A Humanização da Arquitetura Prisional em Prol da Reabilitação Social

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO

A HUMANIZAÇÃO DA ARQUITETURA PRISIONAL EM PROL DA REABILITAÇÃO SOCIAL

Trabalho Final de Graduação apresentado à Banca Examinadora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como exigência parcial para a conclusão do curso de Arquitetura e Urbanismo.

Orientadora: Profª. Drª. Claudia Virginia Stinco Aluna: Isabella Oliveira Albino de Souza São Paulo - 2016


Agradecimentos

Gostaria de agradecer minha família - principalmente meus pais Ademar e Edjane e minha irmã Mayara. Me ensinaram que para vencer na vida precisamos sempre lutar sem medir esforços e nunca abandonar os princípios e valores que me foram passados, dessa forma, o resto viria por consequência. Durante os últimos cinco anos a minha luta foi a de vocês e apenas nós sabemos como foi difícil. Obrigada por me ampararem quando achei que não conseguiria e me incentivarem para eu nunca perder o foco. Agradeço também aos amigos que conquistei nesse caminho, em especial Hanna, Catarine, Tamara e Vincent. Cada um de vocês me ajudou de uma forma diferente porém indispensável. Nós dividimos todos os piores e os melhores momentos dessa jornada e acreditem, vocês foram indispensáveis! Por último, gostaria de agradecer minha orientadora e confidente Claudia Stinco. Desde o começo desse TFG sabia que seria uma das poucas se não a única que encararia essa loucura comigo. Obrigada por confiar em mim, pelos atendimentos e pela divisão de experiências e angustias que carregamos em relação ao tema. Foram com certeza os mais completos atendimentos que eu poderia ter! Choramos, rimos e principalmente alimentamos ainda mais a esperança da mudança que é necessária, mas poucos estão dispostos a discutir.


Dedico este trabalho à Leonor Rodrigues, minha amada avó, madrinha e hoje meu anjo da guarda. Assim como em nossa última conversa, agora a senhora possui uma neta arquiteta e urbanista. Saiba que trouxe comigo nessa jornada tudo que me ensinou ao longo da vida e principalmente esse coração enorme e vontade em ajudar ao próximo, acreditando que o futuro poderia sim ser melhor!


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO

P. 07

2. DA LEI À PEDRA P. 2.1 PENA P. 2.2 SISTEMA PENITENCIÁRIO P. 2.3 REGIMES PENITENCIÁRIOS P.

13 14 15 17

3. ARQUITETURA PRISIONAL P. 3.1 PANORAMA HISTÓRICO P. 3.2 TIPOLOGIAS P. 3.3 CENÁRIOS ATUAIS P.

21 22 32 41


4. ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA AO CONDENADO P. 4.1 APAC ITAÚNA (MG) P. 4.2 APAC ITUIUTABA (MG) P. 4.3 APAC SANTA LUZIA (MG) P.

49 56 58 60

5. APAC TIETÊ – O PROJETO P. 5.1 INSERÇÃO URBANA P. 5.2 O PARTIDO P. 5.3 PROPOSTA APLICADA P.

65 66 72 76

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS P. 103 7. BIBLIOGRAFIA P. 115


“E se, em pouco mais de um século, o clima de obviedade se transformou, não desapareceu. Conhecem-se todos os inconvenientes da prisão, e sabe-se que é perigosa quando não inútil. E, entretanto não vemos o que pôr em seu lugar. Ela é a detestável solução de que não se pode abrir mão.”(FOUCAULT, 1987, p. 196)


1. INTRODUÇÃO


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1. INTRODUÇÃO O presente trabalho final de graduação se debruça sobre o tema da arquitetura prisional, mais especificamente, sobre projetos de centros de reabilitação social do indivíduo infrator, como a APAC - Associação de Proteção e Assistência aos Condenados. A principal dificuldade que se apresenta, assim como coloca Cordeiro (2009) é diminuir o distanciamento entre o autor do projeto - aquilo que ele considera “ideal” para a arquitetura prisional - e as reais necessidades do indivíduo usuário, em um cenário onde os modelos arquitetônicos gradativamente estão passando por um processo de uniformização. É comum também confundir o propósito desse tipo de arquitetura, que é reabilitar o indivíduo encarcerado - e não apenas visar a parcela punitiva, já alcançada através da privação da liberdade - obtém-se como resultado um projeto arquitetônico ultrapassado, que apenas replica modelos mal planejados e retrógrados, sem considerar o ambiente e a população onde será implantado. 08


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Tal posicionamento amplia a visão do problema, conduzindo à reflexão sobre o caráter punitivo das edificações prisionais em detrimento do caráter educativo e do tratamento psicológico que os infratores deveriam receber, no sentido do preparo para a reinserção social do apenado. O ambiente em que se são essas relações também deveria desempenhar um papel “educador”, uma vez que canaliza as ações dos indivíduos nele inseridos. Isso não significa que o espaço construído seja suficiente para controlar resultados e ações dos usuários, mas devemos assumir que possui sua parcela de contribuição e por isso é necessário entender suas dinâmicas, necessidades e possibilidades para melhor projetá-lo, de modo que desempenhe sua função de forma saudável. Além disso, há que se buscar o equilíbrio entre a normativa, a LEP1 , os direitos humanos e a intenção projetual ao se pensar espaços focados na reabilitação social do indivíduo. Atualmente, o Brasil ocupa o 4º lugar no ranking de maior população carcerária mundial (incluindo prisão domiciliar), enquanto os índices de reincidência giram em torno de 80%, com um custo médio de R$ 2 mil preso/mês no sistema carcerário comum. Já a reincidência no sistema APAC é cerca de 12% apenas, 1

LEP - Lei de Execução Penal

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sendo que o recuperando custa somente R$ 800/mês para o Estado2 . É alarmante observar as estatísticas e verificar que 98,5% desses presos estão ainda em idade economicamente ativa e poderiam trabalhar, pagar tributos e ser mão de obra. Entretanto, o que se constata é o desinteresse geral pelo ser humano encarcerado e o desconhecimento sobre novas alternativas de tratamento. A partir de propostas arquitetônicas humanizadas, somado à gestões públicas eficazes e programas de auxilio e reabilitação sociais, acredita-se que será possível promover, de fato, a reinserção social ideal desses indivíduos, e consequentemente, a redução da população carcerária brasileira. Neste sentido, o presente trabalho pretende estudar a arquitetura prisional e repensar a forma como os espaços são projetados, para assim tornar-se mais humana e esse seja um dos principais agentes para a mudança do cenário caótico que vivemos hoje.

Há ainda muito tabu em relação ao tema e poucos estão dispostos a discutir,

uma vez que a ação arquitetonica prisional brasileira passa a ser menosprezada

2 Fonte DEPEN e FBAC. Tabelas disponíveis em http://www.apacperdoes.com.br/?page_id=235 , base período 2004-2009.

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por conta de limitações impostas ao planejamento de unidades penitenciárias que se encontram amarradas a um pensar bastante atrasado culturalmente falando. No entanto, é um espaço planejado, que pretende atender a determinadas dinâmicas, é habitado e por que não pode ter uma composição formal interessante além das suas limitações de segurança? Não só pode como deveria ser projetado por arquitetos, buscando maior relação entre intenções projetuais e usuário. Assim como nos modelos tradicionais, nos deparamos com a "semiótica da vigilância", onde tudo e todos são observados e monitorados cem por cento do tempo. Elementos como esse deveriam ser utilizados para valorizar e reeducar os usuários ao invés de oprimi-los e excluí-los. Apenas assim, começamos a repensar nesse tipo de espaço arquitetonicamente, de forma a relacionar autor, usuário e função, aproximando-o do objetivo final: a reinserção de um indivíduo correto.

“Será que deveríamos falar de reintegração ou integração à sociedade, já que muitos deles nunca estiveram de fato integrados socialmente?”3 3 Valdeci A. Silva, Gerente Administrativo da APAC Pouso Alegre, 2014.

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1. Imagem Ilustrativa


2. DA LEI À PEDRA


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2. DA LEI À PEDRA

Como ponto de partida, para melhor compreensão e discussão sobre o tema da arquitetura prisional, são sinalizadas definições sobre termos que serão tratados ao longo do trabalho.

2.1 PENA

Pena é a sanção aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação penal, ao autor de uma infração, como retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico, e cujo fim é evitar novos delitos(JESUS, 2010).

Ademais, Estefam (2010), a pena deve cumprir dupla função: inibir comportamentos antissociais e, ao mesmo tempo, moldar comportamentos socialmente aceitos; de modo que sua aplicação gera nos indivíduos o respeito e o temor respeitoso, no momento em que percebem que a violação da norma acarreta a efetiva aplicação da sanção – o que reforça a autoridade do Direito. 14


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2.2 SISTEMAS PENITENCIÁRIOS A. FILADÉLFIA

O sistema Filadélfia é aquele cujo sentenciado deve cumprir pena em cela, sem sair, salvo em casos esporádicos.

B. AUBURN

No sistema Auburn, durante o dia o sentenciado trabalha em silêncio junto com os outros, havendo isolamento durante a noite.

C. INGLÊS OU PROGRESSIVO No sistema inglês ou progressivo, o sentenciado cumpre um período inicial de isolamento. Posteriormente

o sentenciado passa a trabalhar junto à os outros reclusos. Na última fase, é posto em liberdade condicional.

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Ao iniciar o cumprimento da pena em regime fechado, o condenado deve passar pelos seguintes estágios: 1º) trabalho em comum no período diurno e isolamento noturno; 2º) transferência para os regimes semiaberto e aberto, sucessivamente; 3º) livramento condicional; Aplicam–se as mesmas regras ao regime semiaberto, executando o isolamento noturno. D. REMISSIVO A Lei de Execução Penal adotou o sistema de remissão, pelo qual “o condenado cumpre pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, pelo trabalho, parte do tempo de execução da pena” (art. 126 a 130). 16


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2.3 REGIMES PENITENCIÁRIOS A.

REGIME FECHADO

B.

REGIME SEMIABERTO

A execução da pena privativa de liberdade deve ser executada em estabelecimento de segurança máxima e média.

A execução da pena privativa se faz atualmente em colônias agrícolas, industrial ou estabelecimento similar. C.

REGIME ABERTO

A execução da pena privativa ocorre albergado ou estabelecimento adequado.

em

casa

de

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Em suma, deve-se ressaltar que, conforme previsto por lei, a pena é estabelecida com o objetivo de manter ordem social. Além disso, a mesma deve não só inibir comportamentos antissociais, mas também moldar os indivíduos de forma à ressocializá-los. Há de se considerar que, o preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral. Itens esses que são facilmente esquecidos e ignorados a partir do momento que a sociedade passa a rotular e marginalizar o condenado ao invés de tentar recuperar o indivíduo.

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2. Imagem ilustrativa

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2. Halden Prision (Noruega)


3. ARQUITETURA PRISIONAL


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3. ARQUITETURA PRISIONAL 3.1 PANORAMA HISTÓRICO O surgimento da arquitetura prisional4 vincula-se ao conceito de pena. Nos primórdios, devido ao baixo desenvolvimento das cidades e o pequeno número populacional, não se faziam necessárias as prisões. Aqueles que cometiam algum desvio de conduta ou atentavam contra o poder, eram sentenciados e punidos – a penas capitais majoritariamente – em praças públicas como forma de afirmação da soberania e do poder do monarca. As primeiras prisões surgiram no século XVI na Europa e eram destinadas a recolher moradores de rua, prostitutas e pessoas que apresentavam comportamento imoral, desvinculados de pena, apenas segregava-se a parcela indesejada da população.

4 Ao tratar de arquitetura prisional tem-se como objetivo tratar de forma generalizada a arquitetura desse tipo de edificação. Partindo de um pré entendimento das diferenciações básicas de tipologias - como cadeia, penitenciárias, presídios e albergues - porém, não tratadas individualmente para não fugirmos do foco desejado no trabalho.

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Foi apenas entre os séculos XVII e XVIII que surgiram os primeiros estabelecimentos de detenção, cujos objetivos se assemelhavam aos atuais. Sendo assim, não havia edifício ou projeto arquitetônico propriamente dimensionado e projetado para essa finalidade. Utilizavam-se subsolos de prédios públicos ou ainda edifícios não habitados. No geral, não obedeciam a nenhum princípio penitenciário ou mesmo de higiene. Eram lugares insalubres, subterrâneos e infectados. As epidemias proliferavam nesses estabelecimentos e dizimavam a população encarcerada, além de contribuir com o alastramento de pestes nas cidades. Jeremias Beteham, no século XIX, propôs um novo tipo de arquitetura prisional, o famoso modelo arquitetônico panóptico, o sistema que tudo vê. Neste modelo o detento é submetido à sensação constante e ininterrupta de vigilância, uma vez que o espaço projetado não lhes possibilita ver quem o observa, assim não consegue saber se está sendo observado e quando, mas com permanente certeza que sim poderia estar sendo. Além disso, submete o agente penitenciário – o observador – à tremenda exaustão, uma vez que reduz a vigilância a apenas um funcionário em ambiente pouco iluminado, forçando-o a ficar sempre ativo e atento. 23


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Arquitetonicamente, esse modelo é constituído por uma construção periférica em anel e no centro uma torre de observação. A construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da construção. Cada cela possui duas janelas, uma voltada para o interior e outra para o exterior, de onde provêm toda e qualquer iluminação do ambiente. A disposição das paredes laterais (limítrofes) 24

4. Presídio em Isla de la Juventud, Cuba. (1926)


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garantem, além da separação das celas, a invisibilidade lateral, ou seja, o isolamento dos indivíduos. E esta é a garantia da ordem do conjunto. Foucault criticava

veemente

o

modelo

panóptico,

definia

o

mesmo como o aparelho arquitetural responsável por criar e sustentar uma relação de poder independente

daquele que o exercia, por meio da indução de um

estado consciente e permanente de visibilidade que

assegurava o funcionamento automático desse poder. Além disso, comparava esse modelo arquitetônico com zoológicos, presos,

em

substituindo

uma

cidade

assim

os

assombrada

animais pela

pelos

peste

e

pela imposição e castração psicológica gerada pela

5. Ilustração prisão panoptica

sociedade disciplinar. A primeira prisão com esse aparelho arquitetônico foi implantada nos Estados Unidos em 1800. Mais ou menos na mesma época, surgiram outros sistemas no mundo: o Filadélfia (1790, EUA), o Auburn (1821, EUA), o Progressivo (1846, Austrália) 25


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e por último o de Montesinos(1934, Espanha). No âmbito arquitetônico brasileiro, a primeira prisão documentada - nomeada como Casa de Correção e citada na Carta Régia de 1769 - foi instalada na cidade do Rio de Janeiro. Posteriormente, foi implantada uma unidade em São Paulo, entre os anos de 1784 e 1788. Arquitetonicamente, não eram edifícios propriamente ditos “correcionais”, mas sim grandes casarões onde funcionavam a Câmara Municipal ou alguma outra representação do poder público. A reclusão acontecia em salas de aprisionamento localizadas nos subsolos ou porões desses edifícios e para lá eram levados aqueles que apresentavam desvios de conduta, cometiam infrações e também os escravos que aguardavam as penas de açoite. Naquele tempo ainda não era tratado como pena de prisão, apenas pagamento de multas e castigos provenientes do sistema escravocrata. Foi a partir do Código Penal de 1890 que começaram a surgir arquiteturas de caráter exclusivamente correcional, mais apropriadas para a pena de prisão, as primeiras “prisões” por assim dizer. É importante ressaltar que foi esse código penal que estabeleceu também as novas formas de aprisionamento, limitando a pena máxima a trinta anos. 26


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Na virada do século XX, São Paulo vivia um período de desenvolvimento econômico, que beneficiava e estimulava o crescimento populacional. As prisões existentes já não eram mais suficientes nem adequadas para a crescente população carcerária. Foi então que, em 1905, foi autorizada a construção de uma nova penitenciária. Distante do centro urbano e com baixos valores imobiliários, o bairro do Carandiru, na região norte da cidade, foi escolhido para abrigar o novo estabelecimento prisional. Francisco de Paula Ramos de Azevedo foi o engenheiro arquiteto responsável pela obra, que tinha como modelo a arquitetura europeia. A inovação não ficaria apenas por conta da arquitetura, a política carcerária também

6. Recorte de noticia publicada no jornal Folha de S. Paulo

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era nova. O Carandiru seria um estabelecimento prisional modelo, a Penitenciaria do Estado simbolizava a vanguarda no tratamento carcerário. Teria um caráter de casa correcional e regeneratória, com oficinas próprias, de forma que o encarcerado pudesse ser acompanhado e educado até sua reabilitação moral. Em 1956, a penitenciária foi inaugurada.

7. Carandiru, SP. 8. Recorte de jornal com a proposta do Carandiru publicado no jornal Folha de S. Paulo.

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9. Carandiru desativado.

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Durante 46 anos o Carandiru foi a maior penitenciária da América Latina, chegando a alojar mais de oito mil presos, porém também foi palco de grandes tragédias. Aquela que era uma promessa de casa correcional regeneratória e de reabilitação, não foi suficiente para suprir a demanda da população carcerária local e nem foi acompanhada de uma

10. Protesto realizado por detentos do Carandiru.

política carcerária idônea. O mesmo foi palco de cenas de extrema violência (fruto da superlotação) e corrupção que levaram a um grande massacre (1992) que até hoje está em processo de julgamento. Este foi um fato marcante que levou 30


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à decisão de desativar o presídio, que acabou parcialmente demolido em 2002. Atualmente, o bairro do Carandiru ainda possui sequelas deixadas pela urbanização que cresceu com um presidio daquele porte. Porém, onde antes eram os pavilhões, hoje é o Parque da Juventude (2007). Fruto de um concurso público realizado em 1999, promovido pelo governo do estado de São Paulo, cujo os vencedores foram Aflalo e Gasperini, a proposta de um novo espaço público onde as pessoas podem usufruir de escolas, biblioteca e lazer, tenta até hoje substituir a memória local.

11. Parque da Juventude, SP.

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3.2 TIPOLOGIAS

Podemos separar a produção arquitetônica prisional mundial em três grandes grupos: A. PANÓPTICA

Citado anteriormente, esse modelo foi idealizado por Jeremias Bentham em 1880; módulos dispõem-se de maneira radial ou circular para permitir total visualização e controle. As edificações eram no geral de seis pavimentos, cuja construção dava-se de forma periférica formando um anel com uma torre de observação no centro. As celas dividiam esse anel, de forma a atravessar toda a espessura da construção. Cada cela possuía duas janelas, uma voltada para o interior e outra para o exterior, de onde provinha toda e qualquer

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iluminação do ambiente. Todo o conjunto era cercado por pátios inscrevendo o edifício em um quadrado.


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12. Modelo de presídio panoptico conforme idealizado por Bentham;

13. Penitenciária Statesville, EUA

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B.

POSTE TELEGRÁFICO OU “ESPINHA DE PEIXE”

Este modelo possui circulação fechada principal e a ela se interligam os diversos módulos, separados entre si, confluindo os fluxos para a circulação. Foi utilizado a primeira vez em 1898, na prisão de Fresnes (Paris, FR). Possuía um corredor central ao qual se conectavam os pavilhões dispostos em paralelo. Já suas extremidades eram demarcadas pelo setor administrativo de um lado e capela do outro.

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14. Penitenciรกria do Estado.

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C. PAVILHONAR Unidades construídas em pavilhões isolados permitindo isolar núcleos de revoltosos, se necessário; contudo, possui a desvantagem de dificultar o acesso para manutenção e segurança dos pavilhões. Este surgiu vinculado ao regime de Auburn, em 1816. Na Prisão de Aubrun (Nova Iorque, EUA), apresentam-se pavilhões retangulares de vários andares dispostos lateralmente ao edifico administrativo.

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15. Casa de Detenção Carandiru.

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A partir de análises de projetos prisionais dos arquivos do DEPEN – Departamento Penitenciário Nacional – do Ministério da Justiça, pode-se observar uma uniformização da produção arquitetônica brasileira. Segundo Agostini, destacamse nos mais recentes projetos de presídios e penitenciárias, duas estratégias de organização do edifício prisional que contemplam a maioria das propostas realizadas no país. São elas: Pavilhões organizados ao redor de pátio descoberto

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Compreendem

um

módulo

externo

destinado

ao

setor administrativo e um ou mais módulos intramuros destinados aos detentos. Estes, compostos por um ou mais pavimentos, apresentam corredores de circulação voltados para um pátio interno, destinado ao banho de sol e convívio. Um mesmo complexo pode abrigar diversos pavilhões com regimes diferenciados e independentes entre si, dispostos paralelamente e conectados por uma rua interna cujo acesso é restrito a funcionários e agentes penitenciários. (AGOSTINI, 2002, p. 21)


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16. Projeto para o Centro de Reeducação de Governador Valadares, desenvolvido nos anos de 1994 e 1995 para abrigar uma penitenciária de regime fechado e semiaberto.

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B. Edifícios organizados a partir de pavilhões dispostos paralelamente Compreendem, da mesma forma, um módulo externo, restrito à administração, e diversos módulos intramuros destinados às atividades e permanência de presos. Estes módulos encontramse articulados por um grande corredor central. (AGOSTINI, 2002, p. 21)

17. Projeto desenvolvido DEPEN no

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para penitenciárias pelo próprio ano de 2000.


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3.3 CENÁRIOS ATUAIS Atualmente o Brasil ocupa o 4º lugar no ranking de maior população carcerária mundial. Antecedido apenas por Estados Unidos, China e Rússia, conforme tabela 1. Nos últimos 10 anos, a população carcerária no Brasil aumentou 160% (tabela 2), atingindo mais de meio milhão de presos em 2016. No entanto, o aumento do número de presos não foi seguido pelo aumento da capacidade prisional, que pode hospedar pouco mais da metade da população carcerária atual.

Tabela 1 Ranking da população carcerária por país, 2016. Fonte: Institute of Criminal Policy Research (www.icpr.org.uk/) e IBGE

Tabela 2 - População carcerária (5 primeiros colocados) entre 2000 e 2010. Fonte: Institute of Criminal Policy Research

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Nos cenários internacionais, podemos observar países como Holanda e Noruega que estão fechando suas prisões ou transformando-as em edificações de usos diversos, como hotéis por exemplo. Nos últimos anos, 19 prisões foram fechadas na Holanda devido ao decréscimo da população carcerária. Há 10 anos o país possuía uma das maiores populações carcerárias da Europa. Hoje a proporção é de 57 pessoas para cada 100 mil habitantes. Esse decréscimo significativo é dado devido aos programas de reabilitação social e pelas penas alternativas à prisão que foram adotadas em alguns casos, como trabalhos comunitários, multas e monitoramentos eletrônicos. Pelo mundo, é possivel encontrar modelos de arquitetura prisional sofisticados modelos, avançados no que se refere à relação entre espaço e usuário. Deve-se sempre ressaltar que o modelo arquitetônico de sucesso ainda precisa ser combinado às gestões públicas eficazes e programas de reabilitação social objetivando a redução da população carcerária e dos índices de reincidência. Como objetos arquitetônicos de interesse, foram selecionados alguns exemplos, apontados a seguir: 42


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A. LEOBEN

CENTER (ÁUSTRIA)

JUSTICE

Localizado na Áustria, o Leoben Justice Center destaca-se não só pela arquitetura como tambem pelos seus usos. O centro não é apenas um presídio para pessoas que cometeram crimes não violentos, mas também um complexo judicial de alto padrão. O programa inclui, tribunal de justiça, salas de apoio jurídico, salas de reuniões, biblioteca,

18. Leoben Judicial Complex, Áustria. Projeto do escritório Hohensinn Architektur.

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quadras poliesportivas, pista de cooper e academia de ginástica. Os prisioneiros podem transitar livremente entre as celas que possuem banheiros próprios e área de cozinha. A arquitetura, que difere das prisões convencionais, auxilia a aceitação do edifício pela sociedade local. 19. Área de convivência e execícios

em Leoben Judicial Complex, Áustria.

20. Celas em Leoben Judicial Complex, Áustria.

21. Hall de entrada, Leoben Judicial Complex, Áustria.

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B. HALDEN (NORUEGA)

PRISION

Localizada na Noruega, a Halden Prision também possui uma arquitetura diferenciada, além de ser tida como uma das prisões mais humanas do mundo. Essa, coloca em xeque a real intenção do objetivo da prisão, se é a punição ou a reabilitação, buscando encontrar um equilíbrio entre ambos. No quesito “reabilitação”, a prisão norueguesa investiu altas quantias

22. Halden Prision.

24. Halden Prision, Noruega

23. Estúdio de música, Halden Prision.

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para formar um acervo de arte além das oficinas que ocupam e reabilitam os presos. Quanto ao quesito “punição”, a arquitetura reflete a intenção. Ou seja, dependendo do nível de segurança, as fachadas se alternam, dos blocos bem escuros até chegar ao vidro e madeira rustica. Sendo assim, conforme o preso vai se reabilitando e conquistando a liberdade, vai ocupando alas mais confortáveis e de fachadas mais agradáveis. 46

25. Fachadas de diferentes materialidades em Halden Prision, Noruega


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Os quartos são individuais, com televisão e possuem banheiros próprios. Cada 10 celas dividem uma cozinha e uma sala de estar. Há quadra de basquete, pista de cooper, parede para escalada e campo de futebol. Além de estúdio de música equipado com aparelhos profissionais. O grupo de agentes penitenciários é composto por 50% de mulheres, pois conforme a filosofia da Halden, acredita-se que isso reduza a tensão com os detentos. Seu papel é motivar os presos para que eles sejam educados e reabilitados. Além disso, os agentes conduzem atividades esportivas das 8h às 20h, jogam e fazem as refeições junto dos presos. São necessários 2 anos de treinamento para se tornar um agente penitenciário na Noruega. Os presos recebem ainda aulas de desenho e gastronomia que os auxiliam a sair de lá mais preparados para a reinserção social.

26. Cela em Halden Prision, Noruega

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27. APAC Santa Luzia, MG


4. APAC


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A APAC - Associação de Proteção e Assistência ao Condenado, surgiu em 1972 na cidade de São José dos Campos, SP. Idealizada pelo Dr. Mário Ottoboni – advogado e formado em ciências sociais e psicológicas – tentava criar uma nova forma de gerenciar e prestar serviços aos condenados de forma a os auxiliar sua inclusão social. A concepção surgiu a partir de serviços voluntários prestados a essa população excluída/marginalizada socialmente, que intensificaram as inquietudes e indignações na forma como o preso era tratado física e psicologicamente dentro de uma arquitetura punitiva. A sigla da instituição inicialmente significava “Amando o Próximo Amarás Cristo - APAC”, o que sintetizava a intenção de reabilitar social e moralmente essa parcela da população. Com o passar dos anos, o modelo foi se estruturando e ganhando notoriedade. Em 1974, a equipe que constituía a Pastoral Penitenciária notou que somente uma entidade juridicamente organizada conseguiria prestar efetivamente tal serviço social. Foi então que institui a APAC como conhecida hoje. Uma entidade civil com personalidade jurídica própria, dedicada à recuperação e reintegração social da população condenada a penas de privação de liberdade. 50


ISABELLA O. A . DE SOUZA 28. Logo APAC

A principal diferença entre o método da APAC e do sistema prisional convencional é que o próprio preso – tratado como recuperando5 - é o responsável por sua reabilitação. Além disso, é prestada assistência espiritual, médica, psicológica e jurídica, por meio de ONG’s e voluntários da própria comunidade onde está inserida, sem a presença de policiais e/ ou agentes penitenciários, fator que contribui para a diminuição da corrupção dentro do atual sistema correcional brasileiro. Contudo, são sempre filiadas à FBAC - Fraternidade Brasileira de Assistência aos Condenados - associação civil de direito privado sem fins lucrativos, cujo objetivo é assessorar e manter as unidades dentro dos propósitos da associação. Sua missão é orientar, zelar e fiscalizar a correta aplicação da metodologia e ministrar cursos e treinamentos para recuperandos, voluntários, funcionários, e autoridades, de 5 A partir do presente momento abolirei certos termos como "presos", "cárcere", "celas", "presídios", etc. para se referir às APAC's e seus usuários, tendo em vista que estes não são os mais adequados quando nos referimos à este tipo de instituição uma vez contextualizada sua missão, objetivo e ideologia. Apenas utilizarei termos que acredito dialogarem adequadamente com esses preceitos.

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modo a consolidar as APAC’s e contribuir para a expansão da entidade. Filiada à PFI - Prison Fellowship International, organização consultora da ONU para assuntos penitenciários, que divulga a proposta de adoção do método APAC a nível mundial. O objetivo da APAC é gerar a humanização das prisões, embora não abandone a finalidade punitiva da pena. Sua principal intenção é conseguir recuperar e reintegrar socialmente o apenado diminuindo assim os altos índices de reincidência. Conforme indicado anteriormente, o índice de reincidência da APAC é expressivamente menor do que o da prisão comum, fator esse que comprova, a princípio, a eficiência do sistema. Além disso, contribui para a redução de custos para o Estado, não só o que respeita os gastos reais para manter esse indivíduo encarcerado, bem como com a sociedade, ao devolver um cidadão tecnicamente qualificado e contribuinte ainda em idade economicamente ativa.

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Atualmente, são cerca de 50 APAC’s em funcionamento nos estados do Espirito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul. Estimase dobrar esse número até 2025, pois estão em processo de implantação 51 novas unidades distribuídas pelo país.

29. Mapa do Brasil com estado que possuem APAC demarcados em azul. Autoria própria

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Esses centros de reabilitação são de pequeno porte, com capacidade entre 80 à 180 recuperandos, buscando atender o indivíduo em unidade próxima à cidade natal ou onde reside sua família, fator este de suma importância no processo de recuperação.

30. APAC São João Del Rei

A proposta de modelo arquitetônico é bem diferente daquele proposto pelo sistema convencional uma vez que valoriza o indivíduo encarcerado. O programa de necessidades varia de unidade para unidade, mas no geral pode ser analisado e dividido em quatro setores: administrativo, alojamentos, apoio (educação, médico e espiritual) e lazer. O setor de lazer é basicamente voltado à prática de esportes, o que auxilia no desenvolvimento do trabalho em equipe e motiva relações humanas. 54


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Essas unidades podem trabalhar com os três regimes – fechado, semi-aberto e aberto – porém não há uma regra. Depende do projeto e local onde está inserido. Outro favor diferencial é o fato de cada projeto ser fruto de uma análise prévia do local onde será implantado, levando em consideração a população, geografia e fatores climáticos locais, buscando gerar um modelo arquitetônico de interesse.

31. Quadra em unidade de correcional.

Urbanisticamente, o modelo APAC pode ser visto como um presídio inclusivo, pois diferente do convencional, o objeto arquitetônico conversa com a cidade e seu entorno imediato, estuda caso a caso onde será implantada cada unidade e convida a sociedade a fazer parte do projeto, provendo assim a relação recuperando e sociedade. 32. APAC Itaúna, MG

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4.1 APAC ITAÚNA - MG A unidade localizada em Itaúnas, Minas Gerais, é tida como APAC modelo. Possui os três regimes – fechado, semiaberto e aberto – além de ala feminina. Como diferencial, comporta berço em suas celas que são extremamente generosas. Possui vasto terreno distribuído entre jardins, áreas de lazer e edifícios que compreendem as oficinas, os três regimes e administração. Compõe seu programa biblioteca, salas de aula, capela, quadras, cozinha e alas de laborterapia. No semiaberto onde, de acordo com a metodologia, é voltado para profissionalização do recuperando encontram-se oficinas. Esta possui parceria com empresa do setor privado que envia uma parte do processo de fabricação de seus produtos para ser produzido internamente e posteriormente comercializado. A mesma permite também que alguns usuários possam trabalhar na própria empresa ao cumprir sua sentença. Além disso, seus usuários também trabalham com horticultura e na criação de animais - para reprodução e comercialização da carne - como suínos e aves. A FBAC possui sede localizada ao lado da ala feminina na instituição, fator que gera a proximidade dos agentes e recuperandos. Dessa forma, facilita o acompanhamento das demandas por mudanças no método apaqueano. 56


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33. APAC Itaúna, MG

34. APAC Itaúna, MG

35. APAC Itaúna, MG

36. APAC Itaúna, MG

37. APAC Itaúna, MG

38. APAC Itaúna, MG

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4.2 APAC ITUIUTABA - MG A unidade de Ituiutaba é também conhecida como “APAC da transparência” pois não possui muros. Uma cerca baixa limita o terreno, sem impedir a “fuga” de nenhum recuperando. O objetivo desse modelo é condicionar o indivíduo a ficar retido pela própria consciência. O processo de reeducação, neste nível, envolve a confiança e responsabilidade pelos seus atos. Esta APAC possui apenas os regimes semiaberto e aberto, diferenciando-se das demais por ter sido construída pelos próprios “apaqueanos”. Construída em 2008, situa-se no centro da cidade e por conta da pouca verba atende apenas cerca de 61 recuperandos (21 cumprindo regime aberto e 40 em semiaberto). Esses indivíduos cumprem serviços à comunidade e são instruídos por meio de trabalho e aulas (das 8h às 18h durante a semana). Esta possui também parceria com empresa do setor privado que envia parte do processo de fabricação de seus produtos para ser produzido internamente e posteriormente comercializado. Já nos finais de semana, cumprem prisão domiciliar pois neste sistema a família é tida como fator de suma importância no processo de reeducação. 58


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39. APAC Ituiutaba, MG

40. APAC Ituiutaba, MG

41. APAC Ituiutaba, MG

42. APAC Ituiutaba, MG

43. APAC Ituiutaba, MG

44. APAC Ituiutaba, MG

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4.3 APAC SANTA LUZIA - MG Construída em 2011 e projetada pelo escritório mineiro MAB Arquitetura e Urbanismo, reflete a grande pesquisa do arquiteto Flávio Agostini na arquitetura prisional. Fruto de parcerias entre APAC, Ministério da Justiça, Prefeitura e comunidade de Santa Luzia, irmãos Maristas e PUC Minas, a unidade é tida como a primeira proposição arquitetônica específica para uma APAC. Na tentativa de quebrar com as falhas e deficiências desse tipo de arquitetura o projeto realizado demonstra claramente a preocupação da aproximação autor e usuário em cada um dos seus setores. A edificação é implantada em um terreno de 42.000m² distantes apenas 3km da região metropolitana em expansão. Essa unidade dispõe dos três regimes: aberto, semiaberto e aberto, abrigando 200 internos (120 em regime fechado e 80 no semiaberto). Dentre seus 6.700m² construídos, conta com galpão de apoio para as famílias, administração, lojas, áreas de convivência, além dos setores de alojamento. A topografia do terreno foi tida como importante elemento para o projeto. Dessa forma, foram projetados terraços escalonados cujo objetivo é permitir a contemplação da paisagem local, impedindo, porém, o contato direto com o exterior. 60


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42. APAC Santa Luzia, MG

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43. APAC Santa Luzia, MG 44. APAC Santa Luzia, MG 45. APAC Santa Luzia, MG

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46. APAC Santa Luzia, MG

47. APAC Santa Luzia, MG

48. APAC Santa Luzia, MG

49. APAC Santa Luzia, MG

50. APAC Santa Luzia, MG

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51. Renderização da Proposta APAC Tietê


5. APAC TIETÊ - O PROOJETO


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5. APAC TIETÊ - O PROJETO 5.1 INSERÇÃO URBANA Tratando-se de um trabalho propositivo, o objetivo final deste TFG é apresentar um centro de Reabilitação Sócio Educativo, a APAC Tietê. A inserção urbana da APAC é de suma importância para esse tipo de propósito. Primeiro, pelo fato de trazer de volta essa Associação para dentro da cidade de São Paulo, haja visto a relevância do papel que cumpre junto à população carcerária. Analisando em âmbito do bairro – o Bom Retiro – temos uma região com quadras e fluxos que refletem a sua formação e reminiscência industrial de grandes lotes, usos descontínuos e sistema viário interrompido. O presente projeto, além de buscar atender as necessidades de uma instituição de caráter sócio educativo para cumprimento de penas, também pretende trazer para a região do Bom Retiro benefícios como um instrumento público de apoio para a população local. Sua implantação retoma e valoriza o passeio público urbano, por meio de calçadas generosas, fluidez de transposição de quadra e, principalmente, o redesenho de uma praça pública - antes abandonado – qual, ao ser incorporada ao projeto onde torna-se o coração do mesmo. Os 66


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usos mistos da nova APAC podem beneficiar a região uma vez que oferece biblioteca, comercio, auditório, exposições e posto de saúde. Dessa maneira, transforma a quadra e convida a população a participar do processo de reinserção social do indivíduo infrator, os ajudando a quebrar as os imensos tabus que cercam o tema.

52. Mapa do município de São Paulo mostrando o recorte da área de estudo - Bom Retiro. Autoria própria.

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53.

Mapa

representando

os

pontos

notĂĄveis da regiĂŁo estudada. Autoria prĂłpria a partir de bases do Google Earth



54.

Montagem

do

projeto aplicado no terreno Autoria partir

escolhido.

prรณpria

de

bases

Google Earth

a

do



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5.2 O PARTIDO A APAC Tietê é uma resposta possível a um problema de arquitetura o da arquitetura prisional - que como se apresenta hoje no Brasil, a abordagem econcontra-se falida. Por outro lado, as APAC’s são parte de um sistema aberto e inclusivo que, entre outras vantagens, permite romper barreiras espaciais em relação aos locais em que são implantados e sociedade. O partido projetual é, portanto, a criação de um conjunto arquitetônico que, por um lado, possa atender um determinado grupo de indivíduos infratores em vias de recuperação e, por outro, seja suficientemente atrativo para que

a sociedade - principalemnte vizinhança - sinta-se chamada a usufruir do equipamento e participar do processo. Para tal, adota-se a combinação de módulos mínimos funcionais, que uma vez aglomerados em diferentes níveis de agregação, constituem principio ordenador e hierárquico da proposta. A cela é tomada como o modulo mínimo funcional. Como a “célula monolítica” de Le Corbusier, o modelo é projetad a partir das dimensições humanas, podendo comportar até quatro usuários. Considerando a associação de duas unidades mínimas obtem-se um módulo agregado que passa a ser repetido e associado em diversos níveis de agregação. Com essa 72


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55. Partido “celula” habitacional

diretriz projetual, os elementos repetitivos assumem diferentes funções nos pavimentos: celas, consultórios médicos e odontológicos, salas administrativas, salas de aulas. Já os espaços aglutinadores são aqueles que tendem a ser “catalisadores”, ou seja, de uso coletivo, como salas de visita e descanso, salas 73


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56.

Perspectiva

explodida do partido da proposta em malhas de diferentes níveis

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de socialização.


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de TV, copa, refeitório, exposições, recepção, entre outros. O projeto da APAC Tietê foi concebido por meio de malhas de diferentes níveis de socialização, com o objetivo de tecer gradativamente as relações entre sociedade e condenado. A tentativa de devolver o indivíduo preparado e reeducado para a sociedade constitue-se em um gesto ambivalente, ou seja, tambem a sociedade se reeduca e “humaniza”. São três, os níveis de socialização, refletidos no gabarito da edificação, uma vez que as malhas são sobrepostas. O primeiro nível é o mais alto e privativo, onde organizam-se as celas, salas de visitas, salas de TV e por isso o uso limita-se aos recuperandos e agentes penitenciários. O segundo nível é de caráter semi público, onde localizam-se consultórios médicos, odontológicos, sala de vacinação, assistência jurídica e psicológica e na ala educacional, a parte de salas de aula, oficinas e salas teóricas. Por último, o terceiro nível situa-se na mesma cota da “cidade”, de caráter público. Nele há quadra poliesportiva, área de exposições, auditório, biblioteca, lojas (comercializa os produtos do próprio presídio), administração e, principalmente, a praça pública – o coração do projeto. A praça será o palco onde podem acontecer as maiores interações e trocas entre a sociedade, que participa do projeto e o indivíduo encarcerado. 75


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5.3 PROPOSTA APLICADA A comparação entre a proposta da nova APAC Tietê e o modelo de arquitetura prisional tradicional permite observar alguns pontos de ruptura:

A. O PROJETO COMO PARTE INTEGRANTE DA CIDADE Enquanto o modelo de penitenciária tradicional é caracterizado pelo isolamento, a APAC busca a integração com os centros urbanos. Dessa forma, a disciplina que antes era obtida pela punição - representada pela separação física do condenado em relação ao entorno externo e a tudo que o levou e motivou cometer essa infração - por um tratamento psicológico e educativo que valoriza o indivíduo e o auxilia a tratar de resolver o elemento motivador da infração, seja através do autoconhecimento, instrução, capacitação e proximidade da família e sociedade. O sistema prisional tradicional, que 76


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é isolado, por meio de barreiras urbanas como dupla disposição de muros com sete metros de altura e recuos de vinte metros dá lugar à uma nova arquitetura com implantação convidativa, integrante à malha urbana e de fácil transposição. O sistema APAC facilita o contato visual do bairro para evitar que o condenado fique alienado (tempo e espaço). Além disso, o contato vai além do visual, construidores por meio das novas relações humanas que lhe são permitidos, ou melhor, recomendados. A interiorização radical, o hermetismo, o isolamento impossibilitam o contato entre instituição e comunidade aumentando o estigma e as dificuldades de reinserção social do preso. A APAC dá lugar à uma nova arquitetura, onde a organização do edifício prisional possibilita a criação de áreas públicas, de lazer, 77


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esporte e encontro, de modo a promover uma maior interação entre comunidade e instituição. O projeto para uma nova APAC (Tietê) propõe uma extensão da infraestrutura física da instituição para o exterior, oferecendo à comunidade novos espaços de reunião, assistência à saúde, cursos e demais atividades. O antigo confinamento como princípio de organização do espaço, claustrofóbico, o isolamento do olhar, a arquitetura punitiva, dá lugar à uma arquitetura que pulveriza a clausura do pátio central e o transforma em praça pública, em espaços de usos coletivos e coomunitários espalhados ao longo do projeto.

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58. Renderização da proposta APAC Tietê


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B.

MODULO MÍNIMO HABITACIONAL

Analisando o núcleo das celas, pensando no sistema panoptico são tidas como elemento de controle das ações individuais pela subtração material. A redução a estruturas mínimas de sobrevivência, facilidade de inspeção, simplificação radial dos espaços cotidianos em função do controle visual e exposição do preso - a “varredura do olhar”. O sistema APAC propõe uma nova complexidade para o núcleo da cela em oposição a sua redução a aparatos mínimos, que atendem exclusivamente a opção pelo controle exaustivo. Assim é reconstruída a individualidade humana e passa-se princípios aos usuários, por poderem utilizar um banheiro particular, suas próprias roupas e não ser chamado ou tido apenas como um número e sim como um indivíduo.

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59. Renderização da proposta APAC Tietê.


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C.

DESPERSONIFICAÇÃO DO PODER

Outro elemento ainda presente na arquitetura prisional tradicional é a despersonificação do poder, a vigilância interrupta coibindo falhas de comportamento e ameaças de resistência. Esse sistema encontra-se comprovadamente falido, uma vez que é fácil corromper os agentes penitenciários. Ao mesmo tempo que afirma a superioridade do funcionário em relação ao preso, o sistema permite escondê-lo e protegê-lo do indivíduo encarcerado. Por outro lado, o agente penitenciário vê-se estressado e exausto. Já no sistema APAC, a instituição é gerida e mantida por membros da sociedade voluntariados, ONG’s e os próprios presos que trabalham em conjunto e diminuem assim as probabilidades de o sistema ser corrompido. 82


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A arquitetura prisional tradicional era exclusivamente utilizada como instrumento de controle e castigo, ao isolar e retirar a capacidade de ação individual do preso, garantindo o total afastamento entre presos e funcionários. A despersonificação do poder adota a passividade como bom comportamento. Esse princípio é invertido conceitualmente pelo sistema APAC, ao descobrir que a arquitetura pode sim garantir a valorização das individualidades, e não apenas impedir todas as ações dos presos. A segurança emerge do convívio entre presos e voluntários. Assim, tanto a população local é valorizada como também os “recuperandos”, ao ter reinseridos socialmente e “reeducados” através de novas relações humanas, trabalho em equipe, auxílio médico-psicológico e disciplina adquirida por meio do trabalho e educação.

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D. IDENTIDADE VISUAL O presente projeto pretende quebrar o tabú que gira entorno ao tema “presídio”. O objeto proposto possui uma preocupação estética cuja intensão é desconstruir a ideia do edifício murado, cinza e opressor, criando uma arquitetura de interesse com elementos diversificados, “amigável” e convidativa. Sua materialidade é composta por vidro, concreto acabado e elementos vazados que auxiliam também na proteção solar. Além disso, brinda a praça pública arborizada que traz maior conforto e disponibiliza espaços agradáveis para o “Bom Retiro”, contribuindo inclusive para ressignificar o nome do bairro. 60. Renderização da proposta APAC Tietê

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6. CONSIDERAÇÕES FINAIS


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O estudo propositivo sobre arquitetura prisional possibilitou o entendimento de premissas de concepção desse tipo de ambiente construído. A compreensão dos objetivos e limites tipológicos vinculados ao tema podem representar o ponto de partida para a proposição de novas estratégias projetuais, à medida que for sendo estabelecida uma relação mais precisa entre as alternativas arquitetônicas mais recentes e o quadro falimentar de nossas instituições. Os índices de reincidência e baixos custos desse tipo de arquitetura refletem uma nova postura, de investimento na capacidade de cada detento em assumir responsabilidades e ações construtivas ao longo de seu período de reclusão. São também a prova cabal de que qualquer tentativa de controle associado ao comportamento dos presos não pode ser promovida apenas pela idealização de um espaço disciplinador, exaustivo e opressor. De um modo geral, o problema da uniformização da produção arquitetônica prisional brasileira reside em três fatores: o descaso social, a falta de investimento público e o distanciamento profissional (referente aos arquitetos). A observação de diversas tipologias existentes e políticas aplicadas, tanto no Brasil quanto 104


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no mundo, conduz ao entendimento de que a arquitetura sozinha não é suficiente para reeducar e reinserir um indivíduo nos moldes considerados “normais” pela sociedade. Faz-se necessário a discussão e implantação de políticas voltadas ao problema sob a ótica clínica (não “criminal”), do auxílio médico e psicológico, investimentos no setor e na educação, além de uma revisão na concepção desse tipo de arquitetura, para assim diminuir o distanciamento entre autor do projeto, usuário e sociedade. Os estudos buscaram mostrar que de fato começaram a surgir respostas arquitetônicas interessantes, que repensam esse tipo de ambiente e demonstram maior atenção no indivíduo usuário. Alguns deles conseguiram quebrar o paradigma da estética opressora dos presídios - fator que ajuda na aceitação e aproximação da sociedade. Para mais, também foi evidenciado que os diversos autores possuem visão parcial sobre o problema, o que justifica o fato de não terem encontrado uma resposta mais abrangente. Ainda, aqueles poucos que possuem uma visão mais abrangente do problema, percebem que a arquitetura, de forma isolada, não é capaz de produzir sozinha a resposta desejada. Sendo assim, a tentativa de observar os diversos fatores (sociais, econômicos, políticos, culturais) como parte integrante do mesmo problema, contribuiu para a confecção de um programa de forma a torná-lo acessível a todos. 105


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As atividades de projeto (AT2) permitiram experimentar e aplicar em um projeto, todo o conhecimento que obtive com essa pesquisa. A partir das respostas que atualmente estamos produzindo e juntamente às propostas que temos aplicadas pelo mundo, proponho a APAC Tietê, como um modelo de ruptura da arquitetura engessada e vazia que ainda é produzida em grande maioria. Desde o projeto da unidade habitacional celular – que valoriza o indivíduo e suas individualidades – até o projeto arquitetônico como um todo e parte integrante da cidade. O aprofundamento das questões relativas à fundamentação e à crítica (AT3) conseguiram criar um ambiente onde os alunos puderam argumentar e trocar ideias coletivamente, bem como tirar dúvidas sobre os diversos temas e preocupações. Neste caso, foi essencial para construir uma visão crítica sobre as respostas arquitetônicas produzidas atualmente e embasar o partido arquitetônico adotado para o projeto da APAC Tietê. A experimentação de elementos específicos do projeto realizada no âmbito das atividades (AT4) possibilitou a produção de uma arquitetura mais completa abrangendo, além das pesquisas gerais sobre o tema, 106


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pesquisas no âmbito do conforto acústico, térmico e estudos de insolação. Nesse sentido, e dada as limitações de um TFG, o desafio que se apresenta é o de pensar novas abordagens ou formas de enfrentar problemas relacionados à reformulação da arquitetura prisional sem ultrapassar a linha tênue da problemática que deve envolver, no âmbito profissional, especialistas em outros campos disciplinares. Espera-se que o estudo da humanização arquitetônica voltada à ressocialização social e a proposta arquitetônica de um novo modelo prisional, no caso a APAC Tietê, possam motivar novas pesquisas e propostas, sejam elas no campo acadêmico, sejam no campo profissional alimentando assim a esperança de um futuro melhor.

“A autoridade, por um lado, e o arquiteto, por outro, têm que saber se as prisões devem ser combinadas no sentido da suavização das penas ou num sistema de regeneração dos culpados, e em conformidade com uma legislação que, remontando à origem dos vícios do povo, se torna um princípio regenerador das virtudes que este deve praticar.” (L. Baltard, 1829)

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EPÍLOGO ?


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Em meio aos devaneios de uma aula vespertina de Teoria da Arquitetura 1, escuto pela primeira vez sobre um tipo de arquitetura da vigilância – intitulada panoptico. Essa, capaz de prender pela mente, reprimir pelo espaço construído, causar sensações de extremo incomodo por uma vigilância que era apenas uma possibilidade e não uma certeza e isso tudo através de um modelo arquitetônico. A partir daquele momento, a voz do professor de TA ficou em um segundo plano enquanto meus pensamentos eram dominados por uma quantidade exorbitante de pensamentos e angústias que se passavam na minha cabeça. Muitos dizem que não sabem ao certo quando a arquitetura “chega” em você, uns dizem que é antes de entrar na faculdade, outros quando entram ou se graduam, mas para mim, sem dúvidas, foi naquele momento. Ali aprendi a importância do ofício que tinha escolhido e a responsabilidade perante o meu trabalho; o quanto eu poderia influenciar na vida de uma pessoa e principalmente causar sensações - fator tido como intangível teoricamente. Nos anos que sucederam essa aula, tentei absorver ao máximo toda a teoria que meus mestres me passavam. Tive a oportunidade de debater e conviver com 109


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grandes profissionais e pessoas excepcionais, até alguns que infelizmente não estão mais conosco mas tenho carinho e “orgulho” de possuir algum croqui feito em aula. Foi então que chegou o último ano - o tão temido e aguardado TFG - o derradeiro. Enquanto muitos demonstravam aquela angustia pela dúvida do tema a ser escolhida eu possuía uma certeza; eu encerraria esse ciclo da forma como comecei, por aquela aula de Teoria da Arquitetura. Para a maioria era tido como um erro ou perda de tempo falar sobre arquitetura prisional; alguns até tentaram me dissuadir mas acredito que apenas aumentou a minha curiosidade e engajamento pelo tema. Em minha cabeça era tão absurdo um espaço ser opressor e discriminatório, independente do motivo que levou aquela pessoa a estar lá. Quanto mais eu pesquisava sobre o tema - para aprender e me munir da teoria necessária para convencer meus professores - mais inquieta eu me tornava. Enxerguei a realidade do problema desse tipo de arquitetura que se tornou ao longo dos anos um modelo pronto a ser replicado, distante, vazio, cujo único objetivo era ser apenas seguro e salubre. Minha maior frustração era ver que profissionais, assim como eu me tornaria, abandonaram a talvez maior premissa 110


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de qualquer arquitetura; a de que construímos espaços para pessoas. O resultado da pesquisa a princípio era incerto, porém revelou-se ser esperançoso. Em meio à tantos episódios de massacres, corrupção, sistema carcerário superlotado, arquiteturas opressoras, celas comparadas à jaulas, muros que segregavam os presos – ou a sociedade dependendo do ponto de vista – descobri que pessoas assim como eu notaram o mesmo problema. Existia sim uma luz no fim do túnel! Contudo não posso afirmar que o modelo APAC é de fato solução. Elas ainda não são adequadas a todos os crimes e adquiriu uma arquitetura, digamos própria, apenas a partir da unidade de Santa Luzia. De qualquer forma, os resultados são muito encorajadores e promissores. Acredito que o modelo arquitetônico de sucesso nesse caso, é aquele que valoriza o indivíduo encarcerado e acredita na possibilidade reabilitação. Infelizmente a arquitetura não é suficiente para resolver todos os problemas, como gostaríamos, mas é nosso dever como arquitetos projetar pensando no indivíduo usuário e não apenas no ato de construir. 111


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“Devemos ainda nos admirar que a prisão se pareça com as fábricas, com as escolas, com os quartéis, com os hospitais, e todos se pareçam com as prisões?” (FOUCAULT, 1987, P.250) O maior medo que tenho em relação a arquitetura é o da uniformização, assim como ocorre com a arquitetura prisional brasileira atualmente, que seja esquecido o real propósito de se projetar – projetar para o outro - ou ainda o impacto que pode causar no usuário. Pior do que isso, é pensar que estão cientes desse impacto e considerem-se no direito de utiliza-lo como arma de controle. Arquitetura não deveria ser isso! Em suma, tenho esperança quanto a arquitetura prisional brasileira. Não, em um futuro próximo ainda, porem algo a ser conquistado à longo prazo. Assim como a Holanda que possuía elevado índice populacional carcerário e em dez anos conseguiu reduzir a ponto de ter que fechar seus presídios, por que não podemos ser os próximos? Para isso, além da arquitetura, é necessário muito investimento 112


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em educação, saúde, moradia – fatores reais de melhoria da mentalidade da população e talvez a redução de motivos que levariam as pessoas a cometerem tais crimes. O presente trabalho me trouxe grande satisfação, não só pelo fato da conclusão de um ciclo e vitória de um obstáculo, mas sim por trazer ao âmbito acadêmico tal discussão. Vejo novos alunos chegando ao TFG com a mesma vontade de pesquisar sobre o tema, cada um com a sua devida motivação, mas todos discutindo, fator que só reafirma minha esperança! Fim.

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7. BIBLIOGRAFIA


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edição. São Paulo: Atlas, 2003. OTTOBONI, Mário. Vamos matar o criminoso? método APAC. São Paulo: Paulinas, 2001 PEREIRA, José Ramón Alonso. Introdução à História da Arquitetura. Das origens ao século XXI. Porto Alegre; Bookman, 2010. ISBN 978-85-7780-576-1 Projeto APAC Santa Luzia. Disponível em: http://m3arquitetura.com.br/category/ institucionais/apac-santa-luzia/ Acesso em 29.10.2015 SUN, Érika Wen Yih. Arquitetura prisional e os direitos sociais no sistema penitenciário. Revista de estética e semiótica, Brasília, V. 3, N. 1 P. 42-61 JAN./JUN. 2013. VARELLA, Drauzio. Estação Carandiru. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. VIANA, Lídia Quièto. A contribuição da arquitetura na concepção de edificações 119


HUMANIZAÇÃO DA ARQUITETURA PRISIONAL EM PROL DA REABILITAÇÃO SOCIAL

penais no Rio de Janeiro. Dissertação de mestrado da escola de arquitetura e urbanismo da UFRJ. Março de 2009. VINNITSKAYA, Irina. Halden Prison / Erik Møller Arkitekter + HLM arkitektur - The Most Humane Prison in the World. Disponível em: http://www.archdaily.com/154665/ halden-prison-erik-moller-arkitekter-the-most-humane-prison-in-the-world WALMSLEY, Roy. World Prision Population List. ICPR, 2016.

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ÍNDICE DE IMAGENS Índice

de Imagens

1. Imagem Ilustrativa - FONTE: https://alcademiraelentedeaumento.files.wordpress.com/2011/09/dsc_1298.jpg 12 2. Imagem ilustrativa - FONTE: https://canalcienciascriminais.com.br/a-funcionalizacao-do-direito-penal-a-partir-decriterios-de-politica-criminal/ 19 2. Halden Prision (Noruega)- FONTE: www.pintirest.com/ 20 4. Presídio em Isla de la Juventud, Cuba. (1926)- FONTE: www.pintirest.com/ 24 5. Ilustração prisão panoptica - FONTE: http://kurtmmf1.blogspot.com.br/2010/10/panorama.html 25 6. Recorte de noticia publicada no jornal Folha de S. Paulo - https://alcademiraelentedeaumento.wordpress.com/ 27 7. Carandiru, SP. - https://alcademiraelentedeaumento.wordpress.com/ 28 8. Recorte de jornal com a proposta do Carandiru publicado no jornal Folha de S. Paulo. - https://alcademiraelentedeaumento. wordpress.com/ 28 9. Carandiru desativado. - https://alcademiraelentedeaumento.wordpress.com/ 29 10. Protesto realizado por detentos do Carandiru.- FONTE: www.pintirest.com/ 30 11. Parque da Juventude, SP. - FONTE: http://parquedajuventude.sp.gov.br/ 31 12. Modelo de presídio panoptico conforme idealizado por Bentham; - FONTE: http://www.secretvictorianist.com/2015_05_01_ archive.html 33 13. Penitenciária Statesville, EUA - FONTE: http://www.varoid.com/2016/10/the-15-most-horrific-asylum-experiments.html 33 14. Penitenciária do Estado. - FONTE: http://aevpsp.com.br/blog/memoria/historia-do-sistema-penitenciario-paulista/ 35 15. Casa de Detenção Carandiru. 37 16. Projeto para o Centro de Reeducação de Governador Valadares, desenvolvido nos anos de 1994 e 1995 para abrigar uma penitenciária de regime fechado e semiaberto. - Agostini, 2002. 39 17. Projeto para penitenciárias desenvolvido pelo próprio DEPEN no ano de 2000. - FONTE: Agostini, 2002. 40 Tabela 1 - Ranking da população carcerária por país, 2016. 41 Fonte: Institute of Criminal Policy Research (www.icpr.org.uk/) e IBGE 41 Tabela 2 - População carcerária (5 primeiros colocados) entre 2000 e 2010. Fonte: Institute of Criminal Policy Research 41 18. Leoben Judicial Complex, Áustria. Projeto do escritório Hohensinn Architektur. - FONTE: http://www.hohensinnarchitektur.at/justizzentrum-leoben_en.php 43 19. Área de convivência e execícios em Leoben Judicial Complex, Áustria. - FONTE: http://www.hohensinn-architektur.at/ justizzentrum-leoben_en.php 44

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20. Celas em Leoben Judicial Complex, Áustria. - FONTE: http://www.hohensinn-architektur.at/justizzentrum-leoben_en.php 44 21. Hall de entrada, Leoben Judicial Complex, Áustria. - FONTE: http://www.hohensinn-architektur.at/justizzentrumleoben_en.php 44 22. Halden Prision. 45 24. Halden Prision, Noruega 45 23. Estúdio de música, Halden Prision. 45 25. Fachadas de diferentes materialidades em Halden Prision, Noruega 46 26. Cela em Halden Prision, Noruega 47 27. APAC Santa Luzia, MG 48 28. Logo APAC 51 29. Mapa do Brasil com estado que possuem APAC demarcados em azul. Autoria própria 53 30. APAC São João Del Rei 54 31. Quadra em unidade de correcional. 55 32. APAC Itaúna, MG - FONTE: http://www.apacitauna.com.br/ 55 33. APAC Itaúna, MG - FONTE: http://www.apacitauna.com.br/ 57 36. APAC Itaúna, MG - FONTE: http://www.apacitauna.com.br/ 57 34. APAC Itaúna, MG - FONTE: http://www.apacitauna.com.br/ 57 37. APAC Itaúna, MG - FONTE: http://www.apacitauna.com.br/ 57 35. APAC Itaúna, MG - FONTE: http://www.apacitauna.com.br/ 57 38. APAC Itaúna, MG - FONTE: http://www.apacitauna.com.br/ 57 39. APAC Ituiutaba, MG - FONTE: https://www.facebook.com/APAC-Ituiutaba-431922696833809/ 59 42. APAC Ituiutaba, MG - FONTE: https://www.facebook.com/APAC-Ituiutaba-431922696833809/ 59 40. APAC Ituiutaba, MG - FONTE: https://www.facebook.com/APAC-Ituiutaba-431922696833809/ 59 43. APAC Ituiutaba, MG - FONTE: https://www.facebook.com/APAC-Ituiutaba-431922696833809/ 59 41. APAC Ituiutaba, MG - FONTE: https://www.facebook.com/APAC-Ituiutaba-431922696833809/ 59 44. APAC Ituiutaba, MG - FONTE: https://www.facebook.com/APAC-Ituiutaba-431922696833809/ 59 42. APAC Santa Luzia, MG - FONTE: https://m3arquitetura.com.br/midia/ 61 43. APAC Santa Luzia, MG - FONTE: https://m3arquitetura.com.br/midia/ 62 44. APAC Santa Luzia, MG - FONTE: https://m3arquitetura.com.br/midia/ 62 45. APAC Santa Luzia, MG - FONTE: https://m3arquitetura.com.br/midia/ 62 46. APAC Santa Luzia, MG - FONTE: https://m3arquitetura.com.br/midia/ 63

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48. APAC Santa Luzia, MG - FONTE: https://m3arquitetura.com.br/midia/ 47. APAC Santa Luzia, MG - FONTE: https://m3arquitetura.com.br/midia/ 49. APAC Santa Luzia, MG - FONTE: https://m3arquitetura.com.br/midia/ 50. APAC Santa Luzia, MG - FONTE: https://m3arquitetura.com.br/midia/ 51. Renderização da Proposta APAC Tietê - FONTE: Própria 52. Mapa do município de São Paulo mostrando o recorte da área de estudo - Bom Retiro. Autoria própria. 53. Mapa representando os pontos notáveis da região estudada. Autoria própria a partir de bases do Google Earth 54. Montagem do projeto aplicado no terreno escolhido. Autoria própria a partir de bases do Google Earth 55. Partido “celula” habitacional - FONTE: Própria 56. Perspectiva explodida do partido da proposta em malhas de diferentes níveis de socialização - FONTE: Própria 58. Renderização da proposta APAC Tietê - FONTE: Própria 59. Renderização da proposta APAC Tietê - FONTE: Própria 60. Renderização da proposta APAC Tietê - FONTE: Própria CAPA - FOTOGRAFIA: http://imagens.efeitovinculante.com.br/2015/08/presoo.jpeg

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