AH - Tudo | 8 de novembro de 2014

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4 O QUE É IMPORTANTE PARA O VALE DO TAQUARI NOVEMBRO/2014

Caminhos que levam ao desenvolvimento Ferrovia, rodovia, hidrovia e aeródromo: temos tudo, mas aproveitamos quase nada. A localização geográfica estratégica favorece modais de transporte suficientes para acelerar o desenvolvimento e fortalecer nossa economia. Mesmo com a capacidade variada, insistimos em transportar quase totalidade da nossa produção pela BR-386, visto a ineficiência nas demais plataformas.

SATURADA

IGNORADA

INTERDITADO

OCIOSA




4

EDITORIAL

O Vale tem tudo O

Brasil em suas áreas mais desenvolvidas oscila como um pêndulo entre a sociedade industrial dos meios de produção, de bens a serem consumidos e do capital. E flerta com a sociedade pós-industrial produtora de conhecimento, administradora de sistemas, capaz de programar mudanças rápidas. No Vale do Taquari, os desafios na área da infraestrutura impedem o total desenvolvimento dos meios de produção, isto é, de colocar o trabalho à disposição do capital. Bem como a sonhada inserção no chamado 'primeiro mundo', e desta forma situar o presente à disposição do devir. Aqui, convivemos com a urgência em desafogar o trânsito nas rodovias e com a necessidade de desengavetar projetos em letargia há anos, em especial da hidrovia e ferrovia. A exemplo de regiões do país mais atrasadas, ainda reside na infraestrutura o principal gargalo do Vale para acelerar o desenvolvimento. A vantagem regional se situa na oferta e na concreta capacidade de aproveitar outros modais de transportes. O Caderno Tudo elegeu como tema central a infraestrutura, haja vista a preeminência de reconquista do espaço perdido. Viver como uma região sitiada tendo à disposição os trilhos do trem que nos ligam à outras regiões produtoras do Estado e país, e de quebra deixar obsoleto o Porto de Estrela sem usufruir da oferta de navegabilidade pelas águas do Rio Taquari, nos põem na contramão de um tempo que aponta para era pós-industrial. Paralelo a rodovia, ferrovia e hidrovia, dispomos ainda de um

aeródromo incipiente. A velocidade das transformações implica não só transporte rápido entre as principais cidades do Rio Grande do Sul, mas também agilidade na tomada de decisões. Área na qual pecamos. Muito se fala em melhor aproveitamento destes quatro modais, pouco se faz. Enquanto – a altos custos e duras penas – conseguimos duplicar a BR-386 entre Estrela e Tabaí, recém iniciamos a discussão para vencer a burocracia que corrói os silos no porto de Estrela. O mais ineficaz entre os 250 erguidos de norte a sul. Diante desse quadro de baixa objetividade, urge a necessidade do Vale do Taquari estabelecer uma agenda de prioridade de investimentos, na qual esteja definido o que de fato é imprescindível para sairmos do marasmo. Afinal, quem quer dar um passo à frente o tem de fazer sobre base sólida e neste caso ela se chama logística. Temos Tudo, menos criatividade e vontade de sentar à mesa e pensar com grandeza. Devemos unir fatores tecnológicos e econômicos capazes de conduzir à convergência facilitadora para emergir a capacidade de cada um e de todos os modais. A partir da página 40, nossos jornalistas narram histórias e ouvem empresários ansiosos para usufruírem da ferrovia e da hidrovia. Ombro a ombro, os gestores públicos clamam por duplicação das rodovias. Mas atenção: só duplicação não basta. Os nós que travam o uso dos demais modais precisam ser desatados. Se não arriscamos a cristalizar o tempo e o admirável mundo novo ficará cada vez mais distante.

Fundado em 1º de julho de 2002 Vale do Taquari - Lajeado - RS Diretor Geral: Adair Weiss Diretor Editorial: Fernando Weiss Diretor Administrativo: Fabrício de Almeida Diretor Comercial: Sandro Lucas

Tudo é mais que infraestrutura A radiografia regional, produzida pelo jornal A Hora, contempla outros temas candentes. O agronegócio e a produção de alimentos consolida-se em projeto econômico. A profissionalização no campo e acessos a novas tecnologias apontam rumos para a sucessão familiar nas propriedades. No Vale, há fatores positivos notáveis. Bons índices de escolaridade, baixa taxa de analfabetismo e alto índice de emprego favorecido pelo boom da construção civil. Sua geografia exuberante atraiu etnia variada. As duas juntas, fazem despertar para o turismo. Porém, evitemos a euforia. Velhos problemas nos assombram. Na energia elétrica mendigamos por melhorias para diminuir os apagões, agravados a todo verão. Descasos com saneamento básico persistem e o número de famílias sem água se mantém. Tratamento de esgoto avança a passos de tartaruga. Mazelas que nos jogam de volta a meados do século passado. A quarta edição desta publicação aborda os crescentes índices de homicídios em 2014. Recordes batidos mês a mês a requerer intervenção do próximo governante. Enfim, o Tudo 2014 reúne os principais assuntos regionais. Com base em cuidadosa apuração, discorre sobre cada um deles e produz análises. A publicação contribui para o nosso autoconhecimento e também para que sejam definidas políticas públicas necessárias a superação do atual desequilíbrio que leva a perigosas fraturas sociais.

Textos: Filipe Faleiro, Giovane Weber, Renata Agostini, Thiago Maurique, Estevão Heisler, Rodrigo Martini Revisão: Daniela Maronesi Monteiro Coordenação: Fernando Weiss

ÍNDICE 8

Investimentos e avanços esbarram na Aneel 14

ECONOMIA

Do Vale para os mercados mundiais 24

TURISMO

Vale desperta, mas o avanço é lento 34

SANEAMENTO BÁSICO

Imediatismo leva governos a negligenciar prioridade 42

CAPA

Desafios que levam ao desenvolvimento 64

SAÚDE

Orçamentos dos municípios estão sobrecarregados 70

EDUCAÇÃO

Avanço no ensino eleva profissionalização 76

Fotos de capa: Anderson Lopes Arte de capa: Gustavo C. da Silva Arte/Diagramação: Gustavo C. da Silva e Gustavo Tomazi Projeto Gráfico: AGEA Propaganda & Marketing

MÃO DE OBRA

SEGURANÇA

Taxa de homicídios expõe mazelas da segurança

Tiragem desta edição: 10.000 exemplares. Disponível para verificação junto ao impressor (ZH Editora Jornalística) Proibida a venda avulsa





O equilíbrio e suficiência no fornecimento de energia elétrica esbarram na morosidade de órgãos federais e estaduais. Projetos arrojados, como de novas hidrelétricas para o Vale do Taquari, travam diante da Fepam e Aneel. Líderes do setor alertam para a chegada de uma crise que, agravada pelo aumento constante dos encargos sobre as fornecedoras, acarretará oneração da tarifa paga pelo consumidor.

8 INFRAESTRUTURA

Investimentos e avanços

esbarram na Aneel Cooperativa Certel tem

5 projetos de novas hidrelétricas barrados nos órgãos federais.

P

roblemas históricos persistem no abastecimento às propriedades, tanto no campo como na cidade. Exemplo crítico ocorreu em fevereiro deste ano, com a morte de quase 500 mil frangos em função de um apagão em parte da área de cobertura da AES Sul. Os prejuízos

chegaram a R$ 5,4 milhões. Alvo das principais críticas, a concessionária amplia o leque de investimentos e atinge os 87 mil clientes da região. No primeiro semestre, aplicou quase R$ 100 milhões nas redes gaúchas. Reformulações do mesmo porte seguem até o fim do ano. Porém, enquanto projetos

tardam a sair do papel, oscilações e quedas continuam afligindo produtores e empresários. A segunda maior fornecedora, a Cooperativa Certel gera energia elétrica para mais de 60 mil associados consumidores dispostos em 47 municípios nos vales do Taquari, Caí, Rio Pardo, Paranhana e Serra.


NOVEMBRO/2014

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Capacidade no limite ameaça abastecimento A potência estadual da carga de energia elétrica está próxima do limite e gera risco iminente de apagões. O principal agravante é que 70% do abastecimento no Rio Grande do Sul depende das linhas de transmissão oriundas do sudeste do país que, sobrecarregadas, são incapazes de atender a demanda. A região, assim como outras do Estado, ainda corre o risco de cortes no próximo ano. Só a geração de energia possibilitará ao Rio Grande do Sul reduzir sua dependência energética de outros estados. No Vale do Taquari, apenas a Cooperativa Certel produz energia elétrica. A exemplo do estado, gera apenas 30% da demanda,

quantia capaz de abastecer cerca de 16 mil famílias. São três usinas hidrelétricas: uma de 7 Megawatt (MW), a Rastro do Auto e outra de 6,12 MW, a Salto do Forqueta, ambas no Rio Forqueta e a terceira a Boa Vista, em Estrela, com produção de 700 kilowatt (KW). Se cotejada a necessidade regional, a geração hídrica é insuficiente. Em períodos de estiagem, o nível dos rios e arroios reduz, limitando a produção de energia. Mesmo drama enfrentam as principais hidrelétricas do país. A pouca chuva na região Sudeste compromete a disponibilidade de energia elétrica nas demais regiões. Mas a cooperativa propõe a

órgãos federais ampliar o leque de geração com a construção de novas usinas para o Vale do Taquari. Cinco projetos estão em análise pela Aneel desde abril de 2010. Sem a definição do órgão federal, a Fepam não emite licença-prévia para funcionamento. Juntos, os empreendimentos teriam capacidade para gerar 25,2 MW, quase o dobro da atual geração. Segundo o presidente da Certel, Erineu Hennemann, tais projetos condicionarão a oferta de uma energia limpa, contribuindo com o sistema elétrico nacional. “Usaremos a mão de obra local e compraremos equipamentos daqui. A partir do funcionamento, o valor de venda

da energia será aplicado em investimentos no Vale do Taquari.” Diante de constantes riscos de apagões e efetiva ameaça em relação ao avanço industrial, a Câmara de Indústria e Comércio do Vale do Taquari (CIC-VT) pressiona a Aneel para agilizar a liberação dos pedidos. Aponta que os projetos de hidrelétricas representam investimentos de R$ 1,5 bilhão e significam a menor dependência em energia. A entidade julga ser preciso mais atenção dos governantes ao Vale do Taquari, só assim os projetos impeditivos do desenvolvimento sustentável da região ganhará o devido impulso à qualidade de vida almejada.

ANDERSON LOPES

Projetos arrojados Outras cinco usinas tiveram autorização da Aneel para operar. Desde julho, a cooperativa trabalha na construção da PCH Cazuza Ferreira (9,1 MW). Em setembro, houve o lançamento das obras das PCHs Linha Aparecida (25,41 MW) e Linha Jacinto (17,41 MW). No mesmo grupo também estão as PCHs Saltinho (24 MW) e Chimarrão (11 MW), mas essas ainda dependem de licenciamento ambiental. A cooperativa estuda a construção de empreendimentos mais arrojados. Cada um com capacidade mínima de geração em 30 MW, as chamadas UHEs. Os três projetos estão em estudo, porém nenhum deles tem previsão de iniciar. Caso saiam do papel, as hidrelétricas ficariam distribuídas na região assim: uma delas ficaria em Muçum (79,5 MW), outra em Encantado (36,20 MW) e a terceira em Arroio do Meio (68,60 MW). Além das hidrelétricas, a Certel avalia a possibilidade de implantar o primeiro parque eólico na

A crise na produção de energia elétrica na região Sudeste acarretará aumento nas tarifas em 2015.

região, no Morro da Harmonia, em Teutônia. A proposta contempla 12 aerogeradores (cata-ventos), com 50 metros de altura cada. De acordo com estimativa da cooperativa, baseada em dados de consumo dos associados, as instalações poderão gerar 16,1 MW de potência. Quantidade capaz de levar energia a 45 mil pessoas, equivalente a 63% da população de Lajeado, por exemplo. A implantação do projeto depende de uma série de questões, inclusive de aval da Fepam e Aneel. Estudo indica que a velocidade dos ventos em morros da região, em médias anuais, chega a sete metros por segundo, quantia suficiente para produção energética. Devido a tais características, o sistema eólico é definido como um dos 23 setores estratégicos da política do governo gaúcho. Segundo dados, o Rio Grande do Sul conta com 469 MW instalados em 16 parques. O potencial chega a 15,8 gigawatts (GW). Ao atingir esse patamar o governo acredita reunir condições para a instalação de novos parques e o estabelecimento de empresas fabricantes de máquinas e equipamentos da cadeia produtiva, bem como para prestadores de serviços especializados.


10 INFRAESTRUTURA

Mercado enfrenta crise A linha de transmissão com tensão de 525 mil volts (kV), interligando a Usina de Salto Santiago, no Paraná, com a subestação de Nova Santa Rita, da Eletrosul, está pronta. As concessionárias do Vale do Taquari recebem energia do sistema elétrico com linhas de 230 kV, vindas da Usina de Passo Real, do complexo de geração da Bacia do Jacuí e da subestação Nova Santa Rita, ligado ao Sistema Interligado Nacional. De acordo com o gerente comercial da Certel Energia, Ernani Aloísio Mallmann, a subestação Lajeado 3 tem previsão para entrar em operação em 2016, mas as obras ainda não saíram do papel. Enquanto isso, é provável que tenhamos novas dificuldades no abastecimento, reconhece. A exemplo do baque do verão passado, corremos o risco de pedir às empresas com geração a diesel para entrar com abastecimento próprio para não desligar a energia elétrica de outros

associados. Esse novo projeto, da Subestação Lajeado 3, dará uma autonomia por pelo menos duas décadas, diz. Mallmann aponta que a matriz energética do país é composta por 70% de hidrelétricas. Como elas estão com dificuldades de atender toda a demanda, começaram a ser ligadas as usinas térmicas. O que tem disponível está ligado. Só que o preço da térmica é seis vezes maior se comparado à hídrica. Seu uso deveria se ater apenas a casos emergenciais, avisa. Com o funcionamento ininterrupto das usinas térmicas, Mallmann destaca que a matriz energética muda. Em tais condições tendem a elevar o preço ao consumidor de forma significativa para os próximos anos. “Elas vêm sendo ligadas desde 2012, em especial pela falta de chuva na região Sudeste. Nas contas de energia já aparece o reflexo da geração térmica mais acentuada, mas está criando um passivo.”

A construção da PCH Cazuza Ferreira iniciou em julho. Hidrelétrica produzirá 9,1 MW. A de Linha Aparecida e Jacinto foram lançadas. A de Saltinho e Chimarrão ainda dependem do licenciamento ambiental.

Custo sobe, incentivo cai e problemas se agravam A Certel Energia foi prejudicada na revisão tarifária da Aneel, feita a cada quatro anos. A última ocorreu em 26 de junho. A Agência aumentou o preço da energia para a cooperativa em 36% e determinou redução na tarifa de venda em 6,14%. Também houve diminuição na parcela B, na qual a Certel Energia recebe recursos da

Aneel para desenvolver manutenção e operação do seu sistema elétrico. O incentivo passou de R$ 58 milhões para R$ 40 milhões. Em contrapartida, a tarifa cobrada pela AES Sul está mais cara que a da Certel Energia. “Estamos revendo todos os nossos processos. Não temos dúvida que reduzirá nosso nível de investimento. É inviável ter

um serviço de qualidade com uma tarifa menor se comparado a outras concessionárias.” A cooperativa expõe suas razões a Aneel no intuito de demostrar a inviabilidade de tal modelo. Uma das ponderações feitas ao órgão federal diz respeito a maior área de atuação da Certel, rural. Nessa região, o consumo é inferior

se comparado as cidades e é preciso manter extensas redes, as quais são prejudicadas de forma constante pela vegetação. “É mais oneroso distribuir energia elétrica no meio rural. Precisamos fazer com que a Aneel entenda. O equilíbrio econômico financeiro do contrato não foi atendido dessa forma”, avalia Mallmann.


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Oscilações comprometem empresas

Geradores como alternativa Segundo Mallmann, uma alternativa é a instalação de geradores nas propriedades para evitar prejuízos na produção, embora o custo seja elevado. Cita que o equipamento supre de forma automática a unidade consumidora na falta de energia da distribuidora. Fundamental na criação de aves, em que pouco tempo sem energia ocasiona a mortandade de muitos animais, diz. A cooperativa não tem como garantir o abastecimento de forma integral, tendo em vista a ocorrência de quedas de luz devido à interrupção das concessionárias abastecedoras, avalia. Aconselha aos produtores que informem as distribuidoras quando instalarem novos equipamentos. Assim a cooperativa terá tempo hábil de executar as obras necessárias para que a unidade consumidora tenha energia elétrica suficiente, diz. A procura pelos aparelhos aumentou tanto na cidade como no campo. A potência dos modelos mais vendidos varia entre 1,2 mil e 30 mil watts, cujo preço vai de R$ 1 mil a R$ 22 mil. Com o aumento da procura, alguns modelos encareceram 30%.

O fumicultor Ivan Feix, 41, de Boqueirão do Leão, comprou há quatro anos um gerador de 8 mil watts para manter estável a distribuição de energia elétrica nos dois fornos. “É melhor prevenir, pois não estamos imunes às intempéries climáticas ou blecautes.” Com a falta de energia a temperatura cai e, dependendo do estágio da secagem, a folha pode manchar e gerar perda de qualidade. A produção anual é de mil arrobas. O avicultor Joseli José Favaretto, 42, de Sério, instalou no começo deste ano um gerador de 30 mil watts para garantir a climatização do aviário que abriga 20 mil frangos. O equipamento é acoplado ao trator e consegue funcionar por 24 horas, se necessário. O produtor Ezequiel Dullius, de Cruzeiro do Sul, comprou um gerador de 8 mil watts em fevereiro. As seguidas quedas de luz provocam transtornos na propriedade. O equipamento é utilizado para colocar em funcionamento os eletrodomésticos da casa. “Quando falta energia elétrica em localidades vizinhas alugo. O preço chega a R$ 150 por dia.”

A insuficiência e precaridade da energia elétrica regional são alguns dos principais entraves para o desenvolvimento. Indústrias limitam investimentos em função da fragilidade. Alvo da maioria das críticas, a AES Sul aumentou o número de investimentos nos últimos anos. A partir disso, diminuíram as reclamações. No entanto, alguns clientes continuam com problemas. Proprietária de uma padaria em Arroio do Meio, Rejane Pedrotti, teve prejuízo de R$ 5 mil no primeiro semestre. A queda de energia durou quase 17 horas. “Se a luz caísse uma vez até aceitaríamos, mas acontece toda hora.” Em um dos cortes, funcionários foram dispensados do serviço para evitar mais despesas. Rejane também se queixa da demora no atendimento. Ela pretende entrar com uma ação cobrando indenização da AES Sul. Em novembro do ano passado, a concessionária anunciou a ampliação da Subestação Lajeado 1,

com incremento de 40% na oferta de energia elétrica para 10,4 mil clientes em Lajeado e Arroio do Meio. Em funcionamento, a potência da estação passa de 25 megavolt-ampere (MVA) para 35 MVA. Para que a energia possa chegar às redes de distribuição, a concessionária também construiu circuito de dez quilômetros de extensão. A rede tem 13,8 mil volts. Juntas, as obras totalizam investimento de R$ 1,6 milhão. No Vale do Taquari, a concessionária fornece mais de mil gigawatt/ hora (GWh) de energia para 87 mil consumidores em 21 municípios. Destes, 64,7 mil são residenciais. As melhorias surgiram após manifestações regionais reclamando da qualidade do serviço oferecido à comunidade. Em fevereiro do ano passado, prefeitos da Amvat conheceram os projetos da entidade: R$ 17 milhões para a ampliação do serviço. Em 2011 foram investidos R$ 11 milhões na região – valor 35% maior do que em 2010.

Campo desguarnecido A maioria das reclamações parte do setor primário, em especial no verão. Nesse período é comum haver quedas de energia em função da sobrecarga da rede, ocasionada pelo excesso de aparelhos de climatização utilizados para refrigerar aviários. Cerca de 250 mil agricultores têm problemas de energia no meio rural no Estado. Na maioria dos casos, a rede de eletrificação monofásica é insuficiente para fornecer potência suficiente aos equipamentos. Um dos principais agravantes ocorre no Vale do Taquari. O diretor do Departamento de Cooperativismo da SDR, Gervásio Plucinski, ressalta a importância de investimentos no campo. Estudo coordenado pelo Comitê de Planejamento Energético do Estado (Copergs)

registra pela primeira vez a necessidade de melhorias no abastecimento às propriedades rurais. Foi realizado levantamento com 3.388 famílias, de 72 municípios gaúchos, com objetivo de visualizar quais são os maiores problemas na qualidade de energia elétrica. Dos agricultores pesquisados 73,02% responderam que têm necessidade de até 25 KW de carga disponível em suas propriedades e outros 21,75% disseram precisar de carga entre 26 e 50 KW. “Esta amostra deixa claro que as concessionárias não estão investindo os recursos necessários na área rural, pois o retorno financeiro para elas nesta área é menor, devido ao número menor de pessoas por km de rede que em períodos urbanos.”


12 INFRAESTRUTURA

Prejuízos ratificam insuficiência no meio rural RODRIGO MARTINI

Problemas na linha de transmissão de Lajeado, interligando as subestações de Encantado e Roca Sales, provocaram perdas de R$ 5,4 milhões em janeiro

Na primeira semana de fevereiro deste ano, cerca de 500 mil frangos morreram, após queda de luz em diversas cidades da região. Quase 20 mil clientes ficaram sem energia elétrica. O que levou a interrupção dos sistemas de ventilação e nebulização. E o resultado foi a mortandade de aves. Na época, a AES Sul informou que o acidente ocorreu em função da dilatação de um dos cabos da linha. Relvado, Encantado e Roca Sales foram as cidades com maiores prejuízos. Nelas, 280 mil frangos morreram, quase 30% da

produção total. Mais de 200 mil frangos morreram só em Relvado. O produtor Ezequiel Bagatini, de Linha Carlos Gomes, foi quem teve o maior prejuízo. Dos 30 mil frangos criados dentro de um aviário, quase 20 mil não resistiram ao calor. Ele ficou sem eletricidade das 14h até a meia-noite. O produtor estima um prejuízo de R$ 18 mil. A maioria dos frangos mortos estava pronta para o abate, programado para o dia seguinte. Todos estavam com uma média de 2,5 quilos e 37 dias de vida. Ele precisou de três caminhões, disponibilizados

pela Secretaria de Agricultura, para transportar as aves até uma vala aberta a poucos metros do aviário. Bagatini paga cerca de R$ 500 por mês pela conta de luz durante o verão. A AES Sul é a operadora no local. Uma semana antes, ele também perdeu cerca de 400 frangos mortos em função da falta de luz. De acordo com Rita Dulac, médica-veterinária da Secretaria da Agricultura, Pecuária e Agronegócio (Seapa), as mortes de aves no verão são corriqueiras. A mortandade de aves devido ao calor é comum no verão. Mas este ano foi atípico e o

número de mortes ultrapassou o esperado para a estação, conta. O presidente da Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frangos (Ubabef), Francisco Turra, lamenta a falta de um seguro específico para cobrir as perdas. A entidade negocia com o governo a criação de um seguro para os avicultores. Para reduzir a vulnerabilidade da atividade agropecuária devido às intempéries, Turra reforça a necessidade de o produtor investir em sistemas de refrigeração e até mesmo geradores movidos a diesel ou gasolina.



Produção de alimentos: eis a vocação do Vale do Taquari. Modernização das propriedades rurais, diversificação de atividades e o avanço – mesmo lento – das políticas públicas rumo ao selo de qualidade, fazem da região um berço do agronegócio no Estado.

14 ECONOMIA

ÉDERSON KÄFFER/DIVULGAÇÃO

O Vale dos Alimentos começa a ser reconhecido. Modelos de produção, sanidade e gestão servem de exemplo para outras regiões do Rio Grande do Sul

Do Vale para os

R

mercados mundiais

econhecido pela capacidade produtiva, o Vale do Taquari se fortalece pelo sistema cooperativista e associativo e a implantação de

Agronégócio é reponsável por

82% do do valor adicionado dos municípios da região.

novas tecnologias. Nos últimos anos, uma transformação ocorreu no meio rural e o colono virou empreendedor. Em parceria com a mulher e os filhos, busca formas de dar sequência ao negócio herdado dos pais e avós. Estimular a atividade e não permitir que lavouras virem mato é um dos principais desafios de gestores da iniciativa público e privada. A sucessão rural é tema de debate recorrente e, aos poucos, encontra

exemplos bem-sucedidos. Westfália é a principal referência. A múltipla e crescente capacidade das indústrias de alimentos fazem da região um celeiro produtivo. Destacam-se as atividades de leite, suínos, aves e doces. Referência no setor primário, a região também se distingue na industrialização. Sorvete, balas, pirulitos, chocolate e refrigerantes são itens feitos aqui e que ganham o Estado, país e mun-

do. Arroio do Meio tem uma das maiores fábricas de chocolate. Três das cinco principais empresas de sorvetes do estado ficam na região. A grande aposta é o leite. A consolidação do Vale dos Lácteos a partir de projetos inovadores de sanidade e produtividade exige quebra de paradigmas e adaptação cultural. A evolução é gradativa e a seleção dos produtores, automática.


NOVEMBRO/2014

GUSTAVO TOMAZI/ARQUIVO A HORA

Abram as porteiras para os jovens O crescente êxodo de jovens agricultores para os centros urbanos tem provocado um problema grave nos núcleos familiares: a falta de sucessores nas propriedades após a aposentadoria dos pais. As chácaras acabam vendidas a terceiros para se tornar campo extensivo de gado de corte, produção de grãos ou sítios de fim de semana. Para tentar reverter esse cenário, foram criadas políticas públicas, parcerias com cooperativas e instituições de ensino para levar conhecimento, orientação técnica, linhas de crédito para melhorar a infraestrutura, a produtividade e o lucro. O exemplo mais promissor vem de Westfália, onde 65% das 425 propriedades têm a sucessão encaminhada. Deste montante 20% já são administradas pelos filhos. Há 775 talões de produtores registrados, média de 1,8 por estabelecimento. Conforme o vice-prefeito e produtor, Otávio Landmeier, a juventude redescobre o agronegó-

cio e implementa um novo perfil produtivo baseado no conhecimento. “Temos 40% dos nossos jovens formados em técnico Agrícola.” A oferta de crédito e as parcerias estabelecidas com cooperativas ajudam a diversificar, garantem a compra, fornecem orientação técnica e fazem o produtor atingir a qualidade exigida pelo mercado. Desde 2012 foram financiados R$ 18,2 milhões pelo Pronaf, a um juro de 2% ao ano e até dez anos para pagar. O técnico agropecuário da Emater, Marcelo Müller, se reporta à qualidade de vida como diferencial para a permanência. O interior tem 53 quilômetros de estradas pavimentadas, de um total de 87. Mais de 75% das famílias têm acesso à internet, 95% conta com rede de energia trifásica, telefonia móvel e redes de água encanada. Exalta a formação de parcerias para gerar produtividade, qualificar a mão de obra e au-

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Aos poucos, programas regionais estancam o êxodo rural. Westfália é exemplo

mentar os lucros. A orientação direta na propriedade é vista como fator determinante para que os projetos de investimento alcancem êxito. “O diálogo entre pais e filhos também é funda-

mental”, salienta Müller. Em 2009, uma pesquisa apontou a falta de reconhecimento do trabalho executado pelos jovens como principal motivo para que abandonem a propriedade.


16 ECONOMIA

Gerência dividida Após concluir o curso de técnico Agrícola, Eduardo Brune fez um contrato de parceria com o pai, Décio. A divisão tanto de responsabilidades como de lucros possibilitou a continuidade do trabalho. Em uma área de 30 hectares, destes dez cultiváveis, são produzidos 500 litros de leite por dia e 22 mil frangos de corte. Com oferta de crédito e boas condições de pagamento, a família investiu R$ 200 mil na reforma do aviário, compra de um trator e demais equipamentos para facilitar a lida. Mesmo com o aumento da lucratividade, Eduardo reclama da inflexibilidade dos pais. Aos poucos a atuação das cooperativas, da Emater, do Executivo e o conhecimento adquirido pelo filho em cursos técnicos mudam conceitos.

Melhor distribuição de renda na área rural ANDERSON LOPES

Uma pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV) trouxe a Westfália como primeira colocada no ranking nacional de distribuição de renda em 2011. Segundo o estudo, 94,1% das famílias pertenciam às classes econômicas A, B e C e recebiam salários iguais ou superiores a R$ 1,2 mil. Apenas 5,8% viviam nas classes D e E e só três famílias recebiam o Bolsa Família. Na agricultura a renda por integrante ativo varia entre R$ 1,5 mil e R$ 2 mil ao mês, calcula Müller. Para ele, a agricultura é o grande responsável pelo índice alcançado. O setor movimentou R$ 123 milhões em 2013. Há dez anos, esse valor era de apenas R$ 44 milhões. Um crescimento de 179,5%. A produção está alicerçada na criação de suínos, leite e aves. Todos possuem pelo menos duas atividades, destaca Müller. Um dos limitantes é a área. Dos 6.250 hectares, 56% é mata

Em Westfália, conhecimento, diálogo e divisão de lucros garantem sucessão

nativa. As áreas agricultáveis somam 1,8 mil ha e apenas 1,2 mil são mecanizáveis. Todas as propriedades foram mapeadas. “Sabemos o que, onde e a quantidade produzida.”

Em torno de 98% dos produtores são cooperativados. Este modelo é incentivado nas escolas. A disciplina de cooperativismo é ministrada desde a 4ª série.


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RICARDO DE MORAES/ARQUIVO A HORA

Foco na diversificação O casal Adriano e Andrelise Feldmann, de Westfália, desde a infância queria seguir a profissão dos pais agricultores. Ele assumiu a administração da propriedade faz oito anos após a morte do pai. Para quitar as dívidas era preciso inovar e a saída veio pelo conhecimento e com diversificação. Investiu R$ 650 mil em infraestrutura. A criação de frangos duplicou e chegou a 40 mil aves. A produção de leite alcança mil litros diários com 35 vacas. Até o fim do ano, serão aplicados R$ 150 mil na construção de free stall para

confinar os animais. O caminho é controlar custos, planejar, diversificar e buscar conhecimento, diz Adriano. A movimentação financeira mensal totaliza R$ 25 mil. Para ele, o trabalho braçal reduziu com o uso de novas tecnologias. Outro fator determinante para se manter na lavoura é a melhor qualidade de vida. Com acesso à internet, telefone, asfalto, projetos de incentivo, atuação de cooperativas e participação em cursos profissionalizantes o casal transformou a propriedade em modelo para a região.

Técnicos assumem negócios A família Wahlbrink descobriu que o sucesso na atividade depende de uma mudança de atitude. Manter uma planilha de custos atualizada, participar de cursos, buscar orientação técnica e formação viraram uma tarefa necessária para obter boa rentabilidade. Com uma área de 21 hectares, a maior parte coberta por mato e não mecanizável, a saída foi diversificar. Sócios de uma cooperativa, apostam na produção de leite, 300 litros por dia, mantêm creche de suínos, 500 animais e criam frangos de corte, 14 mil cabeças. Segundo Elton, a qualificação foi fundamental para atingir bons índices de produtividade. De acordo com o produtor, gerir corretamente o próprio negócio há muito deixou de ser uma necessidade

para se tornar uma obrigação e assim manter as contas com saldo positivo no fim do mês. A mudança na forma de administrar o negócio garante a sucessão da propriedade. Para manter os filhos na lavoura é aconselhado dividir obrigações e lucros, sugere a mulher Silvane. Isso fez o filho Sandro permanecer na propriedade. Responsável pela gerência da criação de frangos e suínos, busca se habilitar para tornar a atividade cada vez mais rentável. Recém-formado em técnico Agrícola, acentua a diversificação como segredo para manter a saúde financeira no campo. “O colono virou executivo e empreendedor. A lavoura é a empresa. Conhecimento é a palavra-chave para atingir o sucesso.”

Na propriedade dos irmãos Guarda, em Arvorezinha, cultivo de frutas, como a maçã, diversifica a lavoura e aumenta os lucros. A cultura tem sido alternativa para substituir lavouras tradicionais e pouco lucrativas na agricultura familiar.

Em busca de conhecimento O Colégio Teutônia tem cerca de 130 alunos matriculados no curso de Técnico em Agropecuária, com duração de dois anos e mais 720 horas de estágio. As turmas possuem até 40 jovens. Destes, dez retornam à propriedade depois da formação. Os estudantes assistem às aulas teóricas e práticas, estas desenvolvidas na granja cuja área é de 29 hectares. Além da produção de leite, 700 litros por dia e 36 vacas em lactação, são colhidas mil sacas de trigo e três mil sacas de milho e soja. A entidade completa 63 anos de fundação em 2015. Para a engenheira agrônoma e coordenadora do curso de Agro-

negócio na La Salles, de Estrela, Rosemarí Driemeier Kreimeier, a formação na área busca preencher uma lacuna que existia no mercado quanto à necessidade de profissionais mais voltados à gestão. Saber administrar é cada vez mais importante, diz. Segundo ela, pelo fato do agricultor ser visto como empreendedor, é preciso estar preparado para as novas demandas da propriedade. Os alunos do curso são preparados para gerir empreendimentos e formar novos líderes. O curso iniciou em 2010 e tem duração de três anos e meio. Estão matriculados 44 estudantes e só quatro se formaram desde a implantação.


18 ECONOMIA

Cooperativas profissionalizam as atividades no campo ÉDERSON KÄFFER/DIVULGAÇÃO

O Vale do Taquari é um polo cooperativista. Dos 332 mil habitantes, mais de 200 mil estão ligados a uma entidade associativa. Teutônia concentra o maior número de associados do mundo, relativamente à sua população. Ao todo 82% dos habitantes são associados a uma das seis cooperativas instaladas na cidade. Na região, há cerca de dez cooperativas, cuja movimentação financeira anual alcança R$ 4 bilhões, valor maior do que a arrecadação de todos os municípios do Vale juntos. Orientação técnica, conhecimento, crédito e novas tecnologias garantem bons índices de produtividade e abrem mercados em todo planeta. Gilberto Piccinini, presidente da Dália Alimentos, de Encantado, eleita a quinta melhor e maior empresa do Brasil no segmento de suínos e aves pela Revista Exame, destaca como diferencial da região a predominância de descendentes de europeus. Para ele, a atuação desses empreendimentos em todos os elos da cadeia produtiva transformou a gestão, possibilita acesso ao crédito e novas tecnologias que resultam na oferta de produto de alto valor agregado com garantia de compra no mercado mundial. “A divisão de lucros é o diferencial.” Com diálogo e planejamento os filhos assumem a gerência dos negócios. Propriedades, mesmo com pequena extensão territorial, aumentam a produtividade, diversificam e inovam,

Ter orientação técnica, facilidade em créditos e acesso a novas tecnologias são propulsores do desenvolvimento rural.

tornando-se referência em modelos produtivos na agricultura familiar. Para Piccinini, o cooperativismo ajudou a superar barreiras. “Nos unimos. Aliamos conhecimento e tecnologia.” O presidente da Languiru, de Teutônia, Dirceu Bayer, terceira maior empresa processadora de alimentos no ramo agropecuário do Estado, destaca que

o modelo empregado na região alcança índices surpreendentes de produtividade. Para ele, as cooperativas oferecem uma garantia de mercado com remuneração segura, alicerce para o produtor de suínos, aves e leite se manter na atividade. A contratação de quase mil profissionais técnicos na Emater contribuiu para melhorar o trabalho desempenhado direto nas propriedades, segundo o gerente regional de Lajeado, Luiz Henrique Bernardi. Em parceria com as cooperativas, sindicatos e secre-

tarias das Agriculturas, a entidade prioriza o treinamento do produtor nos centros de formação. Apesar do crédito farto, o presidente da Sicredi Vale do Taquari, Adilson Metz, se preocupa com a ausência de projetos voltados para oferecer renda e evitar o endividamento. Lamenta que parte do crédito de R$ 40 bilhões oferecido pelo Plano Safra sejam tomados por impulso e não planejados. Alerta para a regra dos três PPP, preciso, posso e por quê. Só após essa análise é recomendado fazer um investimento.



Sanidade, modelo para o país O projeto de sanidade implantado na Comarca de Arroio do Meio, em 2009, se transformou em modelo estadual. Além das seis cidades do Vale do Taquari (Arroio do Meio, Travesseiro, Capitão, Coqueiro Baixo, Nova Bréscia e Pouso Novo) que desenvolvem ações para erradicar as doenças, outras 13 encaminharam pedido para iniciar os testes. No Estado, 34 municípios demonstraram interesse em fazer parte do Programa Estadual de Sanidade (Procetube). O projeto começou a ser discutido em 2008, quando o produtor André Luiz Gerhardt, 42, de Forqueta Baixa, Arroio do Meio, sacrificou metade do plantel de vacas leiteiras da propriedade. Restaram 17 animais. Com prejuízo de R$ 51 mil e continuidade do negócio ameaçada, procurou apoio dos órgãos de saúde pública, Promotoria e Executivo. Devido a pouca atenção recebida, recorreu à mídia, na época uma rádio de Lajeado, para denunciar a gravidade do problema. “As propriedades vizinhas estavam infectadas. Não adiantava eu fazer os testes. Era uma questão de saúde pública.” Dois anos depois foi lançado o projeto de sanidade para tentar erradicar as doenças de 2,3 mil propriedades da Comarca de Arroio do Meio, formada por seis municípios. Apesar do êxito, Gerhardt reduziu o plantel a 12 animais. Por dia vende 200 litros de leite. Investiu em grãos. Cultiva

GUSTAVO TOMAZI/ARQUIVO A AHORA

20 ECONOMIA

Projeto implantado em Arroio do Meio serve de modelo para sanear rebanho leiteiro do Estado. Oferece ao consumidor um produto com procedência e de boa qualidade.

22 hectares de soja por ciclo, cujo rendimento chega a 900 sacas. Mesmo com a realização de testes a cada quatro meses, ao longo dos seis anos foram sacrificados mais cinco animais. O custo para cada teste é de R$ 12. Por litro de leite saneado recebe um bônus de R$ 0,015. “Precisamos mudar primeiro a consciência, a cultura, pois estamos

lidando com alimento. Se sou produtor, preciso manejar bem todos os processos e zelar pela qualidade da matéria-prima.” Conforme um dos coordenadores do Procetube, Oreno Ardêmio Heineck, enquanto produtores apontam falhas na forma de indenização aos produtores e o valor cobrado pela realização dos testes, municípios demonstram pouco interesse em desenvolver políticas para prevenir e combater a doença nas propriedades. Para Heineck, o saneamento do rebanho é um processo irreversível haja vista a saúde do próprio produtor e por exigência do mer-

cado. A meta é sanear todo estado em oito anos. O investimento é de R$ 120 milhões, conforme levantamento prévio. Para a região, o custo total será de R$ 15,4 milhões. “O leite sem certificação não terá mais mercado em cinco anos.” Destaca o pagamento extra de R$ 0,015 por litro ao produtor pela qualidade do leite. Quanto à indenização por animal sacrificado, o valor chega a R$ 2 mil. Este montante é dividido entre Fundesa, Mapa e município. Observa que com a ampliação da área saneada, aumentará a oferta de matéria-prima para as fábricas e tendo um produto


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Força no PIB estadual Conforme dados do Codevat, o setor agropecuário representa 5,9% do PIB estadual. Em 2011 movimentou R$ 1,2 bilhão. O Vale do Taquari concentra 29,4% da criação de frangos, 15% de suínos e 8,8% da produção de leite. As exportações somaram US$ 426

milhões de dólares. Da população total, 332 mil, 85 mil moram na zona rural. Com as propriedades tendo média de 14 hectares, a produção de grãos é menos expressiva. São cultivados 37 mil hectares de milho, 12,9 mil ha de soja e 1,3 mil ha de trigo.

Produção

Posição no Estado

Vale em números Valor adicionado do agronegócio Indústria

5,9% do PIB – R$ 1,2 bilhão 4,3% - R$ 2,4 bilhões

Serviços

2,72% - R$ 3,9 bilhões

Bovinocultura

1,76% do RS - 248 mil cabeças 29,4% - 38 milhões de aves

Avicultura Suinocultura Produção de leite

15% - 940 mil suínos 8,8% - 359mil litros de leite 106,6 mil vacas em ordenha Produtividade: 9L/animal

diferenciado, conseguirão exportar para mercados internacionais. Para ele a maioria dos municípios do Vale resiste em implantar o projeto de sanidade porque o leite não saneado continua sendo aceito, além da lei ser falha. O presidente da Associação dos Municípios do Vale do Taquari (Amvat) e prefeito de Arroio do Meio, Sidinei Eckert, evidencia a fal-

ta de recursos como fator limitante para que mais municípios implantem o programa de sanidade. Em Arroio do Meio, o investimento no programa desde 2009 soma R$ 1 milhão. “É um trabalho conjunto entre produtor, indústria, governo e Executivo.” Lamenta as falhas na fiscalização do processo produtivo, desde a propriedade até a indústria.

São consumidos

População total

1.030.582

332.249 - 3% do RS

de quilowatts de energia por 89,2 mil clientes

Na zona rural moram 85 mil pessoas Expectativa de vida chega a 75 anos

4,8 mil km² de área total

Exportações médias

426 milhões de dólares ao ano fonte Codevat


CACO KONZEN/ARQUIVO A AHORA

Diversificação produtiva afasta crises A diversificação da economia é a principal marca regional. A maioria se relaciona com produção e industrialização de alimentos. As cooperativas Languiru e Dália Alimentos são as maiores do Vale e atuam no segmento de suínos, leite, aves, rede de supermercados, rações e agrocenters (imple-

mentos e insumos agrícolas). Juntas têm mais de dez mil associados e envolvem cerca de 70 mil pessoas. Possuem produtores em mais de cem municípios do Estado. São produzidos mais de 500 itens nas plantas industriais que são distribuídos para mais de 20 estados do Brasil e exportados para

em torno de 40 países no exterior. O faturamento em 2014 deve alcançar R$ 2 bilhões. Por dia produzem 3 mil toneladas entre alimentação humana e animal. Nos últimos anos investiram mais de R$ 500 milhões em projetos de infraestrutura e ampliação dos parques fabris.

Variedade produtiva dá segurança e fortalece a cadeia de alimentos na região. Inovação tecnológica sucita criação de novos produtos.

A produção de sorvetes, chocolates, balas e bebidas também se destaca no Vale do Taquari, a exemplo da fabricação de refrigerantes. A Bebidas Fruki, que completa 90 anos neste ano, emprega mais de 950 funcionários, em cinco municípios do estado. A empresa projeta nova fábrica de sucos, chás, isotô-


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nicos, vitaminas e bebidas a base de soja. O investimento tem um valor estimado em R$ 60 milhões, disputado por 50 cidades gaúchas. Frente ao crescimento da indústria, levantamento sobre as maiores empresas da região sul do país, feita pela PwC, especializada em auditoria e assessoramento tributário, e pela revista Amanhã, colocou a Fruki na 346ª posição. Hoje, com sete linhas de produção, a capacidade máxima supera 380 milhões de litros. Além da Matriz e da fábrica em Lajeado, a empresa conta com centros de distribuição em Canoas, Santo Ângelo, Farroupilha e Pelotas. Outro referencial é a Vonpar Alimentos instalada em Arroio do Meio. Especializada na produção de balas, pirulitos e chocolates. Um complexo de 30 mil metros quadrados e mais de 500 pessoas empregadas, projeta ampliar o faturamento em 20% até 2015 e dobrar em

cinco anos. Na nova fábrica de chocolates são seis linhas de produção: duas para fabricação de bombons, duas para chocolates em barras e duas para confeitos drageados. O investimento supera os R$ 160 milhões. A fabricação de sorvetes favorece a economia regional. Das mais de 300 empresas do setor, as três maiores estão instaladas na região. Tendo o leite como principal ingrediente, o setor ajuda a consolidar o “Vale dos Lácteos”. Estatísticas da Associação Brasileira das Indústrias e do Setor de Sorvetes (Abis), desde 2003, mostram a ascendência da quantidade de sorvete ingerida por cada brasileiro. Em 2003, era de 3,83 litros; no ano passado, chegou à marca de 6,19 litros – o que representa um crescimento de 61,6% no período. O consumo total do alimento, em 2013, atingiu 1,244 bilhão de litros.

Balas Pirulitos Chocolates Sorvetes Erva-mate Leite e derivados Suínos Frangos Refrigerante

Água Mineral Hortifrutigranjeiros Nozes Aipim Ovos Embutidos Gado de corte Ovelhas Cabritos

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RODRIGO MARTINI

24 TURISMO

A falta de planejamento e o despreparo no aproveitamento das riquezas do Vale do Taquari diminuem a capacidade turística. Mesmo assim, o número de visitantes aumenta a cada ano. Aposta de 2015 será a consolidação de rota férrea, de Estrela e Guaporé.

Vale desperta para o setor,

mas avanço é lento O

turismo é o setor terciário em maior ascensão no Brasil. Os passeios se intensificam e resultam em oportunidade de negócios. O Vale do Taquari não foge à regra. Nos últimos quatro anos, o número de visitantes triplicou. Em 2013, receberam mais de 103 mil turistas. E existe tendência a aumentar numa razão direta ao aumento da expectativa de vida. Esse avanço demanda investimentos do setor público e privado, sem os quais o turismo não se sustenta. Locais para hospedagem, gastronomia e compras são fundamentais para as cidades se tornarem referência turística. A falta dessa estruturas reduz em muito o aproveitamento da beleza escondida entre vales e montanhas. Um reflexo é o tempo médio de permanência do turista na região: um dia. Por

não conseguir manter os visitantes por mais tempo, as nove rotas existentes perdem força. Na tentativa de impulsionar o turismo, os municípios se integram. Os roteiros dão espaço a trilhas e ao passeio de trem. Previsto para 2015, o projeto é a novidade mais recente na área. O trajeto de 63 quilômetros interligará Estrela a Guaporé, propondo a mobilização das cidades pelo percurso. O atrativo também fortalece as políticas públicas incentivadas pela Associação dos Municípios de Turismo da Região dos Vales (Amturvales), como a qualificação. Em dois anos, a entidade soma 18 cursos gratuitos, responsáveis por preparar mais de 1,5 mil pessoas para os diferentes segmentos do setor. Nessa busca por referência, a falta de um planejamento mais adequado afigura como obstáculo. Os gestores precisam pro-

porcionar um ambiente propício à transformação. Enquanto a região resiste à mudança, outras partes do estado mostram que é possível tornar o turismo uma atividade rentável. Como modelo mais próximo, aparece a Serra Gaúcha. Gramado, em especial, serve de inspiração para a maior parte das cidades brasileiras. Com uma população de 34 mil habitantes, dá o exemplo de como fazer do turismo oportunidade de negócio e sinônimo de melhor qualidade de vida.

Formado por vales e montanhas, o Vale do Taquari se destaca pelo turismo de aventura. O problema tem sido a permanência média do turista na região: um dia. Infraestrutura precária e falta de orientação sobre os pontos turísticos resultam empecilhos.

Trilhos de trêm oportunizam nova atração turística na região Para seguir o exemplo de cidades como Gramado, na tentativa de atrair mais turistas e se valer dos pontos turísticos existentes para a maior geração de renda, a região do Vale do Taquari deposita a maior parte das expectativas na chegada do trem de passeio. “Ele será o ve-

Em 2013, mais

103 mil turistas visitaram a região

tor principal para todos os demais roteiros”, projeta o presidente da Associação dos Municípios de Turismo da Região dos Vales (Amturvales), Vanildo Roman. A proposta depende apenas de uma aprovação definitiva da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). O percurso somará 63 quilômetros entre Estrela e Guaporé. Além destes, outros cinco municípios estão contemplados: Colinas, Roca Sales, Muçum, Vespasiano Corrêa e Guaporé. O trem turístico, com ar-condicionado e janelas panorâmicas, terá capacidade para transportar até 56 passagei-

ros por viagem. Roman estima o início dos passeios para meados de 2015. Até lá, se fazem necessárias melhorias. A estruturação da rota e a exploração da ferrovia ainda não estão bem resolvidas. O desafio aparente está em ampliar e preparar os demais atrativos, assim como qualificar as pessoas integradas ao setor. A Amturvales contratou um interlocutor para negociar com os empresários e investidores. Marcelo Adriano realizou um diagnóstico prévio sobre as carências e potenciais da região. O levantamento aponta a natureza geográfica do

trajeto como principal diferencial, integrado às características da cultura germânica e italiana. Porém há necessidade de mais esforço do poder público e privado. Para os próximos meses, Adriano projeta visitas individuais aos municípios integrados pela rota. A partir de conversas com empresários locais, avaliará as condições de cada atrativo, a fim de orientar modificações necessárias para a inclusão no roteiro. Com o mapeamento destes pontos, o grupo criará um plano integrado capaz de multiplicar as ofertas de turismo.





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Um passo à frente Com o crescente estímulo ao turismo no país, as cidades despertam para formas variadas de atrair turistas. Algumas já projetam atrativos para se incluir à rota do trem de passeio, como é o caso de Colinas. Há cerca de três anos, o local deixou de ser apenas a Cidade Jardim, conhecida assim devido aos concursos anuais de jardinagem, passando a receber visitantes durante o ano todo. Em épocas como a Páscoa, chegam ao município uma leva de turistas 30 vezes superior ao número de habitantes. Resultado de quase duas décadas de mobilização. Os enfeites espalhados pelos mais diversos pontos do município, atraem pessoas de todo o estado. A última novidade é o Caminho das Lendas. O município aproveita o período próximo ao Dia das Crianças para remontar histórias

infantis. Os personagens invadem os espaços públicos, despertando a curiosidade dos turistas. A partir dessa maior procura, as características da cidade também mudam. Comerciantes reduzem horários do expediente semanal de seus estabelecimentos para abrirem aos sábados e domingos. Aos poucos, começam a perceber que é possível lucrar com o turismo. O prefeito Irineu Horst, 56, acredita no empenho da comunidade em transformar o setor na principal fonte econômica – hoje dependente da agricultura. “Um dia viveremos do turismo”, almeja. Porém a infraestrutura permanece carente. Visitantes apontam a falta de produtos e inexistência de hotéis ou pousadas. Para mudar isso, Horst propõe a criação de atrativos durante todo o ano com constantes inovações.

Para tornar o turismo uma atividade econômica, Colinas investe na montagem de atrativos durante todo o ano. A ornamentação das ruas e praças, em épocas como a Páscoa e o Natal, se tornou marca na cidade com pouco mais de dois mil habitantes. O município integra a trilha do trem e pretende desenvolver novas atrações a partir da efetivação do passeio entre Estrela e Guaporé, previsto para começar no próximo ano.


NOVEMBRO/2014 ANDERSON LOPES

Comunidade acredita no turismo Aos poucos, grupos se reúnem para oferecer produtos locais e atender ao turista. É o caso da Casa do Artesão de Colinas, mantida pelo trabalho de 11 voluntários. Artesãos e agricultores dividem o mesmo espaço, todos os dias. Há exposição de trabalhos manuais e café colonial, preparado a partir de agendamento. “Vimos no turismo uma oportunidade de mostrar nosso trabalho e aumentar a renda”, diz a agricultora Cristina Horst. Há seis anos ela aproveita a local para vender pães, cucas e biscoitos caseiros. Em média, saem mais de 50 unidades por semana. “Com o aumento de visitantes, a venda triplicou e me dá chance

de expandir.” O turismo local atrai também investidores de fora, como o viticultor Luiz Antônio Bianchi. Morador de Bento Gonçalves, há quatro anos comprou um terreno na Linha Roncador, o qual visita toda a semana. Já soma cinco hectares de frutas plantadas, na maioria parreiras. A mudança, em busca de um clima ideal à produção, favorece a safra antecipada. Além do aumento nos lucros, com a expansão do turismo regional, Bianchi planeja a visitação ao espaço e a oferta de mais produtos feitos pelos próprios moradores. Para o próximo ano, quer criar uma agroindústria.

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30 TURISMO

Roteiros precisam de fortalecimento e suporte No Vale, há nove roteiros estruturados, dois deles têm mais de dez anos. Possuem os mais variados atrativos, como cascatas, mirantes, trilhas ecológicas

e pontos históricos. Porém à medida que surgem novas rotas, como o Caminhos do Forqueta, de Arroio do Meio, alguns empreendedores têm desistido das

mais antigas. Algumas atrações, como o sapato de pau, em Westfália, estão se perdendo. Por vezes, as famílias não conseguem manter os RODRIGO MARTINI

espaços, devido ao baixo retorno financeiro. Outro caso é o Tour Lajeado, inativo há dois anos. O município alega falta de recursos para manter o serviço. Gastos com guias, aluguel de veículo de passeio e motorista inviabilizariam o reinício da atividade. Para mudar o cenário, Roman aposta no turismo receptivo. “Temos o cuidado de trabalhar o setor enquanto região (sic).” A partir do slogan O Vale do Acolhimento, destaca a integração entre hotelaria, gastronomia e atrativos. Desde maio, ocorre a venda de pacotes turísticos do Vale em todo o país, promovendo as diferentes atrações dos municípios. A partir desta estrutura integrada, acredita no melhor preparo dos roteiros. Esse desafio, segundo ele, também implica qualificação das pessoas.

O Rio Taquari proporciona diversos atrativos para o turismo de aventura. Mesmo assim, tem sido pouco explorado para despertar visitantes. Aos poucos, ressurgem os passeios de caiaque e lancha.

Divulgação ganha apoio O jornal A Hora traz sua contribuição à divulgação dos atrativos do Vale e com isso espera estimular os mais variados setores a investirem no turismo. O Guia VEM - Vales e Montanhas retrata aspectos turísticos, gastronômicos, geográficos, econômicos e históricos de 56 cidades dos vales do Taquari, do Rio Pardo, Botucaraí e parte da Serra Gaúcha. O material mostra as riquezas naturais e culturais das cidades e traz uma análise de 410 restaurantes, 80 hotéis

e pousadas. Ao mesmo tempo, oferece a oportunidade da região se autoconhecer. Cria subsídios para a valorização do turismo e cultura regional, ao mostrar os potenciais e expor a falta de infraestrutura como principal entrave. Os mais de 70 mil exemplares circulam por todo o país e até no exterior. Moradores do Vale levaram o guia para eventos como o Festival du Rio Grande do Sul, em Paris, mostrando que a busca por turistas não tem fronteiras.

Investimentos em qualificação De 2013 a 2014, a Amturvales treinou 748 pessoas dos mais variados segmentos turísticos da região. A procura pelos cursos ficou abaixo do esperado. Apesar de cinco deles serem gratuitos e destinados aos gestores, hoteleiros, garçons, taxistas, frentistas e empreendedores em geral. Foram investidos mais de R$ 150 mil, com apoio de recursos da Consulta Popular. Segundo a turismóloga Lizeli Bergamaschi, os professores de cada curso prestam consultoria aos

participantes, acompanhando as adaptações. Até o fim de 2015, estão previstos mais 13 cursos gratuitos. Todos custeados pela Consulta Popular de 2011, no valor de pouco mais de R$ 500 mil. O recurso garante vaga para mais de 800 alunos, divididos em 33 turmas. Entre os temas abordados, aparece o serviço de alimentação, hospedagem, gestão em turismo, transporte, sustentabilidade ambiental no setor, curso de línguas e atendimento.


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Perfil do turista que vista o Vale Pessoas de 45 a 90 anos aparecem como principais visitantes do Vale do Taquari no último ano. Na sequência, vem os apaixonados pelo turismo rural e de aventura. De acordo com a Amturvales, a maioria dos turistas ainda provém da região e estado. Depois aparecem turistas de Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro. E uma parcela menor corresponde às pessoas de outros países, como Alemanha, Itália e Estados Unidos. Faltam agências receptivas para vender os atrativos. A principal operadora de viagens da

América Latina, CVC, lançou em março o Vale do Taquari no seu roteiro. Foram veinculados três hotéis, seis restaurantes e 16 pontos turísticos. Nove cidades – Lajeado, Estrela, Colinas, Imigrante, Teutônia, Guaporé, Anta Gorda, Ilópolis e Encantado – passaram a integrar a rota. A notícia foi comemorada por empresários e municípios. Porém até então não iniciou a venda. De acordo com Roman, a operadora negocia a estruturação do pacote com os empreendedores. Sem um acordo, não sai a divulgação.

Visitantes ficam em média apenas um dia em passeio pela região

Estrutura oferecida 27 Guias de turismo 31 Agências de viagens e turismo 37 Condutores locais 500 Taxistas

Hospedagem:

12 Pousadas 44 Hotéis 1.340 Apartamentos 2.777 Leitos Fonte: Amturvales


32 TURISMO

Inspiração vem de Gramado: a cidade gaúcha que aprendeu a transformar o turismo em negócio Com 101 anos de história, Gramado serve de exemplo para a maior parte das cidades brasileiras. O município recebe mais de cinco milhões de visitantes ao ano. O número garante a posição entre os três destinos mais procurados do país. Colonizado por alemães e italianos, a exemplo do Vale do Taquari, o município se formou a partir de 1914. Com a vinda do trem a Canela, os moradores deixaram as terras mais distantes e se instalaram nas redondezas da ferrovia. A partir da construção de pequenas pensões, se criaram espaços para venda de artesana-

to. Aos poucos, produtos como as bengalas de vime, móveis escuros e o chocolate trouxeram identificação a Gramado. Em uma época, na qual 73% da economia provinha da indústria calçadista, os gestores resolveram inovar e diversificar as atividades econômicas. A predominância das temperaturas baixas e a concorrência com o litoral motivaram as atrações no inverno. O turismo, que era amador, passou a ser tratado de forma profissional a partir da década de 80. Passados mais de 30 anos, são 141 hospedarias, 9,6 mil leitos,

1,1 mil estabelecimentos comerciais e 112 restaurantes capazes de atender dez mil pessoas de forma simultânea. O resultado do investimento está na economia: mais de 90% da arrecadação provém do turismo. O setor não só aumenta a renda das famílias, como estimula o empreendedorismo regional e a geração de empregos. Todos os dias, mais de sete mil pessoas de fora atuam em estabelecimentos locais. Investidores interessados em ampliar seus negócios buscam Gramado e agências vendem o destino em todos os lugares do mundo.

Gramadense aponta o caminho Para entender o segredo do sucesso e crescimento contínuo, o ex-prefeito Pedro Henrique Bertolucci, 69, revela técnicas de gestão e decisões tomadas durante os 18 anos em que esteve à frente do governo municipal de Gramado. Graduado em Administração, há seis anos realiza palestras por todo o país, levando dicas de como potencializar o turismo. Nesta entrevista, Bertolucci mostra como é possível transformar o setor em oportunidade de negócio e dá sugestões aos gestores da região.

Jornal A Hora: O que foi determinante para o fortalecimento do projeto turístico de Gramado? Como se quebrou o paradigma de que turismo não dá dinheiro? Pedro H. Bertolucci: O determinante foi que o pessoal pegou o gosto por ganhar dinheiro, entendeu que turismo é uma atividade econômica. Isso porque a administração municipal fez o papel dela, de fomentar os investimentos e mostrar o caminho. As pessoas precisam saber que quem vai ganhar dinheiro não é a administração municipal, é o empreendedor. Em Gramado, começamos com turismo de automóvel, depois turismo de grupo e hoje de negócios e eventos. Com as dife-

rentes atrações conseguimos quebrar um pouco a curva da sazonalidade, atraindo visitantes durante o ano todo. Esse é um dos nossos segredos. AH – Se o poder público deve fomentar o turismo, de que forma ele pode fazer isso? Bertolucci: Ajudando a fazer a promoção da cidade, com a criação de eventos e participação em feiras. A administração municipal tem que proporcionar o espaço para o empreendedor. Mas ela não fará tudo, tem que haver uma parceria, o empresário deve ser o investidor. Nunca damos incentivo (recursos financeiros) para construir hotel ou restaurante, mas estimulamos os empreendedores

a ampliar seus negócios. Outro fator importante é a sensibilização. Desde 1972, turismo integra o currículo escolar, a mobilização pelo setor começa cedo. Temos também um Plano Diretor rígido, implantando medidas de longo prazo com o auxílio da comunidade. Os próprios moradores fazem o papel de fiscais, ao cobrarem uns dos outros. Qualquer mudança no Plano implica decisão de um conselho, formado por entidades. AH – Isso significa que o trabalho ocorre de forma coletiva e contínua. Porém, muitas vezes, vemos que a troca de gestão implica na mudança dos projetos seguidos. Como foi possível

“Desde 1972, turismo integra o currículo escolar e a mobilização pelo setor começa cedo. Temos também um Plano Diretor rígido, implantando medidas a longo prazo com o auxílio da comunidade. Os próprios moradores fazem o papel de fiscais, ao cobrarem uns dos outros. Qualquer mudança no Plano implica decisão de um conselho, formado por entidades.”

trabalhar turismo de forma integrada pelas diferentes administrações municipais? Bertolucci: Se teve muita rivalidade política no início. Conseguimos mudar parte disso a partir da década de 80. Assumi o governo por 18 anos e, mesmo com o período intercalado com outro partido, foi possível seguir a mesma linha de projetos na área. Parte do que tinha se manteve, mesmo que em menor proporção. A partir do momento que o setor passou a gerar lucro, crescimento econômico, não teve mais como retroceder. Hoje, independentemente de governo, não há mais força para parar o turismo. O setor traz a riqueza, a valorização da cidade.


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RENATA AGOSTINI

Porque a cópia não funciona em lugar nenhum. AH – Esse diferencial precisa, necessariamente, estar ligado às origens ou pode ser criado? Bertolucci: Não precisa estar ligado às origens, mas, evidentemente que a base cultural das pessoas ajuda. Cidades como Lajeado, por exemplo, que têm uma tradição germânica forte trazem consigo alguns pontos históricos importantes, como a gastronomia. Porém, é preciso mais. Uma das primeiras coisas que fizemos foi implantar bons banheiros públicos nos pontos turísticos. Criamos uma infraestrutura, melhores acessos e espalhamos canteiros de flores pelas ruas.

AH - Na sua opinião, qual o primeiro passo para uma região se preparar para o turismo? Qual a visão que os gestores devem ter do ramo? Bertolucci: O primeiro passo para desenvolver o turismo é a vontade política do gestor. De outra forma até pode acontecer, mas vai demorar. O município tem que acreditar. Precisa vender isso para fora. Nós saíamos por aí levando nosso café colonial e bandas, mostrando nossa cultura às pessoas de todo país. Trazíamos os empresários para cá, para conhecerem. Foi a partir disso e dos eventos que criamos nome, sustentação. Neste contexto, os gestores precisam ver o turismo como sinônimo de mais qualidade de vida. O governo tem que ter a capacidade de associar que o que é bom para o turista também é bom para o morador. Todos usufruem dos mesmos espaços, urbanos ou rurais.

É preciso ter ciência de que ninguém vai a lugar nenhum se não tiver um bom motivo para ir para lá.”

AH – A partir dessa vontade política, como tornar possível a geração de negócios e a lucratividade pelo turismo? Bertolucci: A partir de um trabalho comunitário, de inovação constante. As pessoas precisam acreditar e investir. Sem o empreendedorismo o turismo não funciona. Não se pode ficar na zona de conforto e, nisso, Gramado nunca ficou. É preciso criar coisas novas sempre. Isso requer em qualificação e, muitas vezes, só falar não adianta, é preciso mostrar. Buscamos conhecimento fora. Levamos grupos de trabalho para conhecer os lugares, ver como funcionam as coisas fora daqui. O Natal Luz, por exemplo, teve inspiração na Letônia – conhecida como Terra do Papai Noel. Técnicas e tecnologias foram aprendidas com a Disney. A Rua Coberta teve inspiração na Espanha. E, o mais importante, nada disso foi copiado.

AH – Quais são as dicas para o Vale do Taquari atrair mais turistas? Como a região pode se destacar entre tantos pontos turísticos oferecidos pelo estado e país? Bertolucci: Cada cidade tem sua particularidade. No caso da região, elas se completam. O Vale tem a estrutura básica pronta. Tem história, tem cultura, tem gastronomia boa. Não tem que, obrigatoriamente, começar com um hotel cinco estrelas. Precisa potencializar, capacitar as pessoas locais e, se preciso, buscar gente de fora. Copiar do outro não adianta, em um determinado momento bate no teto. Se não for buscar conhecimento fora, fica batendo na mesma tecla. A cada dia tem que ter uma coisa nova, um detalhe novo. É preciso ter ciência de que ninguém vai a lugar nenhum se não tiver um bom motivo para ir para lá. É necessário criar algo diferente. Mesmo assim, nada funciona se não tiver o tripé: hotelaria, gastronomia e compras. Sem isso não se faz turismo em lugar nenhum.


O imediatismo leva governos a negligenciar prioridade de 50 anos. A falta de investimentos em saneamento básico mantém insignificantes índices de tratamento de esgoto na região. Lixões, redes de água precárias ou inexistentes e casas ainda sem banheiros dimensionam o tamanho do caminho a ser percorrido nesta área.

34 SANEAMENTO BÁSICO

Solução distante

ANDERSON LOPES

Arroios e córregos se transformam em condutores de esgoto. Nas cidades maiores, como Encantado, os dejetos correm por riacho no centro da cidade

A

Política Nacional de Saneamento Básico remete gestores públicos a um dilema: atender as exigências federais e investir na área ou priorizar demandas do eleitorado. Tal indagação retarda a execução de projetos importantes para a saúde pública há décadas, em especial, aqueles ligados à destinação correta dos resíduos sólidos e a construção de redes de esgoto doméstico.

No Vale do Taquari,

3,18% das moradias sequer têm banheiro.

A demanda era perceptível pelo poder público ainda entre as décadas de 60 e 70. Neste período, surgiam os primeiros loteamentos planejados no Vale do Taquari. A prioridade recaía sobre a oferta de água encanada, energia elétrica e pavimentação de ruas. Esses eram os principais anseios da sociedade. Projetos capazes de recolher a produção de dejetos dessas moradias, a água suja, ficaram em segundo plano. O avanço na área seguiu pífio durante as duas décadas seguintes, 80 e 90. A grande mudança ocorreu a partir da virada do milênio. Com a Lei do Saneamento, de 2007, os papéis de cada órgão foram estabelecidos. Até então, quase não havia planos no Brasil. Prova disso, a maciça maioria dos contratos arquitetados com a Cor-

san eram exclusivos ao tratamento de água. Das 325 cidades atendidas pela estatal, 43 tinham contrato para tratamento de esgoto. A norma prevê o estabelecimento de diretrizes por no mínimo duas décadas e estratégias para universalizar o serviço. Desde então, terceirizados começam a visitar os municípios, oferecendo alternativas. Em certas vezes fantasiosas, com promessas de resolver os quase 50 anos de defasagem em apenas cinco anos. De acordo com especialistas, o momento para resolver o problema que se arrasta por gerações é singular. Há dinheiro disponível por parte da União. Os gestores precisam planejar de forma criteriosa, pensando em como estará o município nas próximas décadas. Antes de abrir um loteamento, por

exemplo, devem resolver as carências existentes. O grande gargalo, no entanto, está no custo: investimentos em saneamento custam milhares de reais, se não milhões. Mas a tarefa ameaça causar ônus político e uma série de reclamações por parte da sociedade. Exemplo disso ocorre em Lajeado, com as obras desenvolvidas pela Corsan. Ruas e calçadas são quebradas para construir canalizações que interliguem residências a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE). A morosidade dos gestores em investir na infraestrutura de saneamento é o principal agravante. Se o serviço fosse realizado antes da expansão urbana – que inclui moradias, empresas e pavimentações – custos e transtornos seriam menores.



36 SANEAMENTO BÁSICO

Obra atrasada A Corsan investe quase R$ 4,5 milhões em 10,5 quilômetros de redes coletoras nos bairros Moinhos e Florestal, em Lajeado. O sistema será interligado a ETE Cohab Moinhos, na Av. Castelo Branco. O serviço iniciado em novembro de 2012 beneficia cerca de 4,5 mil moradores. A nova rede busca ampliar de 0,9% para 7% a abrangência de moradias. A obra deveria estar pronta em abril de 2013, mas ficou para 2015. Um ano e quase sete meses depois, a superintendência regional titubeia em definir uma data para o fim dos serviços. O atraso nos serviços ocorreu por várias razões, entre elas, a falta de pagamentos por parte da Corsan, de mão de obra qualificada das empresas terceirizadas e pouca fisca-

lização da companhia em alguns trechos. Com 70% dos serviços concluídos, após dois anos do início do empreendimento, a estatal ainda precisa finalizar cerca de três mil metros de tubulações. O presidente da estatal havia anunciado a construção de uma nova Estação de Tratamento no bairro Alto do Parque, em abril de 2012. Mas ficou na promessa, sequer há projeto. Enquanto projetos e obras demoram, a estação do bairro Moinhos permanece ociosa. Com capacidade para movimentar oito litros por segundo, trata apenas um litro de esgoto por segundo. São 295 economias interligadas na estrutura, cuja capacidade prevê o tratamento dos efluentes domésticos de mais de duas mil moradias.

Reclamações se multiplicam A falta de qualidade do serviço executado pela Corsan, em Lajeado, somada aos seguidos atrasos, gera reclamações por parte da comunidade. Em março deste ano, moradores da rua Sete de Setembro ameaçaram bloquear a via até que a estatal garantisse uma solução para os buracos no asfalto. Por mais de uma vez, o secretário de Obras da cidade, Adi Cerutti, se mostrou impaciente com os trabalhos. Argumenta que nenhuma rua foi entregue com a mesma qualidade em que estava antes das obras da Corsan. Segundo ele, há um acordo pelo qual a Corsan se compromete a avisar o Executivo sempre que os serviços forem finalizados em determinadas vias. Até o momento, nenhum aviso foi emitido pela estatal. Por quase duas semanas, a moradora do bairro Moinhos

da Água, Eveline de Amaral Oliveira, 37, precisou entrar em casa por meio de um acesso improvisado. Enquanto isso, os operários retiraram os paralelepípedos para a colocação dos canos. Para ela, o pior transtorno é a sujeira. A terra retirada das valetas invadiu calçadas e pátios. No entanto, Eveline apoia a medida. Acredita que, apesar de tardia, a instalação da rede contribui para a saúde pública. De acordo com ela, muitas pessoas têm o costume de ligar as fossas na rede pluvial, provocando assim, mau cheiro em determinados dias. A moradora critica a morosidade do poder público em resolver o problema. Ressalta que antigos gestores deveriam ter se preocupado com a situação. Agora, no seu ponto de vista, dinheiro é jogado fora para reconstruir calçadas e ruas.



38 SANEAMENTO BÁSICO

Cidades pecam ao ignorar regras de saneamento Existem dois sistemas de coleta de esgoto. As redes devem ser construídas uma distante da outra. A primeira, a pluvial, é destinada para o escoamento da água proveniente da chuva, considerada limpa. A outra é chamada de cloacal e recolhe o material de tanques de roupa, pias, banheiros e vasos sanitários. O projeto deve ser elaborado com

critério. Os municípios não podem pensar em economia, do contrário, as redes logo não suportarão mais o escoamento e em poucos anos será preciso refazer o serviço. Especialistas aconselham gestores de pequenos municípios a começar logo a implantação das redes e construção de ETEs. Quanto maior a demora, mais alto será o investimento.

Nas cidades pequenas, os gastos, por enquanto, tem sido inferiores em função de haver menos moradias, calçadas e ruas pavimentadas. Se hoje Lajeado paga caro pelo serviço foi pela imprevisão de antigos prefeitos. As redes de saneamento existentes na região funcionam, na maioria dos casos, por meio de sistemas ANDERSON LOPES

mais simplificados nas residências, como a fossa filtro ou sumidouro. Esse tipo de esgoto muitas vezes é interligado com as canalizações pluviais, indo direto para rios e arroios. Deste modo cria-se um problema de saúde pública, propenso a vetores e doenças, sem falar nos problemas que causa à fauna e flora. Levantamento do Comitê da Bacia Hidrográfica Taquari/Antas analisou a qualidade da água e confrontou os dados com o interesse de uso da população. Os dados auxiliaram na definição do tipo de interferência para alcançar as metas de qualidade no decorrer de duas décadas. Das 32 sub-bacias do Taquari Antas, em 17 foram definidas a qualidade de classe 2, destinada para abastecimento doméstico, proteção das comunidades aquáticas, recreação, irrigação de hortaliças e produção de organismos aquáticos. Para tanto, será necessário reduzir a concentração de fósforo em 97%, como é o caso dos arroios Sampaio e Boa Vista, a porcentagem de Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) em até 77% e de coliformes, em 90%.

Em Lajeado, instalação da rede de esgoto está 19 meses atrasada e falta 30% para conclusão do serviço. Obras de encanamento provoca transtornos e estraga ruas e pavimentos.

G8 monta plano integrado para destinação dos resíduos Prefeitos ligados ao Consórcio Intermunicipal para Assuntos Estratégicos (Cipae-G8) planejam a construção de um centro de triagem e compostagem de resíduos sólidos dos oito municípios. Fazem parte do grupo Canudos do Vale, Marques de Souza, Santa Clara do Sul, Sério, Progresso, Boqueirão do Leão, Cruzeiro do Sul e Forquetinha. A estrutura será montada em uma área de quase 12 hectares em Campo Branco, na área rural de Progresso. As terras foram cedidas pelo governo ao G8 no fim de outubro, com convênio válido por duas décadas. Edital para licitar o serviço deve ser lançado em fevereiro. Será montada equipe com 22 pro-

fissionais: gerente, auxiliar administrativo, vigia, contador, técnico, oito coletores, quatro catadores e cinco motoristas. A proposta é desenvolvida por meio do Plano Nacional de Resíduos Sólidos, exigido por legislação federal. Para isso, a Fundação Nacional da Saúde (Funasa) destinou pouco mais de R$ 5 milhões ao grupo, dinheiro já empenhado. A ação compreende o recolhimento do lixo nos municípios do consórcio, hoje feita de forma individual. Em cada cidade, haverá ainda um ponto de entrega voluntária, destinado aos equipamentos não recolhidos das lixeiras, como sofás, lâmpadas, eletrodomésticos ou pilhas.

Todos os resíduos serão levados até Progresso e separados. No local, haverá balanças para pesar a quantidade de materiais enviados por cada cidade. Os recicláveis serão vendidos e o recurso convertido para baratear o sistema. “Reduziremos os custos com deslocamento, sem falar no dinheiro que entrará da reciclagem”, aponta o prefeito de Progresso, Edegar Cerbaro. Aqueles considerados descartáveis, serão mandados para processamento em Minas do Leão ou Candiota. O envio deve ocorrer de semana em semana. Conforme diagnóstico da Lógica Gestão Ambiental, os oito municípios produzem 50 toneladas de lixo por ano.

Com o plano o consórcio pretende, dentro de cinco anos, reduzir para dez toneladas anuais. Segundo previsto pelo Plano, a equipe de recolhimento dos resíduos terá à disposição cinco caminhões coletores para percorrer os oito municípios. Para facilitar o acesso da população à entrega, o consórcio prevê a instalação de uma lixeira a cada quilômetro na zona rural. Para o centro, haverá uma a cada cem metros. A coleta convencional ocorrerá duas vezes por semana na área urbana. No interior, uma vez. Quanto ao lixo seletivo, as equipes irão uma vez por semana nos municípios, tanto no centro como no perímetro rural.




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Cada município precisa elaborar projeto específico Em paralelo, os governos desenvolvem o Plano de Saneamento Básico (PSB), o qual deve ser entregue à Funasa até dezembro de 2015. A previsão é concluí-lo em fevereiro. Para isso, o consórcio recebeu R$ 550 mil da entidade, valor destinado para a confecção de oito planos. No começo de outubro, foi concluído o terceiro dos 11 “produtos” estipulados pela Fundação. A etapa consiste em audiências públicas

nos municípios. As próximas preveem, entre outras especificações, plano prognóstico, com a indicação de metas, ações, programas, sistemas de controle, cronogramas e indicadores de desempenho. Até então, relatório apontou 39 amostras de água impróprias para consumo em 126 poços artesianos e 23 vertentes da região. A situação ocorre nos poços sem proteção sanitária, com livre acesso de animais em seu entorno. Com

as chuvas, os dejetos acabam se infiltrando na terra até alcançar o lençol freático. Também decorrem de infiltrações nas paredes dos poços ou da proximidade com fossas. Conforme o diagnóstico, nenhum dos oito municípios tem sistema integrado de coleta e tratamento dos esgotos domésticos. Em seis foram relatados casos de esgoto lançado em redes de canalização pluvial, em córregos ou mesmo em via pública. Apenas

RODRIGO MARTINI

Prazo acaba. Lixões continuam Encerrou no começo de agosto o prazo para que municípios brasileiros criassem uma estrutura para a destinação adequada de lixo – como aterro sanitário com manta impermeável para evitar a contaminação do solo. Até então, 60% das cidades descumpriram a exigência federal. Sob alegações de dificuldades financeiras ou técnicas, mais de 3,3 mil prefeitos apostaram na ampliação de prazo e não resolveram o problema dos chamados lixões. Mas no dia 14 de agosto, a Câmara dos Deputados aprovou Medida Provisória (MP) ampliando o prazo até 2018. A proposta tramita no Senado. A erradicação dos lixões e instalação de aterros sanitários para destinação adequada dos resíduos sólidos são metas prevista na Política Nacional de Resíduos Sólidos, sancionada em 2010. Na MP aprovada na Câmara, estados e municípios tiveram prazo prorrogado até 2016 para elaborar os planos estaduais e municipais de resíduos sólidos. Este prazo havia vencido em 2012. Uma das alternativas para as cidades que não cumpriram a meta é assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público, que fiscaliza a execução da lei. Os gestores municipais que não se adequaram à política, poderão responder a ação civil pública, por improbidade administrativa e crime ambiental.

Sério e Forquetinha não apresentaram o problema. Compostos por estruturas e instalações de transporte, retenção, tratamento e destinação das águas das chuvas, os sistemas de drenagem dos municípios apresentaram déficit que resultam em alagamentos e transbordamento de córregos. Também foram verificados pontos de estrangulamentos e tubulações com capacidade insuficiente.

Governo federal havia anunciado para agosto o prazo para a extinção de todos os lixões no Brasil. Adiou para 2018

Informações gerais do Vale

Dados elencados pelo Conselho Regional de Desenvolvimento do Vale do Taquari (Codevat), relativos a 2010, mostram números do saneamento por domicílio.


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Ociosa Com investimentos pífios em dragagem e pouco interesse do empresariado, a hidrovia do Porto Fluvial de Estrela é a mais ociosa entre as 33 do Brasil. Em 2009, foi registrada uma movimentação de 762 mil toneladas. Em 2014, só 64 mil. Repasse da gestão administrativa para o Estado – confirmada neste ano – surge como alternativa para reverter o quadro e atrair novas empresas.

Caminho aberto ao A criação de um plano de logística, com metas para o uso da ferrovia e hidrovia, pode colocar a região em outro patamar. Hoje, poucas cargas chegam pelo trem ao Porto de Estrela. Já a hidrovia é a mais ociosa do país. Tornar atrativo ao empresariado os outros modais representa mais segurança nas estradas, economia e poder de barganha para atrair novos investidores.

Os trens não atendem as necessidades do empresariado local. Pelo Rio Taquari, não há condições para as embarcações navegarem o ano todo. O aeródromo de Estrela está fechado desde 2006. Ferrovia, rodovia, hidrovia e aeródromo. O Vale do Taquari dispõe da infraestrutura de todos esses modais, mas pouco é aproveitado. Apesar da possibilidade de reduzir custos com a logística, usando a hidrovia e

Ignorado

O primeiro entroncamento rodo-ferro-hidroviário do país completa 37 anos em novembro deste ano. Pela área, a movimentação nos primeiros anos superava 1,3 milhões de toneladas. Hoje, o máximo fica em 600 mil toneladas. O que antes era a Ferrovia do Trigo, nos dias atuais, se resume a insumos embarcados no Paraná para atender, na maioria, pequenas propriedades rurais.

HIDROVIA

FERROVIA


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o desenvolvimento a ferrovia, a falta de itinerários frequentes da América Latina Logística (ALL), as dificuldades de cumprir os prazos estabelecidos de embarque e desembarque – sejam do Porto de Estrela a Porto Alegre ou a Rio Grande –, afastam o interesse dos empresários. Caminhões, opção mais cara, permanecem no topo, como alternativa mais viável para o transporte de insumos agrícolas e produtos manufaturados.

Diante desse quadro, completar a duplicação da BR-386 e estendê-la até Iraí; destravar os problemas burocráticos do aeródromo de Estrela; melhorar a navegabilidade do Rio Taquari e acompanhar o desenvolvimento no porto de Rio Grande; aproveitar os trilhos do trem que cruzam o país e fomentar o transporte ferroviário: eis alguns dos desafios para o Vale dos Alimentos.

Saturada Com o fim das obras de duplicação se aproximando, aumenta a expectativa de investidores para aproveitar ainda mais o escoamento pela “Estrada da Produção”. Ao mesmo tempo, prefeitos utilizam leis de incentivos para atrair empresas e indústrias para áreas próximas da rodovia federal. A história de quase 50 anos da BR-386 comprova que ela foi crucial para o desenvolvimento do Vale do Taquari.

Interditado Fundado por um grupo de amigos, o Aeródromo Regional de Estrela está fechado desde 2006. Uma comissão de empresários tenta, com o governo de Estrela, conseguir a liberação para pousos e decolagens. Condição que poderia facilitar a vinda de grandes empreendedores ao Vale do Taquari.

RODOVIA

AERÓDROMO

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MARÍLIA PARENTI DOS ANJOS/CHINELAGEM PRESS

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Nos três estados do Sul, são 7.265 quilômetros de estrada de ferro. Poucos itinerários e falta de prazos para entrega afastam interesse do empresariado

Ferrovia Trilho subaproveitado emperra crescimento O transporte ferroviário é, em média, 30% mais barato do que pelas estradas. Quando o percurso envolve grandes distâncias, a economia é maior. Ainda assim, poucas cargas são transportadas a Estrela por locomotivas. Devido as possíveis avarias no momento do descarregamento e transferência de cargas nos entroncamentos, o uso do modal depende do tipo de carga. De preferência, produtos de baixo valor agregado e em grande quantidade e peso, como grãos, minerais e combustível. Nos três estados do sul, são 7.265 quilômetros de trilhos. Grande parte das composições com destino ao sul do país vem dos estados do Mato Grosso e de Goiás. Como não há estradas de ferro nas cidades onde os insumos agrícolas são embarcados, caminhões levam os produtos até Londrina ou Maringá, no Paraná. Em seguida, carregam-se os vagões para depois partirem com destino ao Vale do Taquari. Neste ano, locomotivas levaram

ao pátio da Companhia de Silos e Armazenagem (Cesa), de Estrela, 15,4 toneladas de grãos. A quantidade preenche 290 vagões de milho e trigo. Conforme o gerente, Ledo Daruy, a unidade tem capacidade para armazenar 35,5 toneladas. Neste ano, a ocupação média dos silos foi de 65%. A complexidade do processo afasta o interesse das cooperativas da região. As empresas preferem comprar milho usado para a ração animal do estado. Em distâncias menores, é mais rápido e prático usar caminhões. Na fábrica de rações da Languiru, a necessidade de mais de 14,5 mil toneladas de milho ao mês precisa ser atendida dentro de prazos que a ALL não consegue garantir. A falta de regularidade, indisponibilidade de linhas e poucos itinerários dificultam as encomendas pelo modal ferroviário. Como resultado, pouco mais de 15 mil toneladas vindas do centro do país chegam ao pátio da indústria por ano. Conforme o presidente da coope-

rativa, Dirceu Bayer, o gasto com o transporte do principal insumo para a fábrica de rações em Estrela, representa 30% do preço do grão. Diante dos volumes, o custo em logística alcança R$ 1,8 milhões. "O uso do modal ferroviário é modesto para nós. Fazemos poucos meses do ano, isso pela indisponibilidade de vagões na malha sul. Vale lembrar que a malha ferroviária ainda é deficiente em muitas regiões de grande produtividade de milho e soja, como no Centro-Oeste." Para o presidente da cooperativa, a região tem a estrutura para melhor aproveitamento dos trens. "Temos tudo instalado aqui, o que precisamos é de mais regularidade de itinerários e o cumprimento dos prazos. Esses fatores podem aumentar a frequência de uso do modal." A Languiru exporta para mais de 40 países. Com o oferecimento de alternativas para a logística, estima Bayer, a indústria teria mais competitividade no mercado interno e externo de carnes, leite e rações.

Um transporte ferroviário mais eficiente, opina Bayer, reduz a necessidade de recursos para estoque, além de harmonizar o fluxo rodoviário no entorno da empresa. "Teríamos regularidade no recebimento e estoque. Estaríamos menos dependentes da logística rodoviária, gastaríamos menos com multas, pedágios e reduziríamos as horas extras para descarga de caminhões." Em outra cooperativa da região, a Cosuel, de Encantado, também usa de forma discreta o transporte ferroviário. Segundo o presidente da cooperativa, Gilberto Piccinini, apesar do ganho em economia com logística, o tempo de entrega das cargas dificulta a produção. “Não há uma data certa. A ferrovia ainda não funciona como deveria.” Presidente do Conselho de Desenvolvimento do Vale do Taquari (Codevat), a economista Cíntia Agostini, atribui ao pouco uso do modal ferroviário o fato de a operacionalização ser monopolizada.



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ALL alega crescimento Apesar da avaliação do empresariado sobre a ineficiência no atendimento pelo modal ferroviário no estado, a ALL afirma que o uso desse tipo de transporte tem crescido cerca de 10% ao ano. Em 2013, segundo a concessionária, foram movimentados mais de cinco milhões de toneladas pelos trilhos gaúchos, destes três milhões foram exportadas ou importadas por meio do porto de Rio Grande. Os números apresentados pela empresa mostram um contraste com o transporte neste ano. Ainda que a ALL aponte melhorias e mais movimentação pelos trilhos, até setembro deste ano, o total de cargas transportadas está muito abaixo do verificado no ano passado. Até setembro, foram 283.162 mil toneladas transportadas pelas locomotivas no estado. Conforme a companhia, os investimentos privados garantem segurança ao processo. Pelo levantamento da ALL, houve queda

de 80% no número de acidentes desde 2006. Questionados sobre o motivo de haver poucos itinerários para a região, a concessionária não respondeu. Em 2012, a diretoria da empresa alegava falta de demanda para o transporte ao Porto de Estrela. Na época, afirmavam que o transporte até a região era constante e maior do que a procura do empresariado. Para se ter uma viagem por dia, estima-se que seriam necessárias cerca de quatro mil toneladas de cargas, o que corresponde a 110 caminhões. Se houvesse lotação total dos vagões, o trem viajaria direto da origem ao destino com prazo de entrega de três dias. A ALL detém quatro concessões no Brasil: a malha Norte (Mato Grosso); malha Oeste (entre São Paulo e Mato Grosso do Sul), malha Paulista além da Malha Sul. São quase 13 mil quilômetros de estradas de ferro.

Vale de fora da nova rota Estudo sobre a construção da ferrovia Norte Sul exclui a região. Pelo projeto da Valec, o traçado entraria no estado por Frederico Westphalen, passando por Cruz Alta, Santa Maria e pelo Vale do Rio Pardo, antes de seguir em direção a Rio Grande. Ainda que a Frente Parlamentar pelas Ferrovias na Assembleia Legislativa não confirme o traçado, o fato é que o Vale do Taquari deve ficar alijado do investimento. Para a presidente do Codevat, Cíntia, os líderes regionais precisam pressionar as autoridades para no mínimo, conseguir um ramal ligando o Porto de Estrela ao novo traçado. “O que não pode acontecer, é ficarmos de fora desse modal de transporte.” Para o presidente da Câmara da Indústria e Comércio (CIC-VT), Ito Lanius, ainda que o Vale esteja excluído do projeto

base da nova ferrovia, o traçado atende regiões importantes do Estado. “Não me parece mal planejado. Segue uma linha racional, que contribuirá para o desenvolvimento.” Na opinião dele, mesmo que não haja um ramal ligando o Vale a ferrovia Norte Sul, a proximidade com o Vale do Rio Pardo não traria prejuízos. “Temos acessos pelas rodovias. Poderíamos transportar por caminhões até as estações.” A ferrovia Norte Sul foi projetada para promover a integração nacional, minimizar custos de transporte e interligar as regiões brasileiras por meio das suas conexões com ferrovias novas e existentes. O trecho vem da cidade de Barcarena, Paraíba, até Rio Grande. São 4.197 quilômetros de extensão com trilhos de bitola larga, proporcionando mais velocidade das locomotivas.


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Impacto na geração de riquezas Para Cíntia, frente ao potencial produtivo da região, a melhoria na infraestrutura logística poderia aumentar a participação no PIB do estado. Além disso, traria impactos indiretos nos gastos públicos. "Teríamos menos custos com saúde e nos atendimentos a acidentes nas rodovias", exemplifica. Segundo ela, esse cenário proporcionaria redução nos custos de transporte para as empresas. "Imaginemos o ganho de tempo e melhores condições. Isso reduz custos e aumenta as possibilidades de trafegar, tornam-se mais

O trajeto usual das locomotivas, que passam pela Malha Sul, partem do Paraná. Os produtos transportados para o Porto de Estrela, na sua maior parte, são insumos agrícolas, em especial milho da Conab, vendidos pela Cesa aos produtores rurais.

Concessionária ALL afirma que a média de crescimento do transporte por trens fica em 10% ao ano. Por outro lado, comparando 2013, quando 5 milhões de toneladas transitaram pelo Estado, até setembro deste ano, a empresa contabiliza pouco mais de 283 mil toneladas que cruzaram a malha da estrada de ferro.

competitivas e aumentam a produtividade." Entre as 28 regiões gaúchas, o Vale do Taquari ocupa o 8ª lugar na geração de riquezas, segundo levantamento sobre o PIB, feita pela Fundação de Economia e Estatística (FEE). A economia local representa 3,2% do total do PIB gaúcho. Nos 36 municípios do Codevat, o setor de serviços tem maior participação, com 51,6% do Valor Adicionado Bruto. Cidades com potencial agrícola prosperaram. Pelos cálculos da fundação, em 2011, o setor evoluiu 9,9%. Aquelas com voca-

ção industrial tiveram retração, interferindo no resultado do ano. Mas a participação do Vale já foi maior, chegando a 4%, como lembra Cíntia. Segundo ela, na última década houve evolução na economia local devido à produção primária e a capacidade industrial. No entanto, em comparação com outras regiões, o crescimento do PIB do Vale foi menor. Para ela, esse resultado tem relação com investimentos públicos, como no polo petroquímico, da região Metropolitana (1º lugar no RS), e do Porto de Rio Grande (4º lugar).

Falta de planejamento afasta negócios Análise do Banco Mundial mostra que a falta de infraestrutura e problemas na logística reduzem a competitividade do país. Conforme a instituição, como há pouco investimento no setor, os indicadores mostram que o nosso custo do transporte é maior do que a China e Malásia, por exemplo. Como resultado, o Brasil permanece relativamente fechado ao comércio internacional. No 20º Fórum Internacional Supply Chain, promovido pelo instituto de logística Ilos, no Rio de Janeiro, no dia 14 de outubro, a gerente de Práticas Comerciais e Competitividade do Banco Mundial, Mona Haddad, palestrou sobre as dificuldades enfrentadas no país. Segundo ela, como o modal rodoviário é o mais usual, há problemas envolvendo a demora no transporte entre regiões, burocracia na liberação das mercadorias, congestionamentos nos portos e rodovias, o baixo investimento para melhoria da infraestrutura e uma fraca ligação intermodal são obstáculos para o desenvolvimento econômico.


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BR-386 Tudo passa pela “Estrada da Produção” A ineficiência da hidrovia e da ferrovia sobrecarrega o fluxo da BR-386. Veículos de passeio e ônibus dividem espaço com caminhões e carretas que levam a produção do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e parte do Paraná pela rodovia. A duplicação de 33 quilômetros entre Estrela e Tabaí, em obras desde 2010, é alento para o Vale do Taquari. Por outro lado, é pouco diante dos problemas entre Lajeado e Iraí, no norte gaúcho. Em pista simples, a rodovia representa constante perigo e acidentes fatais são quase diários. Urge a duplicação. Mais de 25 mil veículos trafegam pela rodovia federal todos os dias, sendo a maioria de transporte de carga. Mesmo com congestionamentos e problemas no asfalto, o transporte rodoviário é a principal - quase única - alternativa de empresário locais. Pagam mais pelo frete, mas optam pelo caminhão pela ineficácia da navegação e do modal ferroviário. Crucial para o desenvolvimento regional, não é demasia afirmar que o Vale do Taquari estaria em patamar econômico inferior se o traçado original da BR-386 – criado em meados da década de 50 – tivesse sido mantido. A luta de líderes e empresários locais, e a vontade política do estado foram primordiais para idealizar e concretizar o maior divisor de águas no desenvolvimento das 36 cidades. Nascido no pequeno vilarejo de Cruzinha, hoje interior de Carazi-

nho, Leonel de Moura Brizola era o governador do estado no fim dos anos 50. Tinha em mãos uma das maiores obras viárias da época. A criação da rodovia federal era arquitetada desde o início daquela década. A BR-386, cujas letras denominavam traçados diagonais, era um projeto que previa ligação do noroeste gaúcho com a região metropolitana. O desenho inicial da BR, idealizado pelo Plano Rodoviário Nacional, excluía a cidade natal de Brizola. Também passava longe de Lajeado, Estrela, Forquetinha, Marques de Souza. Por outro lado, Barros Casal e Boqueirão do Leão seriam alguns dos municípios contemplados pela obra, fundamental para um melhor escoamento de toda a produção regional. Havia ainda outro trajeto, colocando a região alta de Encantado na rota da rodovia federal. Todos previam a travessia pelo Rio Taquari, porém em pontos diferentes do leito. Detalhes dos bastidores políticos que alteraram o traçado original são escassos. Para alguns, foi uma decisão pessoal do então governador. Há quem fale sobre uma pressão de empresários e investidores. “Tinha uma turma do Daer que torcia para um projeto, e outra que torcia por outro. Venceu o lado de Lajeado”, brinca Edson Campos de Andrade, funcionário do Daer na década de 60. Ele participou de toda a obra da BR386 no Vale do Taquari. De fato mesmo, a participação efetiva de equipes de engenheiros norte-

-americanos, cedidos pelo governo dos Estados Unidos por meio da “Aliança Para o Progresso”. A ação “anticomunista” dos EUA iniciou na década de 60. Era simples. O governo norte-americano custeava obras essenciais para o desenvolvimento de países da América Latina, conquistando assim a simpatia dos povos num momento de claro crescimento do movimento socialista. Cuba foi a única nação que negou qualquer fatia dos bilhões de dólares gastos pelos ianques. Lançada pelo então presidente, John F. Kennedy, a aliança trouxe técnicas modernas para construção de rodovias. Um norte-americano, conhecido aqui como Mr. Atkins, era um dos fiscais da

obra. Morou por alguns anos em Lajeado, numa casa instalada na rua Júlio de Castilhos. É lembrado como um dos principais responsáveis pelo adensamento da BR e também pelo know how que garantiu a construção serra acima. Todas as pontes do trecho foram finalizadas antes da pavimentação. Técnicas francesas foram utilizadas nas bases. A estrutura instalada entre Estrela e Lajeado foi inaugurada no dia 20 de setembro de 1962. O trecho estrelense foi asfaltado só cinco anos depois, pela Construtora Sultepa, cujo acampamento ficava no bairro Pinheiros. A rodovia ainda estava distante da capital. Só em 1968, teve início a construção da variante entre Tabaí e Canoas.

Números da BR-386 Média de veículos por dia:

Média de velocidade:

25 mil

Máxima 80km/h

no trecho da 4º Delegacia da PRF

Mínima 50km/h

Extensão:

452 quilômetros entre Iraí e Canoas

Cidades Lindeiras: Canoas, Nova Santa Rita, Montenegro, Triunfo, Tabaí, Paverama, Taquari, Fazenda Vilanova, Estrela, Lajeado, Marques de Souza, Pouso Novo, São José do Herval, Fontoura Xavier, Soledade, Tio Hugo, Carazinho, Sarandi, Frederico Westphalen, Iraí.


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Mãos que ergueram a rodovia na década de 60 Quase 50 anos depois da inauguração da BR-386 no Vale, o ex-assistente técnico rodoviário do Daer, Andrade, e o ex-engenheiro do Daer, Ivanio Faria, visitaram de novo um canteiro de obras na mais importante rodovia da região. Ambos trabalharam juntos na construção do trecho entre o Arroio Estrela e o Forqueta, na distante década de 60. Moraram durante alguns anos num acampamento de funcionários na rua Bento Rosa, nas terras que pertenciam a Arno Feldens. Discutem sobre a importância de Brizola. “Ele que escolheu entre

os três traçados”, lembra Faria. “Mas ele atrasou em quatro anos a obra, pois não aceitava ser fiscalizado pelos norte-americanos”, rebate o amigo. Ambos demostram orgulho pelo feito. “Na época, nosso chefe sempre dizia: podem bater no peito e falar que participaram da obra da “Estrada da Produção”, comenta Andrade, que passou pelo menos 32 anos no Daer. Faria, com 43 anos de serviços prestados ao departamento, se acostumou com os questionamentos das filhas. “Quando passamos pela BR eu digo: tá vendo filha.

Essa o papai ajudou a fazer.” Mãos calejadas de tanto abrir mato a picão e o auxílio de bois emprestados por colonos para subir picadas são apenas algumas lembranças da dupla. Apesar da aparente precariedade do serviço, exaltam a utilização de técnicas modernas para a época. Muito em função dos investimentos norte-americanos. “Vi máquinas que nunca tinha visto na vida. Nem sabia que existiam”, relembra Andrade. Técnicas francesas também foram utilizadas em alguns trechos. Na ponte sobre o Rio Taquari, AnRODRIGO MARTINI

drade explica que foram utilizadas marombas enormes para segurar todo o peso da estrutura durante sua construção. Em Marques de Souza, as proteções contra desmoronamentos das encostas também foram práticas trazidas da França. “Todos aprenderam muito durante aquela obra. Era a mais moderna da época.” Outros detalhes acabam passando quase despercebidos. Mas Andrade esclarece. “A rodovia poderia ser quase toda em linha reta. Mas, optamos por um traçado “fluente”, com curvas que buscam evitar o sono. Há também mecanismos para evitar enjoos.” Faria faz uma observação. “O projeto inicial da obra previa um limite de 120 quilômetros por hora. Só no trecho de Pouso Novo era menor.” O fluxo médio previsto era de pouco mais de quatro mil veículos. O progresso foi tão rápido que, em menos de dez anos ela já estava ultrapassada, diz Andrade. Hoje, o tráfego supera a média de 25 mil veículos diários. Os dois ex-funcionários escolheram Lajeado para morar, após a aposentadoria. Faria não perde a piada. “Ajudei a construir o caminho de casa.”

Ivanio Faria e Edson Campos de Andrade eram funcionários quando a BR-386 foi construída no trecho entre Tabaí e Pouso Novo. Lembram as decisões políticas que incluíram a região no traçado da rodovia, as dificuldades de passar meses acampados em barracas e o advento de novas tecnologias na execução da obra.

No início, fluxo de três mil veículos por dia e corridas A pavimentação exigiu estudos a respeito da constituição geológica do subleito, assim como do dimensionamento do pavimento. O governo previa tráfego intenso de veículos pesados. A estimativa era de um fluxo diário de quase quatro mil veículos. Mas, no início, o escasso movimento permi-

tia o que hoje poucos imaginam: corridas de carros esportivos. Com a ausência de grandes empresas e da ligação direta com Porto Alegre entre 1967 e 1968, o megainvestimento rodoviário estava quase ocioso. “As pessoas faziam festa quando passava um veículo”, lembra Carlos Alberto

Martini, ex-secretário de Indústria e Comércio de Lajeado. Segundo ele, muitos, na época, chegaram a acreditar que a rodovia teria pouca utilidade para a região. Apenas as corridas movimentavam a BR. Reuniam centenas de pessoas, que se aglomeravam em terrenos altos às margens da

rodovia para assistir a passagem dos veículos. “Lembro uma corrida que iniciava no topo da serra. Meu pai me levou com meus irmãos para ver os carros. Era o pequeno rádio – ligado na jovial Rádio Independente – que avisava quando iria passar algum”, comenta o empresário, Cléo Weiand.


ANDERSON LOPES

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Desde a década de 60, empresários perceberam na BR uma vitrina de negócios. Fruki, instalada às margens, tem 600 carretas trafegando por mês

Construção da BR oportuniza investimentos Cléo Weiand é gerente da empresa Apomedil, uma das primeiras a se instalar às margens da BR. Na época, o empreendimento familiar funcionava como um posto de combustível e também como uma oficina para carros e caminhões. Hoje, – já sem o posto e prestes a completar 50 anos – o empreendimento se consolida como a única concessionária da Mercedes-Benz no Vale do Taquari. A finalização do trecho entre Tabaí e Canoas – em meados de 1969 – aproximou ainda mais o Vale do Taquari da capital gaú-

cha. Isso fez com que a estrutura chamasse ainda mais a atenção de empresários. Em 1971, a Fruki instalou seu complexo do lado direito da rodovia. Saiu da tímida fábrica de Arroio do Meio – inaugurada em 1924 – para conquistar o Estado. E a BR foi peça fundamental nesse processo. Segundo Aline Eggers, diretora administrativa da empresa, 30 carretas carregadas com 28 toneladas e mais 30 caminhões com até oito toneladas saem da fábrica todos os dias. A BR-386 se torna essencial para o escoamento da produção da

empresa. “Por mês são cerca de 600 carretas e outros 600 caminhões menores.” Ela conta que a direção da Fruki comprou duas áreas de terras ainda em 1962, quando a “Estrada da Produção” estava em obras, e quase nove anos antes da abertura da sede em Lajeado. Outras empresas não estão instaladas nas margens, e tampouco em cidades lindeiras à BR. Nem por isso deixam de utilizar o principal modal viário da região. A Dália Alimentos, por exemplo, movimenta 1,4 tonelada por semana, utilizando uma

média de 50 carretas. A empresa tem uma previsão de faturar R$ 1 bilhão em 2014. Há quem se beneficie com a chegada de novos insumos. Segundo Gilberto Picinini, presidente da Cosuel, a empresa recebe matéria-prima de 140 cidades gaúchas. “Estamos falando de um quarto do Estado chegando pelas rodovias até Encantado”, diz. Ao mesmo tempo, 67 caminhões carregados com 15 toneladas de embutidos deixam a cidade em direção ao estado Santa Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro e Nordeste do país.


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Áreas nas margens da rodovia valorizam Hoje, boa parte do retorno financeiro dos municípios provém de empresas instaladas às margens da rodovia. Em Estrela, cuja extensão da BR-386 tem em torno de 14 quilômetros, existe 135 empreendimentos funcionando nesta área. Juntas, representam 22,8% do Valor Adicionado Fiscal (VAD) no mu-

nicípio, o que significa cerca de R$ 160 milhões por ano. Utilizando a Lei Municipal de Incentivo, a administração municipal pretende atrair pelo menos mais 30 empresas num prazo de até dois anos. Lajeado tem quase 130 empresas instaladas num trecho de 11,8 km. Paverama, por outro lado, pos-

sui apenas quatro estabelecimentos em 15 quilômetros. O prefeito Vanderlei Markus parece determinado a explorar melhor os espaços, mas pede auxílio. “Possuímos uma ligação com a capital e a metade norte do estado. Por isso é importante apoio de estado e União para atrair investidores.” Em Pouso Novo, são nove ANDERSON LOPES

empresas próximas à BR. Em Forquetinha e Marques de Souza há três e 13 pontos comerciais respectivamente. Em Fazenda Vilanova, há 17 empreendimentos instalados em um trecho de 13 quilômetros. Com a duplicação concluída naquele município, o prefeito agora negocia com AESul e Dnit a preparação de áreas para receber investimentos. A previsão é atrair, pelo menos, três novas empresas em um período de dois anos. Juntas, devem gerar em torno de 30 vagas de emprego. "A rodovia é de grande importância, pois propicia a integração entre os municípios da região e a capital e também com outros países. Facilitando o intercâmbio e o desenvolvimento, nos tornando uma vitrina ao mundo", opina o prefeito, Pedro Dorneles. Segundo ele, as 17 empresas instaladas nas áreas ribeirinhas da BR geraram R$ 900 mil em VAD em 2013.

A Cooperativa Languiru envia por dia mais de 200 caminhões pela região, Estado e país. Se outros modais funcionassem, a diretoria repensaria a logística, reduzindo o tráfego de veículos e aproveitando a ferrovia.

Expectativas aumentam com as duplicações O primeiro trecho duplicado da BR-386 fica entre Canoas e Tabaí. Mesmo com alguns gargalos – como a ponte sobre a rede ferroviária –, o trajeto renovado trouxe diversas indústrias para aquela região. Representou um

significativo crescimento econômico para as cidades lindeiras à rodovia federal, valorizando áreas e terrenos. No Vale do Taquari, a duplicação começou a tomar forma após a interdição da ponte entre Estrela

e Lajeado, no dia 26 de junho de 1994. Ela apresentou problemas na estrutura. Durante alguns meses, o 3º Batalhão de Engenharia de Combate do Exército instalou uma ponte “Bailey Dupla-Dupla”, permitindo a passagem de veícu-

los leves em mão única. Pelo rio, duas barcas permitiam a travessia diária de centenas de caminhões e ônibus. Outros desviavam por Taquari e Venâncio Aires, trafegando por distâncias maiores para chegar e sair do


RODRIGO MARTINI

Vale. Todas essas dificuldades foram fundamentais na conquista de outras obras viárias, graças à mobilização de líderes locais. O trecho entre Lajeado e Estrela começou a ser duplicado em 1995, pouco depois de finalizada a segunda ponte sobre o Rio Taquari. Ambas as obras trouxeram novos investidores à região. Também resultou na queda do número de acidentes na rodovia, que já naquela época recebia uma movimentação superior a 15 mil veículos por dia.

Os perigos da “Estrada da Morte” O trecho da BR-386 no Vale também ficou conhecido pela insegurança. O alto fluxo de veículos e a imprudência dos motoristas transformam a rodovia em uma das mais perigosas do estado. Em nove anos, foram pelo menos 201 mortes registradas no trajeto entre Tabaí e Pouso Novo. Os dados são do Núcleo de Registros de Acidentes e Medicina Rodoviária (Nuram). Os anos de 2008 e 2013 foram os mais violentos, com 36 vítimas cada. Em 2008, a maior tragédia da história da BR-386 chocou o Estado. 13 mortos após acidente envolvendo um caminhão e um ônibus, na ponte sobre o Arroio Concórdia, em Fazenda Vilanova. Foi um divisor de águas na luta pela duplicação. Mesmo assim, a região ainda aguardou dois anos para ver o início da tão sonhada obra. Hoje, faltando alguns poucos quilômetros para o fim da obra de 33,4 quilômetros entre Tabaí e Estrela, empresários e líderes regionais sentem as diferenças de um sistema viário mais seguro. “Trouxe segurança à população, e mais agilidade no transporte. Vai favorecer o escoamento dos produtos da agroindústria até o grande centro consumidor”, afirma Dirceu Bayer, presidente da Languiru. Representantes do setor de transporte de cargas também atentam para o aumento da produtividade. O empresário Valmor Scapini fala sobre a maior segu-

Duplicação de 33 quilômetros da BR-386, entre Tabaí e Estrela, começou em 2010. Previsão de entrega foi adiada duas vezes, e custo já passa de R$ 200 milhões.

rança para motoristas e o economia nos fretes. Calcula em até 20% a economia da mão de obra com pistas 100% duplas. Em 2014, já ocorreram 26 óbitos. A maioria em janeiro, quando nove pessoas morreram - sete delas num mesmo acidente, no quilômetro 307 de Pouso Novo. Segundo relatório da Nuram, a maioria das causas está relacionada com velocidade incompatível aos trechos, falta de atenção, ultrapassagem indevida, desobediência da sinalização, embriaguez ao volante e defeitos mecânicos ena pista de rolamento.

CIC-VT almeja novas obras Presidente da Câmara de Indústria e Comércio do Vale do Taquari (CIC-VT), Ito Lanius, observa o tempo médio de viagem entre Lajeado e Porto Alegre. “Há 20 anos, com menor movimento, demorava 1 hora 15 minutos para ir à capital. Passados os anos, o tempo aumentou. Antes da duplicação, tínhamos de planejar 2 horas e 30 minutos para chegar. Agora, com a rodovia do parque e a nova pista da BR, voltamos ao patamar de 20 anos atrás.” Segundo ele, a CIC pretende implantar uma agenda com o governo do Estado para criar um cronograma de ações para

a região. “Precisamos é de um amplo plano de logística, dentro da realidade financeira e da economia regional.” O desafio da CIC-VT é ajudar no trâmite para duplicar a BR até Iraí. O Dnit contratou uma empresa para fazer o levantamento técnico dos 250 quilômetros. O projeto deve custar cerca de R$ 18 milhões, e a execução da obra está estimada em R$ 1,5 bilhão. Líderes regionais também pedem a duplicação da ERS129/130. Já existe um Estudo de Viabilidade Técnica em andamento, e o projeto custará cerca de R$ 1,5 milhão.


Hidrovia Porto de Estrela é o mais ocioso do Brasil As notícias costumam ser desanimadoras quando abordam o aproveitamento comercial do Rio Taquari. Salvo o recente repasse do controle portuário ao Estado, os dados comprovam que o modal “navega” na contramão do desenvolvimento do Vale. Mobilizações buscando duplicação de rodovias contrastam com o desinteresse pelo transporte fluvial. Hoje, o Porto de Estrela é o menos movimentado entre todos os 33 portos organizados do Brasil. Os índices de cargas transportadas por via fluvial atestam a defasagem do serviço. A queda nos últimos cinco anos é drástica. Em 2009, a Superintendência de Portos e Hidrovias (SPH) registrou uma movimentação de 762 mil toneladas na única hidrovia navegável da região. Em 2014, o número baixou para 64 mil toneladas, contabilizadas até o início de novembro. Uma redução que deve superar 90% até o fim do ano. A hidrovia do rio Taquari já competiu com outras do estado. Hoje, fica bem aquém. No Rio Jacuí, por exemplo, foram transportadas quase 800 mil toneladas nos dez primeiros meses de 2014. No Rio Gravataí, 1,1 milhões no mesmo período. Na Lagoa dos Patos, 933 mil. Os índices do Vale são pífios

também diante dos rios Sinos, Caí e do Canal São Gonçalo, que registraram, respectivamente, 293 mil, 227 mil e 266 mil toneladas neste ano. Essa decadência do transporte fluvial persiste há mais de duas décadas. Desde o fim dos anos 80, quando a movimentação portuária em Estrela chegou a bater a marca de 1,3 milhões de toneladas anuais, o setor vem experimentando uma derrocada bastante acentuada. Há dois anos, foram movimentadas 328 mil toneladas. Ano passado, 180 mil. Em 2014 o otimismo não ultrapassa a marca de 100 mil. Entre as causas apontadas para o declínio está a baixa procura dos empresários pelos serviços do porto. Líderes regionais apontam as mudanças políticas nacionais da época – aliada a globalização do setor agrícola - como fundamental para a mudança de foco das empresas. Os empreendimentos que antes exportavam produtos pelo terminal de Estrela passaram a atender o mercado interno. Outros fecharam. Uma das maiores empresas da região, a Fruki tentou utilizar o modal. Mas o resultado foi insatisfatório. Segundo a diretora financeira, Aline Eggers, os principais problemas foram: condições de

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navegabilidade no rio em diferentes épocas do ano; capacidade de transporte da embarcação muito acima da necessidade, inviabilizando o negócio para a empresa transportadora (embarcação partia com capacidade ociosa); e condições de estrutura do porto para movimentação das cargas.

Assoreamento do rio A lentidão dos trabalhos de desassoreamento é outro motivo. Afora o transporte de areia, realizado de forma periódica entre os vales do Rio Pardo e Taquari, o cais do Porto de Estrela registrou pouquíssimas atracagens neste ano. A Navegação Aliança, a única que ainda mantém a rota de transporte até a capital, realizou só cinco viagens até Porto Alegre em 2014. Há 30 anos, eram 30 por mês. O pouco movimento deixa a estrutura do Porto de Estrela com um aspecto de abandono. Após 37 anos da inauguração, ele funciona com menos de 20% da capacidade anual. Poderia atingir três milhões de toneladas. Há diminuição também no quadro de funcionários. Em 1987, eram 36 pessoas atuando no local. Agora são 12. Quase todos aposentados. Nas últimas duas décadas, nenhuma contratação.

Em 2014, estrutura instalada em Estrela é a mais ociosa entre todos os 33 portos fluviais do país e também em comparação com todos os Terminais de Uso Privado. Conforme dados da Antaq, apenas 2,8 mil toneladas passaram pelo local no 2º trimestre deste ano.


Viagem arriscada Em abril de 2013, reportagem do jornal A Hora navegou a bordo do navio Trevo Azul. A viagem de Estrela até Porto Alegre foi na companhia de uma tripulação formada por sete “navegadores”. A embarcação transportava 2,5 mil toneladas de Estrela até o Porto de Rio Grande, com breve parada na capital gaúcha. O prático, Lonir Aires de Britto, afirmou na época. “Sorte que conheço todos os cantos do Taquari. Se dependesse da sinalização, estaria perdido.” Em três pontos do trajeto de 135 quilômetros, o casco bateu contra as pedras acomodados no fundo do leito. O primeiro choque ocorreu na divisa entre Cruzeiro do Sul e Venâncio Aires, próximo a foz do Arroio Taquari Mirim. A segunda batida foi um pouco mais adiante,

na divisa de Venâncio Aires e Taquari. A última nas proximidades da Ilha das Capivaras, também em Taquari. A embarcação cruzou por duas dragas paradas em meio ao rio. Nenhuma realizava a dragagem e tampouco tinha funcionários a bordo. São elas as principais ferramentas da AHSul para tentar manter navegável o trecho entre o Porto de Estrela e a foz do Taquari no Rio Jacuí. Solução insuficiente. Na ocasião, o comandante foi enfático. “É normal vermos elas paradas.” O comandante só relaxou quando a embarcação de 89 metros de comprimento por 15 de largura deixou o Rio Taquari, após mais de oito horas de atenção máxima. Depois disso, foram mais qua-

Detalhes do porto O Porto fluvial de Estrela é um dos maiores do Brasil. Erguido em uma área de 49 hectares, na margem esquerda do Rio Taquari, possui capacidade de armazenamento superior a três milhões de toneladas por ano. No entanto, trabalha com menos de 15% desse montante. Além do acesso fluvial, os terminais possuem conexões rodoviárias – pela BR-386 e ERS-453 – e fer-

tro horas pelo Rio Jacuí, numa velocidade média de oito milhas marítimas – que corresponde a 14 Km/h –, até chegar ao cais de

roviárias. Com 585 metros de extensão, o cais de acostagem possui seis berços para embarque e desembarque. São dois armazéns graneleiros. Um para 13 mil toneladas e outro para 37 mil toneladas de capacidade estática. O porto conta também com um silo vertical de 40 mil toneladas, e armazém com disponibilidade para 2,26 mil metros quadrados de carga.

Porto Alegre. Conforme membros daquela embarcação, a navegação na única hidrovia do Vale piorou desde aquela viagem.


“Privatizar o porto está fora de cogitação” Há anos líderes regionais sugerem a privatização do Porto de Estrela. Esta também foi a vontade do ex-prefeito de Estrela, Celso Bronstup (morto) e também do atual, Rafael Mallmann. Em agosto, quando a estrutura foi devolvida ao estado pela União, a possibilidade de repassar o controle para a iniciativa privada voltou à discussão. O governo do estado descarta o repasse da estrutura instalada às margens esquerda do Rio Taquari. Quem garante isso é o Diretor de Portos da Superintendência de Portos e Hidrovia (SPH) Antônio Astrana. “Privatizar esta totalmente fora de cogitação.” A decisão inclusive independe da SPH. O convênio assinado com a União, válido por dois anos, espitula igual prazo para que o governo estadual crie uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), cuja finalidade será

administrar o porto. A empresa pública terá semelhança com a EGR. Até lá, a superintendência fica responsável pela manutenção portuária. O diretor considera o arrendamento de espaços para empresas privadas como uma solução exitosa. Isso já ocorre em outros portos, como em Rio Grande, Porto Alegre e Pelotas. Sobre esses convênios “público-privados”, Astrana confirma negociações com empresários do Brasil e também do exterior interessados em investir na área de Estrela. Sem citar nomes, comenta sobre outros acordos firmados com empresas privadas. “Em Porto Alegre, por exemplo, negociamos desde maio com uma empresa que agora investirá R$ 50 milhões junto ao porto, com perspectiva de gerar quase 500 empregos.” Há exemplos interessantes tam-

bém junto ao porto de Pelotas. Só em 2014, duas grandes empresas investiram naquela estrutura. A CMPC Celulose Riograndense e a sul-coreana, Oxnaval. O primeiro acordo prevê embarque da celulose naquele município com destino ao porto de Rio Grande. A outra empresa, especializada em manutenção de embarcações pesqueiras, operará também na transposição do pescado para contêineres refrigerados. Conforme Astrana, o investidor paga pelo uso da área, de acordo com a regulamentação da Antac. É preciso respeitar uma tabela de valores por metro quadrado. Pagam também uma taxa por armazenamento da mercadoria e uso dos equipamentos do porto. Os valores recebidos pelo estado costumam ser, segundo o diretor, investidos no próprio porto. Reconhece os poucos incentivos nos últimos anos e detalha algumas possibilidades. “Foram

poucas dragagens. Não houve compra de novas dragas. Houve desmobilização. Desmonte das estruturas. Fumo, frangos, fertilizantes, trigo. Tudo pode ser transportado, desde que haja interesse.” Cita ainda a facilidade de escoamento dos produtos gerados pelo agronegócio, principalmente em direção ao porto de Rio Grande.

Grandes embarcações são cada vez mais escassas no Rio Taquari. Poucos investimentos em dragagem colocam em risco as estruturas dos navios. A proximidade com as margens atesta as dificuldades. Promessas de dessassoreamento acabam no exercício da retórica.

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“Privatizar o porto está fora de cogitação” Há anos líderes regionais sugerem a privatização do Porto de Estrela. Esta também foi a vontade do ex-prefeito de Estrela, Celso Bronstup (morto) e também do atual, Rafael Mallmann. Em agosto, quando a estrutura foi devolvida ao estado pela União, a possibilidade de repassar o controle para a iniciativa privada voltou à discussão. O governo do estado descarta o repasse da estrutura instalada às margens esquerda do Rio Taquari. Quem garante isso é o Diretor de Portos da Superintendência de Portos e Hidrovia (SPH) Antônio Astrana. “Privatizar esta totalmente fora de cogitação.” A decisão inclusive independe da SPH. O convênio assinado com a União, válido por dois anos, espitula igual prazo para que o governo estadual crie uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), cuja finalidade será

administrar o porto. A empresa pública terá semelhança com a EGR. Até lá, a superintendência fica responsável pela manutenção portuária. O diretor considera o arrendamento de espaços para empresas privadas como uma solução exitosa. Isso já ocorre em outros portos, como em Rio Grande, Porto Alegre e Pelotas. Sobre esses convênios “público-privados”, Astrana confirma negociações com empresários do Brasil e também do exterior interessados em investir na área de Estrela. Sem citar nomes, comenta sobre outros acordos firmados com empresas privadas. “Em Porto Alegre, por exemplo, negociamos desde maio com uma empresa que agora investirá R$ 50 milhões junto ao porto, com perspectiva de gerar quase 500 empregos.” Há exemplos interessantes tam-

bém junto ao porto de Pelotas. Só em 2014, duas grandes empresas investiram naquela estrutura. A CMPC Celulose Riograndense e a sul-coreana, Oxnaval. O primeiro acordo prevê embarque da celulose naquele município com destino ao porto de Rio Grande. A outra empresa, especializada em manutenção de embarcações pesqueiras, operará também na transposição do pescado para contêineres refrigerados. Conforme Astrana, o investidor paga pelo uso da área, de acordo com a regulamentação da Antac. É preciso respeitar uma tabela de valores por metro quadrado. Pagam também uma taxa por armazenamento da mercadoria e uso dos equipamentos do porto. Os valores recebidos pelo estado costumam ser, segundo o diretor, investidos no próprio porto. Reconhece os poucos incentivos nos últimos anos e detalha algumas possibilidades. “Foram

poucas dragagens. Não houve compra de novas dragas. Houve desmobilização. Desmonte das estruturas. Fumo, frangos, fertilizantes, trigo. Tudo pode ser transportado, desde que haja interesse.” Cita ainda a facilidade de escoamento dos produtos gerados pelo agronegócio, principalmente em direção ao porto de Rio Grande.

Grandes embarcações são cada vez mais escassas no Rio Taquari. Poucos investimentos em dragagem colocam em risco as estruturas dos navios. A proximidade com as margens atesta as dificuldades. Promessas de dessassoreamento acabam no exercício da retórica.

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Porto foi um “presente” de Geisel A história da construção do Porto de Estrela envolve um ex-presidente da República. Muitos dizem que ele só existe graças ao general Ernesto Geisel, quarto e penúltimo presidente do regime militar, e com fortes raízes no município. Ele era o governante entre 1975 e 1977, quando foi erguida a gigantesca estrutura às margens do Taquari. Geisel é natural de Bento Gonçalves. O único entre cinco irmãos que não nasceu em Estrela. Pouco antes do parto, a insegurança de uma diligência fez com a família desistisse da viagem entre

a Serra e o Vale. Seu pai, Augusto Geisel, veio da Alemanha no início do século passado e foi para Nova Teutônia, uma antiga colônia. A mulher do ex-presidente, Lucy Markus Geisel, também era natural da cidade. Os serviços movimentaram centenas de trabalhadores de diversas regiões do Brasil. Um grande número de máquinas trabalhava dia e noite na construção da estrutura. O canteiro de obras tinha milhares de metros cúbicos de concreto produzidos por betoneiras. Todo o material se juntava as armações de ferro, dando forma a

um dos maiores portos do país. Foram 23 meses de obras. A justificativa para a obra era “atender o escoamento da demanda do transporte de trigo e soja no corredor de exportação do Porto de Rio Grande”. As estruturas para atracação e armazenagem foram inauguradas no dia 12 de novembro de 1977, sem a presença de Geisel. Quem representou o governo federal foi o então vice-presidente, Adalberto Pereira dos Santos, acompanhado do governador do estado, Sinval Guazzelli. O prefeito na época era Hélio Müsskopf, su-

cessor de Gabriel Mallmann, pai do atual gestor, Rafael Mallmann. A embarcação da Navegação Taquara, carregada de farelo de soja da Companhia Estadual de Silos e Armazéns (Cesa), foi a primeira a atracar, em abril de 1977. Logo após a inauguração, a Farol e a Granóleo se instalaram naquela área. E já no ano seguinte, o terminal passou a ter uma movimentação maior de carga. Foram 580 mil toneladas em 1979. Farelo de soja e óleo eram transportados até o Porto de Rio Grande, de onde partiam para o Oriente Médio.


Qualificação e desenvolvimento na região dos Vales O SEST SENAT prima por desenvolver e disseminar a cultura de transporte, promovendo a melhoria da qualidade de vida e do desenvolvimento profissional

do trabalhados, bem como a formação e a qualificação de novos profissionais para a eficiência e eficácia dos serviços a serem prestados à sociedade.

O Vale Taquari e o Vale do Rio Pardo contam com uma Unidade do SEST SENAT anexa no Posto do Arco em Lajeado. Estruturada para atender

demandas de serviços odontológicos, tem equipe fixa de instrutores e dispõe de equipadas salas de treinamentos. Conta também com uma

equipe multifuncional que dá suporte administrativo e atua nas atividades comunitárias e na oferta de serviços em toda a sua área de atuação.

Saúde, esporte e Lazer O SEST SENAT Lajeado promove parcerias com governos municipais e empresas, para desenvolvimento de campanhas e educação na saúde e responsabilidade social. Conta com um consultório odontológico equipado para atender serviços como: odontopediatria (a partir dos 7 anos), endodontia, periodontia, prevenção, diagnósticos, dentística e radiologia. Na área de esportes, promove torneios de futsal, na promoção social dos trabalhadores do transporte.

Qualificação profissional Seguindo um dos objetivos principais, o SEST SENAT promove a qualificação profissional para o transporte e áreas afins. Em 2013 foram qualificados 2.939 trabalhadores, em um total de 148 mil horas/aula. Para tanto estabelece convênios com governos municipais e órgãos públicos, além oferecer cursos especializados obrigatórios para condutores profissionais.

Cursos especializados • Condutor de Veículo de Transporte de Produtos Perigosos

Equipe: Raquel Mendes (gerente), Mauro Cesar Filho (dentista), Deisi Ritter, Éderson Roodrigues, Joseano Nichele, Marlon Costa e Silva, Rejane Cariolato (instrutores), Ana Paula Southier e Duane Ebone (assistentes administrativas), Elisa Moraes e Jéssica Cunha (auxiliar administrativo) e Vera Lucia Benovit (auxiliar de serviços Gerais).

• Condutor de Veículo de Transporte de Carga Indivisível e Outras

Área de abrangência

• Condutor de Veículo de Transporte Coletivo de Passageiros

33 municípos do vales do Taquari e Rio Pardo:

• Condutor de Veículo de Transporte de Escolares • Condutor de Veículo de Emergência • Formação Profissional para Condutores de Táxi • Motofretista • Formação para Operadores de Máquinas • NR20, NR33 e NR35 • Outros cursos sob demanda e in company

Anta Gorda Arroio do Meio Arvorezinha Bom Retiro do Sul Canudos do Vale Capitão Colinas Cruzeiro do Sul Doutor Ricardo Encantado Estrela Forquetinha Ilópolis Lajeado

Marques de Souza Muçum Nova Bréscia Pouso Novo Progresso Putinga Relvado Santa Clara do Sul Sério e Travesseiro Boqueirão do Leão Herveiras Mato Leitão Passo do Sobrado Rio Pardo

Santa Cruz do Sul Sinimbu Vale Verde Venâncio Aires Alfeu Barros Cassal Camargo Fontoura Xavier Gramado Xavier Itapuca Nova Alvorada São José do Herval Soledade

Nossa vocação é o trabalhador do transporte.


Projeto Cidade Gente Miúda O SEST SENAT do Rio Grande do Sul, em plena década de ação pela segurança no trânsito, desenvolve um projeto itinerante vinculado a esse tema, Projeto Cidade Gente Miúda. Este surgiu em análise a diversos questionamentos sobre o trânsito e tendo os acidentes de trânsito como objetivo para estudos de profissionais que atuam nas diversas áreas de mobilidade e ser o foco de preocupação da sociedade gaúcha e brasileira. Ele ressalta a importância do desenvol-

vimento e implantação de ações educativas para a população jovem, considerando que o comportamento humano é um dos fatores determinantes para a ocorrência destes eventos. Este projeto promove, de forma lúdica, a educação das crianças, de 5 a 7 anos, para o trânsito. Também estimula os valores e comportamentos humanos, relacionadoqs com segurança viária, respeito mútuo, cidadania, meio ambiente, obediência às leis de trânsito e valores ético-sociais. E assim motivar as

crianças para serem multiplicadoras para um trânsito seguro, sensibilizando os adultos (motoristas, ciclistas, motociclistas, passageiros e pedestres) de suas responsabilidades para um trânsito correto. Um dos objetivos é propiciar o desenvolvimento de atitudes e hábitos seguros e preventivos de proteção à vida no trânsito e desenvolver o olhar crítico sobre as situações de risco e perigo motivando discussões e ações para que tornem o trânsito mais seguro e soli-

Odonto

Administrativo

No período de 2008 até setembro de 2014, foram 7.015 pacientes atendidos.

6 no apoio administrativo, 5 instrutores e 1 dentista.

Alunos

Instrutor

De 2008 a 2014, 13.099 alunos participaram de nossos cursos.

De 2008 a 2014, foram ministradas 544195 horas/aula.

Unidade Lajeado: (51) 3709-0771 Rua João Luiz da Rocha, nº 136 - Bairro Santo André - Lajeado/RS www.sestsenat.org.br

dário incentivando a fiscalização dos adultos. Em Lajeado, o Cidade Gente Miúda estará na Expovale 2014. As crianças que participarem terão dois momentos. No primeiro, receberão orientações, de forma lúdica, sobre trânsito, convivência e valores e, no segundo momento, orientações de trânsito de forma prática. Para os pais interessados, os instrutores da unidade estarão disponíveis para questionamentos e dúvidas em relação ao trânsito.


60 CAPA


NOVEMBRO/2014

61

Hidrovia do Mercosul: não sai do papel O Estudo de Viabilidade Técnica Econômica e Ambiental (EVTEA) do empreendimento, elaborado pelo Consórcio Ecoplan-Petcon, já foi entregue à AHSUL. Mas até o momento não há qualquer previsão para que ele saia do papel. Os aguardados investimentos na Hidrovia do Mercosul devem iniciar só a partir do segundo semestre de 2015. A obra prevê construção de um “Corredor Multimodal”, interligando o Porto de Estrela aos portos de Rio Grande, São Paulo e Montevidéu. O projeto perdura há mais de 20 anos. Só o estudo técnico custou cerca de R$ 5 milhões. Dragagem contínua, pouca sinalização e necessidade de balizamento somam as principais carências do trecho. Alterações nos limites da eclusa de Bom Retiro do Sul foram citadas. No início do ano passado, o governo federal anunciou a intenção de investir R$ 217 milhões no empreendimento. Prioridade do Plano Nacional de Logísticas

e Transportes, a hidrovia deve abranger a Bacia da Lagoa Mirim, da Lagoa dos Patos, do Lago Guaíba, os rios Jacuí, Taquari, Sinos, Gravataí, Camaquã, Jaguarão, Uruguai e Ibicuí. No lado uruguaio, o projeto inclui ainda os rios Cebollatí e Tacuary.

Terminais privados crescem Os Terminais de Uso Privado (TUP) são terminais outorgados pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) para empresas privadas. Para o ministro-chefe da Secretaria de Portos (SEP), César Borges, as novas leis trouxeram desenvolvimento a esses empreendimentos. A nova legislação permite o transporte de cargas terceirizadas nesses terminais, diz. Segundo ele, hoje existem mais 170 TUPs no Brasil. A Secretaria de Portos autorizou mais 29 e isso

Investimentos viários da União em 2014 mostram paradoxo Rodovias: R$ 13 bilhões Ferrovias: R$ 3,8 bilhões Hidrovias: R$ 680 milhões

significa um investimento de R$ 10 bilhões em até quatro anos. Em 2013, os números comprovam o avanço do modelo. “Aumentamos 12% na movimentação de carga conteinerizada." O sistema portuário nacional é composto de portos organizados

e TUPs. No ano passado, ambos foram responsáveis por uma movimentação de 931 milhões de toneladas de carga bruta (granel sólido, granel líquido e carga geral). Os terminais privados representaram 64% dessa movimentação, ou 593 milhões de toneladas.


62 CAPA

Aviação Aeródromo fechado para pouso e decolagem

RODRIGO MARTINI

O aeródromo regional de Estrela está fechado desde 2006. Uma comitiva de líderes de classe e dos municípios chegou a se reunir com o prefeito Rafael Mallmann pedindo interferência para tornar o local público em privado. Uma série de trâmites burocráticos dificulta uma definição para uso da área. O aeródromo pertence ao estado, mas a manutenção fica a cargo do governo municipal. A Associação dos Municípios do Vale do Taquari (Amvat) e do Conselho de Desenvolvimento da região (Codevat) solicitaram ao Palácio Piratini a reversão do processo de cedência do terreno. Conforme o secretário de Planejamento de Estrela, Marco Wermann, esse é um passo imprescindível para que se possa fazer investimentos e autorizar a concessão para o uso de terceiros. Outro problema que impede o melhor aproveitamento dos é a existência de uma rede de energia elétrica. A forma da instalação contraria as regras impostas pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Pela análise técnica do órgão, a proximidade com as linhas de transmissão é um risco para pousos e decolagens. De acordo com Wermann, a concessionária responsável pelo abastecimento de luz, a AES Sul, foi contatada sobre a situa-

Anac verifica que proximidade com linhas de transmissão de energia elétrica é um risco. Concessionária AES Sul garante a retirada dos postes. Depois disso, técnicos da União vistoriam o local.

ção. Em resposta ao Executivo, garantiu a retirada dos postes. Mas não apresentou uma data para o trabalho. O Executivo de Estrela protocolou o Plano Básico de Zona de Proteção de Aeródromo no 5ª

Comando Aéreo Regional (Comar), em Canoas, mas não obteve resposta. Segundo o secretário Wermann, solucionado os trâmites, a Anac será comunicada para vistoriar a pista e autorizar ou não o uso do aeródromo.


MARTA RIETH

Acessos Obras ficam na promessa O Estado pretendia concluir o plano de obras de pavimentação asfáltica entre cidades do interior até o fim deste ano. Seis rodovias da região estavam incluídas. De Capitão a Arroio do Meio, o acesso começou a ser pavimentado após 16 anos de espera. Segundo a Secretaria Estadual de Infraestrutura e Logística (Seinfra), a obra ficou paralisada devido a problemas financeiros da empresa Beter, responsável pelo serviço. Apesar disso, a empreiteira não abre mão do cumprimento do contrato. O estado fez uma concorrência neste ano e garantiu 30% dos 16,5 quilômetros de extensão da estrada. Depois da conclusão deste trecho, a tendência é que o asfaltamento pare. Entraves em contratos pactuados até 1998 emperram a conclusão das obras. Além do trecho entre Capitão e Arroio do Meio, ocorrem esses problemas

também com a pavimentação de Coqueiro Baixo a Nova Bréscia, pela ERS-425. Na VRS-811, de Travesseiro a Arroio do Meio, o asfaltamento está parado. Essas situações também são verificadas no asfaltamento da ERS-421, entre Boqueirão do Leão e Sério. Obra parada desde dezembro de 2013, depois que o saldo contratual esgotou, forçando a abertura de uma nova licitação para concluir o asfaltamento. Condição semelhante entre Forquetinha e Sério, também na ERS-421. Nas duas melhorias, cerca de 80% do cronograma foi concluído. Na ERS-424, entre Forquetinha a Canudos do Vale, a obra parou faltando apenas 200 metros a serem pavimentados. O embargo se deve à readequação do projeto, pois moradores exigiram a construção de uma ponte sobre o Arroio Araguari em vez de uma galeria. A alteração está em andamento.

Cidades com acesso de chão batido têm dificuldade em atrair investimentos privados. Situação cria dependência do setor primário e trava o desenvolvimento dos pequenos municípios.

Detalhe das obras ERS-482: Ligação entre Capitão e Arroio do Meio. São 16,53 quilômetros, investimento inicial previsto em R$ 15,95 milhões. ERS-425: Acesso entre Coqueiro

Baixo e Nova Bréscia. Trecho possui 9,6 quilômetros e tinha estimativa de R$ 9,03 milhões. VRS-811: Rodovia entre Arroio do Meio e Travesseiro, ligação por Vila Forqueta. Contrato inicial era de R$ 9,37 milhões. São 9,5 quilômetros.


A reabertura do Instituto de Oftalmologia, em Encantado, a inauguração da Unidade de Pronto-Atendimento (UPA), em Lajeado, e novos convênios firmados com hospitais menores representam avanços na saúde regional. As mudanças refletem na melhora dos serviços e no aumento do número de pacientes atendidos. Por outro lado, forçam prefeitos a assumirem parte do dever do Estado e União.

64 SAÚDE

União e Estado sobrecarregam orçamentos dos municípios JUREMIR VERSETTI/CHINELAGEM PRESS

M

ais da metade das cidades do Vale do Taquari investem acima de 20% da receita anual em saúde, quando o valor mínimo exigido é 15%. Ao mesmo tempo, a arrecadação se torna cada vez mais escassa. Os atendimentos aumentam e os custos também, mas os valores firmados com o estado e União continuam os mesmos. A defasagem da tabela SUS se mantém presente nas discussões. Mesmo com o ajuste da participação estadual, passando para 12% do orçamento, gestores reclamam da falta de critérios quanto à contribuição do governo federal. Este é o que menos repassa – cerca de 5% – e o que mais arrecada. Por não conseguir manter os serviços, muitos municípios veem as instituições fecharem, acarretando redução de leitos hospitalares. Só no último ano, houve a diminuição de 69 vagas. Ao todo, os 19 hospitais da região oferecem 1.094 leitos de internação, dos quais 797 são cadastrados pelo SUS. As cidades se mobilizam para manter as vagas e implantar novos serviços. Como alternativa contra a escassez de recursos, buscam pelo cofinanciamento dos convênios e aumento no repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Outra medida, sugerida pela 16ª Coordenadoria Regional de Saúde (CRS),

Maioria dos municípios aplica mais de

20%

do orçamento na saúde.

Defasagem da tabela do SUS do Estado e União força prefeitos a investirem mais em saúde do que prevê a legislação. Consequência é o corte em alguns atendimentos e insatisfação dos contribuintes gestores.

é a melhor distribuição das especialidades, evitando a competição por profissionais entre as instituições. Apesar da vinda de médicos de fora, a carência por especialistas continua. A busca por mais leitos de UTI e novos investimentos também.

Orçamento municipal saturado Os municípios assumem cada vez mais compromissos com a saúde, sobrecarregando os

orçamentos e inflando a receita. Para não desassitir determinados serviços, a maioria dos gestores investe mais de 20% do orçamento. Os valores ultrapassam o percentual exigido pela legislação nacional, de 15%. Este aumento no valor destinado à saúde compromete outros setores. “Por vezes, se deixa de investir em obras de asfalto, indústria e até mesmo na educação”, diz o presidente da Associação dos Municípios do Vale do Taquari (Amvat), Sidnei Eckert. Segundo ele, mesmo com o repasse de 12% do orçamento estadual à saúde, a defasagem dos serviços continua por conta da União. Esta contribui com metade

do investimento previsto na criação do SUS. “De 10% projetados, investe de 5 a 6%.” A defasagem dos empenhos dificulta a manutenção de programas como a Estratégia de Saúde da Família (ESF). De acordo com Eckert, cada uma dessas unidades tem um custo mensal de R$ 35 a R$ 40 mil. O governo federal contribui com R$ 9 mil, deixando de repassar o equivalente a R$ 132 mil anuais para cada uma. “Quando criado o serviço, o auxílio era de 50%. As despesas aumentaram, mas o convênio continua o mesmo”, reclama. Enfatiza o esforço feito pelos municípios, em investirem acima da cota exigida para manter os serviços.


RODRIGO MARTINI

Instituições lutam para se manter Conciliar receitas e despesas também aparece como principal dificuldade nas instituições de saúde. A demanda financeira e as exigências legais agravam a manutenção dos serviços. Para o presidente do Sindicato dos Hospitais Beneficentes, Religiosos e Filantrópicos e diretor do Hospital Ouro Branco de Teutônia, André Lagemann, mesmo com o avanço na destinação de verbas por parte do Estado, os hospitais continuam operando no vermelho quando atendem pelo SUS. Só neste ano, dois fecharam devido a dificuldades financeiras: Hospital Comunitário Santa Clara e Hospital São João, de Paverama. O primeiro não realizava procedimentos médicos pelo SUS desde outubro de 2013. Segundo o prefeito, Fabiano Rogério Immich, a falta de estrutura e a

redução dos valores repassados pelo estado motivaram a paralisação. Para não desativar por completo o prédio, construído em 1928, o município o transformou em uma clínica de geriatria particular. “Decidimos focar nessa especialidade para acompanhar a demanda da cidade e lugares vizinhos”, diz Immich. Paverama tomou a mesma decisão. Escolhas que, conforme Lagemann, são pertinentes ao momento vivenciado na saúde. “É utopia acreditar que em todos os hospitais sejam pequenos, médios ou grandes, teremos todas as especialidades disponíveis”, enfatiza. Relata a necessidade de hierarquizar os serviços, mantendo pelo menos o primeiro atendimento em instituições menores e reservando os casos de maior complexidade aos grandes centros.

Hospitais de Paverama e Santa Clara do Sul fecharam: 69 leitos a menos

Dificuldade regional Nem mesmo cidades maiores, como Lajeado, deixaram de sentir o impacto no orçamento municipal. O município encerrará o ano com 22% da receita à saúde. Conforme o secretário municipal, Glademir Schwingel, só nos atendimentos de urgência e emergência do Hospital Bruno Born (HBB) são investidos de R$ 4 a 5 milhões mensais. A implantação da UPA, também sobrecarregou o Executivo. Desde março, Schwingel relata a espera por recursos federais. O primeiro depósito ocorreu em outubro, no valor

de R$175 mil. A manutenção dos serviços só foi possível com recursos municipais e estaduais, este último somou R$ 2,1 milhões em sete meses. “Temos um déficit hoje de R$ 2,5 milhões no setor, devido aos recursos não repassados.” Para voltar ao equilíbrio financeiro, prevê alterações nos processos de trabalho, economizando onde for possível. Mesmo assim, estima investimentos semelhantes para 2015. “Saúde sempre foi prioridade, é impossível retroceder. Não temos como reduzir o que já é feito”, diz.


66 SAÚDE

Estado aposta no cofinanciamento O coordenador da 16ª Coordenadoria Regional da Saúde (CRS), Fabiano Merence Brandão, concorda com os gestores quanto à necessidade de aumento dos repasses por parte da União e na definição de especialidades junto aos hospitais. Ao mesmo tempo, aponta as dificuldades de gestão entre as causas de fechamento de instituições. Para mudar esse cenário, o coordenador frisa a busca pelo aumento do valor da Autorização de Internação Hospitalar (AIH) pelo SUS e aposta na criação de estratégias conjuntas com os hospitais. “É necessário o apoio do gestor, na construção de um plano operativo.” Este, conforme

ele, diz respeito à diferenciação dos serviços entre as instituições, evitando a disputa pelos mesmos profissionais. Brandão reconhece também a sobrecarga dos municípios. Uma das propostas do governo estadual consiste no aumento dos tetos dos contratos com os hospitais e na garantia do custeio de mais procedimentos como tomografias e cirurgias eletivas. A tendência é diminuir a participação dos municípios, limitando ao percentual mínimo de 15%, acredita. O cofinanciamento, de acordo com ele, também suprirá a defasagem da tabela SUS ao aumentar a taxa de auxílio. Com o maior comprometimento direto do

No último ano, 41 médicos estrangeiros chegaram para atender nos postos de saúde da região. Mesmo assim, municípios continuam com dificuldade para preencher espaço de especialistas.

estado com as instituições, prevê mais espaço para os municípios focarem na atenção básica. Relata ainda a ampliação dos benefícios no último ano, como a

entrega de veículos novos para o transporte de pacientes e a chegada de mais médicos, na busca pela qualificação dos serviços básicos oferecidos.


NOVEMBRO/2014 ANDERSON LOPES

67

Médicos cubanos elevam atendimentos Para tentar suprir a falta de médicos na atenção básica, o governo investe na parceria com outros países, como Cuba. De novembro de 2013 a março de 2014, só a região do Vale do Taquari recebeu 41 estrangeiros pelo Programa Mais Médicos. Estes, segundo Brandão, foram divididos em 25 municípios, possibilitando a implantação de mais 16 equipes de ESF. Entre os profissionais, está o clínico-geral cubano Richard Daudinot Marquez, 34. Formado há dez anos, atuou em outros países como a Venezuela, por seis anos, e no Paquistão, no terremoto de 2005. “Trabalhamos em Cuba e fora de lá para ajudar

o povo que precisa.” Por esse mesmo motivo, se mudou para Lajeado, onde atua no posto de saúde do Centro desde maio. O contrato tem prazo de três anos. Neste período, mora de aluguel com outros médicos em um espaço cedido pelo município. O convívio com os colegas facilita a aquisição de novos costumes e também a adaptação. Marquez, mesmo sem saber falar direito o idioma local, compreende tudo e arrisca no castelhano. A alimentação, segundo ele, é parecida com a da cidade natal, mudando apenas alguns hábitos peculiares do gaúcho, como o chimarrão. Entre as dificuldades da mis-

são, cita a saudade da família. A mulher, grávida de oito meses, permanece em Cuba. A visita ao país se restringe ao período de férias, previsto para março. Um esforço que, para ele, é recompensado pelo acolhimento da equipe de trabalho e pelo atendimento das pessoas necessitadas. Mesmo assim, relata uma certa resistência dos pacientes quanto a outras formas de tratamento. “Queremos reduzir a dependência por remédios e orientar práticas mais saudáveis, como uma boa alimentação, exercício físico e evitar situação de estresse”, alerta. Com uma estrutura adequada de trabalho e com o apoio da equipe, Marquez aposta na prevenção.

ANDERSON LOPES

Faltam especialistas Mesmo com os profissionais vindos de fora, a carência por especialistas em postos de saúde persiste. Alguns municípios como Teutônia, têm os atendimentos prejudicados. Desde 2010, a administração municipal busca pela contratação de médicos para manter as atividades nas quatro unidades de saúde. Mesmo com a chegada de três médicas cubanas em junho, o quadro continua restrito. As vagas temporárias tiveram baixa procura. Apesar da realização de concurso público, alguns candidatos reprovaram na prova e outros não quiseram assumir as vagas. Por isso parte das consultas foi remanejada para outras unidades e o município foi forçado a contratar de forma emergencial. Segundo o coordenador da 16ª CRS, Brandão, a dificuldade vivenciada por diferentes cidades do Vale resulta da concentração de profissionais nos grandes centros. Poucos formandos especialistas vêm pra região. A disputa salarial também influencia na procura, diz. Como alternativa, sugeri distribuir melhor

Instituto de Oftalmologia reabre O Centro de Oftalmologia de Encantado, fechado desde dezembro de 2012, voltou a funcionar neste ano. Acúmulo de procedimentos provoca filas na instituição, única da região a atender pelo SUS.

as especialidades e a busca pela criação de novos programas para atrair mais médicos.

Um dos avanços conquistados pela região neste ano foi a reabertura do Instituto de Oftalmologia, em Encantado. O prédio estava fechado desde dezembro de 2012, após a rescisão do contrato com o estado devido aos baixos repasses feitos pelo SUS. A articulação dos municípios, mais o cofinanciamento estadual de R$ 46 mil mensais e o limite de R$ 151 mil – pagos conforme produção – garantiram a reabertura da instituição. O atendimento retornou em setembro. Segundo o secretário-

-executivo do Consórcio Intermunicipal de Saúde do Vale do Taquari (Consisa), Nilton Rolante, só no primeiro mês foram mais de 950 pacientes atendidos. A equipe organizou um mutirão, para realizar mais de 150 cirurgias de catarata, acumuladas devido ao tempo de ausência dos serviços. Os serviços são integrais do SUS, abrangendo 37 municípios. Em média, o contrato estadual prevê 1,3 mil consultas mensais, 212 procedimentos cirúrgicos e 4,9 mil diagnósticos e exames.


68 SAÚDE

UPA alivia pronto-socorro do Hospital Bruno Born Desde março, a região conta com a primeira Unidade de Pronto-Atendimento (UPA), construída em Lajeado. São mais de cem funcionários atuando no local para atender uma média de 4,5 mil pessoas ao mês. A medida, segundo Schwingel, reduziu pela metade os atendimentos mensais no Setor de Emergência do HBB. Assim, o hospital consegue dar mais atenção aos casos de maior gravidade, enfatiza. Apesar da troca de contrato, dificuldades iniciais com a manutenção dos serviços e a contratação de pessoal, Schwingel relata a melhora dos atendimentos, oferecidos de forma integral. Com o recebimento de recursos federais e a continuidade dos repasses estaduais, o município estuda formas de ampliar a abrangência de pessoas atendidas, possibilitando convênios com outras cidades.

ANDERSON LOPES

A UPA, inaugurada neste ano, tem capacidade para 300 atendimentos médios diários. Hoje se restringe a Lajeado


O Vale aparece na oitava posição no estado em total de leitos de UTI. Há 31 estruturas disponíveis para usuários do SUS, contando as vagas adultas, pediatras e neonatais. A 16ª CRS estima mais 40 leitos adultos para os próximos quatro anos, almejados pelos hospitais de Encantado, Teutônia, Arroio do Meio e Taquari. O projeto mais avançado é do HBST, de Encantado. As obras para a construção do novo prédio iniciaram em junho, depois de 20 anos de mobilização. O custeio do novo complexo ocorre com recursos próprios da Rede São Camilo, somando um investimento inicial de R$ 4 milhões. Além dos dez leitos de UTI Adulta, a estrutura comportará o novo bloco cirúrgico, centro obstétrico, Central de Material Esterilizado (CME) e leitos de internação. Ao todo, serão oito pavimentos, totalizando cerca de 12 mil metros quadrados. A implantação dos serviços deve ocorrer em 2016. O Hospital Ouro Branco, de Teutônia, teve o projeto arquitetônico de dez leitos adultos aprovado há cerca de dois meses pela Vigilância Sanitária do estado. A obra custará R$ 3,5 milhões. No mesmo prédio, a entidade prevê novas áreas para o diagnóstico por imagem, urgência e

DIVULGAÇÃO

Hospitais investem em UTI

Em Encantado, Hospital Santa Teresinha iniciou a construção de novo prédio para a UTI neste ano. Local oferecerá dez novos leitos a partir de 2016. Além de UTI, estrutura abrigará novo bloco cirúrgico.

emergência, totalizando um investimento de R$ 8 milhões. Segundo o diretor do hospital, Lagemann, a construção depende da captação de recursos. Apesar de parte garantida pela Consulta Popular de 2013, a instituição pleiteia verbas federais e busca parcerias. Os projetos para dez leitos de UTI adulto de Arroio do Meio e Taquari, ambos enviados à Vigilância Sanitária do Estado, permanecem em análise. A diretoria do Hospital São José, de Arroio do Meio, estima o investimento de R$ 2 milhões para ampliação do espaço físico e compra dos equipamentos necessários. A obra visa também a ampliação da estrutura hospitalar, passando de 74 para cem leitos comuns.

Número de leitos reduz

Só no último ano, o fechamento de duas casas de saúde implicou diminuição de 69 leitos de internação no Vale. Ao todo, são 19 hospitais em funcionamento. Conforme dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), na área de abrangência da 16ª CRS, há 1.094 leitos disponíveis. Deste total, 797 são para usuários do SUS. Tendo como base a população regional, em torno dos 350 mil habitantes, o número corresponde a 2,3 leitos para cada mil habitantes. Índice superior ao ofertado no Rio Grande do Sul, inclusive lidera o ranking nacional, com 2,8 vagas. O HBB, de Lajeado, tem 200 leitos, dos quais 120 pelo sistema público. A casa de saúde de Estrela aparece na segunda colocação, com um total de 122 leitos, sendo 85 pelo SUS.

A partir do próximo ano, instituições de Teutônia, Arroio do Meio e Encantado, também têm projetos para ampliar o número de leitos de internação. O Hospital Beneficente Santa Terezinha (HBST) atingirá os cem leitos, exigidos para a implantação da Unidade de Terapia Intensiva (UTI). De forma paralela, a 16ª CRS relata a busca pela traumatologia de alta complexidade. Por enquanto, os atendimentos ocorrem no Hospital Universitário de Canoas. Este investirá em 2015 cerca de R$ 1,5 milhão para dez leitos de UTI e mais R$ 150 mil à área ambulatorial de ortopedia e traumatologia. “Eles dobrarão o número de consultas , chegando a cinco mil mensais”, diz Brandão. Segundo ele, as melhorias refletirão de forma direta na oferta dos serviços à região.


70 EDUCAÇÃO

Considerada um dos pilares para o desenvolvimento regional, a educação avança no Vale do Taquari com investimentos em diferentes esferas. Iniciativas no ensino básico trabalham com conceitos de pesquisa com metodologia científica e habilidades de inteligência emocional. Na educação superior, a Univates se destaca com a expansão do câmpus Lajeado e a criação do Parque Tecnológico (Tecnovates). A instalação de uma unidade do Instituto Federal Sul-rio-grandense (IFSul) amplia a oferta de formação técnica com a intenção de suprir a falta de mão de obra especializada na região.

Avanço no ensino eleva profissionalização I

nvestimentos na educação do Vale do Taquari se intensificam. Conforme o censo de 2010, cerca de 11 mil pessoas são analfabetas, colocando a região entre as de menor taxa de analfabetismo do Brasil. O número corresponde a 3,3% dos 328 mil habitantes verificados no levantamento. No Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), divulgado em setembro, a região apresentou notas acima da média nacional. Porém apenas três municípios alcançaram as metas estabelecidas pelo MEC nas duas faixas etárias verificadas, o que demonstra a necessidade de maior atenção ao ensino básico. O Centro Universitário Univates lidera iniciativas de pesquisa, ensino e extensão com a criação de novos cursos e aplicação de R$ 95 milhões no câmpus de Lajeado. Com mais de 12,7 mil alunos matriculados em 2014, a instituição inaugurou o primeiro curso de Medicina do Vale e prepara a primeira turma de Odontologia para 2015. Entre os investimentos no câmpus está a construção de um centro cultural com teatro, biblioteca e espaço para exposições e um complexo esportivo. O novo prédio do Parque Tecno-

Taxa de analfabetismo está entre os menores do Brasil, com

3,3%

da população do Vale.

ANDERSON LOPES

Pesquisas nas áreas de alimentos, ambiente e energias renováveis são realizadas nos laboratórios do Tecnovates. Com foco no desenvolvimento de produtos, atende empresas criadas na incubadora da universidade e negócios regionais estabelecidos no mercado.

lógico atende desde empresas criadas na incubadora da universidade até negócios regionais já estabelecidos. A profissionalização cresce com o Programa Nacional do Ensino Técnico (Pronatec), que oferece formação intermediada

por Univates, Senac e Senai. Faz parte deste processo a instalação de unidade do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-rio-grandense (IFSul), em Lajeado. A região também experimenta novas opções na educação básica. O Colégio Evangélico Alberto Torres (Ceat) desenvolve o projeto Aluno pesquisador, no qual introduz a metodologia científica na escola das Séries Iniciais ao Ensino Médio.

Em Estrela, a rede municipal de ensino instituiu o Programa Escola da Inteligência com base nas teorias do psiquiatra e escritor Augusto Cury. O método desenvolve habilidades socioemocionais e pensamento crítico por meio de situações do cotidiano dos estudantes. Essas e outras iniciativas trazem perspectivas animadoras para o desenvolvimento da região. Os resultados serão percebidos ao longo das próximas décadas.


UNIVATES

Valor arrecadado com mensalidades da Univates é investido em estrutura. Valorização do câmpus visa aumentar a utilização do espaço e a participação da comunidade

Crescimento da Univates abre portas para o desenvolvimento tecnológico A expansão da Univates coloca a região em destaque no estado. Com mais de cem cursos oferecidos, entre graduações, pós-graduações, técnicos e extensões, a instituição cresce em qualidade e investe em estrutura. A maior parte com recursos próprios, provenientes da mensalidade paga pelos alunos. Outros projetos incluem recursos federais ou do estado. Entre eles está o Parque Tecnológico, que somou R$ 23 milhões em investimentos, incluindo prédio e laboratórios de alta complexidade. Ao todo, R$ 7 milhões foram arrecadados nas esferas federal e estadual. A estrutura fortalece os quase quatro anos de trabalho do Tecnovates e permite a ampliação da pesquisa partilhada com empresas da região.

No intuito de desenvolver tecnologias de ponta, a instituição busca parcerias com universidades e institutos internacionais. O processo incluiria pesquisas conjuntas e intercâmbio de aluno. “Até o momento as maiores possibilidades se encontram na Europa, principalmente, na Alemanha, e na Coreia do Sul”, ressalta o reitor, Ney Lazzari. O foco na produção de alimentos, setor que mais emprega no Vale, permite novas perspectivas na cadeia produtiva regional. Para o reitor, as empresas locais podem aproveitar lacunas no mercado de frangos, suínos e laticínios, hoje, preenchidas por marcas internacionais. Para isso, é preciso investir em pesquisa e desenvolver tecnologia, defende. De acordo com o coordenador do Tecnovates, Eloni Salvi, o custo

da inovação é alto. Para as empresas, o conhecimento gerado na universidade, a infraestrutura

de laboratórios e os recursos humanos do parque aumentam as chances de sucesso.

Infraestrutura O Tecnovates tem três prédios. Dois deles dedicados aos laboratórios nas áreas de alimentos, ambiental, energias renováveis e salas de treinamento com espaço para eventos. O prédio principal tem 3,2 mil metros quadrados divididos em cinco andares. O primeiro deles é utilizado para gestão, lanchonetes, auditório e salas de reuniões. Os outros quatro são aproveitados por empresas. Afora aquelas já consolida-

das no mercado, o Tecnovates também abriga uma incubadora empresarial. Baseada no desenvolvimento de empresas que tragam propostas inovadoras à região, acompanha e oferece suporte técnico aos empreendedores. Em seus dez anos de atuação, a Inovates garantiu o desenvolvimento de diversos negócios no Vale, abrangendo áreas de alimento, automação industrial e tecnologia da informação, acentua Salvi.


72 EDUCAÇÃO

Univates investiu mais de R$ 95 milhões em cinco anos O crescimento da Univates só se sustenta graças ao caráter comunitário da instituição. Todo o recurso é reinvestido em infraestrutura. Dos R$ 95 milhões aplicados nos últimos cinco anos, R$ 35 milhões saíram do caixa da Univates e R$ 30 milhões foram financiados pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Social. Outros R$ 30 milhões ainda dependem de captação.

Parte deste recurso se reverteu para a construção do Centro Cultural. A estrutura de dez mil metros quadrados custou R$ 45 milhões. Abriga teatro com capacidade para 1.173 pessoas, biblioteca com 300 mil livros e sistema automatizado de empréstimo e devoluções, área para convivência, alimentação e exposições. Outra parte visível da expansão da Univates é o estádio olímpico construído junto ao complexo

esportivo. Com arquibancada capaz de receber 2,3 mil pessoas, tem campo de futebol com medidas oficiais, cabines para a imprensa e pista de atletismo de padrão certificado pela Associação Internacional de Federações de Atletismo. As obras custaram R$ 5,5 milhões. A política de valorização do câmpus visa aumentar a utilização do espaço físico da universidade e o grau de participação

da comunidade na instituição. Moradores podem usufruir da estrutura com o pagamento de uma taxa de R$ 45 a cada seis meses, avisa o reitor. O cadastro dá acesso a serviços antes restritos a alunos, professores e funcionários como a biblioteca, laboratórios de informática e o Bicivates, projeto que prevê o compartilhamento grátis de bicicletas por até quatro horas.

ANDERSON LOPES

Alunos Graduação

9.559 Pós graduação

579 Técnico

1.391 Extensão

1.173 Total Centro Cultural abriga anfiteatro com capacidade para 1.173 pessoas e biblioteca com 300 mil títulos.

12.702 fonte: www.univates.br

Medicina e Odontologia criam novo conceito para a instituição No primeiro semestre, a Univates deu início à primeira turma de Medicina do Vale do Taquari. Após prestarem vestibular especial em janeiro, 25 alunos começaram o primeiro dos 12 módulos da formação. Em 2015, será a vez do curso de Odontologia. Os dois cursos têm a mesma característica: buscam suprir

o déficit desses profissionais na atenção básica. Conforme Lazzari, a liberação de novos cursos na área da saúde partiu da falta de profissionais dispostos a atender no Sistema Único de Saúde (SUS). O reitor esclarece que a formação inclui a “atenção básica” desde a primeira semana de aula. “Vamos aos bairros para

conhecer os postos de saúde. A partir daí montar o que será trabalhado em sala de aula. É mais envolvido com o dia a dia da população, com o objetivo de formar profissionais diferentes, assegura. Para incentivar a atuação na atenção básica, o governo federal concede Fies de até 100% da mensalidade aos alunos. Se depois de formado o

profissional optar por trabalhar no SUS durante oito anos, por 20 horas semanais, fica isento de pagar o financiamento. O curso de Odontologia, previsto para começar no primeiro semestre do ano que vem, apresenta o mesmo viés, relata Lazzari. Os profissionais estarão capacitados para integrar as equipes de saúde da família.


NOVEMBRO/2014

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Formação técnica tenta combater falta de mão de obra ANDERSON LOPES

Por ter forte atividade industrial e comercial, o Vale do Taquari sofre com a falta de mão de obra. A agência do Sine de Lajeado contabiliza mais de 315 vagas em todos os setores. Sem trabalhadores locais, a região emprega mais de mil imigrantes, a maioria do Haiti e Senegal. A ausência de técnicos especializados consiste na principal dificuldade para ampliação e desenvolvimento das atividades. Criado em 2011, pelo governo federal, o Pronatec visa preencher essa lacuna. A partir de 2012, foram oferecidas mais de três mil vagas em cursos técnicos de curta duração em instituições como o Senac, Senai e Univates. A consolidação do programa inclui a expansão dos institutos federais de formação, como o IFSul, fundado em 1909, com reitoria em Pelotas. No segundo semestre deste ano começaram as aulas do IFSul em Lajeado. A instituição oferece ensino gratuito em áreas defini-

das a partir da demanda regional. O investimento inicial é de R$ 10 milhões em recursos federais. O valor inclui construção do câmpus, compra de equipamentos e contratação de servidores. As obras estão previstas para serem entregues em fevereiro de 2015. Hoje, as salas de aula e a estrutura administrativa da unidade ficam na Escola Campestre. São 25 alunos e 17 funcionários, entre docentes e técnicos administrativos. O curso técnico de Administração e Gestão de Negócios está em andamento e tem duração de um ano e meio. Recebe alunos com o Ensino Médio concluído. Com a inauguração da estrutura própria o Instituto terá capacidade para receber 1,2 mil alunos. Contará com 60 docentes e 45 técnicos administrativos contratados, além de 45 funcionários terceirizados. Haverá oferta de cursos de automação industrial e processamento de alimentos, integrados ou subsequentes ao Ensino Médio.

Conclusão das obras do câmpus está prevista para fevereiro do ano que vem

De acordo com o diretor-geral do câmpus Lajeado, Luís Afonso da Fonseca, a expansão da rede técnica busca fomentar o desenvolvimento de diferentes regiões

do Estado. Em Lajeado, a escolha dos cursos se deu por meio de audiências públicas com a participação de estudantes, líderes e entidades regionais.


74 EDUCAÇÃO

Educadores buscam novos conceitos de ensino Despertar o interesse de alunos da educação básica e garantir o desenvolvimento da educação em meio a onda de aparelhos eletrônicos e redes sociais é um desafio para professores e escolas. Com vasta informação e elementos de distração disponíveis, educadores estudam novas formas de ensinar crianças e adolescentes. No Colégio Evangélico Alberto Torres (Ceat), estudantes aprendem desde cedo a trabalhar com metodologia científica. Implementado há dois anos, o projeto Aluno Pesquisador incentiva e dissemina por todas as séries o uso de

normas metodológicas aplicadas no Ensino Superior. Os alunos escolhem uma temática, depois são orientados por professores no desenvolvimento do trabalho. A conclusão é submetida a uma banca de avaliadores. Aulas de dicção e oratória

Alunos do Colégio Evangélico Alberto Torres (Ceat) desenvolvem pesquisas com metodologia científica no Projeto Aluno Pesquisador. Iniciativa mobiliza comunidade escolar.

ANDERSON LOPES

auxiliam na apresentação. De acordo com a coordenadora pedagógica do Ceat, Rosângela Maciel, a formação continuada de professores permitiu o começo do projeto. O trabalho segue diferentes estratégias, conforme faixa etária e proposta pedagógica de cada nível de ensino. O projeto começa ainda no berçário, passando por todas as séries do ensino. Foi necessário trabalhar a maneira como iríamos introduzir a pesquisa em cada nível, frisa. Na educação inicial os conceitos e o processo de alfabetização são aplicados simultaneamente no cotidiano dos alunos. A ideia é que possam buscar as respostas para suas próprias perguntas. A estratégia incentiva os estudos temáticos, não necessariamente ligados a conteúdos da sala de aula, mas que despertam o interesse dos alunos. Da 5a a 8a séries os estudantes divididos em duplas ou trios começam a trabalhar com metodologia da pesquisa e a receber

orientações de professores. Criam um objeto, situação problema e justificativa. No 1o e 2o anos do Ensino Médio o trabalho também é apresentado previamente para uma comissão de professores. “Apresentam um pré-projeto, da mesma forma que ocorre nas universidades”, diz Rosângela. Uma vez por ano é realizada apresentação das pesquisas. O evento reúne toda a comunidade escolar. Conforme Rosângela, o envolvimento dos alunos e familiares é cada vez maior. Neste ano parte dos trabalhos foram inscritos na Feira de Ciências da Univates. Para o diretor do Ceat, Rodrigo Maurício Ulrich, trabalhar com iniciação científica acaba sendo um diferencial no currículo dos alunos, além de servir como preparação para os desafios que serão enfrentados no Ensino Superior. Ao final do projeto, todos recebem um certificado e a participação consta no boletim.

Método trabalha a inteligência emocional nas escolas de Estrela A rede municipal de educação de Estrela inova a metodologia de ensino. Instituto no início do ano, o Programa Escola da Inteligência (EI) insere no currículo aulas que instigam o pensamento crítico e controle de emoções. Uma vez por semana os estudantes têm aulas de educação emocional. São incentivados a trabalhar soluções para diferentes situações do cotidiano por meio de uma série de histórias, perguntas e debates. O programa desenvolve ferramentas como expor e não impor ideias, trabalhar perdas e frustrações e se colocar no lugar dos outros. A metodologia acolhe alunos, professores e fa-

mílias e é apoiada por materiais impressos, recursos de multimídia, palestras e ferramentas de educação a distância. O projeto é fundamentado na Teoria da Inteligência Multifocal, desenvolvida pelo psiquiatra e escritor Augusto Cury e envolve a formação de mais de 30 professores da rede. O investimento municipal do programa é de R$ 230 mil ao ano e inclui materiais, formação e assistência. Em média, são R$ 158 por aluno. Mais de 1,5 mil alunos, do Jardim ao 5º ano do Ensino Fundamental participam da iniciativa, que deverá ser ampliada para os 6° e 7° anos em 2015.


A região apresentou notas acima da média nacional no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Mesmo assim, a maioria dos municípios teve desempenho abaixo das metas estipuladas pelo MEC. O índice foi divulgado em setembro e é referente a 2013. Os melhores resultados foram

obtidos nos 4° e 5° anos, nos quais 19 cidades alcançaram a meta. No último levantamento, em 2011, 12 municípios atingiram o objetivo. Os anos finais do ensino básico tiveram resultados piores. Apenas cinco cidades chegaram ao índice estabelecido pelo MEC, contra 11 em 2011.

ANDERSON LOPES/ARQUIVO A HORA

Ideb e analfabetismo

Índice de analfabetismo do Vale do Taquari está entre os mais baixos do Brasil


O Vale do Taquari atinge índice histórico de criminalidade. Enquanto órgãos de segurança tentam conter o avanço do tráfico de drogas, uma pessoa é assassinada a cada seis dias na região. Celas dos presídios seguem superlotadas, mesmo com a inauguração de uma nova penitenciária.

76 SEGURANÇA

Taxa de homicídios expõe mazelas da segurança pública RODRIGO MARTINI

Maioria dos assassinatos ocorridos neste ano na região estão ligados a disputa entre traficantes. Polícia encontrou os autores em 70% dos casos

D

esde janeiro, 51 pessoas foram mortas no Vale do Taquari – aumento de 300% se comparado a

Só em Lajeado foram assassinadas

32 pessoas neste ano

2013. Com 32 assassinatos nestes primeiros dez meses, Lajeado figura entre as cidades mais violentas do Estado. Investigações policiais revelam que parcela dos crimes tem ligação com o tráfico de drogas. A polícia tenta dar resposta. Operações resultaram na detenção de 21 suspeitos de participação nas mortes. Mais de 80 armas foram apreendidas. De acordo com a delegada re-

gional da Polícia Civil (PC), Elisabete Barreto Müller, essas operações auxiliaram na elucidação de 70% dos assassinatos cometidos na região. Enaltece o trabalho da perícia criminal. Cita como exemplo o homicídio do casal Dullius, ocorrido em junho, em Lajeado, e desvendado com provas técnicas poucos dias depois. Elisabete acrescenta que está ocorrendo uma cooperação entre policiais de diferentes regiões do

Brasil para encontrar criminosos que fogem. Como no caso de um acusado de assassinato capturado em Foz do Iguaçu, no Paraná, em outubro. Para a delegada, o aumento no número de mortes tem relação com a ausência de valores na sociedade. Esse é um problema a ser enfrentado por todos e não apenas pelas forças policiais, supõe Elisabete. Já para o delegado Sílvio Huppes, a criminalida-


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RODRIGO MARTINI

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de passa também por questões sociais, de saúde e educação, que não deveriam ser problema em uma região próspera como o Vale. Apesar do elevado índice de assassinatos, o número de latrocínios (roubos seguidos de morte) está controlado. Na cidade com mais homicídios no Vale, Lajeado, há 24 meses não acontece nenhum caso. Apesar da ofensiva dos órgãos de segurança para coibir a venda de drogas, distribuição e consumo mantêm o comércio

Homicídios no Vale 2014(*)

2013

51 17 2012

2011

26 23 (*) até o fim de outubro

Tráfico avança Prisões por venda de drogas e apreensões de entorpecentes aumentam sem haver uma proporcional queda no consumo e tráfico. Estes continuam a desafiar as autoridades. No último ano, 21 traficantes foram detidos em toda a região. Nos três primeiros meses de 2014, chegou a 31. O número de ocorrências por posse de entorpecentes cres-

ce a cada ano Em 2013, 261 pessoas assinaram Termos Circunstanciados por terem sido flagrados com drogas. Há 11 anos, foram 45 ocorrências desse tipo. A polícia identifica os pontos, prende traficantes e retira entorpecentes de circulação. Ainda assim, a distribuição e o consumo não param de crescer. O tráfico é o combustível para

outros crimes, especialmente os patrimoniais e os contra a vida, constata o delegado Huppes. Os Estados Unidos, país que mais investe no combate ao narcotráfico, começa a questionar o modelo repressivo. “Mesmo com bilhões de dólares investidos e cooperação nos países produtores, ainda é possível adquirir drogas em qualquer cidade americana”, lembra Huppes.


78 SEGURANÇA

Socióloga questiona modelo Conforme a socióloga e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Letícia Maria Schabbach, a legislação antidrogas estabelecida em 2006, no Brasil, possibilita o aumento de prisões, mas não impacta na dinâmica das organizações envolvidas com o tráfico. Tira de circulação indivíduos que serão logo substituídos por outros na hierarquia criminal, adverte. A lei aumentou a pena para traficantes e reduziu a dos usuários, mas não especifica circunstâncias ou quantidade que diferencia um do outro. “A definição é subjetiva e fica a cargo das autoridades policiais e judiciais”, crê. Para Letícia, medidas ousadas podem ser uma resposta ao modelo tradicional. Destaca o programa que legalizou a maconha, no Uruguai, mantendo a produção e a distribuição sob controle governamental. Segundo ela, a proposta tem dois eixos. Um deles é o da saú-

de, que oferece tratamento aos usuários e trabalha a prevenção ao consumo. Outro é o da segurança pública, que busca acabar com os rendimentos e poder dos traficantes. A delegada Elisabete tem visão oposta. Acredita que legalizar as drogas seria pior. Os traficantes se reorganizariam para oferecer entorpecentes a preços mais acessíveis que os estabelecimentos autorizados, opina a delegada.

Presídios estão abarrotados Impedir a incidência em crimes é um dos caminhos para a manutenção da segurança pública. Bem como tirar de circulação pessoas que cometem delitos de grande potencial ofensivo. Mas o inves-

O Presídio Estadual de Lajeado está superlotado há anos. Autoridades locais e comunidade chegaram a propor de construir uma nova penitenciária, mas projeto não avançou. Complexo atual tem problemas estruturais graves. As celas são insalubres. Diante do quadro, o Judiciário e o Ministério Público, estudam a interdição da penitenciária.


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tância, a Promotoria ameaçou interditar o prédio, em setembro. Na época, o promotor da Vara de Execuções Criminais, Éderson Vieira, afirmou que pelo menos 60% do funcionamento do presídio apresentava ilegalidades. A inauguração de uma nova unidade em Venâncio Aires

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reduz a superlotação, mas só mitiga o problema. Ao todo, 130 vagas devem ser ocupadas por detentos que, atualmente cumprem pena em Lajeado. Outros 200 presos serão transferidos de Porto Alegre e região metropolitana. De Santa Cruz do Sul sairão mais 70 encarcerados.

A busca pela reinserção dos detentos

timento na construção de novas penitenciárias ou na ampliação das existentes não acompanha o ritmo do crescimento no número de condenações. O resultado é a superlotação dos cárceres, que no Estado resulta intervenções judiciais. A medida mais radical ficou por conta da decisão de implodir o Presídio Central, em Porto Alegre. O Conselho Nacional de Justiça determinou a

Em Arroio do Meio, a integração do Judiciário, administração do presídio, poder público e sociedade civil permitiu reformas na penitenciária. Número reduzido de apenados facilita a administração. Entre as estratégias para manter o controle, não aceitam criminosos de alta periculosidade ou envolvidos com o crime organizado. Nos últimos anos, ampliaram a estrutura do presídio e oferecem espaços de recreação e trabalhos aos presos. Muitos conseguem empregos em fábricas do próprio município e só dormem na penitenciária.

desocupação da penitenciária, em junho deste ano. Dentre os motivos apontados, estão riscos de incêndio, superlotação, insalubridade e o domínio de facções criminosas. Em Lajeado, a situação não é tão temerária. Porém lida com um universo de mais de 580 presos. Destes, cerca de 380 cumprem regime fechado, em um complexo com capacidade estipulada em 122 vagas. Diante da circuns-

Para evitar que a penitenciária de Venâncio Aires tenha os problemas das demais, a Susepe pretende adotar gestão diferente. Com estrutura dividida em quatro módulos separados, a construção facilita o controle dos detentos. Além disso, não serão aceitos condenados envolvidos com o crime organizado, como em Arroio do Meio. Lá, o índice de reincidência é mínimo. De acordo com o diretor, Carlos Sandoval Zachzenski, a penitenciária abriga de 35 a 40 presos no regime fechado e 15 no semiaberto. Todos trabalham e estudam, recebem assistência psicológica e à saúde. Ocorrem celebrações de 11 diferentes opções religiosas, em acordo com a Constituição.

"Aqui são preparados para voltar para a comunidade de maneira melhor do que entraram", afirma Zachzenski. Para o diretor, a recuperação é facilitada pelas características da região. "Em outros presídios há problemas com tráfico de drogas, quadrilhas, assaltantes e homicidas, que não encontramos aqui", afirma. Não misturar condenados por crimes leves com os participantes de facções criminosas constitui parte essencial da estratégia. Assim como a colaboração da comunidade, que garante a realização de obras e a integração dos presos na sociedade. "Temos empresários que dão emprego a detentos e ex-presidiários, o que é fundamental para que mudem de vida."


80 SEGURANÇA

BM amarga quadro defasado A polícia gaúcha enfrenta um dos piores períodos no que tange ao número de servidores, com 13 mil homens a menos do necessário. A defasagem no efetivo alcança a casa dos 37%, a pior das últimas três décadas. O quadro funcional reúnem cerca de 21,8 mil PMs, tropa semelhante a existente no começo dos anos 80. Enquanto isso, a população do Rio Grande do Sul aumentou quase 40%. E a criminalidade, passou a outro patamar. “Naquela época, recebíamos chamados de toca-fitas sendo furtados dos carros. Hoje, de criminosos com armas mais avançadas do que as nossas. E para piorar, temos menos policiais nas ruas”, aponta um militar do Vale do Taquari. Durante a realização da Copa do Mundo de futebol, a Secretaria de Segurança Pública do Estado (SSP) convocou dois mil policiais do interior para atuar na segurança na Região Metro-

politana. Mesmo sob repúdio de líderes regionais, quase 40 PMs do Vale do Taquari foram à Capital. Logo após o retorno a região, nova convocação. Desta vez, para para aumentar a sensação de segurança dos porto-alegrenses. As convocações ocorrem mesmo que quartéis do Vale do Taquari também amarguem déficit de servidores. Em Lajeado, por exemplo, o Programa Polícia Comunitária ainda não está com o quadro completo. Inaugurado em fevereiro, tem apenas nove dos 20 PMs necessários. Agrava o problema a redução na cota de horas extras enviada pela SSP ao Comando Regional de Policiamento Ostensivo (CRPO). Por intermédio da chefia geral da BM, chega cada vez mais reduzida. Os cortes seguem desde o fim do primeiro semestre e, em outubro, atingiram a margem dos 30%. A medida causa ônus ao policiamento e a serviços extraordinários, entre

Assim como no resto do Estado, número de soldados no Vale do Taquari está aquem do necessário.

eles, a realização de patrulhas nos municípios. O governo gaúcho acena promete amenizar as dificuldades. Concurso público realizado neste ano trará 1,6 mil novos servidores para a BM e 400 para o

Corpo de Bombeiros. O número ainda é considerado pequeno, frente a ausência de policiais nas cidades gaúchas. O desafio ao Vale é garantir que ao menos parte desses policiais sejam lotados na região.


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“É urgente a ampliação de alternativas aos presídios”, diz pesquisadora Doutora em Sociologia e professora do Programa de Pós-graduação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Letícia Maria Schabbach, integra o Grupo de Pesquisa Violência e Cidadania da universidade. Formada em 1995, a equipe de 26 pesquisadores elabora estudos sobre a relação entre Estado e sociedade, prestando consultorias aos órgãos de segurança pública gaúchos. O grupo também integra as discussões nacionais que resultaram na criação da Agenda Prioritária da Segurança Pública. Direcionado aos presidenciáveis, o estudo aponta uma série de medidas para equacionar as questões da segurança no Brasil. Entre as propostas está a reorganização do sistema prisional, com prioridade às penas alternativas ao encarceramento.

A Hora - Como você avalia o sistema prisional brasileiro? Letícia Maria Schabbach - A situação é caótica, de crise permanente e insolúvel. O cárcere tem o papel de punir e ressocializar. A despeito da previsão legal, o aumento da população carcerária, a falta de investimentos humanos e materiais nos presídios, e a restrição dos investimentos em políticas sociais terminam por impedir a ressocialização. Existe um movimento de crescente punitivismo

penal e ampliação do encarceramento que rechaça qualquer intenção e prática de reabilitação dos presos e de observação de seus direitos. A prisão não deixa de fabricar delinquentes, pelo tipo de existência que faz os detentos levarem. Por que isso acontece? Letícia - Ainda que as evidências demonstrem o fracasso em punir, corrigir e eliminar atos contrários à ordem convencional a prisão ainda cumpre um papel

na sociedade, pois permanece e se expande. Ao produzir e tornar manuseável a delinquência, se torna um instrumento de poder e dominação. Não há natureza criminosa, mas jogos de força que, segundo a classe dos indivíduos, os conduzirão ao poder ou à prisão. A reincidência prisional demonstra a eficácia deste instrumento. Quais crimes resultam em cárcere? Letícia - As tipificações mais frequentes entre os presos são as dos crimes contra o patrimônio e do tráfico de drogas, especialmente, o de menor escala. Agências do Sistema de Justiça Criminal têm focado sua ação preferencialmente sobre tais delitos, revelando a estruturação para reprimir a chamada criminalidade comum. Existe uma lógica discriminatória que perpassa todo o sistema, vigiando e punindo, com mais vigor, determinados delitos e grupos sociais, enquanto oculta tantos outros. Os

crimes de “colarinho branco” são praticados por grupos e indivíduos favorecidos. Mesmo nas raras vezes em que chegam ao conhecimento da justiça raramente são processados e punidos. Quais políticas públicas seriam viáveis? Letícia - Alguns estabelecimentos prisionais têm procurado ampliar as atividades laborativas, formativas, esportivas e recreativas, visando a garantia de direitos e a preservação de um espaço de convivência respeitável em seu interior. Além da necessária redução dos efeitos perversos das prisões, é urgente a ampliação das alternativas à pena privativa de liberdade. O encarceramento deve ser aplicado apenas em casos absolutamente necessários, de perigo real à sociedade. Ademais, é preciso agir sobre as múltiplas causas do crime, através de políticas de prevenção multissetoriais e com a participação da sociedade.




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