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INTERCÂMBIO OUT 2014 N°1

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CAVANI ROSAS



TORRE DE BRENNAND

O obelisco de Brennand, mais conhecido como “Torre de Brennand”, é uma das atrações turísticas de Recife. Foi concebido pelo aclamado escultor e pintor Francisco Brennand, que possui influências artísticas de Picasso e Gaudí. Embora pintor, ficou mais conhecido pelas esculturas de cerâmica que estão expostas no Museu e Oficina de Cerâmica São João da Várzea, inaugurada em 1971. Construído em 2000, o obelisco de bronze fez parte das comemorações dos 500 anos do Brasil. Localizado às margens do Marco Zero, no parque das esculturas do Recife Antigo, foi alvo de muita polêmica, pois o monumento lembra um órgão sexual masculino. Não foi a única obra de cunho sexual do artista, pois é de costume a influência da arte pagã do Egito antigo em praticamente toda a sua produção artística. Com 32 metros de altura, possui um formato de flor em seu topo. É um dos maiores centros turísticos do bairro do Recife.

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CG: Roberto Portella.

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editorial do divino ao profano drowning princess back to business e algumas idéias sobre o que é trabalho jaume montserrat savage beauty — alexander mcqueen cold feet o cineasta das três bitolas cavani rosas arte digital surreal madonna tim flach comendo do bolo: festa, comida e cultura em nome da felicidade oh, blue, come forth! oh, blue, arise! oh, blue, ascend! oh, blue, come in! a arte de maud vantour aleta fase iv bajado um artista de olinda jérémy schneider narrativa digital: indo além do livro as musas de klimt paisagem calcária na poesia pernambucana jo fevereiro j. borges shin arte&moda boppa armorial 40 anos depois plínio palhano camarada bruscky lara zankoul carlos estevão marcelo ramos lucas freitas

INTERCÂMBIO Out 2015 n°1

PUBLISHER Roberto Portella Câmara EDITOR INTERNACIONAL Rafael Cietto PROJETO GRÁFICO & DIREÇÃO DE ARTE B ­­ ert Zâmara COORDENADORA GERAL Aleta Dantas COLABORADORES (texto) Andreia Miròn, Eduardo Mota, Ninna Phillipini, Adriano Marcena, Jean Frédéric Pluvinage, Paulo Chaves,Cesar Fassina, Thiago Corrêa, Plínio Palhano (artistas) Jvdas Berra, Jaume Montserrat, Claudia Ficca, Davide Luciano, Cavani Rosas, Debby Gram, Tim Flach, Julia Lego, Maud Vantour, Roberto Portella, Bajado, Jérémy Schneider, Hans Withoos, Jolanda Cats, Jo Fevereiro, J. Borges, Shin, Jessica Triputri, Boppa, Plínio Palhano, Paulo Bruscky, Lara Zankoul, Carlos Estevão, Marcelo Ramos e Lucas Freitas (revisão) Aleta Dantas (fotografia) Reinaldo Marques (gerente de marketing) Daniel Henrique. CORRESPONDÊNCIA ivmagazine.contato@gmail.com A revista digital iV é uma publicação trimestral. A publicação não se responsabiliza pelos textos e artigos assinados, que não refletem necessáriamente a opinião da revista. É proibida a reprodução de textos e fotos sem autorização expressa dos autores.

NOSSA CAPA

Maud Vantours.

ÍNDICE

Modelo: Anna Shpak (Queta Rojas Models) Fotógrafo: Jvdas Berra Stylist: Mihaya Urtuzuastegui Hair: Erika Camacho Makeup: Israel Escareño Chong

CARTA DA REDAÇÃO

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cultura visual com o advento da internet passou a não admitir mais fronteiras. O que possibilitou um intercâmbio realmente efetivo com o mercado editorial e assim, eles se misturam em vários momentos nas publicações digitais. A iV Mag é uma revista trimestral de arte feita em Recife, Brasil. Manifestar–se prioritariamente na versão eletrônica, enquanto produto de massa une muitos trabalhos conceituais sempre com um pensamento universal. Nesta edição reunimos um grande time de criadores, escritores e colaboradores de diversos mundos criativos como artes, moda, cultura, design e fotografia. Esse debate não apenas nos impulsiona a experimentar cada vez mais nas linguagens gráficas, imagéticas e audiovisuais em nosso dia–a–dia, mas também busca incentivar a criação artística autoral, afinal o mundo precisa ser alimentado tanto de negócios como de trabalhos autorais. A ideia por detrás dessa iniciativa é fazer uma revista que vai educar e informar de forma aberta, sem restrições morais e sociais e nem mesmo financeiras. Sendo esse um dos nossos diferenciais, diante da multidão de publicações puramente capitalistas que circulam nos dias de hoje. A iV é uma revista independente que se concentra em um sentido mais amplo da arte e da comunidade. O objetivo não é focar em eventos atuais ou em “quem está quente”, mas sim trazer as pessoas para a frente e os fenômenos que merecem reconhecimento e cobertura, independentemente do seu lugar no tempo. Até breve, Equipe iV

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CULTURA_MUNDO

Do Divino ao Profano:

PERFUME Fotografia: Candice Milon

_Por Andreia Miròn

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palavra perfume deriva do latim “per fumum”, os egípcios há + – 4.000 anos A.C honravam seus deuses “esfumaçando” os ambientes e produzindo óleos perfumados através da maceração em seus ritos religiosos. Assim, dos magos, alquimistas para os perfumistas do século XX, as fragrâncias que no primeiro momento da história foram utilizadas para aproximar os homens dos deuses, em outros com o poder de afastar doenças passam a ser símbolo de status e sedução. A fumaça aromatizada que tinha como objetivo evocar os espíritos em rituais através da queima de ervas, especiarias, incensos e madeiras—funcionava como um canal de aproximação celestial. Mas não só de religiosidade o perfume se destacou; também foi cultuado com apelo sedutor e erótico, da bibliografia de Cleópatra às referências do Kama Sutra o perfume desafia o tempo e o libido. Mas é no Velho Testamento que constatamos as citações e suas referências registradas na história… 

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As primeiras referências ao perfume remontam às antigas civilizações do próximo Oriente, especialmente ao Egito.

Instrumento para cozinhar as flores e os ingredientes.

CÂNTICO DOS CÂNTICOS Quão belos são os teus pés nas sandálias que trazes, ó filha de príncipe! As colunas das tuas pernas são como anéis trabalhados por mãos de artista. o teu umbigo é uma taça arredondada, que nunca está desprovida de vinho. O teu ventre é como um monte de trigo cercado de lírios. Os teus dois seios são como dois filhinhos gêmeos duma gazela. O teu pescoço é como uma torre de marfim. Os teus olhos são como as piscinas de Hesebon, que estão situadas junto da porta de Bat–Rabim. O teu nariz é como a torre do Líbano, que olha para Damasco. A tua cabeça levanta–se como o monte Carmelo; os cabelos da tua cabeça são como a púrpura um rei ficou preso às suas madeixas. Quão formosa e encantadora és, meu amor, minhas delícias! A tua figura é semelhante a uma palmeira. Eu disse. Subirei à palmeira, e colherei os seus frutos. Os teus seios serão, para mim, como cachos de uvas, e o perfume da tua boca como o das maçãs.

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Presenciamos durante a Idade Média e o Renascimento que o gosto europeu pelo perfume é inegável além do fato de ser utilizado em inúmeros tratamentos terapêuticos e medicinais; o perfume ganha um novo status ao ser aplicado em colarinhos perfumados, rosários e “almofadas” aromáticas. A famosa “água de Hungria”—talvez o primeiro perfume pessoal—concebido em 1370 à base de rosa, hortelã, ­­erva–cidreira, limão, alecrim e flor de laranjeira, liderou o mercado da perfumaria durante vários séculos. Nos séculos XVI e XVIII, tendo como porta vozes os italianos, espanhóis e franceses os perfumes pungentes substituíram, literalmente, a higiene pessoal. Neste momento histórico, o sinônimo de limpeza não era o habito de lavar–se, mas sim perfumar todo o corpo (cabelo e hálito incluídos!) com pós, pomadas, óleos e águas aromáticas. De uma proporção exagerada, todo o universo pessoal passa a ser perfumado, desde cartas e almofadas, a perucas, ­leques e objetos religiosos! Com o lançamento das luvas perfumadas na França, no século XVII, os franceses tomaram o gosto e a indústria da perfumaria estabeleceu–se rapidamente com a cultura do curtume. Os produtores de perfumes ficaram ainda mais conhecidos por comporem venenos disfarçados como perfumes, um dos quais matou uma duquesa f­ rancesa que ­morreu depois de calçar um par de luvas “perfumadas”, (possibilitada pela ­infiltração do veneno em sua pele). A corte de Luis XV foi até batizada de “corte perfumada”, devida à quantidade de perfume que era pulverizado nas ­roupas, leques e mobília do palácio. Com a virada de um novo século, também o mundo da perfumaria assistiu a muitas novidades! Às casas de perfume francesas, juntaram–se as inglesas, entre muitas outras, e utilizar perfumes desta ou daquela casa tornou–se um símbolo de status social. Desde 1900, após a revolução da indústria da moda, Paris ditava tendências, e com a revolução da indústria química, alguns perfumes começaram a marcar época e se associar a moda. Paris, a cidade luz era referência de elegância de moda e perfume, e se consagra como a capital mundial da perfumaria, através da cidade de Grasse. A alquimia—que até agora privilegiava o uso de substâncias naturais,

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Parfumeria.

animais e vegetais através de técnicas de ­enflourage, destilação e espremedura—deu lugar à química dos produtos ­odoríferos de síntese. Em pleno século XIX, os aromas encontrados na natureza são reproduzidos artificialmente através da química, e assim o surgimento das ­matérias –primas sintéticas representou a possibilidade de produção em uma escala maior. A indústria do perfume parisiense v­ irou sinônimo de sofisticação e a alta–costura animou o frenético movimento criativo dos designers, além de ­Charles Frederick Worth, Paul Poiret,


Fotos: Divulgação

Museum Bellerive.

Thaty Colonia.

Garrafa Cabeça de Cisne.

Coco Chanel—inspirados para criar fragrâncias adaptadas ao glamour de cada grife. A idealização de perfumes em ateliês de “Haute Couture”, já era uma prática comum. E em 1921, o ­perfume apresentado por Ernest Beaux, um jovem perfumista ousado, incorporou ­aldeídos em grande quantidade que deram origem ao Chanel 5 de ­rosas, jasmim e aldeídos. Os aldeídos já eram conhecidos há anos, porém a ousadia ficou por conta de Ernest, afinal um perfume feminino com aldeídos era visto como uma potência de odores. No ano de 1925 , a perfumaria francesa definitivamente aliada a moda se consagrou na industria do luxo, na ­famosa Exposição Internacional das Artes ­Decorativas e das Indústrias Modernas. O Brasil tem sua trajetória marcada na indústria do perfume a partir do século XX, embora na França tenha ­emergido dois séculos antes. Mas o hábito de perfumar–se veio com a corte portuguesa que chegou em terras ­brasileiras no ano de 1808 e com ela o hábito de perfumar–se. De encontro o choque cultural tomou conta dos hábitos portugueses , dos ­negros e dos índios. De roupas pesadas e sem o hábito de banhos diários os portugueses se assustaram com a higiene indígena ­(que se banhavam uma dezena de ­vezes ao dia). Mas foram os escravos negros, por conta da religiosidade africana, do candomblé e da umbanda que da senzala levaram o hábito de ­­banhar–se com flores e ervas, “banho de cheiro” para proteger–se de ­doenças e para p ­ roteção de maus espíritos ­­“banho de descarrego” à casa–grande.

Acabaram constatando que o banho não era nocivo, como se acreditava no Velho Mundo. De acordo com o levantamento da ABHIPEC, os perfumes europeus e americanos não são maioria entre as ­brasileiras, que consomem predominantemente (94%) as marcas nacionais, como O Boticário e Natura. A colônia também entra na mesma classificação das fragrâncias e os hábitos de consumo estão ligados ao estilo de vida. Na região Norte e Nordeste, por exemplo, onde o produto é reaplicado diversas vezes ao dia, notas de lavanda fazem sucesso. Essa é, aliás, a região do Brasil que mais consome p ­ erfume. Já no Centro–Oeste e nas regiões Sul e Sudeste o musk se destaca. Hoje, a indústria dos perfumes continua de vento em polpa, com mais de 30 mil fragrâncias conceituadas no mercado Brasil e desde maio de 2011 ­somos líderes mundiais no consumo de p ­ erfumaria no mundo. Assinado por um estilista, ator ou ­celebridade, o perfume tornou–se um acessório indispensável para homem e para mulher, está acessível a qualquer pessoa e é uma dos presentes mais oferecidos no mundo. É claro que muito mudou em termos de técnicas de produção, matérias–primas utilizadas, formas de apresentação e divulgação, mas uma coisa mantém–se: a aura de ­mistério e romance em torno de cada novo perfume lançado. Os estímulos aromáticos incitam emoções ou recordações, evocam e estabelecem memórias olfativas. Não foi por acaso que a estilista Coco Chanel disse que “o perfume anuncia a chegada de uma mulher e prolonga a sua saída.” 

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EDITORIAL

Princess

Drowning _Fotos: Jvdas Berra





Stylist: Mihaya Urtuzuastegui Guarda–roupa: Wedhaus, Fashion Lovers Hair: Erika Camacho Makeup: Israel Escareño Chong Modelo: Anna Shpak @ Queta Rojas Models Assistentes: Ricardo Marcos, Blanka HG



CULTURA_MUNDO

Moda, Estilo & Trabalho Eduardo Motta — Radar | Inteligência e Projetos de Moda

OS 12 TRABALHOS DE HÉRCULES. Este comeu o pão que os deuses amassaram para ele. Mas deu conta da coisa…

Back to business e algumas idéias sobre o que é o

TRABALHO

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civilização, dizem, avança e evolui. D ­ a moda dizem a mesma coisa. Outro ponto que conecta uma coisa e outra é o esforço despendido para que ambas aconteçam de fato. Em bom português, o trabalho que dá para que as duas entrem em movimento e cumpram sua destinação progressista. O regulador desta conexão seriam as relações de trabalho. As relações civilizadas, é claro. Sem elas este relacionamento desanda e a as afirmações perdem o sentido. Nem uma nem outra avançam ou evoluem e voltamos à barbárie. E o que é pior sem um pingo de estilo, ingrediente que, no final das contas, é o que faz a moda interessante e a civilização algo que valha pena. É por este e por muitos outros motivos que as notícias do trabalho escravo no campo da moda deveriam causar mais impacto do que realmente causam. A prática deveria bastar para riscar do mapa o valor de mercado da marca e da roupa produzida por ela. Para sempre, quem sabe. A despeito disso, e da deselegância implícita, várias das marcas que se comprometem com essa modalidade de trabalho continuam em atividade e continuamos a pagar pelos produtos delas. Como se trabalhar fosse fácil e escravizar alguém através dele, pelo preço final, justificasse os meios. Não justifica. Nem há estilo que aguente. 

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O TRABALHO MAIS ANTIGO DO MUNDO. Pouca gente desempenhou este com tanta graça quanto o personagem de Audrey Hepburn.

O TRABALHO QUE GERA TENSÃO SOCIAL. No filme Sindicato de Ladrões, Marlon Brando sentiu o gosto amargo da corrupção.

Fotos: Divulgação

O TRABALHO QUE ESCRAVIZA. Aconteceu e acontece em tempos pós modernos. Sebastião Salgado foi a Serra Pelada e registrou.

O TRABALHO QUE DÁ DINHEIRO. Uma promessa contemporânea. Tenha tenha O TRABALHO QUE DÁ DINHEIRO. Uma promessa contemporânea. alguma alguma ideia que ninguém teve e ganhe milhão. E aí, vaiEarriscar. A RedeASocial. ideia que ninguém teve eum ganhe um milhão. aí, vai arriscar. Rede Social.

Para Karl Marx, o trabalho não é uma atividade determinada pelo sentido econômico, mas uma prática fundamental e específica da espécie humana. Marx entende que o traço distintivo da h ­ umanidade seria o fato de o homem fazer do trabalho um projeto de sua vontade e de sua consciência. Para ele, o trabalho é a afirmação do homem como um ser consciente. Ou seja, se o trabalho é o escravo, deixa de ser o que é. A moda que é resultado dele, idem. O trabalho tem sentidos diferentes para cada um. Na real, como todo mundo trabalha, poucos tem tempo de pensar a respeito dele. LADY GAGA, mantém o trabalho no topo da agenda, mas é impossível saber, pela declaração dela, se ela está mesmo gostando da coisa: “Eu sou uma garota ocupada. Eu vivo e respiro o meu trabalho.” BERTRAND RUSSELL, o escritor, oferece de graça uma advertência para a musa pop: “Um dos sintomas de um colapso ­nervoso que se aproxima é a crença de que o trabalho é muito importante.” JEROME K. JEROME, escritor e humorista ironiza à maneira inglesa: “Eu gosto do trabalho: ele me fascina. Eu posso me sentar e olhar para ele por horas.” GEORGE CARLIN ator e critico social, dá o texto dos ressentidos. Dos que se sentem prejudicados: “A lagarta faz o trabalho, mas a borboleta recebe toda a publicidade.” RONALD REAGAN, o ex–presidente americano e ex ator mediano, já falecido, fecha com os republicanos e não está nem aí para a classe trabalhadora: “Ouvi dizer que o trabalho duro nunca matou ninguém, mas eu digo, por que arriscar? ” Alguns, como a cantora Lena Horne, dão conselhos práticos: “Sempre seja mais esperto do que as pessoas que você contratar. LEONARDO DA VINCI, gênio em todas as coisas, não complica, apenas reconhece a realidade: ”A vida nos vende todas as coisas ao preço do trabalho”. E assim, caminha a humanidade, cada um trabalhando à sua maneira. Nós, aqui Da Radar, fechamos com o sábio chinês Confúcio. Foi ele quem disse uma vez: ­“Escolha um trabalho que você ama, e você nunca terá que trabalhar em sua vida”. Escolhemos a moda e estamos levando bem a coisa. Até agora, pelo menos. Pois a verdade é que andamos bastante envergonhados com os relatos dessa escravidão tardia que anda costurando nossos casacos em algum canto infeliz do planeta. Para complementar, cedendo com algum atraso à tentação das listas, mania que virou moda global, elegemos arbitrariamente 10 tipos de trabalho que identificamos por aí. 

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GALERIA

O espanhol Jaume Montserrat expressa em suas ilustrações a sua relação de amor e respeito à natureza. Entitulado Emptyland, este trabalho fala ­sobre a importância do vazio, o que para ele, supõe uma infinidade de p ­ ossibilidades. Sua inspiração se deu através de um sonho, onde estava numa ilha cercado por animais. ­“... Todos estavam vazios, assexuados e imortais. Eles não precisavam caçar, nem tinham medo de serem caçados.” Os animais estão retratados como cascas em espirais, possibilitando dessa forma, que um faça parte do outro. "Penso que a arte é a capacidade de encontrar a beleza em qualquer coisa. A arte está no olhar das pessoas, não nos objetos”.

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Meditação.

Ica.

Lima, Perú.

Paraíso.


Elerino.


Zebra.


Flamenco.


Galo.


Girafa.


Urso.


Pinguim.


Tigre.


CULTURA_MUNDO

S В P

avage

eautу ALEXANDER

MCQUEEN

_Por Nina Phillipini

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ara celebrar as contribuições de Alexander ­McQueen no mundo da Moda, ao longo dos seus 19 anos de carreira, o Metropolitam ­Museum, realizou uma exposição em 2011 que se tornou uma das mais visitadas da história do museu realizadas sob a supervisão do curador Andrew Bolton, com o apoio de Harold Koda, curador encarregado, ambos do ­Costume Institute. Savage Beauty (Beleza Selvagem, em tradução livre), nome dado a exposição com a mostra de McQueen, e teve mais de 661 mil ­visitantes. Com seu inicio em 4 de maio a data para encerramento estava prevista para o dia 31 de julho, mas o museu teve que estender a duração e trabalhar com horários especiais, por conta do sucesso. A mostra acabou ocupando as salas do Metropolitan Museum até 7 de agosto. No último dia os visitantes chegaram a enfrentar uma fila de até cinco horas para conferir a exibição. 


Fotos: Divulgação

Savage Beauty entrou para as 10 exposições mais visitadas da história do Metropolitan Museum, que abriga diferentes mostras desde 1870. Os visitantes puderam ver seis diferentes espaços com peças das coleções de Alexander McQueen, havia desde sua coleção de 1992, resultado da pós–graduação no Central Saint Martins, até seu último desfile, que aconteceu depois de sua morte no ano de 2010. A exposição contava com 100 peças e 70 acessórios. O Metropolitan Museum cita Alexander ­McQueen como um estilista que desafiou o entendimento de moda para além da utilidade das roupas transformando–as em uma expressão conceitual de cultura, política e identidade. Cada um dos seis espaços recebeu e uma ­frase, dita pelo próprio McQueen: 

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A MENTE ROMÂNTICA “Você precisa conhecer as regras para as quebrar. É por isso que eu estou aqui, para demolir as regras, mas manter a tradição.”

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GÓTICO ROMÂNTICO E CABINE DE CURIOSIDADES “As pessoas acham que às vezes minhas coisas são agressivas. Mas eu não vejo isso como agressivo. Eu vejo isso como romântico, lidar com o lado obscuro da personalidade.”

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NACIONALISMO ROMÂNTICO “A razão de eu ser patriota pela Escócia é porque acho que ela tem sido tratada muito mal. É comercializada por todo o mundo como… haggis (prato tradicional escocês)… gaita de fole. Mas ninguém nunca fala de outra coisa.”

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EXOTISMO ROMÂNTICO “Eu quero ser sincero sobre o mundo em que vivemos, e às vezes minhas convicções políticas interferem no meu trabalho. A Moda pode ser muito racista, olhando para as roupas de outras culturas como fantasias… Isso é mundano e ultrapassado. Vamos quebrar algumas barreiras.”

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NATURALISMO ROMÂNTICO “Eu sempre amei os mecanismos da natureza, e em maior ou menor grau, o meu trabalho é baseado nisso.”

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PRIMITIVISMO ROMÂNTICO “Eu tento evidenciar a silhueta. Mudar a silhueta é mudar o pensamento de como nós olhamos. O que eu faço é observar as antigas tribos africanas, e como eles se vestem. Os rituais de como eles se vestem… Há muito de tribalismo nas coleções.”

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EDITORIAL

Feet Cold

Um casal perfeito, radicados em Nova York. Dentro de um projeto surreal, criando ilusão de movimentos em animais inanimados. Davide Luciano e Claudia Ficca mostram através da fotografia a série “Cold Feet”, pés de animais jogando cartas, tricô e fazendo outras atividades humanas. _Food Stylist: Claudia Ficca _Fotos: Davide Luciano


Charuto & Scotch.



Manicure.



Bilhar.



Domin贸s.


PaciĂŞncia.




Tric么.


Fotos: Divulgação

CULTURA_MUNDO

Foto: Arquivo/DP/D.A Press

Atriz theca Dana Smutna

Patrimônio vivo de Pernambuco.

Cineasta e jornalista recifense Fernando Spencer, falecido em 17 de março de 2014.

Na gravação de Evocações… Nelson Ferreira, com Flavio Rodrigues (centro), co–diretor.

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Fotografia: Priscilla Buhr

Ao lado de Anthony Perkins.


Spencer: Fernando O cineasta

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das três bitolas

nome Fernando Spencer é sempre lembrado quando o assunto é cinema pernambucano. Cineasta, jornalista e crítico por mais de 40 anos, ele foi responsável por uma extensa filmografia, com mais de 30 títulos produzidos ao longo de todo esse tempo. Também foi um grande pesquisador na área do audiovisual e reconhecido como uma dos mais emblemáticos realizadores do cinema pernambucano no último século. Partiu em março deste ano (1927–2014), e deixou um legado irretocável para as gerações posteriores. Spencer é um dos homenageados deste 7º Festival de Cinema de Triunfo e, a partir deste ano (2014), os vencedores da categoria de curta–metragem pernambucano ganharão o Troféu Fernando Spencer. Fernando José Spencer Hartmann nasceu no Recife, no dia 17 de janeiro de 1927, num sobrado da Rua Augusta (hoje destruída), no bairro de São José, filho de Niconedes Brasil Hartmann e Maria Serafina Spencer Lopes Neto. Seu pai, filho de um engenheiro a­ lemão, Antônio Guilherme Hartmann, foi escrivão de polícia e colaborador de diversos jornais recifenses, entre os quais, o Jornal do Recife, A Noite, J­ornal Pequeno e o Diario de Pernambuco. Estudou em diversos colégios, devido às constantes mudanças de residência da família. Morou no bairro de Afogados, no Recife, em Pau d’Alho e Carpina, municípios da zona da mata pernambucana e na Rua Visconde de Ouro Preto, em Casa Forte, próximo da Praça. Terminou o primeiro grau na Escola Iracema da Costa Lima e fez o segundo grau nos colégios Salesiano e Padre Félix, antigo Ginásio do Recife. Começou a trabalhar aos 17 anos, datilografando e desenhando letras góticas para abertura de livros, na Delegacia de Ordem Política e Social de Pernambuco. Trabalhou também no Cartório de Nascimento e Óbito

de Casa Amarela e ainda como chefe de serviço de cadastro, na filial da empresa de eletrodomésticos, Arno S.A. Seu ­objetivo, no entanto, sempre foi escrever, entrar na carreira jornalística. Foi colaborador de diversos jornais recifenses como o Jornal Pequeno; O Dia; Diario de Pernambuco, onde entre 1952 e 1953, e durante dez anos, tinha uma página infantil, sob o ­pseudônimo de Fernando Saldanha. Mais tarde, também utilizou o pseudônimo de Sérgio Nona, numa página sobre cinema, música e vídeo no Diario de Pernambuco. Colaborou ainda, escrevendo contos para os suplementos literários do Jornal do Commercio e do Diario de Pernambuco, assinando em ambos seu nome completo Fernando Spencer Hartmann. O interesse pelo cinema foi influenciado pelo pai. Aos treze anos, recebeu de presente um projetor de brinquedo que passava filmes de 35mm e foi usado para que ele construísse (...) um cineminha para umas vinte pessoas no fundo do quintal, o Cine Metro (...) No final da década de 1940 e 1950 ­frequentou o Cine Ellite, um cinema que existia em Casa Forte, próximo da sua casa. Tornou–se amigo do porteiro, a quem ajudava a limpar a sala e onde pôde assistir dezenas de musicais e faroestes. Além de jornalista, revisor e editor de cinema do Diario de Pernambuco, onde trabalhou durante quarenta anos (1958–1998), Spencer também teve experiências em rádios. Na década de 1960, fez os programas Filmelândia, na Rádio Clube de Pernambuco, na Rádio Tamandaré e Falando de Cinema, na TV Rádio Clube de Pernambuco. Ambos os programas duraram onze anos ininterruptos. Em 1980, assumiu a coordenação da Cinemateca da Fundação Joaquim Nabuco, atendendo a um convite do então presidente do órgão, Fernando de Mello Freyre, ocupando o cargo até o ano de 2000, quando se aposentou. Considerado como o realizador mais antigo da história do cinema em

Pernambuco e um dos pioneiros do estilo Super Oito de fazer cinema, Spencer começou sua carreira de cineasta em 1969, com A busca, um filme experimental de sete minutos que escreveu, dirigiu e realizou, de maneira artesanal, tendo os filhos como atores e seu amigo Carlos Alberto Campos como fotógrafo. Conhecido como o cineasta das três bitolas (super 8, 16 e 35mm) afirma preferir fazer documentários, porque têm a vantagem de poder ser realizado com uma equipe pequena (...) eu, o fotógrafo e um ou dois assistentes (...) Os filmes eram exibidos em faculdades, auditórios de associações culturais e principalmente nos festivais de cinema, realizados em diversas cidades ­brasileiras como Salvador, Recife, São Paulo, Rio de Janeiro, São Luis, Penedo. Foi presidente da Associação Brasileira de Documentaristas e Diretor da Divisão de Teatro e Cinema, da Secretaria de Educação e Cultura, da Prefeitura Municipal do Recife (década de 1970). Autor de aproximadamente 36 filmes de curta metragem (em Super 8, 16mm, 35mm) e oito vídeos, ganhou diversos prêmios nacionais e estrangeiros. Ao completar 80 anos, em janeiro de 2007, foi homenageado com o ­lançamento do DVD Paixão de cinema sobre sua trajetória, com depoimentos de amigos que acompanharam sua ­carreira, recuperada por Marcílio ­Brandão, um dos sócios da empresa Página 21, idealizadora e executora do projeto. Surpreso com a homenagem diz o cineasta: Eu não esperava um trabalho sobre a minha vida. Não imaginava que eu fazendo cinema, um dia pudesse ser o protagonista da obra. Em 2007, Fernando Spencer foi um dos escolhidos como Patrimônio Vivo de Pernambuco.  CONSULTA BIBLIOGRÁFICA: Portal Cultura. PE. PEGASPAR, Lúcia. ­Fernando Spencer. Pesquisa Escolar Online, Fundação ­Joaquim Nabuco, Recife.

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GALERIA

Cavani Rosas, nasceu no Recife, Pernambuco. É escultor, ­ esenhista, pintor e ilustrador de livros, ­jornais, revistas, d quadrinhos e desenho animado. Começou a carreira na década de 1960. No Diário de Pernambuco foi ilustrador do suplemento infantil e da página de humor. Colaborou para ­publicações como Folha de S. Paulo, Caros Amigos e Le Monde Diplomatique, entre outros. Como d ­ esenhista, busca o fantástico através do realismo das formas humanas, da natureza e da arquitetura. Em 2012, Ganhou o primeiro prêmio sobre símbolo da copa do mundo 2014 em Pernambuco com o tema de ­­­Mateus e Bastião.

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Uma série de esboços para o filme “Sob a Pele”. Cavani Rosas criou tatuagens que foram transpostas para o corpo da atriz, Rita Carelli.










ARTE DIGITAL

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Ben Laposky

_Por Ninna Phillipini

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uito se fala sobre arte digital, porém poucos de fato sabem o que representa este conceito: trata–se da manifestação artística gráfica através do computador, e tem por princípio a construção da arte a partir de processos digitais com a utilização de ­softwares especiais. Na arte digital softwares diversos como Adobe Photoshop, 3D Studio Max, Maya, Adobe Illustrator, Freehand, ­FireWork, Adobe Flash, Adobe ­Premier, Adobe After Effects, entre outros. Dentre os tipos de artes digitais destacam–se Ilustração Digital, Animação 3D, Modelagem, Pintura e Gravura Digital, Edição de Fotografia e Imagens. O mercado de arte digital experimentou um aumento significativo nos últimos 10 anos, com taxas ao redor de 10% ao ano. No Brasil, o crescimento do mercado gira em torno de 15%. Este crescimento é impulsionado por incentivos governamentais, e, principalmente, por grandes produções para o cinema, com bilheterias que batem recordes atrás de ­recordes, e por uma utilização cada vez maior da animação no mercado publicitário. O Brasil é reconhecido por ter estúdios e profissionais de qualidade, além de ter preços altamente competitivos. O mercado nos últimos anos é demandante de mão de obra especializada neste setor. O perfil do profissional de arte digital é de jovens com idade em torno de 25 anos, sendo 75% do sexo masculino, criativo, determinado e antenado com inovações tecnológicas e com que acontece no mercado mundial. Embora esses recursos computacionais tenham sido implementados anteriormente para

a visualização matemática e científica, muito cedo alguns artistas souberam tirar proveito deles para a exploração de uma nova visualidade dentro das artes plásticas. Os primeiros trabalhos artísticos produzidos com o auxílio de computadores utilizavam ainda máquinas analógicas para gerar as imagens, osciloscópios de raios catódicos para exibi–las e películas cinematográficas para registrá–las. Assim é que, em 1952, Ben F. Laposky, nos Estados Unidos, e Herbert W. Franke, na Áustria, conceberam, respectivamente, suas Abstrações Eletrônicas e seus Oscilogramas, considerados as primeiras imagens da computer art. Mas foi a partir de 1962, com o desenvolvimento, por Ivan S ­ utherland, de um completo sistema interativo de desenho por computador, o Sketchpad, que começaram a aparecer os primeiros trabalhos artísticos produzidos inteiramente com computadores digitais. Os pioneiros dessa segunda fase foram os alemães Georg Nees e Frieder Nake, os n ­ orte-americanos Michael Noll e K. C. Knowlton e o húngaro Bela Julesz. De um modo geral, entende–se por computer art um conjunto bastante diversificado de procedimentos, atitudes e estratégias da arte e do artista com relação ao computador. Num primeiro sentido, o computador pode ser encarado como uma ferramenta para a geração e o tratamento das imagens. Uma vez produzidas, modeladas, no caso das imagens tridimensionais, e eventualmente animadas e sonorizadas, as imagens são transferidas para outro suporte (papel, tela, filme, vídeo) e exibidas nas formas tradicionais em galerias de arte ou salas de projeção, assim proliferam–se comunidades virtuais voltadas à divulgação desse tipo de expressão artística. A arte digital só pode ser entendida no âmbito da arte contemporânea.

Erik Johansson.


Alberto Seveso.

Substituindo seus pincéis e prancheta pelo meio virtual, diversos artistas contemporâneos têm feito do computador seu maior instrumento de trabalho. Este movimento ocorre com os artistas do mundo inteiro, como Erik J­ohansson, Alberto Seveso, Christophe Huet, Ricardo­ Salamanca, Oleg Dou, entre outros. 

Christophe Huet.

Roberto Portella.

Oleg Dou.

Ricardo Salamanca.

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EDITORIAL

Sur real _Fotos: Debby Gram _Concepção/Styling: Drica Cruz

Brincos, Minha avó tinha. Colete, B.luxo.



Cintos, Volta ao Mundo. Saia, Minha av贸 tinha.


Colares, B.luxo. Vestido, Minha av贸 tinha.


Vestido, Samuel Cirnasck.


Vestido, Froufrou.


Brincos e Cinto, Minha av贸 tinha. Vestido, B.luxo. Borboleta, Wal茅rio Araujo.

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Beleza: Rafael Capello Modelo: Manoela EW / Ford Models Agradecimento: Brech贸 Minha av贸 tinha

Brincos, Minha av贸 tinha. Colete, B.luxo. Saia, Minha av贸 tinha. Sapatos, Volta ao mundo.

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fotos:Roberto Portella

Madonna

CULTURA_MUNDO

“Eu sou Joselma, conhecida como Madonna dos Cachorros. Moro nas ruas do Recife com meus meninos, e tenho um estilo ousado de me vestir, isso quando eu me visto néh.”


O

O vento vem soprando suavemente, algumas sombras das nuvens que passam apre s sad a ment e apresentam lampejos do sol do dia, com seu calor e esplendor que chega despercebido pela grande multidão barulhenta com os seus sapatos descalços. Mais uma manhã arrastada e sonolenta na vida da moradora de rua, Madonna e dos seus cachorros e seguranças particulares: Mineiro, Crioulo e Alexandre. Seu lar é decorado com pedaços de papelão colados no teto do seu carcomido corpo lesado pelo tempo. O chão lhe serve como moradia de um endereço incerto de um Recife Antigo. 

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Apesar de ter um atestado de insanidade mental, segundo afirma sua irmã Josenilda Gomes de ­Oliveira,—a Tuca, como é conhecida—Madonna dos Cachorros vive a sua loucura aparente nos olhos dos passageiros da agonia que transitam em direção contrária aos seus pensamentos. Eles não conseguem absorver o real do mundo que Madonna sobrevive, talvez mais lúcido do que o nosso, cheio de conturbações espirituais e profetas políticos salvadores do caos. Sua mente alcoolizada a torna delirante. Trôpega, afasta sua pele grudenta colada em roupas vestidas do paraíso, pronta para um strip tease decadente. Sua conversa particular é dirigida a sua legião fiel de cães, que a observam atentamente, os afaga e mima com chupetas ­adocicadas, colo e carinhos. 


Com suas frases: “eita, que homem bonito danado” ou “veja como ela parece com a Kelly Key”, ela vai conquistando as pessoas que d ­ epositam trocados em seus bolsos espertos e gastadores, para manutenção de sua prole de seguidores adestrados. As aparências enganam! Essa senhora, Madonna, que deixou a vida ­vazia encher o seu espírito em desconstrução com uma degradação visual, loira original com cabelos esvoaçantes, ­corpinho s­ arado, cheia de vida e m ­ ovimento e dona de um inglês impecável. Foi uma das mais desejadas entre ­marinheiros e ­boêmios que viviam nos bares e boates das noites do Recife Antigo, entre as décadas de 80 e 90. Um acidente de carro deixou uma platina “tatuada” no braço e o ­ utra na cabeça. Quase que desce ao ­inferno de Dante. Da lama ao caos mental, Madonna é parte integrante de um contexto que não faria sentido algum se não ­contasse com a presença desses seres ao avesso da doce vida idealizada pela grande massa de passantes. Mas como cada cidade tem suas figuras pitorescas que habitam fedidas ruelas. Aqui no Recife não poderia ser diferente. E viva Madonna dos cachorros. 


GALERIA

Retratos de estúdio exibindo criaturas s­elvagens com gestos extremamente expressivos, ­semelhantes aos nossos. O londrino ­­Tim Flach, conseguiu esse resultado e construiu uma ­sequência incrível de registros de animais revelando emoções dignas de seres humanos. O fotógrafo passou os últimos 20 anos ­trabalhando no mercado publicitário para marcas como Adidas, Cirque du Soleil, Jaguar e Sony. Depois de receber a atenção mundial por suas imagens de cães e cavalos, o trabalho intitulado More Than Human tem como objetivo capturar emoção nos animais para serem devidamente lidas e interpretadas. Sua obra tem sido amplamente exibida no Reino Unido, EUA e Extremo Oriente.

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CULTURA_MUNDO

I

magine passar uma hora na cerimônia enfadonha do casamento e quando chegar na hora da recepção não ter bolo para comer? O falatório é geral. Bolo de noiva ruim todo mundo fala mal, imagine festa de casamento sem bolo? Numa solenidade de matrimônio não podem faltar os nubentes, quem fará a cerimônia e os convidados. Esse tripé parece imprescindível, entretanto, faltou algo essencial ao rito de passagem: o bolo da noiva. Durante a cerimônia se observa o vestido da noiva, seu penteado, arranjo de cabeça, maquiagem, unhas, sapatos, dentre outros detalhes que ­ficam mais reservados aos comentários das m ­ ulheres. No momento da recepção é o bolo que muitos desejam. Por mais apressado que se esteja, espera–se para que os noivos cortem o bolo para que possa ser distribuído entre os presentes. Apesar de se saber que nenhuma relação é eterna, ninguém se casa para se separar. Eu diria que pouquíssimos se casam para se separar. O casamento é um ato social fundamentado na constituição de uma família e sua consequência contribui para a preservação da espécie humana: filhos. Casa–se para ser feliz... A comida irmana os seres humanos há muitos séculos e sua função cultural não está ausente em nenhum momento importante das nossas vidas sociais. Não podemos esquecer que a cerimônia do enlace matrimonial também não está livre de garantir a presença da comida em seu contexto ritualístico. Em Pernambuco, a cerimônia de casa-

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mento obriga a presença do bolo de noiva ou bolo de casamento, sem ele, a relação simbólica tem um início socialmente inconsistente, fria, egoísta. O bolo, alimento–símbolo da nova empreitada social dos noivos, será repartido, dividido em fatias e distribuído entre todos, inclusive, para levar para casa ou para quem não se fez presente à cerimônia. Quem come uma fatia do bolo, em meio à alegria dos cumprimentos, comunga da decisão dos noivos e, ao digeri–lo, confirma seu voto de confiança no novo casal. Discutindo a questão entre o ato sexual e o ato de ingerir alimentos, Roberto DaMatta ressalta que “o bolo do casamento e o banquete que segue a cerimônia podem muito bem ser vistos como um símbolo dessa ‘comida’ que será a noiva, algo elaborado e, sobretudo, socialmente aprovado pelos homens do seu grupo”. O bolo de noiva também está associado à fartura que deve permear os desejos do casal. Para se ter ideia, na Roma antiga, durante as cerimônias de matrimônio, as noivas comiam um pão preparado especialmente para a ocasião, significando a vida em comum, a responsabilidade que se iniciava. Com esse mesmo sentido, as noivas gregas usavam pão, frutos secos e bolo. É desse costume grego e romano que vem o bolo de casamento dos dias correntes, o qual é partido pela noiva como­­primeiro ato de sua nova condição de casada. 


Fotos: Divulgação

COMENDO DO BOLO: FESTA, COMIDA E CULTURA EM NOME DA Felicidade O mês de maio é dedicado às noivas e a todo o complexo que envolve uma cerimônia nupcial. em algo muito Deixando de lado o fuzuê que marca a preparação do festejado dia, ­­deter–nos–emos ­­ simples, mas que tem um poder simbólico fulminante: o bolo da noiva. _Por Adriano Marcena Há algum tempo que o bolo de casamento é cortado pelas mãos unidas dos noivos, salientando que a mão da noiva pega na faca e a do noivo sobre a dela. Aliás, aquele bolo de noiva padrão, branco monótono, enjoativo igual à pureza da noiva, com pequenos detalhes ornamentais está pra lá de fora de moda. Bolos criativos, que prezam pelo humor e pela personalidade dos noivos estão disponíveis na Internet a preços módicos. São bolos artísticos, tanto da perspectiva plástica quanto da comestibilidade. Se no passado a arte no bolo de noiva estava atrelada apenas ao sabor, hoje, sua elaboração estética é capaz de causar uma sensação de agradabilidade no ­observador muito antes mesmo de colocar um pedaço na boca. A leitura visual vem antes da gustativa. Comemos, literalmente, muito mais com os olhos... Uma solenidade como o casamento é

momento de alegria, festa, brincadeira, lune de miel, como dizem os franceses. pois a seriedade começa quando acaba o Contudo, embriaguez passa logo, mas mel da lua… Nada melhor que começar o bolo ruim servido no casamento será o exercício lúdico do enlace pelos maio- lembrado por muita gente e por muito res símbolos: o bolo e o vestido da noiva. tempo. O termo lua–de–mel é de origem Existe uma curiosidade, espécie de su- oriental, pois os antigos acreditavam que perstição, que vale ser lembrada. Para no casamento a ­primeira lua (o primeiro não se separarem, os noivos deverão mês) era de mel e a segunda era de abcongelar em casa um pedaço do bolo sinto. A terceira, use sua imaginação... da noiva e só comê–lo um ano após a E essa coisa da felicidade? Efêmera, fugaz e centrifugadora, a quimérica data do casamento. Ao sair de um casamento, muitas mu- sensação que substantivamos felicidade, lheres perguntam entre si: comeu do cheira à centelha emotiva e, às vezes, vai bolo?... A resposta sincera a tal pergun- à categoria de brasa existencial, depois ta é tão reservada quanto os detalhes vira taco de carvão que em alguns mosexuais de uma lua–de–mel. Quando mentos incendeia flácidos sentimentos o bolo não é aprovado por muitas, a esfacelados que também vão ao pó, do resposta, sempre dita baixinho para não qual, provavelmente, não sairão jamais. ser ouvida por muitos, parece ­unânime: Viva os noivos!  péssimo! Não sei o que é pior para uma noiva recém–casada: um bolo de casa- 1. MARCENA, Adriano. Dicionário da Diversidade mento fajuto ou um marido bêbado na Cultural Pernambucana. 2.ed. Recife: CEL, 2011.

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EDITORIAL

Vestido de Organza, テ「rea Prates. Colete e Calテァa, Printing.


(Do filme Blue de Derek Jarman)

Oh, blue, come forth! Oh, blue, arise! Oh, blue, ascend! Oh, blue, come in! _Fotos: Julia Lego


Casaco, Cropped Top, Rega de Tela e Calテァa. Plural. Saia e Sandテ。lia. テ「rea Prates.


Casaco, Regata, Camiseta, Saia de Organza e Sandテ。lias, テ「rea Prates.


Vestido de tule e seda. Printing. Saia. Fรกtima Scofield.


Body e Capa de Chuva em Plรกstico, Vivaz.


Vestido, Printing. Saia, Fรกtima Scofield.


Casaco, Top, Saia e Macacão, Mabel Magalhães.

Styling: João Paulo Durão Produção de Moda: Jéssica Nogueira Assistente Styling: Dane Moore Make: Luiz Bicalho Hair: Theodoro Remigia Vídeo: Fabio Lamounier e Rodrigo Ladeira Modelo: Jennie / Mega


AA

Inca

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CULTURA_MUNDO

Arte de

Maud Vantours

Espiral.

artista plástica e designer, Maud Vantours, nasceu na França em 1985, vive e trabalha em Paris. É uma artista visual especializada em design textil e materiais. Depois de ­completar seus estudos na ESSA Duperré, a freelancer ganhou espaço e despertou emoções com sua arte simples, orgânica e dimensional. Maud Vantours fez do efeito a maior virtude do seu trabalho. Cores, materiais e padrões têm um lugar importante em sua obra, como o papel, que se tornou seu material favorito. Ela esculpe–o em 2D, camada após camada, através da sobreposição de papel e cores para criar padrões inspirados em volume. Um trabalho poético que emerge de suas esculturas e padronagens e permeiam entre a arte e o design. Ela é muito requisitada para editoriais, além de criar o design de mini cenários para campanhas publicitarias e ensaios fotográficos de produtos para Feliz 2013.

Guerlain, Foto: N. Iwanowski.

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Topo.

Festa de confete.

TagHeuer.

grandes marcas de luxo como Guerlain, Tag Heuer, YSL ou Lancôme e grandes varejistas. Em 2008, ganhou o prémio “Coup de Cœur” para a competição Descamps, e primeiro lugar na árvore de Natal de designers, competição organizada pelo Intercontinental Hotel Paris. Ao bloqueiro Andreea Popa, deu essa rápida entrevista. POR FAVOR, VOCÊ PODE FALAR SOBRE VOCÊ? Veja minha biografia no meu site. QUAIS SÃO AS SUAS FONTES DE INSPIRAÇÃO? Pode ser qualquer coisa, uma viagem ou uma exposição. Às vezes, eu posso ter uma ideia e não saber de onde essa ideia veio. Meu cérebro está constantemente pronto para ser inspirado. QUAL É O SEU PROCESSO? ESTOU INTERESSADO EM SABER MAIS SOBRE COMO VOCÊ ATINGE E ­ SSAS JUSTAPOSIÇÕES SURREAIS. É TUDO NA MÃO OU VOCÊ USA UMA COMBINAÇÃO DE PLOTTER DE RECORTE + COMPUTADOR? Às vezes, eu desenho à mão e às vezes eu uso o meu computador.

Então, eu posso cortá–la com a mão ou com um plotter. ­ epende da escala do projeto e do material utilizado. D VOCÊ FAZ COLABORAÇÕES? Sim, eu colaboro com com fotógrafos, artistas ou com ­marcas jovens como Bijoux de Famille. QUEM SÃO SEUS ARTISTAS FAVORITOS? Adoro o trabalho de Giuseppe Penone, é poético e poderoso. Também, Louise Bourgeois, Andy Goldsworthy e de muitos outros. PODEMOS ENCONTRAR UMA SÉRIE DE OBJETOS IMPRESSOS COM O SEU TRABALHO EM QUALQUER LUGAR OU EM APENAS UMA EDIÇÃO LIMITADA? Infelizmente, foi uma edição limitada da atomic soda e o website rad. QUAIS SÃO SEUS PLANOS PARA O FUTURO. NO QUE DEVEMOS FICAR LIGADO? Meu plano é continuar a trabalhar em projetos agradáveis ​​e tentar colaborar cada vez mais com outros artistas. OBRIGADO, MAUD! 

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EDITORIAL

_Fotos: Roberto Portella _Modelo: Aleta Dantas _Beleza: Carlos Ramos

ALETA fase Uma expressão! Cada gesto em sucessivas mutações que falam em certas coisas das fases de um olhar presente.

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CULTURA_MUNDO

BAJADO Um artista de Olinda

Fotos: Divulgação

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Bajado nasceu Euclides Francisco Amâncio. Em 1912, na cidade da Mata Sul ­pernambucana, Maraial, nascia o p ­ intor que, duas décadas depois, ­encontraria em Olinda a inspiração para seu trabalho, e também a morada definitiva, ­desenhando em seus quadros verdadeiras crônicas do cotidiano olindense. O Carnaval de Olinda, é um dos principais motivos das obras de Bajado, em 2014, o artista foi tema do carnaval de Olinda. “É muito bom, é muito gratificante a gente homenagear Bajado no Carnaval porque ele foi uma pessoa que revelou essa folia olindense. Não só no carnaval, mas no bumba meu boi, na c­ iranda, no maracatu”, comemora o artista plástico radicado em Olinda, Raul C ­ órdula, autor do livro “Utopia do Olhar”, que retrata a história da arte da cidade Patrimônio Cultural da Humanidade das últimas décadas. Segundo conta o livro, Bajado conviveu com um conjunto de artistas como Adão Pinheiro, Petrônio Cunha e Ypiranga Filho que, assim como ele, escolheram Olinda para viver e criar. A s­ ingularidade do pintor da Mata Sul, no entanto, era a forma de registrar “as coisas do povo,

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na linguagem do povo”, define Córdula. Essa simplicidade e o caráter empírico de sua arte faz com que muitos o classifiquem como um pintor naïf, que em francês quer dizer “ingênuo”. Termo usado para definir a arte produzida por artistas sem formação acadêmica, a arte naïf é marcada pela forte presença das cores primárias, azul, vermelho e amarelo, e pelos traços simples. Quando chegou em Olinda, no início da década de 1930, para se sustentar, Bajado pintava cartazes e letreiros de cinemas ­locais — outra paixão do artista —, como o Cine Olinda e o Cine Duarte Coelho, e também fazia ilustrações para estabelecimentos comerciais diversos. A ponte que levou o artista local ao mundo foi a intervenção do colecionador e comerciante de arte italiano, Giuseppe Baccaro. Giuseppe Baccaro foi um “marchand” ­diferenciado, pois sua solidariedade e amor à arte eram maiores que o apego às obras. Em dado momento, ­Baccaro vendeu metade de sua coleção e veio morar em Olinda, onde abriu a ­Fundação Casa das Crianças de Olinda, espaço de acolhida e introdução de crianças ao mundo artístico. Foi por intermédio do italiano que ­“Bajado um artista de Olinda”, como ­assinava seus quadros, foi reconhecido internacionalmente, tendo realizado exposições em vários países. Em 1994, dois anos antes de morrer na casa em que morava na Rua do Amparo, Bajado foi homenageado pela Unesco em Paris. “Entre os artistas que conheci, acho que Bajado foi o que mais entendeu e ­gostou do povo. E que melhor o r­ epresenta, sendo ele mesmo povo e gostando de ser. Ao contrário da maioria dos artistas, ­Bajado não quis subir de status, preferindo


ficar onde estava”, fala Baccaro em depoimento presente no livro “Utopia do Olhar”. Bajado também era apaixonado pelo esporte mais popular do país, o futebol, e torcia pelo Santa Cruz, conhecido por ser o time das massas. Sendo assim, o futebol e o time tricolor foram elementos bastante presentes em sua obra, ao lado do Carnaval, de ­situações da vida cotidiana e da cultura do povo pernambucano, em especial o Olindense. Hoje, a pintura de Bajado inspira e ultrapassa barreiras artísticas. Em 2013, o ­maestro Ivan do Espírito Santo, junto com 30 músicos da Orquestra Henrique Dias e da Orquestra Sinfônica do Recife, apresentou ao público pela primeira vez o espetáculo “Ópera Bajado”, que será reapresentado durante a abertura do Carnaval 2014. São 18 canções inspiradas, cada uma, em uma tela do pintor. “Os quadros de Bajado têm um som imaginário. Parece que ele estava escutando alguma música enquanto pintava”, observa maestro Ivan, cujo trabalho foi justamente extrair o som das telas do artista, o que resultou num repertório repleto de frevo, ciranda, maracatu, entre outros ritmos pernambucanos. Ivan contou com a ajuda dos designers Charles e Luiz Ribeiro para retratar a ação presente nas obras de Bajado. A dupla realizou um trabalho de animação que consistiu em recortar as figuras e colocá-las em ação a partir de movimentos sugeridos pelo próprio desenho do artista. “Tem sempre um gerúndio nos quadros, os personagens estão sempre fazendo algo: cantando, dançando”, analisa Maestro Ivan. Bajado, patrimônio da cultura pernambucana, morreu, aos 84 anos, em 1996, em sua residência na rua do Amparo, nº 186, ­Olinda. Já doente e quase cego, ­desenhava compulsivamente. Com uma caneta ­hidrocor se auto–retratava e fazia ­inúmeros desenhos dos cow–boys americanos Tom Mix e Buck Jones. Todos estes desenhos, feitos naquela ocasião, foram guardados pelo poeta e fotógrafo José Rodrigues Correia Filho. Embora reconhecido, morreu pobre e sem recursos para financiar os tratamentos de saúde de que n ­ ecessitava. Se fosse vivo, Bajado teria a oportunidade de ver um trabalho inspirado em sua obra abrindo os festejos da manifestação popular que mais retratou, o Carnaval de Olinda de 2014.  CONSULTA BIBLIOGRÁFICA: Fonte: http://carnaval.olinda.pe.gov.br/carnaval-2014/ homenageados/ bajado|ht tp://w w w. lu i zb er t o.c om /c r on ic a s- do -p a d r e - qu i nc a s / bajado-o-artista-de-olinda-parte-ii

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Fotos: Divulgação

GALERIA

Diretor de arte, designer gráfico e ilustrador, Jérémy Schneider reside em ­Paris e tem como parceira de trabalho sua namorada Violaine Orsoni. Juntos elaboram livros, revistas, e identidades de marca. Suas ilustrações são feitas com giz preto, uma pedra muito frágil, mas detentora de traços suaves, porém ­ wfortes. O requinte observado em suas imagens se deve à importância que dá à luz.

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O Barbudo.


O Gorila.


Homem Macaco.


Detalhe: Selva. (Padr達o)



Eleição.


A Surpresa.


Pรกssaro de Fogo.



CULTURA_MUNDO

NARRATIVA DIGITAL: indo além do livro Fotos: Divulgação

_Por Jean-Frédéric Pluvinage

A

leitura é uma atividade tão antiga quanto a história, mas assim como toda boa história, ela sofre alterações. Dos contos de fada às bibliografias, dos mistérios de detetive às pesquisas­ ­científicas, grande parte do conhecimento humano era encontrado somente na leitura de textos impressos em folhas de papel,­­­não mais. Sim, os livros continuam à disposição, nas estantes e prateleiras, mas agora dividem espaço com o universo do livro digital, também chamado eBook. E a vinda deste novo suporte representa uma revolução na própria forma como lemos e concebemos um livro. Um eBook não é apenas acessar o texto do livro disposto em uma tela. É isso, e muito mais que isso. COMO SURGIU O EBOOK

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A popularização da informática e do computador permitiu que textos fossem produzidos e divulgados eletrônicamente, facilitando a troca de informações de forma instantânea e global. Embora isso seja prático para a transmissão de mensagens curtas, a leitura de textos extensos ainda permanecia muito desconfortável. Mesmo assim, as primeiras experiências textuais e literárias foram surgindo. Embora seja difícil datar com precisão qual foi o primeiro livro digital, é possível apontar exprimentos e publicações marcantes que podem servir de referência. Em 1971, o então estudante americano Michael Hart ganhou acesso ao sistema de computadores da Universidade de Illinois e decidiu contribuir para a equipe de operadores do sistema com a digitalização


PRIMEIRA NOVELA ELETRÔNICA A informática popularizou a troca de documentos por Cd–Roms e disquetes, mas o universo editorial ainda parecia separado desse universo. Eis que, em 1993, o escritor Peter James publicou seu suspense, “Host”, em forma impressa e também em dois disquetes. “Host” foi considerado pela mídia a “primeira novela eletrônica” e teve 12 mil cópias vendidas. LIMITE DO CONFORTO Mesmo com livros em disquetes, nos computadores e disponíveis na ­Internet, ainda havia pouca adesão à ampla leitura digital ou a um mercado de livros on–line. O principal problema era o conforto. É pouco agradável ler textos extensos na tela de um computador, pois o brilho da tela incomoda os olhos após certo tempo. Além disso, ficar sentado na frente de um computador não é muito adequado para quem prefere ler reclinado em uma poltrona ou deitado na cama. Felizmente a popularização do eReader, da “Declaração de Independência dos um dispositivo digital para leitura de eBooks, facilitou a leitura e a ascenEstados Unidos”. Após Michael ter digitado toda a são do mercado de livros digitais. O “Declaração” ele tentou enviar o texto principal expoente dos eReaders foi para todos que estavam conectados no o Kindle, cuja tela de tinta eletrônica sistema, o que seria uma tentativa de não emite luz e portanto não causa desdistribuição “viral” de livros. Mas os conforto para a leitura. Hoje a empresa colegas de Michael o convenceram a evi- americana Amazon assusta o mercado tar o email como forma de distribuição editorial com a sua venda de Kindles e, do texto, e ele optou então por deixar o principalmente, de um acervo enorme texto disponível para download. de eBooks que podem ser comprados e Esse documento digital se tornou o baixados em poucos cliques. primeiro eBook do Projeto G ­ utenberg, projeto que Michael fundou para ACESSIBILIDADE E TECNOLOGIA permitir o acesso público e livre das Outro problema comum dos primeiros pessoas aos livros. Hoje o Projeto livros digitais era a sua acessibilidade e Gutenberg é uma grande plataforma falta de recursos. Muitos dos primeiros on–line de livros digitais gratuitos e de eBooks eram distribuídos principaldomínio público. mente em formato PDF, um formato que não tinha muita flexibilidade ao ser TEXTO–JOGO visualizado em diferentes dispositivos. Junto com o desenvolvimento da O PDF foi criado inicialmente para ser informática, logo vieram os primeiros um documento digital de forma que jogos eletrônicos. Caso do Colossal não fosse necessário imprimir tantos Cave Adventure, de 1976. Curiosidade: papéis nos ambientes corporativos. nada de gráficos. O jogo era puro texto, Depois, tornou-se um documento sendo que as salas e ambientes em que padrão no mundo gráfico, justamente o jogador estava eram descritos pelo para envio de documentos para impresnarrador e era preciso digitar as ações são, pois permitia ao designer visualizar que o personagem teria que fazer para o conteúdo que seria impresso antes do avançar na exploração do jogo. Foi o arquivo ir para a gráfica. grande início dos jogos de aventura tex- Mas como formato para leitura digital, tuais e da popularização de narrativas o PDF se provou limitado. Trata-se de um arquivo pouco flexível, no qual é digitais interativas.

possível acessar o texto e fazer pouco mais do que isso. Não é possível alterar a fonte do texto, nem aumentar ou diminuir o seu tamanho. Felizmente, nesse universo de livros digitais e eBooks, foi criado o que é, hoje, um dos formatos mais populares para leitura, o ePub, abreviatura para Electronic Publication, publicação eletrônica em inglês. O ePub, além de ser uma tecnologia de código aberto (você não precisa pagar nenhuma empresa para criar um ePub) tem muitos recursos que extrapolam a experiência da leitura. Na sua versão mais atual, o ePub 3, é possível inserir hiperlinks, áudios, vídeos e formulários. O ePub também foi criado para ser flexível e acessível, visando suprir as necessidades de pessoas com diferentes deficiências. Ao contrário do PDF, o próprio tamanho do texto de um ePub pode aumentar ou diminuir à vontade, permitindo que pessoas com dificuldades de visão tenham uma leitura melhor. Outro ponto importante do livro digital é o uso de mecanismos de busca para filtrar o conteúdo de um texto. Você pode buscar em uma obra como Otelo, de Shakespeare, todas as referências ao personagem Iago. Agora imagine o poder disso em livros de grande extensão e complexidade, como o Código Civil Brasileiro ou a Bíblia: uma mão na roda para os pesquisadores. Mas tudo isso é apenas o começo. O mercado editorial e didático já planejam grandes mudanças na leitura e aprendizagem ao unir diversas tecnologias. Em um futuro próximo será possível fazer uma leitura em grupo de um livro digital com anotações, hiperlinks e até debates dos outros leitores em vários trechos, ou um computador que analisa as respostas de alunos, que responderam a um caderno de exercício digital, e fornece ao professor um relatório dos pontos fortes e fracos de toda a classe. Portanto, nada de cenário apocalíptico, os livros não vão desaparecer. Eles vão continuar do nosso lado, mais acessíveis e baratos, com mais recursos para pesquisa e com narrativa multimídia. A leitura continua!  DICAS DE HIPERLEITURA: Google Books — você encontra diversos livros digitalizados. São milhões de livros gratuitos. http:// books.google.com.br/ Projeto Gutenberg — Uma das maiores referências em livros digitais. Conta com enorme acervo de livros gratuitos e em diversos formatos, inclusive o ePub. http://www.gutenberg.org/wiki/PT_Principal

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EDITORIAL

Musas D e

AsKlimt _Fotos: Hans Withoos / Jolanda Cats







Retoque de Imagem: Hans Withoos Designs: Fernando Silva ( Roupas Femininas, Acessórios de Cabeça ) Accessórios : Lita Raies para Fernando Silva e Aramez Designs Males: People of the Labyrinths Make Up /Hair: Ronny Elvers Stylist: Almamoun Benmira Agradecimentos: Boymans van Beuningen Rotterdam / Boeketterie Binnenweg Rotterdam Modelos: Julia M, Marleine / Femke / Camille (Fresh Model Management) Tim/Ziggy (Fic Models) Cats & Withoos: Lena e Keet Locação: Heemraadssingel 114 e 116 Rotterdam, A Netherlands Decoração: Jolanda Cats Assistentes: Emerence Wils / Francesco Trovato / Matthijs Heijndijk





Pintura: Gil Vicente

Foto: Divulgação

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Foto: Tuca Siqueira

Foto: Josenildo Freire

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1—Raimundo De Moraes 2—César Leal 3—Cida Pedrosa 4—Jaci Bezerra 5—Juareiz Correya


Poesia

Desenhos: Pedro Zenival

_Por Paulo Chaves

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Os anos 70/80 foram anos de f­ artura e qualidade na produção poética de ­Pernambuco. Naquela época havia uma abundância de poetas e movimentos poéticos que faziam deste estado um dos principais celeiros e tribunas da poesia brasileira. E sempre com a cumplicidade participativa da mídia, que dedicava cadernos inteiros nos jornais da época, aos domingos, à literatura em suas diferentes manifestações. No início dos anos 70, um dos principais movimentos na divulgação dos novos valores foi a chamada “Geração Mimeógrafo”, que, mesmo ­misturando alhos com bugalhos em termos de qualidade poética, lançou muita gente nova e talentosa no cenário da poesia local. Os primeiros a utilizar esse recurso editorial foram poetas ­marginais—como Leila Míccolis—do eixo Rio–São P ­ aulo. ­Marginalidade aqui se entendendo como aqueles devotos da poesia à margem do sistema, excluídos do e­ stablishment literário de então. Naquelas décadas, tudo era motivo para recitais e happenings nos bares de Recife e Olinda. Neles se celebrava—ou se assassinava sem dó nem piedade—a arte poética. Mas que importa a qualidade? Em qualquer campo das artes ela é mesmo escassa. A qualidade, em arte, é sempre exceção, nunca a regra. Nos anos 70/80, a Editora Universitária abria espaço aos novos valores, com uma triagem sempre criteriosa de seu editor, o poeta e crítico literário César Leal. Jaci Bezerra, com suas E ­ dições Pirata, também marcou ­presença no cenário local, promovendo lançamentos coletivos que eram uma festa da inteligência e sensibilidade. O ­mesmo se podendo dizer do Movimento de Escritores Independentes (Meip) e das Edições Bagaço, sob direção do ­poeta Paulo Caldas. E como esquecer

o poeta palmarense Juhareiz Correya e sua Editora Nordestal, que teve como mérito principal a valorização de uma expressão regional na poesia, a exemplo de Ascenso Ferreira,que tinha uma presença física singular e uma obra marcada pelos ritmos, imagens e folclore nordestino. Juhareiz também era uma figura fisicamente diferenciada: um rapaz alto, moreno, cabelos compridos e soltos, sempre de jeans desbotado, parecendo um Walt Whitman dos trópicos. Seus poemas também possuíam uma eloqüência discursiva whitmaniana em seus aspectos formais e em seu grito libertário. E hoje, o que temos no cenário local em termos de poesia? Nada ou no máximo muito pouco. Ainda bem que na Internet o portal Interpoética, d ­ irigido ­pelos poetas Raimundo de Moraes, Cida Pedrosa e Sennor Ramos abriu espaço para a veiculação da produção de poetas de todas as idades e tendências. Entre os novos poetas merecendo destaque especial Raimundo de Moraes, com uma poesia iconoclasta e erudita, em que fustiga, com ironia e acidez cortante, num estilo muito próprio, os padrões morais e repressivos da classe média e de nossas elites aculturadas. Mas além dessa exceção, o panorama poético que podemos vislumbrar em Pernambuco, nesta primeira década do século XXI, é uma paisagem calcária, que evoca o poema famoso de W.H. Auden. E com o agravante de que os “poetas consagrados” locais, quando saem de suas tocas, escrevem versos muito semelhantes aos que escreviam há 20, 30, 40 atrás. Diante dessa esterilidade criativa e qualitativa, o melhor mesmo é ler Antígona, do mestre clássico Sófocles. E ali encontrar coisas belas e sempre atuais, como esta fala da personagem–título da tragédia: “Eu não nasci para partilhar de ódios, mas tão–somente de amor!”. 

PERNAMBUCANA

Fotos: Divulgação

PAISAGEM CALCÁRIA NA

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Fotos: Divulgação

GALERIA

­Jo ­Fevereiro, nasceu em São Paulo, capital. A minha trajetória na vida foi o desenho. Desde a infância fui um rabiscador. Rabisquei as paredes da casa, da oficina do cinema onde meu pai trabalhava, bordas dos cadernos escolares, sempre com o incentivo das pessoas que me rodeavam. Até quando aos quatorze anos fui matriculado na Escola Panamericana de Arte onde tive como professor o artista italiano Nico Rosso, que me deu o maior incentivo de todos... convidou–me para ser seu c­ olaborador. Com ­dezessete anos entrei numa agência de publicidade como assistente de direção de arte, aos vinte e dois dei uma folga na agência quando resolvi trabalhar por dois anos no atelier do escultor letão Tao Sigulda. Voltei para a publicidade, para os quadrinhos, ilustrações editoriais, etc... com passagens por Salvador onde fui diretor de arte da revista Viver Bahia, e por Lisboa onde morei sete anos fazendo storyboards e ilustraçõs como freelancer para agências e editoras. Voltei para o Brasil em 1995 e faço ­freelance até hoje.

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Foram 3 storyboard para os filmes da primeira cerveja sem ĂĄlcool em Portugal nos anos 1990. Este focava a idade mĂŠdia.


Ambientado nos descobrimentos.

Ambientado no iluminismo.


Coleção de quatro capas para cadernos escolares, premiadas como melhores capas infantis do ano. Ecoline e låpis de cor, sobre papel schoeller.


Muammar Ghadaffi ĂŠ alien. Na ĂŠpoca, ele acabara de sumir no disco voador.


Ilustração para matéria de Ailin Aleixo na revista VIP em 1997. Falava sobre a reação adversa dos homens, quando as mulheres resolvem agir como eles. Lápis e ecoline em papel fabriano, +­ photoshop.

Ilustração feita a lápis e ­meios–tons em photoshop, para matéria de Dagomir Marquezi na revista VIP. O tema era a “TV esgoto” da época, mais ou menos no ano 2000.


Dois posters ilustrado para a Eletropaulo. Foram produzidos pela Casa Paulistana Comunicação & Design, que editou e criou o boneco símbolo do projeto. Esses dois posters eram recortados em peças montáveis, e foram distribuidos nas escolas públicas estaduais. Atrás das peças haviam atividades relativas ao uso responsável da energia elétrica, também desenvolvidas pela Casa Paulistana.Nankim e ecoline sobre papel schoeller.


A MONTANHA DAS DUAS CABEÇAS —Foram feitas para um livro paradidático da editora Ática.

DIAS DO CONDOR—Para um livro do Ronaldo Antonelli sobre uma viagem que fez pela América Latina na época das ditaduras militares.



FANTASIA—História feita no final do ano passado para um ezine português, com texto e arte meus. Elaborada digitalmente, intercala imagens de minha autoria com imagens de arquivo retrabalhadas. A proposta foi fazer um exercício de linguagem. A original foi escrita em português de Portugal, mas esta eu traduzi para o brasileiro.


Foto: Divulgação

Fotos: Divulgação

CULTURA_MUNDO

J.Borges

J

osé Francisco Borges, mais conhecido como J. Borges é um dos mestres do cordel, um dos artistas folclóricos mais celebrados da América Latina e o xilogravurista brasileiro mais reconhecido no ­mundo. Ele nasceu em 20 de dezembro de 1935 em ­Bezerros, ­Pernambuco. Filho de agricultores, ele começou a trabalhar aos dez anos de idade na roça, e negociava nas feiras da região, vendendo colheres de pau que ele mesmo ­fabricava. Autodidata, o gosto pela poesia fez encontrar nos f­olhetos de cordel um substituto para os livros escolares. Em 1964 começou a escrever folhetos de cordel; foi quando fez “O Encontro de Dois Vaqueiros no Sertão de Petrolina”, x­ ilogravada por Mestre Dila, que vendeu mais de cinco mil exemplares em dois meses. Animado com o resultado, escreveu o segundo chamado “O Verdadeiro Aviso de Frei Damião Sobre os Castigos que Vêm”, que o conduziu pela primeira vez à xilogravura. Como não tinha dinheiro para pagar um ilustrador, J. Borges resolveu fazer ele mesmo: ­começou a entalhar na madeira a fachada da igreja de ­Bezerros, que usou no seu segundo folheto de c­ ordel. Desde então, começou a fazer matrizes por encomenda e também para ilustrar os mais de 200 cordéis que lançou ao longo da vida. Hoje essas xilogravuras são impressas em grande quantidade, em diversos tamanhos, e vendidas a intelectuais, artistas e colecionadores de arte. 

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Fotos: Divulgação

A divulgação do seu trabalho como gravurista iniciou–se em 1972, quando os pintores cariocas, Ivan Marquetti e José Maria de Souza, em visita a Bezerros, encomendaram gravuras em tamanhos maiores do que os usados normalmente no cordel. Pelas mãos desses pintores, essas gravuras chegaram ao escritor Ariano Suassuna e, com o seu incentivo, Borges passou a ser conhecido como o “melhor gravador do Nordeste”. Em pouco tempo, os seus trabalhos já participavam de exposições na França, Alemanha, Suíça, Itália, Venezuela e Cuba. Os temas mais solicitados em seu repertório são: o cotidiano do po­ bre, o cangaço, o amor, os castigos do céu, os mistérios, os milagres, crimes e ­corrupção, os folguedos populares, a religiosidade, a picardia, enfim todo o universo cultural do povo nordestino. Para o artista, dentre todas as xilogravuras que já fez, a sua preferida é “A chegada da prostituta no céu”, feita em 1976. Com a fama, a família de xilogravadores cresceu, incluindo três filhos do artista, um irmão, três sobrinhos e um primo, graças às aulas do grande mestre e artista popular J. Borges,

que soube cultivar a semente da arte de criar ­figuras exóticas a partir das histórias e das lendas populares, que impregnam o espírito do mestiço nordestino. J. Borges tem recebido vários prêmios e distinções, entre os quais se destacam os concedidos pela Fundação ­­­­­Pró–Memória (Brasília, 1984), pela Fundação Joaquim Nabuco (Recife, 1990), pela V Bienal Internacional Salvador Valero (Trujilo/Venezuela, 1995), a comenda da Ordem do Mérito Cultural (Ministério da Cultura, 1999), recebeu o prêmio UNESCO na categoria Ação Educativa/Cultural. Em 2002, foi um dos treze artistas escolhidos para ilustrar o calendário anual das Nações Unidas, com a xilogravura “A Vida na Floresta”. Em 2006, foi tema de reportagem no The New York Times. Suas gravuras ilustram livros publicados no Brasil, na França, em Portugal, na Suíça e nos Estados Unidos. São de sua autoria, entre outras, as seguintes obras: “Gravuras de J. Borges” (Recife:

Galeria Nega Fulô, 1973), “Xilogravuras de J. Borges” (Recife: Galeria Ranulpho, 1975), “No Tempo que os Bichos Falavam” (Olinda: Casa da Criança de Olinda e Instituto Nacional de Folclore, 1983), e “Poesia e Gravura de J. B ­ orges” em parceria com Silvia Coimbra (Recife: sem editora, 1993). Elas são encontradas também em capas de discos como Quinteto Violado, Festival de Violeiros, Nordeste Cordel, Repentes e Canção. Hoje, J. Borges continua trabalhando com seus filhos no seu atelier em Bezerros, a Casa da Cultura Serra Negra, no km 106 da BR 232, onde máquinas tipográficas dividem espaço com centenas de matrizes, gravuras e folhetos de cordel. Desde 2006, J. Borges é considerado Patrimônio Vivo de Pernambuco, t­ ítulo outorgado pelo Governo do Estado.  CONSULTA BIBLIOGRÁFICA: BEZERROS das xilogravuras e das máscaras: artesanato em Pernambuco. Suplemento CulturalD.O. PE, Recife, ano 15, p. 33, set. 2000. MACHADO, Regina Coeli Vieira. J. Borges. Pesquisa Escolar On-Line, Fundação Joaquim Nabuco, Recife. Disponível em: http://www. fundaj.gov.br BURCKHARDT, EDUARDO. ARTE POPULAR, O artista do sertão. Revista Época, agosto de 2006.

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HIN

GALERIA

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As obras do artista coreano Shin Kwang Ho, são focadas em emoções derivadas do relacionamento dele com outras pessoas. “Concentro–me em meu próprio sentimento”, explica–se. De vertente surrealista, geralmente utiliza óleo em suas criações, mas em alguns momentos também recorre a acrílico e carvão. Gosta de aventurar–se na utilização de diversos materiais. Percebe–se que mesmo diante da sensação de caos, a expressividade dos olhares é notável. Um abstrato profundamente interessante.



Óleo sobre tela—sem título 112x162cm 2012.



Óleo sobre tela—sem título 60x45 cm 2013.


Óleo sobre tela—sem título 193.9x130cm 2012.


Óleo sobre tela—sem título 72.5x60.5 cm 2013.


Óleo sobre tela—sem título 162.2 x 112.1 cm 2013.


Sem título—carvão e conte sobre tela 53,2 x 45,6 cm 2013.


Sem título—bico de pena em papel 25.3x18.3 cm 2014.


Fotos: Divulgação

CULTURA_MUNDO

Arte&MODA

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rte e moda são assuntos interligados na história de crenças e comportamentos e por vezes, fica impossível desmembrar um lado do outro. Estudar a roupa e seus acessórios nos leva a mapear o percurso de nossas trajetórias, artes e modismos. É de comum conhecimento que a moda tende a se apropriar de tudo ao seu redor. O flerte entre essas duas correntes não é recente. Porém, essas trocas nem sempre são aprofundadas. A criação de moda é mais do que um punhado de referências traduzidas em um pedaço de pano. Para criar–se uma imagem de moda é p ­ reciso um desejo pela beleza e inovação e, claro, muita pesquisa e informação. Paul Poiret foi o primeiro estilista a se aprofundar no tema, quando usou nas suas criações estampas exclusivas de artistas e ­ilustradores, isso no início do século 20. Logo, em parceria com Picasso, Coco Chanel seguiu essa f­ órmula e desenhou figurinos para ­ballet. Já nos Anos 50, Pierre Cardin abre sua maison homônima e fica reconhecido pelo estilo vanguardista ; pense em trabalhos geométricos inspirados na Era Espacial. E, ao lado de Pacco Rabanne e André Courrèges, formam a tríplice aliança do futurismo da moda. Na década seguinte, em 1965, temos a inesquecível coleção Mondrian, por Yves Saint Laurent. Moda e Arte também se encontram no ritual milenar japonês de vestir o Kimono. Veja só: são anos de aprendizado para vestir e ser vestido em amarrações de sedas sobrepostas. Os­­kimonos, em si, já são peças de arte valiosas, vide a disputa entre os colecionadores.

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_Por Cesar Fassina

Do oriente, surgiram Rei Kawakubo, Yohji Yamamoto, Issey Miyake e Junya Watanabe. Eles trouxeram inovação técnica e sobreposições absurdas para o mundo fashion. E quando penso em arquitetura da roupa, penso na apresentação de Hussein Chalayan que, em 1999, desconstruiu o chador em três partes. As criações de Chalayan já foram parar no Victoria & Albert Museum, Barbican e Hayward Gallery, para citar alguns. E não para por aí. Nomes como, Viktor & Rolf e John Galliano, sempre estiveram preocupados com esse casamento entre Moda e Arte. Galliano rejuvenesceu a casa Dior com seus desfiles recheados de referências artsy. Quando fala–se em editorial de moda, logo penso no ensaio “In memory of the late Mr. And Mrs. Confort’, onde a modelo Nadja A ­ uermann contracena com um esqueleto. Clicado por Richard Avedon, aquele ensaio ainda me impressiona pelas referências de beleza, moda e arte. E nas passarelas, penso em Prada e Alexander McQueen, que nunca se distanciaram da arte. Enquanto isso, do outro lado do ­Equador, no final dos Anos 80, um pequeno grupo de artistas e estilistas começam a se destacar na cena nacional. Com eles veio a Wearable Art, movimento que defendia uma moda compromissada com a arte. Dentre eles, ainda em atividade, nomes como Glaucia Amaral de Souza, Liana Bloise, Andrea Castor Kraemer e Lino V ­ illaventura. Alguns estilistas se destacam por parcerias com cineastas, fotógrafos e artistas plásticos em geral. Temos Glória Coelho como nossa connoisseur. Ela é a soma de arte viva com conhecimento histórico da indumentária. Em suas passarelas, armaduras medievais transformam–se

em trajes futuristas. Já o estilista Lino Villaventura prefere explorar os campos artísticos através da utilização de técnicas regionais e artesanais. São muitos os estilistas que buscam referências na arte, mas poucos emocionam como Reinaldo Lourenço e Alexandre Herchcovitch, nomes que trouxeram maturidade para a moda brasileira. Vivemos em um país que não incentiva a indústria da moda e a cultura, logo, o baixo nível cultural dificulta o desenvolvimento de revistas e fanzines experimentais. Porém, apesar de todos esses contratempos, nos últimos anos várias publicações conseguiram um lugar ao sol. Entre eles, colaborei com a On Speed, no final dos Anos 90 e início de 2000. Deixando as preocupações comerciais de lado, On Speed foi um dos primeiros fanzines a formar equipes interessadas pelo exercício de moda, arte e estética. A publicação surgiu da parceria do diretor de arte Jorge ­Morabito com o jornalista Zeca ­Gutierres. Eles tinham em mente realizar algo livre de regras batidas. Seguindo esse conceito, surgiram no Brasil as revistas Mercado Mundo Mix, Simples, FFW MAG!, Romeu, S/N, Gudi, Key, Imagens Gostosas, U+Mag e a nova What About. Mesmo após essa longa jornada, alguns ainda acreditam que a arte é apenas uma referência para a moda, que utilizar da arte para uma coleção virou moda—e isso não é verdade. Ao contrario desses argumentos, museus em todo o mundo abrem as portas para exposições de estilistas e suas obras. Em um país desigual, onde incentivos para a cultura ainda é coisa rara, só nos resta nadar contra a maré e desejar um cenário mais aberto e criativo. Quem sabe logo teremos um museu dedicado à moda, arte e história de estilo do nosso país—mas eu divago.


Fotos: Divulgação

Paul Poiret

Coco Chanel

Yves Saint Laurent

Rei kawakubo

Viktor & Rolf

John Galliano

Richard Avedon

Villaventura

Pierre Cardin


EDITORIAL

Boppa Conhecido como Boppa, o estilista Wirama Budipratama é natural da Indonésia e desde jovem já possuía interesse em projetar vestidos de noiva inspirados na boneca Barbie. Autodidata confesso. O estilo de suas criações variam em torno do casual e sexy, fazendo um mix entre o moderno e o elegante. Em 2008 seus projetos foram usados ​​ no Movie Award Indonésia (IMA), onde recebeu o prêmio de top artista local. Elie Saab, Zahirmuad, Marchesa e Zac Posen estão entre os nomes da moda que admira. _Fotos: Jessica Triputri

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Modelos: Caucasian (Angela) Chinese (Deasy Nathaly) Tratamento de Imagem: Roberto Portella


CULTURA_MUNDO

Ilustração J. Bosco

ARMORIAL ANOS DEPOIS

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Movimento completa quatro décadas de história sem festas e com questionamentos de artistas, medalhões de sua primeira geração, sobre poder e verdadeira abrangência na cultura pernambucana

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_Por Thiago Corrêa

nos depois do lançamento na Igreja de São Pedro dos Clérigos, já como um dos pilares fundamentais para se entender a cultura pernambucana, declarações de medalhões da primeira geração armorial nos fazem questionar: existiu, de fato, um movimento? Por e-mail, via secretária, o artista plástico Francisco Brennand diz que “jamais participou do Movimento Armorial” e as poucas exposições as quais integrou não implicavam que “houvesse por esta razão nenhuma afinidade intelectual que o comprometesse com este movimento”. QUARENTA Embora leve adiante o termo armorial com a sua arte, Gilvan Samico (1928–2013), conta que, quando o movimento nasceu, ele estava na Europa. “Não aderi ao movimento, mas fui colocado nele. Quando voltei da Europa, tomei conhecimento de que minha arte era armorial por Ariano Suassuna (1927–2014), então pedi para ele me explicar do que se tratava”, recorda o pintor. Contudo, Samico reconhece que antes integrava o círculo de amizades de Suassuna. “Não foi aleatório, acompanheio começo de tudo. Todos que o cercavam comungavam de suas ideias. Passei sete anos fora, mas aquela semente começou a germinar”, lembra. No livro Em demanda da poética popular, a pesquisadora Idelette Muzart Fonseca dos Santos explica que um dos motivos para o questionamento é o fato da arte armorial ter se desenvolvido antes do seu manifesto, num processo contrário ao de outros movimentos, que, primeiro teorizavam, para depois colocar as ideias em prática. “Nunca houve uma adesão formal ao Movimento Armorial—declarava–se a partir de convergências, das obras, dos artistas, com os elementos fundamentais que definem a arte armorial”, escreve Idelette. “Vejo o movimento como ação estética, que se realizou por afinidade do que estávamos produzindo. Foi um movimento de empatia, mais do que por filiação”, atesta o poeta Ângelo Monteiro, autor do livro Armorial de um caçador de nuvens (1971). “Tínhamos nossas linguagens pessoais que comungavam com a ideia de pensar o Nordeste com a cultura popular, nesse aspecto até João C ­ abral de Melo Neto se encaixava. Ariano batizou toda essa tendência que já havia, o g­ rande feito dele foi perceber isso”, avalia o poeta Marcus Accioly, cujo livro Nordestinados (1971) é tido como armorial. Como na época do lançamento Suassuna era o diretor do Departamento de Extensão Cultural da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), uma s­ egunda geração armorial se formou porque viu na proximidade com o escritor um

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Gilvan Samico Francisco Brennand Romero de Andrade Lima Dantas Suassuna Deca Madureira

Fotos: Divulgação

caminho para a publicação. Dessa safra surgiu Raimundo Carrero com o romance históriBernarda Soledade—a tigre do sertão (1975). “Trabalhava com Ariano na universidade e fui me impregnando com aquele universo. Mas eu também tinha intenções de fazer parte daquilo, até porque achava que a linhagem do romance brasileiro passava pelo cordel que, por sua vez, obedecia ao épico”, recorda Carrero. Sem filiações e com princípios abertos que poderiam englobar desde o compositor Heitor Villa–Lobos ao escritor Guimarães Rosa pelos seus trabalhos de reinterpretação da cultura popular, o Movimento Armorial foi alvo de críticas. No c­ urta-metragem O palhaço degolado (1976), de Jomard Muniz de Britto, o personagem ironiza os largos horizontes de classificação do movimento: “E tudo, pela força dos brasões familiares e dos poderes oficiais, tudo pode­ ­­transformar–se armorial. Céus armoriais, astrologia armorial, literatura de cordel armorial, gravadores armoriais, povo, povo, povo armorial...”. Para o professor de Letras da UFPE, Anco Márcio Tenório Vieira, outros fatores que prejudicam a visão do armorial como movimento foram a ligação de Ariano com o poder oficial e por focar no universo restrito do Nordeste sertanejo. “Ariano era muito isolado, apesar de já ser um dramaturgo de sucesso. O movimento não conseguiu sair desse isolamento e vai perdendo força, as pessoas foram o abandonando para ir em busca de outros caminhos para sua arte”, avalia o pesquisador. O FOLHETO DE CORDEL É FONTE DE INSPIRAÇÃO No dia 18 de outubro de 1970, o Movimento Armorial foi lançado com a realização de uma exposição e um concerto da Orquestra Armorial na Igreja de São Pedro dos Clérigos. Com um panfleto impresso em papel ofício contendo o programa do evento, o escritor Ariano Suassuna começava a teorizar e a batizar uma poética que vinha sendo desenvolvida desde a década de 1950 e que buscava criar uma arte brasileira erudita a partir da cultura popular produzida no Nordeste. Essa estética se mostrava presente nas peças cômicas Auto da Compadecida (1955), O casamento suspeitoso, O santo e a porca (ambas de 1957) e A farsa da boa preguiça (1960) de Suassuna e também foi identificada nos trabalhos de outros artistas da época. De forma declarada ou não ao armorial, eles tiveram em comum o interesse de pensar a identidade cultural do Nordeste a partir das manifestações populares. Para abarcar as mais diversas áreas artísticas, o armorial pegou como síntese o folheto de cordel, usando os versos para o diálogo com a literatura, asrimas para a música, a declamação para o teatro e as gravuras para as artes plásticas. Num primeiro momento, esse campo é representado por Francisco Brennand e Gilvan Samico e depois é seguido por Romero de Andrade Lima e Dantas Suassuna. “O que Ariano queria era recriar, reinventar a cultura popular do Sertão. É aí onde aparece o elemento mágico e o armorial se distancia do Regionalismo pela invenção”, aponta o escritor Raimundo Carrero, que integrou o movimento no início da carreira. Na literatura, além dele e de Suassuna, também são ligados ao movimento os escritores Ângelo Monteiro, Marcus Accioly, Janice Japiassu e Maximiano Campos. A adesão à estética armorial se deu de diferentes maneiras, enquanto uns seguiram pelos temas e pelas imagens sugeridas pelo movimento, outros optaram pela forma. “Usei as formas populares e não os temas, criei minha poesia em cima das estruturas do martelo agalopado, do mourão e da sextilha”, analisa Accioly. Na música, o mesmo aconteceu com a inserção de instrumentos populares como a rabeca, a viola e os pífanos nas formações de orquestra para o desenvolvimento de uma música erudita nordestina. Assim, surgiram as orquestras Armorial e Romançal, o Quarteto Romançal e o Quinteto Armorial, do qual despontaram nomes como os de Antônio “Zoca” Madureira e Antônio Carlos Nóbrega. Este último também é ligado à linguagem da dança, assim como o Grupo Grial, criado em 1997. “O interessante é que Ariano tem uma linha de pensamento, ele não dá uma receita como se deve fazer a arte armorial. Ele dá a coerência e você segue sua receita pessoal”, conta a coreógrafa Maria Paula Costa Rêgo, sobre a experiência de ter convivido com o escritor durante os sete meses de ensaios do primeiro espetáculo do Grial—A demanda do graal dançado.  *Matéria originalmente publicada no caderno Viver do Diario de Pernambuco em 17 de outubro de 2010. thiagocorrea.pe@dabr.com.br

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Fotos: Divulgação

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Plínio Palhano, nasceu no Recife, Pernambuco, em 1954, pertence ao grupo de artistas da chamada Geração 70 do Estado. É um figurativista, mas um figurativista que “atrai” e “abstrai” a figura, repassando–a nas formas “incendiadas” com que desenvolve sua obra. No início de sua carreira, frequentou o Curso Livre de Artes, na Universidade Federal de Pernambuco, então dirigido por Queralt Prat e Lenira Regueira, época de grande convívio com outros nomes de sua geração artística, a exemplo de Antônio Carlos Montenegro, Flávio Gadelha, Gil Vicente e Ricardo Aprígio. Nessa fase, consolidou sua vocação, exercendo sua liberdade de não se apegar a “fórmulas” na utilização de materiais. Mais do que a visão de um “expressionista” tardio—centrado no emocional do ­universo da linguagem pictórica, Plínio Palhano confere a seus quadros uma espécie de investigação do visível, da mesma forma que o filósofo Merleau–Ponty buscou uma “fenomenologia da percepção” que duvidasse de todo olho domesticado...

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Olinda.


Olinda.


Olinda.


Olinda.


Fernando de Noronha.


Fernando de Noronha.


Fernando de Noronha.


Foto: Rafael Adorjan

CULTURA_MUNDO

Camarada

BRUSCKY

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Da série Persona. (1993)

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_Por Plínio Palhano

alo de autenticidade. bairro do Recife Antigo, “para quem ­ uteiro enorDe originalidade pe- não sabe”, na época, um p rene, de raiz fincada. me: quase todo o bairro—, no edifício Bruscky foi sempre a C ­ hanteclair. ­Liderou a mostra e criou sua própria ­invenção. performances que derramavam nas esNão poderia ser ou- cadas “sangue”, como se tivesse ocorritro. Se Marcel Du- do uma ação criminosa ali. As putas champ aparecesse, ele iria chamá–lo adoraram, porque estavam numa verpara um bar e conversar, simplesmen- dadeira festa. O artista rompia, assim, a te. E aí diria: “Meu camarada...”, como pose dos burgueses ­bacharelescos, que faz na introdução dos seus longos até frequentavam, na calada da noite, ­­bate–papos. Não mudaria nada em sua as namoradas prostitutas. trajetória. As atuações de ontem per- Bruscky é um pernambucano que ama manecem renovadas, e assim segue o a cidade do Recife. Impacienta–se, às caminho que encontrou. ­Relembrando vezes, quando tem que fazer viagens Picasso, que disse que não buscava, só ­extensas. Aqui, frequenta os lugares encontrava. Esse é o caso de Paulo. É com gente simples, sem o folclore da ele mesmo construindo um mundo, in- mídia. Os mercados são as escolhas. ventando ideias, em concepções múlti- ­Conhece a arte e os artistas do ­Nordeste e tem um arquivo precioso sobre o amplas, desde os anos 60. Quando, na década de 1970, o artis- biente cultural da região e da cidade. ta fazia as intervenções na cidade do Possui uma pasta sobre cada artista e ­Recife,—o termo intervenção quase movimento. É coautor de um livro sonão se usava, hoje ele é bastante uti- bre Vicente do Rego Monteiro, artista lizado para designar uma das formas de sua admiração. Cícero Dias, quando de arte urbana—causava uma movi- vinha para o Recife, ligava para Bruscky mentação no centro da capital, des- a fim de convidá–lo a compartilhar um pertando curiosidade nos populares. uísque numa conversa que durava horas. Os homens da ditadura militar inter- Num desses encontros, realizou, acompretavam–nas como uma ação comu- panhado por Mário Hélio, uma entrenista, talvez de guerrilha urbana, por vista com o artista. Paulo Bruscky teve isso Bruscky algumas vezes foi preso. um percurso de talento que ultrapassou Tempo de coragem e de arte. Fez uma fronteiras e, mesmo alcançando o recoexposição c­ oletiva na zona— termo nhecimento nacional e internacional, que usávamos para identificar o belo prefere os mercados... 


Cópia conforme original e Original conforme cópia.

Fotos: Divulgação

É uma droga. (1971—2004)

Artistas limpos e desinfetados. (1987), a esquerda, Daniel Santiago.

O que é arte? Para que serve? (1978)

O eu comigo. (1978)

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Fotos: Divulgação

GALERIA

Nasceu no Líbano, Lara Zankoul se formou na Universidade Americana de Beirute, com um mestrado em Economia. Impulsionada pela paixão, aprendeu sozinha a arte de f­ otografar, participando de várias exposições coletivas nacionais e internacionais. Inserida nas artes plásticas através da ­necessidade de escapar de sua própria realidade, explora o encanto e o mistério da psique humana. Excêntrica e divertida, a obra da artista­representa uma tentativa de inventar novos mundos a fim de empurrar os limites da nossa realidade para poder dar uma escapada da monotonia da vida cotidiana. Os personagens que habitam a obra de Zankoul são símbolos universais e atemporais anônimos, existentes dentro de uma paisagem ­­fantástica e surreal.

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Ă“rbita.


Saindo da Concha.


O Jardim Zool贸gico.


Hora do Chรก.


Pendurado.


Rastro.


Lago dos Sonhos.


Vida.



CULTURA_MUNDO Perguntas Inocentes.

CARLOS ESTEVÃO O espírito satírico, o excesso de criatividade do traço inconfundível, a irreverência, a humanidade de seus personagens, derão a Carlos Estevão o lugar de destaque que conquistou no panorama artístico nacional

Era nesse ambiente caótico, o estúdio em Minas Gerais, que Estevão produzia seus desenhos.

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Com aquele corpanzil de açougueiro adiposo nutrido pela ­diapedese da peptona diária, C ­ arlos Estevão, dentro dele, guardava uma alma de anjo. Por isso que irradiava ternura com um riso franco, espontâneo que irradiava o ambiente onde pusesse os pés. Sempre foi fiel ao seu traço e ao seu espirito. Aquele que se renovava sem saltos. Esse permanecia sempre o mesmo. Carlos Estevão de Souza, chargista, ilustrador e caricaturista brasileiro, nasceu no bairro da Madalena em Recife, aos 16 de setembro de 1921. ­Filho de ­Estevão Pires de Souza e Maria Salomé de Souza, descendentes de portugueses que se instalaram na Paraíba e em Pernambuco. O casal teve ainda outros cinco filhos: Mário, José, Antônio, Alberto e Maria de Jesus. A família morou em vários lugares: na vizinha Olinda e nos bairros

da Capunga e Boa Vista. Estudou no ­ inásio Pernambucano e no Colégio SaG lesiano. Nunca teve aulas de desenho ou pintura. Na Secretaria de Agricultura, Indústria e Comércio, fez seus primeiros trabalhos como desenhista da seção de arquitetura. Ao servir ao Exército, interrompeu o trabalho. Em 1946, já casado e com um filho, foi para o Rio de Janeiro. Trabalhou na revista Diretrizes e no Diário da Noite, de propriedade dos Diários Associados. Lá, em 1948, desenhou a tira cômica I­ gnorabus, o contador de histórias, que tinha textos de Vão Gôgo (Millôr ­Fernandes). Logo começa a ­trabalhar na revista O Cruzeiro, na qual permaneceu até o fim de sua vida. Em 1960, ele se separa da esposa, assume um novo relacionamento (com Helena Couto) e se muda para Belo Horizonte, passando a fazer charges para o “Estado


Ignorabus os talentos de Millôr Fernandes, que assinava Vão Gôgo, e Carlos Estevão juntos numa história em quadrinhos repleta de metalinguagem..

As aparencias enganam.

de Minas”. A carreira em O Cruzeiro continuava, ele só não frequentaria mais a Redação no Rio, mas os trabalhos continuariam sendo enviados. No dia 31 de dezembro de 1961 m ­ orria, no Rio de Janeiro, o cartunista Péricles de Andrade Maranhão, o autor de O Amigo da Onça, se suicida. Nas semanas seguintes, o personagem continua a ser publicado com algumas pranchas deixadas pelo seu autor. Depois, os desenhos foram mantidos e eram apresentados como ­“Criação imortal de Péricles—Original da equipe de O Cruzeiro”. Mas, havia uma ­pressão para que Carlos Estevão assumisse o personagem do amigo Péricles, apesar dele não se mostrar disposto a isso. Em um momento de tantas mudanças, inclusive em seu estilo de humor e com planos de fortalecer seus personagens, assumir o Amigo da Onça, um mito que já existia há quase vinte anos, não parecia uma boa ideia. Em certa ocasião, talvez já tramando sua morte, o próprio Péricles havia feito o pedido: “­ Carlos, se

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explicação sempre pronta para os seu tudo que o dinheiro pode comprar e que eu morrer, você faz o Onça pra mim?” ­Carlos Estevão esta- fracassos na vida. viaja pelo mundo todo. Você acredita va completamente enFinalmente em 1965, Carlos Estevão mesmo que todas as pessoas que conhece volvido num gran- aceita o encargo de assumir O Amigo vivem do jeito que demonstram? Você de projeto pessoal: da Onça. O primeiro desenho do per- pode até conhecer um ou dois amigos a criação da revista sonagem assinado por ele é publicado da onça, mas Dr. Macarra, garanto, você Dr. Macarra, total- na edição de 08 de maio. É uma fase conhece um monte. mente escrita e dese- ­extremamente produtiva para o artista. Historiador dos mais importannhada por ele. Quatro Dr. Macarra, o personagem, estava tes da caricatura no Brasil, o escritor meses depois da morte de morto. O Amigo da Onça ganhava cearense Herman Lima definiu o Péricles, chega às bancas a um novo pai e uma vida mais decente humorismo de Carlos Estêvão como sua revista com circulação a partir dali. Não se pode comparar os sarcástico, focando principalmente as nacional e periodicidade dois. O próprio Carlos Estevão explica: fraquezas ­humanas e explorando as simensal. Beirou os 100 mil “Doutor Macarra é apenas um gozador tuações absurdas da vida. Foi assim a exemplares em seu pouco da vida. Dá os golpes para continuar série Dr. Macarra. "Ser Mulher’' focalitempo de vida. Chegou a vivendo. Sempre nos grandes meios. zando aquele conhecido tipo de mulher editar a revista Dr. Macarra, que resistiu É um protótipo do nosso atual Beto feia, porém coquete; "Antes e Depois", na durante nove números. Ele não era fei- Rockfeller. Já o Amigo da Onça é ­mau, qual satirizava o casamento; e "Perguntas to de nanquim, mas de carne e osso. ­Dr. sádico. Morre de rir da desgraça alheia. Inocentes", divertido ensaio sobre o óbvio, ­Macarra era inspirado em um famoso vi- Qualquer dia, eu o mato”. O Amigo da “As Aparências Enganam”, talvez seja a garista do Recife que se fazia passar por Onça pode ter sido o personagem de mais marcante e original de suas séries. engenheiro ou militar e aplicava g­ olpes maior sucesso—e até hoje o mais lem- No primeiro quadro, vêem–se apenas em mulheres carentes com mais de 30 brado—da História do humor b ­ rasileiro, sombras e contornos acompanhados de anos. Sebastião Morato de A ­ lcântara mas Carlos Estevão é o nome mais po- um texto que sugere uma situação de era o nome do sujeito. Nasceu no dia pular do humor na história da revista extremo perigo. No quadro seguinte, a 11 de setembro de 1921, no Município cena se revela e mostra um momento O Cruzeiro. pernambucano de Barreiros. Você não conhece um Dr. M ­ acarra? prosaico, desprovido de qualquer r­ isco Quem nessa vida ou nesse Não já deu uma de Dr. Macarra? Abra ou dramaticidade. agora mesmo o Twitter ou o ­Facebook Era um humor popular, sim, e vasto B ­ rasil, não encontrou pelo e veja quanta gente bem–sucedida, rica, não havia qualquer crime nisso, como caminho o vivido personagem de e inteligente freqüentadora das melhores acusavam alguns críticos. Mas não Carlos Estevão? Foi assim a série “Dr. M ­ acarra”, personagem com uma festas, amigas de ­celebridades, que tem grosseiro como poderia parecer à

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CARLOS, POR ESTEVÃ0 Trechos de sua última entrevista, concedida a Procópio e Geraldo Magalhães, originalmente publicada no Diário da Tarde, jornal mineiro, em 4 de março de 1972, apenas quatro meses antes de sua morte.

Sharleck Halmes corre para resolver mais um caso misterioso.

primeira vista. Nem é preciso sair às ruas para ver os tipos grotescos que ele ­desenhava. Basta ligar a televisão ou ­­conectar–se à internet. O mundo de Carlos Estevão é o nosso mundo. Na vida pessoal tudo parecia correr bem, quando Carlos entra em coma diabético em 1968. Os anos de abuso de álcool e displicência com a saúde começaram a apresentar a conta. A partir daí, não ­beberia mais, mas continuava sendo compulsivo. Deixou o álcool, mas não os doces, que adorava. O ­estrago já estava feito. Os anos seguintes s­ eriam de idas e vindas a hospitais, sem que jamais deixasse de trabalhar. Era outra compulsão. Morava há 13 anos em B ­ elo H ­ orizonte porque não suportava o c­ alor do Rio de Janeiro. Com desenhos na Europa e na América, seu último trabalho especial foi feito um mês antes de morrer: atendeu a uma encomenda de uma cadeia de televisão, revista e jornal do Japão. Em vida o seu talento foi reconhecido pela Enciclopédia Delta Larousse, que o incluiu como um dos maiores chargista do mundo, deixando como legado uma vastíssima obra. Faleceu no dia 14 de julho de 1972, às 21 horas de sexta–feira na Casa de Saúde São José, vitima de trombose cerebral às vésperas de completar 50 anos em Belo Horizonte. Estevão só chegou ­ a conhecer a primeira neta, Mariana, nascida no mesmo ano. Tudo o que foi escrito no calor do momento demonstrava imensa admiração e profunda tristeza. No dia seguinte, o Jornal Nacional confidenciou ao resto do país. “Hoje, o Brasil acordou mais triste.” 

PROCURO FAZER UM HUMOR RISÍVEL. Isto é importante para mim: que o humor seja risível. Não tenho ­pretensões intelectuais e não quero ser um Bernard Shaw brasileiro.” NUNCA FREQUENTEI NENHUMA PANELINHA. Mas tive que enfrentar a famosa luta pela vida. Veja um exemplo: se você vai fazer uma caçada, mata uma paca, arrasta e corta, ­cozinha e come a paca, isto lhe dá um prazer imenso. Agora, se você vai a um concurso de caça, para ver quem consegue matar a paca maior, mesmo que seja a sua vencedora, não há prazer nenhum nisto, ou, se há, já está contaminado. Já houve competição, pressão de g­ rupo, obrigação.” EU RARAMENTE SAIO DE CASA. Como não gosto de Flávio Cavalcânti e essas coisas, deixo a família vendo a televisão lá embaixo e me refugio neste cantinho. Aqui, faço de tudo. Conserto ferro elétrico, invento acendedores, gravo imitações, ouço música clássica e tango. Aqui eu conquisto um pouco daquela liberdade de fazer o que quero sem sofrer restrições.” NÃO CONSIGO SER AGRESSIVO PORQUE OLHO ­MUITO O LADO HUMANO DAS COISAS E DAS PESSOAS. Não faço crítica direcional. Posso criticar uma situação geral, sem especificar, sem citar nomes. Olha, eu quero atualmente um ­pouco de sossego, uma certa marginalização. Assistir de camarote os atletas se digladiando, correndo para ver quem vence na vida. Por ­exemplo: não gosto do tipo de humor do Pasquim. O pessoal é ­excelente, ­conheço quase todos, são meus amigos. Mas eles fazem um humor muito agressivo, citam nomes, etc. Sei lá, todo mundo é humano e tem suas falhas...” ACABO DE COMEMORAR MEU CINQUENTENÁRIO. Nessa altura, realizando um balanço de tudo o que fiz e o que sou, tenho a sensação de que, apesar da fama, apesar de ser um nome nacional, não era bem isso o que queria. Desejava não ter me e­ nvolvido, não ter participado desta competição pela vida, dessa escravidão determinada por obrigações e impostos. Procuro uma vida livre, desvinculada de compromissos. As coisas simples, ­atualmente, são as que me atraem.” “O IDEAL DA VIDA É FAZER O QUE A GENTE GOSTA. (...) Já perceberam que as crianças e os animais são felizes? E por quê? Por causa do imediatismo de suas vidas, da inconsequência. Eles não pensam no futuro, não planejam, vivem o dia de hoje e são felizes. Sei lá... eu queria ser criança...” CONSULTA BIBLIOGRÁFICA: Biografia publicada no livro "Carlos Estêvão Apresenta: Dr. Macarra —Um Playboy na FEB e outras histórias", pela Record em 1981; Memória Viva de Carlos Estevão; e Revista "O Cruzeiro".

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Fotos: Divulgação

GALERIA

Marcelo Ramos, nasceu em Caeté, Minas ­Gerais, artista plástico e programador visual f­ormado pela UEMG, produtor multimídia ­formado pelo UNI-BH, designer gráfico e ilustrador. O artista retrata em sua arte a vida cotidiana do interior do país, com personagens simples que marcaram sua infância. Com traço vigoroso e marcante o artista transmite através das cores e formas sua inquietude e a vontade de mostrar através de sua arte, a grandeza da vida simples. Caricaturista por “hobby” se diverte ao realçar os detalhes das pessoas a quem retrata.

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Ronaldo Fraga.


Karl Lagerfeld.


Jean Paul Gaultier


Anna Wintour.


Constanza Pascolato.


LUCAS FREITAS


Modelo: Amanda Nascimento / Stylist: Rafael Cietto


Shin


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