Isabelle do Nascimento Pessoa
DO CÁRCERE À INTEGRAÇÃO Experimentação tipológica e proposta de um módulo penal para o futuro
João Pessoa Novembro 2018
Isabelle do Nascimento Pessoa_ autora
DO CÁRCERE À INTEGRAÇÃO Experimentação tipológica e proposta de um módulo penal para o futuro
Trabalho final de graduação apresentado como requisito para a conclusão do curso e obtenção do título de bacharel em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal da Paraíba.
Dr. Carlos Alejandro Nome_ orientador
João Pessoa_ PB Novembro de 2018
Banca examinadora
____________________________________________________ Prof. Dr. Carlos Alejandro Nome orientador ____________________________________________________ Prof. Dr. Geovany Jesse Alexandre da Silva
____________________________________________________ Prof. Dr. Pablo de Soto Suárez
P475c Pessoa, Isabelle do Nascimento. Do cárcere à integração: experimentação tipológica e proposta de um módulo penal para o futuro / Isabelle do Nascimento Pessoa. - João Pessoa, 2018. 169 f. : il. Orientação: Carlos Alejandro Nome. Monografia (Graduação) - UFPB/CT. 1. Sistema penal. 2. Prisões. 3. Tipo edilício. 4. Arquitetura penitenciária. 5. Arquitetura especulativa. I. Nome, Carlos Alejandro. II. Título. UFPB/BC
Monólogo de uma prisão
Eu sou do futuro. Em algumas palavras vou te contar um pouco do que eu vejo, dia após dia. Sou um pouco diferente do que estás acostumado a ver — ou não tão acostumado assim, já que as pessoas tendiam a não me enxergar. Venho de uma arquitetura esquecida, de um “não lugar” para “não pessoas”. Mesmo sendo contemporâneos a ti, meus ancestrais são quase invisíveis. Poucos querem vê-los ou discuti-los. Mas vou te dizer: é muito mais fácil olhar para mim do que para eles. Pode-se dizer que sou uma prisão do futuro, ou que eu gerencio uma. Não importa muito para ti de quão futuro estamos falando, mas as coisas estão diferentes agora. Eu não sou, de forma alguma, uma criação perfeita. Sei muito bem que o ideal é que eu nem existisse. Mas esta sociedade ainda necessita de mim, e felizmente aprendeu a me imaginar de outra maneira. Quando eu olho para fora, uma cidade a pleno vapor, que não para nunca. Dentro de mim desenvolve-se uma comunidade com dinâmicas próprias. Eu tenho um pouco de tudo, e sou eu quem separa e junta este tudo com o resto do mundo. O que nos separa não são mais muros, como em outros tempos. Na verdade, não sei bem se a cidade e eu estamos desjuntadas. Ao ser construída no seio de uma cidade edificada, aproveitei sua infraestrutura e proximidade para inseri-la em minhas dinâmicas internas e inserir-me nas suas. Eu sou casa, sou trabalho, sou escola, sou lazer, sou castigo. As interações que em mim ocorrem são complexas e fundamentais. Tenho espaços compartilhados e segregados e meus usuários têm enredos e heterogeneidade abismais. Abrigo alguns detentos, não muitos, cada um com sua história que me antecede e com seus motivos que os trouxeram até mim. Para eles eu sou uma cidade completa, eu sou tudo. Abrigo também o que tu talvez conhecesses como agentes, que passam boa parte das horas de seus dias aqui, e ofereço espaços acessíveis à comunidade, compartilhados com alguns prisioneiros. Todo este contato é espacializado em minhas células. Antes com caráter monofuncional, visando apenas a reclusão e punição do detento, agora eu comporto atividades que podem e devem ser divididas com os demais cidadãos. Esta mescla me dinamizou e me ajudou a minimizar a inócua segregação que existia entre minha tipologia e a socieda-
7
de. O maior ou menor contato com a comunidade ocorre de acordo com a própria progressão penal: quanto maior o avanço obtido, maior liberdade de ações e contatos externos. Eu gosto de me ver como um circuito: as pessoas que em mim entram, percorrem etapas até me deixarem. A progressão de pena comportada toda em uma única edificação, no caso em mim, possibilita arranjos espaciais que facilitam a classificação dos indivíduos confinados e permitem maior individualização penal, moldando-os de acordo com as necessidades intrínsecas a cada etapa do percurso. Minha gestão é descentralizada e a sociedade tem participação em minha administração. Meus presos se organizam em conselhos e também têm voz ativa em minha gerência. Talvez mais importante, eles participam do meu funcionamento, aumentando seu sentimento de apropriação e reduzindo custos operacionais. Ao longo dos anos eu vi o uso da tecnologia de maneira cada vez mais incisiva. Eu sou a tecnologia. Eu sou usada tanto para a recuperação do detento quanto para seu controle disciplinar. Os agentes penitenciários que conheces não existem mais. Não existem vigias que buscavam personificar a hierarquia de poder. Existem profissionais que gerenciam e direcionam as atividades em mim existentes. O controle se dá através de mim, arquitetura e tecnologia: eu vejo tudo e sei tudo que ocorre em mim e ao meu redor. Uso monitoramentos visuais, de presença e rastreio, análises sonoras, de coleta e cruzamento de dados biológicos… Quando eu olho novamente para fora, a cidade toda é fiscalizada de maneira onipresente. Como em mim seria diferente ? As prisões do teu tempo, minhas ancestrais, trabalham com a “mortificação do eu”. Os usuários são objetificados. Aqui eu vejo as coisas tomarem formas diferentemente. Meus usuários precisam participar ativamente em mim e dedicarem-se ao próprio percurso de reinserção. Por isso sou mais flexível, eu preciso ser. Eu preciso oferecer possibilidades de arranjos e re-arranjos. As pessoas daqui não são mais bem-vindas lá fora. Ao menos agora. Elas chegam em mim, cada uma com conflitos pessoais que pre-
8
cisam ser resolvidos e caminhos que devem ser encontrados e seguidos. Depois de mim, elas devem estar prontas para sair e voltar melhor preparadas para enfrentar este realidade. Ao contrário do que estava sendo construído, com pressupostos de eficiência e racionalização extrema do espaço edificado, este complexo de progressão penal que em mim se instaura prevê maior flexibilização de percursos e ordenamentos espaciais menos rígidos. Com as facilidades de controle proporcionadas por recursos de automatização, foca-se menos na fácil apreensão visual de cada pedaço do organismo e mais na vivência que em mim ocorre, assim como na quebra da monotonia de uma paisagem estática e imutável. Eu sou mais complexa e dinâmica, um organismo vivo. Eu vejo diariamente meus usuários tomarem escolhas, caminho a ou b. Alguns variam sempre que podem, outros mantém rituais mais rígidos. Eu sou um caos ordenado, cheia de pontos cegos. Mas cegos para quem? Afinal, eu vejo tudo. A própria ideia de rotina que eu assisto permite aos meus usuários alterar e moldar suas atividades de acordo com suas vontades. Meus espaços são modificáveis para novas apropriações. Os cronogramas são cheios, e precisam ser para evitar o ócio, mas são menos rígidos e oferecem possibilidades de escolhas. Eu assisto a dor humana, vejo o quanto eu posso ser nociva e o quanto eles podem odiar estar em mim. Sempre é um processo de difícil adaptação, em que eles precisam aprender a lidar consigo mesmos. Alguns demoram mais do que outros a começarem a achar seus rumos, vocações, propósitos, objetivos. Alguns se doam mais, outros imergem menos. Em percursos e progressões mais ou menos lentas, eu vejo as pessoas melhorarem. Elas gradativamente se deslocam em meu circuito interno, ganham progressivamente mais liberdade e conexão com o mundo lá fora. É como cumprir meu propósito. Esta é a melhor parte em ser eu.
Isabelle Pessoa Crônica elaborada pela autora em uma das etapas deste trabalho.
9
Resumo
O cenário atual do sistema penitenciário brasileiro é um prenúncio de catástrofe: tem-se consciência de suas falhas, de seus custos e de sua ineficiência. Contudo, as transformações no domínio da arquitetura prisional se dão de maneira extremamente lenta e dificultada pelos próprios limites e complexidades do tipo penal, contribuindo para a manutenção de sua obsolescência. Este trabalho buscou aproveitar seu cunho acadêmico para criar uma oportunidade de debate, reflexão e prospecção de como fazer prisões funcionarem e reintegrarem indivíduos, a partir do entendimento da lógica social por trás do tipo edilício e desprendimento de pré concepções do que conhecemos como cárcere. Assim, adentrou-se em uma natureza especulativa, ambientada em um futuro possível ou provável, com uma margem temporal que permite uma mobilização interdisciplinar e holística. A resolução e programação de um módulo base, passível de desdobramentos e adaptações, viabiliza uma argumentação mais abstrata, contemplando questões que precedem a materialidade da edificação em termos programático-funcionais. Por fim, a experimentação deste novo tipo penal em um modelo unitário permitiu que avançássemos as reflexões do micro para o macro funcionamento prisional, com possibilidades de integrações a sistemas externos.
Palavras-chave: Sistema penal. Prisões. Tipo edilício. Arquitetura penitenciária. Arquitetura especulativa. 11
12
Abstract
The current scenario of the Brazilian penitentiary system is a harbinger of catastrophe: one is aware of its failures, its costs and its inefficiency. However, transformations in the field of prison architecture occur extremely slowly and are hampered by the very limits and complexities of the criminal type, contributing to the maintenance of their obsolescence. This work sought to take advantage of its academic profile to create an opportunity for debate, reflection and exploration of how to make prisons work and reintegrate individuals, from the understanding of the social logic behind the type of building and detachment of preconceptions of what we know as jail. Thus, it has entered into a speculative nature, set in a possible or probable future, with a temporal edge that allows an interdisciplinary and holistic mobilization. The resolution and programming of a base module, capable of unfolding and adapting, makes possible a more abstract argument, contemplating questions that precede the materiality of the building in programmatic-functional terms. Finally, the experimentation of this new criminal type in a unitary model allowed us to advance the reflections of the micro to the macro functioning prison, with possibilities of integrations to external systems.
Keywords: Criminal system. Prisons. Type of building. Penitentiary architecture. Speculative architecture. 13
14
Résumé
Le scénario actuel du système pénitentiaire brésilien annonce une catastrophe: on est conscient de ses défaillances, de ses coûts et de son inefficacité. Cependant, les transformations dans le domaine de l’architecture pénitentiaire se produisent extrêmement lentement et sont entravées par les limites mêmes et les complexités du type criminel, contribuant au maintien de leur obsolescence. Ce travail cherchait à tirer parti de son profil académique pour créer une opportunité de débat, de réflexion et d’exploration sur la manière de faire fonctionner les prisons et de réintégrer les individus, à partir de la compréhension de la logique sociale à la base du type de construction et du détachement des idées préconçues de ce que nous savons comme prison. Ainsi, il est entré dans une nature spéculative, inscrite dans un futur possible ou probable, avec une limite temporelle permettant une mobilisation interdisciplinaire et holistique. La résolution et la programmation d’un module de base, capable de se déplier et de s’adapter, permet un argument plus abstrait, envisageant des questions qui précèdent la matérialité du bâtiment en termes de fonction programmatique. Enfin, l’expérimentation de ce nouveau type criminel dans un modèle unitaire nous a permis de faire avancer les réflexions du micro vers la prison macrofonctionnelle, avec des possibilités d’intégration à des systèmes externes. Mots-clés: Système pénal. Prisons. Type de bâtiment. Architecture pénitentiaire. Architecture spéculative. 15
“
The ambition of this project is to rid architecture of responsibilities it can no longer sustain and to explore this new freedom aggressively. It suggests that, liberated from its former obligations, architecture’s last function will be the creation of the symbolic spaces that accommodate the persistent desire for collectivity.
”
(KOOLHAAS, 1995)
16
Sumário
17
CAPÍTULO 1
33
CAPÍTULO 2
49
109
Investigação teórico-conceitual
CAPÍTULO 3
63
Introdução
Estudo de correlatos
CAPÍTULO 4
Investigação propositiva: módulo penal
de reintegração social
CAPÍTULO 5
Experimentação propositiva de uma unidade
prisional 161
CAPÍTULO 6
164
17
Considerações finais
BIBLIOGRAFIA
18
1
Introdução
No entrecho vigente de aumento de criminalidade e violência, é natural altear e sublinharse o sistema penitenciário brasileiro, constante alvo de críticas por seu grave desprovimento de infraestrutura e consequente ineficiência. Condições de superlotação e descumprimento da classificação dos estabelecimentos penais e sua devida destinação têm trazido agravos substanciais para o próprio funcionamento do sistema, detentor de altas taxas de reincidência que criam um ciclo de aprisionamento infindável. As diversas rebeliões e tomadas de poder que ocorrem nas penitenciárias de todo o país demonstram a fragilidade deste complexo sistema que não consegue assegurar minimamente a segurança do interno, nem tampouco suas demais responsabilidades (SUN, 2008, p.16). Sob os influxos do pensamento positivista, tem-se pregado a humanização da vivência nas prisões e o correto cumprimento da pena através do tratamento individualizado. No entanto, a despeito desta transferência de propósitos, poucos países têm logrado conciliar seus estabelecimentos penais com a Penalogia Moderna1. Mundialmente o Sistema Penitenciário atual tem sido posto em questão em debates e políticas públicas, evidenciando o edifícioprisão como detentor de muitas das expectativas e esforços populares e governamentais a respeito da problemática abordada. Países como Noruega e Alemanha têm avançado na transformação de seus sistemas e outros, como Estados Unidos, França e Reino Unido, têm investido em pesquisas que buscam aproximar cada vez mais o apenamento da reintegração social. A atual conjuntura jurídico-penal brasileira por sua vez vem faceando, desde o período pré-crise 19
(2008), um raro momento de investimento no setor prisional, amparando uma singular oportunidade de revisão e exercício da arquitetura no referido domínio (ESTECA, 2010, pp.1-24). Não obstante o interesse e debate pelo assunto tenha aumentado nos últimos anos, um aspecto marcante da Arquitetura Penitenciária brasileira atual é a ausência de estudo e atualização de sua ciência e de sua perícia. Tem-se, por um lado, um deslocamento da ênfase na análise de aspectos técnicos do edifício para o estudo das relações entre indivíduo e a intervenção arquitetônica, o que propicia, teoricamente, propostas mais coerentes no que tange ao usuário e às suas relações sociais. Em contrapartida, presencia-se uma importante lacuna no conhecimento da Arquitetura Penitenciária devido à inópia, generalidade ou superficialidade do material disponível, compendiados a regras e recomendações para a edificação sem uma prévia retomada de reflexões acerca da eficácia do sistema em questão (ESTECA, 2010, p.4; CORDEIRO, 2011, p.123). No âmbito da Criminologia, desde as últimas décadas várias pesquisas solevaram o conhecimento acerca de avaliações de risco, causalidades criminais e classificação penal do recluso, alinhando-o ao diagnóstico de tratamento recuperativo para evitar e prevenir reincidências. Carece, no entanto, de espacializações desta ciência que atualizem a prática e teoria da arquitetura penal, mantendo-se, assim, o existente descompasso entre os estabelecimentos construídos e o estado da arte atual da problemática estudada. No campo do planejamento, depara-se com órgãos também desprovidos de infraestrutura e de profissionais com conhecimentos específicos sobre o assunto, proporcionando uma deficiência no próprio ato de projetar, construir e reformar os estabelecimentos penais. Observa-se, sobre a arquitetura penal, que a prisão não adveio de uma programação espacial, e sim da emergência da necessidade de espaços para o cumprimento da pena de reclusão e foi sendo progressivamente modificada e aperfeiçoada à medida que progredia20
se a penalogia. No entanto, esta evolução carente de reflexões espaciais que corroborassem o planeamento do edifício tem se dado de maneira cíclica, moldandose para o cumprimento do objetivo da pena a partir de necessidades inferidas, sem prospecções ou conjecturas (SUN, 2008, p.17; CORDEIRO, 2011, p.124). Ainda, devido às características inerentes ao próprio domínio da arquitetura —como o longo tempo de construção —, a aplicação de sua atualização teórica não é simultânea aos avanços da ciência penal, contribuindo para a manutenção constante de edificações prisionais fundamentadas em ideias ultrapassadas.
Figuras 1 e 2: Fotografias da já demolida Casa de Detenção de São Paulo, popularmente chamada de Carandiru, ícone da falha do sistema penitenciário brasileiro. Fonte: https://istoe.com.br/348671. Acesso em 22 de setembro de 2018.
21
Com a Reforma Jurídico-Penal, marcada pela transição de um sistema de justiça despótica e de castigo corpóreo para um sistema de justiça social e de castigo humano visando, principalmente, a defesa da sociedade no lugar da punição vingativa, foi instaurada a pena de privação de liberdade. Esta prevê o encarceramento do indivíduo por um tempo determinado em um local especializado — no caso, a prisão —, visando a recuperação do criminoso através da mudança de sua moral e temor de nova pena e funcionando como prevenção de delitos e mecanismo de reinserção social. Augura, ainda, a individualização da pena, através da classificação criminológica e a separação dos diversos tipos de presidiários em estabelecimentos distintos: de regime fechado, semiaberto e aberto. Contudo, observandose a legislação penal brasileira, torna-se evidente quão destoantes e descompassados encontram-se os estabelecimentos prisionais da finalidade da penalogia moderna, que é a reinserção social de um indivíduo moralmente recuperado. Enquanto as teorias penitenciárias têm como prevalecente os princípios humanistas reformistas no âmbito teórico, as técnicas penitenciárias detêm o método de poder na prática prisional (ESTECA, 2010, p. 9-13). De acordo com o INFOPEN de junho de 2014, fazem-se necessárias profundas reflexões acerca do sistema penitenciário brasileiro, da qualidade de nossas prisões, do perfil das pessoas que têm sido encarceradas e das práticas de gestão dos serviços penais. O Depen propõe uma melhoria destes serviços em quatro eixos principais: alternativas penais e gestão de problemas relacionados ao hiperencarceramento; apoio à gestão dos serviços e redução do déficit carcerário; humanização das condições carcerárias e integração social; e modernização do sistema penitenciário nacional (INFOPEN, 2014, p.6). Em junho de 2016, a população encarcerada no Brasil ultrapassou o marco de 700 mil pessoas privadas de liberdade, um aumento de mais de 700% em relação ao registrado no começo da década de 90. Contudo o sistema brasileiro conta com capacidade para quase metade deste número, apresentando, pois, uma taxa 22
de ocupação de 197,4%. Além da superlotação, outro dado alarmante é o percentual de prisioneiros sem condenação (40%), assim como a inadequação da oferta de vagas para as necessidades reais. Ainda, o não cumprimento consentâneo das progressões penais previstas em lei agravam a conjuntura encontrada principalmente em penitenciárias de regime fechado (INFOPEN, 2017, p. 9-62). Estes dados podem ser melhor visualizados nos gráficos a seguir.
POPULAÇÃO PRISIONAL
726.712 689.510 36.765 437
NO SISTEMA PENITENCIÁRIO EM CÁRCERES PROVISÓRIOS NO SISTEMA PENIT. FEDERAL Nesta página Gráficos elaborados pela autora a partir de informações coletadas no INFOPEN 2017. Fonte: Depen
368.049 358.663 197,4%
VAGAS DISPONÍVEIS DÉFICIT DE VAGAS TAXA DE OCUPAÇÃO
352,6
TAXA DE APRISIONAMENTO
EVOLUÇÃO DAS PESSOAS PRIVADAS DE LIBERDADE ENTRE 1990 E 2016 726,7
401,2
90,0
496,3
148,8
1995
2006
23
2010
2016
17% 2%
49%
8%
5% 3%
11% 1%
26%
11%
2%
3% TIPO DE ESTABELECIMENTO POR DESTINAÇÃO estab. regime provisório estab. regime fechado estab. regime semiaberto
15%
26%
12%
24%
DISTRIBUIÇÃO POR CRIME DOS PRESOS MASC.
estab. regime aberto
tráfico
homicídio
outros
quadrilha ou banco roubo
latrocínio desarmamento violência doméstica
furto receptação
6%
1% 5%
11%
outros
2%
21%
40% 20% 41%
38% POPULAÇÃO PRISIONAL POR TIPO DE REGIME sem condenação
regime aberto
regime fechado
internação e tratamento ambulatorial
regime semiaberto
24
UNIDADES PRISIONAIS POR FAIXA DE TAXA DE OCUPAÇÃO menor que 100% entre 101% e 200%
entre 301% e 400%
entre 201% e 300%
sem informação
401% ou maior
1%4% 6% 9%
7% 19%
15% 14%
19%
51%
ESCOLARIDADE analfabeto afalbetizado sem cursos regulares Ensino fundamental incompleto Ensino fundamental completo
Ensino médio incompleto Ensino médio completo Ensino superior ou acima
1% 3% 1%
26% 7% RAÇA, COR OU ETNIA DOS PRESOS NO BRASIL branca negra amarela indígena
Nesta página e na anterior Gráficos elaborados pela autora a partir de informações coletadas no INFOPEN 2017. Fonte: Depen. Editado pela autora.
25
1% 0% 30%
25%
FAIXA ETÁRIA DAS PESSOAS PRESAS NO BRASIL 18 a 24 anos
35 a 45 anos
25 a 29 anos
46 a 60 anos
30 a 34 anos
61 a 70 anos
Mais de 70 anos
EXPECTATIVA PRISIONAL SOB A ÓTICA DA PENALOGIA MODERNA segurança e controle
reintegração social
punição, castigo
progressão penal
dignidade humana
inserção e contato social
26
CENÁRIO PRISIONAL NO BRASIL
segurança e controle
reintegração social
punição, castigo
progressão penal
dignidade humana
inserção e contato social
Nesta página e na anterior Figuras 3 e 4: Diagramas comparativos entre expectativa e realidade prisionais no Brasil. Fonte: elaborado pela autora.
27
Observa-se que, mesmo em condições distintas de apenamento, superlotação e sistema carcerário, existem similitudes entre detentos de diferentes países, devido à recorrência dos mesmos fatores de risco principais que levam à conduta criminosa. Em nações com maiores índices de desigualdade social, observa-se maior incidência de crimes de propriedade e tráfico — com acentuada presença de analfabetismo, educação incipiente e falta de capacitação —, enquanto países mais igualitários detém maiores percentuais de crimes contra indivíduo. A presença majoritária de grupos étnicos e sociais marginalizados no sistema penitenciário é recorrente, assim como condições de superlotação e incongruência penal. Estes dados fornecem, no campo da criminologia, indícios de fatores causais e pistas de intervenção para o processo recuperativo. O próprio caráter perverso do aprisionamento detém consequências decisivas para a sanidade e vida do sentenciado e, assumindo-se a existência de uma relação simbiótica entre arquitetura prisional e o comportamento humano, assim como a influência que as multideterminações espaciais têm nas ações e características do indivíduo, a importância da utilização de espaços adequados às atividades segundo as demandas do sujeito é latente. Contudo, as necessidades do indivíduo encarcerado raramente são levadas em conta visto que, por este não fazer papel de cliente, os programas de necessidades decorrem de imposições do Estado. Para Foucault (1999, p. 141), a prisão foi materializada como uma instituição e aparelho disciplinar exaustivo. Desde o surgimento dos primeiros espaços carcerários, as conformações espaciais são moldadas a partir de inferências que perseguem a segurança, vigilância e o controle incessante de pessoal, como pode ser visto nos diversos tipos consolidados de edifício prisão ao longo da história. Por sua vez, um dos maiores problemas concernente à arquitetura penitenciária está no paradoxo inerente à própria execução da pena, através da qual faz-se mister ressocializar o indivíduo pela privação das relações sociais, ao mesmo tempo em que se exerce a punição vingativa (SÁ, 1990, p.9; 28
SUN, 2008, p. 23; ESTECA, 2010, p.3; GOFFMAN, 1961 apud CORDEIRO, 2011, p. 124-126; BENELLI, 2014, p.4). Além dos reflexos do ambiente construído na vida e recuperação do preso, deve-se ainda por em questão os impactos dos estabelecimentos no entorno urbano e no imaginário da população a respeito do próprio sentenciado. As instalações de novos presídios acompanham, geralmente, recusa e oposição da comunidade devido ao temor de consequências negativas como desvalorização de propriedades, aumento de violência e estigmatização da área. Em algumas cidades britânicas, por outro lado, têm-se locado prisões estrategicamente para fomentar e estimular o desenvolvimento econômico local com o aproveitamento de mão-de-obra conveniente, sendo esta, porém, uma conjuntura ainda incipiente mas passível de experimentação (JEWKES et al., 2014, p.9). Quanto a aspectos qualitativos e espaciais, vêse a promulgação de uma prática de arquitetura penal engessada, pouco funcional, com altíssimos custos operacionais — que ultrapassam amplamente os dispêndios de construção —, e que trata de maneira completamente homogeneizada seus usuários. Os materiais e técnicas construtivas empregadas, visando o menor gasto possível de instalação, dificultam a flexibilização do estabelecimento, tanto para suprir necessidades emergidas pós-ocupação, como para eventuais expansões e adaptações. Os prisioneiros, aqui tratados como objetos, raramente deparamse com possibilidades de ajustamentos espaciais ao próprio processo de individualização e progressão penal. Presos que já deveriam estar em regime semiaberto comumente permanecem em penitenciárias de regimes fechados, sem nenhuma mudança de encadeamento e de vivência. Segundo Jewkes e Moran (2014, p. 10), ainda que a relevância das considerações estéticas para a qualidade de vida dos prisioneiros seja muitas vezes questionada e minorada, as condições arquitetônicas das instalações estão intrinsicamente relacionadas à penúria do cárcere. Semelhantemente, circunspeções arquitetônicas e plásticas têm grande importância para a comunidade, oscilando entre o 29
ensejo de prisões que aparentem cumprir seus papeis punitivos mas que também se misturem de maneira discreta ao seu entorno, com uma arquitetura branda, funcional e ao mesmo tempo austera. A adaptação de edificações prisionais aos estudos mais promissores da penalogia contemporânea se dá de forma dificultada pela própria dinâmica de construções arquitetônicas. A carência de trabalhos na Academia que busquem espacializar estes novos preceitos, assim como a falta de inovação e mudança na construção de novas penitenciárias, contribuem para a consolidação deste descompasso entre temporalidade arquitetônica e temporalidade penal. Desta forma, ganham destaque abordagens do tema que buscam aproximar a prática da teoria, através da extrapolação de regras e conformidades contemporâneas e da prospecção e proposição de novas ideias e aplicações. A condição antagônica do tema conduz à crença de que não se poderia ter um espaço prisional completamente condizente à condição humana, tanto por aspectos substanciais da reclusão, como por questões econômicas. Segundo Foucault (1987), a prisão ideal seria justamente a “nãoprisão”. Contudo, apesar desta conjuntura bastante desmotivadora, teóricos importantes da área, como Alessandro Baratta, inferem a importância da busca desta reinserção do sentenciado através, principalmente, de sua reinterpretação e reconstrução sobre bases diferentes. Se os alicerces sobre os quais se estrutura todo o sistema penal são frágeis e detentores de diretrizes equivocadas, os estabelecimentos construídos estarão fadados, por conseguinte, ao fracasso (SUN, 2008, p.21; ESTECA, 2010, p. 204). Segundo Davidson (1931, p.33, apud MORAN e JEWKES, 2016, p. 25), as autoridades governamentais nunca conseguirão extrair o melhor de seus arquitetos até que as demandas sejam feitas não mais na forma de planos e materiais, mas sim em termos de performance e atividades. Para ele, projetar prisões baseando-se na atuação do tipo edilício, no lugar de apenas aceitar e replicar o que já foi construído, é a chave parar alcançar melhores resultados. Moran 30
e Jewkes (2015, p.176) sugerem que estudos no âmbito da arquitetura, design e tecnologia (ADT) deveriam testar e simular novas iniciativas projetuais. Destarte, é imprescindível que se repense o sistema e sua consequente materialização e que arquitetos também tomem papel principal no ato conjecturar, de prospectar e propor novas alternativas. Deve-se levar em conta, ainda, o descompasso existente entre a velocidade de construção de arquitetura e a de mudança social e evolução da penalogia, que contribui para a obsolescência do edifício. Para Koolhaas (2016), arquitetos devem buscar compensar os passos lentos de sua profissão, mirando e adequando suas propostas ao tempo em que elas serão de fato utilizadas, promovendo adaptação e aumentando o ciclo de vida do edifício, invertendo a sequência de ações instaurada há tempos, em que a arquitetura surge apenas como resposta sempre atrasada para precisões consolidadas, rígidas e urgentes.
31
O B J E T I V O
G E R A L
Propor, em nível de estudo preliminar, um módulo penal a partir da conjectura e definição de novos princípios e diretrizes de funcionamento prisional.
32
O B J E T I V O S E S P E C I F I C O S Atualizar o programa de necessidades proposto pelo Estado, moldando-o de maneira mais coerente às demandas e necessidades dos usuários do estabelecimento penal, através de métodos de programação arquitetônica. Propor diretrizes de funcionamento da unidade prisional edificada, a partir de prospecções do sistema penal. Relacionar e espacializar premissas de reintegração social e arquitetura da prisão. Testar e catalogar variações do módulo penal base, propondo associações e arranjos de acordo com as classificações prisionais. Experimentar, em nível de estudo preliminar, uma aplicação do tipo edilício proposto em uma unidade prisional. Empregar princípios de modulações que viabilizem flexibilizações do estabelecimento acordadas com carecimentos pós ocupacionais.
33
34
2
Investigação teórico-conceitual
Penalogia Moderna
A composição de grupos sociais sustentase no estabelecimento de contratos sociais que fundamentam o direito de punir do Estado. Criam-se ferramentas, as leis, que tentam regrar e condicionar as ações humanas, assim como sanções para os eventuais infratores. Diferentes povos detêm leis e penalidades diversas, algo visto ao longo de toda história do homem. Com a formação do Estado Moderno Liberal, fruto das Revoluções liberais francesa e inglesa, o direito-poder de punir medieval é revisto e reconfigurado, passando por copiosas modificações e culminando no deslocamento da vingança do soberano para a busca da defesa da sociedade (FOUCAULT, 1987, p.76). A Reforma Jurídico-Penal, baseada em um sistema de justiça social e castigos humanizados, foi influenciada pela filosofia iluminista e renascentista, com caráter antro-centrista, liberal-individualista e utilitarista (ESTECA, 2010, p. 8). De modo geral, as práticas punitivas tornaram-se pudicas. Não tocar mais no corpo, ou o mínimo possível, e para atingir nele algo que não é o corpo propriamente dito. […] O sofrimento físico, a dor do corpo não são mais os elementos constitutivos da pena. O castigo passou de uma arte das sensações insuportáveis a uma economia dos direitos suspensos (FOUCAULT, 1987, p. 15).
A Reforma estabeleceu a pena de privação de liberdade como uma das punições humanas e 35
úteis, assim como a retenção de bens e perda de direitos civis. Os estabelecimentos de encarceramento perderam seu caráter de transição — antes utilizados enquanto aguardava-se a punição em si — e passou a ser a própria sanção, através, teoricamente, do isolamento e recuperação individual. Com esta nova acepção, surgiu a necessidade de construir-se novos edifícios adaptados ao novo propósito de reclusar muitos indivíduos concomitantemente, mantendo-os em plenas condições de saúde e segurança. A Ciência Penitenciária alteia a humanização da vivência nos estabelecimentos penais e a adequada aplicação penal a partir de abordagens customizadas e individualizadas. Isto se dá através da classificação criminológica e apartação dos detentos segundo tipos de crime, faixa etária e gênero. Esta categorização, segundo Esteca (2010, p. 13), do ponto de vista da prevenção positiva é uma garantia de justiça, pois separa presos que influenciariam nocivamente os demais e melhor orienta sua posterior reinserção. Ainda, no âmbito da prevenção negativa e utilidade da pena, esta ordenação permite a aplicação e teste de diferentes punições sobre os prisioneiros, segundo crimes e outros condicionantes, facilitando avançar na descoberta dos métodos mais eficazes. Instrumentos foram produzidos para regularizar a relação entre instituição e presidiários, com o estabelecimento dos direitos do preso, principalmente a partir da década de 1930. Concomitantemente, foram instauradas entidades internacionais, sob incumbência da ONU, para uniformização das técnicas penitenciárias, monitoramento das prisões e proposições de recomendações (ESTECA, 2010, p.15). Reintegração social Um dos problemas decorrentes do modelo penal reformista que suscitou diversas críticas ao longo dos anos é o resultado principal da privação de liberdade: a devolução de um indivíduo destituído de valores devido ao adestramento e não uma pessoa moralmente modificada (ESTECA, 2010, p. 26). Para Sá 36
(1990, p.9), as consequências do caráter perverso do aprisionamento chegam a ser deveras drásticas para a reconstrução do sentenciado, que retorna, muitas vezes, em condições sociais piores que no ingresso. Pesquisas sobre a psicologia da punição apontam indicadores dos motivos pelos quais o encarceramento possui um efeito de intimidação limitado. Para que a punição obtenha êxito na supressão de comportamentos, ela requer aplicação imediata em níveis intensos, captura e execução da punição de criminosos por cada crime cometido, impedimento do escape das consequências devidas por parte do infrator, correta dosagem de acordo com o mau comportamento e adequação da mesma às características do ofensor. Contudo, as condições necessárias para que a punição seja efetiva são de difícil aplicação no sistema de justiça criminal, tanto pela impossibilidade de um policiamento onipresente quanto pela burocracia do próprio sistema (JAMES, 2015, p.15). Quanto à intervenção, faz-se necessário o fortalecimento social e psíquico do indivíduo encarcerado, promovendo-o como pessoa e cidadão a partir de diretrizes e princípios de reintegração social, de intercâmbio sociedade-cárcere, pondo o preso como sujeito e não como objeto (SÁ, 2005, p.5). Alessandro Baratta criou este conceito no fim do século XX, que constituiria o início de um processo de comunicação mútuo visando o reconhecimento do próprio preso na comunidade, e a recognição desta na prisão. Esta integração está condicionada ao envolvimento e corresponsabilização da comunidade pelos delitos que nela ocorrem. “A abertura da sociedade para o cárcere e do cárcere para a sociedade possibilitaria que ambos compartilhassem e dividissem a responsabilidade pela restauração da relação entre sociedade e aqueles que, geralmente, possuem com ela uma história de conflitos” (BRAGA, 2012, p.4). Assim, a recuperação só seria viável com o combate a este antagonismo, buscando a superação deste conflito.
37
A prisão A privação de liberdade e o estabelecimento prisional tornaram-se, assim, o cerne do sistema punitivo que temos vigente. Somados a eles, tem-se desenvolvido e aprimorado as técnicas penitenciárias, que são conjuntos de métodos empregados à administração prisional e tratamento dos delinquentes, como regras e rotinas, buscando sempre a contenção de pecúlios e auferir melhores desempenhos e resultados (CARVALHO FILHO, 2002, p. 22). Aspectos projetuais dos presídios são substanciais para o entendimento de espaços carcerários, visto que correspondem à materialização, em grande parte, dos objetivos e interpelações de um sistema de justiça criminal (MORAN e JEWKES, 2015, p. 164). Esta apreensão, por sua vez, mostra-se também fundamental para a compreensão das experiências vivenciadas nestes espaços e para a proposição de outras alternativas. Segundo Wener (2012, p.7): (…) prisões representam mais do que apenas depósitos de camas para homens e mulheres presos ou condenados. São ambientes mais complicados do que apenas bom ou ruim, confortável ou não. O desenho de uma cadeia ou prisão está criticamente relacionado à filosofia da instituição, ou talvez até mesmo a todo o sistema de justiça criminal. É a manifestação física de objetivos e abordagens de uma sociedade para lidar com presos e/ou condenados, e é um palco para a realização de planos e programas para aplicações futuras (…) (tradução da autora).
A aceitabilidade das instituições correcionais, assim como seu impacto nos usuários, advém da junção de questões psicológicas e sociológicas com questões físicas dos estabelecimentos. A eficiência de uma unidade penal está atrelada intimamente e, por conseguinte, limitada ao próprio sistema no qual está inserido. É evidente um reconhecimento histórico da importância destes espaços desde os primeiros experimentos de Bentham, o primeiro teórico a 38
associar intimamente a concepção penitenciária à idealização arquitetônica do estabelecimento, relacionando reforma, recuperação e segurança de prisioneiros a aspectos formais da edificação e produzindo o primeiro tipo consciente de edificação penal: o Panóptico, que serviu de modelo, durante muitos anos, para diversos estabelecimentos penais construídos no mundo, principalmente nos Estados Unidos (GARCÍA BASALO, 1959, p.60 apud ESTECA, 2010, p.9). Diversos morfologias foram estabelecendose em seguida, de maneira isolada ou combinadas entre si, a saber: formas radiais, circulares, espinhal, pavilhonar, blocos paralelos, entre outros Conquanto o campo da arquitetura, design e tecnologia (ADT) prisionais permanece insuficientemente explorado e teorizado (MORAN e JEWKES, 2015, p. 163), com carência principalmente na investigação e produção de material empírico que auxilie na construção de uma abordagem holística do problema em questão. Segundo Thompson (1980, p. 134), se o objetivo principal do aprisionamento é o preparo do indivíduo para reinseri-lo na sociedade, é óbvio que o mesmo só pode ser alcançado com o combate e alívio do que provoca a criminalidade e, assim, a prisão deve tentar remediar estes desajustes. Assim, para Gill (1972, p.120), a arquitetura penitenciária deve auxiliar este processo, provendo ambientes que simulem, o mais próximo possível, uma vivência convencional, sem prejudicar nem priorizar, com relação aos demais cidadãos, programas educacionais, vocacionais, profissionais, entre outros. A história da arquitetura da prisão mostra-se como um testamento desencorajador da nossa capacidade, por vezes intencional e por outras acidental, de degradar nossos semelhantes. As estruturas das prisões têm continuado a serem construídas de uma maneira que acaba, por um meio ou outro, brutalizando seus ocupantes e privando-os de sua privacidade, dignidade e autoestima, enquanto concomitantemente fortalece sua criminalidade. […] A prisão contemporânea parece permitir a disposição mecânica de
Nesta página Figura 5: Diagrama com exemplos morfológicos de modelos consolidados de prisão. Fonte: elaborado pela autora.
39
dominância do sentenciado. Arquitetos no futuro devem compartilhar alguma responsabilidade para as indignidades não-intencionadas decorrentes de suas obras (JOHNSTON, 1973, p. 53, tradução da autora).
Desde a década de 1960, houve um distanciamento de estudos criminológicos que abordassem o projeto e desenho penitenciário e os que sucederam abordaram principalmente aspectos históricos e impactos negativos do aprisionamento. Recentemente novas linhas de pesquisa têm introduzido e balançado a prática da prisão, com novos discursos acerca de legitimação, segurança, qualidade de vida e saúde na cadeia, entre outros (MORAN e JEWKES, 2015, p. 168). Contudo, percebe-se a constante exclusão da arquitetura, design e tecnologia (ADT) penal como pontos chaves na discussão. Estudos no campo da psicologia ambiental apontam correlações e impacto de condições de superlotação em espaços prisionais no aumento de estresse dos detentos (SCHAEFFER et al., 1988 apud MORAN e JEWKES, 2015, p. 168). Segundo Moran e Jewkes (2015, p. 169), existe uma aceitação cautelosa de que o desenho de espaços carcerários têm efeito direto no comportamento e controle dos prisioneiros. Esta ideia tem sido amplamente aplicada nas pesquisas que têm focado, principalmente, nos aspectos negativos do ambiente na recuperação dos presos, em como suprimir comportamentos não desejados — como auto mutilações — e menos em como potencializar a recuperação do usuário, através, por exemplo, da exploração do potencial da experiência positiva individual e em grupo, que tem sido em parte negligenciada. Para Siserman (2012, apud MORAN e JEWKES, 2015, p. 169), estudos de prisões como edificações e ambientes nos quais o comportamento de detentos pode ser dramaticamente mudado — e que investiguem como isso pode acontecer — permanecem escassos. Existe um crescente reconhecimento global da relativa ineficácia e condições inumanas do modelo prisional modernista, e a experimetação, em alguns países europeus como Noruega, Islândia 40
e Dinamarca, de ideias formais mais progressivas, que exploram aberturas, flexibilidade e normalização no planejamento espacial. Algumas das estratégias utilizadas são: substituição de texturas duras de mobiliários por acabamentos mais confortáveis, utilização da psicologia das cores para personalização espacial, exploração de iluminação natural e artificial para criação da ambiência almejada, manuseio de relações entre interior, exterior e elementos naturais, assim como experimentações de materiais, artes e intervenções que minimizem a monotonia do lugar. Não obstante a importância de ambientes seguros e adequados para prisioneiros e funcionários, nem sempre as estratégias supracitadas são libertadoras e suficientes para criar prisões eficientes e que potencializem a recuperação do detento. Uma das justificativas é a condição altamente restritiva dos programas que os arquitetos devem responder, condicionando suas propostas a pressupostos não revisitados. Outro fator que contribui é a correlação entre edifício prisão e demais estratégias penais, partes componentes do sistema penitenciário cujo sucesso está atrelado a uma abordagem holística e multidisciplinar do problema. Regimes que facilitam bons relacionamentos entre os diferentes usuários, assim como a oferta de condições decentes de habitação e trabalho dentro das penitenciárias, tendem a compor instalações de custódia mais saudáveis (MORAN e JEWKES, 2015, p. 170-178). Gill explora o uso de monitoramento eletrônico como uma extensão das estratégias carcerárias, sugerindo que o confinamento pode ser alcançado independentemente de restrições físicas e que formas alternativas de punição — não necessariamente apoiadas no sistema prisional atual — podem ser tão repressivas quanto o modo tradicional (2013, p.26 apud MORAN e JEWKES, 2015, p.165). Outra inferência que se tem é a do cárcere como algo a mais do que apenas espaços de confinamento, mas também uma ferramenta de reconstrução social e psicológica que extrapola os muros de uma penitenciária.
41
Classificação penal na criminologia moderna A classificação de comportamentos criminosos é uma prática que visa desafiar, direcionar e corrigir comportamentos criminosos em regimes de custódia. Mundialmente, a avaliação de ofensores é principalmente utilizada para classificação, intervenção, gestão de riscos e condicionais. A avaliação de detentos é a base da intervenção criminológica e sua aplicação direciona terapeutas e agentes de custódia para reabilitar os ofensores de maneira adequada. Esta perspectiva é consistente com pesquisas que apontam avaliação de ofensores como ferramenta efetiva na continência e direcionamento de comportamentos criminosos e reincidentes. O RNA (risk and needs assessment) é um instrumento utilizado na criminologia e consiste em uma série de itens usados para coletar dados sobre comportamentos e atitudes relacionados à ação criminosa, assim como ao risco de cometerem crimes novamente. Ele pode servir como mecanismo de classificação dos detentos — em baixo, médio ou alto risco de reincidência — e de direcionamento a programas de reabilitação mais adequados. Os instrumentos de avaliação exploram riscos estáticos — como acontecimentos passados, gênero, idade de primeira reclusão, por exemplo — e dinâmicos — estado civil, nível de educação estabilidade financeira, entre outros. Os primeiros são imutáveis e os segundos, passíveis de intervenção, devendo estar em coerência com as atividades que buscam recuperar e reinserir socialmente o ofensor. O paradigma mais creditado na literatura da predição de risco é o RNR (Risks - Needs - Responsivity ou Riscos - Necessidades - Responsividade), baseado em três princípios fundamentais: avaliação de riscos, direcionamento de necessidades criminogênicas e aplicação de tratamentos responsivos às características individuais. Baseia-se na Psicologia Social, que postula que indivíduos e fatores sociais e situacionais se cruzam, criando valores, cognições e orientações de personalidades que condizem à conduta criminosa (JAMES, 2015, p.5). 42
O princípio de riscos infere que comportamentos criminosos podem ser previstos e que o nível de tratamento deve ser coerente ao nível de risco de reincidir, devido à presença dos fatores que influenciaram à conduta criminosa. Reclusos com altas chances de reincidência precisam ser alocados em programas de tratamento mais intensivo, enquanto os de baixa ou nenhuma, devem receber intervenções mínimas. O princípio de necessidades afirma que tratamentos efetivos devem focar em transformar deficiências criminogênicas, isto é, fatores dinâmicos altamente relacionados à conduta criminosa, e não em questões não criminogênicas, pois estes não estão relacionados à redução de reincidência. Já o princípio da responsividade firma que programas de reabilitação devem ser aplicados de maneira consistente à habilidade individual de aprendizado e que as formas mais eficazes de terapia são a Cognitivo Comportamental, TCC, e as de aprendizagem social (JAMES, 2015, p.6-9). Oito fatores de risco e necessidades compõem as principais variáveis de causalidade na análise de comportamentos criminais de indivíduos. Os quatro principais — histórico de comportamento antissocial, padrão de personalidade antissocial, cognição antissocial e associações interpessoais antissociais — estão vinculados à Terapia Cognitivo-Comportamental, e os demais, a outras atividades específicas.
43
FATORES DE RISCO PRINCIAPIS
FATOR DE RISCO/ NECESSIDADE
INDICADORES
ALVO DE INTERVENÇÃO
Histórico de comportamento antissocial
Isso inclui o envolvimento precoce em várias atividades antissociais. Os principais indicadores incluem ser preso em uma idade jovem, um grande número de ofensas anteriores e violações da regra durante a liberação condicional.
A história não pode ser alterada, mas os alvos de mudança incluem o desenvolvimento de novos comportamentos não criminais em situações de alto risco e a construção de crenças de autoeficácia que apóiem a reforma.
Padrões de personalidade antissocial
As pessoas com esse fator são impulsivas, aventureiras, que buscam o prazer, envolvem-se em problemas generalizados, são impiedosamente agressivas e demonstram um desrespeito insensível pelos outros.
Desenvolver habilidades para lidar com o autocontrole fraco, o gerenciamento da raiva e a má resolução de problemas.
Cognição antissocial
As pessoas com esse fator mantêm atitudes, crenças, valores, racionalizações e identidade pessoal favoráveis ao crime. Indicadores específicos incluem a identificação com criminosos, atitudes negativas em relação à lei e ao sistema de justiça, crenças de que o crime trará recompensas e racionalizações que justifiquem o comportamento criminoso (por exemplo, a “vítima mereceu”).
Reduzir o pensamento anti-social e sentimentos através da construção e praticando pensamentos e sentimentos menos arriscados.
Associações antissociais
Este fator inclui tanto a associação com outros procriminais como isolamentos de outros anticriminais.
Reduzir a associação com outros procriminais e aumentar a associação com outros anticriminais.
44
FATORES DE RISCO MODERADOS
FATOR DE RISCO/ NECESSIDADE
INDICADORES
ALVO DE INTERVENÇÃO
Circunstâncias familiares / maritais
Relacionamentos de baixa qualidade entre a criança e os pais (no caso de jovens infratores) ou cônjuges (no caso de agressores adultos) em combinação com expectativas neutras em relação ao crime ou às expectativas procriminais.
Reduzir conflitos, construir relacionamentos positivos e aprimorar o monitoramento e a supervisão.
Educação/trabalho
Baixos níveis de desempenho e envolvimento e baixos níveis de recompensas e satisfação.
Melhore o desempenho, envolvimento, recompensas e satisfação.
Lazer e recreação
Baixos níveis de envolvimento e satisfação de atividades de lazer não criminosas.
Aumentar o envolvimento e a satisfação de atividades de lazer não criminosas.
Dependência de substâncias
Problemas com o abuso de álcool e / ou outras drogas (excluindo o tabaco). Os problemas atuais com abuso de substâncias indicam um risco maior do que os problemas de abuso de substâncias no passado.
Reduzir o abuso de substâncias, reduzir os apoios pessoais e interpessoais para o comportamento orientado para a substância e melhorar as alternativas ao abuso de substâncias.
Tabela elaborada pela autora, a partir de dados encontrados em JAMES, 2015, p. 8
45
FA
FH
FL
FE
FQ
Nesta página Figura 6: Diagrama com a incidência possível dos tipos de fatores de risco, com gradação crescente de cima para baixo. Legenda: FA- Fator de risco principal, relacionado a histórico, personalidade, relacionamentos e cognição antissociais FH- Circunstâncias do habitar e relações interpessoais FE- Educação e capacitação profissional FL- Recreação e lazer FQ- Abuso de substâncias químicas Fonte: elaborado pela autora.
46
Vigilância e controle Enquanto estratégias contemporâneas de vigilância através de instrumentos tecnológicos permitem maior segurança de pessoal, também reforça a ausência de privacidade e demanda maior autocensura dos funcionários, que podem ser afetados por emoções conflitantes de controle e poder (MORAN e JEWKES, 2017, p. 176). As prisões, assim como diversas outras tipologias edilícias, passam por mudanças que miram o monitoramento de todos os usuários através de interfaces tecnológicas que encorajem flexibilidade de movimentos, enquanto mantêm altos níveis de segurança. Os principais instrumentos mobilizados atualmente são câmeras sem fio com transmissão de imagens digitais, com detecção de objetos e movimentos atípicos; monitoramento biométrico e eletrônico de prisioneiros e visitantes, permitindo o rastreamento de corpos em quaisquer lugares dos edifícios; dispositivos de escuta e patrulha para identificar o uso ilícito de aparelhos telefônicos, sinais precoces de comportamentos agressivos, entre outros (MORAN e JEWKES, 2015, p. 177). Evidências indicam que desenhos podulares assistidos por tecnologia e descentralizados aproximam-se mais da normalidade de espaços não prisionais, proporcionando maior segurança e conforto e diminuindo a quantidade de portões, grades e barreiras físicas de controle, além de permitir que agentes penitenciários tenham papel mais importante na recuperação de detentos do que simplesmente a patrulha (SPENS, 1994, apud MORAN e JEWKES, 2015, p.177). O uso positivo da tecnologia poderia extrapolar noções de hierarquia prisional, transformando complexas relações verticais e horizontais existentes entre prisioneiros, oficiais e visitantes. Embora a falta de privacidade tenha sido amplamente reconhecida como uma das maiores penúrias do cárcere, estudos escassos têm explorado e testado os potenciais que estes instrumentos não personificados de poder têm de modificar pressupostos espaciais da tipologia estudada. 47
Pesquisas apontam e identificam maneiras pelas quais prisioneiros na França e na Rússia conscientemente praticam manobras táticas de negociação espacial para encontrar momentos de isolamento em prisões superlotadas (MILHAUD e MORAN, 2013 apud MORAN e JEWKES, 2015, p. 165), cuja arquitetura, rígida e expositiva, inviabiliza todos os momentos de privacidade precisos pelo homem. Este cruzamento levanta o questionamento : como poderiam ser estes espaços, quando o controle e vigilância não se dão mais apenas por conformações arquitetônicas? Revolta aborta abruptamente os procedimentos normais de projeto. De repente, nauseado pela aparente obrigação da “minha” profissão de fabricar diferenças, de “criar” interesse, de lidar com o aparentemente infinito tédio que existe por aí, inventar. Por que eu? Por que não todo mundo? (KOOLHAAS, 1995, p. 616)
Uma linha de pensamento semelhante sugere a dissolução da arquitetura penitenciária como única responsável pelo controle dos detentos e a atribuição deste a diversos domínios que poderiam contribuir de maneira conjunta à melhor performance do tipo edilício. Tipo edilício e arquitetura
Arquitetura é produto de expectativas sociais. (…) Quatremère de Quincy afirma que
existe na arquitetura uma essência particular a cada exemplar edificado, algo subjacente ao aspecto físico ou à imagem que a obra assuma. Existe uma ‘regra que precede o modelo’ ou a ‘razão original da coisa’, um conteúdo sem forma definida, mas plenamente reconhecível — algo como o ‘espírito do edifício’. (…) Quincy faz uma clara distinção entre o tipo e o modelo. Enquanto o tipo é algo ‘vago’, o modelo é um produto ‘preciso’. O modelo é reprodutível, é aquilo que é passível de cópia. Já o tipo, por ser anterior a qualquer imagem realizada, não permite ser detalhadamente
48
copiado. Partindo-se de um mesmo tipo, podemse obter diversos modelos, mas não o contrário. (BORBA, 2008, pp. 25 - 26).
Algumas teorias contemporâneas aceitam a relevância e o impacto que as motivações sociais têm na arquitetura e as expectativas sociais de utilização do objeto arquitetônico. Uma delas é a teoria da lógica social do espaço (HILLIER & HANSON, 1984), segundo a qual o mecanismo de formação e funcionamento mais primário do ambiente edificado é justamente a mediação de relações sociais, amparadas por barreiras e permeabilidade. A arquitetura poderia ser descrita, por conseguinte, a partir dos conjuntos de relações engendradas pela conformação espacial e não pelo seu aspecto físico-material. Antes de sua materialização, a produção da arquitetura é antecedida por expectativas da sociedade de se viabilizar como estrutura material (BORBA, 2008, p.40). Para Thomas Markus (apud BORBA, 2008, p.40), a ideia dessas convenções é semelhante a um texto que precede o edifício e que este é ele próprio um discurso onde podemos ler estas expectativas.
(…) a arquitetura é sistema de relações entre indivíduos e espaço e entre indivíduos e indivíduos no espaço, antes mesmo de ser um objeto edificado; essas relações são viabilizadas por uma estrutura espacial na qual, quando descrita, podem ser identificados padrões que refletem as prescrições sociais que motivaram o seu estabelecimento (BORBA, 2008, p. 41). Considerando o caráter do evento que se deseja promover, edifícios com mais alto nível de complexidade programática podem subdividir, multiplicar ou mesmo inverter aquele padrão de relação entre usuário do edifício elementar. Sendo assim, dependendo de como e onde ocorrem tais diferenciações, distintos tipos edilícios são elaborados. O raciocínio dos autores sugere um caminho para que se descreva a arquitetura a partir do conjunto de relações geradas pela organização espacial, não por seu aspecto físicomaterial (HILLIER & HANSON, 1984; STEADMAN, 1998; apud BORBA, 2008, p. 39).
a/c
b
b
d
a/c
Nesta página Figura 7: Diagrama elaborado pela autora com os elementos físicos que controlam as relações sociais, segundo a teoria da lógica social do espaço de Hillier e Hanson (1984). Legenda: (a) barreira ao movimento (b) permeabilidade ao movimento (c) opacidade à visibilidade (d) transparência à visibilidade
49
50
3
Estudo de correlatos
O estudo de caso e os correlatos foram escolhidos tomando-se como critérios a temporalidade, destaque e importância no meio, índices de reincidência, entre outros, cada um contribuindo com algum dos pontos discutidos neste trabalho. São eles:
PANÓPTICO - J. BENTHAM
PENITENCIÁRIA DESEMBARGADOR FLÓSCOLO DA NÓBREGA - PRESÍDIO DO ROGER, JOÃO PESSOA - BRASIL
PRISÕES APAC, BRASIL
HALDEN FENGSEL, NORUEGA
51
Penitenciária Desembargador Flóscolo da Nóbrega - Presídio do Roger O Presídio do Roger, localizado no bairro do Roger, em João Pessoa - PB, foi escolhido como estudo de caso da conjuntura atual das prisões de nosso sistema penal. A penitenciária abrigava, em 2016, 1.460 internos (CEDH, 2016, p.3), a despeito da capacidade para apenas 540 detentos. Não obstante a destinação da unidade seja a priori para presos provisórios, a classificação penal não é respeitada e boa parte dos mesmos são sentenciados cumprindo regime fechado ou que deveriam estar em regime semiaberto. Segundo o relatório do CEDH (2016), os blocos componentes da unidade são antigos, construídos na década de 1940. É composta por uma construção central, que comporta a área administrativa, quatro pavilhões mais velhos e dois mais recentes. (…) as pequenas janelas de ventilação existentes nas celas destes pavilhões estão sendo fechadas com tijolo, como forma de castigo, ficando o ambiente insuportável pela falta de ventilação e pelo extremo calor (…) (…) no meio da área encontra-se um prédio que abriga a capela ecumênica, hoje salão multiuso, e também as celas de castigo e de reconhecimento, que são minúsculos espaços sem ventilação e sem nenhuma condição de vida, que amontoam seres humanos junto à grande quantidade de insetos (…) (CEDH, 2016, p. 3).
Muitos dos espaços do presídio não funcionam como previsto no programa: o antigo refeitório foi transformado em uma única cela que comporta mais de 130 presos, a PB4; a sala de aula foi transformada na “Cela da Diversidade Homoafetiva”. Os pavilhões são divididos segundo facções criminosas e potencial ofensivo dos detentos. Segundo o mesmo relatório, as principais queixas são : falta de liberação dos detentos para os 52
Nesta página Figura 8: implantação do Presídio do Roger, em João Pessoa. Fonte: extraída do Google Earth e editada pela autora. Figura 9: croqui aéreo do Presídio do Roger, implantado em um plano mais alto que seu entorno. Fonte: elaborado pela autora.
espaços abertos, superlotação, punições coletivas, aplicação de medidas disciplinares de maneira incoerente com o previsto em lei, falta de tratamento médico e assistência da defensoria, revista íntima vexatória e péssimas condições dos banheiros e infraestrutura da construção (CEDH, 2016, p. 6). Rebeliões e conflitos internos são frequentes, seja em virtude das condições precárias da unidade, seja por desavenças entre facções.
53
Nesta página Figura 10: sanitários do pavilhão de visitas íntimas. Fonte: CEDH, 2016. Figura 11: foto interna de uma cela de isolamento. Fonte: CEDH, 2016.
54
Nesta página Figura 12: sanitário de um dos pavilhões de isolamento. Fonte: CEDH, 2016.
55
Panóptico
O Panopticon foi a primeira prisão idealizada da qual se tem registro, apresentado pelo filósofo e jurista Jeremy Bentham — em 1791, na obra The Inspection House — como a utopia do encarceramento ideal. Apesar da dificuldade encontrada inicialmente para sua aplicação, tornou-se o programa arquitetônico da maior parte das prisões construídas durante os anos 1830-1840, em sua forma original ou miscigenado a outros estilos, tendo-se transformado em um marco na teoria da arquitetura penitenciária.
A moral reformada; a saúde preservada; a indústria difundida; os encargos públicos aliviados; a economia assentada, como deve ser, sobre uma rocha; o nó górgio da Lei sobre os pobres não cortado, mas desfeito — tudo por uma simples ideia arquitetural (BENTHAM, 2000, p.15 apud ESTECA, 2010, p. 35).
Nesta página Figuras 13 e 14: Ilustrações da proposta do Panopticon de Bentham. Fonte: BORBA, 2008.
Seu desenho consiste em uma estrutura circular, cujo centro hospeda uma “casa de inspeção”, da qual um único vigilante conseguiria ter acesso visual a toda as celas dispostas ao seu redor — o que reduz o número de inspetores requisitados —, dando origem ao seu nome (pan- tudo; óptico - visão). Ao mesmo tempo, esta deve ter seu interior invisível para os detentos, criando um sistema de controle de pessoal exaustivo. Percebe-se o sustento do modelo na formação de um hierarquia clara entre indivíduos, de uma nova ordem social que prevê a vigilância onipresente do indivíduo pelas estruturas de poder (BORBA, 2008, p. 77). Um espaço vazio, que Bentham chama de espaço intermediário ou anular (BENTHAM, 2000, p.19), deve existir entre as celas periféricas e a casa de vigilância central, o que viabiliza uma inspeção entre pavimentos. A inovação de sua proposta “consistia na instituição de dois sentidos: um geral — a espacialização de uma situação de vigilância ininterrupta do indivíduo por uma instituição formalmente estabelecida” (BORBA, 2008, p. 78) e outro específico: o problema 56
Nesta página Figuras 15 e 16: Fotografias do Presidio Modelo, construído na década de 1920 na Ilha da Juventude, Cuba. É uma das materializações mais conhecidas do Panóptico. Fonte: Friman, 2015. Editadas pela autora.
da visibilidade organizada em torno de um olhar dominador e vigilante que, para Foucault (2006, p.215), agiria em proveito de um poder rigoroso e meticuloso. Para ele, ainda, a vigilância transforma-se em observação, avaliação e aprendizagem.
Assim, a ideia do Panóptico vai além da estrutura de separação hierárquica e do eficiente sistema de vigilância. O fato de servir a mais de um programa edifício só reforça o argumento de Foucault de que o poder é algo que se torna, de forma difusa, onipresente em meio às diversas instituições que moldam a sociedade (WHITAKER, 1999 apud BORBA, 2008, p. 79).
A ideia do tipo arquitetônico do Panóptico manifesta-se através de um sistema de relações entre indivíduos — estes alocados em lugares precisos da edificação — e entre indivíduo e espaço. Constróise a partir da compartimentação e categorização de indivíduos, cada um com seu papel e posição na hierarquia do sistema espacial do edifício. O Panóptico foi extremamente estudado e discutidos por nomes importantes, como Giddens (2003), Goffman (2007) e Foucault (1978), não necessariamente tratando-se da arquitetura em si, mas abordando de maneira geral questões de vigilância e controle.
57
Centros de Reintegração Social (CRS) - APAC
O segundo correlato escolhido para estudo foi o modelo do Centro de Reintegração Social (CRS) disponibilizado pela APAC — Associação de Proteção e Assistência aos Condenados, uma entidade civil de direito privado que funciona de maneira autônoma jurídica, administrativa e financeiramente. Para atuar nos presídios, está amparada pelo Código Civil e pra Lei de Execução Penal — n 7.210/84. As APACS são coordenadas e fiscalizadas pela FBAC — Fraternidade Brasileira de Apoio aos Condenados —, que visa orientar e assistir suas instituições, mantendo em vista os propósitos das associações (FERREIRA, 2016, p. 20). Visando a reintegração do preso, os CRSs apoiam-se em doze pilares fundamentais: 1. participação da comunidade; 2. o recuperando ajudando o recuperando; 3. trabalho; 4. espiritualidade; 5. assistência jurídica; 6. assistência à saúde; 7. valorização humana; 8. a família; 9. o voluntário e o curso para sua formação; 10. CRS; 11. mérito e 12. jornada religiosa. Os detentos devem passar por um processo progressivo de recuperação , da admissão à soltura, com atividades exercidas que visam prever assistência à família, educação, saúde, bem-estar, profissionalização, reintegração social, pesquisas psicossociais e recreação (FERREIRA, 2016, p.53).
Nesta página Figura 17: Mapa com unidades de CRS - APAC existentes em território nacional. Fonte: Elaborado pela autora a partir de dados encontrados em http://www.fbac.org.br
500km
58
Nesta pรกgina Figuras 18, 19, 20 e 21: Imagens de um CRS - APAC. Fonte: FBAC http://www.fbac.org.br
59
Nesta página e na seguinte Figura 22: Mapas chaves da esquerda para a direita: 1- área coberta 2- pátio regime fechado 3- área descoberta 4- setorização: a - regime fechado, b - semi-aberto, c - aberto, d - serviços gerais, e - administração Fonte: elaborados pela autora a partir de dados fornecidos pela FBAC.
PRISÃO ABERTA E CONTATO COM A COMUNIDADE
INSERÇÃO
CLASSIFICAÇÃO, TAMANHO E ABRANGÊNCIA
PROGRESSÃO PENAL
A comunidade deve se fazer presente, estabelecido laços com os recuperandos e participando do dia a dia da instituição, promovendo fortalecimento social e prevenindo rupturas. Deve facilitar, ainda, a criação de vínculos empregatícios pós soltura, entre outros. A inserção de novos CRS deve ocorrer de modo a facilitar o contato com a comunidade, que tem papel de grande importância na recuperação dos detentos. Existem modelos disponíveis para CRSs de 84 e 120 detentos. O modelo maior comporta espaços destinados para diferentes classificações de detentos — regime fechado, semiaberto e aberto —e possui processo de admissão padrão da APAC. A progressão penal apoia-se na ideia de mérito do detento, que o leva da admissão à soltura através do percurso de atividades de recuperação. Segundo Ferreira et al. (2016, p. 76), destaca-se a importância de uma CTC (Comissão Técnica de Classificação) que viabilize, ao longo do trajeto, o correto acompanhamento e classificação quanto às necessidades de tratamento individualizado, alterações de apenamento, entre outros. Nos regimes fechado e semi-aberto, as celas têm 13,70 m2, compartilhadas por 6 detentos, com quartos para 60
a
b
c e
d
REGIMES: FECHADO
ADMINISTRAÇÃO
SEMI-ABERTO
SERVIÇOS GERAIS
ABERTO (ALBERGADO)
SEGURANÇA E PRIVACIDADE
ROTINA, FLUXOS E PERCURSOS
visita íntima. Dentro dos setores, os prisioneiros podem circular com maior autonomia, sem celas trancadas e com acesso aos equipamentos oferecidos A rotina dos detentos é rigorosa e preenchida com atividades educativas, religiosas, sociais, de capacitação, reuniões, gincanas, atendimentos especializados individualizados, visitas íntimas etc. As atividades são setorizadas de acordo com os usuários e tipo de regime (fechado, semi-aberto e aberto), compartilhando-se área administrativa e de serviços gerais. Cada bloco de regime é composto por espaços fechados e abertos, além de funcionarem de maneira independente. A mudança entre espaço de regime semi-aberto para o fechado se dá a partir de espaços de transição, como eclusas, que separam e delimitam os fluxos. Estes são, por sua vez, racionalizados em corredores ortogonais.
61
Nesta página Figura 23: croqui de implantação da prisão Halden. Fonte: Archdaily. Figura 24: implantação da prisão Halden. Fonte: Imagem produzida pela autora a partir do Google Earth.
Halden Fengsel A Prisão Halden é uma penitenciária de segurança máxima, localizada em Halden, na Noruega. É a segunda maior prisão do país, tendo sido construída em 2010, ambicionando e mirando o principal propósito da Penalogia Moderna: a reabilitação e reintegração social. É um projeto de autoria de dois escritórios Erik Møller Arkitekter e HLM arkitektur. Para isso, seu funcionamento é bastante semelhante ao mundo exterior. Diversas atividades são compartilhadas entre detentos e funcionários desarmados, proporcionando uma atmosfera mais comunitária. Os detentos condenados por crimes graves compõem cinquenta por cento de sua população carcerária, cerca de 250 presos, e um terço é composto por traficantes de drogas. Os que necessitam de cuidados psiquiátricos ficam separados dos demais, assim como os que passam por recuperação de dependência química. Os demais presos habitam outros dois blocos, em celas de aproximadamente dez metros quadrados, todas
62
Nesta página Figuras 25, 26, 27: Prisão Halden, Noruega. Fonte: Archdaily
com televisão, mesas, frigobar, banheiro com chuveiro e janelas de vidro que permitem maior entrada de luz natural. Grupos de 10 ou 12 celas têm espaço comum com cozinha e espaço de estar, com sofás modulares e entretenimentos digitais. Eles ficam trancados nestes pavilhões durante 12 horas por dia, sendo aconselhados a socializarem e utilizarem os demais ambientes compartilhados durante o resto do dia. São ofertadas atividades recreativas, esportivas, de trabalhos manuais com madeira, cozinha, aulas de música, bibliotecas, capelas. As refeições podem acontecer no refeitório ou os usuários podem comprar seus ingredientes no mercado interno do estabelecimento e cozinhar suas próprias comidas. As visitas são permitidas duas vezes na semana, um benefício que pode ser retirado dado o descumprimento de regulamentos internos. Existem espaços para visitas individuais, com quartos equipados com cama, pia, sanitário e preservativos , e para visitas de família, com apoio para crianças. Visitas de longa duração também são viabilizadas em pequenas casas isoladas, com mais de um cômodo, cozinha e espaços de lazer.
63
64
4
Investigação propositiva: módulo penal de reintegração social
A importância da separação de detentos para melhor performance de sua recuperação sugere a manutenção de diferentes tipos edilícios responsivos às características comuns de conjuntos de presos. Segundo James (2015, p.6-9), a eficácia do trabalho de reinserção está combinada ao nível de risco de reincidência do ofensor, isto é, detentos de médio e alto risco respondem melhor às atividades recuperativas que os de baixo risco, que deveriam ter menos contato com os demais. Assim, os crimes cometidos seriam divididos em violentos e não violentos, e os presos, em baixo, médio e alto risco de reincidência, baseando-se na quantidade de índices sinalizados. Prisioneiros de baixo risco condenados por crimes não violentos poderiam — como diretriz geral — passar por penas e acompanhamentos alternativos, não necessariamente o encarceramento. Os demais passariam por circuitos de tratamento personalizados. Devido à alta incidência de crimes de propriedade, e à menor complexidade causal destes delitos comparando-os com os cometidos contra outro indivíduo, este trabalho contempla o estudo do tipo destinado a prisioneiros de médio e alto risco condenados por crimes não violentos. Este ensaio deve ser entendido em sua temporalidade, classificação dos detentos sob a ótica da criminologia, progressão penal e atividades realizadas no centro de recobro.
65
NV
V
BR MR
x
AR
x
Nesta página Figura 28: Destinação dos presos por classificação em baixo, médio e alto índice de reincidência e violentos/não violentos. Fonte: elaborado pela autora. Figura 29: Diagrama com ocupação de carga horária dos detentos de acordo com classificação RNR. Fonte: elaborado pela autora.
tempo livre atividades obrigatórias TEMPO LIVRE
66
ATIVIDADES OBRIGATÓRIAS
Temporalidade Para construção de um marco de referência que deve ser perseguido e alcançado com as proposições projetuais, faz-se necessário seu entendimento em termos de temporalidade. A ideia de repensar o edifício penal nos desprende do presente e nos conduz à ideia de como ele poderia ser em um futuro possível ou provável e como este experimento idealizado pode nos levar, de alguma forma, a ajudar a firmar uma nova realidade acerca do tema. Para isso, buscou-se cruzar prospecções do que poderia ser este novo sistema e performance do edifício com seu tempo de funcionamento — um futuro social passível de ser imaginado a partir da coleta de informações do passado e do presente. Uma imersão em obras de grandes nomes da Futurologia, ou nas suas ramificação e revisões, fornece pistas dos pontos de interesse que demandam maior atenção, como a maior participação de máquinas nas atividades do homem e sua espacialização, a contínua substituição do homem por robôs para a realização de determinadas tarefas e o impacto de avanços tecnológicos nas dinâmicas sociais. Isaac Asimov, acerca da Feira Mundial de Nova Iorque de 1964, devaneia a respeito do que poderia ser um futuro próximo de 50 anos, caso o homem mantivesse distância de armas nucleares. Para ele, o caminho que a humanidade tem percorrido — principalmente relacionado à tecnologia —, é esperançoso, construindo uma perspectiva mais otimista do que está por vir (ASIMOV, 1964, p.2). A incorporação de tecnologias inteligentes pode assumir papel de grande importância tanto no funcionamento de um edifício prisional quanto de demais tipologias arquitetônicas. Ferramentas já existentes de monitoramento, coleta e análise de dados podem ser integrados em um único sistema de acompanhamento dos detentos, de maneira a eximir a arquitetura penitenciária de ser regida majoritariamente por critérios de segurança e controle, permitindo-lhe responder de maneira mais adequada à performance almejada (MORAN e JEWKES, 2015, p. 177). 67
Imagina-se que — desde que se pense em hierarquias da dualidade privacidade e vigilância —, quando o domínio não é alcançado através de conformações arquitetônicas, mas sim por mecanismos digitais, as prisões podem assumir formas diferentes, que tenham melhor participação na recuperação de detentos. As atividades internas também devem ser pensadas sob uma visão prospectiva, em como elas podem ser alteradas pelas novas dinâmicas sociais e como podem ser assistidas por instrumentos tecnológicos, por exemplo na individualidade e especificidade do usuário. A substituição cada vez maior de determinadas ocupações por equipamentos nos leva a crer que as atividades laborais que ocorrem nas penitenciárias — geralmente atreladas à manutenção da mesma — deverão ser transformadas. Uma série de questionamentos podem ser levantados e incorporados nas etapas de idealização afim de aumentar o ciclo de vida útil da edificação e sua eficiência: Para que situação as pessoas devem ser capacitadas? Quais atividades laborais serão realizadas por máquinas e quais, por homens? Como responder espacialmente a novas dinâmicas entre homem e máquina? Respostas a estas perguntas devem facilitar o processo de aplicação criativa de conceitos como flexibilidade, modulação e adaptabilidade. Mesmo assim, a humanidade sofrerá muito com a doença do tédio, uma doença se espalhando mais amplamente a cada ano e crescendo em intensidade. Isso vai ser mentalmente grave, com consequências emocionais e sociológicas, e ouso dizer que a psiquiatria estará longe de ser a especialidade médica mais importante em 2014. Os poucos sortudos que podem ser envolvidos no trabalho criativo de qualquer tipo serão a verdadeira elite da humanidade, pois só eles farão mais do que servir uma máquina (ASIMOV, 1964, p.3, tradução da autora).
Na página seguinte Figura 30: Colagem com referências icônicas de futurologistas. Fonte: Elaborada pela autora.
68
69
Progressão penal O processo de recuperação do condenado, assim como diversas atividades praticadas pelo homem, tem seu êxito apoiado, em parte, na participação ativa do mesmo. Além da oferta de diferentes ocupações, o atrelamento de sua prática à progressão da pena se mostra, segundo Pazzian (2014, p.13), uma ferramenta bastante eficaz no estímulo de participação dos recuperandos. Hoje a ideia de progressão penal já é aplicada em nosso sistema penitenciário, porém apenas ligada ao bom comportamento, como forma de recompensa. Funciona como uma promessa distante de melhoria, sendo, no entanto, pouco convidativa devido a todo o processo estático e incerto do sistema, corroborando para o ócio dominante dos presídios atuais. Quando atrela-se a pena não apenas a uma condição temporal, mas também a atividades mínimas obrigatórias e crescimento individual do prisioneiro, o condicionamento da soltura pode servir de fomento ao investimento de ânimo e esforços para sua própria evolução. É importante que se tenha consciência do circuito a ser percorrido e que os diferentes detentos, nas diferentes fases, percebam-se e interajam entre si. A aplicação da ideia de progressão no circuito de um mesmo complexo prisional visa justamente criar um contato visual e interpessoal que possa alavancar a eficácia das atividades propostas. A partir de ferramentas de avaliação de prisioneiros, o monitoramento do progresso dos mesmos deve ser feito imperativamente e com constância rigorosa, que ateste sua evolução, eventuais retrocessos ou problemas que deverão ser solucionados com novas estratégias. Neste sentido, o avanço na ciência da inteligência artificial e técnicas de monitoramento faz-se necessário para viabilizar um acompanhamento individualizado e personalizado. Assumindo o papel preventivo do encarceramento, o contato com a comunidade livre também deve ocorrer de maneira gradativa, atrelado aos riscos de reincidência e ao próprio progresso 70
individual. Sublinha-se a importância da participação ativa de usuários externos na recuperação de detentos, tanto dentro quanto fora do complexo. Assim, dividiuse o percurso em quatro etapas principais:
E1
Esta deve ser uma parte obrigatória da pena de todos os ingressantes do complexo, pois deve comportar a avaliação, classificação e triagem dos prisioneiros. É um momento em que devem ser coletados dados, montados perfis classificatórios e construídos programas individualizados de tratamento.
E2
Nesta fase, dá-se início às atividades recomendadas precedentemente de acordo com as identificações criminológicas, englobando principalmente detentos com alto risco de reincidência. As incumbências devem estar cerceadas no complexo penal, o contato com visitantes deve ser mais restrito e controlado e as horas úteis semanais, mais preenchidas com atividades mínimas obrigatórias. Os reclusos devem ter menos horários livres e menos tempo vago em seus módulos residenciais.
71
E3
Diferentemente da etapa anterior, esta fase é composta por atividades internas e externas, tendo também uma maior interação com a comunidade. Seus presos são majoritariamente de médio risco, isto é, com maior flexibilidade de agenda semanal e mais tempo livre.
E4
Funcionando como um período de pré-soltura, aqui devem ser destacados esforços movidos para a reinserção do detento em uma extensão do sistema penitenciário, externo ao complexo edificado, que proporcione maior estabilidade para o combate à reincidência — como segurança habitacional, pecuniária e emocional.
Classificação criminológica dos detentos
Na página seguinte Figura 31: Diagrama de classificação criminológica e destinação aos módulos referentes de atividades obrigatórias. Fonte: elaborado pela autora.
A partir dos princípios de avaliação e classificação criminológica do RNR, adotou-se-se cinco fatores de risco principais que levam pessoas a condutas criminosas: I. Fator de risco principal, relacionado a histórico, personalidade, relacionamentos ou cognição antissociais (FA); II. Circunstâncias do habitar e relações interpessoais (FH); III. Educação e capacitação profissional (FEC); IV. Recreação e lazer (FRL); V. Abuso de substâncias químicas (FQ). A incidência destes nos detentos pode ocorrer de forma simultânea — em presos de alto risco de reincidência — ou não, afetando a intensidade com a qual o tratamento deve ser aplicado e a variedade das atividades prescritas. Para determinação dos possíveis usuários do tipo estudado, simulou-se através de combinação simples de análise combinatória todos os potenciais perfis de criminosos. Cada perfil está atrelado a módulos correspondentes de atividades de recuperação, que busquem atuar diretamente nos fatores de risco que conduziram-no ao comportamento criminoso. Dentro de cada módulo de atividade existe o progresso naquele tratamento. Simultaneamente, a avaliação e classificação dos mesmos permite-nos locá-los na etapa correspondente da pena proposta. Desta forma, temos uma categorização dos apenados por tipos de fatores de risco e estágio no circuito progressivo.
72
MÓDULO DE TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL
MÓDULO DE EDUCAÇÃO E CAPACITAÇÃO
MÓDULO DE HABITAÇÃO E RELAÇÕES INTERPESSOAIS
MÓDULO DE RECUPERAÇÃO QUÍMICA E SAÚDE
MÓDULO DE LAZER E RECREAÇÃO
73
Atividades, pessoas e relações
Nesta página Figura 32: Diagrama com módulos de atividades e usuários possíveis. Legenda: amarelo - detentos; azul - profissionais atuantes; vermelho visitantes; verde: externos. Fonte: elaborado pela autora.
TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL
As principais atividades propostas para o circuito penal são destinadas a responder os principais fatores de risco que conduzem ao comportamento criminoso, visando a reintegração social do indivíduo para gradual reinserção na sociedade. Devem ser pensadas em módulos, considerando cada um dos usuários do espaço (detento, equipe, visitante e externo) e como abrigar suas relações: Os quatro principais fatores de risco relacionados a comportamento, cognição, relacionamentos e personalidade antissociais (FA) devem ser trabalhados com sessões de TCC (Terapia cognitivo-comportamental). Os fatores de risco relacionados à educação e capacitação (FE) devem conduzir ao módulo de aprendizado e formação, compartilhado por todos os quatro tipos de usuários. Problemas relacionados ao abuso de substâncias químicas (FQ) devem guiar a módulos de saúde, e os de lazer (FL), ao de recreação. A maneira como os detentos habitam e interagem entre si e com visitantes compõe o módulo habitacional, que deve atuar sobre fatores de risco relacionados às circunstâncias do habitar e relações interpessoais (FH).
MÓDULO DE EDUCAÇÃO E CAPACITAÇÃO
MÓDULO DE SAÚDE
74
MÓDULO DE LAZER E RECREAÇÃO
MÓDULO HABITACIONAL
Devido à alta variabilidade dos usuários, cujos perfis e número mínimo de atividades obrigatórias são inconstantes, as atividades devem ser pensadas em grupos — em quantas pessoas participam simultaneamente — e em carga horária, para viabilizar indicações posteriores de quantificação e dimensionamento. Em caso eventual de maior incidência de presos de médio risco, com menor quantidade de atividades obrigatórias, os espaços ociosos devem ter usos exportados para a comunidade. Para melhor incentivar e amparar relações, os grupos devem ser pensados em números divisores de 16 — 1,2,4,8,16 —, conforme performance almejada de cada atividade. Ainda, deve-se levar em conta o tempo sugerido de cada uma das práticas. Assim, torna-se possível criar relações quantitativas entre os diferentes módulos componentes de tratamento.
75
Terapia Cognitivo-comportamental
Nesta página Figura 33: Colagem espaço TCC individual. Fonte: Imagem elaborada pela autora. Na página seguinte Figura 34: A - Isométrica espaço TCC em grupo B- Planta baixa espaço TCC em grupo C- Corte espaço TCC em grupo D- Isométrica espaço TCC individual E- Planta baixa espaço TCC individual F- Corte espaço TCC individual Fonte: elaborado pela autora.
Segundo James (2015, p.7), os objetivos das intervenções quanto aos quatro principais fatores de risco antissociais incluem: desenvolver novos comportamentos não criminosos em situações de alto risco e construir crenças de autoeficácia que suportem uma reforma individual; desenvolver habilidades para lidar com o autocontrole fraco, o gerenciamento da raiva e a má resolução de problemas; reduzir o pensamento e sentimentos antissociais através da construção e prática de pensamentos e sentimentos menos arriscados; reduzir as associações interpessoais relacionadas ao crime e aumentar as associações não criminosas. Para tanto, devem ser realizadas sessões semanais de TCC com os detentos, de maneira individual e compartilhada — em grupos de quatro e oito detentos. As sessões individuais acontecem em ambientes para uma ou duas pessoas. As em grupo, por sua vez, possibilitam arranjos diferentes de até 8 pessoas. É importante que a arquitetura responda com equilíbrio à dualidade de barreiras e permeabilidade, proporcionando intimidade e conforto privativo, ao mesmo tempo que foge de uma ambiência
76
A
D 0
B
E
C
F
1
5
1:150
0
1
5
de confinamento. Esses espaços permitem maior isolamento para introspecção, distrações positivas — como integração com elementos da natureza — e caso possível, ampla possibilidade de entrada controlada de luz natural.
77
Nesta página Figura 35: Colagem com quartos individuais do módulo de recuperação de dependência química. Fonte: elaborada pela autora. Na página seguinte Figura 36: A- Sala de reuniões em grupo B- Corte sala reuniões em grupo C- Suítes individuais D- Corte suítes individuais E- Sala de acolhimento multiprofissional e recepção F- Sala multiuso G- Sala de procedimentos H- WC PCD I- Consultório odontológico J- Consultório de atendimento multiprofissional K- Estoque L- Dispensação de medicamentos e estoque Fonte: elaborado pela autora.
Recuperação do corpo - dependência de substâncias Ações devem ser mobilizadas para reduzir a dependência de substâncias dos que forem afetados por este fator de risco, visando diminuir os apoios pessoais e interpessoais relacionados a elas e melhorar as alternativas individuais. Devem ser fornecidos amparo para desintoxicação e tratamento progressivo individual e em grupos. Os ambientes deste módulo também devem estar fundamentados na Teoria de Projeto de Suporte, de Roger Ulrich (1997, p.99), amparando relações sociais, conferindo controle sobre o espaço e sobre níveis de exposição e privacidade, luminosidade e temperatura. Deve incorporar a estação de serviços de saúde do edifício, demandando maior controle sobre a mobilidade dos usuários. A presença deste setor no módulo penal não deve substituir uma transferência para um centro de reabilitação, se necessário, mas prover cuidados e atendimentos emergenciais, assim como espaços que abriguem atividades coletivas contra a dependência.
78
A
C
B
D
F
G
E
H
K
I
L
0
J
79
1
5
Habitar a prisão e relações interpessoais Este é um dos módulos mais complexos, em termos de performance, e importantes do sistema, onde os usuários passarão maior parte de seus dias. Buscando maior semelhança entre realidades interna e externa ao cárcere e contrapondo-se à conjuntura atual em que a cela, ao invés de comportar o habitar, é um gerador de problemas e inibidor ou desestimulador de melhorias, este espaço deve amparar o permanecer e viabilizar relações interpessoais, parte essencial da recuperação individual. Assim, o que deve ser este residir, como responder espacialmente a suas demandas e como uma moradia pode auxiliar o detento em seu processo de recuperação? Para Heidegger (1971, p.42), a compreensão do habitar se traduz no modo poético como o homem se encontra sobre a terra, no princípio básico da existência humana.
O habitar, a partir do construir, não se restringe a somente possuir uma residência, mas é a própria condição em que o homem se encontra no mundo. Esta condição é compreendida por ele como um cultivo, resguardo (…) O habitar traduz-se em uma morada junto às coisas, já que elas revelam, por si mesmas, o que é próprio da existência. (…) traduz o fazer-se no mundo (…) (JESUS, 2007, p. 6). Uma ponte, um hangar, um estágio, uma usina elétrica são construções e não habitações: a estação ferroviária, a auto-estrada, a represa, o mercado são construções e não habitações. Na auto-estrada, o motorista de caminhão está em casa, embora ali não seja a sua residência; na tecelagem, a tecelã está em casa, mesmo não sendo ali a sua habitação. Nelas, o homem de certo modo habita e não habita, se por habitar entende-se simplesmente possuir uma residência (HEIDEGGER, 2002, p.125).
Para delinear um escopo performático exigido por um espaço de habitação, Herbert (1977, p. 19980
Nesta página Tabela com o cruzamento de espaços funcionais e zonas de atividades dominantes (preto) e recomendadas ou alternativas (cinza). Fonte: elaborada pela autora a partir de informações coletadas em Hebert (1977, pp. 199- 208).
208) parte do comportamento e das atividades que ocorrem em um lar e, para contornar as funções indeterminadas culminadas pelo caráter genérico do usuário para o qual se projeta, deve-se empregar padronizações com variabilidade. A performance da moradia deve ser analisada quanto a aspectos ambientais e princípios organizacionais — sistemas hierárquicos dos ambientes e a interrelação entre os elementos componentes ou subsistemas. Utilizase conceitos de modulação (comportamental e espacial), ordens hierárquicas e flexibilidade. Espaços funcionais são compostos por zonas de atividade com determinados requisitos, a saber: questões espaciais, como dimensões mínimas ou desejadas; localização e demandas de armazenamento; controle de privacidade visual, acústica e de acesso; requisitos técnicos de equipamentos, serviços, climatização; e conforto ambiental, acústico e lumínico. Os espaços funcionais que ele descreve são: 1. Hall de entrada 2. Banheiro 3. Lavabo 4. Cama de casal 5. Cama de solteiro 6. Espaço multiuso 7. Cozinha 8. Refeições 9.Estar. Cada um destes espaços está associado a zonas de atividade:
Espaço funcional
Zonas de atividade
Espaço funcional
HALL DE ENTRADA
entrada/saída livre circulação
BANHEIRO
ablução lavagem de roupas
ESPAÇO MULTIUSO máquina de lavar tanque lavagem manutenção armazenamento
LAVABO
necessidades fisiológicas
CAMA DE CASAL
dormir: dupla armazenamento mesa de trabalho
CAMA DE SOLTEIRO
dormir: individual armazenamento mesa de trabalho recreação 81
Zonas de atividade
COZINHA
preparação alimentos refeições leves
REFEIÇÕES
refeições em grupo
ESTAR
recebimento de visitas tv em grupo lazer em grupo
Em espaços de reclusão, o paradoxo entre não ficar só e ainda assim estar em um lugar muito solitário deve-se à inexistência de gradações ou hierarquias de privacidade e níveis de individualidade que acaba por criar, muitas vezes, altos níveis de tensão e problemas relacionados à alta exposição. Esta tensão é ainda potencializada pela característica mutável dos usuários já potencialmente fragilizados. Pesquisas indicam que um bom habitar pode ajudar a reconstruir e manter independência, rotinas diárias, confiança e relações sociais. “A falta de privacidade era nada mais do que ser denegrido sem motivo, mas tudo faz parte do sistema prisional.” (FOSTER, 2017)
Além de responder como promover e espacializar habitações na condição de cárcere, este módulo deve apoiar-se na Teoria de Projeto de Suporte, de Roger Ulrich (1997, p.99), que sustenta — a partir de técnicas baseadas em evidências — a relação entre espaço e desenvolvimento pessoal de usuários. Para ele, deve-se promover o suporte social para pacientes, funcionários e visitantes, incluindo acomodações e espaços de socialização que ajudem a reduzir o estresse. Deve-se, ainda, trabalhar intencionalmente com o sentimento de controle dos usuários sobre o ambiente, como questões relacionadas à privacidade, iluminação, temperatura, acústica e outros elementos de projeto. Por fim, relações entre espaço e natureza, além de outras distrações positivas, devem estar incorporadas na discussão do habitar como fomentador do progresso holístico do homem. Os módulos habitacionais foram divididos conforme estágio no circuito do apenamento, por comportarem condições diferentes de habitar e convívio interpessoal, como condições distintas de compartilhamento e contato com visitantes e maior ou menor tempo de encarceramento obrigatório. A rotatividade dos usuários, e com isto dos companheiros de moradia, deve ser levada em conta em cada uma das etapas.
82
Os principais núcleos de atividades definidos foram: 1. íntimo, dormir: cama, armazenamento de objetos importantes, maior autonomia e menor interação; 2. sanitários, banho, manutenção, dml 3. estudo, lazer individual, distração positiva: escrivaninha, armazenamento 4. lazer em grupo, tv, pequenas e médias interações 5. cozinhas e pequenas refeições
Nesta página Figura 37: Organogramas de relações de atividades e de ambientes referentes ao módulo habitacional. Fonte: elaborados pela autora.
DORMIR
ESTAÇÕES DE TRABALHO REFLEXÕES, APRENDIZADO, LAZER INDIVIDUAL
LAZER EM GRUPO
MANUTENÇÃO E LAVAGEM
ABLUÇÃO
ARMAZENAMENTO DE OBJETOS PESSOAIS
TV EM GRUPO
REFEIÇÕES EM GRUPO
REFEIÇÕES LEVES
NECESSIDADES FISIOLÓGICAS RELAXAMENTO, RECREAÇÃO
PREPARAÇÃO DE ALIMENTOS
1 2
1 4
3 1
1 5
1
4
2
3 1
83
1
1
Nesta página Figura 38: Isométrica de um módulo habitacional H1 para 16 reclusos. Fonte: elaborada pela autora. Na página seguinte Figura 39: A1- Célula individual - V I B1- Célula individual - V II C1-Célula dupla - V I D1- Célula individual - V III D2- Corte célula individual - V III E1- Célula individual - V IV F1- Célula dupla - V II G - Isométrica variações células individuais H - Isométrica variações células duplas. Fonte: elaborado pela autora.
H1: Este espaço deve abrigar durante curta duração detentos que passarão por triagens, avaliações e classificações criminológicas, com muitas das atividades de tratamento obrigatórias não iniciadas. O nível de interação entre eles deve ser controlável, permitindo que os usuários determinem níveis de exposição e intimidade. Utensílios de armazenamento e estações individuais podem fazer a conexão entre os núcleos mais privativos e os espaços compartilhados devem ser privilegiados quanto a aspectos qualitativos (iluminação, conforto ambiental, visuais etc.) e não fomentadores de estresse. Propõe-se células moduladas para um e duas pessoas, um sistema para abrigar as necessidades mais íntimas do indivíduo, que permite diferentes formações de mobiliários, como mesas de apoio e de estudo, assim como a composição de aberturas e fechamentos.
0
84
1
5
A1
B1
C1
A2
B2
C2
D1
E1
F1
D2
E2
F2 0
G
H
85
1:150
1
5
86
Na página anterior Figura 40: Colagem do módulo habitacional H1. Fonte: Imagem elaborada pela autora. Nesta página Figura 41: Colagem do módulo habitacional H2. Fonte: Imagem elaborada pela autora.
H2: Neste módulo, os presos devem estar agrupados em grupos menores, de quatro a oito detentos, favorecendo uma melhor interação entre os mesmos. Este não deve ser acessível a visitantes externos e as interações devem acontecer nos espaços de visitas íntimas ou de socialização. Assim como no H1, ambientes compartilhados devem ser valorizados quanto à iluminação, vista e espacialidade. O bloco deve ser composto por células íntimas moduladas, espaços de estar compartilhados conectados por aberturas geradas pelos próprios usuários, espaço para preparo de alimentos e refeições, além de banheiros.
87
Nesta pรกgina Figura 42: A- Planta baixa mรณdulo habitacional H2 - tipo a B e C- cortes do mรณdulo habitacional H2 - tipo a. Fonte: elaborado pela autora.
A
B
C
1:150
0
88
1
5
Nesta pรกgina Figura 43: D- Planta baixa mรณdulo habitacional H2 - tipo b E e F- cortes do mรณdulo habitacional H2 - tipo b. Fonte: elaborado pela autora.
D
E
F
1:150
0
89
1
5
0
90
1
5
Na página anterior Figura 44: Isométricas módulo habitacional H2. Fonte: elaborado pela autora. Nesta páginas Figura 45: Colagem módulo habitacional H2. Fonte: elaborada pela autora.
91
H3: Este estágio confere maior autonomia ao detento, com mais horas livres de atividades obrigatórias e maiores possibilidades de interação com terceiros. Visitantes autorizados podem acessar estes ambientes em horas programadas, demandando maior privacidade compartilhada. Assim, os módulos H3 devem ser individuais, equipados com banheiro e utilitários para o dia-a-dia. Nesta página Figura 46: A- isométrica H3 B - planta baixa H3 C- cortes módulo H3 Fonte: elaborado pela autora.
B
A
C
B A
C 0
92
1
1:150 5
Nesta pรกgina Figura 47: colagem mรณdulo H3. Fonte: elaborada pela autora.
93
Nesta pรกgina Figura 47: colagem mรณdulo H3. Fonte: elaborada pela autora.
94
Nesta página Figura 48: A- isométrica módulo habitacional H4. B- planta baixa módulo habitacional H4. Fonte: elaborado pela autora.
H4: O quarto módulo deve fornecer amparo aos detentos que estão em processo de liberação mas não têm moradia estável para retornar, funcionando como um tipo de albergado. A privacidade para as atividades mais íntimas deve ser conferida com mobiliários adequados, como beliches e camas com fechamento para conferir privacidade mais íntima.
0
0
95
1
1
5
5
A
B
Nesta página Figura 49: Módulo para visitas íntimas. A - isométrica módulo visitas B- planta baixa módulo visitas C- corte módulo visitas Fonte: elaborado pela autora.
C 1:150
0
96
1
5
Aprender, capacitar Este módulo deve comportar atividades de ensino e capacitação profissional, buscando melhorar o desempenho, envolvimento, recompensas e satisfação individuais (JAMES, 2015, p.8). Quanto mais coerentes com as necessidades e vocações específicas dos usuários, mais efetivos serão os esforços realizados neste domínio. Assim, sugere-se a aplicação de princípios de estilos de aprendizado e instrução experimental para melhor performance espacial. Segundo teoria do aprendizado experimental (KOLB, 1984, p. 194), o ato de aprender é melhor concebido como um processo, e para potencializá-lo, o foco principal deve ser o engajamento dos alunos no mesmo, incluindo feedbacks dos seus esforços de aprendizagem. Para Dewey (1987, apud KOLB, 1984, p.197), a educação deve ser concebida como uma reconstrução da experiência individual e todo aprendizado é um re-aprendizado, facilitado por um procedimento que trabalha em cima de ideias e crenças estabelecidas, examinando-as e integrando novas e mais refinadas concepções. Ainda, afirma a importância de contrastes e conflitos dentro de um processo holístico de adaptação ao mundo, mobilizando todo o funcionamento individual — pensar, sentir, perceber e comportar-se. Conforme termos de Piaget (apud KOLB, 1984, p. 198), aprender acontece através do equilíbrio de processos dialéticos da assimilação de novas experiências dentro de conceitos existentes e da acomodação de conceitos existentes em novas experiências. Os diferentes estilos de aprendizado podem ser melhor adequados às características individuais com o uso de tecnologia ou de sistemas de mobiliários projetados para responder a uma variedade determinada de atividades. Os grupos de atividades devem ser pensados de forma a facilitar interações e individualização, com poucos detentos por equipe. Devem ser criados espaços hospitaleiros e acolhedores, espaços para aprendizagem conversacional, para desenvolvimento de expertises, para ação e reflexão, sentir e pensar e para desenvolvimento de 97
Nesta página Figura 50: Módulo educação básica. A - isométrica mobiliário educação básica para 8 pessoas B- planta baixa mobiliário educação básica para 8 pessoas C- corte mobiliário educação básica para 8 pessoas D - isométrica mobiliário educação básica para 6 pessoas E - planta baixa mobiliário educação básica para 6 pessoas F - corte mobiliário educação básica para 6 pessoas Fonte: elaborado pela autora.
responsabilidade pelo próprio progresso. Para Kolb (2006, p. 52), o método de instrução experimental pode ser visto como um modo de locomoção entre diferentes regiões de aprendizado, influenciado pelas características individuais de assimilação. Ao invés de ser um processo universal, funciona como um mapa de territórios de treinamento distintos que viabiliza a prosperidade de e interrelação de diferentes estilos. Assim, sugere-se que estes espaços sejam fluidos, podendo acomodar diferentes estilos de ensino e apreensão sem muito esforço. A assistência tecnológica permite maior adequação do treinamento e direcionamento às carências individuais, através, por exemplo, de computadores ou óculos digitais que viabilizam ensino
A
D
B
E
C
F
1:150
0
98
1
5
Nesta página Figura 51: colagem módulo educação básica. Fonte: elaborada pela autora.
à distância ou assistida. Propõe-se uma subdivisão em atividades de educação básica, de educação especializada/vocacional, educação situacional, capacitação prática e ocupações laborais. Alguns destes serviços devem ser prestados e compartilhados com a comunidade, isto é, com todos os quatro tipo de usuários: detentos, equipe, visitante, externo. Espaços ociosos podem ser exportados ou redimensionados conforme potenciais e necessidades do entorno. A fragmentação da atividade em grupos pequenos permite até que profissionais de educação e capacitação externos possam atuar no espaço por interesses específicos, como a preparação de detentos para inserção no mercado.
99
A
C
B
D
E
F
1:150
0
100
1
5
Recreação
Na página anterior Figura 52: Módulo educação especializad, capacitação e educação situacional. A - planta baixa educação vocacional B- corte educ. vocacional C- planta baixa capacitação prática D - corte capacitação prática E - planta baixa educação situacional F - corte educação situacional Fonte: elaborado pela autora.
O setor de recreação busca aumentar o envolvimento e satisfação de atividades de lazer não criminosas, devendo fornecer amparo para atividades esportivas, de lazer compartilhado, meditativas etc. (JAMES, 2015, p.8). Para Gutierrez e Almeida (2008, p.100), lazer e presídios expõem-se em opostos, no qual o primeiro pode ser caracterizado pela busca de um prazer, partindo-se da ideia do sujeito como agente histórico, agindo por vontade própria em um contexto de limitações materiais e conflitos individuais ou entre grupos. Para Goffman (1996), a estaticidade tenebrosa de presídios e a reprodução do ilícito pelos padrões de força, linguagem e grupos são questões que devem ser levadas em conta no funcionamento da dinâmica interna do sistema prisional. O entendimento a partir da dicotomia lazertrabalho dificulta a abordagem entre lazer e presídios convencionais, visto que a reclusão promove o ócio e as atividades desenvolvidas têm mais cunho terapêutico que de lazer. “(…) o tempo das obrigações na reclusão não teria um contraponto, isto é, o preso só possui o tempo de privação de liberdade; o espaço, em uma instituição fechada, impede a existência do lazer, por não existir a característica de livre escolha e movimento” (ALMEIDA E GUTIERREZ, 2008, p. 102). Autores que discutem o sistema prisional, como Playfard (1969) e Goffman (1996), e o lazer, como Dumazedier (1979) e Marcellino (1987), insinuam pontos chaves pelos quais o lazer surge como algo inviável na conjuntura atual de presídios: a partir da ideia de trabalho como contraponto e elemento constituinte fundamental do lazer, os presos, por não trabalharem, não possue-no; e as atividades realizadas são recreativas e não de lazer, apesar de também funcionarem como mitigador de tensões. Segundo Gutierrez (2008, p. 103): (…) Refere-se às atividades dos presos como recreativas e não de lazer. A busca do prazer é o elemento fundamental para a constituição do lazer e recrear-se parte também desse
101
pressuposto. Esta separação foi idealizada pelos autores das teorias dicotômicas, com o intuito de dividir as atividades lúdicas no ambiente de obrigação social, isto é, as atividades de lazer seriam as atividade das obrigações sociais. Por isso as atividades lúdicas dos presídios poderiam ser consideradas recreativas. (…)
Este módulo deve amparar recreações de cunho terapêutico e diferentes atividades de lazer enquanto busca de prazer, que tem importância reforçada por trabalhar com a ideia de grupos e suas relações sociais. A inserção do mundo de fora da prisão nestas atividades pode ser vista como uma barreira à criação de uma identidade intramuros definida pela delinquência (ALMEIDA E GUTIERREZ, 2008, p. 117).
A reabilitação deveria promover a incorporação das regras compartilhadas no mundo da vida. Porém, ocorre um distanciamento das normas compartilhadas porque os reclusos não possuem um ambiente propício para a transformação. Deste modo a reclusão serve como instituição de valorização das normas, tendo como objetivo ser o espelho social para reforçar nos indivíduos livres as regras impostas (ALMEIDA E GUTIERREZ, 2008, p. 116).
O processo de envolvimento dos detentos com atividades recreativas e distrativas também deve perseguir a ideia de um mapeamento de performances para grupos de diferentes tamanhos (divisores ou múltiplos de 16, preferencialmente). Diferentes estratégias de monitoramento podem viabilizar uma flexibilização do determinismo programático rígido, permitindo o uso deste território de maneira mais dinâmica e volátil, conferindo certo grau de poder de decisão aos recuperandos, como qual atividade realizar e horário de preferência. Estão sendo propostos para responderem demandas recreativas: espaços de leitura, de atividades audiovisuais, de atividades artísticas e trabalhos manuais, de hobbies e de esportes ou atividades físicas. Devido a seu caráter social, estes 102
ambientes devem ser compartilhados com usuários adventícios, de modo a diminuir o impacto da privação de liberdade e reclusão neste âmbito individual e e aproximar a realidade interna da externa ao cárcere. O lazer mais informal também deve ser sublinhado na discussão do sistema, devendo ser incorporado na forma de nichos multifuncionais e adaptáveis. A oferta e disponibilidade igualitária destes recursos pode impactar positivamente sobre o convívio e tensão entre usuários, além de diminuir seu uso como ferramenta de poder e dominância de presos sobre outros.
103
A 0
1
5
1:200
B
0
104
1
5
C
Na página anterior e nesta página Figura 53: Módulo recreação A - isométrica audiovisual e leitura B- planta baixa audiovisual e leitura C- planta baixa espaço hobbies e oficinas manuais D - planta baixa exercícios do corpo Fonte: elaborado pela autora.
D
105
1:250
0
1
5
Outros
O conjunto de atividades e ambientes correspondentes proposto deve ser complementado com componentes auxiliares mais variáveis, como o módulo administrativo, apoio para profissionais e funcionários, sanitários a serviço da unidade, entre outros. O programa deve ser alterado conforme potencialidades e problemas do entorno no qual estará sendo implantada a unidade penal. Ainda, devem ser previstos repostas programáticas para questões como acessibilidade dos ambientes e módulo habitacional adaptado, restaurante e cozinha, nichos de convivência e encontros, incluindo um módulo para encontro familiar com crianças, pontos de controle de acessos e circulação, entre outros.
A
Nesta página Figura 54: Módulo habitacional acessível A - planta baixa B- corte Fonte: elaborado pela autora.
B 0
106
1
5
A atribuição de grupos menores para o funcionamento das atividades descritas demanda uma lógica mais complexa de desempenho espacial, visto que as incumbências deverão se dar em um número maior de sessões distribuídas ao longo da semana para cobrir a totalidade de detentos incididos. Em contrapartida, oferece melhores condições de interações interpessoais, individualização aplicada e dinâmica de rotina menos enrijecida, grande vantagem dentro do contexto de reclusão e cárcere. A lógica de ocupação pode ser comparada à distribuição de salas disponíveis, aulas necessárias e turmas existentes na montagem de um componente curricular. Nas páginas seguintes ilustrou-se um exemplo de composição de rotina de um dia de diferentes usuários possíveis da unidade. É importante salientar, por fim, que o gerenciamento integrado assistido por tecnologias de monitoramento e processamento de dados, assim como inteligências artificiais, tornam-se extremamente bem vindos para otimizar e viabilizar o exercício alvidrado.
Na página seguinte Figura 55: Diagrama exemplo de rotinas de um dia por usuário. Fonte: elaborado pela autora.
107
ADMINISTRAÇÃO
RECUPERAÇÃO DEPENDÊNCIA QUÍMICA E SAÚDE
VISITAS ÍNTIMAS E FAMILIARES
EDUCAÇÃO E CAPACITAÇÃO
ESPAÇOS DE CONTROLE E ÁREAS TÉCNICAS
HABITAÇÃO ESTÁGIO 2
LAZER E RECREAÇÃO
HABITAÇÃO ESTÁGIO 1
HABITAÇÃO ESTÁGIO 3
TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL
RESTAURANTE
HABITAÇÃO ESTÁGIO 4
108
HORAS
00 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23
DETENTO ESTÁGIO 1
DETENTO ESTÁGIO 2
DETENTO ESTÁGIO 3
DETENTO ESTÁGIO 4
VISITANTE
109
110
5
Experimentação propositiva de uma unidade prisional
O tipo proposto, entendido aqui como uma relação entre expectativas sociais e estrutura espacial edilícia, deve ser ajustado conforme necessidades e oportunidades de seu entorno. Assim, o programa descrito pode compor respostas de diferentes tamanhos — determinados pelos agrupamentos de atividades e usuários — e organizações formais. A integração e vinculação de sistemas inteligentes possibilitam melhores respostas às necessidades locais e otimização de recursos. Espaços compartilhados, como os módulos de educação e capacitação, o de recreação e lazer, ou até mesmo o de saúde, podem ser redimensionados para comportar um número mais expressivo de usuários externos. Da mesma forma, oportunidades extrínsecas de capacitação, integração profissional, espaços de lazer, entre outras, podem ser incorporadas no sistema. A proposta deve ser vista como um sistema em si que deve ser vinculado a sistemas externos para melhorar ambas performances.
111
112
Na
=
P Hu Ha
x (Oa)
Onde: Na : Número de ambientes P: População prisional total Hu: Horas úteis semanais disponíveis Ha: Horas por sessão de atividade Oa: Ocupação de detentos por sessão de atividade Fonte: Equação elaborada pela autora.
Para quantificar-se os núcleos de atividades explanados, adicionou-se critérios de tempo e espaço, determinando-se quais os usuários, ocupação por uso — número de detentos — e carga horária mínima semanal para sua realização. As incumbências principais relacionadas ao tratamento, com exceção do módulo habitacional, devem estar contempladas nas 12 horas úteis diárias, de segunda à sexta. Criouse uma equação para determinação do número de ambientes necessários para a realização de cada atividade, buscando maior economia e otimização do espaço edificado. Devido à recomendação de um máximo de 250 presos por unidade federal — o menor dos tipos existentes —, optou-se por adotar um número semelhante para simulação do estudo piloto, facilitando posteriores comparações entre produto proposto e realidade existente. Também, de maneira geral recomendam-se números reduzidos de reclusos por organismo prisional, facilitando sua operação. A ideia de modulação, além de aplicada na espacialização e técnicas de construção, deve ser também incorporada na quantificação de ambientes, de modo a criar uma relação clara entre número de detentos e demanda espacial por tipo atividade. A tabela na página seguinte é um subproduto da etapa de programação arquitetônica, conferindo dados quantitativos de ambientes em uma escala de macro funcionamento. O estudo piloto programático foi simulado para um total de 240 presos, com agrupamentos por atividade variáveis entre 1, 2, 4, 8 e 16 e + detentos por atividade, promovendo diferentes níveis de interação, privacidade e dinâmicas programático-funcionais.
113
ESTUDO PILOTO PROGRAMÁTICO DE UMA UNIDADE PRISIONAL CAPACIDADE: 240 PRESOS
HABITAR ESTÁGIO 1 550 m2 48 detentos 11,00 m2/detento HABITAR ESTÁGIO 2 900 m2 80 detentos 11,25 m2/detento HABITAR ESTÁGIO 3 1000 m2 80 detentos 12,50 m2/detento HABITAR ESTÁGIO 4 45 m2 32 detentos 1,50 m2/detento RECREAÇÃO E LAZER 1200 m2 esportes atividades artísticas audiovisual leitura hobbies
A
B
84
16
3
84
8
10
84
1
80
12
16
2
7 7
16 8 16 32 8
1 1 2 1 1
7
C
A: HORAS POR SEMANA | B: OCUPAÇÃO DE DETENTOS POR ATIVIDADE | C: NÚMERO DE AMBIENTES
114
A
B
EDUCAÇÃO E CAPACITAÇÃO 1800 m2 educação básica 20 8 educação especializada 10-20 4 educação situacional 4 8 capacitação especializada
RECUPERAÇÃO QUÍMICA 175 m2 6 detentos desintoxicação reuniões em grupo módulo de saúde TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL 275 m2 salas de apoio individual e em grupos OUTROS 750 m2 restaurante administração apoio equipe áreas técnicas espaços espirituais e meditativos
C
10 20 2
24 1 4 8
6 1
2 2
4 2
10
1 8
300 1
A: HORAS POR SEMANA | B: OCUPAÇÃO DE DETENTOS POR ATIVIDADE | C: NÚMERO DE AMBIENTES
115
116
117
Na página seguinte Figura 61: Colagem ilustrando a periferia de Santiago, com transportes de alta velocidade. Fonte: elaborada pela autora.
Tomemos como campo de experimentação Santiago del Chile, cidade que enfrenta grave superlotação de seus presídios. A ideia de descentralizar o sistema em unidades menores permite uma distribuição estratégica das mesmas ao longo do território, adaptando-se às potencialidades e características do entorno e abrangendo uma maior parcela da população. Mesmo terrenos mais longínquos podem ser viabilizados condicionados à oferta de transportes de alta velocidade que têm o feliz impacto de encurtar distâncias. A sudeste da capital temos Puente Alto, fronteira de expansão da urbe para as montanhas de San José del Maipo. Se escolhêssemos um dos muitos terrenos vazios de sua periferia com potencial de crescimento, a implantação de um equipamento deste tipo poderia ser dimensionado conforme demanda do entorno e tendo, inclusive, maior possibilidade de ocupação do terreno e exploração de integração com a natureza. Sistemas de monitoramento inteligentes e automatizados, junto a uma ocupação espacial decentralizada, podem criar amparo para dinâmicas funcionais mais complexas.
118
119
Na página seguinte Figura 62: Colagem ilustrando a ocupação de Manhattan. Fonte: elaborada pela autora.
Em uma abordagem diferente teríamos, por exemplo, uma cidade como Nova Iorque, com grande potencial e tendência à verticalização. Em um lugar cujo solo tem valores eminentes, a ocupação de um terreno com apenas uma unidade penal poderia levar à subutilização do mesmo. Se imaginássemos a locação de um módulo penal na ilha de Manhattan, o mesmo poderia estar ocupando o espaço aéreo, acoplado a um complexo de uso misto. Se tomássemos como exemplo a área do pavimento da torre do One World Trade Center, maior arranha-céu das Américas, um módulo para 240 detentos poderia ser implantado em três lâminas da mesma, ocupando cerca de 2% de sua área construída. O controle de acesso ao módulo se daria apenas pelos núcleos centrais de circulação vertical. Com a banalização e expansão de sistemas de monitoramento e rastreamento, algumas atividades recuperativas podem ocorrer até mesmo fora deste recorte, em outros pavimentos da edificação, ou em outros lugares da cidade.
120
121
1. Informação disponibilizada no mapa interativo do Código Urbano. Fonte: <https://www.codigourbano.
org/nao-acabou-o-espaco-paraconstruir-em-sao-paulo/)>. Acesso em 06 de setembro de 2018. Na página seguinte Figura 63: Colagem ilustrando o cenário de São Paulo. Fonte: elaborada pela autora.
A implantação em áreas de meio urbano adensado sugere uma ocupação compacta, otimizando o uso dos terrenos disponíveis. Entornos complexos, de uso miscigenado e com justaposição de sistemas distintos que compõem a urbe devem ser encarados como maiores potenciais de integração do composto penal do qual a unidade proposta faz parte. A incorporação da fiscalização penal a sistemas de vigilância da cidade robustece a possibilidade de extravasar as atividades programáticas da edificação. O terreno escolhido para a experimentação propositiva de um modelo a partir do tipo definido ao longo deste trabalho está localizado no distrito Itaim Bibi, em São Paulo, cidade com destaque mundial por sua verticalidade e adensamento. Situa-se na Zona Oeste, sob administração da Prefeitura Regional de Pinheiros. É um bairro nobre, de alto gabarito e que comporta sedes de grandes empresas. O lote está atualmente subutilizado, de propriedade do INSS1 e possui cerca de 9.300 m². Em seu entorno próximo temos o Parque Povo, o Shopping Iguatemi JK e complexos empresariais. Faz fronteira com o túnel Pres. Jânio Quadros, com a Av. Henrique Chamma e com a Rua Professor Geraldo Ataliba.
122
123
Figura 64: Itaim Bibi, SĂŁo Paulo, 2018. Entorno do terreno escolhido. Fonte: Google Earth. Editado pela autora.
124
125
Figura 65: Ilustração do entorno. Itaim Bibi, São Paulo, futuro. Fonte: Elaborado pela autora.
126
127
Neste cenário, a ocupação limitada do solo nos direcionou a uma ideia de arranjo compacto, como um cubo ou uma esfera, sendo o primeiro escolhido para esta exploração. Definiu-se, assim, uma projeção quadrada de 40m x 40m. A distribuição do programa ao longo do volume seguiu dois critérios principais. O primeiro deles refere-se aos diferentes usuários dos módulos componentes da unidade: detentos, visitantes, externos e profissionais. Uma gradação da mobilidade dos usuários ao longo do eixo vertical sugeriu três blocos principais: um primeiro, com atividades compartilhadas entre detentos, visitantes, profissionais e pessoas externas; um intermediário, sem acesso a indivíduos forasteiros não vinculados a reclusos; e por fim, um restrito a visitantes e pessoas sem conexão.
Nesta página Figura 66: Planta de situação do terreno e entorno. Em projeção, proposta de implantação do modelo penal. Fonte: elaborado pela autora. Na página seguinte Tabela de relações entre os diferentes usuários e as atividades abrigadas. Legenda: Preto - relação forte; Hachurado - relação média; Branco relação fraca. Fonte: elaborada pela autora. Na página seguinte Figura 67: Diagrama de distribuição vertical do programa. Fonte: elaborado pela autora.
R. P RO
F. G E
RAL
ATA LIB
A
AV. HEN R
IQU
EC HAM
MA
DO
TÚN
EL P
RES
. JÂ
QUA
DRO
S
AV. CHE DID J
AFE
T
NIO
0
50 ESCALA 1:3000
128
ATIVIDADES | USUÁRIOS
FUNCIONÁRIOS PROFISSIONAIS
EXTERNOS
VISITANTES
DETENTOS I
II
III
IV
TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL RECUPERAÇÃO E DEPENDÊNCIA QUÍMICA HABITAR E RELAÇÕES INTERPESSOAIS H1 - HABITAR ESTÁGIO 1 H2 - HABITAR ESTÁGIO 2 H3 - HABITAR ESTÁGIO 3 H4 - HABITAR ESTÁGIO 4 VISITAS ÍNTIMAS ENCONTROS EDUCAÇÃO E CAPACITAÇÃO EDUCAÇÃO BÁSICA EDUCAÇÃO ESPECIALIZADA OU VOCACIONAL EDUCAÇÃO SITUACIONAL CAPACITAÇÃO ESPECIALIZADA OU VOCACIONAL LAZER OUTROS ADMINISTRAÇÃO ÁREAS TÉCNICAS RESTAURANTE
O primeiro bloco, responsável pela conexão do edifício ao seu entorno, é formado pelo térreo, primeiro e segundo pavimentos. Neste contexto, recebe em quase totalidade os módulos de educação/ capacitação e recreação/lazer, assim como setor administrativo, restaurante e módulo habitacional H4. O segundo pavilhão pode ser transitado por detentos, visitantes e funcionários, sendo restrito a usuários desvinculados. Deve comportar o módulo habitacional H3 (terceiro estágio), amparo para encontros com visitas autorizadas — como família, advogados, entre outros —, setor de visitas íntimas e familiares. Por fim, o terceiro e último compartimento deve ser acessível apenas a detentos e profissionais relacionados, amparando os módulos de habitação H1 e H2, setor de Terapia Cognitivo-comportamental e saúde/recuperação de dependência química. Os espaços de aprendizado situacional também foram posicionados neste bloco, por não servirem a usuários externos e fazerem parte das atividades de todo o percurso do circuito penal proposto. 129
Nesta página Figura 68: Diagrama de relações da unidade com o exterior e interior.. Fonte: elaborado pela autora.
O segundo critério parte do questionamento do que as pessoas vêem e como isso pode contribuir no processo de reintegração individual. O que elas vêem de fora e o que observam internamente ? O tempo que passamos confinados em construções não é, necessariamente, o problema. A sociedade contemporânea já encara a míngua progressiva do usufruto de espaços externos, sejam eles públicos ou privados, e o aumento da reclusão em ambientes fechados. A monotonia do confinamento, no entanto, é uma das consequências negativas do engessamento arquitetônico — principalmente nos modelos construídos almejando-se a simplicidade e racionalidade formal por preceitos de vigilância e contenção. Manter o miolo do edifício interessante é um desafio que necessita mobilizar o experimentalismo do usuário, as relações entre indivíduo-espaço e as interpessoais, sejam elas contatos visuais ou de livre mobilidade. Para isso, o vazio de seu âmago, o espaço remanescente a partir da distribuição do programa nas lâminas do volume, ganha grande importância por sua potencialidade de entreter e de transformar a ambiência interna da unidade.
130
Nas páginas seguintes será apresentada de maneira diagramática a distribuição programática ao longo do edifício -- em plantas e cortes --, de maneira relacionada à forma do vazio remanescente deste arranjo. As plantas em maior escala podem ser encontradas no QR code ao lado ou em anexo.
131
RECUPERAÇÃO DEPENDÊNCIA QUÍMICA E MÓDULO DE SAÚDE
EDUCAÇÃO E CAPACITAÇÃO
ADMINISTRAÇÃO
VISITAS FAMILIARES
132
ESPAÇOS DE CONTROLE E ÁREAS TÉCNICAS
RECREAÇÃO E LAZER
HABITAÇÃO ESTÁGIO 1
HABITAÇÃO ESTÁGIO 3
HABITAÇÃO ESTÁGIO 4
HABITAÇÃO ESTÁGIO 2
TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL
RESTAURANTE
133
TÃ&#x2030;RREO
1
2
3
4
5
e
e
d
d
c
c
b
b
a
a
1
2
3
4
5
0
134
50
PRIMEIRO PAVIMENTO
SEGUNDO PAVIMENTO
0
135
50
TERCEIRO PAVIMENTO
QUARTO PAVIMENTO
0
136
50
QUINTO PAVIMENTO
SEXTO PAVIMENTO
0
137
50
SÃ&#x2030;TIMO PAVIMENTO
OITAVO PAVIMENTO
0
138
50
NONO PAVIMENTO
COBERTURA
0
139
50
Nesta página Figura 75: Cortes esquemático com distribuição vertical do programa. Fonte: elaborado pela autora.
5
4
3
2
1
e
e
d
d
c
c
b
b
a
a
5
4
3
2
1
140
Nesta página Figura 76: Cortes temáticos com marcação do vazio interno. Fonte: elaborado pela autora.
5
4
3
2
1
e
e
d
d
c
c
b
b
a
a
5
4
3
2
1
141
142
O vazio e suas adjacências
Na página anterior Figura 77: programa explodido. Fonte: elaborada pela autora. Nesta página Figura 78: diagramas formais de cheio e vazio. Fonte: elaborados pela autora.
O vazio foi encarado como um espaço com potencial de gerar conexões e atração. A ideia de compacidade formal pode ser encontrada em diversos modelos penais, inclusive no próprio Panóptico. Nesta exploração, porém, o miolo deve receber atividades diferentes de apenas circulação e vigilância, como nichos de encontro e permanência compartilhada. Espera-se que a colocação do homem neste elemento formal possa criar dinâmicas que combatam o desinteresse gerado pela estaticidade e estagnação da arquitetura.
143
144
Na pĂĄgina anterior e nesta Figuras 79, 80, 81: fotografias maquetes volumĂŠtricos de estudo. Fonte: tiradas pela autora.
145
146
147
Nas pĂĄginas anteriores Figuras 82, 83, 84 e 85: fotografias maquetes volumĂŠtricos de estudo. Fonte: tiradas pela autora.
148
Nestas pรกginas Figuras 86, 87: fotografias maquete programรกtica de estudo. Fonte: tiradas pela autora.
149
150
151
Circulação vertical A circulação vertical ao longo do edifício deve ocorrer pelos elevadores — entre os três blocos explanados — e por escadas distribuídas de maneira a criar circuitos de percursos dentro de cada setor. A ideia é que mecanismos automatizados de vigilância possam aumentar a mobilidade individual dentro de compartimentos isoláveis.
Rotas de fuga Atualmente a questão da evacuação de edificações prisionais em caso de sinistros tem fomentado grandes discussões. Além da tipologia não ser contemplada em normas para cálculo e dimensionamento de saídas de emergência, algumas das características físicas mais recorrentes, como o uso de grades para delimitar ambientes, não impedem a propagação de fumaça e fogo entre os pavilhões componentes. Um dos empecilhos encontrados está em como desocupar a construção dado que seus usuários têm liberdade de locomoção comprometida. Nesta experimentação, optou-se por fazer a soma da população da lâmina com os parâmetros mais restritivos: o segundo pavimento, com módulos de educação/capacitação e recreação/lazer. A NBR 9077/2001 prevê a utilização de áreas de retenção — espaços com resistência a fogo de pelo menos quatro horas e com acesso direto às saídas de emergência — para reduzir o dimensionamento das rotas de fuga e facilitar a evacuação de tipologias com fluxos complexos, como hospitais. Este elemento foi inserido acima do primeiro bloco, abaixo dos módulos habitacionais, em um pavimento técnico que, além de receber a área de retenção, deve prever um espaço para concentrar equipamentos responsáveis pelo funcionamento de subsistemas da edificação.
152
Nesta página Figuras 89, 90: diagrama de circulações verticais (superior) e de rota de fuga para evacuação da edificação, com uso de áreas de retenção. Fonte: elaborados pela autora.
153
154
155
Sistemas Somados a este objeto arquitetônico definido por barreiras e permeabilidade, opacidade e transparências, temos uma série de outros sistemas que devem ser ajuntados e integrados entre si para prover soluções técnicas que contribuam positivamente para a performance do tipo edilício. A mesma lógica de ordenamento modular deve ser adotada, facilitando esta compatibilização de componentes. Entende-se que existem diversas respostas possíveis para materializar a dinâmica edificada que tem sido proposta e, com a produção de conhecimento e avanços tecnológicos correntes e iminentes, acredita-se que estas deverão ser cada vez mais otimizadas para melhoria de desempenhos e redução de custos operacionais. Esta integração não precisa acontecer apenas dentro da unidade, mas também com elementos e sistemas externos a ela. Temos, por exemplo, a possibilidade de criar uma unidade que, além de autossuficiente em consumo energético, também seja geradora e exportadora para seu entorno. Outro exemplo possível seria a utilização do subsolo do terreno como estacionamento para servir à cidade, ou com outro tipo de prestação de serviço. Em ambos os casos, existem diferentes possibilidades de inserção do edifício penal nas dinâmicas da cidade de maneira vinculada.
Nas páginas anteriores Figuras 91, 92, 93 e 94: fotografias maquete programática de estudo. Em vermelho, blocos de circulação vertical. Fonte: elaborados pela autora.
156
157
158
159
160
6
Considerações finais
O caminho que alguns governos têm tomado na interpelação do problema penitenciário ao redor do mundo é assustador. O grande aumento da taxa de aprisionamento e consequente superlotação dos estabelecimentos demanda a construção urgente de novos presídios, que surgem majoritariamente na forma de modelos ultrapassados. Ainda que exista um grande descompasso entre o desempenho esperado do tipo prisão pela penalogia moderna e sociedade contemporânea e o resultado obtido, a inovação se dá de maneira dificultada, com respostas arquitetônicas engessadas a um programa denso e intricado. Sob a ótica do conceito de tipo edilício de Quatremère de Quincy e da teoria da lógica social do espaço de Hillier e Hanson, existe uma regra que antecede a materialização da arquitetura, como um texto que poderá ser lido através da edificação. Este, por sua vez, está fundamentado nas expectativas e relações sociais que deverão ser abrigadas na mesma e no papel do espaço tanto de intermediador destas interações como de agente atuante. A complexidade do tipo edilício penal dificulta o processo de mudança dos modelos construídos, corroborando para a manutenção de conformações práticas sobrepujadas pelos estudos que comprovam sua ineficácia. É importante que seja feita uma reconstrução da narrativa que se quer erguer através da arquitetura penal, e mais imprescindível ainda que isto seja feito de maneira holística e interdisciplinar, potencializando o alcance de melhores resultados. Diante desta perspectiva, este trabalho buscou contribuir com a construção de um raconto especulativo possível, definindo um novo texto — 161
um tipo arquitetônico para uma classificação penal específica — que pode servir de base para inovar e conduzir a uma nova realidade acerca da problemática abordada. Devido à lentidão inerente à própria arquitetura, assim como sua capacidade de perpassar e servir a diferentes épocas, assume-se a importância do papel que o arquiteto tem em levar em conta a temporalidade do edifício, incorporando-a em seu escopo. Planejamentos a longo prazo podem viabilizar uma mobilização interdisciplinar, com respostas integradas que permitam o compartilhamento das obrigações e expectativas de desempenho das edificações prisionais. Assim, pôde-se alcançar uma espacialização mais livre de pré concepções do que deveria ser um espaço de reclusão, aproximando-a de preceitos de reintegração social. A racionalização e modulação das relações e atividades inerentes ao programa permitiu a formulação de um tipo com grande margem para exploração. O mesmo processo propositivo adotado pode ser aplicado para outras variações de classificações penais, construindo um panorama mais geral do que deve ser alcançado. A aplicação e experimentação propositiva de um organismo programático completo possibilitou ainda o entendimento e visualização de como o módulo proposto pode ser incorporado em uma unidade total, e ainda como vínculos externos podem contribuir e viabilizar a aplicação deste tipo de equipamento. Acreditamos que as prisões como conhecemos estão fadadas ao fracasso e torna-se extremamente necessário que nos esforcemos para encontrar respostas melhores. Ao longo deste trabalho, ficou ainda mais evidente o longo percurso que deve ser trilhado na reformação da conjuntura atual e como nós, responsáveis por desenhar soluções para problemas, precisamos tomar papel mais ativo na proposição de alternativas diferentes que viabilizem a idealização de um novo escopo penal que possa ser aplicado frente às iniciativas de investimento no referido domínio. 162
Bibliografia
AGOSTINI, F. M. O edifício inimigo: A Arquitetura de estabelecimentos penais no Brasil. 2002. Dissertação (Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo) — Escola de Arquitetura e Urbanismo, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte. ALEXANDER, C. A Pattern Language: Towns, buildings, construction. Nova Iorque: Oxford University Press, 1977. BARATTA, Alessandro. Ressocialização ou controle social: uma abordagem crítica da “reintegração social” do sentenciado, 1990. Disponível em: <http:// www.eap.sp.gov.br/pdf/ ressocializacao.pdf>. Acesso em : 10 de março de 2018. BAUMAN, Z. Liquid Modernity. Cambridge: Polity Press, 2001. BENELLI, SJ. Foucault e a prisão como modelo institucional da sociedade disciplinar. In: A lógica da internação: instituições totais e disciplinares (des) educativas [online]. São Paulo: Editora UNESP, 2014, pp. 63-84. ISBN 978-85-68334-44-7. Disponível em: SciELO
Books <http://books. scielo.org>. Acesso em 02 de maio de 2018. BENTHAM , J. et al. O Panóptico. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2008 BERTALANFFY, Ludwig von. Teoria geral dos sistemas. Rio de Janeiro: Vozes, 2008. BRAGA, Ana Gabriela Mendes. Reintegração social: discursos e práticas na prisão — um estudo comparado. 2012. Tese de doutorado — Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, USP, São Paulo. BRASIL. [Lei de Execução Penal (1984)]. Lei de execução penal: lei nº 7.210, de 1984, que institui a Lei de Execução Penal, e legislação correlata. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de edições Câmara, 2010. BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Comissão Parlamentar de Inquérito do Sistema Carcerário. CPI sistema carcerário. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2009. 620 p. (Série ação parlamentar ; n. 384). BRASIL. Ministério da Justiça e da Segurança. Departamento
164
Penitenciário Nacional. Levantamento nacional de informações penitenciárias: INFOPEN. Atualização — Junho de 2014. Brasília: Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2015. BRASIL. Ministério da Justiça e da Segurança. Departamento Penitenciário Nacional. Levantamento nacional de informações penitenciárias: INFOPEN. Atualização — Junho de 2016. Brasília: Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2017. BONSIEPE, G., KELLNER, P. e POESSNECKER, H. Método experimental: Desenho Industrial. Florianópolis: LDP/DI, 1984. BORBA, C. Até os limites do tipo: Emergência, adequação e permanência das propriedades sócioespaciais dos edifícios de re-formação. 2008. Dissertação (Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Urbano) — Universidade Federal de Pernambuco, Recife. BORBA, D. M.; CORREIA, I. C. M. Reintegração social: Estratégias de intervenção junto aos encarcerados. ETIC, v. 3, p. 1–13, 2009.
BOTELLA, Elena Mata. El análisis gráfico de la casa. 2002. Tese de doutorado (Departamento de Ideación Gráfica Arquitetónica) — Escuela Técnica Superior de Arquitectura de Madrid — Universidad Politécnica de Madrid, Madrid, 2002. BOYNE, R. Post-panopticism. Economy and Society, v. 29, n. 2, p. 285–307, 2000. CAMARGO, Virginia da Conceição. Realidade do Sistema Prisional, 2006. CARRABINE, E. et al. Criminology: A Sociology Introduction. 2. ed. Nova Iorque: Routledge, 2009. CARVALHO FILHO, L. F. A prisão. São Paulo: Publifolhas, 2002. CASEY, P. M. et al. Offender Risk & Needs Assessment Instruments: A Primer for Courts. National Center for State Courts, p. 111, 2014. CHAN, Karen Hoi Man. Recover in Place: Architecture for Living and Wellbeing in San Francisco’s Tenderloin District. 2017. 86 p. Tese (Mestrado em Arquitetura)- University of Washington, Washington, 2017. Disponível em: <http://hdl.handle.
net/1773/40784>. Acesso em: 20 fev. 2018. CHERRINGTON, D. J. Crime and Punishment: Does Punishment Work? Hayes International: The Hayes Report on Loss Prevention, v. 22, n. 2, p. 2–3, Fruitland Park, Florida, 2007. CLARKE, R. A. Information Technology and Dataveillance. Communication of the ACM, v. 31, n. 5, p. 498–512, 1988. CORDEIRO, Suzann. Até quando faremos relicários: a função social do espaço penitenciário. Maceió: EDUFAL, 2006. CORDEIRO, Suzann. O espaço penal x indivíduopreso: dinâmicas do espaço habitado. Revista Brasileira de Segurança Pública, v.5, n. 8, pp. 122137, 2011. DOVEY, Kim and DICKSON, Scott. Architecture and Freedom? Programmatic Innovation in the Work of Koolhaas/OMA. Journal of Architectural Education (1984-), 04 fev. 2017. Vol. 56, No. 1, pp. 4-13. ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. Ministério da Justiça. Making Prisons Work: Skills for Rehabilitation.
165
[s.l: s.n.]. 2011. ESTECA, A. C. P. Arquitetura penitenciária no Brasil: análise das relações entre arquitetura e o sistema jurídico-penal. 2010. Dissertação (Programa de Pesquisa e Pós-Graduação da FAU) — Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de Brasília, Brasília. ESTEVES, Ana Margarida Correia. Flexibilidade em Arquitetura: Um contributo adicional para sustentabilidade do ambiente construído. Dissertação (Mestrado em Arquitetura) — dARQ FCTUC, Coimbra, 2013. FERREIRA, V.; OTTOBONI, M. Método APAC: sistematização de processos. Belo Horizonte: Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, Programa Novos Rumos, 2016. FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Tradução de R. Ramalhete. Petrópolis: Vozes, 1987. GALIČ, M.; TIMAN, T.; KOOPS, B. J. Bentham, Deleuze and Beyond: An Overview of Surveillance Theories from the Panopticon to Participation. Philosophy and Technology, v. 30, n.
1, p. 9–37, 2017. GOMES, L. B. et al. As origens do Pensamento Sistêmico: Das partes para o todo. Pensando Famílias, v. 18, n. 2, p. 3–16, 2014. GUTIERREZ, Gustavo and ALMEIDA, Marco Bettine de. Cultura e Lazer: Uma Aproximação Habersiana. Lua Nova, São Paulo, nº 74, pp. 93-130, 2008. HENNING, K.; LABRECQUE, R. M. Introduction to Risk Assessment for Criminal Justice Administrators. Disponível em: <https:// multco.us/file/61283/ download>. Acesso em 19 de maio de 2018. HESSELINK-LOUW, A. E. Criminological Assessment of Prison Inmates: A Constructive Mechanism Towards Offender Rehabilitation. 2004. Tese de Doutorado (Departamento de Literatura e Filosofia) — Universidade da África do Sul. HESSELINK, A.; BOOYENS, K. Correctional Criminology: An Innovative South African Practice. Southern African Journal of Criminology, v. Special Ed, n. 1, p. 1–15, 2014. HEIDEGGER, Martin. Building Dwelling Thinking.
In: Poetry, Language, Thought. Nova Iorque: Harper Colophon Books, 1971 . p. 42.
be brutal, bland or beautiful? Scottish Justice Matters, v. 2, n.1, pp. 8-11, 2014.
HEIDEGGER, Martin. Construir, Habitar, Pensar. In: Ensaios e Conferências. (trad.) Márcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis: Vozes. 2ª ed. 2002.
JEWKES, Yvonne (dir.) Handbook on Prisons. London: Routledge, 2007.
HILLIER, B; HANSON, J. The social logic of space. Cambridge: Cambridge University Press, 1984.
JOHNSTON, Norman. The Human Cage: A Brief History of Prison Architecture. Nova Iorque: Walker and Co., 1973. LAWSON, B. How designers think: The Design Process Demystified. Burlington: Elsevier, 1981. v. 2
JAMES, N. Risk and Needs Assessment in the Criminal Justice System. Congressional Research Service, p. 32, 2015. JESPERSEN, J. L.; ALBRETCHSLUND, A.; ØHSTRØM, P. H.; ALBRETSEN, J. Surveillance, Persuasion, and Panopticon. In: KORT, Y. et al. Persuasive Technology: Second International Conference on Persuasive Technology. Palo Alto: Persuasive, 2007. p. 109120. JESUS, M. P. A. de. Considerações sobre o habitar cotidiano no pensamento de Martin Heidegger. [s.i.] 2007. JEWKES, Yvonne; MORAN, Dominique. Should prison architecture
166
JULIÃO, E. F. O sistema penitenciário como fenômeno urbano. 2012.
KOOLHAAS, Rem; MAU, Bruce. S, M, L, XL. Nova York, The Monacelli Press, 1995. LIDDICOAT, Stephanie. Architecture as Therapy Bloodletting: Beauty spills forth from the Wound. 2010. 247 p. Tese de Mestrado (Mestrado em Arquitetura)- Faculdade de Arquitetura e Design, Universidade de Wellington, Wellington, Nova Zelândia, 2010 LOGSDON, L.; AFONSO, S.; DE OLIVEIRA, R. A Funcionalidade e a Flexibilidade como Garantia da Qualidade do Projeto de Habitação de Interesse Social. II
Simpósio Brasileiro de Qualidade do Projeto no Ambiente Construído SBQP 2011. X Workshop Brasileiro de Gestão do Processo de Projeto na Construção de Edifício, p. 223–234, 2011. LYON, D. Surveillance, Power and Everyday Life. Em: MANSELL, R. (Ed.). Oxford Handbook of Information and Communication. [s.l.] Oxford University Press, 2009. p. 1–37. MACAULAY, Fiona. Os Centros de Ressocialização no Estado de São Paulo: Um novo modelo para a administração penitenciária. São Paulo, 2015. MARTIN, B.; HANINGTON, B. Universal Methods of Design: 100 ways to research complex problems. 1. ed. Beverly: Rockport Publishers, 2012. MARX, G. T. Surveillance Studies. International Encyclopedia of the Social & Behavioral Sciences, Ed. 2, p. 733–741, 2015. MATHIESEN, T. The Viewer Society: Michel Foucault’s ‘Panopticon’ Revisited. Theoretical Criminology, v. 1, n. 2, p. 215–234, 1997.
MORAN, D.; JEWKES, Y. Linking the carceral and the punitive state: A review of research on prison architecture, design, technology and the lived experience of carceral space. Annales de géographie, v. 702–703, n. 2, p. 163, 2015.
PEREIRA, R. R. Otimização do espaço arquitetônico prisional: mapeamento sistêmico e projeto. In: Estudos Interdisciplinares em Ciências Biológicas, Saúde, Engenharias e Gestão. [s.l: s.n.]. p. 275–303.
MORAN, D.; JEWKES, Y.; TURNER, J. Prison design and carceral space. In: Handbook on Prisons: Second Edition, n. Moran 2015, p. 114–130, 2016.
PIAT, Myra et al. (Em)placing recovery: Sites of health and wellness for individuals with serious mental illness in supported housing. Health & Place, [S.l.], set. 2017. Vol. 47, p. 71-79. Disponível em: <https:// doi.org/10.1016/ jealthplace.2017.07.006>. Acesso em: 28 jul. 2018.
MORRIS, R. G.; WORRALL, J. L. Prison Architecture and Inmate Misconduct: A Multilevel Assessment. Crime and Delinquency, v. 60, n. 7, p. 1083–1109, 2014. PAZZIAN, R.M. A descaracterização da prisão como forma de ressocializar o indivíduo. p. 17, 2014. Disponível em: < https://www.conamp. org.br/pt/biblioteca/ artigos/item/556-adescaraterizacao-daprisao-como-forma-deressocializar-o-individuo. html>. Acesso em 20 de maio de 2018. PEÑA, William M.; PARSHALL, Steven A. Problem Seeking An Architectural Programming Primer. New York: John Wiley & Sons. Inc., 2001. 225p.
167
REIMAN, J. H. Driving to the Panopticon: A Philosophical Exploration of the Risks to Privacy Posed by the Highway Technology of the Future. Santa Clara, California: Computer & High Technology Law Journal, v. 11, n. 1, p. 27–44, 1995. SÁ, Alvino Augusto de. Arquitetura Carcerária e Tratamento Penal. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 79, n. 651, p. 247-257, jan.1990. SÁ, Alvino Augusto de. Sugestão de um esboço de bases conceituais para um sistema penitenciário.
São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, Secretaria de Administração Penitenciária, Departamento de Reintegração Social, Manual de reintegração Social, 2005, p. 13. Disponível em:<http:// www.sap.sp.gov.br/ download_files/reint_ social/apresentacao/ sugestao_esboco.doc>. Acesso em: 04 de março de 2018. SHERIDAN, Connor. Foucault, Power and the Modern Panopticon. Dissertação — Trinity College, Hartford, 2016. Trinity College Digital Repository. Disponível em: <http:// digitalrepository.trincoll. edu/theses/548>. Acesso em: 02 de maio de 2018. SILVA, A. B. E. Baratta , Foucault e a questão criminal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, v. 123, n. Setembro, p. 16, set. 2016. SUN, Érika W. Y. Pena, prisão, penitência. 2008. Dissertação de mestrado (Programa de Pós-Graduação da FAU) — Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de Brasília, Brasília.
Rehabilitation Programs. Legislative Analyst’s Office, p. 20, 2017. THOMPSON, Barbara A. Prison design and prisoner behavior: philosophy, architecture and violence. 1980. Dissertação — Oberlin College, Ohio. TORPEY, J. Through Thick and Thin : Surveillance after 9 / 11. Contemporary Sociology, v. 36, n.2, pp. 116-119. Anais. 2015 TRAVIS, J. But they all come back: Rethinking prisoner reentry. Washington: Sentencing & Corrections: Issues for the 21st Century, v. 7, p. 1–11, 2000. ULRICH, R. S. A theory of supportive design for healthcare facilities. J Healthc Des, v. 9, n. March, p. 3–4, 1997. WENER, R. E. The environmental psychology of prisons and jails: Creating humane spaces in secure settings. Cambridge: Cambridge University Press, 2012.
TAYLOR, M. Improving In-Prison
168
169