Gostaria de relembrar que este é um arquivo temporario. A história que está sendo disponibilizada não é de uma forma definitiva, algumas coisas ainda precizam ser terminada, além da própria obra ainda não ter um desfecho, chegando, no máximo, ao fim de seu primeiro terço. Agradeço aos que estiverem lendo este arquivo e espero poder contar com a opnião dos mesmo sobre o trabalho em questão. - João Brum
Ouvi uma piada uma vez: Um homem vai ao médico, diz que está deprimido. Diz que a vida parece dura e cruel. Conta que se sente só num mundo ameaçador onde o que se anuncia é vago e incerto. O médico diz: “O tratamento é simples. O grande palhaço Pagliacci está na cidade, assista ao espetáculo. Isso deve animá-lo.” O homem se desfaz em lágrimas. E diz: “Mas, doutor… Eu sou o Pagliacci.” . Boa piada. Todo mundo ri. Rufam os tambores. Desce o pano. - Roschach
Trecho da Grafic Novel “Watchman”, escrita por Alan Moore e ilustrada por Dave Gibbons. Este trecho é uma referencia do autor à opera “Pagliacci”, de 1892, escrita por Ruggero Leoncavallo.
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Prólogo
Porto Real, Centro, Palácio Real, 15 de janeiro de 2014, 19h
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O enorme e mítico Palácio Real, construído em 1950 para ser o maior palácio de festas da cidade, usando um capital oferecido pela própria prefeitura municipal. Com mais de 1.000 m² de área construída, e quase 1 km² de um enorme gramado, recheado de esculturas de pedras e fontes aquáticas, além de lagos e rios que atravessam os campos, choupanas e piscinas gigantescas. Nesse enorme espaço de festas, é aonde uma apresentação histórica acontece. Um enorme palco é montado para a apresentação. Juntos, conversando e rindo, mais de uma centena de políticos extremamente influentes e militares de alta patente, com seus acompanhantes, além de grandiosos atores e magnatas industriais. Andando no meio dessa multidão, seca e quase inumana, Mirian Rua, a Delegada Geral da Policia Civil de Porto Real, a pessoa que mais debateu e se levantou contra a volta dos transumanos nos últimos anos. Usando saltos altos, e um rústico vestido rubro, que se estende até a metade da coxa, junto de uma parka negra e com seus cabelos negros presos em um coque no alto da cabeça. “Malditos covardes hipócritas”, pensa a delegada “nem parece que cinco anos atrás, repudiavam a existência desses malditos”. Andando sem ter um lugar especifico para onde ir, Mirian vaga por entre os poderosos de Porto Real, vendo a felicidade nos rostos de cada um, por acharem que, com esse grupo financiado pelo Estado, eles estariam livres de ameaças que possivelmente poderiam vir a surgir. É nessa vaga locomoção, que Mirian avista ao longe Hugo Kuhn, o organizador de tudo isso, o Secretário Municipal de Segurança Pública, o Conselheiro Presidencial de Tecnologia da Informação e Armamento, além o dono das Empresas A.E.Q., um conglomerado detentor das maiores empresas de tecnologia do Brasil, conversando com o Ministro da Defesa Brasileira, o general reformado, João Alberto Godoi. Hugo, como em todas as ocasiões que permitem, usava um terno
branco, gravata preta e camisa social vermelha. Enquanto João Alberto usava um comportado terno militar verde escuro, com todas as suas medalhas de condecorações e méritos. Os dois conversavam sobre os jovens que iriam se apresentar e mostrar ao mundo para que vieram... mostrar que seriam heróis. Para Mirian, eles viriam para serem monstros assassinos de civis, que apensa existem para que a polícia seja esquecida ou odiada pela sociedade. De forma extremamente sutil e habilidosa, Mirian se colocou próximo dos dois e “sem querer”, ouviu a conversa dos dois. -Sr. Ministro – diz Hugo, com um copo de champanhe na mão – Eu acredito que essa seja a melhor iniciativa já feita pelo governo nesses últimos anos. Precisamos ter uma forma de manter a paz na cidade. -Acredito que isso seja verdade, Dr. Kuhn – responde João Alberto – Sei que esses jovens foram muito bem treinados pelo senhor e por seus colegas. -Absolutamente, senhor. Assim como eu, alguns antigos heróis como Pesadelo, Andarilho e tantos outros nos ajudaram com isso. - Enquanto fala, Hugo percebe uma movimentação por uma abertura de duas cortinas, o clima parece tenso, Rodolfo Vilhella e Murilo estão se encarando. Dois segundos depois, uma jovem loira e alta aparece e fecha o pequeno espaço – Senhor... - diz Hugo – tenho que pedirlhe licença. Alguns infortúnios me chamam. -A vontade Dr. - Responde o ministro – Posso saber a que infortúnios se refere? -Os jovens do nosso grupo estão um pouco nervosos por aparecerem em público dessa forma, preciso acalmálos e os instrui-los nesse momento crucial para todos. - sem dar tempo para uma resposta do ministro, o bilionário Hugo Kuhn corre na direção do backstage do palco. -Vai tomar no seu cu, playboy! – grita Murilo para Rodolfo – Quem você acha que é para dizer o que é certo e o que é errado?? -Pergunto o mesmo a você, seu babaca! – grita Rodolfo em resposta.
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-Parem vocês dois! Isso não vai levar a nada – grita Renata no meio da confusão. Thais a e Renata Goth estão na frente de Murilo, e usando todas as suas forças para segurar o brutamonte que tenta desesperadamente atacar seu antagonista, porém se recusa a agredir as duas para chegar a seu objetivo. Miguel Torres, por sua vez, consegue segurar Rodolfo, já que os dois têm o mesmo tamanho e força. -Isso tudo é uma baboseira escrota. - mais uma vez grita Murilo – Não precisamos estar aqui. Vamos embora! - Te parafraseando: “QUEM É VOCÊ PARA DIZER O QUE DEVEMOS FAZER?” - grita Rodolfo irado. -Eu sou o cara que come a sua mãe, aquela vaca. É com essa declaração mentirosa, e claramente de zombaria, que o clima pesou ainda mais. -Eu vou comer a sua irmã hoje à noite. Até mesmo Thais, a irmã de Murilo, se assustou e por mínimos milésimos, esqueceu de que estava segurando seu irmão. Isso foi o necessário para que o jovem se soltasse e corresse na direção de Rodolfo, que por sua vez, estava ainda mais irado. Miguel, vendo que estava no meio do caminho dos dois, correu a uma velocidade incrível para um canto longe, e deixou os dois se resolverem. Foi nesse momento que o backstage do palco aonde ocorreria a apresentação virou um inferno. Uma caixa de som, que pesava no mínimo quarenta quilos, foi arremessada por Murilo na direção de Rodolfo, que por sua vez, criou um campo de força que o protegeu. Quando o punho de Murilo se chocou contra o rosto de Rodolfo, nada mais adiantava ser dito. Toda essa confusão se iniciou por um simples conjunto de comentários. Murilo, o jovem alto e forte, com dread-looks, negro e com um rosto jovial, porém rígido, olhava, por uma pequena fresta entre as enormes cortinas que davam para o gigantesco salão, recheado de pessoas importantes, tanto militares, quanto políticos, e até empresários magnatas além de conhecidos atores. Vendo isso, ele diz: -Isso me parece um evento de arrecadação de fundos.
Ouvindo o comentário, que ao ver de Rodolfo, era ridículo, o jovem de cabelo liso caído em uma franja loira, pele caucasiana e olhos verdes, com cerca de 1m e 70cm de altura, e magrelo, responde de forma atravessada. -Isso é a nossa forma de mostrar ao mundo para o que viemos. Eles nos financiaram e ainda irão nos financiar. Eles merecem isso. -Eles merecem é um tiro na cabeça. -Responde Murilo – Nós vamos proteger eles mesmo. Eles que devem se sentir forçados a nos pagar e fazer o que a gente quiser. -Quer dominar o mundo... — ironiza Miguel, o jovem moreno, de cabelos na altura do ombro, tão magro quanto Rodolfo e tão negro quanto Murilo. -Apesar do Miguel não falar nada de útil, dessa vez ele está certo. Não adianta você querer ser revoltado com o sistema que te criou, você tem que aceitá-lo. Você tem que lutar para que ele se torne melhor. - diz Rodolfo. -O playbozinho de merda, vai tomar nesse teu cu raspado, porra. Você quer aceitar um sistema que te privilegiou por ser filho de militar. Quero ver se você fosse abandonado por ele, quero ver se você fosse um morador de rua, que acordasse todos os dias em um lugar diferente. Quero ver o que você faria se tivesse que brigar com um cachorro por comida. Quero ver se você tivesse uma vida na sarjeta, assim como eu tive. E ai sim eu gostaria de saber qual seria a sua opinião sobre o “sistema”. Agora cala sua boca, que você não manda em nada. – diz Murilo enquanto caminha de forma agressiva na direção de Rodolfo. -Calma, Murilo – diz Valquiria enquanto abraça Murilo - Isso não vai levar vocês a nada. -Deixa esse puto falar o que ele quiser. Eu vi e eu sei como é o mundo, eu já estive lá fora com frio e com fome, meu pai era militar, mas eu demorei a me encontrar depois que o mataram e destruíram a minha casa. Eu sei como é difícil estar lá foral. E eu também quero que você saiba que a nossa obrigação é ir até lá e mostrar para o mundo que nós viemos para ajudar. Se eles tiverem medo de nos, tudo o que treinamos se tornará inútil. Mostrar pra eles que nós somos o que eles precisam, não o que você julga que eles
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merecem. - diz Rodolfo enquanto tenta andar na direção de Murilo, porém é impedido por Miguel. Nesse mesmo momento, Thais se une a Valquiria na esperança de segurar o enorme jovem negro. Hugo entra na área comum na parte de traz do palco e encontra o cenário de guerra. Ele vê Murilo, montado em Rodolfo, disferindo poderosos socos, que explodem em feixes de energia quando impactam o escudo energético feito por Rodolfo. Miguel está agarrado ao pescoço do enorme negro, junto de Renata, a jovem de cabelos roxos e curtos, pele morena e corpo esguio, os dois tentam impedir Murilo de continuar a bater, mas o esforço é em vão. Ainda tentando segurar Murilo, está Valquíria, que tenta segurar o braço direito do jovem, mas sempre que ele faz o movimento do soco, a mão da jovem, loira, alta e esbelta, escapa, deixando que mais um soco seja desferido. Thais vai ao encontro de Hugo, assim que o mesmo chega. -Senhor – diz a jovem, assustada – Eu acredito que seja melhor que deixemos os dois resolverem seus próprios problemas. Intervir só vai deixar os dois ainda mais irritados. -Se deixarmos os dois, eles vão derrubar o prédio. diz Hugo seco. Thais é o tipo diferente de menina, inteligente e esperta, seu corpo sempre foi fino e sem vida, extremamente sem sal. Sem dizer uma palavra, Hugo segue na direção do aglomerado de jovens, e com um rápido movimento, aplica um choque elétrico, usando um aparelho de teaser, na nuca de Murilo. O jovem negro cai para o lado, se debatendo. Rodolfo, que se sentia na razão, e imaginava que Hugo também o via assim, se levantava vagarosamente, mas caiu de novo, quando o pé do Dr. Kuhn bateu em seu rosto. -Vocês são dois moleques idiotas e estúpidos. - diz Hugo, cuspindo cada palavra com ódio – Agora se preparem! Vocês vão entrar no palco agora. Ao dizer isso, Hugo sai da presença do grupo e vai para o palco, para começar a anunciar o grupo.
Com sua parka negra e seu vestido vermelho, Mirian Rua provocava olhares. Entre eles, o do General João Alberto Antunes. -Boa noite, Delegada. – o General surpreende Mirian – Não acredito que uma mulher tão bonita não tenha vindo acompanhada para um evento tão importante. Todos os manuais de boas maneiras iriam dizer para Mirian agradecer e fingir ficar lisonjeada com o gracejo, e da mesma forma respondê-lo. Porém, infelizmente, a delegada não havia nenhum desses manuais na bolsa. -Obrigada, senhor. - começa a dizer Mirian – Porém a presença de um homem em uma festa como essa, não faz com que eu me sinta melhor. Prefiro ser solteira e me dar completamente para o meu trabalho. -Muito diferente a sua visão sobre o mundo, delegada – diz o Ministro de Defesa Brasileira. -Eu sei disso, senhor. - responde Mirian ainda agressiva – E me orgulho disso. Me orgulho de não ser mais uma mulher conformada, ou ser mais uma feminista fanátic... -Olhe! Parece que os jovens irão se apresentar. - diz o ministro, aliviado por aquela situação ter terminado. -Sim. Eles vão se apresentar. - concorda Mirian. -BOA NOITE, senhoras e senhores. - começa Hugo a falar, sem nenhum microfone aparente, porém com o som bem alto e claro em todos os cantos do salão principal – Hoje, nos reunimos para conhecermos o futuro. Hoje nos reunimos para que todos conheçam o que o destino preparou para nós. O que o destino QUER para nós. A mais ou menos dez anos, eu vesti um traje super-tecnológico e cheio de apetrecho, e sai pelas ruas de Porto Real durante as noites, para bater em bandidos. Durante anos eu fiz isso, durante anos eu coloquei minha vida em risco, e aprendi a ser um herói na prática. Assim como muito amigos. Hoje, eu sei que isso foi um erro. Hoje eu sei que o que eu fiz colocou a minha vida e a vida de diversas outras pessoas em risco. E todos sabem como isso terminou. Hoje... O mundo muda. Hoje, as coisas vão ser diferentes. Eu e diversos outros que cinco anos atrás aposentaram seus mantos, hoje treinam jovens com poderes especiais. Hoje vocês conhecerão o grupo que vai fazer com
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que o mundo mude. Eles são poderosos. Eles são treinados. Eles são jovens. Eles são a nova geração de superpoderosos. Eles irão proteger vocês... Irão proteger vocês de qualquer um que pratique terrorismo, mas insista em se chamar de herói. Eles são o Grupo Anti Terrorismo Heroico. Eles são o G.A.T.H. Com essas palavras, os seis jovens membros do Grupo entram em formação: Rodolfo, Murilo, Thais, Renata, Miguel e Valquíria. Todos uniformizados e se movendo com extrema autoconfiança e aparente prepotência, passando uma boa imagem. Mirian Rua assiste toda a entrada dos jovens com extrema atenção, enquanto Hugo Kuhn se afasta, deixando a maior parte do palco para os jovens mostrarem seus poderes. A primeira foi Valquíria, que com um rápido movimento de mãos, criou uma longa espada de luz branca, e logo depois, mostra sua habilidade com ela, cortando o ar e deixando partículas de luz no caminho, arrancando um suspiro do publico. Logo depois, Vulto, o jovem com o nome de Miguel se apresenta, correndo de um lado para o outro do palco, com extrema velocidade, chegando até a sumir completamente da visão do público, até o momento em que Renata, usando seu traje e o vulgo de Psy, usa seus poderes telecinéticos em jovem velocista e o levanta fazendo com que ele pare de correr de um lado para o outro do palco, essa situação arranca aplausos e risadas da multidão no Palácio Real. Logo depois, foi Rodolfo quem se apresentou, criando uma esfera de energia em torno de si mesmo, Escudo, nome usado pelo jovem ao vestir seu uniforme, mantem a barreira enquanto o próprio Hugo arremessa alguns objetos aleatórios no campo de força, que acabam sendo ricocheteados. Vendo que isso não era grandes coisas, Thais, a partir do hoje, conhecida como Atalanta, lança uma raja de energia no campo de força, que absorve a energia e fica maior e mais brilhante, finalmente se ouve um suspiro do público. Em seguida, chega à vez de Aquiles, o jovem alto, negro e forte, chamado pelos amigos de Murilo. Recheado de má vontade e desprezo, Aquiles olha fixamente para o público. Ele puxa uma faca estilo militar do bolso, e com um movimento lento e rústico, faz um corte no próprio pulso, que em um segundo,
começa a escorrer sangue. Durante longos cinco segundos, todos no Palácio olharam como medo para o corte tenebroso no braço de Aquiles, mas logo depois, todos se assustam ainda mais quando o machucado fecha e logo depois, apenas o sangue mostrava que ali havia existido um corte.vvvvv -Sim senhoras e senhores - diz Hugo com entusiasmo, tentando quebrar o gelo- Eles estão juntos de nós no combate a seres mal intencionados com a nossa população. Eles são fantásticos. Eles são os melhores de uma geração, e provavelmente de toda a história. Agradeço a presença de todos, e espero que tenham apreciado a apresentação. Quero agradecer-lhes a atenção e... Bem... Aproveitem a festa, ainda temos muito álcool para todos!
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Capitulo 1
Porto Real, Atalaia, Rua Fonceca Jr, 16 de janeiro de 2014, 01h32min
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Um homem alto, forte e acabado, acabado pela dor e pelo exílio da prisão, um ex-policial condenado por matar os assassinos do próprio filho, um homem acabado pela guerra contra o tráfico, anda pela rua sem um destino definido. Seu ombro lateja, no dia anterior a sua saída da cadeia, um grupo formado por membros de duas gangues rivais que ele mesmo havia ajudado a prender se uniu apenas para tentar matá-lo um dia antes de ganhar a liberdade, porém Mauricio conseguiu sobreviver a eles até que os carcereiros chegassem e tirassem os bandidos de perto dele. Ele anda lentamente levando consigo apenas sua roupa do corpo, e uma pistola 9mm junto de um dinheiro que havia deixado guardado, em um armário alugado, sob um nome falso, de uma estação ferroviária. Sua vida foi destruída, dispensado com desonra da polícia civil, o filho de um detetive amoroso e atencioso, que foi morto em uma violenta troca de tiro com bandidos locais, agora é um desabrigado e assombroso homem sem luz, que vaga pelas ruas de Atalaia sem rumo e acabado. O homem se pergunta por que o mundo precisava ser tão monstruoso e violento. Por que o mundo precisa tanto da violência para girar. Se a paz reinasse, seu pai nunca seria morto, seu filho nunca teria sido espancado até a morte por ser gay, nem sua mulher se mataria depois a noticia de que teve seu filho ser morto. Porém Maurício sabe que a paz nunca reinará, ele sabe que o conceito de “paz” é utópico de mais para ser valido e ser aplicado em um grupo de sete bilhões de pessoas. Sempre existirá conflito de interesses, e sempre existira a luta para que esses interesses prevaleçam e sejam preservados. Os pensamentos de Maurício são interrompidos quando um grito de dor rasga o silencio da madrugada. O grito masculino ecoa nos ouvidos do homem durante alguns
segundos, que o ouve atentamente. Durante esse tempo, o expolicial fica estático, sem ação, imaginando o que ira fazer em seguida. No final desse tempo, ele começa a correr na direção do som, que estava mais próximo do que ele poderia imaginar em um primeiro momento. Uma rua escura, transversal à rua principal onde Maurício estava. Essa rua com pouca iluminação e sem câmeras, agora estava mais movimentada que o normal, e ficaria ainda mais nos próximos instantes. Quatro moradores de ruas, mendinhos no sentido literal da palavra, ou “crakudos” se preferir, batem em um jovem, de calça jeans e camisa social. Eles parecem extremamente drogados, com os olhos vermelhos e zonzos. Mauricio, sempre foi um cara grande, parrudo e amedrontador, porém, mesmo tentando manter-se em forma na academia do presídio, ele não era a mesma coisa. Tudo pareceu acontecer de forma extremamente rápida. Enquanto o jovem, caído no chão, pedia por ajuda, ele viu uma mão surgir do negrume da rua sem iluminação e puxar um dos mendigos, que por sua vez, sumiu de sua visão. Com um rápido movimento, aproveitando que os outros moradores de rua haviam parados para avaliar a situação, a vitima se levanta e tenta correr para longe dali, porém ele está muito machucado, e cai cinco passos depois de se levantar. Com sangue na mão direita, e um homem sujo e com o nariz quebrado, sendo segurado na mão esquerda, o vulto de Mauricio olha fixamente para os outros três mendigos na sua frente, que estranhamente urram de forma muito sinistra e correm na direção dele. - Merda – pensa Mauricio quando vê a cena. Com um rápido movimento, o ex-policial larga o corpo do homem e puxa sua arma, mas o movimento que antes era fácil e automático, hoje em dia demora a ser relembrado. Quando ele empunha arma, já é tarde de mais, um dos moradores de rua já está muito próximo a ele. Esse mesmo morador de rua bate com força na mão de Mauricio, fazendo com que a arma voe e bata em uma das paredes do beco. Nesse momento, o grande homem começa a se relembrar de todos os detalhes daquele exato local. Um beco
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longo, que seria um hipotético atalho para se locomover entre a Rua Fonceca Jr. e a Av. Mariano Hunt, se não fosse por seu minúsculo tamanho, talvez um beco de um metro e noventa centímetros de largura, sendo que vários postes de luz bloqueavam o caminho para eventuais carros passarem, postes, esses, que à anos suas luzes não funcionam. Pilhas de lixo se amontoam pelo caminho, e portas e janelas de casas e prédios. Com o passar dos centésimos de segundos, o mendigo esta ainda mais próximo de Mauricio. O ex-policial pode sentir o fedor exalado pelo homem a sua frente, ele sente ânsia de vómito, mas se segura e desfere um soco no rosto do mendigo, que por sua vez, geme de dor ao cair para trás, com o supercilio aberto. O mendigo que vem a seguir hesita. Vendo isso, Mauricio tem tempo o suficiente para dar dois passos para trás e pega a primeira coisa que acha em uma pilha de lixo, que estranhamente é uma frigideira. Por um segundo, até ele hesita e observa mais uma vez a frigideira que acabou de agarrar. Esse segundo foi o suficiente para o outro mendigo ultrapassar o que aparentemente havia se predisposto a lutar, e chegar até o ex-policial. Porém não foi o suficiente para que o mendigo tivesse tempo para agredilo, ou fugir da pancada que Mauricio disferiu em seu rosto, usando a frigideira. Vendo que seus três colegas estavam desmaiados ou incapacitados, o terceiro mendigo, de longe o mais covarde, corre na direção da Av. Mariano Hunt, esperando se salvar. O jovem observa tudo, caído e claramente debilitado. Enquanto Mauricio anda em sua direção, passa pelo segundo mendigo em qual bateu, o que apenas abriu seu supercilio, e desfere mais um soco em seu rosto, fazendo assim com que ele desmaie. Logo após ele vai até sua arma, e pega a sua pistola, que havia caído em meio a luta. - Você está bem? – diz Mauricio enquanto se abaixa ao lado do jovem que havia sido vitima de uma tentativa de assalto. - Sim. – diz o jovem, porém sua voz mostrava o contraio. - Qual o seu nome? Me de seu celular.
- Meu nome é Rodrigo. - com um movimento longo e claramente dolorido, Rodrigo pega e entrega o telefone o homem que acabou de o ajudar. -Rodrigo, preciso que você fique calmo e se esforce para não dormir. Isso é crucial. - Tudo bem. - Alô – diz Mauricio depois de discar um numero bem curto e esperar que atendessem – Tem um homem ferido aqui na minha frente, ele foi espancado por quatro mendigos e precisa de atendimento urgente. Você tem como rastrear essa ligação? Sim. Ótimo. Não. Não quero ser identificado. Depois de desligar o telefone, Mauricio coloca-o na mão de Rodrigo e se levanta. Ele se distancia, enquanto coloca sua arma no coldre que pendia por de baixo de seu casaco. Porém ele para ao ouvir o jovem chama-lo. - Tome. Eles iam levar os cem reais que eu tenho na certeira mesmo, e você impediu isso. Acho que cinquenta reais podem te ajudar. – diz Rodrigo, com sangue escorrendo de sua boca e com sua mão estendida, segurando uma nota de cinquenta.v Sem jeito, e sem saber exatamente o que fazer, ele pega a nota e coloca em seu bolso, enquanto sai andando vagarosamente.
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Capitulo 2
Porto Real, Azul, Rua Emanuel Cavalcante, 16 de Janeiro de 2014, 3h21min
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Depois de horas maçantes, de um evento ridículo, com pessoas ridículas, reunidas em um único lugar ridículo, por causa de um motivo ainda mais ridículo do que todos juntos, Mirian Rua chega em sua casa. Suas pupilas doíam, seus braços mal conseguiam girar o volante do EcoSport branco que ele mesma tinha comprado com seu salario de delegada. Entrando em casa, com sono e cansada, ela vai diretamente para sua cama. Porém, quando abre a porta de seu quarto, algo inesperado acontece: o barulho de sua campainha. Ele olha para seu relógio e vê que já se passaram, e muito, das três horas da manhã. Preocupada e vagarosamente, Mirian anda até a porta principal de seu apartamento. Com os olhos pesados, porem sempre se mantendo em alerta, ela olha pelo olho magico de sua porta e vê a ultima pessoa que ela imaginaria ver. Mirian abre a porta e, agora, olhando frente a frente para Mauricio Marques, sentimentos conflitantes entram em colapso, deixando sua mente em total inquietação. A história dos dois é extremamente complicada. No final dos anos noventa, Alexandre Rua já era o Delegado Geral da Policia Civil de Porto Real. Com seus quarenta e cinco anos, o homem já era respeitado por todos os escalões da cidade, e sempre vivendo a sua sombra, estava Mirian Rua, a jovem detetive, promissora, que apenas havia ganhando esse título por ser filha de Alexandre. Durante alguns anos na policia, Mirian resolveu alguns pequenos casos de assassinatos e assaltos de pequenos, porém a fama realmente veio quando Mauricio Marques foi designado como seu parceiro. O homem já era mais experiente, tinha toda uma carreira e renome na Polícia Cívil. Os dois aprenderam muito um com o outros, e isso, no final das contas, acabou se transformando
em uma paixão imprudente. Mauricio era casado e amava sua esposa, porém a era apaixonado por Mirian, era algo mais físico do que qualquer outra coisa. Os anos se passaram e a paixão secreta dos dois durou até o dia da morte de seu filho. Nos três dias que se seguiram, Mauricio apenas ficava agarrado com sua mulher, Isadora. No quarto dia, Mauricio se sentiu obrigado a ir ver Mirian, porém, quando o marido se afastou, sua mulher se se jogou da janela do apartamento em que moravam. Quando Mauricio descobriu, se culpou e quase se jogou da mesma janela que sua mulher. Dois meses se passaram, e o julgamento dos suspeitos pelo assassinato do filho de Mauricio terminou. A sentença? Inocentes. Foi esse veredito que fez com que a vida de Mauricio se afundasse por completo. Ele assassinou friamente os quatro jovens suspeitos de terem matado seu filho. 19 seco.
- Não vai me convidar pra entrar? – diz Mauricio,
- Não. – reponde Mirian, mais seca ainda. - Parece que a menina cresceu. - Mais do que você imagina. - Só te peço um copo d’agua e uma conversa. Pelos velhos tempos. – diz Mauricio, com um pequeno sorriso no rosto. Mirian chega para o lado, e assim abre caminho para o ex-policial entrar. Ela fecha a porta logo depois que Mauricio entra. Ela sente a diferença no modo de falar e de se mover, até em sua aparência, facilmente. Ele está mais rustico, sua barba, que antes era rala e completa, agora é um emaranhado de fios crespos, sujo e cheio de falhas. Suas sobrancelhas estão grossas, seu olho exala uma fúria contida por anos. A delegada leva sua inesperada visita até seu escritório. Uma sala ampla e bem decorada se apresenta. Com longas
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prateleiras de livros, feitas de maneira, e uma mesa enorme, também de madeira, no fundo da sala, dividindo o espaço de uma cadeira comum, de aparência metálica com estofado de couro negro, de uma grande imponente cadeira, que se encontra de costas para uma enorme janela envelopada. Vasos de plantas decoram o ambiente, diferente da mesa de madeira que não possui praticamente nenhum adorno, porém recheado do papeis, pastas e livros variados. Mirian senta na cadeira maior, e oferece a menor para Mauricio, que se senta. Instintivamente, ele se estica para pegar uma espece de caderno de bolso, que se assemelha a um diário que ele havia visto à muitos anos. Mirian rapidamente retira-o do alcance da mão do homem a sua frente. - Medo de eu ler seu diário? – indaga Mauricio. - Esse diário não é meu. Isso é uma prova de um crime acontecido muitos anos atrás, mas que não foi solucionado. – responde Mirian, com claro ódio na fala. - Se você diz... – diz Mauricio com sarcasmo. - Diga logo o que você quer. Pois se não reparou, são quase quatro horas da manhã. - Sim. Eu sei. – depois de dois segundos olhando para o rosto de Mirian, Mauricio continua – Eu só queria ver você. Ouvir sua voz. Sai da prisão hoje. Queria rever algumas pessoas. - Eu sou a primeira pessoa que você vê hoje? - Não. Lembra-se daquele caso que estávamos quando eu fui preso? O nome do cara era Julian. Eu fui visitar o cara. - Como ele está? – pergunta Mirian com medo da resposta. - Morto. O medo de Mirian se concretizou. - Você sabe que agora, eu sou a Delegada Geral da Policia Civil de Porto Real, né? - Sim. Mas também sei que em nome dos velhos tempos, você não vai me prender. - O problema é que não estamos nos velhos tempos. Se você basear sua nova vida no que se passou anos atrás,
não vai ser bom pra você. - Sim, eu sei. Os heróis. Os vilões. O Dia do Fim. Isso mudou a forma como o mundo roda. Sei bem disso. - Então o que você quer? O que você realmente quer? - Sabe? – diz Mauricio, enquanto ascende um cigarro. – Não ach... - Por favor – interrompe Mirian – Apague o cigarro. Não tolero isso dentro de minha casa. – Imaginei que você tinha perdido essa chatice com os anos. – enquanto ri, ele apaga o cigarro na própria calça e o coloca de novo no maço. – Não acho que o mundo tenha mudado tanto. Pelo o que eu vi desde que sai da prisão, o mundo ainda é violento. Pessoas ainda são assaltadas nos becos escuros da cidade. O trafico ainda comanda as regiões pobres da cidade. Mulheres ainda são estupradas. O que mudou é que agora as pessoas veem isso. Esses caras com poderes vieram e mostram que o mundo pede por alguém que pode lutar contra isso. Algo que a policia não pode ser. - Mauricio. – diz Mirian – Eu realmente não estou a fim de ouvir seus discursos filosóficos obre o bem e o mau, ou o certo e o errado. Realmente não estou no clima. - Então está no clima para transar? – diz Mauricio quase sem pensar, no mesmo momento em que disse, ele sabia o erro que tinha cometido. - Sai daqui, antes que eu te de um tiro, ou te jogue na cadeia por mais quinze anos. Vai embora. – diz Mirian segurando sua ira. - Foi bom ver você. Realmente eu sentia saudades. – diz Mauricio enquanto se levantava e anda na direção da porta do escritório – Não vai me levar? O apartamento é muito grande, posso me perder. E além do mais, dizem quando visita bate a porta, ela nunca mais volta. - Você sabe muito bem aonde é a porta. – diz Mirian irada, sentada na sua cadeira – E além do mais, eu não quero que você volte. Mauricio sai da casa, batendo a porta com cuidado. São quatro horas da manhã e Mirian olha pelo olho magico da porta de sua casa, com uma lagrima caindo de seus olhos,
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vendo Mauricio entrando no elevador e indo embora.
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Capitulo 3
Porto Real, Vanilha, A.S.E.S., 16 de janeiro de 2014, 20h35min Um dia comum, em uma cidade comum, em um universo comum? Talvez. Os jovens que a cerca de dois anos treinam para serem soldados em um combate contra seres superpoderosos autoproclamados “heróis” tem um dia comum no local aonde eles acostumaram de chamar simplesmente de ASES. Academia Superior de Ensino a Soldados, apesar de ser foneticamente feio, o nome passa exatamente o motivo para o qual foi criado. Nos primeiros anos da década de setenta, em plena ditadura militar, e na época em que as milícias armadas chegavam ao seu auge, os militares sentiram a necessidade de treinar soldados de uma forma “superior”. O projeto foi bem estruturado e concebido com a ajuda de alguns empresários que ajudaram na fundação da cidade de Porto Real. Com o final da Ditadura Militar no Brasil, o projeto ASES foi ficando cada vez menos útil aos interesses militares, e depois de alguns anos, e da Prefeitura decretar que o projeto não rendia os lucros esperados a segurança pública, a Academia Superior de Ensino a Soldados foi fechada. Cerca de vinte anos depois do fechamento oficial, Hugo Kuhn, disponibilizando uma verba absurda, reestrutura a antiga academia, que agora manteria seu nome, porém seria casa e centro de treinamento do G.A.T.H. O grupo, como sempre, estava disperso em o que eles mesmos chamavam de Hall da Zoeira, um grande salão circular, com diversas poltronas espalhadas, todas viradas para uma televisão gigante, com DVD e vários videogames, o resto da sala é decorada com vasos de plantas relativamente grandes, alguns computadores Mac’s, ficaram no canto esquerdo da sala, enquanto do lado contrario se encontra uma enorme cozinha, no estilo americano, com uma grande bancada no centro, que serve tanto para apoio no preparo de uma refeição, quanto como mesa de jantar. Rodolfo e Miguel estão jogando freneticamente uma partida de futebol no
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videogame, sentados no sofá, com Valquíria sentada entre os dois gritando e torcendo sempre para o time que esta com a bola, enquanto que Thais e Renata estão na cozinha, fazendo um jantar para o grupo, ou pelo menos tentando. Murilo, sempre o mais deslocado do grupo, está deitado em um dos sofás do centro do salão, porém ignorando a partida e apenas ouvindo musica com seus fones de ouvido. - Sai dai cara. Poxa. Para de ensebar! – grita Rodolfo em tom de protesto. - Que nada, isso é estratégia: prender a bola e esperar o jogo acabar – responde Miguel extremamente feliz – Já to ganhando mesmo. - Vacilão. Vou quebrar um jogador teu se continuar assim – responde Rodolfo aderindo à brincadeira. - Huhul!!!! Vai time de branco!!! – grita Valquíria. Mais um minuto se passa. Minuto esse em que Rodolfo se irrita com o jogo feito por Miguel. - ACABOU!!! – grita Miguel se levantando e se vangloriando – E mais uma vez o Miguel, O Rápido, ganha o jogo – diz enquanto ri. - Aquele teu ultimo gol foi super cagado. Só me ganha assim. – responde Rodolfo em fúria. - Só te ganho assim, mas já te ganhei milhões de vezes – Miguel responde a provação antes de jogar um pedaço de papel qualquer no colo de Murilo – E ai cara? Quer perder pra mim também? Murilo em um primeiro instante olha pra Miguel com um claro desprezo, mas depois sua feição muda e ele parece estar mais disposto a jogar uma partida. - Vamas lá né. Não custa nada fazer uns gols em você. – diz Murilo dando um sorriso irônico. - É galera, acho que vou jogar um pouco no pc do meu quarto – diz Rodolfo enquanto se levanta do sofá e vai na direção da porta. - ALERTA DE VIRGEM! – grita Miguel em tom de zombaria – Vai jogar com que time, Murilo? - Vou de Milan. – responde Murilo sentando no lugar em que Rodolfo estava.
novo!!
- EBA!! – grita Valquíria – Vou torcer pra um time
Apesar da sua afirmação, Rodolfo apenas queria distancia de Murilo, o incidente na apresentação do grupo não tinha sido esquecido pelo jovem. Ele vai para a cozinha, aonde estavam Thais e Renata, e se senta em uma das cadeiras da bancada. - E ai? Estão fazendo o que? – pergunta o jovem para as meninas. - Cara! – responde Renata – Estávamos tentando fazer uma costela, mas não estava ficando maneiro. - É. Agora estamos fazendo um mega-ovo mexido pro pessoal. – complementa Thais. - Acho que também não tá dando muito certo. – diz Rodolfo olhando para o aglomerado de ovo na frigideira, com um aspecto feio e com uma coloração escura. - Rodolfo. – chama Thais – Você tem alguma noção de qual é a idade mental da Valquíria? - Cara! Eu arrisco uns cinco anos – provoca Renata, se metendo no assunto de Rodolfo e Thais. - Poxa! Vocês podiam dar um desconto pra garota. Ela foi achada largada no meio do mar e não tem nenhuma memória antes de acordar no hospital. É natural ela estar meio deslocada e sem saber o que fazer. – responde Rodolfo de forma cordial. - Por isso mesmo, não tem sentido ele estar em um grupo “militar”. E quem arrumou esse nome pra ela? Valquíria. Qual o significado? – diz Renata. - Ai você se resolve como o Hugo. – responder Thais. - Mas vocês já viram o que ela consegue fazer? – diz Rodolfo com um tom de admiração – Cara! Ela cria objetos de luz. E tipo... Ela é super habilidosa com as mãos. Sabe manejar uma espada como ninguém. - Até já sei a espada que você quer que ela maneje. Danado... – zomba Renata, deixando Rodolfo vermelho na hora. - Concordo com Rodolfo. Ela tem muitas habilidades, mas quem não garante que ela está mentindo sobre a amnésia
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dela? Hein? – indaga Thais aos dois – Quem garante que ela não está aqui pra nos espionar ou nos matar depois. Ela tem muitas habilidades.
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- Sim. – concorda Rodolfo – Mas quem me garante que você e o Murilo não estão mentindo? De onde vocês veem? - Prazer, meu nome é Thais – a jovem diz esticando a mão para Rodolfo aperta-la – Eu vim de uma família rica, mas meus pais me abandonaram quando descobriram que eu tinha poderes. Fui morar na rua, mas Murilo me protegeu e me acolheu quando eu precisei. Pronto. Sabe de onde nos viemos. - Mas quem me garante que você está me dizendo a verdade? Quem confirma isso? – diz Rodolfo – Quem me garante que isso não é uma mentira? Conheço e confio em você. Mas conheço e confio em você, da mesma forma que conheço eu confio na Valquíria. - O argumento dele é muito valido no meu ponto de vista. – diz Renata mostrando que ainda esta ali. - Cala a boca, Renata. – diz Thais, que faz com que a amiga levante as mãos em sinal de rendição e vá ver o ovo mexido que estavam fazendo – Então você prefere não desconfiar de ninguém, a desconfiar de todo mundo? - Exatamente isso – responde Rodolfo – Eu tento ver o melhor das pessoas. - Falando no capeta, o diabo aparece. – diz Thais enquanto vê Valquíria se aproximar. - E ai? – diz a jovem loira e extremamente branca – Estavam falando o que de mim? - Nada. – responde Rodolfo – Apenas falando das suas habilidades com uma espada. Valquíria senta do lado de Rodolfo e de frente para Thais. Porém, quando começa a falar, é interrompida por Hugo, que é acompanhado por uma jovem de aparentemente dezessete ou dezoito anos. Os dois veem pela sala principal do salão, que fica na direção das costas do sofá e do lado da cozinha.
- Boa noite, garotos. Quero apresentar alguém muito especial a vocês. - Fala quem é a gatinha ai do teu lado, chefão – grita Miguel, que está de joelhos no sofá, apoiado com os braços no encosto do sofá para vê-los. - Ela é muita areia pro seu caminhãozinho, Vulto – diz Hugo zombeteiramente – Essa é Viviane Godoi. Ela é filha do Ministro de Defesa do Brasil, homem cujo qual sem a ajuda não estaríamos aqui, e com um pedido formal dele, aceitei Viviane no grupo. Decisão que foi tomada também pelas as excepcionais habilidades da jovem. - Maneiro! – exclama Thais – Mostra pra gente o que você faz? O pedido faz com que Viviane fique vermelha de vergonha. Hugo gargalha e diz: – Acredito que Viviane tem dons diferentes dos de vocês. Ela, assim como eu, tem o dom da inteligência. Viviane desde cedo tem as melhores notas no colégio, e formou em Ciência da Computação, com apenas deses sete anos e agora é nossamais nova amiga e companheira. - Ótimo, boss. – diz Valquíria já indo na direção de Viviane e depois a puxando para si, para saírem dali – Vamos enturmar ela. A Viviane parece muito fechada. Vamos abrir ela um pouco. – diz a jovem loira enquanto ri. - Isso não vai acontecer agora – diz Hugo, secamente, causando um espanto no grupo – Tenho uma missão para vocês. Todos encontrem comigo no hangar em dez minutos, devidamente uniformizados e preparados para combate.
Como pedido por Hugo, dez minutos depois do aviso, o grupo já havia trajado seus uniformes e devidamente equipados para uma missão de campo, sendo Viviane a única exceção, ela havia acabado de chegar, não tinha um uniforme. Todos estão em fila no hangar. Menos Miguel. Hugo chega ao hangar, para na frente da fila e vê
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o time. Ele repara que apenas seis estão ali, e percebe que alguém esta faltando. Quando olha para o relógio e vê que os dez minutos que ele havia estipulado já haviam se passados, Hugo bufa de decepção. Porém quando olha de novo para o grupo, vê que agora os sete estavam ali, e que Rodolfo, Thais, Renata e Athena estão usando todas as suas forças para segurar uma gargalhada, Viviane também segura o riso, mas parece ter mais habilidade nessa disciplina. - Vulto – chama Hugo – o velocista do grupo. Você estava aqui quando olhei para o relógio? - Claro, senhor. – responde Miguel descaradamente. - Vou fingir que acredito. – responde Hugo ironicamente – Garotos, essa é a primeira missão de vocês. Eu preparei algo bem fácil, bem tranquilo. Vocês quase não vão ter que se indispor com inimigos. - Por que eu acho que isso quer dizer que nós vamos ter que bater em vários inimigos? – sussurra Rodolfo para Valquíria, que, por sua vez, ri. - Hoje de manhã, um homem foi visto carregando um carro nas costas em pleno bairro da Morada. Esse homem é descrito em seu arquivo pessoal como de cor parda, cabelos curtos, tatuagens pelo corpo, com cerca de 1,68m de altura e 75kg. Esse não é o tipo de homem que vai carregar um carro nas costas, porém, as imagens do acontecimento mostram isso. Com essas palavras, Hugo pega uma espécie de tablet e mostra um vídeo, que se projeta holograficamente na frente dos jovens: nesse vídeo, um monstro de quase três metros de altura e aparentemente com trezentos quilos de puro musculo, carrega um carro nas costas e o arremessa contra um grupo de pessoas. - É com isso que vocês lidarão hoje. – diz Hugo cinicamente – acabamos de receber a informação de que a policia esta atirando no mostro neste exato momento, mas sem efeito... Espero que vocês possam impedir que a situação piore. Posso contar com vocês? – ouve-se um sonoro “SIM” por parte dos integrantes do grupo. – Então está tudo certo. Vocês têm seus equipamentos, usem-nos bem. Outra coisa: nunca chamem um ao outro pelos seus verdadeiros nomes,
sempre usem seus codinomes. Agora vão garotos. Acabem com aquele monstro. – depois de uma pequena pausa, o suficiente para os jovens começarem a entrarem no jato que os levariam ao destino, Hugo diz – Viviane, você vai ficar aqui. Hoje não é seu dia de estreia.
- Parece que foi ontem que nosso treinamento começou. – diz Thais, para ninguém em especifico, mas para todos ao mesmo tempo – Parece que tínhamos uns cinco anos quanto começamos com isso. - Verdade. – diz Miguel, parecendo não acreditar que tanto tempo havia se passado – Já estamos nesse treinamento à quase dois anos. Passamos por muita coisa juntos. - Eu lembro que a Valquíria era retardada. – diz Renata, ironicamente – Opa! Ela ainda é... - Vai se ferrar, Renata. – responde a jovem loira irritada. - Vocês ouviram o que o Hugo disse. – diz Rodolfo de forma seca – Não vamos nos chamar por nossos nomes. Usaremos nossos codinomes, mesmo aqui, temos que ganhar esse habito. A nave usada pelo grupo, chamada de Albatroz, foi projetada por uma das empresas pertencentes à Hugo, a Nuke Tecnologias de Transporte, a nave tem a capacidade de decolagem vertical e um incrível sistema de camuflagem, conseguindo ser indetectável para qualquer tipo de radar conhecido. Sendo uma nave simples e compacta, feita para ser rápida, o Albatroz não possui muito espaço interno, tendo assim, espaço apenas para dez tripulantes. Este numero beira a perfeição, já que o grupo é formado por sete integrantes, sendo que apenas seis estão ali presentes, e acaba disponibilizando espaço para possíveis prisioneiros. Todos os jovens receberam treinamento para pilotar o Albatroz, porém Thais e Miguel foram os que mais demonstraram habilidade com o maquinário. E são esses dois que pilotam a nave em conjunto, no momento. Nos
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bancos posteriores aos de Thais(Atalanta) e Miguel(Vulto), estão Renata(Psy), Rodolfo(Escudo) e Valquíria, sentados lado a lado, e Murilo(Aquiles), por ultimo. Aquiles está trajando seu uniforme, um collant preto, com alguns detalhes que lembram as estampas militares, e diversos bolsos no cinto tático que traja, além de duas espadas embainhadas em suas costas, sua mascara tapa a metade inferior de seus tosto e mostra o sorriso diabólico de uma caveira. Esse visual é amedrontador para quem vê, e o olhar fixo no escuro horizonte contribuía para isso. - Você tá bem ai, Aquiles? – diz Valquíria olhando para traz, na direção de Murilo. – Tá mais quieto que o normal. Nem escuto a sua respiração. - Apenas me concentrando e me preparando pro o que vem ai. – responde Aquiles com o tom sério de sempre – Coisas que todos aqui deveriam estar fazendo. O treinamento acabou. Temos que enfrentar uma ameaça real agora. Agora sim temos que mostrar a nossa utilidade. - Nessa eu tenho que concordar com o Aquiles – diz Escudo – Isso não é um treinamento. Existem reais possibilidades de morrermos lá. Isso vai mudar as nossas vidas. Treinamos duro para esse dia. E agora temos que mostrar do que somos feitos. - Galera. – diz Vulto alguns segundos depois de Escudo terminar de falar – Chegamos. Olhando de cima, todos no grupo viam o inferno de baixo de si. As imagens mostravam uma pequena fração do que estava acontecendo ali. Uma praça publica estava em chamas, o bairro Morada parecia o caos. Muitos chamam esse de um bairro pobre e pacato, porém agora ele era o centro dos olhos do mundo. Um monstro enorme está a destruir o único local aonde as crianças podem brincar, e está matando inocentes. Os policiais estão a serem massacrados. Veículos maiores, como tanques e carros fortes não conseguem manobrar nas vielas que dão acesso à praça. Apenas o G.A.T.H. pode resolver essa situação. - Alguém tem algum plano de ação? – diz Atalanta, ainda atônita com a cena que se apresenta na praça. - Sim. – diz Escudo – Valquíria e Atalanta, vocês vão
ser nossos carros chefes. Vocês vão bater de frente com o monstro. As duas tem que fazer muito barulho e direcionar a atenção dele em vocês, ele precisa ser distraído. Psy, enquanto a Valquíria e Atalanta estiverem distraindo o monstro, você precisa lançar o Aquiles na nuca do monstro, incapacitando o mesmo. Vulto, você vai se encarregar de imobiliza-lo. Aqui no Albatroz, o Hugo colocou uma espécie de cabo de aço super resistente. Você vai usar esse cabo de aço pra envolver o monstro e imobiliza-lo. Enquanto isso, eu vou tentar evacuar o máximo de civis que eu conseguir. Sem que nenhum integrante discuta sobre o plano, o grupo logo salta do Albatroz. Aquiles é o primeiro a descer, sem paraquedas ou cordas. Em seguida desce Valquíria, levando Atalanta junto dela, em uma plataforma feita de energia branca, junto de Psy, que levita até o chão. Escudo e Vulto descem por ultimo, usando cordas táticas. Vulto, pouco depois de chagar no chão, já começa a se movimentar por todos os cantos. Ele usa sua velocidade para tirar alguns civis de zonas de risco, enquanto o resto do grupo começa a coloca o plano em prática. Aquiles, que foi o primeiro a chegar ao chão, já procura um lugar avantajado do ambiente, um lugar que o possibilitasse de ver todos os pontos da ação, o telhado de uma casa de dois andares de frente para a praça onde toda a ação acontecia. - Minha função é te arremessar no monstrão, tenho que ficar perto de você. – diz Psy, mostrando que aquela situação a satisfazia, fazendo, sem seguida, uma careta sapeca e arrancando um sorriso do canto de boca de Aquiles. Os dois, na parte de cima daquela casa viam Atalanta e Valquíria iniciarem o combate com o monstro. O monstro havia crescido desde que as imagens que Hugo mostrou para os jovens foram gravadas. Atualmente, o homem aparentava ter uns quatro metros de altura. Sua pele tem um tom de azul que se assemelha à cor do mar, porém algumas manchas em seu corpo dava uma aparência mais esverdeada a ele. Seu cabelo parecia ter caído, pois o monstro agora tem alguns fios de cabelo espalhados aleatoriamente por seu couro cabeludo. Sua face é obscura, primitiva, a única coisa visível em seu rosto é ódio.
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- Danado! – grita Valquíria em seu traje branco e prata, cobrindo todo seu corpo, com uma espécie de óculos tático, deixando seus longos cabelos loiros esvoaçando – Quer aprender a ser mais educado e cumprimentar quem acabou de chegar? – diz a menina de pé em uma plataforma de energia branca, que flutua. O monstro vai à direção da menina, que em um rápido movimento, lança uma rajada de energia no rosto do monstro, que urra de dor. Fatalmente, a raiva do monstro aumenta, fazendo com que ele comece a correr na direção da jovem. Fato este que é interrompido quando outra rajada de energia é lançada contra as costas do monstro, lançando-o para frente, mas se mantém de pé. A origem dessa segunda rajada são as mãos de Atalanta. - São duas pra você se preocupar, otário. – grita Atalanta para o monstro. Em uma fração de segundos, o monstro levanta um carro popular e, de forma ainda mais rápida, arremessa-o na direção de Atalanta, que igualmente rápida, se lança para seu lado esquerdo, desviando do carro. Por sua vez, o carro segue e seu caminho, que por obra do destino é uma menina de dez anos, com um bebê no colo, parecendo ser sua irmã. A possível tragédia se estingue quanto Escudo se interpõe entre os dois, e com seus poderes, cria uma barreira de energia azul. Seu uniforme está impecável, o collant cinza chumbo, sobreposto por um protetor dorsal que cobre a parte superior de seu dorso, seus ombros, trapézios e parte do pescoço, feitos de uma liga especial de paládio e carbono, sua mascara também é feita da mesma liga, e os dois compartilham a cor azul escuro. - Você esta bem? – diz Escudo olhando para menina com sua possível irmã no colo. - S-s-si-im – responde ela. - Então corra pra longe. – diz Escudo, saindo de perto logo em seguida. Enquanto isso o monstro urra de dor, quando Atalanta e Valquíria lançam, ao mesmo tempo, uma rajada de energia, cada uma, na direção do monstro. - Aquiles. – diz Psy, de cima do prédio – É a nossa
vez. - Sim – responde o jovem rastafári com amargura em sua voz. Assim, Psy, a jovem telepata começa a levitar, e junto dela, traz Aquiles consigo, fazendo com que ele voe, usando seus próprios poderes da mente e de uma forma mais do que rápida, ela arremessa Aquiles, que já com suas espadas em mãos, voa na direção das costas do monstro.
Enquanto isso, no Instituto ASES, Viviane e Hugo estão sentados em um os sofás do Hall da Zoeira dos membros do GATH. Os dois estão sentados no mesmo sofá, lado a lado, olhando para a televisão onde mais cedo alguns dos membros do grupo jogavam videogame, nessa televisão, está se passando os acontecimentos caóticos na praça do bairro Morada. - Está vendo isso? – diz Hugo para Viviane – Quanto tempo você acha que sobreviveria ali? - Não sei. – responde ela secamente – Tempo o suficiente para ser útil, talvez. - Exatamente, ” talvez”. Não podemos te arriscar dessa forma, dificilmente você seria útil no campo de batalha. Quando eu aceitei que você se juntasse eu grupo, minha intenção não era te colocar no meio do barulho. Você vai ter uma função diferente deles. - Mas por que? – diz Viviane indignada – Eu quis me juntar ao grupo para poder ajudar a lutar contra os caras verdadeiramente maus. E sentada dentro desse prédio eu não posso fazer nada. - É? Então me diz em que você pode ajudar em um caso como esse? – diz Hugo apontando para a tela, no exato momento em que os jovens chegam ao local. - Eu faço ginastica olímpica à anos, e também tenho faixa rocha de taekwondo. – responde Viviane orgulhosa de si mesma. - Huhum – murmura Hugo – Você lembra-se do Saltador?
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- Não. - Ele era um herói do passado, assim como eu. Ele usava uma roupa vermelha e prata, tinha uma mascara bem clichê, mas era maneira. E ele é um cara muito maneiro, mas ele não tinha poderes, mas ele tinha sido lutador de MMA e assim como você, fez ginastica olímpica quando era adolescente. - Isso é apenas uma prova de que eu posso ser uma heroína como eles – diz Viviane olhando pra tela. -Isso é uma prova de que você vai morrer. – diz Hugo alterado – O Saltador morreu em dois meses. Tomou dois tiros no rosto depois que foi atordoado por uma pancada na cabeça por um brutamonte qualquer. – vendo que a história causou um abalo na mente de Viviane, Hugo continua – Acredito que depois disso, você vá intender que seus anos de ginastica artística e anos de taekwondo não vão te ajudar em uma briga dessas proporções. Seus talentos vão ser muito mais bem aproveitados aqui, ajudando na disposição tática do time. Quando seu pai veio a mim dizendo que você queria participar desse time eu aceitei imediatamente, pois já tinha ouvido falar sobre a sua habilidade com computadores.
Enquanto Aquiles viaja pelos ares, na direção do monstro, a atenção de todos do grupo se concentra nele, aquele momento definiria a continuidade do fato. E as expectativas se confirmam quando o jovem herói atinge, em cheio, com suas espadas, a nuca do monstro. As duas laminas curvas, afiadas e reluzentes, se cravam por completo na parte de trás do pescoço monstruoso do ser que antes já fora um homem, e se projetam para frente, saído pelo peito do monstro. Nesse mesmo momento, para finalizar a ação do grupo, Vulto, que havia recebido a missão de envolver o monstro em um cabo de aço especial, entra em cena. Como seu próprio nome diz, apenas um vulto azul e dourado é visto dando voltas no monstro. Essas voltas são seguidas por um fio prata reluzente que envolve o monstro por todos os lados, deixando-o imóvel, que com o tempo, cai no chão, como uma pedra.
-Tomou, cara de avestruz catatônico. – diz Vulto para o monstro desacordado no chão. -Ganhamos? – pergunta Atalanta que já está próxima de Aquiles, segurando seu braço. - Acho que sim – diz Escudo. - Só eu acho que isso foi muito fácil? – pergunta Psy para todos do grupo. - Não... – responde Aquiles. Quando ela termina de falar, o que todos tinham medo acontece. O monstro começa a se contorcer, enquanto seus ombros alargam e seus membros ficam mais grossos, assim como seu dorso e pernas. O cabo de aço não consegue mais segurar a preção, até o ponto em que estoura. No mesmo momento em que a corda estoura, jogando partículas de metal para todos os lados, o monstro solta um grito de dor e raiva que parece ecoar por toda a cidade. Esse grito foi alto o suficiente para causar um deslocamento enorme nas correntes de ar ambientes e lançar os jovens para todas as direções. Psy e Vulto foram os únicos que conseguiram sair ilesos do ocorrido, pois conseguiram manifestar seus poderes rápidos o suficiente para evitar o impacto. Aquiles, por sua vez, foi o mais atingido; por estar mais perto do monstro, foi atingido com mais força pelo deslocamento de ar e arremessado mais longe. - Mas que puto – diz Vulto, que com seus poderes de super velocidade, havia fugido da área aonde ainda se podia ouvir o grito do monstro, e já estava de volta. – Vocês estão maus? - Que nada – diz Aquiles, depois de tirar uma pedra de aparentemente cinquenta quilos de cima do braço esquerdo, que agora aparece dilacerado, pendendo do braço do jovem rastafari. – Tá todo mundo bem pra caralho. Mas não havia tempo para brincadeiras, o monstro já seguia na direção de Aquiles, que com um braço praticamente destruído e todo o corpo machucado, mal tinha como se defender. O primeiro pensamento de Vulto foi retirar Aquiles dali, porém o mesmo era grande de mais para o pequeno velocista. Quando o rastafári pensa em uma forma de se
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defender contra um monstro tão grande, usando apenas um braço, já é tarde de mais, o monstro já se encontra a dez metros dele. Nesse momento que uma grande barreira azul de energia surge a sua frente. Junto dessa barreira, alguém se interpõe entre o monstro e Aquiles, esse alguém é Escudo, o mesmo garoto que ele havia brigado no dia anterior, no dia de apresentação para a Superclasse de Porto Real. - Seu braço já melhorou?! – grita Escudo em meio ao barulho dos gritos de ódio combinados com as batidas ocas dos socos do monstro no escudo criado por ele próprio. - Ainda não. – responde Aquiles. Logo depois de responder, o rastafári vê dois feixes brancos indo na direção do monstro, e em seguida, um grande clarão de luz. A origem dos dois feixes são as mãos de Atalanta e Valquíria. O monstro agora está no chão, com suas centenas de quilos de músculos e raiva, o monstro ruge caído no chão. Uma mistura de raiva e dor no rugido do monstro causa uma mistura de pânico e medo nos heróis do grupo que teria que derrota-lo. Ninguém sabe o que fazer, ao certo. Todos ali estão inseguros. Quase todos tem medo do monstro que nunca imaginariam enfrentar. Na verdade, todos ali já tinham passado por treinamentos que simulavam ocasiões como aquela, mas nenhuma simulação, nenhum treinamento havia mostrado para aqueles jovens o poder que o medo tem. Nenhum treinamento poderia ajuda-los ali. Mas isso não impediu Escudo de agir. Quando mais uma vez o monstro se levantou e, sem nem lembrar que havia acabado de receber duas rajadas de energia, corre na direção dos jovens, que já haviam se reagrupado, no local aonde Escudo, Vulto e Aquiles estavam, Escudo já criava uma barreira de energia entre eles e o monstro, fazendo com que o grandalhão volte a bater na barreira. - Pessoa, eu sei que isso é ridículo – grita Escudo, claramente desconfortável pelo esforço de manter o escudo – Mas... ATAQUE SOVIÉTICO NESSE DISGRAÇADO! Depois de alguns segundos de absorção da ideia, os jovens que haviam sido denominados como G.A.T.H. agora atavam por todas as direções o monstro.
O primeiro, e mais apreçado, foi Vulto, que com sua super velocidade, corre envolta do monstro e o escala enquanto desfere socos fracos no corpo do mesmo, que por sua vez, se balança como um cachorro se secando e lança o jovem para longe. Porém ele não é rápido o suficiente para Atalanta que o acerta com uma rajada de energia no rosto. Logo em seguida, uma arvore voa na direção do monstro, arremessada por Psy com seus poderes telecinéticos. Infelizmente o monstro foi mais rápido e com um simples movimento dos braços, consegue pegar o tronco da arvore e rapidamente usar como porrete para acertar Valquíria, que em uma de suas plataformas flutuantes de energia voava em sua direção com uma espada, também de energia, em mãos. Aquiles por sua vez, aproveita o momento e, usando uma esfera de energia criada por Escudo, se lança na direção do monstro, que tenta acerta-lo com um soco, que Aquiles consegue desviar e com uma de suas espadas causar um profundo corte no braço direito do monstro. - Tudo isso por um corte no braço – reclama Vulto, em tom de zombaria – Melhor isso do que nada... Enquanto o monstro ainda rugia de dor, a mesma Valquíria que havia sido jogada para longe, abatida por uma arvore, já estava de volta, com uma nova espada energética e outra plataforma flutuante de energia, voando na direção do rosto do monstro. Ela acerta de raspão o rosto do monstro, que cai apoiado em um joelho e gritando de dor, com um rasgo do canto direito da boca, até sua orelha direita. Escudo corre na direção do monstro e prepara um soco para disferir no rosto do mesmo, potencializado por uma esfera de energia criada em sua mão. Porém o monstro não se dá por vencido e rapidamente segura o braço do jovem. Outra rajada de energia é lançada contra ele, mas dessa vez ainda menos efetiva. O monstro sente apenas um toque e em seguida lança Escudo, que ainda estava segurando, na direção de onde a rajada havia vindo, acertando Atalanta, e jogando os dois para longe em um emaranhado de braços e pernas. Psy novamente entra em cena, mas dessa vez, usa seus poderes telecinéticos diretamente no monstro. A telecinese é conhecida por não ter barreiras. Tudo pode ser controlados por ela. Desde uma pequena folha seca que cai
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de uma arvora, até um planeta inteiro está submisso ao poder de quem controla totalmente sua habilidade de controlar a matéria. Psy com certeza não é uma dessas pessoas que controla totalmente sua habilidade, mas no decorrer de dois anos de treinamento, seus poderes foram treinados de tal forma, que suas habilidades transpassavam o que já tinha sido visto e feito por telecinéticos até mais antigos que ela. Isso já é o suficiente para levantar um monstro de trezentos quilos. Com absoluta certeza, seria mais fácil se ele estivesse desacordado, ou zonzo, porém ele está acordado, machucado e com raiva. Com dificuldade, Psy levanta-o. Aos poucos ela o controla, e parece que o mesmo começa a aceitar que estava derrotado, porém ele não está. A jovem telecinética não aguentará aquilo por muito mais tempo. Nesse momento o tempo para. Ou pelo menos é assim que Vulto vê. O jovem velocista, irresponsável, imaturo e arrogante vê o mundo em uma mínima fração da sua real velocidade quando usa para valer seus poderes. Com tudo a uma velocidade de 0,01% vista aos olhos do jovem, ele anda calmamente a uma das casas mais próximas dali. Com tranquilidade, o jovem de 16 anos se vê procurando por botijões de gás e cabos que os liguem aos fogões. Foi nesse momento que o jovem percebeu que aquilo era apenas uma casa comum, uma cozinha comum, portanto um botijão de gás e um fogão comum. E ai a sua velocidade foi necessária. Em um estalo de insanidade, a ideia de buscar todos os galões de gás das casas mais próximas surgiu. E assim o jovem Vulto fez. Quinze galões de gás, em um único lugar. - Todos juntos. O gás vai sair e tudo explode. – diz a si mesmo Vulto. -Vult...! – começa a gritar Escudo, mas para quando vê o velocista próximo dele – O que você foi f...? - Psy – grita o velocista, apontando para a casa na qual tinha colocado os botijões de gás – Joga ele naquela casa! E é o que ela faz. Ela o arremessa com força. Com a força do impacto, uma parede inteira da casa de dois andares que ficava de frente para a praça cai aos pedaços. Nesse
momento, Vulto sabe que tem que ser rápidos. - Atalanta, lança uma rajada de energia naquele prédio. – grita Vulto. - Por que? – pergunta a jovem. - Só lança – retruca o velocista. Atalanta lança uma rajada de energia, que agride o interior do prédio, mas não causa nenhum problema maior. - Era pra acontecer alguma coisa? – pergunta a jovem. - Era pra explodir tudo. Tem vários botijões de gás abertos lá dentro. – diz Vulto. - Merda. A energia da Atalanta não é incendiaria. – diz Aquiles – Sejam mais inteligentes. É melhor lançar aquele pedaço de madeira no monstro. Enquanto diz isso, o jovem aponta para um pedaço de madeira no chão, que havia pegado fogo graças à explosão de um dos carros que o monstro havia destruído em seu ataque. Psy segue o concelho de Aquiles. E no mesmo instante o prédio explode. A explosão cresce de forma indesejada. Os prédios no entorno do alvo são atingidos pela explosão e caem aos pedaços. Os jovens, em grupo, se aproximam do local da explosão, depois de se recomporem do susto, e veem um homem sair decadente do meio dos destroços. Ele cai de costas para cima. Parece derrotado. Esse era o homem que um instante atrás fora um monstro que havia causado toda aquela destruição. - Acho que vão implicar com a gente por toda essa bagunça – diz Valquíria, para o grupo. - Eles deveriam nos idolatrar – responde Aquiles – Nos salvamos a cidade. Ele ia destruir tudo. - Como sempre, Aquiles – diz Escudo – Acha que todo o mundo te deve saudações. No mesmo instante, um feixe de luz os ilumina. São as câmeras de helicópteros de emissoras televisivas locais. E junto deles a multidão atônita aparece. - Parece que você estava errado, irmão – diz Atalanta
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para Aquiles. - Talvez – responde o rastafári. – Posso estar certo, ou errado. Com o termino da colocação de Aquiles, os civis que se sentiam seguros o suficiente para chegarem perto e verem o que estava acontecendo. Eles aplaudem os jovens que haviam acabado de terminar com o pesadelo da Praça do Karmo.
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Capitulo 4
Porto Real, Centro, Edifício Jezé Eufrozino, 16 de Janeiro de 2014, 23h44min “Pessoas cansadas e acomodadas com suas vidas, em sua maioria sem nenhum futuro, porém alguns promissores, mas provavelmente nunca vão desenvolver seu potencial”, esse é o pensamento de um Fantasma. Uma sombra na escuridão. Um companheiro de um cavaleiro solitário. Victor, um jovem que uma vez se viu sem rumo, hoje se sente mais forte do que um dia já pode se sentir. Anos atrás, o jovem morava na rua. Teve poucos amigos, mas todos verdadeiros. Alguns manifestaram poderes e se esconderam no esgoto. Outros aproveitaram a chance e viraram famosos, como Murilo e Thais. - Seus amigos estão na televisão. – uma vós grave ruge na escuridão da sala. - Eles não são mais meus amigos. – responde o jovem em resposta, na varanda do apartamento, olhando para o horizonte chuvoso. “Fantasma” foi o nome que ele adotou. Na varanda do apartamento, ele pensa sobre o caminho que o levou até ali. Pais mortos, uma vida de vagabundagem na rua, bons amigos, traição e uma vida sem sentido, sem rumo, sem objetivo. “Anderson”, esse é o nome que o fez sair da lama. Esse é o nome do homem que enfiou a mão na sarjeta, segurou a mão do garoto e o tirou de um poço de merda em que sua vida se encontrava, e deu-o um objetivo. A maioria das pessoas chama seu salvador de “Manto”. O primeiro vulto na noite, o cavaleiro solitário de Porto Real. O único homem que mesmo depois de ser proibida a atuação de heróis, se manteve na ativa, não desistiu e usou suas habilidades para atormentar os bandidos que hoje estão em hospitais e necrotérios. - Eles estão famosos – diz Manto, com seu capuz negro encobrindo o rosto e sua capa negra esvoaçando ao vento da porta que dá para a varanda entreaberta – Eles aparecem
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nos noticiários a todo instante. - Malditos sejam. – responde Fantasma, irritado, enquanto passa pela porta da varanda, adentrando a sala, e fechando-a atrás de si. - Apesar de destruírem um monstro enorme em público, não conseguiram impedir que matassem este homem. – a voz estridente de Manto mais uma vez rasga o ambiente, que logo em seguida é iluminado por um raio. A luminescência do raio mostra o homem morto no chão. Nu, apenas com um lençol manchado de sangue tapando suas intimidades, seu peito estava coberto de sangue e com um enorme buraco bem ao centro. - Isso ainda é seu treinamento – diz Manto – O que você vê aqui? Depois de alguns segundos para organizar as ideias, Fantasma responde. -Arma calibre .12. Como não tem nenhuma marca de tiro no chão e o ferimento é muito grande para ser a queima roupa, e denso de mais para ser a média distancia, deduzo que ele recebeu dois tiros antes mesmo de cair: uma escopeta automática. – levantando e indo até a porta, continua a falar – A porta estava aberta quando entramos, analisando os padrões de ranhuras na fechadura, a experiência é obvia. – olhando para o ambiente – O homem não estava sozinho aqui. Provavelmente prostitutas o acompanhavam. Acredito que acharemos algum tipo de material... pubiano... em alguma parte do corpo da vitima. Assim como digitais nos copos. - De acordo com suas deduções, como foi a ação? – questiona Manto. - O assassino entrou pela porta principal, com um método muito interessante de arrombamento, silencioso e rápido. Rápido o suficiente para acontecer no intervalo de movimentação da câmera do corredor. A vítima estava com uma prostitua na sala, sentado no sofá especificamente, vendo televisão, enquanto a prostituta praticava sexo oral com o mesmo. O assassino o encontra e atira sem hesitar. Dois tiros a media-curta distancia. Dois tiros seguidos. A prostituta foi poupada, provavelmente por um senso distorcido de piedade do assassino. Um trabalho totalmente profissional. A única
conclusão que vejo é o assassinato encomendado da nossa vitima: João Alberto Godoi. - Como ele saiu daqui? – indaga Manto esperando que ele termine a investigação com êxito. - Eeehh... – hesita Fantasma ao ser questionado por algo que parece tão óbvio, porém se mostra ser extremamente complicado – Acredito que ele tenha usado o mesmo artificio para sua entrada: sair do quarto no tempo exato que a câmera de segurança do corredor perde a porta desse quarto de seu campo de visão. - Ingênuo. – diz Manto, demonstrando seriedade – Ele nem saiu do quarto ainda. Nesse momento, um vulto negro se contorce e grunhi das sombras da sala, ao mesmo tempo em que começa a correr na direção dos dois. Manto e Fantasma pulam em direções opostas, deixando que o homem passe no meio da dupla, seguindo na direção do enorme portal que leva para a varanda do apartamento. Os dois vigilantes não tem nenhum tempo de reação, se levantam rápido, e seguem o homem, mas não conseguem impedi-lo de quebrar o vidro da porta que dava para a varanda e pular da sacada do prédio. O homem está em queda livre, com a chuva noturna irrigando o asfalto sujo, que ficará ainda mais sujo quando o sangue do homem se espalhar pela calçada do Edifício Jozé Eufrozino. Fantasma saca seu arco, e em outro movimento, quase simultâneo, ele puxa uma flecha de sua aljava. Ele atira-a para baixo, na direção do homem. Esses mínimos instantes parecem horas para Fantasma, que queria mostrar suas habilidades com seus equipamentos para o seu mentor, mas nem dois segundos se passaram. Com a mesma rapidez de um raio, uma nuvem de fumaça roxa, mal iluminada pela lua, surge e desaparece. E junto com a nuvem, o homem some, deixando apenas uma flecha para trás, que cai até o chão, e quando chega, estoura e começa a soltar cabos aleatórios, criando um emaranhado de cordas na calçada exatamente a frente do Edifício Jozé Eufrozino. - Você não tinha visto ele mesmo? – pergunta um
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Fantasma incrédulo com o que vê. - Não. – responde Manto. - Tem ideia de quem ele é? - Sim. – Manto responde e se cala logo em seguida.
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Capitulo 5
Porto Real, Morada, Avenida Barão do Karmo, 17 de janeiro de 2014, 02h34min Conhecendo Porto Real como ela conhece. E sabendo dos acontecimentos recentes, uma ligação para a polícia na madrugada de quarta para quinta-feira, avisando de um corpo achado em uma caçamba de lixo, no bairro do Morada, só pode ser um herói encobrindo um de seus vários erros. Mirian Rua viaja pela Avenida Barão do Karmo com esse sentimento de ódio no peito, enquanto pensa em que grau de deformação o corpo achado está. Com graves problemas para dormir, desde o dia em que Mauricio apareceu para atormenta-la, Mirian havia decidido passar sua madrugada na delegacia, acompanhando de perto os crimes da madrugada da cidade. Chegando ao local, tudo já estava devidamente isolado e, inevitavelmente, coberto de jornalistas. Toda morte que acontece nessa cidade, pode ser fonte de uma noticia incrível. Mas nesse caso é diferente. O excesso de jornalistas é obrigatório. Foi uma jovem jornalista que morreu. Apesar de serem competitivos entre eles mesmos, sempre tentando serem melhores que seu colega, e ter o destaque da primeira página, e não o companheiro que está parado ao seu lado, os repórteres são unidos, de certa forma. Se um deles morre, ou vai para o hospital por culpa de uma fatalidade do trabalho, o alvoroço criado pelos demais membros da classe é insuportável. Eles pressionam a policia, para investigarem o ocorrido. Pressionam os políticos para usarem suas influencias. Pressionam até o trafico e a milícia, para acharem entre eles mesmos os culpados. Viviane Rodrigues, 26 anos, 1,72m, 62kg, olhos castanhos, cabelo preto, pele caucasiana, estava usando remédios para dormir nas ultimas três semanas. Esses eram os dados da moça nos registros médicos mais recentes. Mirian havia visto medidas de busto e quadril, mas havia
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se esquecido de todas as medidas fúteis que haviam sido criadas para diferenciar as mulheres. Um beco escuro, sendo iluminado apenas pelos faróis e giroflex das viaturas, além dos milhões de flashes das câmeras dos jornalistas ali presentes. Mirian passa pela multidão de jornalistas em seu carro, sendo ajudada por policiais que abrem um corredor para que seu EcoSport brando possa passar sem matar ninguém no processo. - O que você tem para mim – diz Mirian, já dentro da área restrita da policia e fora do carro, para um dos membros da equipe de médicos forenses que acompanhava a ação. -Boa noite, delegada. – responde o homem – A única informação que conseguimos até o momento é que a jornalista foi espancada até a morte em algum lugar, e foi jogada de uma boa altura nessa caçamba de lixo. – Mirian instintivamente olha para cima, na direção dos dois prédios aos quais à caçamba de lixo ficava ao meio. – Pensamos nessa possibilidade. – diz o médico prevendo o que a delegada iria dizer – Já temos dois grupos de investigadores em cada prédio procurando por vestígios de sangue, ou de algum suspeito. - Bom trabalho – Mirian se dirige até a caçamba, para ver o corpo da vítima, mas no meio do caminho para e volta – Doutor? Já nos encontramos antes? - Acredito que sim, senhora. – depois de dizer isso, o homem se aproxima e estende a mão – Meu nome é Alexandre Alexx Schultz, fui contratado duas semanas atrás. A senhora me entrevistou. Hoje é meu primeiro dia fora do laboratório. - Parabéns. Tenha um bom primeiro dia de campo. – responde Mirian, fria e seca, como sempre. - Muito obrigado – responde um animado Alexandre. Mirian anda até a caçamba ainda com o corpo, nenhuma marca de tiro, facada ou barra de ferro. Quem havia feito isso, fez com as mãos limpas. O problema é que pelo estado que o corpo da jornalista estava, a pessoa que havia feito isso, passou horas batendo na coitada.
Capitulo 6
Porto Real, Centro, Instituto Médico Legal, 17 de janeiro de 2014, 05h20min Fabio Sena, conhecido mundialmente como um dos grandes nomes ligados a medicina forence da atualidade, havia sido forçado a voltar para seu país de origem, para trabalhar por um salario longe de ser digno de um profissional como ele. Tudo isso, o resultado de um acordo, que na época parecia inteligente, que prometia todos os seus custos com estudos e materiais pagos pelo governo, mas com a promessa de um dia voltar e trabalhar como diretor em um dos IMLs mais movimentados do país. Esse homem, endurecido pelos anos como médicos legista em CSIs e Low & Orders da vida real, que agora, com seus instrumentos em mãos, estuda o corpo da jornalista com cuidado, em uma mesa de metal. Ela está nua, mas ele mantem sua pose, com seu enorme jaleco branco, sua mascara e luvas também brancas. Das sombras do local, uma voz rouca surge. - Como andas seus estudo? - Primeiro me responde quem é que fala. – diz Fabio, largando os instrumentos na mesa, ficando apenas com um bisturi em mãos, que mantem escondido na manga de seu jaleco. - Então solte esse bisturi. – diz a voz rouca. – Eu acho que você vai me reconhecer. Enquanto diz isso, Mauricio sai das sombras. Fabio em um primeiro momento não o reconhece, por causa da barba e o cabelo enorme, mas depois consegue visualizar o rosto de um homem que há muito tempo havia sido um de seus únicos amigos, assim como Mirian. - Quando você saiu da cadeia? – pergunta Fabio. - Uns três dias atrás. - Como você entrou aqui? - Você esqueceu a porta aberta.
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- O que você quer? - Ela. – Mauricio olha para os olhos de Fabio e diz – Aliais, senti saudades de você. - Eu não sei o que dizer – responde Fabio ainda sem saber ao certo o que dizer. A ultima vez que ele havia visto Mauricio, o ex-detetive estava atirando em quatro jovens dentro de um tribunal. - Me diga o que aconteceu com ela então. – diz Mauricio indo na direção da mesa onde a jovens estava. - Bom ... – Fabio, com seus 160cm de altura e pele caucasiana, puxa ar e começa a falar – Ela foi achada em uma caçamba de lixo, em um beco escuro no Morada. Ela tem marcas fortes de espancamento até a morte, aparentemente um grupo de no mínimo cinco pessoas a espancou. Depois os mesmos se reuniram e jogaram a menina da janela de um dos apartamentos de um dos prédios. O apartamento em que ela foi espancada já foi achado, com manchas de sangue por todo lado. As pegadas achadas no quarto sugerem que o grupo que a espancou era formado por sete pessoas. A cena é grotesca, marcas de sangue por todo lado. Nenhuma digital ou material capilar foi achado. Nenhum vestígio de pele nas unhas da menina, nem nenhuma das fraturas habituais que são causadas quando uma pessoa tenta se defender, então provavelmente ela não teve empo de reação: pode tanto ter sido ameaçada com uma arma, quanto pega de surpresa por traz. Nenhum indicio de abuso sexual anterior ou posterior à morte. – depois de uns instantes de silencio, onde Fabio parecia estar pensando de havia se esquecido de algo, finaliza – É só isso. - Mesmo depois de vinte anos trabalhando aqui, você ainda é o melhor médico legista que eu conheço. – responde Mauricio. - Posso saber o porquê do interesse na morte da menina? - Eu conhecia o pai dela. Era um informante muito leal, me ajudou muito quando eu estava cassando tentando colocar Antônio Giovanni na cadeia. - Você já a visitou. – pergunta Fabio, agora, aparentemente, mais tranquilo.
- Já. – responde Mauricio sem tirar os olhos das marcas do corpo da menina a sua frente. - E como foi? - Você não gostaria de saber. – enquanto diz isso, Mauricio sai da sala, se dirigindo a saída do IML de Porto Real. - O que você vai fazer da vida agora? – pergunta, gritando, Fabio. - Vou sobreviver – responde Mauricio no mesmo tom de voz. Durante alguns segundos, Fabio observa a porta por qual o amigo de longa data havia passado, pensando no tempo que havia passado desde que ele não o via. Mas ele tinha que se concentrar no que estava fazendo, ele devia mandar uma mensagem e fazer uma ligação. Primeiro faz a ligação. -Alo, delegada – depois uma pausa ele continua. – Sim, sou eu o Dr. Fabio. Eu já tenho um diagnostico sobre a vítima dessa madrugada. Sim. Posso espera-la. Sem problema. A porta está aberta. E depois manda uma mensagem. Um número sem nome em sua agenda. Uma mensagem em que Fabio descreve exatamente a mesma coisa que havia dito para Mauricio e que iria dizer para Mirian assim que ela chegasse.
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Capitulo 7
Porto Real, Jericó, Aeroporto Internacional Antônio Mascarenhas, 19 de janeiro de 2014, 18h32min
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“Nunca vi essa cidade tão quieta por tanto tempo”, é o que pensa Murilo enquanto vê o a cidade se estendendo à baixo de si. O aeroporto de Porto Real é localizado em um ponto perfeito: um elevado no extremo oeste da cidade, chamado de Monte Cristo, mais distante do mar, portanto menos ventoso. A visão inteira de uma cidade litorânea, que caminha em uma linha tênue e tortuosa, em que hora cai para a mais perfeita beleza, e hora cambaleia para o verdadeiro caos, se estende pelo olhar de Murilo, que fumando um cigarro, pensa em coisas sobre sua vida, como na batalha conta o monstro, no bairro Morada, ou na noite em que os mendigos que o criaram morreram. Esse é um habito que desde muito jovem ele já tinha. Andar completamente perdido pelas ruas da cidade e observa-la de pontos altos o fazia relaxar. Nunca teve problemas em ficar cansado, ou com os músculos doendo, já que seu fator de cura super desenvolvido repunha as energias gastas por seu corpo antes mesmo que ele pudesse sentir o cansaço. O desgaste em seu corpo é basicamente inexistente.
O mesmo já não pode ser dito da menina que se esconde no esgoto nesse exato momento. As redes subterrâneas da cidade são sinônimos de “inóspito”, “traiçoeiro” e “medonho”, porém, mesmo assim os homens responsáveis pela manutenção das redes de gás, esgotos e eletricidade de Porto Real são obrigados a andar pelos seus corredores estreitos e decadentes, recebendo apenas 30% a mais que receberiam normalmente, devido ao acréscimo por periculosidade. Dois homens estão vagando pelos tuneis que formam a rede subterrânea da cidade. Os dois vestem uniformes da Docas Redes Elétricas, empresa responsável pela
distribuição e manutenção da rede elétrica geral da cidade. A conversa entre os dois é completamente inútil e fútil, nada mais interessante do que uma conversa sobre peidos. Scarletty escuta isso tudo atentamente. Ela é a menina que se esconde no esgoto e escuta a conversa dos homens. Havia tanto tempo que ela não interagia com pessoas diferentes das que estava acostumada a encontrar no esgoto (pessoas grotescamente feias, ou tão insanas que nem o mundo externo, cheio de psicopatas assassinos, os aceita), que ela ansiava por ouvir conversas banais desses tipos para não enlouquecer. Mas mesmo assim ela já havia enlouquecido. A mais ou menos três anos essa jovem não se chama de Scarletty, e nem ouve ninguém chama-la assim. A última vez em que ouviu alguém a chamar assim foi sua mãe, que gritava seu nome, enquanto batia na porta do banheiro em que a jovem havia se trancado quando começou a se transformar. Desde cedo Scarletty se mostrou carismática e extremamente linda. Muitos amigos... Muitos namorados... Sua mãe nunca soube quem era o pai da jovem, ou se sabia, nunca contou para a filha, que cresceu sem uma figura paterna, que, de acordo com ela mesma, foi algo bom: fez com que ela não tivesse o medo submisso do sexo oposto que algumas mulheres desenvolviam por causa da obediência a seus pais. A jovem, que todo dia no colégio, na hora da chamada, xingava sua mãe no fundo de sua consciência pelo nome que a havia lhe dado: “Scarletty Carvalho Branco”, em um dia qualquer, do ultimo trimestre de 2010, havia percebido que em sua pele havia crescido mais pelos nos últimos quinze minutos, do que em toda a sua vida. Sua pele antes negra, estava se tornando cinza, sobreposta por pelos grossos e duros. Sua cabeça começou a latejar de forma agonizante, fazendo-a levar às mãos a cabeça. E quando, debilmente, olhou para suas mãos para ter certeza de que não havia sangue, viu que os pelos tinham crescidos ainda mais e que suas unh as agora estavam pretas e três vezes maiores. - Mãe! – grita a jovem Scarletty – Socorro!
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Apesar do pedido, ela mesma já se prontificava em se ajudar. Indo para o banheiro e molhando as mãos com a água da torneira, esperando que aquilo desgrudasse dela. Tudo em vão. Até o momento em que ela se olha no espelho do banheiro de sua casa, a única coisa que ela ainda não havia pensado em fazer. Porém, quando fez, percebeu que se arrependeria para o resto da sua vida. Ela havia se tornado em uma ratazana humanoide. - Scarletty! – grita uma mãe desesperada pela filha enquanto bate em uma porta trancada. – Abra essa porta! Scarletty havia fechado a porta no momento em que se viu no espelho, no momento em que percebeu que não poderia aparecer para a mãe daquela forma, não tão rapidamente. 52
- Calma mãe! – grita a filha, com uma voz chorosa, com medo, sem saber exatamente o que fazer – Eu vou abrir, mas espera um pouco. Durante trinta segundos, Scarletty se preparou pra tudo: um infarto, um derrame cerebral, um ataque de fúria, um tiro, mas não para o que realmente iria acontecer. Ela abriu a porta. Com toda a calma e tranquilidade do mundo, ou pelo menos era o que tentava. Ela abria a porta devagar, mas suas mãos tremiam. Suas roupas estavam rasgadas, resultado de uma irracionalidade da jovem, que tentava ver todos os pelos que cresciam em seu corpo. O seio esquerdo pendia a mostra quando a porta foi aberta, mas logo a mão direita da jovem largou a porta e subiu até tapalo. Sangue escorria de todo o corpo da menina, resultado da “transição”, os acontecimentos recentes com seu corpo havia feito com que os poros que antes expeliam suor para resfriar seu corpo, estivessem expelindo sangue arterial.
- Quem é você? – diz a mãe de quem antes era Scarletty – O que você fez com a minha filha? Seu monstro! A jovem tentou se explicar, mas cada vez que tentava dizer uma palavra, o choro subia mais a sua garganta e um grunhido se manifestava. A cada palavra que Scarletty tentava pronunciar, mais disforme e grotesco o grunhido se transformava, até o momento em que a jovem percebeu que não conseguiria dizer nada, não ali, não naquele momento... Sabe-se lá quando... Nos esgotos da cidade ela havia encontrado refúgio do mundo, e amigos para guia-la na vida, mas ela precisava de coisas que ninguém no esgoto poderia dar a ela: uma vida na superfície. “A Escória sempre será a escória”. Um nome que ninguém além de alguém que mora no esgoto gostaria de ouvir, quando se refere a uma mulher: Rata. Uma vida que ninguém gostaria de levar: na sarjeta. - Ontem à noite o meu supervisor mandou fazer a manutenção de um cabo cortado se conexão lá no Vanilha – diz um dos homens com camisa da Doca Redes Elétricas. - O seu supervisor também é o meu supervisor, seu bosta – responde o outro homem – E o que tem você ir fazer uma manutenção no Vanilha? Rico também tem problema com a luz. - É, mas pra onde um fui mandado, era quase em baixo do A.S.E.S – diz o primeiro homem como se isso tivesse o mesmo peso de que ele tivesse falado que havia encontrado o Santo Graal. - E que merda é essa de ASES? - “Academia Superior de Ensino a Soldados”, a base do Grupo Antiterrorismo Heroico, o G.A.T.H. - Tu tá falando grego pra mim. – diz o segundo homem enquanto os dois chegam à uma porta escrito “Cuidado, Alta tensão”. – Chegamos ao terminal elétrico do aeroporto. - Os caras que apareceram na televisão esses dias, pow. Batendo naquele monstro lá no Morada – diz o primeiro homem, gordo e alto – Qual é o problema que o pessoal do
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aeroporto tá relatando mesmo? - Á sim, e dai? Você achou alguém cadáver despachado nos túneis de lá perto e tá achando que foram os superpoderosos? – diz o segundo homem, magrelo, mas alto e com o rosto ossudo, ironicamente – Eles estão dizendo que a energia tá caindo toda hora. Provavelmente é só um mau contato, mas eles estão reclamando que os geradores estão começando a pifar: toda vez que a energia cai, o gerador liga, e toda vez que a luz volta, eles desligam. Isso se repetindo cinco vezes por dia dá um prejuízo maneiro. - Entendi – diz o mais gordo – Não aconteceu nada de mais lá perto não. Eu só queria dividir com alguém que eu estiver perto de gente como essa. Mostrar o lado bom da profissão. - Se esse é o melhor lado da nossa profissão, a gente tá fudido, Marcos. – responde o segundo homem, seco e com desgosto. - Para com isso, Luís. – responde Marcos em tom brincalhão – Pelo menos conseguimos por comida nas mesas de nossas famílias. - Como se isso valesse o RISCO. – responde Luís de forma ainda mais seca, enquanto Rata ouve cada palavra, escondida.
Apoiado em uma mureta, do lado de fora do aeroporto, Murilo ainda observa o horizonte. Seus pensamentos agora estão focados no grupo de qual faz parte. Nas diferenças que os tornam únicos, nos inimigos que futuramente poderiam enfrentar e em como cada um reagiria. Porém seus pensamentos são interrompidos graças ao toque de seu celular. O jovem rastafári nunca havia tido dinheiro na sua vida, além de alguns centavos que achava no chão, ou que ganhava de esmola de uma velhinha bondosa qualquer, ou de um bêbado decadente em uma noite de muita esbórnia. Na tela de seu celular, o mais humilde que pudesse ser, para se adequar ao conhecimento quase nulo sobre tecnologia de Murilo, o nome “Andreia” aparecia. Andréia
sempre foi uma amiga de Murilo, durante um tempo até namorados. O rastafári conhecia a jovem, de cabelos castanhos, pele morena e olhos pretos, muito baixa para sua idade, desde muito jovem. Os dois se conheceram em um orfanato no bairro General Bormann, quando tinham dez anos. Viraram melhores amigos muito rapidamente, mas quando Andreia foi adotada, mas Murilo esquecido no orfanato, eles perderam contato. Quase três anos depois, quando Murilo já havia fugido do orfanato e conhecido Thais, os dois se reencontraram, namoraram por um tempo (um namoro infantil e muito respeitoso), mas perceberam que aquilo não levaria a nada, e continuaram apenas como grandes amigos, o que são até hoje. -Eh... Oi. – atende Murilo, sem saber exatamente como conversar por telefone. - Oi! – responde uma, euforicamente feliz, Andreia. – Como é que tu tá, negão? - To bem. – responde Murilo – Toda aquela maluquice que aconteceu no Morada, não me abalou tanto quando o Hugo quer que o mundo pense. - Sei como é. Na verdade não sei não, mas tá valendo – responde Andreia, antes de rir histericamente, muito mais do que a piada valeria. - E você? Como tá levando a vida? - Sabe como é né? To no último ano do colégio. Quero terminar logo isso pra não precisar estudar nunca mais. - Se eu pudesse ter o que você tem... - Você ia odiar! – responde Andreia rindo – Sério, sou muito mais ser igual a você e bater na cara de monstros o dia todo. – termina a jovem com outra risada histérica. Ao fundo, a jovem Andreia consegue ouvir um barulho de explosão. Um barulho vívido e retumbante, que a incomoda a ponto de tirar o aparelho de perto do ouvido. - QUE BARULHO FOI ESSE? – grita a jovem ao telefone para Murilo. - Problemas. – diz Murilo de uma forma que se equilibra perfeitamente entre o suave e o rude, sendo ao mesmo tempo tranquilizador, mas também não dando
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margem para ser indagado sobre qual o problema – Depois eu te ligo. Dizendo isso, Murilo já estava correndo na direção da explosão, e vendo a cena de caos e medo das pessoas que se preparavam para viajar para “N” lugares, agora estavam, ele sentiu pena de todos eles.
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Alguns segundos antes - Já avisou que vamos desligar o sistema de energia deles? – pergunta Marcos. - A central ligou pra eles à meia hora atrás avisando que estávamos vindos arrumar o problema deles. – responde Luís. - Então vamos fazer nosso trabalho. Enquanto isso Rata observa o trabalho dos homens, escondida em um canto escuro, quase presa no teto da sala onde ficava o terminal de eletricidade do Aeroporto Internacional Antônio Mascarenhas. Ela gostava de ver os homens das empresas de gás e eletricidade da cidade fazerem seus respectivos trabalhos, isso à ensinava como as coisas funcionavam e assim ela poderia usar esses conhecimentos para se safar em alguma ocasião inespecífica. Em algum momento alguma coisa que ela havia aprendido olhando esses tipos de homens faria a diferença. - Eu disse que era só um mau contato – diz Luís, olhando para o terminal. - Pode ser só isso. – diz Marcos abrindo sua caixa de ferramentas e procurando algo – Mas também um dos fusíveis pode ter estourado, ou um dos plugs do terminal pode ter quebrado. - Que nada. Se fosse plug ou fusível isso não estaria funcional hora nenhuma. - Só se fosse fusível, mas se o plug tiver com mau contato com o terminal, e não o cabo em mal contato com o plug, vai ser mais difícil. – responde Marcos achando a lanterna que estava procurando. – Não sei se essa lanterna tá funcionando direito.
- Pera ai, me deixa ver se é isso aqui... – diz Luís enquanto coloca um fio para o lado usando uma chave de fenda que guardava no cinto. - Calma, car... – Marcos se interrompe quando a luz da lanterna se ascende, enquanto ele aponta para o alto, ele vê Rata e solta um grito de medo afeminado, enquanto dá dois passos desajeitados, para trás. Os dois paços que Marcos dá para trás, são o suficiente para chegar à Luís, fazendo com que a mesma chave de fenda, que com todo cuidado, o homem mais alto e magro usava para analisar os cabos conectados ao terminal, faz com que dois dos cabos que ele percebera que estava soltos se tocassem, resultando em um curto-circuito. Faíscas saltaram dos dois cabos com violência, mas o verdadeiro estrago estava acontecendo logo à cima deles. A explosão que Murilo havia deduzido como problema para Andreia ao telefone, fora criada nesse instante, culpa de um susto que havia acarretado em um curto circuito, que por sua vez, acarretou na explosão de um dos geradores do aeroporto.
De volta a Murilo... Os andares do Aeroporto Internacional Antônio Mascarenhas têm seus respectivos pés direitos extremamente altos na parte interna do aeroporto. Cada andar tem em média cinco metros de altura, fazendo com que o os seis andares de lojas e áreas de embarque, desembarque, bilheterias, espaços de lazer, como praças, cinemas “pequenos” e áreas recreativas para crianças, e mais um andar especial separado apenas para pessoas autorizadas, que é o núcleo de toda a administração do local, tenham quase quarenta metros de altura. O circulo central do aeroporto é aberto, ou seja, todos os andares tem um enorme “buraco”, exatamente ao meio, tendo visão para os outros andares do aeroporto e para o hall de entrada do mesmo. As escadas rolantes são estrategicamente colocadas para que você seja obrigado a andar pelo aeroporto: a escada rolante que leva-o ao próximo andar, sempre estará no local contrario ao qual você está, em relação ao “buraco” no meio
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do aeroporto, fazendo você contorna-lo. Um homem, com um pouco mais de um metro e meio de altura, que provavelmente descia a escada rolante na hora da explosão, está pendurado, com seus braços, extremamente curtos, no corrimão da escada rolante, para o lado de fora. Suas pernas curtas balançam infantilmente, enquanto ele tenta, inutilmente, voltar para a segurança, algo que não o deixe cair quinze metros, violentamente, contra o chão. Murilo surge para ajuda-lo. Com apenas uma das mãos, ele segura a mochila que o homem usava, e com um puxão rápido e forte, ele o trás para cima da escada rolante, deixando-o seguro. Desde que havia desligado o telefone na cara da Andreia, Murilo já havia salvado no mínimo cinco pessoas. Ele havia dito a si mesmo que não se preocuparia com identidades secretas. Seu verdadeiro nome e rosto não seriam um segredo para o mundo, e não fazia muito sentido isso: nenhum dos membros do GATH tinha muito a esconder. Murilo e Thais viviam na rua, Rodolfo é órfão, Valquíria não tem memória de quem era (se alguém a reconhecesse seria ainda melhor) e Miguel queria a fama. A única que teria algum motivo para se preocupar com isso seria Renata, mas de todos, ela é a que menos parece se preocupar com alguma coisa. Alguns, como Rodolfo e Miguel, usam mascaras para se tornarem ícones, ícones que as pessoas pudessem ver e reconhecer, já a mascara de Aquiles era algo diferente, o significado de sua existência é o simples medo. Murilo, depois de salvar o homem na escada rolante, e perceber que ainda haviam muitos que teriam que ser ajudados ali, pensa o quão bom seria se um dos seus companheiros de grupo estivesse ali. “Psy poderia fazer tudo levitar. Valquíria poderia criar plataformas para tirar as pessoas de perigo. Vulto poderia virar todo mundo em um instante. Escudo poderia...”, ele para por um instante, “Não, ele não”, pensa Murilo, que logo depois percebe que havia pensado em todos tratando pelos seus codinomes, pelos nomes que haviam escolhido para que o mundo os conhecesse, “Isso é estranho”.
Seus pensamentos são interrompidos quando um casal, que tenta fugir de todo o caos, é pego de surpresa por um pedaço enorme de concreto que se desprende do teto e cai na direção dos dois. Porém, quando Murilo se projeta para correr até eles, o casal é jogado para trás, uma força invisível de extrema potencia os arremessa para trás, salvando-os do desabamento. O jovem rastafári logo pensa que seus desejos foram concretizados e que seus companheiros haviam aparecido para auxilia-lo. Porém ele logo percebe que está sozinho. Um novo grito de desespero ecoa pelo ambiente, dessa vez é o grito de uma criança. Uma criança pendurada em um cabo de alta tensão. O cabo parece estar desativado, mas ela ainda balança no cabo a mais de vinte metros de altura, uma queda fatal para qualquer pessoa, mesmo a mais forte delas. Murilo está no quinto andar, enquanto a jovem criança está pendurada em uma corda que a deixa na mesma altura que o quarto andar. O jovem rastafári pensa em descer e pegar a criança no andar de baixo, porém, até a sua chegada, seria mais provável que a criança já estivesse morta e estirada no chão do hall de entrada do aeroporto. Então a brilhante ideia surgiu. Sem muito que se fazer, a não ser seguir esse plano, Murilo, usando todo seu atletismo e força, desenvolvidos nos anos em que correu da policia e de outros grupos de jovens briguentos diversas vezes, saltou cinco metros. O pulo levou cerca de três segundos, do momento de que pegou impulso do corrimão da escada rolante, até o momento em que pegou o menino, mas nesses instantes o tempo havia diminuído a um terço do normal e uma vida inteira se passou na frente dos olhos do jovem rastafári. Não sua vida, mas a vida da criança, as milhões de escolhas e caminhos que o menino poderia seguir. Suas profissões, seus amores, suas amizades. E então, quando ele achou o corpo de menino, no ar, mais ainda se passou na cabeça de Murilo. Todos os treinamentos de como ele deveriam cair se tivesse alguém no colo, algo que seria crucial naquele momento: uma criança pequena e frágil, no colo de uma pessoa que a pegou no ar a mais de vinte quilômetros por hora, caindo uma distancia de quatro metros. Mas nada veio completamente a sua cabeça, apenas
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flashes que não revelavam nada de determinante. Quando Murilo caiu de costas para o chão, parece que todo o mundo voltou ao normal. Os barulhos de destroços, o cheiro de queimado, o calor no ar. - Como você está, garoto? – diz Murilo se levantando, dolorido, se não fosse seu fator de cura e resistência avançada, sua coluna teria se estraçalhado ao bater no chão de costas. - Tá doendo! – exclama o menino com voz chorosa – Meu pé tá doendo! - Calma. Deixa eu ver. – quando Murilo segura o pé do garoto ele ainda se debate um pouco, mas depois que Murilo o segura com força, e o garoto percebe que quanto mais ele se meche, mais seu pé dói, ele para e Murilo consegue diagnostica-lo. – Você vai ficar bem, só torceu o tornozelo. Vai buscar os seus pais. – diz enquanto se levanta e segue para o próximo civil a ser ajudado. Mas então olha pelo para peito de um dos andares e vê a cena de caos. Os painéis de vidro que serviam de teto estavam estraçalhados no chão, pelo menos quarenta por cento da estrutura do local estava espalhada pelo chão, destruída, e os outros sessenta por cento estavam completamente comprometidos. Tudo esta em chamas. Todo o local está caindo aos pedaços, mesmo Murilo ajudando varias pessoas, o rastafári consegue ver varias pessoas mortas soterradas por onde passa o olhar. - Eu não vou conseguir fazer isso sozinho... – diz enquanto passa o olhar sobre o aeroporto destruído. - E não precisa – diz uma voz feminina, vinda das costas de Murilo – Eu posso ajudar. - Mas que merda é essa? – diz Murilo depois de se virar e ver a figura de uma rata humanoide, com pelos cimentos, raquítica e de um metro de meio de altura. - Meu nome é Rata e posso te ajudar a tirar todos daqui. - Meu nome é Murilo, e duvido muito que você com todo esse seu tamanho consiga tirar alguém daqui de dentro. - Eu conheço esse lugar melhor do que você, aposto que não está conseguindo tirar muitas pessoas por que o
caminho está bloqueado – diz Rata tentando manter-se firme perante sua própria timidez. - Comesse a falar. – diz Murilo. - Os tuneis do esgoto passam por aqui, você pode tirar as pessoas dos escombros e manda-las saírem pelos tuneis. - É o que faremos então. – responde Murilo. Rata se perguntava exatamente por que estava fazendo aquilo por pessoas que tinham medo de gente como ela. Pessoas que veriam uma ratazana humana e a chamariam de monstro. Pessoas que forçaram ela e outras dezenas de pessoas como ela se recluírem no esgoto. A resposta é CULPA. Culpa por ter feito tudo isso, culpa por ter sido o ponto de ignição de todo o problema no aeroporto. Ela agora deveria de alguma forma ajudar. - Ei!! – grita Murilo enquanto tira um pedaço enorme de concreto de cima da perna de uma senhora de cabelos grisalhos – Não vai fazer nada não? - É... sim... Claro – responde Rata aleatória. Ela anda até a mulher que Murilo acabara de salvar e a puxa de debaixo da pedra, mas ela se contorce e empurra a jovem. - Sai daqui, seu monstro! – grita a senhora. Rata no mesmo instante se afasta e tropeça, caindo no chão, enquanto olha com medo para a senhora. Murilo ainda está segurando a pedra, sua camiseta está manchada de sangue e com alguns rasgos. O outro jovem, de cerca de dezesseis anos, aparentemente seu filho, ajuda a senhora a se levantar para poderem ir embora, mas antes a senhora faz questão de agradecer Murilo e depois olhar fixamente para o rosto de Rata, com desgosto. - Por isso demorei tanto a vir ajudar. – diz Rata. - Eu sei como é isso – diz Murilo enquanto estende a mão para ajuda-la a se levantar. – Realmente intendo. - Obrigada – agradece Rata enquanto pega a mão de Murilo e se levanta. – Acho melhor você fazer isso sozinho. - Verdade. – responde um Murilo desanimado – Mas me diga aonde é a entrada para os tuneis.
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- Ali – diz Rata apontando para dez metros de distancia de onde eles estavam – Atrás daquela porta tem uma espécie de bueiro, com uma tampa de metal extremamente pesada, mas acredito que você seja forte o suficiente para abri-la. - Obrigado – diz Murilo com uma indiferença nauseante. - Acho que é minha hora de ir embora. - Quer que eu abra o bueiro para você? – diz Murilo. - Não, minha saída é por outro lado. Rata diz isso enquanto corre na direção contraria a Murilo, que por sua vez, vai em direção à porta da qual a jovem havia se referido.
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- O que você está fazendo aqui? – diz uma mulher com uma aparência reptiliana para Rata, quando a mesma já se encontrava nos tuneis subterrâneos de esgoto. - Eu comecei tudo isso. Vim ajudar a impedir que muitos morram – responde uma Rata com medo. – Desculpa Víbora, mas eu tinha que ajudar. - Infernos – diz Víbora – Depois que Conexão viu você no sistema de câmeras do subsolo do aeroporto, Brutus me mandou aqui com o Raio-X. Ele está lá em cima te procurando, e deve estar tirando algumas pessoas do perigo. - Como ele vai fazer isso como invisibilidade? – pergunta Rata. - Não sei, mas ele vai tentar – responde Víbora – Vai embora. Eu vou dar um jeito de falar com o Raio-X. - Não, eu posso ajudar. – diz Rata. - Não quero saber. – Víbora retruca com convicção – Você já ajudou gente de mais hoje, vai embora.
- Deixa eu adivinhar: Não achou ele? – diz Viviane quando Rodolfo entra pela porta da sala especial de Viviane. - Pior, disse que não. O Hugo simplesmente sumiu. – responde Rodolfo – Só eu tenho vontade de matar ele às
vezes? - Pergunta pro Murilo, ele deve saber – diz Viviane ironicamente. - Muito engraçada. - Eu ainda não intendi a rivalidade de vocês. – diz Viviane descontraidamente, sentada na frente de um computador com quatro monitores de 22’ – Deve ser por causa de mulher, não é? - Nem é isso. – diz Rodolfo sentando em uma das cadeiras da sala, posicionada ao lado da cadeira da jovem hacker – Apenas temos algumas discordâncias sobre a forma como enxergamos o mundo. - Sei... – diz Viviane enquanto muda a visualização da janela do computador – Olha só, ele está saindo com algumas das vitimas. Os monitores mostram Murilo saindo de um bueiro próximo do aeroporto. As vitimas salvas pelo rastafári estão visivelmente machucadas e decadentes, porém vivas. 63
Capitulo 8
Porto Real, Vanilha, Instituto ASES,19 de janeiro de 2014, 20h45min - Quem que o Hugo acha que é pra não nos deixar ajudar na situação do aeroporto? – indaga um furioso Rodolfo. - Acho que ele é tipo o nosso DONO... – responde Valquíria. - Essa parada de “dono” pega um pouco mau... – ironiza Miguel. - Eu só estou preocupada com o Murilo. – diz Thais.
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Thais, Renata, Miguel, Valquíria e Rodolfo, que chegou depois, estão sentados no balcão da cozinha do grande salão recreativo do Instituto. Duas horas antes, os jovens haviam visto na televisão, imagens de uma explosão no aeroporto Antônio Mascarenhas, e logo depois, Viviane havia comunicado a todos que Murilo estava no local (ela o havia rastreado pelo seu celular). Instintivamente, todos se prontificaram a colocar seus uniformes e irem para o aeroporto, porém foram impedidos por Hugo. O empresário e diretor do A.S.E.S. havia dito que eles não poderiam ir até lá por motivos burocráticos, mas deixou detalhes em segredo. Todos sentiram a mesma raiva. - Eu não vou conseguir ficar aqui parado esperando ele aparecer. – diz Miguel – Eu posso sair e voltar antes que alguém perceba que eu sai. - Concordo. – apoia Thais. - Não vai ser necessário. – diz Murilo, entrando pela porta do Hall da Zoeira, e indo direto para um dos sofás do salão. - E então? – diz Miguel, que já havia usado sua velocidade para chegar a um dos sofás da sala – Como foi lá? - O inferno – diz Murilo.
- Não duvido. – diz Renata – Pelas imagens a situação estava bem difícil mesmo. - Só consegui por que tive ajuda. – diz Murilo. - Ajuda de quem? – pergunta Rodolfo. - Pelo cheiro... – responde Murilo – Uma moradora do esgoto. Ela era meio rato meio humano. Deprimente. E por que vocês não apareceram? - A situação não permitia – diz Viviane entrando pela mesma porta principal que Murilo havia entrado instantes atrás – Algumas questões burocráticas e táticas impediram que todos entrassem em ação. - Que tipos de questões? – pergunta Murilo. - A primeira é que toda a estrutura estava muito comprometida. – começa Viviane – Eu estava acompanhando tudo, junto do Rodolfo, pelas câmeras de segurança que não haviam sido destruídas do aeroporto. Toda a estrutura estava decadente, a entrada por terra era impossível, com as entradas bloqueadas, e criar buracos nas paredes para o grupo entrar era inviável. A entrada aérea também não era viável, a probabilidade de um erro na descida era muito alta. - Você ainda não falou das “questões burocráticas”... – diz Rodolfo em tom de desconfiança. - Isso... – começa Viviane, que logo se interrompe e abaixa a cabeça enquanto cora – Eu não posso dizer... - Não pode por quê? – diz Thais. - Por que eu não sei... – diz Viviane ainda mais tímida. - Não preciso dos meus poderes pra saber que ela esta mentindo? – diz Renata para o grupo. - Ela não mente. – diz Murilo – Mas ela está com medo e com vergonha. Isso tudo é novo pra ela. – Murilo vai à direção da menina e pergunta: - O que o Hugo falou pra você? - Nada... – ela responde – Ele apenas me ligou e disse para observar você e toda a tragédia sem ser descoberta, por isso que eu vigiei você pelas câmeras do aeroporto e depois retirei qualquer vestígio da minha presença no sistema de câmeras deles. E se acontecesse qualquer coisa... Se a situação piorasse... Era pra eu avisar ele...
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- Pra que ele iria querer que alguém “avisasse ele” se a situação piorasse? – diz Renata. - Só tem um jeito de saber... – diz Murilo – Onde ele está? - Ninguém sabe. – diz Viviane – Ele simplesmente me deu essas ordens e disse que iria sair. - Sair em um momento importante como esse é estranho... – diz Miguel. - A não ser que você queria aproveitar a distração para fazer alguma coisa ainda mais importante. – responde Rodolfo quase que instantaneamente. – O que resta é esperar...
Porto Real, Alessandro Cunha, Terraço da Místicas Metais Industriais, 19 de janeiro de 2014, 20h 30min
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- É bom que você tenha me chamado para algo importante. – diz Hugo Kuhn, escondido pelas sombras da noite – Cada vez que nos encontramos isso se torna mais perigoso. - Isso é mais importante do que você possa imaginar. – diz a voz grave de Manto. - Diga então. – diz um Hugo, apressado. Manto havia enviado uma mensagem codificada para Hugo três dias antes, pedindo um encontro entre os dois, mas só agora Hugo pode responder de forma segura. - Você deve ter ouvido falar da morte do Sr. Godoi? - Foi muito sentida por todos nós... – diz Hugo ironicamente. - Com certeza... Eu estive lá antes dos policiais. Eu estava monitorando a casa do homem. Esperava protege-lo, já que toda essa movimentação do seu grupo de jovens havia exposto bastante o homem. - Por que eu acho que não vou gostar do que vou ouvir? - Por que não vai... – diz Manto – Quando eu cheguei o assassino ainda estava lá. De alguma forma, eu só o percebi
depois de muito tempo, ele teve um treinamento impecável, as técnicas furtivas dele são eximias. Mas a pior parte é que ele também tinha poderes... - Que tipos de poderes? – pergunta Hugo, curioso. - Teletransporte. - Alguns nomes veem em mente. Muitos vilões tinham essa habilidade. - Mas só um deixa uma fumaça roxa quando desaparece... - Gatu... - Gatuno! – diz Manto – Exatamente... Ele é o único que soltava esse tipo de fumaça ao se teletransportar. - Ele nunca foi o cumulo da competência. Ser hábil o suficiente para se esconder de um cara como você é de mais pra ele... - Não vemos o cara há uns sete anos no mínimo, antes do Dia do Fim. Tempo de sobra pra treinamento. - Quem pode ter treinado ele? Dr. Blut? - Aposto nisso... E se o Blut está envolvido, o Supremo também deve estar... - O Supremo está morto! – exclama Hugo com ímpeto. - Você sabe o que eu penso sobre isso. - Ele não pode ter sobrevivido a tudo aquilo. - Nós dois sobrevivemos, Futuro. – diz Manto. - Não me chame mais assim. - E esquecer-se de tudo o que fizemos por essa cidade? - Isso não vem ao caso. - E quando vai vir? – depois de uma pequena pausa, Manto continua – O Dia do Fim aconteceu há anos, muitos já se esqueceram de como éramos importante antes de tudo aquilo. - Os tempos são outros. O Sentinela fez tudo isso mudar... - “A Lince fez tudo isso mudar”, você quer dizer. - A coitada não teve culpa alguma. O Supremo estava
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usando sua mente. - Por que ela foi fraca... Se todos tivessem me escutado desde o inicio, nada disso teria acontecido. Ninguém estaria aposentado, os vilões estariam sendo cassados da forma que se deve, ainda seriamos livres. Ninguém teria morrido naquele dia. - Não, só o Supremo teria morrido. - Mas dezenas de milhares de civis estariam vivos estariam vivos. - Mas nenhum deles poderia acreditar nos heróis que os protegem. As crianças cresceriam sem esperança, sem ter em quem se espelhar. - Mas agora essas mesmas crianças estão mortas! Você sempre foi o cara dos números... QUANTAS CRINÇAS MORRERAM NAQUELE DIA? Quantos pais de família? Quantas mães? Quantos inocentes? Quantos heróis? - Entenda que is... – Hugo começa a responder, mas se interrompe quando Manto contorce o rosto. - Fique quieto... – diz Manto para Hugo. – Está ouvindo isso? - Não... - Tem alguém aqui... - Por isso que eu não gosto de encontrar você... – diz Hugo – Aonde? - Ali... – diz apontando para uma saída de ar extremamente pequena, com amanho suficiente apenas para uma criança. Hugo avança na direção da saída de ar. Conforme se aproxima, Hugo sente o ar quente e em instante o calor está quase insuportável. Olhando por entre a grade que tranca a saída de ar, Hugo vê uma movimentação. - Você está certo. – diz Hugo para Manto – Tem alguém aqui. - Eu sempre estou certo. – responde o vigilante, seco. - Convencido. – diz Hugo enquanto tira um canivete do bolso. O canivete se transforma em uma espécie de alavanca
mecanizada, que rapidamente força a grade da saída de ar, deixando assim que o “espião” possa ser retirado de seu esconderijo. O que Hugo não imaginava era ver um rato humanoide na entrada de ar. Era Rata quem se escondia na entrada de ar, porém, nesse instante, ela parecia à beira da inconsciência. - Que coisa nojenta... – diz Hugo assustado com a menina, enquanto tira-a de dentro da entrada de ar. - Essa coisa nojenta ouviu tudo o que conversamos – diz Manto, se aproximando. - Eerr... Menino... Você está bem? – pergunta Hugo. - E-e-eu... s-sou... m-m-m-m-me-menin-menina... responde Rata quase inconsciente. - Tome... – diz Manto enquanto se abaixa e entrega uma barra de cereais para a mutante. – O que aconteceu? - Eu estava vagando pelo prédio, só estava observando... Eu faço isso às vezes... Eu não estava roubando. Ai um dos seguranças me viu e eu tentei fugir, aqui pra cima, pelas saídas de ar... Mas quando eu cheguei aqui, descobri que elas ficam trancadas. - Por que você não pediu ajuda? – pergunta Hugo. - Eu vi que vocês estavam conversando um assunto sério, e preferi não interferir... - Você podia ter morrido ali. – diz Hugo – Se ficasse mais uns minutos ali só encontrariam seu corpo. - Eu sei... Mas... Eu... Não... – ela hesita muito – Me deixem ir embora... - Você ouviu de mais... Você não pode ir embora assim... – diz Manto. - Eu não ouvi nada de mais... Só conversas sobre o que aconteceu a cinco anos traz. – responde Rata, defensivamente. - Sim, mas ouviu o meu nome. – diz Hugo – E se de alguma forma, alguém me ligar ao Manto, não tenho como manter a posição que tenho. - Por favor... Eu não vou contar pra ninguém... –
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promete Rata. Depois de alguns instantes, onde Hugo e Manto se entreolham, esperando que o outro faça a escolha, Hugo responde. - Vá embora logo. Mas jure que ninguém além de nós vai saber disso. - Eu juro. – diz Rata, que logo em seguida sai correndo pelo terraço do prédio e sumindo na escuridão. - Você acha que essa decisão foi inteligente? – pergunta Manto. - Não tenho total certeza. Só o tempo vai me confirmar, mas acredito que sim. Além do mais, quem vai acreditar naquele bichinho esquisito se ela disser algo. - Faz sentido. - Claro que faz. – diz Hugo olhando na direção na qual Rata havia ido instantes antes – É melhor eu ir embora, não quero dar sorte ao azar. - A filha do Saltador morreu. – diz Manto meio a escuridão. - Eu soube. - O diretor do IML me mandou uma mensagem de texto com o que ele conseguiu deduzir. - O que de importante? – pergunta Hugo, cabisbaixo. - Um grupo de sete pessoas a espancou até a morte... O corpo estava quase irreconhecível. - O enterro foi ontem. Preferi não ir para não dar margem para perguntas que eu não tenho resposta. - Acabou não adiantando muito, alguém vazou essa informação na internet a algumas horas. Eu acompanhei de longe. A delegada estava lá. Parece que ela mesma vai liderar as investigações do assassinato da menina. - Claro. A imprensa deve estar caindo em cima disso. Esses safados se unem quando um deles morre. - Verdade. É melhor você ir. Eu também tenho algumas coisas a acertar hoje à noite. - Sim. Como vai o treinamento do garoto?
- Ele é bom... Jovem e inexperiente, mas aprenderápido e tem bom preparo físico. Ele ainda vai longe. - Bom... Adeus então. - Até a próxima. –diz Manto que logo depois some no meio das sombras. Ao telefone, Hugo diz: - Portal, pode me tirar daqui? – logo depois ele some sem deixar vestígios.
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Capitulo 9
Porto Real, Alessandro Cunha, Sistema Subterrâneo de Esgoto, 19 de Janeiro de 2014, 21h02min
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Em pleno inverno, o inferno toma conta de Porto Real, uma onda de calor imoral assola a região sudeste do país. A praia é o melhor refúgio dos mais acomodados, mas para os habitantes dos esgotos da cidade, o calor é insuportável, que junto ao odor abafado e as borbulhantes poças de estrume e restos mortais de corpos jogados por mafiosos no esgoto, torna a estadia no Sistema Subterrâneo de Esgoto o lugar ideal para se esconder da sociedade. Rata anda cambaleante pelos túneis, suas pernas tremem, seus olhos mal conseguem ficar abertos. Ela havia fugido depois de encontrar Víbora nos túneis logo a baixo do Aeroporto, a mutante com aparência reptiliana havia mandado que Rata fosse para junto de seu grupo, A Escória, mas ela havia mudado um pouco o trajeto e estava passando pelo bairro Alessandro Cunha para se preparar mentalmente para a bronca que iria tomar d’O Concelho, os membros mais velhos e importantes do grupo. Aos poucos sua visão fica turva... Seus olhos ficam mais pesados, muito pesados... Tão pesados quanto suas pernas... Ela não consegue ficar de pé... Seus joelhos batem contra o chão de concreto banhados por água de esgoto... Depois seus olhos veem a água se aproximando... E então ela sente vomito, estrume e excrementos em sua boca... Depois de alguns segundos, uma forma reptiliana tira-a da água... Ela diz alguma coisa, mas Rata não consegue escutar...
Porto Real, Vanilha, Instituto A.S.E.S, 19 de janeiro de 2014, 21h02min - Finalmente suas esperas acabaram, senhores. – diz Miguel entrando pela porta do Hall da Zoeira, aonde todos os outros jovens estavam – Hugo acabou de chegar e tá vindo pra cá.
Todos estavam esperando o diretor do Instituto chegar a horas. Hugo estava passando pela porta principal do salão quando Rodolfo já começa a esbravejar. - Que porra é essa, Hugo? Como assim questões burocráticas que não deixavam que a gente ajudasse o Murilo no Aeroporto? - Acalme sua periquita, Escudo. – diz Hugo tranquilamente – Todas as suas perguntas tem respostas. - Então comece pela mais importante: Além das questões táticas que não deixavam que nos entrássemos lá, que Viviane já nos informou, o que nos impediu? – diz Renata com os braços cruzados e olhado para Hugo. - Algumas pessoas importantes acharam que vocês trabalharam muito bem em equipe, quando lutaram contra o monstro. O problema é que essas mesmas pessoas tinham suas duvidas sobre a capacidade individual de vocês. A situação no Aeroporto foi alertada pra mim assim que tudo começou, e quando eu soube que Aquiles estava lá, eu vi a situação perfeita pra mostrar para essas pessoas que vocês estavam prontos para trabalharem tanto em grupo, quando sozinhos. - E pra que você pediu pra “V” só vigiar e te avisar se a situação piorasse? – indaga Rodolfo. - Pra poder liberar a ação de vocês. – diz Hugo se sentando em um dos sofás – Apesar das condições não permitirem uma melhor entrada de vocês, poderíamos apelar pra sorte de uma inserção aérea. - Pera ai? – diz Miguel tentando entender a situação – De onde surgiu o nome “V”? - É o apelido que eu dei pra Viviane, o nome dela é muito grande. – diz Renata. - Nomes e apelidos não importam agora. – diz Thais – O que importa é saber aonde nosso querido diretor estava quando tudo isso estava acontecendo. - Deus do céu. – diz Hugo batendo a mão na testa. – Eu não posso ter uma vida pessoal que não seja da conta de vocês? - Não. – diz Murilo que estava sentado praticamente
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na mesma posição desde que havia chegado do Aeroporto. - Tudo bem então. – diz Hugo com uma sobrancelha levantada e olhando para Murilo. – Eu tenho uma amiga que não vinha na cidade há muito tempo, o nome dela é Layla Al Samir. Sim, ela é egípcia. E sim, eu estava comendo a bucetinha dela. – diz Hugo gesticulando com o dedo médio passando por dentro de um circulo feito com a outra mão – Felizes agora? Ou passei informação de mais pra vocês. - Acho que tive informação de mais... – diz Valquiria, que não tinha se pronunciado até agora. - Mais alguma pergunta? – pergunta Hugo, depois de instantes de silencio, ele continua – Então vou para minha casa, só queria saber se você estava bem Murilo. E me parece que continua em bom estado. - Você poderia saber disso sem vir aqui. – diz Murilo de forma rude. - Sim, mas queria sanar as duvidas dos meus pupilos também. – diz enquanto se levanta do sofá e segue para a porta do salão – Aliais, se preparem, amanhã eu tenho uma missão para vocês. - Como assim? – pergunta Rodolfo irritado – Depois de tudo isso, você quer nos mandar pra uma missão? - E por que não? – diz Hugo – Todos vocês ficaram aqui e não precisaram fazer nada, estão bem descansados. E Aquiles se regenera bem rápido, suas forças já devem estar em perfeito estado nesse momento. Dizendo isso, Hugo sai pela porta principal do Hall da Zoeira, deixando um grupo de jovens sem saber exatamente o que esperar no dia seguinte. - Quem achar que ele é meio doido levanta a mão – diz Miguel. Valquiria levanta a mão o mais rápido que consegue – Tamo junto. – diz o jovem velocista e bate no peito em sinal de irmandade. - Eu to achando isso muito estranho. – diz Rodolfo de pé e com os braços cruzados– Eu acho que isso é mentira. - Eu tentei ler a mente dele enquanto ele falava. – diz Renata, sentando no mesmo sofá em que Murilo estava sentado – Mas ele manja dos paranauê. Ele me impediu
de ler a mente dele, e se der mole nem percebe que estava fazendo isso. - Ele é experiente. – diz Thais enquanto senta em no braço do sofá do lado contrario de onde Renata e Murilo estavam – Não leve a mau, mas não é qualquer um que vai conseguir ler a mente dele. - Gente. – diz Valquíria – Eu sou meio lerda e tal... Mas eu sei que vocês não tão acreditando na história dele. - Parece que dessa vez você acertou, pelo menos uma vez. – diz Renata. - Espero que vocês não estejam realmente pensando em fazer alguma coisa contra o Hugo, ainda mais agora. – diz Viviane que não havia pronunciado uma palavra quando Hugo estava na sala – Tudo isso é novo pra todo mundo, principalmente pra mim, mas tudo bem. O grupo acabou de ser apresentado pro mundo, vocês não podem fazer um motim do nada. - Quem falou de motim? – diz Rodolfo – Nos temos que investigar ele, isso sim. - Mas não podemos esquecer pra que estamos aqui. – lembra Thais – Temos missões a cumprir e ameaças à impedir. - Voto por todo mundo ir dormir e descansar, o dia foi cheio e vamos ter trabalho amanhã. – diz Renata. - Acho justo. – fala Murilo se levantando do sofá – Meu corpo se regenera, mas minha mente não... Mesmo não ficando cansado, eu ainda fico com sono. Amanhã podemos discutir melhor isso. Talvez nem seja necessário tudo isso. Talvez o Hugo esteja falando a verdade. Ele pode mesmo ter ido encontrar com a amiga dele e estamos aqui de bucha pensando em o que ele tava fazendo, enquanto provavelmente ele está comendo outra piranha qualquer por ai. - Realmente o sono vai fazer bem pra todos. – diz Thais se levantando e indo em direção a Viviane. – Hey, você vai dormir aqui hoje? - Na verdade não. – diz a jovem – Minha mãe ainda está muito mal com a morte do meu pai. Eu vou pra casa e passar a noite com ela. Mas amanhã eu vou estar aqui pra
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ajudar vocês na missão. - Precisa de uma carona, ou que alguém vá com você até em casa? – diz Rodolfo, se metendo do nada na conversa. - N-não. – diz Viviane um pouco surpresa – Eu estou bem. Eu vou pedir um taxi. Rapidin eu chego em casa. - Tudo bem então – responde o jovem criador de escudos de energia.
Porto Real, General Bormann, Sistema Subterrâneo de Esgoto, 19 de janeiro de 2014, 23h14min
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Zonza e enjoada, Rata acorda em sua cama. O sistema de esgoto de Porto Real já foi usado como prisão na época da ditadura militar, porem a dificuldade para recuperar presos que fugiam de suas celas, por causa da enorme gama de caminhos que o fugitivo obtinha, fez com que o projeto fosse descartado e uma nova prisão fosse criada na superfície da cidade. Hoje em dia, o pavimento que antes obtinha a maior quantidade de celas para prisioneiros políticos, hoje é a casa d’A Escória. Rata vê a figura de Víbora sentada em uma cadeira na frente de sua cela, que estava fechada. - Eu te mandei vir para cá. – diz a mulher em tom sério. - Eu sabia que vocês iam brigar comigo, por isso demorei mais a chegar. – responde Rata se sentando na cama, com dificuldade – Só que eu acabei ficando presa em um tudo de ventilação e quando consegui sair... E-eu estava passando muito mau. - Sorte sua que eu te achei no caminho pra cá. Se não você estaria ate agora naqueles túneis. Se um daqueles mendinhos te achasse você estaria fudida. - Ee s-sei... Me desculpe, por favor. – diz Rata arrependida. - Não é pra mim que você tem que pedir desculpas. O concelho que te ver. Rata sabia que isso iria acontecer: os altos membros
da Escória haviam convocado-a. - Eu imaginava. – diz a jovem rata-humanoide se levantando. Enquanto Víbora abria a porta e à levava para a presença do Concelho, Rata pensava no que ela poderia usar como argumento a seu favor, mas nada vinha-lhe a cabeça. - Chegamos. – diz Víbora enquanto abre uma enorme porta de metal enferrujado, que dava direto pra uma mesa longa de madeira podre. Olhando para O Concelho, Rata vê que a mulher que havia à levado até lá, se encaminha para uma das cadeiras da mesa. - O que você tem a declarar? – diz um homem enorme, sentado na cabeceira da mesa. A Escória é um grupo que a quase dez anos vive no esgoto fugindo da sociedade. Brutus, o homem enorme, é um ex-vilão, que após o fim da Era de Ouro dos Heróis, fugiu para os esgoto, sabendo que também seria caçado como nunca antes visto. Seus poderes de super resistência e super força, além de sua determinação, confiança e coragem, foram a inspiração para os outros ex-vilões e heróis que que haviam se escondido com medo da sociedade que iria caçalos para sempre. Brutus protegeu e ajudou outros fugitivos nos esgotos, ele os uniu e fez com que todos se ajudassem. Assim nasceu a Escória, e dos membros mais inteligentes e sagazes, nasceu o Concelho. Nenhuma decisão é feita, e nenhuma ação é concluída se antes não for aceita pelos cinco membros que formam o Concelho: o próprio Brutus, com seus dois metros e meio de altura e trezentos e cinquenta quilos; Cilada, um ex-vilão muito inteligente e trapaceiro; Syth, um alienígena que divide seu corpo com um simbionte com vida própria; Conexão, o mais antigo deles, um robô com a consciência de uma pessoa habitando-o; e sua mentora Víbora, uma engenhosa e habilidosa mulher com aparência reptiliana. - Eu não tenho uma defesa que não seja o fato de eu ter tentado ajudar em uma situação que eu mesmo criei. – diz Rata acanhada. - Você sabe que a principal regra da nossa sociedade é
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se manter no anonimato, se manter fora de vista. Mas mesmo assim se aventurou a se envolver na situação calamitosa no Aeroporto Antônio Mascarenhas. – diz Syth inexpressivo. - Eu fui moralmente obrigada a ajudar em uma situação que eu mesmo ajudei a criar. – responde Rata indignada. - Como assim ajudou a criar? – diz Conexão. - A explosão foi criada por um curto circuito que ocorreu por causa de um homem que se assustou quando me viu. – responde Rata – Eu juro que não foi minha intenção. - Eu acredito na menin... – diz Víbora, mas é interrompida por Brutus. - Essa menina é sua pupila, Víbora. Você sabe muito bem que não tem voz nessa audiência. – brande a voz estridente do enorme homem. - Então o que eu estou fazendo aqui? – pergunta indignada a mulher. - Ué! Até onde sei, a porta de saída não está trancada. – diz Cilada, ironicamente. - Em um momento como esse eu tenho que concordar com Cilada. – ruge a voz de Brutus – Você foi encarregada de cuidar da recuperação da menina e de traze-la até aqui. Sua permanência no ressinto não é proibida, mas é inútil. - Realmente a voz da Renegada era o que mantinha esse concelho longe da crise. – diz Víbora com ódio – Ela se foi e o inferno tomou conta disso. - Não ouse falar este nome nessa sala – esbraveja Brutus enquanto bate com força na mesa de madeira, fazendo um enorme buraco na mesma – Renegada foi uma de nos. Nos ajudou muito, mas isso é passado. Ela mudou de lado e agora está morta. Ponto final. Agora saia daqui imediatamente. Só se apresente amanhã para nossa reunião. - Feliz, pequena ratinha? – diz Cilada, logo depois que Víbora sai pela porta de metal enferrujado. - Não, senhor. – responde Rata ainda mais acanhada. - O que você fez no Aeroporto, minha filha? – pergunta Conexão, com uma voz robótica, mas que lembra a de um senhor de terceira idade amigável.
- Eu encontrei com um dos membros do grupo que foi criado a poucos dias atrás. Eu disse pra ele sobre as saídas pro esgoto que levariam ele pra fora dali com os feridos. Só isso. – responde Rata. - Por Deus. Logo um dos membros do G.A.T.H.? – indaga Brutus – Já imaginou se ele diz sobre você ao mentor deles e eles vêm nos procurar? - Eu não tive escolha. Era ajudar ela a ajudar os outros, ou deixar todos morrerem – rebate Rata. - Se eles vierem, estaremos prontos. – diz Seth – Lutaremos com honra até nosso ultimo homem. - Pra você é fácil falar isso, Seth, você é o pikão das galáxias, provavelmente o mais poderoso aqui. Quero ver se você só tivesse sua inteligência pra sobreviver. – lança Cilada. - Vocês não acham que já tivemos problemas de mais por hoje? – diz a voz robótica de Conexão – Devemos selar logo o destino de Rata e irmos todos descançar. - Verdade. – diz Cilada – Estou morrendo de sono. E então? O que fazemos com ela? - Eu voto por não fazermos nada. – diz Seth – Ela já sofreu de mais naquele duto de ar. - Concordo com Seth. A jovem já teve problemas de mais. – concorda Conexão. - Eu penso o contrário. – diz Cilada – Mesmo já tendo sofrido bastante, o fato de ter se exposto tanto e nos expostos dessa forma, faz a menina merecer um castigo severo. - Então está resolvido. – per fim Brutus fala – Você será punida, Rata. Porém sua pena não será tão dura. Você está proibida de sair de nossas dependências, sem permissão minha, durante trinta dias. Nos próximos trinta dias vocês não poderá sair da área que compõe o Pavimento 5. Você intendeu? -Sim, senhor. – diz Rata, agradecendo mentalmente por ter pego uma sentença tão leve – Dou minha palavra de que não irei me revoltar ou tentar fugir de seu castigo. - Não veja isso como um simples castigo. – diz Conexão – Veja como uma medida comportamental pedagógica.v
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- Senhor, desculpe. – diz Rata, com vergonha – Mas eu não sei o que é “pedagógica”.
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Capitulo 10
Porto Real, Azul, Rua Emanuel Cavalcante, 20 de janeiro de 2014, 2h45min Quando os problemas da ação do G.A.T.H. na Praça do Karmo pareciam ter assentados, quando a poeira havia baixado, uma situatção tão ruim quando a anterior havia feito a cidade voltar os olhos para a ineficiência da policia e a necessidade de pessoas com habilidades especiais. Ainda por cima, a morte da jornalista havia criado um desconforto ainda mais problemático por parte dos jornalistas. “Os desgraçados não vão me deixar em paz”, pensa Mirian sentada em sua cadeira, no escritório de sua casa. Depois de investigações, Mirian havia descoberto que a jovem jornalista assassinada era filha de um antigo herói, e depois da informação ter sido vasada por alguém da policia, pessoas que simpatizavam com os antigos heróis também estão pegando no pé da policia usando o argumento de “estarem desprezando quem eles acham que são culpados pela ineficiência deles no passado”. A cereja do bolo é a saída de Mauricio da cadeia. A delegada sentia sua cabeça prestes a explodir. - Não. Faz o que eu te falei. Mantem esses menores na cela da delegacia e deixa eles ai até de manhã. – diz Mirian ao telefone – Mesmo que eles nem saibam que é a jornalista que morreu, eles vão pensar duas vezes antes de fazer alguma merda. A delegada desliga o telefone e se recosta na cadeira do escritório. Ela olha o livro na mesa, o mesmo livro que não tinha deixado Mauricio encostar quando veio visitala. Aquilo não era exatamente um livro, na verdade era um diário: o diário do herói Sentinela. Ela já havia lido-o mais de dez vezes, mas todas as vezes que lia procurava algo diferente, algo que nunca havia conseguido encontrar; um indicio de mentira, um nome que viesse a ajudar a prender heróis que haviam cometido crimes no passado, ou qualquer coisa do tipo. Ela pega o diário e abre-o na primeira pagina para,
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mais uma vez, lê-lo a procura de pistas.
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“Eu não sei exatamente como começar a escrever um diário. Na verdade eu nem sei exatamente por que eu estou escrevendo isso. Acho que estou escrevendo isso por que nos últimos tempos tem coisas de mais acontecendo na minha vida e eu não sei exatamente como conviver com essas coisas, e não tenho muitas pessoas com que eu posso compartilhar minha vida dupla. Mas enfim... Primeiro eu gostaria de me apresentar a você (eu vou me referir a você por que é estranho falar comigo mesmo, provavelmente o ‘você’ é o fogo ou a gasolina, eu não quero que ninguém leia isso, então irei queimar esse diario depois que terminar): meu nome é Raphael Silva Moreno, tenho cerca de 1,80m, uns 90kg, minha pele é morena e meu cabelo curto é negro, assim como meus olhos. Atualmente eu trabalho como barman em uma boate no bairro Rappa a noite, e como vendedor de seguros durante o dia, sim, eu ando o dia todo batendo de porta em porta vendendo seguros e passo a noite vendendo cachaça pros bêbados. Eu estou me cagando de rir aqui, você pode não achar, mas pra mim isso é a coisa mais hilária do mundo. Mas no final das contas eu ainda tive sorte. Tudo isso me deixa bem solto pro meu terceiro trabalho: eu sou o super herói Sentinela. Dizem que eu fui o primeiro grande herói, dizem que sou fonte de inspiração pra outros heróis, mas eu não me vejo assim, eu me vejo apenas como o cara que tenta fazer seu trabalho da melhor forma possível. Eu acho que pulei um pouco as coisas. Acho que eu tenho que mostrar como é que eu cheguei nesse ponto antes de mostrar o que sou. Bem... Minha mãe desde novinha morou na Villa Santa Rosa, uma favela no meio do bairro Aurora, já o meu pai veio do nordeste e morou no Recanto, um bairro recheado de pessoas vindas do mesmo lugar que ele. Os dois se conheceram em um prédio no Centro, minha mãe trabalhava como faxineira em um dos apartamentos e meu pai era porteiro no prédio. Pelo o que eles me contaram, eles se conheceram com o tempo, começaram a ir juntos para
o ponto de ônibus, e um belo dia, ao invés de pegarem um ônibus e irem casa um pra suas casas, pegaram um ônibus e foram pro motel. Foi quando eu surgi. Cresci, estudei, e chegou o momento de sair de casa. Foi o que eu fiz, sai da nossa casa na Vila Santa Rosa e fui morar no bairro Morada, em um quarto-e-sala. Contar isso já é mais que bom, apesar de eu acreditar que só isso já é o suficiente pra você saber como eu sou. Mas alguns comentários dos meus amigos me assustam. Eventualmente sou chamado de ‘gentil’, ‘justo’, ‘amigável’. Isso é estranho, eu não sei reagir bem a elogios, ou pelo menos não sabia. O que importa é que meu destino me transformou em algo inumano, em algo impensável. Um belo dia, tive problemas com uns bêbados na boate que trabalho. Um cara estava dando em cima de uma mina perto do bar, mas quando ele passou dos limites e ela deu um tapa no rosto do maluco, eu me enfiei no meio da briga e tentei separa-los, mas não tive muita sorte. O cara tinha uns amigos com ele e eu sai na pior. Os seguranças colocaram os caras pra fora, e eu, com meus dentes quebrados e beiço arrebentado, fui pros fundos da boate ficar um pouco sozinho. Foi nesse momento que minha vida mudou. Um clarão me segou, e quando abri os olhos, estava olhando um céu cheio de estrelas, mas quando olhei pra baixo, não achei o chão. Eu estava em pleno espaço sideral, não sabia o que acontecia, mas sabia que isso não era bom. Imagine a minha reação quando ouvi uma voz vinda do além, grave ecoante, mais alta do que eu acharia confortável. Ela disse alguma coisa em uma língua estranha, mas, de uma forma muito estranha, eu consegui entender. Ela dizia: ‘Ao mesmo tempo em que a existência foi concebida, a Sentinela também foi. O poder da Sentinela agora é seu, você é o campeão desse mundo fraco, o campeão dos derrotados, o ser que vai salvar essa raça da extinção e do caos’. Sabe o quanto é estranho ouvir isso? Sabe o quanto eu tive medo quando o mesmo clarão me segou de novo e eu estava em casa? Eu nunca vou esquecer isso. Eu nunca vou esquecer o dia em que eu me tornei do maior heróis de todos.”
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Mirian Rua fecha o diário e larga-o em cima de sua mesa, sem nenhum cuidado. Sua dor de cabeça parece piorar. Ela se levanta e vai na direção da sala de estar. Sua casa, desprovida de decoração, é básica, porém enorme. A sala é mau iluminada, com moveis de madeira e alguns outros em tons de bege, com alguns quadros de arte neoclássica espalhados sem, nenhum padrão, espalhados pelas paredes da sala e do corredor que leva ao escritório e os quartos. A delegada senta no sofá e liga a televisão. Está passando o noticiário que mostra os estragos do acidente no Aeroporto Antônio Mascarenhas. Os dois homens que acabaram por causar o acidente já haviam sidos intimados a depor no dia seguinte, ela havia marcado o interrogatório para o final da manhã, mas não acreditava que poderia dormir nem um pouco essa noite. Porto Real, General Bormann, Rua Camarista, 20 de janeiro de 2014, 2h45min 84 Aparentemente alguma coisa em sua vida havia dado certo. Mauricio, o homem que havia perdido tudo, havia descoberto que ainda tinha o básico para viver: uma casa. Ele havia dado a casa como pagamento para o advogado que estava responsável por seu caso, já que o ele nunca havia pensado em guardar dinheiro para uma situação como aquela. O ex-policial havia pensado em ir fazer uma visita ao homem, mas quando chegou e viu a porta trancada, com um aviso de “propriedade do governo”, ele foi a procurar respostas. E acabou por descobrir, através dos vizinhos, que depois de anos continuavam os mesmo, que o homem que havia ficado de posse do seu apartamento havia morrido por uma bala perdida dois anos atrás. O prefeitura havia procurado parentes, mas não acharam nenhum. No final das contas, o imóvel havia ficado sob a posse do governo. E pra deixar tudo ainda melhor, o promotor que havia ficado encarregado de cuidar disso, havia deixado uma cópia da chave do imóvel com uma vizinha do apartamento. Convencer a vizinha idosa de deixar Mauricio voltar
a morar ali foi a parte mais fácil, ela já o conhecia a anos, e não o julgava por ele ter feito o que fez com os homens que mataram o seu filho. - Obrigado, Dona Sílvia. – diz Mauricio enquanto entra pela porta do apartamento e depois fecha -a de si. Ele vê que o que um dia foi sua casa, havia mudado totalmente. Desde a televisão da sala, até a cama de seu quarto haviam sido trocadas, apenas algumas estantes haviam sido preservadas, sendo reenvernizadas e uma poltrona muito antiga fora trocado seu estofado. Porém o mais estranho é que o quarto de seu filho estava praticamente intacto. Aparentemente o advogado não tinha nenhum filho, nem ninguém que pudesse dar as roupas de um adolescente de 14 anos, além de ter um quarto inteiro sem utilidade. Ali estavam algumas coisas que Mauricio havia imaginado que haviam sido jogadas fora, como roupas de sua mulher e dele mesmo, além de alguns quadros que sua mulher pintava, um hobby de sua amada. Mas a parte mais traumática de tudo aquilo foi ver a janela de onde Isadora, sua mulher, havia se jogado. Ele se lembra de chegar à sua rua e ver o corpo de sua amada esparramado no chão, sangrando e sem vida, na frente do prédio. A queda de dez andares havia deixado o corpo irreconhecível, e apesar de todos os seus anos na policia, Mauricio ainda tinha pesadelos com a cena. Ele se volta para o centro da sala, ascende um cigarro e senta em seu novo sofá. “Isso é bem melhor do que dormir em pontos de ônibus e estações de metro”, pensa o ex-policial enquanto dá uma longa tragada em seu cigarro. Por costume, ele bate as cinzas do cigarro no chão, e só nesse momento é que percebe o quão bem cuidado tudo estava. Para um lugar fechado ha pelo menos dezoito meses, o lugar não tinha uma sujeira. Foi então que ele imaginou Dona Silvia fazendo visitas semanais a casa que ela havia ficado sob posse da chave, para fazer uma pequena faxina. Ele á uma dona de casa muito bem aposentada e solteira, seus filhos saíram de casa mais de uma década atrás, e ela provavelmente estava tentando arrumar coisas para fazer em seus momentos de tédio, e algumas pessoas tem hábitos muito estranhos para
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passar o tempo. Apesar disso, Mauricio não se sentia confortável ainda. Ele sabia que precisava arrumar dinheiro de alguma forma. Seu pensamento era virar um assaltante mesmo. Durante seu tempo na policia acabou conhecendo tanta gente que fez bastante dinheiro roubando na rua, que a ideia havia passado por sua cabeça, mas a ideia foi logo descartada quando se lembrou como encontrou com essas pessoas. Sem muitas ideias de o que fazer, Mauricio havia voltado a fazer o que sabia fazer melhor, andar pela madrugada, sem rumo nem direção. Porém suas andanças não haviam-no levado a muito longe de casa. Ele gostava daquele bairro, morou lá desde criança e conhecia cada rua, beco e viela dali. O General Bormann, que deu seu nome ao bairro, era amigo intimo de seu pai, na época em que aquele lugar ainda se chamava Rio Longo. A história do nome “novo”, que já tinha mais de trinca anos, é que um deposito de gás explodiu (nunca se soube o porquê, mas a teoria é de que um balão tivesse caído no depósito) e acarretou um enorme incêndio que tomou conta de todo o bairro. O General Carlos Antônio Bormann, que morava no bairro com sua mulher e um filho de dois anos, ajudou com todas as suas forças o resgate dos feridos. O problema foi quando, depois de ter ajudado a evacuação durante horas, e salvo centenas de vidas, o General descobriu que sua mulher e o filho haviam morrido ainda na explosão do depósito de gás, fazendo com que o general tivesse um infarto e falecido ali mesmo na rua, em meio ao caos. Ao longe, o homem vê duas pessoas conversando frente a uma casa lotérica fechada, um deles parece ter um envelope em mãos. Enquanto Mauricio se aproxima, ele vê que um carro da Policia Militar de Porto Real para em frente aos dois. Da viatura, dois policiais, devidamente uniformizados e armados, descem de começam a conversar com as, agora reveladas, mulheres que estavam paradas conversando na frente da casa lotérica. Observando de longe, Mauricio continua andando. Ele sabia que aquilo era o “arrego”. Muito dinheiro estava naquele lugar, e como em toda boa cidade grande, a proteção
que você tem da policia, é paga por fora. Ele mesmo nunca havia se envolvido nesse tipo de coisa por fazer parte da Policia Civil: ele ao mesmo tempo que recebia melhor do que os policiais militares, ele não era responsável pelo patrulhamento das ruas, apenas pela apuração e investigação de crimes. Ao chegar mais perto, o ex-policial ouve o primeiro tiro. Esse tiro pega de raspão no braço de um dos policiais, o mesmo tomba pra frente e a bala segue para o peito de uma das mulheres que estavam na porta da lotérica. Ao ouvir o tiro, Mauricio se agacha e se esconde atrás de um caro próximo. O policial que acompanhava o ferido, dispara na direção de que o tiro veio, mas um segundo tiro acerta-o por trás, bem no meio de suas costas. Um homem de mascara, se aproxima e atira na cabeça do policial que havia tomado o tiro no braço e segue para dentro do estabelecimento, por uma pequena porta no batente que deixa o lugar trancado. Outros três homens aparecem, dois deles também entram pela porta, enquanto o ultimo fica de guarda na entrada. Movido pela vontade de fazer justiça, o ex-policial não vê alternativa diferente de entrar em combate com os homens. Tudo seria quer ser feito com muito cuidado, já que eram quatro bandidos armados, e não mendigos viciados em crack. A possibilidade de morte era real, e qualquer erro poderia ser o ultimo. Porém ele estava ali, e o espirito de policial que ainda vivia nele era maior do que a vontade de correr para o mais longe possível dali. Ele segue agachado, se esforçando para não fazer nenhum barulho, por entre os carros, se mantendo fora da visão do bandido que havia ficado de guarda. Por sorte, a viatura havia estacionado exatamente a frente da lotérica, e outros carros estava estacionados no mesmo lado da rua em fila, fazendo com que a visão da rua ficasse parcialmente tapada pelos carros, dando liberdade para Mauricio seguir. Agachado no espaço entre o carro que estava estacionado atrás da viatura e o carro atrás dele, o ex-policial observa o bandido de guarda, ele segura uma pistola 9mm e tem uma granada presa no cinto. Mauricio não acreditava que o homem levasse aquilo consigo mais do que como um artefato para amedrontar vitimas, mas ainda assim aquilo seria útil na
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ação. O bandido vestia uma toca preta e roupas casuais; uma camisa de malha verde escura, uma calça jeans e um tênis preto. Ao ouvir um barulho de tiro vindo de dentro do estabelecimento, Mauricio sabe que deve agir. Ele saca uma faca militar de dentro de seu casado e segue furtivamente até o homem, seu tom de pele escura e sua roupa preta ajudamno a oculta-lo na escuridão da noite. Quando o bandido percebe que alguém se aproxima, já é tarde de mais. Com um movimento rápido, o ex-policial enfia a faca no peito do bandido e bate as costas do mesmo no batente da porta, enquanto dá uma cabeçada em seu nariz. Logo depois, com o homem ainda de pé em sua frente, e com a faca ainda cravada em seu peito, Mauricio puxa-o para porta e mantem o corpo do bandido à sua frente. Os bandidos dentro do local não intendem nada, nem mesmo depois do ex-policial empurrar o bandido, arrancando a faca de seu peito de se escondendo de novo atrás do batente. Os bandidos que estavam dentro da loja, se aproximam do companheiro, que se vira e mostra o nariz sangrando e o buraco em seu peito feito pela faca. Logo depois ele percebe que a granada que prendia em seu bolso não estava mais com o pino. Nesse momento é tarde de mais para fazer qualquer coisa, a granada explode e o bandido que havia ficado de guarda tem seu corpo dividido em duas partes pela explosão da mesma. O bandido que estava mais próximo da explosão é arremessado na direção do balcão da caixa lotérica, que serve para dividir os clientes dos atendentes do estabelecimento, que fica no final do local. Os outros dois recebem ferimentos mais leves, mas percebem que todo o lugar estava tomado por poeira e nada além de dois ou três palmos a sua frente podia ser visto. - Que porra foi essa, irmão? – indaga o bandido que estava mais longe da explosão. - Sei lá, porra. – diz o outro entre crises de tosse – Caralho, a gente tem que sair daqui. Ao terminar de dizer isso, os bandidos escutam o primeiro tiro, depois o segundo e o terceiro, que acerta o ombro esquerdo do que estava mais longe da explosão, que
geme de dor. Finalmente eles começam a atirar na direção qual eles imaginavam que os tiros vinham. Durante alguns segundos isso se segue, mas então a poeira baixa e todos percebem que estão sem balas. Os dois bandidos que estavam mais longe da explosão ficaram sem balas, da mesma forma que Mauricio do lado de fora, protegido pelo batente da lotérica. - Porra, vai lá ver qual é a desse cara. – diz o bandido que havia levado o tiro. - Tá maluco, porra? – replica o outro bandido – Por que eu tenho que ir lá? - Por que você não tomou um tiro. Com esse argumento, o bandido vai, relutante, até a entrada do estabelecimento. Chegando perto da porta, a mão de Mauricio surge da porta e acerta o rosto homem, que cambaleia pra trás. Nesse momento, o ex-policial consegue ter uma visão melhor do lugar: todas as paredes, e o teto, eram pintados de branco, porém com a granada, viajavam entre tons de cinza e vermelho sangue, enquanto o chão de ardósia cinza, agora tinha um buraco bem ao centro e um corpo, dividido em dois, caído próximo ao buraco, o balcão que divide os clientes dos balconistas é localizado no final do ambiente, onde um corpo abatido e sangrando se contorce de dor, a esquerda algo que um dia fora uma bancada de apostas, mas que agora já não passava de um monte de mármore destruído. - Mata esse viado! – grita o bandido que havia tomado o tiro no ombro, enquanto se levanta. O bandido que já havia tomado um soco de Mauricio, parte para cima do ex-policial de novo. Ele consegue acertar um soco com a mão esquerda no rosto do homem, que cambaleia pra trás, dando tempo do bandido avançar para cima dele novamente, com um soco de direita. Só que desta vez, Mauricio consegue desviar do soco, indo para sua esquerda, e aplicando um soco no rosto do bandido, com o braço esquerdo, movimento que já é agregado ao feito em seguida, que puxa a cabeça do bandido para a sua esquerda, e faz com que ela bata no batente do estabelecimento, nocauteando-o instantaneamente.
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No tempo em que enfrentava o primeiro bandido, o segundo já vinha em sua direção, com uma faca em sua mão direita. Sem pensar muito, o bandido tenta acertar, com uma estocada, o seu antagonista, porém Mauricio consegue desviar, para sua direita, e acerta um soco no rosto do inimigo, que não se desestabiliza e segue mais uma vez frente ao expolicial. Dessa vez, o bandido lança um golpe cortante, vindo da direita para a esquerda, mais uma vez Mauricio consegue desviar, mas não sem consequências, um pequeno corte é feito em sua barriga. O ferimento queima, e ele sente a dor, mas não pode fraquejar. Vendo que é uma boa oportunidade, o ex-policial aproveita o posicionamento quase de costas, que o bandido havia ficado despois de desferir o golpe, se joga para sua esquerda, e pula nas costas do mesmo, puxando-o em um mata-leão bem encaixado. O homem se debate e os dois acabam por cair no chão. O bandido consegue desferir um golpe com a faca na perna de Mauricio, fazendo com que ela fique cravada em sua coxa. Mauricio grita de dor e acaba por fraquejar o golpe, dando tempo de que o bandido saísse da chave. Ele se vira e acerta um soco no rosto de seu inimigo, seguido de outro, e mais um. O quarto soco viria, porém é impedido pelo, faixa roxa de jiu-jitsu, Mauricio Gomes, que em um giro rápido de quadril, puxa o braço do homem em um arm-lock em meio a tudo. Ele força do braço do bandido, visando quebra-lo, porém o mesmo é inteligente e segura com força a faca que instantes atrás havia cravado em sua coxa. Mauricio sente a dor da lamina em sua perna, e sente ainda mais dor quando o bandido arranca-a da sua perna. Ele aparenta que iria tentar enfiar a faca novamente na outra perna do ex-policial, que por sua vez, afrouxa o golpe e se levanta mais rápido do que se imaginaria que um homem de mais de quarenta anos conseguiria fazer, e acerta um soco no rosto do homem, atordoando-o. O bandido ainda segura a faca, porém Mauricio consegue segurar seu pulso e torcelo, fazendo com que o mesmo solte a arma. Depois disso, os socos disferidos de cima pra baixo, pelos poderosos punhos do ex-policial, rapidamente nocauteiam o bandido. Machucado e cansado, Mauricio se levanta, com sangue pingando do corte em sua barriga e do buraco em
sua perna. Lentamente, ele anda até a porta que dá acesso para a parte de trás do balcão, onde ficam os balconistas. Nesse momento ele ouve mais um tiro, e logo depois seu ombro direito começa a queimar. Ele olha seu ombro e vê o sangue jorrando de um buraco de bala. O bandido que estava mais perto da explosão havia sobrevivido, mesmo que por muito pouco. Ele tenta atirar de novo, mas é tarde de mais, a arma calibre .38 demora a ser destravada dando tempo para Mauricio ir para cima dele, desferindo vários socos em sua face, deixando o inconsciente e seriamente machucado. Por fim Mauricio consegue chegar até a porta de entrada para a área restrita do estabelecimento. Quando ele empurra a porta, pra que ela se abra, a porta cai por completo, batendo com força no chão, obviamente ela havia sido danificada pela explosão. O ex-policial entra e se senta de frente para a mulher que estava com o envelope, recheado de dinheiro. - Acho que era isso que eles queriam – diz estendendo a mão esquerda, com o envelope de dinheiro que havia encontrado no chão quando entrou na área restrita. - B-b-bri-brig-brigada – responde a mulher estendendo a mão para o envelope. - Pera ai! – exclama Mauricio quando vê outros envelopes exatamente iguais nos fundos da área restrita para funcionários. – Eles iam ficar com tudo isso que tá ai atrás. Acho justo eu ficar com isso. – diz enquanto puxa o envelope para si. - Mas esse dinheiro é daqui. – diz a mulher já sem nenhum sinal de estado de choque. - Todo esse dinheiro ai atrás também... – diz apontando com a cabeça pros outros envelopes – Acho que isso não vai fazer muito diferença pra vocês. – diz Mauricio enquanto mostra sua arma, que estava descarregada, porém a mulher não sabia. - Tudo bem... – diz ela entendendo o recado. - Muito obrigado pela compreensão. – diz Mauricio colocando o envelope no bolso interno do casaco e depois de levantando, com muito esforço. - Espera. O que eu faço agora? - diz a mulher ao ver que o homem que havia acabado de salva-la estava saindo do
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estabelecimento. - Vocês tem câmera de segurança? – pergunta ele. - Temos. – ela responde – Mas elas pararam de funcionar a uns dois dias e a assistência técnica não apareceu pra concertar. - Então diga exatamente o que aconteceu aqui, mas diz que eu estava usando uma mascara. - Ok – responde a mulher. - Ah, já ia me esquecendo. – diz Mauricio arrancando um pedaço de pano da sua camisa e usando para estancar o sangue da sua perna – Diz pros homens da policia procurarem pelo pessoal da assistência técnica, eles devem saber de alguma coisa. Com essas palavras, Mauricio sai pela porta no batente do estabelecimento mancando e usando o casaco para disfarçar os machucados. Ele segue assim até seu prédio, passando pela portaria sem que o porteiro percebesse seu estado. Subindo, sozinho, pelo elevador até seu andar, o expolicial coloca a mão sob seu casaco e percebe que o buraco de bala em seu ombro esta sangrando muito, deixando sua mão esquerda coberta de sangue. Quando a porta do elevador se abre, ele vê uma jovem de aparentemente quinze anos, de pele branca e cabelos longos e ruivos, vestida de pijama, olhando pela janela longo corredor, que dava vista para a casa lotérica. Ele anda devagar e em silencio, esperando que ela não o percebesse. O corredor longo, com varias portas de madeira dos dois lados, tendo no final, uma grande janela de vidro, com uma pequena extensão, permitindo que duas pessoas se sentassem ali com conforto, tudo bem iluminado por diversas lâmpadas florescentes. Mauricio consegue seguir em silencio até quase a porta de sua casa, a ultima do corredor, do lado da janela em que a menina estava apoiada, porém alguns poucos metros antes, ele sente a dor de sua perna piorar e cambaleia para o lado, fazendo com que bata seu ombro machucado na parede, fazendo-o gemer de dor. Nesse momento, a jovem de cabelos ruivos que estava na janela percebe a presença do ex-policial.
- Eita, qual foi tiu, tá doidão? – diz a jovem quando vê Mauricio cambaleando. Depois dele não responder, ela percebe que o mesmo está muito machucado – Ih, carai. Calma ai que eu vou te ajudar. – ela ajuda o homem a se apoiar e depois pergunta – Qual é o seu apartamento? Mauricio aponta ultimo apartamento e a jovem leva-o até a porta. Ele tenta puxar a chave, mas não tem muito controle sobre os movimentos. A menina ajuda-o e abre o apartamento. Os dois entram pela porta e os ferimentos de Mauricio começam a pingar, deixando o chão de sua casa com varias gotas de sangue. Ela deixa-o no sofá e durante alguns segundos pensa em o que vai fazer em seguida. Por fim ela corre para fora do apartamento e some do campo de visão do ex-policial. Ele por alguns instantes fica desesperado, ele estava sangrando muito e não tinha nada em casa que pudesse usar para estancar o sangramento, pelo menos ele não sabia se tinha. Ele tenta ficar de pé, mas só consegue ficar tempo o suficiente para ver a menina ruiva sair do apartamento que fica em frente ao seu, o apartamento da Dona Silvia, da forma mais silenciosa possível, e entrar no apartamento do ex-policial novamente. - Affs, seu maluco, eu disse pra você ficar deitado. – diz ela entrando e fechando a porta do apartamento atrás de si. Mauricio tinha certeza de que não ouvira ela dizer nada a ao sair, na verdade ele não lembra de ouvir nenhum barulho desde que sentou-se no sofá. - Isso vai doer. – diz a jovem tirando algumas gazes e um vidro de remédio de uma mochila – Mas se eu não fizer isso, esses machucados vão acabar infeccionando. - Tudo bem... – diz Mauricio mau conseguindo respirar. Então ele tira o casaco e revela o buraco de bala em seu ombro. - Nossa! – exclama a jovem quando vê aquilo – Agora eu tenho certeza que você estava no meio daquela zona toda lá em baixo. - Não... – tenta falar Mauricio – Eu não...
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- Tudo bem, eu não vou contar nada pra ninguém. – diz a jovem e logo depois encosta uma gaze molhada no buraco de bala no braço do ex-policial, que segura o grito de dor por alguns segundos, mas seu esforço logo se encera quando ele fica inconsciente.
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Capitulo 11
Porto Real, General Bormann, Mendes Oficina Mecânica, 20 de janeiro de 2015, 11h25min Uma buzina aguda acorda Victor em um susto. O jovem companheiro do vigilante Manto, desde que conheceu seu mentor, vinha trabalhando em sua Oficina e morando com o mesmo, declarando, para todos os efeitos, que era filho da irmã de Anderson, que havia morrido recentemente. O garoto caucasiano e de cabelos castanhos, olha, sentado em uma cadeira de madeira rustica, colocada atrás de uma pequena mesa de metal no canto mais distante da entrada da loja, olha pela entrada e vê um Corsa sedã prateado parado, com um homem alto e magro parado ao lado do veículo. - Opa! – grita Victor se levantando indo na direção do homem – Já estou indo. - Porra, cara! – esbraveja o homem quando o jovem já está perto dele – Vocês querem me fuder? Eu vim aqui semana passada e esse carro já tá dando problema de novo. - Se acalme, mano. – diz Victor – O que tá acontecendo? - Pow, o freio tá mole e eu to ouvindo um barulho estranho vindo do motor. – diz o homem claramente mais calmo. - Tudo bem, então. Coloca o carro pra dentro, que eu vou chamar o Anderson, ele vai poder te ajudar melhor do que eu. - Ok – diz o homem antes de entrar no carro. Victor faz o que disse, ele adentra a Oficina enquanto ouve o homem ligar o motor. Ele percebe que realmente o motor estava fazendo um barulho estranho e já imaginava o que poderia ser, mas prefere se manter quieto e seguir para a escada que o levava para o segundo andar, aonde ficava sua casa, e de Anderson, em si. A oficina, apesar de ter um amplo espaço de 6m de largura, por 4m de comprimento, é bem rustica e suja; o chão, de cimento sem piso, é repleto de manchas de olho e guimbas de cigarro apagadas, enquanto as paredes parecem ter enegrecido com o tempo, decorrente de
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mais de uma década recebendo poeira trazida pelos carros; do lado direito de quem vêm da entrada da oficina, uma estante pregada na parede exibe algumas peças de carro, como parachoques, canaletas e retrovisores, ao lado de outra estante menor que comporta algumas garrafas de olho de motor de diferentes marcas, que por sua vez, ficava ao lado de um alinhador de direção a lazer e um alinhador de faróis. - Hey! – grita o jovem, enquanto pega uma maquina de solda e arrasta um macaco tipo jacaré, que estavam entre os dois braços de sustentação do elevador trifásico – Coloca o carro aqui. O homem dentro do carro faz sinal de positivo e avança com o Corsa. Do lado esquerdo de quem vem da entrada, preso à parede, tão suja quanto todo o resto do lugar, pode-se ver um calibrador de pneus ao lado de uma balanceadora de rodas, assim como uma prensa hidráulica. Todas as ferramentas são sujas de graxa e ficam espalhadas pelo chão da oficina e em cima de maquinas. Depois de largar o macaco tipo jacaré perto da mesa aonde estava sentado e deixar a maquina de solda em uma mesa perto da porta para o banheiro, nos fundos do lugar, o jovem sobe a escada que leva ao andar superior; à sua casa. Logo ao abrir a porta de ferro que divide a escada que vêm da oficina para a casa, Victor vê seu mentor desferindo fortes socos contra um saco de areia na meio da sala. - Anderson... – diz o jovem fechando a porta atrás de si – Tem um cara aqui que tá precisando de uma ajuda com o carro dele. - Tá bom. – responde Anderson entre socos – Já to indo. - Você tá bolado com o que aconteceu ontem, né? – diz Vitor enquanto se senta em um dos sofás da sala. - Sim. – diz Anderson ainda entre socos. Ele veste uma bermuda de cargo bege, com manchas de olho e está sem camisa. Todo seu, corpo, incluindo sua cabeça careca, estão encharcados de suor, Vitor logo soube que ele estava ali a um bom tempo, e que ele mesmo havia dormido tempo de mais sentado naquela cadeira – Isso vai ferrar com a gente. Isso não podia ter acontecido nesse bairro. - Mas você não acha que a policia pode ignorar isso
não? As pessoas aqui nunca falam nada que possa prejudicar elas. Nesse ponto temos que agradecer a violência dessa cidade. Anderson para abruptamente e fala. - Nunca diga para eu agradecer a violência dessa cidade. – depois de alguns instantes olhando para o rosto de Victor, Anderson volta a bater no saco de areia, agora focando em chutes de diferentes ângulos – Eu faço isso à mais de vinte anos e à mais de vinte anos eu nunca agi como Manto nesse bairro, pra evitar que a policia aparecesse por aqui procurando um vigilante. – agora o homem negro e musculoso chuta com ainda mais força o saco de areia – Ai aparece um cara qualquer por aqui, faz o que quer e nos coloca em risco. Eu não vou aguentar essa idiotice sem uma retaliação. Não vou mesmo. Depois de dizer isso, Anderson dá mais um chute de média altura no saco de areia, bem mais forte que os outros chutes que Victor havia visto até o momento. Depois disso, o homem para de bater e olha fixamente para o jovem que conversava com ele e diz: - Nós temos que nos preparar pra uma possível investigação da policia. - Você não acha que está indo longe de mais não? – indaga Victor – O cara fez o que não devia naquela caixa lotérica e tudo mais, mas não é o fim do mundo. A mulher de lá disse que o cara tava vestindo calça jeans, um casaco preto e uma mascara ninja, esse tipo de coisa você compra em qualquer lugar, existem inúmeras pessoas que podem ter comprado essas roupas em qualquer lojinha por ai. - Exatamente isso que me preocupa – responde Anderson – Imagine que você é um investigador da policia. “Uma pessoa alta e forte, com habilidades de luta e bom atirador, vestindo uma calça jeans e um casaco preto, roupas comuns em noites frias como a do dia do incidente, usando uma touca ‘ninja’ preta, algo que uma pessoa que passa seu tempo protegendo os outros com uma mascara poderia usar pra ajudar pessoas inocentes em um momento em que não pudesse perder tempo de vestindo apropriadamente. Bem, essa descrição de ‘alto e forte, com habilidade de luta e bom atirador’ se encaixam perfeitamente no perfil do único
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vigilante que ainda atua. E olha só essas estatísticas; aqui diz que o vigilante Manto nunca atuou no bairro onde aconteceu o incidente. Talvez ele more por lá, e em um momento em que ia na rua comprar maconha(por que, acredite se quiser, é assim que eles pensam) para seu pupilo passou pela situação e se viu obrigado a intervir.” - Isso faria bastante sentido. – responde Victor. - Claro. – responde Anderson com sua estridente voz, enquanto usa seus braços para levantar, com dificuldade o saco de areia do gancho do teto bem no meio da sala. Ele consegue tirar e larga-o em um carto da sala perto da janela que dá de frente para a parede do prédio do lado. – Que inferno... Quem é que tá lá embaixo? - É um cara branco, magro e alto. – responde Victor – Ele tá com um Corsa Sedã prata e disse que veio aqui semana passada. - Puta merda... – diz Anderson antes de beber um gole de agua, da geladeira que ficava na sala – Eu disse que a ele precisava trocar as pastilhas de freio. - Ele disse que também tem um barulho estranho no carro dele. – responde Victor se levantando e indo na direção da porta por onde havia entrado – Eu acho que é a Bomba D’agua que tá dando “tilt”. - Se for isso é tranquilo. – diz Anderson enquanto pega uma camiseta preta, que estava pendurada no parapeito da janela e usa-a para secar um pouco do suor do corpo. Depois disso, ele segue para a porta, que Victor já havia aberto e começava a sair, com a camisa em cima do ombro.
Porto Real, Vanilla, Instituto A.S.E.S, 20 de janeiro de 2015, 13h Renata andava calmamente pelos corredores do instituto, seu quadril balançava de um lado para o outro, e os olhos de Murilo não conseguiam desviar da telepata a sua frente. Thais segue ao lado de seu “irmão”, eles não eram irmãos de sangue exatamente, mas quando Thais foi
expulsa de casa, por seus pais, pelo fato de ter poderes e ser uma aberração no ponto de vista deles, Murilo a achou e cuidou dela. Mesmo não sendo tão mais velho que a menina, o jovem rastafári era maior e já sabia se cuidar muito bem, tinha contatos e alguns esconderijos que ela poderia passar a noite sem ser perturbada. Ele a ajudou a achar comida, e a se defender, e ela o ensinou a ler e a escrever. Thais sempre foi extremamente inteligente, e Murilo indiscutivelmente forte e rápido, com os dois se ajudando, ninguém conseguia para-los. Ele ensinou-a à roubar carteiras sem ser percebida, e ela ensinou-o à como tratar bem uma pessoa e engana-la. Essa convivência acabou criando um laço muito forte entre os dois, e desde então os dois se consideram irmãos acima de tudo. - Vou ter dar uma moral só dessa vez hein... – diz Thais baixinho no ouvido do irmão. - O que? Como as... – o rastafári diz, mas é muito tarde. - Renata, sua safada, vem aqui. – grita a jovem para a telepata a sua frente. - O que você quer, sua vadia? – rebata Renata. - Nossa... quanto amor... – exclama Murilo em um tom baixo. - Pra dar e vender. – diz Thais – Renatinha, você não tava querendo umas aulas extras de luta e o Andarilho disse que não tinha tempo pra ter aulas extras com você? - Sim... Eu disse. - Então. Eu esbarrei com o professor por ai, e ele disse que de todos nós, o Murilo é o melhor em combate corpo-acorpo. Então você pode ter umas aulas com ele ai invés de ficar treinando sozinha com aquele saco de areia. - Isso faz sentido... – diz Renata pensativa. – Você topa, Murilo? O rastafári parece corar, mas seu tom de pele não deixa transparecer. - Pode ser. – diz Murilo, dando de ombros – Mas não vejo necessidade disso. Você tem telepatia, não precisa saber dar um soco, você pode fazer o inimigo bater a testa no teto e o deixar cair no chão. - Nossa... Quanto sangue no olho.
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- Essa é o máximo que você vai conseguir dele. – diz Thais rindo. – Acho que ele por natureza é bruto. - Um pouco. – diz o rastafári. – Amanhã à noite tá bom pra você, Renata? - Perfeito. – responde a telepata. - Então me encontra no ginásio umas 8h. No que você tá com mais dificuldade pra pegar? Os três chegam ao fim do corredor, onde uma grande sala circular, com um pé direito extremamente alto e placas de metal formando o teto e as paredes, se apresenta. No centro, uma câmara suspensa, presa ao teto, tem janelas para todos os lados da sala, porém é um vidro escurecido, deixando impossível se ver alguma coisa do lado de dentro. Do lado direito de quem veem do corredor principal, é possível ver uma área com alguns bancos e armários, como um vestiário, mais ao fundo, existem duas portas, que dão para os banheiros, escrito “feminino” e “masculino”, uma do lado da outra. - Bem... – diz Thais – Eu vou deixar vocês sozinhos pra resolverem isso. Em seguida, a jovem vai em direção ao vestiário, deixando Murilo e Renata no final do corredor principal. Enquanto se afasta, a Thais fiz sinal de positivo e pisca o olho para Murilo, já que estando atrás de Renata, a mesma não poderia vê-la. Vendo sua irmã ir ao vestiário, o rastafári percebe que Rodolfo e Valquíria já estavam por lá. - Tipo... – começa a falar Renata, mas é interrompida por um vulto em alta velocidade passando atrás de si, vindo do corredor e indo para o vestiário. – Seu anãozinho inútil. – diz a telepata zombando da baixa estatura de Miguel. - Eu ainda ferro com a vida desse cara. – diz Murilo. - Não quero ler sua mente pra saber se isso é brincadeira. – diz Renata sorridente. - Em alguns raros momentos eu brin... – o rastafári se interrompe – CUIDADO! Murilo com um movimento rápido, empurra Renata para o lado, e acerta um chute frontal contra um homem negro e careca, que se projetava, com uma faca na mão, atrás da jovem. Outro homem, muito parecido, porém com roupas
de cores diferentes, aparece, também com uma faca na mão. Dessa vez Murilo desvia do golpe, deixando o homem passar por ele, e então ele vira, desferindo um chute lateral no peito do homem. - Mas o que é isso? – diz Renata enquanto se levanta, um pouco zonza. - Não sei. – diz Murilo, olhando na direção de que Thais tinha ido. Ele se assusta quanto não vê o vestiário, apenas uma parede de concreto, com grafites e pichações semelhantes a marcas de gangues. - Mas que porra é essa? – diz Murilo. - CUIDADO! – essa foi a vez de Renata salvar o rastafári. A telepata usa seus poderes e arremessa dois homens para longe, eles batem violentamente contra um carro prata que estava estacionado naquele cenário, provavelmente os matando. - Obrig... – Murilo começa a falar mas é interrompido. - SEM FORÇA LETAL, PSY! – grita uma voz familiar vindo de todos os lugares, e de nenhum ao mesmo tempo. - Isso só pode ser sacanagem. – diz Renata. - Não é não – diz Vulto, passando como um raio pelo lado dá telepata, deixando seus cabelos voando com o vento. - O Portal é um safado, nem pra dizer um oi antes da aula. – diz Atalanta enquanto sai de uma porta de madeira de um dos prédios da simulação. Portal era o professor responsável pro treinar os jovens como uma equipe (formações defensivas, ofensivas, trabalho em equipe e proteção de civis). A sala na qual eles estavam é chamada “Arena”, que, além de ser enorme, é equipada com o melhor e mais bem conceituado equipamento de reprodução holográfica que o dinheiro pode pagar, uma tecnologia não usada fora dos laboratórios mais avançados. Por sorte, nenhuma dessas barreiras mundanas fazem frente ao poder aquisitivo dos homens e mulheres mais poderosos de Porto Real, com o auxílio do governo. Escudo sai da mesma porta de que Atalanta veio, e com um rápido movimento de pés, se esquiva de um homem,
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exatamente igual aos quatro que Aquiles e Psy haviam derrubados, mas, assim com os outros, com uma roupa diferente. O homem tropeça para frente, mas ainda fica de frente para o jovem criador de campos de força, e quando ele vai atacar, a porta que Atalanta, Escudo e Vulto haviam passado, se abre de novo, mas dessa vez era Valquíria que se juntava aos outros na simulação. - Aaarrgghh! – ruge o homem com a faca na mão, para a jovem loira. - Aarrrggrreehhh – ruge Valquíria de volta, ironicamente. A menina alta e loira, cria um martelo de luz, e acerta o homem, que cai para traz, apagado. - Agora que já estão todos juntos, por favor, derrubem esses robôs sem usar força letal. – diz Portal pelos alto falantes que ecoava por toda a simulação. – Isso vale principalmente para, Aquiles, Psy e Valquiria. - Você quem manda. – diz Murilo, que parte pra cima de dois homens que estão mais próximos. - Vamos fazer isso direito. – diz Rodolfo pensando em um plano. O lugar todo parecia o cenário de uma rua principal pós manifestação: fachadas de prédios mais baixos e muros com pichações de gangues, sobrepostas por outras pichações com pedidos de impeachment e palavras de ordem. No chão, diversos flyers de divulgação de algum partido político ou candidato em especifico, alguns rasgados outros chamuscados. Alguns carros pegam fogo deixando uma longa faixa de fumaça cinza cortando o céu holográfico. – Aahh! Que se dane. É só bater pra apagar esses caras. - É assim que se falar. – diz Vulto, passando por Escudo em alta velocidade. O velocista, usando seus poderes, consegue desferir um soco em cada um dos três homens que estavam a sua frente, porém por ser pequeno e esguio, cada golpe não causa mais do que um pequeno desconforto em cada um dos homens. Isso força Vulto a focar mais tempo em cada um dos alvos. O jovem se aproxima do homem mais próximo e acerta outro soco em sua face, porém usa sua velocidade para ir para as costas do mesmo, acertando outro soco na nuca do homem, que por sua vez, tenta dar um soco rodado para trás, que
acertar apenas o vazio, já que Vulto mais uma vez se esquiva e vai para as costas do homem, para assim acertar um chute com a sola do pé na parte de traz do joelho do seu ofensor. O homem grita de dor enquanto vai de joelhos no chão, mas seus gritos são silenciados quando o jovem velocista acerta uma joelhada no rosto do homem, fazendo-o cair para trás. Agora ele ainda tinha, no mínimo, dois inimigos para abater. Enquanto isso, Atalanta e Psy lutava lado a lado, as duas tinha poderes que pouco seriam de adianto em uma luta contra indivíduos sem poderes ou habilidades especiais, já que causariam muitos danos de uma forma quase letal, então as duas, juntas lutam com as próprias mãos contra os homens negros e carecas com facas nas mãos. Um homem segue em direção a Atalanta, que com um rolamento rápido para a direita, deixa a perna para trás fazendo com que o homem tropeçasse e caísse com o rosto no chão de cimento. Psy por sua vez, vê que um homem tinha na direção de Atalanta e grita: - ATRAS DE VOCÊ! A jovem se vira e vê o metal quase já em seu rosto, ela consegue desviar para sua esquerda, deixando a faca passar do lado de seu rosto, porém o homem usando a parte de trás de sua mão, acerta o rosto da jovem, deixando uma pequena gota de sangue escorrer pelo canto de sua boa. - Bateeerr! – diz o homem. Quando ele se dirigia para chutar Atalanta, um outro homem aparece, porém esse parece estar voando. Esse último homem foi jogado por Aquiles, que ao ver a irmã em perigo, quis ajudar. O homem acerta o inimigo que acabara de acertar Atalanta e os dois vão para longe. Os dois irmãos de entreolham e acenam rapidamente com a cabeça. Psy já não tem a sorte de ser protegida por alguém, um dos homens acertar um chute frontal contra a costela da jovem telepata, fazendo a urrar de dor e cambalear para trás. Porém um outro homem a segura pelas costas, enrolando seus braços pela cintura da jovem e levantando-a. O homem que havia a acertado com o chute frontal, segue em sua direção com a faca em mãos. “Tem que ser muito idiota para não usar os poderes em uma situação dessas”, pensa a telepata enquanto se via naquela difícil situação. Ela logo usa seus
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poderes telepáticos para atordoar o homem a sua frente, o que ela não havia levado em consideração é que todos aqueles homens eram robôs equipados de hologramas para ficarem com a aparecia de um humano. Psy estava indefesa e não parecia que ninguém a ajudaria. Por sorte ela estava errada. Um vulto negro acerta o homem que caminhava na direção de Psy, jogando-o para longe. O volto em questão era Aquiles, que batendo o ombro no peito do robô-holograma, havia nocauteando-o. A jovem telepata, por sua vez se sentia mais motivada a se desvencilhar do homem que a segurava, assim, ele usa seu peso para fazer com que o homem coloque-a novamente no chão, uma vez feito isso, a jovem dá um passa para frente, fazendo com que uma pequena distância fique entre os dois, dando espaço para que ela de uma cotovelada no rosto do homem que a agarra, uma cotovelada forte o suficiente para que ele perca o equilíbrio e solte-a. - Obrigado. – diz Psy para seu salvador. Porém Aquiles parece não ouvir e parte para outro homem que se aproximava. Ele pula sobre o mesmo, acertando um Superman Punch no rosto do inimigo, derrubando-o na mesmo hora. - De nada... – diz o rastafári baixo demais para Psy ouvir. O homem que havia agarrado Psy ainda estava em seu encalço, a jovem telepata, dessa vez consegue desviar de um chute frontal, e com extremo esforço consegue acertar um soco com o punho direito no rosto do homem, que parece não sentir muito, pois logo em seguida, ele desfere um soco contra o rosto da jovem, que a acerta com força total, jogando-a para trás. - Bateer! – diz o homem. - Alguém tem que programar melhor vocês, hein, meu filho? – dizendo isso, Psy usa mais uma vez seus poderes, e consegue jogar o homem para trás, porém dessa vez, a jovem conseguiu se controlar, jogando-o de forma mais amena, apenas para que ele ficasse desacordado. O homem, por coincidência, cai perto de Escudo, que se via com sérios problemas para lidar com os quatro homens que iam para cima dele. - Calmas aew, galera. – diz o jovem – Podemos
resolver isso de outra forma. - Bateer! – dizem os quatro homens ao mesmo tempo. - Parece que não vai rolar. O primeiro homem avança contra Escudo, dando-lhe uma estocada, porém o jovem consegue desviar e acertar um soco contra o rosto do homem, que cambaleia para trás. Outro homem já investia contra o criador de campos de energia, mas é impedido por uma parede de energia que acerta-o, arremessando-o para trás. - Muito bem Escudo, soube utilizar seu novo poder. – diz uma outra voz pelos autofalantes. Porém o jovem ainda estava em perigo, ele ainda tinha três inimigos para se preocupar. Os dois homens que ainda não tinha atacados avançam juntos, dando, ao mesmo tempo, estacadas visando acertar a barriga de Escudo, que por sua vez, conseguiu criar um escudo de forca, para impedir que fosse acertado. Quando o jovem desmaterializa o escudo, ele torce a mão dos homens, quase que fazendo um nó com o braço dos dois inimigos e acertar um soco no rosto de cada um dos dois, para logo depois criar outra parede de energia e lançar os dois para longe. Quando o homem que havia o atacado primeiro, um homem acerta-o e os dois se enroscam caídos no chão. O homem tinha sido arremessado por Valquíria, que parecia estar se divertindo com tudo aquilo. A jovem loira se movia graciosamente, usando seus construtos de energia luminosa para acertar cada um dos homens sem dificuldade, lançando-os para longe sem nenhuma preocupação, enquanto cantava uma música triste sobre filhotes de patos que haviam ido passear e, um de cada vez, sumiam nas montanhas. Aquiles por outro lado, lutava com garra e ia derrubando cada um de seus inimigos como se fossem apenas pesos de papel, porém ele não parecia ver graça nisso, o rastafári sempre gostou de uma boa briga, mas diferente de Valquíria, ele nunca deixa isso a mostra. O último robô-holograma é derrotado e todos se reúnem no centro da simulação. - E ENTÃO? TEM MAIS ALGUMA COISA? – grita Valquíria. É nesse momento que os prédios que compõem a
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simulação começam a sumir, os homens com os quais os jovens estravam lutando instantes antes, começam a perder a aparência humana, e pode se ver a estrutura metálica que forma o corpo dos mesmos. Pela porta principal, pode se ver duas figuras andando juntas. Uma delas é Hugo, que anda enquanto bate palmas. - Parabéns, garotos! O treinamento de vocês mostra cada vez mais frutos, vejo que Portal fez um ótimo trabalho com vocês em relação a trabalho em equipe. Parece que estão prontos pra missão de hoje. - Por que você não para de embromação e fala logo qual é a nossa missão hoje à noite? – diz Rodolfo impaciente. - Tudo bem. Por favor, Adriana, me entregue as pastas. – Hugo diz se dirigindo a mulher que o acompanhava, depois de pegar seis pastas, ele entrega-as aos jovens do GATH – Aqui estão plantas e fotos do lugar, apesar de você já terem uma pequena lembrança do lugar. - Pera ai. – diz Renata – Esse aqui é o Palácio Real. - Sim, eu lembro. – diz Valquíria – Foi lá que a gente se apresentou. Que legal! – diz a jovem entre risos. - O que a gente vai fazer lá? – pergunta Thais. - Vocês vão fazer a segurança do prefeito. Ele está sob algumas ameaças e pode acontecer de algum grupo criminoso tentar acabar com ele hoje, então quero vocês lá para ajudar na segurança do lugar. - Por que vocês não colocam a polícia pra isso? – pergunta Rodolfo. - Você está no Brasil, mas especificamente em Porto Real. – diz Hugo, irônico – A maioria dos policiais dessa cidade venderia a mãe por dinheiro, ninguém confia que eles possam fazer a segurança de alguém e não se sujeitarem a vender a pessoa. – o magnata se vira de costas e começa a se distanciar, com sua assistente – Depois eu conto todos os detalhes, quero todos prontos às vinte horas em ponto. E estudem bem essas plantas, vocês vão ter que saber tudo sobre aquele lugar. - Pelo menos vai ter bebida de graça. – diz Vulto. - Têm bebida de graça mas isso é sério. – diz um homem negro, com cabelos rastafári saindo de um portal, acompanhado de outro homem, este branco e com um curto
cabelo loiro – Vocês têm trabalho muito bem juntos, mas não se esqueçam que ainda não são perfeitos. - Iiihh, qual foi? – diz Valquíria fazendo uma espécie de dança da vitória – Nós somos sinistros!! - Concordo contigo. – diz Vulto, que estando a alguns metros da jovem loira, usa sua super velocidade e aparece do lado dela, com a mão esquerda levantada – Bate ai! Ela faz o que Vulto pede. - Não é muito por ai não. – diz Portal, o homem loiro – Vocês têm muito o que aprender ainda. Valquíria poderia ter dado algum tipo de assistência enquanto Psy estava sendo encurralada pelos dois homens, por não ter à ajudado, Aquiles teve que se realocar para ajudá-la. A mesma coisa com você, Vulto, enquanto Escudo estava com quatro inimigos a sua frente, você estava brincando com um dos robôs. - Eu vi isso... – diz Atalanta. - Enfim, vocês precisam se concentrar pra missão de hoje, a último lugar que os poderes de vocês podem falhar ou sair de controle, é junto dos figurões da cidade. Além de poder matar alguém que não fez nada de errado, eles ainda podem cortar nossa verba só de SACANAGEM. – diz o homem negro. - Eu não vou dar esse mole, Falange. – diz Psy. - Então vamos... – responde Falange – Tenho algumas liçõezinhas pra ajudar vocês a controlarem seus poderes hoje.
Porto Real, General Bormann, Rua Camarista, 20 de janeiro de 2015 14h21min Com a visão turva, o teto parece se movimentar, os olhos parecem arder a cada vez que Mauricio pisca, e seu corpo parece mais pesado do que nunca. - Merda... – diz o ex-policial quase sem voz. Mesmo se sentindo fraco, o homem tenta se levantar, porém seu ombro esquerdo começa a latejar quando ele tenta. Ao olhar para o lado, ele percebe que está na sala, a televisão está ligada, e o sol raia do lado de fora da janela da sala.
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- Merda... – diz ele, agora com um pouco mais de firmeza. Do lado direito da janela, um balcão divide a sala da cozinha, nesse balcão está uma jovem sentada, ruiva e pele clara. Ela está sentada em cima do balcão, mexendo em um tablet e fumando um cigarro. - Merda... – diz Mauricio, parecendo bem melhor. - Para de falar “merda”. – diz a jovem – Parece que a sua boca é um cu, saca? Mauricio tenta se levantar mais uma vez, dessa vez é mais fácil, e ele consegue se colocar sentado. - O que você está fazendo aqui? – diz ele de forma rude, enquanto se mantem sentado. - Nossa. Nem um “obrigado por salvar minha vida”. – responde a jovem. - Eu conseguiria me virar sozinho. - Me poupe, né? Você mal conseguia ficar de pé. Você pode ser durão e não querer admitir, mas sabia que EU salvei a sua vida. Conviva com isso. - Depois de tudo o que eu já vivi, aceitar que uma garotinha de quinze anos salvou minha via é o de menos. - EU TENHO DEZESSETE. – grita a jovem ruiva. - Você me salvou só pra me matar depois? – responde Mauricio tampando os ouvidos com as mãos – Fala mais baixo, por favor. - Desculpa. – diz a menina enquanto desce de cima do balcão. Depois de deixar o tablet em cima do mesmo, e apagar o cigarro em um cinzeiro que também estava no balcão e com uma camiseta larga, de um time americano de basquete, e um short jeans com as pontas desfiadas, ela vai até o homem que havia ajudado na noite anterior. – Me deixa trocar esse curativo. - Tudo bem. – diz Mauricio se apoiando nas costas do sofá, enquanto a jovem se aproxima e começa a puxar os esparadrapos que prendiam a gaze ao corpo dele. – E então? Eu posso saber o nome da minha salvadora? - Agora eu sou sua “salvadora”, é? – responde a jovem, antes de dar um sorriso irônico para o Mauricio. – Meu nome é Alexandra, mas meus amigos me chamam de Alex. – ela faz uma careta quando vê o ferimento no ombro
do ex-policial. - E então, Alex? Como você sabe alguma coisa sob... – Murilo começa a falar mais é interrompido. - Não me chame de “Alex”. Nós não somos amigos ainda. - Hum... Justo. – diz o ex-policial dando de ombros. – Voltando: Como você sabe como fazer um curativo? - Eu faço segundo grau técnico de enfermagem. Posso não conseguir fazer um transplante de órgãos, mas sei fazer um curativo... – depois de uma pausa, ela continua. – ...Ou tirar uma bala do ombro de um cara que eu nunca vi na minha vida. - Nossa, quer uma medalha pela sua ironia? - Não preciso de medalha... – diz Alexandra, enquanto coloca algum tipo de liquido em uma gaze que estava em sua mão – Eu tenho algo melhor pra me recompensar: isso. Depois de dizer, a jovem encosta a gaze molhada por cima do ferimento, arrancando um grito de dor de Mauricio. - Gritos de dor massageiam meu ego, sabe? – diz a jovem. - Entendi seu ponto de vista. – diz o ex-policial. - Segura isso no lugar. – diz a jovem apontando para a gaze e, depois de Mauricio segurar, ela pega um rolo de esparadrapo, corta e alguns pedaços e prende a mão dela. Em seguida ela usa os pedaços de esparadrapo para colar o novo curativo no lugar – Sabe que isso vai pra sua coleção de cicatrizes a tatuagens né? - Imaginei. – diz Mauricio olhando para seu torço, tentando contar as cicatrizes que possuía, porém muitas eram cobertas pelas tatuagens que tinha colecionado com a mesma proporção. – Acredito que agora você queira saber meu nome, certo? - Não, minha vó já tinha falado de você. – responde a jovem, indo até a bancada e ascendendo outro cigarro. - Agora que eu lembrei, você é neta da Dona Silva. – diz Mauricio se levantando. - Sim. Eu vim morar com a ela no ano passado. É que a casa dela fica mais perto do meu colégio. - Intendi. – diz Mauricio pegando um dos cigarros do maço que estava em cima do balcão e acendendo-o. Ele dá
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uma longa tragada e solta a fumaça, depois sente um cheiro estranho e pergunta: - Isso é café? - O que? – pergunta ela já sentada no balcão novamente. – Ah! Sim. Eu fiz café pra mim. Você gosta? O ex-policial vai até a cafeteira sem dizer uma palavra, a jovem desce novamente do balcão e vai até a mesa da sala, aonde estava sua mochila. - Bem... Tá dando minha hora, daqui a pouco minha vó vai começar a me ligar e ela acha que eu fui pro colégio hoje. - Ué, mas ela não vai estranhar que você tá vestida assim? – diz Mauricio. - Que nada. Eu estudo em um colégio maneiro. Não tem uniforme lá. – responde a jovem olhando pelo olho mágico da porta. - Então espera ai. – diz o homem indo até o envelope que estava no casaco que tinha usado na noite anterior. – Pelo menos fica com um dinheiro. Você gastou um monte de coisas comigo hoje e tenho que te agradecer pelo o que você fez por mim. - Fica tranquilo, não preciso disso. - Como não. Pega esse dinheiro. - Já disse que, porra. - Claro que você precisa. - Preciso não. – diz a jovem abrindo a porta. Ela olha para o lado onde fica o elevador e antes de sair diz: - Eu já fiz isso.