URBAN . MAG

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CONTEMPORARY LIFE &

#1 NOV.FEB ‘13

ARTS



VOIDS



DITORIAL que é que um objecto editorial pode oferecer? Lá fora, uma mesa de café, numa qualquer rua da cidade. Um livro. Cá dentro, na “mesa de trabalho”, projecta-se mais uma edição da AeL, a vinte e sete, dedicada aos livros, aos autores e leitores, aos artistas e designers, editores, produtores e livreiros associados à edição contemporânea. As abordagens são múltiplas, assinalam-se vertentes e declinações das publicações independentes nacionais e internacionais, diferentes edições de autor, projectos e livros de artista. Iniciamos o número com uma conversa sobre livros de fotografia entre André Príncipe e Daniel Blaufuks; Paulo Mendes mostra-nos alguns livros de artistas nacionais e internacionais resgatados aos caixotes da memória; José Bártolo fala-nos sobre uma geração de designers editores, da criação de uma nova cultura do self-publishing contemporâneo e do contexto editorial mainstream. Jorge dos Reis escreve sobre livros de provas tipográficas, catálogos de tipografia, das letras com que veste as suas palavras; Gisela Leal regista-nos a actividade da Inc. livros e edições de autor, que é uma pequena livraria situada na cidade do Porto, dedicada às várias formas de edição em arte contemporânea. Pedro dos Reis destaca a importância dos projectos editoriais na produção de conhecimento contemporâneo com uma entrevista a Caroline Schneider, da Sternberg Press, uma das mais reconhecidas pequenas editoras de publicações sobre arte e pensamento crítico do nosso tempo. Susana Pomba escreve sobre a idade do kindle perante o aparecimento dos e-readers e Luís Peixoto mostra-nos Os Lusíadas restaurados pela Fundação Ricardo do Espírito Santo Silva. Obrigada aos nossos leitores.

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NDICE

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ARQUITECTURA MUSICA & DANÇA

p. 6-13 2 VS 1 JOHN CAGE & 2 X 1 MERCE CUNNINGHAM 2=1 AIRES MATEUS

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ART

p. 27-30

MALEVITCH CHEIO SOBRE O VAZIO VAZIO SOBRE O CHEIO

DONALD JUDD EDUARDO CHILIDA JOSÉ LOUREIRO

FRANCISCO PINTO COELHO


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MAN RAY

FOTOGRAFIA & FASHION

p. 32-41 BETWEEN THE GAP

IRVING PENN

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CULTTURA & LIFESTYLE

p. 40-47 SARA ANJO

ALFAMA + SILÊNCIO - NÃO LUGARES

MARC AUGÉ

DESTAQUES/AGENDA p. 48-49


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John CAGE E Sean Scully, 1945 Dublin

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: Dois em um

John Cage e Merce Cunningham, 1992

Duas vidas extraordinárias. Juntos, mudaram a música e a dança do século XX. Falámos com quem os conheceu na intimidade e quem os viu trabalhar Cunningham, convidou-o a compor uma peça. Veio a ser a primeira de várias colaborações e o princípio de uma amizade.

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imenta não dormia no loft, mas passou lá longas horas. "O John acordava a meio da noite para escrever, e o Merce não era de trabalhar à noite. Mas os quartos não tinham paredes, eram divididos por estantes de livros." De resto, "eram dois workaholics, absolutamente". Vida e arte, sem separação. "Havia um movimento muito grande de gente. O Bob Rauschenberg e o Jasper Johns entravam e saíam. O Norman Mailer 'vivia' lá. E havia obras de todos até na casa de banho. Era um mundo de cultura, que passava muito pelo vinho." Tanto Merce como John "eram conhecedores de vinho", conta Pimenta. "Ajudei a levar o Merce Cunningham a Lisboa em 1993. Tivemos oportunidade de beber vinho português, e o Merce sabia o que era vinho alentejano e o que era vinho do Douro." Mas de manhã cedo, Merce acordava e ia para o estúdio, do outro lado de Manhattan. "Trabalhava, trabalhava, trabalhava. Porque o estúdio também

John Cage e Merce Cunningham, et le corps

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"O silêncio não é silêncio, é o som não musical.” era uma escola. Eles sempre tiveram problemas de dinheiro. O Bob Rauschenberg e o Jasper Johns tinham feito muito dinheiro e ajudavam. Eram uma espécie de patronos. E o Philip Glass também. O John gostava muito dele. O Glass é uma pessoa muito fechada, mas muito generosa. Então o dinheiro deles vinha daí, das aulas, e de fundos do Estado que foram sendo cada vez menos. Conversei muito com o John sobre isto. Ele me contou que até aos seus 50 e poucos anos tinham tido muitas difi culdades."

Som e movimento Cage estava interessado no som. Quando começou a deitar borrachas e outros objectos para dentro do piano - aquilo que nos anos 40 ficou conhecido como "piano preparado" - era uma forma de transformar o instrumento noutra coisa, numa orquestra percutiva. Cunningham estava interessado no movimento. Na forma como cada pessoa podia ser diferente ao mover-se no espaço. Começava cada coreografia a partir de um movimento, não de uma ideia. Queria deixar para trás a dança que conta histórias. Zoologia e Antropologia em vez de Psicologia. Ambos estavam interessados no acaso, esse "exercício maravilhoso de atenção". O que os paus do I Ching, os dados ou uma moeda ao ar decidissem seria sempre mais ilimitado do que a decisão humana. Podia libertar a criação em direcções inesperadas, afastando o criador dos lugares-comuns, desbloqueando a angústia. Nenhum deles estava interessado em emoções. As emoções, disse Cage, estão no público. Para Cunningham tratava-se de mergulhar no vazio, tal como para Cage se tratava de mergulhar no silêncio, e ambos dispondo-se "ao fracasso", observou Germano Celant. Mas o que daí resultasse nunca seria um erro, acreditava Cage: "O erro está completamente fora de causa, porque uma vez acontecida uma coisa é." A percepção budista ajudou a quebrar várias convenções de palco. Deixou de haver frente frente é o que está diante do bailarino de cada vez que ele se vira. Deixou de haver centro - centro é qualquer ponto onde um bailarino está. Num liceu do Porto O compositor António Pinho Vargas viu um espec-

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scenario, choreography merce cunningham, costumes comme des garçons, 1997

táculo da companhia no fim dos anos 70, num pavilhão do liceu Garcia da Orta, no Porto. "Impressionou-me imenso. Ao contrário do que era a minha ideia, havia enorme diferença entre a abordagem de Cunningham e a de Cage. O Cage era música improvisada de acordo com aquelas operações de acaso, o próprio Cage sentado a uma mesa com as electrónicas. Mas o que se via na coreografia de Cunningham era uma coisa que pressupunha estruturação extrema. Havia uma divisão em grupo e, num dado momento, quatro ou cinco bailarinos arrancavam na mesma direcção." Mas o acaso também existia na coreografia. Que grupo de bailarinos arrancava, e em que direcção, era decidido num cara ou coroa imediatamente antes, de modo que nenhum espectáculo era igual, e nunca se sabia o que ia acontecer até acontecer, ainda que os espectadores não soubessem isso. "O que saía para o público era uma sucessão de grupos, e depois solos. Enquanto isso, a música seguia o seu caminho em paralelo, sem nenhuma relação com o que se estava a passar na dança." Depois, em 1987, conheceu John Cage num workshop em Amesterdão, durante uma semana. "Foi desconcertante e enriquecedor." Estavam entre 60 a 80 pessoas. Cage começou por perguntar quantos tocavam instrumentos e fez uma lista de 20. Depois perguntou quantos compunham e fez outra lista de 20. "Entrei na lista dos compositores. Ele pegou nas folhas de relações numéricas produzidas pelo I Ching, comparou números e chamou: 'Número 14.' Veio o número 14. 'Ah, és tu. O que tocas?' 'Oboé.' Então vais fazer uma peça de oboé para amanhã.'" E por aí fora. Cage pôs toda a gente a compor peças mínimas com um prazo de um, dois, três dias. "Disse-nos no workshop: 'Não escrevam para uma grande orquestra, porque eles não gostam da vossa música. Não percam tempo, escrevam para músicos vossos amigos.' Anos mais tarde percebi que era absolutamente verdade." Cunningham nunca teve estes problemas. Cage seria mais célebre, mas Cunningham era mais consensualmente respeitado, mesmo pelos padrões clássicos. O mestre britânico de ballet Richard Glasstone insistia que os maiores bailarinos que alguma vez vira eram Fred Astaire, Margot Fonteyn e Cunningham, lembrou o New York Times, quando Merce Cunningham morreu.

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scenario, choreography merce cunningham, comme des garçons, 1997

E o autor do obituário acrescentou que Merce era o equivalente de Nijinsky na dança moderna americana: o longo pescoço, a intensidade animal, o espantoso salto". A crítica da New Yorker, Joan Acocella, descreveu Merce assim: "Penso que nenhum coreógrafo no mundo nos dá uma visão tão próxima da verdade. Beleza sem razões, e sem ansiedade quanto à falta de razões: talvez isto seja o que a vida era antes de a começarmos a transformar. Às vezes, quando olho para um palco de Cunningham, penso que estou a ver o mundo no sétimo dia, com tudo novo e sendo o que é - antes da serpente, e das lágrimas e das explicações."

Alegria de viver

I ching divination, john cage

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Eram artistas preparadíssimos, mas com grande vivacidade. Aquilo era o que eles queriam fazer, e faziam. E havia todo um caldo de cultura para justifi car aquela exuberância, uma grande dose de utopia e de idealismo." A filosofia zen era uma base. "Tinham uma postura muito desprendida, não se tomavam por génios, como a grande dama Martha Graham. Nunca assumiam posições de star, de diva. Era agradável estar com eles." E eles moviam uma grande troupe. Além dos bailarinos e dos artistas plásticos - Duchamp, Warhol, Rauschenberg, Johns -, havia os músicos contemporâneos que iam colaborando com a companhia: Christian Wolf, La Monte Young, Morton Feldman, Alvin Lucier, Earle Brown. Os amigos falam deles com grande carinho. No filme de Caplan, uma amiga diz que John e Merce eram anjos que se dedicavam ao que faziam. E entretanto John aparece a regar as plantas, a cozinhar, e a apanhar os sons da sexta avenida à janela como se fossem ar fresco na cara: "O silêncio não é silêncio, é o som não musical.” Na verdade, prefiro sons a música. Não poderia ser mais feliz do que com estes sons da sexta avenida constantemente, sem nunca se repetirem."


merce cunningham and john cage perform A Dialogue, 1974

John disse uma vez que Merce o surpreendia sempre, e isso era o que mais gostava nele. Dessa vez chamoulhe: "O meu melhor amigo." Nos obituários, perfis e artigos aparecem expressões como "parceiros de uma vida" ou "amigos inseparáveis". Mas o New York Times escreveu "amantes", há uma semana, quando Cunningham morreu. Eles nunca falaram publicamente nesses termos. Um historiador de arte Jonathan Katz, defende num ensaio que o trabalho de Cage sobre o silêncio foi uma forma de resistência passiva numa sociedade homofóbica. "A relação entre os dois era óbvia e não suscitava qualquer reparo, não havia qualquer referência a isso, nem curiosidade, nem o contrário", diz Sasportes. "Tinham uma imensa camaradagem artística." Nunca falaram de paixão, insiste Emanuel Pimenta, que fotografou extensamente os bastidores da companhia e o loft deles. "Eram muito ciosos da sua intimidade. Era uma amizade de décadas. Eram como irmãos. Até hoje muitas pessoas me perguntam se eram homossexuais. Esses estereótipos não funcionavam na vida deles. O que era importante era o trabalho - que não era trabalho, era prazer. Estar ligado ao mundo e a partilha com outras pessoas." No dia seguinte à morte de John Cage, Merce Cunningham foi trabalhar, como sempre. John teria gostado que assim fosse.

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merce cunningham, comme des garçons, 1997

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House in the Serra de Mira de Aire

A entrevista permite conhecer Manuel (1963) e Francisco (1964) Aires Mateus e os Aires Mateus. O seu percurso e o discurso artĂ­stico da dupla de arquitectos.

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Quem são eles? Como fazem o que fazem?

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DOIS, mas são


AIRES MATEUS

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Criadores de projectos onde a matéria concreta se assume inteiramente como uma das personagens centrais da arquitectura, Manuel e Francisco Aires Mateus deixam que a luz penetre nessas estruturas compactas, revelando e enaltecendo o espaço.

house in Alvalade

Entre a máxima de Louis Sullivan “a função faz a forma” e a de Robert Venturi “a forma faz a função”, qual escolheriam para definir a vossa arquitectura? Manuel Aires Mateus [MAM] - Fundamentalmente, a arquitectura lida com necessidades de transformação e com um problema. A partir desse problema, justifica-se qualquer nível de alteração. Nesse sentido, talvez estejamos mais perto da «função faz a forma». No entanto, também sabemos que a maneira como os espaços se abrem, ou se tornam claros, permite uma série de intervenções que lhes confere um grau de liberdade muito grande e, portanto, nesse sentido, «a forma faz a função». Pensamos que, no fundo, para o arranque de qualquer projecto é essencial haver um pretexto, uma necessidade de transformação. E depois, a partir daí, começa-se o processo arquitectónico, e é nas condições – lugar, budget, possibilidades técnicas, programa – que encontramos a possibilidade de transformação. Os projectos devem ter qualidade. À qualidade está sempre subjacente a ideia de clareza. E aí encaixam-se essas duas máximas, em tempos diferentes, talvez, do processo. house in Alvalade

Francisco Aires Mateus [FAM] - Os princípios são indutores do projecto. Poderá acontecer que ressalte mais uma vertente ou outra.

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Na sua obra, uma série de binómios se declara,

cheio-vazio claro-escuro densidade-gravidade

museo parque de los cuentos no antigo convento de la trinidad

interior-exterior

massa-ausência, sendo que o que distingue a sua arquitectura é o que fica entre eles, o que os une e separa. Fernando Távora afirmou que para ele a arquitectura começa quando uma senhora muda uma cadeira de lugar na sala. Qual o vosso conceito de arquitectura? MAM - Isso quer dizer que a arquitectura é tudo. A nossa experiência diz-nos um pouco isso – que tudo pode ser arquitectura. Achamos que a arquitectura pode existir na resolução de uma casa de banho, num objecto de design… FAM - Esta é uma daquelas frases que era preciso contextualizar de uma forma mais precisa, porque tem este sentido de que tudo pode ser arquitectura, e isso para nós é de facto verdade. Mas tem outro sentido – há coisas em que nós, como arquitectos no desenvolvimento do nosso trabalho, temos uma interferência restrita. MAM - Mas é interessante essa ideia de que tudo é arquitectura. Não há nenhuma arte ou manifestação humana que não necessite de um suporte arquitectónico.

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Depurada, lírica e até mística, a arquitectura dos irmãos Aires Mateus é um exercício artístico e conceptual, que compõe um conjunto de peças arquitectónicas em relação com o lugar onde se inscrevem.

inspiration drawing

Desde 1989, ano em que projectaram a discoteca «Sociedade Anónima» até hoje, de que forma consideram que evoluiu a vossa arquitectura? MAM - A grande evolução que temos no nosso trabalho é a tomada de consciência das próprias possibilidades do que fazíamos. No princípio tínhamos uma atitude muito mais instintiva, à procura do desenho, e que se desenvolve a partir desses projectos iniciais até à Residência de Estudantes em Coimbra. A seguir dá-se uma fractura que está relacionada com a consciência de objectivos. Valores como o tempo, a permanência, o envelhecimento, a espacialidade, o uso passaram a ser mais determinantes do que questões que nos preocupavam mais na altura, como a imagem, a forma. FAM - O que também, na verdade, se relaciona com um processo de maturação, de crescimento, que é normal. Surgiu mais ou menos de uma forma natural. Isto é mais ou menos evidente quando se analisam os diferentes projectos feitos em épocas distintas.

house in Alentejo

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VOIDS, biennale di venezia

Espaço e matéria: na consistência das matérias disponíveis, a luz modula o espaço, conferindo-lhe uma poética significação plástica.

As casas projectadas por vocês são consideradas como belas estruturas do ponto de vista formal, mas há quem as veja como pouco habitáveis. Acham que isso se deve ao elevado grau de experimentalismo que imprimem nos vossos projectos? MAM - Não, acho que isso se deve a uma total desinformação sobre o grau de habitabilidade das casas. Essa crítica corre mas nunca foi feita por alguém que tenha habitado alguma das casas. O que acontece é que as casas são largamente habitáveis.

eduardo chilida, sem título

FAM - Não há nenhuma casa, por mais radical que ela possa parecer, que não seja uma resposta directa a uma encomenda de um cliente. Temos, depois, o feedback das pessoas que habitam as casas, e nunca nos aconteceu elas nos dizerem que a casa não habitável. MAM - Corre essa ideia porque não pode correr outra – estamos em Portugal. Não há outra razão.

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HEIO SOBRE O VAZIO

SOBRE O CHEIO

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O QUE É QUE ESTES

ARTISTAS TÊM COMUM?

Eduardo Chilida

Donald Judd

oscovo é a origem geográfica da pintura monocromática. Há quem considere a composição suprematista "Branco sobre Branco" (1918), de Kazimir Malevich, o primeiro exemplo do preenchimento da superfície pictórica por uma única cor. No caso deste artista, existia uma clara intenção metafísica: o monocromo seria sinónimo de espaço infinito, levando assim a um limite insuperável o programa da pintura ilusionista. Outra origem para este tipo de abstraccionismo radical é o trabalho "Cor Vermelha Pura, Cor Amarela Pura, Cor Azul Pura" (1921), de Alexandr Rodchenko. O artista russo fazia notar que tinha reduzido a pintura à sua conclusão lógica através da realização de três telas que ostentavam cada uma das cores primárias: "Afirmo: acabou. Cores básicas. Cada plano é um plano e não há representação". Este é o pano de fundo sobre o qual surgem, mais tarde, em finais dos anos 1960, início da década seguinte, as obras dos alemães Blinky Palermo e Imi Knoebel, ambos alunos de Joseph Beuys, na Academia de Arte de Düsseldorf, cidade onde chegaram a partilhar o mesmo estúdio. As investigações em torno da cor são centrais nos percursos de ambos os artistas.

“Malevitch apresentou os seus quadros suprematistas e, à semelhança dosícones russos ortodoxos que tradicionalmente eram colocados nos cantos das casaspara rituais religiosos, colocou o Quadrado Negro exposto no canto superior da salade exposições, como o surgimento e representação de um novo ícone, apelando àconsciência um registo de modernidade.” “É ponto assente que basearemos o nosso julgamento na forma como considerarmosque a obra penetra na nossa consciência e altera os nossos sentimentos e pensamentos. A este respeito, a nossa resposta ao Quadrado Suprematista Negro pode ser idêntica àque

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José Loureiro

Francisco Pinto Coelho

A INFLUÊNCIA DO SUPREMATISMO DE MALEVICH

temos perante um ícone bizantino.” “Transformei-me no zero da forma e resgatei-me do lodaçal de tolices da arteacadémica. Destruí o círculo do horizonte e escapei do círculo dos objectos, o anel do horizonte que aprisionara os artistas e as formas da natureza. O quadrado não é uma forma subconsciente, mas a criação da razão intuitiva. O rosto da nova arte. Oquadrado é o infante vivo, real. É o primeiro passo da criação pura em arte.” “A arte é a capacidade de criar uma construção que não provém das relações entre as formas e a cor, que nãoé fundada sobre o gosto estético que

preconiza o bonitinho da composição, mas que é construída sobre o peso, a velocidade e a direcção do movimento. É preciso dar às formas o direito à existência individual (…). Nós somos o coração vivo da natureza (…). Nós somos o seu cérebro vivo.”

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Em Palermo essa pesquisa atravessa as diferentes linhas do seu trabalho: dos "Objectos" (19641974) às "Stoffbilder" (1966-1972), das pinturas e desenhos murais (1968-1973) às "Metallbilder" (1974-1977). Destas últimas faz parte uma das realizações maiores do pintor: "To the People of New York City" (1976), revelada na Heiner Friedrich Gallery, em Nova Iorque - a obra, dividida em 15 partes, inclui 39 painéis individuais, pintados à mão em vermelho cádmio, amarelo cádmio e preto. Pouco tempo depois da morte de Palermo - a 18 de Fevereiro de 1977 -, Imi Knoebel apresentou a sua monumental "24 Cores - para Blinky", na galeria Heiner Friedrich de Colónia. Tratou-se da primeira experiência deste artista com a cor - antes desta obra, apenas tinha realizado monocromos pretos ou brancos e esculturas em "masonite" -, inaugurando um período que se estende até aos nossos dias. A série dedicada ao seu amigo, visível na Dia: Beacon, perto de Nova Iorque, é formada por polígonos pintados de uma só cor - as formas escolhidas, ao escaparem aos convencionais quadrados, rectângulos, etc., emprestam à abstracção um inesperado dinamismo. Mais próxima de Malevich do que de Rodchenko, pela busca de uma dimensão metafísica no fazer, a obra de Knoebel tem neste ciclo épico um dos seus momentos mais significativos: nenhum dos painéis tem um ângulo recto e a tinta aplicada não sofreu nenhum tipo de mistura, saindo directamente do tubo para o suporte em madeira.

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Nós, os suprematistas, abrimo-vos o caminho. Andai depressa! Porque amanhã já não ireis reconhecer-nos.


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ESTAQUES

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MARK ROTHKO

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Lisboa. Museu Colecção Berardo. Centro Cultural de Belém. Pç. Império Tel.: 213612878. 3ª a Dom. das 10h às19h. Até 15/10 Até ao dia 14 de Agosto, o Garage Center for Contemporary Culture em Moscovo irá apresentar a obra de Mark Rothko pela primeira vez na capital russa. A exposição intitulada “Into an unknown world” será também a maior mostra de uma colecção privada da obra do artista.

ART

O Garage recorda-nos que Rothko – associado à escola nova-iorquina de pintores expressionistas abstractos – nasceu na verdade no antigo império russo em 1903, naquela que é hoje a cidade de Daugavpils, na Letónia. “Into an unknown world” consistirá em mais de uma dúzia de quadros criados entre 1949 e 1969.

PASSION De Brian de Palma Com Rachel McAdams e Noomi Rapace Até ao dia 14 de Agosto, o Garage Center for Contemporary Culture em Moscovo irá apresentar a obra de Mark Rothko pela primeira vez na capital russa. A exposição intitulada “Into an unknown world” será também a maior mostra de uma colecção privada da obra do artista. O Garage recorda-nos que Rothko – associado à escola nova-iorquina de pintores expressionistas abstractos – nasceu na verdade no antigo império russo em 1903, naquela que é hoje a cidade de Daugavpils, na Letónia. “Into an unknown world” consistirá em mais de uma dúzia de quadros criados entre 1949 e 1969. As obras em exposição incluem No. 12 Yellow (Orange, Red on Orange) de 1954, bem como estudos.

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CINEMA


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GENDA ROBERT WILSON Lisboa. Teatro Nacional D. Maria Pç. Rossio Tel.: 212149834. 3ª a Dom. às 21h. De 10/03-29/09

TEATRO

Até ao dia 14 de Agosto, o Garage Center for Contemporary Culture em Moscovo irá apresentar a obra de Mark Rothko pela primeira vez na capital russa. A exposição intitulada “Into an unknown world” será também a maior mostra de uma colecção privada da obra do artista. O Garage recorda-nos que Rothko – associado à escola nova-iorquina de pintores expressionistas abstractos – nasceu na verdade no antigo império russo em 1903, naquela que é hoje a cidade de Daugavpils, na Letónia.

FEDERICO GARCÍA LORCA Um Poeta em Nova Iorque mais próximo do projecto original de Lorca

LITERATURA Até ao dia 14 de Agosto, o Garage Center for Contemporary Culture em Moscovo irá apresentar a obra de Mark Rothko pela primeira vez na capital russa. A exposição intitulada “Into an unknown world” será também a maior mostra de uma colecção privada da obra do artista.

Até ao dia 14 de Agosto, o Garage Center for Contemporary Culture em Moscovo irá apresentar a obra de Mark Rothko pela primeira vez na capital russa. A exposição intitulada “Into an unknown world” será também a maior mostra de uma colecção privada da obra do artista. O Garage recorda-nos que Rothko – associado à escola nova-iorquina de pintores expressionistas abstractos – nasceu na verdade no antigo império.

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Director Joana Alvarez ja@urban.mag.com Editora Ana Mello am@urban.mag.com Redactora Cristina Campos cristinacampos@arteseleiloes.com

Capa Joana Alvarez Tipos de Letra Nexa texto: Heroic Condensed Lisboa Sans, Bodoni Papel capa: Creator Silk de 280 grs miolo: Creator Silk de 150 grs

Colaborações Francisco Pinto Coelho Rita Penêda Daniel Malhão Luis Brito Jorge dos Reis José Bártolo José Luís Neto Luís de Andrade Peixoto Paulo Mendes Pedro Portugal Pedro dos Reis Sílvia Guerra Susana Pomba Tatiana Macedo Teresa Pearce de Azevedo info@urban.mag.com Produtora Editorial Madalena Palmirim mp@urban.mag.com Direcção de Arte & Design Joana Alvarez joana.c.alvarez@gmail.com Produção Gráfica Finepaper info@finepaper.pt Revisão de Conteúdos Sara Paiva info@arteseleiloes.com


THE BEGINNING


VOIDS ISSUE . $12.00

AIRES MATEUS VS JOHN CAGE & MERCE CUNNINGHAM 2

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MALEVITCH EDUARDO CHILLIDA DONALD JUDD JOSE LOUREIRO FRANCISCO PINTO COELHO CHEIO SOBRE O VAZIO OU VAZIO SOBRE O CHEIO

MAN RAY IRVING PENN

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