Desenho de embarcações de recreio

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SÉRGIO MELO

DESENHO DE EMBARCAÇÕES DE RECREIO


SÉRGIO MELO

DESENHO DE EMBARCAÇÕES DE RECREIO

Uma terapia de substituição para arquitectos ressabiados e uma aventura intelectual para designers sem horizontes.

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ÍNDICE I.

Introdução.

II.

Plano geométrico. Linhas e coordenadas.

III.

Volume submerso e deslocamento. Centro de flutuação e centro de gravidade. Imersão e caimento.

IV.

Metacentro, altura metacêntrica e raio metacêntrico. Momento endireitante e momento inclinante. Relações e coeficientes comparativos. Constantes de forma.

V.

Resistência das querenas. Atrito e formação de ondas. Resistências parasitas. Estabilidade.

VI.

Embarcações a motor. Embarcações de deslocamento, planantes e semi-planantes.

VII.

Embarcações à vela. Tipos tradicionais e modernos de velame. Evolução da forma dos cascos, das quilhas e dos patilhões.

VIII.

Sistemas de propulsão mecânica. Motores, caixas redutoras e de inversão. Hélices. Lemes e outros dispositivos direccionais

IX.

Construção de embarcações. Materiais: plásticos reforçados com fibras, madeira, ligas de alumínio e aço. Sistemas de cálculo de estruturas. Mastros, cabos e velas. Análise e cálculo dimensional.

X.

Bibliografia.

XI.

Exemplos. Nota – As figuras de apoio ao texto tem numeração própria e encontram-se agrupadas no final dos capítulos a que dizem respeito. As que constituem os exemplos finais são apresentadas a seguir aos respectivos elementos escritos, em sequência lógica, sem numeração. As escalas indicadas nas figuras referem-se aos desenhos originais, cujas dimensões foram alteradas com o processo de reprodução, pelo que não devem ser consideradas.

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I. INTRODUÇÃO Para além das razões mais óbvias e mais interessantes que podem levar um arquitecto a escrever um livro sobre o desenho de embarcações está aquela que é referida no título. No meu caso trata-se de uma espécie de medicina para curar a ferida que resulta do facto de sempre ter desejado fazer projectos de edifícios e, por razões que não posso detalhar aqui, nunca ter podido realizar esse desiderato em quantidade e qualidade que satisfizessem esta minha necessidade intrínseca. Dá-se o caso de que, por motivos decorrentes da minha própria vida e, em certa medida, da história recente do nosso país, comecei tudo muito tarde. E embora este tipo de condicionamentos não tenha prejudicado outros colegas em situação idêntica, comigo as coisas não correram bem. Encontro-me, agora, no ocaso da vida e acredito que posso redimir-me de ter sido levado a fazer tantas coisas desagradáveis, se conseguir chegar ao fim desta pesada empreitada que me propus executar mas que, apesar do esforço exigido, não deixa de constituir um verdadeiro prazer nos momentos mais empolgantes. Por outro lado, a inclinação para desenhar estes artefactos que se deslocam na interface de dois fluidos, a água e o ar, é dificilmente explicável. Poderia adiantar alguns motivos, mais por racionalização posterior do que para explicar a sua verdadeira génese, à maneira como os arquitectos arranjam desculpas e aduzem razões programáticas para decisões de desenho que não conseguem explicar e cuja objectividade deixa muito a desejar. Basta ler as memórias descritivas e “justificativas” que acompanham os projectos de edifícios e os planos de urbanização para se compreender o que acabo de dizer. Admito, contudo, que quem tem o mesmo género de compulsões está pouco ou nada interessado na psicanálise da sua paixão. Uma coisa pode, desde já, assumir-se como certa, a saber: um barco, contrariamente a um edifício, é um artefacto que não precisa de um lote para ser implantado, é algo que é concebido para se deslocar graciosamente sobre a água, embora a observação continuada dos nossos portos de recreio nos possa suscitar algumas dúvidas sobre a autenticidade desta asserção. É que na sociedade afluente em que temos vivido, a posse destes objectos, principalmente dos mais caros, parece dever mais à caracterização do estatuto social e económico do possuidor do que, propriamente, à vontade de usar. Para situar melhor o âmbito desta obra, isto é, para definir adequadamente aquilo sobre que me proponho escrever, devo esclarecer que, por razões que me parecem evidentes, não vou falar de navios, sejam eles petroleiros, porta contentores ou coisas do mesmo jaez. Por outro conjunto de razões, mas com algum desgosto, também não falarei daquelas embarcações utilitárias tradicionais que há algumas décadas ainda sulcavam as águas do rio Tejo e de outros cursos de água navegáveis do nosso país, transportando produtos e pessoas entre as margens, ou que demandavam os abundantes pesqueiros que se situavam para lá do porto de Cascais e ao longo da costa portuguesa. É claro que ainda se Pag. 4


transportam pessoas entre as margens e se pesca fora da barra, mas os meios a que me refiro ficaram obsoletos há muito tempo, em face de novas soluções mais fiáveis e comercialmente mais interessantes para as entidades que agora exploram esses negócios e que não são as mesmas que a eles se dedicavam na época a que me referi. Procurarei ser prático, falando de embarcações de recreio, objectos que podem ser utilizados nas actividades de lazer e cuja posse e utilização inflama muitas imaginações. Por ser esse o costume, nada do que ficar dito se aplica a embarcações com o comprimento total superior a trinta metros (cerca de cem pés). Este limite tem como fundamento determinados motivos de raiz técnica e económica, mas não só. Se quisermos enquadrar regulamentarmente o conceito de embarcação de recreio, no contexto da legislação portuguesa, podemos recorrer ao artigo 2º do Decretolei nº 96/97, de 24 de Abril, que fixa o seu âmbito com maior rigor, referindo um comprimento máximo um pouco menor. Lembro, contudo, que, neste período de crise, a produção em série de barcos de recreio, pequenos e médios, se reduziu drasticamente, sendo certo que a construção de unidades de grande porte, feitas à medida da vaidade e dos desejos de exibição megalómana da fortuna dos seus proprietários, constitui um nicho industrial e comercial florescente, nos países onde esta indústria tem tradições e peso económico. Sinal dos tempos! Quando, há alguns anos, comecei a pensar em escrever este conjunto de textos estava no meu pensamento o ambicioso desejo de produzir uma obra de dimensões apreciáveis que integrasse todas as questões pertinentes que se colocam a quem quer aprender a arquitectura das pequenas embarcações de recreio e, bem assim, a concepção dos aspectos construtivos, quer no que se refere ao cálculo dos elementos estruturais, quer ao seu desenho e pormenorização. Estava também implícito o desejo de tratar, do ponto de vista de quem projecta embarcações, das matérias relacionadas com os equipamentos mecânicos, com predominância dos vários meios de propulsão e dos elementos do armamento. Tratava-se, como facilmente se percebe, de uma tarefa que não é fácil de levar a cabo por uma única pessoa! Devo lembrar neste momento que, no estado actual da indústria, são utilizados vários materiais, isolados ou em conjunto, para a execução de embarcações de recreio. A sua escolha depende de factores muito variados, desde a sua disponibilidade nas proximidades dos estaleiros, até ao programa que suporta o empreendimento, passando pelos recursos económicos que estão disponíveis e pelo conhecimento das técnicas de utilização e de fabrico. O material tradicional predominante é a madeira, cujas excepcionais características mecânicas nunca é de mais enfatizar, tanto mais que muita gente que se considera tecnicamente conhecedora tem a cabeça cheia de equívocos a este respeito. Sendo a madeira um material utilizado na construção de embarcações há milénios, a sua utilização tem vindo a sofrer profundas transformações, há algumas décadas para cá, ao ser aplicada conjuntamente com resinas plásticas e outros produtos sintéticos que a indústria agora disponibiliza. Em boa verdade, uma Pag. 5


embarcação construída com recurso às novas técnicas de utilização da madeira tem pouco a ver com aquelas cuja feitura obedeceu aos métodos clássicos, quer do ponto de vista da sua estrutura, quer da aparência, quer, ainda, das espécies vegetais e das dimensões das peças utilizadas. Não se pode ignorar que a disponibilidade de certos tipos de madeira, tendo em atenção a exploração intensiva e indiscriminada a que tem estado sujeitas as florestas onde crescem as espécies exóticas mais valiosas, é cada vez mais rara e mais cara, para já não falar das consequências ambientais de tais práticas predadoras. Entre os materiais mais comuns na fabricação de embarcações de recreio figuram várias resinas plásticas reforçadas com fibras, nomeadamente, as que são obtidas a partir do vidro e outras. Pode dizerse que são agora os materiais mais usados, apesar de a sua utilização, reciclagem e destruição apresentar problemas para o ambiente que são difíceis de resolver, no estado actual dos conhecimentos. Com maior ou menor incidência na utilização, o alumínio, o aço e algumas ligas exóticas, também integram o grupo de que estamos a falar. Voltando à execução da “empreitada” que me propus inicialmente, devo confessar que, com a periódica avaliação da eventual conveniência de difusão e venda desta obra no mercado, se foi instalando no meu espírito a preocupante sensação de que estas matérias só importam a um número muito restrito de pessoas, ao mesmo tempo que começava a ficar consciencializado da dimensão ciclópica da tarefa. Este conjunto de pensamentos negativos fez arrefecer os meus ímpetos iniciais. Depois de meditar no assunto e de chegar a admitir que o melhor seria não fazer nada, acabei por concluir que era mais razoável tentar atacar a execução desta empreitada dentro de limites compatíveis com as minhas reais possibilidades, deixando para os leitores mais interessados uma bibliografia que os ajude a completar a sua formação. Uma coisa que me deixou verdadeiramente estupefacto, quando comecei a interessar-me racionalmente pelo desenho de barcos, foi a mais completa ausência de informação fiável sobre o tema, em língua portuguesa. Dir-se-ia que é algo de muito peculiar, para um país que sempre se vangloriou dos seus feitos navais no período das descobertas, não só na sua componente de aventura e de heroísmo, como na da propalada existência de uma infra-estrutura técnica e científica que supostamente esteve na origem de tais feitos. Como não investiguei os aspectos relacionados com a navegação, admito como possível que esses conhecimentos não fossem exclusivamente empíricos, no que diz respeito às actividades de orientação no mar, mas estou agora convencido de que tudo o que se fez no domínio da concepção e da construção dos barcos ficou a dever-se, exclusivamente, a uma prática anterior de utilização de embarcações de pesca e de cabotagem, apoiada em inovações e tentativas esporádicas, sem sistematização de dados experimentais. Segundo se diz, os primeiros barcos utilizados pelos portugueses no início dos descobrimentos só podiam deslocar-se para sotavento, não sendo viável a navegação em zonas de vento certo. Era por esse motivo que os marinheiros que se aventuravam a descer a costa africana temiam as dificuldades do caminho de regresso. A navegação para barlavento Pag. 6


só veio a ser praticável com a transformação do caíque, há muito utilizado pelos pescadores algarvios na sua faina quotidiana. Tratou-se, portanto, da adaptação de um sistema de velame conhecido e usado no Mediterrâneo desde o século treze. Diz-se que foram os portugueses que fizeram essa primeira adaptação, distribuindo as velas longitudinalmente nas suas embarcações de três mastros, o que lhes permitiu, em certa medida, navegarem contra o vento. Como julgo conhecer bem os portugueses e não sofro de megalomania, não considero exagerado aceitar como provável que, afinal, a nossa gente não mudou grandemente, permanecendo bastante igual ao que era no século quinze. É um facto comprovado no dia-a-dia que continuamos a cultivar o gosto pela improvisação, fazendo as coisas em cima do joelho. São raras as manifestações de perseverança e de vontade de trabalhar afincadamente, com vista à consecução de objectivos de médio e de longo prazo. A ideia, muito glorificada pelos nossos meios de comunicação e por alguns patetas que se pretendem fazedores de opinião, de que os portugueses, individualmente, são capazes de excelentes prestações no estrangeiro, desde as actividades mais humildes às mais exigentes, manifesta-se também noutros povos com o mesmo tipo de lacunas e revela, sem margem para equívocos, o desejo obsessivo de consagração fora de portas e a mania de que somos formidáveis, escondendo dos outros as dificuldades que sentimos quando temos de nos organizar colectivamente para tirarmos partido dos recursos disponíveis e, assim, conseguirmos produzir as coisas de que precisamos ou que, simplesmente, satisfaçam os nossos desejos de prazer. A par e passo com esta faceta negativa e, até certo ponto contraditoriamente, manifesta-se um endeusamento de tudo o que é estrangeiro e uma subserviência cultural e funcional perante povos que, por simples ignorância, consideramos mais civilizados do que nós e dos quais estamos constantemente a importar produtos e ideias que, sem qualquer exercício crítico, aceitamos como excelentes. Esta caracterização, que alguns podem considerar impiedosa, de uma certa bacoquice nacional serve, entre outras coisas, para explicar que, apesar de eu ter ficado totalmente dependente das culturas técnicas americana, inglesa e sueca, entre outras, no meu esforço isolado de aprendizagem do desenho de embarcações de recreio, não retirei nenhuma satisfação particular desse facto, nem entendo que isso sirva para justificar o que quer que seja. Quero deixar bem claro que fiquei triste por não me ter sido possível suprir a minha carência de conhecimentos recorrendo aos meios nacionais, ou mesmo, aos de outras origens diferentes das que acabo de referir. Solicito a benevolência dos leitores para o facto de ter ficado a conhecer tão mal, como é facilmente constatável, o vocabulário especializado da língua portuguesa sobre temas náuticos e de construção naval, mas acabei por me convencer de que não perdi grande coisa. Gosto muito de andar de barco, mas nunca fui atacado por uma vontade obsessiva de praticar este tipo de actividades. É por isso que a minha postura, ao escrever este livro, é semelhante à dos arquitectos que se propõem desenhar edifícios hospitalares, sem terem um particular desejo de virem a frequentálos na qualidade de doentes. Também não tenho a intenção de fazer um manual para a prática de desportos náuticos, primeiramente porque não possuo conhecimentos suficientemente sólidos sobre o assunto e, depois, porque é uma tarefa que nunca pretendi executar e que verdadeiramente não me interessa. O que está em causa, nesta obra é a concepção de embarcações de recreio, com um suporte Pag. 7


técnico credível, veiculando pontos de vista estéticos e científicos pessoais, alguns dos quais estão sujeitos a controvérsia, mas cuja defesa me proponho fazer, dando exemplos concretos de alguns destes artefactos. O desenho de embarcações tem sido, ao longo dos tempos, uma actividade muito tradicionalista, onde dificilmente se aceitam inovações formais, ou outras. Mas é minha convicção de que é possível olhar para esses objectos com o espírito totalmente aberto. Na busca de analogias que sustentem a minha postura, lembrei-me do que tem acontecido com as flutuações do gosto dominante, nas últimas décadas, quanto ao desenho de edifícios e de outros artefactos de uso corrente, como é o caso dos automóveis. Alguns dos projectos que apresentarei como exemplos estão associados a factos curiosos que não deixarei de referir se e quando isso vier a propósito. Aproveitarei a história de um dos exemplos para mostrar como a superficialidade e o laxismo se juntam ao oportunismo mais descarado de alguns dos nossos empreendedores, quando se trata de montar um negócio que comporta alguns riscos, embora possa vir, eventualmente, a traduzir-se na abertura de um mercado interessante. Esta experiência negativa não foi suficiente para me fazer perder a esperança de que, algum dia, um pequeno grupo de pessoas, projectistas apaixonados e empresários honestos, acabe por se interessar pelo assunto e, finalmente, se venha a desenvolver uma indústria de construção naval que justifique a presunção de que somos um povo de marinheiros e de que temos condições para construir alguns dos barcos que usamos. Só por esta via criaremos o nosso próprio “know-how” e deixaremos de ficar dependentes da produção importada, ainda que muitos de nós estejam intimamente convencidos de que só o que é estrangeiro é que é bom. O vazio cultural português é um dado bem conhecido da antropologia e certos pensadores têm-se esforçado por explica-lo, particularmente no que se refere à componente das ciências humanas, mas deixando totalmente de lado a componente das técnicas e das ciências exactas, aspectos do conhecimento que são fundamentais para o devir de qualquer povo. Parece-me interessante lembrar, neste momento, que, muito mais do que as ciências, as técnicas tem nacionalidade e, por esse motivo, constituem um património negociável e transmissível, contrariamente ao que muito boa gente pensa. Não sei se já repararam como alguns dos intelectuais portugueses mais conceituados nutrem um profundo desprezo pelo conhecimento técnico, atitude com que contribuem para a manutenção de uma ignorância generalizada neste domínio do conhecimento e para a difusão da ideia absurda de que existe um antagonismo insanável entre técnica e arte, com o falso pressuposto de que não são aspectos complementares na resolução dos problemas do desenho e, até, daqueles com que nos deparamos no nosso quotidiano mais trivial. As embarcações são um meio extremamente económico de transportar grandes cargas, com pouco dispêndio de energia, na condição de isso ser feito a baixa velocidade. Quando se trata de chegar depressa, todos os outros meios de transporte são mais eficientes. A seu tempo compreenderemos a razão por que isto é assim. Mas considero oportuno referir, desde já, que é por causa desta limitação Pag. 8


física que não sou um grande apologista do desenho de barcos de regata, à vela e a motor, embora na época em que vivemos, estando completamente obcecados pela competição e pela velocidade, seja muito difícil não sucumbirmos às tendências dominantes. Assim, excepcionalmente, entre as embarcações que usarei para ilustrar a teoria estará uma “máquina” projectada para andar depressa. Mas isso não impede que continue a ser convicção minha que aquilo que pode justificar verdadeiramente a prática dos desportos náuticos é o puro prazer que deriva de nos deslocarmos suave e silenciosamente sobre a água, nos rios ou no mar ou, então, o desejo de enfrentarmos a força aterradora e incontrolável de uma tempestade num objecto de dimensões reduzidas, onde é posta à prova a nossa resistência física e psicológica. Termino esta introdução com a indicação de que ao longo da minha vida tentei sempre, às vezes com pouca convicção, transmitir os conhecimentos que fui adquirindo penosamente neste domínio. Cheguei a oferecer os meus préstimos a um dirigente de uma universidade, que não manifestou qualquer interesse em criar, dentro de um dos cursos existentes, uma disciplina sobre o tema. Se conseguir levar a bom termo esta tarefa, algo do que aprendi ficará disponível para aqueles que vierem a interessar-se, no futuro. Mas, como já o referi anteriormente, é-me impossível abordar exaustivamente todas as matérias que considero relevantes para uma completa aprendizagem desta interessante actividade. Para quem estiver verdadeiramente interessado, há sempre a possibilidade de recorrer à bibliografia que foi criteriosamente seleccionada para responder adequadamente aos pressupostos fixados.

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II. PLANO GEOMÉTRICO. LINHAS E COORDENADAS O projecto de uma embarcação de recreio, como de qualquer objecto de prazer que desempenha cumulativamente funções utilitárias, começa sempre por um programa que define as condições de utilização e os objectivos a atingir. Gostaria que ficasse claro que, quando falo de funções, não me estou a limitar exclusivamente ao elenco das funções denotadas, aquelas que esperamos que um artefacto cumpra, sem margem para desculpas. Refiro-me, também, às funções conotadas, do domínio do subjectivo e do emocional, como seja tudo o que na forma do objecto foi adoptado por motivações estéticas ou, mesmo, para caracterização do estatuto do futuro possuidor. Para quem começa a estudar o assunto, pode parecer que, neste âmbito particular das criações humanas, a variedade das opções é bastante limitada. Isto resulta principalmente dos efeitos corrosivos da publicidade, esse território comunicacional privilegiado da mentira e das meias verdades, cujos profissionais adoram tratar-nos como mentecaptos. Mas também deriva dos métodos de comercialização e da actividade frenética da produção em massa que, na busca incessante de “novidades” que respondam ao mau gosto dominante, banalizou de maneira escandalosa o desenho dos objectos de grande consumo e deixou uma falsa ideia de que, com pequenas alterações ao conceito de base é sempre possível responder a todas as exigências. Como os mais atentos já devem ter verificado, há projectistas e construtores que levam a vida toda a fazer variações inconsequentes acerca do mesmo tema, simplesmente porque concluíram que o consumidor não refila desde que se satisfaçam as suas tendências mais básicas e conservadoras. Basta, para tanto, que finjam que estão a ser inovadores. O leitor há-de constatar, de cada vez que sobe mais um degrau na penosa escada do conhecimento artístico e científico, como aquela atitude é moralmente condenável e tem vindo a contribuir para a decadência do gosto educado, devendo ser combatida sem desfalecimentos, para que subsista um saudável espírito crítico e para o bem da cultura. Quando temos o programa da embarcação relativamente bem definido, é chegado o momento de fazermos alguns esquiços preparatórios, com vista ao início das discussões com o futuro proprietário e, eventualmente, com o construtor. Destas discussões vai resultar, porventura, uma definição mais precisa do objecto, através de um conjunto de interacções entre os parceiros da aventura, que culminará num estudo prévio, ou num anteprojecto. Devo dizer que é importante que o resultado final deste primeiro esforço se traduza numa imagem que, por mais inovadora que se pretenda, deve reflectir a essência do programa. Mesmo que a nossa mente esteja disponível para a novidade das formas, e isso parece-me saudável, não julgo conveniente que, por exemplo, um barco a motor concebido para a velocidade, com as limitações físicas de que já dei conta, apresente a estética de um rebocador. A não ser que um dos objectivos, que também considero pertinente na actividade do desenho, seja a exploração da componente humorística que, a meu ver, deve estar presente em muitos actos da nossa vida e de que não devemos abdicar, sempre que isso seja possível. Pag. 10


Convém relembrar que na memória colectiva dos povos se foram acumulando, ao longo dos tempos, imagens que associamos involuntariamente às tipologias dos objectos, por um processo selectivo que nos leva a só reter aquilo que tem consistência formal e de que a experiência acumulada validou o uso, com suporte num conjunto muito variado de razões que não devemos menosprezar, sem fortes justificações ou sem argumentos técnicos, científicos e artísticos consistentes. Sejamos livres de espírito, mas não nos deixemos dominar pela facilidade e pela gratuitidade! Se exceptuarmos as embarcações que planam, como é o caso da “máquina” a que me referi anteriormente, a propósito de velocidades elevadas, e de cujo desenho falarei oportunamente, todas as outras que apresentarei se movem de acordo com o princípio de Arquimedes, isto é, o peso da água deslocada pelo casco é equivalente ao seu peso total. E até as embarcações susceptíveis de planarem, só contrariam o citado princípio a partir de uma determinada velocidade ou, melhor dizendo, de um determinado valor da razão entre a velocidade e a raiz quadrada do comprimento da linha de água. Mas se quiséssemos ser absolutamente rigorosos, teríamos de admitir que, para regimes de velocidade inferiores à velocidade limite de um casco, que está directamente relacionada com a dificuldade com que uma determinada embarcação empurra o trem de ondas de superfície que é formado pelo seu movimento, se verifica sempre um certo grau de incumprimento da regra, mesmo nas embarcações ditas de deslocamento. Contudo, para efeitos práticos, este fenómeno não tem qualquer relevância. Fica assim assente, para os fins do projecto, que a quantidade de água deslocada por uma embarcação de deslocamento está relacionada intrinsecamente com o seu peso total, a saber, a soma dos pesos do casco, da superstrutura, dos equipamentos, das vitualhas, da tripulação, dos passageiros, etc. Quando desenhamos um barco e marcamos a sua linha de flutuação, que separa as obras vivas das obras mortas, temos de ficar com a noção de que o volume previsto abaixo dessa linha, ou linhas, tendo em devida conta a variação das condições de carga e da densidade da água (que depende do seu grau de salinidade), é o adequado para que o barco se desloque nessa posição de equilíbrio, ou muito próximo dela. Precisamente porque está em causa um problema de equilíbrio, tenho de referir-me, não só, ao peso das coisas a que aludi anteriormente, como também à sua distribuição no interior do casco e acima dele. É claro que alguns dos objectos que estão a bordo se movem, como é o caso dos tripulantes e dos passageiros, e se consomem, como é o caso da água potável e dos combustíveis, mas isso tanto pode ser desprezado como aproveitado, dependendo das dimensões do barco, das suas características funcionais e da utilização que lhe estamos a dar em cada momento. Não vejo necessidade de chamar à colação, neste momento, alguns desastres famosos que induziram a perda de muitas vidas e que resultaram precisamente da ocorrência da deslocação não planeada de objectos, ou de pessoas, dentro de embarcações e de navios. Também não considero indispensável falar do conhecimento que tem de estar associado às operações de carga e descarga dos navios mercantes, para que a sua estabilidade fique assegurada, quer no porto, quer em marcha. E fica, obviamente, por referir o caso particular do

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transporte de cargas líquidas, cujas características de acondicionamento implicam um desenho específico dos navios que se dedicam a essa actividade. Voltando, agora, à discussão inicial, é de prosseguir com o projecto procedendo à execução do plano geométrico, isto é, ao desenho das linhas. Não se trata ainda do desenho definitivo, mas de uma primeira tentativa de definição da forma e do volume. Aquilo que se designa por plano geométrico é um conjunto de linhas, curvas e rectas, que definem com rigor o volume do casco e, por vezes, das superstruturas, na totalidade ou em parte. Essas curvas são obtidas pelo seccionamento do hipotético objecto por planos horizontais, de perfil, de frente, de rampa e oblíquos, tantos quantos reputemos suficientes para a correcta definição do volume, já que a geometria dos cascos não é, em geral, exprimível por via matemática. Nem isso nos interessa. A matemática é muito mais útil em outras situações! A representação desenhada da superfície exterior da embarcação obedece a algumas regras objectivas mas, também, a convenções que não tem nenhuma fundamentação credível, que não seja a tradição. Faz-se assim porque é costume. Apresentarei, de seguida, alguns exemplos esquemáticos de planos geométricos de embarcações, recorrendo a tipos convencionais, para justificar as relações entre forma e função. O assunto não vai ficar esgotado, nem é esse o objectivo. Estamos a começar! Aproveitarei o desenho de alguns desses planos geométricos para explicar um dos métodos de cálculo do deslocamento das embarcações, isto é, do volume e do peso da água deslocada. Na mesma sequência calcular-se-á, também, a localização do centro de flutuação, isto é, do centro de gravidade do referido volume de água. É precisamente nesse ponto que colocaríamos a origem de um vector vertical, voltado para cima, se quiséssemos representar a força da impulsão. Também não é preciso pensar muito para concluir que, numa situação de repouso, o centro de gravidade do conjunto constituído pela embarcação e por tudo aquilo que ela contem, num dado momento, deve coincidir com a vertical que contem o vector da impulsão, sendo que o vector do peso da embarcação se dirige para baixo, isto é, tem sentido inverso ao da impulsão. Se, por causa da incorrecta distribuição dos pesos, ou por acção de forças exteriores, assim não acontecesse, o barco oscilaria até que esse desiderato fosse atingido. No momento em que tal se verificasse, o plano de contacto dos dois fluidos, a água e o ar, seccionaria idealmente o casco, definindo a verdadeira linha de flutuação. Portanto, essa linha só é coincidente com a que nós desenhamos no projecto se for verificada a condição que acabei de referir. Já no que se refere às posições relativas dos dois centros na linha vertical que contém os vectores correspondentes, isto é, o da impulsão e o do peso, a discussão é mais complexa. Sendo bastante fácil determinar o centro de flutuação a partir das linhas do barco, com meia dúzia de cálculos, porque se trata de encontrar o centro de gravidade de um volume de densidade uniforme, sem vazios, o mesmo não se pode fazer para calcular o centro de gravidade. A heterogeneidade dos materiais que constituem a embarcação e os seus pertences, as diferentes densidades e as localizações de todos os componentes relativamente ao sistema de eixos coordenados a que recorremos para situar os objectos no espaço, dão-nos logo a ideia Pag. 12


de que não estamos em presença de um trabalho simples. Não é coisa impossível de executar, mas faz parte daquele grupo de tarefas que os projectistas abominam, por as considerarem sumamente maçadoras. Esta tarefa encontra-se ao mesmo nível de criatividade da medição e da orçamentação, nos projectos de arquitectura. Não é por outra razão que os arquitectos portugueses, principalmente os mais idosos, estão sempre a arranjar pessoas que se encarreguem desses trabalhos, para não terem de os fazer! Só para levantar a ponta do véu, direi que é costume, em muitas situações, recorrer ao uso de lastro móvel para equilibrar as embarcações, mas não se pode pensar neste artifício como se dispuséssemos de uma panaceia ou de uma solução miraculosa. Há limitações de variadíssima ordem que não devemos ignorar, nomeadamente o facto de estarmos a recorrer ao transporte de um peso morto que rouba a potência do motor, só porque não fomos capazes ou não estivemos preocupados em prever a colocação das coisas mais pesadas nos lugares adequados. É preciso lembrar, neste momento, que há barcos que, pelas suas características intrínsecas tem de usar lastro em percentagem muito elevada, e isso facilitanos as coisas neste aspecto particular, mas falaremos do assunto quando for oportuno. O empenho na determinação rigorosa do centro de gravidade de um objecto flutuante, apesar de necessário, não precisa de ser levado longe demais, pois tem como limite o bom senso que deve presidir a todos os actos do projecto. É por esse motivo que não faria qualquer sentido levar em consideração a permanência de um casal de namorados, apaixonadamente abraçados na proa do Titanic, com o olhar perdido no horizonte, porque o peso dessas duas pessoas não influenciaria significativamente a posição da linha de flutuação desse navio de proporções colossais, mesmo tendo em consideração que os extremos das embarcações são, por razões óbvias, os piores sítios para colocar objectos pesados! Vamos analisar, agora, o desenho que se encontra na figura nº1. O que aqui está em causa é uma representação esquemática, em três projecções, do volume de um troço da proa de uma embarcação, sem quaisquer pretensões de autenticidade. O seu objectivo é o de mostrar como cada ponto é representado nas três vistas, na sequência do seccionamento do volume do casco por planos de perfil, de frente e horizontais, definindo assim as curvas que caracterizam a forma do objecto. Repetindo a operação de seccionamento tantas vezes quantas as necessárias, atinge-se uma representação exaustiva da querena, cuja análise permite ao projectista compreender completamente a forma que está a conceber, ao mesmo tempo que vai eliminando eventuais incorrecções ou deformidades. Trata-se de um processo iterativo que só termina quando nos consideramos satisfeitos com a forma desejada. Tal como é referido no texto que acompanha a figura, também foi representado um plano de rampa, cuja finalidade é a de determinar uma diagonal. Estas curvas são importantes, pelo menos em certos tipos de cascos, para termos a certeza de que a embarcação, quando está adornada, continua a deslizar sem grandes problemas, não apresentando irregularidades naquelas partes que só contactam com a água nessas condições. Veremos nas figuras seguintes, que representam vários tipos de embarcações de recreio, qual é a aparência das linhas, as diagonais incluídas. É fundamental que todas as curvas Pag. 13


indicadas tenham um desenvolvimento suave, sem protuberâncias ou concavidades. Para o seu desenho recorremos a escantilhões de vários formatos, que foram concebidos expressamente para esse fim e se designam pelo nome de curvas de Copenhaga. Existem algumas dezenas, com tamanhos variados, que hoje se fabricam em chapa de vidro acrílico. Antes eram feitas de baquelite e de outros materiais semelhantes. São numeradas para efeitos de identificação e a sua correcta utilização exige bastante treino. Além das curvas de Copenhaga há, também, os virotes, peças finas e longas, umas de secção uniforme e outras de secção variável, que se imobilizam na prancheta por meio de pesos de chumbo ou de ferro, nos quais está fixada uma ponta de aço que se apoia na parte superior do virote onde, em geral, foi praticada uma concavidade para melhor fixação da referida ponta. Os virotes antigos eram de madeira flexível mas agora, tal como as curvas de Copenhaga, também se fabricam em metacrilato de metilo. O facto de se usarem virotes para o desenho das curvas, e de a sua manutenção sobre a prancheta, com a curvatura adequada, exigir a aplicação de cerca de uma dezena de pesos de 1,5 a 2,5 quilogramas cada um, obriga a que o plano de desenho seja mantido na posição horizontal, disposição que pode representar inicialmente um inconveniente para os projectistas que estão habituados a trabalharem com a prancheta inclinada, ou na posição vertical, como era o meu caso quando comecei a desenhar barcos. Sendo certo que quem desenha está cada vez mais dependente do computador e que já se vêem poucos estiradores nas salas de desenho, não posso deixar de referir que, hoje, estão disponíveis no mercado sistemas lógicos, uns simples e baratos, outros complexos e dispendiosos, cujos programas foram concebidos expressamente para o desenho de embarcações. Alguns desses programas tem, ainda, a vantagem de procederem aos cálculos daquelas quantidades cujo conhecimento é fundamental para o desenvolvimento do projecto e que, quando feitos manualmente se tornam aborrecidos, além de representarem uma grande perda de tempo. Contudo, há que ter em devida conta o valor heurístico que representa a execução dos cálculos em máquinas elementares, sem possibilidade do uso de algoritmos ou do recurso a programação, facto que tem sido esquecido em muitos ramos da técnica e da ciência. A feitura dos cálculos desta maneira penosa, pelo menos quando se aprende, implica a introdução de correcções, que é preciso fazer repetidamente até se atingirem resultados satisfatórios. Isto permite sentir a evolução das soluções e compreender efectivamente as relações entre as diversas variáveis contidas nas fórmulas. Os engenheiros e os arquitectos mais idosos, que aprenderam a calcular estruturas de edifícios pelos métodos iterativos (Cross e Kani), sabem perfeitamente do que estou a falar. No meu caso, a questão resolveu-se com a maior facilidade pois não me sinto vocacionado para a aprendizagem dos instrumentos informáticos, entre outras razões, porque entendo que me roubam o prazer da utilização dos meios tradicionais do desenho. Deixo essa nova abordagem para aqueles que estão mais interessados nos processos mais recentes e não se importam de pôr de parte o lápis e a borracha. Na bibliografia indicarei, pelo menos, um livro que fornecerá indicações sobre o tema dos meios informáticos. Devo insistir, ainda uma vez, no facto de que o recurso ao computador, na fase de aprendizagem, dificulta, a meu ver, uma completa compreensão dos argumentos que sustentam as decisões do desenho, limitando a criatividade de quem projecta.

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Desenhei os planos geométricos esquemáticos contidos nas figuras 2 a 5, sem grandes preocupações de rigor. São exemplos que só servem para que os leitores fiquem com uma ideia aproximada de alguns tipos comuns de embarcações que convêm ter presentes, mas que não esgotam, nem de perto nem de longe, todas as possibilidades de responder às várias exigências funcionais e formais que estes artefactos nos colocam. Esclareço que, por razões de simplificação e de clareza, as secções transversais que estão representadas em cada um dos desenhos são relativamente poucas e, sempre, em número de sete, definindo seis intervalos iguais no comprimento da linha de água que, supostamente, corresponde à flutuação da embarcação em condições normais de carga. Nas situações correntes de desenho, o número de curvas que definem a forma, incluindo as referidas secções transversais costuma ser maior, dependendo das dimensões do artefacto. É, contudo, imperativo que as secções transversais que figuram dentro dos limites da linha de flutuação sejam equidistantes e em número impar, para que se defina um número par de intervalos iguais. Só deste modo é possível proceder aos cálculos iniciais (volume submerso, deslocamento e centro de flutuação), recorrendo à utilização da primeira regra de Simpson, que estudaremos adiante. Fica desde já feito o aviso de que, por vezes, é preciso intercalar mais secções em determinados pontos do casco, para que se consiga uma melhor definição da sua geometria, mas estas secções auxiliares não se usam na determinação das variáveis referidas, pelo que a sua área não é calculada, contrariamente ao que ocorre com as áreas das outras. Tal como referi antes, para além das disposições que derivam de exigências devidamente sustentadas, técnica ou cientificamente, há nos desenhos do plano geométrico uma série de convenções que geralmente se respeitam, embora tal prática só esteja apoiada na tradição. Por exemplo, nas vistas laterais e inferiores, o casco é habitualmente representado com a proa virada para o lado direito do desenho, numerando-se as secções transversais da direita para a esquerda, a partir de zero, inclusive, sem considerar aquelas que estão para lá dos limites da linha de flutuação contida no plano que constitui a interface dos dois fluidos. Como é evidente, para efeito dos cálculos a que nos estamos a referir, só está em causa o volume do casco situado dentro de água, isto é, as obras vivas (querena). Outras convenções serão visíveis ao longo da obra, mas não vejo qualquer necessidade de chamar a atenção para elas, neste momento, pois são facilmente identificáveis. Vamos agora analisar, com algum detalhe, os desenhos das figuras 2 a 5. Começando pela observação do barco representado na figura 2, logo nos apercebemos de que é um casco tradicional de barco à vela, com uma quilha fixa relativamente longa, se tivermos em conta os modelos comerciais mais recentes e, bem assim, as embarcações de regata, desenhadas com a obsessão da velocidade. Nos tempos que correm este casco é considerado pesado, mas na época em que estas formas eram populares tal afirmação daria vontade de rir. Por causa da grande evolução que se verificou durante os últimos cinquenta anos, quer nos materiais utilizados na construção, quer nas técnicas de fabricação, os barcos tem vindo a reduzir o seu peso de maneira drástica, sem que isso se traduza na perda da resistência mecânica e da resiliência. Por outro lado, é preciso não esquecer que, quando se encomenda uma unidade projectada expressamente para responder a um programa, ou se compra um barco de série, o Pag. 15


que se está a pagar é, em grande parte, a quantidade e a qualidade dos materiais que lá se colocam. Daí que os barcos mais leves, construídos com materiais de qualidade questionável, devam ser mais baratos, se o seu preço não estiver inflacionado por factores alheios à economia do fabrico. Não me parece que seja necessário aduzir argumentos para sustentar a constatação de que está em marcha um certo revivalismo formal em muitos domínios do desenho do ambiente construído, desde os edifícios aos automóveis. E as embarcações de recreio não fogem a esta regra. É por causa desta tendência actual, cujas motivações são bastante complexas, que estão outra vez a construir-se embarcações deste género. Para além das razões obscuras, entre as quais parece avultar o conservantismo formal derivado do enjoo que provoca nos consumidores a gratuitidade de muitas soluções modernas de desenho, que os seus autores nos impingem como sendo o último grito da moda, não pode deixar de se afirmar que este tipo de casco é muito mais confortável e seguro do que o das embarcações dotadas de quilhas estreitas e profundas e de lemes em forma de sabre, as quais, em mares agitados, se movimentam abruptamente, com grave prejuízo para os estômagos e a boa disposição do pessoal a bordo, para não referir efeitos eventualmente mais graves. É claro que, por causa da diferença das superfícies molhadas, tratando-se de duas embarcações com dimensões semelhantes, o nosso barco será ligeiramente mais lento em algumas situações de vento, mas muito mais fácil de manter no rumo desejado. O pouco que se ganha em ligeireza perde-se, seguramente, em conforto, tranquilidade e facilidade de manutenção do rumo. Sempre me pareceu irracional tentar melhorar a velocidade em algumas décimas de nó, à custa da segurança e da boa disposição dos tripulantes. Quem tem pressa deve ir de automóvel ou de avião, não deve utilizar um barco, porque a persistência nessa atitude faz levantar justificadas dúvidas sobre a inteligência e a sanidade mental da pessoa que opta por este meio de transporte, em tais condições! Aproveito a presente oportunidade para dizer algo sobre as questões da resistência hidrodinâmica, isto é, sobre as forças que se opõem ao movimento das embarcações. O atrito na água e a resistência que deriva da formação de ondas resultantes da deslocação do barco são as forças mais significativas para as embarcações que se deslocam a velocidades normais. A resistência parasita devida aos equipamentos salientes do casco (hélices, veios, suportes, etc.) e a resistência do ar são pouco importantes nos regimes de velocidade mais baixos, embora seja conveniente tê-las em devida conta nas embarcações planantes, que mal tocam na superfície da água quando se deslocam a alta velocidade. Mas, para interpretar correctamente as curvas de resistência representadas na figura 6 é preciso adiantar mais algumas noções cuja racionalidade não é evidente. Note-se que ainda hoje continuam a verificar-se lacunas importantes nas explicações teóricas com que os investigadores tentam tornar inteligíveis os fenómenos que ocorrem com a deslocação dos cascos na interface da água com o ar. Há mesmo alguma controvérsia entre especialistas e os textos mais conhecidos divergem na apresentação das matérias mais complexas. É com esta reserva que deve ser lido o que se diz em seguida. Pag. 16


Primeiro que tudo há que referir que o atrito provocado pelo contacto da água com a superfície do casco resulta, obviamente, da quantidade dessa superfície e da sua rugosidade, entre outros factores cuja reduzida importância não justifica que sejam referidos nesta obra de carácter geral. Quanto à resistência derivada da formação de ondas pelo movimento das embarcações, verifica-se que ela resulta, em grande parte, da forma e do volume das querenas, na medida em que o referido movimento provoca um aumento de pressão na parte anterior dos cascos, causando a distorção da superfície líquida. Contrariamente ao que acontece com o atrito, este tipo de resistência depende pouco da viscosidade da água e só se verifica se o flutuador em causa se deslocar na zona de contacto de dois fluidos com diferentes densidades que, no caso que nos ocupa, são a água e o ar. O movimento da superfície da água é um fenómeno essencialmente gravitacional e é por este motivo que não se constata a existência de resistência provocada pela formação de ondas quando um submarino se desloca submergido ou quando um avião voa no ar. Ainda no século XIX, alguns físicos ingleses e de outras nacionalidades, procuraram encontrar uma relação entre a resistência e a velocidade de objectos flutuantes na água, tendo acabado por descobrir várias fórmulas experimentais de que falaremos mais adiante. Desses trabalhos experimentais decorre que o atrito aumenta uniforme e suavemente com o aumento da velocidade da embarcação, enquanto que a resistência devida à formação das ondas sofre um aumento abrupto a partir de um determinado valor da razão entre a velocidade e a raiz quadrada do comprimento da linha de água, no caso das embarcações de deslocamento. Por outro lado, verifica-se que, nos regimes mais baixos da velocidade, é o atrito que representa a maior fatia da resistência, enquanto que a partir do momento em que aquela razão atinge um determinado valor, passa a verificar-se o contrário. Voltando ao tema das embarcações representadas nas figuras 2 a 5, detenhamo-nos na da figura 3. Está aqui representada uma pequena embarcação à vela, com um peso muito reduzido, concebida para usar uma superfície de velame comparativamente grande, que lhe permitirá deslocar-se velozmente, com pouco vento, em águas protegidas. A sua estabilidade é baixa, não somente por causa da forma das secções transversais, muito arredondadas na zona do encolamento, mas principalmente pelo seu baixo deslocamento (peso) e pela ausência de lastro fixo. Nestas condições, a sua estabilidade depende fundamentalmente da tripulação, que pode ser obrigada a pendurar-se na borda, ou em trapézios, esforçando-se bastante para a manter equilibrada. Neste exemplo, a quilha e o leme apresentam a possibilidade de rodarem em torno de um eixo e de serem parcialmente escamoteáveis, com vista à redução do calado e da superfície molhada. Esta disposição introduz alguma complexidade adicional no projecto e na construção do barco mas permite diminuir o atrito, obtendo-se, assim, maior velocidade quando se navega com ventos da alheta ou de popa. No fabrico desta embarcação deve fazer-se apelo a materiais leves e resistentes, para que uma execução descuidada não venha a comprometer aquilo que o desenho das linhas pretende indiciar. Pag. 17


Olhando agora para a figura 4 vemos a representação esquemática das linhas de um barco a motor para serviço pesado. Pode ser usado para a faina da pesca ou como barco de recreio, de grande deslocamento, susceptível de aguentar qualquer borrasca, sem problemas. Pode ser construído com materiais e técnicas tradicionais, devendo dimensionar-se os seus elementos estruturais com elevadas margens de segurança, sem preocupações de poupar no peso. A forma do casco permite-lhe transportar equipamentos e vitualhas em quantidades suficientes para permanecer no mar por longos períodos, com várias pessoas a bordo. Sendo uma embarcação de grande deslocamento, a sua estabilidade não é praticamente afectada por variações de carga relativamente importantes. A genealogia das suas formas entronca na das que tem vindo a ser utilizadas nas traineiras do Atlântico Norte, onde as condições de tempo, geralmente adversas, obrigaram os pescadores a recorrerem a este tipo de cascos, cujas oscilações em mares encapelados são relativamente lentas, comparativamente com o que ocorre com a embarcação seguinte. A figura 5 representa uma forma de casco muito comum nos dias actuais. A maior parte dos barcos de recreio movidos exclusivamente a motor, de grande série, que hoje se fabricam, tem cascos semelhantes a este, embora grande parte deles não tire qualquer partido da sua forma. Trata-se de um casco planante, o que quer dizer que, a partir de uma certa velocidade deixa de se deslocar de acordo com o princípio de Arquimedes. Mas, para que esta condição se verifique, é preciso que a relação do peso total com a potência dos motores seja inferior a pouco mais do que 15 quilogramas por cavalo de potência efectiva. É claro que o desenho da parte imersa do casco tem de obedecer a determinadas regras geométricas que implicam que os centros de flutuação e de gravidade sejam localizados fora dos limites tradicionais, ficando muito recuados. Vemos neste desenho que a parte posterior da querena mantém a mesma forma em todas as secções. Como se pode verificar pela observação do plano geométrico, os dois lados do fundo apresentam um diedro constante, a partir da secção mestra. Dir-se-á, por agora, que não convém que o ângulo deste diedro seja superior a 165º. Quanto menor é o ângulo, maior é o calado e mais pesada e segura é a embarcação, mas maior tem de ser a potência do motor, para que se cumpra o requisito da relação entre o peso e a potência. No entanto, advirto o leitor de que não deve ficar com a ideia de que todos os cascos que podem planar tem arestas e, muito menos, de que todos os cascos com arestas podem planar. Há barcos com cascos redondos que também planam e puros barcos de deslocamento que não tem o casco redondo. Contudo, a forma indicada no desenho é a mais eficiente para o fim pretendido, embora seja menos confortável e menos resistente aos impactos do que um casco com secções convexas, como qualquer pessoa com alguns conhecimentos de resistência dos materiais bem compreende. Tal como antes foi vagamente assinalado, este tipo de casco tem o centro de flutuação muito recuado, uma vez que a maior parte do volume imerso se situa entre a secção mestra e a popa. É por este motivo que o seu movimento em águas agitadas é irregular e pode mesmo ser perigoso, contrariamente ao que acontece com o barco da figura 4, mais lento, mais seguro e mais económico. Só devemos desenhar uma embarcação que plane se dispusermos de potência de cruzeiro suficiente nos Pag. 18


motores para conseguir esse efeito e se soubermos que a sua utilização habitual não implica a navegação em condições de mar adversas, com ondulações que transformam o prazer de navegar num verdadeiro tormento. Só em águas calmas é que faz sentido o recurso a um barco como o da figura 5, cuja construção, equipamento e manutenção são dispendiosos e cujo consumo de combustível é proibitivo. É claro que, se o conhecimento atempado da previsão do tempo nos leva a abandonar um local em vias de se tornar perigoso, o barco da figura 5 permite fazê-lo muito mais rapidamente do que o da figura 4, o que não deixa de ser uma vantagem. Nesta descrição sintética de tipos de embarcações ficaram de lado muitos exemplos interessantes, nomeadamente os multicascos. Trimarans e catamarans, a motor e à vela, podem constituir motivo de grande prazer, tanto na execução do projecto, como na sua utilização. Mas este texto não pretende ser exaustivo, pelo que o leitor que esteja interessado em estudar estes e outros temas terá de aguardar algum tempo e, eventualmente, de procurar documentação em textos especializados. Vamos falar, agora, das coordenadas que, juntamente com o plano geométrico, constituem o ponto de partida para um verdadeiro projecto de embarcação. Quando se pretende construir uma embarcação, a partir do plano geométrico (e dos desenhos de construção), a primeira coisa a fazer é reproduzir esse conjunto de rectas e de curvas, em tamanho natural, usando para o efeito um local com as dimensões adequadas, que disponha de um pavimento totalmente desempenado, onde se pode desenhar. É aqui que entram as coordenadas, pois a ampliação das linhas, exclusivamente com base nos desenhos à escala, é uma tarefa quase inviável. As coordenadas são determinadas pelo projectista durante a fase de concepção e apresentadas sob a forma tabular, constituindo um conjunto de dimensões lineares que resultam da medição de distâncias entre a superfície do casco e certas linhas e planos de referência, a saber, alturas a partir da base, larguras a partir do plano central e distâncias aos eixos (diagonais). Em rigor, pode afirmar-se que é possível reconstituir as linhas, em tamanho natural, dispondo exclusivamente da tabela das coordenadas, sem conhecer os desenhos. É importante perceber que a execução do desenho das linhas, no pavimento da sala do risco, implica a utilização de virotes de grande comprimento, para que as curvas se desenvolvam perfeitamente desempenadas, sem irregularidades. Por mais cuidado que o autor do projecto tenha no desenho do plano geométrico e na determinação das coordenadas haverá sempre correcções a fazer na passagem para as dimensões reais, que serão tanto menores quanto maior for o rigor colocado no desenho das linhas, na fase de projecto. Às vezes, quando o local onde se vão desenhar as linhas não tem dimensões suficientes, pode usar-se o tamanho natural para o desenho das secções transversais, enquanto que a vista lateral e a vista inferior e, bem assim, as diagonais, são representadas em escalas menores. Aplica-se o tamanho natural nas larguras e nas alturas e metade ou um terço das dimensões reais nas medições longitudinais. Este método, apesar de apresentar as linhas de água, as secções longitudinais e as diagonais com curvaturas superiores às reais, permite executar moldes correctos das secções transversais, para posterior fixação Pag. 19


na estrutura de suporte, onde se vai construir a embarcação ou o molde, ou mesmo para a execução das secções definitivas, tudo dependendo do método de construção e dos materiais a utilizar. Alguns projectistas, para não aumentarem excessivamente as dimensões das folhas de papel onde representam o plano geométrico e, ao mesmo tempo, para diminuírem as possibilidades de erro nas mudanças de escala, usam também escalas diferentes para as diversas vistas, maximizando a escala das secções transversais, mas representando as três vistas sobrepostas. Embora seja um pouco mais difícil de interpretar um desenho executado segundo este processo, a utilização de escalas mais próximas da realidade dimensional permite aumentar o rigor na determinação das distâncias. O que considero mais aconselhável e faz sentido é desenhar um conjunto de linhas na forma convencional e, no caso de se considerar conveniente, desenhar outro com escalas diferentes, para posterior utilização na elaboração da tabela das coordenadas. Convém não esquecer que o desenho do plano geométrico utilizando meios informáticos permite resolver o problema do rigor dimensional das coordenadas com maior facilidade, facto que constitui uma vantagem nos processos de fabricação em série de embarcações cujos componentes são executados em plásticos reforçados com fibras. Nestes casos a execução do molde e do contramolde, sem falhas, é do maior interesse, na medida em que os erros que persistirem nestes suportes da construção final são transferidos para todas as cópias que deles se retirarem.

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III. VOLUME SUBMERSO E DESLOCAMENTO. CENTRO DE FLUTUAÇÃO E CENTRO DE GRAVIDADE. IMERSÃO E CAIMENTO. Neste capítulo vamos retomar a análise de algumas situações que já foram ligeiramente abordadas no capítulo anterior e tratar de esclarecer a localização no espaço, de dois pontos que, de acordo com os princípios gerais da hidrostática, definem a resultante de grandezas vectoriais de que o conhecimento é indispensável para que o artefacto que estamos a conceber cumpra adequadamente as funções denotadas previamente fixadas no programa. Contudo, nunca nos devemos esquecer de que as ciências exactas devem ser aplicadas com as reservas necessárias, na medida em que os modelos abstractos que concebemos a partir dos conhecimentos científicos são, em geral, aproximações bastante grosseiras e limitadas da realidade, só a reproduzindo parcialmente. Sendo certo, por outro lado, que o conhecimento científico está em constante mutação, na sequência dos avanços culturais, do progresso das investigações e da consequente alteração das teorias, pode dizer-se, como já o fez um pensador do século XX, muito citado mas pouco conhecido, que este tipo de conhecimento é o paradigma do conhecimento errado. Assim, quando os projectistas e técnicos recorrem à ciência para tomarem decisões de projecto, nunca devem perder de vista a realidade com que estão confrontados, recorrendo, sempre que possível, ao conhecimento empírico, para validação das opções tomadas. Há, na construção naval, uma longa tradição de aprender com os desastres e a análise e o tratamento estatístico dos eventos nefastos cuja explicação não é óbvia, constitui um manancial de regras para bem conceber e construir, que nunca deve ser menosprezado por quem tem a responsabilidade de projectar. As sociedades de classificação de navios que estão ligadas às grandes empresas seguradoras produzem, compilam e publicam essas regras, alterando-as sempre que acontecimentos não previstos, depois de devidamente estudados, tornam evidentes as falhas que ocorrem nas normativas e nos protocolos em vigor num dado momento. Vamos começar pelo cálculo do volume imerso da embarcação que está esquematicamente representada na figura 2. Tal como já anteriormente foi referido por mim, trata-se de um exemplo pouco rigoroso, como os restantes que se seguem, mas que serve perfeitamente para exemplificar a aplicação da primeira regra de Simpson, que é o método mais comum, de entre vários de que dispomos, para a determinação do volume de água deslocado pelo casco quando flutua no plano horizontal de cota 0. E consequentemente, do peso total da embarcação. Utilizando um planímetro, um integrador, ou, para quem não dispõe destes instrumentos de medida, recorrendo a um dos métodos geométricos mais usados para a determinação aproximada de áreas de figuras planas irregulares, procedemos à medição da superfície das metades das secções transversais, abaixo do referido plano, tal como se apresentam no desenho onde estão representadas as secções transversais. Porque neste caso se trata de áreas Pag. 21


desenhadas à escala 1:25, multiplicamos o valor obtido por 25X25=625, para ficarmos com o referido valor, em tamanho real. Assim teremos: Sn = A / 2 0 = 00,00 dm2 1 = 11,28 dm2 2 = 29,58 dm2 3 = 49,05 dm2 4 = 49.38 dm2 5 = 33,13 dm2 6 = 00,00 dm2 Aplicando estes valores como se fossem dimensões lineares, a uma escala conveniente, marcamo-los a partir de uma recta de referência, mantendo as posições relativas das secções e procedendo, de seguida, ao desenho da curva das áreas que nos permite visualizar a distribuição do volume submerso ao longo do plano longitudinal. Estando as medições bem executadas e as linhas do plano geométrico bem desenhadas, a curva das áreas deve apresentar um desenvolvimento harmonioso, sem saliências ou reentrâncias abruptas, a não ser que se trate de uma embarcação com quilha de barbatana ou de bolbo lastrado, o que não é o caso. Se a curva não tiver um desenvolvimento regular é porque as medições e/ou os cálculos de algumas das áreas das secções estão errados e torna-se indispensável repeti-los, até que a referida linha apresente uma curvatura verosímil. Para efeitos comparativos, com vista a ganharmos um conhecimento perfeito do aspecto das coisas, é conveniente observarmos, sempre que isso seja possível, os planos geométricos e as curvas das áreas de embarcações semelhantes. Vamos, agora, construir uma tabela para a determinação do deslocamento da embarcação e para a localização da linha vertical que contem o seu centro de flutuação, quando esta se encontra em repouso. Veremos mais adiante que, quando um barco oscila, a forma do volume submerso se altera e, consequentemente, o seu centro de flutuação se desloca.

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Sn

A/2 (dm2)

X

D

X

F

∑b

0

0,00

1

0,00

3

0,00

1

11,28

4

45,12

2

+90,24

2

29,58

2

59,16

1

+59,16

3

49,05

4

196,20

0

0,00

4

49,38

2

98,76

1

-98,76

5

33,13

4

132,52

2

-265,04

6

0,00

1

0,00

3

0,00

∑ a = 531,76

2

a d 3

 V

-363,80 ∑ bt = - 214,40

Distância entre secções transversais, medida no plano geométrico:

Cálculo do volume submerso: V 

+149,40

d = 10,0 dm

2  531,76  10,0 3  V  3545,967dm 3

Cálculo do peso total da embarcação (deslocamento): D (água doce) = 3545,067 x 1 = 3545,067 kg D (água salgada) = 3545,067 x 1,026 = 3637,387 kg

Cálculo da posição longitudinal do centro de flutuação: Fl 

 bt  d -214,40  10,0  F l 531,36 a

 Fl = -4,03 dm, em direcção à popa (por ser um valor negativo), a partir da secção mestra S3. Quanto à fundamentação teórica deste método (ou de outros que podemos aplicar como sejam, por exemplo, a regra dos trapézios e a regra de Tchebycheff) e, bem assim, do cálculo da localização transversal do centro de flutuação, remeto o leitor para um qualquer texto de arquitectura naval, onde pode encontrar as explicações necessárias. Direi apenas que, neste método, os troços de curva compreendidos entre linhas consecutivas, representando as secções transversais, são considerados como sendo segmentos de parábolas e que conhecimentos elementares da análise matemática e da física permitem perceber, sem grandes dificuldades, porque é que as coisas se fazem desta maneira e não de outra. Quanto aos multiplicadores que estão indicados na terceira e na quinta colunas da tabela anterior, basta dizer que a sua aplicação está relacionada com o número de secções que, como antes foi dito, tem de ser sempre em número ímpar, para que os intervalos sejam pares. Suponhamos, então,

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que, em vez de sete temos onze secções e, naturalmente, dez intervalos. Neste caso, os multiplicadores da regra de Simpson serão, sequencialmente: 1, 4, 2, 4, 2, 4, 2, 4, 2, 4, 1. No que diz respeito aos multiplicadores do centro de flutuação, por que está em causa a determinação de momentos relativamente à secção mestra, a sequência será: 5, 4, 3, 2, 1, 0, 1, 2, 3, 4, 5. O número 0 corresponde sempre à secção a partir da qual são calculados os momentos, não tendo de ser, obrigatoriamente, a secção mestra. Mas se for esta a escolhida, os cálculos serão mais fáceis porque, em condições normais, o centro de flutuação estará mais próximo desta secção do que de qualquer outra, se esquecermos por momentos as embarcações planantes. Observando, na figura 2, a curva das áreas e a superfície subtendida entre ela e a corda onde se apoia, constatamos que não apresenta um desenvolvimento simétrico relativamente à secção mestra. Se esse facto se verificasse, o cálculo que fizemos para determinar a posição longitudinal do centro de flutuação daria um resultado final nulo, significando esse valor que os momentos à esquerda e os momentos à direita da secção mestra se equivaleriam e que a recta que contem o centro de flutuação coincidiria com a recta que representa a citada secção (S3). Compreende-se facilmente, pois é da natureza da teoria, que a linha que contem o centro de flutuação divide a referida superfície em duas partes com a mesma área, embora se apresentem geometricamente diferenciadas. Quanto mais próxima esta linha estiver da secção mestra da embarcação mais equilibrada é a distribuição dos volumes das obras vivas (querena). No caso presente constata-se que há menos flutuação do lado da proa pelo que, em situações de mar agitado, a recuperação da horizontalidade, quando a proa afunda, pode não ocorrer nas melhores condições e com a rapidez necessária. Um barco deste tipo, com um desenho verdadeiramente tradicional teria a curva das áreas ligeiramente mais cheia na frente e, provavelmente, mais cavada para a ré. Relembro que o que se pretende com este exemplo é a possibilidade de exemplificação dos cálculos. Não está em causa o desenho de uma embarcação perfeita nem isso, sequer, existe. O projecto de embarcações de recreio, como de qualquer outro artefacto com alguma complexidade, implica uma cadeia de decisões comprometidas com as opções do programa, tendo sempre em mente que não se pode ter o melhor de todos os mundos. Nas actividades de concepção, como na vida, nunca se consegue proceder à optimização simultânea de todos os objectivos porque, muitas vezes, são contraditórios. No princípio do século XX, as embarcações de recreio e as traineiras de pesca tinham o centro de flutuação muito próximo da secção mestra, localizando-se, às vezes, para vante do plano transversal que a contem. Hoje, isso não se verifica e muito menos nas embarcações planantes mas, neste último caso, Pag. 24


há exigências de ordem técnico-científica para que tal aconteça. Já falámos disso anteriormente e voltaremos a falar, com maior profundidade. Contudo, é preciso ter presente que, nas embarcações modernas, a redução do peso dos materiais de construção e dos motores tornou menos favorável a relação entre o peso dos tripulantes, dos passageiros e de todas as outras coisas que não estão permanentemente a bordo e o peso da embarcação e dos equipamentos fixos. Nos barcos antigos, a partir de certas dimensões, a influência dos itens móveis era quase irrelevante para a variação da horizontalidade e da posição do seu centro de gravidade. Agora, quando se concebe uma embarcação de dimensões médias é preciso ter um cuidado acrescido com a distribuição dos pesos, facto que influencia significativamente o arranjo do seu interior. Veremos adiante, quando falarmos do metacentro, como as posições do centro de flutuação e do centro de gravidade variam quando o barco é solicitado por acções externas e pela movimentação de objectos e de pessoas no seu interior. E aprenderemos como isso pode afectar a estabilidade do flutuador, para o bem e para o mal. É uma evidência que as embarcações de um só casco (e a maior parte dos multicascos) são simétricas em relação ao plano longitudinal, por vezes designado por diametral. Por esta razão, o centro de flutuação fica contido nele. Como já aprendemos a determinar a posição longitudinal do referido ponto, se nos interessar fixar a sua posição no espaço tridimensional relativamente a um sistema de eixos ortogonais, basta-nos conhecer a sua altura relativamente à linha de flutuação de referência (neste caso usaremos a linha -2). Para esse efeito teremos de dividir a querena (obras vivas) num número impar de linhas de água, equidistantes, e medir seguidamente as suas meias áreas. Na figura 2 estão representadas cinco linhas de água, (incluindo a linha 0) que dividem verticalmente as obras vivas em quatro intervalos iguais. Vamos determinar, de seguida, as respectivas superfícies e repetir as mesmas operações que fizemos para cálculo do deslocamento e da posição longitudinal do centro de flutuação.

LA

A/2 (dm2)

×

V

×

F

0

452,50

1

452,50

2

+905,00

-1

294,12

4

1176,48

1

+1176,48

-2

120,26

2

240,52

0

0,00

-3

51,45

4

205,80

1

-205,80

-4

19,80

1

19,80

2

-39,60

∑ a = 2095,10 Distância entre linhas de água:

∑b

+2081,48 -245,40 ∑ bt = +1836,08

d = 2,5 dm

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Cálculo do volume submerso: V 

2 a d 2  2095,10  2,50  V  V = 3491,833 dm3 3 3

O valor encontrado para o volume submerso é inferior em cerca de 50 dm3 (1,5%) ao que foi obtido a partir das secções transversais, facto que nos permite concluir que os cálculos realizados não apresentam erros significativos. No entanto, o número reduzido de linhas de água e de secções transversais que utilizámos para explicar o método e, bem assim, a escala muito pequena que foi usada para a execução dos desenhos justificariam a ocorrência de erros maiores. Variações da ordem dos 5% no cálculo do volume submerso, usando as secções transversais e as linhas de flutuação, são perfeitamente toleráveis. Para não correr o risco de que alguns leitores, mais cépticos, fiquem convencidos que houve alguma batota da minha parte direi, apenas, que o que é verdadeiramente relevante neste momento é a aprendizagem do processo. Haverá, no futuro, muitas oportunidades para testar o rigor de execução de desenhos e de medição das áreas, sempre que se usarem escalas de apresentação compatíveis com as dimensões da embarcação e se recorrer ao planímetro polar. Continuemos, pois. Cálculo da posição vertical do centro de flutuação (com referência à linha de água -2):

Fv 

 bt  d 1836,08  2,50  F   Fv = 2,19 dm, acima da linha -2, por ser um valor positivo. v a 2095,10 

Não suscita um grande interesse, nem é prática corrente, representar a curva de áreas correspondente às linhas de água. Contudo, para que se fique com uma ideia da distribuição vertical do volume submerso, no presente caso, fiz a sua indicação à esquerda das secções transversais. Para a execução da referida curva utilizei os valores obtidos na medição das superfícies das linhas de água, recorrendo a uma escala conveniente, tal como tinha feito quando desenhei a primeira curva das áreas. Também aqui, a recta que contem o centro de flutuação divide a figura em duas partes geometricamente (muito) diferentes, das quais estamos em condições de assegurar a igualdade das suas áreas. Em termos de modelo físico, podemos afirmar que o centro de gravidade de um corpo, ou de um conjunto de corpos, é o ponto por onde passa a resultante dos vectores que representam as várias forças ponderais do corpo, ou do conjunto. Se estiver em causa um objecto rígido, por exemplo, uma viga metálica de secção variável, diremos que ela fica equilibrada quando a apoiarmos num fulcro cuja aresta pertence ao plano que contem o centro de gravidade. Vê-se, imediatamente, que estamos a lidar com momentos, à esquerda e à direita dessa linha de apoio, isto é, com produtos de forças ponderais por distâncias ao plano que contem o centro de gravidade. Se colocarmos um objecto com o peso de um quilograma sobre o lado direito da viga, à distância de um metro do centro de gravidade, e se só

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dispusermos de outro objecto com meio quilograma de peso, para restabelecermos o equilíbrio perdido teremos, obviamente, de pousa-lo a dois metros de distância, para o lado esquerdo. md = 1 kg x 1 m = 1 kg.m me = 0,5 kg x 2 m = 1 kg.m md = me Para determinarmos a localização do centro de gravidade de um conjunto tão complexo como é um barco, com todo o seu equipamento, os tripulantes e tudo o que estes transportam para bordo, é preciso conhecer o centro de gravidade de cada um desses itens e, naturalmente, o seu peso. Na prática, é normal fixar a posição de muitos desses centros de gravidade, por estimativa, com base em dados da experiência, a não ser quando os objectos em questão tem pesos muito elevados, como é o caso de certos equipamentos metálicos, dos motores, dos tanques de combustível que lhes estão associados e dos depósitos de água, quando estamos a lidar com embarcações de dimensões apreciáveis. Há tabelas técnicas e catálogos de fabricantes que nos podem fornecer informações preciosas, no que se refere a massas volúmicas dos materiais, ao peso dos equipamentos e, até, à localização dos centros de gravidade. Se tivermos algum cuidado na avaliação que levarmos a cabo, o resultado final acabará por ficar muito próximo da realidade, já que é provável que os erros eventualmente cometidos não ocorram todos no mesmo sentido, o que faz com que se anulem mutua e tendencialmente. É interessante pensar um pouco, neste momento, nos problemas que se colocam ao projectista quando pretende localizar objectos cujo peso varia consideravelmente durante uma viagem, como é o caso dos tanques de combustível. A desatenção a esta questão pode levar a que, durante um longo percurso, ocorram alterações na horizontalidade das embarcações, com efeitos negativos na sua performance e, até, na segurança. A distribuição do combustível por vários tanques, criteriosamente implantados, e/ou a sua localização nas proximidades do centro de gravidade, permitem obviar ao inconveniente a que referi. Contudo, devemos ter sempre presente a noção de que, com o desenho do plano geométrico, fixámos definitivamente o centro de flutuação, decisão que nos obriga a distribuir os pesos de tal modo que o centro de gravidade se situe na vertical que contem esse ponto. Por esta razão, não é de bom senso terminar o arranjo interior da embarcação, sem deixar uma margem de manobra para a ocasional deslocação de alguns itens bastante pesados, como pode ser o caso dos motores, ou do lastro, nas embarcações que o usam. Na sequência do que já foi dito anteriormente a propósito dos tanques de combustível (ou dos depósitos de água), estes não devem ser usados para ajustamentos de última hora, por causa das variações de peso, em função do combustível (ou da água) que contêm. O desenho do interior das embarcações está condicionado pela funcionalidade, pela segurança, pelo conforto dos ocupantes e pelo imperativo de distribuir os pesos de modo a que o centro de gravidade fique localizado onde é preciso que esteja. Trata-se, como é óbvio, de um processo iterativo, que não é tão complicado

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como pode parecer à primeira vista. A sua resolução é facilitada pela análise de exemplos bem sucedidos e pela experiência que se adquire com o treino e o tempo. Vamos agora estudar os modos como se calcula a mudança de imersão e de caimento da embarcação, quando se constata que ela não repousa no plano de flutuação para que foi concebida e se pretende que tal facto se verifique. Compreende-se que, se a imersão é superior à prevista, isso significa que o conjunto ficou mais pesado do que era pretendido. Nesta situação pouco haverá a fazer, porque é provável que não seja possível retirar equipamento de bordo, até ao ponto em que o deslocamento acabe por atingir o valor projectado. Teremos, em geral, de assumir o novo deslocamento e as consequências que daí resultam. Mas nem todas serão negativas, embora fique evidente que o aumento do peso e, consequentemente, da superfície molhada afectarão negativamente a velocidade do barco. É claro que este inconveniente será muito mais grave em certos tipos de embarcações, como facilmente se conclui depois do que ficou dito para traz. Se estamos a lidar com um barco a motor, do tipo planante, já sabemos que teremos de respeitar o limite de peso imposto pela potência efectiva dos motores que foram instalados. Se esse limite for ultrapassado o barco nunca atingirá uma velocidade que lhe permita planar e comportar-se-á como um barco de deslocamento, situação que vai colocar o projectista numa posição pouco confortável perante quem lhe fez a encomenda, tanto mais que essa pessoa e os seus convidados serão obrigados a sofrer todos os inconvenientes de desconforto e de insegurança que resultam da localização recuada dos centros de flutuação e de gravidade, sem qualquer vantagem visível. Se pretendemos determinar um número que nos indique de quantos quilogramas precisamos para baixar ou elevar o plano de flutuação de um ou dois centímetros, calculamos a área de flutuação, usando a primeira regra de Simpson, e multiplicamos o valor obtido pela altura que está em causa (1 ou 2 cm). Como as embarcações de que nos estamos a ocupar, com raras excepções, não tem as bordas verticais e, portanto, paralelas, o processo que estamos a usar está longe de ser correcto. Mas, para o nível de rigor pretendido neste género de operação, a aproximação é suficiente, desde que a variação da altura da linha de água não ultrapasse dois ou três centímetros. Para valores maiores será necessário ter em devida conta o aumento ou a redução da área de flutuação que resulta do aumento do deslocamento ou da sua redução, respectivamente. Aproveitando o exemplo da figura 2, de que nos temos servido para exemplificar os cálculos, vamos medir, em cada secção transversal, ao nível da flutuação a que corresponde a linha de água 0, a distância que vai da superfície exterior do casco à recta que representa o plano diametral e inscrever os valores obtidos na tabela já nossa conhecida.

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Sn

l (dm)

×

A

0

0,00

1

0,00

1

4,30

4

17,20

2

7,60

2

15,20

3

9,80

4

39,20

4

10,95

2

21,90

5

9,25

4

37,00

6

0,00

1

0,00 ∑ a = 130,50

Distância entre secções transversais, medida no plano geométrico:

Cálculo da área de flutuação: A 

d = 10,0 dm

2 ad 2  130 ,5  10,0  A  A = 870 dm2 3 3

Cálculo aproximado do volume deslocado com 2 cm de imersão: V = 870 x 0,2  V = 174 dm3 Estando em causa uma embarcação que se desloca em águas salgadas, cuja densidade aproximada já conhecemos, é fácil determinar imediatamente a variação de deslocamento que está envolvida na operação: P = 174 x 1,026  P = 178,5 kg Ficamos a saber que, se levarmos para bordo uma carga de 178,5 kg, a embarcação afunda uniformemente 2 cm, desde que a distribuição dos objectos seja de tal modo que o centro de gravidade do conjunto se mantenha na vertical do centro de gravidade da embarcação. No caso em que essa exigência não fique respeitada, haverá diferença de imersão entre a proa e a popa, situação que podemos explorar para corrigir qualquer erro de projecto ou de construção. Como é fácil de perceber, não temos vindo a considerar problemas relacionados com o equilíbrio transversal das embarcações, porque são coisas que se colocam com menor frequência, embora certos erros bastante comuns na concepção do arranjo interior possam conduzir a que a embarcação flutue inclinada para bombordo ou para estibordo. No entanto, as situações mais graves são as que dizem respeito ao equilíbrio longitudinal e é por esse motivo que também se deve saber como resolver um problema destes. Vamos recorrer a um método aproximado, porque é o que se costuma fazer quando estão em causa embarcações de recreio e, também, porque um método mais preciso implicaria o conhecimento, neste momento, da posição do centro de gravidade e do que são os metacentros e dos processos de cálculo para a sua localização, de que só falaremos adiante. Para efeitos práticos, é Pag. 29


costume assumir que a altura metacêntrica longitudinal, que é como quem diz, a distância do centro de gravidade ao metacentro longitudinal, é igual ao comprimento da linha de flutuação que corresponde ao deslocamento que se está a considerar. Uma vez assumida esta simplificação, já podemos determinar a quantidade de quilogramas por decímetro (kg.dm) que é necessária para corrigir um determinado caimento. A questão do equilíbrio longitudinal, isto é, da correcção de um caimento para a popa e para a proa, leva-nos a falar, mais uma vez, de momentos. Não podemos esquecer que um caimento de dois centímetros significa que a variação é de um centímetro em cada extremo, a não ser que se trate de uma embarcação planante que, como já foi referido, tem muito mais flutuação à popa e, consequentemente, os seus centros de flutuação e de gravidade estão muito recuados. O que temos de ter presente na nossa mente é que a correcção do caimento resulta da soma das duas correcções, à proa e à popa, podendo as mesmas ser iguais ou diferentes, em valores absolutos, porque em valores relativos só podem ser de sinais contrários.

Momento para equilibrar longitudinalmente um centímetro: m 

D  GM L  10

Foi dito anteriormente que não cometemos um grande erro se assumirmos que GM = L, isto é, que a altura metacêntrica longitudinal é igual ao comprimento da linha de água. Nessa ordem de ideias, teremos:

m

D 10

É evidente que se estiver em causa uma correcção de três centímetros teremos de triplicar o valor obtido, e assim por diante. A embarcação que nos tem vindo a servir para exemplificar a teoria tem um deslocamento aproximado de 3637 kg, se considerarmos que o desenho se refere a um barco que vai ser utilizado em água salgada. Se, quando ele flutuar em repouso, constatarmos que está caído para a popa de três centímetros (1,5 + 1,5), por exemplo, sabemos que precisamos de um momento de 1140 kg.dm para corrigir esta falha.

Senão vejamos: m3cm  

3637  3  m3cm   363,7  3  m(3cm) = 1091 kg.dm. 10

Na eventualidade de existir algum lastro móvel no interior da embarcação, facto que é comum em embarcações deste género, podemos deslocá-lo em direcção à proa de uma distância suficiente, para o efeito. Suponhamos que o lastro móvel de que dispomos é de 2% do deslocamento, isto é, de cerca de

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70 kg de lingotes de chumbo. Neste caso teremos de deslocá-los horizontalmente de um pouco mais do que 1,50 m em direcção à proa, como se constata através deste simples cálculo: 1091 ÷ 70 = 15,58 dm = 1,56 m Vamos admitir que, ao calcularmos o centro de gravidade da embarcação, na fase de projecto, constatamos que o referido ponto está recuado de cerca de 0,5 dm em relação ao centro de flutuação. Sabendo que o seu deslocamento é de 3637 kg, precisamos de reposicionar um ou mais itens, de modo a que se consiga um momento de 1818 kg.dm (3637 x 0,5), para que o centro de gravidade fique na vertical do centro de flutuação. Se tivéssemos previsto instalar a bordo um motor auxiliar cujo peso, de acordo com dados do catálogo, seria de 308 kg, dividiríamos o momento de 1818 kg.dm pelo peso do motor, chegando, assim, a saber a distância a que é preciso deslocá-lo para atingir o desiderato pretendido: 1818 ÷ 308 = 5,90 dm = 0,59 m Sendo viável o reposicionamento do motor, deslocá-lo-íamos de 59 cm, na direcção da proa, e ficaríamos com o nosso problema resolvido. No caso contrário, teríamos de procurar outros itens e fazer os cálculos necessários, até que conseguíssemos levar o centro de gravidade ao ponto onde deve estar. Através da anterior discussão ficámos a saber que, para se conseguir equilibrar um barco cujo caimento não está certo, teremos de reposicionar o lastro ou parte do equipamento. Também é possível conseguir esse efeito adicionando lastro ou retirando equipamento, soluções que, como se percebe, não são geralmente aconselháveis, pelos inconvenientes que podem provocar. Em última análise, se a situação for verdadeiramente complicada, pode ter de se recorrer a uma solução drástica, que é o redesenho das linhas para que o centro de flutuação se desloque para a vertical do centro de gravidade. Será um percurso inverso daqueles que propusemos e, obviamente, muito mais trabalhoso, pois é mais do que provável que a solução definitiva não seja encontrada à primeira tentativa. Voltando à questão da determinação do peso de uma embarcação na fase de projecto, é quase certo que o grau de rigor exigido pode levar-nos à execução de um trabalho enfadonho e demorado. O resultado final ficará a depender do conhecimento que possuirmos do peso de cada item. Faço notar que os materiais e os métodos utilizados na fabricação dos cascos e das superstruturas também influenciam, em certa medida, a quantidade de trabalho a fazer. A propósito, é o que se passa com a construção tradicional em madeira, em que centenas de pequenas peças ligadas por parafusos e pregos, podem implicar um esforço de medição e de cálculo para o qual não estamos disponíveis. Um bom exemplo do que estou a procurar mostrar pode ser apreciado nas páginas 308 a 315 do livro indicado na bibliografia, Skene’s Elements of Yacht Design (8ª edição), cujo autor preparou este trabalho como suporte da Pag. 31


construção do seu iate Pipe Dream, em madeira, com base em métodos tradicionais. Chamo a atenção para o facto de que o cálculo dos momento só é feito segundo as direcções vertical e longitudinal, deixando de lado a direcção transversal por não a considerar relevante neste caso. Só para dar uma ideia da dimensão da tarefa com que nos defrontaremos, refiro agora um exemplo que aparece num conhecido livro de dois autores suecos (ver a bibliografia), a propósito de uma embarcação à vela, com motor auxiliar, de doze metros de comprimento total, a construir em resinas plásticas reforçadas a fibra de vidro. Neste caso, o trabalho de avaliação dos pesos foi feito a partir da divisão do conjunto em catorze grandes grupos, assim identificados: 

Estrutura, zona da proa, cabina da proa, salão, estação de navegação, cozinha, instalações sanitárias, cabina da popa, poço e zona da popa, instalações mecânicas, equipamento do tombadilho, armamento e velas, lastro e, finalmente, tripulação, consumíveis e equipamento avulso.

Constatamos que os critérios utilizados na designação dos grupos não correspondem a uma visão homogénea do artefacto, mas o que é relevante nesta tarefa é estabelecer uma grelha que não deixe escapar nada de verdadeiramente significativo, independentemente do seu rigor conceptual. Na sequência deste trabalho inicial, cada um dos grupos a que me referi antes foi subsequentemente dividido em elementos mais pequenos, totalizando cerca de duas centenas. A cada um dos elementos da lista foi atribuído um peso, por conhecimento ou estimativa, sendo definida a localização do seu centro de gravidade segundo três direcções ortogonais, de acordo com a seguinte metodologia: 1.

Distância longitudinal, a partir da secção extrema da linha de flutuação do lado da proa, atribuindo valores positivos na direcção da popa e negativos na direcção contrária;

2.

Distância transversal, a partir do plano diametral, atribuindo valores positivos para estibordo e negativos para bombordo;

3.

Distância vertical, a partir do plano de flutuação de referência, atribuindo valores positivos para cima desse plano e negativos para baixo.

Após a construção da tabela, procedeu-se à determinação dos totais parciais, para cada um dos grupos e, subsequentemente, dos totais gerais, o que permitiu comparar o peso do conjunto assim obtido com o deslocamento da embarcação calculado inicialmente e, bem assim, localizar com rigor o centro de gravidade, obrigatoriamente situado na vertical do centro de flutuação. Pelo meio ficaram alguns exercícios de ajustamento do volume e da posição do lastro, o qual, com o barco a meia carga, acabou por atingir a significativa percentagem de 40% do deslocamento, valor perfeitamente aceitável numa embarcação com o programa pretendido. Deslocamento a meia carga = 8,12 toneladas; Lastro = 3,25 toneladas. Pag. 32


Oportunamente, se houver condições para isso, quando apresentar o projecto de uma das embarcações que mostrarei na parte final da obra, será feita a computação dos pesos e da localização do centro de gravidade, segundo critérios de arrumação e de diferenciação algo diferentes dos que citei e muito mais simples. Faço notar que é o nosso conhecimento da embarcação, das técnicas e dos materiais de construção, e dos seus equipamentos que deve orientar a escolha do método e a divisão em grupos e subgrupos, tendo sempre presente o princípio do menor esforço. Tal como já referi antes, não vale a pena perder tempo a fazer cálculos e medições, se os resultados a obter não são fiáveis (porque se desconhecem variáveis importantes), ou são devidos a um excesso de rigor, incompatível com o nível de aproximação de que somos capazes. Não é o facto de se fazerem muitas contas que torna o nosso projecto globalmente melhor. Os recursos matemáticos são um meio de que dispomos para serem utilizados com bom senso e parcimónia, sendo um sinal de inteligência e de lucidez a adopção de uma atitude permanente de desconfiança perante resultados absurdos ou insólitos, que se afastam da norma.

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IV. METACENTRO, ALTURA METACÊNTRICA E RAIO METACÊNTRICO. MOMENTO ENDIREITANTE E MOMENTO INCLINANTE. RELAÇÕES E COEFICIENTES COMPARATIVOS. CONSTANTES DE FORMA. Não é fácil compreender, de imediato, os efeitos conjugados das grandezas físicas que concorrem para a estabilidade dos flutuadores, em geral, e das embarcações, em particular, a não ser quando acontece que o seu centro de gravidade se situa abaixo do centro de flutuação, na recta vertical que une os dois pontos. Ora esta condição raramente se verifica. Consideremos o cilindro de material homogéneo cuja secção se encontra representada no lado esquerdo do topo da figura 8 (cilindro A) e, bem assim, o cilindro seguinte, do lado direito, constituído por três partes de duas substâncias de diferentes densidades (cilindro B). É fácil de concluir que o centro de gravidade coincide com o centro geométrico, em ambos os casos, enquanto que o centro de flutuação está muito abaixo deste ponto, no local correspondente ao centro de gravidade do volume do líquido que foi deslocado quando nele se mergulharam os referidos sólidos. Esta é uma situação em que o equilíbrio do flutuador se designa por indiferente. Se fizermos rodar o cilindro em torno do seu eixo longitudinal verificamos que ele se imobiliza ao fim de algum tempo, por acção do atrito, mantendo-se nessa posição até que, sob o efeito de uma qualquer força exterior, seja posto novamente em movimento. O centro de rotação destes objectos coincide com o seu centro de gravidade, como facilmente se compreende. O mesmo já não se verifica com o cilindro C (representado em duas posições diferentes), que é constituído por duas partes de substâncias diferentes, em que a menor é muito mais densa. A primeira posição corresponde a uma situação de equilíbrio instável, ao passo que a segunda diz respeito a outra de equilíbrio estável. Já o mesmo se não verifica com os prismas quadrangulares, de diferentes densidades, representados na parte inferior da figura. Como eles são homogéneos, os seus centros de gravidade coincidem com os respectivos centros geométricos. Mas os centros de rotação (os pontos M) encontram-se em várias posições que dependem do peso dos flutuadores e da sua geometria. Antes de qualquer outra consideração é preciso dizer que esses pontos se designam por metacentros e que, no caso das embarcações (e da maior parte dos flutuadores), só permanecem fixos quando estão em causa ângulos de inclinação infinitamente pequenos, relativamente às posições estáveis. Como facilmente se percebe, a cada inclinação do plano de rotação de um flutuador, corresponde um metacentro. No que diz respeito à teoria que sustenta este estudo, por razões de ordem prática, só nos interessam dois conjuntos de metacentros particularmente importantes, os transversais e os longitudinais.

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Já é do nosso conhecimento que um barco se pode inclinar em todas as direcções, pela acção de forças externas ou pelo deslocamento de pesos no seu interior. Por razões de simplificação é comum fazer-se a análise desses movimentos segundo duas direcções principais, a longitudinal e a transversal. Também nos dá bastante jeito considerar essas inclinações como independentes e, embora tal assumpção não seja rigorosamente verdadeira, é assim que os textos de arquitectura naval costumam apresentar o tema. Seguindo a prática dos referidos textos vamos começar por abordar as questões relacionadas com a estabilidade transversal e, consequentemente, por caracterizar adequadamente o conjunto de metacentros que lhe corresponde, os metacentros transversais. No caso em que, por acção do vento, das ondas, da movimentação de objectos pesados no interior da embarcação, ou de quaisquer outros factores pertinentes que não afectem o deslocamento, uma embarcação adorna de um determinado ângulo α, passando do plano de flutuação F L para o plano F’L’, constatamos que o valor do volume imerso não se altera e que o princípio de Arquimedes continua a vigorar. Os vectores do peso (P) e da impulsão (I) permanecem iguais em valor absoluto, com direcção vertical e sentidos contrários. Contudo, o centro de flutuação C desloca-se da sua posição inicial para a posição C’, em direcção ao bordo que fica mais próximo da superfície da água. Observemos cuidadosamente os desenhos esquemáticos que se situam na parte superior da figura 7. As cunhas FOF’ e LOL’, que se prolongam a todo o comprimento do casco, são designadas por cunha emersa e cunha imersa, respectivamente. O ponto Mα, determinado pela intersecção da vertical que passa pelo novo centro de flutuação C’ com a recta que contem o centro de flutuação inicial C, e o centro de gravidade G, é designado por metacentro (do ângulo α). O segmento que liga o centro de gravidade ao metacentro chama-se altura metacêntrica (GMα = r - a) e o que liga o centro de flutuação ao metacentro designa-se por raio metacêntrico (FMα = r). A distância que vai do centro de gravidade à vertical que passa pelo novo centro de flutuação C’ é conhecida como braço endireitante (GZ). Como se pode concluir facilmente, sendo iguais e opostos os vectores do peso e da impulsão, formam um binário cujo valor é equivalente ao produto do deslocamento por GZ. Designamos esta quantidade por momento endireitante:

m = P x GZ.

Se construirmos uma curva, num sistema de dois eixos coordenados ortogonais, em que inscrevemos no eixo vertical os valores do momento endireitante correspondentes aos diferentes ângulos de inclinação e no eixo horizontal os referidos ângulos, teremos uma representação da curva da estabilidade estática. A área que fica subtendida à curva, até um determinado ângulo, representa o trabalho que foi produzido para que a embarcação se incline até esse ponto e equivale à estabilidade dinâmica correspondente.

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Retomando a expressão do momento endireitante, vamos reescrevê-la do seguinte modo: m = P.(r-a).sen α Já vimos que o segmento (r-a) se designa por altura metacêntrica. Podemos acrescentar que o produto P (r-a) se chama de coeficiente de estabilidade transversal. O valor de “a” está dependente da posição do centro de gravidade da embarcação e é tanto menor quanto mais baixo se situar o referido centro. Quanto ao valor de r, é fácil compreender que depende essencialmente da forma da querena. Se esta tiver formas cheias ele será, obviamente, maior do que no caso de ela ser fina (ver, para o efeito, os três desenhos da figura nº 9). Ainda podemos apresentar a fórmula anterior de uma maneira diferente. Vejamos: m = (P.r.sen α) – (P.a.sen α) Designa-se o primeiro termo da diferença por binário de estabilidade da forma e o segundo por binário de estabilidade do peso. Sendo certo que, em quase todos os barcos, o centro de flutuação está posicionado abaixo do centro de gravidade, diz-se que o primeiro binário é endireitante e o segundo inclinante. Mas, nas embarcações à vela fortemente lastradas, o centro de gravidade localiza-se, por vezes, abaixo do centro de flutuação, situação em que o segmento “a” passa a ter sinal negativo. Neste caso será: m = (P.r.sen α) – (P. (–a).sen α)  m = (P.r.sen α) + (P.a.sen α) É fácil de compreender que, nesta situação particular, ambos os termos da expressão anterior contribuem para reconduzir o flutuador à posição inicial, contrariamente ao que acontece quando o centro de gravidade está localizado acima do centro de flutuação. Há várias maneiras, algumas das quais bastante elaboradas, de explicar o conceito de metacentro. A que vamos aprender é, a meu ver, adequada para o nível científico e matemático que esta obra pressupõe. Voltemos, então, aos desenhos da figura 7. Seja V o volume total submerso, v o volume de cada uma das cunhas (imersa e emersa), g e g’ os respectivos centros de gravidade e δ a densidade da água. Verificando-se que a impulsão, na embarcação inclinada, é igual à impulsão inicial, embora passe pelo novo centro de flutuação, vamos considerar as seguintes grandezas vectoriais:

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I = V.δ, aplicada em C quando a embarcação está horizontal e em C’ quando está inclinada; i = v.δ, aplicada em g e em g’, após a inclinação. Tendo em atenção que o ângulo α é muito pequeno e tende para zero, podemos assumir, sem cometer erros significativos, que: sen  =  (radianos)  cos  = cos  /2 = 1

Na sequência destas assunções simplificativas vamos escrever a expressão dos momentos dos vectores da impulsão a respeito do eixo longitudinal, considerando o seu sentido, a sua distância ao eixo e as suas posições relativas, antes e depois de a embarcação estar inclinada. Igualaremos as resultantes, uma vez que não se verificou alteração no deslocamento (peso e volume da água deslodada): V.δ.c = v.δ.d + v.δ.d – V.δ.b  V.b + V.c = v.d + v.d  V.(b + c) = v.(2.d)  b + c = (2.d.v) ÷ V

b + c = CM  sen

Atendendo a que:

e

2.d = gg  cos  2 ,

porque, como antes referimos, estão em causa ângulos muito pequenos, tendendo para zero, teremos:

CM   sen  

v  gg   cos  2 V

CM 

v  gg , V

em que (v.gg’) representa o momento do volume das duas cunhas em relação ao eixo de rotação coincidente com o eixo longitudinal. Recorrendo, agora, aos desenhos situados na parte inferior da figura 7, verificamos que o volume da cunha elementar é:

dv 

y  dx  z , com z = y.sen α 2

e, consequentemente, z = y.α,

teremos

dv 

 2  y  dx 2

O momento elementar é, então: dm = dv.2/3y, em que (2/3y) é a distância do baricentro da cunha elementar ao eixo de rotação. Substituindo a expressão de dv nesta última, teremos:

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dm 

1    y 3  dx 3

Procedendo à integração, teremos a expressão do momento total de uma cunha: Para as duas cunhas será:

m = 1/3.α.∫ y3.dx

2m = 2/3.α.∫ y3.dx

Como 2m  v  gg  e o momento de inércia da superfície de flutuação relativamente ao eixo de rotação (It) é igual a 2/3.∫ y3.dx, teremos: 2m = α.It

CM 

  It I  CM  t V V

ou

r = It/V

O raio metacêntrico transversal é equivalente ao quociente entre o momento de inércia da área de flutuação (relativamente ao eixo longitudinal) e o volume da querena. Conclui-se desta relação que o valor do raio metacêntrico só depende da geometria das obras vivas, que o mesmo é dizer que, para um determinado deslocamento e para a mesma superfície de flutuação, o raio metacêntrico será tanto maior quanto maior for o momento de inércia (It), ou seja, quanto mais curta e mais larga for a embarcação. Nos casos em que a superfície de flutuação se anula, como acontece, por exemplo, com os submarinos quando estão totalmente submersos, o momento de inércia e o raio metacêntrico também se anulam, pelo que o metacentro e o centro de flutuação coincidem. Por causa das formas dos cascos das embarcações de recreio com que lidamos habitualmente, só para pequenos ângulos de inclinação é que a intersecção das duas flutuações, a horizontal e a inclinada, coincide com o eixo longitudinal. Quando o ângulo começa a atingir valores significativos (acima dos 7º) deixa de se verificar essa condição e o cálculo dos braços de alavanca (GZ) tem de processar-se de modo a que se tome em devida conta o facto de as flutuações inclinadas terem de corresponder, obviamente, a um deslocamento igual ao que foi inicialmente calculado. A parte imersa do casco correspondente a cada uma das inclinações deve ter o mesmo volume que todas as outras. Diz-se, em arquitectura naval, que as obras vivas que obedecem a este imperativo são isoquerenas. Sendo certo que um cálculo de estabilidade completo deve fazer-se para intervalos de 10º, 15º, 20º ou 30º de inclinação, até que se atinjam 60º, 100º ou ainda mais graus de inclinação, dependendo do tipo e das condições de utilização da embarcação, facilmente se compreende que há muito trabalho de cálculo e de medição a fazer, até que estejam disponíveis os dados necessários para o desenho da curva dos momentos endireitantes. Faremos, oportunamente, uma aplicação prática deste conjunto de cálculos.

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Aproveitando a embarcação da figura 2 e algumas medições anteriormente efectuadas vamos calcular o momento de inércia transversal (It) da sua superfície de flutuação. Tratando-se de uma superfície irregular, não nos é possível recorrer a tabelas técnicas para obtermos o resultado. Utilizaremos, mais uma vez, a primeira regra de Simpson e o conceito de momento de inércia de uma superfície, relativamente a um eixo, que já conhecemos da física. Construímos a tabela da maneira que se expõe a seguir. Na primeira coluna indicamos os números de referência das secções transversais, como já fizemos noutras oportunidades, na segunda coluna colocamos as distâncias entre o eixo longitudinal e os extremos da linha de flutuação, em cada secção transversal, tal como fizemos quando procedemos aos cálculos relativos às variações de imersão; na terceira coluna colocamos os cubos das distâncias que antes tínhamos escrito na segunda coluna; na quarta coluna escrevemos os nossos conhecidos multiplicadores de Simpson e na quinta coluna colocamos os resultados dos produtos dos cubos das distâncias pelos multiplicadores. Fazendo a soma dos valores da última coluna, multiplicando por dois, para termos a superfície de flutuação completa (e não apenas metade) e, ainda, pelo terço do intervalo entre secções, chegamos a um valor que, de acordo com a teoria, tem de ser, ainda, dividido novamente por três, para chegarmos ao resultado final. Sn 0 1 2 3 4 5 6

It 

2  d  3    i t 3

l (dm) 0,00 4,30 7,60 9,80 10,95 9,25 0,00

 I  t

l3 (dm3) 0,00 79,51 438,98 964,43 1312,93 791,45 0,00

× 1 4 2 4 2 4 1

I 0,00 318,04 877,96 3857,72 2625,86 3165,80 0,00 ∑ It = 10845,38

2  10,0  3  10845 ,38  It = 24100,84 dm4 3

No cálculo do volume submerso e do deslocamento, a partir das áreas das secções transversais determinámos oportunamente que: V = 3545,967 dm3. Substituindo estes valores numéricos na expressão CMα = It ÷ V, teremos: CMα = 24100,84 ÷ 3545,967  CMα = 6,8 dm,

ou

r = 6,8 dm

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Quando está em causa o cálculo da posição do metacentro longitudinal, o eixo deve ser transversal e passar pelo centro geométrico da superfície, o que também acontece com o eixo longitudinal. Mas neste último caso verifica-se simetria relativamente ao eixo longitudinal, o que garante que o referido centro está contido no eixo, não sendo preciso determiná-lo. Estando identificados, neste momento, com a teoria que sustenta a determinação dos raios metacêntricos, vamos aplicá-la ao cálculo do raio metacêntrico longitudinal, com vista à localização correcta do metacentro longitudinal. Quando, mais tarde, conhecermos a posição do centro de gravidade, já podemos efectuar cálculos do caimento sem necessidade de recorrermos à simplificação que assumimos anteriormente, de considerarmos que a altura metacêntrica longitudinal é aproximadamente equivalente ao comprimento da linha de flutuação. A verdade é que essa simplificação é aceitável nas fases iniciais da concepção mas, em certos tipos de embarcações, dá origem a diferenças que convém evitar. Vamos, então, proceder ao cálculo do momento de inércia longitudinal da embarcação que temos vindo a utilizar. A primeira coisa a fazer é determinar a posição do centro geométrico da superfície de flutuação, pois o que está em causa, tal como aconteceu com o momento de inércia transversal, é a determinação de um momento de inércia relativamente a um eixo que passa por esse centro e é perpendicular ao eixo longitudinal. Vamos copiar a tabela construída para o cálculo das variações da imersão, completando-a com mais duas colunas, o que nos permitem posicionar o referido centro.

Sn

l (dm)

×

a (dm)

×

G

0

0,00

1

0,00

3

0,00

1

4,30

4

17,20

2

34,40

2

7,60

2

15,20

1

15,20

3

9,80

4

39,20

0

0,00

4

10,95

2

21,90

1

21,90

5

9,25

4

37,00

2

74,00

6

0,00

1

0,00

3

0,00

∑ a = 130,50 Distância entre secções transversais, medida no plano geométrico:

G

d  gt a

 G

∑g

49,60

-95,90 ∑ gt = -46,3 d = 10,0 dm

10,0   46,3  G = -3,5 dm (a partir da secção mestra, na direcção da popa, por 130,5

ser um valor negativo)

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Para procedermos ao cálculo do momento de inércia vamos desenhar o eixo transversal que contem o centro geométrico e medir, sobre as rectas que representam as secções longitudinais na vista inferior da embarcação da figura 2, as distâncias desse eixo aos extremos da linha de flutuação, no sentido da popa e da proa (ver, para o efeito, a figura nº 2A). Esta operação dá-nos dois valores para cada secção, facto que ocorre pela primeira vez. Como vamos usar a regra de Simpson é preciso garantir a equidistância das referidas secções que, no nosso caso, são cinco, definindo quatro intervalos iguais. Já sabemos que, para atingirmos um rigor adequado, precisaríamos de mais alguns intervalos, mas o que se pretende, neste momento, é explicar o processo. Assumindo que é do conhecimento do leitor que o momento de inércia de duas superfícies é igual à soma dos momentos de cada uma, a respeito de um qualquer eixo, vou construir a tabela fazendo simultaneamente o cálculo das duas partes que estão unidas pelo eixo. Como ele passa pelo centro geométrico, cada uma das partes tem momentos de inércia iguais, mas usarei este processo como forma de verificação de erros eventuais e para aumentar o rigor. Quem estiver interessado pode somar alternadamente os valores da coluna final (coluna I). Verificará que, de facto, os resultados das duas somas não são iguais, quando deviam ser. Mas como a diferença é pouco importante (cerca de 5%) e o que nos interessa neste momento é aprender o método, passamos adiante. Assim teremos: Bn 0 0 1 1 2 2 3 3 4 4

l (dm) 26,50 33,50 25,60 28,13 24,00 21,50 20,87 14,00 7,63 9,38

L3 (dm3) 18610 37595 16777 22259 13824 9938 9090 2774 444 825

× 1 1 4 4 2 2 4 4 1 1

I 18610 37595 67108 89036 27648 19876 36360 10936 444 825 ∑ it = 308438

d = 2,5 dm

Il 

2  d  3   it 2  2,5  3   308438  Il   Il = 171354 dm4 3 3

O raio metacêntrico longitudinal vem a ser: Rl = Il ÷ V  Rl = 171354 ÷ 3546  Rl = 48,3 dm Sendo nossa conhecida a posição do centro de flutuação é fácil localizar o metacentro longitudinal, a partir do valor de Rl. Mas, como ainda desconhecemos a posição do centro de gravidade da embarcação, não nos é possível fazer o cálculo rigoroso do caimento. Contudo, estamos em presença de um tipo de embarcação bem conhecido, que nos permite assumir, desde já, que o seu lastro constituirá entre 35 e

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45% do deslocamento da embarcação. Nestas condições, o centro de gravidade fica muito próximo do centro de flutuação, podendo mesmo coincidir com ele. Se fosse esse o caso, teríamos a altura metacêntrica com o mesmo valor que o raio metacêntrico. Nesta ordem de ideias seria:

m

D  GMl  L  10 

 m

3637  48,3 60 10

(o valor de 3637, para o deslocamento, foi anteriormente calculado para água salgada) m = 292,78 kg.dm m (3cm) = 292,78 x 3  m (3cm) = 878 kg.dm O valor assim obtido é manifestamente inferior ao valor de 1091 kg.dm que obtivemos anteriormente, quando fizemos os cálculos simplificados. O recurso à movimentação de 70 kg de lastro, que foi considerado nos referidos cálculos, impunha uma mudança de posição de 1,56 m. Com o valor agora obtido verificamos que bastaria movimentar o lastro de 1,25 m para corrigirmos o caimento: 878 ÷ 70 = 12,5 dm = 1,25 m. As embarcações de recreio agrupam-se em vários tipos, de acordo com as funções denotadas, o mesmo acontecendo com outros tipos de embarcações e navios, principalmente no que diz respeito às obras vivas, que constituem a parte do flutuador que mais influencia as suas performances. A inovação formal verifica-se, na maior parte das situações, nas obras mortas e na superstrutura, quando esta existe, e corresponde à introdução de detalhes decorativos ou a pequenas variações da geometria que não afectam o conceito geral daquilo que se projecta. É por esta razão que, desde longa data, recorremos à comparação de relações dimensionais entre querenas do mesmo tipo, para verificarmos se o objecto que estamos a conceber se afasta excessivamente da norma. Trata-se de procurar analogias com querenas semelhantes, das quais já conhecemos o comportamento, no que se refere à estabilidade, à segurança e à velocidade. As grandezas lineares de superfície e de volume que é costume utilizar para determinar as relações e os coeficientes de que temos vindo a falar são as seguintes: 

Comprimento da linha de flutuação entre perpendiculares, na interface entre a água e o ar, que designaremos pela letra C;

Boca máxima na flutuação, correspondente à maior largura da linha de flutuação na interface entre a água e o ar, que designaremos pela letra L;

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Imersão média, medida a meio da distância entre perpendiculares, que designaremos por I (faço notar que, por causa da banalização do uso de apêndices isolados, como é o caso das quilhas e dos lemes de barbatana, a medição que hoje se faz da imersão impõe que se tomem determinados cuidados que apreciaremos ao estudarmos casos concretos);

Área da flutuação na interface entre a água e o ar, que designaremos por Ah;

Área da porção imersa da secção transversal que corresponde à boca máxima, que designaremos por At;

Área da porção imersa da secção longitudinal que contem o plano diametral (plano de abatimento), que designaremos por Al;

Volume de deslocamento correspondente à flutuação considerada, que designaremos por V.

Partindo destes valores dimensionais, é possível determinar várias relações, algumas das quais se utilizam com bastante frequência. As principais são as seguintes: a=C÷L

e

b=I÷L

Quanto aos coeficientes, habitualmente designados por coeficientes de adelgaçamento, há a considerar os seguintes: 

Coeficiente de adelgaçamento da flutuação, que corresponde ao quociente entre a área da flutuação e a área do rectângulo circunscrito (fineness coefficient): c1 = Ah ÷ (C x L)

Coeficiente de adelgaçamento da porção imersa da casa-mestra, que corresponde ao quociente entre a área da secção transversal que integra a boca máxima e a área do rectângulo circunscrito: c2 = At ÷ (L x I)

Coeficiente de adelgaçamento da porção imersa do plano de abatimento, que corresponde ao quociente entre a área da secção longitudinal que contem o plano diametral e a área do rectângulo circunscrito: c3 = A l ÷ (C x I)

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Coeficiente de adelgaçamento total da querena, que corresponde ao quociente entre o volume da querena (volume imerso do casco) e o volume do prisma rectangular circunscrito (block coefficient): c4 = V ÷ (C x L x I)

Coeficiente de adelgaçamento transversal da querena, que corresponde ao quociente entre o volume da querena e o volume do cilindro que tem por altura a boca máxima na flutuação e por secção recta a superfície do plano de abatimento: c5 = V ÷ (L x Al)

Coeficiente de adelgaçamento longitudinal da querena, que corresponde ao quociente entre o volume da querena e o volume do cilindro que tem por altura o comprimento da querena e por secção recta a porção imersa da secção transversal que integra a boca máxima (prismatic coefficient): c6 = V ÷ (C x At)

Coeficiente de adelgaçamento vertical da querena, que corresponde ao quociente entre o volume da querena e o volume do cilindro que tem por altura a imersão média e por secção recta a superfície de flutuação: c7 = V ÷ (I x Ah)

Tendo em atenção as definições anteriores dos vários coeficientes, é possível estabelecer as seguintes relações:

C5 = c4 ÷ c3;

c6 = c4 ÷ c2;

c7 = c4 ÷ c1.

Para além dos coeficientes que acabámos de estudar, (grandezas sem dimensões), costumamos recorrer a outros parâmetros numéricos que designamos por constantes da forma e que também servem para efeitos comparativos. Estas constantes são definidas das seguintes maneiras: p1 = C ÷ V1/3;

p2 = L ÷ V1/3;

p3 = I ÷ V1/3;

p4 = Ah ÷ V2/3;

p5 = At ÷ V2/3;

p6 = Sm ÷ V2/3.

Como é fácil de constatar, os quocientes em causa são, como os anteriores, valores sem dimensões.

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A fórmula da constante p6 refere a grandeza Sm que diz respeito à superfície molhada e que pode ser calculada, com um grau de aproximação aceitável, recorrendo à primeira regra de Simpson. É natural que se queira conhecer a área da superfície molhada pois, como já vimos antes, uma parte importante das resistências que se opõem ao movimento das embarcações é consequência do atrito da querena na água, que será tanto maior quanto maior for a superfície molhada. Contudo, não se pode abordar o problema do desenho das querenas tendo exclusivamente na ideia a preocupação de minimizar a superfície molhada, pois tal objectivo conflitua com outros que tivemos oportunidade de referir e que tem, também, muita importância, senão para a velocidade, pelo menos para a estabilidade e para a segurança. Voltando, agora, ao modo de determinação da superfície molhada, basta--nos considerar a vista de frente que está integrada no plano geométrico e medir ao longo de cada secção transversal o comprimento que vai da linha de flutuação até à zona mais funda. Como está em causa uma linha curva, é necessário utilizar uma régua flexível, de metal, plástico ou cartolina, que temos de dobrar cuidadosamente, fazendo-a acompanhar cada uma das secções, dentro dos limites que acabei de referir. Os valores obtidos para os comprimentos das várias secções vão sendo inseridos na tabela com que já estamos familiarizados. Obtidos os produtos pelos multiplicadores de Simpson, faz-se a soma dos valores encontrados, multiplica-se por dois, para que sejam consideradas as duas metades e, ainda, por um terço da distância entre secções, tal como tem vindo a ser feito quando se recorre a esta regra. É preciso ter presente que, nos casos em que a embarcação dispõe de quilha de barbatana e leme em forma de sabre, estes apêndices tem de ser medidos à parte, sobre a vista lateral, sem esquecer as duas faces, e o valor da área deve ser adicionado ao que foi obtido através da medição das secções transversais. Parece-me oportuno referir que, assim como estão disponíveis no mercado vários aparelhos de medida das áreas, tais como o planímetro e o integrador gráfico, também há dispositivos mecânicos para a medição do comprimento de linhas curvas, os quais, como é evidente, facilitam grandemente o trabalho dos projectistas. Outra nota que julgo digna de menção, é a que diz respeito ao facto de este método conter uma falha conceptual, pois a soma dos intervalos iguais entre secções transversais, que se utiliza no cálculo, corresponde ao comprimento entre perpendiculares e é um pouco mais pequena do que a distância medida entre a proa e a popa, ao longo da linha de flutuação. E seria esta última distância que deveria ser utilizada no cálculo da superfície molhada, por tomar em consideração a curvatura da superfície. Mas o trabalho implicado com este pequeno suplemento de rigor não faria grande sentido. A prática corrente no desenho de embarcações de recreio é a que acaba de ser explicada, uma vez que o erro cometido não tem significado do ponto de vista da utilização que se pretende, para fins comparativos. Se medirmos as duas distâncias, no desenho da vista inferior da figura 2, constataremos que o comprimento entre perpendiculares é inferior em 10% ao comprimento do contorno da linha de flutuação. Como Pag. 45


imediatamente se percebe, o erro será tanto menor quanto mais fina for a embarcação. No entanto, o que é importante que se verifique é que o método utilizado seja sempre o mesmo, quando procedemos a análises comparativas. Em particular, para as embarcações à vela, é costume fazer outras avaliações comparativas tendo em atenção o deslocamento, a área do velame, o comprimento da linha de flutuação, a superfície molhada e o lastro. Como a tradição destas análises comparativas é de origem inglesa, recorre-se ao sistema “imperial” de medidas. Exemplificando: 

Área do velame (em pés quadrados) a dividir pelo Deslocamento (em pés cúbicos, elevando esta quantidade a dois terços).O valor obtido permite avaliar a capacidade da embarcação em combater a resistência provocada pelo sistema de ondas. Diz-se que o valor é baixo quando é inferior a 14, que é moderado entre 14 e 18, que é alto entre 18 e 21 e que é muito alto acima de 21.

Área do velame (em pés quadrados) a dividir pela Superfície molhada (em pés quadrados). Um resultado de 2,5 indica uma excelente performance com ventos fracos.

Deslocamento (em long tons) a dividir por 1% do Comprimento da linha de água, elevado ao cubo (em pés). Esta razão dá-nos uma ideia do peso relativo da embarcação. Quando o valor obtido ultrapassa os 300 o barco é pesado, entre os 200 e os 300 está na média, entre os 100 e os 200 é leve, abaixo de 100 é considerado ultraleve.

Lastro (em libras) a dividir pelo Deslocamento (em libras). Esta razão dá uma ideia da estabilidade relativa. Valores abaixo dos 30% são considerados baixos, entre 30% e 40% são moderados, entre 40% e 50% são altos e acima de 50% são muito altos.

Em geral, tratando-se de embarcações semelhantes, os resultados comparativos são de confiar. Contudo, aparecem muitos casos que suscitam maior cuidado na análise, uma vez que a quantidade de parâmetros que influenciam a performance de uma embarcação justifica uma atitude de reserva, principalmente quando as diferenças são pequenas.

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V. RESISTÊNCIA DAS QUERENAS. ATRITO E FORMAÇÃO DE ONDAS. RESISTÊNCIAS PARASITAS. ESTABILIDADE. Vamos voltar a considerar, neste capítulo, os tipos de resistência que se opõem ao movimento das embarcações quando estas são movidas pelos próprios meios, a saber, os motores, o velame e outros meios nossos conhecidos. Não trataremos das situações de reboque porque, no contexto deste livro, esta forma de propulsão não tem qualquer relevância. Para começar falaremos um pouco acerca da forma das embarcações e da influência que ela pode ter sobre a facilidade de deslocação na interface dos fluidos que as envolvem. Por causa da enorme diferença entre as densidades da água e do ar (a água é oitocentas vezes mais densa do que o ar) e de outras coisas menos importantes, as questões da hidrodinâmica e da aerodinâmica tem de ser tratadas autonomamente. Enquanto que a parte submersa das embarcações está sujeita a um conjunto de fenómenos de resistência que temos de considerar relevantes desde as mais baixas velocidades, já o efeito do ar sobre a parte do casco que está emersa e sobre as superestruturas só começa a ter alguma importância, que exige apreciação e tratamento ao nível do desenho, a partir de velocidades que ultrapassem os quarenta e cinco nós. Diz-se que foi com o desenho dos aviões que os problemas da aerodinâmica começaram a merecer a atenção dos engenheiros e dos projectistas, por causa das perdas de potência resultantes de um desenho deficiente que não atendia a esses aspectos. Mais tarde, os fabricantes de automóveis começaram a preocupar-se com o assunto, acabando por transformar uma abordagem que começou por ser científica e técnica numa moda estética, o streamlining, com manifestações ridículas de exagero e de mau gosto, principalmente no período dos anos quarenta e cinquenta do século passado, que ainda estão na memória dos mais velhos. Importa reter que, enquanto o desenho das querenas deve resultar de uma síntese em que a componente hidrodinâmica desempenha a sua parte entre outras igualmente importantes, mesmo nas embarcações mais lentas, só faz sentido considerar a intervenção negativa da resistência do ar no movimento das embarcações quando estão em causa velocidades muito altas, de acordo com os padrões usados no meio naval, os quais tem pouco a ver com o que se passa no ambiente automóvel e muito menos com o mundo dos aviões. Quando estamos a desenhar embarcações à vela, destinadas à utilização sistemática em regatas, é compreensível que façamos o aproveitamento de todos os meios disponíveis para maximizar a velocidade. Se nos lembrarmos de que as referidas embarcações raramente se deslocam na posição horizontal, faz sentido que consideremos, para efeitos de análise e comparação, o desenho de linhas de flutuação em várias inclinações. Esse desenho não se revela tão simples como pode parecer, pois conforme os barcos se inclinam, também mudam de caimento, pelo facto de, normalmente, terem mais flutuação à ré. Hoje são raros os barcos que adornam sem alterarem a posição do eixo longitudinal de Pag. 47


flutuação. A maior parte deles faz o que acabei de referir, mas há casos, como o de certas embarcações tradicionais holandesas (boier, botter, etc.) que, entretanto, foram adaptadas para recreio, que fazem precisamente o contrário, pois são mais cheias à proa do que à popa. Contudo, a situação mais comum é a primeira. Portanto, ao desenhar linhas de flutuação inclinadas, temos de começar por estimar a mudança de caimento na vista lateral, desenhando a nova linha de referência, em perfil, com uma inclinação que compense a maior flutuação da popa, se for esse o caso. Veremos que, por causa disso, as secções transversais apresentam várias rectas paralelas, em vez de uma recta única na representação da linha de flutuação de referência. O objectivo a atingir é conseguir que a nova posição longitudinal do centro de flutuação coincida com a inicial, isto é, que ambos os centros estejam contidos no mesmo plano de perfil. Só deste modo é possível garantir que o centro de gravidade continua na vertical do novo centro de flutuação. É evidente que precisamos de muita sorte para conseguirmos acertar à primeira tentativa, sendo certo que se trata de uma actividade que envolve muito desenho e bastantes cálculos. Mas, como diz o nosso povo, nada se consegue sem trabalho. E, afinal das contas, para que vai servir todo este trabalho? Não devemos desanimar se constatarmos que as linhas de flutuação apresentam um desenho fortemente distorcido, para um dos lados. É assim mesmo! O que nos interessa é dispormos de elementos que permitam fazer comparações com embarcações que foram bem sucedidas, pois uma pequena melhoria na hidrodinâmica das obras vivas pode traduzir-se naquela vantagem suplementar que os fanáticos da competição procuram na linha de chegada. Catalogando as três formas de resistência a considerar no desenho de embarcações de recreio, diremos que está em causa o atrito (água e ar), a formação de ondas e a resistência parasita. Já falámos de todas anteriormente, mas sem grande detalhe. Vamos, agora, tratar do assunto de modo mais sistemático, recorrendo às explicações científicas mais convenientes, para uma melhor compreensão dos fenómenos, sendo certo que as teorias disponíveis apresentam aspectos controversos e lacunas que, só com o tempo, o desenvolvimento das investigações pode vir a colmatar. Em particular, no que se refere ao atrito das querenas na água, os fenómenos envolvidos são complexos e as explicações disponíveis não se revelam, a meu ver, inteiramente satisfatórias. De qualquer modo, há que evidenciar que esta componente da resistência é a mais importante nas embarcações de recreio que se deslocam nos regimes de baixa velocidade e que são, obviamente, a maioria. Há situações em que o atrito na água atinge 80% da resistência total, mas quando estão em causa grandes navios, a resistência devida ao atrito pode chegar aos 90%. Acerca dos veículos que se deslocam totalmente submersos, pode dizer-se que, praticamente toda a resistência ao seu movimento resulta do atrito da água. Por razões de simplificação trataremos desta matéria considerando que tudo se passa em ambiente calmo, com a interface entre os dois fluidos perfeitamente plana, situação que, como sabemos, raramente se verifica. Por outro lado vamos admitir, para efeitos de exposição da teoria, que as embarcações se deslocam na posição normal de equilíbrio, sem orçarem ou apresentarem caimento.

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Todas as embarcações de recreio e, em particular, as que tem um deslocamento comparativamente elevado, apresentam curvas de resistência como aquelas que estão representadas na figura 6. Verificase que a resistência devida ao atrito vai aumentando suavemente em função da velocidade, ou melhor dizendo, em função da velocidade relativa (relação entre a velocidade e a raiz quadrada do comprimento da linha de água). Já no que diz respeito à resistência que resulta da formação das ondas, o comportamento das embarcações é muito diferente. A partir do ponto em que a referida relação (velocidade relativa) atinge 1,1 (com a velocidade medida em nós e o comprimento entre perpendiculares medido em pés) a resistência aumenta abruptamente, como se o sistema de ondas colocasse uma barreira hidrodinâmica ao aumento da velocidade. E embora as curvas da figura 6 digam respeito a embarcações a motor, com determinadas características geométricas, este género de comportamento é aplicável a todos os outros tipos. Detendo-nos um pouco sobre o gráfico em questão, podemos dizer que o mesmo resultou de ensaios efectuados em tanque, com dois modelos cujas relações entre deslocamento e comprimento da linha de água apresentavam os valores de 150 e 250, respectivamente, embora ambos tivessem o mesmo coeficiente prismático, de 0,64. Não é a primeira vez que faço notar as discrepâncias entre a realidade física e as teorias científicas que procuram explicá-la. Às vezes, as simplificações são excessivas, porque os modelos abstractos estão longe de cumprirem os requisitos fundamentais de reprodução do comportamento das variáveis. É o que se passa com as análises que admitem que a água se comporta como um fluido perfeito, o que quer dizer que não sofre tensões tangenciais. Trata-se, obviamente, de uma falsidade que não pode ser escamoteada quando estamos a estudar a resistência ao movimento dos corpos que se deslocam na água e na interface da água e do ar. A verdade é que a maior parte dessa resistência, pelo menos dentro dos limites correntes de velocidade, quer da água, quer das embarcações, fica a dever-se ao atrito na zona de contacto entre a querena e a água. Esta ocorrência deriva da existência de viscosidade e da ausência de deslizamento do fluido na referida zona. É sabido que uma placa extremamente fina pode intercalar-se entre camadas de um fluido perfeito, em movimento, sem afectar as condições do fluxo (trata-se, obviamente, de uma assumpção meramente teórica). Já o mesmo não pode acontecer quando a placa se encontra submergida num fluido imperfeito, como é o caso da água, pois as partículas que se encontram mais próximas da placa estão completamente paradas, provavelmente por causa de fenómenos de atracção. Conforme a água fica mais afastada da placa, menos se sente o efeito do retardamento e há uma distância a partir da qual já nada afecta o movimento das partículas do fluido. Esta camada, dentro da qual os gradientes de velocidade são consideráveis, começando em zero até atingirem um valor relativamente importante, costuma designar-se por camada limite e a sua existência foi notada pela primeira vez, que se saiba, por J. Scott Russel, em 1865. É interessante ler o que ele disse sobre o assunto e que consiste em algo parecido com isto: “Já observei o fenómeno várias vezes e parece-me que o que se passa é que a totalidade da superfície das querenas fica coberta por uma fina camada de água que adere firmemente a elas, deslocando-se Pag. 49


com a mesma velocidade (o que quer dizer que a velocidade relativa entre a água, nesta camada, e a querena é nula). Há uma segunda camada de água que adere parcialmente à primeira, mas que se atrasa um pouco porque tem de arrastar consigo uma terceira camada, que também arrasta uma quarta, e assim sucessivamente, verificando-se sempre um diferencial de velocidade entre duas camadas contíguas, até se atingir uma espessura a partir da qual o líquido deixa de ser perturbado pela passagem da embarcação». Esta imagem das lâminas de água contíguas, cujas velocidades relativamente à embarcação variam de zero, na zona de contacto com o casco, até ao valor mais alto na zona mais afastada, dá uma ideia muito precisa do que se passa. Toda a resistência devida ao atrito ocorre no interior desta camada e resulta do aparecimento de forças de fricção que actuam paralelamente à superfície da querena, em direcção contrária à do seu movimento. Experiências conduzidas por Osborne Reynolds (e outros) provaram que as características do fluxo dentro da camada limite e as forças de atrito que lhe estão associadas dependem de uma quantidade conhecida como número de Reynolds, a saber:

Rn = 80 000 x V x L

em que V é a velocidade da embarcação através da água, em pés por segundo e L é o comprimento da linha de água, em pés. Quando a embarcação se desloca a baixa velocidade, o número de Reynolds é comparativamente baixo e o movimento das partículas de água é, em grande parte, paralelo à superfície molhada, isto é, o fluido move-se suavemente, sem perturbações. Diz-se que, nestas condições, o fluxo é laminar, designação que deriva da tal imagem inicial, de que existem várias camadas finas de fluido que deslizam umas sobre as outras, com atrito. Em consequência da viscosidade da água verifica-se que o fluxo laminar tem características de auto estabilização porque, nas situações em que é acidentalmente perturbado, de modo abrupto, acaba por se reconstituir. Contudo, quando o fluxo laminar aumenta de espessura para lá de um certo limite, adquire uma instabilidade permanente e o seu comportamento altera-se drasticamente. Neste caso, que ocorre quando o número de Reynolds atinge um determinado valor, dizse que o fluido passou ao regime turbulento. As partículas de água começam a oscilar em direcção perpendicular à do movimento da embarcação e formam-se pequenos vórtices no interior da camada limite. Sabe-se que, neste novo estado, o atrito aumenta consideravelmente e que a alteração do comportamento das partículas de água é influenciada pela forma das querenas e pelo estado da superfície de contacto, sendo certo que a ausência de rugosidades contribui para que o regime turbulento demore mais tempo a aparecer. O valor do número de Reynolds que lhe corresponde pode variar entre (5 x 105) e (5 x 106). No entanto, a existência de grandes imperfeições na superfície molhada pode provocar o aparecimento do regime turbulento ainda abaixo de Rn = 5 x 105, pelo que, quem se preocupa com performances elevadas, deve manter o casco da sua embarcação perfeitamente liso, não sendo, contudo, necessário que se apresente brilhante.

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Vale a pena fazer, neste momento, algumas considerações acerca dos sistemas de dimensões habitualmente utilizados em arquitectura naval, tanto mais que, como constatámos há instantes com o número de Reynolds, ainda é bastante comum, pelo menos nos países de cultura anglo-saxónica, o recurso ao sistema inglês de medidas, que os seus criadores gostam de designar pomposamente por sistema imperial. Este sistema antropomórfico tem vindo a perder terreno para o sistema métrico que, sendo uma criação dos franceses, é mais abstracto e simples. Neste momento, a Grã-Bretanha já usa legalmente o sistema métrico, mas ainda não abandonou totalmente o sistema tradicional, enquanto que os Estados Unidos parecem pouco preocupados com o problema, em muitas áreas do conhecimento e na indústria. Por causa dos custos que a mudança vai acarretar e pelos efeitos de toda a ordem que implica, serão, provavelmente, os últimos a aplicarem generalizadamente o sistema métrico. Quando comecei a escrever este texto pensei no assunto e cheguei à conclusão de que deveria utilizar, sempre que possível, o sistema métrico, mas sem fazer dele um uso exclusivo. A verdade é que há coeficientes e relações entre grandezas cuja apresentação, desde sempre, no sistema inglês, levou muita gente deste sector a memorizar valores de referência que acabaram por adquirir um significado quase mítico. A conversão destes valores para o sistema métrico retirar-lhes-ia esse peso histórico e, a meu ver, isso seria lamentável e inconveniente. Nesta ordem de ideias, tenho vindo a usar esporadicamente e continuarei a fazer concessões à utilização do sistema inglês, sempre que se verifiquem as tais condições que referi, de que não vejo necessidade de prescindir. Porque somos pessoas sensíveis devemos valorizar a componente poética que está associada à ciência e às técnicas. Do mesmo modo que o nome de Osborne Reynolds se encontra intimamente ligado ao estudo dos fenómenos de viscosidade e, bem assim, à caracterização dos regimes laminar e turbulento que andam associados à resistência devida ao atrito dos flutuadores nos fluidos, também o nome de William Froude aparece relacionado com os fenómenos gravitacionais e de inércia que coexistem com a formação dos sistemas de ondas gerados pelo movimento das embarcações. Há, também, um número de Froude, que se exprime pela seguinte fórmula: Fr = 0,2977 × V ÷ L½, em que V é a velocidade da embarcação em nós e L o comprimento entre perpendiculares, medido em pés. Para efeitos comparativos podemos reescrever a fórmula do número de Reynolds, utilizando as mesmas dimensões que usamos nesta última, o que dará: Rn = L × V ÷ 7,5735 × 106

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Infelizmente, apesar das muitas tentativas nesse sentido, não foi possível arranjar uma expressão que traduza os efeitos combinados da viscosidade e da gravidade porque, tanto quanto é conhecido até este momento, estamos em presença de uma impossibilidade física. Sem entrar nos pormenores científicos do problema direi, apenas, que as experiências com modelos, em tanques, que tanto tem contribuído para a compreensão destes fenómenos (a partir dos trabalhos iniciados por William Froude), só podem ser conclusivas se as duas componentes da resistência (atrito e formação de ondas) forem tratadas autonomamente. Foi Froude quem produziu uma evidência experimental deste facto, no ano de 1872. Por razões que não são difíceis de explicar, mas que não interessa discutir neste contexto, verificam-se discrepâncias entre as constantes utilizados pelos ingleses e as que são usadas pelos americanos (dos Estados Unidos) para a medição dos fenómenos relacionados com a resistência e para a caracterização da forma dos flutuadores. As relações entre a velocidade e o comprimento das embarcações e a velocidade e o comprimento dos sistemas de ondas que lhes estão associados e, bem assim, as relações entre a superfície molhada e o deslocamento obedecem a diferentes conceptualizações, o que é pena e pode confundir quem se interessa por estes assuntos. Há que referir que a notação americana usada no estudo da resistência é teoricamente menos rigorosa, mas mais prática e mais simples, pelo que será a esta que recorrerei, sempre que isso seja possível. Vejamos, de seguida, algumas dessas relações. 1.

Relação entre o deslocamento e o comprimento da linha de água:

d = D ÷ (L ÷ 100)3

em que D é deslocamento em toneladas inglesas (1,096 toneladas do sistema métrico) e L é o comprimento da linha de água em pés. 2.

Relação entre a velocidade e o comprimento da linha de água, nas embarcações, e entre a velocidade e o comprimento das ondas nos sistemas que estão associadas ao movimento dos flutuadores:

v = V ÷ L1/2

em que V é medida em nós e L em pés. Vejamos agora, o caso dos coeficientes de resistência, em que as resistências são medidas em libras e o deslocamento em toneladas inglesas. Assumindo que Rt é a resistência total, Rf a resistência devida ao atrito e Rr a resistência residual (formação de ondas e resistências parasitas), teremos respectivamente: rt = Rt ÷ D

rf = Rf ÷ D

rr = Rr ÷ D

Quando observamos o movimento das ondas, qualquer que seja o acontecimento que está na sua génese, ficamos com a ideia ilusória de que está a verificar-se o movimento de uma massa de água na direcção de propagação deste fenómeno ondulatório. Mas se dirigirmos a nossa atenção para pequenos objectos flutuantes, ou mesmo para formações isoladas de espuma, constatamos que não ocorre uma Pag. 52


deslocação sustentada da água no sentido de propagação das ondas. A verdade é que a velocidade a que se movem as ondas pode ser enorme, como ocorre com os maremotos. No entanto, o movimento das partículas da água que as ondas contem é sempre relativamente lento. O que acontece, na realidade, é que as partículas de água se movem segundo um caminho circular de pequeno raio, sob o efeito combinado da gravidade (do peso) e da força centrífuga. Como a água é um fluido imperfeito, a viscosidade e a tensão superficial acabam por determinar o fim do movimento de qualquer ondulação, coisa que não aconteceria se o fluido fosse perfeito. Já sabemos que as ondas resultam de mudanças de pressão que ocorrem na água, sempre nas proximidades da superfície de contacto com o ar. O padrão do movimento das ondas depende essencialmente do número de Froude (Fr = V ÷ (g x L)1/2) ou, usando a notação americana, da velocidade relativa (v = V ÷ L1/2), isto é, da relação entre a velocidade das ondas e o seu comprimento, o que vem a ser quase a mesma coisa que o número de Froude, pois os efeitos da gravidade são praticamente constantes. As ondas de superfície que se formam com a passagem de uma embarcação cumprem quase totalmente o modelo fixado pela teoria trocoidal e mantém uma relação constante entre a sua velocidade e a raiz quadrada do seu cumprimento, a saber: v = 1,34 × L1/2 Tal como foi referido inúmeras vezes, o principal factor que determina a formação das ondas de superfície, associadas ao movimento dos flutuadores, é a resistência devida à gravidade. Em termos gerais há três diferentes grupos de ondas que convém tipificar: 1.

As ondas divergentes produzidas na proa da embarcação;

2.

As ondas transversais da proa;

3.

As ondas transversais da popa.

Quando a embarcação se desloca a baixa velocidade, são as ondas divergentes da proa que se tornam mais evidentes mas, a altas velocidades, as ondas transversais assumem muito maior importância e são as que mais influenciam o crescimento da resistência residual. Sabe-se que a energia contida nas ondas formadas pelo movimento das embarcações é proporcional ao seu comprimento e ao quadrado da sua amplitude. Também se constatou que, embora não exista uma relação geral fixa entre amplitude e comprimento, essa relação mantém-se aproximadamente constante dentro de grupos sucessivos de ondas. A experiência mostra que a resistência de origem gravitacional aumenta rapidamente, conforme o número de comprimentos de ondas diminui, dentro dos limites do comprimento da linha de flutuação.

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Número de comprimentos de onda 6 3 1,795 1 0,8

Velocidades relativas (v = V ÷ L1/2) 0,547 0,775 1,00 1,34 1,50

O gráfico da figura 6, para o qual chamei a atenção várias vezes, apresenta, na sua parte superior, a indicação de comprimentos de onda, desde n=3 até n=0,8. Por ele é possível verificar que o crescimento da resistência devida à gravidade ocorre simultaneamente com a redução do número de comprimentos de onda, aumentando abruptamente a partir da região em que a velocidade relativa atinge o valor 1,2. Ao empurrar a água lateralmente, a querena exerce uma força neste fluido que produz um aumento de pressão nas secções próximas da proa; por causa deste facto a embarcação tende a resistir ao movimento frontal. O aumento da pressão na frente da embarcação, concomitantemente com a redução da pressão na popa, faz deslocar o centro das pressões verticais no sentido da proa e obrigam esta a levantar-se, afundando a ré, de modo a que a resultante do conjunto das forças ascendentes permaneça na vertical do centro de gravidade, supostamente inalterável. A distância que a água precisa para voltar à posição inicial de equilíbrio, sob a influência do seu peso, corresponde ao comprimento de onda natural, que se move à mesma velocidade que o barco. Nas situações em que o barco se desloca a uma velocidade menor do que a velocidade que corresponde ao movimento de uma onda que tem um comprimento igual ao comprimento entre perpendiculares da embarcação, a água volta à posição anterior e a curva das áreas relativa ao deslocamento do barco em movimento apresentará um valor nulo na popa, se for esse o valor que a curva apresentava em repouso. Já quando o barco se desloca a velocidades superiores isso não acontece pois a popa da embarcação mergulhará na água, fazendo com que a curva das áreas termine num valor superior a zero. Quando estamos a desenhar uma embarcação de deslocamento que se pretende rápida, não podemos deixar de ter em linha de conta este comportamento. Se a popa for razoavelmente larga, sem excessos, com uma imersão quase nula nesse ponto quando está imobilizada (ver, por exemplo, o barco à vela da figura 3) constataremos que, quando em repouso ou deslocando-se a baixas velocidades, apresenta uma curva das áreas que termina praticamente em zero. Mas, se a velocidade aumentar, a proa levanta e a popa afunda, alterando-se o caimento de tal maneira que o deslocamento se reduz na frente e aumenta concomitantemente na parte posterior do barco, onde a curva das áreas passará a apresentar um valor muito diferente de zero, podendo chegar a atingir o valor maior de área imersa, ao longo de todo o comprimento da linha de flutuação. Basta, para tanto, que a popa seja suficientemente larga e que a velocidade relativa tenha um valor acima de 1,2. É conveniente observar a figura 11 para se ficar com uma ideia do comportamento dos barcos de deslocamento cuja popa ainda apresenta alguma flutuação quando estão em repouso. Este tipo de barcos consegue adaptar-se melhor do que um barco com popa fina às exigências de uma velocidade comparativamente alta, sem comprometer muito as suas prestações a baixa velocidade. Não Pag. 54


podemos esquecer que os barcos de deslocamento são construídos, na maioria dos casos, para funcionarem a velocidades relativas inferiores a 1,34, limite imposto pela resistência provocada pela formação das ondas. Acima deste valor a popa afunda, por falta de apoio na água, e a embarcação tem uma grande dificuldade em avançar, mesmo que disponha de potência de sobra no motor. Como estamos a falar de velocidades relativas, torna-se evidente que a velocidade absoluta será tanto maior quanto mais comprida for a embarcação. As representações da figura 11 ajudam a compreender isso mesmo. Se estiverem em causa duas embarcações semelhantes, com comprimentos entre perpendiculares, respectivamente, de 25 e de 36 pés, a mais comprida atinge, obviamente, uma velocidade absoluta maior, para a mesma velocidade relativa. Isto quer dizer que se só está em causa a velocidade de uma embarcação de deslocamento, em projecto, esta deve ser tão longa quanto possível, pois andará mais depressa com a mesma potência do motor, sendo por isso mais económica. É claro que raramente a questão do projecto se coloca em termos tão simples, já que exigências de carácter funcional e económico, ou outras, podem impedir esta optimização.

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VI. EMBARCAÇÕES A MOTOR. EMBARCAÇÕES DE DESLOCAMEMTO, PLANANTES E SEMI-PLANANTES. Vamos tratar neste capítulo das embarcações a motor, no sentido em que os seus meios principais, ou únicos, de propulsão são motores de explosão ou de combustão. Trataremos destas embarcações separando-as de outras que, dispondo também de motores, só os utilizam como auxiliares, como é o caso de muitas embarcações à vela. A verdade é que a introdução dos meios mecânicos de propulsão, desde os primórdios da máquina a vapor, veio alterar profundamente o desenho dos barcos e navios, dando-lhes uma flexibilidade de movimentos e uma fiabilidade que nunca tinham conhecido até esse momento, na medida em que deixaram de estar totalmente dependentes das condições atmosféricas cujo controlo pelo homem continua a ser uma impossibilidade. Antes do advento dos motores também não se pensava em embarcações planantes, se bem que, com determinadas condições de vento é possível mover pequenos barcos à vela, adequadamente desenhados, com alguma impulsão dinâmica. Mas o que é importante reter é que, com desenho adaptado, o recurso aos motores permitiu atingir velocidades que eram impensáveis para as embarcações à vela. No entanto, já sabemos que a relação mínima entre o peso da embarcação e a potência dos motores impede que grandes artefactos flutuantes possam planar, pois a potência necessária para tal e os problemas estruturais que o apoio dinâmico coloca, não tornam fácil nem económica a construção desses objectos. Por outro lado, vivemos num tempo em que as dificuldades na obtenção de combustíveis fósseis nos obrigam a nunca esquecer a necessidade de reduzir os consumos, para já não falar das consequências ambientais do uso indiscriminado de motores de explosão e de combustão. Assim, enquanto não surge uma alternativa mais económica e ambientalmente mais segura, teremos de pensar maduramente antes de contribuirmos para lançar no mercado objectos de prazer com tantos inconvenientes! Quando anteriormente fizemos comentários acerca das embarcações a motor cuja geometria está esquematicamente desenhada nas figuras 4 e 5 dissemos alguma coisa acerca das performances previsíveis destes dois tipos. Contudo, neste momento é conveniente que nos detenhamos na análise das suas linhas e, em particular, das suas curvas de áreas. Podemos afirmar que a embarcação da figura 4 é uma típica embarcação de deslocamento, com o seu centro de flutuação localizado nas proximidades da secção mestra, mais precisamente a 53 % do comprimento da linha de água, a partir da proa. Já a embarcação da figura 5 é do tipo planante, pelo que o seu centro de flutuação se encontra aproximadamente a 61 % do comprimento da linha de água, bastante próxima da secção 4. É fácil perceber que as duas curvas tem um desenvolvimento bem diferente. A primeira é quase simétrica relativamente ao segmento médio, enquanto que a segunda, por causa das formas da querena, é deliberadamente assimétrica, com muito maior flutuação no lado da popa. A curva das áreas do barco de deslocamento termina à popa com uma área nula, ao passo que a da embarcação planante apresenta Pag. 56


nessa zona uma área imersa quase igual à da secção mestra. Entre estes dois tipos de embarcações situam-se outras que representam uma espécie de compromisso entre posições extremas, com curvas de áreas que tendem mais para um ou para outro tipo, ficando as opções a depender do seu programa funcional e das disponibilidades de potência. Parece-me interessante e educativo que levemos a efeito, neste momento, alguns cálculos sumários com vista à determinação da potência dos motores que é necessária para fazer mover as embarcações em causa dentro dos regimes de velocidades de cruzeiro que lhes são adequados, em função do seu tipo e das performances que consideramos óptimas. Nunca nos devemos esquecer de que os programas que suportam a concepção de cada um destes objectos têm subjacentes lógicas conceptuais cuja contestação, por quem projecta ou por quem usa, faria destes actores pessoas pouco inteligentes. Recorrendo a uma analogia que todos compreendem, pode dizer-se que seria manifestamente absurdo, por exemplo, andar permanentemente com um automóvel desportivo de grande potência, à velocidade de sessenta quilómetros horários, numa via rápida e, em contrapartida, tentar utilizar uma viatura utilitária como se fosse um Ferrari, o que não quer dizer que, como todos sabemos, não haja pessoas que se permitem estes devaneios. Já dissemos inúmeras vezes, a propósito dos vários tipos de resistência que se opõe ao movimento dos corpos flutuantes, que as embarcações de deslocamento tem, independentemente dos recursos de potência motriz disponíveis, uma velocidade relativa óptima, a partir da qual será necessária uma grande potência para aumentar a velocidade para além desse limite, mesmo que o acréscimo de velocidade seja muito pequeno. Analisando as curvas de resistência da figura 6 e os sistemas de ondas da figura 11, compreendemos que para lá de uma velocidade relativa de 1,34 as coisas começam a ficar complicadas, quando estamos a lidar com embarcações que não foram desenhadas para terem apoio dinâmico na sua deslocação, isto é, que estão obrigadas a cumprir sempre o princípio de Arquimedes. Como se deduz da figura 6, se conseguirmos atingir a velocidade relativa de 1,5, porque está disponível potência suficiente para tanto, um barco com estas características fica apoiado em 0,8 de um comprimento de onda, significando isto que deixa de ter apoio na popa, facto que obrigará a sua proa a levantar exageradamente, dificultando sobremaneira o seu movimento. Não sendo impossível atingir velocidades relativas de 1,5 e 1,6 com embarcações de deslocamento convencionais, a verdade é que, se elas não forem muito estreitas e leves, com todas as consequências de utilização que derivam dessas características, isso só se consegue com potências exageradas e consumos desnecessários de combustível. Mas, quando passamos para o território das embarcações planantes, como é o caso do barco da figura 5, já nos é possível atingir velocidades relativas da ordem dos 10, ou mesmo mais. É claro que isso só é viável desde que o peso total do artefacto não ultrapasse os quinze quilogramas por cavalo de potência efectiva, condição que já referimos várias vezes. Convém ter sempre presente que o acto de planar corresponde a um regime de movimento determinado pela velocidade da embarcação, sendo certo que, enquanto não atingem essa velocidade, que lhes permite receber apoio dinâmico da água, os barcos planantes cumprem o princípio de Arquimedes e comportam-se como se fossem de deslocamento. Acerca das duas embarcações que estamos a analisar em termos comparativos pode Pag. 57


dizer-se que apresentam quase o mesmo comprimento das linhas de flutuação, embora o seu deslocamento seja completamente diferente. A primeira tem um volume submerso de cerca de 30 200 decímetros cúbicos, enquanto que a segunda tem, aproximadamente, 19 200 decímetros cúbicos, um pouco mais de metade da primeira. Se quisermos que a primeira se desloque com uma velocidade relativa de 1,3, quase no limite da sua eficiência óptima, isso vai corresponder a uma velocidade absoluta de: v ÷ L1/2 = 1,3  v = 1,3 × 39,341/2 (o comprimento da linha de flutuação é de 1200 cm= 39,34´)  v = 8,15 nós. Recorrendo a uma fórmula empírica que é vulgarmente utilizada, verificamos que precisamos de um motor com uma potência efectiva de 120 cavalos para deslocar a embarcação à velocidade máxima de 8,15 nós. Passando agora para a embarcação planante, podemos admitir, sem grande exagero, que a sua velocidade relativa deve situar-se em 5,8 (ou mais). É fácil verificar que a esta velocidade relativa corresponde uma velocidade absoluta de: v ÷ L1/2 = 5,8  v = 5,8 × 39,341/2  v = 36,38 nós Recorrendo a outra fórmula empírica, que também é frequentemente referida, e que se aplica especialmente a embarcações planantes e semi-planantes, chegamos à conclusão de que precisamos de 1300 cavalos de potência efectiva para atingir a velocidade de 36,38 nós com a nossa embarcação. Independentemente de não ser possível atingir esta velocidade com a embarcação de deslocamento, que tem quase o dobro do volume imerso da embarcação planante para o mesmo comprimento da linha de flutuação, ficamos a saber que a velocidade nos barcos custa muito caro. A potência dos motores do barco planante é mais de dez vezes superior à dos motores do barco de deslocamento, a que corresponde uma diferença astronómica de consumos, e uma velocidade que é só o triplo da primeira. Fica assim perfeitamente esclarecida uma afirmação feita inicialmente por mim de que é muito económico fazer o transporte de grandes cargas por barco, a baixa velocidade, e que tal já não é economicamente viável com rapidez, se bem que a um comprimento da linha de flutuação maior corresponde, para uma mesma velocidade relativa, uma velocidade efectiva maior. Por exemplo, para atingirmos a velocidade de 36,38 nós com um navio (que só pode mover-se em regime de deslocamento), ao qual fixamos a velocidade relativa de 1,3, precisamos de que o comprimento da linha de flutuação se aproxime dos 240 metros, a que corresponderia um volume imerso da ordem dos 250 000 metros cúbicos, se fosse do mesmo tipo da embarcação da figura 4!

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Já anteriormente abordámos a questão das relações numéricas entre dimensões das embarcações, de modo a caracterizá-las. No que se refere às embarcações a motor são particularmente relevantes algumas delas, que passo a citar. Em primeiro lugar vem o coeficiente prismático, que dá uma indicação da finura do casco. Trata-se, como já foi referido, do quociente entre o volume da querena e o de um prisma cuja secção transversal é igual à maior secção da querena e cujo comprimento é o mesmo da linha de flutuação da embarcação. Quando estamos a comparar embarcações que apresentam diferentes coeficientes prismáticos, verificamos que lhes correspondem diferentes velocidades relativas, numa perspectiva de aproveitamento óptimo das suas potencialidades, embora não seja possível fixar uma relação directa, porque se constatam variações cuja explicação teórica se apresente difícil. Nota-se experimentalmente mas não se explica que, a velocidades relativas de 0,9, ou menos, correspondem embarcações cujo coeficiente prismático vai de 0,60 a 0,80. As velocidades relativas entre 1 e 1,2 deve corresponder um coeficiente mais baixo, entre 0,54 e 0,59. Vamos, agora, calcular os coeficientes prismáticos das embarcações das figuras 4 e 5. No que se refere à primeira temos: c6 = 30200 ÷ ( 20 × 6 × 192,5 × 2)  c6 = 30200 ÷ 46200  c6 = 0,65. Trata-se de um valor um pouco alto para este tipo de embarcação, o qual poderia ser reduzido com alguma vantagem se os extremos da embarcação fossem menos cheios. Vejamos, agora, qual o valor do coeficiente da embarcação planante da figura 5: c6 = 19200 ÷ (20 × 6 × 113 × 2)  c6 = 19200 ÷ 27120  c6 = 0,71 Este valor considera-se correcto para uma embarcação deste tipo, podendo mesmo ser mais elevado. Nas embarcações a motor mais antigas, a secção que tinha a maior área era, geralmente, a secção mestra e era, sem margem para dúvidas, este valor que se utilizava para calcular o coeficiente prismático. Hoje, por razões de vários tipos, entre as quais se encontram as que são derivadas da distribuição dos pesos e do aproveitamento do espaço interior, essa ocorrência raramente se verifica. Por exemplo, no caso da embarcação de deslocamento de que determinámos o coeficiente, a secção que apresenta a maior área submersa é a secção 4, sendo certo que, na embarcação planante, a secção maior é a 5, já muito próxima da popa. Um coeficiente que também se utiliza com frequência para comparar barcos a motor é o que recorre ao quociente entre o deslocamento, medido em toneladas inglesas (1 tonelada inglesa equivale a 2240 libras e 1,016 toneladas métricas), e a centésima parte do comprimento da linha de flutuação, em pés, elevada ao cubo.

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D/L = P ÷ (0,01 × L)3 Vamos determinar os valores deste coeficiente para as duas embarcações que temos vindo a utilizar para teste. No caso da embarcação de deslocamento teremos: D/L = (30200 ÷ 1016) ÷ (0,01 × 39,34)3  D/L = 29,72 ÷ 0,0609  D/L = 488 Este valor diz-nos que a embarcação é bastante pesada e, obviamente, que jamais teria condições para planar. Independentemente das exigências próprias do desenho e da potência dos motores que sabemos serem necessárias para que um barco atinja esse desiderato, isso jamais pode acontecer com barcos que apresentam coeficientes destes, acima dos 250. Para se conseguir esse efeito, o ideal é que o coeficiente se situe entre 140 e 225. Vejamos, então, o que acontece com o nosso barco planante: D/L = (19200 ÷ 1016) ÷ (0,01 × 39,34)3  D/L = 18,90 ÷ 0,0609  D/L = 310 Como se acaba de constatar este valor é manifestamente excessivo, pelo que, se pretendermos melhorar a sua eficácia para navegar como embarcação planante, teremos de fazer algo para o reduzir. Por razões de facilidade destes cálculos temos vindo a assumir que um decímetro cúbico de água equivale a um quilograma, ou seja, que os valores computados correspondem a uma situação em que os barcos se deslocam em água doce. Se as contas fossem feitas para água salgada os valores correspondentes ao peso das embarcações seriam, como sabemos, um pouco superiores o que, no caso deste último coeficiente, daria resultados ainda maiores. Com esta explicação pretendo chamar a atenção para o facto de que, pelo menos no que se refere ao barco planante, numa situação de projecto, seríamos obrigados a reduzir o valor do seu deslocamento, tornando-o mais leve. Para o efeito, entre outras acções possíveis, podemos baixar um pouco a linha de flutuação de referência, facto que, por causa da diminuição do peso, concorre também para reduzir de alguma coisa a potência dos motores. Se conseguíssemos atingir os 13500 decímetros cúbicos, em vez dos 19200 que obtivemos antes, já estaríamos com um coeficiente aceitável. Para isso seria necessário que a linha de água baixasse cerca de 10 centímetros, ficando a embarcação com um calado de 1,05 metros, em vez de 1,15 metros que agora apresenta. Como se pode ver por este exemplo, as questões do desenho só estão completamente resolvidas quando conseguimos equacionar de maneira harmoniosa os vários factores em presença. Faço notar que o abaixamento da linha de flutuação tem implicações de vária ordem, nomeadamente no que se refere ao dimensionamento da estrutura e ao peso dos itens que podemos instalar a bordo. Quando decidimos reduzir o volume submerso em cerca de 5700 decímetros cúbicos teremos de ter uma particular atenção com a escolha dos materiais de construção e com as suas performances

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mecânicas. Posso adiantar, neste momento, que certos materiais que agora já estão facilmente disponíveis e determinadas técnicas modernas de construção permitem atingir resistências mecânicas elevadas, com pesos relativamente baixos. Já sabemos que as condições do movimento das embarcações de deslocamento e das embarcações planantes são muito diferentes, na medida em que as primeiras cumprem o princípio de Arquimedes e as segundas, a partir de uma certa velocidade elevam-se, alterando-se a sua superfície de flutuação de maneira radical. Os projectistas costumam recorrer a um coeficiente adimensional (número de Froude volumétrico) para determinarem a aptidão das embarcações para planarem, sendo certo que não há valores absolutamente precisos para definição dos modos de movimento. Vejamos, então, a expressão que traduz o coeficiente: Fnv = v ÷ (g × V1/3)1/2 em que v é a velocidade da embarcação medida em pés por segundo (1,6889 nós), g é a aceleração da gravidade, nas mesmas dimensões, e V é o volume submerso, medido em pés cúbicos. Os barcos de deslocamento operam a valores deste coeficiente inferiores a 1,3, os barcos semiplanantes tem o coeficiente situado entre 1,0 e 3,0 e os barcos planantes apresentam valores superiores a 2,3. Como se pode constatar, há uma certa sobreposição dos valores. Aplicando esta fórmula aos dois casos que temos vindo a testar, considerando a embarcação planante com o valor do deslocamento reduzido para 13500 decímetros cúbicos, teremos 0,76 para a embarcação da figura 4 e 3,9 para a embarcação da figura 5. Qualquer dos valores é compatível com aquilo que se admite como adequado. Do mesmo modo que a experiência fixou como máximo admissível cerca de quinze quilogramas para cada cavalo de potência efectiva, nas embarcações planantes, também os ensaios determinaram que, nas embarcações de deslocamento, a cada cavalo de potência correspondem 225 a 275 quilogramas de peso. Nestas condições a velocidade relativa da embarcação situar-se-á no conhecido valor de 1,34. Mas se dispusermos de motores com uma potência bastante maior, que corresponda, por exemplo, a metade daquele peso, à volta de 125 quilogramas por cada cavalo efectivo, só conseguimos aumentar a velocidade relativa para 1,5, algo que já referimos antes como uma das características mais marcantes deste tipo de embarcações. No que se refere às embarcações semi-planantes basta referir que não são mais do que um compromisso entre as duas situações extremas, constituindo muitas vezes a solução ideal para programas em que se procura aliar a velocidade com a economia e com performances intermédias. Julgo que qualquer leitor já terá percebido que a curva das áreas de uma embarcação semi-planante é também um compromisso entre as duas que temos vindo a estudar, não valendo a pena perder mais tempo com o assunto.

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Para finalizar esta discussão faz todo o sentido recordar, mais uma vez que, por causa das exigências de potência, as embarcações planantes estão sujeitas a limites dimensionais bastante apertados. Não é económica nem tecnicamente viável fazer embarcações planantes de grandes dimensões (com mais de trinta metros), pelo menos enquanto só tivermos motores de explosão e de combustão do tipo convencional. Por outro lado, as solicitações dinâmicas impostas pela deslocação das embarcações a alta velocidade e pela assimetria do apoio nestas condições de movimento obrigam a cuidar particularmente do correcto dimensionamento dos elementos estruturais e do revestimento do casco, sem nunca esquecer a questão crucial do limite do peso. O impacto da água e as vibrações do casco, como resultado da alta velocidade, podem ter efeitos destrutivos sobre os referidos elementos e sobre as ligações, efeitos esses que não se verificam nas embarcações de deslocamento, a não ser nas raras situações em que são apanhadas pelo mau tempo. Nos últimos anos tem vindo a vulgarizar-se a utilização de multicascos como embarcações a motor, de lazer. Como estas embarcações são bastante diferentes dos monocascos vale a pena dizer algo sobre elas, tanto mais que muitas das assunções feitas acerca destas últimas não se lhes aplicam. Pondo de parte alguns exemplos especiais particularmente exóticos, podem classificar-se os multicascos, tal como os monocascos, em embarcações de deslocamento, planantes e semi-planantes. Contudo os limites de velocidades relativas que separam estas categorias devem ser analisados com algum pormenor pois apresentam diferenças substanciais relativamente aos monocascos. Só irei abordar, neste momento, os catamarans de cruzeiro, deixando de lado os trimarãs, por causa da sua raridade e, também, os catamarans de corrida. Por outro lado, são os catamarans de cruzeiro que começam agora a vulgarizarse, e não quaisquer outros. Particularmente na Nova Zelândia, na França e nos Estados Unidos, por causa das economias de combustível e do conforto que resulta do apoio em dois cascos, tem vindo a aparecer inúmeros exemplos de catamarans de cruzeiro. No início, estes barcos tinham um desenho muito semelhante ao dos multicascos à vela, mas com o tempo e com o conhecimento que se foi adquirindo acerca destes artefactos, a concepção foi evoluindo e há, neste momento, um entendimento muito mais profundo das diferenças entre os monocascos e os multicascos a motor. A primeira coisa que configura a diferença é que não se aplicam a estes últimos os valores de velocidade relativa (ou do número de Froude) que correspondem aos vários tipos dos primeiros. Por mais incrível que pareça, um catamarã de deslocamento, com motorização adequada, pode atingir uma velocidade relativa de 3,25, ou ainda mais. Com esta velocidade não se constata qualquer espécie de apoio dinâmico no seu movimento, situação que sabemos, também, ser impossível de se verificar com um monocasco de deslocamento. É importante referir que o cálculo da velocidade relativa dos catamarans se faz tomando em consideração o comprimento entre perpendiculares de cada um dos seus cascos, muito longos e estreitos, por comparação com os das embarcações de um só casco. Observando mais uma vez a figura 6 concluímos imediatamente que, para se atingirem altas velocidades relativas com embarcações de deslocamento (e também com embarcações planantes), é preciso atacar principalmente a resistência de origem gravítica, isto é, a que conduz à formação de ondas. Ora, há duas maneiras para atingir este Pag. 62


desiderato, a saber, reduzir drasticamente o peso ou fazer cascos de deslocamento muito longos e estreitos. Como um catamarã de cruzeiro precisa sempre de algum volume imerso, para poder transportar todas as coisas e pessoas que é normal existirem dentro de uma embarcação com a referida finalidade, não resulta fácil reduzir o seu peso para além de um determinado limite. No que se refere à utilização de cascos planantes subsistem as dificuldades intrínsecas à sua geometria. Por razões óbvias, as querenas dos catamarans são estreitas, isto é, apresentam uma relação entre o comprimento e a boca, na linha de flutuação, da ordem dos 9 ou 10 para 1, enquanto que nas embarcações convencionais de um só casco esses valores são muito menores. Sabemos que, com querenas tão estreitas, é difícil conseguir apoio dinâmico pelo que, só nos resta verdadeiramente a segunda das duas possibilidades antes referidas, ou seja, usar cascos de deslocamento longos e estreitos. Não quer isto dizer que seja impossível conceber catamarans de cruzeiro com cascos planantes, desde que o valor da relação referida antes ande à volta de 7 para 1, mas começa a ser muito complicado desenhá-los quando ultrapassam os quinze metros de comprimento total. Quando, por razões programáticas, se ultrapassa esta dimensão, faz todo o sentido usar querenas de deslocamento, tanto mais que, como dissemos antes, é possível atingir boas velocidades relativas com cascos deste tipo. E porque será que a barreira da velocidade relativa, de 1,34, não se aplica aqui? Porque dois cascos muito estreitos, rigidamente ligados a uma distância conveniente, tem uma área frontal muito menor do que a de um monocasco de comprimento comparável. Contudo, percebe-se intuitivamente que, quanto menor for a área frontal, menor é o volume de água que a embarcação tem de afastar sempre que se move e isso é fundamental para reduzir a resistência provocada pela formação dos sistemas de ondas. É conveniente referir, neste momento, que duas embarcações com o mesmo comprimento da linha de água, deslocando-se a velocidade semelhante, produzem sistemas de ondas de características semelhantes, com a única diferença de que a embarcação mais estreita, com menor área frontal, dá origem a ondas com menor altura, isto é, com uma distância menor entre a cava da onda e a crista respectiva. Compreende-se, sem dificuldade, que o barco mais estreito desloca menos água do que o barco mais largo, situação que, obviamente, exige um menor esforço ao sistema de propulsão, qualquer que ele seja. Quando ainda não se conhecia a teoria que suporta o desenho das embarcações planantes e semi-planantes e, por qualquer razão programática, era imperativo obter “altas velocidades” na água, projectavam-se embarcações de deslocamento muito longas, estreitas e bastante leves, com todos os inconvenientes que daí advinham para a segurança e para a estabilidade. Uma embarcação que ficou famosa na época, desenhada e construída em 1897 por Charles Parsons, tinha um pouco mais de trinta metros de comprimento da linha de água, enquanto a boca na flutuação se ficava por um oitavo deste valor. Esta embarcação, com quarenta e quatro toneladas e meia de deslocamento, dispunha de três turbinas a vapor, cuja potência total atingia dois mil cavalos, conseguindo deslocar-se à “extraordinária” velocidade de trinta e cinco nós. A proporção entre a boca e o comprimento (um para oito), utilizada no desenho das linhas da Turbinia (era este o seu nome), foi uma opção resultante de se ter concluído, pelo recurso a ensaios, que as embarcações com as referidas proporções requeriam a Pag. 63


menor potência para regimes de velocidades relativas inferiores a 1,34. Como hoje sabemos, o argumento que sustentou aquela opção de projecto constituiu, sem margem para discussão, uma falácia resultante da generalização abusiva. Aquilo que é bom para uma velocidade relativa tão baixa, infelizmente não se aplica quando se pretende atingir o valor de 3,5. Para que o leitor fique razoavelmente identificado com as características geométricas de um “catamaran” de cruzeiro, dotado de cascos de deslocamento, apresento na figura 12 o plano geométrico simplificado de uma das mais bem sucedidas formas, capaz de viagens transoceânicas, desde que a sua estrutura esteja adequadamente concebida para resistir a condições adversas de mar. É preciso ter presente que a geometria da asa de ligação dos dois cascos apresenta condicionalismos muito particulares que a diferenciam fortemente da forma dos monocascos pois, para além das questões de resistência mecânica, em geral, e da resistência à flexão e à torção, em particular, que a deslocação em mar aberto coloca, é nesse vazio central que se localiza a maior parte dos espaços de estar e de dormir, nos catamarans de cruzeiro. Voltando agora ao desenho da figura 12, convém referir que ele se afasta bastante da forma inicial dos catamarans a motor que, como já foi dito, eram baseados em desenhos anteriores que tinham sido concebidos para recorrerem ao uso das velas. Essas primeiras embarcações tinham pouca flutuação na popa, disposição que não influenciava negativamente o seu movimento derivado do uso de velame (o conjunto das velas em funcionamento ajudava a equilibrar as querenas), mas que se veio a revelar inconveniente, no caso da propulsão com motores porque, a partir de certa velocidade, a popa começava a afundar e a performance da embarcação era fortemente afectada. Parece-me interessante evidenciar as características da curva das áreas desta embarcação de dimensões apreciáveis. Por causa da forma particular da popa existe, ainda, alguma flutuação entre as secções 5 e 6, o que permite que este barco se desloque em posição horizontal, mesmo quando se move a velocidades importantes, tal como se pretendia. Mas é evidente que a forma da referida curva é típica de uma embarcação de deslocamento. Embora não sejam apresentados os cálculos referentes ao deslocamento e à localização do centro de flutuação, os mesmos foram feitos. Os resultados obtidos permitem afirmar que o volume imerso (dos dois cascos) atinge 15550 dm3, aproximadamente. Por outro lado, nota-se que a localização longitudinal do centro de flutuação ultrapassa ligeiramente a secção mestra, no sentido da proa (1,17 dm), facto que provavelmente não será inconveniente, bastando, para tanto, ter em devida conta o arranjo dos espaços e a distribuição dos elementos mais pesados, quando se proceder ao desenho do seu interior. No caso de se verificar, durante o cálculo dos pesos e da localização do centro de gravidade, que o centro de flutuação precisa de ser recuado, poderemos alterar ligeiramente o volume das duas querenas, exigência que se resolve, sem dificuldade, alargando as secções transversais da popa com vista a um pequeno aumento do seu deslocamento nesta zona.

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VII. EMBARCAÇÕES À VELA. TIPOS TRADICIONAIS E MODERNOS DE VELAME. EVOLUÇÂO DAS FORMAS DOS CASCOS, DAS QUILHAS E DOS PATILHÔES. Desde os tempos mais antigos, os pescadores e outros navegantes procuraram tirar vantagem do uso do vento para se deslocarem em embarcações. A evolução das velas e dos cascos ocorreu, essencialmente, a partir dos dados recolhidos da experiência, muitas vezes penosa e dramática, que permitiu aperfeiçoar empiricamente as embarcações, sem recurso a quaisquer meios científicos de suporte. Só a partir do século XVIII é que alguns físicos começaram a utilizar os incipientes conhecimentos de hidrodinâmica e de aerodinâmica disponíveis nessa época para, aplicando-os à prática de velejar e do movimento das embarcações, tentarem compreender, com um enquadramento científico adequado, os fenómenos que estão envolvidos na actividade náutica. Deve dizer-se, em abono da verdade, que os primeiros resultados obtidos, quer na criação de modelos explicativos, quer ao nível da alteração dos desenhos tradicionais que tinham evoluído lentamente através dos séculos, nem sempre foram satisfatórios. As interacções entre vento, ondulação, querenas e velame são muito complexas e continuamos a constatar, ainda hoje, a existência de várias lacunas e de alguns equívocos nas teorias que pretendem servir de suporte à concepção das embarcações, ao seu desenho e à actividade desportiva que deriva da utilização destes artefactos. É por este motivo que a aprendizagem do acto de projectar embarcações de recreio deve basear-se ainda, em grande parte, no saber feito de experiência, isto é, no conjunto dos dados qualitativos e quantitativos que o uso continuado validou. Isto não quer dizer que a experiência prática (assim como o recurso à teoria) conduza obrigatoriamente a resultados definitivos. Sabemos que algumas das observações que durante muito tempo tivemos por solidamente fundamentadas, sustentaram decisões que o tempo e outras observações do mesmo género acabaram por pôr em causa, demonstrando a sua falsidade. É esta a razão por que nestas, como noutras situações semelhantes, uma atitude de permanente dúvida e de modéstia revela lucidez e bom senso. Estarmos cheios de certezas acerca dos vários aspectos da concepção e da construção de embarcações e, também, da prática da vela denota uma grande falta de realismo. Muitos dos projectistas de maior sucesso guardam ciosamente, para uso pessoal, os resultados de testes e outros conhecimentos que foram adquirindo e validando durante a sua actividade profissional, não só através de um trabalho sistemático de recolha e de inventariação de dados como também de maneira fortuita. Neste momento vem-me à memória a conhecida frase de Picasso que, segundo parece, não desenhava embarcações, mas que mostra como é importante estarmos atentos aos sinais que o mundo nos envia, a todo o momento, e que sintetiza uma atitude mental que devemos ter sempre presente: “Primeiro encontro, depois procuro” Pag. 65


Vamos começar as nossas explicações por uma descrição sumária do efeito do vento nas velas, porque este é um dos aspectos que mais confusão cria na mente dos que pretendem conhecer algo mais do que ideias feitas sobre os fenómenos em causa. Todos os avanços atingidos na concepção dos sistemas de velame, a partir da utilização de panos redondos, foram marcados pela necessidade de se conseguir navegar mais próximo da direcção donde vem o vento, com vista a reduzir os trajectos que antes eram obrigatórios para se chegar a um determinado lugar situado a barlavento. É fundamental que se compreenda que, na sua concepção original, as embarcações movidas a vento constituíam sistemas de atrito que desenvolviam forças propulsoras quase exclusivamente na direcção do movimento do ar. Por causa dessa limitação sofriam as consequências negativas que resultavam da dependência da direcção do vento. Tanto quanto a nossa cultura histórica ocidental (sistematicamente refeita em função dos poderes emergentes) nos permite conhecer, foi a partir do momento em que as embarcações de pesca do Mediterrâneo, por volta do século XII, começaram a utilizar as velas “latinas”, envergadas segundo o plano longitudinal da embarcação, diferentemente das velas redondas, que eram sustentadas por vergas cruzadas transversalmente nos mastros, que os pescadores devem ter percebido intuitivamente que seria possível navegar contra o vento. É claro que esta capacidade de deslocação para novos rumos em relação à direcção do vento não era, nem é, ilimitada. A experiência da vela diz-nos que, mesmo os actuais sistemas mais eficientes, não conseguem fazer progredir as embarcações segundo direcções abaixo de um determinado ângulo entre o sentido do vento verdadeiro e o rumo do barco. Em condições bastante favoráveis esse ângulo é da ordem dos 55 graus, ou um pouco menos, situação em que o ângulo de incidência do vento nas velas fica pelos 25 graus. Neste tipo de mareação, designada por navegação à bolina cerrada, o conjunto da embarcação e das velas funciona como um dispositivo de elevação, no qual a força que produz essa elevação se desenvolve perpendicularmente ao movimento. Trata-se de algo muito diferente do que se passa quando o barco é empurrado pelo vento, isto é, quando navega com vento de popa ou da alheta. Uma análise cuidada da maneira como funcionam os dois sistemas (de atrito, com vento pela ré, e de elevação, com vento pela proa), revela imediatamente a maior complexidade do conjunto das forças envolvidas quando ocorre o movimento da embarcação contra o vento. Por exemplo, o fenómeno do abatimento, que é o ângulo que o plano longitudinal da embarcação faz com o seu caminho real, é maior quanto mais cerrada for a bolina, facto que prejudica significativamente o andamento da embarcação, na medida em que o seu avanço ocorre um pouco de lado, com manifesto detrimento da sua hidrodinâmica, na medida em que a área frontal é superior àquela que o barco apresentaria no caso de se deslocar rigorosamente segundo o seu eixo longitudinal. Os barcos são concebidos para se moverem segundo esse eixo, embora se conheçam algumas excepções muito raras, como era o caso de certas embarcações tradicionais de pesca usadas no Japão e de outras bastante utilizadas pelos pescadores portugueses fora da baía de Cascais (as muletas) cuja concepção explorava a capacidade de deslizarem lateralmente, em determinadas condições, para fins estritamente utilitários (lançamento e recolha das redes).

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Deve ter sido por causa do esforço exigido às embarcações e às tripulações, quando se navega à bolina cerrada, que um velejador de nacionalidade americana, com pretensões a aristocrata, deu como título a um livro, no qual relata os seus feitos náuticos, a seguinte frase: “Os cavalheiros não navegam contra o vento“. Para compreendermos o que está em causa vamos fornecer alguns conceitos adicionais, que nos ajudarão a construir mentalmente um modelo explicativo desta complexa fenomenologia. Chama-se centro velico (ou centro de esforço das embarcações à vela) ao ponto de aplicação da resultante dos efeitos do vento sobre o conjunto das velas. A sua determinação pode fazer-se de várias maneiras, algumas gráficas e outras através de cálculos. Na figura 15 pode ver--se a aplicação de um dos métodos gráficos, provavelmente aquele que os projectistas mais utilizam. Trata-se de determinar o centro geométrico de cada uma das velas e, simultaneamente, de calcular a sua área. Como as velas mais correntes são triângulos ou quadriláteros é relativamente fácil atingir este objectivo. Combinando as velas, duas a duas, determina-se o baricentro dos conjuntos parciais, ligando os centros por um segmento e, colocando perpendicularmente a este, outros segmentos cujo comprimento corresponde às áreas das velas, de modo a que a de menor dimensão seja aplicada a partir do centro da vela maior, e vice-versa. Ligando os extremos dos segmentos obtêm-se o centro de cada conjunto. Repetindo esta operação as vezes necessárias chega-se ao centro velico do conjunto total. Como pode ver-se pela observação da figura 15, as velas situadas para vante do mastro mais avançado não foram consideradas individualmente. O que é costume fazer-se, nestes casos, é considerar o triângulo formado pelo mastro, pelo cabo onde enverga a vela mais avançada, quando há mais do que uma, e pela parte superior do convés, determinando o centro geométrico desta superfície e utilizando, de seguida, a sua área total, independentemente do número de velas que aí existam. Foi aquilo que eu fiz, neste exemplo. Todavia, faço notar que, através de ensaios em túneis de vento e de medições com modelos, foi possível concluir que a posição dos centros velicos não é estável. A sua localização depende das mareações e de outros factores que não vale a pena referir neste contexto. Mas a variação das posições quando a área do pano se mantém constante é relativamente limitada e pouco relevante para o que nos diz respeito. Para já, interessa fixar este método de determinação do centro velico, pois a sua relação com outro centro, o centro de resistência lateral, deve ser devidamente considerada no desenho de embarcações à vela. Para o observador pouco atento, o efeito do vento nas velas parece resultar directamente da pressão do ar em movimento, situação que, afinal, só acontece com vento de través ou de popa. Contudo, nas condições de navegação contra o vento, já estamos em presença de um conjunto de forças que podem ser comparadas com as que se desenvolvem na asa de um planador ou de um ultraleve, quando estes se deslocam no ar. Na verdade, as experiências levadas a cabo neste domínio por investigadores qualificados vieram demonstrar que a força de elevação é, na sua maior parte, devida à redução da Pag. 67


pressão do vento no extradorso das velas (sotavento) e não ao aumento da referida pressão no intradorso. A curvatura das velas, sob a acção do vento frontal, obriga a que o ar que circula na parte convexa se desloque com maior rapidez do que o que passa na zona côncava (barlavento). A dinâmica dos fluidos ensina-nos que a pressão diminui nas regiões em que a velocidade do fluido é maior, por oposição àquilo que se passa nas regiões de baixa velocidade. Assim, a força de elevação acaba sendo o resultado combinado da redução da pressão e do seu aumento, respectivamente, a sotavento e a barlavento, embora se saiba, através de testes laboratoriais, que a sucção produzida no extradorso da vela conta bastante mais do que o empuxo no intradorso. Verifica-se, na realidade, que com a sucção se obtém aproximadamente 60% a 80% da força total. Nos sistemas em que há várias velas parcialmente sobrepostas (ver, para este fim, os esquemas explicativos da figura 13) desenvolve-se, ainda, um efeito adicional, o chamado efeito de fenda, que conta positivamente para o andamento da embarcação. A geometria do conjunto faz com que a corrente de ar que passa entre as velas aumente ainda mais a sua velocidade no extradorso da segunda vela (e das restantes, quando existem), potenciando a diminuição da pressão nesse lado do pano e, consequentemente, o efeito de sucção. Mas, para que as coisas se processem da melhor maneira, é preciso que as velas adjacentes se mantenham com uma posição e uma curvatura semelhantes e, por outro lado, que a parte em que se verifica sobreposição dos panos apresente uma área razoável, sem ser excessiva. A experiência demonstrou que há um limite para essa sobreposição, que é também influenciada pela resistência mecânica dos mastros para suportarem as tensões produzidas pelas velas e pela capacidade dos molinetes, ou dos músculos dos tripulantes! Acontece, ainda, que certas normas contidas em regulamentos de regata, definidoras das principais características das embarcações, condicionam as dimensões das velas, bem como as áreas de sobreposição. Ao conjunto das forças que a passagem do ar faz que se desenvolvam sobre as velas contrapõem-se um outro conjunto que actua sobre a embarcação e, em particular, sobre as obras vivas, como consequência da passagem da água. Chama-se centro de resistência lateral ao ponto onde a resultante dessas forças actua. Se repararmos no desenho constante da figura 14 podemos aperceber-nos perfeitamente dessas acções actuando sobre a querena, quando a embarcação se desloca à bolina. Na figura 15, anteriormente referida a propósito do centro velico, aparece também indicado o centro de resistência lateral, que não é mais do que o centro geométrico da figura plana que representa, nesta vista, a projecção das obras vivas da embarcação sobre o plano de referência. Para determinar a sua localização aproximada há, também, vários métodos, sendo o mais comum e mais simples, aquele que consiste na reprodução do perfil situado abaixo da linha de água, em papel rígido ou cartolina, recortando-o com uma tesoura, ou outro dispositivo de corte. Suspende-se, em seguida, a figura assim obtida, do bisel de uma régua, em equilíbrio horizontal, e marca-se sobre ela a linha de intersecção dos dois planos. Repete-se esta operação segundo três direcções quaisquer, marcando novamente na superfície da cartolina os segmentos de recta que coincidem com as intersecções do plano da régua com a figura que nela está apoiada e equilibrada. Verificaremos que, se houver algum cuidado, os três segmentos se encontram num único Pag. 68


ponto. Este é o centro de resistência lateral que coincide, obviamente, com o centro geométrico da figura. Vamos agora discutir com algum pormenor, a relação que deve existir entre as posições relativas deste centro e do centro velico, para que a embarcação não apresente vícios e navegue nas melhores condições. Contudo, devo advertir o leitor de que existe uma enorme controvérsia acerca desta matéria, porque, tal como já o referi inúmeras vezes, o desenho de embarcações de recreio não se apoia em princípios científicos exactos. Tomando como aceitável o que diz F. S. Kinney, no conhecido livro Skene,s Elements of Yacht Design, sobre a percentagem que representa a distância horizontal entre os dois centros, relativamente ao comprimento da linha de água, medido ao longo do seu eixo central, teremos: 

para sloops- de 14% a 19%;

para yawls- cerca de 15% (atribuindo metade da área da catita, no cálculo da posição do centro velico);

para ketches- cerca de 20% (atribuindo metade da área da mezena, no cálculo da posição do centro velico);

para schooners- cerca de 5%.

Todos estes valores são para utilizar partindo do princípio que o centro velico está situado à frente do centro de resistência lateral, na direcção da proa. No entanto, o famoso palhabote América, que fez uma carreira desportiva extraordinária, tinha o centro velico recuado em relação ao centro de resistência lateral de cerca de 1% do comprimento da linha de água! Aproveito este momento para referir que, como é evidente, nas embarcações com patilhão móvel, é possível alterar a posição do centro de resistência lateral conforme se move o referido apêndice. Até existem veleiros com dois patilhões, sistema que permitem actuar com maior eficácia neste domínio, com vista à melhoria das condições de navegação. Já constatámos, a propósito do estudo das embarcações a motor, que as forças envolvidas no seu movimento estão essencialmente relacionadas com fenómenos hidrodinâmicos. No que se refere às embarcações movidas exclusivamente à vela, ou que dependem parcialmente do movimento do ar para se deslocarem, estão obviamente em causa fenómenos que, além da água, envolvem o ar. Estamos a falar de forças de atrito e de elevação actuando nas querenas e nas velas, sendo certo que a necessidade da sua compreensão implica que nos detenhamos com algum pormenor nos modelos científicos que as explicam. Quando um flutuador se desloca na interface dos dois fluidos, a água e o ar, ou quando estes se deslocam em torno do flutuador, o que, de um ponto de vista do enquadramento teórico, não apresenta qualquer diferença, o referido objecto fica sujeito a um conjunto complexo de forças e momentos, em que as primeiras se podem descrever cientificamente sem grande dificuldade, mas cuja

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separação e graduação, na prática, se revelam extremamente difíceis. Vejamos, em termos gerais, o elenco das entidades físicas mais evidentes que estão envolvidas no movimento: 1.

Forças da inércia (elevação), que derivam da aceleração do movimento dos fluidos quando se afastam do seu percurso normal por efeito da presença de uma embarcação;

2.

Forças da viscosidade (atrito), que se devem à atracção exercida pela superfície do casco e das velas sobre os fluidos que com eles contactam, originando um gradiente de velocidade nas camadas sucessivas dos fluidos (ar e água) em contacto com a embarcação, a que já antes nos referimos, a propósito das embarcações a motor;

3.

Forças da gravidade, que empurram os fluidos para as suas posições de equilíbrio, depois de se terem afastado para cima e para baixo, pela acção da passagem do flutuador;

4.

Forças de compressão, devidas à eventual redução do volume dos fluidos como resultado da passagem do flutuador.

Uma rápida apreciação deste conjunto leva-nos a concluir que só as três primeiras é que nos devem preocupar quando estamos confrontados com o desenho de embarcações de recreio, na medida em que as forças de compressão só interessam aos engenheiros e físicos aeronáuticos, pois só eles lidam com artefactos que se deslocam a velocidades próximas ou superiores à velocidade do som no ar. Quanto às forças da viscosidade e da gravidade já falámos bastante delas quando discutimos as querenas das embarcações a motor. Ficam, então, para analisar as forças de inércia, as tais que se desenvolvem perpendicularmente à direcção do movimento dos corpos e desempenham um papel fundamental na sua progressão, nas situações em que esta depende de sistemas de velame ou de dispositivos semelhantes, que tiram partido do vento. Quando nos dedicamos ao estudo da passagem do ar pelas velas e da água pelos apêndices dos cascos que produzem efeitos hidrodinâmicos favoráveis, tais como as quilhas, os patilhões, as tábuas de abatimento e os lemes, temos a consciência de que esses dispositivos não interferem, a não ser marginalmente, com o que se passa na interface dos dois fluidos. Na verdade, a formação dos vários sistemas de ondas que o movimento da embarcação gera depende, essencialmente, da força da gravidade e da área frontal que o flutuador em causa apresenta quando se move, não sendo influenciada pelas forças de inércia e de viscosidade. Também já tratámos anteriormente deste assunto quando estudámos as embarcações a motor, pelo que não se justifica repetir as considerações que foram feitas nessa oportunidade. Tendo em atenção que o presente texto lida essencialmente com o desenho de embarcações de recreio (de cruzeiro e de regata), não vamos falar de embarcações à vela que são ou eram destinadas a outros fins. Esta é uma área do conhecimento mais ligada à história que pode ser explorada por aqueles que tiverem interesse no assunto, já que a sua vastidão e variedade dão pano para mangas, como diz o povo. Pag. 70


Por outro lado, mesmo com a limitação do universo do discurso às embarcações de recreio, a catalogação e tipificação das várias configurações de velame não se revela muito simples, já que são muitas as nações e culturas que apresentam um património muito variado neste domínio. Contudo, há dois países cujas tradições são mais ricas, correspondendo cada um deles a atitudes diferenciadas, quer dos construtores, quer dos projectistas, quer dos praticantes do desporto, provavelmente por influência de factores históricos, sociais, geográficos e económicos que não será muito difícil discernir. Estamos a falar da Inglaterra e dos Estados Unidos da América. É claro que outros países mais pequenos, como a Suécia e a Holanda, ou mais longínquos, como a Austrália e a Nova Zelândia também praticaram e praticam intensamente este desporto, tendo, até, contribuído com avanços científicos e técnicos da maior relevância para a melhoria das performances destes artefactos. Mas não pode deixar de se assinalar que as alterações do desenho e da fabricação que ocorreram nos Estados Unidos durante a segunda metade do século dezanove e a primeira do século vinte, período em que os seus projectistas e estaleiros lutavam para roubar a supremacia aos ingleses nos domínios da concepção e dos materiais, contribuíram decisivamente para a democratização desta actividade, tradicionalmente reservada aos mais ricos, pelo menos no que diz respeito às unidades de maiores dimensões. Como é fácil entender, as embarcações exclusivamente destinadas a cruzeiros privilegiam o conforto e a segurança, em detrimento da velocidade. Já as embarcações destinadas essencialmente à prática de regatas são concebidas e construídas, tendo como objectivo principal as performances desportivas. São bem conhecidos alguns casos em que este objectivo foi levado a extremos que redundaram em desastre, implicando, até, a perda de vidas humanas. Tudo aconteceu deste modo porque a busca incessante da velocidade obriga a um esforço de redução do peso e isso, obviamente, pode resultar no enfraquecimento das estruturas, mesmo nos casos em que se utilizam materiais exóticos e dispendiosos cujas características mecânicas são excepcionais. Quando está em causa a produção de grandes séries de embarcações, cujo volume e desenho do interior permitem aos utilizadores permanecerem a bordo por períodos de tempo alargados, com possibilidade de pernoitarem e de prepararem refeições, os fabricantes procuram soluções de compromisso que lhes permitam vender um objecto que seja adaptável às duas funções, o cruzeiro e a regata. Isto tem sido conseguido com algum sucesso, muitas vezes à custa da redução dos custos de fabricação, por via da instalação de unidades fabris em países onde a mão-de-obra é mais barata. Nos tempos em que o material mais comum para a fabricação das embarcações de recreio (e outras) era a madeira, a construção de barcos de qualidade só era viável quando estavam disponíveis artesãos qualificados e experientes, situação que, por causa do método de aprendizagem, correspondia sempre à existência, ao longo de décadas, de gerações de carpinteiros navais e de uma tradição instalada desde longa data que permitia um conhecimento profundo das características dos materiais e da maneira de os utilizar. E este enquadramento social e técnico, associado ao elevado custo do produto final, limitava as possibilidades Pag. 71


de execução dessas máquinas de qualidade excepcional, muitas das quais ainda estão disponíveis hoje, por causa dos esforços dos proprietários, que investem continuamente verbas elevadíssimas na sua recuperação e conservação. Mas quando começou a generalizar-se a construção de barcos em resinas plásticas reforçadas a fibra de vidro, tudo se alterou. Como é fácil de constatar, este material pode ser manuseado por gente sem preparação técnica específica, sendo fácil, para quem dirige as unidades fabris, fazer um controlo rigoroso da qualidade. Em países pobres é sempre possível poupar nos sistemas eficientes de ventilação e noutros dispositivos de prevenção destinados a minimizar os inconvenientes para a saúde dos operários que o manuseamento descuidado das resinas sintéticas e das fibras de vidro e de carbono pode provocar. Por outro lado, os impactes ambientais dos subprodutos desta indústria não devem ser negligenciados e alguns países já dispõem de legislação restritiva cujo rigoroso cumprimento acaba por onerar significativamente o custo de produção das embarcações. Apesar das enormes quantidades de embarcações de plástico reforçado a fibra de vidro, obsoletas ou fora de uso, que enchem as marinas, os estaleiros, os espaços de parqueamento e os depósito que pululam por toda a parte, ainda não foi desenvolvido um sistema económico, eficaz e não poluente para conseguir a sua eliminação. Faço notar que não se conhece, ainda, qual é o tempo de vida deste material composto que, aparentemente, parece ser eterno e que, por causa disso, começa a colocar problemas difíceis de resolver, muito diferentes dos que ocorrem, por exemplo, com os automóveis, cuja reciclagem já está a fazer-se em condições relativamente aceitáveis. Quando estes últimos ficam obsoletos, é possível aproveitar uma fracção significativa dos seus componentes e o aço com que se fabricam as carroçarias acaba por deteriorar-se se for deixado sob a acção prolongada do tempo. O mesmo não acontece com os materiais de que agora se faz a maior parte das embarcações de recreio. Voltando novamente à questão da configuração dos sistemas de velas mais comuns convém referir que não tenho a pretensão de fazer uma descrição exaustiva de todos os tipos. Há, porventura, muitos que desconheço ou que conheço mal. Mas aquilo que pode interessar, no âmbito deste texto, é dar uma ideia geral do assunto, com vista à criação de uma base de conhecimentos susceptível de um eventual aprofundamento futuro por parte dos leitores cuja curiosidade não se esgota facilmente. Já falámos superficialmente acerca das duas maneiras como podem ser envergadas as velas e das designações respectivas. As velas redondas envergam em paus cruzadas nos mastros perpendicularmente ao plano longitudinal e as velas latinas envergam segundo o referido plano, em mastros, vergas, caranguejas e estais. É sabido que os panos redondos caíram praticamente em desuso e que, pelo menos no que diz respeito às unidades modernas, se generalizou o uso do pano latino de desenho triangular e trapezoidal, pela possibilidade que estas velas nos dão de explorar mareações que não estão ao alcance das velas redondas.

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As embarcações de recreio movidas à vela, de dimensões mais correntes, possuem um ou dois mastros, podendo encontrar-se unidades maiores com três e mais mastros. Contudo, vamos enumerar exclusivamente as primeiras, utilizando uma mistura da terminologia anglo-americana com a portuguesa, por ser aquilo que é mais corrente entre nós. Devo referir que muitas destas embarcações são derivadas de embarcações tradicionais utilizadas pelos seus detentores em várias fainas, o que permitiu evidenciar as suas qualidades marinheiras. É claro que a mudança desses artefactos para uma utilização exclusiva no desporto e o recurso generalizado a motores auxiliares permitiu refinar os desenhos e as técnicas de construção, com o objectivo de melhorar as performances, de simplificar o aparelho e de satisfazer o orgulho dos praticantes e dos possuidores. As embarcações de um mastro que usam uma só vela envergada nesse mastro foram muito populares nos Estados Unidos no fim do século dezanove e no princípio do século vinte mas caíram em desuso por causa da instabilidade que resultava, em grande parte, de alguns exageros na sua concepção. Eram denominadas cat boats e raramente ultrapassavam os trinta pés de comprimento entre perpendiculares. Uma embarcação que continua a ser extremamente popular ainda hoje é o sloop. Tem um mastro, uma vela grande e um estai que, em determinadas mareações e condições de vento pode ser substituído ou acompanhado por mais um pano. Outro barco bastante parecido com este é o cuter. Aquilo que distingue a sua armação da do sloop é a relação entre a área da vela grande e a dos panos que são envergados para vante do mastro. No caso do cuter a vela grande é menor, como consequência da implantação do mastro mais para a ré do que no sloop. Existe a ideia de que o cuter é um barco melhor adaptado para cruzeiros oceânicos e situações de mau tempo, por causa do maior número de velas que a sua armação permite envergar, facilitando combinações mais variadas da área dos panos e das posições dos centros velicos do que a armação do sloop. A armação de que falaremos a seguir, que é bastante comum em embarcações com comprimento superior a quarenta pés, é o ketch, também designado entre nós por chalupa. Trata-se de uma armação de dois mastros, sendo o mastro da ré de pequenas dimensões. Designa-se por vela grande aquela que enverga no mastro grande e por mezena a que enverga no mastro menor. Uma armação bastante semelhante a esta é a do yawl. Neste caso o mastro da ré ainda é menor do que o anterior e muito chegado ao painel da popa. Por causa desta localização do mastro, a retranca respectiva projecta-se para além do comprimento do casco. Por outro lado o pano que enverga neste mastro designa-se por catita e tem, obviamente, dimensões muito reduzidas. Pode dizer-se que a sua utilização serve, principalmente, para estabilizar o casco, contrariando os balanços provocados pelas ondas, tal como acontece, por exemplo, em pequenas embarcações de pesca, a motor, que praticam a sua faina no norte da Espanha (e noutros locais) e que dispõem, apenas, de um pequeno mastro fixado na popa para envergar a referida vela. Praticamente todos os entendidos nestas matérias são unânimes em dizer que quando o mastro pequeno fica para a ré da roda do leme, estamos em presença de um yawl. Pag. 73


Finalmente, apresentamos o palhabote, que nas terminologias inglesa e americana se designa por schooner. É um barco com dois mastros, como a chalupa e o yawl, mas em que o mastro grande, contrariamente ao que se passa com estas duas armações, se situa para a ré do mastro menor. Neste caso o mastro menor é designado por mastro do traquete. Esta disposição dos mastros influencia decisivamente a geometria das velas, colocando alguns problemas ao aproveitamento do espaço situado entre os dois mastros. O recurso a latinos quadrangulares é bastante habitual nestes casos, mesmo quando as restantes velas são latinos triangulares. Mas há outros esquemas de velame mais ou menos comuns neste tipo de armação, tendo em atenção que os latinos quadrangulares se encontram fora de moda há bastante tempo, por causa da maior complexidade da sua manobra e da necessidade de usarem mais um pau, a carangueja. Não posso deixar de chamar a vossa atenção, neste momento, para o facto de que o domínio quase absoluto da vela triangular, também designada por bermuda ou Marconi, começa a ser posto parcialmente em causa. Estão a aparecer, com bastante frequência, armações que, sem serem absolutamente fieis à tradição, recuperam geometrias antigas que parecem ter dado excelentes prestações, adaptando-as ao nosso tempo, através do recurso a materiais mais leves e resistentes e a dispositivos de manobra, cuja concepção e desenho actualizam os antigos artefactos. Tenho visto defender estas armações com argumentos técnicos e científicos dificilmente aceitáveis, embora me pareça mais razoável admitir que, provavelmente, o que está em causa é um desejo de recuperar imagens do passado e de retornar às coisas supostamente simples que se pensa terem existido nesses tempos mais recuados. Em boa verdade, essas coisas só tem vida real na imaginação das pessoas. Mas devemos ser tolerantes com estes apetites românticos e compreender que na nossa existência tomamos, muitas vezes, decisões que não são inteiramente racionais. Pela minha parte acredito que estamos em presença de uma recusa momentânea e passageira dos desenhos modernos e ultramodernos que está a verificar-se, também, noutras áreas da concepção de bens duradouros de consumo. Um argumento que me seduz significativamente nestes exemplos reaccionários do desenho de embarcações é a sua indiscutível beleza. Com esta resumida e rápida exposição de alguns dos tipos mais comuns de armações de embarcações à vela, esquematicamente representados nas figuras 16, 17 e 18, não ficam obviamente esgotadas todas as hipóteses e alternativas em matéria de concepção. Há um sem número de soluções novas (e a inventar), fruto da imaginação dos projectistas, ou repescadas de tradições locais quase esquecidas, que merecem análise e ponderação, com vista ao seu uso e à experimentação, sempre que os proprietários e os utilizadores estejam disponíveis para explorarem novos caminhos, ou caminhos antigos que foram momentaneamente varridos da memória dos povos. O que é importante, quando se desenha algo que se afasta das soluções conhecidas e experimentadas, é a necessidade de aderir aos princípios, às relações que tenho vindo a referir e que a experiência consagrou. Pag. 74


Tal como já disse anteriormente a propósito de outras matérias, para quem estiver interessado em aprofundar os conhecimentos neste domínio complexo do desenho das velas estão disponíveis indicações bibliográficas preciosas no final do livro. O texto “The sailmaker’s apprentice”, de Emiliano Marino, é um documento excepcional, ao qual nem sequer falta aquele elemento de paixão, sem o qual o estudo de qualquer matéria científica e técnica se torna quase insuportável. Ainda nada foi afirmado acerca da área total do velame das embarcações. Depois de tudo o que tem sido dito, torna-se evidente que a referida área depende de vários factores. Contudo, é do mais elementar bom senso concluir que a superfície total das velas de uma embarcação deve permitir-lhe navegar satisfatoriamente, sem que seja constantemente necessário reduzir o pano para evitar inclinações excessivas. Já anteriormente no capítulo IV, a propósito das relações e dos coeficientes comparativos escrevi algo sobre este assunto. Sendo certo que a superfície molhada e o deslocamento determinam decisivamente as performances da embarcação, faz todo o sentido relacionar a área do velame com estas duas variáveis. Teremos, então, uma expressão e dois gráficos que nos permitem testar a validade da opção que o nosso desenho representa neste domínio e, eventualmente, proceder à sua correcção, se for caso disso. Ver, para este efeito, a figura 19. No primeiro gráfico temos no eixo das abcissas o quociente entre a área das velas (em condições normais de vento) e a superfície molhada e no eixo das ordenadas o comprimento da linha de água. No segundo gráfico, o eixo das abcissas contém os valores do produto da superfície molhada pelo comprimento total do casco dividido pelo deslocamento, enquanto que o eixo das ordenadas apresenta, como no primeiro gráfico, o comprimento da linha de água. Na presente situação vamos recorrer, por razões históricas, ao sistema inglês de medidas, sendo certo que os valores calculados para os eixos das abcissas são adimensionais e, portanto, não dependentes do sistema utilizado. Faço notar que os gráficos apresentados se destinam a embarcações de cruzeiro. Com os dados assim obtidos não se está à procura de atingir boas prestações em regime de regata, é preciso ser mais agressivo! Como já dispomos dos valores da embarcação da figura 2 que nos permitem aplicar, de imediato, o segundo gráfico, vamos utilizá-lo para calcular a área do pano que conduz à obtenção de adequadas condições de navegação. Assim, teremos: LA = 6m = 19,67 pés C = 7,75m = 25,41 pés D = 3,546m3 = 125 pés cúbicos Se olharmos com atenção para o gráfico em causa, veremos que, como o comprimento da linha de água é ligeiramente inferior a 20 pés, o ponto a aplicar estaria na mancha mais elevada (ponto B). Contudo, acabei por escolher o ponto A, porque se trata de uma embarcação com cabina, de deslocamento Pag. 75


apreciável e, na verdade, as manchas mais pequenas, nos dois gráficos, destinam-se a embarcações miúdas e abertas que navegam em zonas protegidas, com as tripulações a contribuírem decisivamente para o seu equilíbrio. Não é, obviamente, a situação do pequeno cruzeiro que temos vindo a estudar. O ponto A permite-nos ler, no eixo das abcissas, um valor de 70. Aplicando este valor no primeiro termo da fórmula respectiva, fica:

70 

70  125 Sv  C  344  S v  344 pés quadrados (  37 m2)  Sv  25,41 D

Se pretendermos armar a embarcação em sloop, por exemplo, teremos de dividir a área assim determinada, pela vela grande e pelo triângulo definido pelo mastro, pelo cabo onde enverga o estai e pela parte superior do convés, tal como anteriormente foi explicado. Parece-me conveniente referir, neste momento, que quando falo em triângulos estou a fazer aproximações mais ou menos grosseiras, na generalidade das situações. Como é sabido, há dois lados das velas triangulares e das velas latinas quadrangulares que não são rectos, visto apresentarem uma certa curvatura. Quer a valuma, quer a esteira dessas velas são desenhadas deste modo. Sendo assim, nos casos em que essa curvatura é muito acentuada, é conveniente fazer a avaliação desse excesso e acrescentá-lo ao cálculo da área do triângulo respectivo, ou do quadrilátero. Nos casos em que a curvatura é diminuta, não é costume considerá-la para efeito de computação das áreas. Já referi inúmeras vezes, ao longo desta obra, que a enorme quantidade de variáveis que influenciam a qualidade final do artefacto que estamos a conceber e que não temos condições para considerar na totalidade, quando fazemos opções de projecto, justificam que os cálculos envolvidos e as fórmulas empíricas aplicadas sejam usados com bom senso e, principalmente, sem excessos ridículos de rigor. Contudo, parece-me oportuno referir que há outros métodos mais refinados para determinar a superfície que as velas devem ter, mas só faz sentido recorrer a eles quando estão em causa embarcações de regata. Os métodos do ângulo de Dellenbaugh e do coeficiente de pressão do vento são dois deles. Quem estiver interessado no assunto pode consultar, entre outros, o livro “ Technical Yacht Design”, de Andrew Hammitt. Para encerrar este capítulo vou falar, um pouco, sobre o tema das formas das obras vivas das embarcações à vela, ou melhor, acerca da geometria do perfil destes artefactos, abaixo da linha de água. Para este efeito é conveniente observar com atenção as figuras 20 e 21, onde estão representados vários perfis da parte imersa de embarcações projectadas nos anos referidos no lado esquerdo dos desenhos, figurando, no lado direito, uma representação esquemática das secções mestras. Estão ainda indicados os valores do deslocamento, em toneladas, e do comprimento da linha de água, em metros. Não existe, da minha parte, a intenção de apresentar exaustivamente todas as situações que ocorreram durante estes 105 anos. O meu objectivo consiste em tipificar as tendências mais significativas que se afirmaram neste período. Uma das principais tendências, que se constata nas embarcações projectadas sem quaisquer intenções revivalistas, é a constante redução do peso, com vista ao aumento da Pag. 76


velocidade e à diminuição do custo. É claro que esse desiderato só pôde ser atingido por via do recurso a novos materiais ou novas técnicas de utilização de materiais tradicionais, como é, por exemplo, o caso da aplicação das madeiras moldadas e coladas à temperatura ambiente, com colas de nova geração. Outra tendência, também evidente, é a da redução da superfície molhada e, consequentemente, da área do perfil longitudinal. O recurso a patilhões rotativos e outros dispositivos móveis, de aumentar e reduzir o calado manteve-se estável ao longo deste período e foi utilizado, em geral, para facilitar a navegação em águas pouco profundas, locais onde não se podia chegar com quilhas de dimensões convencionais. É claro que também contava como objectivo dos projectistas e dos utilizadores, a diminuição da superfície molhada, quando os patilhões estavam recolhidos. Uma tendência que também se difundiu e acentuou foi a da separação entre as quilhas e os cascos, passando aquelas a assemelharem-se a asas de aviões, com perfis adaptados de séries testadas em laboratório, terminando muitas vezes com bolbos hidrodinâmicos lastrados. Este género de dispositivos contribui para a melhoria das performances mas levanta sérios problemas de resistência mecânica, principalmente na zona da junção das quilhas com os cascos, Por causa da deficiente resolução técnica destas ligações, já ocorreram incidentes muito graves em embarcações projectadas por gabinetes com reputação internacional e em outras de produção corrente. Soluções deste tipo exigem um estudo aturado e a eventual contribuição de especialistas na concepção de estruturas metálicas sofisticadas. O cálculo e a localização do lastro das embarcações à vela é uma das matérias que não pode ser ignorada, mesmo num livro que pretende ser uma introdução ao desenho destes artefactos. Para a sua colocação há que ter em conta a localização pretendida do centro de gravidade total, pelo que nem sempre é possível encontrar a solução à primeira tentativa. Como se trata provavelmente do item mais pesado, uma vez que, nas embarcações que dependem dele para obter um nível adequado de estabilidade, deve constituir entre 30% e 60% do peso total, há que ter o maior cuidado na determinação dos seus pontos de apoio. Em geral, fica colocado entre as secções transversais 3 e 6, quando se divide a linha de água em 10 secções, com o zero situado do lado da proa. É fixado por grandes parafusos à quilha, dependendo o sistema de fixação do material em que é feita a embarcação. Aproveitando, mais uma vez, a embarcação da figura 2, vamos fazer o ensaio que é apresentado na figura 25, retirando do desenho base, para o efeito, os elementos necessários para a resolução do problema. Como pretendemos obter resultados suficientemente precisos, vamos reduzir para metade o espaçamento dos planos que seccionam a embarcação transversalmente, introduzindo os planos 2A, 3A, 4A e 5A, a acrescentar aos planos preexistentes 2, 3 e 4. Recorrendo à regra de Simpson, medem-se as áreas das partes das secções que são ocupadas pelo lastro e procede-se ao cálculo habitual. Segue-se a aplicação das fórmulas já conhecidas e, deste modo, ficamos a conhecer o volume do lastro e a localização da vertical que contem o seu centro de gravidade. Não esquecer que o lastro é feito de um material Pag. 77


homogéneo, ferro fundido ou chumbo, com densidades respectivas de 7,1 e 11,5. Apresentam-se os cálculos de seguida:

Sn

A/2 (dm2)

X

V

X

C

∑b

2A

0,00

1

0,00

3

0,00

2

0,39

4

1,56

2

3,12

3A

2,53

2

5,06

1

5,06

3

3,94

4

15,76

0

0,00

4A

3,51

2

7,02

1

-7,02

4

2,68

4

10,72

2

-21,44

5A

1,75

1

1,75

3

-5,25

∑ a = 41,87

V

2

a d 3

 V

+8,18

-33,71 ∑ bt = - 25,53

2  41,87  5,0  V  139,57 dm3 3

Vamos optar, neste caso, pelo chumbo. Como a densidade deste metal é de 11,5 teremos como peso total da peça: 139,57 x 11,5 = 1605 kg Cálculo da percentagem do peso do lastro relativamente ao peso da embarcação: 1605 ÷ 3637 = 0,44  44% Cálculo da posição longitudinal do centro de gravidade do lastro, coincidente com o seu centro de flutuação (a peça é constituída por um material homogéneo, sem vazios):

Cg 

-25,53  5,0 b  d  Cg   Cg = 3,05 dm, em direcção à popa (por ser um valor negativo), 41,87 a

a partir da secção 3. Como já referimos antes, optou-se por recorrer ao chumbo como material de base pelo que se obteve uma peça com o peso total de 1605 kg, o que nos dá uma percentagem de 44%, relativamente ao peso total já conhecido. Para embarcações deste género é um valor aceitável, podendo ser um pouco menos, à volta dos 40%. Se repararmos nos desenhos da figura 25, onde também está marcada a vertical do

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centro de flutuação da embarcação, verificamos que existe uma distância de 0,98 dm entre esta e a vertical do centro de gravidade do lastro. Só conhecendo a posição do centro de gravidade da embarcação, sem o lastro, será possível saber se a combinação assim obtida coloca o centro de gravidade do conjunto na vertical do centro de flutuação. Se assim não acontecer, há que fazer ajustes e redesenhar o lastro ou desloca-lo para outra posição conveniente. Contudo, como pouca gente acredita em milagres é costume, nestes casos, deixar sempre 1% a 5% de lastro móvel, no interior, para ajustes finais! Devo, ainda, acrescentar uma última nota a propósito da escala a que foi realizado o desenho da figura 25. Está em causa um objecto de dimensões reduzidas pelo que, para efeito de maior precisão nos resultados, seria conveniente recorrer, por exemplo, à escala 1: 10. Tal tarefa não foi empreendida porque o que se pretende é explicar o processo e nada mais.

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VIII. SISTEMAS DE PROPULSÃO MECÂNICA. MOTORES; CAIXAS REDUTORAS E DE INVERSÂO. HÉLICES. Os sistemas de propulsão mecânica das embarcações de recreio subdividem-se em três subsistemas, a saber, o subsistema motor, o conjunto dos elementos de transmissão e o dispositivo propulsor propriamente dito. Acerca do primeiro pode dizer-se que, excluindo o método anacrónico das máquinas a vapor e as modernas turbinas a gás, estão em apreciação dois tipos principais, os motores de explosão e os motores de combustão interna. Os primeiros consomem gasolina e os segundos consomem gasóleo. Devo referir que em alguns países onde o gosto pela tradição está muito arreigado, como é o caso da Inglaterra, existem ainda exemplares de embarcações de recreio movidas a vapor, que eram essencialmente destinadas a circularem em águas interiores e que são agora extraordinariamente bem cuidadas e exibidas com enorme orgulho em exposições e outros eventos de carácter festivo, para além da sua utilização para passeios em rios navegáveis e lagos. Há neste país e, também, nos Estados Unidos várias associações de proprietários deste tipo de embarcações e fabricantes de equipamentos mais ou menos requintados que fornecem, com os referidos equipamentos, indicações e especificações técnicas detalhadas para a sua montagem e utilização. Trata-se, obviamente, de um movimento com características revivalistas que explora, como já disse antes a propósito dos sistemas de velame tradicionais, uma visão romântica passadista, ao gosto de alguns estratos sociais da classe média alta. Para dizer algo do outro sistema menos comum de propulsão mecânica, a turbina de gás, há que referir que a sua grande virtude reside no facto de ser comparativamente mais leve do que os outros sistemas, embora apresente inconvenientes que só permitem o seu uso em embarcações excepcionais, nomeadamente, as que são destinadas a usos militares. Estou a referir-me às altas rotações que este sistema desenvolve, o que impõe a utilização obrigatória de dispositivos de transmissão complexos e dispendiosos, de modo a ser possível reduzir as rotações da turbina para valores compatíveis com a utilização de hélices em meio aquoso, para já não falar do facto de, no fabrico das referidas turbinas, haver necessidade de recorrer a materiais com características mecânicas e térmicas especiais, por causa das altíssimas temperaturas que se desenvolvem no seu interior, quando em funcionamento. Os metais e os materiais compósitos que são usados na produção dos motores de avião (a jacto) dão-nos uma ideia do que está em causa. Contudo, há já alguns anos que estão em curso investigações acerca de novos compostos cerâmicos que resistem a esforços mecânicos excepcionais e a altíssimas temperaturas. Se essas investigações vierem a traduzir-se em resultados favoráveis do ponto de vista técnico e dos custos de produção, poderão abrir-se, no futuro, perspectivas interessantes para a Pag. 80


utilização e a subsequente banalização das turbinas a gás, por causa do seu reduzido volume e peso, conquanto o combustível a usar não atinja preços proibitivos, o que para já parece pouco provável. Em rigor, ainda existe um outro subsistema de motorização, hoje caído em total desuso, que teve alguma voga nos finais do século dezanove e, ainda, durante o século vinte. Este subsistema começou por ser aplicado nas primeiras embarcações que atingiram altas velocidades. Estamos a falar das turbinas a vapor. A propósito da geometria dos cascos falei anteriormente do Turbinia, um barco que era dotado de uma máquina deste tipo e que em 1895, em Inglaterra, atingiu a extraordinária velocidade de mais de trinta e dois nós! Na sequência deste sucesso e de alguns outros do mesmo género, apareceram várias aplicações militares e comerciais deste “motor”, mas a sua complexidade e ineficiência fez desaparecer totalmente este tipo de motorização, em embarcações de recreio. Voltando agora aos subsistemas mais comuns, os motores de explosão e de combustão interna, pode dizer-se que nos últimos quarenta anos se assistiu a uma evolução destes subsistemas, nem sempre comandada pelas exigências do uso a que nos estamos a reportar, isto é, à utilização em ambiente marítimo. Na verdade, as dimensões, o peso específico, as velocidades atingidas e a potência alteraramse profundamente. Mas os motores de que estamos a falar são produzidos, há algumas décadas, a partir de blocos fabricados para serem utilizados em automóveis e camiões ou instalações estacionárias industriais. Com algumas raras excepções, já não se fazem motores com um programa exclusivo para utilização expressa em embarcações de recreio, pelo que os avanços atingidos na produção destas máquinas em matéria de redução do peso e de aumento cumulativo da potência passaram pela subida exagerada dos valores da compressão e do número de rotações, induzindo alterações no desenho dos motores propriamente ditos e dos sistemas auxiliares de entrada e de saída do ar e do combustível, exactamente como aconteceu com os motores dos automóveis. Como já referi anteriormente e será perfeitamente esclarecido quando estudarmos os subsistemas de propulsão, estas modificações tem óbvias vantagens mas também alguns inconvenientes. Por outro lado, o aumento da velocidade dos pistões, concomitante com a redução do seu curso, torna-se inconveniente, do ponto de vista da sua duração, na medida em provoca um maior desgaste das peças cujas superfícies contactam durante o seu movimento. Os antigos motores marítimos, por causa das baixas rotações que desenvolviam, podiam ter uma ligação directa à hélice e, assim, o bloco da transmissão só precisava de dispor das engrenagens de inversão da marcha, para utilização quando fosse necessário. Com os modernos motores altamente rotativos isso já não é viável e as transmissões têm de conter, para além da inversão de marcha, um dispositivo de redução das rotações, de modo a tornar possível o acoplamento à hélice, sem que se produzam fenómenos nocivos, como é o caso da cavitação que contribui significativamente para a diminuição do tempo de vida das hélices, entre outras coisas que não interessa agora referir. O recurso a transmissões hidráulicas tem sido de grande vantagem naquelas situações em que, por razões de falta de espaço, é preciso separar o motor da transmissão. As vantagens de uma maior Pag. 81


flexibilidade na localização dos subsistemas são inegáveis, se bem que há sempre um preço adicional a pagar quando se recorre a este tipo de instalação, quer por causa do aumento da complexidade, quer pela maior possibilidade de ocorrência de avarias. Sabe-se que os motores a gasolina representam um perigo maior do que os motores de combustão interna no que se refere à eventualidade de ocorrência de incêndios e de explosões. Contudo, desde que se tenham em atenção as regras de segurança referidas nos manuais dos fabricantes e nos regulamentos das seguradoras e das várias associações internacionais de construtores, quando está em causa a instalação de motores com sistemas de ignição, que consomem gasolina, é sempre possível usufruir das vantagens destes motores, no que diz respeito à relação peso/potência, incomparavelmente melhor da que possuem os motores diesel. Há situações em que é praticamente impossível prescindir do uso dos motores a gasolina, como acontece quando se projectam embarcações de alta velocidade, nomeadamente as que são utilizadas em corridas. O motor de explosão destinado à instalação em embarcações de recreio tem, basicamente, o corpo do motor, uma transmissão destinada a reduzir as rotações e a inverter a marcha e os restantes acessórios indispensáveis ao seu funcionamento, entre outros, um alternador, um ou mais carburadores, uma bomba de água, uma bomba de combustível, um sistema de arrefecimento e um sistema de exaustão dos gases da combustão. Dadas as elevadas temperaturas que são atingidas no escape, este último conjunto de acessórios tem de impedir efectivamente o contacto acidental das partes aquecidas do motor com os elementos da embarcação que sejam susceptíveis de arder, eventualidade que a ocorrer pode originar fogos de efeitos devastadores, principalmente nas embarcações de madeira ou de outros materiais combustíveis. Existem vários tipos de escapes, dos quais falaremos mais adiante. O motor de explosão a que nos estamos a referir é o conhecido motor de quatro tempos, cujo princípio de funcionamento nos é familiar, pois trata-se do mesmo tipo de motor que é usado maioritariamente nos automóveis. Tanto quanto sei, os motores de dois tempos (que não são de combustão interna, como acontece com os motores diesel, do tipo Detroit, da General Motors), já só são utilizados como motores fora de borda e em ferramentas industriais e agrícolas ligeiras. Os fabricantes deixaram de produzir motores deste tipo para utilização em veículos de transporte. Convém referir que são cada vez mais comuns os motores fora de borda a quatro tempos. Como sabemos, os motores a dois tempos tradicionais são bastante mais baratos, por causa da sua grande simplicidade, mas consomem uma mistura de gasolina com óleo lubrificante que torna a sua utilização pouco prática, para além de nos obrigarem a suportar os fumos do escape que exalam um odor desagradável, sendo, ainda, mais perniciosos do ponto de vista ambiental. Recentemente, os fabricantes dos motores a dois tempos conseguiram resolver alguns dos inconvenientes referidos, pelo que a sua comercialização voltou a estar na ordem do dia.

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Quando o motor é instalado internamente é da responsabilidade do projectista de embarcações de recreio prever um sistema de exaustão dos gases do motor que permita que esses gases muito quentes atinjam o ar livre com facilidade. Para que esse desiderato seja atingido é necessário que os tubos que conduzem os gases para a atmosfera tenham o menor número de curvas, de modo a evitar-se um desenho que propicie potenciais causas de pressão posterior. Quando não se tem em devida conta estes cuidados, as válvulas de escape sobreaquecem, com a consequente diminuição da potência do motor e a possibilidade de incêndio. É claro que estando o motor instalado num espaço confinado, há que dar a maior atenção à ventilação desse espaço, quer para diminuir a temperatura ambiente para valores aceitáveis, quer para facilitar a evacuação dos gases resultantes da evaporação acidental de combustível que, por qualquer razão não previsível, se tenha escoado para este local. É fácil encontrar informação de interesse nos textos publicados pelo American Boat and Yacht Council. Há, ainda, livros dedicados à construção de embarcações que tratam do tema com algum detalhe, nos capítulos apropriados. É importante referir que há dois tipos fundamentais de dispositivos de exaustão dos gases da combustão, para instalações de motores internos: a exaustão húmida e a exaustão seca. No primeiro caso exige-se o fornecimento permanente de um pequeno jacto de água enquanto o motor trabalha. Este jacto misturase com os gases quentes expelidos pelo motor através de um injector, nas imediações da inserção do tubo de escape ao bloco. Essa água pode ser doce e vir directamente do sistema de arrefecimento do motor ou ser água do mar, caso a embarcação se esteja a deslocar num ambiente líquido salgado. A utilização deste tipo de dispositivo implica que o motor (ou motores) se encontre instalado parcialmente acima da linha de água, coisa que raramente acontece nas embarcações que também são movidas à vela. Faço notar que a saída dos gases do motor será conectada ao tubo de exaustão, de modo a que este apresente um declive de 4%, continuamente, até à saída dos fumos para a atmosfera, que geralmente ocorre através de um orifício circular praticado na popa. A geometria do tubo de escape, nestes casos, implica um certo cuidado, com vista ao impedimento de retornos de água para o motor, situação que, a verificar-se, conduziria a graves avarias, como facilmente se percebe. No que se refere ao estudo destes problemas é importante analisar a informação técnica produzida e difundida pelos fabricantes e vendedores. Nessa informação encontram-se desenhos, valores de potências, de consumo de combustível, peso, localização do centro de gravidade e outros aspectos importantes para conhecimento dos designers. Os motores marítimos (a gasolina e a gasóleo) são, geralmente, instalados com uma pequena inclinação, para que seja possível que o seu eixo atinja a água de modo a poder receber a hélice. A inclinação máxima possível é indicada pelo fabricante e não deve ser ultrapassada, caso contrário a lubrificação do motor não se processa convenientemente e pode acontecer que as peças em movimento acabem por “gripar”.

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Só para ficarmos com uma ideia aproximada dos consumos dos motores marítimos, apresento seguidamente os seus valores médios: 

Motores interiores de gasolina – 3,4 litros por 10 HP, por hora;

Motores interiores de gasóleo - 2,3 litros por 10 HP, por hora;

Motores fora de borda, a 2 tempos – 5,7 litros por 10 HP, por hora.

Para a escolha do motor a aplicar num determinado projecto concorrem vários factores que é preciso ponderar, a saber: custo, peso, dificuldade de manutenção, disponibilidade de peças, potência necessária, etc. Pode dizer-se que se o barco é leve e rápido e, além disso, é utilizado em águas interiores, faz sentido recorrer a um motor de gasolina. Quando o barco é grande e pesado e, na maioria das situações, se destina a cruzeiros em mar aberto, por largos períodos de tempo, é de optar pelos motores diesel. É uma opção mais segura, porque o combustível não apresenta perigo de incêndio. O recurso a ”sterndrives” (z-drives), acoplados a motores de gasolina ou gasóleo, é uma alternativa bastante difundida, por causa das suas vantagens. O conjunto é fornecido completo, com todas as partes integradas e, por isso, não é necessário desenhar sistemas de escape ou qualquer outra coisa que não sejam os seus apoios. É fácil aceder à hélice, para limpeza ou manutenção e é possível alterar o seu ângulo de funcionamento. A embarcação não precisa de leme, mas o motor tem de ser instalado muito próximo da popa, facto que coloca problemas de equilíbrio por este objecto de peso considerável se situar longe do centro de flutuação. Se ainda tivermos presente na nossa memória o que anteriormente foi dito acerca do desenho das embarcações planantes e do facto de a localização do seu centro de flutuação ser muito recuada, concluímos que serão os veículos ideais para aplicação deste sistema de transmissão. Antes de terminar com algumas referências aos problemas relativos à instalação de motores internos convém dizer, ainda, algo sobre os motores fora de borda. Nos últimos anos começaram a difundir-se os motores fora de borda a quatro tempos e, quase ao mesmo tempo, foram resolvidos muitos dos inconvenientes dos motores a dois tempos. Já se fabricam motores deste último tipo em que não é preciso misturar óleo lubrificante com o combustível. Tendo em linha de conta os avanços tecnológicos verificados recentemente e a inerente simplicidade destes motores, é muito possível que, num futuro próximo, voltem a estar na moda, e não só para mover embarcações. A instalação de um motor interno numa embarcação implica que se considerem cuidadosamente as condições de fixação, a distribuição dos esforços resultantes do seu peso e a limitação dos efeitos destrutivos das vibrações de todo o sistema. Mais uma vez, faz sentido recorrer aos “Standards” referidos anteriormente a propósito dos sistemas de exaustão dos gases da combustão, particularmente, ao

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capítulo “Machinery division, project”. Também é importante estudar as especificações fornecidas pelos fabricantes pois, infelizmente, não há normalização nas dimensões dos apoios, mesmo em motores de potências semelhantes. Nas embarcações construídas em madeira, segundo os métodos tradicionais, estão disponíveis várias obras, das quais destaco “Boatbuilding”, de Howard Chapelle, um clássico na matéria, que explica a resolução dos problemas da instalação de motores. Para conhecer as modernas técnicas de utilização da madeira associada a resinas epóxidas, cuja aplicação está cada vez mais generalizada, convém ler “The Gougeon Brothers on boat construction”, ou outros textos que apresentem os métodos mais conhecidos que recorrem à associação das madeiras com resinas e colas de última geração. No capítulo IX, quando tratarmos dos materiais mais utilizados, voltaremos a abordar este tema, sendo certo que não vale a pena explicar coisas que estão melhor expostas nas obras indicadas na bibliografia. Com este trabalho está em causa uma introdução pouco exaustiva aos assuntos de índole acentuadamente tecnológica, ficando o seu eventual aprofundamento para o recurso a leituras posteriores mais especializadas. Vamos, agora, abordar o tema das hélices que, como se pode constatar, considero um substantivo feminino, embora haja muita gente no meio náutico que tem opinião diversa! Começo por referir que não está em causa o projecto destes artefactos. É uma matéria assaz complexa que não conheço, nem tenho idade para aprender. Aquilo que pretendo expor são alguns processos de selecção das hélices disponíveis no mercado, de modo a que a sua instalação permita aproveitar, nas melhores condições, a potência dos motores a que ficam acopladas e evitar os inconvenientes de uma escolha inadequada. E este desiderato já não é tarefa simples, tanto mais que a quantidade de variáveis que influenciam este processo impede a sua optimização. A primeira coisa a fazer para iniciar o trabalho é determinar as características da embarcação e do motor. Uma embarcação de deslocamento exige uma hélice que não pode ser aplicada numa embarcação planante. Por outro lado, as características do motor, tais como potência, torque, rotações e consumos de combustível são factores que interferem com a referida escolha. Os fabricantes fornecem folhetos onde é possível obter estes dados para cada um dos motores que produzem e, em alguns casos, outros dados de interesse como os diâmetros das hélices, de acordo com os valores de redução das rotações que são obtidos com o tipo de redutor escolhido. Vale a pena consumir algum tempo estudando estes documentos, sendo certo que determinados dados contidos nestes textos de índole comercial, como é o caso dos diâmetros das hélices, são meramente indicativos, devendo ser confrontados com os cálculos a realizar pelo projectista. Para chegarmos até à definição das características da hélice temos um longo caminho a percorrer, começando pela velocidade pretendida para a embarcação, levando em devida conta as suas características. Já falámos anteriormente das velocidades relativas, a propósito das embarcações de deslocamento e constatámos que há limites que dificilmente podem ser ultrapassados. Neste momento vale a pena recordar, mais uma vez, a figura nº 11. Se quisermos que as duas embarcações apresentadas ultrapassem a velocidade relativa de 1,34 (imagem no fundo da página) as referidas Pag. 85


embarcações começam a navegar com a popa cada vez mais afundada na cava da última onda transversal e só à custa de um enorme aumento de potência do motor é que se conseguirá um aumento ridículo da velocidade absoluta. Faço aqui um parêntesis para dizer que tem sido possível furar esta regra com embarcações de deslocamento ultraleves, com boca muito reduzida. Mas trata-se de situações excepcionais que não vale a pena exaltar neste contexto em que nos estamos a iniciar no desenho de veículos aquáticos normais. Contudo, pode ser de alguma utilidade dizer qualquer coisa sobre aquilo que se considera pesado e leve quando falamos de embarcações. Voltando à figura 6 verificamos que no topo esquerdo do quadro está uma fórmula que serviu para caracterizar as duas embarcações acerca das quais são definidas as curvas de resistência. Uma dessas embarcações apresenta o valor de 250 e a outra o valor de 150. Estes coeficientes (displacement lenght ratios) dão uma ideia do peso relativo de cada uma delas. Por exemplo, a embarcação da figura nº 2 deste texto tem o coeficiente de 470. É muito mais pesada, comparativamente, que as duas anteriormente referidas. Ora, para “furar” a regra da velocidade relativa é preciso baixar muito este valor, o que quer dizer que só com técnicas modernas de construção é possível fazê-lo (com coeficientes abaixo de 100 o sistema de formação de ondas reduz-se drasticamente). Os valores ideais para obter tal efeito seriam abaixo dos 80. Já se sabe que o preço a pagar é a redução, ou mesmo a eliminação, de muitas das coisas que consideramos confortáveis quando passeamos de barco, para além da necessidade de uma escolha criteriosa dos materiais e das técnicas de fabrico do artefacto. Vamos voltar à embarcação da figura nº2 que temos vindo a utilizar para aplicação da teoria que vai sendo desenvolvida. Tratando-se de uma típica embarcação de deslocamento que se move à vela, precisa de um motor auxiliar para se deslocar quando esse elemento natural não está disponível. O processo que vamos seguir para escolher esse motor serve, também, para usar com as embarcações que dependem exclusivamente dos meios mecânicos para se deslocarem. Fica, desde já, assente que nós somos pessoas razoáveis, pelo que escolhemos neste caso, como ponto de partida, uma velocidade relativa de 1,34, ou seja:

v  1,34 , em que LA

LA  6 m  19,67 pés (linha de água)

v  1,34 19,67  v  1,34  4,44  v  5,9 nós (11 Km/h) Tendo fixado o valor da velocidade absoluta que procurávamos, vamos determinar, agora, a combinação de motor e hélice que responde a este enquadramento. Para o efeito recorremos a uma fórmula empírica que nos vai permitir determinar a potência do motor que se adequa às características fixadas. Mas antes disso, falaremos um pouco da escolha do valor da velocidade relativa neste processo, tendo presente o tipo de embarcação e as prestações pretendidas. Já sabemos que, para os verdadeiros barcos de

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deslocamento, veleiros com motor auxiliar ou barcos exclusivamente motorizados, o referido valor será de 1,34, ao qual corresponde uma determinada velocidade absoluta máxima, para aqueles que fazem a selecção “correcta” do motor. Dois bons exemplos deste tipo de embarcações são os que estão representados nas figuras 2 e 4. Daqui para a frente já estaremos a lidar com embarcações semiplanantes e planantes e, para tentar atingir velocidades relativas muito altas, temos de pensar em materiais leves e resistentes, porque a este nível o peso é um factor determinante. Quando estão em causa embarcações medianamente velozes fixaremos um valor da velocidade relativa entre 2,5 e 4. Esta é a situação a que corresponde a embarcação representada na figura nº5. Acima de 4 estão as máquinas de alta velocidade, dispendiosas na manutenção e no consumo. As embarcações de corrida, perigosas, desconfortáveis e ainda mais dispendiosas já atingem valores de 8 e mais. Não apresentarei neste texto nenhum exemplo do género. Ao decidirmos o valor da velocidade relativa a atribuir à embarcação que estamos a projectar, devemos ter presente o que se passa com embarcações semelhantes que nos sejam familiares e que consideremos de bom nível. Vamos ver, então, qual a potência do motor a escolher, usando para o efeito a fórmula de que falamos atrás. Devo dizer que há inúmeras fórmulas para atingir este e outros objectivos da arquitectura e da engenharia naval pelo que, quem estiver interessado em procurar outros caminhos, pode recorrer à bibliografia apresentada ou fazer um percurso autónomo de investigação. Prosseguindo:

 vr  SHP       10,665 

3

em que:

SHP – potência ao eixo, em cavalos (shaft horsepower);  – deslocamento, em libras; vr – velocidade relativa (speed lenght ratio) que, neste caso, é de 1,34. Aplicando à embarcação da figura nº 2, teremos:

SHP  8020  1,34  10,6653  SHP  8020  0,001983  SHP  16 Assumindo uma diminuição de 15% na potência disponível, por causa das perdas na transmissão e noutros mecanismos acoplados, chegamos ao seguinte valor: 16  0,85  19 BHP (brake horsepower)

Procurando em folhetos técnicos fornecidos por fabricantes, vamos tentar encontrar um motor com potência aproximada de 19 BHP, que responda às exigências pretendidas. Resta, agora, determinar qual Pag. 87


a transmissão a escolher, em função das rotações do motor e dos rácios de redução disponíveis. Sabemos que, do ponto de vista da eficácia, é sempre melhor ter hélices com o maior diâmetro possível, concomitantemente com as menores rotações disponíveis no eixo a que estão acopladas. Aliás, os mecanismos de redução das rotações só são usados porque os motores marítimos modernos são muito rotativos. Grandes diâmetros, combinados com motores de baixa rotação são o que há de melhor para obter uma alta eficiência do conjunto. É claro que, por vezes, não é possível utilizar o maior diâmetro, por causa das restrições dimensionais da zona do casco onde vai ser aplicada a hélice. No presente caso, depois de alguma pesquiza, encontrei um motor diesel de um conhecido fabricante sueco que, de acordo com os dados do catálogo, tem uma potência máxima de 17 SHP, a 3000 RPM (rotações por minuto). O referido motor é comercializado em duas versões, uma delas com um “sail drive” que, obviamente, não pode ser utilizado nesta embarcação, por causa da geometria das obras vivas. A outra versão tem duas opções de redução, à escolha. Uma com 2,4:1 e outra com 3,0:1. Como não dispomos de dados construtivos da embarcação que nos permitam, neste momento, fazer uma opção fundamentada do ponto de vista do enquadramento dimensional, vamos escolher a redutora de 3,0:1. A análise do diagrama deste motor, no que diz respeito à potência, indica que o seu limite inferior é de 8 SHP, a 1500 RPM, e o seu limite superior é aquele que já foi assinalado anteriormente (17 SHP, a 3000 RPM). Com a instalação da redutora escolhida, o eixo da hélice apresenta o seguinte intervalo de rotações (RPM): 1500:3 (8 SHP) -------------------------------------------3000:3 (17 SHP), ou seja: 500 (8 SHP) -------------------------------------------1000 (17 SHP) São estes dados que servirão de ponto de partida para a selecção da hélice. Julgo que já está, neste momento, totalmente assumido pelo leitor que o desenho de embarcações é um acto criativo em que abundam as incertezas, dos pontos de vista científico e técnico. Contudo, a liberdade artística mantem-se condicionada por factores físicos que não podem ser subvalorizados, mesmo quando se desconhece a extensão dos seus efeitos. Na selecção das hélices para uma determinada embarcação raramente estão disponíveis todas as variáveis que concorrem para a eficácia do seu funcionamento, como é o caso da velocidade e da direcção do movimento da água em que a embarcação se desloca. Seleccionar hélices implica conhecer razoavelmente a teoria, mas há que ter sempre atenção aos resultados obtidos em embarcações semelhantes, com sistemas motrizes do mesmo tipo. Isto é, a experiência não deve ser menosprezada. Convém dizer, neste momento, que as hélices mais utilizadas no sector das embarcações de recreio são as de três pás. Há razões para isso. No entanto, nas embarcações à vela, para reduzir a ocorrência de resistências parasitas quando a hélice está parada, usam-se hélices de duas pás dobráveis (folding Pag. 88


propellers). Esta solução aparece no motor que escolhi anteriormente, quando é fornecido com o “sail drive”. Na verdade, uma hélice de duas pás é mais eficiente, mas o recurso a esta solução implica verificar o fenómeno da cavitação, coisa de que ainda nada foi dito. A cavitação consiste na formação de bolhas de vapor de água, com efeitos eventualmente destrutivos do material de que são feitas as hélices. O seu aparecimento é uma consequência do abaixamento excessivo da pressão no dorso das pás da hélice e é tanto maior quanto menor for a superfície sobre que incide. É por ser mais fácil aumentar a área total das pás quando o seu número é maior que o recurso a três pás está mais difundido. Quem pretender ter uma visão mais aprofundada destas questões deve ler o livro Propeller Handbook indicado na bibliografia, onde o autor faz um esforço meritório de simplificação deste tema complexo. Quanto ao método que vou utilizar para seleccionar a hélice tenho a esclarecer que é simples e adequado para este tipo de embarcação à vela, com motor auxiliar. Nas embarcações movidas exclusivamente a motor vale a pena recorrer a um método mais preciso, como é, por exemplo, o método de “Taylor and Troost”, também conhecido como método Bp-δ. A sua aplicação apoia-se em gráficos construídos para séries de hélices com características semelhantes no número de pás e na razão entre a área das pás e a área do disco em que se inserem. Voltando ao método mais elementar, vamos determinar o diâmetro para hélices fabricadas em série, de contorno elíptico e secção ogival, com uma razão entre a largura média e o diâmetro de 0,33. São hélices comuns, disponíveis no mercado internacional. Usaremos a fórmula empírica:

D

632,7  SHP0,2 RPM0,6

em que:

D – diâmetro, em polegadas; SHP – potência do motor no eixo, em SHP RPM – rotações por minuto, no eixo, após redução na transmissão. Para determinar o diâmetro usam-se sempre os valores máximos de SHP e RPM, o que já não vai acontecer no cálculo do passo. Teremos, então:

D

632,7  170,2 632,7  1,76  D  D  17,6  18" (polegadas) 0,6 1000 63,1

Pelas razões anteriormente assinaladas, o valor obtido para o diâmetro, arredonda-se sempre para cima.

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Também, como referi no cálculo do diâmetro, para determinar o passo da hélice vamos usar valores de potência e rotação um pouco menores do que os valores máximos, pelo que adoptaremos uma redução de 10% na potência: 17  0,9  15,3 SHP

Analisando o gráfico do motor fornecido pelo fabricante, verificamos que, a esta potência corresponde um valor de rotação aproximadamente igual a 2700 RPM. Entrando com o factor de redução da transmissão escolhida, teremos: 2700  3  900 RPM

Coloca-se, agora, o problema do escorregamento. Sem entrar em grandes detalhes técnicos, parece evidente (e é) que, quando a hélice roda uma volta completa, a embarcação não percorre a distância correspondente ao comprimento dessa volta (passo). Há um certo escorregamento (slip) que não se verifica, por exemplo, quando um saca-rolhas penetra na rolha de uma garrafa (quando as rolhas são de boa qualidade!). Há várias maneiras de calcular este escorregamento e há, ainda, algumas tabelas que o fixam para certos tipos de embarcações, com base em conhecimento empírico. Recorrendo ao livro “Propeller Handbook” vemos que, para embarcações à vela dotadas de motor auxiliar, com velocidade absoluta inferior a 9 nós, é atribuída a percentagem de 45% para escorregamento (por sinal é o valor mais elevado entre os tipos de embarcações referidas).

Usando mais uma fórmula empírica teremos:

P

v  1215,6 RPM  1  slip

em que:

P – passo da hélice; v – velocidade da embarcação, em nós; RPM – rotações por minuto; slip – percentagem de escorregamento (neste caso é 45%).

Aplicando ao nosso caso, teremos: P 

5,9  1215,6 7172 ,0  P  P  14,5  14" (polegadas) 900  1  0,45 495

Contrariamente ao que ocorre com o diâmetro, no cálculo do passo, arredonda-se o valor obtido para baixo.

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Ficamos, então com uma hélice de D=18”, P=14” e

LM  0,33 (largura média a dividir pelo diâmetro). D

Para compreender o conceito de largura média (mean width) ver a página 29 do “Propeller Handbook”. Numa embarcação com características semelhantes à que estamos a usar é normal praticar uma abertura mais ou menos oval na zona posterior da quilha, junto ao leme, para colocar a hélice. No desenho dessa abertura há limites a observar, em termos dimensionais, para que não ocorram interferências nocivas. Se a hélice que acabamos de escolher tiver dimensões exageradas, isto é, se não couber ou ficar demasiado próxima do casco e do leme terá que ser substituída por outra de menor diâmetro. Para atingir esse desiderato teríamos de trocar a transmissão que reduz as rotações na proporção de 3,0:1, aplicando aquela cuja proporção é de 2,4:1. Nestas condições o eixo da hélice apresentaria os seguintes valores de RPM: 1500:2,4 (8 SHP) -----------------------------------------------3000:2,4 (17 SHP), ou seja: 625 (8SHP) -----------------------------------------------1250 (17 SHP) E seria com estes dados que se repetiriam todos os cálculos até se obterem os valores finais. Feitas as contas, se não houve nenhum engano, teremos uma hélice de 15 polegadas de diâmetro e 12 polegadas de passo, a rodar muito mais depressa do que a anterior, o que poderia, eventualmente, obrigar-nos a verificar se ocorre cavitação e, caso tal ocorresse, diminuir um pouco a eficiência. Para além destes problemas que acabo de enunciar ainda ficam outros por tratar. Mas o assunto é árido e parece-me pouco interessante para a maioria dos leitores. Por isso, fico por aqui. Quem quiser saber mais e pretender lidar com as adaptações deste método a hélices de 2 e 4 pás, aprender o método Bpδ, estudar o fenómeno da cavitação e muitas outras questões conexas, pode ler o texto que referi e ficará esclarecido. Para terminar este capítulo vamos abordar, agora, a questão dos dispositivos direccionais. Anteriormente, ao apresentar vários modelos de quilhas, patilhões e geometrias de embarcações, abaixo da linha de água, mostrei, concomitantemente, vários tipos de lemes (figuras 19 e 20). Completa-se, neste momento, um pouco mais esse conjunto de exemplos com a figura 24, sem pretender esgotar o tema. A geometria dos lemes está, em muitas situações profundamente marcada pela tradição e pelos materiais e métodos de fabrico. Contudo, não deixa de ser evidente que as suas dimensões, em plano, são tanto maiores quanto menor é a velocidade do veículo cuja direcção pretendem controlar. Com o advento dos materiais compósitos, nomeadamente, dos plásticos reforçados a fibras de vários tipos, apareceram as grandes produções de embarcações de recreio fabricadas a partir de moldes negativos. Pag. 91


E a fabricação dos lemes ficou integrada no mesmo modelo de produção. Isso permitiu construir moldes com secções em forma de aerofólio, dentro dos quais são produzidas as cascas dos lemes, suportadas no seu interior por uma estrutura metálica ligada rigidamente ao eixo, normalmente construído em tubo de aço inoxidável, monel ou outro metal adequado. Os lemes, tal como os dispositivos direccionais dos aviões, actuam por pressão no lado que recebe o fluxo do fluido e sucção no lado oposto. Por esta razão a sua localização deve ser sempre, no caso das embarcações a motor, directamente atrás da hélice, para que recebam o referido fluxo com a máxima intensidade. É muito interessante, para esse efeito, ver os esquemas de funcionamento do leme Kitchen (este é o nome do engenheiro naval inglês que o inventou) que, com duas conchas rotativas, controla os movimentos do fluxo produzido pela hélice, de maneira totalmente original. Para quem estiver interessado, um passeio pela internet mostrará como se passam as coisas! Como é sobejamente sabido, muitas das embarcações mais velozes estão equipadas com mais de um motor. A maior parte das vezes possuem dois. Depois do que ficou dito, fica evidente que, para dois motores, deve haver dois lemes. Não sendo isso possível, por qualquer razão construtiva ou outra, o desenho do único leme deve ser tal que, quando este vira, uma parte da porta deve ser atingida pelo fluxo de uma das hélices. O quadro e a fórmula que se apresentam na figura 23 servem para determinar as áreas laterais dos lemes de embarcações à vela e a motor, com comprimentos das linhas de água entre 20 e 100 pés (6,10 e 30,5 metros). Para obter orientação que permita desenhar lemes de embarcações de menores dimensões, basta olhar para outras embarcações semelhantes que se comportem adequadamente para os fins visados. Observando o quadro que referi acima constata-se que a área que se determina a partir da linha referente às embarcações à vela é lida directamente na escala do lado esquerdo. Para as embarcações a motor, o valor obtido na escala do lado direito é introduzido na fórmula respectiva, de cuja resolução sai a área pretendida. Faço notar que qualquer valor que resulte de um ponto marcado no quadro, nas imediações da linha correspondente ao tipo de sistema propulsor (vela ou motor), é aceitável. Há inúmeros factores, alguns pouco relevantes, que influenciam as performances dos lemes, pelo que seria estultícia pretender levar longe de mais a determinação da sua área lateral. Um valor aproximado é perfeitamente suficiente. Alguns dos vícios que se verificam no uso continuado de embarcações são difíceis de detectar na fase de projecto, pelo que não devemos adoptar soluções de desenho com base numa convicção desmedida no resultado dos cálculos. Projectar é uma aventura, comporta riscos.

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IX. CONSTRUÇÃO DE EMBARCAÇÕES. MATERIAIS: PLÁSTICOS REFORÇADOS COM FIBRAS, MADEIRA, LIGAS DE ALUMÍNIO E AÇO. SISTEMAS DE CÁLCULO DE ESTRUTURAS.MASTROS, CABOS E VELAS. ANÁLISE E CÁLCULO DIMENSIONAL. As embarcações de recreio que se constroem na actualidade são executadas em vários materiais de base, a saber: fibras de vidro e de carbono (e de outras substâncias) impregnadas com resinas sintéticas (poliéster, vinilester, resinas epóxidas, etc.), madeira, ligas de alumínio e aço. Para além destes materiais mais comuns usam-se ainda outros, esporadicamente, entre os quais se destacam dois muito diferentes: a liga de cuproníquel e o ferrocimento. A primeira é um material muito dispendioso, com características excelentes, e o segundo está na outra extremidade da tabela, por ser o material dos pobres. Barcos de pesca que praticam a sua faina na China, em Cuba e em outros países do terceiro mundo são fabricados com este material, utilizando técnicas elementares e recursos muito reduzidos. Pode dizer-se que o PRF (plástico reforçado com fibras) domina inteiramente o mercado actual da fabricação em série, por um conjunto de razões que facilmente se compreendem. Isto não quer dizer que uma avaliação mais aprofundada deste tipo de produto não levante inúmeras objecções ao seu uso indiscriminado (do ponto de vista ambiental e não só). Os processos de fabrico do PRF são pouco limpos e prejudiciais para a saúde dos operários, se não forem tomadas medidas rigorosas de segurança e de condicionamento dos ambientes fabris. Grande parte das resinas, quando reagem, libertam gases tóxicos para a atmosfera, como é o caso do estireno libertado pelo poliéster e cuja libertação ocorre durante a reacção exotérmica que precede a fase de endurecimento, após aplicação do catalisador e do acelerador. Para controlo da qualidade do produto final é necessário fixar limites relativamente apertados de temperatura e de humidade, de modo a que a passagem ao estado sólido do material compósito se processe de tal maneira que a resistência mecânica do conjunto não venha a ser diminuída. Julgo que ainda é possível adquirir nas livrarias um livrinho, muito bem escrito, sobre o tema da utilização e do fabrico do PRF, para os fins mais diversos. O título do referido texto é: Poliéster reforçado a fibra de vidro, e o seu autor é o engenheiro Victor Branco. De um ponto de vista conceptual, o PRF apresenta semelhanças com o betão armado porque os objectos construídos com eles tem por base dois produtos: um material contínuo constituído pela argamassa de cimento, no betão, e pela resina de poliéster, no PRF, e outro material descontínuo que constitui a armadura, feita de vergas de aço, no betão, e de fibras de vidro (ou de outras substâncias), no PRF, originando estruturas monolíticas, contrariamente ao que se passa, por exemplo, com um casco de madeira executado segundo as técnicas tradicionais. Neste último caso há centenas de peças que são fixadas umas às outras com as mais variadas ligações metálicas e de madeira. Uma embarcação de madeira executada segundo a técnica clássica (carvel planking) e outra de PRF comportam-se, do ponto de vista mecânico, de maneira muito diferente sob as acções a que estão sujeitas em meio aquático. E, obviamente, as questões relacionadas com os custos Pag. 93


da manutenção dos artefactos, ao longo do tempo, e da sua fiabilidade, são argumentos que justificam, entre outros, a opção dos utilizadores pelo PRF, como se constata pela observação de centenas de marinas e portos, em todo o mundo. A fabricação de um casco de PRF dentro de um molde fêmea é empreendida através da aplicação de tecidos de fibras de vários tipos, em camadas sobrepostas, devidamente impregnadas de resina (handlay up), até ser atingida a espessura que resultou dos cálculos estruturais. Como algumas superfícies do casco estão quase verticais, na fase de estratificação, as resinas devem ser tixotrópicas, para que não escorram durante o período que antecede a cura e o endurecimento, deixando os tecidos deficientemente impregnados. Há outra técnica bastante comum para aplicar os produtos em causa, mas na fabricação de cascos não me parece conveniente a sua utilização pois as características mecânicas do produto final são manifestamente inferiores. Trata-se da projecção simultânea de fibras e resina (spray-up), utilizando uma pistola e algum equipamento mecânico criado para o efeito. Porque o PRF é um material bastante flexível e, nas unidades mais pequenas, pode atingir espessuras muito reduzidas, os objectos assim construídos tem tendência a deformar-se quando são sujeitos a determinadas solicitações. A melhor maneira de obviar a este inconveniente deu origem a um outro sistema de fabrico, a construção em sandwich, isto é, a aplicação do PRF em duas camadas separadas, com um recheio de material leve (uma espuma plástica ou madeira de balsa seccionada perpendicularmente às fibras), preenchendo o espaço intermédio. Este sistema reduz a flexão de painéis de teste mais de sete vezes, com um aumento de peso inferior a 10%. Para construir embarcações à unidade, ou em séries muito reduzidas, utiliza-se um molde macho, executado em tiras de madeira horizontais e verticais, o que permite montar um esqueleto suficientemente rígido para apoiar placas flexíveis de espuma ou balsa, sobre as quais se executa o layup exterior. Posteriormente retira-se o casco do molde e procede-se ao lay-up interior. É claro que este método implica um enorme trabalho complementar de preparação da superfície exterior para o acabamento, trabalho esse que não existe na utilização de moldes fêmea finamente acabados, onde foi aplicado previamente o gel-coat. Contudo, como o PRF sofre retracção, tal como o betão armado, o recurso ao molde macho permite que a retracção contribua para uma ligação mais perfeita entre camadas de tecido de fibra. Como não está em causa esgotar o tema deste material compósito, sugiro o recurso a leituras complementares da bibliografia, para aqueles que sentirem necessidade de saber mais. Se considerarmos agora as técnicas de utilização da madeira, modernas e tradicionais, os universos em que nos vamos mover são muito diferentes. Esta mudança resulta, essencialmente, da invenção e produção generalizada das modernas colas industriais, a saber: resorcinol (fenol resorcinol formaldeído), resinas epóxidas e cianoacrilatos. Estes adesivos são as primeiras colas verdadeiramente utilizáveis em Pag. 94


contacto permanente com a água, desde que sejam aplicadas de acordo com os protocolos definidos pelos seus fabricantes. Há uma segunda categoria de colas, colas termoplásticas, que não apresentam o mesmo grau de fiabilidade, mas podem ser utilizadas em zonas menos expostas. Caracterizam-se por manterem uma certa flexibilidade residual, após aplicação e secagem, e são naturalmente mais económicas que as primeiras. Estou a falar dos acetatos de polivinil e dos poliuretanos, particularmente nas suas formulações mais recentes, que aumentaram substancialmente a resistência à delaminação e à humidade. Se não pretendermos falar de sistemas de fabrico raros ou exóticos e nos fixarmos nos sistemas que o uso já consagrou, podemos dizer que há seis maneiras de abordar o tema da construção de embarcações em madeira, duas tradicionais e quatro modernas. É claro que, por vezes, os sistemas misturam-se e, também, na construção tradicional se recorre, agora, em muitas situações, aos modernos adesivos. Mas, para os fins que nos interessam, vamos admitir que nada disso acontece! O sistema mais comum de construir de modo tradicional é aquele que recorre à execução do casco com base na fixação de fiadas longitudinais de tábuas, apoiadas lateralmente e calafetadas (costado liso – carvel planking). O outro sistema que estamos a considerar é o do costado trincado (lapstrake), em que as fiadas longitudinais de tábua são sobrepostas pelos lados, cortados em bisel, para reduzir a altura das juntas, fixando umas às outras com pregos de cobre, pelo que fica suprimida a necessidade de calafeto. O primeiro sistema é exigente do ponto de vista da qualificação da mão-de-obra, dá origem a embarcações pesadas, permite reparações fáceis e precisa de madeiras de qualidade, cada vez mais raras. O segundo sistema quase só se aplica em unidades muito pequenas, permitindo executar embarcações relativamente leves, ao contrário do sistema anterior. É indiscutível a elegância dos produtos fabricados deste modo, mas a execução é, também, complexa e exige grande rigor dimensional na definição das peças exteriores do casco. Falando agora das maneiras modernas de construir, começaremos pelo sistema do casco trincado, mas em que as tábuas são coladas e, em geral, cortadas de painéis de contraplacado marítimo (glued lapstrake). Tal como o sistema anterior, este processo é usado essencialmente em pequenas unidades e, por causa do recurso ao contraplacado e às colas actuais, é possível obter objectos leves, resistentes e muito rígidos. Como em todos os processos que se baseiam no uso de colas para fazer a ligação das peças, as grandes reparações são muito difíceis de levar a cabo. O sistema que vem a seguir é aquele que, na língua inglesa, se designa por strip-planking. É uma técnica consumidora de trabalho intensivo, que consiste na assemblagem de tiras de madeira que, por exemplo, na construção de uma canoa podem ter meio centímetro de espessura e dois centímetros de largura. Por causa da fragilidade do conjunto, o processo é quase sempre completado com a aplicação de tecidos leves de fibra de vidro, por fora e por dentro, devidamente impregnados com resinas epóxidas. Recorrendo a tiras de madeira de secções apreciáveis é possível construir unidades de quinze metros (e mais), sem problemas. Neste caso Pag. 95


as tiras, além de serem coladas, são também pregadas. A protecção dos cascos com fibras e resinas permite utilizar madeiras de baixo custo (cedro, sapele, etc.), sem que isso afecte a durabilidade e a resiliência do conjunto, desde que, na manutenção periódica, se detectem eventuais passagens de água e se corrija o problema atempadamente. Escolhendo madeiras de baixa densidade é possível construir embarcações relativamente leves. Outro dos sistemas modernos que se usa bastante para executar barcos à vela de competição, é o que se designa por moldagem a frio (cold-molding) (a moldagem a quente é pouco utilizada e exige equipamento dispendioso que não interessa referir). Os cascos são construídos sobre um molde positivo, através da aplicação de tiras de folheado de madeira relativamente largas, com espessuras de alguns milímetros (veneer), dependendo do tamanho da unidade. As tiras são aplicadas em várias direcções cruzadas, colando-as às inferiores, de modo a obter uma casca que se for seccionada parece feita de contraplacado curvo. É um processo que permite obter cascos fortes, leves e impermeáveis, adaptando-se a formas complexas. É difícil de reparar e exige mão-de-obra muito qualificada e colas de altíssima qualidade, para que o resultado final não seja um fracasso. É susceptível de se adaptar facilmente à fabricação de pequenas séries. Finalmente abordaremos o método stitchand-glue que se assemelha ao sistema glued lapstrake, na medida em que recorre ao uso de resinas epóxidas para ligar as peças do conjunto. Aproveito a oportunidade para referir que embora o resorcinol seja a cola de referência, em termos de resistência e de fiabilidade, é menos utilizada do que a resina epóxida porque exige que as superfícies de contacto fiquem perfeitamente ajustadas, sem vazios. Quanto à resina epóxida, tal exigência não se verifica, na medida em que a sua propriedade de “gap filling” torna a aplicação mais simples e a execução das zonas de contacto da madeira menos rigorosa. Com a técnica stitch-and-glue usamos embarcações geralmente pequenas e médias (mas não só), cujo casco é constituído de painéis planificáveis, ligados entre si. Recorrendo muitas vezes ao CAD-CAM, desenham-se e cortam-se os painéis em contraplacado marítimo, furam-se ao longo dos bordos a intervalos curtos e regulares e ligam-se com pequenos troços de fio de cobre. Os fios servem para manter o conjunto ligado temporariamente pois aplica-se seguidamente pasta de resina epóxida e tiras de tecido de fibra de vidro, ao longo das juntas, deixa-se endurecer e removem-se de seguida os fios (ou parte deles). Posteriormente reforçam-se as juntas, por dentro e por fora, com mais tiras devidamente impregnadas e termina-se com os acabamentos. Há um estaleiro, na zona do Oceano Pacífico junto a Seatle, nos Estados Unidos, que só constrói embarcações segundo esta técnica. A unidade maior que fabrica é um barco de cruzeiro, a motor, com 48 pés de comprimento total e com um deslocamento de 32 000 libras! Este é um processo rápido e económico em que os cascos possuem obrigatoriamente arestas, cuja aparência nem sempre é aceite, do ponto de vista estético. Exige-se um projectista talentoso para superar esta dificuldade. As espécies de madeira que se utilizam na construção de embarcações e iates são inúmeras. O uso de algumas foi consagrado por uma tradição de séculos, nas regiões onde são produzidas e aplicadas, outras ganharam estatuto com a saga das descobertas, quando foi mostrada ao mundo a riqueza das florestas tropicais, como é o caso da teca, a madeira mais nobre de todas as que se aplicam neste sector Pag. 96


de actividade, e os mognos americanos e africanos. Alguns dos livros que são referidos na bibliografia apresentam listagens das madeiras mais utilizadas pelo que não vejo necessidade de repeti-las aqui. Antes de terminar esta pequena exposição sobre técnicas de utilização das madeiras é preciso referir que o recurso ao moderno equipamento motriz de configuração das peças desse material liberta para a atmosfera dos ambientes fabris inúmeras partículas de reduzidas dimensões que serão respiradas pelos operários, se não forem tomadas providências, em matéria de filtragem e de ventilação, que impeçam essa ocorrência. Com as ferramentas tradicionais nada disto acontecia. Ora, contrariamente ao que se pensa sobre os produtos naturais, por causa das ideologias ecológicas, os efeitos destas poeiras são, em muitos casos, altamente perniciosos. A natureza não nos propicia só coisas benéficas, também fabrica venenos e é preciso ter em devida conta os efeitos do manuseamento dos produtos florestais, em particular dos de origem tropical que, como já se constatou, podem apresentar um grau de toxicidade elevado, Em muitos casos, as referidas poeiras vão adicionar-se aos vapores produzidos por algumas das colas industriais que hoje se utilizam no interior dos edifícios fabris deficientemente ventilados. Vamos, agora, examinar sumariamente a produção de embarcações em metal, construídas em ligas de alumínio e aço. Sendo dado o caracter exótico e de raridade do cuproníquel, apesar da sua extraordinária qualidade de resistir indefinidamente ao ambiente marinho, mesmo sem qualquer protecção, e de não ser sequer atacado pelos organismos que costumam fixar-se aos cascos, fica excluído das nossas considerações. O mesmo se aplica ao ferrocimento, mas por razões muito diversas. O alumínio que hoje se usa na indústria naval não é só o elemento da escala periódica que nós conhecemos bem. Nunca poderia ser utilizado, no estado puro, para o fim que nos ocupa, por causa da sua incapacidade para resistir à corrosão e, ainda, pela sua fragilidade. O alumínio destinado à construção de iates e de embarcações mais miúdas é uma liga que contem, além do próprio elemento, cerca de 5% de magnésio e pequenas quantidades de silício, manganês e crómio. O que é interessante referir é que, sendo os dois principais metais contidos na liga extremamente macios e frágeis, a liga apresenta características mecânicas muito superiores e é muito resistente ao ambiente marinho. Basta dizer-se que pode ser utilizado na construção de cascos, sem que seja preciso aplicar-lhe qualquer protecção. Os cascos desta liga são pintados por razões meramente decorativas. Como nota à margem, informo os leitores que as ligas de alumínio que contem cobre, utilizadas na construção de aviões, não podem contactar com água salgada pois são corroídas rapidamente. As chapas de ligas de alumínio utilizadas na construção de embarcações são muito dúcteis, esticando e flectindo quando são atingidas por objectos pesados e duros. Não partem nem furam como acontece com outros materiais. Estas ligas tem, ainda, outras propriedades interessantes, conduzindo bem o calor e, quando as superfícies estão bem tratadas, são excelentes reflectoras. Uma embarcação de alumínio pousada na água dissipa rapidamente para o seu entorno grande parte do calor que não reflecte. Pode dizer-se que as embarcações de alumínio são frescas dentro de água! O maior inconveniente que se pode assacar a este material é o seu custo. É mais caro de que a madeira, o PRF e o ferro. Contudo, os modernos métodos e equipamentos de formatação, Pag. 97


soldadura e acabamento das chapas e dos perfis extrudidos tornaram a fabricação de iates relativamente competitiva, sem esquecer que a reciclagem do produto de base é sempre viável. A manutenção destas unidades, cujo peso é inferior ao de unidades semelhantes feitas com os outros materiais correntes, também, é menor. Com pequenas variações nas percentagens dos metais utilizados nas ligas e com a aplicação de uma meia dúzia de têmperas de vários tipos, é possível criar uma variedade de produtos cujas características mecânicas permitem escolhas muito dirigidas. Um dos problemas que merece ser levemente discutido neste texto é o da soldadura das ligas de alumínio. Há, essencialmente, dois métodos de as soldar, o TIG e o MIG. Em ambos é utilizado um gás inerte (árgon ou hélio, ou uma mistura dos dois) para impedir que o oxigénio do ar chegue à zona da soldadura e oxide o alumínio fundido, destruindo o trabalho. No método TIG usa-se um eléctrodo de tungsténio para formar o arco com a zona da junta a soldar. Este eléctrodo não é consumível. No método MIG o eléctrodo é consumível e, nem todos os eléctrodos disponíveis no mercado são adequados para aplicação em embarcações. Com o método MIG é possível soldar chapas com 3 milímetros de espessura, mas um soldador competente pode chegar a metade dessa espessura, usando o método TIG. O desenho das linhas de uma embarcação a construir com chapas metálicas implica um bom conhecimento da geometria das superfícies planificáveis, para que o trabalho de conformação das chapas não seja uma tarefa excessiva, afectando proibitivamente o custo final. Há vários métodos de abordar este tema, dos quais falarei oportunamente em dois dos exemplos que apresentarei no final, quer para a execução de um molde fêmea de um pequeno iate a executar em PRF, quer para a definição de painéis de contraplacado de um pequeno barco a motor fora de borda. Vamos, agora, abordar a utilização do aço na construção de embarcações. Comparando as características deste metal com as do alumínio veremos quão diferentes eles são. O alumínio tem uma densidade de 2,691, enquanto que o aço atinge 7,849, o que quer dizer que as peças de alumínio só pesam 34% das de aço. No que se refere às tensões de ruptura, um dos aços mais utilizados na construção dos cascos apresenta o valor de 414 MPa, enquanto que uma das mais utlizadas ligas de alumínio, com a têmpera adequada, atinge o valor de 276 MPa, isto é, fica abaixo 67% nesta característica. Sabemos que em matéria de ductilidade o alumínio é muito superior e que o aço tem o grave problema da corrosão. Isto não quer dizer que o alumínio esteja isento deste problema. Contudo, o alumínio é principalmente susceptível à corrosão electrolítica, a qual pode ser parcialmente neutralizada com a aplicação de ânodos de zinco no casco. O caso do aço já é diferente pois no dimensionamento das peças que vão contactar com a água do mar é preciso prever uma percentagem de redução da espessura, para perdas resultantes da corrosão. O recurso a aços do tipo Cor-Ten atenua bastante o problema, em termos de longevidade (mas não o elimina), desde que a manutenção periódica seja executada sem falhas. A preparação das superfícies com jacto de areia antes das pinturas é imperativa. Pag. 98


Os aços estão divididos em classes, de acordo com a quantidade de carbono que é adicionada ao ferro para alterar as suas características. Assim teremos: 

aços com baixo teor de carbono, até 0,15%;

aços para fins estruturais, ou aços macios, com teor de carbono entre 0,15 e 0,30%;

aços com teor médio de carbono, isto é, entre 0,30 e 0,50%;

aços de alto teor de carbono, entre 0,50 e 1,00%.

De todos estes, os que são utilizados para a construção de embarcações são os aços macios, com a excepção do Cor-Ten, que também se utiliza, embora pertença à primeira categoria. Vamos abordar, agora, as matérias relativas ao dimensionamento dos elementos estruturais, com aplicação a todos os materiais anteriormente referidos (PRF, madeira, ligas de alumínio e aço). As embarcações devem manter a sua forma quando ficam sujeitas aos esforços que resultam do uso a que são destinadas, dependendo essa propriedade das características mecânicas e dimensionais dos seus elementos estruturais, a saber, o revestimento exterior (que preenche, ainda, outras funções) e o conjunto dos elementos longitudinais e transversais fixados ao revestimento exterior e à superestrutura, quando existe, bem como de alguns outros elementos, como anteparas e outras peças do equipamento interior que tem, cumulativamente, outras funções. Todos estes elementos devem ser concebidos e desenhados de modo a constituírem uma unidade coerente, dimensionada com base em métodos confiáveis. No geral, há três métodos de determinação das dimensões dos elementos estruturais: método analítico, método comparativo e método empírico. No primeiro recorre-se à física, à resistência dos materiais e à matemática para calcular os esforços a que estão sujeitas as peças, atribuindo valores às solicitações com base na recolha e medição dos dados da experiência; no segundo parte-se do conhecimento da geometria e dos dados numéricos de uma embarcação semelhante, construída noutro material, e procede-se à alteração das dimensões a partir de constantes conhecidas, podendo fazer-se pequenas alterações no desenho das peças, de acordo com os resultados obtidos; no terceiro recorrese a informação acumulada pela experiência, nomeadamente de exemplos de sucesso e, também, de acontecimentos funestos que puseram em evidência deficiências que tiveram de ser corrigidas, num processo de tentativas e erros. O método analítico, extensivamente utilizado no cálculo estrutural dos grandes navios, é raramente aplicado no desenho de embarcações de recreio e de iates. Um conceituado arquitecto naval americano, que escreveu um texto didáctico sobre este tema, diz o seguinte:

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“Outra razão para usar raramente o método analítico no desenho de pequenos iates e barcos de diversão é que as fórmulas correntemente empregadas dão origem a dimensionamentos que geram desconfiança por serem irrealisticamente diminutos, quando comparados com a grande quantidade de dados empíricos que temos disponíveis, como resultado de se construírem barcos e se observarem as suas performances. Talvez o método analítico, quando aplicado ao desenho de pequenas embarcações, seja tecnicamente defensável – talvez, como um humorista pôs a questão, o yacht designer médio use um «factor de ignorância» em vez de um factor de segurança. Contudo, o yacht designer que está preocupado com os aspectos de segurança dos produtos que concebe, como todos nós devemos estar, seja guiado mais pelo que foi historicamente demonstrado que é adequado, do que por aquilo que pode ser teoricamente admissível,”. Para os fins a que se destina este despretensioso livro resulta quase evidente que o método a aplicar pelos seus leitores, no caso de pretenderem dominar as técnicas de concepção dos artefactos em causa, será, prioritariamente, o método empírico. Não irei fazer uma exposição detalhada do assunto, limitarme-ei a discorrer sumariamente sobre o tema, tendo como base o texto The Elements of Boat Stregth, referido na bibliografia. Com este livro é possível atingir, em plenitude, os objectivos pretendidos. Não se trata de um texto de investigação destinado a apresentar desenvolvimentos especializados do tema. É, como diz o autor, uma referência fácil de usar para o cálculo de elementos estruturais (scantlings) fiáveis, práticos e sólidos, para barcos de diferentes tipos e serviços. Scantlings são os tamanhos, as formas, os materiais e os pesos dos componentes estruturais de um barco. Tudo começa, como em qualquer outro sistema do método empírico (há vários), com a determinação de um número a partir das dimensões da embarcação em causa. Neste livro, que apresenta a vantagem não despicienda, de usar cumulativamente o sistema métrico e o sistema inglês de medidas, o número em questão designa-se por Scantling Number (Sn) e resulta do produto de três dimensões da embarcação (comprimento total, largura e altura na secção média), a dividir por uma constante. As definições e as figuras de apoio contidas no livro esclarecem, sem lugar a equívocos, do que se trata.

Sn 

LOA  Beam Depth (metros) 28,32

Aplicando esta fórmula à embarcação que temos vindo a usar para testar a matéria que se vai aprendendo, teremos: LOA = 7,75 m

Sn 

7,75  2,07  1,38  S n  0,78 28,32

Beam = 2,07 m Depth = 1,38 m

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É este o número que utilizaremos ao longo de todo o processo de cálculo das dimensões dos elementos da estrutura. Suponhamos que a nossa embarcação da figura nº 2 ia ser construída em PRFV (poliéster reforçado a fibra de vidro), e queríamos determinar as espessuras do casco estratificado à mão, de maneira convencional, com parede simples (hand-lay-up). Vamos à página 28 do livro e aplicamos a fórmula 4-1. Obtemos o valor de 5,9mm para a região denominada “lower topsides”, cuja localização está indicada na figura nº 26 deste texto. Passando à fórmula 4-2 determinamos as espessuras de todas as superfícies do casco. Ver, para o efeito, a figura referida acima. Agora é preciso encontrar uma sequência de tecidos, roving e mat, que se colocam alternadamente, aplicando sobre eles a resina. Faço aqui um parêntese para referir que não se deve aplicar resina em excesso, porque isso diminui as propriedades mecânicas do estratificado. O livro que referi anteriormente, do engenheiro Victor Branco e, bem assim, aquele que estamos a usar, dão indicações preciosas sobre as condições técnicas e ambientais da aplicação do PRFV. É necessário, de seguida, escolher os tecidos de acordo com uma gramagem que, após terminar a operação de lay-up, conduza a uma espessura e um peso tão aproximados quanto possível dos valores obtidos no cálculo. Por outro lado, faz sentido não exagerar na variedade das gramagens para evitar erros de aplicação durante o processo, que é realizado sempre sob uma certa tensão, por causa dos tempos curtos disponíveis, antes do endurecimento dos materiais utilizados. Não se respeitando esses tempos, ocorrerão desperdícios. Recorrendo à tabela 4-9 procedi à escolha dos tecidos, de modo a que, na aplicação não houvesse mudança de gramagem na mesma camada. Ficamos com a combinação que se apresenta a seguir, em que os valores entre parênteses são os que foram encontrados pela aplicação das fórmulas. UPPER TOPSIDE (5,0 mm): 24 - 15 combi - mat = 2,26 mm, 24 - 15 combi - mat = 2,26 mm, 18 - 10 combi - mat = 1,60 mm. Total = 6,12 mm. LOWER TOPSIDE (5,9 MM): 24 - 15 combi – mat = 2,26 mm, 24 - 15 combi – mat = 2,26 mm, 18 - 10 combi – mat = 1,60 mm. Total = 6,12 mm. BOTTOM (6,8 mm): 24 - 15 combi - mat = 2,26 mm, 24 - 15 combi - mat = 2,26 mm, 18 - 10 combi - mat = 1,60 mm, 18 oz/sq.yd. roving = 0,79 mm. Total = 6,91 mm. Pag. 101


KEEL REGION (8,9 mm): 24 - 15 combi – mat = 2,26 mm, 24 - 15 combi – mat = 2,26 mm, 18 - 10 combi - mat = 1,60 mm, 18 oz/sq.yd. roving = 0,79 mm, 1,50 oz/sq.ft. mat = 1,22 mm, 18 oz/sq.yd. roving =0,79 mm. Total =8,92 mm. Este conjunto constitui a parte do lay-up que diz respeito ao casco propriamente dito, mas ainda falta referir o revestimento exterior de acabamento, para que a operação fique completa. Na construção em grandes números existe sempre um molde fêmea que deve apresentar uma superfície sem quaisquer irregularidades, devidamente preparada com cera própria, para evitar que o estratificado se cole. Sobre essa superfície aplica-se (à pistola) o gelcoat e sobre ele um mat muito leve cujo peso deve situar-se entre 1 e 1,5 oz/sq.yd. para embarcações de 7,5 a 9 metros. Este fino tecido deve ser colocado antes de o gelcoat terminar a cura, para que a aderência entre os dois materiais se processe nas melhores condições. Só depois se aplicam, em camadas sucessivas, os elementos do casco que constituem a parte estrutural. Após resolver esta fase dos cálculos seguir-se-ia com o desenho da estrutura interior e com o seu dimensionamento, isto é, com a definição dos elementos longitudinais e transversais. Estes componentes são normalmente indispensáveis para que seja assegurada a rigidez do conjunto, embora nas pequenas e médias unidades à vela, como é aquela que nos ocupa, não costuma ser necessário recorrer a elementos longitudinais e transversais, para além daqueles que constituem o arranjo interior das embarcações, isto é, as anteparas e os elementos de apoio, tais como beliches e locais de arrumos. Isto resulta do facto de as baixas velocidades a que se deslocam tais embarcações engendrarem pressões muito baixas, o que não acontece com embarcações a motor cujas velocidades já são apreciáveis. Mas vamos ficar por aqui, deixando o assunto para ser estudado por quem pretender, através da consulta da obra de referência indicada. Há inúmeros aspectos deste método de construção, assim como dos outros, que ficaram por referir, no pressuposto de que a leitura da bibliografia constitui uma obrigação complementar imperativa. Devo apenas referir, antes de passar a outro tema, que os métodos de cálculo empíricos começaram a ser utilizados desde longa data, com a construção tradicional em madeira, como seria previsível. E, cada um desses sistemas determina o “scantling number” de maneira diferente. Por exemplo, o sistema Nevin’s usa a raiz cúbica do deslocamento, em pés cúbicos. A Westlawn scantling formula, apresentada nos textos didácticos fornecidos pela escola já referida,

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obtém o número a partir da seguinte expressão: C 

L B , em que L representa o comprimento total 16

e B a boca máxima. Existem, ainda, outros sistemas que se encontram espalhados pela literatura especializada e que foram testados, com sucesso, em milhares de situações que, a meu ver, demonstram a validade destas abordagens. Vamos, agora, tratar da mastreação e do aparelho fixo. Embora tenham sido realizadas várias experiências, algumas com sucesso, recorrendo a outros materiais, que não os consagrados na prática, há dois que são os mais usados, no tempo actual, nas embarcações de recreio. São algumas das ligas de alumínio e a madeira de abeto, uma resinosa que se desenvolve em alguns estados da América do Norte e do Canadá. Mas como vou recorrer, mais uma vez, a um método empírico para dimensionar estes componentes e preciso de conhecer o momento endireitante correspondente à inclinação de 30 graus, vou aproveitar a oportunidade para explicar como se determina a curva de estabilidade de uma embarcação, esclarecimento que, propositadamente, ficou por fazer no local próprio deste texto, isto é, o capítulo IV. Aproveitarei, como sempre, a embarcação representada na figura nº 2. Copiando as secções transversais da referida figura e repetindo as mesmas secções para o lado oposto de cada um dos dois desenhos que se encontram na figura nº 27, ficamos com uma vista da proa e outra da popa. Marcamos nos dois desenhos duas linhas de água com a inclinação de 30 graus. Recorrendo à regra de Simpson vamos calcular o deslocamento da parte imersa do casco adornado, medindo a totalidade da área de cada uma das secções. Devemos ter presente que, neste caso, a segunda coluna do quadro onde se inscrevem os valores das áreas não diz respeito a metade das áreas, mas sim à totalidade. Como consequência deste facto, a fórmula que costumamos usar deixa de ter o número 2 no numerador. Se o valor obtido se aproximar do que foi calculado anteriormente com a linha de água horizontal, admitindo-se desvios da ordem de 3%, prosseguimos com o trabalho. Se o desvio for maior desenhamos novas linhas de água, paralelas às iniciais e repetimos os cálculos. Com algum treino acabaremos por acertar logo à segunda tentativa, quando não for à primeira! Daqui para a frente iremos aplicar outra regra de cálculo, a regra dos trapézios e não a regra de Simpson. Para isso dividimos a linha de água em espaços iguais, em que uma das linhas separadoras tem de passar obrigatoriamente pelo centro de gravidade. Como não fizemos, ainda, o cálculo respectivo, temos de estimar a sua localização. Como o lastro constitui 44% do peso total, não parece difícil chegar a um ponto que tem grandes probabilidades de estar muito próximo da verdadeira posição. No caso que agora nos ocupa sabe-se, por experiência com embarcações semelhantes, que o centro de gravidade fica ligeiramente acima do centro de flutuação.

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Na regra dos trapézios não existe qualquer restrição para o número de intervalos, ao contrário do que acontece com a regra de Simpson. Outro ponto importante a considerar é que, tal como está apresentado nos dois desenhos da figura nº 27, deve-se evitar ir até ao extremo das secções, sendo mais conveniente dar uma pequena folga, pois está demonstrado que procedendo assim os resultados são mais precisos. Seguidamente constrói-se o quadro que está na parte inferior da folha e inscrevem-se nos locais próprios os valores obtidos por medição dos comprimentos dos segmentos entre a linha de água inclinada e o extremo das secções, depois de aplicada a escala respectiva (neste caso é de 1:25). Repare-se que na secção 4 uma parte do segmento fica do lado de fora. Esta parte não deve ser considerada, tal como refere o desenho. De acordo com a regra dos trapézios todos os valores que se encontram nos extremos superior e inferior da tabela devem ser reduzidos a metade. Feitas as somas em cada coluna, multiplicase cada valor obtido pela distância entre secções transversais. No desenho da figura nº2 é de 10 dm, como sabemos. Ficamos na última linha com os valores das áreas de cada secção longitudinal inclinada, a, b, c, d, … Transportamos esses valores para a segunda coluna do quadro da direita e multiplicamos cada um deles pela distância entre o plano respectivo e o plano que passa pelo centro de gravidade. Tal como fazemos na regra de Simpson para determinar a posição do centro de flutuação, também aqui contamos valores positivos e valores negativos. Neste caso vai-se subtrair a soma das duas primeiras linhas da soma das cinco restantes. Finalmente, divide-se o valor obtido pela soma das áreas inscritas na segunda coluna e tem-se a distância entre o plano inclinado que passa pelo centro de gravidade e aquele que passa pelo novo centro de flutuação. A essa distância damos o nome de braço endireitante. Se repetirmos estes cálculos para várias inclinações, por exemplo, de dez em dez graus, teremos um conjunto de valores que, se forem inscritos num sistema de dois eixos ortogonais e unidos por uma curva constituem a curva de estabilidade que nos dá uma ideia muito precisa do comportamento da embarcação neste domínio. Colocam-se os ângulos no eixo horizontal e os comprimentos dos braços endireitantes no eixo vertical. Já conhecemos o braço endireitante, que acabámos de calcular, e o peso total da embarcação, em água salgada. Vamos calcular, de imediato, o momento endireitante a 30 graus: M30 = GZ (dm) x D (kg)  M30 = 2,813 x 3545  M30 = 9972 dm.kg Dos desenhos em que nos estamos a apoiar retiramos o comprimento da boca situada na zona onde o mastro atravessa o convés e que é de 20 dm. De seguida aplicaremos a fórmula empírica que está integrada no método desenvolvido pela conhecida firma Sparkman and Stephen’s.

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Carga vertical no mastro:

P

M30  2,78 9972  2,78  P  P  2772 kg b 10 2

Vamos, agora, calcular o comprimento do maior troço do mastro sem apoios. Como o barco está armado em sloop, com os brandais amarrados no topo, o mastro fica dividido em duas partes, uma entre o convés e o espaçador (spreader) e outra entre o espaçador e o topo do mastro. Nestas condições costuma fixarse o espaçador quase a meio do mastro, a 51,5 % da altura total, acima do convés. Como o mastro mede 100 dm, o troço inferior medirá: L = 100 x 0,515  L = 51,5 dm. Da tabela da página 168 do livro Skene’s Elements of Yacht Design, onde vem explicado o método (o autor desta edição aumentada da edição inicial do livro trabalhou muitos anos na firma referida acima),retiramos o valor da constante C a aplicar na fórmula seguinte: C = 0,94 (um único espaçador, um tubo de alumínio). Cálculo do momento de inércia transversal do mastro:

Itt 

C  (L2t  P) 0,94  (51,52  2772) I    Itt  0,94  0,265  0,277  Itt  0,069 dm4 tt 108 108

 Itt  690 cm4 Para determinar o momento de inércia longitudinal do mastro voltaremos à tabela referida acima e procuraremos a constante que se aplica nesta situação e que é 0,54 (embarcação com comprimento da linha de água inferior a 32 pés, estais fixados no topo do mastro). Neste caso a dimensão vertical do troço do mastro, sem apoios, é a totalidade do comprimento entre o convés e o topo do mesmo, porque não há apoios intermédios. Cálculo do momento de inércia longitudinal:

Ill 

C  (L2l  P) 0,54  (1002  2772) I    Ill  0,54  1  0,2772  Ill  0,1496 dm4 ll 108 108

 Itt  1496 cm4 Pag. 105


Como só encontrei uma tabela de secções ovais de alumínio com valores numéricos no sistema métrico no livro dos autores suecos que está na bibliografia (Principles of Yacht Design) fui lá procurar uma secção cujos valores dos momentos de inércia estivessem ligeiramente acima dos que aqui foram encontrados. Escolhi um perfil oval de alumínio com 224 mm x 150 mm de eixos principais e uma espessura de 4,5 mm. Para calcular a tensão nos brandais aplica-se a seguinte fórmula:

T

M30  1,5 9972  1,5 14958  T  T  T  1496 kg b 10 10 2

A este valor é aplicado um coeficiente de segurança de 2,5 a 2,75 nos brandais superiores e de 3 nos brandais inferiores. Ts  1496  2,75  Ts  4114 kg

Ti  1496  3  Ts  4488 kg

Ts  40335 N

Ts  44012 N

Com base na tabela da página 169 aplicam-se percentagens de distribuição das cargas, 60 % nos brandais duplos inferiores e 45 % nos superiores. Brandais superiores: 40335 x 0,45 = 18151 N Brandais inferiores: 44012 x 0,65 = 28607 N Como devem ter notado, nos resultados obtidos, converti os quilogramas em newtons, isto porque na tabela dos cabos que consta do livro sueco referido acima é esta a unidade utilizada. Consultada a tabela, ficamos com cabos de aço inoxidável 1 x 19, com o diâmetro de 5 mm nos brandais superiores e de 6 mm nos inferiores. Qualquer deles tem uma tensão de rotura bastante superior à tensão de trabalho calculada. Para calcular a secção dos estais não existe, neste método nenhuma fórmula. Utilizase, simplesmente, a seguinte regra empírica: escolhe-se o maior diâmetro que se aplicou nos brandais. Portanto, ficarão os dois estais, da proa e da popa, com cabos de aço inoxidável 1 x19, com o diâmetro de 6 mm.

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Ainda ficam alguns itens por estudar, tais como os cabos do aparelho móvel, os “chainplates”(não sei como se diz em português) e outras coisas menores. Contudo não vejo necessidade de expor aqui, nesta obra de iniciação, tudo aquilo que facilmente se pode encontrar na bibliografia. Devo acrescentar, em abono da verdade, que se tivesse que ser eu a procurar a necessária documentação teria, em muitas situações, de recapitular a matéria estudada há muito tempo e o apetite já não é grande! Por outro lado, tal como no caso das estruturas, escolhi um método simples para o cálculo dos mastros e do aparelho. Quem quiser adquirir uma visão mais alargada deste tema, só tem de consultar a bibliografia, nomeadamente o livro dos autores suecos onde está exposto, além deste, outro método mais preciso. Abrem-se horizontes insuspeitados, para quem tiver a energia para consultar alguns destes livros, onde são postos em confronto pontos de vista variados e diferentes perspectivas, acerca de muitos dos assuntos tratados. É por essa razão que acabo por nada dizer sobre velas, um tema fascinante para quem aprecia os barcos que dependem delas para se moverem. Seria uma verdadeira perda de tempo escrever sobre esta matéria quando existe aquele livro maravilhoso (Sailmaker’s apprentice) que é referido na bibliografia e que trata do tema muito melhor do que eu o faria. Infelizmente quase todos os livros referidos estão escritos em inglês, mas é uma condição do século XXI dominar razoavelmente esta língua franca. Provavelmente o general De Gaulle está a dar voltas no seu túmulo mas, se repararem, até os políticos franceses já falam inglês! E quando a situação chegou a tal ponto, não temos outro remédio senão aceitar este império.

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BIBLIOGRAFIA ESSENCIAL 1. CIÊNCIA APLICADA 1.1. Basic Naval Architecture Autor – Kenneth C. Barnaby Editor – Hutchinson scientific and technical Este livro expõe, com grande clareza, o estado “actual” do conhecimento científico no domínio da arquitectura naval. A última edição é de 1969. 1.2. Technical yacht design Autor – Andrew G. Hammit Editor – Adlard Coles Limited Texto teórico destinado a apresentar modelos físicos e matemáticos das questões que o autor considera mais pertinentes na fenomenologia do uso e da prática desportiva com embarcações. 2. DESIGN DE EMBARCAÇÕES DE RECREIO 2.1. Preliminary design of boats and ships Autor – Cyrus Hamlin, N.A. Editor – Cornell Maritime Press Livro da maior utilidade para quem pretende ter uma visão de conjunto do processo criativo, cheio de informações relativas à ergonomia, à segurança e à economia. O fantasma do suporte matemático é desmistificado. 2.2. Skene’s elements of yacht design (8ª edição) Autor – Francis S. Kinney Editor – Dodd, Mead and Company Livro clássico sobre o tema, com edições sucessivas, constantemente actualizadas. Contem informação útil para aplicação nos projectos. O autor das últimas edições trabalhou muitos anos na famosa firma de projectistas Sparkman and Stephens. 2.3. Principles of yacht design Autores – Lars Larsson and Rolf E. Eliasson Editor – International Marine / Mc Graw-Hill Esta é a obra de dois arquitectos navais suecos. O primeiro é professor universitário de hidrodinâmica e o segundo tem formação em engenharia de construção, mas exerce actividade

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profissional como projectista de embarcações de recreio. Texto eminentemente moderno, com enfoque nos iates à vela. Excelente base matemática e suporte técnico-científico credível. 3. ARMAÇÕES E VELAS 3.1. The sailmaker’s apprentice Autor – Emiliano Marino Editor – International Marine / Mc Graw- Hill Praticamente tudo o que interessa sobre o desenho, a execução e a reparação das velas. Em certas passagens apresenta o nível literário de um bom romance! 4. HÉLICES 4.1. Propeller Handbook Autor – Dave Gerr Editor – International Marine / Mc graw-Hill Tudo o que é preciso saber para escolher (com critério) e perceber o funcionamento das hélices das embarcações de recreio. 5. MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO E CÁLCULOS ESTRUTURAIS 5.1. Wood Handbook – Wood as an engineering material Autores – Bergman, Richard; Cai,Zhiyong et al. Editor – United States Department of Agriculture – Forest Products Laboratory Sitio – www.fpl.fs.fed.us Texto exaustivo sobre o tema das aplicações técnicas das madeiras, qualidades e defeitos, com um enfoque generalizado.

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5.2. The elements of boat strength Autor – Dave Gerr Editor – International Marine / Mc Graw-Hill Livro fundamental para o desenho e a execução dos cálculos estruturais, com uma abordagem directa e prática das características físicas dos materiais utilizados na construção de iates e outras embarcações. Não se pode dispensar, se o método de cálculo a utilizar é empírico. 5.3. Boatbuilding

Autor – Howard I. Chapelle Editor – W. W. Norton and Company, Inc. Pag. 109


Construção tradicional em madeira, sem cálculos. Muito bem ilustrado, com desenhos excelentes. Feito por quem sabia (o autor foi um notável investigador que escreveu vários livros de grande qualidade sobre a história marítima e a construção de navios dos Estados Unidos da América). Faleceu recentemente. 5.4. Marine Composites Autor – Eric Greene Sitio – www. ericgreene associates.com/images/MARINE COMPOSITES/PDF. Informação bastante exaustiva sobre os modernos materiais compósitos, com aplicação na indústria naval. Bem documentado. 5.5. Rules and Regulations for the Classification of Yachts and Small Craft Autor e Editor – Lloyds Register of Shipping Normas de execução e dimensionamento de embarcações produzidas pela famosa seguradora inglesa. Uma espécie de bíblia sobre o tema. É apresentado sob a forma de dossier e está sujeito a alterações periódicas, em função dos avanços da investigação aplicada e da ocorrência de incidentes que revelem defeitos na concepção dos modelos físicos que suportam os cálculos. 5.6. Standards and Recommended Practices for Small Craft Autor e Editor – American Boat and Yacht Council Inc. Normas americanas para orientação de projectistas e construtores sobre praticamente todos os aspectos importantes deste ramo da indústria. Sujeito a alterações periódicas de actualização, em função da inovação tecnológica. 5.7. The Gougeon Brothers on Boat Construction Autor – Meade Gougeon Editor – Gougeon Brothers Excelente livro prático sobre a construção de embarcações em madeiras e resinas, segundo as técnicas mais modernas (o autor é um dos membros da família que montou uma empresa, à escala mundial, para produzir e comercializar resinas epóxidas e todos os produtos complementares para os fins referidos). Boas ilustrações e fotografias. 5.8. Poliéster Reforçado a Fibra de Vidro (guia prático) Autor – Victor Branco Editor – Luís Falcão Simões de Carvalho Este pequeno manual foi publicado antes do aparecimento de produtos e métodos de fabrico tecnologicamente evoluídos cuja utilização está hoje bastante difundida, como é o caso de certas resinas e dos tecidos de carbono, mas serve perfeitamente como introdução ao tema. Pag. 110


EXEMPLO 1 Nos anos de 1985-1986 o Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas Industriais (IAPMEI) e a Direcção Geral da Qualidade lançaram um concurso nacional de design industrial intitulado “Design na Indústria”. Esse concurso pretendia promover a difusão do design no nosso tecido industrial que estava e ainda continua, trinta anos depois, particularmente em certos sectores, muito pouco interessado no assunto, situação que potencia a fabricação de produtos de baixa qualidade conceptual, cuja colocação no mercado é particularmente difícil em competição com produtos similares de outras origens, que resultaram da concepção de projectistas devidamente habilitados. É preciso dizer-se que, em alguns sectores da indústria nacional as coisas evoluíram de maneira drástica nos últimos anos e isso reflectese na reputação, tanto interna como externa, dos produtos em questão. Mas, na área a que me estou a referir pouco ou nada mudou nestes quase trinta anos. A ideia do referido concurso implicava a associação de uma pequena ou média empresa com um designer, tendo em vista a criação, em conjunto, de um artefacto de consumo que apresentasse características de desenho de bom nível, o que lhe permitiria concorrer nos mercados com equivalentes estrangeiros. Havia quatro prémios do mesmo montante, a distribuir em partes iguais entre as equipas ganhadoras (empresa e designer) e, ainda três prémios menores para estudantes da área do design que concorressem com projectos autónomos. Foi a esse concurso que apresentei este projecto de embarcação, depois de descobrir uma empresa que se manifestou interessada no assunto. Logo aqui, as coisas começaram mal pois o objectivo seria que a empresa interessada procurasse um designer, e não o contrário. Durante a execução do projecto tive alguns contactos esporádicos com gestores da referida empresa e, aos poucos, comecei a aperceber-me de que, para eles, se tratava exclusivamente de uma oportunidade de promoção, sem qualquer espécie de investimento, e pouco mais. Entre os quatro projectos premiados, conjunto de que este fazia parte, havia vários objectos cuja concepção se apresentava relativamente simples, independentemente do seu caracter mais ou menos inovador. Não estava prevista, nem se verificou, qualquer hierarquização dos trabalhos premiados. No dia da entrega dos prémios lá nos deslocámos a Leiria, onde se realizou a cerimónia, estando presente um representante da empresa que recebeu, sem qualquer problema, o quantitativo que assumiu que lhe pertencia por uma coisa para a qual nada tinha contribuído. Durante alguns meses fui contactando com gente dessa organização, com vista à possível execução do molde da embarcação em causa, mas acabou por ficar claro para mim que esse molde só seria feito se eu estivesse disponível para custeá-lo! Pelo menos foi essa a ideia que me transmitiram. É assim que as coisas se passam, muitas vezes, na nossa terra. Pag. 111


Na sequência do concurso e ainda com a esperança de que algo se faria, preparei a documentação para o licenciamento da embarcação, tendo em vista a produção de uma pequena série. São esses desenhos que agora apresento, juntamente com alguma documentação referente aos cálculos de suporte que, como se pode constatar, são apoiados em métodos nem sempre iguais aos que apliquei no presente texto. Neste caso socorri-me dos métodos preconizados e ensinados pela Westlawn School of Yacht Design, uma instituição americana de ensino à distância, com a qual iniciei os estudos, nesta matéria, no princípio dos anos oitenta do século passado e que, alguns anos depois, passou a designar-se por Westlawn Institute of Marine Technology, designação que ainda hoje utiliza. Falando agora das bases geométricas que estão na origem deste projecto quero dizer que as mesmas se apoiam em conceitos relativamente apreensíveis por quem tem uma razoável formação em geometria descritiva. A observação da primeira folha deste projecto, onde se encontram representadas as linhas do casco, revela que o mesmo é constituído por uma série de superfícies curvas limitadas lateralmente por linhas também curvas que constituem as arestas (chines) do volume assim definido. Por causa da facilidade de construção do molde, em contraplacado (ou outro material adequado), era minha intenção que cada uma dessas superfícies fosse planificável. Entre os métodos disponíveis para atingir este objectivo só há um que se pode aplicar a esta situação particular. É o método das linhas oblícuas não complanares (skew lines), cuja descrição pode ser vista num dos textos referidos na bibliografia (Technical Yacht Design, pag.221 e seguintes). Os outros dois métodos, também referidos no mesmo texto (superfícies cilíndricas e superfícies cónicas) não são aplicáveis por causa da limitação que resulta do facto de as linhas que constituem as arestas estarem totalmente predeterminadas. Contudo, é conveniente referir que o método dos cilindros foi aplicado por mim nos exemplos 4 e 5, como pode ser facilmente constatado. E quem estiver interessado em ver um exemplo onde se aplicam simultaneamente o método dos cones e o dos cilindros, com resultados estéticos excelentes, pode apreciar o desenho que se encontra na página 112 do livro, também constante da bibliografia, Skene’s Elements of Yacht Design. Porque estamos a lidar com objectos reais e não com entidades abstractas, é importante não nos deixarmos influenciar demasiadamente pelos modelos teóricos que sustentam, no nosso universo do discurso, a possibilidade de execução das coisas que imaginamos! Se tomarmos como base as linhas curvas longitudinais que constituem as arestas que delimitam a forma do casco da nossa embarcação, usando os valores das coordenadas para executar um modelo à escala conveniente (coisa que fiz para apresentar ao concurso), não nos preocupando em reproduzir rigorosamente a curvatura das superfícies limitadas por duas arestas contíguas, é possível, aplicando um material flexível e estendendo-o cuidadosamente entre arestas contíguas, obter a planificação de cada um dos gomos, suficientemente precisa, para posterior reprodução no material definitivo que vai constituir o molde fêmea, a construir sobre um exoesqueleto de madeira ou de metal. Como hoje já Pag. 112


parece viável experimentar a reprodução destas operações em computador, deixo esta possível abordagem à consideração dos entendidos no assunto. Vou, agora, apresentar para mera informação dos leitores, os textos preparados para o licenciamento do projecto, alguns dos quais não foram exigidos pelas autoridades licenciadoras mas que, naquele momento, me pareceu que poderiam ser de alguma utilidade para que os técnicos que iam analisar o dossier pudessem fazer um juízo sustentado sobre as qualidades marinheiras da embarcação. MEMÓRIA DESCRITIVA Com a elaboração do projecto desta pequena embarcação costeira, de convés fechado, pretende-se tornar viável a produção de uma série limitada cujo preço unitário de venda se situe dentro de limites razoáveis. Só assim será possível responder adequadamente a uma clientela potencial cujas capacidades económicas são relativamente modestas e cujo gosto pelas actividades náuticas ainda não encontrou uma resposta apropriada no mercado nacional destes artefactos. Tendo como objectivo prioritário a redução dos custos de mão-de-obra concebemos o casco, o convés e os restantes componentes a estratificar, de tal modo que é possível fabricá-los a partir de moldes de contraplacado, sem necessidade de execução de contramoldes dispendiosos. O resultado previsto, quer do ponto de vista estético, quer do das performances, não se afigura significativamente inferior ao das embarcações de desenho mais convencional. Como se pode verificar através da observação dos elementos gráficos apresentados, a embarcação em causa destina-se fundamentalmente à prática de pequenos cruzeiros, mas também tem condições para participar em regatas, suportando perfeitamente um aumento substancial da superfície de velame, se um utilizador experiente quiser melhorar as suas prestações nos regimes de vento mais calmos. O arranjo interior desta embarcação é bastante simples e corresponde, essencialmente, ao programa anteriormente definido. Tem quatro beliches, uma sanita química amovível, um compartimento para guardar o motor fora de borda e algum espaço para arrumos. Tendo em conta as reduzidas dimensões de sinal da embarcação, o elevado custo do equipamento e a utilização prevista, optou-se por recorrer a um motor fora de borda, como meio de propulsão mecânica, embora seja possível adaptar os desenhos para uma instalação fixa do tipo Sail Drive. Para a opção apresentada no projecto, um motor com a potência de 6 HP é a resposta adequada às necessidades que se prevêem. A decisão de recorrer à construção em resina de poliéster reforçada a fibra de vidro ficou a dever-se, essencialmente, ao baixo custo de manutenção das embarcações construídas com este material e à relativa economia do processo de fabrico. Com a utilização de resinas isoftálicas e um adequado controlo da temperatura e da humidade durante a fase de estratificação, obtém-se um produto de excelentes características mecânicas. Optou-se, também, por preencher quase totalmente, com espuma de Pag. 113


poliuretano, os espaços vazios entre as superfícies, externa e interna, de poliéster reforçado. Esta solução diminui significativamente a arqueação líquida mas pareceu-nos que tal inconveniente é aceitável, no caso presente, se se tiver em conta a segurança adicional que se obtém. Tratando-se de uma embarcação destinada a cruzeiros relativamente curtos, que pode ser utilizada por tripulações pouco experientes, não é irrelevante o facto de ser inafundável. Sabendo-se que o poliéster reforçado tem uma grande resistência mecânica mas, também, uma deficiente rigidez, a utilização da espuma de poliuretano entre as superfícies interna e externa, é a forma ideal de ultrapassar esta deficiência, pelo que a solução adoptada se apresenta duplamente vantajosa. A mastreação pode vir a ser executada, indiferentemente, em perfis de alumínio ou madeira de abeto, embora só se apresentem os desenhos relativos a este último material. No primeiro caso ficamos com um conjunto mais leve e de melhor performance aerodinâmica, mas há tipos de utilização que podem justificar o recurso à madeira. Deixamos a utilização ao critério do utilizador. Chama-se também a atenção para o facto de a quilha e o conjunto do leme serem construídos à parte e separáveis do casco. As condições de fixação destes elementos não prejudicam a resistência do conjunto e facilitam a manutenção periódica e eventuais reparações. No que se refere a meios de salvação, equipamento e luzes regulamentares admite-se que sejam os futuros proprietários a proceder à sua instalação, no respeito pela legislação em vigor e, nomeadamente, pelos artigos 30, 31 e 32 do Regulamento Provisório das Embarcações de Recreio. Contudo, sugere-se a eventual dispensa da instalação da jangada pneumática, tendo em conta o facto de se tratar de uma embarcação de pequenas dimensões e de ser inafundável. Está prevista a instalação de dois extintores de pó químico, com capacidade de 1kg, sendo um fixo nas imediações do motor e outro no interior da cabine. A execução deste projecto implicou a elaboração dos cálculos abaixo descriminados. Os referidos cálculos podem vir a ser apresentados, no todo ou em parte, para responder a quaisquer esclarecimentos complementares. 1.

Deslocamento e Centro de flutuação

2.

Área de flutuação e superfície molhada

3.

Curva de estabilidade (ângulos de 30, 60, 90 e 120 graus)

4.

Cálculos estruturais

5.

Superfície de velame e Centro vélico

6.

Mastro, retranca, estais e brandais

7.

Centro de gravidade e distribuição dos pesos.

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INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR Na sequência da entrega dos documentos para licenciamento da embarcação no porto de Lisboa, recebi um ofício da Direcção dos Serviços de Segurança – Inspecção Geral de Navios, solicitando alguns esclarecimentos complementares que apresentei oportunamente, juntamento com outros dados que considerei pertinentes. São esses elementos que incluo de seguida. PREVISÃO DE BORDO LIVRE (em centímetros) A

B

C

Bordo livre na proa

73,1

68,6

59,8

Bordo livre máximo

85,0

80,5

71,7

Bordo livre na popa

70,2

65,7

56,9

Deslocamento

840 kg

1120 kg

1730 kg

Notas: 

Os valores indicados na coluna A correspondem à flutuação da embarcação vazia (deslocamento de 1120 – 280 = 840 kg);

Os valores indicados na coluna B correspondem à flutuação projectada, que resultou de se ter acrescentado ao peso da embarcação completamente equipada, uma carga de 280 kg, considerada por nós a carga normal de cruzeiro (três a quatro tripulantes, roupas e alimentação);

Os valores indicados na coluna C correspondem àquilo que admitimos como carga máxima (deslocamento de 840 +890 = 1730 kg); o valor de 890 kg para carga máxima foi determinado de acordo com a norma H.5 – Boat load capacity dos STANDARDS AND RECOMMENDED PRACTICES FOR SMALL CRAFT (American Boat and Yacht Council, Inc.).

MÉTODOS E NORMAS UTILIZADOS NO DIMENSIONAMENTO ESTRUTURAL E NA DETERMINAÇÂO DAS ESPESSURAS DO CASCO E DO CONVÉS A atribuição das cargas e dos esforços, o dimensionamento estrutural e o cálculo das espessuras do casco e do convés foram levados a efeito de acordo com o método preconizado pela Westlawn School of Yacht Design (fiberglass design and construction) para embarcações não planantes, à vela e a motor. Os resultados obtidos, no que se refere a espessuras e peso dos reforços de fibra de vidro, foram seguidamente confrontados com os valores indicados nas RULES AND REGULATIONSW FOR THE CLASSIFICATION OF YACHTS AND SMALL CRAFT da Lloyd’s Register of Shipping.

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O dimensionamento do mastro, da retranca (abeto e alumínio), dos estais e dos brandais foi determinado a partir da fórmula de Euler. Os resultados obtidos foram seguidamente comparados com os valores encontrados pelo método empírico, proposto pela Westlawn School of Yacht Design. FERROS, AMARRAS E ESPIAS DE AMARRAÇÃO Ferros: 

1 âncora tipo Almirantado de 14 kg

1 âncora CQR de 25 lbs, ou, em alternativa,

1 âncora Danforth – Standard de 25 lbs, ou, em alternativa,

1 âncora Bruce de 7,5 kg.

Amarras: 

1 corrente de elos de 8mm, com 8 metros

1 cabo de nylon de 12 mm, com 30 metros

1 cabo de nylon de 12 mm, com 50 metros

1 cabo de nylon de 16 mm, com 2 metros

Acessórios: manilhas de união, tornel, manilha de talingadura, olhal com arganeu, sapatilhos, etc.

Espias de atracação: 

1 cabo de nylon de 10 mm, com 30 metros

2 cabos de nylon de 10 mm, com 12 metros cada um

2 cabos de nylon de 10mm, com 6 metros cada um.

Nota: A selecção dos ferros e o diâmetro das amarras resultaram da aplicação da norma A-5- Anchoring, mooring, docking, towing and lifting dos STANDARDS AND RECOMMENDED PRACTICES FOR SMALL CRAFT (American Boat and Yacht Council, Inc.). DADOS NUMÉRICOS MAIS SIGNIFICATIVOS 

Comprimento entre perpendiculares --------------------------------------------------- CT =6,00 m

Comprimento na linha de água ------------------------------------------------------------ C =5,20 m

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Boca máxima ----------------------------------------------------------------------------------------- BM =2,22 m

Boca máxima na flutuação ------------------------------------------------------------------- B =1,91 m

Calado máximo -------------------------------------------------------------------------------------- CM =1,00 m

Deslocamento ---------------------------------------------------------------------------------------- D =1120 kg

Lastro (35,7%) --------------------------------------------------------------------------------------- L = 400kg

Área de flutuação ---------------------------------------------------------------------------------- AF =6,62 m2

Superfície molhada -------------------------------------------------------------------------------- SM =9,50m2

Superfície vélica (vela grande + 100% do triângulo a vante) ------------ SV =16,50m2

Deslocamento por centímetro de imersão ------------------------------------------- d =66,2 kg

Momento para variar a imersão longitudinal de um centímetro-------- M =1802 kg.cm

Raio metacêntrico longitudinal ------------------------------------------------------------- Rl = 8,4 m

Raio metacêntrico transversal -------------------------------------------------------------- Rt =1,1 m

Coeficiente de bloco (só do casco) = 40,5 %

Coeficiente prismático = 57,0 %

Coeficiente de finura = 67,7 %

SV/SM = 1,74 (ver, para o efeito, o gráfico superior da figura nº 19 do texto)

 

S.V. 

2 3

1900 2

1120 3

 17,62 (valores de referência, AV em pés quadrados e D em pés cúbicos:15,5  17)

D/(0,01 x C)3 = 222 (valores de referência, D em long tons e C em pés: 250  350)

ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS DOS MATERIAIS UTILIZADOS Foram apresentadas, em anexo, várias cópias de certificados de aprovação de resinas de poliéster, de tecidos de fibra de vidro (mat e woven roving) e de poliuretano expansível para utilização em estratificados e painéis sandwich, em embarcações.

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DESLOCAMENTO E CENTRO DE FLUTUAÇÃO

St

½ A (dm²)

×

Δ (dm³)

×

CF

0

0,000

1

0,000

5

0,000

1

1,164

4

4,656

4

18,624

2

4,202

2

8,404

3

25,212

3

4

65,440

1

38,468

0

---

2

32,720 26,308 12,160 67,120 5,920 37,352

2

6

8,180 13,154 6,080 16,780 1,480 18,676

1

37,352

7

18,130

4

72,520

2

145,040

8

13,382 7,070 0,300 0,000

2

26,764 28,280 1,200 0,000

3

80,292

4

117,920

5

0,000

4 5

9 10

2 4

4 1

323,404

147,744

380,604 232,860

(304,124)

 (total) 

2 fs 3

 (sem apêndices) 

CF 

Xc  s f



2  323,404  5,2 3

2  304 ,124  5,2 3

CF 

232,860  5,2 323,404

  1121 dm³ (kg)

  1054 dm³ (kg)

CF  3,74 dm (atrás de St5)

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ÁREA DE FLUTUAÇÃO

SUPERFÍCIE MOLHADA

St

½ Largura

×

Áreas Flutuação

St

½ Perímetro

×

Superfície Molhada

0

0,00

1

0,00

0

0,20

1

0,20

1

1,90

4

7,60

1

2,20

4

8,80

2

4,06

2

8,12

2

4,40

2

8,80

3

6,08

4

24,32

3

6,55

4

26,20

4

7,66

2

15,32

4

8,15

2

16,30

5

8,86

4

35,44

5

9,35

4

37,40

6

9,52

2

19,04

6

10,20

2

20,40

7

9,44

4

37,76

7

10,05

4

40,20

8

8,54

2

17,08

8

8,85

2

17,70

9

6,58

4

26,32

9

6,80

4

27,20

10

0,00

1

0,00

10

1,00

1

1,00

191,00

A .F. 

2  191  5,2 3

A .F .  662 ,13 dm2

204,20

S.M.Casco  

2  204,20  5,2 3

S.M.Casco   707 ,90 dm2 S.M.Quilha   167 ,20 dm2 S.M.Leme   74 ,50 dm2 S.M.Total   949 ,60 dm2

CÁLCULO DA SUPERFÍCIE VELICA Método do Coeficiente de Pressão do Vento:

S.V. 

  GZ20º 2470  0,95  2  S.V.  WPC  LA  C 1,2  12,95  0,94 2

GZ 20º  0,29 m  0,95 pés

WPC  1,2 (iate de cruzeiro) LA  (CV  CRL)  3,95 m  12,95 pés

 S.V. 

2346,5  S.V.  171 pés2  16 m2 13,73

C  cos 20º  0,94   1121 kg  2470 libras

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Método Dellenbaugh:

DC 

57,3  S.V.  LA  1 57 ,3  177,37  12 ,95  DC     GM 2470  2,83

S.V.  16,50 m2  177,37 pés2 LA  (CV  CRL)  3,95 m  12,95 pés   1121 kg  2470 libras

 DC  18 ,83 º

GM  (CG  M)  0,86 m  2,83 pés

De acordo com a tabela respectiva, a embarcação devia ter uma superfície vélica um pouco superior, pelo que se considera ligeiramente “undercanvased”. Neste cálculo foi utilizada a superfície vélica do projecto.

Pag. 120


ESTIMATIVA DO CÁLCULO DOS PESOS E D0 CENTRO DE GRAVIDADE

Item

Peso

Dist. St 5

Mom. Hor.

Dist. LA

Mom. Vert.

Zona do Fundo (incluindo interior)

60

-0,55

-33,0

-0,18

-10,8

Lados

70

0,20

14,0

-0,7

-49,0

Bordos

30

0,25

7,5

0,50

15,0

POPA

8

-2,40

-19,2

0,45

3,6

Longitudinais (Vert. + Hor.) + Poliur.

30

-0,30

-9,0

0,25

7,5

Transversais

3,5

-2,10

-7,35

0,30

1,05

II

3,5

-0,25

-0,87

0,50

1,75

II

2,0

0,80

1,6

0,50

1,0

II

3,5

1,55

5,42

0,50

1,75

II

1,5

2,25

3,38

0,40

0,6

II

1,5

-2,60

-3,9

0,20

0,3

II

2,0

-1,90

-3,8

0,05

0,1

15

1,00

15,0

1,00

15,0

II

15

-1,30

-19,5

0,45

6,75

II

2,5

-0,50

-1,25

0,90

2,25

MOTOR FORA DE BORDA+TANQUE

30

-2,00

-60,0

0,15

4,5

SANITA AMOVIVEL

10

2,15

21,5

0,10

1,0

CAIXA DO MOTOR

10

-1,00

-10,0

-0,10

-1,0

COLCHÕES

10

-0,40

-4,0

0,10

1,0

MASTRO+ARMAMENTO+VELAS

50

0,50

25,0

3,00

150,0

ANCORA+CORRENTES+CABOS

30

2,30

69,0

0,45

13,5

EQUIPAGEM

250

-1,40

-350,0

0,50

125,0

COMIDA+ÁGUA+ROUPAS

30

0,00

0,00

0,10

3,0

FERRAGENS NO DECK+ESCOTILHAS

20

0,00

0,00

0,90

18,0

LEME COMPLETO C/ SKEG E STOCK

50

-2,30

-115,0

-0,45

-22,5

360

0,30

108,0

-0,65

-234,0

22

-2,36

-51,9

0,00

0,00

CASCO:

INTERIOR:

DECK - CONVÉS

QUILHA LASTRO MÓVEL (CHUMBO) TOTAL

1120

CG (long .) 

 418 ,37  0,374 m  37,4 cm atrás de St 5 1120

CG ( vert .) 

55 ,35  0, 049 m  4,9 cm acima da LA 1120

-418,37

55,35

Pag. 121


CÁLCULOS ESTRUTURAIS (poliéster reforçado com fibra de vidro e poliuretano expandido) Os presentes cálculos foram baseados nas fórmulas e nos algoritmos contidos no texto didáctico referente ao desenho e à construção de embarcações de deslocamento e planantes, a executar em resinas de poliéster reforçadas a fibra de vidro, integrado no curso ministrado pela Westlawn School of Yacht Design. O mesmo texto contem tabelas que indicam os valores aplicáveis a certas grandezas, de acordo com as normas e os protocolos americanos deste sector da indústria e com os princípios gerais da resistência dos materiais. São apresentados neste livro, meramente a título de exemplo, porque à data em que o desenho foi executado ainda não estava disponível o livro The elements of Boat Strenght, referido na bibliografia, que julgo mais adequado para utilização pelas pessoas a quem se dirige esta obra. Nota - É prática corrente admitir neste tipo de materiais e de construção, que os esforços a que o casco está sujeito não justificam o recurso a reforços longitudinais e/ou transversais, para além dos que constituem as anteparas, os beliches e outros elementos do arranjo interior, para embarcações à vela de reduzidas dimensões como é esta a que nos estamos a reportar. Nestes casos calculam-se primeiro as espessuras do casco da embarcação e só depois se verifica a eventual necessidade de reforços adicionais. Note-se que quando estamos a lidar com embarcações que se movem exclusivamente a motor, principalmente as mais velozes, o caminho a seguir na execução dos cálculos será o inverso do que aqui foi utilizado, começando-se pelo cálculo dos reforços longitudinais e transversais e passando depois à determinação das espessuras do casco propriamente dito. Lista de símbolos: Pd – pressão hidrostática no casco (fundo e lados), Phs – distância vertical abaixo da borda, multiplicada por 0,5, Pvs – pressão resultante do movimento, de acordo com tabela apresentada no texto da WSYD, Mb – momento flector máximo, L – distância sem apoios, z – módulo da secção, Fs – resistência à flexão, da – flecha admissível, tr – espessura para garantir determinada rigidez, d – flecha, Ef – módulo de elasticidade do material que constitui as faces do painel sandwich,

Pag. 122


t – espessura total do painel sandwich, tc – espessura do material de baixa densidade contido entre as faces do painel, tf – espessura das faces, Ec – módulo de elasticidade do material de baixa densidade, fs – tensão das faces (compressão e tracção), fc – tensão de corte do material de baixa densidade (poliuretano), Fm – módulo de flexão. Nos cálculos que se seguem foi utilizado o sistema inglês de medidas. FUNDO LATERAL: Pd  Phs  Pvs  Pd  3,28  0,5  0,134  Pd  1,774 lbs/in2

Mb 

z

P  L2  y 1,774  27,52  3  Mb   Mb  335 ,4 lbs.in 12 12

Mb 335,4  z  z  0,0112 in3 Fs 30  10 3

Flexão:

tf 

L 27,5 z  tf   0,0112  t f  0,154 in 2 2

Rigidez:

da 

L 27,5  da   d a  0,275 in 100 100 1

1

 P  L4  3  3 1,774  27,5 4   t r     t r  0,425 in t r   6  32  1,5  10  0,275   32  Fm  d 

Embora a espessura calculada do ponto de vista da resistência, seja inferior à que foi calculada para responder à rigidez, vamos arbitrar valores para a primeira e, posteriormente, refazer os cálculos da rigidez, mas considerando a participação do poliuretano e da camada interior do estratificado.

Pag. 123


Assim:

0,154  2,7 0,057

3 camadas de woven roving de 18 oz (600g/m2) 3 camadas de mat de 1 oz (300g/m2)

Espessura mat ----------------------------- 0,030 x (3 x 1) = 0,090 woven roving --------- 0,0015 x (3 x 18) = 0,081 0,171 in  4,3 mm (esta espessura não integra gelcoat e topcoat) Peso mat ----------------------------------------woven roving ---------------

133  0,563 16

18  3  0,244  0,824 16 1,387 lbs / ft2  6,763 kg/m2

Rigidez (contando com o poliuretano expandido e o laminado interior):

d

P  L2 4

 0,561  L2  tc    3 2 3 t  t f   E c  Ef  t  t c

P = 1,774 lbs/in2

d

1,774  27,5 2 4

 0,561  27,5 2  4    6 3 3 2 4,261  0,131   6000   10  4,261  4

L = 27,5 in Ef = 106 psi Ec = 6 x 103 psi

4  424 ,25  d  335 ,4     13363231 ,6 102341 ,4 

t = 0,171 + 0,09 + 4 tf = (0,171 + 0,09) / 2 tc = 4 (valor médio)

d  0,0238 in  0,6mm

Como d < da, isto é, 0,0238 in < 0,275 in, os valores arbitrados são suficientes.

Pag. 124


FUNDO (zona da quilha): Aplica-se mais 50% do que foi calculado para o FUNDO LATERAL. Assim:

0,154  1,5  4,05 0,057

4 camadas de woven roving de 18 oz (600g/m2) 5 camadas de mat de 1 oz (300g/m2)

Espessura mat ------------------------------------- 0,030 x 5 = 0,150 woven roving ----------------- 0,0015 x 72 = 0,108 0,258 in  6,6 mm Peso mat ---------------------------------------woven roving --------------

153  0,937 16

18  4  0,244  1,098 16 2,035 lbs / ft2  9,920 kg/m2

LADOS (zona com poliuretano expandido):

Pd  Phs  Pvs  Pd  1,97  0,5  0,134  Pd  1,119 lbs / in2

Mb 

z

P  L2  y 1,119  18 2  3  Mb   Mb  90 ,64 lbs  in 12 12

Mb 90,64  z  z  0,00302 in 3 3 Fs 30  10

Flexão:

tf 

18 L  z  tf   0,00302  t f  0,027 in 2 2

Pag. 125


Rigidez:

da 

L 18  da   da  0,18 in 100 100 1

1

 P  L4  3  3 1,119  18 4   t r     t r  0,239 in t r   6  32  1,5  10  0,18   32  Fm  d 

Aplicando o esquema de cálculo usado anteriormente, teremos:

0,027  0,47 0,057

2 camadas de woven roving de 18 oz (600g/m2) 2 camadas de mat de 1 oz (300g/m2)

Espessura mat ----------------------------------------- 0,030 x 2 = 0,060 woven roving --------------------- 0,0015 x 36 = 0,054 0,114 in  2,9 mm Peso mat -----------------------------------------woven roving ---------------

123  0,375 16

18  2  0,244  0,514 16 0,889 lbs / ft2  4,335 kg/m2

Nota: O laminado dos lados fica bastante acima das exigências de cálculo. Foi assim decidido para evitar que se verifique uma redução abrupta da espessura do estratificado, na passagem dos fundos laterais para os lados. Ver a figura esquemática integrada nos elementos desenhados do projecto. Rigidez (contando com o poliuretano expandido e o laminado interior):

P  L2 d 4

 0,561  L2  tc    3 2 3 t  t f   Ec  Ef  t  t c

P = 1,118 lbs/in2 L = 18 in Ef = 106 psi Ec = 6 x 103 psi

d

 1,118  18  0,561  18 2    6 3 3 2 2,204  0,102   6000  4  10  2,204  2 2

2

t = 0,114 + 0,09 + 2 tf = (0,114 + 0,09) / 2 tc = 2 (valor médio)

Pag. 126


2  181 ,74  d  90,639    2706185 , 66 26510 , 42  

d  0,013 in  0,33mm

Como d < da, isto é, 0,013 in < 0,18 in, os valores arbitrados são suficientes. LADOS (zona sem poliuretano, até à borda):

Pd  Phs  Pvs  Pd  0,7  0,5  0,134  Pd  0,484 lbs / in2

Mb 

z

P  L2  y 0,484  8 2  3  Mb   Mb  7,74 lbs  in 12 12

Mb 8  z  z  0,000258 in 3 3 Fs 30  10

Flexão:

tf 

8 L  z  t f   0,000258  t f  0,00103 in 2 2

Rigidez:

da 

L 8  da   da  0,08 in 100 100

1

1

 P  L4  3  3 0,484  8 4   t r     t r  0,0802 in t r   6  32  1,5  10  0,08   32  Fm  d 

Como tr > tf, temos:

0,0802  01,4 2 camadas de woven roving de 18 oz (600g/m2) 2 camadas de mat de 1 oz (300g/m2) 0,057

Pag. 127


Espessura mat ----------------------------------------- 0,030 x 2 = 0,060 woven roving --------------------- 0,0015 x 36 = 0,054 0,114 in  2,9 mm Peso mat ------------------------------------------woven roving -----------------

12 3  0,375 16

18  2  0,244  0,514 16 0,889 lbs / ft2  4,335 kg/m2

CONVÉS E COCKPIT Considerando que o painel sandwich tem as seguintes espessuras: tf – camada exterior (1 x wr + 1 x mat) -------------------------- 0,057 in. tc – camada intermédia de poliuretano ------------------------- 1,583 in. tf - camada interior (2 x mat) ----------------------------------------- 0,060 in. Total ------ 1,700 in.  43 mm Considerando duas réguas de contraplacado de 10 cm de largura intercaladas nas arestas do convés ficamos com uma distância máxima aproximada, sem apoios, de 75 cm  30 in. Flecha admissível = 30 / 200 = 0,15 in  4 mm

P  L2 d 4

d

 0,561  L2  tc   3 3 t  t f 2  Ec  Ef  t  t c

1  30 2 4

  0,561  30 2 1,583   6 3 3 2 1,7  0,057   6000   10  1,7  1,583

d  225 0,000534  0,0000977

d  0,14 in (como 0,14 < 0,15 a solução é aceitável)

Pag. 128



Tensão do laminado (faces) – esforço de tracção:

fs 

P  L2 1  30 2  fs   fs  1201 psi 8  t f  t  t f  8  0,057  1,7  0,057 

(como 1,201 x 103 < 12 x 103 a solução é aceitável) Tensão do poliuretano (camada intermédia) – esforço de corte:

fc 

P L 1  30  fc   fc  9,13 psi    2 t  tf 2  1,7  0,057 

(sendo 100 psi a resistência limite do poliuretano às tensões de corte, como 9,13 < 100 a solução é aceitável) Nota – É normal considerar que a flecha admissível no convés seja igual à distância sem apoios a dividir por 250, para evitar que os ocupantes da embarcação tenham a sensação desagradável de andarem sobre uma superfície flexível. Contudo, em soluções económicas pode chegar-se até ao valor de L/100. Neste caso admitiu-se L/200, opção que se considerou adequada para o nível de qualidade fixado para o produto. CÁLCULO DO MASTRO, DA RETRANCA, DOS BRANDAIS E DOS ESTAIS Para levar a efeito a execução dos cálculos acima indicados recorreu-se à fórmula de Euler, seguindo o esquema do segundo método referido nos textos da Westlawn School of Yacht Design que não foi explicitado no presente livro. Tal como já foi dito anteriormente a propósito de outros cálculos deste exemplo, apresenta-se porque assim foi executado no momento em que se projectou esta embarcação. Faço notar que este método de cálculo, assim como outros, deixa de lado vários factores que influenciam a segurança do conjunto, tais como o modo de apoio do mastro e as condições de movimento da embarcação no mar. Em consequência das lacunas do modelo teórico que serve de base aos cálculos, as fórmulas respectivas integram coeficientes de segurança variáveis bastante elevados, de acordo com a praxis, como se pode ver na folha anexa onde se encontra o esquema dimensionado do mastro e dos brandais (e nos cálculos subsequentes). Começando pelo referido esquema, calculam-se as reacções nos brandais partindo de uma série de pressupostos, através dos quais se determinam as forças de compressão que permitirão chegar às dimensões da secção do mastro e, bem assim, às secções dos cabos.

Pag. 129



Continuando os cálculos iniciados na folha onde figura o esquema simplificado do mastro, vamos avaliar o efeito das tensões dos brandais na compressão do mastro:

Brandais superiores ------ CU 

10.5  162  CU = 850 2

Brandais inferiores ------- CL 

11.5  240  CL = 1200 2.3 2050 lbs

Compressão total

2050

Peso do mastro e do aparelho

90

Peso das velas

30

Peso da retranca

15

Esforço do aparelho (3 vezes o peso das velas)

90

Esforço das velas (estimado)

25

Total

2300

Fórmula de Euler: 

Momento longitudinal (com um coeficiente de segurança de 2): 2

3,14  W  2    E I  L  2

 3,14  7  9000  2     10  IL  9000  2263  IL 295 , 2  

9000  IL  4 in4(alumínio)  IL  2263 2

9000  3,14  6  9000  2     1,3  10  IL  IL  294  295 ,2 

W = 2300 x 3,9 (c.s.) = 9000 lbs LL = 24,6’ x 12 = 295,2” E = 107 (alumínio) E = 1,3 x 106 (abeto) [I] = in4

 IL  31 in4 (abeto)

Pag. 130


Momento transversal (não se considera nenhum coeficiente de segurança): 2

3,14  W    EI  L  2

3,14  7  9000     10  IT  9000  5177  IT  138 

 IT 

LT = 11,5’ x 12 = 138”

9000  IT  1 .7 in4 (alumínio) 5177

2 9000 3,14  6  9000     1,3  10  IT  IT  673  138 

 IT  13 in4 (abeto) Secção do Mastro (dimensões e geometria): Alumínio – Secção oval – Espessura da parede = 0,125” (3,2 mm) Eixos = 5” x 3” (12,7 cm x 7,6 cm) Abeto – Secção oval –

Espessura da parede = 0,8” (20,5 mm) Eixos = 5,5” x 4” (14 cm x 10,2 cm)

Nota: A escolha das secções foi feita a partir dos momentos de inércia, usando tabelas. Secção da Retranca (dimensões e geometria):

W

SV  WPC 107,5  1,5  W  W  19 lbs 8,5 L

Alumínio – Secção circular – Espessura da parede = 0,125” (3,2 mm) Diâmetro = Ø 3” (7,6 cm) Abeto – Secção rectangular arredondada –

Espessura da parede = 0,5” (12,7 mm) Lados = 3,5” x 2,3” (8,9 cm x 5,8 cm)

Nota: O dimensionamento da retranca foi obtido a partir de uma tabela contida nos textos da WSID.

Pag. 131


CÁLCULO DA ESTABILIDADE Os cálculos de estabilidade desta embarcação foram levados a efeito utilizando as seguintes inclinações: 30º, 60º, 90º e 120º. Tal como referi anteriormente, seria mais rigoroso recorrer a um número maior de ângulos, eventualmente com um intervalo de vinte graus, isto é: 20º, 40º, 60º, 80º, 100º, 120º e 140º. Contudo, as quatro inclinações que usei nestes cálculos já nos dão uma ideia bastante precisa da curva da estabilidade, permitindo afirmar que o comportamento da embarcação, neste domínio, está de acordo com o que se espera de um veleiro deste tipo. Ver, em anexo, os elementos escritos e desenhados subsequentes que, a meu ver, corroboram a presente afirmação.

Pag. 132
















EXEMPLO 2 O presente estudo tem o nível de anteprojecto e foi elaborado nos anos oitenta do século passado para responder a um exercício apresentado pela Westlawn School (WSID), no âmbito dos estudos que fiz nesse período. Apesar de só ter sido exigido, neste caso, um número reduzido de cálculos, aqueles que foram pedidos já permitem concluir da viabilidade da proposta, tanto assim que o instrutor que a analisou a considerou muito boa. Como se pode concluir da apreciação dos elementos executados e agora apresentados, trata-se do tal exemplo que prometi anteriormente que mostraria, para exemplificar a exploração do tema da velocidade em meio aquático. É uma embarcação planante, do tipo “runabout”, de quatro lugares, tal como determinava (em alternativa) o programa fornecido pela escola. A escolha assumida de um motor diesel pode ser questionada, do ponto de vista da resposta mais adequada a dar ao que era solicitado, no que se refere à velocidade, pois um motor a gasolina seria mais leve para a mesma potência ou mais potente para o mesmo peso. A primeira hipótese (motor mais leve) permitiria colocar mais facilmente o centro de gravidade na vertical do centro de flutuação e a segunda (motor mais pesado) permitiria andar um pouco mais depressa. Mas a minha permanente preocupação com os problemas da segurança, levou-me a fazer a referida opção que julgo aceitável e, provavelmente, de acordo com a opinião de muitos dos aficionados que funcionam no mesmo registo que eu. Quer o texto, quer os elementos escritos dos desenhos são apresentados na forma original, isto é, na língua inglesa. Com a provecta idade que já possuo, não me é possível refazer os desenhos com a competência e o rigor que a minha mão e a minha vista me permitiam naquele tempo e, também, não considero relevante proceder à retroversão do texto. Só peço que me sejam perdoados os erros linguísticos que os especialistas não deixarão de encontrar. Ainda sou do tempo em que, no ensino regular oficial, se investia mais no estudo da língua francesa, pelo que espero a benevolência dos leitores mais exigentes. *Programa fornecido pela WSID: Draw plans for a high speed, four or six passenger runabout, between 20´ and 26´L.O.A., and of conventional beam. The plans are to consist of a profile and arrangement; lines and offsets; construction profile, beam plan and frame plan; and at least two sections. Construction drawings should show engine, fuel tank, and steering gear installation.

Pag. 133


In order to determine proper trim, provide a complete table of weights and moments, and calculate the location of the longitudinal center of gravity. *Resposta: Material: the hull, deck and structural members of this boat are to be made of sheets and plates of marine aluminum alloy in order to attain the least possible dead weight (about 1000 lbs. for hull, deck and structure). The chosen alloys and tempers are as follow: Hull and deck ------------ 5086 H 32 Structural members - 5083 H 112 Scantlings were obtained by the empirical method, using data furnished by book 20, volume 1. Displacement and LCB:

STA

Half Areas

×

Functions for Δ

×

CB

0

0.0000

1

0.0000

5

0.0000

1

0.1907

4

0.7628

4

3.0512

2

0.5742

2

1.1484

3

3.4452

3

1.0016

4

4.0064

2

8.0128

4

1.4145

2

2.8290

1

2.8290

5

1.6164

4

6.4656

0

---

6

1.6504

2

3.3008

1

3.3008

7

1.6551

4

6.6204

2

13.2408

8

1.6602

2

3.3204

3

9.9612

9

1.6721

4

6.6884

4

26.7536

10

1.3750

1

1.3750

5

6.8750

36.5172

 

2  F s  64 3

LCB 



2  36.5172  1.8104  64 3

- 17.3382

60.1314 42.7932

  2820 .7 lbs

42.7932 1.8104 Xc  s  LCB   LCB  2 .12  abatf STA5 (0.31 abaft STA6) 36.5172 F

Pag. 134


Engine – Volvo Penta, AQ 225 D / 280 B ----------------------- 225 HP – Top, 180 HP – Cruising Keith’s Formula: Assuming

M  C

3

C=17 (very eficient runabout)

3 L P 18.1  225 15 .97  M  17   M  17   M  43 mph (top speed) B 6.3 6.3

M  40 mph (cruising speed)

Checking on second speed chart (Book 14) – Fast runabout   2820   15 .67 lbs/HP  180 P P

 44 statute miles/hour

40 V V   9.4  18.1 L L WEIGHT CALCULATION ( wgt = lbs; dist. from STA 6 =in.):

Item

WGT

Dist. from STA 6

Horiz. Moments

37.42

+6.85

+256.33

8.46

+5.91

+50.00

Stern plating

31.15

+7.05

+219.61

Transverse frames – STA 9

16.42

+5.59

+91.79

STA 8

16.71

+3.72

STA 7

19.95

+1.89

+37.71

STA 6

18.09

+0.04

+0.72

STA 5

20.37

-1.79

-36.46

STA 4

19.93

-3.60

-71.75

STA 3

24.79

-5.44

-134.86

STA 2

18.03

STA 1

13.87

-9.15

STA 0

10.37

-10.95

-113.66

STA -1

2,05

-12.75

-26.14

73.42

-1.42

-104.26

53.16

-2.46

-130.77

Integral tank

31.19

-0,00

0.00

Engine girders and transverse stifeners

12.52

+3.72

Stern frames Outboard driving mounting plating

Longitudinal frames - bottom Side

-7.30

+62.16

-131.62 -126.91

+46.57

Pag. 135


Stifeners – STA 2  STA 3

5.51

-6.40

Hull plating – A.P.  STA 9

29.36

+6.42

+188.49

STA 9  STA 8

44.35

+4.53

+200.91

STA 8  STA 7

44.02

+2.72

+119.73

STA 7  STA 6

44.09

+0.89

+39.24

STA 6  STA 5

44.47

-0.91

-40.47

STA 5  STA 4

44.16

STA 4  STA 3

43.43

-4.51

-195.87

STA 3  STA 2

40.55

-6.34

-257.09

STA 2  STA 1

36.89

-8.15

-300.65

STA 1  STA 0

29.93

-9.96

-298.10

STA 0  F.P.

28.52

-11.65

-332.26

Deck and cockpit plating – A.P.  STA 9

8.93

+6.18

+55.19

STA 9  STA 3

40.20

-0.46

-18.49

STA 3  STA 0

68.73

-7.52

-516.85

STA 0  F.P.

16.75

-11.93

-199.83

Engine (Volvo Penta, AQ 225 D / 280 B)

893.00

+4.49

+4009.57

Engine cover (aluminum sheet and insulation)

32.80

+4.25

+139.94

Engine controls and console (air intake)

53.72

-3.38

-181.57

130.00

0.00

0.00

Acrylic screen

18.14

-5.55

-100.68

Stearing system

13.00

+0.63

+8.19

Cockpit sole (plywood)

45.00

-2.40

-108.00

Cockpit side (plywood)

22.00

-2.20

-48.40

Battery

17.50

-7.94

-138.95

Seats (aft)

70.00

+0.99

+69.30

Seats (forward)

45.00

-3.43

-154.35

230.00

+1.03

+236.90

300.00

-3.39

-1017.00

Fuel (half capacity)

Crew (2 young people, aft) (2 adults, forward) TOTAL

1120

-2.71

-35.26

-119.67

+892.43

LCB = 2.12 - 1.81  LCB = 0.31 abaft STA 6

CG 

892.43  CG = 0.31 abaft STA 6 2867.95

Pag. 136





EXEMPLO 3 Por várias vezes, quando ainda tinha disponibilidade para isso, apresentei propostas ao concurso internacional “Classic Boat Amateur and Professional Design Competition”, promovido anualmente pela conhecida revista mensal inglesa Classic Boat. Em geral fiquei bem classificado, mas nunca consegui chegar ao primeiro lugar, que era, obviamente, o meu objectivo. O exemplo que agora vou apresentar constitui uma dessas tentativas, por sinal a que ficou pior posicionada pois não passou do quarto lugar, se bem me lembro. Pelo menos, um membro do júri criticou negativamente a solução, contudo, foi aquela em que mais me esforcei e que continua a parecer-me uma proposta interessante para responder ao programa que foi apresentado aos leitores num dos números da revista, no ano de 1998. Tal como no exemplo anterior, as partes escritas são apresentadas em inglês, pelo que peço, mais uma vez, as minhas desculpas no que se refere a eventuais falhas semânticas e gramaticais. Como não sei onde pára o exemplar da revista que continha o programa, dispenso-me de o apresentar, embora a exposição do conceito que inicia o texto explicativo que acompanhou os desenhos permita ter uma ideia aproximada do que se trata. 1140 Motorsailer 1 – The concept 1.1 – “The desire to find our own space, self-sufficient in our own craft, is one of the reasons why we go cruising”. This statement served as a “moto” for the boat I wish to present to your consideration. I assumed that three friends in a boat, for one month, need enough space to walk around. That is why I designed a reasonable spacious boat, putting an emphasis on the motor side, undercanvased, but capable of making a trip to search a shelter under sails alone. 1.2 – Depending on the chosen wilderness (for instance, the coast of Scotland or the Cape Vert Islands), the equipment may vary. I think of things like an instant water heater, a generator and a reverse osmosis desalinator, etc., that I have not indicated on the plans. Of course, these items can be installed without any difficulty. 1.3 – As you can see looking at the lines, I propose a pure displacement craft, with a displacement/length ratio of 252. Furthermore, the location of the longitudinal centre of buoyancy is totally compatible with a speed/length ratio of 1.15.

Pag. 137


1.4 – The centerboard is to be used not only with sails. It also serves to maintain the boat on her track, when needed. 2 – Numerical data

IMPERIAL

METRIC

LOA (length overall)

37.37

11.400 m

LWL (length waterline)

34.88

10.640 m

BOA (beam overall)

11.38

3.470 m

BWL (beam waterline)

10.56

3.220 m

Hd (hull draft)

1.98

0.605 m

Maximum draft (cb. up)

2.75

0.840 m

Maximum draft (cb. down)

5.74

1.750 m

Displacement (tons)

10.699 long tons

10.871 M tons

Displacement (lbs, kg)

23,966 lbs

10,871 kg

Displacement (cu. ft., dm3)

374.476 cu. ft.

10,604 dm3

Sail area

341.74 sq. ft.

31.79 m2

Shaft centerline below waterline

1.62

0.495 m

Maximum propeller diameter to fit within aperture

21

0.533 m

D/L ratio

252

---

Block coefficient (CB)

0.51

0.51

Prismatic coefficient (CP)

0.58

0.58

3 – Engine, propeller and shaft Assuming S = 6.8 knots, we have

S  S  S  6.8  S  1.15 L L L LWL 34.88 Then: S 10.665  1.15  3 L   SHP

3

10.665  SHP = 30 (stated upper limit) 23 .966  SHP

For continuous output we must operate the engine at 85% of the top RPM and HP. We also have to allow for a 3% loss of power due to friction and back pressure.

30 SHP  1.03  36HP 0.85 Pag. 138


This indicates an engine with a maximum BHP rating of 36 HP. Departing from this value I pick up a 4-stroke diesel engine, a Volvo MD 17D/MS2, with a maximum output of 36 HP, at 3000 RPM, equipped with a reduction gear of 3:1 and an output shaft downward angle of 7º. Maximum intermittent shaft output would be 35 HP. Under these conditions the maximum speed of the boat would be: S 10.665  S  7.15 knots 3 34.88 23.996  35

Let us chose the propeller using the Bp-δ method:

Va  7.15 0.804 Va

Bp 

 5.75 knots

(SHP) 0.5  RPM 350.5  1000  Bp   Bp  74.6 2 .5 Va 5.752.5

From the chart Bp-δ (screw series B 3.65 – type B, 3 blades, d.a.r.= 0.65) we take: δ  315 and   43 Adjustment of δ for single screw: δ  315  0.95  δ  299.25

Then: D 

  Va 12 299.25  5.75  12 D   D  20.65 (52.5 cm) RPM 3000  3

From the chart we obtain

PM  0.65 , then: Dp

PM  0.65  20.65  PM  13.4 (34.1 cm)

Pag. 139


We can settle on a 21 inch diameter x 13 inch pitch propeller, three bladed, with a d.a.r. of 0.65. Checking for cavitation:

MWR 

d.a.r. 0.65  MWR   MWR  0.425 3  0.51 1.53 2

2

D 21  Ad       MWR  0 . 51  nº of blades  Ad  3 .1416     0 . 425  0 . 51  3  2  2 

 Ad  225.22 sq.in. Allowable blade loading: PSI  1 .9  Va 0.5  ft 0.08  PSI  1.9  5.75 0.5  1.62 0.08  PSI  4.73

Actual blade loading:

PSI 

326 SHP e 326 35 0.43  PSI   PSI  3.79 Va Ad 5.75 225.22

As we can see there is no cavitation at all but the efficiency is not very good (=0.43). Doing the calculations again with a screw B 3.50, d.a.r. = 0.50 we have the same diameter and pitch but at a cost of some cavitation (actual blade loading of 5.4) we attain a better value for efficiency (=0.472). Let us determine the propeller-shaft diameter (solid tobin bronze):

Ds  3

321.000  SHP  SF 321 .000  35  3  Ds  3  D s  1.14 ( 30 mm) St  RPM 20 .000  3000  3 

From the data of the engine:

Power

RPM (gear ratio 3:1)

Fuel hourly consumption

35 SHP

1000

220 gr/HP

¾ x 35 SHP = 26.25 SHP

680

193 gr/HP

½ x 35 SHP = 17.55 SHP

480

195 gr/HP

Pag. 140


Estimated speed at 3/4 full power of engine: S  L

10.665 3

3     SHP   4

S  34.88

10 .665 3

3 23 .996    35  4 

 S  6.49 knots

The total fuel capacity of the boat is 500 litters. Converting to weight: 500  0.88  440 kg If we travel at 3/4 full power we have an hourly consumption of: 193 gr  26.25 SHP  5.066 gr Which means that we can run for almost 87 hours: 440.000  5.066  86.85 hours At 6.49 knots we can voyage on power alone for 563 miles, under ideal conditions: 6.49  86.85  563.65 4 – Construction (wood and aluminum alloy). The hull is to be done using strip planks of Australia (Acacia Melanoxylon, R. Brown) and laminated members of the same wood, unless otherwise stated on the sheets. Floor timbers and gussets are made of woods that were already used in Portuguese caravels. As to the method of construction I would advise something similar to the construction of Westernman (see CB nº 115) but using, instead of epoxy, a modified PVA glue (Borden XB90K5). The outside is to be sheathed with two epoxied layers of 400 gr glass. The components made of aluminum alloy are to be prefabricated and then, set in place, with the exception of the stiffening members of the centerboard case. The ballast, molded in lead to fit the hull form must be well secured to the backbone and the frames. For economic reasons, the tanks (fuel, fresh water and sewage) and the bath tub can be done of FRP, using a known method of cheap molding. There was much to say about the options I assumed, but I let it to your judgement when analyzing the drafts.

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EXEMPLO 4 Aqui está mais uma ideia sujeita à apreciação do júri da revista Classic Boat, desta vez no ano de 2002. O objectivo principal dos promotores do concurso era conceber uma embarcação na qual fosse possível instalar, com critério, o motor representado nos desenhos, um pequeno motor diesel marítimo de uma marca japonesa muito conhecida. O vencedor do concurso receberia um exemplar do referido motor. Devo dizer que a minha proposta, contemplando alguma ironia contestatária do conformismo estético dominante no universo do discurso da arquitectura naval, foi uma espécie de «caixote» destinado a uma utilização em águas interiores, onde as condições de navegabilidade são geralmente boas. E há em Portugal muitos rios e albufeiras com excelentes condições para a sua utilização. Mas, o que seria verdadeiramente formidável era conduzir este artefacto pelas redes de canais da Europa continental e da Inglaterra, aproveitando o tempo disponível para visitar os monumentos e os restaurantes das povoações ribeirinhas. Um jovem casal, com espírito desportivo e alguns meios, que se atrevesse a empreender esta viagem, ficaria com memórias para o resto dos seus dias. Das propostas submetidas a concurso que chegaram a ser publicadas esta era, obviamente, a mais radical e pareceu-me, pelo que vi escrito, que o editor da revista a achou muito divertida. Mas o júri, provavelmente conservador, só lhe deu o terceiro lugar. No que se refere aos aspectos construtivos é fácil concluir que a sua realização pode fazer-se, com rapidez e eficiência, a partir de painéis de contraplacado marítimo, pois todas as superfícies do casco e da superestrutura são planificáveis, como se pode verificar pela análise das linhas e dos restantes desenhos. É possível, e isso foi referido por um dos elementos do júri, aproveitar este desenho para instalação de um motor fora de borda de baixa potência, depois de introduzidas algumas alterações simplificadoras na zona da popa. Deste modo ficaria a sua construção e utilização ao alcance de um maior número de utilizadores e os custos de manutenção mais aliviados. Fica, porém, evidente que, com esta alternativa, a despesa com combustível aumenta substancialmente. Mais uma vez, apresento o texto tal como foi enviado, juntamente com os desenhos, para apreciação, em língua inglesa.

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River craft “RIO TEJO 7.5” 1. The concept 1.1. As it is said by Philip C. Bolger about the boat “Alice”, « Recreation suffers from thinking too hard. By definition it ought to be spontaneous. The people motoring through rivers and harbors look as they were doing it right, but the boats they’ve been sold don’t. The designers have been studied harder than is appropriate». I tried to avoid this sin but I must confess that it is not easy. 1.2. My idea was to design a river boat of simple construction and maintenance, intended to promenade slowly on the estuaries of rivers Tagus and Sado, two beautiful bodies of water with plenty opportunities to see birds and dolphins, and to visit both ancient and modern monuments on their riversides. One can navigate these rivers during several years without being bored, stopping on the banks to seek restaurants where you can enjoy a good meal at a reasonable price. This is why I designed a tunnel hull, for extreme shoal draft. With this kind of arrangement you can reach places that cannot be attained in normal conditions. It is also possible that, with a trailer, this boat may be transported by route to other interesting places, namely, rivers Douro and Guadiana, both navigable for many miles, from their mouths. 2. Numerical data Imperial

Metric

25.57’

780 cm

024.59’

750 cm

BOA (beam overall)

6.89’

210 cm

BWL (beam waterline)

6.39’

195 cm

Hd (hull draft)

1.18’

36 cm

3.47 long tons

3.53 M tons

370 cu.ft.

3440 dm3

Shaft centerline below waterline

4.72’’

12.0 cm

Max. propeller diameter to fit tunnel

12.4’’

31.5 cm

D/L ratio

233

--

Block coefficient

0.65

0.65

Prismatic coefficient

0.81

0.81

LOA (length overall) LWL (length waterline)

Displacement (tons) Displacement (cu.ft., dm3)

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3. Propeller and shaft calculations. Engine – Yanmar 1 GM 10 Maximum output = 9.1 HP Continuous rating output (at crankshaft) = 8.0 HP Let us use a value of SHP = 7.5. Under this conditions the speed of the boat would be:

10.665 S 3  L   SHP

10.665 S 3  S  5.23 knots (9.69 Km/h) 7773  7.5 24.59

Let us choose the propeller, using the Bp-δ method (single screw): Cb  0.65 Wf  1.11  (0.6  Cb )  Wf  0.72 Va  V  Wf  Va  5.23  0.72  Va  3.77 With SHP = 7.5 we have 3,450 RPM at crankshaft and 1,560 RPM at the propeller, using a reduction ratio of 2.21 (Model KM 2P). Then,

Bp 

SHP0.5  RPM Va2.5

 Bp 

7.50.5  1560  Bp  155 3.772.5

From the chart Bp-δ (screw series B 3.65 – type B, 3 blades, d.a.r. = 0.65) we take:

  450 and   35 Adjustment of δ for single screw:

  450  0.95    428 Then,

D 

  Va  12 428  3.77  12 D   D  12.4" RPM 1560

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From the chart we obtain

PM  0.52 , then: Dp

PM  0.52  12.4"  PM  6.4" Giving the restrictions (screw working in a tunnel), we can settle on a 12 inch diameter x 7 inch propeller, three bladed, with a d.a.r. of 0.65. Let us determine the propeller-shaft diameter (solid Tobin bronze):

Ds  3

321,000  SHP  SF 321,000  9.1  3  Ds  3  D s  0.65" St  RPM 20,000  3600  2.21 

(16.4 mm)

4. Fuel consumption At SHP = 7.5 the engine has an hourly consumption of: 210 gr x 7.5 = 1,575 gr (from the data). The total fuel capacity of the boat is 70 litters. Converting to weight: 70 x 0.88 = 61.6 kg This means that the engine can run for 39 hours.

61,600  1,575  39.1 hours 5. Construction The hull is to be done using sheets of marine plywood sheathed with two epoxied layers of 400gr glass. Sawn frames and all other members are to be made of Australia (Acacia Melanoxylon, R. Brown) and Holm oak, in accordance with good practice. The deck, the cockpit sole and the cabin sole are to be done of 5 mm Iroko, laid over 10 mm plywood. The guards are to be of varnished Iroko, applied over finished hull. Note – It seems to me that, giving the use of the craft, there is no need for stability calculations.

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EXEMPLO 5 Desta vez, e para finalizar, apresento uma pequena embarcação de recreio que submeti à apreciação do júri do concurso promovido esporadicamente pela conhecida revista americana WoodenBoat. Passou ignorado no meio do conjunto dos concorrentes, provavelmente porque foi mais uma solução entre muitas outras que se assemelhavam e que não apresenta qualquer originalidade. Reconheço que não investi grande esforço na sua execução e que os efeitos corrosivos do tempo já não me deixaram desenhar com a elegância da juventude. Contudo, este exercício simplista pode ajudar a imaginar artefactos despretensiosos cujo prazer de utilização está num nível superior ao orgulho de possuir. E esta atitude, quanto a mim, merece ser valorizada nos tempos complexos em que vivemos. Seguem os elementos escritos e desenhados, na forma habitual, isto é, na língua dos promotores da referida competição.

1 – My proposal attempts to answer the parameters shown in your AD for the Design Challenge, keeping in mind that the resulting must stay within reasonable limits of simplicity of construction and maintenance. The solution presented is open to alterations of the materials used and the method of construction. Because the hull surfaces are developable, it is possible to adapt this boat to «seam-and-batten» or «stitch-and-glue» methods or, even, welded sheets of marine aluminum, left unpainted for low maintenance. I imagine the presented version to be painted over the fabric of glass applied on the exterior of the plywood hull and deck (one layer of 400 gr. glass). 2 – I made the calculation of the displacement having obtained a volume of 1000 dm3, which corresponds to 1000 kg (2205 lbs) for fresh water. I also made a rough evaluation of the weight, reaching a result of about 180 kg (400). Nevertheless, this number may be altered if we change to other wood species, materials or systems of construction. Pag. 146


3 – Numerical data: LOA – 5620 mm (18.43 in) LWL – 5400 mm (17.70 in) BOA – 1580 mm (5.18 in) DISPLACEMENT – 1000 kg (2205 lbs) Block Coefficient – 0.42 Prismatic Coefficient – 0.75 Speed (25 HP maximum power): S  10  C  L1 / 2  P1 / 3  D1 / 3 S  10  1.6  17.71 / 2  251 / 3  22051 / 3

S  15.1 knots

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