Neurociência, Cognição e Linguagens

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Por que o Erro é só dele?

Editora

E mais... Conheça o curioso caso de Phineas Gage



Revista de Neurociência, Cognição e Linguagens - Tudo para suas pesquisas na área da Educação. Rio de Janeiro, junho de 2016 Jornalista responsável: Carla de Paiva Graduada em Pedagogia. Professora e pesquisadora na área da Educação Especial, Mestranda em educação.

Revista de Neurociência, Cognição e Linguagens - Tudo para suas pesquisas na área da Educação. Rio de Janeiro, junho de 2016 Jornalista responsável: Izadora Souza Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro no Instituto Multidisciplinar. Pesquisadora na área da Educação Especial, Mestranda em educação.

Revista de Neurociência, Cognição e Linguagens - Tudo para suas pesquisas na área da Educação. Rio de Janeiro, junho de 2016 Jornalista responsável: Saionara Pussenti Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro no Instituto Multidisciplinar. Professora e pesquisadora na área da Educação Especial e Gênero, Sexualidade, Infância e Educação. Mestranda em educação.


SUMÁRIO O caso de Phineas Gage

Neurociência e Educação Pág. 1

Caminhão de Dúvidas Pág. 5 Pág. 26

Emoções e sentimentos Pág. 6 O texto “As emoções e os sentimentos segundo António Damásio” de Fátima Moura da Silva traz considerações importantes sobre a temática. FOTO: www.dasgehirn.info

FOTO: Aula do curso de pós-graduação na UFRRJ sobre neurociência

O Erro Pág. 8 A autora Maria de Jesus Fonseca faz uma crítica a obra “O Erro de Descartes ”

Vida e Obra Levy Vigostki Pág.15

Vida e Obra Antônio Damásio Pág.17

Disciplina Pág. 28

Conheça as emoções no filme DivertidaMente Pág. 32

FOTO: DISNEY PIXAR

Entrevista com Antônio Damásio Pág.18


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A IMPORTÂNCIA DA NEUROCIÊNCIA NA EDUCAÇÃO por Vera Lucia Mietto1 Os avanços e descobertas na área da neurociência ligada ao processo de aprendizagem é sem dúvida, uma revolução para o meio educacional. A Neurociência da aprendizagem, em termos gerais, é o estudo de como o cérebro aprende. É o entendimento de como as redes neurais são estabelecidas no momento da aprendizagem, bem como de que maneira os estímulos chegam ao cérebro, da forma como as memórias se consolidam, e de como temos acesso a essas informações armazenadas. Quando falamos em educação e aprendizagem, estamos falando em processos neurais, redes que se estabelecem, neurônios que se ligam e fazem novas sinapses. E o que entendemos por aprendizagem? Aprendizagem, nada mais é do que esse maravilhoso e complexo processo pelo qual o cérebro reage aos estímulos do ambiente, ativa essas sinapses (ligações entre os neurônios por onde passam os estímulos), tornando-as mais "intensas". A cada estímulo novo, a cada repetição de um 1

comportamento que queremos que seja consolidado, temos circuitos que processam as informações, que deverão ser então consolidadas. A neurociência vem nos desvendar o que antes desconhecíamos sobre o momento da aprendizagem. O cérebro, esse órgão fantástico e misterioso, é matricial nesse processo do aprender. Suas regiões, lobos, sulcos, reentrâncias tem sua função e real importância num trabalho em conjunto, onde cada um precisa e interage com o outro. Mais qual o papel e função de cada região cerebral? Aonde o aprender tem realmente a sua sede e necessita ser estimulada adequadamente? Conhece r o papel do hipocampo na consolidação de nossas memórias, a importância do sistema límbico, responsável pelas nossas emoções, desvendar os mistérios que envolvem a região frontal, sede da cognição, linguagem e escrita, poder entender os mecanismos atencionais e comportamentais de nossas crianças com TDAH, as funções executivas e o sistema de comando inibitório do lobo pré-

frontal é hoje fundamental na educação assim como compreender as vias e rotas que norteiam a leitura e escrita (regidas inicialmente pela região visual mais especifica (parietal), que reconhece as formas visuais das letras e depois acessando outras áreas para que a codificação e decodificação dos sons sejam efetivas. Como não penetrar nos mistérios da região temporal relacionado a percepção e identificações dos sons onde os reconhece por completo? (área temporal verbal que produz os sons para que possamos fonar as letras). Não esquecendo a região occipital que tem como uma de suas funções coordenar e reconhecer os objetos assim como o reconhecimento da palavra escrita. Assim, cada órgão se conecta e se interliga nesse trabalho onde cada estrutura com seus neurônios específicos e especializados desempenham um papel importantíssimo nesse aprender. Podemos compreender, desta forma que o uso de estratégias adequadas em um processo de ensino dinâmico e prazeroso

Disponível em: http://www.pedagogia.com.br/artigos/neurocienciaaeducacao/index.php?pagina=0


2 provocará consequentemente, alterações na quantidade e qualidade destas conexões sinápticas, afetando assim o funcionamento cerebral, de forma positiva e permanente, com resultados extremamente satisfatórios. Estudos na área neurocientífica, centrados no manejo do aluno em sala de aula vem nos esclarecer que a aprendizagem ocorre quando dois ou mais sistemas funcionam de forma inter-relacionada. Assim, podemos entender, por exemplo, como é valioso aliar a música e os jogos em atividades escolares, pois há a possibilidade de se trabalhar simultaneamente mais de um sistema: o auditivo, o visual e até mesmo o sistema tátil (a música possibilitando dramatizações). Os games (adorados pelas crianças e adolescentes) ainda em discussão no âmbito acadêmico são fantásticos na sua forma de manter nossos alunos plugados e podem ser mais uma ferramenta facilitadora, pois possibilita estimular o raciocínio lógico, a atenção, a concentração, os conceitos matemáticos e através de cruzadinhas e caçapalavras interativos, desenvolver a ortografia de forma desafiadora e prazerosa para os alunos.

Vários sites na internet nos disponibilizam esses jogos. Desta forma, o grande desafio dos educadores é viabilizar uma aula que "facilite" esse disparo neural, as sinapses e o funcionamento desses sistemas, sem que necessariamente o professor tenha que saber se a melhor forma de seu aluno lidar com os objetos externos é: auditiva, visual ou tátil. Quando ciente da modalidade de aprendizagem do seu aluno, (e isso não está longe de termos na formação de nossos educadores) o professor saberá quais estratégias mais adequadas utilizar e certamente fará uso desse grande e inigualável meio facilitador no processo ensino ? aprendizagem. Outra grande descoberta das neurociências é que através de atividades prazerosas e desafiadoras o "disparo" entre as células neurais acontece mais facilmente: as sinapses se fortalecem e redes neurais se estabelecem com mais facilidade. Mas como desencadear isso em sala de aula? Como o professor pode ajudar nesse "fortalecimento neural"? Todo ensino desafiador ministrado de forma lúdica tem esse efeito: aulas dinâmicas, divertidas, ricas em

conteúdo visual e concreto, onde o aluno não é um mero observador, passivo e distante, mas sim, participante, questionador e ativo nessa construção do seu próprio saber, o deixam "literalmente ligado", plugado, antenado. O conteúdo antes desestimulante e repetitivo para o aluno e professor ganha uma nova roupagem: agora propicia novas descobertas, novos saberes, é dinâmico e flexível, plugado em uma era informatizada aonde a cada momento novas informações chegam ao mundo desse aluno. Professor e aluno interagem ativamente, criam, viabilizam possibilidades e meios de fazer esse saber, construindo juntos a aprendizagem. Uma aula enriquecida com esses pré-requisitos é mágica, envolvente e dinâmica. É saber fazer uso de uma estratégia assertiva onde conhecimentos neurocientíficos e educação caminham lado a lado. Mas como isso é possível? O que fazer em sala de aula? A seguir veremos algumas sugestões que podem ser adotadas: 1- Estabeleça regras para que haja um convívio harmonioso de todos em sala de aula,


3 fazendo com que os alunos sejam responsáveis pela organização, limpeza e utilização dos materiais. Opinando e criando as regras e normas adotadas, eles se sentirão responsáveis pela sala de aula 2- Faça uso de materiais diversificados que explorem todos os sentidos. Visual: mural, cartazes coloridos, filmes, livros, filmes educativos; Tátil: material concreto e objetos de sucata planejados. Há uma riqueza de sites na internet que nos disponibilizam atividades muito ricas e prazerosas. A criatividade aflora e a aula se torna muito divertida; Auditivo: música e bandinhas feitas com material de sucata, sempre com o conteúdo inserido nelas. A criação de músicas sobre conteúdos é uma forma divertida de aprender. Talentos apareceram em sala de aula. E quem não gosta de cantar? A aula fica muito rica e prazerosa! 3- Reserve um lugar com almofadas e tapete, para momentos de descanso e reflexão. O "cantinho da leitura" é fundamental na sala de aula na ausência de uma biblioteca. Relaxar após o trabalho prazeroso significa dar tempo para

o cérebro escanear todo o conteúdo que vai ser assimilado, ativar o hipocampo (região responsável pelas memórias) e consolidar o que se aprendeu. 4- Estabeleça rotinas onde possam realizar trabalhos individuais, em dupla e em grupo. (rotinas estabelecidas reforçam comportamentos assertivos e organização. Crianças com TDAH, que apresentam mal funcionamento das funções executivas se beneficiam com rotinas e regras pré estabelecidas.) O trabalho em equipe é extremamente prazeroso, ativa as regiões límbicas (responsáveis pelas emoções) e como sabemos que o aprender está ligado à emoção, a consolidação do conteúdo se faz de maneira mais efetiva. (hipocampo) 5- Trabalhar o mesmo conteúdo de várias formas possibilita aos alunos "mais lentos" oportunidades de vivenciarem a aprendizagem de acordo com suas possibilidades neurais. Dê aos mais rápidos, atividades que reforcem ainda mais esse conteúdo, que os mantenham atentos e concentrados, para que os mais lentos não sejam

prejudicados com conversas e agitação dos mais rápidos. 6- A flexibilidade em sala de aula permite uma aprendizagem mais dinâmica e melhor, percebida por todos os alunos. O professor que ministra bem os conflitos em ala de aula, que tem "jogo de cintura" e apresenta o conteúdo com prazer mantém seus alunos "plugados" na sala de aula. Desta forma, sabedores deste mecanismo neural que impulsiona a aprendizagem, das estratégias facilitadoras que estimulam as sinapses e consolidam o conhecimento, dessa magia onde cada estrutura cerebral se interliga para que todos os canais sejam ativados. Assim ,como numa orquestra afinadíssima, onde a melodia sai perfeita, estar de posse desses importantes conhecimentos e descobertas será como reger uma orquestra onde o maestro saberá o quão precisamente estão afinados seus instrumentos e como poderá tirar deles melodias harmoniosas e suaves. A neurociência se constitui assim em atual e uma grande aliada do professor para


4 poder identificar o indivíduo como ser único, pensante, atuante, que aprende de uma maneira toda sua, única e especial. Desvendando os mistérios que envolvem o cérebro na hora da aprendizagem, a neurociência disponibiliza, ao moderno professor (neuroeducador), impressionantes e sólidos conhecimentos sobre como se processam a linguagem, a memória, o esquecimento, o humor, o sono, a atenção, o medo, como incorporamos o conhecimento, o desenvolvimento infantil, as nuances do desenvolvimento cerebral desta infância e os processos que estão envolvidos na aprendizagem acadêmica. Logo, um vasto campo de preciosas informações relacionadas ao aluno e ao processo de absorção da aprendizagem a ele proporcionada. Tomarmos posse desses novos e fascinantes conhecimentos é imprescindível e de fundamental importância para uma

pedagogia moderna, ativa, contemporânea, que se mostre atuante e voltada às exigências do aprendizado em nosso mundo globalizado, veloz, complexo e cada vez mais exigente. Conceitos como neurônios, sinapses, sistemas atencionais, (que viabilizam o gerenciamento da aprendizagem), mecanismos mnemônicos (fundamentais para o entendimento da consolidação das memórias), neurônios espelho, que possibilitam a espécie humana progressos na comunicação, compreensão e no aprendizado e plasticidade cerebral, ou seja, o conhecimento de que o cérebro continua a desenvolver-se, a aprender e a mudar não mais estarão sendo discutidos apenas por neurocientistas, como até então imaginávamos. Estarão agora, na verdade, em sala de aula, no dia a dia do educador, pois uma nova visão de aprendizagem está a se delinear. O fracasso e insucesso escolar têm

hoje um novo olhar, já que uma nova e fascinante gama de informações e conhecimentos está á disposição do educador moderno. Graças à neurociência da aprendizagem, os transtornos comportamentais e da aprendizagem passaram a ser mais facilmente compreendidos pelos educadores, que aliados a neurociência tem subsídios para a elaboração de estratégias mais adequadas a cada caso. Um professor qualificado e capacitado, um método de ensino adequado e uma família facilitadora dessa aprendizagem são fatores fundamentais para que todo esse conhecimento que a neurociências nos viabiliza seja efetivo, interagindo com as características do cérebro de nosso aluno. Esta nova base de conhecimentos habilita o educador a ampliar ainda mais as suas atividades educacionais, abrindo uma nova estrada no campo do aprendizado e da transmissão do saber.


Caminhão de Dúvidas

Como a ciência define Neurociência?

O que é self?

Como se constrói a mente e a consciência?

Como Espinosa influência Vigotski e Damásio?

O que é inteligência ou o que é ser inteligente?

Quando|como é possível ter consciência da consciência?

Será que o ser humano se organiza sem a representação?


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As emoções e os sentimentos segundo António Damásio por Fátima Moura da Silva2 As emoções e os sentimentos fazem parte do processo regulador da vida e são essenciais não só à sobrevivência física individual, mas também para o êxito da espécie humana, considera António Damásio. Em «Ao Encontro de Espinosa - As Emoções Sociais e a Neurologia do Sentir» -, agora reeditado pela Temas & Debates/ Círculo de Leitores, o neurologista aborda as emoções e analisa os sentimentos, considerando que têm bases físicas, com origem no corpo. É verdade que o uso habitual da palavra emoção tende a incluir a noção de sentimento. Mas na tentativa de compreender a cadeia complexa de acontecimentos que começa na emoção e termina no sentimento, separar a parte do processo que se torna pública da parte do processo que sempre se mantém privada ajuda clarificar as ideias», escreve Damásio. «À parte pública chamo emoção e à parte privada sentimento», continua. Para Damásio, os sentimentos «são a expressão do florescimento humano ou do sofrimento humano, na mente e no corpo». «Os sentimentos não são uma mera decoração das emoções, qualquer coisa que possamos guardar ou deitar fora. Os sentimentos podem

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ser, e geralmente são, revelações da vida dentro do organismo», afirma, acrescentando que na existência do dia a dia, estes revelam, simultaneamente, «a nossa grandeza e a nossa pequenez». «A forma como a revelação se introduz na mente só agora começa, ela mesma, a ser revelada», sublinha. Por outro lado, uma emoçãopropriamente-dita é uma coleção de respostas químicas e neurais que formam um padrão distinto. As respostas – a um objeto ou acontecimento que desencadeia a emoção - são automáticas e não se limitam a encaixar-se nos repertórios de ação prescritos pela evolução, incluem sim muitos outros adquiridos pela experiência individual, considera o autor. O resultado imediato destas respostas é uma alteração temporária do estado do corpo e do estado das estruturas cerebrais que mapeiam o corpo e suportam o pensamento, acrescenta.

«O resultado final das respostas é a colocação do organismo, direta ou indiretamente, em circunstâncias que levam à sobrevida e ao bemestar», frisa ainda. Na obra, Damásio «visita» o filósofo judeu holandês Baruch Espinosa (1632-77), reconhecido como um dos pilares do pensamento ocidental, e que fascinou o cientista desde a juventude. Agora, António Damásio confirma o que Espinosa já

Extraído da página: diariodigital.sapo.pt/news.asp?id_news=603040


7 pensava, que os sentimentos constituíam o alicerce da mente. «A minha (anterior) invocação de

Descartes foi puramente emblemática de uma perspectiva sobre um problema científico e filosófico e pouco tinha a ver com o personagem histórico. A minha relação com Espinosa, porém, é inteiramente diferente. Espinosa é uma pessoa ímpar e as suas ideias e maneira de ser fundem-se com os problemas psicológicos que aborda e com a correspondente neurociência», afirma. «Elucidar a neurobiologia dos sentimentos e das emoções que os percebem alerta a nossa visão do problema mente-corpo, um problema cujo debate é central para a nossa compreensão daquilo que somos: a emoção e as várias reações a ela estão alinhadas com o corpo, enquanto os sentimentos estão alinhados com a mente», afirma o neurologista, Mas a tentativa de explicar a biologia dos sentimentos e das emoções também tem resultados práticos. «Vai contribuir sem qualquer dúvida para a descoberta de tratamentos eficazes de algumas das causas principais do sofrimento humano, como por exemplo a depressão, a dor e a toxicomania. Além disso, compreender o que são os sentimentos, a forma como funcionam e o seu significado humano são passos indispensáveis para a construção futura de uma visão

dos seres humanos mais correta do que a atual, uma visão que tomará em conta todo o espetacular progresso que se tem vindo a fazer nas ciências sociais, nas ciências cognitivas e na biologia», afirma. O êxito ou o fracasso da humanidade depende em grande parte do modo como o público e as instituições que governam a vida pública puderem incorporar essa nova perspectiva da natureza humana em princípios, métodos e leis, diz Damásio, para quem compreender a neurobiologia das emoções e dos sentimentos é necessário para que se possam formular princípios, métodos e leis capazes de reduzir o sofrimento humano e engrandecer o florescim ento humano.

De facto, a nova perspectiva diz até respeito ao modo como os seres humanos poderão abordar conflitos latentes entre interpretações sagradas ou seculares da sua própria existência, afirma. «Ao Encontro de Espinosa» completa a série de livros de Damásio sobre o papel da emoção e dos sentimentos nas relações entre a mente e o corpo, que inclui também «O Erro de Descartes» e «O Mistério da Consciência».


O calor fazia o sangue circular; “As finas e minúsculas partículas do sangue se transformavam em “espíritos animais”, os quais conseguiam depois mover os músculos” (DAMÁSIO, 2012, p. 220). Livro o Erro de Descartes

PLATÃO

DUALISMO Corpo (res extensa) Mente (res cogitans)

SANTO AGOSTINHO AGOSTINHO

DESCARTES SS

Fallor ergo sum

Cogito ergo sum

MECANISCISMO

Esquema produzido pelos autores, 2016.

FOTO: https://edukavita.blogspot.com.br/2015/06/biogra fia-de-rene-descartes-matematico.html


9 ANÁLISE CRÍTICA DA OBRA DE ANTÓNIO DAMÁSIO "O ERRO DE DESCARTES" OU O ERRO DE DAMÁSIO SOBRE "O ERRO DE DESCARTES" Por Fonseca, M.J.M.3

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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS - O título oficial deste painel promovido pelo Departamento de Ciência da Educação é "Análise crítica da obra O ERRO DE DESCARTES de António Damásio". Para título desta comunicação eu própria "O ERRO DE Damásio acerca do Erro de Descartes" ou "Como distinguir um neurocientista de um filósofo". Talvez no fim de me ouvirem me ajudem a decidir por um deles. - Dada a minha formação académica e profissional, centrar-me-ei nos aspectos em que a obra de Damásio toca os domínios da filosofia. - Situar-me-ei, nessa análise, a partir do ponto de vista de Descartes e daquela que é a interpretação consensual da filosofia cartesiana. - De algum modo me considero, portanto, advogada de defesa de Descartes. - Daqui não pode nem deve inferir-se que me coloco simultaneamente como advogada de acusação de Damásio - o que é, aliás, manifestamente impossível no âmbito dos códigos legais. - Por outro lado, o que está em análise é a obra, esta obra, e não o autor. Mas analisar o texto ou a obra implica sempre um diálogo a três: o autor, o texto ou a obra, o leitor. Por isso, por vezes, é muito difícil manter a análise na obra sem passar pelo autor, já que o texto interpela-nos, nós interpela-mos o texto e, às vezes, interpelar o texto é também interpelar o seu autor. - Devo dizer que escrevi um texto algo longo sobre o assunto presente. Dado o 3

tempo disponível, achei melhor encurtálo, vincando apenas as ideias fundamentais. Espero ser breve, mas clara e espero ser sintética (que é coisa que não sou) mas inteligível. Posto isto, comecemos, então, essa análise. E comecemos pelo título, como não podia deixar de ser. 1. - O TÍTULO Curioso o título para um livro que, confessadamente, não trata de Descartes nem sequer da filosofia "embora tenha sido por certo acerca da mente, do cérebro e do corpo", (Damásio (1995):20) daquilo que o autor designa, numa palavra, por neurociência. Isto mesmo é confirmado pela contagem (não muito rigorosa evidentemente) do número de vezes que aparece o nome de Descartes. Vinte e cinco vezes Descartes. Seis vezes cartesiana. Trinta e uma vezes no total em duzentas e setenta e umas páginas. Ora, se assim é, a primeira questão que coloco é esta: Porque não inverteu o autor o título? O sub-título passa a título principal e o título a sub-título: EMOÇÃO, RAZÃO E CÉREBRO HUMANO. O erro de Descartes. E uma Segunda questão: E porquê O Erro de Descartes e não de Platão ou Kant, por exemplo? Autores a que o texto faz referência. " Mas há quem possa perguntar por que motivo incomodar Descartes e não Platão cujas ideias sobre o corpo e a mente são muito mais exasperantes." (Damásio (1995):255). Infelizmente o autor não responde à sua própria pergunta!

Texto extraído de http://www.ipv.pt/millenium/ect2_mjf.htm


10 A única resposta que encontrámos é indireta e é aquela que o autor dá para justificar o título e a escolha de Descartes. Descartes é "a figura emblemática que moldou a abordagem mais difundida respeitante à relação mente-corpo." (Damásio (1995):20). Ora, desta opinião não são os profissionais e os especialistas da filosofia, que consideram, precisamente, que essa figura emblemática é Platão e não Descartes. Sendo assim, parece, desde logo, que o título é inadequado. O próprio autor parece ter consciência disto mesmo, porquanto afirma que, de fato, o livro não é sobre Descartes e, assim, Descartes é meramente um pretexto. PORQUÊ, ENTÃO, ESTE TÍTULO? PORQUÊ, ENTÃO, DESCARTES? PODERIA PROPÔR ALGUMAS EXPLICAÇÕES, ENTRE OUTRAS: POR MARKETING? PARA CHAMAR A ATENÇÃO? POR MODA?

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Atentemos na última hipótese. Não deixa de ser curioso que títulos deste género, que direta ou indiretamente evocam Descartes, tenham ultimamente vindo a lume e nada tenham a ver com a filosofia. Curioso também que vão já em largas reimpressões. Por exemplo: Nunes dos Santos, Existes, logo pensa, 9ª edição, 1988. O próprio livro de Damásio que já vai, nesta data, em 12ª edição e todas publicadas entre Maio de 1995 e Agosto do mesmo ano. Até a banda desenhada glosa Descartes. Indubitavelmente, Descartes está hoje na ordem do dia. É um autor pleno de atualidade. E, de fato, quem não conhece Descartes e o seu famoso " penso, logo existo"? E toda a gente conhece o Discurso: todos o lemos quando passámos pela escola. O homem comum, com uma cultura geral média, conhece melhor Descartes que

Platão ou Kant. Quem não sabe que o "penso, logo existo" é uma afirmação cartesiana? Quanto a Platão ou Kant, que afirmações famosas lhe podem atribuir o homem comum? O próprio Damásio considera que o "penso, logo existo" é uma afirmação "talvez mais famosa da história da filosofia." (Damásio (1995):254) Tiremos então a ilação que parece óbvia. O título não podia ser outro senão O Erro de Descartes porque Descartes é mais conhecido que qualquer outro filósofo e isso, aliado ao facto de que Descartes, afinal, e a crer em Damásio, errou, é garantia de sucesso ou, pelo menos, desperta a nossa atenção. 1. - Os Erros de Descartes Descartes errou, segundo Damásio. Mas afinal em que errou Descartes? Qual foi, então o Erro de Descartes? Para dizer a verdade, foram vários os erros de Descartes na perspectiva de Damásio. Enunciemo-los: Primeiro, o mais fundamental, sob o ponto de vista de Damásio, aquele que vai ser alvo de todas as críticas, é o erro do dualismo. Segundo: Mas Descartes cometeu outros erros, aliás "bem mais espetaculares"! (Damásio (1995):255) Por exemplo, os erros presentes na explicação que dá para a circulação do sangue (o calor é que faz circular o sangue) ou para a explicação do movimento dos músculos (por recurso aos "espíritos animais"). (Cf. Damásio (1995):255) No que diz respeito a estes últimos, Damásio não lhes atribui qualquer importância, porquanto "há muito tempo que sabemos que ele estava errado nestes aspectos concretos." (Damásio (1995):255) Restam os outros dois, o erro do dualismo e o do mecanicismo. Destes, o erro mais grave e decisivo é o erro do dualismo pois o dualismo "continua a prevalecer" e a influenciar a


11 ciência e a cultura hodiernas. (Cf. Damásio (1995):255) Apresentados os erros de Descartes, segundo Damásio, cumpre agora apreciá-los, saber se Descartes efetivamente errou e se Damásio tem ou não razão. 1.

- O(s) Erro(s) de Descartes. O Erro do Dualismo. Comecemos pela análise daquela que é, na perspectiva de Damásio, o único erro autêntico - o do dualismo. Em que consiste este erro? Na radical separação e diferença entre corpo e alma, res cogitans e res extensa, matéria e espírito. Erro patente, desde logo, e segundo Damásio, no "penso, logo existo" - que é a formulação que aparece no Discurso do Método (publicado em 1637). Mas Descartes dá outras formulações desse mesmo princípio, formulações essas que mutuamente se esclarecem. "Cogito, ergo sum " nos Princípios da Filosofia (publicada em 1644) e "sum res cogitans" nas Meditações Metafísicas (publicada em 1642). Sou. Sou o quê? Sou uma coisa que pensa, existo porque penso e enquanto penso, eis o que significam essas formulações. Se deixar de pensar, deixo de existir porque deixo de ter garantia, a certeza e a consciência da minha existência. Por isso, pensar e existir são, no fundo, uma só e mesma coisa e Descartes pode falar de intuição na apreensão desta única verdade. Mas o grande problema, para Damásio, reside no facto de " como sabemos que Descartes via o ato de pensar como uma atividade separada do corpo, esta afirmação celebra a separação da mente, a 'coisa pensante' (res cogitans) do corpo não pensante, o qual tem extensão e partes mecânicas (res extensa)." (Damásio (1995:254) E se isso é, de algum modo, pelo menos na aparência, verdade, tenho, contudo, algumas objecções a propor.

1ªobjecção - O dualismo patente na acusação de Damásio e Descartes é uma consequência do sistema, não é uma opção primeira do sistema cartesiano. Isto é, Descartes não parte do dualismo, ele chega ao dualismo, resultando isso da forma como Descartes põe os problemas. Por outro lado, o dualismo nunca satisfez o próprio Descartes que, por isso, o tentou ultrapassar, até porque como explicar que no homem a res cogitans (a mente) coexista e se relacione com a res extensa (o corpo). Daí o recurso cartesiano à glândula pineal - atual hipófise - (a que Damásio alude algumas vezes) como forma de explicar a intersecção e a inter-relação entre a mente e o corpo. E se a explicação pela glândula pineal mereceu algum louvor, o próprio Damásio o atesta quando afirma "curiosamente essa interligação [do corpo com a mente, a razão, o sentimento, a emoção] ocorre de forma intensa não muito longe da glândula pineal" (Damásio (1995):138), também é verdade que tal explicação não satisfaz ninguém nem o próprio Descartes. Ouçamo-lo: "é necessário saber que a alma está verdadeiramente unida a todo o corpo, e que em rigor não se pode dizer que exista numa das suas partes com exclusão das outras, pois o corpo é uno e de um certo modo indivisível". (Descartes (1968):115) Ao ouvir este texto quase se diria que estávamos a ouvir Damásio! 2ªobjecção - Damásio engana-se na interpretação que faz de Descartes. Primeiro erro de interpretação Descartes procura uma resposta para uma questão metafísica e não para uma questão de origem, como Damásio afirma. Ora Descartes não se questiona de onde vem ou provem a mente. Interroga-se pelo SER. O que é que existe? E responde: Existe o pensamento (primeira existência e primeira verdade fora de toda a dúvida), existe Deus (Segunda existência e


12 Segunda verdade) e existe o Mundo (terceira existência e terceira verdade). Mas este primeiro, segundo e terceiro não aparecem por ordem de importância ou por ordem de origem. Correspondem meramente à ordem da fundamentação do sistema. E por isso a uma só questão o que é que existe? - um só resposta: existe o pensamento, Deus e o Mundo. Segundo erro de interpretação Descartes não procurava uma fundação lógica para a filosofia, como Damásio afirma, procurava, quando muito, uma fundação lógico-metodológica e gneseológica - e isto é verdade ao nível do Discurso. Mas a autêntica fundamentação que Descartes busca é uma fundação ontológica e metafísica, que só ela garante a outra fundamentação lógico-gnoseológica, porquanto se quero conhecer, quero conhecer coisas que realmente existam, caso contrário p meu conhecimento seria ilusão, falsidade, mentira, fantasmagoria, porque conhecimento de nada, de algo que não existia. Mas mais. Quando se procura um primeiro princípio fundante - como é o caso de Descartes - é evidente que esse princípio, como qualquer princípio, é indemonstrável. É que o princípio funda, mas não é fundado. Os princípios, portanto, não se provam, aceitam-se (ou não). São fruto, em última análise, de uma opção/decisão e objeto de uma crença. Ora como pode Damásio considerar errado o primeiro princípio cartesiano se, como princípio que é, não se pode demonstrar a sua verdade ou falsidade? Para mais, Damásio faz a mesma coisa que Descartes, aparentemente sem se aperceber disso, radicando a confusão no sentido indiscriminado que Damásio dá ao tempo origem, que considera sinónimo de princípio. Ora, na terminologia filosófica, tais termos não são, de modo nenhum, equivalentes. Princípio é fundamento e origem é causa. E, de facto, Damásio não se pergunta

apenas pela origem (causa) da mente, pergunta também, antes de mais, pelo princípio. E na resposta que dá, onde, aliás, está bem patente a confusão terminológica referida, coloca-se nos antípodas de Descartes. "Para nós, portanto, no princípio foi a existência e só mais tarde chegou o pensamento. E para nós, no presente quando vimos ao mundo e nos desenvolvemos começamos ainda por existir e só mais tarde pensamos na medida em que existimos, visto o pensamento ser, na verdade, causado por estruturas e operações do ser." (Damásio (1995):254) Damásio a formular o seu próprio princípio metafísico! A existência! No princípio era a existência e é a existência que na sua própria evolução, desenvolvimento e complexificação permite o aparecimento do pensamento. E o que é verdade para a perspectiva filogenética, também o é na perspectiva ontogenética. Portanto, primeiro existimos. Existimos sem pensar. Depois, mais tarde, pensamos, existimos e pensamos. À existência acrescentou-se o pensamento. E, tal como é posta, a afirmação é também uma afirmação dualista. Porque primeiro existe uma coisa e depois outra diferente da primeira. Parece, portanto, que Damásio sofre do mesmo mal de que acusa Descartes: uma doença chamada dualismo agudo... ou crónico, dependendo da perspectiva. 3ª objecção - Um dos aspectos cruciais da argumentação de Damásio contra Descartes consiste em considerar que este erro do dualismo é imperdoável, porquanto é uma concepção errada que perdura até hoje e determina ainda hoje o modo como conhecemos as relações mente-corpo. Ora a minha objecção vai no sentido de considerar que o dualismo já estava presente em concepções anteriores a Descartes - por exemplo em Platão que distingue matéria e forma, Kosmos aisthetos e Kosmos noetos, corpo e


13 razão. E que dizer do Cristianismo que, mais que nenhuma outra força cultural, marcou decisivamente a nossa tradição ocidental? E que distingue alma de corpo, espírito de matéria, bem e mal... E só o primeiro polo destas dicotomias é valorizado! Porquê, pois, atribuir a Descartes a culpa do dualismo, se ele não foi o primeiro nem sequer o último dos dualistas? 3.2. - O Erro do Mecanicismo O segundo erro de Descartes: o mecanicismo. Erro que, tal como o anterior, ainda não foi refutado e continua a perdurar nos nossos dias. Muito curioso que, relativamente a este erro, Damásio só o enuncie, parecendo que, de repente, foi atacado por algum ataque de amnésia que o fez esquecer-se de o refutar. Primeira conclusão: o erro do mecanicismo perdura e, neste caso, pode perdurar já que Damásio não o desfaz. Última conclusão: o mecanicismo, afinal, não é um erro! Há aqui, indubitavelmente, uma contradição em Damásio. De qualquer forma, também o mecanicismo não é apenas uma concepção cartesiana. Ele é o modelo que preside à interpretação do mundo e da natureza na moderna concepção de ciência, desde os seus inícios no século XVII e já antes de Descartes, com Kepler, Copérnico e Galileu. (5) Consiste o mecanicismo em considerar que tudo na natureza se explica analogamente ao funcionamento de uma máquina, em que tudo acontece sempre da mesma maneira, as mesmas causas provocando sempre os mesmos efeitos. Logo, a hipótese do mecanicismo é indissociável da hipótese da causalidade. E se o mecanicismo é um erro então a ciência é um erro! Podemos compreender, então, o súbito ataque de amnésia de que parece ser vítima Damásio e porque é que ele não desfaz este pretenso erro. É que Damásio

é ele mesmo um mecanicista! Aliás, como cientista, não podia deixar de o ser. Por isso só posso concluir que não foi Descartes o culpado de "os biólogos adoptarem até hoje, uma mecânica de relojoeiro como modelo dos processos vitais" (Damásio (1995):253-254), como afirma Damásio. E posso mesmo concluir mais: que Damásio adopta "uma mecânica de relojoeiro como modelo dos processos vitais" (Damásio (1995):254) e neurológicos ou não afirme ele que o cérebro é causa da mente! Diz Damásio: "Poderíamos começar com um protesto e censurá-lo [a Descartes] por Ter convencido os biólogos a adoptarem até hoje uma mecânica de relojoeiro como modelo dos processos vitais. Mas talvez isso não fosse muito justo." (Damásio (1995):253-254). Convenhamos que, de facto, não é nada justo! E Damásio sabeo bem! No Post-Scriptum (Damásio (1995):258271) dirige uma última crítica a Descartes." A negligência cartesiana da mente, por parte da biologia e da medicina ocidentais, tem tido duas consequências principais. A primeira situa-se no campo da ciência. O esforço para compreender a mente em termos biológicos em geral atrasou-se várias décadas e pode dizer-se que só agora começa. (...) A Segunda consequência negativa relaciona-se com o diagnóstico e com o tratamento eficaz das doenças que nos confrontam" (Damásio (1995):261)), a saber, as doenças da mente. Ora mais uma vez sou obrigada a contradizer Damásio. Mas aqui Descartes nem sequer precisa que o defendam. Ele próprio se defende e contradiz Damásio quando no Discurso afirma "De maneira que esse eu, isto é, a alma pela qual sou o que sou é mais fácil mesmo de conhecer que o corpo" (Descartes (1968):40) ou quando afirma nas Meditações, e é o título da Segunda Meditação "Da


14 natureza do espirito humano: que se conhece melhor que o corpo". (Descartes (1976):117) E não resisto a citá-la como ela foi escrita originalmente pelo próprio Descartes em latim "De natura mentis humanae: quod ipsa sit notior quam corpus." (Descartes (1970):36) E provando que a mente é mais simples e fácil de conhecer que o corpo, Descartes aventura-se no estudo da alma ou da mente escrevendo o Tratado das Paixões da Alma, publicado em 1649. Não parece, de modo nenhum, a não ser por um erro muito grosseiro ou má-fé, que possamos acusar Descartes de ter esquecido a mente e de, por essa razão, ser igualmente culpado pelo atraso no estudo da mente! 4. UMA NÃO-CONCLUSÃO Posto isto, não estejam à espera de uma conclusão, não me peçam uma conclusão, não me podem sequer pedir

que conclua. De facto, é uma impossibilidade concluir. Há muito ainda por explicar, nada está fechado e, portanto, concluído. Tudo está aberto e permanece, ainda, em aberto. Nota em alegação final - A única "conclusão" que posso "concluir", em resposta ao repto que me foi lançado no início, é que, em face do exposto, julguem os senhores, distintos jurados! E penso que não podem proferir outro veredicto no caso que esteve presente neste Tribunal de Damásio versus Descartes, a não ser o do réu, o acusado, não é culpado, mas inocente! Aliás, é essa a minha profunda convicção ou não teria aceitado esta defesa quando me foi proposta. O veredicto de inocência que espero, já está, por isso, implícito num dos títulos que vos propus.


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Você conhece? FOTO: http://www.minutopsicologia.com.br/postagens/2 015/10/02/voce-conhece-vigotski/

Lev Semionovich Vigotski [várias traduções são possíveis para seu sobrenome: Vygotsky, Vygotski ou Vigotsky] (1896-1934) foi um grande cientista bielorrusso, que ficou mundialmente conhecido pelas suas contribuições para a psicologia. Apesar de não possuir formação oficial na área (raridade para aquela época), podemos considerá-lo um psicólogo, pelo fato de que suas contribuições teóricas foram criadoras de uma Escola de Pensamento que muito influenciou a psicologia posteriormente ao século XX. De descendência judaica, Vigotski era formado em direito, história, literatura e medicina, compreendia nove idiomas (dizem alguns biógrafos que, apesar de ter o domínio dos outros idiomas, não gostava de falá-los para respeitar a pronunciação correta das palavras), foi professor na cidade de Gomel (Bielorrrusia), mudando-se posteriormente para Moscou Rússia), para trabalhar no Instituto de Psicologia daquela cidade.

Junto com Alexei Nikolaievich Leontiev (1903-1979) e Alexander Romanovich Luria (1902-1977), criou a Psicologia Histórico Cultural, uma teoria psicológica baseada em um tipo próprio de Materialismo (Toassa, 2015) com base no Marxismo. Vigotski morreu de tuberculose aos 37 anos, tendo deixado em um curto período de tempo, cerca de 10 anos, vários manuscritos (alguns dos quais ainda desconhecidos do grande público) de grande relevância para a Psicologia. Muitos nomes têm se dado para a escolha de pensamento que se originou em Vigotski: Escola de Vigotski, Psicologia Histórico-Cultural, Psicologia Sociocultural, Psicologia sociohistórica, psicologia sociointeracionista etc. Tais nomes ocorrem em parte por traduções e interpretações parciais da obra do autor: González Rey (2005) assinala que, psicologia sociocultural, é uma mistura e/ou interpelação da psicologia pragmática ou cognitiva estadunidense na obra de Vigotski; assim como


16 psicologia sociointeracionista (Duarte, 2011) que recebeu interpelações da teoria piagetiana; e como pode-se perceber a influência do culturalismo norteamericano e europeu e do Marxismo latinoamericano nas diversas correntes da chamada Psicologia Sociohistórica. A base da psicologia vigotskiana é muito simples: o caráter social do desenvolvimento humano. Ou seja, o ser humano, por mais que tenha um aparato biológico/orgânico, necessita de um aparato social para desenvolver esta infraestrutura. Neste sentido, o social vai muito além das interações entre as pessoas, mas do conjunto de símbolos e afetos que são gerados no processo de modificação do mundo através das ferramentas construídas pelo homem. E neste sentido, o desenvolvimento humano se dá através

de quatro vias, ou entradas, que são a microgênese, a filogênese, a ontogênese e a sociogênese (não vou me ater a explicar os pontos, uma googlada resolve isso). Muitas foram as contribuições de vigotski aos campos do desenvolvimento humano, da psicopatologia, da epistemologia da psicologia, da psicologia da arte, entre outras, que ainda estão sendo descobertas: os livros de Vigotski foram proibidos pela ditadura soviética por um período de 20 anos, sendo abertas ao mundo somente a partir de 1956, chegando no Brasil somente em 1984, cinquenta anos depois de sua morte, demonstrando que há ainda muito a que se fazer, e muito o que se conhecer do autor

Disponível em: http://www.minutopsicologia.com.br/postagens/2015/10/02/voceconhece-vigotski/


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Biografia

Antônio Damásio estudou medicina na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, graduando-se em 1969. Cursou residência em neurologia no Hospital Universitário e, em 1974, doutorou-se também pela mesma Universidade. Mudou-se, então, para os Estados Unidos como pesquisador do Centro de Pesquisas da Afasia de Boston. Atuou como clínico no tratamento dos transtornos do comportamento e da cognição. Como teórico começou a interessar-se por neurobiologia da mente, estudando em especial os sistemas neurais relacionados à consciência. Atualmente Antônio Damásio integra o Departamento de Neurologia da Universidade de Iowa, onde é pesquisador. Como escritor de livros de ciência, Damásio trata da relação entre emoções e sentimentos, e de suas bases cerebrais. Em 1994 publicou seu primeiro livro, "O Erro de Descartes", recebido com entusiasmo. Em 2001 publicou seu segundo livro, "O Mistério da Consciência", outro grande sucesso de público. Sua obra mais recente, "Em Busca de Espinosa" (2003), trata das relações entre a filosofia e a neurobiologia, explorando as questões que envolvem o comportamento humano e a ética. Casado com a cientista Hanna Damásio, que também é co-autora de várias de suas obras, Damásio é membro da Academia Americana de Artes e Ciências e de diversas instituições científicas americanas e europeias. Também faz parte do conselho editorial de dezenas de revistas de ciências, como "Learning and Memory", "European Neurology" e "Brain and Cognition". Por sua atuação no campo das ciências cognitivas, recebeu diversos prêmios. Texto disponível em: http://educacao.uol.com.br/biografias/antonio-damasio.htm

Frases disponíveis em: http://citacoes.in/autores/antonio-damasio/reb


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ENTREVISTA ANTÓNIO DAMÁSIO: O NEUROCIENTISTA

PÕE A MÃO NA CONSCIÊNCIA Por Ana Gerschenfeld 4 Tópicos

1-

Cérebro

Um dos maiores mistérios da natureza está dentro da cabeça de cada um de nós. Como é que o nosso cérebro gera a consciência? Como consegue articular a nossa percepção do mundo com o nosso sentir do mundo e de nós próprios? Como fabrica subjetividade, esse atributo exclusivamente humano da mente consciente? Há quem diga que o problema de saber como a consciência é construída pelo cérebro humano é demasiado complexo para ser resolvido... pelo cérebro humano. O neurocientista português António Damásio — um dos mais brilhantes investigadores do mundo na área do cérebro — não concorda: a prova disso é que tem dedicado a sua vida ao estudo das bases biológicas da consciência e do papel das emoções na consciência, na tomada de decisão ou no sentido moral. Todas elas áreas que, até não há muito tempo, eram consideradas totalmente inacessíveis aos métodos da experimentação no laboratório. Para António Damásio, coisas à partida tão distantes da ciência “dura” como a música ou as artes são na realidade indissociáveis da problemática das bases neurais da consciência: como explicar de outra forma de onde nos vem essa nossa tão natural capacidade de nos emocionarmos com uma peça de Bach, com uma paisagem — ou com o azul do mar? Há muitos anos, António Damásio, hoje com 66 anos, emigrou de Portugal para os EUA — primeiro para o Iowa e mais tarde para a costa oeste, onde hoje dirige com a mulher, Hanna Damásio, o Brain and Creativity Institute, na Universidade da Califórnia do Sul (o nome do instituto é revelador). Na sua passagem por Lisboa, no início deste mês, a Pública falou com ele sobre a teoria da consciência que apresenta no seu último livro, recentemente editado em Portugal — e também de como surgiu a sua paixão pelas neurociências, do dia-a-dia do seu trabalho, do seu gosto pela escrita e de muito mais. O seu eu autobiográfico, para usarmos uma das suas expressões, conta que foi o historiador Joel Serrão, então seu professor, que lhe disse, um pouco inesperadamente, para se dedicar à neurologia. Nesta entrevista diz aos jovens que, para ser cientista, é preciso saber tolerar a solidão intelectual. Ele, que tem sempre o seu “dueto” com Hanna, explica que as ideias da última obra, O Livro da Consciência (Temas e Debates), levaram dez anos a amadurecer.

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Ana Gerschenfeld atua como jornalista na área de ciências no Jornal Público Porto. Para maiores informações: https://www.publico.pt/autor/ana-gerschenfeld


19 Por que é que se dedicou ao estudo do cérebro? Foi por causa de livros que leu ou houve algum professor que o fez apaixonar-se pelo tema? Foi uma combinação de fatores. Um prende-se com o meu interesse pelos mecanismos e com a curiosa transição que me fez passar dos mecanismos dos motores — que eram a minha paixão quando tinha dez anos — para os mecanismos da mente. Não faço ideia nenhuma da maneira de como isso aconteceu, mas sei que a certa altura — devia eu ter à volta de 15 anos — , ainda sem pensar de todo no cérebro, fiquei obcecado pelos mecanismos mentais. E achava que, para abordar essas questões — aí a influência foi com certeza literária —, teria de me tornar escritor ou cineasta. Isso fazia sentido, visto que também tinha uma grande paixão pela literatura e pelo cinema. Mas depois, no liceu — em Portugal —, tive como professor um filósofo chamado Joel Serrão. Era um professor magnífico — ensinava História e Filosofia — e eu de vez em quando conversava com ele. Um

dia, falei-lhe do que queria fazer e disse-lhe que estava a tentar decidir se ia escolher a via literária ou científica no liceu. Ele ouviu-me e respondeu: “O que tu queres ser é neurologista.” “Ah, disse eu, neurologista. E porquê?" "A questão é que vieram daí uma quantidade de textos que ele achou que eu devia ler e, em particular, a recomendação de ler um livro do Egas Moniz. Tudo isto aconteceu, lembro-me muito bem, quando eu tinha 16 anos — e, depois de ter pensado bastante no assunto, decidi que ia para Medicina e que ia ser neurologista. Era a via natural. Foi uma decisão que nunca se alterou. Quando entrei para a faculdade, lembro-me de que as pessoas me diziam: “Não vais nada ser neurologista, vais ser cirurgião plástico.” “Veremos”, respondia eu. E acabei mesmo por me tornar neurologista. Claro que fui ficando cada vez mais contente com a minha escolha, porque de facto correspondia totalmente àquilo que me interessava.

Como trabalha? Como formula as suas hipóteses? É com

base na sua própria investigação, mas também nos resultados dos outros? São precisas as duas coisas. Há resultados que são nossos, obtidos no meu laboratório, e há resultados que são de outros e que motivam novas experiências no meu laboratório. Ou que motivam reflexões. É uma interação extremamente dinâmica. Não há só uma linha de investigação, há muitas, a entrecruzarem-se constantemente.

Quando tem uma ideia ou uma formulação, discuteas com outros? Ou precisa de se fechar no seu gabinete e de pensar sozinho? Geralmente, preciso de ambas as coisas. É raro que haja ideias que não sejam muito rapidamente discutidas com a Hanna [Damásio]. Portanto, logo ali começa um dueto.

O diálogo com a sua mulher Hanna é essencial. Absolutamente. Sobretudo no aspecto experimental, porque eu tenho muito mais capacidade teórica do que experimental e ela


20 tem uma enorme capacidade experimental. Imagina imediatamente as experiências que podem ser feitas, é uma das coisas que gosta imenso de fazer. Portanto, estabelece-se aí imediatamente um

Quais são as coisas de que mais gosta no processo de investigação? E aquelas de que não gosta? As coisas de que não gosto... Os tempos mortos. Por exemplo, quando estamos a começar uma nova experiência. Fazemos a primeira e corre bem, mas a segunda já não corre tão bem. Portanto, é preciso fazer uma terceira. A nossa investigação é uma investigação em seres humanos (que podem ser doentes neurológicos ou não). Por isso, não é uma investigação em que se possa dizer aos participantes para estarem lá quando nos convém. As coisas demoram o seu tempo e há um intervalo entre o momento em que a nossa ideia já é sufi cientemente clara para ser testada e o momento em que finalizamos os testes. Esse é o aspecto menos agradável. Aliás, eu costumo dizer aos estudantes mais novos, que pedem para fazer

diálogo. Também há uma fase de apuramento e, a seguir, organizo uma espécie de workshop, uma série de reuniões de laboratório durante as quais o nosso grupo apresenta as novas ideias para as testar. Eu gosto de convidar as pessoas a uma rotação pelo nosso instituto, que é muito bom ver como se faz investigação, porque, se pensam que querem ser cientistas, têm de ver se são capazes de tolerar os tempos mortos da ciência. Não é todos os dias que há resultados fantásticos. Nem tudo é muito excitante e há dias e dias em que não acontece nada. É preciso ter paciência e conseguir tolerar a sua própria solidão intelectual. Se isso não é possível, não vale a pena tentar ser cientista. E as coisas de que mais gosta? Há alturas em que algo faz clique? Há, sim. Aquilo de que mais gosto é de entrever uma possibilidade — quando, no meio de uma discussão, de repente se tem um momento de compreensão (um haha moment) em que se vê a possibilidade de uma interpretação ou se entrevê aquilo que devemos procurar. Isso é um grande prazer. Um outro prazer enorme é ser capaz de escrever

fazer o shooting down das ideias — agradavelmente, claro, não de forma agressiva. A colocar perguntas para tentarmos avançar.

uma boa interpretação dos resultados. Gosto de escrever e gosto de conseguir explicar bem o que penso. Não é só obter o resultado e plop! O resultado precisa de ser trabalhado e precisa de ser escrito de forma a que também se torne agradável para o leitor. Não há razão nenhuma para que os artigos científicos sejam escritos de forma maçadora, num mau estilo ou numa língua pouco trabalhada. Devem ser tão bem escritos como as peças literárias. Essa é outra fonte de prazer do meu trabalho. Há duas décadas, as neurociências não estudavam nem as emoções nem a consciência, que pareciam estar fora do alcance da biologia. Hoje, ainda há muitos cépticos que continuam a pensar que não é possível abordá-las pelo lado das bases neurais?

Há, mas há menos. Por exemplo, dentro da


21 filosofia, que tradicionalmente era o bastião dos que não acreditavam que se pudesse estudar a mente pela via neural, há hoje em dia muitos jovens que estudam filosofia e que querem estudar neurociência. Tudo isso está a mudar, o que por outro lado também provoca, por parte de alguns filósofos mais tradicionais, uma enorme reação de irritação, porque de certo modo acham que a neurociência compete com a filosofia tradicional. Ficaria espantadíssimo se, após a leitura do meu novo livro, não houvesse alguns filósofos a escrever que tudo isto é horrível, que não faz sentido nenhum estar a abordar a mente através da neurociência, que é superreducionista e que não está verdadeiramente ligado aos problemas centrais. Um argumento, quanto a mim, insustentável. Mas, hoje em dia, há também pessoas que suspeitam ou que temem que tanta biologia, que uma abordagem tão completamente biológica do ser humano, possa de algum modo reduzir a dignidade humana. No meu livro, toco várias vezes nesse problema para dizer que é exatamente o contrário

que acontece. Quanto mais estudamos a biologia, tanto ao nível de uma simples célula como dos tecidos ou dos organismos inteiros, mais espantoso é o que encontramos. Espantoso pela riqueza da organização, pela complexidade, pela forma extraordinária como umas células que nem cérebro possuem antecipam os valores fisiológicos e os sistemas necessários à regulação da vida. É verdadeiramente extraordinário e a única coisa que nos deve causar é espanto. Por isso, não vejo em que é que a abordagem biológica diminui a dignidade humana, antes pelo contrário. Acho que, quando percebemos a beleza dessa vida nos pormenores mais pequenos e também no grande alcance dos grandes sistemas, passamos a ter muito mais respeito por aquilo que é a vida. Mas há aí um problema e de certeza que vamos ver pessoas, como acontece de cada vez que são publicados livros deste tipo que penetram um pouco mais no grande público, que acham que pode ser uma terrível ameaça para o ser humano. Não é.

Qual é o derradeiro objetivo das suas

pesquisas? Penso que não há um derradeiro objetivo. Há uma tentativa, sempre renovada, de esclarecer problemas e, no fundo, os problemas que me interessam são sempre os mesmos. O problema de como as emoções funcionam, de como os sentimentos se estabelecem. Isso prende-se com uma outra grande questão: como é que nasce a menc te, como é que nasce o eu e como é que se constrói a mente consciente.

Em que consiste a teoria da construção da consciência humana que apresentou agora em O Livro da Consciência, editado há poucas semanas em Portugal? Em matéria de conceitos, a minha visão da construção da consciência tem muitas semelhanças com aquilo que já escrevi anteriormente [nomeadamente, em O Sentimento de Si]: há um “proto-eu”, não consciente, que surge ao nível do tronco cerebral, um “eu nuclear” e um eu autobiográfico (ver nestas páginas “Os patamares da consciência”). A esse


22 nível, as ideias são exatamente as mesmas que já expus há uma dezena de anos. Mas os mecanismos que proponho agora são diferentes.

A consciência aparece a que nível? Aparece quando aparece o eu nuclear e depois oscila constantemente entre o eu nuclear e o eu autobiográfico. Neste momento, ambos temos um eu nuclear a funcionar e o nosso eu autobiográfico está em pano de fundo. Mas quando foi preciso — por exemplo, quando me perguntou por que é que me dediquei ao estudo do cérebro, o meu eu autobiográfico funcionou completamente e fui buscar uma série de imagens que têm a ver com a minha vida entre os 10 e os 16 anos. A seguir, o meu eu autobiográfico regressou aos bastidores e aquilo que conta agora é o eu nuclear, são todos estes conteúdos com que eu estou a jogar neste momento para responder à sua última pergunta. Mas, antes de se tornar consciente, como é que nasce a mente? A criação da mente propriamente dita reside na capacidade que o

cérebro tem de criar mapas neurais que vão dar origem a imagens. A ideia não é nova: vários colegas a têm abordado. Gerald Edelman [conhecido neurocientista norteamericano], por exemplo, é muito claro sobre a necessidade de existirem mapas neurais no cérebro. É dessa capacidade de gerar mapas neurais que surgem os conteúdos principais da mente: as imagens visuais, auditivas, olfativas, tácteis — e, o que é muito importante, as imagens que nos vêm do nosso próprio corpo. Estas imagens, estes sentimentos básicos que temos do nosso próprio corpo — e que eu chamo agora sentimentos primordiais — vão depois ajudar a construir o eu. As imagens do nosso próprio corpo são sentimentos? Sim, só que os mapas do corpo são diferentes dos mapas do mundo exterior. De facto, se há algo de novo no meu último livro — algo que penso há muito tempo, mas que só agora consegui finalmente verbalizar numa forma que me agrada —, consiste em dizer que as imagens do corpo são imagens de uma

natureza diferente das imagens do exterior. Porquê? Porque são imagens que começam a ser geradas ao nível do tronco cerebral, numa região do cérebro que está naquilo que eu descrevo no livro como uma união, uma fusão praticamente completa com o corpo. E o que isso vai permitir do ponto de vista teórico — e também prático, julgo eu — é fazer com que essas imagens não sejam só imagens cognitivas, divorciadas do seu objeto, mas sim imagens ligadas ao seu objeto, que é o corpo. Ou seja, imagens sentidas. Ora isso prende-se com um problema absolutamente central, que inúmeros filósofos e neurocientistas têm enfrentado. É o problema dos qualia — a dificuldade de explicar que nós não só temos imagens, mas que também sentimos essas imagens. Quando olhamos para o mar, não vemos apenas o azul do mar, sentimos que estamos a viver esse momento de percepção. Muitas pessoas têm dito que isto é impossível de compreender, que é algo que está fora do campo das neurociências. Mas eu acho que existe a possibilidade de que o modelo que acabei de descrever resolva o problema dos qualia. É


23 óptimo vislumbrar a possibilidade de ligar coerentemente os sentimentos e a consciência. Por exemplo, neste momento, você tem uma imagem de mim, que está a construir a nível visual, mas também a nível auditivo. Mas há também uma outra imagem que surge ao mesmo tempo na sua mente: a imagem do seu próprio organismo, que está a ser gerada automaticamente no seu tronco cerebral e representada na sua ínsula [uma região do córtex cerebral]. Ora, essa imagem é uma imagem que, por estar ligada a si, está ao mesmo tempo a produzir um mapa que é sentimento. E é aí que me parece que está o grande segredo de criar uma consciência sentida e não uma consciência de autómato.

Disse que os mecanismos cerebrais que propõe agora para a emergência da consciência são diferentes... Sim. Há uma dezena de anos, julgava que o mecanismo com que se constrói o eu nuclear requeria a participação do córtex cerebral [a parte mais evoluída do cérebro, que desempenha as funções

cognitivas]. Agora, penso que o tronco cerebral consegue perfeitamente fazer isso sozinho. Isso não quer dizer que o córtex cerebral tenha ido para as urtigas. Continua a haver uma interação entre o córtex cerebral e o tronco cerebral. Mas a visão de um córtex cerebral a fazer tudo parece-me extraordinariamente errada. Não posso dizer que alguma vez tenha acreditado completamente nisso, mas embora tenha tido sempre a suspeita de que havia coisas muito importantes para estudar no tronco cerebral, parecia-me sempre que o processo podia ser explicado quase completamente ao nível do córtex. Contudo, já no ano 2000, lembro-me de ter escrito um trabalho que apresentámos na Nature e no qual transparecia cada vez mais que o subcórtex tinha de ter um grande papel. No fundo, demorou dez anos a amadurecer essas ideias e a ter novos dados. Quanto ao eu autobiográfico, sempre pensei que dependia sobretudo do córtex cerebral e continuo a pensá-lo, mas hoje acho que depende sobretudo de uma região muito particular do córtex — o

córtex posteromedial ou PMC — e de uma interação, que agora me parece vislumbrar, entre o córtex e o tronco cerebral. Isto é muito diferente de aquilo que eu tinha proposto há uma dezena de anos.

Quando fala em subcórtex, trata-se de que estruturas? Do tronco cerebral e do tálamo. O tálamo, tal como o apresento no meu livro, é um sistema intermédio, porque para chegar do tronco cerebral ao córtex cerebral é preciso passar pelo tálamo. O córtex cerebral tem maneira de chegar ao tronco cerebral sem necessariamente utilizar o tálamo, mas nas vias ascendentes o tronco cerebral tem de comunicar muito através do tálamo.

O PMC já faz parte do córtex. Sim, mas de um córtex mais antigo, que recebe mensagens do tronco cerebral. No fundo, temos a produção de sentimentos primordiais, depois a produção do que eu chamo “sentimentos de saber” e depois, a certo ponto, quando já há uma enorme quantidade de


24 conteúdos relativos, por exemplo, à nossa biografia, é necessário coordenar esses conteúdos — coordenar a maneira como eles são apresentados à maquinaria dos sentimentos para que possam ser beneficiados por um sentimento que os distinga. O que é extraordinariamente importante. O PMC é precisamente um agregado de regiões que estão organizadas de tal maneira que têm a capacidade de muito rapidamente chegar a um grande número de sítios do cérebro e reevocar as imagens que nos vão permitir aceder rapidamente à nossa autobiografia. Desempenha um papel de grande coordenador. Há uma quantidade de novos dados sobre o PMC e, de facto, as coisas começam a encaixar bem.

Também inclui no seu modelo uma estrutura chamada ínsula. Ela também faz parte do córtex? Também. A ínsula é um córtex com uma parte antiga e uma parte mais moderna e permite repetir com maior pormenor aquilo que já está no tronco cerebral em matéria de sentimentos. Aliás, aí é que reside outra grande

diferença na minha visão das coisas: na visão mais tradicional, os sinais sobre o corpo juntam-se no tronco cerebral e são depois relançados sobre a ínsula — e é na ínsula que aparece a plataforma dos sentimentos. Na minha visão atual, os sinais estão no tronco cerebral. O tronco cerebral faz os seus primeiros mapas — que são muito simples —, transforma esses sinais e inicia o sentimento. Depois, envia todos esses sinais para a ínsula, onde os mapas são completados e onde existe a possibilidade de os relacionar com os objetos que inicialmente desencadearam o processo — e que podem ser visuais, auditivos, etc. Por exemplo, se você ouvir uma grande peça de Bach, desencadeia-se um processo auditivo. Esse processo auditivo vai provocar uma série de emoções e de sentimentos; as transformações ligadas às emoções e aos sentimentos vão aparecer mapeadas primeiro pelo tronco cerebral; depois, o tronco cerebral vai transferi-los para o córtex, onde se irão ligar ao iniciador de todo o processo, que foi a audição da peça musical do sr. Bach. Esta visão não exclui nenhum

sistema, mas enriquece a maquinaria cerebral que fornece dados ao córtex.

Há quem diga que nunca se vai conseguir saber exatamente como é que cérebro humano gera a consciência. Acha que o problema se pode de facto revelar demasiado complexo? É perfeitamente possível, mas é de facto provável que continuemos a progredir. Se olharmos para dez anos atrás, ou 20, ou 50, a verdade é que não se sabia então uma grande parte do que se sabe hoje. Praticamente toda a marcha da ciência tem desmentido os velhos do Restelo que não acreditavam que se pudesse descobrir coisa nenhuma. Tem havido uma constante negação desse princípio. Penso que as pessoas que apostam que não vamos conseguir se arriscam a perder a aposta. Dito isso, não quer dizer que eu tenha qualquer certeza de que todos os mistérios do Universo serão revelados. É bem possível que seja difícil ultrapassar certos muros do mistério da consciência — mas, até agora, isso não aconteceu. Todos os


25 anos fazemos o mistério recuar um bocadinho. É por isso que devemos continuar a tentar. O que é que vai ser preciso mostrar para confirmar a sua teoria da consciência? O que é que está pela frente? Temos de pensar no imediato. Temos de pensar em técnicas — no caso dos seres humanos, em técnicas de imagem funcional e algumas de imagens estruturais — que nos permitam confirmar passo a passo algumas das coisas que no quadro teórico atual ainda são hipotéticas. Depois, vamos ter de fazer experiências em animais de várias espécies, incluindo com certeza primatas não humanos. Certas técnicas de imagem têmse revelado extraordinariamente poderosas e surgem constantemente pequenas modificações de software que nos vão permitir chegar a resultados mais fortes. Acha que a Internet e a maneira como as pessoas — e principalmente as crianças — interagem hoje com os computadores podem estar a alterar o

cérebro humano? De que maneira?

pensamentos? De variadíssimas formas. Não há dúvida de que a rapidez de processamento cognitivo está a aumentar sob o efeito do multitasking e do bombardeamento de sinais, em geral visuais. Isto influi sobre a atenção e seria improvável que não levasse a uma modificação da forma como o nosso cérebro funciona e como concebemos o mundo. Mas claro que isto é pura especulação. Isso vai de alguma forma alterar a nossa consciência? Não... Vai alterar a superfície dessa consciência, vai alterar a velocidade com que as coisas funcionam. Graças a técnicas de imagem, conseguiu-se recentemente distinguir certos conceitos no momento em que se formam no cérebro de uma pessoa (uma planta vs. um rosto, por exemplo). Isso parece assustador quando se pensa que os militares, a polícia e até os especialistas de publicidade ou de marketing gostariam todos de poder entrar na nossa cabeça. Vai ser possível um dia alguém “ler” os nossos

Eu não ficaria extraordinariamente preocupado, porque existem limitações muito grandes. Uma coisa é ser capaz, num trabalho experimental, cuidadoso, demorado, de concluir que é mais provável que uma pessoa esteja a pensar nos pijamas do gato do que no gato propriamente dito. Mas daí a ter qualquer espécie de certeza num teste que fosse feito com exatamente essas mesmas técnicas na população geral é um grande passo. Estamos a falar em coisas curiosas, mas que têm muito a ver com probabilidades de ser uma coisa ou a outra. Mas eu tenho a impressão de que os militares e a polícia não querem jogar com probabilidades, querem ter certezas. O que seria aterrador é que não se percebesse aquilo que as técnicas permitem e se confundissem probabilidades com certezas. Aí, claro, teríamos um mundo perfeitamente kafkiano ou pior. É preciso que as pessoas percebam isso. Texto disponível em: https://www.publico.pt/cien cia/noticia/antoniodamasio-o-neurocientistapoe-a-mao-na-consciencia1461526.


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Phineas Gage era um funcionário dos caminhos-de-ferro americanos que viveu no século XIX. Em 1848, quando tinha 25 anos, teve um acidente que acabou por o tornar famoso: ao colocar explosivos para abrir caminho numa rocha, provocou uma explosão. A barra de ferro usada para empurrar os explosivos atravessa a cabeça, penetra o queixo, arranca-lhe o olho esquerdo e sai pela parte superior do crânio. Assistido num hospital, recupera acabando por viver 12 anos. Para além das crises de epilepsia esporádicas, manteve as suas funções motoras bem como as capacidades intelectuais. Apesar das suas funções intelectuais se manterem intactas, o acidente provocou alterações na sua personalidade. Aquele que era um homem pacífico trabalh ador e educado passou a ser um homem colérico, instável e mal-educado. Desta forma acabou por perder o emprego e tornou-se numa atração circense. A barra de ferro acompanhouo por toda a sua vida e foi enterrada com ele. O seu cérebro foi conservado no Mus eu da Escola Médica de Harvard e posteriormente tornou-se objetivo de estudo por parte de dois investigadores portugueses Hanna e António Damásio. Como vimos na triste história de Gage o acidente não afetou as suas funções intelectuais mas afetou outro tipo de funções superiores que distinguem dos seres humanos dos outros animais, com a reflexão, a decisão, a consciência, a imaginação, entre outras. Gage era incapaz de tomar decisões, o que à partida nos parece simples para quem é tutor das suas capacidades intelectuais. Damásio nas suas investigações concluiu que as áreas pré-fontais (área afetada no cérebro de Gage) envolvem complexas relações com as emoções. As relações entre o córtex pré-frontal e as emoções dão-se nos dois sentidos: o córtex apoia-se nas informações emocionais para tomar decisões e tem também um papel inibidor das emoções (controla os impulsos). A ruptura entre o centro emocional e o córtex pré-frontal pode levar à indiferença afetiva. No caso de Gage acontece o contrário, como a área afetada foi o córtex pré-frontal não há controlo das emoções o que o levou a ter comportamentos impulsivos e descontrolado. 5

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Disponível em: http://psicob.blogspot.com.br/2008/04/phineas-gage.html



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DISCIPLINA


Professores


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Profª. Drª Márcia Denise Pletsch É doutora em Educação, com mestrado em Educação e especialização em Altas Habilidades pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Graduada em Educação Especial, com Habilitação em Deficiência Mental, pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Professora adjunta do Instituto Multidisciplinar e do Programa de PósGraduação em Educação, Contextos Contemporâneos e Demandas Populares da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Coordena o Grupo de Pesquisa Observatório de Educação Especial e inclusão escolar: práticas curriculares e processos de ensino e aprendizagem (PPGEduc/UFRRJ) e, por meio de convênio interinstitucional entre a UFRRJ e a UERJ, também é pesquisadora do grupo de pesquisa Inclusão e aprendizagem de alunos com necessidades educacionais especiais: práticas pedagógicas, cultura escolar e aspectos psicossociais (UERJ/PROPED). Com financiamento do Programa Observatório da Educação/CAPES, coordena o projeto de pesquisa em rede sobre deficiência intelectual com os Programas de PósGraduação em Educação da UFRRJ, da UDESC e da Univali, abrangendo 11 redes de ensino. Com financiamento do CNPq e do Programa Jovem Cientista do Nosso Estado da FAPERJ, coordena projeto de pesquisa na área de múltipla deficiência. Atualmente, é vice-diretora do Instituto Multidisciplinar - Campus da UFRRJ de Nova Iguaçu (desde 2013).

Participa de projetos de extensão sobre desenvolvimento regional da Baixada Fluminense financiado pelo PROEXT/MEC. Atua como Vice Presidente do Fórum Permanente de Educação Especial da Baixada Fluminense, que integra pesquisadores do Instituto Multidisciplinar (UFRRJ), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) - Campus de Duque de Caxias e os gestores da área de Educação Especial na Baixada Fluminense/RJ. Seus principais temas de investigação incluem educação especial, políticas de educação inclusiva, escolarização de pessoas com deficiência, processos de ensino e aprendizagem de pessoas com deficiência intelectual e múltipla, práticas curriculares e formação de professores.

Prof. Dr. Marcelo Bairral

Licenciado (1990) e especialista (1992) em Matemática pela Universidade Federal Fluminense, mestre em Educação Matemática pela Universidade Santa Úrsula (1996), doutor em Educação Matemática pela Universidade de Barcelona (2002) e pós-doutor em Educação Matemática pela Universidade do Estado de Nova Jersey (EUA, 2007) e pela Universidade de Turin (Itália, 2012). É professor associado III da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Preside o Gepem desde 2003 e é o editor responsável do Boletim Gepem. É idealizador e coordenador da Série InovaComTic da Editora da UFRRJ. Foi


31 coordenador e atua como docente do Programa de Pós-Graduação em Educação, Contextos Contemporâneos e Demandas Populares (PPGEduc/UFRRJ). É também professor do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática (PPGEduCIMAT/UFRRJ). Atua em educação matemática nos seguintes temas: interações em ambientes virtuais, inovação tecnológica e formação de professores, aprendizagem matemática em dispositivos touchscreen, inovações curriculares em geometria. Foi coordenador do GT19 (Educação Matemática) da ANPEd e membro da coordenação do GT6 (Ed. Matemática: Novas Tecnologias e EaD) da SBEM. Em julho de 2013 passou a integrar a Comissão internacional para melhoria do ensino e da aprendizagem de matemática (CIEAEM).


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Está na hora de colocar Elsa e Anna de lado e voltar os olhos para Divertida Mente. O novo filme da Pixar, já aclamado pelas críticas e profissionais da saúde, mostra um grande estudo sobre a neurociência de forma animada e simples para qualquer pessoa conseguir entender, inclusive crianças. Para começar vamos deixar bem claro que não foi um filme que demorou um ano para ser feito, e sim, cinco anos. Cinco anos de pesquisa, de construção e desconstrução da mente humana, de produção, animação, e finalização. Antes de tudo, não sou nenhum tipo de neurocientista ou algo assim, apenas gosto do assunto, e achei interessante passar essa informação para vocês. A minha ideia aqui é desconstruir o filme de forma que todos possam entender de onde saiu tudo aquilo que vimos e as mensagens presentes no longa-metragem. Para isso, vamos começar pelo básico, o que são emoções e como elas funcionam em nosso cérebro? Emoções são as reações do nosso corpo em relação a alguma experiência, a alguma mudança dentro da gente ou até mesmo no ambiente que estamos (ou até mesmo a combinação dessas duas mudanças). De acordo com diversos neurocientistas, temos quatro emoções primárias que são a Alegria, relacionada a momentos que o corpo experimenta felicidade; a Tristeza, quando o corpo experimenta situações mais sensíveis como a perda, um trauma, solidão; a Raiva, quando o corpo se exalta diante de algo que a pessoa não concorda; e o Medo, que é um sentimento que serve para nos proteger. As outras emoções são combinações dessas primárias, como é mostrado no filme com a personagem Nojinho. Nossas emoções servem para nos motivar a seguir diferentes caminhos ao longo de nossa vida e, principalmente, moldam nossa personalidade. Todos nós sentimos todas as emoções que passam na mente da jovem Riley, porém, se observamos possuímos uma emoção que se destaca mais, como é o caso da Alegria na mente de Riley, a Tristeza na mente de sua mãe e Raiva na mente de seu pai. Explicado o que é uma emoção, vamos para seu funcionamento no cérebro. Nossas emoções são controladas pelo sistema límbico de nosso cérebro, lá é onde emoções, motivações, memórias, comportamento e aprendizagem são controlados. O cérebro humano é feito para reconhecer uma ameaça ou uma recompensa e, quando o faz, mensagens químicas são liberadas através do sistema límbico para o nosso corpo, o que resulta no sentimento de alguma emoção. Algumas de nossas reações ocorrem antes mesmo de pensarmos sobre o assunto, o que influencia todo o resto do nosso pensamento, por exemplo, quando estamos em uma situação recompensadora, liberamos hormônios como serotonina, oxitocina, dopamina e endorfina; ou quando nos sentimos ameaçados, liberamos hormônios de estresse como o cortisol e adrenalina assim como o nosso pensamento pode influenciar nossas emoções.


33 Bom, até aqui já podemos dizer que o filme se passa no sistema límbico da Riley, mas o que são aquelas bolas? A princípio, elas parecem ser meras lembranças, porém ao fim do dia, elas são enviadas para memórias de longo prazo, portanto, não são memórias comuns. De acordo com a neurociência, memórias de longo prazo são memórias de curto prazo que sofrem um processo de consolidação, ensaio ou associação significativa, como por exemplo, a música do comercial de chiclete que, assistido diversas vezes, foi armazenada lá. Toda memória que aparece na animação reforça uma atitude, uma informação ou aspectos de sua personalidade. No caso daquelas células (os metalúrgicos) que vemos selecionando determinadas memórias para que Riley as esqueça, está relacionado ao processo de esquecimento, quando as memórias de longo prazo têm suas conexões sinápticas enfraquecidas ou uma nova memória se sobrepõe, como é a justificativa colocada no filme, “Ela não precisa lembrar de números de telefones, ela tem tudo anotado no celular!”. Logo depois, temos a Ilha da Imaginação e a Produções de Sonhos. Nessa parte, falamos das mesmas áreas do cérebro. Quando falamos de imaginação, juntamos tudo aquilo que já vimos uma vez na vida e construímos algo novo. Ao ativarmos nossa imaginação, diversas áreas do nosso cérebro entram em atividade para que possamos criar essa nova imagem e ideia, por isso, não há como dizer exatamente onde a Ilha da Imaginação e a Produção de Sonhos estão localizadas, porque ambas as “funções” ativam diferentes áreas de nosso cérebro. Depois de tudo isso, surgem algumas dúvidas quanto à mensagem transmitida. Muitos pensam que Divertida Mente trabalha com a depressão, outros pensam que é a aceitação da tristeza. Como não temos a confirmação de

nenhuma das duas hipóteses pelo diretor, trabalharemos com essas duas ideias. Quanto à ideia de depressão, é plausível, pois a doença está relacionada a diminuição de dopamina e serotonina liberado através das sinapses nervosas, traduzindo isso, seria quando a Alegria e a Tristeza são transportadas as memórias de longo prazo. Nesse momento, não existe uma emoção no controle e todas aquelas presentes estão relacionadas ao hormônio de estresse. Nojinho, Raiva e Medo não sabem como controlarem Riley de uma forma mais feliz ou centrada, portanto, a personagem passa a ficar introvertida, tímida e até mesmo insegura. Já a outra mensagem seria sobre a aceitação da Tristeza na vida da pessoa. Convenhamos que não existe fórmula mágica ou Hakuna Matata que faça com que vivamos uma vida só com boas emoções e alegrias, até porque isso não é saudável. No longa-metragem, isso é claramente mostrado em diversas situações, especialmente naquelas em que momentos de Alegria foram formados a partir de um momento triste. É importante sabermos respeitar e saber sentir essa Tristeza que, ao longo do tempo se torna em compreensão, assim como é mostrado pela Tristeza sentando ao lado Bing Bong, logo após perder seu carrinho. Experiências resultam em novas emoções que, consequentemente, resultam em novos aprendizados e compreensão sobre nós mesmos o que nos faz evoluir e desenvolver emocionalmente. Crescer pode ser uma jornada turbulenta, e com Riley não é diferente. Ela é retirada de sua vida no meio-oeste americano quando seu pai arruma um novo emprego em São Francisco. Como todos nós, Riley é guiada pelas emoções – Alegria, Medo, Raiva, Nojinho e Tristeza. As emoções vivem no centro de controle dentro da mente de Riley, onde a ajudam com conselhos em sua vida cotidiana. Conforme Riley e suas


34 emoções se esforçam para se adaptar à nova vida em São Francisco, começa importante emoção de Riley, tente se manter positiva, as emoções entram em conflito sobre qual a melhor maneira de viver em uma nova cidade, casa e escola.

uma agitação no centro de controle. Embora Alegria, a principal e mais CATARINA DÉA É editora do site D'o Camundongo Disponível em: http://www.ocamundongo.com.br/dive rtida-mente-neurociencia/




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