Revista Brasil Musical

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brasilmusical.com.br

PITTY Entrevista exclusiva “Sete Vidas”

Leo Cavalcanti O despertar do despertador.

Jeneci Tulipa Ruiz

Megalo maníaca

O melhor da vida é de graça.

Gal Costa Com a boca no mundo.

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editorial

Equipe técnica Jéssica Alvarenga e Borges Wellisson Souza Revista confeccionada para a disciplina de Diagramação em Design Gráfico, ministrado

pelo professor Cesar Netto pela Universidade Estácio de Sá, campus Praça XI.

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brasilmusical.com.br

PITTY Entrevista exclusiva “Sete Vidas”

Leo Cavalcanti O despertar do despertador.

Jeneci Tulipa Ruiz

Megalo maníaca

Foto da capa Pitty divulgação

O melhor da vida é de graça.

Gal Costa Com a boca no mundo.

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Edição e montagem Jéssica Borges

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Quem?

Bangers

As sete

Quando?

de

vidas

Por Onde?

Miley

de

6

8

Pitty

12

35 Anos de Gal Tropical

24

O Melhor da Vida

7

Megalomania

16

Banda do Mar

17 O

Despertar de Leo Cavalcanti

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SU MĂ RIO

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Quem? Quando? Por onde? por Mário Ribeiro

Dando início a uma turnê pelo Reino Unido na próxima semana (01 de Julho) Howling Bells retorno com seu quarto álbum, Heartstrings, em 2 de junho. Para todos nós, vocalista Juanita Stein respondeu cinco perguntas para nós.

Quem interpretaria você no filme da sua vida? Idealmente Ali McGraw, Faye Dunna-

way ou Claudia Cardinale. Tudo a partir da década de 70, é claro. Todos eles representam qualidades que se relacionam com a moderna, mulher complexa. Ternura, impetuosidade e mormaço.

O que você está trabalhando atualmente? Terminamos recentemente um novo álbum, Heartstrings, para que os próximos meses vai ver uma campanha de desdobramento para isso. Haverá uma turnê pelo Reino Unido em julho e agosto,

por isso volta para a sala de ensaio para reaprender todas as músicas.

Por que você faz aquilo que você faz? Estou

na maior parte sem saber que eu faço isso. Mas, ocasionalmente, em um turbilhão de paixão ou angústia alguém pode trazê-lo para a minha atenção e eu momentaneamente vai debruçar sobre ele. Em seguida, ele é feito. Nós somos o que somos.

Onde você se vê daqui a dez anos? Em uma

praia, com minha família, sorrindo com o contentamento e sabendo de alguém que está vivendo seus sonhos em voz alta.

Quando haverá uma colheita para o mundo? “Com cada ação que você está semeando uma se-

mente, embora a colheita que você não pode ver.” Ella Wheeler Wilcox Para mais novidades, acesse: www.howlingbells.co.uk

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O Melhor da Vida por Fernanda Nogueira

O músico Marcelo Jeneci revelou nesta segunda-feira o clipe de “O Melhor da Vida”, canção que integra seu segundo álbum “De Graça”. Produzido pela Academia de Filmes, o clipe já havia sido exibido na TV na segunda-feira (12), no canal por assinatura Multishow, mas o lançamento oficial se deu nesta segunda.

O cantor aparece pouco nas filmagens, mas é ele quem encerra o clipe, com a característica maquiagem brilhante embaixo dos olhos. O vídeo ainda traz a estética rosa/ azul que marca a capa do disco mais recente de Jeneci. A dança é conduzida pelos versos da canção, que dizem que “o melhor momento é aquele que não quer passar”, e que “o melhor da vida vem de graça”.

A produção, dirigida por Isabel Lenza e Fernanda Weinfeld, conta com participação dos bailarinos contemporâneos Janaína Castro e Filipe Bruschi, que integram o Grupo Corpo. O casal aparece dançando em um galpão enquanto Marcelo entoa os versos da faixa.

Após um doloroso processo de reconstrução, Marcelo Jeneci lança novo disco e redescobre os prazeres mais simples da vida. Com produção de Kassin e Adriano Cintra, “De Graça” conta com 13 faixas, entre elas “Alento” e “Pra Gente Se Desprender”, e está à venda desde outubro do ano passado.

De Graça já disponível nas lojas de todo o país e no Itunes. 7


BANGERZ DE

MILEY

Bangerz Tour é a quarta turnê mundial da artista musical estadunidense Miley Cyrus, em suporte de seu quarto álbum de estúdio Bangerz (2013). A digressão foi primeiramente mencionada por Cyrus em outubro de 2013, com o anúncio oficial sendo feito no mês seguinte ao revelar as datas dos shows nos Estados Unidos e noCanadá.2 A excursão terá início em fevereiro de 2014 nos países supracitados e estenderá-se por até dois meses, concluindo a primeira etapa com um total de 39 concertos realizados. A dupla sueca Icona Pop e a cantora estadunidense Sky Ferreira foram confirmadas como os atos de abertura da parte norte-americana dos espetáculos.

8

por Cláudio Barreto

“A minha vida está literalmente girando ao redor desta turnê. Diane Martel (...) e eu estamos desenvolvendo essa digressão, que será maluca. (...) No momento que você pisar na arena toda aquela coisa fará com que você sinta-se como uma parte deste diferente mundo louco e o show começará no minuto que você adentrar a porta, ao invés de inciar apenas quando subo no palco.” — Cyrus descrevendo a preparação e o conceito da Bangerz Tour.


Para tudo e respira fundo, galera! A produtora de shows Time for Fun acaba de divulgar na tarde desta segunda-feira (9), que Miley Cyrus se apresentará em três capitais do Brasil, no mês de setembro, com a turnê “Bangerz Tour”. A primeira cidade a receber a diva polêmica é Brasília, no Ginásio Nilson Nelson, no dia 24. Depois, é a vez de São Paulo receber a visita da artista, no dia 25, na Arena Arena Anhembi. Por último, e não menos importante – a “Bangerz Tour” aterrissa no Rio de Janeiro, no dia 28, na Praça da Apoteose. A abertura da venda dos bilhetes e os valores deles ainda não foram divulgados. Os boatos de que Miley viria ao Brasil começaram em maio, depois que o jornalista José Norberto Flesch, do jornal “Destak”, confirmou a presenta da estrela teen no país. “Não sei porque vocês estão me perguntando da Miley Cyrus. Eu já tinha avisado que ela vem em setembro”, comentou ele na época. As apresentações da ex-”Hannah Montana” pelo mundo estão dando o que falar e o jeito agora é esperar a Copa passar!

O repertório abaixo é representativo do concerto.

(Não correspondendo necessáriamente aos outros shows da turnê.) 1. “SMS (Bangerz)”

11. “Drive”

2. “4x4”

12. “Rooting for My Baby”

3. “Love Money Party”

13. “Jolene”

4. “My Darlin’”

14. “Hey Ya!”

5. “Maybe You’re Right”

15. “23”

6. “FU”

16. “On My Own”

7. “Do My Thang”

17. “Someone Else”

8. “Get It Right”

18. “We Can’t Stop”

9. “Can’t Be Tamed”

19. “Wrecking Ball”

10. “Adore You”

20. “Party in the U.S.A.”

Próximas Datas

!

24 em Brasília, no

Ginásio Nilson Nelson, no dia 26 em São Paulo, na Arena Anhembi, e no dia 28 no Rio.

Finlândia...........................1º de julho de 2014

Dinamarca........................4 de julho de 2014 Alemanha.........................6 de julho de 2014 Suiça....................................7 de julho de 2014 Itália....................................8 de julho de 2014 Áustria................................10 de julho de 2014 Espanha.............................13 de julho de 2014 Portugal..............................15 de julho de 2014 Espanha..............................17 de julho de 2014 9


as sete vidas de por Cláudio Barreto

fotos Divulgação

PITTY


Pitty voltou, melhor que nunca, mais madura, o que ĂŠ normal, mais talentosa, e apresentando um trabalho que tem tudo para ficar na histĂłria como um dos ĂĄlbuns mais queridos de sua discografia.

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“Ele mora depois do seis e antes do oito, e é primo. Pragmaticamente até poderia ser apresentado assim, mas veio vestido de mistério. Nasci num dia 07 do ano de 77 sob o signo de libra – que rede a sétima casa, segundo a astrologia. Os sete dias da semana norteiam e conduzem nossa rotina, os tais sete dias bíblicos da criação. Queria mesmo era pintar o sete navegando os sete mares, e quem sabe as sete cores do arcoíris dariam o ar de sua graça. Não seria um bicho de sete cabeças rodar o mundo como desejo se eu tivesse uma bota de sete léguas. Daria até uma passada pela avenida sete em salvador, minha terra natal. Mas as coisas que seguem oscilando entre os sete pecados capitais e os sete princípios da moral pitagórica; acendo uma vela de sete dias e penso nos sete chacras que, gostaira, um dia fossem plenos. Todos os sentidos atravessando os sete buracos da minha cabeça. Tudo o que é intuitivo e sinuoso como um gato que tem sete vidas; e por mim poderia ser uma das sete maravilhas do mundo. Outra maravilha, e nessa me deleito, as sete notas musicais que se multiplicam e desabrocham em acordes e melodias. A sétima arte – o cinema – que também me alimenta deveras. A teosofia diz que nossa vida se divide em setênios, e os budistas têm sete degraus até a iluminação. O sétimo arcano maior do tarot é o carro: aquele que executa, que bota pra frente, e é progresso e ação. As sete velas da menorah iluminam o chão do templo, e volta e meia por aí té encontrarmos esperança, fortaleza, prudência, amor, justiça, temperança e fé; que são as sete virtudes humanas de acordo com a filosofia. As sete pragas do egito, os sete selos de são joão, as trombetas do apocalipse e tantos outros setes naquele livro antigo. Estamos no ano de 2014, cuja a soma é sete.E logo mais te conto um segredo não mais tão guardado a sete chaves. bjs, P.”

A semana anterior marcava o início de uma nova fase para a carreira de Pitty. Entre 2011 e 2013, ela mergulhou no mundo paralelo do Agridoce, projeto com o guitarrista Martin Mendonça. As canções da dupla,

baseadas em voz, piano e violão, chamaram a atenção de quem antes encaixava a artista na prateleira do “rock juvenil”. “Gerou uma curiosidade. Muita gente que nunca tinha falado do meu trabalho falou”, ela diz. “Existia uma relutância porque é feio dizer que gosta de Pitty. Eu entendo, o ser humano é assim mesmo. Mas acho massa quando o tempo vai passando e essas pessoas vão quebrando os preconceitos e saem do ‘não ouvi e não gostei’.” Por um ano e meio, ela se dedicou a levar para os palcos o seu projeto mais acústico, de folk psicodélico, o Agridoce (feito com Martin, o guitarrista da banda). Mas bateu, como ela diz, “a demanda interna da saudade”, e Pitty agora volta a ser Pitty com “Setevidas”. O primeiro disco de rock de Pitty em cinco anos. Sobre as bases tradicionais de guitarras, ela se sentiu à vontade para experimentar

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e vencer a autocensura de investir, por exemplo, em elementos de percussão. O recém-lançado trabalho encontra a cantora em um momento peculiar não só artisticamente mas também na vida pessoal. Prestes a completar 37 anos – ela faz aniversário em 7 de outubro –, Priscilla Novaes Leone se viu resignada após um período turbulento em 2013, em que ela lida com o inevitável, o irremediável. Que expõe “mortes reais e metafóricas” Duas delas, bem reais, a morte do amigo Peu Sousa (ex-guitarrista da banda que a acompanha, que cometeu suicídio em maio de 2013) e do ídolo Lou Reed (morto em outubro), inspiraram a canção “Lado de lá” e “A vida segue”. A turnê do disco, de fato, começa em agosto. No Rio de Janeiro, os shows serão nos dias 15 e 16, no Circo Voador. As perspectivas de Pitty para 2014 são as melhores. “Desde o ano passado eu estava sentindo uma preparação para uma volta com força do rock. E este é um ano muito bom para isso. Tem muita gente no Brasil, como os Titãs, lançando discos importantes. Passou aquela coisa meio pasteurizada que rolou por volta de 2010, a infantilização geral do rock. Sinto que existe agora uma conspiração boa do universo.” Enquanto o marido, Daniel Weksler, baterista do NX Zero, viaja em turnê, ela divide o apartamento com os gatos Billie (um presente da escritora Clara Averbuck) e Charlie – a gata Nêga, que aparece na capa de SETEVIDAS, morreu poucos dias depois das sessões de fotos para o álbum. Foi na casa onde hoje está “tudo o que interessa” que Pitty falou do novo trabalho, da descoberta do próprio lado feminino e das superações que, atreladas à maturidade, deram a ela a segurança para se sentir confortável como mulher e artista.

Você se despediu do Agridoce em junho de 2013 e ficou dez meses longe da vida pública. O que fez durante esse tempo? A gente acabou as coisas

do Agridoce e eu entrei nessa bolha do novo disco. Fui escrevendo, com calma, sem pressão, sentindo o momento. E aí chegou a hora em que eu falei: “É agora! Preciso!” Precisar é o verbo, né? Como a gente não tinha prazo para lançar, deu para fazer tudo com bastante calma.

Do Agridoce para cá, você diria que se descobriu diferente? Eu aprendi pra caralho. Descobri uma pessoa que eu não conhecia em mim. Aquela instrumentista, aquela compositora, aquela persona que é tão diferente de mim e, ao mesmo tempo, me completa. Uma coisa meio yin-yang. Eu tocava piano para mim, mas transformar isso numa coisa para compartilhar com os outros é diferente. Nunca podia imaginar que um dia... “Ah, você vai subir e tocar piano no palco.” Ahn? Tá louco? Nunca!

Conseguiu experimentar novos elementos na produção de SETEVIDAS? A gente gravou um mon-

te de textura, guitarras, agogô, caxixi, percussão. Usei umas coisas que nunca tinha usado. Eu tinha receio de experimentar com percussão. Acho que, por causa da minha herança, por eu ser da Bahia também, tinha medo de ficar caricato. Já vi muita gente colocar percussão no rock e não ficar legal.

Você tinha medo de te depreciarem por isso? Não,

não era por causa dos outros. Era por mim. Eu não tinha muita certeza. Tinha medo de não saber a medida. E tinha um pouco de trauma também, vi muita gente tentar e ficar estranho, aquela coisa meio de som para turista, forçada, tipo querendo tacar uma cuíca no rock, sabe? Acho que tudo tem medida. Música é alquimia, é culinária, é o tanto de cada tempero que você põe, então não sabia se eu tinha a medida. Acho que ainda não tenho, só botei a carinha bem tímida nisso.

Por que a insegurança? Eu achava que não iria con-

seguir. Tecnicamente. Cantar e tocar [ao mesmo tempo] é difícil. Mas às vezes você nem precisa ter técnica. Se existe uma intuição para a coisa, você tira um som. Meu professor de piano falava isso: “Eu posso te ensinar teoria, a música. Musicalidade ou você nasce com ou você nasce sem”. A pessoa sabe a matemática, porque música é matemática, né? Você decora ali a casa, conta, sabe que meio tom vem para cá, duas casinhas é um tom – a matemática é uma coisa racional. Então, quando ele me disse isso eu passei a confiar, a ter coragem. Tipo: “Beleza, eu não sei a técnica disso, mas, se eu


tiro um som e está gostoso, pronto”. E foi bom inclusive para a minha banda, me deu outra percepção de mim como artista.

faixas, para mim, são capítulos. Vão acontecendo coisas doídas e sofridas ao longo dessa história, transformações. Pessoas sempre caindo e se levantando.

Em relação à nova formação, como tem sido o processo de adaptação de Guilherme Almeida ao grupo e o que ele tem acrescentado, além de qualidade sonora, ao dia-a-dia de vocês? Foi tudo super tranquilo. Na primeira semana que ensaiamos juntos já fizemos todas as demos do disco e muitas outras sobras. É muito rápido e fácil de trabalhar com ele. Ele saca muito de música, harmonia, melodia, e sempre tem sugestões bacanas.

Sobre Setevidas, o nome do disco (e da canção) é uma provocação a quem achava que você não voltaria mais? Se sim, teve um gosto especial “calar” as pessoas que diziam que você havia “abandonado” o rock? Na verdade não. É sobre

uma experiência pessoal de superar problemas de saúde, de perceber como isso é importante e de dar mais valor a tudo ao redor e às coisas simples. O “agora que eu voltei” é pra vida mesmo, não necessariamente para o rock porque dele nunca saí de fato.

Finalizando, você finalmente pôde descansar no último ano, depois de mais de uma década de atividades diretas. Considerando que você já é uma cantora bastante experiente, dá para dizer que a banda chegou naquela fase em que precisa de um tempo maior para descansar e se preparar mais para novos projetos? Não sei como vai ser daqui pra

frente, só sei que até agora foi assim. E percebo que esse tempo foi muito bom e importante pra mim, o saldo foi totalmente positivo. Mas acho que tem que ir sentindo as necessidades, a demanda tem que ser sempre interna. A gente sente quando é hora de gravar um disco.

Você reflete sobre essa questão da exposição?

Procuro sempre discutir e entender isso. Porque é muito louco que eu tenha uma profissão na qual eu me sinto, em alguns momentos, completamente inadequada. Eu não sei lidar com essa história de ser celebridade. Não sou celebridade – sou uma cantora, uma artista, tenho uma banda de rock. E não tem como fugir, porque se você quer ser popular e quer que todo mundo te conheça, vai acabar acontecendo isso [de se tornar celebridade] de alguma forma. Eu, no palco, sou muito livre, não tenho nenhum incômodo, e com meus amigos é assim também. Mas, se eu entro em um restaurante e fica todo mundo olhando para mim, morro de vergonha. Não sei lidar. E nem sou tímida, só não gosto de ser observada.

Você se considera feminista? Eu descobri que sou

feminista. Não é uma coisa que você decide: “Acordei, a partir de agora sou feminista”. Entendi que eu era a partir do momento em que comecei a ler alguns textos feministas e me identifiquei. Eu já pensava assim antes, mas não sabia que era feminismo, não tinha essa nomenclatura. Para mim, hoje é muito mais fácil ser mulher, afirmar minha feminilidade. Antes era aquela coisa de você chegar e a primeira pergunta que nego te faz é: “Quando você vai posar para a Playboy?” Oi? Eu estou lançando um disco! Só porque sou mulher? Toda mulher que se destaca, em qualquer área, a primeira pergunta que se faz é: “Quando você vai ficar nua para mim, meu amor?” Eu monto um disco como se ele fosse um livro — explica. — As 14

SETE VIDAS já disponível nas lojas de todo o país e no Itunes.


“Com a idade, você vai ficando mais venenoso. É o veneno da paciência, de falar a coisa certa na hora certa.”

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MEGALOMANIA

por Walter Chagas foto Rodrigo Schimidt

Na intensa convivência entre músicos durante as turnês, surgem as piadas internas. Com Tulipa Ruiz e a banda, em viagens para tocar o disco Tudo Tanto, não foi diferente. Quero dizer, até foi. A piada interna cresceu e, veja só, virou música. “Megalomania” estará disponível para download gratuito no site oficial da cantora e é lançada com exclusividade pelo site da cantora. Carimbó azeitado por programações e as guitarras sempre reconhecíveis de Luiz Chagas e Gustavo Ruiz – pai e irmão/produtor da cantora, respectivamente –, a faixa virou coisa séria e ganhou até fotos exclusivas para o seu lançamento (como, por exemplo, a imagem acima). De autoria da banda toda, ou seja, de Tulipa Ruiz, Gustavo Ruiz, Luiz Chagas, Márcio Arantes (baixo e programação), Caio Lopes (bateria), a canção foi criada em 2013, quando o baixista Marcio Arantes questionou ao restante do grupo sobre o tamanho do amplificador que ele teria. “Vocês acham que é uma megalomania usar 16

esse amplificador?” Depois da gargalhada geral, a palavra foi remoída pela banda na criação de uma música – esta que é lançada para download agora. “É uma música-carapuça”, brinca Tulipa, no comunicado enviado pela assessoria de imprensa dela. O clima descontraído entre os músicos pulsa vivo em “Megalomania”, justamente definido pela cantora como um “single de verão para tocar em festinha”. A música até já foi apresentada ao vivo, no carioca Circo Voador e nos paulistanos Cine Joia e Sesc Bom Retiro, ainda neste mês. Gravada no estúdio El Rocha, a canção foi masterizada no Sterling Sound, em Nova York. Para baixar, acesse: www.tuliparuiz.com.br Ou, posicione seu celular no QRCODE ao lado para download direto no seu smartfone.


A Banda do Mar por Paula Teixeira foto Reprodução Facebook

Assim, de forma despretensiosa, Mallu Magalhães – hoje conhecida apenas pelo primeiro nome – anunciou que ela e o marido Marcelo Camelo criaram uma banda e que o primeiro disco deles sairá logo nesse segundo semestre. Em um parágrafo curto publicado no Facebook oficial da cantora paulistana de 21 anos, ela revelou que o casal trabalhará ao lado do português Fred Ferreira, baterista das bandas portuguesas Buraka Som Sistema e Orelha Negra. “Hoje posso contar o que tenho guardado com euforia”, escreveu Mallu no início da tarde desta terça-feira, 6. “Nos juntamos e fizemos a Banda do Mar. O álbum com nossas composições sai no segundo semestre, seguido da turnê.” Por fim, ela diz: “Agora preciso aguentar até lá!”. As carreiras do casal Mallu e Camelo já se encontraram em diversos outros momentos desde o início do relacionamento deles, anunciado em 2008. Tudo começou com uma participação dela no primeiro disco solo dele Sou, também daquele ano. Naquele disco, a dupla fez uma parceria na faixa “Janta”, eleita pela Rolling Stone Brasil como a melhor música nacional lançada naquele ano. O mesmo se deu no segundo trabalho solo de Camelo, Toque Dela, de 2011. Já a participação de Camelo no trabalho de Mallu foi ainda mais latente, principalmente no terceiro álbum dela, Pitanga, produzido pelo músico do Los Hermanos e lançado também em 2011. Já Fred trabalhou no último disco de Wado, Vazio Tropical, cuja produção é de Camelo.

O Toque Dela (2011) Marcelo Camelo

Pitanga (2011) Mallu Magalhães

Sistema Komba (2011) Buraka Som

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O DESPERTAR DE LEO CAVALCANTI Produzido em parceria com o músico Fabio Pinczowski, “Despertador” (2014) teve suas canções compostas ainda em 2012 durante o período de turnê de seu primeiro álbum “Religar”, mas só pôde passar pela experimentação em conjunto enquanto Leo Cavalcanti participava de uma residência artística na Alemanha, onde se propôs a tocar apenas músicas inéditas. Após seu retorno, foram convidados para compor a banda os músicos Samuel Fraga (bateria), Guilherme Held (guitarra) e Marcos Leite Till (baixo e sintetizadores). É uma obra universal devido ao seu tema e à sua forma e pode ser classificada, segundo seu autor, como pop intergaláctico. Leo Cavalcanti é um mensageiro que fala diretamente conosco logo quando se inicia a primeira faixa: Levante! É um convite para despertar a consciência sobre si e sobre o mundo e, ao mesmo tempo, é um convite para dançar. Com a presença

constante do pop e do eletrônico em suas 10 faixas, contando com sintetizadores que participam ora do plano climático, ora do plano rítmico, o álbum é de fácil acesso para os ouvintes por conter arranjos com ritmos dançantes conhecidos por muitos corpos. Somando-se às batidas eletrônicas, as letras são trabalhadas de modo simples e direto e, muitas vezes, nos intimam a participar dos jogos de ações das músicas pelo uso do imperativo ou pela construção de diálogos pelo uso de “você”, que não é alguém em particular, mas, nós, seus ouvintes. Os mais sabidos há muito já compartilham o conhecimento sobre a dificuldade de se criar algo simples, mas de conteúdo de fino valor. “Despertador” é o exemplo disso. É de se acreditar que não é a toa que Leo Cavalcanti opta pela simplicidade, pois, assim é preciso para que um número maior de pessoas seja iluminado pela realidade de seu universo,

que não é um universo particular – e aqui lhe devemos nossa admiração e respeito – mas o nosso universo interior, bem como o que nos circunda.

É uma doação pela arte. É uma devoção ao amor. Ele elabora uma obra musical pela qual é sugerida uma transformação pessoal e espiritual no ouvinte ao apresentar em suas letras os valores de igualdade e liberdade, o desapego ao material, a anulação do ego que, uma vez conquistada, nos faz alçar voo e gozar. São planos cósmicos aos quais se chega pela leveza do espírito e pela fé no amor por si só. Não é em nome de nenhum ser divino que o mensageiro nos dirige a palavra-ação, segundo ele “cê chega lá porque então cê é um deus”, a hora é aqui e é agora, a transformação é real e “ ninguém nesse planeta vai escapar” Se já possui a chave para as portas da percepção, terá livre acesso à esse universo, caso ainda não tenha, esteja aberto ao despertar.

ENTREVISTA EXCLUSIVA Brasil Musical Você poderia falar um pouco sobre como foi o processo de criação e elaboração de seu novo álbum? Leo Cavalcanti Foi um processo mágico, fluido, que me surpreendeu. Pois quando comecei a gravar, não tinha muito definido. Apenas tinha um repertório, alguns caminhos sonoros e desejo de fazer um trabalho novo. No Religar, foi o contrário: desde o inicio já sabia o nome, fiz praticamente todos os arranjos, sabia bem como queria o resultado final. E de fato, para esse disco, eu queria era não saber: queria ficar mais permeável, para que o processo revelasse por sí só o que ele seria. Queria estar mais solto, sem tentar controlar tanto o resultado. Pois, como sou cantor, compositor, arranjador e produtor de minhas músicas, por vezes tendo a centra l iza r

a criação. Neste, quis tentar criar em conjunto. Tudo começou em 2012, o final da turnê do meu primeiro disco foi um momento muito fértil de composição para mim. Compus muito, em um curto espaço de tempo. Pensei em até gravar um disco duplo. Muitas músicas que escrevi alí, foram importantes para me reerguer de uma época muito dura em minha vida, onde passei por grande tristeza e confusão. No começo de 2013, fui convidado para realizar uma residência artística na Alemanha por 3 meses. Lá, fiz diversas performances e shows. Foi maravilhoso. E me propus a fazer lá um show só de músicas inéditas. Serviu para eu testar algumas dessas músicas novas e selecionar um grupo delas, q u e 21


acabaram entrando no ‘Despertador”. Quando cheguei no Brasil, tinha um repertório mais ou menos delimitado. Mas sem saber como gravaria. Foi aí que comecei a trocar figurinhas com o Fabio Pinczowski. A gente tinha tocado juntos em alguns shows (um tributo em homenagem ao Paul McCartney). E ele me falou do estúdio dele aqui em São Paulo, o 12 Dólares, e da possibilidade de levar os equipamentos de lá pra gravar num sítio. Em paralelo fizemos uma experiência de trabalho em conjunto e deu muito certo: a gravação de “Hotel das Estrelas”, faixa do mestre Jards Macalé, que entrou no disco “E Volto Pra Curtir” disco-releitura do disco do Macalé de 72, organizado pelo Marcio Bulk do site Banda Desenhada. Fiquei muito feliz com essa experiência. O trabalho fluiu muito bem. Foi aí que tive a certeza de que deveria fazer esse disco com o Pinc. Ele deu a ideia de gravarmos num sítio, com a banda junto. Topei na hora. Foi me ocorrendo a ideia de trazer a sonoridade dos sintetizadores para o disco. Baixos Synths, e timbres que dessem abertura para um Pop com “pressão”, assim com para momentos mais psicodélicos. A banda ficou 3 dias no sitio. Eles não se conheciam entre sí e mal conheciam as músicas. Por um “milagre”, nesses 3 dias conseguimos tirar as músicas, arranjá-las, e gravá-las. No total, 8 das 10 músicas presentes no disco. 70 % do disco foi gravado em 3 dias. O resto demorou quase 2 meses, em sessões aspergidas. Esse resultado surpeendeu a todos. É aquele tipo de mágica que ninguém pode prever. BM Você observa alguma relação ou influência de sua residência artística na Alemanha na sonoridade presente nas músicas do “Despertador”? LC Esta viagem para a Alemanha foi importante em muitos sentidos. Uma espécie de aquecimento para a gravação do disco, meses depois. Além do encontro com muitas formas de arte, e da interação que tive com artistas de várias áreas artísticas, criando performances em conjunto com eles, fiz também muito shows por lá, e eles serviram também para testar algumas músicas novas e consolidar um repertório que me deparei com vontade de gravar. Também me fez repensar o que quero com a arte, e de que maneiras posso expandir meu trabalho. Por lá, ouvi nas rádios e nas festas música eletrônica experimental local e também música dos Bálcãs e turca, tanto tradicional quanto psicodélica, que adoro. Minha vontade de aprofundar no uso de sintetizadores, que já existia antes, só se consolidou lá na Alemanha. Além de ouvir coisas de música eletrônica por lá, boa parte dos shows que fiz lá foi com uma formação que utilizava sintetizadores (fazia uma dupla com Gabriel Spinosa, músico brasileiro que também fez a residên-

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cia). Também gravei um clipe de “Get a Heart”, (a única musica em inglês do disco), em Berlim. Vamos estrear muito em breve. BM Como você enxerga o movimento da nova cena musical da MPB? LC Vejo muito conservadorismo, mas também muita gente fazendo música sem medo de arriscar, de criar sua própria linguagem e sua própria realidade musical, sem necessidade de se deter em gêneros. Construindo sua própria história. Tem muita gente fazendo trabalhos incríveis, cada vez mais. E essa diversidade realmente me interessa. É o que torna a cena mais rica. Cada um com a sua maneira de dizer o que diz. BM O que de renovação esses novos artistas trazem? LC Dentro daqueles que sinto algo realmente original e autêntico: vontade nenhuma de se enquadrar em nenhum rótulo pré-concebido. Liberdade para brincar com a música do jeito que lhe convir. Isso, considero eu, é condição primordial para arte surgir. BM Sobre os elementos da música eletrônica presentes no seu novo álbum: você citaria músicos aos quais ouviu que trabalhassem seus arranjos com a fusão do eletrônico e possam ter lhe influenciado? LC Minha inclinação tem sido de produzir música com uma sonoridade pop, mas com profundidade, algo que seja dançante e contemplativo ao mesmo tempo. Para a pista e para os sonhos. Que trace uma integração entre sonoridades eletrônicas e acústicas de forma que os dois virem a mesma coisa. Não iniciei esse trabalho buscando


por referências a algum trabalho autoral. Lido com os elementos que me interessam no momento, e a partir disso acaba ocorrendo a mistura que resulta no som que eu faço. Não existe preocupação em me enquadrar em algum gênero, ou me relacionar a algum trabalho já existente. Mas é claro, tudo o que ouço, me influencia. Ano passado, quando gravei o disco, estava ouvindo (e até hoje ouço, muito) desde sons mais psicodélicos, como Tame Impala e Animal Collective (que o Marcos Till, da banda, me apresentou), à praias mais pop e r&b, como Justin Timberlake e Alicia Keys. São trabalhos que fazem as fronteiras se perderem, entre o sintético e o orgânico, e isso muito me interessa. Também ouvi muito Fiona Apple e Little Joy. Musica turca e dos Bálcãs nas festas que fui na Alemanha. Musica eletrônica experimental nas rádios de lá. Meus clássicos do Stevie Wonder e João Gilberto. Chet Baker que sempre me acompanha. Abraçaço do Caetano e Recanto da Gal. Ravi Shankar e o new age de Snatam Kaur e Krishna Das. Musica meditativa. Percebo agora que ouvi menos música brasileira em 2013… BM Qual o efeito você espera observar em seus ou-

vintes, uma vez que selecionou músicas de temas sobre a espiritualidade, o autoconhecimento, e a coletividade? LC Não espero observar algum efeito especifico nos outros, provocar alguma reação. Não é desta maneira que crio o trabalho que faço. O trabalho que faço tem que fazer sentido pra mim, senão não faz sentido nenhum. Nao crio pensando no que os outros vão achar. Também não me proponho a falar sobre espititualidade e autoconhecimento como se fizesse apologia a algo. Isso acontece naturalmente porque são temas presentes em minha vida. Não é algo que é planejado. Simplesmente acontece. E é algo que me faz bem, uma questão individual, interna. Acredito que, se algo faz bem pra gente verdadeiramente, consequentemente pode fazer bem para o outro. Portanto, quando percebo que a pessoa se conectou com o trabalho que faço, como tantas vezes vejo acontecer, de maneira transformadora, é como se algo se encaixasse, algum ciclo se completasse. É um retorno pelo qual sinto-me imensamente grato. Agora, é impossível controlar o que os outros vão achar. Sei que tem gente que não gosta do trabalho que faço, que não se identifica e/ou se sente incomodado. Acho isso muito natural, e inevitável. Isso tem sua beleza também. E está fora do meu alcance – ainda bem.

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35 anos de Gal Tropical No dia 11 de janeiro de 1979, estreava no Teatro dos Quatro, Rio de Janeiro, um dos shows mais míticos da história da MPB, “Gal Tropical”. Concebido e dirigido por Guilherme Araújo, o espetáculo era a própria encenação da música brasileira, fazendo renascer sucessos esquecidos pelo tempo, era uma página retirada do samba canção, do chorinho, das marchinhas de carnaval, do samba de gafieira, do tropicalismo, do bolero, do sertanejo de raiz, da brasilidade musical, retratada na maior voz do país, a de Gal Costa. O último show de Gal Costa, “Com a Boca no Mundo”, considerado um “flower power” fora de hora, teve uma repercussão negativa na crítica. Era preciso pensar na Gal Costa que despontava, uma mulher exuberante e sensual, no auge dos seus trinta e três anos. Era preciso deixar a rebeldia da cantora e transformá-la de vez numa grande intérprete à altura da sua voz privilegiada. Pensando assim, Guilherme Araújo sofisticou o figurino da cantora, tirou os seus pés descalços do palco, mergulhando-a em um extraordinário repertório de clássicos da MPB. “Gal Tropical”, o show, foi estruturado a partir o repertório 24

do álbum “Água Viva”, lançado em 1978. Além das músicas do disco, trazia um repertório profundo, alegre e, principalmente, brasileiro. As canções superaram às expectativas e deram origem a um outro álbum homônimo ao show. Sem medo de arriscar, “Gal Tropical”, o disco, trazia um desfile de canções de várias décadas distintas, transitando entre o repertório de Emilinha Borba e o de Carmen Miranda. Ressuscitava as velhas marchinhas carnavalescas, empoeiradas e esquecidas pelo Tropicalismo e pela Bossa Nova, além de emocionar com toques suaves de lirismo nas canções de amor, no duelo da voz aguda da cantora com a guitarra elétrica. O ponto culminante do disco era transformar velhas canções como se fossem inéditas, definitivas na voz de Gal Costa. O show se iria estender até 1981, percorrendo várias cidades brasileiras, excursionando com sucesso pela Europa, Estados Unidos, Israel, e vários outros países. O álbum foi, assim como “Água Viva”, disco de ouro. Gal Costa era finalmente consenso nacional, ocupando as capas e páginas das revistas, os quadros musicais da televisão, as trilhas sonoras das novelas, e as críticas dos jornais. Passou, merecidamente,


a ser conceituada como grande intérprete, tornando-se definitiva. Show e disco, constituem um acervo incalculável da MPB, como uma jóia sem data a dar brilho aos seus ritmos. Sambista, tropicalista, alegre, infinita nas possibilidades do canto, com “Gal Tropical”, a estrela subia rumo ao infinito das divas do cancioneiro brasileiro.No dia 11 de janeiro de 1979, estreava no Teatro dos Quatro, Rio de Janeiro, um dos shows mais míticos da história da MPB, “Gal Tropical”. Concebido e dirigido por Guilherme Araújo, o espetáculo era a própria encenação da música brasileira, fazendo renascer sucessos esquecidos pelo tempo, era uma página retirada do samba canção, do chorinho, das marchinhas de carnaval, do samba de gafieira, do tropicalismo, do bolero, do sertanejo de raiz, da brasilidade musical, retratada na maior voz do país, a de Gal Costa. O último show de Gal Costa, “Com a Boca no Mundo”, considerado um “flower power” fora de hora, teve uma repercussão negativa na crítica. Era preciso pensar na Gal Costa que despontava, uma mulher exuberante e sensual, no auge dos seus trinta e três anos. Era preciso deixar a rebeldia da cantora e transformá-la de vez numa grande intérprete à altura da sua voz privilegiada. Pensando assim, Guilherme Araújo sofisticou o figurino da cantora, tirou os seus pés descalços do palco, mergulhando-a em um extraordinário repertório de clássicos da MPB. “Gal Tropical”, o show, foi estruturado a partir do repertório do álbum “Água Viva”, lançado em 1978. Além das músicas do disco, trazia um repertório profundo, alegre e, principalmente, brasileiro. As canções superaram às expectativas e deram origem a um outro álbum homônimo ao show. Sem medo de arriscar, “Gal Tropical”, o disco, trazia um desfile de canções de várias décadas distintas, transitando entre o repertório de Emilinha Borba e o de Carmen Miranda. Ressuscitava as velhas marchinhas carnavalescas, empoeiradas e esquecidas pelo Tropicalismo e pela Bossa Nova, além de emocionar com toques suaves de lirismo nas canções de amor, no duelo da voz aguda da cantora com a guitarra elétrica. O ponto culminante do disco era transformar velhas canções como se fossem inéditas, definitivas na voz de Gal Costa. O show se iria estender até 1981, percorrendo várias cidades brasileiras, excursionando com sucesso pela Europa, Estados Unidos, Israel, e vários outros países. O álbum foi, assim como “Água Viva”, disco de ouro. Gal Costa era finalmente consenso nacional, ocupando as capas e páginas das revistas, os quadros musicais da televisão, as trilhas sonoras das novelas, e as críticas dos jornais. Passou, merecidamente, a ser conceituada como grande intérprete, tornando-se definitiva. Show e disco, constituem um acervo incalculável da MPB, como uma jóia sem data a dar brilho aos seus ritmos. Sambista, tropicalista, alegre, infinita nas possibilidades do canto, com “Gal Tropical”, a estrela subia rumo ao infinito das divas do cancioneiro brasileiro. 25


O Tempo Presente Como Experiência Artística Por

Alice Caymmi

Todos os pequeninos cantos obscuros dos amores que vivi estão vivos e luzentes vibrando em notas musicais. Muitas vezes pensei que se eu não fizesse uma música eu poderia não resistir e morrer. Mas isso não é o principal. Não pode ser o elemento principal da criação. Estar em casa e experienciar a tecelã que sou, fazendo crochet, esculpindo barro, limpando o quarto, entendendo meu gato, tudo isso deve ser a matéria principal de que é feito o meu objeto artístico. Em um determinado instante percebi que o material mais rico que tenho é a solidão. Forçar isolamento não faz de ninguém um gênio. As pessoas têm a ilusão de que precisam se enfiar no mato para escrever, cantar, gravar. Acho isso de um extremismo clichê assim como a minha primeira obsessão por inspiração romântica. A verdade é que eu nem sei se cheguei a amar. Tudo parecia uma vitrine. Meus amores sempre foram resultados da minha curiosidade estética. Uma vez comecei a namorar porque achei o rapaz um ser humano complexo e cheio de nuances e por isso de uma potência criativa grande. A realidade agora é a solitude e a vontade de criar algo sobre mim mesma. Que eu, em minha solidão, molde meus próprios parâmetros criativos. Faço cursos sobre coisas que nunca experienciei, estudo poesia e teatro, acompanho o crescimento das plantas da sala. Tudo isso é matéria. Tudo é moldável e pode ser rearrumado. O amor como pulsão de vida se confunde com a comoção

erótica da arte. Tudo pulsa em objetos arrumados de forma criativa. As notas, os móveis, as palavras, todas essas coisas têm um sentido quando rearrumadas de acordo com a nossa ordem interna fecundadora da tela em branco. Essa tela em branco metafórica é o tempo presente. Fazer pão, mexer em papéis, experienciar o silêncio, são atos artísticos. Não sei ao certo explicar agora o que é ser criativo pois para mim isso já ultrapassou a barreira das artes plásticas. A vida agora é mais importante. Todo esse assunto nos leva a tentar entender a performance como a arte última. Creio que seja mas tem algo além disso. Existe uma ínfima parte de nosso cotidiano que tem um brilho maior. Pequenos gestos que se tonam grandes. Viver o momento criativo enquanto se anda no chão frio com pés descalços. O deslocamento de foco de uma ilusão de amor romântico para o tempo presente como arte deve trazer muito mais vida ao que se cria. Se nós mesmos despimos a arte e o processo artístico dos seus clichês, passamos a comer arte, andar sobre a arte, dormir com ela. Tudo que eu queria era entender melhor como transformar isso tudo em um produto final que seja consumível. Porque, sim, preciso ser consumida, quero ser consumida e consumir aqueles que me cercam. Dá para compreender o que digo? A arte perdeu seus limites e barreiras. Tem que tomar um novo sentido. Mas como explicar isso? Entendendo tudo como vida e toda a vida como erótica e todo erotismo como fecundação e toda a fecundação como criação.

Alice Caymmi é cantora e compositora. 26


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