Olho as minhas mãos - José Luís Peixoto

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olho as minhas m達os. nas minhas m達os tudo passa.



duas planícies desertas. ruínas. o que ficou para trás.



uma menina que caminhou sozinha nas minhas m達os e perdeu a sua sombra.



um inverno distante que esqueceu a solid達o entre as minhas m達os.



nas minhas mĂŁos tudo passa. e tudo morre. nas minhas mĂŁos tudo sufoca atĂŠ ser nada.



jardins que as minhas m達os arrasam. mundos inteiros que as minhas m達os desvastam.



nas minhas m達os tudo passa.



as minhas mãos são uma noite insípida e vazia. são uma noite cheia de gente como cadáveres ou fantasmas.



as minhas m達os foram mesa e n達o eram mesa. foram cama e n達o eram cama.



nas minhas m達os tudo passa.



um homem de boas intenções viveu nas minhas mãos. viveu e caiu cansado na palma das minhas mãos.



vejo esse homem e vejo-me atravĂŠs dos seus olhos. agoniza. olha-me com pena.



morrerĂĄ quando as minhas mĂŁos morrerem.




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