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Justiça, Estado e Direito

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Igreja Católica

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(SANTO AGOSTINHO DE HIPONA)

Na “República” de Cícero, Cipião define o povo como uma massa unida em sociedade no reconhecimento comum de um direito e na comunhão de interesses. O que ele entende por direito reconhecido, é o que explica no desenvolvimento da exposição; e com isto mostra que sem justiça o Estado não pode governar-se; que onde não existe a verdadeira justiça, não pode haver o direito. O que se realiza segundo o direito, certamente é justo; as ações injustas, pelo contrário, não podem ser realizadas segundo o direito. Com efeito, não podem chamarse direito as disposições injustas dos homens, visto que eles próprios afirmam que é direito aquilo que promana da fonte da justiça; e que é falso o que alguns afirmam, com base nas ideias erradas: que o direito é aquilo que tiram proveito os mais poderosos.

Portanto, onde não existe a verdadeira justiça, não pode haver a união de uma massa associada pelo comum reconhecimento de um direito; e por isso não pode haver um povo, segundo a definição de Cipião ou, melhor, de Cícero; e, se não existe o povo, sequer a coisa pública, porém somente uma massa amorfa indigna do nome de povo.

Por isso, se o Esta-do é a coisa pública e se não existe o povo se não há o reconhecimento do direito – e não há direito onde não há justiça -, daí sem dúvida alguma se deduz que onde não existe justiça não há o

Estado. Mas a justiça é a virtude que atribui a cada um o que lhe pertence. Por conseguinte, como se pode falar de justiça no homem se não se atribui ao Deus verdadeiro justamente o homem e o sujeitamos aos demônios imundos? Acaso é isto dar a cada um o que lhe pertence? Quem retira um poder do legítimo possuidor e o dá a quem sobre ele não tem nenhum direito, é injusto; e quem subtrai a si mesmo do domínio de Deus, por quem foi criado, e sujeita-se aos espíritos malignos, porventura é ele justo?

(De: “A Cidade de Deus”, Livro XIX, cap. XXI. Santo Agostinho, 354-430, Bispo de Hipona. Importantíssimo teólogo e filósofo e, além disso, um dos grandes santos da Igreja. Sua festa litúrgica é no dia 28 de agosto e o dia anterior, 27 de agosto, é reservado à memória de sua mãe, Mônica, sobre quem ele escreveu, de forma muito sensível e comovente, em suas “Confissões”).

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