Universidade Federal de Ouro Preto
A OPERAÇÃO URBANA CONSORCIADA ANTÔNIO CARLOS + LESTE/OESTE: uma cartografia da atuação dos arquitetos e urbanistas
Janaina Souza Carneiro
Ouro Preto 2018
Janaina Souza Carneiro
A OPERAÇÃO URBANA CONSORCIADA ANTÔNIO CARLOS + LESTE/OESTE: uma cartografia da atuação dos arquitetos e urbanistas
Monografia apresentada ao Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Ouro Preto como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo.
Orientadora: Prof. Dra. Karine Gonçalves Carneiro
Ouro Preto, 26 de janeiro de 2018
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RESUMO
Entender a atuação do arquiteto e urbanista dentro do planejamento urbano da forma como essa acontece no campo de trabalho, que está muito além do que é ensinado na academia é o tema deste trabalho final de graduação. Para tal, será usado o método cartográfico proposto por Deleuze e Guattari a partir de um recorte que permite avaliar uma situação real, neste caso, a Operação Urbana Consorciada Antônio Carlos + Leste/Oeste, da cidade de Belo Horizonte. Pretende-se aqui cartografar os atores envolvidos nessa operação urbana consorciada, com foco nos arquitetos e urbanistas, e assim entender os vários lugares de fala e atuação possíveis para o profissional.
Palavras-chave: operação urbana consorciada, direito à cidade, atuação, arquiteto e urbanista.
ABSTRACT
Understanding the role of the architect and urban planner within the urban planning as it really happens in the field of work, which is beyond what is taught in the academia, is the subject of this final undergraduate’s thesis. For this, the cartographic method proposed by Deluze and Guattari will be used, staring from a clipping that allows the evaluation of a realistic situation, which is in this case, the Antônio Carlos + East/West Joint Urban Operation, from the city of Belo Horizonte. It is intended to map the actors involved in this joint operation, focusing on architects and urban planners, and thus understand the possible places of speech and action for the professional.
Keywords: joint urban operation, right to the city, acting, architect and urban planner.
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LISTA DE SIGLAS
BH: Belo Horizonte CDURP: Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto CEPAC: Certificado de Potencial Adicional de Construção CF: Constituição Federal CMPU: Conferência Municipal de Política Urbana COMPUR: Conselho Municipal de Política Urbana CPTM: Companhia Paulista de Trens Metropolitanos EAD-UFMG: Escola de Arquitetura e Design da UFMG EC: estatuto da cidade EIV: estudo de impacto de vizinhança FAMERJ: Federação das Associações de Moradores do Rio de Janeiro FGTS: Fundo de Garantia por Tempo de Serviço FMH: Fundo Municipal de Habitação FNRU: Fórum Nacional pela Reforma Urbana FUNCEF: Fundação dos Economiários Federais GPUR: Gerência de Planejamento Urbano HIS: habitação de interesse social IAB: Instituto de Arquitetos do Brasil IBASE: Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas JK: Juscelino Kubitschek MNRU: Movimento Nacional pela Reforma Urbana MPMG: Ministério Público de Minas Gerais ONG: organização não-governamental
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OUC: operação urbana consorciada OUC-ACLO: Operação Urbana Consorciada Antônio Carlos + Leste/Oeste PD: plano diretor PPP: parceria público-privada SEDE: Secretaria Extraordinária de Desenvolvimento TFG: trabalho final de graduação UFMG: Universidade Federal de Minas Gerais
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SUMÁRIO 1.
INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 6
2.
HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO URBANA NO BRASIL ...................................... 9
3.
CASOS DE OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO BRASIL ........... 15
3.1.
OPERAÇÃO URBANA CONSORCIADA FARIA LIMA ................................... 15
3.2.
PORTO MARAVILHA ..................................................................................... 22
4.
HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO URBANA DE BELO HORIZONTE E AS
OPERAÇÕES URBANAS......................................................................................... 28 4.1. 5.
AS OPERAÇÕES URBANAS NA LEGISLAÇÃO DE BELO HORIZONTE ..... 32 A OPERAÇÃO URBANA CONSORCIADA ANTONIO CARLOS +
LESTE/OESTE E SEUS ANTECEDENTES ............................................................. 39 5.1.
NOVA BH ....................................................................................................... 39
5.2.
OUC-ACLO ..................................................................................................... 41
6.
ANÁLISE DA OPERAÇÃO URBANA CONSORCIADA ANTONIO CARLOS +
LESTE/OESTE.......................................................................................................... 43 6.1.
A OUC-ACLO NO ÂMBITO DA CARTOGRAFIA ........................................... 46
6.1.1.
PESQUISA DE CAMPO .......................................................................... 47
6.1.2.
O DESENHO CARTOGRÁFICO ............................................................. 60
7.
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 64
8.
REFERENCIA BIBLIOGRÁFICA ...................................................................... 65
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1. INTRODUÇÃO
A produção do espaço das cidades contemporâneas, principalmente aquelas consideradas de grande porte, tem sofrido a interferência cada vez mais constante de empresas e investidores privados através de suas ações e apropriações dos instrumentos de política urbana. Estas últimas, por sua vez, criaram condições – de modo deliberado ou não – que formalizam e institucionalizam tal atuação e avanço do capital. Esse fato configura a presença neoliberal na lógica de gestão das cidades e torna visível as disputas ocorridas na assimilação e implementação de tais instrumentos da legislação urbana brasileira. Ele também aponta para a necessidade de compreensão desse fenômeno no âmbito da arquitetura e do urbanismo. Dessa forma, este trabalho tem como objetivo se debruçar sobre um desses instrumentos previstos no Estatuto da Cidade (EC) (2001), a saber, as Operações Urbanas Consorciadas (OUCs). Mais especificamente, o intuito é o de cartografar os atores específicos de um determinado campo, a saber, os arquitetos e urbanistas, que participaram e participam, assim como suas interrelações, nos processos relacionados às OUCs na cidade de Belo Horizonte/MG. Sabendo que as OUCs, em Belo Horizonte, vêm sendo discutidas já há algum tempo e levando em consideração o tempo hábil do Trabalho Final de Graduação para o desenvolvimento desta pesquisa, os estudos foram centrados, especificamente, naquela OUC que está em discussão para possível implementação na cidade, a saber, a Operação Urbana Consorciada Antônio Carlos + Leste/Oeste (OUC-ACLO). Tal fato, entretanto, não exclui o estudo necessário de operações urbanas que a antecederam – tanto consorciadas como simplificadas. A importância desse estudo justifica-se por uma certa disparidade entre as finalidades teóricas e práticas do uso dos instrumentos de política urbana já que no âmbito da Constituição Federal (CF), de 1988, definições importantes foram incorporadas, no capítulo que trata das políticas urbanas, no sentido de evitar a especulação imobiliária e garantir a participação popular aos processos de produção dos espaços da cidade. Nesse sentido, tendo em vista a importância do arquiteto e urbanista como articulador entre teorias e a prática do planejamento urbano, é de grande interesse verificar os vários posicionamentos que esse profissional do espaço assu-
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me. Ainda, tendo em vista o caráter generalista da formação do arquiteto e urbanista, seus modos de atuação nessas dinâmicas não são únicos, podendo ter diversos graus de envolvimento, participação e posicionamento frente a essa questão. Para alcançar o objetivo proposto, a metodologia a ser utilizada estará centrada no método cartográfico – que será explicitado mais adiante – no intuito de verificar as formas como os distintos atores, de um modo geral, e os arquitetos e urbanistas, de modo mais específico, estão presentes e atuantes no processo de criação e implementação das OUCs em Belo Horizonte. Assim, foram realizados, no escopo da aplicação do método cartográfico, levantamento, leituras e análise da legislação pertinente, pesquisa bibliográfica relacionada ao tema, estudos análogos e conversas com arquitetos e urbanistas envolvidos nessa questão em esferas distintas – órgãos públicos do município, movimentos sociais, escritórios de arquitetura e urbanismo, empresas e academia. O método cartográfico está aqui apoiado nas leituras realizadas de textos, artigos e livros que têm como ponto de partida as teorias de Deleuze e Guattari (1995). Dentre elas destacam-se Roberta Romagnoli (2009) e os grupo Iconoclasistas, e Indisciplinar da Escola de Arquitetura, Urbanismo e Design da Universidade Federal de Minas Gerais (EAD-UFMG). Tanto numa perspectiva teórica quanto prática tais pesquisadores buscam romper a cisão entre pesquisador e objeto de pesquisa ao compreender que a cartografia ocorre num ambiente de imersão que provoca transformação social a partir de posicionamentos políticos, éticos e estéticos (ROMAGNOLI, 1995). Desse modo, produtos e problemas são levantados durante o processo cartográfico e o intuito é o de dar visibilidade a discursos e narrativas, em grande medida, invisibilizados pelas posturas e posições hegemônicas e dominantes. A abordagem teórica passará por discussões mais abrangentes que buscam compreender a influência do cenário neoliberal na produção dos espaços da cidade e, para isso, os estudos serão baseados em David Harvey. No âmbito das discussões sobre a legislação urbana brasileira e, de modo mais específico, das OUCs, Raquel Rolnik e Mariana Fix serão, respectivamente, referências de importância. Para desenvolver o trabalho, além dos capítulos introdutório e conclusivo, a monografia estará estruturada nos capítulos descritos a seguir. No segundo capítulo será abordada a legislação urbana brasileira através de um histórico, com ênfase
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nas operações urbanas consorciadas, entendendo seu processo de criação e contexto de aplicação. O intuito deste capítulo é entender a utilização de tal instrumento em relação à sua fundamentação e uso prático. No capítulo três serão apresentados alguns casos de operações urbanas consorciadas no Brasil, como forma de análise e estudo de situações análogas para que seja possível visualizar sua aplicação em outras realidades nacionais e entender, quando analisado o objeto de estudo desse trabalho, o que é comum da aplicação do instrumento e o que se forma como peculiaridade do contexto de Belo Horizonte. O quarto capítulo pretende, a partir do histórico da legislação urbana e operações urbanas em Belo Horizonte, entender a inserção prática do instrumento no contexto específico da cidade, a partir, principalmente, da Operação Urbana Consorciada OUC-ACLO com o objetivo de perceber como ela se conformou e seus desdobramentos até o presente momento já que ainda não foi instituída. A partir das informações coletadas na primeira fase deste trabalho e das conversas com arquitetos e urbanistas que tiveram relação com a OUC-ACLO, ou ainda com a Nova BH – OUC não implementada por razões que descreveremos ao longo do trabalho e que antecedeu a OUC-ACLO –, o quinto capítulo traz os estudos referentes à Operação Urbana Consorciada OUC-ACLO e a compilação das informações levantadas e seus resultados na forma de cartografia. É importante destacar que o fio temático que deram direcionamento às conversas com os arquitetos e urbanistas foi a relação de suas atuações profissionais com a OUC e com outros arquitetos com ela também envolvidos.
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2. HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO URBANA NO BRASIL
Para compreender como as OUCs se inserem no contexto nacional devemos analisa-las no âmbito mais ampliado das legislações de caráter urbanístico no Brasil. Por isso, a necessidade de um percurso histórico que contemple tal aspecto e que ressalte, de um modo geral, os instrumentos de política urbana ao longo do tempo. Entretanto, por sabermos que não haveria tempo hábil, em função dos objetivos deste trabalho e do tempo de sua execução, iniciaremos esta tarefa num momento em que grandes cidades brasileiras passam a expandir em função da industrialização. Nos anos 1950, Juscelino Kubitschek, presidente do Brasil, instaura uma política desenvolvimentista, criando um plano de metas para o crescimento do país dividido em seis grupos: transporte, energia, alimentação, indústria de base, educação e a criação de Brasília. A industrialização acelerada e a criação de equipamentos e infraestrutura urbana provocam o crescimento das cidades e o êxodo rural. Esse plano foi viabilizado através de recursos públicos aliados a investimentos privados – parte destes com capital estrangeiro – e com a chegada de empresas internacionais, como a Volkswagen, em 1959 – que exemplifica também este momento altamente vinculado a medidas que incentivaram políticas e ações rodoviaristas (DUARTE, 2016). Esse crescimento rápido aprofundou os problemas relacionados à falta de moradia e à baixa qualidade de vida dos habitantes, o que trouxe à tona a necessidade de se discutir o planejamento urbano de modo mais sistemático. Em virtude dessa situação, no governo de João Goulart, o tema da Reforma Urbana mostrou-se de relevância em um Seminário realizado pelos Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE), em 1963, em Petrópolis (VALADÃO, 2016). Entretanto, durante a ditadura militar tais discussões saíram da agenda do governo, voltando à tona no final do período autoritário, nos anos 1970 e 1980. Neste momento, as pautas democráticas ressurgiram. Dessas investidas é que surgiu o Movimento Nacional pela Reforma Urbana (MNRU), que tinha como objetivo fomentar os debates sobre a reforma urbana no país. O MNRU uniu forças com o IAB, sindicatos, Movimento de Defesa dos Favelados, Federação das Associações de Mo-
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radores do Rio de Janeiro (FAMERJ) e uma série de organizações nãogovernamentais (ONGs) que levou ao seu fortalecimento e o colocou numa posição de extrema importância durante a discussão do processo constituinte durante o governo do presidente José Sarney (AVRITZER, 2010). Não há dúvidas de que a atuação do MNRU teve papel essencial para a criação dos artigos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988, dentro do inédito Capítulo II que, pela primeira vez em uma constituição brasileira, versava sobre a Política Urbana: Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo poder público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. § 1º - O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana. § 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. § 3º - As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro. § 4º - É facultado ao poder público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: I - parcelamento ou edificação compulsórios; II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais. Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. § 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil. § 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. § 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião. (BRASIL, 1988)
Tais artigos versam sobre a obrigatoriedade da feitura do plano diretor (PD) em determinados municípios, sobre a função social da propriedade e sobre o usuca-
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pião. Desse modo, ilustram grande avanço nas reinvindicações pela reforma urbana e pelo direito à cidade, que de fato, como visto, foi consolidado, entre outros fatores, em função da contínua luta do MNRU. Segundo Raquel Rolnik, nas décadas de 1980 e 1990, os movimentos sociais e populares “conseguiram pautar o processo de redemocratização com questões pertinentes à construção de um Estado de direitos” (ROLNIK, 2017, p. 2), mas também a entrada do país nos circuitos globalizados do capital e das finanças e a consolidação de uma política neoliberal, junto com a estruturação do jogo político eleitoral “pautaram igualmente os rumos da política urbana no país, marcando este processo de forma ambígua e contraditória” (ROLNIK, 2017, p. 2). As discussões, como se vê, foram amplas e constantes nesse período. Após a promulgação da Constituição, O MNRU se transforma no Fórum Nacional pela Reforma Urbana (FNRU), que em 2001, enfim, consegue conduzir a aprovação do Estatuto da Cidade (AVRITZER, 2010). A Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, denominada Estatuto da Cidade (EC), regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, que estabelece as diretrizes para a política urbana no país. Pelo contexto de sua formulação apresenta um contundente viés social: “Para todos os efeitos, esta Lei [...] estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental” (BRASIL, 1988). O Estatuto da Cidade estabelece eixos centrais para a condução do planejamento das cidades: controle da posse especulativa da terra e melhor distribuição dos processos de urbanização, reformulando a ocupação do solo; participação popular no planejamento urbano; e regularização da posse urbana através do usucapião (CARNEIRO, 2016). Entretanto: Essa lei, ao priorizar o uso de recursos públicos para a promoção do desenvolvimento urbano, priorizou a confecção de grandes projetos de infraestrutura que redesenharam as redes urbanas. Porém, sem o fortalecimento de espaços de planejamento e ordenamento territoriais a partir da gestão efetiva, com participação de processos e comunidades locais, tal desenvolvimento não trouxe o arrefecimento de certos problemas tais como a segregação socioespacial (CARNEIRO apud ROLNIK, 2016, p.359).
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No âmbito do desenvolvimento desta pesquisa, há no Estatuto, dois incisos que merecem destaque. O primeiro deles resguarda e institucionaliza mecanismos relacionados à participação popular e o segundo traz a possibilidade de alianças conhecidas como parcerias público-privada: Art. 2º A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais: [...] II – gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano; III – cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais setores da sociedade no processo de urbanização, em atendimento ao interesse social. (BRASIL, 2001)
Esses incisos garantem por um lado o direito à reinvindicação de participação popular com o intuito de garantir processos de gestão democrática e por outro a entrada de recursos financeiros privado na política pública já que viabiliza a entrada do capital privado nos processos de urbanização. Desse modo, percebemos que junto com a consolidação dos direitos conquistados nos artigos 182 e 183 ocorre a formalização da entrada de recursos privados que acontece desde que as cidades e a aglomeração de pessoas desperta interesse do capital. Este último aspecto é de grande importância já que, principalmente a partir da década de 1990, vem sendo observado o processo de neoliberalização das políticas públicas que, no planejamento urbano, é grandemente representado pelo empreendedorismo urbano, “resposta neoliberal à crise econômico-política do modelo de estado provedor, que encontra espaços de confluência perversa com alguns temas e críticas constantes na plataforma de Reforma Urbana” (ROLNIK, 2017). Ao tomar atitudes de mercado, o planejamento urbano pratica a lógica de investir quando há a possibilidade de lucro, que é o oposto do ideal da criação da Constituição de 1988, já que para equilibrar a cidade os investimentos devem ser feitos nas áreas mais desfavorecidas, esquecidas pela lógica empreendedora. Neste sentido, é válido ressaltar o posicionamento de David Harvey sobre aspectos que se vinculam ao direito à cidade: A questão de que tipo de cidade queremos não pode ser divorciada do tipo de laços sociais, relação com a natureza, estilos de vida, tecnologias e valores estéticos desejamos. O direito à cidade está muito longe da liberdade
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individual de acesso a recursos urbanos: é o direito de mudar a nós mesmos pela mudança da cidade. Além disso, é um direito comum antes de individual já que esta transformação depende inevitavelmente do exercício de um poder coletivo de moldar o processo de urbanização. A liberdade de construir e reconstruir a cidade e a nós mesmos é um dos mais preciosos e negligenciados direitos humanos (HARVEY, 2012, p. 74).
De volta às questões relacionadas à legislação, é importante também salientar o papel que os planos diretores passam a ter para as cidades a partir da Constituição de 1988. Numa perspectiva teórica, os planos diretores deveriam servir como um marco regulador da especulação imobiliária, pois a obrigatoriedade de aplicação da função social da cidade e da propriedade dificultaria a sanção da retenção especulativa (ROLNIK, 2017). Ou seja, embora alguns limites deverem ser respeitados no plano diretor, a autonomia municipal de aplicar ou não os instrumentos previstos no EC trouxeram uma certa maleabilidade, e mesmo que um instrumento seja previsto no plano diretor, sem uma lei municipal posterior que o regulamente seu caráter prático desaparece. Havendo compreendido o histórico dos principais marcos legais da política urbana no país e o modo como o avanço de práticas neoliberais vêm conduzindo a produção do espaço da cidade cada vez mais para um viés mercadófilo, passaremos, em seguida, para a elucidação do instrumento urbanístico que é o aporte principal deste TFG, as OUCs. A Operação Urbana Consorciada é um instrumento de Política Urbana garantido pelo Artigo 4º do Estatuto da Cidade. Entretanto, para ser aplicado em uma dada localidade, deve ser regulamentado por legislação municipal própria, ou seja, deve constar em seu Plano Diretor. A OUC demanda recursos públicos e privados e, de acordo com o Estatuto deve garantir efetiva participação social. Sua definição, no próprio Estatuto ressalta: § 1º Considera-se operação urbana consorciada o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental. (BRASIL, 2001)
As OUCs são realizadas em nível municipal, dentro da zona urbana, e modificam as potencialidades construtivas da legislação urbanística existente – aquela constante no PD e nas leis de uso, ocupação e parcelamento do solo. As áreas que
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serão passíveis de aplicação das OUCs devem ser especificadas e outras diretrizes tais como o programa básico de ocupação; o programa de atendimento econômico e social para a população diretamente afetada pela operação; as finalidades da sua aplicação; o estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV); a forma de controle da operação e a contrapartida exigida daqueles que usufruem da operação também devem ser definidas (BRASIL, Estatuto da Cidade, 2001). O Artigo 34 do EC prevê a emissão de títulos de potencial adicional de construção como moeda para custear a OUC. Tais títulos permitem que, dentro da área da operação, os parâmetros urbanísticos sejam ultrapassados. Esse fato, por sua vez, é gerador de conflitos já que, por um lado, a venda de tais títulos serve para angariar fundos para obras públicas na área da operação que causem melhoramento urbano e chamem investimento privado. Entretanto, por outro, permitem um maior adensamento que a legislação urbana municipal previa, o que faz que maiores gastos com infraestrutura sejam necessários. Como será visto adiante, para que esse modelo de arrecadação financeira através dos títulos funcione, a área de implantação da operação urbana consorciada deve ser de interesse econômico privado, ou seja, áreas onde já há certa especulação, com infraestrutura chamativa ou adjacente a ela. Assim, as operações reforçam a segregação socioespacial, uma vez que se investe mais onde já há investimento prévio ou em áreas que beneficiam a ampliação de uma região de interesse, o que também causa gentrificação1.
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Gentrificação é a valorização de uma determinada região, alterando as dinâmicas existentes principalmente com os aumentos dos preços, tanto imobiliários com dos bens ali comercializados, Isso leva à expulsão da população de baixa renda que antes vivia ali.
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3. CASOS DE OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO BRASIL
Ao analisar casos aplicados de operações urbanas consorciadas no Brasil se torna visível a distância que separa discurso e prática, ao mesmo tempo em que é possível, por conta do seu contexto polêmico, visualizar a forma como o arquiteto lida com o instrumento. No Estatuto da Cidade, sua regulação é baseada no argumento de que ela viabiliza grandes obras apesar das restrições orçamentárias e de que são os beneficiários pela obra que arcam com seus custos desonerando, portanto, o poder público de determinados investimentos em infraestrutura urbana (FIX, 2004). Entretanto, a partir dos casos que serão estudados abaixo, será possível perceber questões que vêm a reboque da aplicação das OUCs nos territórios. Adiantase, neste sentido que, quando se pensa em quem se beneficia, de acordo com o próprio EC, de uma operação urbana - proprietários, usuários permanentes e investidores privados –, muitas vezes, a realidade se manifesta de um outro modo. De fato, após a implementação da OUC, investidores privados terão lucro, proprietários terão seus terrenos valorizados e seus usuários usufruirão de melhor estrutura urbana. Entretanto, dificilmente tais proprietários e usuários serão os mesmos de antes da operação. Todo interesse imobiliário gera especulação, e esta gera gentrificação – como esclarecemos mais acima – e, desse modo, a OUC torna-se um mecanismo subserviente a tal processo. Para ilustrar tais questões trataremos da OUC Faria Lima, que ocorreu em São Paulo, e da Operação Porto Maravilha do Rio de Janeiro.
3.1.
OPERAÇÃO URBANA CONSORCIADA FARIA LIMA
As operações urbanas na cidade de São Paulo começam antes da criação do Estatuto da Cidade ou da promulgação da atual Constituição ainda na década de 80. Na época, existia a operação interligada, na qual se vendiam exceções à lei de zoneamento por lote, e o faturamento se destinava ao Fundo Municipal de Habitação (FMH), dedicado à produção de habitação social. A maior crítica a esse instrumento foi por sua aplicação ser pontual e o ganho não compensar o investimento adicional
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em infraestrutura para compensar o adensamento que tais concessões causavam (FIX, 2004). Assim, iniciou-se, em São Paulo, a discussão sobre operações urbanas, em que a venda de concessões valeria não para um lote, mas para uma área urbana determinada em lei específica, e os recursos financeiros adquiridos não iriam para habitação social, mas para investimentos na própria área da operação, muito próximo ao que hoje é uma operação urbana consorciada. Entretanto, a captação de recursos por parte da prefeitura ainda era feita com venda de exceções à legislação, logo, segundo Mariana Fix, “pressupõe-se, portanto, que exista razoável interesse do mercado imobiliário, o que faz com que as operações urbanas também tendam a concentrar-se em regiões já privilegiadas da cidade” (FIX, 2004, p. 3). No que diz respeito à Operação Urbana Faria Lima (FIGURA 1), ela foi projetada por Júlio Neves2, em 1987, e teve sua aprovação em 1995. Vale lembrar que a Constituição Federal vigente é de 1988 e o Estatuto da Cidade, onde consta o instrumento Operação Urbana Consorciada, é de 2001, o que deixa a operação Faria Lima anterior à institucionalização federal de tal mecanismo. Porém, sua similaridade com o mecanismo do EC indica que a Faria Lima pode ter sido precursora para a criação do instrumento.
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Júlio José Franco Neves, nascido em 1932 em São Paulo, é arquiteto e urbanista formado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Já atuou como presidente no Instituto de Arquitetos do Brasil, da Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura e do Museu de Arte de São Paulo.
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Figura 1: inserção geográfica da Operação Faria Lima
Fonte: arquivo do autor modificado a partir do Google Maps.
Na Operação Faria Lima foi pela primeira vez implantado o sistema de venda de potencial construtivo por título financeiro, o Certificado de Potencial Adicional de Construção (CEPAC). Os CEPACs são valores mobiliários emitidos pelo Poder Público para pagamento dos adicionais construtivos para a área de uma OUC. Eles não correspondem a uma área específica e pode ser comercializado independente de as partes terem
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propriedades na área da operação, criando uma especulação própria, independente, embora somada, com a própria especulação da terra na OUC (FIGURA 2).
Figura 2: funcionamento dos CEPACs
Fonte: INDISCIPLINAR.
O que se pode observar desde então foi que “como qualquer título financeiro, seu preço oscilaria conforme interesse do mercado, na Bolsa de Valores” (FIX, 2004, p. 5). Além de custear obras – conforme mostrado acima –, os CEPACs também serviriam para pagar desapropriações necessárias à implementação do projeto. Para além dos efeitos que de algum modo já foram mencionados neste trabalho, o principal debate sobre os CEPACs, inclusive no âmbito do Estatuto da Cidade, foi o fato deque a sua compra era desvinculada da propriedade do terreno, criando assim uma especulação imobiliária financeirizada (FIX, 2004). A Operação Faria Lima foi criada com o intuito de ser a continuação do centro financeiro criado pela Avenida Paulista. A proposta da região veio do setor imobiliário, sendo acatada pela prefeitura na gestão do então prefeito Paulo Maluf (FIX,
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2004). O limite de adição de potencial construtivo por meio de CEPAC era de quatro vezes a área do terreno, e houve outros incentivos para remembramento e construção em lotes com mais de mil metros quadrados. O perfil da região era, até então, predominantemente de residências da classe média, e a proposta era de um centro financeiro. Houve movimentos e reinvindicações contra a operação, mas esta foi aprovada com unanimidade na câmara municipal. Entre 1995 e 2000, antes do Estatuto da Cidade, a região já havia se modificado radicalmente. O bairro residencial com comércios de pequeno e médio porte foi trocado por edifícios de condomínio de luxo e comerciais. As obras necessárias para o metrô levaram a desapropriações em massa, gerando uma tábula rasa em várias áreas da região. O Largo da Batata era final de rota de ônibus para todas as regiões da cidade. Tais obras levaram a construção de um terminal rodoviário junto à Estação Pinheiros da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), que também ganhou uma estação de metrô, dando espaço no Largo para a construção de um canteiro de obras para a operação. A mudança drástica de público do Largo, que passou a ser dos funcionários das construções durante o período de implementação da OUC, grande parte deles de fora da cidade, degradou o Largo e mudou o comércio local. Entretanto, a nova dinâmica foi assimilada pelo o que restou da vivência antiga, já que em um primeiro momento de construção da infraestrutura, apenas as áreas destinadas às obras foram desapropriadas. Após o término das construções, as áreas de canteiro foram trocadas por praças áridas, e o comércio antigo foi trocado por construções de luxo pelo mercado privado (FIGURAS 3 e 4).
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Figura 3: Largo da Batata em 1980
Figura 4:Largo da Batata em 2017
Fonte: autores desconhecidos.
A valorização imobiliária, ou seja, os ganhos dos investidores privados, foi capaz de fazer com que o valor do aluguel para edifícios de alto padrão na Faria Lima fosse maior que na Avenida Paulista. Entretanto, ao se avaliar os gastos com a operação pelo poder público são contabilizados R$ 476 milhões em valores atuais, o que poderia significar lucro ao governo se não fossem gastos indiretos não contabilizados, como obras no entorno na operação que, em números atuais, passam dos R$ 2 bilhões3 (TABELA 1).
TABELA 1: VALORES DA OPERAÇÃO FALIA LIMA4 ITEM
GASTO
Total arrecadado Total pago
R$ 3592 mi R$ 2691 mi
Leilão de CEPAC Despesas
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GANHO
R$ 1.249.220.316,00 R$ 1.831.361.571,00
Valores retirados do artigo A “fórmula mágica” da parceria público-privada, de Mariana Fix, p. 7. Embora os valores sejam confusos e contraditórios, todos foram retirados da seção de Recursos Financeiros do Caderno da Operação Faria Lima (2016). Em todas as tabelas os valores têm saldo positivo, mas as tabelas indicam resultados diferentes para os mesmos tópicos. 4
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Fonte: Caderno da Operação Faria Lima
Com base no exposto acima, alguns aspectos desta operação devem ser pontuados com o intuito de sistematizar questões que podem auxiliar na compreensão dos modos como a OUC-ACLO vem sendo pensada e se tais aspectos fazem parte dos modos como arquitetos e urbanistas a ela relacionados posicionam-se frente a este instrumento urbanístico. Neste sentido, foram observados: o escopo da proposta – que diz respeito ao seu texto geral e motivação do projeto; a inserção física da proposta – sua localização na cidade e seu entorno; a alteração na paisagem e apropriações – que concerne ao modo como tal operação modificou as condições físicas e cotidianas do local; o aspecto financeiro – que tem como base os modos de obtenção de verba e os gastos do projeto e fomentados por ele; a participação popular – que visa entender como a população teve conhecimento e influencia na operação; os efeitos socioambientais da proposta – que implicam na maneira como a população foi apetada por ela.
Escopo da proposta: a concepção da operação surgiu do interesse privado. A necessidade da operação foi de expandir o centro financeiro da cidade, já consolidado, e buscar a ampliação do mercado de terras. O poder público, como parte da estrutura das parcerias público-privadas (PPPs) que viabilizam as OUCs, não criou mecanismos ou estratégias efetivas para garantir a fixação da comunidade local, o que resultou em descontentamentos e na não aceitação do projeto por parte da comunidade local5. Neste sentido, a proposta inseriu-se no âmbito dos interesses do poder público e de investidores privados.
Inserção física da proposta: a área do projeto, como mencionado, possui uma localização estratégica para investidores imobiliários e, portanto, já era de interesse do mercado. A região está ligada diretamente com a Avenida Paulista e têm regiões nobres no seu entorno.
Alteração na paisagem e apropriações: houve uma mudança drástica na paisagem. A transformação física do entorno conduziu a outras transformações, como a mudança de público, classe social, usos e cotidianos.
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O Largo da Batata transformou-se em um espaço comum a protestos, de inicio, contra a Operação Faria Lima, propiciados pelo espaço amplo e árido criado com a saída dos canteiros de obras. O coletivo A Batata Precisa de Você ainda atua na região.
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Aspecto financeiro: os ganhos não compensam os lucros. Na descrição financeira da operação há outras formas de obtenção de recursos além dos CEPACs, mas além dos dados apresentados serem curiosamente confusos, ao se levarem consideração o valor ganho com CEPAC, que é o grande trunfo das operações urbanas consorciadas ao se considerar o retorno de capital para os cofres públicos, este representa menos da metade dos gastos, sem mencionar as obras fora da área da operação advindas de seus impactos, como as melhorias das vias no seu entorno.
Participação popular: ao se notar todas as manifestações contra obras dessa OUC que ainda existem, como as organizadas pelo grupo A Batata Precisa de Você, vê-se que, mesmo que por formalidade tenha tido participação popular, não foi um projeto popular.
Efeitos socioambientais da proposta: a completa transformação da paisagem e moradores locais mostra mudanças socioambientais drásticas, mesmo com alguns pontos de resistência.
3.2.
PORTO MARAVILHA
O Rio de Janeiro é marcado pelas reformas urbanísticas drásticas, também chamadas de tábulas rasas. Tais reformas, junto com a geomorfologia carioca, tem relação profunda com seu contexto sociocultural. No início do século XX tivemos a aplicação do urbanismo sanitarista Haussmanniano, que reformulou o centro da cidade alterando seu desenho urbano, população e usos, a favor das classes mais altas. As propostas de Pereira Passos, prefeito do município de Rio de Janeiro entre 1902 e 1906, foram uma iniciativa de modernização excludente, responsável pelo surgimento das primeiras favelas da cidade, uma vez que a população mais pobre expulsa de suas casas se viu obrigada a procurar novo lugar para moradia e continuar próxima de seu local de trabalho. Tal reforma causou uma grande intervenção urbana e social, “criando um centro e uma imagem de cidade modernizada por meio da destruição de largos trechos urbanos e pelo deslocamento da população que ali vivia, em nome da higiene e do embelezamento urbano” (SUPPIA, 2014).
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Durante as décadas de 1930 a 1950, embora já houvesse discussões sobre um novo planejamento urbano modernista, as classes mais altas tinham a liberdade para executar “algumas obras de seu interesse e integrantes de planos antigos. Eram fundamentalmente obras que atendiam às partes da cidade que a elas interessavam, como a remodelação do centro, principalmente pela remodelação de seu sistema viário” (PIRES, 2010). Os primeiros planos diretores da cidade do Rio de Janeiro foram o Plano Agache, de 1930, elaborado pelo arquiteto francês Alfred Hubert Donat Agache e o Plano Doxiadis, de 1965, projeto do arquiteto e urbanista grego Constantino Doxiadis. O Plano Agache “representou a tentativa das classes dominantes da República Velha de controlar o desenvolvimento da forma urbana carioca, já por demais contraditória” (PIRES, 2010). Suas intervenções focavam nas regiões Centro e Sul e a partir de um discurso modernista tinha como objetivo instituir a segregação e apartação social, definindo em qual zona estaria as habitações para classe social menos favorecida. Já o Plano Doxiadis era extremamente tecnicista e racionalista, com o objetivo de fomentar o desenvolvimento urbano, mas tinha um caráter estrangeiro e fugia totalmente da realidade carioca (PIRES, 2010). Durantes os governos autoritários, o Rio de Janeiro recebe gigantescos investimentos em infraestrutura, baseado em modelos importados e sem debate público. O debate sobre temas urbanos se faz na década de 1980. Em 1992 há a criação de um plano diretor com um viés mais democrático. Entretanto, o jogo urbano carioca não foge do contexto nacional, e a entrada no mercado no planejamento da cidade torna-o cada vez mais fragmentado e voltado aos interesses privados. O Plano Estratégico adotado tem como papel “desregular, fragmentar e dar ao mercado um espaço absoluto, a cidade se instrumentaliza para competir com as demais na disputa por investimentos externos diretos” (PIRES, 2010). Nesse contexto, com uma segregação social alta e consolidada, nasce a Operação Porto Maravilha (FIGURA 5). Assim como a Operação Faria Lima – e vale citar, a OUC-ACLO como veremos mais adiante –, o local de sua implantação se encontra próxima a regiões valorizadas da cidade e possuem infraestrutura urbana, equipamentos, áreas comerciais e de serviço consolidados. De certa forma, tais áreas conformam-se como eixos de conexão (considerada por boa parte dos plane-
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jadores urbanos como degradada ou dedicada a parcelas da classe baixa) para outras áreas de interesse econômico mais proeminente. O projeto do Porto Maravilha previu a construção de equipamentos, obras de infraestrutura de saneamento e telecomunicações e reestruturação do sistema viário. A grande justificativa para a realização da operação foram os megaeventos que ocorreram na cidade do Rio de Janeiro, a saber, o Mundial de 2014 e as Olimpíadas de 2016, o que já leva a visualizar o seu caráter turístico.
Figura 5: inserção geográfica do Porto Maravilha
Fonte: arquivo pessoal modificado a partir do Google Maps.
O projeto foi inicialmente pensado na primeira versão do novo plano estratégico da cidade em 2009, e após seu aval em 2010 pelo Comitê Olímpico Internacio-
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nal, o Porto Maravilha se tornou o marco do legado olímpico, tornando-o chamativo para os governos municipal, estadual e federal. A boa relação junto aos governos federal e estadual seria indispensável para a implantação do projeto de revitalização, dada a predominância de terrenos da União naquela área e a necessidade de implementação de uma política de segurança capaz de combater a violência do passado (WERNECK, 2016).
O prefeito que conduziu a Figura 6: Entorno do Porto Maravilha implementação do projeto foi Eduardo Paes, que buscou criar condições para seu rápido andamento. Para tal, procedeu ao processo de troca de área de ação das Olimpíadas, que no projeto inicial previa a concentração de todos os equipamentos na Barra da Tijuca, para que a operação acontecesse na região portuária6 (FIGURA 6). Instaurou, ainda, mudanças no corpo da prefeitura, criando secretarias específicas para o rápido andamento
do
projeto
(WERNECK,
2016). As secretarias ligadas à execução do Porto Maravilha foram entregues a pessoas anteriormente ligadas ao ramo imobiliário e econômico, como Felipe Go-
Fonte: modificado a partir de imagem do Caderno Porto Maravilha
es, ex-sócio da consultoria McKinsey, que se tornou secretário da Secretaria Extraordinária de Desenvolvimento (SEDE), presidente do Instituto Pereira Passos e do Conselho Municipal de Desenvol6
O Porto Maravilha entra no escopo das grandes obras de requalificação urbana que ocorrem em função dos grandes eventos mundiais. Neste sentido, apresenta diversas similaridades com o ocorrido em Barcelona, em 1992, em função da realização das olimpíadas, principalmente na região conhecida como Barceloneta. (FERREIRA, 2010)
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vimento Econômico. Goes criou a Rio Negócios em 2010, agência responsável em angariar e apoiar empresários interessados em investir na cidade. Já a Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto (CDURP), concebida para coordenar a implantação do Porto Maravilha, foi assumida por Jorge Arraes, ex-diretor imobiliário do fundo de pensão dos funcionários da Caixa Econômica Federal, a Fundação dos Economiários Federais (FUNCEF) (WERNECK, 2016). Segundo Mariana Werneck: As reformas institucionais e as inovações normativas buscavam, assim, instaurar uma administração pautada na interlocução entre o poder público e as empresas privadas, e o Porto Maravilha expressava essa inflexão. Além de ser instituído por meio de uma operação urbana consorciada, o projeto de revitalização sinalizava para a contratação de uma Parceria PúblicoPrivada (PPP) responsável pela execução das obras e prestação dos serviços [...], lavrada em outubro de 2010 no valor global de R$ 7,6 bilhões, distribuídos ao longo de 15 anos. Dessa forma, o Porto Maravilha representava a construção de um novo paradigma no desenvolvimento do Rio.
Para realização do projeto foram contabilizados o despejo de 1230 famílias que viviam na região ou em favelas próximas7.Ou seja, houve um impacto relevante em populações já historicamente vulnerabilizadas, mas que se localizavam em uma porção central da cidade. Por outro lado, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) foi utilizado na aquisição de 3,5 bilhões de reais em CEPACs, o que reitera a vertente especulativa da terra urbana que passa a ser tratada como commodity. Fica claro, assim, a que setor a Operação Porto Maravilha foi direcionado. TABELA 2: VALORES DO PORTO MARAVILHA ITEM
GASTO
Custo de contrapartida PPP
R$ 7,6 bi 8
Leilão de CEPAC (lote único arrematado pelo FGTS )
GANHO
R$ 3,5 bi
Fonte: Caderno Porto Maravilha
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800 famílias do Morro da Providência contabilizadas pelo Fórum Comunitário do Porto e 430 irregulares na área da operação pelo Comité Popular da Copa e das Olimpíadas do Rio de janeiro (WERNECK, 2016). 8 (FGTS) Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
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Aqui percebe-se algumas semelhanças com a paulistana Operação Porto Maravilha:
Escopo da proposta: a concepção da operação surgiu para um evento de intenso turismo e oportunidades de empreendimentos imobiliários de megaproporção, as Olimpíadas sediadas na cidade do Rio de Janeiro. O jogo político propiciado pelos megaeventos é o ponto norteador do projeto.
Inserção física da proposta: novamente, a área do projeto já era de interesse econômico. Era uma área degradada entre o centro da cidade e os aeroportos, na região centro-sul.
Alteração na paisagem e apropriações: houve uma mudança drástica na paisagem. A tábula rasa, historicamente já presente na região se instaura e nas áreas para onde não havia projetados novos desenhos urbanos (Morro da Providência e Morro da Conceição) houve grandes desapropriações.
Aspecto financeiro: os ganhos não compensam os lucros. A venda de CEPACs não chega à metade do custo total da obra. Deve-se destacar também que sua compra, por lote único, foi realizada pelo FGTS, e não por empresas privadas.
Participação popular: ao se notar a drástica mudança da população local, não só de moradores, mas também a flutuante, uma vez que a região se teve um grande apelo turístico após a operação, não se vê a participação da população que uma vez habitou ali.
Efeitos socioambientais da proposta: a completa transformação da paisagem e moradores locais mostra mudanças socioambientais drásticas.
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4. HISTÓRICO DA LEGISLAÇÃO URBANA DE BELO HORIZONTE E AS OPERAÇÕES URBANAS
Como trataremos, neste TFG, de uma OUC localizada na cidade de Belo Horizonte, é importante que compreendamos um pouco de sua história no âmbito das legislações urbanísticas. Belo Horizonte foi a primeira cidade planejada do Brasil, executada pela Comissão Construtora, sob responsabilidade do engenheiro politécnico Aarão Reis, entre os anos 1894 e 1897, e inaugurada como nova capital mineira, no lugar de Ouro Preto, em 1897 (FIGURA 7) (TONUCCI FILHO, 2009). Foi seguido um modelo de tábula rasa para um projeto modernista e higienista já que para a execução do plano foram desconsideradas as pessoas que moravam no local – o antigo Curral D’el Rey – assim como características físico-geográficas da área de implementação.
Figura 7: traçado original da cidade de Belo Horizonte
Fonte: Arquivo Público Mineiro
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Em 11 de janeiro de 1895, ainda antes da apresentação do desenho do traçado urbano para a nova capital das Minas, foi assinado o decreto n. 53, o Plano da Nova Capital, com as primeiras diretrizes urbanísticas para a cidade, dentre eles a racionalidade, a funcionalidade, o embelezamento e o viés higienista e disciplinador. Já em 1901, foi homologado o Regulamento das Construções, Reconstruções e Demolições de Obras na Cidade de Minas, com a determinação dos primeiros parâmetros urbanísticos que só valiam para a Zona Urbana (perímetro dentro da atual Avenida do Contorno) dedicada às classes sociais mais altas9. Ali a oferta de lotes Figura 8: inserção geográfica de Belo Horizonte
era limitada, parte pelo Estado, parte por proprietários criando estoque para futura especulação (TONUCCI FILHO, 2009). A primeira legislação para o zoneamento da cidade, levando em consideração a cidade como um todo e como ela se conformou se dá pelo decreto n. 165 de 1933 (TONUCCI FILHO, 2009). Tal de-
Fonte: criado pelo autor
creto versa sobre a nomenclatura
arquitetônica técnica; a obrigatoriedade de licença por parte da prefeitura para qualquer obra; o cadastro de todos os profissionais autorizados a trabalhar nas obras da cidade; todo o material documental necessário para a legalização de uma obra; e as diretrizes arquitetônicas gerais. O grande apelo técnico construtivo gerado tornou ainda mais difícil a formalização das casas populares e colocou a autoconstrução fora da legalidade. Assim, o planejamento urbano se voltou às classes com condições financeiras de pagar por todo o processo. Incentivado pelo modelo desenvolvimentista criado pelo governo de JK, em 1951, o então prefeito Américo Renê Giannetti aprova o primeiro plano diretor da cidade, instituído pela Lei 232/51. Segundo Valadão, “elaborado por Oscar Niemeyer, pelo urbanista Francisco Prestes Maia e pelo paisagista Burle Marx, o plano foi
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As classes mais baixas ocuparam, ainda durante a construção da cidade, a Zona Suburbana (fora dos limites da Avenida do Contorno), onde o crescimento já não seguia o descrito no Plano da Nova Capital.
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calcado num modelo de planejamento de caráter regulatório a fim de regular e orientar a expansão urbana” (VALADÃO, 2016, p. 21) Embora houvesse muitos terrenos reservados à especulação imobiliária, o crescimento de Belo Horizonte até a década de 80 é dado principalmente pela industrialização. O crescimento das indústrias nos municípios vizinhos levou Belo Horizonte a se tornar um polo de serviços, e em 1976 é aprovada a Lei de Uso e Ocupação do Solo Urbano da Região Metropolitana de Belo Horizonte, elaborada pela Plambel10 (TONUCCI FILHO, 2009), que refaz o zoneamento da cidade e repensa o uso do solo urbano levando em consideração a massa metropolitana criada, melhorando o transporte e setorizando os usos nessa escala macro. Em 1996 é aprovado o segundo Plano Diretor da cidade pela Lei 7.165, na administração de Patrus Ananias, que levado pelo contexto nacional da época, tinha um discurso inclinado a um planejamento democratizado, descentralizado e integrado, como se vê nos seus artigos iniciais: Art. 1º - O Plano Diretor do Município de Belo Horizonte é o instrumento básico da política de desenvolvimento urbano - sob o aspecto físico, social, econômico e administrativo, objetivando o desenvolvimento sustentado do Município, tendo em vista as aspirações da coletividade - e de orientação da atuação do Poder Público e da iniciativa privada. Art. 2º - A política de desenvolvimento urbano tem por objetivo o ordenamento do Município e o cumprimento das funções sociais da propriedade, assegurando o bem-estar dos munícipes. Art. 3º - São objetivos do Plano Diretor: I - ordenar o pleno desenvolvimento do Município no plano social, adequando a ocupação e o uso do solo urbano à função social da propriedade; II - melhorar a qualidade de vida urbana, garantindo o bem-estar dos munícipes; III - promover a adequada distribuição dos contingentes populacionais, conciliando-a às diversas atividades urbanas instaladas; IV - promover a estruturação de um sistema municipal de planejamento e gestão urbana democratizado, descentralizado e integrado; V - promover a compatibilização da política urbana municipal com a metropolitana, a estadual e a federal; VI - preservar, proteger e recuperar o meio ambiente e o patrimônio cultural, histórico, paisagístico, artístico e arqueológico municipal; VII - promover a integração e a complementaridade das atividades urbanas e rurais na região polarizada pelo Município - visando, dentre outros, à redução da migração para este -, mediante o adequado planejamento do desenvolvimento regional (BELO HORIZONTE, 1996).
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Plambel foi uma autarquia estadual responsável pelo planejamento da Região Metropolitana de Belo Horizonte durante o Regime Militar, em atividade de 1974 a 1996.
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Entretanto, embora o plano seguisse o ideário de Reforma Urbana, as práticas do setor imobiliário, de especulação e construção de obras que mudavam a dinâmica da cidade e, pouco a pouco, se sobrepunham a pequenos pontos da legislação, conseguiram perverter tais diretrizes de caráter social. (VALADÃO, 2016). O plano diretor teve duas alterações, em 2000 e 2010. Em 2000 foram criados incentivos a diversas áreas que convém a implantação de operações urbanas, como a mobilidade, cuidado ao patrimônio, desenvolvimento econômico, integração das esferas municipal, estadual e federal, levantamento de terras públicas e griladas no município e priorização de políticas de habitação. Já em 2010 as alterações foram mais objetivamente voltadas às operações, inclusive com mudança das suas disposições gerais e descrição na lei: Seção I Disposições Gerais Seção I (arts. 65 a 65-E) acrescentada pela Lei nº 9.959, de 20/7/2010 (Art. 10) Art. 65 - Operação urbana é o conjunto integrado de intervenções, com prazo determinado, coordenadas pelo Executivo, com a participação de entidades da iniciativa privada, objetivando viabilizar projetos urbanísticos especiais em áreas previamente delimitadas. Parágrafo único - A operação urbana pode ser proposta ao Executivo por qualquer cidadão ou entidade que nela tenha interesse. Art. 65 - Operação Urbana é o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Executivo Municipal, com a participação de agentes públicos ou privados, com o objetivo de viabilizar projetos urbanos de interesse público, podendo ocorrer em qualquer área do Município. § 1º - A Operação Urbana pode ser proposta pelo Poder Executivo Municipal ou a este, por qualquer cidadão ou entidade que nela tenha interesse, e será aprovada por lei específica, observado o disposto no art. 80, II, da Lei nº 7.165/96. § 2º - O encaminhamento à Câmara Municipal de projeto de lei relativo à Operação Urbana deverá ser precedido de assinatura de Termo de Conduta Urbanística - TCU - entre o Executivo e o empreendedor interessado, por meio do qual este se compromete a cumprir as obrigações e os prazos constantes da proposta de texto legal, sob pena de aplicação das penalidades previstas no TCU. Art. 65 com redação dada pela Lei nº 9.959, de 20/7/2010 (Art. 8º) Art. 65-A - As áreas envolvidas na Operação Urbana não podem receber potencial construtivo adicional, originado da Transferência do Direito de Construir, durante a tramitação do projeto de lei respectivo, a não ser que essa tramitação exceda o prazo de 4 (quatro) meses. Art. 65-A acrescentado pela Lei nº 9.959, de 20/7/2010 (Art. 9º)
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Art. 65-B - A lei referente à Operação Urbana pode prever que a execução de obras por agentes da iniciativa privada seja remunerada pela concessão para exploração econômica do serviço implantado. Art. 65-B acrescentado pela Lei nº 9.959, de 20/7/2010 (Art. 9º) Art. 65-C - O potencial construtivo das áreas privadas passadas para domínio público sem ônus para o Município pode ser transferido para outro local, determinado por lei, situado dentro ou fora das áreas envolvidas na Operação Urbana. Art. 65-C acrescentado pela Lei nº 9.959, de 20/7/2010 (Art. 9º) Art. 65-D - As Operações Urbanas classificam-se em Operações Urbanas Simplificadas e Operações Urbanas Consorciadas. Art. 65-D acrescentado pela Lei nº 9.959, de 20/7/2010 (Art. 9º) Art. 65-E - As Operações Urbanas e os projetos urbanísticos especiais que envolvam a autorização da Transferência do Direito de Construir poderão ser realizados com a contrapartida de transferência não onerosa de imóvel ao Município, sendo vedado, nessa hipótese, pagamento de indenização, a qualquer título, ao particular. Art. 65-E acrescentado pela Lei nº 9.959, de 20/7/2010 (Art. 9º) (BELO HORIZONTE, 1996)
Acima percebe-se a diferença de tratamento com as operações urbanas. Todo o capítulo II do PD, referente às operações urbanas teve grande modificação em 2010. Desde 2014 está em discussão, a partir da IV Conferencia Municipal de Políticas Urbanas, o novo plano diretor da cidade. Como será visto adiante, a aprovação do novo plano tem ligação direta com a implementação da Operação Urbana Consorciada Antônio Carlos Leste Oeste – objeto de estudo deste trabalho. Tendo observado de modo geral a legislação urbanística relacionada à cidade de Belo Horizonte, daremos destaque, em seguida, às operações urbanas.
4.1.
AS OPERAÇÕES URBANAS NA LEGISLAÇÃO DE BELO HORIZONTE
As operações urbanas estão presentes no Plano Diretor de Belo Horizonte, de 1996 (BELO HORIZONTE, 1996), mas aparecem, ainda nesse momento, de modo superficial – sem definição ou maiores esclarecimentos sobre sua regulamentação no território belorizontino e remetendo às definições e finalidades da legislação federal. Entretanto, já traz, em seu Anexo 4 (MAPA 01), a demarcação das áreas que poderiam ser objeto deste instrumento.
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Figura 9: åreas de operaçþes urbanas consorciadas
Fonte: Plano Diretor de Belo Horizonte (1996)
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Já na atualização do Plano Diretor, em 2010, pela Lei 9.959/2010, as Operações Urbanas passam a ter papel de destaque e sua definição é explicitada e modificada da original de 1996. Sua revisão diferencia e traz especificidades a dois tipos de Operações Urbanas possíveis de serem implementadas no território: Operações Urbanas Consorciadas e Operações Urbanas Simplificadas. No que tange as Operações Urbanas Consorciadas, embora o instrumento já constasse no texto original de 1996, foi explorado no texto de 2010, como se vê: Seção III Da Operação Urbana Consorciada Seção III (69 a 69-H) acrescentada pela Lei nº 9.959, de 20/7/2010 (Art. 10) Art. 69 - Os recursos levantados para a realização das intervenções somente podem ser aplicados em aspectos relacionados à implantação do projeto relativo à operação urbana. Art. 69 - Operação Urbana Consorciada é o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Executivo Municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorização ambiental, podendo ocorrer em qualquer área do Município. § 1º - Cada Operação Urbana Consorciada será instituída por lei específica, de acordo com o disposto nos arts. 32 a 34 da Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001, - Estatuto da Cidade. § 2º - As Operações Urbanas Consorciadas serão instituídas visando a alcançar, entre outras, as seguintes finalidades: I - implantação de equipamentos estratégicos para o desenvolvimento urbano; II - otimização de áreas envolvidas em intervenções urbanísticas de porte e reciclagem de áreas consideradas subutilizadas; III - implantação de Programas de Habitação de Interesse Social; IV - ampliação e melhoria da Rede Estrutural de Transporte Público Coletivo; V - implantação de espaços públicos; VI - valorização e criação de patrimônio ambiental, histórico, arquitetônico, cultural e paisagístico; VII - melhoria e ampliação da infraestrutura e da Rede Viária Estrutural; VIII - dinamização de áreas visando à geração de empregos. § 3º - Poderão ser previstas nas Operações Urbanas Consorciadas: I - a modificação de índices e características de parcelamento, ocupação e uso do solo e subsolo, bem como as alterações das normas edilícias, considerando-se o impacto ambiental delas decorrente e o impacto de vizinhança; II - a regularização de construções, reformas ou ampliações executadas em desacordo com a legislação vigente. § 4º - A lei específica que aprovar ou regulamentar a Operação Urbana Consorciada deverá conter, no mínimo: I - a definição da área a ser atingida; II - o programa básico de ocupação da área;
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III - o programa de atendimento econômico e social para a população diretamente afetada pela Operação; IV - as finalidades da Operação; V - o estudo prévio de impacto de vizinhança; VI - a contrapartida a ser exigida dos proprietários, usuários permanentes e investidores privados, nos termos do disposto no inciso VI do art. 33 da Lei nº 10.257/01; VII - a forma de controle da Operação, obrigatoriamente compartilhado com representação da sociedade civil. § 5º - Os recursos obtidos pelo Poder Público Municipal na forma do inciso VI do § 4º deste artigo serão aplicados, exclusivamente, na própria Operação Urbana Consorciada. § 6º - A partir da aprovação da lei específica de que trata o § 1º do art. 69 desta Lei, são nulas as licenças e as autorizações a cargo do Poder Público Municipal expedidas em desacordo com o plano de Operação Urbana Consorciada, conforme previsto na Lei nº 10.257/01. § 7º - O Executivo poderá utilizar, na área objeto da Operação Urbana Consorciada, mediante previsão na respectiva lei específica, os instrumentos previstos nos arts. 32 a 34 da Lei nº 10.257/01, bem como a Outorga Onerosa do Direito de Construir, de acordo com as características de cada Operação Urbana Consorciada. Art. 69 com redação dada pela Lei nº 9.959, de 20/7/2010 (Art. 13)
A seção ainda contém a continuação do Artigo 69, que delimita as áreas de operação e suas respectivas diretrizes principais. Torna-se claro que a modificação da lei em 2010 foi inteiramente direcionada à aplicação de operações urbanas consorciadas. Ao cruzar tal dado com a linha do tempo das operações urbanas que aconteceram na cidade saltam sobreposições que serão comentadas mais adiante. Com relação às Operações Urbanas Simplificadas, estas são destinadas a projetos mais pontuais, e têm seu processo com menos etapas. Ainda assim, seu texto foi também inteiramente modificado em 2010. Presente no art. 66 do plano diretor, acrescentada pelo art. 10 da Lei 9.959/2010 não está previsto no Estatuto da Cidade, constando somente na legislação municipal belorizontina. Seu diferencial está na exclusividade de motivação por interesse público11. Ela destina a viabilizar as seguintes intervenções: I - tratamento urbanístico de áreas públicas; II - abertura de vias ou melhorias no sistema viário; III - implantação de programa habitacional de interesse social; IV - implantação de equipamentos públicos; 11
A legislação de Belo Horizonte cria essa diferenciação pois nela prevê que a iniciativa de uma operação urbana pode vir por outros interessados além do poder público. No Estatuto da Cidade não existe essa distinção, entretanto, também não existe proibição para tal, já que coloca a cargo do município a responsabilidade pelas operações urbanas.
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V - recuperação do patrimônio cultural; VI - proteção ambiental; VII - reurbanização; VIII - amenização dos efeitos negativos das ilhas de calor sobre a qualidade de vida; IX - regularização de edificações localizadas em área não parcelada oficialmente. IX - regularização de edificações e de usos; X - requalificação de áreas públicas. (BELO HORIZONTE, 1996)
Ao se analisar criticamente a definição da operação urbana simplificada, o tratamento econômico que Belo Horizonte dá ao capítulo de operações urbanas e a definição de tal pelo EC, entende-se que o – pequeno – viés social da operação urbana, advindo do Estatuto da Cidade, na legislação municipal é apresentado pela denominada operação urbana simplificada. Visto isso e deixando em destaque o ano de 2010 e todas as modificações no texto sobre as operações urbanas, é necessário ressaltar que em 2013 foi apresentado o plano da Operação Urbana Consorciada Nova BH, que ocupava ao total 7% da área da cidade. Como a proposta da Nova BH é diretamente relacionada à OUCACLO, no próximo capítulo, trataremos inicialmente da primeira para, em seguida, explorarmos esta que é o ponto central deste trabalho. Mesmo com o detalhamento da lei sendo posterior, as operações urbanas na cidade já acontecem há algum tempo. Abaixo se encontra a linha do tempo das operações urbanas de Belo Horizonte feito pelo grupo de pesquisa Indisciplinar (FIGURA 10), com o recorte entre a criação do PD de 1996 e o inicio da Nova BH. Percebe-se já a presença das construtoras Andrade Gutierrez e Barbosa Mello nas obras de maior porte e que a maioria das operações está em pontos da cidade que posteriormente se tornariam importantes no que seria a Nova BH.
37 Figura 10: linha do tempo das operaçþes urbanas de Belo Horizonte
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5. A OPERAÇÃO URBANA CONSORCIADA ANTONIO CARLOS + LESTE/OESTE E SEUS ANTECEDENTES
Para iniciar a abordagem sobre a OUC-ACLO é necessário retornar a já mencionada OUC Nova BH. Isto porque, em 2013, foi apresentado publicamente pelo governo municipal da cidade de Belo Horizonte o projeto Nova BH, uma operação consorciada que contemplava os corredores leste-centro-oeste e centro-norte da cidade, formado pelas avenidas Antônio Carlos/Pedro I, Avenida dos Andradas, Tereza Cristina e Via Expressa. Tal operação teria 25 Km², equivalente a 7% do município, e afetaria diretamente a 170 mil moradores (INDISCIPLINAR, OUC Nova BH). Esta OUC que não foi implementada pelos problemas que apontaremos a seguir, foi a base daquela que é o ponto central deste trabalho, a saber, a OUC-ACLO. Por isso, de início trataremos da Nova BH para, em seguida, nos debruçarmos sobre a OUC-ACLO.
5.1.
NOVA BH
A intenção da Nova BH era, dentre outras, verticalizar o bairro de Santa Tereza e outros próximos ao centro. Já havia o projeto de uma torre, a maior da América Latina, para a área antes mesmo da apresentação do projeto da operação, que estava em projeto pela prefeitura junto com empresas interessadas – as construtoras Barbosa Melo, Andrade Gutierrez e Odebrecht (INDISCIPLINAR, OUC ACLO). Tal operação foi elaborada entre a prefeitura e algumas construtoras, chegando a conhecimento da população somente em sua apresentação do formato final. A proposta era inteiramente voltada ao mercado, nos mesmos modos vistos nos casos estudados, a Operação Faria Lima e o Porto Maravilha.
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Figura 11: modelo econômico da Nova BH
Fonte: Indisciplinar
Pela falta de participação popular em sua elaboração, como exigido no Estatuto da Cidade, a sociedade civil pediu auxílio ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) investigar a operação, que com auxilio de um dossiê organizado pelo grupo Indisciplinar levou ao Conselho Municipal de Política Urbana (COMPUR) a solicitação de barrar tal operação, o que implicou na paralisação de sua tramitação nos órgãos competentes. Em 2014, entretanto, a Prefeitura dá entrada a uma nova operação urbana consorciada que, de certo modo, implicou na reapresentação da Nova BH. A partir de então, a maior OUC proposta para a cidade passa a se chamar Operação Urbana Consorciada Antônio Carlos + Leste/Oeste (OUC-ACLO), com o intuito de corrigir as questões que haviam sido indicadas como não conformes pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG).
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5.2.
OUC-ACLO
O MPMG exigiu da Administração Municipal diversas medidas para que a nova operação assumisse sua responsabilidade junto à participação popular e gestão democrática da cidade. As principais obrigações foram: 1) submeter novamente o projeto ao Conselho Municipal de Políticas Urbanas (COMPUR) e tornar ineficaz a decisão anterior do órgão que aprovou os estudos da operação e o plano urbanístico apesar de recomendação contrária do MP; 2) disponibilizar o plano urbanístico e os estudos da operação urbana (EIV e EVEF) da OUC Nova BH e da OUC-ACLO, após finalizados; 3) garantir a participação popular na elaboração do Plano Urbanístico da OUC-ACLO, por meio de oficinas participativas e debates regionais, com caráter de consulta pública, nos quais as pessoas possam apresentar propostas, objeções, questionamentos; 4) realizar audiências públicas que devem abordar vários tópicos previstos no acordo pelo MP. Tais audiências deverão ser gravadas e filmadas, amplamente divulgadas com antecedência mínima de 15 dias e ter posterior divulgação das propostas apresentadas pela população; 5) atendimento contínuo de plantão presencial e via internet à qualquer pessoa interessada (tudo isso antes da conclusão do plano urbanístico da OUC-ACLO e dos estudos de impacto); 6) obrigação de responder e divulgar na internet todos os questionamentos da sociedade civil; 7) obrigação de demonstrar ao Ministério Público, a cada 2 meses, o cumprimento das medidas pactuadas; e outras obrigações que, caso não cumpridas, implica em crime de improbidade administrativa. (INDISCIPLINAR, OUC ACLO)
Esse acordo judicial abre precedentes na luta de movimentos populares por real participação no planejamento urbano, que como se viu até agora nesse trabalho, na atual conformação da legislação e práticas administrativas, não tem passado, na maior parte das vezes, do discurso. O Indisciplinar - Grupo de Pesquisa da Escola de Arquitetura Urbanismo e Design Universidade da Federal de Minas Gerais (UFMG) – foi quem produziu o dossiê entregue ao Ministério Público e que fundamentou a ação contra a Nova BH, o que coloca na conformação da OUC-ACLO a participação também da academia, junto aos movimentos populares.
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Embora o projeto seja bem próximo do original, as principais alterações foram incluir as extremidades leste e oeste na operação, para que a área também usufrua dos benefícios da OUC; a revisão dos parâmetros urbanísticos de acordo com a IV Conferência Municipal de Política Urbana (CMPU), tornando tais parâmetros dependentes da aprovação do Novo Plano Diretor de Belo Horizonte; o incentivo a tipologias habitacionais para a população que não possui carro e utiliza frequentemente o transporte público; a previsão de etapas para a implementação do projetos para garantir a distribuição de recursos de forma mais igualitária entre as áreas; o aprimoramento do Plano de Atendimento Econômico Social; o leilão dos CEPACs por etapa; a estrutura de gestão geral e local e a previsão de construção de habitação de interesse social (HIS) com recursos da OUC (INDISCIPLINAR, OUC ACLO). Apesar das OUCs serem um ponto central deste trabalho, o objetivo é o de verificar e analisar as formas de interação e participação de arquitetos e urbanistas relativamente a este instrumento urbanístico. Nesse sentido, considerando tal escopo, não cabe um detalhamento aprofundado das principais características constantes na proposta da OUC-ACLO ainda não aprovada para implementação - majoritariamente, por depender da aprovação do novo plano diretor ainda em tramitação na Câmara.
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6. ANÁLISE DA OPERAÇÃO URBANA CONSORCIADA ANTONIO CARLOS + LESTE/OESTE
A Nova BH foi idealizada pelo conjunto de três construtoras, a Andrade Gutierrez, a Barbosa Melo e a Odebrecht, e pretendia aumentar os potenciais construtivos em uma região extensa que compreendia alguns dos principais corredores de transporte da cidade. Segundos relatos de arquitetos envolvidos e com os quais pude conversar durante as atividades de campo, a proposta chegou pronta para a Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, sem conhecimento prévio do setor técnico (FIGURA 12). Foi somente na sua apresentação que outros setores da cidade tiveram conhecimento. Tal apresentação pública aconteceu no Seminário Mineiro de Direito Urbanístico em 2013, através do, na época, Secretário Adjunto de Planejamento Urbano da prefeitura, Marcello Faulhaber, com um discurso deliberadamente mercadófilo. Em tal apresentação, o Secretário “conceitou as OUCs como um pacto entre a cidade e o mercado imobiliário e sustentou que é um excelente negócio para o mercado, por isso [as operações urbanas consorciadas] são tão bem sucedidas” (MAYER, 2013).
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Figura 12: relação dos atores na Nova BH
No período de aprovação da Nova BH um conjunto de associações de moradores e movimentos coletivos começaram a se organizar para tentar impedir a operação já que todo o processo, além de não divulgado para sociedade civil, foi apresentado de forma técnica e elaborado sem participação. Neste âmbito, é importante ressaltar que a presença de arquitetos e urbanistas nos movimentos sociais auxiliou o entendimento e criação de estratégias para tal organização.
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Assim, a sociedade civil, aqui representada pela união de associações de moradores e movimentos sociais pediu auxílio ao Ministério Público Estadual para que a Nova BH fosse barrada. O MP, com auxílio do grupo de pesquisa Indisciplinar, que criou o dossiê sobre a operação, declarou ao COMPUR a inconstitucionalidade do projeto, uma vez que não houve participação popular (FIGURA 13).
Figura 13: relação dos atores durante processo do MP
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Conforme já mencionado, foi pela atuação do MP, a partir das demandas do Indisciplinar e dos movimentos sociais, que a Nova-BH foi questionada e suspensa. Assim, nasce a OUC-ACLO12, em um contexto de luta por participação popular. Comparada a outras operações urbanas consorciadas e, principalmente, segundo relatos de arquitetos e urbanistas envolvidos, tal operação teve uma divulgação e participação pioneiras no país. A partir deste ponto, a operação será discutida junto com as relações dos arquitetos e urbanistas envolvidos, portanto deve-se ressaltar que a OUC-ACLO foi totalmente elaborada, porém ainda não foi enviada para aprovação, por motivos que serão discutidos a seguir.
6.1.
A OUC-ACLO NO ÂMBITO DA CARTOGRAFIA
Como principal atividade relacionada ao método cartográfico neste trabalho, para além das informações secundárias levantadas, foram realizadas conversas com arquitetos e urbanistas envolvidos nos processos tanto da Operação Urbana Consorciada Antônio Carlos + Leste/Oeste quanto da sua precedente, a Nova BH. Quanto ao primeiro aspecto, foram pesquisadas as informações referentes à própria OUC-ACLO e artigos, reportagens e matérias a ela relacionadas. No que diz respeito às conversas, elas ocorreram entre outubro e novembro de 2017 na cidade de Belo Horizonte. De início, foram procurados profissionais que, de antemão, já haviam sido identificados no decorrer dos estudos. A partir da indicação desses, outros arquitetos e urbanistas também foram contatados.
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Como meio de interferir na busca de informações, tal operação teve diversas denominações pelo Diário Oficial do Município. Segundo Fernanda Chagas “a partir do final de 2011, diversas publicações no Diário Oficial do Município fazem referência à realização de uma Operação Urbana na região, ora chamada de ‘área de especial interesse urbanístico do Vale do Rio Arrudas’ ora de ‘operação urbana consorciada das Avenidas Andradas / Tereza Cristina / Via Expressa”’ (BRUZZI apud CHAGAS, 2013).
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6.1.1. PESQUISA DE CAMPO As conversas foram realizadas com o intuito de entender as várias formas de atuação do arquiteto e urbanista em relação aos processos relacionados às OUCs em questão e como estes se relacionavam dentro do conjunto de discussões a elas referentes. Para tal, buscamos estruturar os pontos a serem explorados na conversa, que foram, essencialmente, suas relações, fala e local de fala dentro desse contexto. Durante a conversa, optamos por apresentar o assunto geral da pesquisa e prezar pela livre fala do arquiteto e urbanista. Somente quando algum dos pontos de interesse não fossem abordados seriam feitos direcionamentos com o intuito de compreender certas questões, listadas a seguir: Cargo e função na instituição, empresa, ou movimento com o objetivo de entender o local de fala do arquiteto e urbanista, uma vez que nenhum discurso é neutro; A relação direta ou indireta do trabalho com as OUCs no intuito de reforçar a perspectiva anterior, ou seja, o local de fala, segundo o próprio arquiteto e urbanista; Objetivos diretos ou indiretos relacionados ao trabalho do arquiteto e urbanista com estas OUCs para que se pudesse entender o que pretendiam com tal atuação; O alcance dos objetivos; A interação, durante as atividades relacionadas a essas OUCs, com outros arquitetos e urbanistas e suas respectivas instituições, empresas ou movimentos. Este ponto buscava compreender as relações entre os profissionais durante os processos; De que modos tais interações influenciaram no alcance de seus objetivos; As dificuldades enfrentadas durante as atividades desempenhadas com relação a essas OUCs; Os impactos, na atividade profissional, das atividades relacionadas à participação nas OUCs;
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O posicionamento do Arquiteto e Urbanista frente ao instrumento urbanístico "operação urbana consorciada” para que se pudesse verificar como tal profissional se coloca de forma consciente e declarada sobre o tema. Todas as conversas aconteceram em encontros presenciais para que houvesse uma melhor absorção das informações. Posteriormente, as relações e atores apresentados serão sintetizados de forma gráfica e as análises feitas de forma textual. Todas as informações a partir deste ponto, incluindo os desenhos da cartografia, foram feitos exclusivamente a partir das falas dos arquitetos e urbanistas com os quais pude conversar. Ao total foram realizadas oito conversas que buscaram contemplar arquitetos e urbanistas que desenvolvem suas atividades profissionais em setores diversos: academia, Câmara dos Vereadores, empresas privadas, Ministério Público, Prefeitura e sociedade civil (FIGURA 14). Destes grupos, quatro são representados por arquitetos e urbanistas que participaram das conversas – academia, empresas privadas, Prefeitura e sociedade civil –, e dois foram apresentados por tais profissionais – Câmara dos Vereadores e Ministério Público.
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Figura 14: grupos de atores
Para resguardar a identidade de cada um dos profissionais que contribuíram com esta pesquisa, optamos por não divulgar seus nomes, mas por indicar os setores nos quais atuam ou atuaram. Abaixo, mostraremos um quadro resumo com as principais informações de cada um desses arquitetos e urbanistas – os pictogramas utilizados para identificar os setores de atuação coincidem com aqueles listados na figura acima - assim como o conteúdo das conversas.
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O primeiro profissional13 trabalhou na Gerência de Planejamento Urbano (GPUR), onde participou da elaboração da OUC-ACLO. Além disso, teve vínculo com a academia, exercendo a função de docente no ensino superior. Segundo ele, metade dos integrantes do GPUR eram arquitetos e urbanistas e a construção da OUC-ACLO foi um trabalho conjunto entre todos os profissionais dessa gerência. A proporção da operação trouxe desafios novos para o planejamento na cidade e, para isso, recorreram a alguns técnicos da Prefeitura do Município de São Paulo para aconselhamento devido a experiência que já haviam obtido em função das grandes OUCs implementadas naquela cidade – uma delas, como evidenciamos, foi a Faria Lima. Quando eram necessários projetos arquitetônicos ou urbanísticos para o desenho da cidade eram contratadas empresas ou escritórios arquitetônicos para a tarefa, sendo todos os mencionados acima o seu relacionamento com arquitetos no processo. Em relação aos direcionamentos dos profissionais, afirma que há uma preferência dos arquitetos entre as área de projeto e de planejamento, sendo que os profissionais da prefeitura tem inclinação ao planejamento. A falta do estudo de viabilidade financeira pela demora do processo de licitação é o que, no seu entender, levou à não concretização do projeto. A principal influência em sua carreira foi o ganho de experiência. 13
Esta conversa aconteceu no dia 24 de outubro de 2017, no prédio da FAU-UFMG.
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Em relação ao instrumento de política urbana “operação urbana consorciada”, diz que é um instrumento dissimulado. A curto prazo seus efeitos são muito positivos, além de trazer escala ao zoneamento, entretanto, é concentrador de renda, não traz diversidade à cidade e acontece apenas onde já existe interesse econômico e imobiliário. RESUMO
Cargo e função: membro do GPUR
A relação com as OUCs: participou da elaboração da OUC-ACLO
Objetivos: elaborar o caderno da operação
O alcance dos objetivos: o caderno foi concluído
A interação com outros arquitetos e urbanistas: dentro da própria equipe do GPUR e aqueles contratados para projeto de desenhos urbanos para a operação
Influência de tais interações: benéfica
As dificuldades enfrentadas: falta de apoio popular por conta da forma como procedeu a Nova BH
Os impactos na atividade profissional: ganho de experiência
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Este arquiteto e urbanista foi representante da Subsecretaria de Regulação Urbana14, pertencente à Secretaria de Políticas Urbanas no processo de discussão da OUC-ACLO, enquanto mantinha ativo seu escritório. Nas dinâmicas, teve bastante contato com arquitetos do setor privado, de construtoras e de outras secretarias. Organizava dinâmicas e acredita que o arquiteto tenha um papel gestor. Nesse processo, teve como dificuldade a efetividade da teoria, e teve problemas de aceitação dos envolvidos com a funcionalidade da OUC-ACLO e, principalmente, com o aluguel social proposto para a operação. Entretanto, o caráter de intermediação do seu trabalho na operação teve retorno muito positivo no seu trabalho posterior. Para este arquiteto e urbanista, o instrumento operação urbana consorciada é muito inteligente, pois aproveita uma estrutura já existe e incentiva a convivência entre público, privado e acadêmico, e quando há uma participação rasa é porque teve um estudo raso. Entretanto, a demora do processo deveria ser diminuída para sua melhor aplicação. RESUMO
Cargo e função: membro da SUREG
A relação com as OUCs: acompanhou o processo participativo
Objetivos: intermediar os encontros
O alcance dos objetivos: completou seu objetivo
A interação com outros arquitetos e urbanistas: trabalhou com arquitetos e urbanistas do corpo técnico da própria prefeitura, da sociedade civil e de empresas privadas
Influência de tais interações: benéfica para o processo
As dificuldades enfrentadas: conciliar opiniões opostas
Os impactos na atividade profissional: ganho de experiência
14
Esta conversa aconteceu no dia 25 de outubro de 2017, no escritório do profissional.
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Participou do COMPUR como corpo técnico durante a fase de análise do 15
EIV . Enquanto isso ministrava aulas e mantinha seu próprio escritório, embora suas três frentes de trabalho não tivessem tido relação. Manteve o discurso neutro, sem grandes informações sobre o processo e as relações. Sobre o instrumento, acredita ter ótima aplicação e que a comunidade acadêmica o demoniza sem necessidade. Diz que o problema está nos setores públicos não entenderem seu papel, o que faz com que os setores privados se aproveitem. RESUMO
Cargo e função: membro do setor técnico do COMPUR
A relação com as OUCs: participar do processo de aprovação junto ao COMPUR
Objetivos: não declarado objetivamente
O alcance dos objetivos: não declarado objetivamente
A interação com outros arquitetos e urbanistas: declarou contato apenas dentro do próprio COMPUR
Influência de tais interações: não declarado objetivamente
As dificuldades enfrentadas: não declarado objetivamente
Os impactos na atividade profissional: ganho de experiência
15
Esta conversa aconteceu no dia 27 de outubro de 2017, no ambiente de ensino do profissional.
54
Este arquiteto e urbanista participou do COMPUR no setor técnico 16, e tinha sua vaga vinculada ao cargo discente que também ocupava. Enquanto isso, também mantinha vinculação com movimentos sociais envolvidos com a OUC-ACLO. Tem posicionamento contra a implantação de tal operação e aponta os jogos que acontecem no processo de aprovação. Teve muito ganho de experiência por causa do seu envolvimento, conseguindo ver “por trás do Estatuto”. Sobre as OUCs, a forma como são praticadas não é apenas uma aplicação deturpada, pois o instrumento não foi teorizado ingenuamente mas foi escrito como forma de negociação para a conseguir implementar outros instrumentos. RESUMO
Cargo e função: membro do corpo técnico do COMPUR
A relação com as OUCs: participar do processo de aprovação
Objetivos: ponderar sobre a operação e impedir perdas à população
O alcance dos objetivos: houve perdas e ganhos
A interação com outros arquitetos e urbanistas: dentro do COMPUR, na academia e, durante todo o processo, em movimentos sociais e Prefeitura
16
Influência de tais interações: não influenciou seus demais campos de trabalho
Esta conversa aconteceu no dia 12 de dezembro de 2017, no escritório do profissional.
55
As dificuldades enfrentadas: o “jogo” que acontece antes dos meios oficiais, que leva ao COMPUR uma situação já pré-estabelecida antes da reunião que discutiria certo tema
Os impactos na atividade profissional: ganho de experiência
Este arquiteto e urbanista participou do processo na fase de discussão participando de um dos movimentos sociais envolvidos17. Teve contato com arquitetos e urbanista que formavam o corpo técnico da prefeitura e do grupo de pesquisa Indisciplinar, com os quais teve boa relação, mas não se encontrou com representantes de construtoras nas discussões que participava. O principal embate participado foi sobre o corte de capital de giro da OUCACLO com empresários. Em todo o processo, teve ganhos e perdas em relação a seus objetivos. O instrumento tem aplicação perigosa, com teorização que tente para benefícios para o capital. No modelo que existe hoje é segregador e excludente, mas pode existir desde que lapidado.
17
Esta conversa aconteceu no dia 29 de outubro de 2017, no Mercado Santa Tereza, em Belo Horizonte.
56
RESUMO
Cargo e função: membro do Movimento Salve Santa Tereza
A relação com as OUCs: participou das discussões no processo participativo
Objetivos: impedir grandes empreendimentos no bairro Santa Tereza
O alcance dos objetivos: houve perdas e ganhos
A interação com outros arquitetos e urbanistas: profissionais de outros movimentos sócias, da academia e da prefeitura
Influência de tais interações: neutra
As dificuldades enfrentadas: o maior poder nas decisões dos empresários
Os impactos na atividade profissional: ganho de experiência
Trabalhou como técnico da prefeitura na transposição dos conceitos para a forma de legislação e atualmente ministra aulas18. Se relacionou com dois grandes contratos na OUC-ACLO: o primeiro para a proposta econômica, sem a presença de arquitetos e urbanistas, e o segundo sendo um consorcio entre as construtoras Barbosa Melo, Andrade Gutierrez e o escritório Gustavo Penna.
18
Esta conversa aconteceu no dia 7 de novembro de 2017, no ambiente de trabalho do profissional.
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Sua principal dificuldade foi a desconfiança, principalmente do setor popular, remanescente da Nova BH. Teve todo o processo como ganho de experiência. Sobre as OUCs, tem potencial positivo pois a principal dificuldade da prefeitura com implementação de estrutura é o custo financeiro, e o instrumento cria uma linha de financiamento, teoricamente. Entretanto, ainda não conseguiu atingir maturidade na sua aplicação, e precisa equilibrar a participação da população com a adesão do privado. De modo geral, os arquitetos e urbanistas têm papel limitado pois as OUCs são um processo político. E ainda assim, após a ida do projeto para a câmara dos vereadores, o arquiteto perde total controle sobre o que será aprovado. RESUMO
Cargo e função: membro da Subsecretaria de Planejamento Urbano
A relação com as OUCs: trabalhou no projeto da operação
Objetivos: transcrever o projeto em lei
O alcance dos objetivos: a transcrição foi realizada, mas não chegou a ser enviada à Câmara dos Vereadores.
A interação com outros arquitetos e urbanistas: apenas com outros técnicos da prefeitura, embora tenha conhecimento de outras áreas que envolvem a profissão
Influência de tais interações: neutra
As dificuldades enfrentadas: em relação ao seu objetivo não houve, mas afirma que o processo político envolvido dificulta a real execução do projeto.
Os impactos na atividade profissional: ganho de experiência
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Este arquiteto e urbanista teve envolvimento acadêmico com a operação, participando das discussões também com o interesse de avaliar temas ligados a ela19. Após o auxílio do grupo Indisciplinar com a formulação de um dossiê sobre a Nova BH, o MP entrou com uma ação civil pública alegando inconstitucionalidade pela falta de participação popular na operação. A partir de então, na OUC-ACLO, houve uma reformulação da OUC na prefeitura, mas a partir do texto da Nova BH. O corpo técnico da prefeitura, agora o grande mediador das discussões da operação, foi muito receptivo com a sociedade civil, A forma como o instrumento foi usado até hoje é nociva, mas a OUC-ACLO é uma tentativa de realmente atacar os problemas urbanos. O problema das OUCs é a financeirização da terra urbana, e a OUC-ACLO tem estratégias para diminuir a especulação financeira. Ela é um grande teste para se entender se, com uma construção que vá além da participação do capital, o instrumento de operação urbana consorciada pode dar certo. RESUMO
Cargo e função: estudante da EAD-UFMG
A relação com as OUCs: participou como ouvinte
Objetivos: entender o processo participativo para realização de seu trabalho final de graduação
19
O alcance dos objetivos: conseguiu participar de maneira extensa Esta conversa aconteceu no dia 9 de novembro de 2017, no ambiente pessoal do profissional.
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A interação com outros arquitetos e urbanistas: compilou todos os arquitetos que teve contato, e estes foram das mais diversas áreas dentro da operação
Influência de tais interações: ganho de experiência
As dificuldades enfrentadas: não houve
Os impactos na atividade profissional: ganho de experiência
Este estudante de arquitetura e urbanismo teve participação constante nos processos desde a descoberta da Nova BH até as últimas discussões da OUCACLO, como participante de movimentos sociais e representante de entidades estudantis20. A Nova BH não teve participação nem dentro da prefeitura, e os técnicos também a desconheciam. Foi criada pelas construtoras e entregue pronta. A luta por participação popular teve que ser constante, pois membros do conselho que não concordavam com o jogo político decidido fora dos meios formais e se posicionavam contra era rapidamente trocados. OUC é um instrumento problemático pois não temos políticas urbanas estruturadas. A abrangência de uma operação não se limita ao seu desenho, o que torna complexo de definir sua real modificação da cidade. É também democraticamente frágil, pois sua execução permite que as regras sejam arbitrárias. 20
Esta conversa aconteceu no dia 20 de novembro de 2017, no Palácio das Artes, em Belo Horizonte.
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RESUMO
Cargo e função: estudante de arquitetura e urbanismo da EAD-UFMG
A relação com as OUCs: participou ativamente como sociedade civil
Objetivos: acompanhar e participar da elaboração da operação
O alcance dos objetivos: embora houvesse barreiras, conseguiu acompanhar todo o processo
A interação com outros arquitetos e urbanistas: de todos os grupos classificados
Influência de tais interações: ganho de experiência
As dificuldades enfrentadas: houve muitos enfrentamentos e criação de barreiras a favor dos empresários
Os impactos na atividade profissional: entender melhor como pode ser a atuação do arquiteto
6.1.2. O DESENHO CARTOGRÁFICO
Das interrelações apresentadas pelos arquitetos e urbanistas acima, criamos um rizoma, modelo descritivo criado por Deleuze e Guattari, com a intenção de explicitar tais relações. Com o que foi exposto até aqui das conversas acontecidas na pesquisa de campo, surgiu o diagrama abaixo:
Subsec. de Regulação Urbana
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PREFEITURA SP GRUPO ACADEMIA
Subsec. de Planejamento Urbano
IAB Secretaria Municipal de Política Urbana
GRUPO SETOR PÚBLICO GRUPO MP
contratos
GRUPO SOCIEDADE CIVIL GRUPO CÂMARA DO VEREADORES GRUPO EMPRESAS PRIVADAS
COMPUR Escritórios
pREFEITURA bh
RELAÇÕES DIRETAS RELAÇÃO DE COLABORAÇÃO RELAÇÕES NÃO-CONTÍNUAS RELAÇÕES FUTURAS
empresas privadas
Indisciplinar
Construtoras
OUC ACLO
Grupos formalizados
ACADEMIA
Açoes individuais
mINISTERIO pUBLICO
Movimentos Sociais
sociedade civil
Associações de Moradores
cartografia dos atores na oucaclo
CAMARA
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Conforme podemos observar, há tanto perspectivas distintas como pontos em comum nos discursos dos arquitetos e urbanistas que contribuíram para este trabalho. É notório que muitos discursos se chocam, e isto principalmente pelo local de fala do ator. Para evitar possíveis reconhecimentos alguns desses embates foram suprimidos, entretanto uma situação recorrente durante as conversas é a omissão de algumas informações, geralmente por aquele em uma posição de maior destaque e com seu grupo e local favorecido pela ação em questão que depois é revelada em outra conversa e se mostra uma informação importante para o decorrer do processo. A escolha pelo método cartográfico de levantar todos os dados a partir somente das conversas deixou claro, durante o processo, de que o arquiteto pode participar de qualquer grupo de interesse da cidade, e seu discurso se molda ao seu local, como acontece com qualquer outro ator. Ao final deste trabalho, percebe-se dois pontos muito evidentes relacionados a atuação do arquiteto na cidade: Primeiro: a gestão e o planejamento urbano teorizados e ensinados academicamente pouco preparam para o que se é praticado. Seja o Estatuto da Cidade ou qualquer outra lei ou teoria ensinada pela academia por ser interpretava, burlada e enviesada pelas mais diversas maneiras, tão únicas para cada caso, que a única forma de preparar o arquiteto e urbanista para tal área é o trabalho no campo. Mostra disso é a unanimidade dos arquitetos e urbanistas ouvidos neste trabalho sobre o ganho de experiência com o envolvimento com esta operação, independente da carreira prévia de cada um. E por último, a falta de estrutura de planejamento e gestão urbana que há atualmente. O arquiteto realmente pode participar do planejamento da cidade por diversos meios, o que não significa que efetivamente irá participar de todo o processo, e uma vez que uma operação urbana consorciada é entregue para aprovação na câmara dos vereadores, embora exista arquiteto e urbanista no corpo técnico da câmara, este não necessariamente será consultado e o legislativo tem total autonomia para modificar qualquer trecho do corpo do projeto. Saindo do âmbito do arquiteto e pensando na participação popular, considerando que o arquiteto também se insere nesse grupo, a OUC-ACLO foi elogiada por
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alguns arquitetos e urbanistas pela sua participação popular, mas esta se mostra novidade e conquistada através de muitas lutas. A OUC-ACLO está agora parada, já que depende da aprovação do novo plano diretor municipal, com coeficiente de aproveitamento um para toda a cidade, para que se torne economicamente interessante. Logo, não foi possível analisar o processo de sua aprovação.
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7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A criação do Estatuto da Cidade e todos os mecanismos de política pública envolvidos foi um marco da democracia brasileira e um grande avanço nas lutas populares pela reforma urbana. Entretanto, a prática de construir cidades, antes de depois do seu advento, sempre serviu ao interesse privado e tais mecanismos, como a operação urbana consorciada, serviu para institucionalizar a entrada de capital e interesses privados na vida pública. O meio urbano é ambiente de uma luta incessante entre classes, e cada período da história urbana mostra um capítulo de como isso se consolida no espaço. A Operação Urbana Consorciada Antônio Carlos Leste/Oeste marca a entrada de pequenas vitórias por parte das camadas mais baixas, através da união entre movimentos populares e a academia. O discurso social que a legislação pode ter e a falsa democracia que nela é mostrada oculta as diversas formas de coalizão que o governo público e as empresas privadas podem criar. Talvez a forma mais complexa de enfrentar seja quem ocupa que cargo e favor de quem. O jogo de atores, esses com nomes próprios e representações claras, está além do que a legislação atual consegue controlar e permanecer jogando demanda tempo, criatividade e coragem para enfrentar algo tão complexo e mutável, principalmente quando se faz parte do grupo que não possui recursos financeiros e interesses econômicos.
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8. REFERENCIA BIBLIOGRÁFICA
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