PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, COMUNICAÇÃO, LETRAS E ARTES CURSO DE COMUNICAÇÃO E MULTIMEIOS Janaína viegas siqueira
identidades abjetas: uma reflexão sobre o não-lugar do negro lgbt na cidade de são paulo
são paulo 2015 1
Janaína viegas siqueira
identidades abjetas: uma reflexão sobre o não-lugar do negro lgbt na cidade de são paulo
Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado a Pontifícia Universida-
de Católica de São Paulo, como requisito à obtenção do título de Bacharel em Comunicação e Multimeios.
São Paulo, 16 de novembro de 2015.
banca examinadora
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AGRADECIMENTOS
Dedico esse trabalho à todas as pessoas que fazem parte da minha vida. A todos
aqueles que, através de olhares, conversas e gestos de compreensão, diariamente reafir-
mam a beleza de estar vivo - apesar dos pesares e das angústias resultantes das proble-
matizações constantes com as quais não é possível viver sem. Dedico meu esforço a toda
minha família (e peço desculpas por ter me afastado durante o período de produção desse projeto); a minha avó Margot, por me mostrar que o amor, a compreensão e a paciência
são fundamentais para o mantenimento da sanidade mental. Ao meu avô Drauzio, por sempre manter viva a chama daquilo que nos torna humanos com seu jeito encantador
de menino sonhador. À minha mãe Luiza, por absolutamente tudo, e principalmente por me mostrar que o conformismo é a pior das mazelas humanas e que a liberdade é a única
coisa pela qual vale a pena viver. A minha tia Cecília, por todo o amor que sempre demons-
trou ao querer me proteger e me guiar nos caminhos do mundo. Meus irmãos, Lucas e Laila, por me darem fé no futuro - ao meu pai Adilson, pela liberdade que inspira.
A TODOS os meus amigos, maravilhosos, incríveis e poderosos, que me fazem cho-
rar de rir e rir de chorar, enquanto seguimos evoluindo juntos, tramando revoluções que
revolucionam apenas por existirem em nossas conversas em mesas de bares pela cidade. Ao meu maninho de alma, Vinícius Pereira por colcoar um pouco de razão na loucura e de loucura na razão. Ao menino Caio Lopes, porque se não fosse pela nossa sintonia mental,
musical e existencial, eu jamais teria tido clareza mental suficiente para realizar esse tra-
balho. Ao menino Theo Barreto, por me mostrar que nossa simples existência já é um ato político. A Amanda Smith, por me ajudar na finalização, por provar que a verdadeira ami-
zade não tem nada a ver com o tempo e por ter me dado forças para querer surpreender a
todos aqueles que não esperavam nada de mim. A Marina Cruz, pela ajuda, paciência, po-
litização e todo o mais, que é muito. Ao menino Fernando Imai, por ser uma das criaturas mais especiais que já pisou nessa terra. A Helena Obersteiner, por me mostrar que sim, é
possível realizar o que você quer do jeito que você quer - mas tem que querer de verdade.
A Na Gian, por ser o mais puro amor em pessoa e pelo carinho tão sincero da nossa ami3
zade. A Marina Affarez, por estar do meu lado nesses tempos corridos e complexos e por me mostrar novas perspectivas e possibilidades de existir, lutar, resistir e amar. E também por tudo aquilo que não posso escrever aqui.
A todos meus irmãos desse laboratório de sonhos que é a Vaidapé. A mana Pati
Iglecio, porque é nóis sempre mina. Ao meu mano João “sujão” Miranda, por ter me ajuda-
do demais a concluir esse trabalho e por nunca desacreditar da missão, mesmo que isso signifique ter que lidar com tretas das mais gigantescas, mas que se resolvem na vontade de mudar o mundo. Ao menino Henrique “Ique” Santana, porque sem você não ia dar pé.
Ao coletivo NegraSô, por me acolher e me mostrar que quando nóis junta, não tem pra ninguém. Aos meus professores, com uma admiração especial a minha orientadora Zuleica Camargo, por tolerar meus atrasos e me ajudar mesmo em momentos da maior correria.
A Ezio Rosa, Luana Hansen, Fernando Ribeiro e Rafaelly Domingues por terem me
recebido em suas casas e compartilhado suas vivências em tardes extremamente agradáveis.
A todos aqueles que já se sentiram excluídos por serem quem são. A todos aqueles
que me mostraram exatamente o que eu não quero ser. A todos aqueles que já foram dimi-
nuídos por não estarem de acordo com o que é norma pra essa sociedade doente. A todas minhas irmãs e irmãos de cor que padeceram nas mãos da injustiça. A todos aqueles que
foram negados o direito de amar - todos aqueles que foram negados o direito de existir, de gritar e de se nomear - mas que mesmo assim se recusam a calar. A todxs os pretxs, as bichas, as sapas e as travestis. É nóis por nóis ou nunca será.
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Resumo
O produto aqui apresentado é um web série documental de representação social,
através do qual são narradas vivências, reinvidicações e problematizações a respeito do
não-lugar ocupado por indivíduos que vivem na interseção entre ser negro e LGBTT nas
periferias da cidade de São Paulo. Utilizando como base teorias a respeito do poder do discurso e a da construção identitária dele resultante, esse trabalho se coloca como uma
reflexão sobre o papel da mídia hegemônica na formação de identidades e abjeções, em especial quando na posição de narradora da vivência de sujeitos históricamente excluídos. Palavras-chave: Websérie, LGBTT, Negro, Mídia, Representatividade
Abstract The following work is a documental web-series of social representation, showing
the lives, struggles and demands of those who experience the intersection of being black
and LGBTT in the outskirts of São Paulo. Based on theories that reflect the power of discourse in the construction of identity, this work is a reflexion concerning the role of hege-
monic media in the formation process of identidies and abjections, specially when narrating the lives of those historically excluded.
Keywords: Webseries, LGBTT, Blackness, Projects, Media, Representation
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Sumário
1. Introdução..............................................................................................................................08 2. Fundamentação teórica...................................................................................................12 3. Diretriz Conceitual do produto...............................................................................25 3.1. referências audiovisuais.....................................................................................28 3.2. Diretriz audiovisual.............................................................................................31 3.3. Perfil do usuário......................................................................................................34 4. Roteiro.......................................................................................................................................35 4.1. Eleição e descrição dos objetos....................................................................35 4.2. Estratégias de abordagem...............................................................................36 4.3 – Estrutura ..................................................................................................................37 5. etapas de produção.............................................................................................................38 6. Considerações finais .........................................................................................................40 7. Bibliografia............................................................................................................................42 7.2. Referências fílmicas.......................................................................................................42 7.3. Referências bibliográficas........................................................................................43
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Lista de figuras:
Figura 01: Frame extraído do 7o episódio da série “Strolling” etirado do site: http://www.strollingseries.com/strolling#/strolling7/
Figura 04: Frame extraído do 8o episódio da série “Strolling” retirado do site: http://www.strollingseries.com/strolling#/strolling8/
Página 28 28
Figura 05: Imagem extraída do 1o episódio da série “Polyglot”, retirado do site: <https://vimeo.com/125791835>
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Figura 06: Imagem extraída do 1o episódio da série “Polyglot”, retirado do site: <https://vimeo.com/125791835>
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Figura 07: Frame extraído do ep. 4 da série “Empoderadas”
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Figura 08: Frame extraído do ep. 5 série “Empoderadas”
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Figura 08: Frame extraído de episódio da série “O Que É o Rap com MC Sombra”
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retirado do site: <https://www.facebook.com/programaempoderadas/videos> retirado do site: <https://www.facebook.com/programaempoderadas/videos> retirado do site: <vaidape.com.br/blog/category/o-que-e-o-rap/>
Figura 08: Frame extraído de episódio da série “O Que É o Rap com Rashid” retirado do site: <vaidape.com.br/blog/category/o-que-e-o-rap/>
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1. Introdução
Pensar em como atua a interseção das opressões raciais e de gênero, explorar os
efeitos da construção e da legitimação de discursos sobre os corpos de indivíduos historicamente excluídos, paralelamente às configurações sócio espaciais da cidade de São Paulo.
O presente trabalho apresenta-se no formato de uma produção audiovisual, reali-
zada com o intuito de auxiliar na luta por uma representatividade contrária a reprodução de estereótipos e discursos normatizantes, conveniente reafirmados por instituições e meios de comunicação hegemônicos.
Propõe-se, portanto, uma abordagem da questão da representatividade para além
da simples presença de negros e LGBTTs (Lésbicas, Gays, Bisexuais, Transexuais e Trans-
gêneros) na mídia, questionando sua ausência como produtores de conteúdo uma vez que são donos de suas próprias vozes, e conscientes das forças que atuam em prol de seu silenciamento, ao impedi-los de protagonizarem narrativas construídas a seu respeito.
Usar de meu privilégio ao acesso a meios de produção audiovisual na tentativa de
ampliar o alcance das narrativas pessoais daqueles que sentem na pele o que significa viver no último país a abolir a escravidão nas Américas, no qual 63% dos mais de 30 mil jo-
vens assassinados em 2012 eram negros1 e onde uma pessoa LGBTT é assassinada a cada 26 horas2. Partindo da crença de que a real compreensão desses dados infere enxergá-los
não apenas como cifras assustadoras, mas sim como fatores sintomáticos de violências
simbólicas, discursivas e institucionais que perduram na sociedade brasileira, desenvolvi, ao longo do ano de 2015, o TCC aqui apresentado.
Uma vez que minha própria etnia, orientação sexual e identidade de gênero forçam
reflexões acerca da temática que circunda a produção, minhas vivências pessoais influencia FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. BRASIL: Tábua Completa de Mortalidade. Disponível em: <http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=88&data=01/12/2014>. Acesso em: 27 set. 2015.
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GRUPO GAY DA BAHIA, 2012. Relatório assassinatos de homossexuais (LGBT) no Brasil. Disponível em: <https://grupogaydabahia.files.wordpress.com/2013/06/relatorio-20126.pdf>. Acesso em 27 abr. 2015
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ram fortemente na decisão de realizar essa série. Sendo uma pessoa negra e homossexual, que durante toda a vida esteve inserida em ambientes predominantemente brancos e heteronormativos, o questionamento a respeito da ausência ou da sub-representação de pessoas
negras e LGBTT em filmes, livros e séries de televisão foi inevitável. Ao procurar referências em meios tradicionais, deparei com um universo no qual pessoas como eu pareciam estar fadadas a vivenciar apenas situações de cunho negativo, sendo sempre narradas como criminosas, degeneradas e antissociais.
E aí repousa o ponto mais crucial e talvez mais sútil de minha análise, fundamental
para a concepção do produto audiovisual aqui apresentado: a forma como grupos sociais específicos são majoritariamente narrados, raramente narradores de suas próprias histórias.
Vamos tomar como base o fato de que, no Brasil, a cada 10 jornalistas, apenas 2 são
negros, segundo levantamento da FNJ3. Dentro do ambiente acadêmico, destaca-se a cifra
de 1%4 referente ao número de professores universitários autodeclarados negros. Diante
deste cenário, fica claro como a produção acadêmica e midiática constitutiva de discursos a respeito do negro no Brasil é quase que exclusivamente elaborada por indivíduos brancos e
de posição social elevada, que inevitavelmente reproduzem discursos e legitimam práticas sociais e institucionais que contribuem para a manutenção do racismo.
Quanto a questão da representatividade LGBTT, compreender os domínios do gê-
nero e do sexo como imersos em relações sociais de poder construídas historicamente através de dispositivos institucionais, valores religiosos, morais, médicos e científicos que produzem discursos normatizantes, infere a compreensão do papel ativo que os
meios de comunicação hegemônicos possuem na construção simbólica de comportamentos sociais tidos como aceitáveis ou não.
A mídia se configura como um espaço importante no processo de construção da 3 Federação Nacional dos Jornalistas - FENAJ: Perfil do jornalista brasileiro - Características demográficas, políticas e do trabalho (2012). Disponível em: <http://www.fenaj.org.br/relinstitu/pesquisa_perfil_jornalista_brasileiro.pdf>. Acesso em: 27 set. 2015. 4 CARVALHO, J. JORGE. O confinamento racial do mundo acadêmico brasileiro. REVISTA USP, São Paulo, n.68, p. 88-103, dezembro/fevereiro 2005-2006.
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sexualidade, uma vez que socializa significados e discursos. (MAKSUD, 2000). Tomemos como exemplo o surgimento da AIDS, nos anos 1980 e a forma como a postura da mídia foi determinante na construção de representações da epidemia. Ao focar em certos enqua-
dramentos que relacionavam a doença à homossexualidade, se implantou no imaginário
popular a noção de que a AIDS era uma espécie de “câncer gay”, uma doença moral. Dessa forma, a mídia contribuiu para a criação de estigmas que foram absorvidos por marcos jurídicos, institucionais e culturais que perduram até os dias de hoje.
As mídias não transmitem o que ocorre na realidade social, elas im-
põem o que constroem do espaço público. A informação é essencialmente uma questão de linguagem, e a linguagem não é transparente ao mundo, ela apre-
senta sua própria opacidade através da qual se constrói uma visão, um sentido particular do mundo. [...] Se são um espelho, as mídias não são mais do que um
espelho deformante, ou mais ainda, são vários espelhos deformantes ao mesmo tempo daqueles que se encontram nos parques de diversões e que, mesmo deformando, mostram, cada um à sua maneira, um fragmento amplificado, simplificado, estereotipado do mundo (CHARAUDEAU, 2010, p. 19-20).
A pessoa LGBTT e negra é estigmatizada tanto pela representação da raça inferior,
quanto pela representação negativa da sexualidade contra-hegemônica. Ela é habitante
de dois mundos distintos, porem similarmente cercados de tabus na sociedade brasileira (LIMA, A.; CERQUEIRA, F. A., 2007. p. 269-286), estando sujeita a todas as problemáticas
provenientes da fabricação de discursos estigmatizantes e esteriotipantes, subjugada a uma espécie de não-lugar, uma vez que não satisfaz as expectativas de nenhum dos imaginários
criados a seu respeito. Tomemos como exemplo o universo simbólico criado ao redor da figura do homem negro, como sendo necessariamente heterossexual, viril, forte e violento (ROSA, 2006). Um homem negro homossexual, “afeminado”, é uma afronta à essa construção. Ao mesmo tempo, o imaginário criado ao redor do homossexual é majoritariamente associado à figura do homem branco de classe média. Nesse sentido,
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O homossexual negro experimenta também uma negação no mundo
homossexual – seus clubes, boates, espaços de confraternização, trajetórias
pessoais modelares, imagens, mídia gay, sua perspectiva de poder e, o que é
muito importante, padrões de consumo, sempre têm como referência o homossexual branco. Ou seja, ocorre uma afirmação da identidade homossexual que
passa necessariamente pelas perspectivas definidas por um mercado de consumo voltado para o público homossexual urbano, branco, jovem e integrado às relações de produção e trabalho estabelecidas pelo mundo branco, heterossexual hegemônico. (LIMA, A.; CERQUEIRA, F. A., 2007. p. 269-286)
Tendo em mente as questões apresentadas a respeito da produção e difusão de
discursos hegemônicos, legitimadores de supostas verdades sociais, esse trabalho pretende ser uma análise crítica debruçada sobre os universos microssociais de raça, gênero
e sexualidade - e do multiverso resultante da interseção entre eles. Através de registros
em vídeo, essa série de entrevistas se coloca como um contraponto às formas e sentidos de poder corriqueiramente articulados dentro do universo da mídia, trazendo reflexões a respeito da construção identitária quando da perspectiva da interseção entre raça, gênero e sexualidade. Em outras palavras, abordo a hipótese da existência e manutenção do racismo e da homolesbotransfobia como uma construção histórica excludente, que age simultaneamente como causa e efeito quanto a falta de protagonismo de negros e LGBTTs na produção midiática.
Representatividade importa.
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2. Fundamentação Teórica
Cabe aqui dizer que, tratar de fundamentar todas as particularidades das questões
que orbitam esse trabalho com a profundidade que merecem é uma tarefa que não cabe
dentro da proposta de um TCC de produto. O que trago aqui é quase que como um resumo, um condensado de teorias e ideias de grande complexidade que contribuíram para a elaboração do trabalho, mas que devem ser discutidas e problematizadas com maior profundidade em momentos mais oportunos. Do poder do discurso
Analisar as relações entre discurso, poder e sexualidade me levaram a procurar
respaldo na obra de Michel Foucault, em especial em “A História da Sexualidade, vol.1 – A vontade de Saber”. Na primeira parte da obra, Foucault demonstra como se desenvolveram, a partir do século XVII, as relações entre a sociedade ocidental e os temas do campo
da sexualidade. A partir desse período, chamado de era vitoriana (1837-1901), e até os dias de hoje, a sexualidade teria sido contida e emudecida. O que até então era tratado
com franqueza , sem ser regulado nem vigiado, passou a ser grosseiro, indecente, obsceno. Segundo o autor, a sexualidade se torna um assunto cheio de mistérios e restrito às
quatro paredes do quarto - o sexo e suas intimidades são confiscados pela família conjugal,
o casal formado por um homem e uma mulher, responsáveis pela procriação. Qualquer ex-
pressão da sexualidade diferente da idealizada família burguesa é tratada como algo que
não se deve comentar ou praticar abertamente. Aqueles que falam abertamente sobre os tabus se tornam também eles mesmos tabus: ganham o status de transgressores, desordeiros e anormais, criando assim uma relação intrínseca entre poder, sexo e discurso.
Nos dois últimos séculos, a sexualidade tornou-se objeto privilegiado
do olhar de cientistas, religiosos, psiquiatras, antropólogos, educadores, passando a se constituir, efetivamente, numa ‘questão’. Desde então, ela vem sendo
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descrita, compreendida, explicada, regulada, saneada, educada, normatizada, a
partir das mais diversas perspectivas. Se, nos dias de hoje, ela continua alvo da vigilância e do controle, agora ampliaram-se e diversificaram-se suas formas de regulação, multiplicaram-se as instancias e as instituições que se autorizam a
ditar-lhe as normas, a definir-lhe os padrões de pureza, sanidade ou insanidade, a delimitar-lhe os saberes e as práticas pertinentes, adequados ou infames. Ao lado de instituições tradicionais, como o Estado, as igrejas ou a ciência, agora outras instâncias e outros grupos organizados reivindicam, sobre ela, suas
verdades e sua ética. Foucault (1993) certamente diria que, contemporanea-
mente, proliferam cada vez mais os discursos sobre o sexo e que as sociedades continuam produzindo, avidamente, um “saber sobre o prazer” ao mesmo tempo que experimentam o “prazer de saber”.
LOURO, Guacira Lopes. Teoria queer: uma política pós-identitária
para educação. Estudos Femininos, Florianópolis, ano 9, n. 2, p. 541-553, 2001.
Essa forma de repressão moderna do sexo coincide justamente com a época de de-
senvolvimento pleno do capitalismo, aliando-se à ideia de que o trabalho sobrepõe o pra-
zer e o sexo está restrito à procriação. A “anormalidade” sexual é tida como algo que não deve ser apenas punido, mas sua punição também serve como exemplo para sustentar os discursos que criam a normatividade. Conforme as décadas foram avançando, é possível
observar um aumento significativo dos discursos acerca da sexualidade. Porém, ao contrá-
rio de livrar o assunto dos tabus e proibições, o discurso a respeito do sexo ganha novas definições e restrições em relação a como, quando e quem pode falar dele.
Foucault (1996) propõe a análise do discurso como um mecanismo a ser investiga-
do através das condições que levam a sua existência, que por sua vez estão subjugadas a uma ordem institucional regulatória e controladora. Apesar do autor não se dedicar a aná-
lise específica da mídia, Rafael Grohmann, no artigo “Michel Foucault, Discurso e Mídia” (2010, p.1-11.) a partir da exposição de elementos-chave da teoria foucaultiana, auxilia na compreensão da relação entre os efeitos do poder do discurso na sociedade e a fabricação
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e a propagação dos mesmos no campo midiático. Segundo o autor, “Um programa foucaul-
tiano para estudar a imprensa não deveria esquecer de averiguar como os tipos sociais produzidos negativamente podem contar com a legitimidade e o aval da mídia enquanto formação discursiva. “ Grohmann (Ibid.)
Pensando no papel da mídia como “a produtora de uma gramática simbólica por
meio da qual se universaliza modos e estilos de vivência” (MARTÍN-BARBERO, 2009, p. 199), a linguagem não deve ser vista apenas como uma ferramenta que possibilita a
compreensão e a tradução de ideias através de símbolos que garantem a comunicação,
uma vez que ela se comporta como ferramenta do discurso, que por sua vez não é neutro e muito menos inocente. Ela traz consigo todo um modo de produção social que articula
fenômenos linguísticos e processos ideológicos (BRANDÃO, 2001). Devemos, portanto, problematizar os conflitos ideológicos que resultam das condições de produção e do contexto histórico-social de quem a produz.
Ao considerarmos a realidade brasileira, na qual os meios de comunicação de mas-
sa estão fortemente concentrados nas mãos de poucos empresários que possuem conhecidos vínculos com o poder político e econômico5, sabemos que a opinião da população
acaba sendo fortemente influenciada pelo discurso difundido através das diferentes pla-
taformas de difusão por eles controladas. Destas, a televisão continua sendo a maior influência. Uma pesquisa realizada pelo IPEA6 (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada)
em 2014 revela que 74% dos brasileiros afirmam ter a televisão como o principal meio de acesso a informação, seguido pela Internet (11,7%) e jornal impresso (6,7%). Destes, 46,6% afirmam que ela é a maior influência na formação de opiniões, mais até que os fa-
miliares (28,7%). Para ilustrar este cenário, tomemos como exemplo o fato de que 83% da população se declarou a favor da redução da maioridade penal de 16 para 18 anos de 5 Em pesquisa realizada em 2005 pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), foram coletados dados que demonstram que das 332 emissoras, 263 (69,3%) estão vinculadas às redes Globo, SBT, Record, Bandeirantes, Rede TV! e CNT. . http://donosdamidia.com.br/ Acesso em 10 novembro 2015. 6 Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada: IPEA. Percepções da população sobre políticas públicas . Rio de Janeiro, 2014 Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/livros/livros/150826_livro_sips_2014.pdf>. Acesso em: 27 set. 2015.
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idade.7 Ao considerarmos os dados coletados pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), que demostram que apenas 0,9% do total dos crimes praticados no Brasil
são cometidos menores de 18 anos, é necessário problematizar a origem da percepção da população a respeito de menores infratores. Segundo Grohmann,
“A imprensa pode agir com uma “naturalização da verdade” e como
parte de uma sociedade “normalizadora”. O discurso de programas televisivos policiais como “Cidade Alerta” é um exemplo disso: “ele é criminoso, e tem que ser morto”; “a polícia tem que matar”. Como se construiu, através da imprensa
brasileira, ao longo dos anos, as imagens de tipos sociais como o criminoso, o mendigo e a prostituta? Será que há diferenças entre as construções discursi-
vas de um criminoso serial killer ou um criminoso passional? Neste aspecto,
a mídia pode se relacionar com outras características da teoria do biopoder, como a ambiguidade do cuidado – principalmente no que tange à sexualidade, à higiene e ao sanitarismo – a moral e o urbanismo.”
GROHMANN, Rafael do Nascimento. Michel Foucault, discurso e mídia.
Anagrama, São Paulo. v.3, n. 2, p.1-11. 2010
Considerando as relações de poder como determinadas por relações de força, é
possível afirmar que o discurso midiático e as ferramentas de linguagem das quais se apropria é um dos principais instrumentos da inserção de noções de verdade na realidade social na qual está inserido. (Dittrich, 2004) Portanto, podemos concluir que a percepção da população em relação a grupos sociais historicamente excluídos está diretamente ligada a forma como eles são retratados em discursos midiáticos.
Pensando na influência de discursos na estigmatização de grupos sociais especí-
ficos, podemos trazer aqui o conceito de “abjeção”, proposto por Judith Butler, filosofa e 7 Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística: IBope. 2015. Disponível em: <http://www.ibope.com.br/pt-br/noticias/Paginas/83-da-populacao-e-a-favor-da-reducao-da-maioridade-penal.aspx>. Acesso em: 27 set. 2015.
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escritora estadunidense. Corpo abjetos são aqueles que não deveriam existir ou que “não
fazem sentido” dentro do sistema capitalista heterocentrado (BUTLER, 2010. p151-172). Esse conceito pode ser aplicado para além do universo das discussões de gênero e sexua-
lidades, tomando como exemplo os moradores de rua, invisibilizados por conta de sua
condição socioeconômica; faxineiras e empregados terceirizados, que passam como invisíveis; a população carcerária, que fica escondida aos olhos do “cidadão de bem”; o aval
que possui a polícia para matar o pobre no morro, representando justamente o extermínio de vidas que não são consideradas vidas, pois não são vividas pelos moldes do modelo de consumo e produção do capital.
A situação de abjeção também se concretiza quando sujeitos estão “desviados” do
contexto econômico mundial, quando não são indivíduos produtivos nem consumidores, quando não têm lugar na divisão social do trabalho. Embora essa condição nada tenha a ver com a materialidade do seu corpo ou com a expressão de sua sexualidade ou gênero,
o deslocamento material-econômico produz nos sujeitos abjeção subjetiva, precarização, marginalidade e, obviamente, violação de direitos. A abjeção não ocorre apenas pela nega-
ção de direitos, mas também pela própria ausência de reconhecimento e de legitimidade, que por sua vez atua diretamente no processo de formação de identidades. Do processo de Construção de Identidade
A noção de identidade conforme ao pensamento filosófico clássico, central e es-
sencialista, é posta em cheque quando confrontada com a realidade das multiplicidades e
especificidades da experiência humana na pós-modernidade. Stuart Hall em “A Identidade
Cultural na Pós Modernidade” (2005) classifica três concepções distintas de identidades associadas a diferentes períodos e sujeitos históricos. São elas: o sujeito do iluminismo, o sujeito sociológico e o sujeito pós-moderno. O primeiro é o produto do pensamento bur-
guês, moderno, liberal e racionalista do século XVIII - o sujeito que se coloca como centro
do mundo, em oposição ao pensamento medieval e teocêntrico. O segundo, oriundo dos avanços no campo dos estudos sociológicos, refletia a “crescente complexidade do mun-
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do moderno e a consciência de que este núcleo interior do sujeito não era autônomo e autossuficiente, mas era formado na relação com “outras pessoas importantes para ele”,
que mediavam para o sujeito os valores, sentido e símbolos - a cultura - dos mundo que ele/ela habitava (...).De acordo com essa visão (...) a identidade é formada na “interação” entre o eu e a sociedade.” (Hall, 2005. p.8) Já o sujeito pós moderno é tido como não ten-
do uma identidade fixa, essencial ou permanente, e sim uma identidade transformada
continuamente em relação às formas como é representado ou interpelado nos sistemas
culturais que o rodeiam - o sujeito, portanto, assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que em muitos momentos se contradizem e que geram contínuos deslocamentos. (IBID, p.9)
A identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma
fantasia. Ao invés disso, à medida em que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade
desconcertante e cambiante de identidades possíveis, com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao menos temporariamente (HALL, 2005, p.13).
Assim, a produção de subjetividades está estreitamente atrelada às estruturas ca-
pitalistas, pois elas são uma forma de impor certos modos de perceber o mundo.
Dito de outro modo, através dessas estruturas produtoras de subjetivi-
dades, nossas ações, desejos e percepções são padronizados. Trata- se, então, de um processo construído, de natureza industrial que atravessa as mais variadas instituições sociais, as práticas governamentais, midiáticas e culturais. A
comunicação, nesse cenário da produção de subjetividades, aparece como um importante recorte do ambiente social, pois se assujeita à lógica hegemônica e
contribui para a manutenção e disseminação desses consensos e representações hegemônicas do mundo. (SILVA, 2015. p.144)
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É sobre reflexões acerca do sujeito pós-moderno que se estrutura a teoria Queer,
originada nos Estados Unidos em meados da década de 80 e protagonizada por um grupo de pesquisadores bastante diversificado que voltou seu trabalho para os estudos da diversidade sexual. A teoria Queer se propõe como uma “Sucessora do Construtivismo Social”
(Dynes, l995. p34-52) e busca explorar como operam essas relações de poder na socie-
dade contemporânea, além de desafiar categorizações rígidas associadas a identidades sexuais. Para a Teoria Queer, a ideia de identidade que pressupõe a unidade e estabilidade
do sujeito sociológico descrito por Hall (2005) é insuficiente. O queer quer ser múltiplo e não se sujeitar - ao questionar a naturalização das identidades heteronormativas, expõe as contradições dos processos de formação identitária, e “está preocupado antes em tor-
nar visível e questionar as lógicas que estabelecem uma classificação entre os indivíduos e que impõem o “normal” e, consequentemente, o desviante. Desse modo, o queer ques-
tiona a identidade como um fator limitante dos processos múltiplos dos sujeitos, uma vez que a identidade estabelece o ser e exclui o não ser, o plural, o diverso, o diferente.” (SILVA, 2015. p.143)
Queer é tudo isso: é estranho, raro, esquisito. Queer é, também, o sujeito da sexualidade desviante – homossexuais, bissexuais, transsexuais, travestis, drags. É o excêntrico que não deseja ser “integrado” e muito menos “tolerado”. Queer é um jeito de pensar e de ser que não aspira o centro nem o quer como referência; um jeito de pensar e de ser que desafia as normas regulatórias da sociedade, que assume o desconforto da ambiguidade, do “entre lugares”, do indecidível. Queer é um corpo estranho, que incomoda, perturba, provoca e fascina (LOURO, 2004, p.8).
Nesse ponto, é necessário problematizar alguns aspectos da teoria Queer quando
aplicada à contextos de identidade racial. Na obra “Problemas de gênero: feminismo e
subversão da identidade” (BUTLER, 1990), ao afrontar a noção de gênero como derivado de fatores exclusivamente biológicos, demonstrando como a construção de discursos so-
18
bre o sujeito está diretamente relacionada à manutenção da ordem heteronormativa atra-
vés de sistemas binários (dois sexos fixos, macho x fêmea; homem x mulher; masculino x
feminino; pênis x vagina etc), a autora propõe a descentralização dos sujeitos e o fim da
prática essencialista, que atua no sentido de nomear identidades através da construção identitária do “eu” em oposição ao “outro”. (MOORE, 2011),
Porém, como apresentado por Arantes em ”Homossexualidades e negritudes: iden-
tidades e afetividades no entre lugar.” (2009), quando transposto para a perspectiva do movimento negro, “A descentralização do sujeito e o esvaziamento da identidade, talvez não se configure (...) como um “bom caminho” a ser percorrido, a não ser que, ao invés de
se manter numa posição de luta pela igualdade racial, as reivindicações passem a ser em benefício de um mundo sem clivagens étnico-raciais”.
“(...) esse movimento em direção a anti-identidade pode ser visto como
um ato político e polêmico de resistência que confronta construções identitárias heteronormativas. Porém, também representa problemas sérios para
aqueles grupos - como Afro-americanos - que procuram isolar e problematizar
construções identitárias sexuadas e racializadas, e que percebem o potencial
insurgente e libertador da solidariedade e da comunhão entre grupos étnico -raciais.”
Moore, D. L. (2011). An Interrogation of the Black Presence in the
Queer Project.
Bell Hooks, no artigo “Postmodern Blackness,” (2010) (Negritudes Pós-Modernas,
em tradução livre), questiona: “O que seria dos negros e negras sem um toque de essen-
cialismo?” e “Não deveríamos desconfiar de uma crítica pós-moderna do “sujeito” quando ela surge em um momento histórico no qual muitas pessoas subjugadas sentem que es-
tão tendo voz pela primeira vez? (...) É fácil criticar/desistir da identidade, quando já se
tem uma”. Apesar de problematizar a visão anti-essencialista dos teóricos pós-modernos, a autora conclui que existem pontos positivos ao se adotar essa abordagem, no sentido de
19
que ela desafia noções de universalidades identitárias dentro da cultura e da consciência
de massa, e pode abrir novas possibilidades para a construção de identidades, ao afirmar múltiplas identidades negras e desafiar paradigmas coloniais e imperialistas a respeito dela.
Propõe-se, então, a tática do “essencialismo estratégico”, definida por Spivak (2010)
como o uso tático e intencional da prática essencialista na construção da identidade. Essa tática se define pela forma como grupos sociais marginalizados podem, temporariamen-
te, colocar de lado as suas diferenças com o intuito de construir um senso de identidade coletiva, através da qual se articulam em movimentos políticos. Isso significa, basicamen-
te, extrair um elemento comum, uma essência, dentro de determinado grupo social, enfatizando-a com o intuito de criar uma noção de coletivo e fortalecer sua presença na
sociedade. Spivak, referindo-se às populações indígenas norte-americanas, observa que, apesar de termos como “Indigenous” e “Native American” resultarem em generalizações
problemáticas e estigmatizantes, a auto-identificação como tal tem uma função importan-
te no sentido de criar um sujeito sobre o qual se organizam grupos, e sobre o qual podem operar políticas públicas. (DOURISH, 2008)
(...) a identidade é uma realidade sempre presente em todas as socie-
dades humanas. Qualquer grupo humano, através do seu sistema axiológico sempre selecionou alguns aspectos pertinentes de sua cultura para definir-se
em contraposição ao alheio. A definição de si (autodefinição) e a definição dos outros (identidade atribuída) têm funções conhecidas: a defesa da unidade do grupo, a proteção do território contra inimigos externos, as manipulações
ideológicas por interesses econômicos, políticos, psicológicos, etc. (MUNANGA 1994, p. 177-178)
O contexto brasileiro
No que diz respeito ao processo de formação de identidade negra no contexto bra-
sileiro, objeto de estudo deste trabalho, é necessário trazer um breve panorama históri-
20
co do processo de formação da identidade nacional. Com o fim do sistema escravista em 1888, os pensadores brasileiros são confrontados com a questão da construção da nação e de uma identidade nacional. Kabengele Munanga, no livro “Rediscutindo a mestiçagem no Brasil” (1999) aponta a problemática constituída em torno dessa questão tendo em vista a nova categoria de ex-escravizados negros, que representavam quase 50% da população brasileira na época. (ANDREWS, 2004)
“Como transformá-los em elementos constituintes da nacionalidade e
da identidade brasileira quando a estrutura mental herdada do passado, que os
considerava apenas como coisas e força animal de trabalho, ainda não mudou?
Toda a preocupação da elite, apoiada nas teorias racistas da época, diz respeito à influência negativa que poderia resultar da herança inferior do negro nesse processo de formação da identidade étnica brasileira.”
Munanga, K. Rediscutindo a mestiçagem no Brasil: identidade nacional
versus identidade negra. (1999)
As relações sociais estabelecidas nesse cenário de exploração e violência do perío-
do pós-abolicionista são os primeiros indícios daquilo que, no futuro, seria a constituição da nação brasileira a partir da lógica da mestiçagem (ARANTES, 2008). A construção da identidade do negro brasileiro pode, a grosso modo, ser dividida em três momentos:
O período pós-abolição, no qual a palavra “negro” era utilizada para se referir di-
retamente aos escravos e libertos - sobretudo os ‘que davam trabalho’ (MATTOS, 1993 p. 344) (iniciando assim, a construção social da imagem do “negro” sempre associada a ter-
mos essencialmente pejorativos relacionados aos “tempos de cativeiro”); a mestiçagem enquanto solução às tentativas de branqueamento da população negra, acompanhada à
ilusão do total branqueamento da população; o fracasso do processo de branqueamento
nos moldes propostos pelas teorias eugenistas, seguido pela concepção do mestiço como “verdadeiro brasileiro”, dando origem a uma forma de pensar a realidade racial brasileira a partir da falsa ideia de democracia racial (FREYRE, 1961), que seria considerada o “mito
21
fundador de uma nova nacionalidade” (GUIMARÃES, 1999).
A mestiçagem não pode ser concebida apenas como um fenômeno es-
tritamente biológico, isto é, um fluxo de genes entre populações originalmente
diferentes. Seu conteúdo é de fato afetado pelas ideias que se fazem dos indivíduos que compõem essas populações e pelos comportamentos supostamente
adotados por eles em função dessas ideias. A noção de mestiçagem, cujo uso é ao mesmo tempo científico e popular, está saturada de ideologia (MUNANGA, 2004, p. 18).
Munanga (2004) considera que o conceito de mestiço ser politicamente desarti-
culador, uma vez que se apresenta como um obstáculo epistemológico para a construção
de uma identidade comum entre negros e mestiços, uma vez que ambos estão sujeitos à estigmatização e ao preconceito racial. (ARANTES, 2008).
Algumas vozes nacionais buscam atualmente reunir todas as identida-
des, brancos, negros, indígenas em torno da unidade “mestiça” reunindo todos os brasileiros. Vejo nesta proposta uma nova sutileza ideológica para recuperar a ideia de unidade nacional não alcançada pelo fracasso do branqueamento
físico. Essa proposta de uma nova identidade mestiça, única, vai na contramão
dos movimentos negros e outras chamadas minorias. (MUNANGA, 2004, p. 16)
Muitos afro-descendentes, como efeito da proposta ideológica e política de Estado
(o embranquecimento ou a “ascensão” de negros para brancos) muitas vezes apresentam
variações de identificação em relação à cor da pele (moreno, mulato, pardo, “chocolate”,
dentre outras centenas de denominações que buscam se distanciar da noção de “negro” e se aproximar de um ideal de embranquecimento). Ao afirmar que “Essa proposta de uma
nova identidade mestiça, única, vai na contramão dos movimentos negros e outras chama22
das minorias”, Munanga expõe um dos grandes desafios enfrentados pelo movimento negro brasileiro: criar uma noção epistemológica positiva a respeito do negro, “através da inversão de uma lógica negativa para uma sensação de orgulho e pertencimento, na elaboração de
reações a um passado comum” (...) “colocando a ‘negritude’ como uma operação de desintoxicação semântica e de constituição de um novo lugar de inteligibilidade da relação consigo, com os outros e com o mundo” (ARANTES, 2008, p.61 apud MUNANGA, 1988, p. 45).
A persistência da ideologia do branqueamento no Brasil está relacio-
nada às relações de poder patrimonialistas que têm marcado profundamente
a história do país. A ideologia do branqueamento traz em si um enorme potencial de abafar, inibir reações coletivas da parte dos “não-brancos”, uma vez
que os induz a aproximar-se do padrão hegemônico. E ao induzi-los a negociar individualmente certos privilégios (por exemplo, a carta de alforria, um me-
lhor salário), contribui para que os poucos “negros” que conseguem ascender socialmente se afastem da maioria dos “não-brancos” que não tiveram tanta
“sorte” como eles. Essa negociação “caso a caso” tem evitado que os valores
discriminatórios embutidos nesse esquema ideológico corram o risco de ser questionados e/ou criticados de forma coletiva. (Hofbauer, 2006, p. 408-409)
A “identidade negra” expressaria, segundo esse raciocínio, a conquista da plena
consciência não apenas no que diz respeito à exploração e à discriminação do negro, mas também no que diz respeito à força civilizatória própria que se manifestaria num conjun-
to de características irredutíveis. No fundo, postula-se aqui implicitamente a existência de uma espécie de “essência do ser negro” (Hofbauer, 2006, p.393). Justifica-se aqui a
necessidade de aplicação da tática do “essencialismo estratégico” proposto por Spivak na
construção da identidade do negro no Brasil.
23
A iintersecção e o não-lugar do negro LGBT
Homossexuais escondem sua homossexualidade por meio da subordi-
nação às normas de gênero, haja vista o quanto essas construções são interligadas. Os negros, por sua vez, podem disfarçar as marcas de sua negritude apro-
ximando-se dos padrões estéticos brancos e adotando classificações baseadas em cor, ao invés de raça (Oliveira, 2007, p. 390-391).
A intersecção entre ser negro e LGBTT é um fator significativo para as construções
identitárias daqueles que a experienciam. O distanciamento em relação ao binarismo he-
gemônico faz com que os sujeitos que ocupam esse entre-lugar possuam vivências e ex-
periencias sociais sob uma perspectiva diferenciada, sujeita a discursos estigmatizantes que contribuem para a invisibilidade e a impunidade com relação ao preconceito e à dis-
criminação ao qual são submetidos. Os movimentos sociais (negro e LGBTT) lutam para
conquistar, no âmbito legislativo e cultural/discursivo, um deslocamento identitário das
construções negativas a seu respeito. O entre-lugar, portanto, “significa a afirmação das diferenças e a flexibilização de fronteiras, estabelecendo questionamentos que ajudam a compreender novas formas de sociabilidade que, embora estejam historicamente presen-
tes nas sociedades, só agora, a partir de uma conjuntura em que há tanto o desejo quanto a necessidade de se problematizar as normas e as estruturas, podem ser percebida, avaliadas e melhor, vivenciadas.” (ARANTES, 2008).
Nesse trabalho foram expostas diferentes teorias que se complementam, viabili-
zam e se retroalimentam, traçando paralelos entre as relações de poder na produção do discurso midiático, que por sua vez fabrica “verdades sociais” atuando diretamente no
processo de construção da identidade dos sujeitos. Implica-se uma discussão das identidades dentro da perspectiva do momento histórico no qual o grupo que a reinvidica (ou expurga) está inserido, propondo-se a tática do essêncialismo estratégico para abarcar as nescessidades de grupos sociais heterogêneos em sua composição e atuação.
24
3. Diretriz Conceitual do produto
Inicialmente, pensava em ter como plataforma para esse projeto a mídia impressa,
área com a qual já trabalhei e que portanto possuo mais experiência. A ideia de transfor-
má-lo em uma série em vídeo surgiu a partir de uma lógica pessoal: dentre as plataformas midiáticas que consumo, a que mais influencia meu processo de aprendizagem é a audio-
visual; em especial o formato documental e jornalístico. Ouvir depoimentos de pessoas que realmente estão inseridas nos contextos e situações que estão sendo representadas adiciona à narrativa elementos que auxiliam o processo de assimilação e compreensão de mensagens, seja pelo tom de voz do narrador, por suas expressões faciais e linguagem
corporal ou pela direção de seus olhares. Apesar de sua pluralidade, acredito que a mídia impressa não ofereça a riqueza de estímulos que permitem ao receptor uma compreensão satisfatoriamente abrangente das questões apresentadas nesse trabalho.
Como citado anteriormente, um dos aspectos que me levou a querer realizar meu
TCC a respeito de pessoas negras e LGBTT foi a noção de que sujeitos pertencentes a gru-
pos sociais específicos são majoritariamente narrados, raramente narradores de suas próprias histórias. Gayatri Spivak (2010), no artigo “Pode o Subalterno Falar?”, elabora
uma crítica ferrenha à forma como se dá a construção do conhecimento (e do discurso) por parte de pesquisadores e intelectuais que assumem para si a prática de falar em nome
daqueles historicamente silenciados com o pretexto de “portar a voz” de suas demandas e causas. Segundo o autor, ao assumirem essa prática, contribuem diretamente para o obs-
curecimento das falas dos sujeitos de suas teses por aqueles que ocupam posições discur-
sivas hegemônicas. (ARANTES, 2008). Nas palavras de Félix Guatari (o qual, vale apontar, é alvo de críticas no artigo de Spivak):
“Como se a voz precisasse de portador. Ela se porta bem sozinha e
numa velocidade louca no seio das massas, quando ela é verdadeira.” (GUATARI, 1987 p.16).
Tendo essa preocupação em mente, optei pela metodologia de entrevista semi-di25
retiva ou semi-estruturada (MAY, 2004. p.149). Esse método se caracteriza por ser mais aberto em relação à entrevista diretiva, no sentido de que “parte do princípio de que o indivíduo entrevistado possui uma compreensão da realidade construída a partir de suas
próprias experiências histórico-culturais.” (ARANTES, 2008). Gil (1999, p. 112) denomina esse método de “pesquisa focalizada” e explica que
“o entrevistador permite ao entrevistado falar livremente sobre o
assunto, mas, quando este se desvia do tema original, esforça-se para a sua retomada. Este tipo de entrevista é bastante empregado em situações experimentais, com o objetivo de explorar a fundo alguma experiência vivida em
condições precisas. (...) Nestes casos, o entrevistador confere ao entrevistado ampla liberdade para expressar-se sobre o assunto. “ Gil (1999, p. 112)
As entrevistas que compõem esse projeto foram conduzidas nos locais de escolha
de cada entrevistado. Destes, dois optaram por suas próprias residências, e uma no Parque da Independência, Zona Sul de São Paulo, por ser mais próximo do seu local de trabalho. A escolha do perfil dos entrevistados foi baseado na auto-identificação de cada um deles como negros(as) e LGBTTs, levando em consideração suas trajetórias de militância
e vivências individuais. Encontrar pessoas dispostas a participar da série se provou uma
tarefa mais simples do que inicialmente se imaginou. No início do segundo semestre de
2015, divulguei em alguns grupos do Facebook voltados especificamente para pessoas LGBTTs e Negras (destaque especial para o grupo “Quilombo LGBT”, que possui mais de 600 membros oriundos de diversas partes do Brasil) a ideia do projeto e uma convocatória para a participação. Dalí, surgiram diversas pessoas dispostas a serem entrevistadas e muitas outras manifestações positivas de apoio à produção.
Vale aqui ressaltar que o produto aqui apresentado é constituinte de uma web série
a ser lançada no início de 2016 pela Vaidapé, coletivo de mídia independente do qual faço
parte desde 2012 e que conta hoje com publicações diárias em seu site, um programa de rádio, projetos audiovisuais, além da distribuição gratuita de uma revista impressa
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semestral. Para além de um projeto de cobertura jornalística, buscamos dar voz aos mo-
vimentos culturais e sociais historicamente oprimidos e marginalizados, dando espaço para difusão de ideias e conteúdo de quem não tem sua voz ouvida na sociedade, além de promover eventos e discussões em espaços públicos.
Esse trabalho surge no sentido de identificar e difundir aspectos “essenciais” da
experiência de ser negro e LGBTT no Brasil contemporâneo, pelo formato de websérie documental na qual os protagonistas do recorte proposto atuam na produção, além de se-
rem representados pelo perfil dos entrevistados, de forma a fazer frente à maneira como se cosntróem discursos a respeito do negro LGBTT na atualidade.
O processo de produção se deu em três fazes: Primeiro, a seleção de cada entre-
vistado e o agendamento da entrevista. Segundo, o dia de filmagem - em cada dia tive o auxílio de uma pessoa para operar a segunda câmera, que ficava em um tripé simples. Ter-
ceiro, a edição e finalização em softwares específicos (Adobe Premiere Pro e Plural Eyes). Os custos de produção foram baixíssimos, uma vez que, seguindo o modelo de pro-
dução de conteúdo da Vaidapé, socializamos o uso de equipamentos de filmagem e cap-
tação de áudio para que nossos projetos audiovisuais não dependam exclusivamente de financiamento externo e possam ser feitos de forma independente. Sendo assim, o único custo real com o qual tive que arcar foi com o transporte até os locais de filmagem.
27
3.1. Referências Audiovisuais
Em relação a referências audiovisuais, a série “Strolling”, produzida pela diretora
inglesa Cécile Emeke é uma das que mais influenciaram esse projeto. Se trata de uma sé-
rie de entrevistas na qual, em cada episódio, a câmera acompanha uma pessoa diferente durante uma caminhada, enquanto ela é entrevistada sobre diferentes questões ligadas a
política, negritude, gênero e sociedade. Os entrevistados são todos afrodescendentes; em
seu site8 a autora descreve o projeto como “uma tentativa de conectar as histórias espa-
lhadas e não-contadas da diáspora negra/africana.” A produção se utiliza de uma câmera
única, sem tripé. Em relação a enquadramentos, temos a maior parte em plano médio focando no rosto do entrevistado - essas cenas se intercalam com outras que mostram
detalhes como a vestimentas, gestos e outras imagens de apoio (como paisagens), que
aliadas aos cortes rápidos e frequentes, adicionam ritmo e dinamicidade à narrativa. Os vídeos tem duração média de 7 minutos e, assim como no presente produto, as perguntas
são retiradas no processo de edição e apenas as respostas dos entrevistados constituem o produto final.
Figura 1: Imagens do 7o episódio da série “Strolling”, em que se apresenta
Figura 2: Imagens do 8o episódio da série “Strolling”, em que se apresenta
referência a closes em partes do corpo dos entrevistado. http://www.strolling-
referência a enquadramentos em plano médio. http://www.strollingseries.
series.com/strolling#/strolling7/ - Acessado em 21 de Outubro de 2015.
com/strolling#/strolling8/ - Acessado em 21 de Outubro de 2015.
8 http://www.cecileemeke.com/
28
A série “Polyglot”, de Amelia Umuhire, Diretora e artista visual nascida em Ruanda
e residente em Berlin, é uma web série ficcional que “segue a vida de jovens poliglotas em Berlin.”9. Da mesma forma que a série Strolling, a produção tenta trazer vivências não este-
reotipadas de jovens da diáspora africana na Europa de hoje em dia. Em entrevista ao site NPR Berlin, a diretora afirma:
“Se você for ver a a constituição da televisão, existe apenas uma ima-
gem da Alemanha: a de pessoas brancas falando alemão. Pessoas negras apa-
recem apenas como enfermeiras ou cozinheiras. Você não as conhece, essas pessoas que são uma grande parte de Berlin e da Alemanha, porque elas estão marginalizadas na mídia.”
Entrevista publicada em maio de 2015. Disponível no site: http://www.
nprberlin.de/post/life-berlin-exploring-identity-language-and-race-polyglot
Figura 3: Imagens do 1o episódio da série “Polyglot”,no qual a atriz está a
Figura 4: Imagens do 1o episódio da série “Polyglot”,no qual a atriz
procura de um apartamento em Berlin. Retirado de: https://www.youtube.
está a procura de um apartamento em Berlin.Retirado de: https://www.
com/watch?v=eymq_Bz74qw - Acessado em 21 de Outubro de 2015.
youtube.com/watch?v=eymq_Bz74qw / - Acessado em 21 de Outubro de 2015.
Também serve como referência a série “Empoderadas”, “uma web série em formato
documental que visa apresentar mulheres negras das mais distintas áreas de atuação (artes, entretenimento, política, empreendedorismo e outras); que possibilitam o empoderamento das demais mulheres. “ 10. Realizada a partir da parceria entre as cineastas Joyce Prado e 9 Retirado da página do Facebook do projeto. < https://www.facebook.com/polyglott/info/> Acesso em 10. Nov. 2015.) 10 Retirado da página do Facebook do projeto. < https://www.facebook.com/programaempoderadas/info/> Acesso em 10. Nov. 2015.)
29
Renata Martins, a série é veiculada quinzenalmente na internet. Ao representar mulheres negras de maneira positiva e empoderadora, fugindo de esteriótipos e abrindo espaço de
fala para pessoas que atuam em áreas diversas, a série é um exemplo de produção audiovisual combativa a discursos hegemônicos, e uma grande influência para meu trabalho, principalmente quanto à temática.
Figura 05: Frame extraído do ep. 4 da série “Empoderadas” na qual a Rapper fala
Figura 06: Frame extraído do ep. 5 da série “Empoderadas” retirado
sobre a questão racial no Brasil. retirado do site: <https://www.facebook.com/
do site: na qual a entrevistada conversa a respeito da cultura negra e da
programaempoderadas/videos> Acessado em 21 de Outubro de 2015.
dança no Brasil. <https://www.facebook.com/programaempoderadas/ videos> Acessado em 21 de Outubro de 2015.
A série “O que é o Rap”11, produzida pelo Coletivo Vaidapé desde o início de 2012.
Em cada episódio, algum protagonista da cena do hip-hop nacional é entrevistado sobre questões ligadas aos desafios e oportunidades dessa forma de expressão artística no Bra-
sil, além de responder questões sobre política, sociedade e cultura da atualidade. As cenas são interlocuções entre a imagens do entrevistado e imagens de apoio, mostrando também o local da entrevista, gestos e detalhes que adicionam riqueza à narrativa.
Figura 07: Frame extraído de episódio da série “O Que É o Rap com Mc
Figura 08: Frame extraído de episódio da série “O Que É o Rap com Rashid”
Sombra”, na qual o artista fala sobre a cena do rap nacional brasileiro. retira-
na qual o artista fala sobre a questão do racismo no Brasil. retirado do site:
do do site: <vaidape.com.br/blog/category/o-que-e-o-rap/>
<vaidape.com.br/blog/category/o-que-e-o-rap/>
11 <http://vaidape.com.br/blog/2015/06/o-plano-senzala-esta-em-curso-gaspar-fala-sobre-racismo-e-hip -hop/> Acessado em 14 nobembro 2015.
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3.2. Diretriz Audiovisual
Incentivar o diálogo sobre diferentes experiências, sentidas com maior
ou menor intensidade. Apresentar novos modos de ver o mundo ou de mostrar aquilo que, por qualquer dificuldade ou condicionalismos diversos, muitos não vêem ou lhes escapa. (PENAFRIA, 2001, p.5)
Nichols (2005) define documentário, não como uma reprodução da realidade, mas
sim como uma representação do mundo em que vivemos. Uma boa reprodução seria aque-
la que tem a maior similaridade com o produto original, que serve aos mesmos propósitos e mantém suas características essenciais. Já uma boa representação é julgada não pela sua
similaridade com o original, mas sim pelo valor das ideias atribuídas à ela e pela qualida-
de da orientação ou do ponto de vista apresentado. “Esperamos mais da representação do que da reprodução” Uma representação revela uma determinada visão do mundo, “uma
visão com a qual talvez nunca tenhamos deparado antes, mesmo que os aspectos do mundo nela representados nos sejam familiares”. (Ibid.) Essa representação porém, não pode ser tida como imparcial. Sobre as influências pessoais sobre o produto final do documentário, Vanessa Zandonade e Maria Cristina de Jesus Fagundes em “O vídeo documentário como instrumento de mobilização social” (2003), afirmam que
(...) é consenso entre os pesquisadores afirmar o aspecto pessoal do do-
cumentário que age sobre determinada realidade ao retratá-la, seja em vídeo
ou em filme. Nesse contexto, a atuação do jornalista em produções documentais adquire o caráter autoral que se contrapõe à definição de jornalismo imparcial e isento, criticado por muitos profissionais da área. Dessa forma, existe uma maior possibilidade de entendimento dos telespectadores a respeito do assunto retratado.
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Quanto à necessidade de elaboração de roteiro, Puccini (2009) em seu livro “Ro-
teiro de documentário: da pré-produção à pós-produção” defende que sua utilização é essencial para a organização e realização de projetos documentais, uma vez que auxilia
na produção e evitam a ocorrência de imprevistos. Em oposição, Eduardo Coutinho em “O
documentário de Eduardo Coutinho: televisão, cinema e vídeo”, Lins (2004) defende que o uso de um roteiro no gênero documental impossibilitaria a ocorrência de situações ines-
peradas no momento da filmagem. O autor defende o uso de “dispositivos”, ou seja, regras
que auxiliam na produção, mas que ao mesmo tempo mantém o caráter de espontaneida-
de que caracteriza uma produção que se propõe a ser uma representação da realidade. No presente projeto, a teoria de Coutinho prevalece: não planejo interferir no andamento das entrevistas para além da formulação de perguntas – o que não exclui, de forma alguma, o uso de “dispositivos” organizacionais, uma vez que esses conferem consistência e coerência à produção.
O conteúdo desse trabalho foi composto a partir de entrevistas semi-diretivas com
jovens negros LGBTT oriundos de periferias na cidade de São Paulo, nas quais foram relatadas experiências pessoais e opiniões acerca da realidade vivida por cada um. A cada
encontro, me preocupei em expressar que o intuito do projeto não é traçar um perfil biográfico de cada um, mas sim captar, no breve espaço de tempo de uma entrevista, o que
pensam sobre o mundo e o que o mundo pensa sobre eles, além de panoramas a respeito
da posição ocupada por LGBTTs negros(as) em movimentos sociais, na mídia e no espaço urbano. A montagem e o processo de edição foram trabalhados com o intuito de transmitir, de forma simples e sintética, conceitos de grande complexidade que foram levantados
por cada entrevistado, como o processo de formação da identidade de gênero e construção histórica da imagem e da posição do negro na sociedade brasileira, que frequentemente ficam restritos a discussões acadêmicas em linguagem inacessível a maior parte da
população. Para tal, cada episódio é dividido em blocos temáticos, organizados durante
o processo de decupagem e que variam dependendo da abordagem escolhida por cada
entrevistado. Por exemplo, no segundo episódio, o escritor Ézio Rosa começa sua fala relatando os fatores que levaram a criação do blog Bicha Nagô, fato que passa pela questão
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da necessidade de representatividade na mídia e que guia o primeiro bloco temático. Essa questão, por sua vez, o leva a comentar sobre o processo de formação de identidade negra no Brasil e sobre seu próprio processo de identificação como negro, tema do segundo bloco.
A respeito dos recursos sonoros, cada episódio tem como trilha sonora uma música
diferente que se repete ao longo do vídeo. Selecionei batidas instrumentais de hip-hop ,
que, por ser um estilo musical de ritmo marcado e leve, auxilia na escolha de momentos
para cortes e ambienta o espectador no universo retratado, uma vez que o rap e o hip-hop são quase onipresentes em comunidades negras urbanas ao redor do mundo.
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3.3. Perfil do usuário
A série será distribuída a partir dos canais de divulgação do coletivo Vaidapé. Na re-
vista impressa, parte do trabalho escrito estará presente na sessão “Valendo Nota”, na qual expomos resumos de trabalhos acadêmicos acerca de temas abordados em nossa linha editorial. A série em vídeo será publicada em nosso canal no YouTube12 no qual publicamos
vídeos autorais, além de webséries e vídeo reportagens, e também na pagina do coletivo no Facebook13, que conta com aproximadamente 30 mil curtidas e um alcance semanal que
varia entre 100 e 200 mil pessoas. O público a ser atingido é majoritariamente composto
por jovens nativos digitais, pertencentes à geração Y, que, por terem crescido inseridos em um contexto de inovação tecnológica e possuírem acesso à informação em diversas plataformas, procuram diversidade e inovação nas temáticas abordadas e na linguagem do produto
audiovisual. Essa nova forma de consumir informação influencia diretamente nas escolhas
de linguagem e técnicas de montagem. Pretende-se engajar o telespectador não apenas com base no conteúdo, mas também pela forma na qual ele é apresentado - episódios curtos, lançados semanalmente no formato de websérie.
Para além do público atual da Vaidapé, majoritariamente composto por jovens de
classe média/alta politicamente engajados, pretende-se atingir pessoas que não estão restritas a esse recorte tão específico. Para tal, buscar formas de difusão que permitam ampliar
a sensibilidade social sobre o tema se torna necessário. A exibição gratuita do documentário em locais de interesse público como centros culturais, eventos, praças, logadouros, e ocupações culturais pretende auxiliar nesse papel.
12 https://www.youtube.com/user/vaidape 13 https://www.facebook.com/revistavaidape/
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4. Roteiro 4.1 - Eleição e Descrição dos Objetos
Entrevistados:
Luana Hansen: tem 34 anos, é produtora musical, rapper e dj. Já trabalhou em diversas áreas - na padaria de um supermercado, no telemarketing, fundou ONG, foi traficante, usuária e,
na época de seu vício em crack, chegou a morar nas ruas do centro de São Paulo.Participou do documentário 4 minas, de Elisa Gargiulo, do filme Antônia de Tata Amaral e, hoje, é também atriz no projeto Escola em Trânsito, do grupo de teatro XPTO, além de militante do movimento feminista, negro e LGBTT.
Ezio Rosa tem 21 anos, é integrante do corpo de baile do grupo Ilú Obá de Min - Educação, cultura e arte negra. Membro co-fundador do coletivo Ijó Lewá, cuja missão é disseminar a cultura afro brasileira através da dança e da musicalidade na periferia. Autor do tumblr Bi-
cha Nagô, que tem a proposta de discutir homossexualidade com o recorte de raça e classe. Arte educador social, atuante na região da zona leste de São Paulo, onde realiza atividades voltadas à valorização da cultura afro-brasileira e à problematização de gênero e lgbtfobia.
Rafaelly Domingues: Atriz e cantora, tem 30 anos, é transexual e já trabalhou em diversas áreas. Atua como conselheira fiscal no Instituto Omindaré, ONG que realiza uma pluralidade
de ações sócio-educacionais-culturais voltadas para a diversidade, incluindo ações voltadas
para afro-descendentes, povos indígenas, portadores de necessidades especiais, povos do mar, povos de terreiro, comunidades quilombolas e ribeirinhas e trabalhadores rurais.
Fernando Ribeiro de Oliveira: homem trans, tem 28 anos e trabalha como agente de viagens.
Cada entrevistado possui um perfil distinto, trazendo perspectivas diferenciadas em relação aos temas discutidos.
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4.2 - Eleição e justificativa para as estratégias de abordagem
A estratégia de abordagem das questões feitas nas entrevistas seguiu a metodolo-
gia de entrevista semi-diretiva, método caracterizado por ser mais aberto do que o de uma
entrevista diretiva, na qual o entrevistador já tem todas as perguntas em mente. As per-
guntas foram sendo elaboradas ao longo da conversa, dependendo do contexto da fala do
entrevistado. Ao explicar, no início de cada encontro, o contexto do trabalho e as questões
que procurava abordar, sempre repetia que: “quero falar o mínimo possível. Quero ouvir o que você tem a dizer, o que você acha relevante dentro de todo o contexto apresentado”. Em alguns momentos, durante pausas muito longas ou quando o entrevistado começava a
desviar muito do tema, introduzia algumas questões, mas no geral, apenas deixei o entrevistado falar, sem grandes formalidades. Essa abordagem se justifica dentro da proposta
de realizar um projeto no qual os protagonistas fossem narradores, e não narrados, como abordado anteriormente na diretriz conceitual. Cada encontro teve duração média de uma
hora. Me preocupei em criar um ambiente no qual o entrevistado se sentisse confortável,
portanto o local de cada entrevista e a roupa utilizada ficaram a cargo das escolhas de cada um, sendo realizada uma pequena direção no sentido de propor locais com boa iluminação e poucos ruídos sonoros.
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4.3 - Estrutura
A estrutura dos vídeos é dividida em quatro blocos: 1o Bloco – Introdução
Fade in. Música. Imagens de cobertura, mostrando imagens do bairro e do local da
entrevista, do entrevistado em situações descontraídas, de forma a inserir o espectador no universo que está sendo retratado.
2o Bloco - Primeira parte da entrevista
Com o entrevistado sentado, começa a entrevista. Pedi para que se apresentassem
brevemente e respondessem a questão “qual você considera o maior diferencial em ser um LGBTT negro de periferia”. A entrevista segue, alternando cortes entre as duas câmeras.
3o Bloco - Respiro
Após cerca de 30 minutos de conversa, sugeria que procurássemos algum local
externo, como uma praça, para continuar a entrevista. Nesse momento, aproveitava para capturar imagens do entrevistado caminhando, do bairro e outras imagens de cobertura. 4o Bloco - Segunda parte da entrevista
Agora em local externo, continua a entrevista nos mesmos moldes do primeiro blo-
co, até a conclusão. Fade Out. Fim.
A iluminação e a captação de som foi ambiente, sem intervenção de luz profissio-
nal. Em algumas entrevistas utilizei um microfone Shotgun, ligado à câmera de mão, realizando os ajustes necessários. A câmera de mão utilizada foi uma Canon EOS 5D, com uma
lente de 55-250mm, F/4-5.6, e a do tripé uma Canon EOS T5, com uma lente 18-55mm, F3.5/5.6.
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A câmera do tripé foi posicionada de forma a registrar enquadramentos em plano
médio e aberto, fixos e frontais. A movimentação da segunda câmera foi feita na mão, procurando enquadramentos variados, em primeiro plano e plano detalhe, além de planos gerais captando imagens do ambiente.
A montagem das entrevistas foi feita de forma linear, contando apenas com inserts
de falas que se relacionavam entre si, quando apareciam em momentos distintos do vídeo. A sincronização, edição de vídeo e o tratamento de áudio foram realizados respec-
tivamente nos softwares Plural Eyes, Adobe Premiere e Adobe Audition, dando mais destaque e clareza as vozes e ajustando as diferenças na temperatura de cor das duas câmeras.
No processo de edição, a voz e a imagem do entrevistador foram retiradas, de for-
ma que apenas as respostas configuram o produto final. 5. Etapas de Produção:
As etapas de produção se deram da seguinte maneira: • Escolha do tema e dos recortes desejados • Pesquisa e leituras a respeito do tema
• Procura por pessoas interessadas em participar do projeto, através de conversas
com amigos e conhecidos e postagens em grupos do Facebook voltados para o público negro e LGBTT.
• Seleção de entrevistados e agendamento das entrevistas
• Pesquisa dos modelos de entrevistas e formatos de séries documentais
• Deslocamento até os locais escolhidos por cada entrevistado e gravação do ma-
terial bruto
• Decupagem do material
• Edição de cada entrevista no software Adobe Premiere CS6. • Fechamento do conteúdo de cada entrevista
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Pós-produção e finalização:
• Tratamento dos arquivos de áudio das entrevistas no software Adobe Audition. • Definição edição em loop das trilhas sonoras.
• Elaboração e animação de títulos e identificação de cada entrevistado. • Ajustes e tratamento de cor e som. • Exportação do projeto em Full HD.
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6. Considerações Finais
Nesse trabalho foram apresentadas diferentes possibilidades de reflexão para a
compreensão de elementos que circundam a vivência de indivíduos Negros e LGBTTs,
pertencentes a dois grupos sociais historicamente oprimidos e silenciados por fatores essencialmente congruentes. Através da exposição de teorias de que se complementam,
viabilizam e retroalimentam, foi traçado um paralelo entre as relações de poder quanto a construção de discursos midiáticos, que por sua vez fabricam “verdades sociais”, atuando
diretamente no processo de construção identitária. Compreende-se que as identidades nessecitam serem dicutidas dentro da perspectiva do momento histórico pelo qual o grupo que a reinvidica (ou expurga) está inserido.
No caso do movimento LGBTT, especificamente sob a perspectiva da teoria Queer,
percebe-se uma nescessidade de ruptura com as noções de identidade que foram cons-
truídas sobre o sujeito LGBTT. Termos como “gay”, “lésbica” e “transexual” falham em abranger a diversidade e a complexidade das sexualidades humanas, questão apontada
por alguns entrevistados, além de remeter a esteriótipos e narrativas sobre sujeitos que pouco se assemelham àqueles que são representados em discursos midiáticos. Busca-se, portanto, uma afronta à noção de identidade como um todo.
O movimento negro, apesar de compartilhar da necessidade de ruptura com iden-
tidades fixas no sentido de desafiar noções de universalidades identitárias dentro da cultura e da consciência de massa, abrindo caminho para novas possibilidades para a cons-
trução de identidades (HOOKS, 1990), é obrigado a levar em consideração o contexto de formação da identidade nacional brasileira sob a perspectiva da mestiçagem, que associa ao distanciamento da identidade negra uma forma de ascenção social. Propõe-se, então, a
tática do essêncialismo estratégico, que busca empoderar sujeitos pertencentes a grupos sociais marginalizados através da identificação de uma “essência”, uma “identidade em comum” que gera uma percepção de grupo aumentando as potencialidades de mudanças
sociais concretas. No caso do movimento negro, isso significa afrontar a forma como a qual indivíduos afrodescendentes são levados a se auto-identificarem como qualquer coi-
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sa (pardo, moreno, chocolate, entre centenas de oturos nomes que constam na “tabela de cores” do racismo velado no Brasil), menos como negros.
Esse trabalho surge no sentido de buscar e difundir algum aspecto da “essência”
da experiência de ser negro e LGBTT no Brasil contemporâneo, por meio da produção de uma websérie documental na qual os protagonistas do recorte proposto são, de fato,
protagonistas tanto na produção, quanto na representação dos sujeitos que figuram em
cada episódio, afrontando a maneira como discursos sobre o negro LGBTT se constróem na atualidade.
A crença é a de que, quanto mais formos capazes de idenficar nossas semelhanças
dentro de uma malha tão distinta e diversa de experiências, mais ampliamos nossas chan-
ces de estabelecer diálogos e construir novas possibilidades identitárias que reflitam com maior fidelidade a complexidade da experiência humana, seguindo na direção contrária
(ou afrontando diretamente?) a intolerância e a estigmatização às quais estão sujeitos aqueles que divergem das normas impostas pelos discursos e poderes hegemônicos que estão em jogo atualmente. Encerro minha conclusão retomando a frase que deu início a toda essa jornada:
Representatividade importa.
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