a mulher e a cidade uma análise de espaços urbanos sob a perspectiva de gênero
iullin marques gonçalves UMA ANÁLISE DE ESPAÇOS URBANOS SOB A PERSPECTIVA DE GÊNERO
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“Para participar como cidadãos iguais na pólis, mulheres devem reivindicar o espaço público.” CYNTHIA BOWMAN, 1993 (tradução livre)
a mulher e a cidade
UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA Bacharelado em Arquitetura e Urbanismo Trabalho Final de Graduação I Aluna: Iullin Marques Gonçalves Orientadora: Letícia Viana
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sumário Resumo
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Abstract
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Introdução
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Capítulo 1 A divisão sexual do trabalho Repressão, supressão e substituição A imagem da cidade
10 12 17 26
Capítulo 2 Metodologia Barra da Tijuca Maracanã Madureira Cidade de Deus
36 38 40 52 62 74
Capítulo 3 Metodologias de solução Estratégias de ação Cronograma TFG 2 Plano de necessidades
86 88 94 99 100
Conclusão
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Bibliografia
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resumo Este caderno propõe a hipótese de que a misoginia se manifesta no planejamento urbano e, como resultado, molda o espaço urbano e a relação que a mulher tem com a cidade. O trabalho possui o objetivo de estudar como esta estrutura social se manifesta, com um enfoque na segurança da mulher em relação à violência de gênero; como aplicação do tema, foram selecionados pontos em 4 bairros da cidade do Rio de Janeiro para receberem um diagnóstico do espaço sob esta perspectiva. Foram realizadas enquetes e entrevistas com mulheres para auxiliar nesta análise; verificou-se que, apesar dos diferentes contextos urbanos, muitas das patologias identificadas são as mesmas, e, quando diferentes, possuem a mesmo problema raiz, produzindo efeitos similares nas mulheres. Como propostas de solução, foram sugeridas as vias do urbanismo tático e urbanismo social como formas mais eficientes de lidar com o problema. Concluiu-se que a relação da mulher com a cidade é disfuncional, distorcida pela hostilidade que o espaço urbano apresenta, e que como principal solução deve-se incorporar a perspectiva da mulher na construção do espaço. Palavras-chave: mulher. espaços urbanos. misoginia. violência de gênero. planejamento urbano. urbanismo tático. urbanismo social.
abstract This paper raises the hypothesis that misogyny is manifested in urban planning and, as a result, shapes urban spaces and the relationship women have to the city. This work aims to study how this social structure manifests itself, with a focus on women's safety relating to gender-based violence. Specific spaces in 4 neighborhoods in the city of Rio de Janeiro were selected to receive a diagnosis through this perspective. Forms and interviews with women were done to help with this analysis; it was verified that, in spite of the different urban contexts, many of the issues identified in those spaces are the same, and, when different, have the same root problem, causing similar effects in women. As possible solutions, tactical urbanism and social urbanism were suggested as efficient ways to deal with the problem. It was concluded that women's relationship to the city is dysfunctional, warped by the hostility that urban spaces present, and that as a main solution women's perspective must be incorporated in the making of the city.
Keywords: women. urban spaces. misogyny. gender-based violence. urban planning. tactical urbanism. social urbanism.
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introdução Baseado na hipótese de que a subjugação histórica da mulher em relação ao homem se manifesta e se perpetua no espaço urbano – sendo este um dos pilares fundamentais na consolidação desta estrutura social – este caderno tem como objetivo servir de base conceitual e metodológica para a segunda parte do Trabalho Final de Graduação de mesmo tema. Conceituando-se em autores como Friedrich Engels, Diana Agrest, Kevin Lynch e muitos outros, explora-se os contextos social e histórico da misoginia – desde a sua formação e sua relação com o sistema capitalista de produção, aos efeitos da exclusão da mulher no planejamento urbano, até à distorção da imagem que a mulher possui da cidade, com um enfoque no contexto da violência de gênero e como este fator cria uma sensação constante de insegurança no espaço urbano.
O tema é então aplicado em trechos diversos da cidade do Rio de Janeiro – em pontos específicos nos bairros da Barra da Tijuca, Maracanã, Madureira e Cidade de Deus – com o intuito de explorar as possíveis formas que o problema pode se manifestar na construção (e manutenção) do espaço urbano. É importante entender os contextos únicos dos espaços a serem analisados, já que o problema no planejamento – apesar de possuir a mesma raiz – pode se manifestar de formas opostas em contextos diferentes. Por fim, o caderno apresenta também propostas de estratégias de ação, baseadas nos conceitos de urbanismo tático e urbanismo social/acupuntura urbana de Jaime Lerner, métodos mais comuns e eficientes de reparar a situação do espaço urbano neste contexto social. Vale ressaltar que as manifestações da misoginia no espaço urbano são apenas uma faceta de um problema muito maior, que abrange questões que vão muito além do planejamento urbano. O intuito deste trabalho é de apresentar uma proposta de abordagem do tema no contexto urbanístico, instigando questionamentos e trazendo maior ciência à questão da relação da mulher com o espaço urbano, e a sua importância para o problema global da subjugação da mulher.
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capítulo 1 • A divisão sexual do trabalho • Repressão, supressão e substituição • A imagem da cidade
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a divisão sexual do trabalho Friedrich Engels (1884): “a primeira divisão do trabalho foi a que ocorreu entre homem e mulher visando a geração de filhos.” Ao longo da história global, a mulher foi e é submetida (por meios legais e culturais) a uma posição não apenas diferenciada, mas inferior em relação ao homem. Baseada nas diferentes funções reprodutivas da espécie humana, cria-se uma divisão denominada divisão sexual do trabalho, que atribui à mulher o trabalho reprodutivo – reprodução da espécie e manutenção do lar – e, ao homem, o trabalho que é considerado produtivo – trabalho que gera, de fato, capital (VIANNA, 2014). A divisão sexual do trabalho não atribui valores iguais aos diferentes papeis, sendo ela uma hierarquia de produção. Neste contexto, a mulher é reduzida a um papel de reprodutora e servente. Consi-
dera-se produção (porém não tratada como tal, ou seja, remunerada) as tarefas domésticas e a geração de filhos – sejam eles parte da futura classe trabalhadora, seja eles detentores dos bens de capital. O casamento monogâmico também garante, em teoria, que estes filhos sejam filhos de seu pai, ou seja – o herdeiro legítimo de seus bens (ENGELS, 1884, p. 84). Longe de acidental ou meramente conveniente, a divisão sexual do trabalho apresentou-se como peça-chave para o desenvolvimento do sistema capitalista de produção: [O] trabalho doméstico, em primeiro lugar, cria sim valor: ao transformar, por exemplo, a comida em alimento há agregação de valor. Além disso, a gratuidade e desvalorização criam um cenário de exploração da força de trabalho feminina, que é necessária para a lógica de reprodução do capital, pois é a partir do trabalho da reprodução que se permite o cotidiano da vida das pessoas (família e do homem trabalhador da esfera produtiva) e, ainda, é pelo trabalho da mulher que se reproduz a força trabalhadora, que se criam as novas gerações que poderão ser utilizadas como mão de obra. Explica-se: o trabalho doméstico, gratuito e invisível da forma como é realizado, não entra “na conta” do capital: é o que permite que o homem da família, por exemplo, trabalhe mais, pois não realiza as tarefas, que também deveriam ser sua, com a casa e com a família e é o que permite que as mulheres ocupem cargos mais precarizados e seus salários sejam vistos como complemento do masculino, visto como o verdadeiro provedor para as necessidades da casa, e que as mulheres aceitem trabalhos de meio período, irregulares, com salários baixos ou que não respeitam os direitos mínimos da trabalhadora. Não se poderia, portanto, vislumbrar a continuação do capitalismo sem a exploração do trabalho doméstico (das mulheres), da maneira como é, desvalorizado, pois assim tem-se uma base gratuita no sistema de produção. Se entrasse na conta final do capital, os lucros diminuíram, e haveria maior distribuição de renda, o que não interessa ao capitalista. (VIANNA, 2014, p. 24-25)
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Se não fosse pelo trabalho doméstico não-remunerado realizado pela mulher, todos esses serviços seriam realizados por profissionais pagos – para aqueles que possuem condições financeiras – ou pelos próprios trabalhadores. Se o homem trabalhador possui em casa uma esposa que lava, passa e cozinha para a família, ele pode trabalhar até altas horas para seu chefe. E, se o homem burguês possui uma esposa em casa que executa estas funções, ele economiza recursos ao não ter que contratar algum profissional. Apesar dos efeitos da divisão sexual do trabalho afetarem a classe proletária em geral, logicamente, o fato de que estes papeis são hierarquizados significa que um se beneficia em detrimento do outro. As mazelas geradas pelo sistema capitalista para a população não apenas se intensificam para a mulher, mas também tomam formas específicas. Neste caso, para a mulher, as consequências são desastrosas: sem poder financeiro algum, a mulher fica à mercê do patriarca – seu pai ao nascer, e seu marido ao casar-se. De acordo com Edésio Fernandes (2007, apud SANTORO, 2008), no mundo, 95% das mulheres não possuem conta bancária – sendo todo o poder financeiro da família controlado, então, pelo homem.
No mundo, 95% das mulheres não possuem conta bancária.
Tenta se justificar a situação da mulher pela ideia de que o homem provê um lar e bens para a mulher, e isso seria uma divisão de trabalho “justa”; na realidade, a condição da mulher pouco se assemelha a de um trabalhador formal: não há contrato, remuneração regulamentada, carga horária máxima, direitos trabalhistas ou normas de segurança. O homem, apesar de uma posição semelhante à
do empregador, não cumpre nenhum dos deveres deste. A desvalorização tanto da mulher como de seu trabalho reprodutivo cria também uma desvalorização da esfera doméstica no geral (associada à mulher, e por ser supostamente improdutiva). Cria-se também uma falsa dicotomia entre a esfera pública e a privada, atribuindo a elas valores político e apolítico, respectivamente, reforçando a ideia de que a política não deveria atingir a esfera do lar (VIANNA, 2014). A criação desta dicotomia público/privado e a sua hierarquização servem como pretexto para o abuso generalizado da mulher: A divisão sexual do trabalho, entre esferas produtivas e reprodutivas, cria também uma divisão entre espaço público e espaço privado. Se o trabalho reprodutivo, destinado às mulheres, é realizado no lar, será ele, portanto, sempre associado ao âmbito privado. Já o reprodutivo, dos homens, é realizado na rua, empresa, fábrica, trabalho fora do espaço da casa, portanto no espaço público. Essa divisão faz com que o espaço público seja de dominação masculina, excluindo as mulheres. Essa exclusão é grave se pensarmos que o espaço público é considerado o espaço político por excelência, sendo que o lar sempre foi colocado como espaço unicamente de competência da família (ou seja, realiza-se uma hierarquização de esferas, considerando a casa/lar/ família como algo “apolítico”, que não deve ser publicizado). (...) Essa dicotomia público/privada foi (e é) crucial para a compreensão da opressão das mulheres, pois com ela surge a ideia de que tudo o que ocorre no âmbito da família, do lar, ou seja, no espaço privado, é problema apenas da família e não deve haver intervenção pública, nem de outras pessoas nem do Estado, para resolver. O problema dessa ideia é que legitima a violência contra a mulher, que ocorre em sua grande maioria por pessoas conhecidas (companheiros, maridos, familiares) exatamente no
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âmbito privado. É a base da expressão popular “em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher”. Acontece que são estes os casos nos quais é extremamente necessária a intervenção da sociedade, pois as mulheres vítimas de violência doméstica têm enorme dificuldade em sair dessa situação, pois dependem ou economicamente ou mesmo emocionalmente dos parceiros violentos, e talvez por não querer desmanchar o núcleo familiar, visto que ainda caberia a elas os cuidados dos filhos e do lar, em caso de separação do casal. (VIANNA, 2014, p. 25-26)
A divisão sexual do trabalho possui um inerente desequilíbrio de poder, facilitando situações de abuso financeiro, físico, emocional e sexual. Não há garantia de que o homem não irá agir de forma abusiva e violenta contra sua esposa, e em contextos onde não há nenhum amparo legal para vítimas de violência doméstica, não há nada que o impeça de fazê-lo, e nenhum lugar para qual a mulher possa recorrer. O problema de violência de gênero torna-se, então, um problema “do lar”, pessoal, que deve ser resolvido de forma privada sem que o Estado se envolva – ou seja, sem consequências legais reais para o agressor. É necessário destacar que mais de 2/3 dos feminicídios ocorrem em casa (Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2019). E, mesmo em relacionamentos onde não há violência explícita, a dependência financeira da mulher ao homem não lhe dá liberdade para escolher alguma opção que não seja servir a um homem de graça. Sem recursos em seu nome, é impossível qualquer tipo de emancipação se não se permite que a mulher tenha independência de bens ou quaisquer meios de alcançá-los. A mulher é afetada de forma constante pelo medo de viver informalmente (SANTORO, 2008). Este medo a confina a situações não-ideais em casa, sendo forçada a tolerá-las (entre um ou múltiplos casamentos) pois não há opções fora de casa a não ser as ruas. E as ruas, por sua vez, dificilmente são melhores.
repressão, supressão & substituição Bernard Tschumi (2005): "o contexto é comumente ideológico." Devido à condição histórica da mulher de exclusão de ocupações que não pertencessem à esfera doméstica – o que inclui, logicamente, as áreas de arquitetura e urbanismo – o espaço da cidade não é planejado para mulheres. Ao longo da história, para os homens que, de fato, trabalhavam com planejamento, não havia razão para incorporar a perspectiva da mulher, seus medos e anseios – afinal, considerava-se que ela “não pertencia” ao espaço público, mas sim ao espaço do lar. Ela não deveria navegar a cidade livremente – não era o seu lugar. Em seu texto À margem da arquitetura: corpo, lógica e sexo (publicado na compilação Uma Nova Agenda para a Arquitetura, organizada por Kate Nesbitt em 1996), a arquiteta e urbanista Diana Agrest define
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o sistema da arquitetura como “o corpo de textos e regras desenvolvido no Renascimento que, como leitura dos clássicos, estabeleceu os fundamentos da arquitetura ocidental” (p. 585). Neste contexto, arquitetos renascentistas faziam uso do antropomorfismo codificado por Vitrúvio (80 A.C.–15 A.C.), onde o corpo humano é caracterizado como perfeito e harmônico, e a arquitetura e o urbanismo idealmente deveriam seguir suas proporções de maneira análoga (p. 587). Mas, diferentemente dos textos ambíguos de Vitrúvio, autores como Filarete e Francesco di Giorgio Martini “suprimem a ambiguidade original do gênero do corpo em questão, deixando explícito que a figura humana é sinônimo da figura masculina.” (p. 589) Sendo assim, o corpo da mulher – com suas diferentes funções e proporções – é automaticamente excluído deste sistema da arquitetura.
A arquitetura e o planejamento urbano frequentemente seguiam a anatomia ou a lógica do corpo do homem, considerado perfeito.
De acordo com Agrest (1996), “a substituição do corpo da mulher pelo corpo do homem sempre se dá na função maternal de reprodução” (p. 594). Certos autores chegam a assemelhar explicitamente a função do arquiteto – neste contexto, invariavelmente homem – à função materna; outros atribuem ao umbigo masculino – do corpo perfeito e harmônico, mas que não provê alimento – a função de “ventre” urbano, o centro da cidade de onde surge toda a vida: Em Filarete, o arquiteto, um homem, dá à luz como uma mulher. Em Di Giorgio, o centro da cidade, segundo a configuração do corpo do homem, provê subsistência, como o corpo da mulher, pelo cordão umbilical, desde o útero até a cidade inteira. No primeiro caso, as fantasias de concepção e reprodução dos homens se corporificam na figura do arquiteto; no segundo caso, elas são inscritas nos princípios de organização da configuração formal da cidade. Desse modo, a mulher é suprimida, reprimida e substituída. (AGREST, 1996, p. 594)
Ou seja, mesmo enquanto a mulher é excluída de forma literal e simbólica da arquitetura, estando apenas o homem presente em todos os outros aspectos – construindo cidades, criando o sistema da arquitetura a seu ver – o homem ainda se apropria (desta vez simbolicamente) da “produção” da mulher, da sua designada função: a única que lhe é valorizada, a ponto de ser confundida com o “ser mulher”. Dentro deste contexto, como simplesmente não havia mulheres na área do planejamento urbano ou arquitetônico, e sua perspectiva era completamente negligenciada, a atitude torna-se um gesto de supressão, repressão e substituição (p. 594). Apesar dos gestos de exclusão explícita – literal e simbólica – não foi possível eliminar totalmente, de todas as formas, a presença da mulher no planejamento urbano. Apesar das extensivas restrições, muitas mulheres reconheciam seu potencial e sua afinidade pelo tema, e encontravam outras maneiras de trabalhar
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na área: Porque mulheres (...) não tinham acesso à expertise técnica disponível para arquitetos e engenheiros civis homens, elas foram excluídas das profissões de ‘construção de cidade’, e utilizaram o serviço social como uma via por onde poderiam exercer seu interesse e dedicação a questões de reformas sociais e urbanas. (WIRKA, S. M., 1998, p. 157, tradução livre)
Susan Marie Wirka (1998) aponta: “de fato, alguns estudiosos argumentam que mulheres criaram a profissão de serviço social precisamente porque queriam um caminho profissional para seu trabalho de reforma quando não havia nenhum aberto a elas.” (p. 157-158, tradução livre). Graças às ações extensivas de movimentos feministas ao longo dos dois últimos séculos, especialmente no século XX, a mulher conseguiu conquistar (entre inúmeros outros) o direito de exercer as mesmas profissões realizadas pela outra metade da população – o que inclui, logicamente, ocupações que lidam com planejamento urbano de forma mais direta, como arquitetura, urbanismo e engenharia civil. De fato, 63,1% dos arquitetos e urbanistas ativos e registrados no CAU são mulheres, assim como 67% dos estudantes de arquitetura (CAU, 2019).
Mulheres compõem 63,1% dos arquitetos.
Mas apesar da presença contemporânea da mulher no planejamento, as cidades ainda não se configuram como um espaço do qual a mulher pode se apropriar, como veremos mais a fundo no próximo capítulo. Há algumas explicações: o desenvolvimento da cidade, por exemplo, não segue o mesmo ritmo cronológico do de um ser humano. Vivemos em ci-
dades que foram planejadas há cinquenta, cem anos ou mais. E, mesmo com planos diretores, que são feitos a cada dez anos, cada plano demora vários anos para serem implementados, e mais anos ainda devem ser contados para que seus efeitos possam ser devidamente analisados. E outra: mudanças políticas e legais não são necessariamente refletidas de forma imediata nas atitudes da sociedade, especialmente quando estas sustentam sistemas de exploração e subjugação enraizados nas relações humanas há milênios. A inserção da mulher no mercado de trabalho, por exemplo, não é perfeita – ainda se carrega um estigma de que a mulher se torna, eventualmente e invariavelmente, “reprodutora” e “dona de casa” – em outras palavras, não pode trabalhar tanto e/ou tão bem quanto o homem – o que se traduz em oportunidades de trabalho reduzidas devido à chamada dupla jornada de trabalho (VIANNA, 2014). Pela mesma razão que agrada ao empregador que o homem possua uma esposa em casa executando as tarefas domésticas, empregar esta mulher torna-se uma desvantagem. Isto leva muitas mulheres de classe média a empregar profissionais, geralmente mulheres (“empregadas domésticas”, quase que invariavelmente de classes baixas) a exercer estas funções em seus lares, reforçando a relação da misoginia com a classe social: É a mulher pobre trabalhadora a que mais sofre com a desigualdade de acesso ao espaço urbano, pois sofrem o que sofre a classe trabalhadora com o transporte precário, moradia precária, moradia distante do trabalho, quase nenhum acesso a lazer; e sofrem também o que sofrem as mulheres de maneira geral, como a insegurança na rua, o medo de sofre alguma violência física, como a sexual, ou o assédio nas ruas; e ainda
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sofrem pela condição de mulheres pobres, pois devem arcar com a dupla jornada de trabalho, sendo as responsáveis pela manutenção do lar e da família com recursos escassos, pela dependência de serviços públicos que são extremamente precários e distantes, como o acesso à saúde, educação dos filhos e das filhas, etc. (VIANNA, 2014, p.37)
A falta de representatividade histórica feminina das mais variadas ocupações ou cargos de poder – especialmente políticos – também fortalece a concepção de que a mulher é menos apta a exercer estas funções; ignorando, além da evidência ao contrário, o longo contexto histórico de verdadeira exclusão. Ocorre um desmerecimento do trabalho da mulher de forma generalizada. Apesar da presença no mercado de trabalho, a representatividade política não aumentou significativamente: Se por um lado a mulher está mais presente no mercado de trabalho (mesmo que ainda tenha muito a galgar na competitividade com homens em termos de cargos e salários), em termos de representatividade política, não tem aumentado a participação de mulheres como representantes: são poucas conselheiras, vereadoras, deputadas, senadoras, líderes dos movimentos sociais, entre outros. (SANTORO, 2008, p.5)
Mesmo com a eleição de mulheres a cargos de Presidente da República como Dilma Rousseff em 2010 e 2014, a participação da mulher na política, por exemplo, ainda é proporcionalmente baixa. A maior parte das figuras políticas são homens – no caso da Câmara dos Deputados, por exemplo, apenas 10,5% são mulheres, abaixo da média mundial de 23,6% (IBGE, 2018). Faz-se necessário compreender que o planejamento tem papel de expressão do interesse público. (SANTORO, 2008). E, se a presença política da mulher é baixa,
dificulta-se a execução de pautas relevantes a este grupo. Para questões de minorias, a representatividade ser baixa (e efêmera) é perigosa – não há tempo suficiente para pôr estas propostas em prática, especialmente tratando-se de cidade e de seu longo tempo de desenvolvimento.
Mulheres compõem 10,5% dos deputados.
Na esfera da arquitetura e do urbanismo, “a maioria dos dirigentes das entidades profissionais e premiados pela atuação profissional são homens, cenário que se reflete também no panorama internacional.” (CAU, 2019) Muitas vezes – de forma semelhante à apropriação metafórica mencionada por Agrest, e o desmerecimento do seu trabalho doméstico – seu trabalho na esfera da arquitetura e do urbanismo é apropriado e desmerecido pelos homens: É impressionante descobrir que praticamente todos os “grandes arquitetos” ou “grandes homens” da história da arquitetura e do urbanismo tiveram esposas também arquitetas trabalhando ao seu lado, ou melhor, à sua sombra, no desenvolvimento de seus projetos. Quando não esposas, existem sócias ou co-autoras que não receberam qualquer crédito ou reconhecimento pelo trabalho desenvolvido. (DE FONTES, 2016, p. 126)
A arquiteta americana Denise Scott Brown, cofundadora da firma Venturi, Scott Brown and Associates, escreve em Room at the Top? Sexism and the Star System in Architecture (1989): A primeira indicação de meu novo status [casada com o arquiteto Robert Venturi] surgiu quando um arquiteto cujo trabalho eu havia revisado disse, “Nós do escritório
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achávamos que era [Venturi] escrevendo, usando seu nome.” Na época que escrevemos Aprendendo com Las Vegas, nossa experiência crescente com atribuições incorretas levou [Venturi] a incluir uma observação no início do livro pedindo que o trabalho e ideias não fossem atribuídas somente a ele e descrevendo a natureza de nossa colaboração e os papéis dos indivíduos na nossa firma. Seu pedido foi quase que totalmente ignorado. (...) Quando Praeger publicou uma série de entrevistas com arquitetos, meu nome foi omitido da sobrecapa. Nós reclamamos e Praeger adicionou meu nome, mas contestando que isso iria estragar o design da capa. Na dobra interna, porém, “oito arquitetos” e “os homens por trás” da arquitetura moderna foram mencionados. Como nove foram listados na frente, concluo que ainda sou deixada de lado. (BROWN, 1989)
Esta tendência de desmerecimento se estende até para movimentos de bairro, fora do âmbito estritamente profissional. No mundo contemporâneo, as mulheres se envolvem de forma majoritária em movimentos de bairro, mas não se sentem confortáveis em ser ouvidas – e ainda são vistas como traidoras de seu “papel”: Uma pesquisa do Etapas sobre a presença das mulheres no Orçamento Participativo do município de Recife (2004) mostrou que 58% dos participantes eram mulheres e as conclusões do trabalho apontam para a necessidade de fortalecer a identidade de gênero na política de luta pelo direito à participação e democratização, pois apesar da forte presença das mulheres nas plenárias, 64,3% delas afirmam nunca expressar seu pensamento durante os trabalhos. [Iara Rolnik Xavier] destaca que a participação no movimento é contraditória para as mulheres: se por um lado, enxergam como uma forma de emancipação, alcance de liberdade por meio da possibilidade de desenvolver suas potencialidades além das funções domésticas; por outro, mostram que são tidas como traidoras do seu papel na vida doméstica, de dona de casa, mãe de família. (SANTORO, 2008, p.5)
Mulheres são 51,8% da população brasileira. (IBGE, 2019)
Por ser maioria em posições de poder, a perspectiva do homem ainda é a considerada “padrão” – mesmo quando este é, numericamente, menos da metade da população (IBGE, 2019) Com baixa representatividade, a questão da mulher torna-se minoritária. Sem a participação da mulher de forma significativa na face política do planejamento urbano, são criadas – e continua-se a criar – cidades que não são feitas para a maior parte da população. Ou seja, a cidade continua a ser planejada por homens, administrada por homens, incorporando apenas o dito padrão da perspectiva masculina. Neste contexto, como a cidade pode ser feita para alguém a não ser para homens? Como podemos falar da criação de espaços urbanos democráticos se a área do planejamento negligencia o estado das cidades atuais como um perigo para a maior parte da população?
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a imagem da cidade Julia Vansetti Miranda, Akkelies van Nes (2020): "a violência de gênero tem uma influência profunda no relacionamento da mulher com a cidade, indo além do pensamento consciente." (tradução livre) Deve-se compreender que, exatamente por ser um grupo vulnerável, as mulheres são geralmente afetadas de forma mais acentuada do que homens não apenas por desigualdades sociais, mas também socioterritoriais (SANTORO, 2008). Estas desigualdades podem se manifestar de várias formas, incluindo de formas tangíveis. A questão da falta de acessibilidade quando aplicada a uma calçada malcuidada e fora dos padrões da NBR 9050, por exemplo, afetaria um homem com dificuldades de locomoção (como um cadeirante); quando se trata da mulher, deve-se considerar não apenas a existência de mulheres com estas
mesmas necessidades especiais, mas também a existência de mães com carrinho de bebê, que também não poderiam se apropriar deste espaço (considerando que, tradicionalmente, é a mulher que exerce esta função de cuidadora de filhos, diminuindo a possibilidade da presença deste empecilho para o homem comum). É de extrema importância atentar-se também os efeitos da natureza sexual da misoginia. Mulheres compõem a esmagadora maioria de vítimas de estupro, com índices que podem chegar a 99% em alguns estados do país (Sinan, 2017). Como a agressão sexual é comumente utilizada como uma das maiores – se não a maior – ferramenta de subjugação por parte do homem em relação à mulher, os medos da mulher no espaço urbano se apresentam de forma que se conecta, em particular, à ameaça “final” da agressão sexual: Mulheres parecem ser o grupo mais afetado por perigos urbanos porque elas se sentem vulneráveis à violência sexual, que para elas constitui um crime grave, o que Ferraro (1996) chamou de efeito “sombra”: o medo da agressão sexual influencia todos os aspectos das suas vidas. (CONDON; LIEBER; MAILLOCHON, 2007, tradução livre)
Um espaço escuro e vazio na cidade, por exemplo, naturalmente incita sensações de apreensão e medo – visibilidade é pior sob baixa iluminação, e não há ninguém para socorrer em caso de emergência. Para o homem, que se insere no lado do opressor no contexto de subjugação da mulher e é vítima da maior parte dos assassinatos na rua (SIM, 2016) o medo da possibilidade de um assalto ou assassinato possivelmente precede a de agressão sexual. No caso da mulher, além da ameaça do assalto e do assassinato na rua (cuja incidência é mais baixa do que a do homem (SIM, 2016), mas de forma alguma inexistente), ela preocupa-se também com a possibilidade de estupro – muitas vezes, mais do que qualquer outro crime.
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Para este trabalho, foi realizada uma pesquisa em formato Google Forms de nome Análise da segurança da mulher em espaços públicos do Rio de Janeiro (2021). No formulário, que gerou 12 respostas, as entrevistadas foram questionadas acerca de seu comportamento no espaço urbano. Deve-se ressaltar que apenas 8,3% das entrevistadas dirigem. Avalie a intensidade do medo que você sente da possibilidade de sofrer os seguintes crimes. (1 - MENOS medo; 5 - MAIS medo) Intensidade do medo:
1
2
3
4
5 6 5
nº de respostas
28
4 3 2 1 0
Assalto/roubo
Assédio sexual
Sequestro
Estupro
Assassinato
Independente da questão de gênero, por conta de sua prevalência nos meios urbanos, o assalto/roubo recebe grande número de respostas de grau “5”; seguindo a mesma lógica, a prevalência comparativamente mais baixa de sequestros e assassinatos causa seus altos números de respostas com graus mais baixos. Nota-se a prevalência do medo de crimes de natureza explicitamente sexual – assédio sexual e estupro. O assédio sexual é prevalente o suficiente (apesar de muito raramente registrado), o que explica seu maior número de respostas de grau “5”. O estupro, apesar de menos comum, é um ato altamente violento e uma ameaça psicológica constante à mulher, sendo ele – junto ao feminicídio – for-
mas mais extremas e explícitas de ódio à mulher. Nota-se também que o crime de estupro, apesar de não receber o maior número de respostas de grau “5”, foi o crime que recebeu maior número de votos altos no geral (maior número de votos de grau “4”), e o único a não receber nenhuma resposta com grau abaixo de “3”. Em caso de emergência, você sente que pode confiar em outras pessoas para intervir na situação?
Sim
50%
50%
Não Talvez
Em caso de emergência, você sente que pode confiar na polícia para intervir na situação?
33,3% 16,7%
50%
Sim Não Depende da área
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Você já tomou alguma destas medidas por se sentir insegura na rua? Marque todas as opções que se aplicam.
Trocar o percurso
11 (91,7%)
Carregar objetos para autodefesa
4 (33,3%)
Mandar mensagens de texto ao sair de/chegar em algum lugar
10 (83,3%)
Atravessar a rua por receio de um estranho
11 (91,7%)
Ficar em casa em vez de sair para um evento
5 (41,7%)
Não vestir certas roupas Rejeitar algumas propostas de emprego
9 (75%)
0 (0%)
Em uma tentativa de contornar estas possibilidades, pode ocorrer a criação de certos hábitos. Seu percurso é alterado (“trocar o percurso”, “atravessar a rua por receio de um estranho”), sua independência diminuída ("mandar mensagens de texto (...)") assim como sua rotina ("ficar em casa (...)") ou seus pertences (“carregar objetos que possam ser utilizados para autodefesa”), e até sua forma de se vestir é alterada com a intenção de minimizar a possibilidade de ocorrência de violência – mesmo que estas sejam tentativas de soluções individuais para um problema coletivo (e fora do controle da vítima). Nota-se que nenhuma das entrevistadas escolheu a opção “rejeitar algumas propostas de emprego”.
Você já foi chamada de louca, paranoica, exagerada, teve seus medos do espaço público e/ou ja teve estas medidas zombadas por outras pessoas?
33,3%
Sim Não
66,7%
Estas pessoas eram, em sua maioria, homens ou mulheres?
9,2%
Homens
36, 3%
54,5%
Mulheres Meio a meio/não tem resposta
Seus medos são menosprezados, e nota-se certa negligência em relação ao tema, reproduzido até mesmo por outras mulheres. Apesar disso, 100% das entrevistadas reportaram não acreditar que homens tomam estas medidas e/ou sentem estes mesmos medos ao navegar o espaço da cidade, demonstrando ciência por parte da mulher diante de sua situação diferenciada.
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A MULHER E A CIDADE
Se a rua e os espaços públicos fossem seguros, que atividades você faria livremente? Como isso mudaria seu modo de se vestir e sua liberdade em transitar pelo espaço? •
Acho que eu caminharia mais, eu poderia me vestir com uma legging/blusa curta ou até mesmo um short sem me preocupar de alguém mexer comigo. Também usaria mais saias sem me preocupar se estão curtas demais. E em relação ao transitar, eu preciso me planejar muito para sair e voltar de casa por morar em um lugar perigoso, então se as ruas fossem mais seguras eu teria mais liberdade para ir e vir a hora que eu quisesse e poder ficar mais tempo numa festa ou na casa de um amigo sem medo de voltar para casa.
•
Poderia sair, andar, fazer caminhadas de noite e sozinha. Ficaria mais à vontade em usar roupas mais justas e vestidos/saias.
•
Andar com celular na mão. Usar short.
•
Corrida ao ar livre, encontro com amigos em praças, mais passeios que precisem do trem, metrô como meio de transporte. Me sentiria mais segura em usar roupas que gosto sem me sentir acuada, como o uso de roupas com decote ou curtas, uso de roupas de exercício sem precisar me cobrir após sair da academia. E não me sentir na obrigação de usar sutiã porque todos param para olhar e questionar quando não uso, principalmente homens.
•
Teria menos medo de colocar saia ou vestido.
•
Mexer no celular, na carteira etc.
•
Poderia usar as roupas que quero.
•
Eu acho que teria mais tranquilidade em transitar de noite.
•
Se as ruas fossem totalmente seguras, isso não limitaria as saídas sozinha no período noturno quando preciso ou muito cedo pela manhã antes das 6h.
•
Não me preocuparia em relação ao horário que devo chegar ou sair de qualquer lugar.
•
Caminhadas, saídas noturnas, atividades individuais etc.
•
Uma coisa que eu tenho medo de fazer, mesmo no meu bairro, é fazer atividades físicas ao ar livre durante a noite, quando eu tenho tempo, exatamente por conta do risco de ser assaltada ou ainda assediada/abusada.
Apesar das respostas diversas – e do fato de que nem todas falam de problemas pertinentes apenas à questão de gênero – existe um certo padrão: a mulher sente-se com falta de liberdade para navegar o espaço. A ameaça da violência contra a mulher é um elemento que molda e demarca a forma como ela navega o espaço da cidade, causando sensações de confinamento e repressão. Seu comportamento no espaço urbano torna-se completamente controlado, girando, no fundo – até mesmo de forma subconsciente – em torno da possibilidade de que ela possa ser mais uma vítima ao sair na rua.
Espaços problemáticos para a mulher podem passar despercebidos sob a perspectiva do homem.
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A MULHER E A CIDADE
Kevin Lynch define, em A Imagem da Cidade (1982, p.14): “A imagem de um bom ambiente dá, a quem a possui, um sentido importante de segurança emocional.” Dentro deste contexto de manifestação espacial da violenta subjugação da mulher, pode-se descrever a imagem da cidade formada pela mulher como distorcida quando comparada à do homem. O espaço urbano é seu inimigo, e trabalha contra sua segurança emocional. Ao homem é concedido o direito de viver o espaço público – digno de explorá-lo, moldá-lo, interpretá-lo e vivê-lo. No homem é possível a emergência do espírito do flâneur – arquétipo literário da cultura parisiense, codificado pelo poeta Charles Baudelaire em sua obra O Pintor da Vida Moderna (1863). O flâneur é um homem – tradicionalmente, invariavelmente homem – que vive a cidade moderna. É um “homem do mundo” (p. 855), um gênio profundamente curioso (p. 855856). A imagem da cidade, para o flâneur, é a de um mundo a ser descoberto. Enquanto isso, o caráter que Baudelaire confere à mulher na rua é de um objeto a ser olhado, evocando sensações e desejos sombrios nos homens (p. 873); são figuras pouco distintas (p. 852), ídolos estúpidos e enfeitiçadores (p. 873). E, claro, comumente acompanhadas de um homem ou de sua família (p. 877). Apesar da repressão, no fundo, esta mesma vontade de viver o espaço existe na mulher – diferentemente do homem, porém, ela não pode ser saciada por completo. A poeta americana Sylvia Plath (1932-1963) expressa sua frustração: Sim, meu desejo ardente de me misturar a turmas de operários, marinheiros e soldados, a frequentadores de bares – fazer parte de uma cena, anônima, ouvindo e registrando – tudo isso é prejudicado pelo fato de eu ser moça, uma fêmea que corre sempre o risco de ser atacada e maltratada. Meu interesse intenso pelos homens e
suas vidas é frequentemente confundido como desejos de seduzi-los, ou como um convite à intimidade. Mas, meu Deus, quero conversar com todo mundo, o mais profundamente que puder. Quero poder dormir em campo aberto, viajar para o oeste, andar livremente pela noite... (PLATH, 2004, p. 96-97)
Plath define seu desejo de conhecer a cidade e o mundo de maneira similar à do flâneur – mas dolorosamente consciente das limitações a quais foram impostas por ser mulher, e, portanto, mais vulnerável. Diante da ameaça concreta da violência, a mulher muda radicalmente seu comportamento, e reprime seus desejos. A rua não é um espaço para ser explorado, mas sim uma representação e um ator do mal que permeia toda a sua vida. A mulher que tenta se apropriar do espaço urbano parece querer transgredir seu “papel de mulher”, tentando se apropriar do papel masculino do flâneur. A mulher que entra para as estatísticas de violência de gênero é responsabilizada pelo mal que um homem lhe causou – pois ela estava no “lugar errado”, “na hora errada”, e “deveria saber qual é o seu lugar". Transfere-se a responsabilidade do agressor sobre a vítima e aceita-se a opressão da mulher pelo homem como estado natural das relações humanas.
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capítulo 2 • • • • •
Metodologia Barra da Tijuca Maracanã Madureira Cidade de Deus
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metodologia Com o intuito de identificar padrões de patologias em espaços diversificados, foram escolhidos trechos diferentes em 4 bairros da cidade do Rio de Janeiro, baseado em fatores como Índice de Desenvolvimento Humano (IBGE, 2000) e morfologia: 1. Barra da Tijuca (IDH = 0,959) 2. Maracanã (IDH = 0,944) 3. Madureira (IDH = 0,831) 4. Cidade de Deus (IDH = 0,751)
0
4
8 km
Bairros destacados na cidade do Rio de Janeiro. Ao Norte, Madureira; ao Sul, Barra da Tijuca; a Leste, Maracanã; no centro, Cidade de Deus.
Seguindo o princípio de incorporação da perspectiva da mulher na análise do espaço urbano, cada um dos trechos selecionados dos bairros será analisado de acordo com seu contexto (espacial, político e social). A identificação das patologias encontradas nos espaços será representada visualmente sobre imagens extraídas do Google Streetview (2020). As patologias serão organizadas dentro das seguintes categorias, de forma similar à metodologia do grupo Me Muevo Segura (2019): Infraestrutura e manutenção: problemas como má iluminação, sujeira e falta de manutenção, irregularidades quanto à acessibilidade. Fluxos: problemas relacionados à movimentação de pessoas e veículos, seja ela muito alta para o seu contexto, seja ela muito baixa. Inclui também problemas de organização de fluxos, tanto de pessoas quanto de veículos. Morfologia: problemas de natureza da forma do espaço, como passagens muito estreitas, espaços muito largos ou dispersos, muros e fachadas cegas, grande distância até o transporte público. Vigilância: problemas relacionados a órgãos como a polícia, como a falta ou o excesso de policiamento. É necessário destacar que a relação com a polícia e a percepção do usuário em relação à necessidade ou não de policiamento dependerá fortemente de seu contexto social, podendo ser afetados por fatores como classe, cor etc. Outros: patologias que não se encaixam em nenhuma das categorias anteriores.
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barra da tijuca A Barra da Tijuca é um bairro de classes média alta e alta, localizado na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Sua formação data do final da década de 1960, sendo projetado pelo arquiteto e urbanista Lúcio Costa, que atribuiu ao bairro uma configuração de cidade modernista. O desenho do bairro é caracterizado por suas extensas quadras beirando largas avenidas; de fato, a Barra foi pensada para a escala do automóvel, característica que escoa por todo seu projeto, desde a configuração das ruas até as fachadas. Sendo assim, fora da esfera dos condomínios fechados (que são projetados pensando na escala humana internamente) a morfologia do bairro dificulta a caminhada a pé, parte fundamental da comuta por transporte público; deve-se ressaltar que mulheres são apenas 35% das carteiras de habilitação do país (ABRAMET, 2021), fazendo do transpor-
te público um meio de transporte especialmente relevante para este grupo. Tratando-se de um bairro de grande escala, a caminhada no bairro pode se tornar muito mais extensa e exaustiva. No geral, as ruas da Barra da Tijuca se caracterizam por longos trechos em torno de enormes terrenos que, por questões de segurança e autossegregação espacial, tendem a ser muradas ou gradeadas, limitando de forma severa a interação entre a rua e estes lotes. Devido à escala, é comum também que estes grandes lotes possuam apenas um principal uso (e apenas uma massa de edificação), e que grande parte deste lote tenha muito pouca área construída. A pergunta “Avalie sua experiência com segurança em um ou mais dos bairros” da enquete Análise da segurança da mulher em espaços públicos do Rio de Janeiro (2021) teve como uma de suas respostas: A falta de comércio informal em algumas ruas e a quantidade de condomínios fechados fazem com que andar de noite ou bem de madrugada seja um ato de coragem! (...) Outro fator (que é um pouco inconsciente) mas que aumenta a ocorrência de assaltos são as distâncias entre os pontos. Por exemplo, se eu quiser sair da UVA até o Barra Shopping, tenho que atravessar diversas pistas sem nenhum tipo de proteção/pessoas, o que me expõe ao risco de assaltos. De noite, então, andar pela Barra fica muito perigoso. (ANÔNIMA, 2021)
Baseado em respostas do formulário e entrevistas, o trecho da Barra da Tijuca escolhido para a análise foi a Avenida General Felicíssimo Cardoso. Compreende-se o trecho como desde a esquina com a Avenida das Américas até a altura do campus da Universidade Veiga de Almeida (UVA).
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Ao lado, mapa de localização do trecho. Abaixo, mapa de usos e fluxos. (Elaborados pela autora.)
comércio/serviços institucional residencial com. informal UVA Barra via arterial via coletora via local
Para o diagnóstico, o trecho foi dividido em 2 seções: A. Faixa sentido Norte-Sul (vindo da Av. das Américas) B. Faixa sentido Sul-Norte (indo para a Av. das Américas) Localizado na região do Parque das Rosas, é uma via com duas faixas de sentidos opostos, separados por um canteiro. No lado Oeste da Avenida (sentido Norte-Sul) encontra-se o Clube Marapendi e o Campus UVA, por toda a extensão deste lado da Avenida. A Leste (sentido Sul-Norte), encontra-se usos variados, como o Marapendi Shopping (e comércios adjacentes), alguns condomínios fechados e um colégio – além de conexões com ruas menores e mais locais como a Rua Marechal Henrique Lott, que circunda a Praça do Parque das Rosas. Na segunda enquete em formato Google Forms Análise de trechos específicos nos bairros (2021), foram feitas perguntas acerca do trecho. O que há de positivo neste trecho? •
Natureza exuberante;
•
Na General Felicíssimo Cardoso a área de lazer (ciclovia é um ponto positivo);
•
As ruas são bem largas e arborizadas;
•
Por ser uma via coletora, o trânsito não tão intenso e se torna menos perigoso;
•
É limpo;
•
É um lugar de passagem, mas gosto do canteiro central, que é gramado;
•
Bom movimento de carros e pedestres, ruas largas;
•
Arborização;
•
O Shopping Marapendi;
•
Qualidade visual devido a limpeza e vegetação presentes na rua;
•
Um pouco de arborização.
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Conte sua experiência neste espaço. •
Tenho enorme prazer em transitar por ali e passear pelo Shopping Barra Square e frequentar os restaurantes do local.
•
Na General Felicíssimo (...) já tive alunos que foram assaltados.
•
Moro na avenida Prefeito Dulcidio Cardoso e trabalho na Veiga de Almeida.
•
Nunca me senti em perigo, porém há relatos de que não é tão seguro assim de noite. Eu mesmo de noite passo por ali bem rápido.
•
Nunca fiquei em apuros ao passar por essa rua, mas em alguns horários eu passei bem atenta.
•
Já vi muitas pessoas estranhas por lá e fiquei com medo.
•
Sempre atravesso pelo canteiro central pisando no mato que costuma estar alto e prefiro andar pelo lado do Rosas e não do Clube. Mas o trecho da Praça e do Shopping são inseguros, pois são grades, na prática semelhantes a muros e empenas cegas.
•
Sempre que passava pelo lugar, tentava passar o mais rápido possível, e estava sempre de olho em todos os lados. Durante o período em que estudei à noite, nunca passei por ali. Mesmo que o movimento de veículos seja bastante intenso em alguns momentos do dia, o pedestre passa tão desapercebido que sempre achei melhor evitar passar por ali quando fosse possível.
•
Já presenciei alguns assaltos e até criminosos pulando muro do Clube.
•
Passei por essa rua todos os dias durante 4 anos. A rua nunca foi muito movimentada fora dos horários de entrada e saída dos alunos da UVA. Quando precisávamos ficar até de noite na Universidade, era preciso passar muito rápido pela rua ainda que estivesse em grupo, pois a rua é realmente muito escura à noite.
•
Me sinto insegura, passo o mais rápido possível por ali. Tento andar em grupo para me sentir mais segura.
•
Liguei para a Rio Luz pedindo para trocar as lâmpadas, eles disseram que assaltantes costumam quebrá-las para deixar o trecho mais escuro.
Quais problemas você identifica no trecho Av. General Felicíssimo Cardoso?
Falta de iluminação
10 (90,9%)
Baixa movimentação de pessoas Grande movimentação de pessoas
9 (81,8%) 0 (0%)
Falta de policiamento Excesso de policiamento
11 (100%) 0 (0%)
Falta de manutenção Sujeira
4 (36,4%) 2 (18,2%)
Passagens estreitas Espaços muito largos
4 (36,4%) 1 (9,1%)
Muros e fachadas cegas Tráfego intenso de veículos
3 (27,3%) 2 (18,2%)
Grande distância até o transporte público
6 (54,5%)
Quais medidas você já tomou para lidar com estes problemas no local? Evitar passar pelo trecho
2 (18,2%)
Andar apenas acompanhada
4 (36,4%)
Estar sempre atenta ao entorno
9 (81,8%)
Não permanecer no trecho Passar dentro do Shopping Marapendi
8 (72,7%) 1 (9,1%)
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A MULHER E A CIDADE
Na seção A do trecho foram identificadas as seguintes patologias: 1: falta de iluminação 2: sujeira e/ou falta de manutenção 3: má acessibilidade 4: pouca movimentação de pessoas 5: estacionamento na rua 6: muros cegos 7: passagens estreitas 8: vegetação fechada 9: falta de policiamento 10: falta de sombreamento
1
9
6 10
3
4
7
3
5
6 7
7
4
3
6 10 3
5 4
2 47
48
A MULHER E A CIDADE
1 8
3
1
7 2
Na seção B do trecho foram identificadas as seguintes patologias: 1: falta de iluminação 2: sujeira e/ou falta de manutenção 3: má acessibilidade 4: pouca movimentação de pessoas 5: tráfego intenso de veículos 6: muros cegos 7: passagens estreitas 8: grande distância até o transporte público 9: falta de policiamento 10: falta de sombreamento
1
4 10
3
2 49
50
A MULHER E A CIDADE
1
2
10
3
1
10
6 3
4
2
6
7
5 3
2
9
1 8 4
2
10
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maracanã
O Maracanã é um bairro de classe média e média alta, circundando o Estádio do Maracanã. Junto a bairros como Tijuca, Vila Isabel, Andaraí e Grajaú, o Maracanã está inserido na região da Grande Tijuca. A formação do bairro data do século XVIII, mas sua urbanização começa realmente na década de 1870, já voltada para atender as necessidades da classe média alta. Majoritariamente residencial e comercial, o bairro possui quadras grandes e adensadas, com lotes de tamanho médio. O Maracanã é dotado também de diversas linhas de ônibus, trem e metrô, facilitando a locomoção por transporte público – meio de transporte mais utilizado pelas mulheres (ABRAMET, 2021). Infelizmente, a alta ocorrência de assaltos na região (PREVIDELLI, 2013) torna o lugar inseguro para não apenas as mulheres, mas toda a população que frequenta o bairro.
Localizado em uma área que pode ser caracterizada como um polo educacional, de acordo com uma das entrevistadas, a Rua Senador Furtado contém, entre muitas outras instituições, o Campus Tijuca da Universidade Veiga de Almeida. Compreende-se o trecho como desde a esquina com a Avenida Radial Oeste, na altura da escada da passarela, até a entrada da UVA. A rua é uma via de mão única de largura confortável para um carro. O trecho foi dividido em 2 seções, A e B: A. Lado Oeste da rua (onde se localiza o Campus Tijuca da UVA) B. Lado Leste da rua (onde se localiza a escada para a passarela da estação de transporte público) Na seção A são encontrados: uma das entradas da UVA Tijuca, o Instituto Federal do Rio de Janeiro, um estacionamento murado para estudantes e professores, e um pequeno bicicletário Bike Itaú. A partir da saída da UVA, encontra-se extensos muros cegos e uma entrada/saída de veículos para o estacionamento, ambos fatores que prejudicam a caminhabilidade da área. Na seção B, além de mais instituições de ensino com fachadas cegas (ou parcialmente cegas), no canto da rua encontra-se um estacionamento de rua para carros e motocicletas. De acordo com uma das entrevistadas, o estacionamento é um acordo entre os funcionários das instituições de ensino, e a largura da rua permite que esta ocupação não atrapalhe significativamente o fluxo de veículos do trecho, que não é intenso. Encontra-se também uma escada para a passarela do transporte público localizado na Radial Oeste. Não há nenhum tipo de rampa ou elevador que atribua acessibilidade a este equipamento.
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A MULHER E A CIDADE
Ao lado, mapa de localização do trecho. Abaixo, mapa de usos e fluxos. (Elaborados pela autora.)
comércio/serviços institucional infr. de mobilidade UVA Tijuca
via arterial via coletora
Em entrevista com uma estudante da UVA Tijuca, foi relatado que as pessoas em geral – não apenas as mulheres – sentem bastante insegurança na região devido aos inúmeros relatos de furto. Devido à baixa movimentação de pessoas e a falta de manutenção, o trecho tem aspecto de “abandonado”, e muitos dos comerciantes ambulantes da região deixaram de frequentar o local pela mesma razão. A passarela que leva ao transporte público possui localização extremamente conveniente para os estudantes da região, oferecendo um caminho mais consistente e seguro para o ponto de ônibus e estação de metrô, amplamente utilizados pelos frequentadores. Apesar disso, a entrevistada descreveu que a maior parte dos estudantes – que preferem sempre andar em grupo na região, nunca sozinhos – evita a passarela por medo da violência, preferindo dar a volta por ruas mais movimentadas que possuem bares e restaurantes. A entrevistada também relatou que, antes da pandemia da Covid-19, possuía como rotina sair mais cedo da aula para sair acompanhada de um amigo, sentindo bastante insegurança em dias onde este não comparecia à aula.
A escada para a passarela na seção B do trecho. (Fonte: Google Streetview)
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A MULHER E A CIDADE
No horário da noite, os problemas do trecho se intensificam. Após o fechamento da estação de metrô às 19h, o fluxo de pedestres no sentido Norte-Sul (ou seja, mais movimentação no sentido do trecho) se limita apenas ao fluxo de pessoas descendo dos ônibus que desembarcam a partir deste horário. A falta de iluminação da rua torna-se um problema extremamente visível à medida que escurece, e o fechamento de outros usos da região intensificam ainda mais o aspecto de “abandonado” – especialmente quando se considera a falta de usos residenciais no trecho. Na segunda enquete em formato Google Forms Análise de trechos específicos nos bairros (2021), foram feitas perguntas acerca do trecho. O que há de positivo neste trecho? •
Estudantes no local.
•
A facilidade de acessar a Tijuca
•
O polo educacional.
Conte sua experiência neste espaço. •
Sempre correndo e com certo medo.
•
Só de passagem e ao fazer prova na Veiga e Cefet.
Quais problemas você identifica no trecho Rua Senador Furtado?
Falta de iluminação
1 (50%)
Baixa movimentação de pessoas
1 (50%)
Grande movimentação de pessoas
0 (0%)
Falta de policiamento Excesso de policiamento
2 (100%) 0 (0%)
Falta de manutenção
2 (100%)
Sujeira
2 (100%)
Passagens estreitas
1 (50%)
Espaços muito largos
0 (0%)
Muros e fachadas cegas
0 (0%)
Tráfego intenso de veículos
0 (0%)
Grande distância até o transporte público
2 (100%)
Quais medidas você já tomou para lidar com estes problemas no local? Evitar passar pelo trecho Andar apenas acompanhada Estar sempre atenta ao entorno Não permanecer no trecho
1 (50%) 0 (0%) 1 (50%) 2 (100%)
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A MULHER E A CIDADE
No lado Oeste do trecho foram identificadas as seguintes patologias: 1: falta de iluminação 2: sujeira e/ou falta de manutenção 3: má acessibilidade 4: pouca movimentação de pessoas 5: muros cegos 6: passagens estreitas 7: falta de sombreamento
6 4
7
5 4 3
1 7 5
2
6
4
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A MULHER E A CIDADE
No lado Leste do trecho foram identificadas as seguintes patologias: 1: falta de iluminação 2: sujeira e/ou falta de manutenção 3: má acessibilidade 4: pouca movimentação de pessoas 5: muros cegos 6: passagens estreitas 7: grande distância até o transporte público 8: falta de policiamento 9: falta de sombreamento
1 5
4 6
1 2 4
8
2
7 2 9
3
4
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madureira
Madureira é um bairro de classe média baixa localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro. De origens rurais no século XIX (“Sertão Carioca”), o bairro se desenvolveu de forma orgânica desde então – especialmente após a consolidação da Central do Brasil no bairro vizinho de Cascadura, em 1858. A construção da estação ferroviária de Madureira, porém, só terminou em 1890. Devido a seu tipo de formação, a morfologia do bairro é densa e irregular, com lotes estreitos de pequena escala; é forte a presença de moradia, estabelecimentos comerciais e de serviço, e usos diversificados pela região. A forma do bairro se apresenta como relativamente amigável à caminhada – parte importante da comuta por transporte público, meio de transporte mais utilizado pelas mulheres (ABRAMET, 2021). Infelizmente, a altíssima taxa de criminalidade da região – mais de 3500 ocorrências de
assalto em 2012 (PREVIDELLI, 2013) – faz do bairro perigoso para a caminhada. O bairro é conhecido na cultura popular por ser “o maior polo comercial da Zona Norte e segundo da cidade” (PIMENTEL, 2013). O Mercadão de Madureira, presente na região há mais de 60 anos, é um grande centro comercial que movimenta a região inteira (G1, 2009), tanto economicamente quanto em questão de fluxo de pessoas. Madureira se caracteriza também como um polo da cultura negra do Rio, sendo ele um dos berços do samba carioca (PIMENTEL, 2013). Na década de 1970, o interesse do jovem periférico havia mudado do samba para gostos inspirados na cultura americana, como a black music; na década seguinte, o movimento havia perdido força, mas ainda havia uma parcela da população que mantivera este interesse, e buscava um lugar central no subúrbio que pudesse abrigar um baile (NUNES, 2019). Os estacionamentos embaixo do Viaduto Negrão de Lima, construído em 1960 e “durante muitos anos a principal obra de infraestrutura rodoviária do subúrbio do Rio” (NUNES, 2019), se apresentou como o espaço ideal para abrigar o Baile Charme de Madureira no início da década de 1990.
Viaduto Negrão de Lima em um típico sábado à noite de Baile. (Fonte: Diário do Rio)
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Ao lado, mapa de localização do trecho. Abaixo, mapa de usos e fluxos. (Elaborados pela autora.)
0 comércio/serviços institucional residencial infr. de mobilidade com. informal Baile Charme via arterial via coletora via local
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150 m
Em 2013, o prefeito vigente Eduardo Paes reconheceu o Baile Charme de Madureira como “bem cultural de natureza imaterial da cidade”. De acordo com Jones MFjay, um dos fundadores e até hoje organizador do baile, o novo status da área serve como reconhecimento de um trabalho pelo poder público, o que pode melhorar as condições do Baile (EXTRA, 2013). A partir deste momento, porém, foi decretado que a área não pode mais ser utilizada como estacionamento durante o dia, permanecendo então inutilizada e cercada por um muro metálico. Como fruto de decisões políticas positivas, mas que ainda assim negligenciam a perspectiva da mulher, cria-se um espaço ocioso cercado por um muro cego. Para o diagnóstico, o trecho foi dividido em 3 seções A, B, e C: A. Ruas Alfeu de Castro e Francisco Batista B. Saída do Viaduto ao Sul C. Rua Carvalho de Souza A primeira seção, próxima à linha do trem, é uma área relativamente deserta – a não ser pelo tráfego de veículos em horários de pico – e ocupada por pessoas em situação de rua nas calçadas do viaduto. Não há nenhum outro uso no local, o que intensifica a vulnerabilidade destas pessoas abrigadas. A segunda seção é uma região comercial e bastante movimentada por pessoas, contando com quiosques que, apesar de não serem fixos, fazem parte do comércio diário da região. A terceira seção se localiza na porção mais central do Viaduto, nos arredores da área destinada ao Baile Charme.
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A MULHER E A CIDADE
Em entrevista com uma frequentadora da região, foi relatado que, apesar de alguns pontos do trecho – especialmente a seção B – possuírem uma boa quantidade de movimentação de pessoas durante o dia, à noite o espaço se transforma completamente. Embaixo do viaduto, o comércio informal – que não é fixo – fecha completamente. A seção do trecho fica completamente em desuso, tendo apenas o fluxo de carros no entorno como movimento. Foi destacado também que a iluminação é muito longe do ideal. Fora de uma noite de sábado típica, a seção C do trecho se configura de maneira similar à seção A – pouco movimentada e mal iluminada, especialmente à noite. Na segunda enquete em formato Google Forms Análise de trechos específicos nos bairros (2021), foram feitas perguntas acerca do trecho. O que há de positivo neste trecho? •
Durante o dia tem muitas pessoas e comércio aberto.
•
Os ambulantes.
Conte sua experiência neste espaço. •
Nunca sofri nada, porém não me sinto confortável ao caminhar por esse trecho, pois além de escuro e sujo, durante a noite principalmente é quase deserto, tendo somente presença de pessoas em situação de rua e eventualmente marginais.
•
Nunca presenciei nada!
Uma das entrevistadas relatou, em resposta à primeira pergunta, não ter nada de positivo a destacar; em resposta à segunda pergunta, a mesma relatou já ter sido assaltada neste trecho.
Quais problemas você identifica no trecho Viaduto Negrão de Lima?
Falta de iluminação
1 (50%)
Baixa movimentação de pessoas
1 (50%)
Grande movimentação de pessoas
2 (100%)
Falta de policiamento Excesso de policiamento
1 (50%) 0 (0%)
Falta de manutenção
1 (50%)
Sujeira
2 (100%)
Passagens estreitas Espaços muito largos
1 (50%) 0 (0%)
Muros e fachadas cegas
2 (100%)
Tráfego intenso de veículos Grande distância até o transporte público
2 (100%)
1 (50%) 0 (0%)
Quais medidas você já tomou para lidar com estes problemas no local? Evitar passar pelo trecho
1 (50%)
Andar apenas acompanhada
1 (50%)
Estar sempre atenta ao entorno
2 (100%)
Não permanecer no trecho
2 (100%)
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Na seção A do trecho foram identificadas as seguintes patologias: 1: falta de iluminação 2: sujeira e/ou falta de manutenção 3: má acessibilidade 4: pouca movimentação de pessoas 5: tráfego intenso de veículos 6: muros cegos 7: falta de suporte local para pessoas em situação de rua
1 7
6 5
4 3
1
7
6 5 2 4
1
6 4 3
5
7 2
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Na seção B do trecho foram identificadas as seguintes patologias: 1: falta de iluminação 2: sujeira e/ou falta de manutenção 3: má acessibilidade 4: muita movimentação de pessoas 5: tráfego intenso de veículos 6: falta de policiamento
1
3
4 5
1
6
4 2
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Na seção C do trecho foram identificadas as seguintes patologias: 1: falta de iluminação 2: sujeira e/ou falta de manutenção 3: má acessibilidade 4: pouca movimentação de pessoas 5: tráfego intenso de veículos 6: muros cegos 7: passagens estreitas
1
7 5
6 4
2 3
1
6 7 4
5
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cidade de deus A Cidade de Deus é um bairro de classe baixa localizado na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Originalmente concebido na década de 1960 como um bairro de interesse social para famílias sem teto das favelas do Rio, uma enchente durante a sua construção deixou mais de 100 cariocas mortos e 20 mil desabrigados; como medida de emergência, o governador Negrão de Lima autorizou a transferência dos desabrigados para o bairro inacabado. As ocupações provisórias tornaram-se permanentes, e, com as eventuais invasões, a área foi ocupada de forma desordenada, configurando-se como uma favela. De acordo com alguns moradores, o bairro foi implantado próximo à Barra da Tijuca para prover mão de obra para a sua construção. Devido à ideia de casa “embrião” do arquiteto Giuseppe Badolato – lotes residenciais pequenos, de 120 m², onde poderia ser construído o essencial
para cada família à medida do necessário – o bairro conta com lotes agrupados em pequenas quadras-quarteirão com praças no centro e ruas para pedestres. Apesar do crescimento desordenado, muitas destas praças centrais ainda existem. Em seu projeto, Badolato frisava a importância de proteger principalmente as crianças – sendo as mulheres outro grupo similarmente vulnerável que se beneficiaria deste layout. Apesar do tráfego intenso nas ruas principais, a morfologia do bairro faz dele amigável ao pedestre. Infelizmente, fatores como a falta de manutenção e os conflitos violentos – extremamente comum nas favelas do Rio – dificultam a navegação segura e confortável pelo espaço, especialmente para não-moradores. A Praça Padre Júlio Groten – originalmente Praça Roberto V. Pequeno, porém conhecida popularmente como Praça da Cidade de Deus – é uma das maiores praças do bairro, e se localiza no encontro das ruas Edgard Werneck e Miguel Salazar, inserida em uma centralidade de caráter comercial. A praça possui uma área de parquinho para crianças, equipamentos de ginástica para idosos e algumas mesas no lado oposto. Além do comércio, o entorno conta com escolas, uma igreja e uma UPA 24h. Apesar de sua localização e morfologia ideais, a praça é pouco movimentada. De acordo com uma moradora entrevistada, existe uma discrepância entre usos e públicos-alvo – as crianças, que poderiam ocupar a praça, se sentem incomodadas com a quantidade de ruído causado pelo movimento do entorno, principalmente do tráfego de veículos. Jovens também raramente ocupam a praça por falta de usos atrativos, sendo apenas uma área de passagem. Deve-se destacar também a presença da UPP no entorno – devido aos conflitos comuns em favelas do Rio, os moradores não possuem um relacionamento ideal com a polícia.
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Ao lado, mapa de localização do trecho. Abaixo, mapa de usos e fluxos. (Elaborados pela autora.)
comércio/serviços institucional residencial lazer via arterial via coletora via local
0
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50 m
O trecho foi dividido em 2 seções A e B: A. Da primeira curva ao início da segunda curva (sentido Norte-Sul) B. Da segunda curva ao ponto inicial da Seção A, finalizando uma volta completa A praça é cercada inteiramente por vias arteriais. Apesar do tráfego intenso de veículos em horários de pico, os semáforos em cada curva auxiliam no gerenciamento do trânsito e reduzindo sua intensidade, especialmente na seção B, entre os semáforos. O trecho possui rampas em alguns pontos e calçadas de tamanho relativamente confortável; a falta de manutenção, porém, dificulta a acessibilidade de pessoas com dificuldades de locomoção, sendo antitético à proposta de atrair a presença de idosos na praça. Foi identificado também um poste com fios e caixa elétrica expostos, ameaçando ainda mais a integridade do usuário do espaço. Além disso, foi reportado a presença de sujeira no local. Apesar da presença de alguns postes na praça, o local foi considerado mal iluminado. Considerando que a área é majoritariamente comercial – com apenas alguns dos edifícios menores no entorno imediato tendo algum pavimento com andar residencial – o horário da noite torna-se extremamente problemático para a mulher que deseja passar por este trecho, com pouca iluminação e ainda menos movimento após o entardecer. A arborização confere sombra a grande parte das áreas ocupáveis do trecho; uma grande porção central da praça, porém, se encontra sem vegetação ou qualquer outra forma de sombreamento. A área é esparsa e sem uso, e não foi identificado se a porção é utilizada de forma eficiente para circulação.
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Em entrevista com uma jovem moradora da região, foi reportado não haver a presença de comércio informal na praça, e que, para ela, o local era apenas de passagem ou ponto de localização de permanência rápida, expressando querer permanecer o mínimo de tempo possível no trecho. A moradora também reportou se sentir desconfortável em relação à presença da polícia no entorno do trecho. Na segunda enquete em formato Google Forms Análise de trechos específicos nos bairros (2021), foram feitas perguntas acerca do trecho. O que há de positivo neste trecho? •
É uma alternativa de lazer para uma parcela da população que não tem acesso a equipamentos elitizados e a culturas que divergem das presentes na comunidade.
Conte sua experiência neste espaço. •
Quase não frequento, é mais um local de passagem. Percebo muito lixo no chão e uma travessia muito longa e pouco acessível de pedestres.
Quais problemas você identifica no trecho Praça da Cidade de Deus?
Falta de iluminação
1 (100%)
Baixa movimentação de pessoas
0 (0%)
Grande movimentação de pessoas
0 (0%)
Falta de policiamento
0 (0%)
Excesso de policiamento
1 (100%)
Falta de manutenção
1 (100%)
Sujeira
1 (100%)
Passagens estreitas
1 (100%)
Espaços muito largos
0 (0%)
Muros e fachadas cegas
0 (0%)
Tráfego intenso de veículos Grande distância até o transporte público
1 (100%) 0 (0%)
Quais medidas você já tomou para lidar com estes problemas no local? Evitar passar pelo trecho
1 (100%)
Andar apenas acompanhada
0 (0%)
Estar sempre atenta ao entorno
0 (0%)
Não permanecer no trecho
1 (100%)
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Na seção A do trecho foram identificadas as seguintes patologias: 1: falta de iluminação 2: sujeira e/ou falta de manutenção 3: pouca movimentação de pessoas 4: tráfego intenso de veículos 5: espaços muito largos 6: muito policiamento 7: falta de sombreamento por arborização
1
3 2
6 3
4 2
1
7 5 3
2
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1
4
3 2
1
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Na seção B do trecho foram identificadas as seguintes patologias: 1: falta de iluminação 2: sujeira e/ou falta de manutenção 3: pouca movimentação de pessoas 4: tráfego intenso de veículos 5: espaços muito largos 6: falta de sombreamento por arborização
1
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6 1 3
5 2
1 3
2
4
1
4 3 2
1 3
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capítulo 3 • • • •
Metodologias de solução Estratégias de ação Cronograma TFG 2 Programa de necessidades
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metodogias de solução Como visto nos capítulos anteriores, é de extrema importância para a proteção dos direitos da mulher e sua participação na sociedade urbana, além de sua integridade física e emocional, a existência de espaços públicos dos quais as mulheres possam se apropriar de forma livre. Para promover a realização do potencial das mulheres da cidade, é necessária a criação de espaços urbanos seguros, que possibilitem navegação e permanência adequadas. No contexto social da mulher, é importante que estes espaços tenham uma imagem diferente da atual que a cidade apresenta para a mulher, passando as sensações de segurança e tranquilidade no lugar de incerteza e hostilidade. EQUIZAGA (1997 apud SANTORO, 2008) sugere que a melhor estratégia de ação inclui, antes de
qualquer coisa, diminuindo a escala: Olhar sobre gênero deve ser mais do que um olhar que vai trabalhar a desigualdade em termos quantitativos. Efetivamente, pensar a desigualdade de gênero no território em um plano vai além de escrever princípios e diretrizes, ou determinar onde estarão equipamentos, mas também, por exemplo, entender o olhar diferenciado das mulheres sobre o espaço. (SANTORO, 2008, p. 2-3)
Aproximando-se a escala do cidadão é possível ver o espaço de uma forma mais minuciosa, enxergar detalhes que um plano urbano generalizado não consegue capturar. Faz-se necessário então estudar os espaços de perto, levando em consideração as suas peculiaridades e dinâmicas únicas. É necessário aproximar a arquitetura e o urbanismo do público por meio de pesquisas, formulários, entrevistas etc. Deve-se levar em consideração a opinião pública – que é diversa e muitas vezes contraditória – e, então, pesar o que realmente é relevante e funcionará para o bem de todos. Opiniões contrárias devem ser estudadas de acordo com o seu contexto, e servir para alimentar questionamentos.
É necessário desnaturalizar os problemas de gênero no planejamento.
Deve-se também estudar os movimentos de bairro existentes, seus métodos e limitações, e o que eles têm feito (e podem fazer) para melhorar a qualidade de vida de suas áreas de atuação. É fundamental que se desnaturalize os problemas de gênero no planejamento urbano: afinal, se não são reconhecidos, dificilmente se sabe que eles existem.
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Informando a população da questão, nota-se com mais facilidade nos espaços existentes os mesmos padrões entre espaços distintos – problemas diferentes de acordo com seus contextos específicos, mas com uma mesma raiz que se manifesta de formas diversas. Com maior ciência da questão, escuta-se a voz da mulher pelo espaço urbano de uma forma geral. No projeto, problemas urbanos de uma forma geral devem ser considerados, visto que estes afetam a mulher não apenas como usuária do espaço, mas também enquanto mulher. Deve-se pensar o espaço de uma forma que trate dos problemas de gênero de uma forma específica, não generalizada ou negligente. O diferencial está na incorporação da perspectiva da mulher de forma significativa – se uma solução para um problema é proposta e esta causa prejuízos à qualidade de vida deste grupo, a estratégia deve ser repensada a fim de criar um espaço verdadeiramente democrático.
Não adianta apenas criar uma cidade do zero.
Não adianta também simplesmente criar uma cidade utópica do zero. Primeiramente, não é prático: como discutido anteriormente, a cidade tem um ritmo de desenvolvimento muito mais longo do que o do ser humano. Criar um plano, executá-lo, e observar seu desenvolvimento demanda muito tempo – e a questão é urgente. Além disso, o que fazer com as mulheres que já existem, com suas vidas realizadas e enraizadas nas cidades de hoje? Forçá-las a recomeçar do zero em um espaço urbano completamente novo é antitético à proposta de fortalecer a participação da mulher na sociedade urbana atual. Sendo assim, a proposta mais realista é a de requalificação de espaços já existentes, cuja estrutura pode ser incorporada em planos futuros a fim de evitar que mais espaços problemáticos sejam criados.
Infelizmente, com um governo ineficiente que não representa mulheres de forma proporcional e, como consequência, negligencia a perspectiva da mulher, dificilmente podemos contar com a ação vinda do poder público. Até hoje, é gritante a escassez de planos urbanos em grande escala que lidam com a questão de gênero. Temos que contar, então, com ações de grupos politicamente engajados, formados por cidadãos – comumente movimentos de cunho feminista. É comum que estas ações sociais façam uso do chamado urbanismo tático: “ações pontuais de pequena escala que visam a mudança de comportamento e de cultura a longo prazo.” (ITDP Brasil, 2019).
Ações pontuais de pequena escala que visam mudanças a longo prazo.
O urbanismo tático, com sua implementação relativamente simples e rápida, dá poder às mãos do cidadão, sem maior interferência do Estado; ao mesmo tempo, é utilizado para chamar atenção deste aos problemas negligenciados da cidade.
Ações como a do grupo Me Muevo Segura (2019), de Bogotá, na Colômbia, demonstram o poder transformativo do urbanismo tático no contexto das relações de gênero. Com uma coletiva que incorporou cidadãos, órgãos sociais e acadêmicos e entidades privadas, e estudou espaços problemáticos de forma minuciosa, o grupo transformou espaços problemáticos de Bogotá em espaços seguros para mulheres e pontos de atração da cidade.
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Acima, o trecho antes da intervenção "Nuestro Jardim Cultural". (Fonte: TUMI) Abaixo, após a intervenção. (Fonte: TUMI)
O grupo SampaPé, por sua vez, atua nas ruas de São Paulo de forma semelhante, agregando grupos de pessoas interessadas em melhorar as condições do espaço urbano para mulheres por meio do urbanismo tático. Em Como melhorar a segurança e a mobilidade de meninas e mulheres? (2019), o grupo cita “três linhas de práticas para a construção de cidades melhores para meninas e mulheres”, de Carolyn Whitman: 1) ações que aumentem a segurança, como melhorar a iluminação das ruas; 2) a criação de lugares seguros, como a transformação de bairros em lugares mais diversos através, por exemplo, do uso do solo e da mudança do desenho das ruas; e 3) a criação discursiva de espaços seguros (...) a partir, por exemplo, de ações de ativismo com mensagens anti-violência e processos de participação cidadã. (WHITMAN apud SAMPAPÉ, 2019, p. 29)
Junto ao urbanismo tático, podemos implementar também o urbanismo social. A definição de urbanismo social varia entre estudiosos, mas pode-se citar a acupuntura urbana: “não necessariamente de pequena escala, mas sim pontuais e estratégicas (...) rápidas de executar, reversíveis, e, muitas vezes, de baixo custo.” (MOREIRA, 2020) As ações de acupuntura urbana são relativamente mais complexas do que as de urbanismo social, mas seguem princípios semelhantes, e “não é raro que projetos (...) sejam seguidos por uma série de outras intervenções nesse mesmo âmbito.” (MOREIRA, 2020). Um dos exemplos citados por Jaime Lerner em Acupuntura Urbana (2003) é a ideia da "Cidade 24 horas" no Zócalo, centro histórico da Cidade do México. Lerner defende que o comércio formal e o informal podem se conciliar, programando suas atividades em horários diferentes: assim que o comércio tradicional fecha às seis da tarde, o comércio ambulante ocupa a praça, conferindo movimento e segurança a um espaço que não se esvazia à noite. (p. 25-26)
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estratégias de ação Kevin Lynch (1960): Um meio ambiente característico e legível não oferece apenas segurança mas também intensifica a profundidade e a intensidade da experiência humana. Deve-se atentar à criação de espaços ativos para diminuir a insegurança causada por ambientes vazios. Para que seja criado espaços seguros para as mulheres, é ideal que estes espaços sejam atrativos à população em geral em primeiro lugar. A movimentação de pessoas inerentemente cria vigilância no espaço urbano, conceito codificado como olhos da rua pela jornalista Jane Jacobs (1961). Mas apenas tornar espaços vazios e inutilizados em espaços movimentados e ocupados não é o suficiente para criar espaços que atendam às demandas da mulher – afinal, crimes também ocorrem em espaços movimentados (MIRANDA et al.,
2020). Deve-se, então, organizar os fluxos de maneira eficaz, onde a grande movimentação de pessoas não se torne um empecilho para a segurança da mulher e para a percepção da ocorrência de crimes.
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Traz-se o movimento também pela criação de atividades no espaço – a valorização da arte e da cultura local, por exemplo, pode atrair pessoas por meio de eventos como workshops ou performances de artistas da região.
O comércio informal, além de movimentar a economia local, gera movimento na região; áreas onde o comércio ambulante é incorporado podem se tornar pontos de encontro, criando referências no espaço urbano.
A segurança do espaço é também importante tanto para os passantes quanto para os comerciantes, então é fundamental que seja implantada o tipo de vigilância apropriada para a área, dependendo do relacionamento do público com a polícia. Por fim, deve se tornar o espaço fisicamente agradável de caminhar, sem que a forma do espaço seja sua inimiga. A falta de sombreamento pode ser solucionada por meios provisórios (como coberturas móveis) aos de longo prazo, que demandam mais estudo – como o plantio de árvores que se adequem ao ambiente. O descumprimento das normas de acessibilidade exclui parcelas da população de acessar o espaço; a sujeira facilita a disseminação de doenças; e
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a falta de manutenção – como fios expostos ou calçadas esburacadas – pode ser um risco à integridade física do cidadão. Questões como essas muitas vezes demandam ações mais complexas que envolvem o poder público – fazendo-se necessário publicizar o problema por meios como o urbanismo tático. “Para participar como cidadãos iguais na pólis, mulheres devem reivindicar o espaço público.” (BOWMAN, 1993) O grande objetivo, então, torna-se criar um espaço democrático que seja atrativo para todos – mas que dê atenção especial às demandas negligenciadas das mulheres, para que, assim, seja atingido este status de igualdade.
A ocupação apropriada de um espaço pode mudar completamente a percepção do usuário.
cronograma tfg 2 Para a segunda parte deste Trabalho Final de Graduação, tem-se como diretrizes: • • •
•
• • • •
Estudar as políticas locais Aprofundar-se nos vários contextos dos bairros Realizar entrevistas mais profundas com visitantes e moradoras de cada região para melhor entendimento da perspectiva da cidadã Estudar ações de movimentos sociais atuantes nas regiões (ou, se estes não existem, entender o motivo da ausência) Ouvir sugestões de soluções de entrevistadas Estudar condicionantes climáticos de cada região para criação de propostas adequadas Estudar dados demográficos de cada região para melhor entendimento das relações sociais Criar layouts com propostas de estratégias que abrangem do urbanismo local à acupuntura urbana, de fácil entendimento visual.
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programa de necessidades Melhorias na infraestrutura
Organização de fluxos Mudanças na forma Segurança pública Requalificação de usos Outros
Iluminação adequada Conformidade à NBR 9050 Limpeza e manutenção Realocação de estacionamentos Organização de espaços movimentados Expansão de calçadas Delimitação de novos espaços Grau e tipo de policiamento adequados Comércio integral Espaços para eventos, arte e lazer Suporte para pessoas em situação de rua Implantação de vegetação UMA ANÁLISE DE ESPAÇOS URBANOS SOB A PERSPECTIVA DE GÊNERO
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conclusão O estudo possibilitou a exploração do contexto histórico e social do tema, analisando a relação da misoginia com o sistema capitalista de produção – por meio da divisão sexual do trabalho – e como a subjugação da mulher foi e é fundamental na consolidação deste sistema, cujos efeitos na construção do território são bem documentados. Foram observados efeitos da opressão de gênero nas ocupações tradicionalmente masculinas – como a área da arquitetura e do planejamento urbano – manifestando-se de maneiras simbólicas na organização do espaço, e de formas mais explícitas, como a exclusão da mulher e a apropriação de seu trabalho. Foi confirmada a hipótese de que a relação da mulher com a cidade é disfuncional, devido à hostilidade que o espaço urbano apresenta para este grupo por meio da ameaça da violência de gênero, que molda a experiência da mulher tanto na esfera doméstica quanto na esfera pública.
Por meio das enquetes e entrevistas realizadas com mulheres, foi encontrado um padrão de apreensão junto a uma forte sensação de falta de liberdade. Observou-se, acordando com a conceituação teórica, que a mulher modifica drasticamente seu comportamento no espaço urbano devido a seu status de grupo particularmente vulnerável. Ao analisar os trechos dos bairros cariocas, verificou-se que os espaços, no geral, carecem principalmente de boa iluminação, manutenção, limpeza, acessibilidade, gerenciamento de fluxos adequado, grau e forma de policiamento adequados, e presença de usos que facilitem a apropriação do espaço. Foi observado também que, apesar das drásticas diferenças entre os contextos dos trechos, as patologias, mesmo quando se manifestam de formas distintas, causam os mesmos efeitos no comportamento da mulher, já que todos se inserem no mesmo contexto maior da misoginia, possuindo o mesmo problema como raiz. Dada a urgência endêmica da questão e a falta de representação política necessária – além de tempo – torna-se necessária a elaboração de estratégias de ação que contem com a participação do cidadão e sejam de implantação mais simples e com um prazo de tempo mais curto do que um plano diretor, com o intuito de oferecer uma solução paliativa que ao mesmo tempo desperte a atenção da população em geral e do poder público. Neste sentido, estratégias na escala do urbanismo tático e social se caracterizam como adequadas para este tipo de intervenção. As estratégias específicas para cada trecho serão delineadas de forma mais detalhada na segunda parte deste Trabalho Final de Graduação. Confirma-se, então, que é de extrema importância para a integridade física e mental da mulher – e para a realização da sua completa participação na sociedade urbana – que seja incorporada a sua perspectiva na construção do território ao mesmo tempo que se desnaturaliza a sua tradicional condição de exclusão.
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UMA ANÁLISE DE ESPAÇOS URBANOS SOB A PERSPECTIVA DE GÊNERO
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