tempo que custou me dar conta de que minha mãe não ia me proteger, porque nem sequer podia proteger-se a si mesma. E as coisas foram piorando. Pensei que, se não fosse logo, terminaria me matando. —Aonde foi? —perguntou-lhe Max enquanto a observava. Seus olhos estavam vazios. —A nenhum lugar. Não tinha nenhum lugar aonde ir. Perdi-me na cidade. Vivi nas ruas e fiz amigos ali. As drogas me ajudavam a suavizar a dor, e as pessoas me ensinaram como sobreviver. Ao princípio me pareceu horrível a idéia de vender meu corpo por dinheiro, mas quando tive fome de verdade, comecei a ver de maneira diferente. Era muito melhor que o que me ocorria em casa. Ao menos, eu tinha o controle de quando, e como e com quem. Ao menos, isso era o que dizia a mim mesma. Além disso, pagavam-me — encolheu os ombros—. Sobrevivi assim durante um tempo, até que fiquei grávida. Max sentiu um nó no estômago. —Não lhes pedia... que usassem preservativo? — Não lhes pedia que fizessem nada, Max. Incomodava-se ao tipo equivocado, podia acabar com cicatrizes, ou coisas piores. —Tem sorte de que tudo o que te ocorresse fora ficar grávida. —Sim. —E o que ocorreu depois? Lydia baixou a cabeça. —Havia uma mulher mais velha, Mary Agnes Brightman, a quem todo mundo chamava Nanna. Tinha uma casa enorme no White Plains. dizia-se que acolhia as garotas grávidas, assim lhe fiz uma visita. —E te acolheu? —Sim. Ela não o fazia oficialmente, não tinha licença. Só aquela enorme casa e um grande coração. Quando eu estive ali, éramos seis garotas vivendo permanentemente, e havia outras muitas que entravam e saíam. Nanna nos dava de comer, vestia-nos e nos falava como a seres humanos inteligentes. Algumas decidiam abortar, e quando o faziam, ela o pagava, levava-as a um bom médico. Outras decidiam ter os meninos e tentar criá-los. E outras decidiam dar aos meninos em adoção. Nanna tinha um filho que era advogado, e ajudava às garotas a conseguir tudo sem cobrar nada. Assentindo lentamente, Max disse: —E essa foi à escolha que você fez. —Sim. Nanna e seu filho, Brian, levaram-me para ver um casal que queria adotar a meu bebê. Não cheguei a conhecê-los nem a falar com eles, só os vi de longe. Estavam às compras. Sabiam que eram os primeiros na lista de espera do Brian, assim provavelmente teriam um bebê em pouco menos de um ano. Estavam comprando móveis, um berço, uma banheira... E eu os observei. Ela enchia os olhos de lágrimas cada vez que via um ursinho de pelúcia, ou que pegava uma roupinha. Ele lhe algo dizia um pouco divertido, brincava sobre os nomes ou alguma coisa assim até que ela sorria de novo. Pareciam... tão bons. Sabe? Agradáveis. Normais. E aquela mulher, Deus, queria tanto um filho... —Lydia tomou ar—. Aquela noite, Brian me mostrou algumas fotos de sua casa, embora não me disse onde estava, e eu não sabia que era no White Plains. Sabia que seriam felizes ali. Max tinha vontades de chorar. —Mas não quiseram às duas?
—Não tiveram a oportunidade de escolher isso. Quando soube que ia ter gêmeos, Brian deixou que eu pensasse que as duas iriam para mesma casa, mas não foi assim. Ele fez que sua irmã fosse para outra casa. —Por quê? —Oh, pensou que estava fazendo algo bom. Queria ajudar a seu amigo da costa oeste que queria ter um filho desesperadamente. Não acredito que queria machucar a ninguém, mas o fez. Eu não soube a verdade até que Nanna morreu, nove anos mais tarde. Ela o tinha averiguado, e estava furiosa com seu filho por isso. Deixou-me sua casa, com a justificativa de que me tinham enganado quando ela só tinha querido me ajudar, e que me devia aquela reparação. —E você continuou com seu trabalho —disse Max. —Tenho-o feito enquanto o reunia com outros trabalhos. Trabalhos legítimos. Uma das condições que Nanna punha na hora de ajudar as garotas como eu era que não voltássemos para essa vida, e eu fui uma das poucas que o conseguiu. Kimbra também. Conheci-a na casa da Nanna. Quando Nanna morreu e me deixou a casa, eu sabia tanto como dirigi-la como ela. E resultou que Kimbra tinha uma grande cabeça para os negócios. Ajudou-me a criar uma organização sem fins de lucro, Haven House. Assim obtínhamos subvenções do governo. Max respirou profundamente e olhou a Lydia aos olhos. —E você acreditou que Morgan e eu nos envergonharíamos dessa história? Lydia apartou o olhar. —A princípio, sim. — De nada —Max, impulsivamente, pegou-lhe a mão—. Tinha razão a respeito desse casal. Tive a infância dos sonhos que queria que tivesse. E se esse advogado não a tivesse levado a outra parte, Morgan também a terei tido. Meus pais adotivos foram maravilhosos, Lydia. Nunca sofri falta de nada. E muito menos de amor. Lydia fechou os olhos. —Não sabe o que significa para mim te ouvir dizer isso. Separar-me de vocês... foi tão difícil... —Imagino. Mas acredito que fez o correto, e te estou muito agradecida. —O correto para ti, possivelmente, mas não para a Morgan... As duas olharam ao outro lado do corredor. Lydia disse: —Vou sentar-me com ela durante um momento. Lydia levantou. Então, Max se levantou também e, com um pouco de estupidez, deu-lhe um abraço. Lydia a apertou forte, e depois a soltou. —Acredito que vou voltar a ligar ao Lou. —Boa idéia —assentiu para lhe dar ânimos e saiu ao corredor. Lou estava dormido na cadeira com a cabeça pendurando para um lado e a orelha pressionada no ombro. Algo o despertou. Duas coisas. Uma foi o som do telefone. A outra foi a voz de Dante. E vinha de muito perto. Justo ao lado de sua cara. —Sinto muito ter que fazer isto, Malone, mas não tenho escolha. Lou abriu os olhos e viu o vampiro inclinado em cima dele. Estendeu os braços para afastá-lo, mas a cadeira caiu para trás e Dante caiu em cima. Afundou as presas na garganta do Lou, enquanto ele lutava desesperadamente por tirar-lhe de cima. Lou agitou um braço e golpeou a mesinha de noite. O telefone caiu e se desprendeu,
e Lou escutou vagamente como uma voz repetia seu nome. —Deus! —disse, apertando os dentes contra a sensação de que lhe sugassem o sangue—. Salvei-te a vida! —tentou gritar, mas não foi mais que um som débil—. Ajudei-te! Pulsava-lhe o coração mais do que ele considerava saudável, e ainda assim continuou lutando para tirar à criatura de cima. Seus esforços foram inúteis. Finalmente, Dante levantou a cabeça e deixou Lou apoiar-se no chão. —Ainda está me ajudando —lhe disse. Parecia... diferente. Mais forte. Brilhavam-lhe os olhos, e tinha a cara cheia de vida. «De minha vida», pensou Lou. Dante limpou a boca com o dorso da mão. Depois levantou o Lou do chão e o deixou sobre a cama. Virou-se, pegou o fone do chão e o pôs no ouvido. —Seu namorado te necessita, Max. Está te esperando no hotel. Será melhor que venha depressa. Não bebi todo seu sangue, mas tinha muita sede. E desligou o telefone. Lou gemeu e tentou alcançá-lo. Sabia muito bem o que pretendia o vampiro. Queria que Max se afastasse de sua irmã para poder aproximar-se ele. Maldito. Dante olhou e lhe disse: —De verdade, sinto-o muito. Não há outra maneira. Lou tentou sentar-se enquanto Dante se virava, mas só conseguiu incorporar um pouco o corpo antes de cair para trás de novo, na escuridão.
CAPÍTULO XIV
—Espera! A linha cortou, e durante um instante, Max sentiu o pânico maior de sua vida. Depois o sacudiu, ergueu as costas e correu para a porta. Tinha que ajudar ao Lou. Então, ficou imóvel ao lado da habitação de sua irmã, vendo-a deitada na cama, indefesa. Por que lhe tinha contado aquilo Dante? Porque era muito bom? Não. Queria que deixasse a sua irmã desprotegida. Como se supunha que ia escolher entre sua irmã e Lou? Pensou que, realmente, não tinha que escolher. Voltou para a sala de espera, tomou o telefone e marcou o número de emergências. Disse-lhes onde estava Lou, e que estava a ponto de morrer por perda de sangue. Depois procurou no bolso da calca o cartão que lhes tinha dado Stiles. Marcou-o, com a esperança de que fosse o que fosse que tivesse feito Lou para mantê-lo preso até que chegasse a polícia não tivesse servido de nada. Morgan despertou lentamente, sentindo dor por Dante. Deus, onde estaria? Por que não tinha ido a procurar? Não podia levantar a cabeça para procurar pela habitação do hotel, e não ouvia bem, como se todos os sons estivessem amortecidos. Viu, vagamente, como Max falava com a Lydia e com o David.
—Vão trazer o Lou em um minuto. Por favor, desçam e esperem. E se... se... está muito mal, venham me buscar. Do contrário... —Entendemos —disse David—. Tome cuidado, Max. Max assentiu, e Morgan se perguntou o que estava ocorrendo. O que tinha ocorrido ao Lou Malone? E por que David advertia a Max que tomasse cuidado? Devia ter medo de que Dante fosse para ela. «Oh, Deus, deixem que venha por mim», pensou. Depois que David e Lydia saíssem da sala, Maxine abriu a porta do armário, meteuse dentro e voltou a fechá-la. O que... A janela se abriu de repente, e uma suave brisa moveu as cortinas. Uma figura escura entrou na habitação. O coração lhe deu um salto no peito da Morgan quando Dante aterrissou com suavidade no chão. Quando ele a olhou, teve a sensação de que seu corpo despertava. Quis gritar, falar, saltar a seus braços, mas não podia. Uma lágrima lhe rodou pela bochecha. Dante a viu e correu a seu lado com o amor lhe brilhando nos olhos. Tiroulhe o cabelo da cara com sua larga mão, e Morgan viu que ele também estava chorando. —Estou aqui —sussurrou—. Tudo irá bem agora, meu amor. Estou aqui. inclinou-se sobre ela e a beijou, e ela saboreou seu beijo brevemente. A porta se abriu violentamente e Dante voltou à cabeça. Frank Stiles, o homem das cicatrizes, apareceu com seus três acompanhantes. Dois estavam no banheiro, e o terceiro depois da cortina da cama. As armas apontavam a Dante, e Maxine saiu do armário. —Te afaste dela, Dante —lhe disse. —Não sabe o que está fazendo —respondeu ele brandamente, olhando fixamente a Morgan com os olhos cheios de lágrimas. Ela levantou ligeiramente uma mão para protestar, mas ninguém lhe fez caso—. Por favor, está morrendo, Maxine. Sua irmã vai morrer, a menos que me deixe ajudá-la. —Sinto muito, mas não acredito em uma palavra do que disse Dante. Não posso depois do que fez ao Lou. Lou? O que tinha feito Dante ao Lou? perguntou-se Morgan. «te acalme, meu amor. Malone está bem, prometo-lhe isso». Os pensamentos de Dante entraram em sua mente e a tranqüilizaram. «Voltarei por ti, juro-lhe isso». Então se volto para ir para a janela. Stiles disparou sua arma, e a Morgan cortou a respiração. Um dardo se cravou no ombro de Dante. Fosse o que fosse, funcionou instantaneamente. Dante caiu de joelhos, olhando a Max. —Pelo amor de Deus, não deixe que ocorra isto. Max se aproximou dele. —Perdeste qualquer simpatia de minha parte ao atacar ao Lou. Ele era o único que te concedeu o benefício da dúvida, o único que queria te ajudar. E você o traiu. —Não te dá conta do que tem feito —lhe disse, e olhou a Morgan, lhe jurando sem uma palavra que encontraria o modo de voltar para ela. —Afaste-se, senhorita Stuart. Nós o levaremos. Foi uma sorte que não nos detiveram a polícia, finalmente. Seu noivo só tinha um par de algemas, e não pôde prender a todos. Um de meus homens nos liberou antes que aparecesse a polícia. Se fosse assim, este animal se teria saído com a sua.
Enquanto Stiles falava, seus homens tinham prendido a Dante, embora já estivesse completamente inconsciente. Tiraram-no da habitação silenciosamente, sem que nenhuma das enfermeiras o visse. Quando partiram, Maxine suspirou e se aproximou de sua irmã para lhe pega a mão. Ao olhá-la, deu-se conta de que Morgan tinha os olhos cravados nela. Lutou por pronunciar umas palavras, e finalmente o conseguiu, em um sussurro. —Consegue que volte —lhe disse com raiva—, ou morrerei te odiando por isso, Max. Juro-lhe isso.
Os captores de Dante estavam sentados ao redor de uma mesa, fumando e falando em voz baixa. Dante ficou temporalmente inconsciente pela droga, e ao despertar encontrava-se muito fraco. Pareceu-lhe que estava convexo sobre uma mesa, amarrado sobre uma maca. Só percebia o aroma de tabaco, a umidade e a mofo da casa em que estavam. Seria uma casa desabitada? —A droga funciona, Frank. Conseguiste. —Funciona —respondeu a odiada voz do Stiles—, mas não sei se funciona bem, nem durante quanto tempo faz efeito. — Bom, o monstro está inconsciente —disse outro—. Isso é tudo o que preciso saber. —Então é um idiota. Os homens ficaram em silencio durante um momento. Depois um deles perguntou: —E o que vamos fazer com ele, chefe? Disse que não íamos fazer nenhum prisioneiro. —E não vamos fazer. vamos executar a todos, vamos eliminar a raça. Aí é onde nossa missão se diferencia da DIP. Entretanto, vamos manter a este com vida até que vejamos como funciona a droga. Depois, abriremos suas veias e deixaremos que sangre. Dante reprimiu um calafrio. Aquele homem estava reorganizando por sua conta a Divisão, de um modo muito mais feroz que o governo. Brandamente, deu um puxão às correias da maca. Eram fortes, e sentiu que ainda não tinha força suficiente para rompê-las. Entretanto, perguntou-se para que tinha que tentá-lo. Se não podia salvar a Morgan, que sentido tinha? Deus, por que tinha esperado tanto para reconhecer que havia um vínculo entre os dois? Ela não o tinha feito. Ela sabia desde o começo o que era aquilo. Era dele. Tinha demorado séculos para encontrá-la, e a iam tirar sem que pudesse fazer nada para evitá-lo. —Vá ver se ainda está inconsciente — ordenou Stiles a um deles. Uns passos se aproximaram, e Dante relaxou a expressão e ficou completamente imóvel. —Inconsciente —confirmou o homem. —Se assegure —lhe disse Stiles. O homem ficou quieto um momento. Dante ouviu que dava umas tragadas fortes ao charuto, e depois sentiu calor perto do pescoço. A sensação se fez mais forte até que notou a ponta do charuto. Apertou a mandíbula para evitar gritar enquanto lhe abrasava a pele. A dor era lacerante, mas não reagiu. Se o fazia, matariam. Tinha que sobreviver, escapar e chegar ao lado da Morgan. O homem apartou o charuto, mas sua queimadura permaneceu ali, ferindo. Dante cheirou sua própria carne queimada.
—Estou seguro —disse o homem—. Está inconsciente. Morgan estava imóvel na cama, observando, muito fraca para fazer outra coisa. Nem sequer podia falar. Não ia viver muito, mas não lhe importava. O único que lhe importava era Dante. Se não podia estar com ele, a morte era muito mais desejável que a vida. Entretanto, não podia suportar pensar que tinha caído nas mãos daqueles homens. Não o suportava. Caíam-lhe as lágrimas pelas bochechas, mas era incapaz de uivar sua angústia. Quase não escutava a sua suposta irmã enquanto a garota estava sentada a seu lado, lhe explicando todas as razões pelas que tinha que trair ao homem ao que amava. Tinha aturado na sua melhor amiga, dizia. Tinha atacado ao Lou. Era um assassino. Tudo aquilo eram palavras. Palavras muito menos convincentes e comovedoras que as que tinham escrito um louco em seu diário. A porta se abriu, e Morgan viu como entrava Lou com uma bandagem no pescoço. Estava bem. Saudável. Tinha cor. —Lou! —Max saltou da cadeira e o tornou em seus braços—. Está bem? Não posso acreditar que te fizesse isso. Depois de tudo o que fez por ele... —deixou que as palavras se desvanecessem—. Onde estão David e Lydia? —perguntou. —Enviei a casa para que descansem um pouco —lhe disse Lou. Entretanto, não estava olhando a ela, a não ser ao Morgan. Sustentou-lhe o olhar e tentou falar. —Dante —sussurrou. —Acreditava que já teria chegado —disse Lou, e se virou para Max para lhe perguntar—. O viu? —Ver quem? O Dante? Lou assentiu. — Supus que viria pela Morgan —fechou os olhos—. Tinha muito medo que te interpusesse em seu caminho. Converte-se em alguém muito perigoso em tudo o que se refere a ela. Não acredito que haja nada que não fosse capaz de fazer... Max baixou a cabeça. —Veio —admitiu—. Eu sabia que viria, e chamei o Stiles e a seus homens. Lou piscou e olhou a Morgan, que tinha a cara coberta de lágrimas. —Mataram-no? —perguntou, voltando-se lentamente para o Max. —Dispararam-no com um dardo. Não acredito que o matassem, mas não estou segura. O levaram rapidamente. —Aonde? —Não sei. Jesus, Lou, não se preocupe tanto por ele. Tentou te matar. —Não. Não o fez. —O que quer dizer? Lhe... mordeu-te. bebeu-se seu sangue. —E te disse onde me encontraria. Têm-me feito uma transfusão de menos de um litro, Max. O médico me disse que teria estado perfeitamente embora não houvessem me trazido para o hospital. Teria estado enjoado, cansado e débil durante um par de dias, mas bem. —Atacou-te e disparou ao Stormy. —Assegurou-se de que me encontrariam e de não tomar muito para não me fazer dano. Ela sacudiu a cabeça.
—Veio aqui. Veio por minha irmã. —Embora soubesse que tinha muitas possibilidades de que fosse uma emboscada. Sabe que não é tola, Max. Certamente, pensou que poderia te enganar para que fosse daqui, mas que a possibilidade era muito pequena. E veio de toda forma. Arriscou tudo por vir até ela. —Para matá-la —soltou Max. —Ou possivelmente para salvá-la. —Não. Está equivocado. Tem que estar equivocado. Ao Morgan lhe acelerou o coração. Estavam-se aproximando muito. «Por favor, Deus, deixa que o salvem desses homens». Alguém bateu na porta, e uma enfermeira apareceu a cabeça. —Senhorita Stuart? Tem uma mensagem no mostrador, de... Lydia. Disse que alguém estava tentando chamá-la no celular, mas que o tem desligado. Tem que chamar a este número —disse, e deu uma nota a Max. —É certo, tinha-o desligado porque há uma placa de proibição. A enfermeira assentiu. —Podem interferir com os equipamentos eletrônicos do hospital. Mas... bom, como exceção, pode usá-lo aqui dentro, mas perto da janela. —Obrigado —Max abriu a nota e leu o número, enquanto a enfermeira saía e fechava a porta—. É do hospital do White Plains —fechou os olhos—. Oh, Deus, deve ser Stormy. Deve ter morrido. Oh, Deus, morreu. Lou a abraçou. —Será melhor que ligue —lhe disse—. Sua mãe quererá falar contigo. Chorando, Max marcou o número em seu celular e esperou. Depois, disse: —Sim? Jane, é Maxine. Houve uma pausa. Então Maxine apartou um pouco o telefone para lhe dizer ao Lou: —Disse que espere um momento. Alguém me vai dizer isso —e de repente, abriu muito os olhos e começou a falar de novo—: Êh... Stormy? É você? Então começou a balbuciar, e a chorar e a rir ao mesmo tempo, lhe dizendo umas quantas palavras a sua amiga. Quando, finalmente, recuperou o controle, disse-lhe: —Quero que saiba que temos ao homem que te fez isto. Nunca mais vai machucar a ninguém —fez uma pausa—. Sim, sim, estou segura —então, olhou ao Lou—. Poderia-Me descrever isso então, Max empalideceu e se voltou para o Morgan—. Não. Não. Tudo vai bem, Stormy. Descansa. Ficar forte de novo. Tenho que desligar, mas logo te ligarei de novo. De acordo? Por fim desligou. —O homem que atirou na Stormy tinha a cara desfigurada e cheia de cicatrizes. —Stiles —grunhiu Lou—. E mentiu sobre isso, mentiu sobre tudo o resto. Max se voltou para a Morgan. —Deus, o que fiz? Morgan, sinto muito. Sinto-o muitíssimo. Morgan a olhou suplicante. —Por favor... —Sei, sei —disse ela, e se voltou para o Lou—. Temos que resgatar Dante. —Mas aonde vamos o encontrar? Stiles pode o haver levado a qualquer parte. Pela segunda vez aquela noite, a janela do quarto de Morgan se abriu, e uma forma
escura entrou. Entretanto, não era Dante. Morgan reconheceu a Sarafina. Era assombrosa. Tinha uma juba de cabelo escuro e brilhante, os olhos negros, os lábios vermelhos e a pele branca como a neve. Levava um vestido comprido de veludo da cor do sangue, e seu olhar era tão penetrante que fez que se estremecessem. —Tenho uma sugestão. —Quem demônios é você? —perguntou-lhe Max, interpondo-se entre ela e a mulher. —Valente, para ser uma mortal. Meu nome é Sarafina. Sou a irmã de Dante. E sua tia, e sua mãe. —É uma vampiresa —disse Max, acusando-a. —Seus poderes de observação são assombrosos — respondeu a mulher, sarcasticamente—. Sim, sou uma vampiresa. E será melhor que me ajudem a resgatar a Dante, ou pagarão o que lhe têm feito com sua vida. Está claro? Max não cedeu. —E como sei que podemos confiar em ti? Sarafina arqueou as sobrancelhas. —Bom, o fato de que me ofereça como ceva para o caçador de vampiros deveria ser garantia suficiente, não te parece? Max e Lou a olharam assombrados. —É a única maneira. Dante não me envia sinais mentais o suficientemente fortes para que saiba onde está. Entretanto, sinto que está vivo. —Vivo —sussurrou Morgan, chorando. —Sim. O qual é mais do que se pode dizer de ti, mortal. Morgan sorriu fracamente. Não lhe importava estar a ponto de morrer, sempre e quando Dante estivesse vivo. —Vamos, temos pouco tempo —disse Sarafina a Max—. Chama o homem desfigurado e lhe diga que tem outro vampiro. Que está ferido, que não pode mover-se e que o ataste para entregar-lhe lhe diga que me vais levar a casa dos escarpados. Depois, leva ali a sua irmã tão rapidamente como possa. Depois se voltou para o Lou. —Enquanto ela a leva, me amarre e me leve aos escarpados para esperar ao caçador. —Lou, não acredito que deva ir sozinho com ela. —Tem medo de que o mate? —perguntou-lhe Sarafina, pondo os olhos em branco e suspirando—. Mortais. Está bem, se quiser que esteja o suficientemente fraca como para que não seja uma ameaça, também podemos arrumar isso —tirou uma pequena adaga do bolso de seu vestido—. Tão somente tenta que não perca muito sangue — se levou a adaga pulso. Lou tomou o braço e impediu que se cortasse. —Não! —olhou a Max—. Temos que confiar nela, Max. Necessitamos que tenha todas suas forças ou nos arriscamos a perder a luta. Stiles tem três homens trabalhando com ele, e possivelmente mais, todos eles armados. —Por não mencionar que estão treinados —disse Max. Então fez uma pausa e se voltou para Sarafina—. Pode ajudar a minha irmã? Dante diz que pode salvá-la. Você pode também? A mulher olhou a Morgan. —Sinceramente, temo que esteja muito fraca para sobreviver à transformação neste
momento. Além disso, se o tentar, eu também me debilitaria e não poderia lutar durante horas, e então, Dante teria morrido —disse, e apartou o olhar. —Mas há uma oportunidade. —Sim. Mas eu não o farei. —E esperas que confie em ti? —perguntou-lhe Max. Lou a pegou pelo braço. —Seja razoável, Maxie. Se tentar e fracassar, perderemos aos dois. Se o tentar e funciona, Morgan sobreviverá, mas Dante não. Crê que é isso o que quer Morgan? Morgan tentou dizer que não, mas não pôde. —Se fizermos o que ela diz, temos uma oportunidade de salvar aos dois. Max fechou os olhos, baixou a cabeça e assentiu, finalmente. Depois abraçou ao Lou. —Tome cuidado, por favor. —Terei. Max se voltou para a Sarafina. —Não me importa que droga seja. Se lhe fizer mal, encontrarei e te matarei. A mulher pareceu surpreendida e divertida ao mesmo tempo. —Verdadeiramente acredito que o tentaria —depois se voltou para o Lou—. Vamos —disse. O jogou ao ombro como se fosse um boneco e saltou pela janela. Max gritou e apareceu para olhar para baixo. Depois suspirou de alívio. —Chama —sussurrou Morgan—. Chama. —Sim. Agora mesmo. Max pegou o celular e marcou de novo.
CAPÍTULO XV
—Stiles. Graças a Deus que está aí. Escute, não sei que demônios fazer. Temos... temos outro. —O que? —Temos uma vampiresa —Max tragou saliva enquanto falava—. Acredito que a enviou ele. Tentou matar a Morgan. Lou estava aqui, lutaram e ela terminou caindo pela janela. Ele não queria empurrá-la, mas ocorreu. Esteve a ponto de cair também. —Está ferida? —Sim. Parecia que estava bastante mal. ficou inconsciente e a atamos, mas não estou segura de quanto tempo poderemos retê-la. Caso acorde... —Onde está? —Lou a levou a casa para vigiá-la. Disse-me que a entregaria nos escarpados. —Estarei ali em vinte minutos —respondeu Stiles, e desligou. Assentindo lentamente, Max guardou o telefone no bolso e se sentou junto a sua irmã, lhe acariciando o cabelo. —Agüenta um pouco mais, carinho. Só um pouco mais. Morgan moveu a cabeça quase imperceptivelmente. Naquele momento, a porta se abriu e o doutor Hillman entrou. —Maxine, queria ver-me? —Sim —disse ela. ficou de pé, levantou o queixo e estirou as costas—. Quero levar a
Morgan para casa. —Impossível —respondeu ele, rapidamente, sem pensá-lo. —Sim é possível. Possivelmente não seja aconselhável, mas sim é possível. —Não sei se sobreviverá ao trajeto, Maxine. —Vamos, doutor. Não acredita que vá passar de esta noite? —Sinceramente, não —respondeu o médico, tristemente. —Então, que diferença há? Ela quer morrer em sua casa, em sua cama. Não há nada que se possa fazer por ela aqui, exceto prolongar sua vida umas quantas horas mais. Mas você pode fazer algo por ela: conceder-lhe seu último desejo. Eu aceitarei a responsabilidade. Ele baixou a cabeça sem dizer uma palavra. — Se me disser que não, levarei de toda forma. Com um suspiro, o médico se aproximou da Morgan e lhe acariciou a bochecha. —É isso o que quer Morgan? Quer voltar para casa? Ela pôde assentir, inclusive esboçar um sorriso moribundo. O doutor se incorporou e respirou profundamente. —Está bem. Encarregar-me-ei da papelada. —O tempo é muito importante. —Farei rapidamente. E o fez. Assombrosamente rápido. Dez minutos depois, Morgan estava em um táxi, envolta em uma manta, com a Max a seu lado. Quando chegaram a casa, Morgan deixou escapar um suspiro de alívio. Estava claro que aquilo era tudo para ela. Max pagou ao taxista e bateu na porta. Lydia e David saíram, e David tomou a Morgan nos braços e a meteu na casa. Depois subiu a seu quarto e a deitou. Max se sentou a seu lado e pegou suas mãos. —Agüenta Morgan. Se sentir que está desvanecendo, pensa em Dante, e pensa em que vai vir por ti. Eu mesma o vou trazer, prometo-lhe isso. Um ligeiro gesto de assentimento. Um suspiro de alívio. Um sussurro. —Date pressa. Max olhou a Lydia e ao David. —Fica com ela. —Sabe que o faremos. Tome cuidado, Max —disse Lydia, e lhe deu um abraço. Max lhe disse ao ouvido: —Diga-lhe Pode ser que seja sua última oportunidade.
Sarafina estava deitada de flanco no chão frio e úmido, ao lado da borda do escarpado. Tinha postas umas algemas e os pés atados com fita de embalar. Estava imóvel com os olhos fechados e o cabelo despenteado. Manchou-se a cara e o vestido com barro, com a esperança de que tudo resultasse mais convincente na escuridão. Lou sentiu certa admiração por aquela mulher. Era valente. Tinha razões para sê-lo, porque era mais forte que dez homens de uma vez. Entretanto, aquilo era correr muitos riscos. Era evidente que queria muito a Dante. —Ainda não tenho clara sua relação com Dante — lhe disse Lou, brandamente. Estava de pé, a seu lado, escutando atentamente para saber quando chegava Stiles—. Disse que é sua irmã, sua mãe e sua tia. Como demônios pode ser isso?
Ela abriu os olhos e o olhou sem mover a cabeça. —Sou sua irmã porque todos os vampiros o são. Vamos à mesma fonte, compartilhamos o mesmo sangue com o antígeno que nos faz único. Mãe, porque eu sou a que o converteu. Transformei-o de um mortal agonizante a uma poderosa criatura imortal. Eu lhe dei sua nova vida. —E sua tia? —Pelo método normal. Sou tataratia, se quer dizê-lo tecnicamente. Eu era a irmã de seu tataravó. —Assim que o transformou por que... —Shhh! Estão aí! —sussurrou Sarafina—. Ele sabe que com as algemas não será suficiente, assim tentará me drogar, como fez com Dante. Não pode permitir-lhe —Não voltará a ver-me. Lou aguçou os ouvidos e a vista, mas não conseguiu perceber nada. Certamente, os sentidos daquela mulher eram muito mais agudos que os dos humanos. Finalmente, começou ouvir os passos do Stiles, e o homem emergiu da escuridão. Aproximou-se cautelosamente da Sarafina, da mesma forma que alguém se aproximaria de um tigre dormido. —Está inconsciente —o tranqüilizou Lou—. Golpeou-se muito forte ao cair. —Isso foi o que a ruiva me disse por telefone —disse Stiles. tirou uma seringa de injeção do bolso e lhe pôs uma agulha. Depois deu um passo para a Sarafina, e outro, e depois se retirou. —Oh, Por Deus, quer fazê-lo já? —disse-lhe Lou. Finalmente, Stiles se aproximou dela, ajoelhou-se e aproximou a agulha ao braço da Sarafina. De repente, ela deu uma cabeçada no peito do Stiles e o atirou ao chão. A seringa de injeção caiu ao chão. Lou se atirou sobre ela e lutaram durante um momento enquanto ele conseguia pegar a seringa de injeção e apertava o êmbolo para jogar o conteúdo ao chão, ocultando suas ações do Stiles. —Já está, maldita seja —grunhiu Lou. Sarafina fingiu que ficava inconsciente e Lou se levantou. Estendeu ao Stiles a seringa de injeção e ele a olhou. —Obrigado —lhe disse. —Esse monstro tentou me matar —disse Lou—. E isso fazem duas vezes, esta noite. Tinha razão sobre eles, Stiles. O homem assentiu. —Ela não o tentará mais vezes —atirou a seringa de injeção ao chão e pegou nos braços a Sarafina—. Recorde disse ao Lou enquanto se aproximavam da caminhonete do homem, que estava estacionada na parte dianteira da casa—. Não diga a ninguém. Isto terminou. Você e todos os que estão envoltos nisto têm que esquecer disso. Entendido? —Não o esquecerei —respondeu Lou—. Mas guardarei isso —e esboçou um sorriso forçado—. E, de todas as formas, quem ia acreditar-me? —Exato. Quando Stiles jogou Sarafina na parte traseira da caminhonete, Lou estremeceu. —Não voltará para ver-me. —Não se ofenda Stiles, mas espero que tenha razão —respondeu Lou, e disse adeus com a mão enquanto o carro se afastava. E quando as luzes traseiras desapareceram na curva, Max apareceu no carro do Lou e ele saltou ao assento do passageiro.
—Passou muito tempo —disse Lydia, passeando pela habitação da Morgan uma hora mais tarde—. Por que já não voltaram? Deus, vai amanhecer dentro de muito pouco. David lhe pôs uma mão sobre o ombro. —Tenta ter fé, Lyd. Tudo vai sair bem. Tem que sair bem. Sorriu-lhe de uma maneira que disse a Morgan que havia algo entre eles. Algo que lhe tinham ocultado. —Max tem razão —lhe disse David com suavidade—. Deveria dizer-lhe. Lydia se aproximou da cama, sentou-se junto a Morgan e pegou sua mão. Olhandoa aos olhos, disse-lhe: —Morgan... eu sou a mulher que lhes trouxe para o mundo a ti e a Max. Sou... sou sua mãe. —Mãe... —Morgan sussurrou a palavra. Não estava totalmente assombrada pela notícia. Perguntou-se por que Lydia e Max estavam tão unidas, e por que Lydia se preocupava tanto por ela, quando acabavam de conhecer-se. Tinha visto a mulher chorando no hospital a seu lado e, sabendo que era adotada, não tinha sido muito difícil de deduzir. —Dei-lhes em adoção porque pensei que seria o melhor. Queria que tivessem uma boa vida. Disseram-me que iam para mesma família, e passaram dez anos até que me inteirei de que não tinha sido assim. Suspirando, Morgan assentiu com os olhos. Estava muito fraca para mover a cabeça. Então, olhou ao David. —É meu pai? —conseguiu sussurrar. —Não —respondeu David—. Embora o pensasse durante algum tempo. Poderia ter sido —ele também se aproximou e se sentou sobre a cama—. Eu era um dos clientes da Lydia. Sempre lhe gostei. Quando me disse que estava grávida, aceitei fazer os exames. Quando soube que não eram filhas minhas me... parti. Foi um engano, Morgan. Aquilo me obcecou. Procurei a Lydia um ano mais tarde, e ela me disse que tinham sido adotadas, embora não soubesse dos detalhes, sabia que eram felizes. Eu contratei a um detetive particular para lhes encontrar. Maxine estava bem, em uma boa família. Mas você... — sacudiu a cabeça—. Eu não gostava do ambiente no qual estava crescendo, e não sabia como desfazer o que já estava feito, assim me mudei à costa oeste e me fiz o melhor amigo de seu pai. Era o único que podia fazer para estar perto de ti e te vigiar. Sentia-me obrigado a fazê-lo. Não voltei a chamar a Lydia para dizer-lhe por que... bom, porque sabia que morreria se soubesse que te tinha adotado uma gente como aquela —se inclinou para lhe beijar a bochecha—. O sinto, carinho. Sinto não te haver dito a verdade. Ela fechou os olhos. —Quero-te —murmurou. David tinha os olhos cheios de lágrimas. Morgan queria dizer aos dois que não tinha nada contra eles, que tudo estava bem. Mas não podia. Aquela maldita debilidade lhe tinha roubado a capacidade de fazer as coisas. Tentou dizer-lhe com os olhos. Era o único que podia fazer assim os abriu para olhá-los. —Por que estão demorando tanto? Max freou quando viu que Stiles tinha diminuído a marcha. Tinha estado conduzindo sem luzes, guiando-se só pelas luzes traseiras da caminhonete do Stiles na distância. Era muito arriscado e estúpido, mas o fazia por sua irmã. Não podia acreditar
que ela mesma tivesse estragado as coisas. Tinha que arrumá-lo. Estacionou fora da estrada e abriu a porta do carro. —Já chegamos —disse ao Lou. —Não. Você não. Vai para carro e pedir ajuda. Não me importa o que vás dizer, só quero que avise à polícia. Vou entrar sozinho. — É uma droga —então tirou seu celular e ligou à polícia—. Não temos cobertura. —Assim, como te disse, tem que ir em busca de ajuda. —Embora o fizesse e viéssemos a toda pressa, não chegaríamos a tempo. Temos que fazê-lo agora, Lou. Você e eu. Possivelmente com um pouco de ajuda do dueto da morte que está aí dentro o conseguiremos —deixou as chaves postas, saiu do carro e, sem esperar que Lou respondesse, começou a andar. Ele a alcançou imediatamente. —Pode sair ferida, Max, e eu não poderia viver com isso. —Minha irmã está morrendo, Lou. Eu o provoquei. Tenho que fazê-lo. Se não o fizer, e ela morrer, como demônios crê que eu vou viver com isso? Ele tragou saliva e a olhou na escuridão. —Maldita seja, é muito obstinada. —Sim, e você adora. —Aqui tem —disse ele, e lhe pôs sua pistola na mão. Era a pistola pequena. —E você? Ele levantou o outro braço e ela viu, pela primeira vez, a forma escura da arma que levava. Era uma pistola enorme. —Imaginei que tinha chegado a hora das armas grandes. —Bem pensado. Caminharam por um lado da estrada até que viram o carro do Stiles ao lado de uma casa apartada, quase em ruínas. Parecia abandonada, mas havia luz dentro. —Crê que Sarafina ainda está na caminhonete? —perguntou-lhe Max, sussurrando. —Stiles teria sido um idiota se a tivesse deixado ali. Quando estavam chegando a casa, Max notou o canhão de uma arma nas costas. —Te mova e a Mato —disse o homem. Ela se inclinou ligeiramente e viu o Lou olhando-a com uma expressão de horror. —Está bem, está bem, tranqüilo —disse—. Somos amigos. —Tira a arma. Lou se inclinou e pôs a pistola no chão. Depois se ergueu de novo. —Você também, bonita. Max deixou cair a pistola que tinha na mão. —Agora, dentro. Os dois. Lou e Max entraram na casa e o homem os guiou para uma sala em que havia um farol aceso. Ali estavam Stiles e os outros dois homens, sentados em uma mesa. —Bom, o que é o que temos aqui? —perguntou Stiles, levantando-se. Através de uma porta aberta que havia a sua esquerda, Max viu Dante amarrado em uma maca, e a Sarafina em outra. Ela fingiu que não se dava conta. —Impressionante —disse ao Stiles—. Assim que este é o novo quartel geral da DIP? Isto sim que é alta tecnologia. — É algo temporário —disse Stiles—. Querem morrer agora, ou prefere me explicar primeiro por que viestes?
Lou falou antes que Max pudesse lhe dar ao Stiles outra resposta sarcástica. —O Seguimos. —Sabia. —Se sabia, por que partiu? —Do que está falando? Lou umedeceu os lábios. —Depois que você partiu, peguei a seringa de injeção do chão e vi que ainda restava a metade da droga. Preocupei-me de que ela pudesse despertar e atacá-lo na caminhonete, e vim te advertir Lou saiu correndo. Stiles arqueou as sobrancelhas, assentindo enquanto Lou mentia. Assobiou quando acabou a explicação. —E eu que acreditava que tudo isto era para tentar tirar Dante daqui. Diga-me, Lou, onde deixou seu carro? Não lhe ouvi entrar no caminho. —Ficamos sem gasolina. Está estacionado na estrada, um pouco mais à frente. —Já —Stiles olhou ao homem que estava detrás deles—. Leva-os pra fora e mata-os. Max olhou ao Lou e se deu conta de que ele tinha medo. Por ela, não por ele. Então, o homem e outro de seus companheiros os agarraram e os tiraram da casa pela porta de atrás. Puseram-nos um junto ao outro de costas para eles. —Ajoelhem. —Morrerei de pé, obrigado —disse Max. —Como queira —o canhão da pistola se moveu de suas costas até a nuca. De repente, Lou se agachou e deu no outro homem uma cotovelada no estômago. Então se voltou e atirou sobre o que estava apontando a Max. A pistola saltou pelos ares e disparou. Embora Max ouvisse um ruído ensurdecedor, não sentiu nenhuma dor, assim supôs que o disparo não a tinha alcançado. Encontrou-se no chão, provavelmente pelo shock do disparo tão perto de seu ouvido, mas se levantou quando viu que um dos tipos estava arrastando-se para chegar até sua pistola. Ela também foi pega-la, mas ele pegou primeiro e a apontou. Lou estava lutando com o outro homem, rodando pelo chão entre os arbustos. Max levantou uma mão instintivamente, e o homem, que a estava apontando ao peito, atirou. Quando o fez, uma figura escura se interpôs entre ela e o pistoleiro, como um raio negro. Ouviu-se outro disparo que provinha de detrás. Lou tinha ganhado a luta pela outra pistola e disparou a seu assaltante no peito. O homem caiu ao chão. Detrás do Lou, seu cupincha estava inconsciente e ensangüentado. Ela ouviu os pneus de um carro que derrapava. Stiles e o outro homem estavam escapando, sem dúvida, mas Max estava muito horrorizada para ir atrás deles. Dante, a única esperança de sua irmã, o homem que acabava de interpor-se entre a bala e ela, jazia no chão, sangrando, ofegando, agarrando o peito. —Oh, Deus —sussurrou ela. —Cubra disse ele, entre dentes—. Faça que estanque antes que perca muito sangue. Assentindo, ela rasgou parte de sua camisa, fez uma bola de tecido e a apertou contra a ferida. —Agora... me leve para Morgan. —Lou, traz o carro —lhe disse. Lou saiu correndo. Sarafina saiu da casa, olhando a Max e a Dante em seus braços. Ainda tinha as algemas nos pulsos, mas a corrente estava quebrada.
— Se tentar transformá-la esta noite, não terá êxito —lhe disse friamente. —Não sabe. —Está muito fraca. E agora você está ferido. Não tem toda a força necessária. —Farei que funcione. —Pode ser que o fato de tentá-lo acabe contigo. —Então, morrerei. Sarafina fechou os olhos e baixou a cabeça. O carro se aproximava a toda pressa. Sarafina voltou para a casa, e Max se perguntou por que. Quando voltou, Lou vinha a seu lado, e ela trazia a fita de embalar que ele tinha usado para lhe amarrar os tornozelos. A lançou a Max. —Ponha mais tecido na ferida, e amare bem com a fita ao redor do ombro e do peito. Max não perguntou nada e fez exatamente o que lhe havia dito. Então, Sarafina disse: —Se afaste. Max deixou Dante sobre o chão com suavidade, e Sarafina se aproximou e ajoelhou a seu lado. —Fez sua escolha, Dante, entre mim e essa mulher a que desejas. Escolheste-a. —Por que tenho que escolher? —Viria comigo agora?A deixaria? —Não posso. —Então, escolheste a ela —disse. Levou o punho aos lábios, mordeu e depois o pôs na boca de Dante. Ele o agarrou e bebeu. —Esta é a última vez que te ajudo, Dante. Nunca terá a oportunidade de me trair de novo. Ela separou o pulso, pegou um pedaço de tecido que Max tinha deixado no chão e o enfaixou. —Não te traí, Sarafina. Espera... Sem dizer uma palavra mais nem olhar atrás, ela desapareceu na escuridão. Dante fechou os olhos. De dor, pensou Max. —Vamos, Lou. Vamos levar o a carro. Temos que levá-lo para Morgan. Lou olhou ao céu enquanto ajudavam a Dante a caminhar entre os dois. —Logo vai amanhecer. —Ela não sobreviverá um dia mais. Tem que ser agora. Se é que já não é muito tarde —Então, olhou a Dante—. Era certo o que ela dizia? É possível que não funcione? —Se ela estiver muito perto da morte, ou eu muito fraco... —Dante suspirou e se separou deles para caminhar até o carro por si mesmo. Sentou-se no assento traseiro—. Funcionará. Tem que funcionar. Lou saiu à estrada principal e pisou fundo o acelerador.
CAPÍTULO XVI
Dante saiu do carro e olhou a casa. O medo que sentia era tão intenso que quase ultrapassava a dor que lhe causava a bala. Sentia a Morgan. Sua essência era débil, tênue, e se desvanecia mais e mais cada vez que tomava fôlego. Seu próprio corpo se balançava de
debilidade, lhe recordando o quanto vinculado estavam um ao outro. Max o agarrou pelo braço para apoiá-lo. —Está bem? —É ela. Está muito débil. —Sei. Vamos. Dante permitiu que o guiasse e se deu conta de que Lou ficava atrás quando chegaram às escadas. Não podia deixar de pensar que, se Morgan morria, seria culpa dele. Devia havê-la escutado desde o começo. Deveria havê-la trocado naquele momento, quando ela estava forte. Se conseguisse transformá-la naquele momento, se conseguisse salvá-la, nunca conheceriam a força sobrenatural que ela teria tido se ele tivesse atuado antes. odiava-se por seu egoísmo. Por seu medo. Sim, ele tinha tido medo dela. Medo do poder que tinha sobre ele. Podia lhe fazer mal, o destruir. Faria se morresse. No quarto, David e Lydia estavam ao lado da cama, mas Dante apenas os olhou enquanto se aproximava da Morgan. Oh, Deus. Já quase parecia um fantasma. Max se aproximou da Lydia e do David e lhes disse algo em voz muito baixa. Dante os observou enquanto cada um deles se inclinava para dar a Morgan um beijo na fronte. Depois saíram da habitação. Então, Max se inclinou também para ela. —Trouxe-o, tal e como te prometi. Dante se aproximou, e Morgan lhe sorriu fracamente. —Obrigado —sussurrou. Max assentiu. —Não voltarei a verte, verdade? Morgan não respondeu, e Max a abraçou brandamente. Depois se afastou dela. —Seja feliz. Dante olhou para a janela. Estava a ponto de amanhecer. Brandamente, tomou a Morgan nos braços e a levou até o balcão. Antes de sair, voltou-se para Max. —Obrigado por nos ajudar. — Só desejaria haver dado conta muito antes dos quais eram os monstros em realidade. Dante saiu pelas portas do balcão e se deixou cair até o chão. Enquanto caminhava para o escarpado, sentiu os olhos da Max sobre eles. E também sentiu suas lágrimas. Levou a Morgan a seu refúgio sob a casa. Ele estava seguro de que não tinha contado a ninguém, nem sequer a sua irmã, que aquele lugar existia. Ali estariam a salvo. Entretanto, não a poria no ataúde. Ela estava a ponto de morrer, e devia estar muito assustada. Em vez disso, arrancou o forro de seda branco e o enchimento e fez um leito sobre o chão. Ali posou a Morgan e se deitou junto a ela. Depois a beijou. Devolveu-lhe o beijo. Ele o sentiu, sentiu sua resposta embora ela não pudesse mover-se apenas. Acariciou-lhe o queixo. —Estará comigo para sempre, Morgan. Jamais voltarei a duvidar de ti. — Sim —sussurrou ela. Ele levantou seu queixo e apertou a cara contra seu pescoço. Mordeu-a e lhe atravessou a jugular. O sangue fluiu para sua língua, e ele sentiu que a excitação despertava em seu corpo, inclusive naquele estado tão débil. E a fome o possuiu como sempre possuía aos de sua raça.
Mas não podia tomar muito, recordou a si mesmo. Só um pouco. Bebeu profundamente, até que a transladou ao reino escuro entre a vida e a morte. O coração da Morgan fraquejou, e então, rapidamente, ele abriu seu pulso com as presas e o aproximou dos lábios. Ela bebeu até que Dante se sentiu enjoado. Então puxou firmemente o pulso e o enfaixou com um pedaço de tecido. Morgan caiu para trás, com os olhos fechados. —Por favor, não morra. Não. Deus, faz que isto funcione. Por favor. Dante sussurrou ao ouvido: —Me faça amor... pela última vez. Ele fechou os olhos de pena. —Não pode ser a última vez, meu amor. Não pode ser. Tirou-lhe a camisola e lhe fez amor, com ternura, devagar, brandamente. Nunca tinha amado assim a ninguém. Em nenhuma de suas duas vidas. Ainda estavam unidos quando saiu o sol. E quando ela dormiu, Dante não soube se estava morta... ou era imortal. E então ele dormiu também.
Epílogo Um mês depois Maxine, vestida com um longo branco, sentou-se e desfrutou da visão do Lou com um smoking. Estava sentada entre ele e Lydia. Lydia também estava maravilhosa aquela noite. Tudo era maravilhoso, mas agridoce. —Isto é incrível —disse Stormy, sorrindo a Max—. Não posso acreditar que me conseguiste uma entrada. —Os candidatos ao prêmio a melhor roteiro original são... Stormy voltou a sentar-se em seu assento e todos fixaram sua atenção no cenário. David estava sentado o outro lado da Lydia, e pela expressão de sua cara Max soube que estava nervoso igual a ela. A apresentadora continuou: —E o ganhador é... —abriu o envelope—: Morgan da Silva, pelo Twilight Hunger O público explodiu em aplausos. A favorita tinha ganhado. As pessoas levantaram, incluídos eles cinco. Abraçaram-se. Max e Lydia gritaram de alegria, e David subiu ao estrado enquanto a apresentadora anunciava: —Recolherá o prêmio, em nome do Morgan da Silva, David Sumner, seu produtor, diretor e amigo. Ele assentiu tristemente quando pegou o prêmio da mão da bonita mulher e levantou a estatueta dourada para que as pessoas a admirasse. Quando os aplausos cessaram, uma enorme fotografia da Morgan antes que a enfermidade tivesse feito estragos nela foi projetada na enorme tela. —Era tão bonita —disse alguém detrás da Max—. E tão jovem. Lentamente, o público voltou a sentar-se em silencio para escutar as palavras do
David. —Obrigado. Morgan teria se sentido emocionada e agradecido por isso. Oxalá ela tivesse podido recolher este prêmio. Este filme, e os outros três, eram tudo para ela. Obrigado. Muito obrigado. Os aplausos ressonaram de novo, enquanto um par de modelos o acompanhava fora do cenário. Lou acompanhou a Max ao cemitério de madrugada. Uma vez que chegaram à porta, ele ficou ali, para lhe deixar espaço. Com a estatueta nas mãos, Max se aproximou da bonita lápide de granito. O nome da Morgan estava gravado na pedra, junto a sua data de nascimento e a de sua morte. Com lágrimas nos olhos, Max aproximou o prêmio à tumba. —Conseguiu minha irmã. Ganhaste. Morgan saiu de detrás da lápide. Não podia tirar o sorriso da cara ao pegar a estatueta e abraçá-la contra seu peito. —Consegui verdade? Oh, é incrível! ganhei! ganhei! —disse, e girou sobre si mesma, rindo, desfrutando do som de suas gargalhadas suaves na noite. Dante também saiu dentre as sombras e a abraçou, detendo seu movimento. —Não esqueçamos de quem era na realidade a história. —Oh, por favor —disse ela, sorrindo-lhe—. Não tinha vida até que eu o converti em um roteiro. —Seu roteiro não teve vida até que encontrou minhas histórias —brincou ele. —Estupendo. Então, compartilharemos o troféu. Dante a beijou, e sua risada cessou momentaneamente. —Como compartilhamos tudo —sussurrou ele, e sua voz profunda ao lado do ouvido fez que Morgan estremecesse. Max pigarreou exageradamente, e Dante liberou a sua irmã. —Você pode vê-la muito mais que eu —disse Max, abrindo os braços—. Importa-te? Dante fez um gesto de rendição e as duas irmãs se abraçaram. Sua irmã. Sua própria irmã. Morgan não podia acreditar no quanto tinha chegado a querer da Max em tão pouco tempo. Mas parecia que, uma vez que sobreviver tinha deixado de ser sua obsessão principal, tinha tido tempo de pensar no que realmente significava ter a Maxine em sua vida. —Está maravilhosa —lhe disse Max, enquanto posavam seus olhos verdes no rosto de sua irmã—. Saudável. Vibrante. Um pouco pálida, é certo, mas suponho que as coisas são como são. —Sinto-me maravilhosa —respondeu Morgan—. Melhor do que nunca estive, Max. Forte, poderosa e mais viva que quando realmente o estava. E tudo graças a ti. Max baixou a cabeça. —Eu estive a ponto de te causar a morte —sussurrou. —Não, carinho. Você me salvou. Apareceu quando mais te necessitava, e ficou a meu lado apesar de que eu tentei te enxotar. Manteve-me com vida e resgatou a meu amor para trazê-lo pra mim —lhe disse Morgan. Entretanto, Max ainda tinha a cabeça encurvada. Morgan pegou seu queixo e fez que elevasse a cara—. Querida, se não tivesse vindo, Stiles nos teria matado aos dois. Embora te custe um pouco reconhecer a verdade, foi sua presença que marcou a diferença. Estou convencida.
Max a abraçou de novo. —Sinto não te haver escutado desde o começo. —Eu também cometi esse engano, Maxine —disse Dante, brandamente—. De fato, acredito que Malone foi o único que viu as coisas claras desde o começo. —No final, tudo saiu bem —disse Lou, que finalmente se aproximou—. estivemos muito perto de perder a pele. —É certo —Dante lhe estendeu a mão para saudá-lo. Morgan pegou a Max pelo braço e a afastou um pouco, enquanto os dois homens ficaram conversando junto à tumba. —Temos que falar —lhe disse. —Sobre o que? —Sobre a casa —respondeu Morgan, enquanto caminhavam entre as árvores do cemitério, entre as tumbas e as flores—. Quase não estiveste ali desde... bom, desde meu funeral —uma suave brisa fria lhe acariciou o pescoço, e estremeceu—. Deus, é inclusive divertido dizer isso. —É sua casa, Morgan. Necessita um lugar no qual viver. Não quero te tirar isso Quero dizer, que tudo foi uma formalidade. É minha só sobre o papel. —Não, não é verdade. Quero que seja tua —respondeu Morgan—. Além disso, eu não posso habitá-la abertamente e me arriscar a ser descoberta. Quero que você viva aqui, e que a use. Pode estabelecer aqui seu negócio, se quiser. Seria o melhor para as duas. —Para as duas, êh? —perguntou Max—. No que beneficia a ti e a Dante? Ter parentes por toda parte não é o melhor para um casal tão apaixonado. Vocês estão completamente atordoados, como dois recém casados. —Não imagina. Ele é incrível —sussurrou—. Nunca acreditei que tudo pudesse ser tão... completo. Nunca em toda minha vida tive a ninguém... só ao David. E agora, de repente, tenho a ti, e tenho a este homem que... que morreria por mim. Quer-me tanto, que quase não o assimilei ainda. —Você mesma me está dando a razão para preservar mais sua intimidade —disse Max—. Vocês dois não se beneficiariam nada. —Sim. Que você estivesse aqui seria nossa coberta. —Coberta? — Sim. Desta forma, tenho que ter muitíssimo cuidado para que ninguém me veja. Se você estivesse aqui e alguém me visse, as pessoas pensariam que sou você. Poderia sair em público alguma vez. Ir a um filme, ou inclusive a compras —então se deteve e pegou as mãos de Max—. Sobre tudo, se a casa está ocupada por minha família, os estranhos não se aproximarão. —Veio gente bisbilhotar? —Oh, de vez em quando. Fãs, curiosos, meninos do povoado... Êh, sou famosa. ganhei um prêmio importante, sabe? Max sorriu. —Sim, já o tinha ouvido. —E? O que me diz? Max o pensou durante um longo momento. —Realmente, seria um lugar estupendo para estabelecer a empresa. Mas... Stormy é minha sócia. Ela também teria que vir. Morgan assentiu. Tinha visto a garota loira de longe.
—Ela sabe algo de mim? —Não o contei —disse Max—, mas acredito que o suspeita. E eu confio nela. Não nos trairá. Morgan sorriu. —E além disso, há o Lou. Também tenho que pensar nele —continuou Max. —Crê que quererá mudar-se pra cá e trabalhar contigo? Max se encolheu de ombros. —Acredito que não seria difícil convencê-lo, porque vai retirar-se da polícia dentro de pouco, e me falou sobre ir viver em uma casinha na praia, e ter um barco para sair pra pescar... —Então, o que é o que te detém, Max? Vamos, faz. Eu sinto falta de você, e se estivesse aqui, poderíamos recuperar todos os anos que perdemos. —Não sei... Se você estiver segura de que nos quer aqui... —É minha irmã. Sabe que quero que esteja aqui. Finalmente, Max assentiu. —Está bem. Virei, então. O Serviço de Investigações Sobrenaturais terá seu quartel geral no Easton, Maine. —SIS —disse Morgan—. Eu gosto de como soa. —Pensei que você gostaria. Abraçadas deram a volta e caminharam de novo até a tumba. Morgan se aconchegou nos braços de Dante e ele a abraçou com ternura. —Vai amanhecer, carinho —lhe disse. —Sei —respondeu Morgan. Sorriu a sua irmã e ao Lou—. Veremos-nos logo? —Muito em breve —prometeu Max. Morgan e Dante se perderam entre as sombras.
—Acredito que agora é mais feliz do que nunca foi —disse Max, observando como partiam—. Têm muita sorte. —Por que diz isso? —perguntou Lou. Começou a andar para o carro, e Max o alcançou imediatamente, encolhendo os ombros. —Não é evidente? São almas as gêmeas. Louca, selvagem e eternamente apaixonados. Não posso imaginar o gratificante que deve ser ter um homem que te queira como Dante quer a Morgan. O que têm é muito especial. —Suponho que tem razão —disse Lou, pondo o braço na Max sobre os ombros despreocupadamente enquanto se dirigiam ao estacionamento—. Alguns tipos passam a vida sem encontrar isso. —Sim. E há outros que o têm justo debaixo do nariz e não querem vê-lo. —Você acredita? —perguntou-lhe, olhando-a. Max pôs os olhos em branco e sacudiu a cabeça. —Sim —respondeu ela—. Acredito. Lou encolheu os ombros e continuou caminhando. Das sombras, Sarafina observou a Dante enquanto falava e ria com os mortais e depois partia abraçando a sua amante. —Querer-te-ei sempre —sussurrou a Morgan—. Acredito que, de algum modo, já te
amava. —Parecemos um para o outro, Dante. Sabe agora, verdade? —Sempre soube, inconscientemente. A primeira vez que o disse, estremeci —a beijou brandamente—. Sinto que me custasse tanto. Ela sorriu e lhe devolveu o beijo. —Está bem, mas não deixe que volte a acontecer — então, afastou-se dele, com a vida e o amor brilhando nos olhos—. Aposto uma corrida até em casa! —e, girando e rindo, saiu disparada tão rápido como o tivesse podido fazer Sarafina. Dante saiu correndo atrás dela sem olhar atrás. Assim que aquilo era o que queria. Tinha uma nova família. Havia de voltado as costas. Dante, o último vínculo que restava com sua família, sua herança, seu sangue. Maldito fosse. Tinha-a traído, exatamente igual ao resto de seus familiares. Sarafina pensou que não se importava. Caminhou até encontrar um lugar iluminado pelos raios da lua e se sentou no chão. Era uma vampiresa. Não necessitava de uma família. Não necessitava de ninguém absolutamente. E nunca o necessitaria. Jamais.
FIM