JOÃO FRANCISCO COSSA
CONSIDERAÇÕES SOBRE CASOS ESPECIAIS NO DIREITO MILITAR: CASAL DE MILITARES E A POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA LEI N° 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006, LEI MARIA DA PENHA
LONDRINA - PARANÁ 2018
JOÃO FRANCISCO COSSA
CONSIDERAÇÕES SOBRE CASOS ESPECIAIS NO DIREITO MILITAR: CASAL DE MILITARES E A POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA LEI N° 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006, LEI MARIA DA PENHA
Trabalho apresentado à disciplina de Direito Penal – legislação Especial, do Curso de Bacharelado em Direito, turma 3000, da Universidade Estadual de Londrina, como requisito avaliativo. Professor: Mes. Carlos Jose Cogo Milanez.
LONDRINA - PARANÁ 2018
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CONSIDERAÇÕES
SOBRE
MILITAR:
DE
CASAL
CASOS
MILITARES
ESPECIAIS E
A
NO
DIREITO
POSSIBILIDADE
DE
APLICAÇÃO DA LEI N° 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006, LEI MARIA DA PENHA Este texto trará alguma considerações acerca do direito penal militar relativo a casais militares, dado a promulgação da lei nº 11.340/06. Primeiramente, abordarse-á a organização da justiça militar, sua origem, funciomanento e organização. Sequencialmente, trará os atrasos legislativos que afetam a legislação militar, da qual a lei nº 11.340/06 é mais uma delas. E, por último, analisar-se-á a lacuna jurídica quanto a aplicação ou não das medidas protetivas e decorrências de competência e matéria. Inicialmente, os militares do exército, da política militar e os bombeiros militares em determinados crimes, relativos ou não a sua atuação, são regidos por uma legislação específica, a saber: o Código Penal Militar e o Código Processual Militar. Ademais, podem também incorrer na previsão deste direito civis. Além disso, são também julgados e contemplados criminalmente por uma justiça específica que é a Justiça Militar, e, por sua vez, possui instâncias estaduais e federais, de igual modo, os Tribunais de Justiça Militar, para alguns estados, funciona como segunda instância da Justiça Militar Estadual, e, nos Estados, em que não existe o T.J.M essa competência é exercida por uma Câmara Especializada do Tribunal de Justiça. Ainda, contando como segundo grau relativo aos militares federais ou terceiro grau recursal para os estaduais tem-se o Superior Tribunal Militar. Cabe ressaltar que ao STF apenas cabe questões de questões constitucionais. Este contexto se deve ao fato da instituição militar ter se constituído pela vinda da família Real representada pela organização de um corpo militar uniformizado voltado para a defesa da família real, e futuramente do Brasil independente. Dessa forma, os militares passaram ser regidos por regulamentos próprios, assim como acorria em Portugal, especificamente aplicados a estes, que possui suas particulares e se encontra assentada em dois princípios fundamentais, a hierarquia e a disciplina. Ademais, ressalta-se na história do Brasil um constante tratamento privilegiado em relação dos militares, propiciando certas discrepância e que permanecem ainda no sistema legal.
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[...] a brutal diferença da sanção penal prevista para os delitos de porte e tráfico de drogas na Lei de Droga (Lei nº 11.343/06), respectivamente, penas restritivas de direito (advertência, prestação de serviços e comparecimento a programa/curso educativo) e pena privativa de liberdade (reclusão de 05 a 15 anos), em contraponto ao preceito sancionador do artigo 290 do CPM (tipo alternativo que engloba o porte e o tráfico), que prevê a imposição de reclusão de 01 a 05 anos. (NETO, 2002, p. 4).
A existência das instituições militares, sejam elas pertencentes às Forças Armadas ou às Forças Auxiliares, é essencial para a manutenção do Estado, contudo estas diferenças devem ser vistas atualmente a partir dos princípios constitucionais, como o princípio da isonomia, e também uma necessidade de um combate da corrupção e da criminalidade que atinge as instituições militares, cabendo, outrora, penas mais severas para aqueles que na sua atuação desvirtuam do fim de segurança e proteção da sociedade, caso mais evidenciado na formação das milícias, de forma mais pontual no Rio de Janeiro. Assim é importante rememorar a noção mais específica de crime militar, pois esta perspassa toda a noção de proteção aos direitos e deveres relativos às pessoas que estão revestidas do caráter militar. Dessa maneira crime militar segundo as lições de Célio Lobão: o grupo específico dos crimes propriamente militares é constituído por infrações que prejudicam os alicerces básicos e específicos da ordem e disciplina militar, que esquecem e apagam, com o seu implemento um conjunto de obrigações e deveres específicos do militar, que só como tal pode infringir (apud NETO, 2002, p. 7).
Contudo, civis também são passíveis do cometimento de crimes previsto na legislação militar. Por isso, os crimes devem ser materialmente relativos ao direito penal militar e não apenas cometidos por militares. Para isso, deve inicialmente, fazse necessário que o fato a fim de que seja enquadrado como crime militar é esteja tipificado na Parte Especial do Código Penal. Seguidamento, passa-se à análise da Parte Geral, no qual o art. 9º, em seus incisos, deve se subsumir no fato. Finalmente, verifica-se se o sujeito ativo pode cometer o delito militar na esfera em que se aplica o CPM, o que excluirá o crime praticado por adolescente, ressalvada a previsão do art. 50 e 51 do mesmo código, e, somente no âmbito estadual, o delito praticado por civis.
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Seguidamente, o Direito Militar, no que tange ao seus diplomas normativos como o Código Penal Militar e o Código de Processo Criminal Militar, carece de grandes atualizações normativas, advinda de certo interesse legislativo, decorrendo determinados prejuízos, como supracitado e revelam certa discrepâncias entre as previsões comuns e as militares. Ressalva-se apenas alterações pontuais modificações pelas Leis nº 6.544/78, 9.299/96 e 9.764/98, que passam bem distantes das intensas modificações que vem sofrendo o Código Penal, principalmente em face da edição do Estatuto do Idoso e da Lei Maria da Penha. Estas carências, mais especificamente no que diz respeito a militares casados, será melhor perscrutado neste trabalho. Pelas razões anteriormente mencionadas, sabe-se que cada vez é maior o número de mulheres ingressantes nas Forças Armadas, Polícias Militares e Corpo de bombeiros militares, aumenta-se igualmente as mulheres nos mais altos postos da hierarquia militar, com cargos de comando e chefia, rompendo noções machistas e tradicionais muito presentes ainda na cultura militar; e, de igual forma, o casamento entre militares é muito comum, e não há nada de reprovável em tal prática, apenas, restando a exigência dde comportamento adequados durante o serviço, e, de igual forma, certos preceitos éticos são esperados de tais pessoas. Sequencialmente, os regulamentos não adentram comportamento no âmbito familiar e isto está amplamente de acordo com as garantias constitucionais. Contudo, a violência doméstica é um prática muito comum na sociedade brasileira, embora, haja um grande reprobalidade por parte da sociedade em torno de tal. Não diferente disso, vê-se comumente a violência doméstica entre casal militares, o que torna a questão um pouco mais complexa. Com o advendo da Lei nº 11.340/06, conhecida por Lei “Maria da Penha”, houve
um
enrijecimento
das
punições
relativos
às
violências
doméstica,
especialmente, buscando protejer a vulnerabilidade das pessoas envolvidas, destarte, houve a conceituação e as formas pelas quais essa violência pode ser perpetrada, alterando normas penais e processuais penais e criando Juizado Especial especificamente para este fim. Contudo, a mesma lei não contemplou tal previsão nos casos militares, ocasionando uma lacuna e repercutindo diretamente em um possível antinomia jurídica, um conflito jurídico. O dilema jurídico de aplicação ou não da Lei “Maria da penha” torna-se um tanto espinhosa por justamente não ter repercutido no direito penal militar, neste
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esteio, a própria legislação militar, com a competência própria, prevê que em caso de um casal de militares em conflito, restando um agressão ao outro, é por sua essência um crime militar, com base no contido no art. 9 inc.II alínea a, o qual prevê: “Art. 9° CPM: Consideram-se crimes militares, em tempo de paz: II os crimes previstos neste Código, embora também o sejam com igual definição na lei penal comum, quando praticados: a) por militar em situação de atividade ou assemelhado, contra militar na mesma situação ou assemelhado;”
Decorre da compreensão do dispositivo acima que em caso de uma violência de um militar contra o outro a matéria diz respeito propriamente ao que se aplica ao direito penal militar, tendo natureza de ação pública incondicionada, quase que em regra, e promovida pelo Ministério Público Militar. Dado esta condição, não é pacífico a solução para o conflito, pois de um lado existem juristas defendem a inaplicabilidade da Lei Maria da Penha e por sua vez a aplicação do Código Penal Militar, por lesão ou mesmo ameaça; e do outro lado, juristas defendendo a insconstitucionalidade do artigo 9 do CPM e consequentemente a aplicação da Lei Maria da Penha. O primeiro grupo, a partir da Leitura do Artido 9, CPM, havendo agressão (lesão corporal) entre militares casado caberia ao Comandante, para não prevaricar, a obrigação de instaurar um inquérito policial militar (IPM). Observando que a partir da representação o delito já estaria sendo apurado pela Autoridade Policial. O mesmo poderia acontecer em caso de ameaça. O segundo grupo, se fundamentam no princípio da isonomia material e asseguram a possibilidade da aplicação da Lei Maria da Penha, pois as violência domésticas, mesma no caso de militares, não decorrem da condição de militares e nem são elementares dos tipos penais abordados. Neste sentido, enuncia-se um precedente jurisprudencial, no qual faz vislumbrar a possibilidade da aplicação da Lei Maria da Penha: Ementa - Recurso Criminal nº 1989.01.005859-7 - STM Crime praticado por militar em residência localizada em prédio sob administração Militar. Iincompetência da Justiça Militar. Local sujeito a administração militar não inclui o interior do apartamento onde reside o militar com sua família, em face do preceito constitucional que assegura a inviolabilidade do lar - art. quinto, XV da Constituição. II- Desavenças conjugais terminando em agressões físicas do marido
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(Oficial) a esposa não descaracterizam o lar como bem particularmente tutelado pela Constituição Federal. III- Conflito negativo de competência entre Tribunal Superior e Juiz Federal. Remessa dos autos ao Excelso Pretório em razão do art. 27 parágrafo primeiro das Disposições Transitórias da Constituição Federal em vigor, combinado com o art. 119, inciso I letra 'e', da Carta de 1967. IV- Decisão unânime.
Na mesma direção, se a ocorrência do fato diz respeito a vida comum do casal, permanecendo no âmbito da vida conjugal ou de companheiros, apartados da disciplina e na hierarquia militar, consequentemente, a jurisdição comum prevalecerá. Isto conforme decisão do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual a administração militar “não interfere na privacidade do lar conjugal, máxime no relacionamento do casal’. Por tudo isso, será uma questão a ser analisado no caso concreto, mas sobremaneira nestas características serão aplicadas a jurisdição comum, como a Lei Maria da Penha, inclusive com a devidas medidas protetivas. Contudo, deve-se ponderar, ao mesmo tempo que muitas vezes é difícil diferenciar
a
vida
social
da
particular,
ocasionando
um
entrelaçamento,
principalmente nos caso em que há agressão existe uma grande possibilidade de decorrer uma situação administrativa militar, pelo fato da mulher aparecer com lesões aparentes ou a ocorrência comumente serem atendidas por Policiais Militares. E quando, entre o casal militar os crimes envolver a hierarquia e a disciplina,e ocorrer no pleno exercício desta hierarquia, sendo durante serviço dos militares ou em local sujeito à administração militar e com cunho profissional deve-se aplicar a jurisdição militar, devendo-se aplicar o CPM e julgado pela Justiça Militar. Caso este visto neste julgado: HABEAS CORPUS N° 125.836/SP - Supremo Tribunal Federal. Apelação da Defesa. Crime de Ameaça. Preliminar. Incompetência. Provas. Depoimentos. Documentos. Vítima. Intimidação. Independentemente da circunstância ou do lugar do crime, da condição de serviço ou de qualquer outra, se autor e vítima forem militares da ativa, o delito será militar, conforme estabelece o art. 9º, inciso II, alínea "a", do CPM. Ademais, apesar da alegação Defensiva no sentido de que os acontecimentos se deram no âmbito familiar e até mesmo na intimidade do casal, eles também tiveram desdobramentos na Caserna, uma vez que os fatos geradores da condenação ocorreram quando a Ofendida estava de serviço na OM e na presença de outros militares, o que inevitavelmente atrai a competência desta Justiça especializada para o julgamento do feito. Na hipótese, o delito de ameaça encontra-se delineado e provado, não só por força dos depoimentos neles constantes, como também
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em razão das provas documentais anexadas. Para a configuração do tipo em tela, cujo núcleo constitui o verbo "ameaçar", é necessário, ainda, que a vítima se sinta intimidada e atemorizada a ponto de ter sua liberdade psíquica violada. Também esse requisito restou mais do que evidente no processo. Rejeição da Preliminar. Desprovimento do Apelo da Defesa. Unânime(...) Independentemente da circunstância ou do lugar do crime, da condição de serviço ou de qualquer outra, se autor e vítima forem militares da ativa, o delito será militar, conforme estabelece o art. 92 inciso II, alínea "a", do CPM. Ademais, apesar da alegação Defensiva no sentido de que os acontecimentos se deram no âmbito familiar e até mesmo na intimidade do casal, 11 eles também tiveram desdobramentos na Caserna, uma vez que os fatos geradores da condenação ocorreram quando a Ofendida estava de serviço na OM e na presença de outros militares, o que inevitavelmente atrai a competência desta Justiça especializada para o julgamento do feito. Na hipótese, o delito de ameaça encontra-se delineado e provado, não só por força dos depoimentos neles constantes, como também em razão das provas documentais anexadas. Para a configuração do tipo em tela, cujo núcleo constitui o verbo "ameaçar", é necessário, ainda, que a vítima se sinta intimidada e atemorizada a ponto de ter sua liberdade psíquica violada. Também esse requisito restou mais do que evidente no processo .
Em conformidade, com o julgado acima e suas decorrências, quando o crime doméstico tiver repercussão militar será considerado de jurisdição militar, caso seja violências como abusos, ameaças, ofensas e violência psicológica, no qual a organização militar não tiver ciência, caberá uma representação do ofendido na justiça comum. Mas, mesmo neste exame poderá o julgador da justiça militar bservar os institutos protetivos da “Lei Maria da Penha”. Isto verifica-se na atuação do Corregedor Geral da Justiça Militar do Estado de São Paulo, fundamentou a aplicação da Lei 11.113, de 13 de maio de 2005, a qual alterou a redação do artigo 304 do Código de Processo Penal. Semelhante modificação, visando harmonizar o ordenamento jurídico, deu provimento nº 002/05-CG da Justiça Militar do Estado de São Paulo, expendido uma “orientação normativa” para o Auto de Prisão em Flagrante Delito. Por fim, não havendo um pleno consenso acerca do tema e não havendo um pronunciamento no STF ou uma pacificação jurídica, resta a compreensão da competência da Justiça Militar para os caso de agressão doméstica entre militares casados, cabendo, outrossim, a possibilidade da aplicação das medidas protetivas previstas na Lei nº 11.340/06, podendo ofender a princípio da isonomia. Contudo, apenas nos casos em que a violência doméstica é silenciosa para a organização militar, cabe a representação do ofendido perante a justiça comum.
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REFERÊNCIAS JESUS FILHO, Felisberto Cerqueira de. Militares casados entre si e os Delitos Penais. Rio de Janeiro, 2005. Diponível em: < http://jusmilitaris.com.br/sistema/ arquivos/doutrinas/militarescasados.pdf>. Acesso em: 19 mai. 2018. KOBAL, Fernando Rodrigues. Direito militar e a lei 11.340, de 07 de agosto de 2006, denominada “Maria da Penha”. Monografia da Pós-Graduação no Curso Direito Militar, Universidade Cruzeiro do Sul – UNICSUL. SÃO PAULO, 2008. Disponível em:<http://jusmilitaris.com.br/sistema/arquivos/doutrinas/direitomilitaremariadapenha .pdf> . Acesso em: 19 mai. 2018. NETO, Benevides Fernandes. Crime militar e suas interpretações doutrinárias e jurisprudenciais.
2008.
Disponível
em:<
http://jusmilitaris.
com.br/sistema/
arquivos/doutrinas/crimemilitarinterpr.pdf>. Acesso em: 19 mai. 2018. ROSA, Paulo Tadeu Rodrigues. Organização da Justiça Militar. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 35, 1 out. 1999. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/1569>. Acesso em: 19 mai. 2018. SCHELBAUER, Jefferson Philipe Claro. Antinomia entre o direito penal militar e a lei n° 11.340, de 7 de agosto de 2006, lei maria da penha, para casal de militares.
Curitiba,
2014.
Diponível
em:
http://tcconline.utp.br/media/tcc/2015/12/ANTINOMIA-ENTRE-O-DIREITO-PENALMILITAR-E-A-LEI-N%C2%B0-11.340.pdf>. Acesso em: 19 mai. 2018.
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