Personalidades IPT - Vicente Chiaverini

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Vicente chiaverini Engenheiro, professor e empresário. A trajetória profissional de Vicente Chiaverini agregou valor à história da metalurgia no País, e sua larga experiência prática contribuiu para a formação de pesquisadores e profissionais da área.

Vicente Chiaverini (1914 - 2011)

“É bom a gente se sentir que está realizando alguma coisa. Por isso eu conjugo o ensino com a pesquisa, a empresa privada e a atividade literária”. Entrevista de Vicente Chiaverini, Revista BANAS Informa, 08/09/1969.

No IPT, onde trabalhou de 1940 a 1955, escolheu e desenvolveu a carreira de engenheiro metalurgista, aprendeu a ser pesquisador e empreendedor de novas ideias. Na década de 1940, colaborou para a melhoria das indústrias metalúrgicas brasileiras, introduzindo o processo da metalurgia do pó, até então desconhecido no País. A tecnologia contribuiu principalmente para a florescente indústria automobilística, e hoje são inúmeras as aplicações industriais de peças sinterizadas produzidas a partir de pós metálicos e não-metálicos. Pela sua capacidade técnica e ótima relação com os alunos, o professor Chiaverini deixou rastros de admiração. Suas obras ultrapassaram as fronteiras do País e até hoje são referências de estudos e pesquisas para técnicos e engenheiros. Como empresário, teve uma trajetória promissora: implantou a primeira indústria de metalurgia do pó no Brasil, que se desenvolveu rapidamente, e até hoje é referência na área. Além disso, dirigiu várias instituições de peso no Estado de São Paulo. Chiaverini é mais uma personalidade da história do IPT que colaborou com os avanços científicos e tecnológicos brasileiros, especialmente na área de metalurgia e siderurgia. Ele nos deixou em 16 de dezembro de 2011.

Pó de neodímio-ferro-boro, empregado na preparação de super-ímãs pelo processo de metalurgia do pó. Os super-ímãs são utilizados na fabricação de HDs.


vida Vicente Chiaverini nasceu em 8 de dezembro de 1914 na cidade de São Paulo, filho do italiano Rodolpho Chiaverini e da espanhola Conceição Mejias. Seu pai chegou a São Paulo no final do século XIX e estabeleceu-se no bairro do Bixiga, onde montou uma fábrica de chapéus. Apaixonado por música, Rodolpho fazia questão que os seis filhos tocassem algum instrumento musical. Chiaverini aprendeu a tocar piano, e junto com os irmãos fazia apresentações de música popular na sala de visitas da casa próxima à Avenida Paulista, com porta e janela abertas, para que os passantes pudessem apreciá-los. Conceição e Rodolpho, pais de Chiaverini

Déc. de 1930 - Vicente Chiaverini (primeira fila, agachado, entre os dois irmãos) e a família na residência do bairro do Bexiga

Entrou no IPT em 1940, sob a direção de Adriano Marchini, como aluno assistente na Seção de Ensaios Mecânicos. Em seus 15 anos de dedicação ao Instituto, contribuiu para o incremento das empresas metalúrgicas brasileiras com a introdução de um novo processo de fabricação, a metalugia do pó, pela qual até hoje são produzidas peças para as indústrias automobilística e de eletrônicos.

Década de 1920 - Apresentação do quarteto formado pelos irmãos Chiaverini - ao piano, Alzira; no violencelo, Reynaldo; na flauta, Rodolfo, e Francisco A família abastada permitiu a Chiaverini frequentar uma escola particular. Estudou parte do curso primário e todo o secundário (atual ensino fundamental e médio) no Instituto Medio Italo Brasileiro “Dante Alighieri”, em regime de internato.

“No Dante naquela época as aulas eram em italiano, com exceção das aulas de francês, latim, inglês e português.” Vicente Chiaverini em entrevista 07/01/2005 Entretanto, a crise de 1929 viria a afetar a fábrica e a situação financeira piorou no início da década de 1930: o pai de Chiaverini começou a produzir os chapéus no quintal de casa e cabia a Vicente entregá-los à noite, após chegar do colégio. Vicente quase foi obrigado a parar os estudos, mas o comportamento exemplar e as boas notas levaram a diretoria da escola a lhe conceder uma bolsa de estudos completa. Isso possibilitou a sua preparação para ingressar no curso superior e a finalização dos estudos em 1933.

Nesta época, Chiaverini foi apresentado à Lia Correa, moça de família tradicional paulista, pelo companheiro de trabalho eng. Manoel Moraes (Manoelito). Vicente e Lia casaram-se em agosto de 1946 e tiveram quatro filhos: Helena Maria, Luiz Vicente, Maria Regina e Maria Alice. Ao deixar o IPT, em 1955, continuou como professor na Escola Politécnica e expandiu sua atuação como empresário e diretor de diversas instituições do Estado de São Paulo.

“Na vida familiar não poderia ter sido mais feliz com Lia, com os 4 filhos casados, e os seus 11 netos e 6 bisnetos”. Vicente Chiaverini em seu Memorial

1946 - Casamento de Chiaverini e Lia da Cunha Correa

No ano seguinte, com a criação da Universidade de São Paulo, foi formado um curso pré-universitário, para preparar os estudantes que queriam ingressar na Universidade. Chiaverini inscreveu-se nesse curso e foi classificado entre os primeiros colocados. Neste período, começou a trabalhar para seu sustento, dando aulas particulares à noite e realizando trabalhos topográficos. Essas atividades o influenciaram na escolha pela engenharia e pela carreira docente. Em 1934, ingressa na Escola Politécnica no curso de Engenharia Civil, graduando-se em 1940. Sete anos depois viria a trabalhar na Escola, na qual teve uma carreira exemplar por 36 anos (até 1983).

Dezembro de 1940 - Formatura da turma da Escola Politécnica Chiaverini é o segundo da esq. para a dir., na primeira fila, de terno branco


professor Na década de 1940, conforme a família crescia, Chiaverini precisou aumentar a sua renda. Em uma reunião com Adriano Marchini, surgiu o convite para trabalhar como assistente do prof. Ary Torres, na Escola Politécnica da USP. Ele aceitou com entusiasmo, pois estava alcançando um de seus maiores desejos, a carreira universitária. Na escola, foi encarregado de ministrar aulas de materiais metálicos para a construção civil, mas tornou-se em pouco tempo especialista em todos os materiais de construção.

“Devido a seus múltiplos afazeres, Ary Torres ausentava-se com frequência. Às vezes eu estava em casa sossegado, ele telefonava dizendo: Olha... eu vou viajar, vai dar aula você.” Entrevista de Vicente Chiaverini em 2005 Em 1947, inicia a sua trajetória como professor assistente na Poli. Foi nessa função que publicou seu primeiro livro, “Aços-carbono e Aços-liga“, que lhe valeu a “Medalha de Prata Colpaert” e o diploma de sócio-honorário da Associação Brasileira de Metalurgia, Materiais e Mineração, a ABM. O livro tornou o seu nome conhecido nos meios universitários do País, na América Latina e em Portugal. Anos depois escreveu também “Tratamentos Térmicos das Ligas Metálicas” e “Metalurgia do Pó”.

1967 - Posse de Chiaverini como professor catedrático na Escola Politécnica da USP

“Em 1969, na escolha do paraninfo da turma de formando, segundo um sobrinho, que era dessa turma, foi feita uma pesquisa entre os alunos sobre o nome a ser escolhido. Seu grande rival foi o jogador Pelé, que ainda estava no auge de sua carreira futebolística.” Citação de Helena Maria Chiaverini em 07/02/2012

Déc. de 60 - Aula de Chiaverini na Escola Politécnica da USP

Década de 1980 - Lançamento do livro Aços e Ferros Fundidos Para completar a carreira universitária, prestou concurso de livre-docência (1964) com a tese “Contribuição para o estudo de propriedades de ferro sinterizado e suas ligas “ e foi nomeado professor titular. Três anos depois, submete-se ao concurso de cátedra com a tese “Contribuição para o estudo de fatores que determinam a vida das ferramentas de metal duro”. Seu bom desempenho na Escola o levou a ser convidado, anos depois, a chefiar o Departamento de Engenharia Mecânica. Aposentou-se em 1983, deixando o que foi para ele um grande prazer: o contato constante com alunos e professores.


engenheiro e pesquiSador “As aulas práticas das matérias do curso eram ministradas por engenheiros do IPT(...) Um dos professores era Hubertus Colpaert, do Departamento de Metalografia, que, pela profundidade e clareza de suas aulas, foi um dos responsáveis pela escolha de minha carreira em Metalurgia,” Vicente Chiverini em entrevista em 2005.

Déc. de 1940 - Forno Cubilot para ferro fundido, com capacidade de processamento de uma tonelada por hora, na Usina de Fundição do IPT O setor das indústrias metalúrgicas era incipiente no Brasil na década de 1930. As poucas existentes, como a Companhia Siderúrgica BelgoMineira, Aços Villares e outros, eram pouco aparelhadas e faltava mão de obra qualificada. Os ferros fundidos eram quase desconhecidos no Estado de São Paulo; nenhuma fundição dispunha de fornos elétricos e poucas possuíam máquinas de moldar. O mercado nacional dependia inteiramente de importação. É nesse contexto que Vicente Chiaverini iniciou sua trajetória de engenheiro e pesquisador no IPT, sob a direção de Adriano Marchini, no bairro do Bom Retiro. Ele ingressou no Instituto como assistente-aluno na Seção de Metais do Setor de Ensaios Mecânicos e Metalurgia, sob a chefia de Miguel Siegel, em 1940. A Seção passava por um momento difícil por causa da II Guerra Mundial: faltavam materiais metálicos para auxiliar nos ensaios de trilhos e na confecção de barras-padrão para aparelhos portáteis de dureza, bem como fitas de aço para enfardamento de algodão.

Em 1943, o programa “Coordinator of Inter-American Affairs”, cujo objetivo era colaborar com o governo brasileiro em atividades educacionais oferecendo o treinamento de técnicos nos EUA, cedeu ao IPT duas bolsas de estudo. Chiaverini e Tharcisio Damy viajaram para os EUA para especialização em novas tecnologias por meio de cursos intensivos e estágios em laboratórios e indústrias. Chiaverini se interessou pela metalurgia do pó, curioso pela rapidez na fabricação de peças metálicas. Chiaverini passou seis meses estagiando no Stevens Institute of Technology na cidade de Hoboken, em New Jersey, uma das melhores escolas de Engenharia Mecânica dos Estados Unidos. A instituição era a única que possuía, na década de 1940, um curso de pós-graduação em metalurgia do pó e um laboratório experimental para a pesquisa do processo.

“Quando estive por ocasião nos EUA, encontrei um rapaz da Bahia que estava fazendo um curso lá...Ele me perguntou o que eu estava fazendo... Quando disse que estava fazendo um curso de metalurgia do pó, ele disse o seguinte: mas esse Brasil em crise manda o homem aqui para estudar poeira” (idem)

O interesse de Chiaverini pela área de metalurgia foi incentivado pelas aulas de Hubertus Colpaert na Escola Politécnica. Em 1942, foi contratado como engenheiro, com a incumbência de montagem e operação dos fornos Detroit e Heroult, inéditos no Brasil.

Déc. de 1940 - Forno elétrico Heroult para aço e ferro fundido, com capacidade de uma tonelada, na Usina de Fundição do IPT

Déc. de 1940 - Forno elétrico Detroit para ferro fundido e ligas especiais, com capacidade de 250 kg, na Usina de Fundição do IPT


engenheiro e pesquiSador Em 1944, três professores norte-americanos convidados pela Escola Politécnica chegaram ao Brasil para ministrar aulas de metalurgia. Allan Bates, do Laboratório de Pesquisas de Westinghouse de Pittsburgh; Robert F. Mehl, chefe do Departamento de Metalurgia do Carnegie Institute of Technology, também de Pittsburgh, e Arthur Phillips, da Yale University em Connecticut.

“Tenho orgulho de ter feito e ter criado a Metalurgia do Pó no IPT... Pra mim foi a coisa mais importante, criar um novo processo de fabricação de peças...” Entrevista com Vicente Chiaverini, 2005

A presença dos professores influenciou os pesquisadores a criarem uma associação para fortalecer a área de metalurgia no País. Chiaverini fundou em 1944, com profissionais de São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, entre outros, a Associação Brasileira de Metalurgia, Materiais e Mineração, a ABM, da qual foi presidente.

No ano seguinte, encarregou-se da montagem dos equipamentos destinados às novas seções de Metalurgia do Pó e de Tratamento Térmico. Lá eram produzidas peças para indústria em caráter semi-industrial, como buchas porosas de bronze para ventiladores e bombas de água de automóveis. A amizade com o Professor Mehl foi fundamental para um importante passo em sua vida profissional na década de 50: Chiaverini decidiu criar seu próprio negócio e deixou o IPT em 1955 para se dedicar à carreira empresarial e à Escola Politécnica. 1946 - Futuras instalações experimentais dos pavilhões da Metalurgia na Cidade Universitaria

2000 - Chiaverini comemorando aniversário de 86 anos e o recebimento da Medalha de Ouro da Associação Brasileira de Metalurgia, Materiais e Mineração - ABM

Em 1945, Marchini pede a ajuda de Chiaverini no processo de construção das novas instalações da metalurgia do IPT na Cidade Universitária. Aproveitando o momento, Chiaverini apresentou um relatório propondo a instalação de um laboratório ou usina experimental de metalurgia do pó. O projeto foi aceito e ele passou a ser sub-chefe do Setor de Obras, com a incumbência de acompanhar projetos e adquirir equipamentos americanos para as novas instalações.

1949 - Vista geral da Seção de Metalurgia do Pó

Déc. de 1940 - Usina de Fundição do IPT no bairro do Bom Retiro


empresário Novas oportunidades de negócios surgiram no Brasil na década de 1950 como consequência da II Guerra Mundial, que limitou as importações e forçou a expansão industrial. O País deixava de ser agrário, a população urbana crescia aceleradamente, e o número de automóveis em circulação aumentava. Vicente Chiaverini alimentava o desejo de iniciar em São Paulo, por conta própria, a produção em escala industrial de peças metálicas sinterizadas, uma atividade que coordenava com êxito na Seção de Metalurgia do Pó do IPT. Ele então preparou um relatório sobre a viabilidade de fabricar peças sinterizadas no Brasil, documento que chegou às mãos de Ary Torres. Para atender ao aquecimento do setor industrial, Vicente e Ary fundam, com um grupo de engenheiros do IPT, a empresa Brassinter, em 1954, no bairro paulistano de Santo Amaro, e nela permaneceu cerca de 20 anos. A empresa tornou-se rapidamente um dos maiores complexos industriais do País, fabricando peças em metal duro, metal pesado, eletrodos e contatos elétricos, produtos comercializados nacional e internacionalmente.

No mandato de Paulo Maluf como governador, entre 1979 e 1982, o secretário de estado da Indústria, Tecnologia e Comércio, Oswaldo Palma, convidou Chiaverini para o cargo de vice-presidente executivo do Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia. Foram quatro anos de desafios em busca de novas possibilidades na área de estímulo ao desenvolvimento tecnológico. Nesse período, devido à crise do petróleo, participou de diversas missões econômicas para Arábia Saudita, Iraque, México e Canadá, e missões tecnológicas e econômicas aos Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha, Finlândia, França e Japão. Ao final do governo, saiu da Secretaria e passou a realizar consultorias no setor de tratamento térmico e metalurgia do pó.

“Como é que vocês vão fazer uma fábrica de um negocio que ninguém sabe o que é? ...Mas foi um sucesso! Hoje existem outras fábricas além da Brassinter.” Entrevista com Vicente Chiaverini, 2005 A década de 1960 foi marcada por reviravoltas políticas. O País tinha vivido um intenso processo de investimentos e industrialização. A migração rural transformou as maiores cidades brasileiras em metrópoles com graves problemas e as obras de infraestrutura haviam demandado gastos excessivos e empréstimos externos. É nesse cenário que Chiaverini projeta o seu nome no meio industrial de São Paulo, engajando-se em atividades associativas e políticas. Em 1964, ele assumiu a direção do Centro e Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp/Fiesp) e foi eleito “industrial do ano” na cidade de Santo Amaro.

1969 - Paulo Salim Maluf, então prefeito de São Paulo (segundo da dir. para esq), e Chiaverini (terceiro da dir. para esq) na posse da diretoria do Metrô

Década de 1970 Chiaverini em missão internacional para a Fiesp Em 1969, o Metrô de São Paulo estava em construção para suprir os problemas de transportes da cidade. O então prefeito Paulo Maluf indicou Chiaverini para presidir a companhia. Chiaverini dedicou boa parte de sua gestão a convencer as autoridades da importância de linhas de transporte rápido e a obter recursos para o término das obras. Desligou-se do metrô um ano depois e assumiu a diretoria do Banco de Desenvolvimento do Estado de São Paulo (Badesp) e, pouco depois, do Banco Finasa de Investimentos. Ao demitir-se do banco, foi convidado a assessorar a Secretaria de Ciência e Tecnologia do Estado.

1969 - Chiaverini em entrevista sobre o Metrô de São Paulo para a revista Banas Informa


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