Nª 131

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upado

Universidade Federal de Uberlândia

Universidade Federal do Espirito Santo

Os estudantes dizem não a Temer

Universidade Federal de Viçosa

Universidade Federal do Paraná

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Distribuição Gratuita

o Piauí

e Federal d

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ral ade Fede Universid do Pará

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Estudante constituição

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Estudantes e professores em Belo Horizonte

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Universidade Federal do Rio Grande do Sul Universidade Federal da Bahia

UNB ocupada

Editorial: O governo Temer, fruto de um golpe das elites, mostrou desde o início seu desprezo pela educação. Graças à antiga PEC 241, hoje PEC 55, que deve ser a bíblia de sua gestão, cerca de R$ 500 bilhões serão retirados dos programas educacionais. As verbas para o ensino primário, médio e universitário, deverão ficar congeladas pelos próximos 20 anos, ignorando até mesmo o aumento da população e a crescente longevidade dos brasileiros. Essa política lesiva ao conhecimento teria de provocar a reação dos mais prejudicados, os jovens de todo o Brasil. São eles que estão de Norte a Sul, no quadro da crise

NESTA : O EDIÇÃ

Universidade Federal de Santa Maria

Ano 16 - Nº 131 - Dezembro 2016

geral que domina o País, denunciando a agressão que o atual governo pretende praticar contra a educação. Até o encerramento desta edição, 204 universidades e faculdades, além de mais de 1.000 escolas em 23 Estados, encontravam-se ocupadas pelos estudantes, entre elas a PUC Minas, a primeira instituição privada a aderir ao movimento. Eles protestam também contra a forma pela qual assunto tão relevante é tratado em Brasília. O governo em nenhum momento procurou ouvir a sociedade, principalmente os estudantes, professores e especialistas. Foi uma decisão discricionária, adotada por um governo sem voto, desacreditado perante a opinião pública, que está tendo a resposta mais do que merecida. Leia na pag. 2

Lula entrevistado por Oliver Stone - Pag 12 Emir Sader Leonardo Boff José Maria Rabelo Ângela Carrato Mauro Santayana Carlos Nicodemos Reimont Ricardo Rabelo Agamenon de Oliveira Guilherme Boulos Jandira Feghali Márcio Bueno


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Editorial

Os estudantes dizem não a Temer O Brasil, que seria o último país da América Latina a abolir a escravidão, foi também dos últimos a criar uma universidade. As nossas elites nunca se interessaram pela educação de seu povo. Para elas, bastavam os colégios particulares, caros e quase sempre religiosos, onde estudavam seus filhos, e depois as universidades no exterior, como as de Coimbra e de outras cidades da Europa. O ensino público começou a valer, assim mesmo para uma minoria da população, com os inícios da República. Só no primeiro governo de Vargas, surgido na Revolução de 30, foi que passou a merecer maior atenção. Até hoje estamos entre as nações com os mais baixos índices educacionais. Nossas taxas de analfabetismo, o total e o funcional, envergonham qualquer país medianamente desenvolvido. A última pesquisa da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), publicada na semana passada, coloca o Brasil nas piores posições, figurando por exemplo em 65º lugar no ensino da matemática entre os 70 países pesquisados. Os governos de Lula e Dilma empreenderam um grande esforço para reverter esse quadro aviltante. O Pronatec e o Universidade Para Todos foram símbolos desse esforço de democratização do ensino técnico e universitário, possibilitando o ingresso nas escolas superiores de setores que antes não tinham acesso a elas, como os pobres e os negros. O governo Temer, fruto de um golpe das elites, mostrou desde o início seu desprezo pela educação. Graças à antiga PEC 241, hoje PEC 55, que deve ser a bíblia de sua gestão, cerca de R$ 500 bilhões serão retirados dos programas educacionais. As verbas para o ensino primário, médio e universitário, deverão ficar congeladas pelos próximos 20 anos, ignorando até mesmo o aumento da população e a crescente longevidade dos brasileiros. Essa política lesiva ao conhecimento teria de provocar

a reação dos mais prejudicados, os jovens de todo o Brasil. São eles que estão de Norte a Sul, no quadro da crise geral que domina o País, denunciando a agressão que o atual governo pretende praticar contra a educação. Até o encerramento desta edição, 204 universidades e faculdades, além de mais de 1.000 escolas em 23 Estados, encontravam-se ocupadas pelos estudantes, entre elas a PUC Minas, a primeira instituição privada a aderir ao movimento. Eles protestam também contra a forma pela qual assunto tão relevante é tratado em Brasília. O governo em nenhum momento procurou ouvir a sociedade, principalmente os estudantes, professores e especialistas. Foi uma decisão discricionária, adotada por um governo sem voto, desacreditado perante a opinião pública, que está tendo a resposta mais do que merecida. As elites e seus representantes atuais, entretanto, não aprendem. Em vez de dialogar com os manifestantes, preferem como sempre mandar a polícia agir em seu lugar. É o que está acontecendo com a desocupação das escolas a manu militari, como nos

As ocupações das escolas, envolvendo mais de 200 delas, estão mostrando aos atuais governantes, assaltantes do poder, que eles não são os donos do Brasil. Os estudantes exigem ser ouvidos, na defesa de uma educação de qualidade e mais democrática. piores tempos da ditadura. Mas os estudantes estão demonstrando que a juventude sabe o caminho a seguir, o da luta consciente pelos seus direitos. Qualquer que seja o resultado imediato das ocupações, já deram seu recado, fazendo ver a esses governantes, assaltantes do poder, que eles não são os donos do Brasil.

Onde encontrar: Associação Brasileira de Imprensa, Sindicato dos Jornalistas do Rio, São Paulo e BH, Ordem dos Advogados do Brasil, Sindicato dos Petroleiros, Escola de Comunicação, Instituto de Economia, Instituto de Filosofia, Escola de Serviço Social, Escola de Música, Instituto de Psicologia, Fórum de Ciência e Cultura, Faculdade de Direito, faculdades de Geografia, Geologia, Engenharia, Matemática, Química, Física, Meteorologia, Letras, Medicina, Enfermagem, Educação física, alojamento estudantil do Fundão, Coppe (UFRJ), UERJ, UFF (Campus Gragoatá e Praia Vermelha), Café Lamas, Fundição Progresso, Cordão da Bola Preta, Botequim Vaca Atolada, Bar do Gomez, Bar do Serginho, Bar do Mineiro, Casarão Ameno Resedá, Faculdade Hélio Alonso, Arquivo Nacional, Livraria Ouvidor (BH), Livraria Quixote (BH), Livraria Scriptum (BH), Livraria Cultural Ouro Preto (Ouro Preto), Sindicato dos Engenheiros e Bar Bip Bip, Café do Museu da República.

Diretor e Editor: Ricardo Rabelo - Mtb 21.204 (21) 3547-3699 bafafa@bafafa.com.br Diretora de marketing: Rogeria Paiva mercomidia@gmail.com

Direção de arte: PC Bastos bastos.pc@gmail.com Circulação: Distribuição gratuita e direcionada (universidades, bares, centros culturais, cinemas, sindicatos)

Praça: Rio de Janeiro São Paulo Belo Horizonte

Tiragem: 10.000 exemplares

Fotos capa: Mídia Ninja

Agradecimentos: Aos colaboradores desta edição.

Publicidade: (21) 3547-3699 mercomidia@gmail.com

Realização: Mercomidia Comunicação Bafafá 100% Opinião é uma publicação mensal.

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A tragédia social que nos espera (educação, saúde, previdência, etc.), a criação de um salário mínimo e de um salário desemprego, controle dos Mais breve do que se pode imaginar, ficará bem preços e dos juros bancários e outros itens da mesma claro que as políticas anunciadas pelo governo não serão natureza. O programa previa ainda o investimento de bicapazes de superar, nem de longe, a crise que afeta o lhões de dólares em grandes obras Brasil. Ao contrário, elas nos levarão a um crescente de engenharia, de que o sistema agravamento da situação, como estamos vendo nos hidrelétrico do Vale do Tennensse países que adotaram o mesmo receituário para enfrentar foi determinante, mas também na a quebra de suas economias, que já dura quase 10 anos. construção de estradas, pontes, A Grécia é o símbolo mais dramático desse processo, escolas, aeroportos. Essas obras embora muitas outras nações estejam passando por em seu conjunto criaram milhões semelhantes dificuldades. de empregos, provocando uma Nos momentos de grave anemia econômica, ampliação do mercado consumié preciso haver uma forte intervenção estatal, a fim de dor interno, com reflexos positivos em toda a cadeia minimizar seus efeitos e abrir caminho para a recupe- produtiva, que permitiram a recuperação da atividade ração das atividades produtivas. O exemplo histórico econômica. O estado assumia em todo esse contexto dessa formulação é o do New Deal, programa adotado um papel decisivo, protagônico, sem o qual aqueles pelo governo americano para enfrentar a recessão, que resultados não teriam sido alcançados. desde 1929 paralisava a economia do país. Em pouco O Plano Marshall, que tornou possível a remais de quatro anos, a partir de 1933, a administração construção da Europa após a Segunda Guerra Mundial, do presidente Franklin Delano Roosevelt propiciou a foi pelo mesmo caminho, com os investimentos gigansuperação da crise e a retomada da trilha do desenvol- tescos dos EUA (cerca de U$ 150 bilhões, em valores vimento. atuais) aplicados nos países destruídos. Também ali o E quais foram as principais medidas constantes planejamento público e os investimentos governamentais do New Deal, que contrariavam frontalmente os funda- tiveram um papel preponderante. mentos da ciência econômica conservadora, dominada O que o governo Temer oferece é o inverso dispelos fiscalistas de sempre, responsável ela própria so. A PEC 55, anteriormente denominada 241, conduz pelos dias tormentosos que os EUA atravessavam? O a drástica redução das funções do estado, de acordo aumento do déficit público, a elevação dos gastos sociais com as ideias neoliberais que estão em curso, com total

José Maria Rabêlo*

ineficácia, em várias partes do mundo. Num cenário de atentados aos direitos dos trabalhadores em geral, dos servidores públicos, de aposentados e pensionistas, que constituem a imensa base da sociedade, prevê um corte radical nos investimentos do governo, que comprometem as diferentes áreas de sua atuação, agravando o quadro recessivo. O prazo de vigência da PEC, de 20 anos, quase o de uma geração, é uma aberração em todos os sentidos, patrocinada por um governo ilegítimo, golpista, que tem contra si o repúdio de mais de 80% da população. Trata-se de um conjunto de ações desesperadas, trazendo de volta os piores momentos de nossa história, de estagnação, de desemprego em massa, de miséria e fome para os lares mais pobres, que ficarão ainda mais pobres. Enfim, uma tragédia social, que já está batendo às portas. MODESTO Modesto da Silveira deixou a vida. Uma vida marcada pela extrema honradez, pela coragem e pelo amor à democracia. Seus exemplos iluminam nossos caminhos. Vai em paz, companheiro, vá! *Jornalista


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Artigo patrocinado

A crise insiste, persiste e não desiste Agamenon de Oliveira

podemos tirar. A primeira e mais óbvia é que a crise

não tem nenhum interesse

Segundo o jornal Valor Econômico de 19 de No-

é muito mais profunda do que se imagina e a simples

no pleito de 2018. Seja ver-

vembro deste mês, pela primeira vez no terceiro

mudança na presidência da República e o “retorno da

dade ou não sua impotência

trimestre, em mais de quatro anos, a receita líquida

confiança” da classe empresarial com a saída de Dilma

diante do enfrentamento da

de 278 empresas de capital aberto, apresentou

e que inevitavelmente viria, ainda não foi suficiente

crise e a forma de enfrenta-la se coloca como o eixo

queda nominal de 3% quando comparado com o

para a volta dos investimentos. É importante voltar-

fundamental das disputas politicas e ideológicas na

mesmo período de 2015. Os fatores principais e que

mos a este argumento que foi muito usado durante

conjuntura atual. Para as forças progressistas pelo

mais pesaram no desempenho negativo dessas em-

as campanhas eleitorais recentes e se justificariam

cenário catastrófico representado pelas medidas que

presas foram o desemprego, juros e inflação altos,

como uma medida pragmática “legitimadora” do golpe

o governo Temer acena para fazer essa transição.

além dos fatores externos causados pela a eleição

desferido contra a presidente eleita.

Caso elas sejam de fato implementadas a maioria

de Donald Trump. Ainda segundo esta mesma fonte

A segunda conclusão menos óbvia, mas que se apre-

da população enfrentará não somente a crise, com

as empresas Petrobrás e Eletrobrás não entraram

senta cada vez mais como uma realidade é a incapa-

sua face perversa e destrutiva, além de um quadro

nesta avaliação pois são pontos fora da curva e

cidade do governo Temer de sair da crise. Isto é impor-

social onde veremos crescer ainda mais a miséria, a

distorceriam a avaliação.

tante porque o discurso oficial do governo é que ele

desigualdade e o arbítrio, constituindo um sério perigo

Pelo cenário que se apresenta duas conclusões

está no poder justamente para fazer esta transição e

de um retrocesso social imprevisível.

Sr. Governador, não somos caso de polícia Reimont* O Rio de Janeiro acordou no dia 16/11 como se estivesse em guerra. E o senhor desta guerra chama-se Luiz Fernando Pezão, governador do estado. Para enfrentar a indignação popular, ele gradeou a Alerj, fechou inúmeras ruas do Centro, convocou 500 militares da Força Nacional e juntou a eles mais 500 homens da Tropa de Choque, prometendo uma escalada sem precedentes da violência contra a população. Pezão vira as costas para o povo do Rio, deixa claro que despreza a imensa maioria dos quase 17 milhões de moradores deste estado, especificamente os que não fazem parte do seu rol de relacionamentos públicos-privados. Nega o diálogo. E vai além, quer calar a nossa voz na base da intimidação, da pancada e das bombas. Quer que aceitemos como gado um pacote de maldades que, além de não combater os reais problemas de caixa do estado, vai penalizar brutalmente trabalhadores e a população mais pobre, como se estes fossem responsáveis pela má gestão do estado.

Não, senhor governador, não somos caso de polícia! Somos cidadãs e cidadãos indignados, sim; há entre nós até mesmo pessoas já desesperadas, sem ter como pagar as contas e sustentar a família, com salários confiscados, dependendo da ajuda de vizinhos e familiares.

O senhor propõe que aceitemos passivamente um pacote que corta e congela salários e pensões, que aumenta impostos e contribuição previdenciária, que acaba com benefícios sociais, que afeta, principalmente, servidores e a população mais pobre. Pois nós respondemos que NÃO. E a nossa resposta é nas ruas. Nós queremos ser ouvidos.

Queremos discutir medidas efetivas para acabar com o rombo do estado que os senhores criaram. Queremos, sobretudo, uma auditoria nas concessões de isenções fiscais concedidas pelos senhores e que, em cinco anos – de 2008 a 2013 –, geraram um encolhimento de R$ 138 bilhões na arrecadação do ICMS, valor quase cinco vezes maior do que a pseudo economia que o senhor pretende fazer com o seu pacote de maldades. Queremos saber por que, neste ano, já em plena crise, o senhor ampliou a concessão de isenções, beneficiando mais dez empresas dos setores de distribuição, beleza, cosméticos, alimentos e bebidas. Queremos saber por que, além da isenção fiscal, o estado ainda financiou, com bilhões de reais, algumas dessas empresas. Queremos saber por que perdurou esse pacote de bondades para empresas, um pacote que foi decisivo para o caos financeiro do Rio. Não, senhor governador, não somos nem gado e nem caso de polícia. O que exigimos é diálogo e respeito. E exigimos nas ruas, apesar das grades, das pancadas e das bombas. O senhor não nos calará.

*Vereador, PT-RJ


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Grotesco

Ricardo Rabelo Delação Odebrecht

Não escapa ninguém do governo e do Congresso das denúncias dos delatores da Odebrecht. A lavanderia de dinheiro sujo funcionava a todo vapor há mais de uma década em troca de favores com a construtora. Quero ver agora a imparcialidade do poder judiciário em denunciar e punir os envolvidos.

Impostor

Até quando?

Até quando a mídia vai fingir que o país não vive os maiores protestos estudantis de sua história? Até quando a mídia vai fingir que o governo Temer não é um descalabro administrativo? Até quando vamos aguentar essa onda fascista que começa na própria polícia militar? E com todo respeito: até quando o nosso povão vai continuar fingindo que está tudo bem e lavando as mãos?

Vergonha

no Rio. O Palácio Guanabara era dirigido por uma quadrilha que desviou uma fortuna até agora incalculável. Apenas um inquérito apura o desvio de R$ 200 milhões. A prisão de Cabral é um alento, mas o certo é ele devolver cada centavo que roubou.

Cabral II

Quem diria que o jornalista Sérgio Cabral fosse gerar um filho corrupto até o último fio de cabelo? Um filho que na década de 80 andava de ônibus e era do partidão. O incrível foi a total falta de escrúpulo em assaltar os cofres públicos. O cara, que conheceu o paraíso, agora literalmente está no purgatório. Bem feito!

Falência

O impostor Temer faz 100 dias no Planalto depois do impeachment da Dilma. E foi delatado pela Odebrecht de ter recebido propina de US$ 10 milhões. Ele jamais poderia estar no comando do país e ainda tomando decisões contra os trabalhadores e a classe média. Temer pratica a política da terra arrasada, com um Congresso que parece muito uma confraria do que um parlamento. O propósito é tirar da população qualquer benefício possível e desmantelar a máquina estatal. O mais desolador é ver o STF sucumbir diante dos políticos e não ter coragem de impedir as barbaridades que temos visto no país este ano. Se o STF é Guarda da Constituição é hora de agir!

Que vergonha ver a nossa polícia criminalizando os movimentos sociais e as ocupações estudantis em escolas e universidades. Onde vai parar isso? Onde está afinal o judiciário isento? É nítido que faz parte do golpe. Lamentável é pouco, é uma aberração!

As manifestações na ALERJ são um sinal do que pode vir por aí com esse pacote recessivo do governo do estado. Engana-se quem acha que vai ser pacífico. Se o Estado pode falir imagina os funcionários públicos que não recebem salários? Vai ser uma onda de quebradeira de pessoas físicas.

Fascismo não

Cabral

O que corria na boca pequena ficou público. O ex-governador Sérgio Cabral assaltou os cofres do estado numa roubalheira sem precedentes

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Dou todo apoio aos servidores públicos, mas condeno veementemente aqueles que pregam a volta da ditadura e reverenciam personagens execráveis como Bolsonaro. Ponto fora!

Não nutro nenhum amor pelo Garotinho, mas achei grotesca a transferência dele para Bangu 8 diante das câmeras de TV. Principalmente porque o cara sequer foi julgado. A prisão dele abre as portas para qualquer juiz tendencioso fazer isso com outras personalidades, inclusive Lula e Dilma. O certo seria ele ter sido poupado de exposição. Estranho a TV Globo, como sempre, estar de plantão como que esperando a carniça. Como dizia Brizola, “se a TV Globo está do lado de cá, estou do lado de lá”.

Ponderação Empresa processada bancou evento de juízes em resort baiano com Lewandowski, Moro e Carmen Lúcia. E se fossem a Dilma e o Lula os beneficiários? Francamente!

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e famílias. Já os jovens mortos e desovados numa mata perto da Cidade de Deus não têm nome nem família.

Absurdo

Isso não é piada! Os turistas e cariocas que quiserem passear no bondinho de Santa Teresa terão que desembolsar R$ 20 a partir do dia 15 de dezembro. Será a primeira vez que o transporte será cobrado desde que voltou a circular após o acidente com seis mortos, há cinco anos. Os moradores ficarão isentos da cobrança, desde que cadastrados previamente. Foi para isso que privatizaram o bondinho? Vamos botar a boca no trombone!

Trump I

Ponderação II

Esdrúxulo esse procurador da República, Deltan Dallagnol, ter comprado para investir dois apartamentos do programa Minha Casa, Minha Vida. O ato pode até ser legal, mas é totalmente imoral. Uma pergunta que não quer calar: e se fossem Dilma ou Lula que tivessem comprados os imóveis? O céu ia desabar sobre eles!

A eleição de Donald Trump é um sério risco à paz mundial e aos direitos humanos. A pregação fascista do presidente eleito dos EUA assusta e pode levar a conflitos inimagináveis. Os brasileiros que se cuidem. Conseguir o visto para os Estados Unidos não vai ser tarefa fácil.

Trump

Curioso Os policiais mortos no helicóptero da PM tinham nomes

O Trump é Temer em escala planetária!


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Aos gringos, o filé. Para a Petrobras, o osso. Mauro Santayana* Entre os aspectos mais perversos da atual retirada nacional, baseada filosófica e administrativamente na diminuição do papel do Estado e das empresas estatais e paraestatais como instrumentos de aumento da competitividade e do desenvolvimento do Brasil em sua natural disputa com outros países do mesmo porte territorial e demográfico, um dos mais abjetos, pelo cinismo com que tem sido levado a cabo, é o que envolve o acelerado e proposital enfraquecimento, para não dizer descarado desmonte, da Petróleo Brasileiro Sociedade Anônima. A desculpa é sempre a mesma. Estariam, a Petrobras e o país, quebrados, devido à atuação dos governos anteriores, embora a estatal estivesse, até há poucas semanas, a caminho de zerar o déficit cambial acumulado nos últimos anos; suas ações tenham se valorizado em mais de 170% neste ano, em processo iniciado quando Dilma ainda se encontrava à frente da Presidência da República; esteja batendo sucessivos recordes de produção, especialmente no pré-sal; e o Brasil quebrado de Lula seja o mesmo país em que o BNDES tem tão pouco dinheiro que se prepara para “devolver” 100 bilhões de reais ao Tesouro e a mesmíssima nação que pagou as dívidas com o FMI e que acumulou 370 bilhões de dólares em reservas internacionais, diminuindo, ao mesmo tempo, a Dívida Pública Bruta e a Líquida nos últimos 13 anos. O cinismo é tanto, que a turma que alega que faltava transparência à direção anterior da empresa é a mesma que, agora, pretende concentrar mais poder nas mãos de pequenos grupos para decidir questões estratégicas, como o que vender, ou melhor, “doar” dos ativos da empresa e a quem fazê-lo; a participação ou não da Petrobras como operadora neste ou naquele poço do pré-sal; o uso ou não de peças e equipamentos comprados ou encomendados no Brasil neste ou naquele projeto; e até mesmo a fixação do preço da gasolina, a cada mês, “seguindo a média dos preços internacionais” que levarão, se não houver transparência e discussões públicas, abertas, à possibilidade da eventual ocorrência de corrupção em altíssima escala, já que envolvem, qualquer um destes temas, direta ou indiretamente, interesses que vão de multinacionais a fornecedores estrangeiros de equipamentos a donos de postos de gasolina, em uma escala que vai de bilhões de reais a dezenas de bilhões de dólares. Nesse processo, abandona-se a lógica, evitando que a Petrobras, que, durante anos, subsidiou os consumidores brasileiros, quando a gasolina estava mais cara lá fora, seja ressarcida por isso, agora, quando ela está mais barata. Adiando a recuperação da maior empresa nacional, o que é uma excelente desculpa para entregar, a toque de caixa, e a preço de banana, seus mais importantes ativos, sem consulta à sociedade brasileira, que é, em última instância, a dona do negócio. Áreas de maior valor agregado e de maior potencial de avanço da pesquisa tecnológica e científica, como a petroquímica, o transporte e a distribuição gás e de combustíveis, estão sendo entregues a concorrentes, deixando apenas o osso, ou a produção, para a Petrobras, dependendo do poço, quando isso for de interesse do “mercado”, representado pela associação que reúne, no Brasil, as petroleiras estrangeiras. O que dá mais dinheiro? Um barril de petróleo bruto, em um momento em que os preços se encontram historicamente deprimidos, ou um barril de gasolina ou diesel, vendido diretamente ao consumidor, na bomba de combustível? A ganância, e a possibilidade de lucro é tanta, que o anúncio demagógico da inútil queda do preço da gasolina nas refinarias saiu como um tiro pela culatra, aumentando os preços para o consumidor, em muitos estados, no lugar de diminuí-los. Ou alguém achou que os donos dos postos iriam repassar o desconto para os clientes?

A contradição dos recém-chegados é tanta que o seu discurso privatista e entreguista defende a superioridade e proeminência da iniciativa privada sobre o Estado, mas os ativos da Petrobras estão sendo entregues a estatais, leia-se, a estados estrangeiros, como a Noruega e a China, porque no mundo real, e não no da midiotização brasileira, são as empresas estatais, como as sauditas e as chinesas, que dominam o mercado mundial do petróleo, e são nações altamente estatizadas, como a China, que dominam a economia mundial e são os maiores credores da Europa e dos Estados Unidos. Enquanto nossa maior empresa vai sendo desmontada, esquartejada, descaracterizada estrategicamente, as mentiras sobre ela vão se acumulando, como um infinito zigurate babilônico. Cabe aos petroleiros processar a Price Waterhouse and Coopers para que ela prove os alegados desvios de 6 bilhões de reais na companhia, que já deveriam ter sido reincorporados aos novos balanços. Ao contrário do senso comum baseado em um discurso apressado e rasteiro, a gasolina no Brasil não está entre as mais caras do mundo. Há mais de 50 países em que ela custa mais do que aqui, incluídos grandes produtores, como a própria Noruega, a quem estamos entregando mega poços do pré-sal, quando poderíamos simplesmente estabelecer alianças entre a Petrobras e estatais estrangeiras, mantendo o controle dos poços e das reservas em nossas mãos, como deveria ter sido feito agora com a Total francesa. A verdade é que a Petrobras não está, nem esteve, nunca, quebrada da forma que foi divulgada. O seu endividamento decorreu não de algumas dezenas de milhões de dólares efetivamente pagos por empreiteiras a bandidos como Paulo Roberto Costa e Nestor Cerveró para que não atrapalhassem seus negócios, mas da brutal queda do preço do petróleo que a afetou e também outras companhias. E de uma estratégia deliberada de sabotagem da credibilidade da empresa, para derrubar o governo anterior e levar as suas ações ao chão, para que grandes investidores privilegiados, como George Soros, por exemplo, e acionistas estrangeiros que nunca acreditaram em sua quebra e no catastrofismo fascista fizessem extraordinárias fortunas, em poucos meses, como aconteceu este ano, enquanto otários tupiniquins pseudo conservadores e midiotizados se desfaziam de suas ações, metendo o pau na empresa, nas redes sociais, a cinco reais quando elas estão valendo hoje quase 20 reais. A cabeça do ovo e a piscina do Alvorada Surreal e kafquiana, para dizer o mínimo, a nova investigação em curso para saber se a Odebrechet teria “beneficiado” Lula fazendo, de graça, consertos na piscina do Palácio do Alvorada. “Beneficiado”, como? Lula, agora, virou dono do Palácio do Alvorada? Se a construtora consertou a piscina do palácio, ótimo. Ela arrumou e valorizou o patrimônio público. Nesse caso, qual foi o prejuízo para o erário? Ou o Sr. Luis Inácio, já acusado antes - sem provas - de “roubar” crucifixos, faqueiros “fakes”, cujas fotos foram tiradas de um site de leilões dos EUA, etc, saiu com a piscina debaixo do braço, quando deixou de ser Presidente da República? Ou mandou consertá-la para cometer outros crimes, quem sabe para fazer um “test-drive” nos emblemáticos - e caríssimos, ostentatórios - pedalinhos do sítio de Atibaia? No afã de encontrar crimes que possam ser atribuídos ao ex-presidente da República, os responsáveis pelo “caso” tem que ter um mínimo de bom-senso e de sentido de proporção, para não passar ao mundo a impressão de que estão simplesmente forçando a barra para criar mais um de uma longa série de factoides políticos, ou simplesmente procurando, com microscópio eletrônico, pêlo em cabeça de ovo para incriminar o ex-presidente da República. *Jornalista e escritor, publicado no site www.maurosantayana.com


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Desmonte da política habitacional Guilherme Boulos* No último dia 14 de novembro, Michel Temer disse no programa “Roda Viva” que seu governo “incentiva” o Minha Casa, Minha Vida. Causou espanto que não tenha sido questionado por nenhum dos jornalistas presentes. Desde sua posse, Temer suspendeu todas as contratações da faixa 1 do programa. Essa é a faixa que faz do Minha Casa, Minha Vida um programa social de moradia e não uma linha de crédito imobiliário. Destinada a famílias com renda mensal inferior a R$ 1.800, a faixa 1 tem um patamar elevado de subsídio, o que permite reduzir as prestações e tornar os critérios de adesão mais acessíveis. O Minha Casa, Minha Vida tem muitos problemas, a começar pelo papel protagonista das empreiteiras, que tem o poder de definir a localização e, dentro de limites mínimos, a qualidade e tamanho das casas. Mas tem uma importante qualidade: o subsídio reservado à faixa 1, que inclui na política habitacional milhões de pessoas que, por não serem “sujeitos de crédito” bancário, historicamente nunca puderam ter acesso ao direito à moradia. É precisamente esta qualidade que está sendo desmontada. O Brasil tem hoje um deficit habitacional de 6,06 milhões de famílias, segundo o último levantamento do IBGE. Desse total, 84% estão na faixa de renda inferior a três salários mínimos. Qualquer política que pretenda enfrentar a falta de moradia no país deveria, portanto, ter foco nesse segmento.

Deveria ainda aprender com a experiência anterior e ampliar a modalidade Entidades, que demonstrou capacidade de produzir casas melhores com valor menor, através da participação dos futuros moradores na gestão do projeto e da obra. Os exemplos são muitos, a começar pelo Condomínio João Cândido, entregue em 2014, com apartamentos de 63 m², três dormitórios, varanda e elevador, utilizando o mesmo recurso com que as empreiteiras entregam caixotes de 39 m². Mas a política do governo Michel Temer vai em sentido inverso. Ao mesmo tempo em que congelou a faixa 1 e descumpriu compromissos de retomada do Entidades, ampliou as linhas de crédito para moradias de alto padrão. Em julho, o governo dobrou o teto do valor dos imóveis financiados pela Caixa, passando de R$ 1,5 milhão para imóveis de R$ 3 milhões. E ampliou, nestes casos, a parcela financiável de 70% a 80% do valor total. É o Minha Mansão, Minha Vida. Todas as contratações de moradia desde a posse de Temer tiveram foco nas faixas 2 e 3 do programa, que responde por apenas 16% do deficit habitacional. Tentando tapar o sol com a peneira e manter as aparências do Minha Casa, Minha Vida como programa social, o governo abriu este mês a possibilidade de contratações para a chamada “faixa 1,5”, que permite o atendimento de famílias mais pobres, porém, com subsídio bem mais reduzido e critérios de adesão próximos aos de mercado. Quem tiver restrição cadastral está automaticamente excluído e a aferição dos critérios de renda

é extremamente rígida. É uma falsa solução para o problema. Na prática, sem alarde, estão acabando com o Minha Casa, Minha Vida como programa social e retomando a velha política do BNH (Banco Nacional de Habitação) de tratar a moradia como ativo financeiro, restrito a quem tenha capacidade de crédito imobiliário. Além de destinar a maior parte do volume de recursos da Caixa para o financiamento de imóveis de alto padrão. De direito, a moradia passa ao status de privilégio. Esta opção política terá como consequência previsível o agravamento da crise urbana e dos conflitos sociais. A escalada recessiva, com aumento do desemprego e redução da renda dos trabalhadores, já tem criado um aperto no orçamento familiar que vai tornando o aluguel uma despesa quase impagável para milhões de brasileiros. O “ônus excessivo com aluguel” tornou-se o principal fator do deficit habitacional, especialmente nos grandes centros urbanos. Em São Paulo, responde por 60% do total; no Rio, por 63%. Some-se a isso a falta de perspectiva de atendimento por programas públicos. O resultado será explosivo. É de se esperar um novo ciclo de ocupações urbanas e de conflitos pela terra nas periferias das grandes cidades. Se as ocupações e mobilizações pela moradia já vinham crescendo –mesmo com o fator compensatório do Minha Casa, Minha Vida– agora tendem a explodir, agravando ainda mais a tensão social no país. Dirigir na contramão sempre trás sérios riscos. Dirigir um governo na contramão das necessidades sociais, principalmente de uma necessidade tão básica como a moradia, é colisão na certa. *Líder do MTST – Movimento dos Trabalhadores sem Teto

Aniquilar movimentos sociais faz parte do golpe Jandira Feghali* A proibição à entrada de estudantes no Senado, agredidos com spray de pimenta pela polícia legislativa, na quarta-feira 09/11, representa mais um episódio de um longo processo de criminalização dos movimentos sociais. Esse movimento faz parte de uma onda de reação das forças conservadoras contra os direitos conquistados na Constituição de 1988, que culminou com o golpe contra uma presidente legitimamente eleita e a ascensão ao poder de um presidente usurpador justamente com a finalidade de concluir esse processo de reversão de direitos. Assim como a invasão da Escola Nacional Florestan Fernandes, centro de formação superior do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), pela polícia de São Paulo na sexta-feira (4), sem mandado judicial, o episódio deixa claro que o Brasil vive um estado de exceção sob um falso manto de legalidade. Barrados no Congresso Nacional, esses estudantes foram convidados a participar de uma audiência pública sobre reforma do ensino médio (Medida Provisória 746/16). Mas, depois de viajar mais de mil quilômetros para manifestar sua opinião, foram “desconvidados” e não puderam sequer entrar na casa. Isso mostra que a “Casa do povo” não suporta mais ouvir a voz das ruas. A repressão aos estudantes que ocupam escolas e universidades em todo o país compõe esse mesmo cenário de perseguição a quem ousa levantar a voz contra o governo

golpista. Em sua luta, esses jovens se opõem principalmente à PEC da Morte (55 no Senado e 241 na Câmara), prestes a ser votada no Senado, e à reforma do ensino médio. Os estudantes entenderam que essas medidas se prestam a liquidar o Estado e colocar todos os setores a disposição do mercado como simples fonte de lucro. A reforma do ensino nada mais pretende que a transformação do nível médio em instância de formação profissional para servir às empresas. Segundo levantamento do site Intercept Brasil, do premiado jornalista Glenn Greenwald, a média brasileira de gastos das empresas com treinamento de um funcionário é de R$ 518. O que os empresários e o governo querem é transferir esse custo para nós, contribuintes. Com a mudança, nós pagaremos o “treinamento dos jovens”, dando de mão beijada ao empresariado o jovem “formatado” para o mercado, de preferência acrítico. Há também a previsão de parcerias de escolas públicas com o setor privado. Mais um passo rumo à mercantilização do ensino. Por sua vez, a PEC 55 também personifica um ataque direto a todas as conquistas sociais, pois representa a redução milionária de investimentos em todos os setores, inclusive educação e saúde, motivo pelo qual consultores do Senado a consideram inconstitucional. Como se não bastasse, o ministro da Educação, em mais um ato claro na direção de criminalizar qualquer foco de

resistência, chega ao ridículo de anunciar que irá processar organizações estudantis, como a União Nacional dos Estudantes (UNE) e a União Nacional dos Estudantes Secundaristas (Ubes), pelo adiamento do Enem. Ao acusar os movimentos de estudantes de atrapalhar o exame, esse ministro tenta colocar estudante contra estudante, e jogar para eles a responsabilidade por uma decisão tomada por seu ministério. Onde houve diálogo, como em Minas Gerais, as provas foram aplicadas sem nenhum problema. As elites brasileiras nunca se conformaram em perder o controle do Estado para forças populares que começaram apenas recentemente a disputar com elas o poder. Acostumadas ao total controle do poder público, que deveria atuar sempre em função de seus interesses personalíssimos, custaram a se dar conta do significado da Constituição cidadã de 1988. Mas agora centram fogo pesado para aniquilar as conquistas que ao longo dos anos foram se consolidando. O golpe representa o ápice desse processo de desmonte, com as medidas do governo usurpador contra todas as formas de direitos sociais. Por isso, é imperioso que as forças democráticas se conscientizem dessa articulação autoritária e se unam em torno de um novo consenso em favor de toda a Nação brasileira, e não apenas dos setores que nunca deixaram de se sentir senhores dessa terra. *Deputada Federal – PcdoB-RJ, publicado no blog do Noblat


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Sobre juizes, ministros e espiões Ângela Carrato* Quando, no futuro, os pesquisadores forem estudar o golpe parlamentar de 2016, que derrubou a presidente legitimamente eleita, Dilma Rousseff, um episódio chamará atenção. Trata-se do “Dia da Suprema Vergonha”, data em que o Supremo Tribunal (STF) decidiu que o réu, Renan Calheiros (PMDB), poderia continuar presidindo o Senado, mas estava fora da linha sucessória da presidência da República. Em todos os países democráticos do mundo, a Suprema Corte tem o papel de guardiã da Constituição e das leis. No Brasil dos golpistas, no entanto, as decisões da Suprema Corte, que já vinham sendo questionadas por sua morosidade e parcialidade, caíram de vez no descrédito popular. Como acreditar num STF que não permitiu que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que nem delatado estava, tomasse posse como ministro da Casa Civil de Dilma e aceita que, no governo Temer (PMDB), sete políticos, cada um com pencas de delações, assumissem e continuem integrando o primeiro escalão da República? Como acreditar num STF que deveria ter julgado, imediatamente após a votação do golpe, travestido de impeachment no Senado, a sua legalidade, e até agora, não se debruçou sobre o assunto?

Coincidentemente, a decisão do STF sobre Calheiros se deu logo depois que ele anunciou que colocaria em votação, em regime de urgência, o projeto de Lei de Abuso de Autoridade por parte de juízes, do Ministério Público e da Procuradoria Geral da República. A viúva do irmão do ex-presidente Collor, Tereza Collor, alagoana como Calheiros, numa longa carta aberta à população, dá todas as dicas para se entender o que aconteceu. Renan é do tipo que vende dificuldades para obter vantagens. Ao colocar em pauta um projeto que atingiria diretamente os interesses do Judiciário, antecipou-se ao que acreditava ser uma retaliação do STF. Resultado: depois de estranhos telefonemas e encontros secretos madrugada à dentro, Renan permaneceu no cargo por seis votos contra três. Quase que imediatamente, o STF viu o incomodo projeto de Renan ser retirado da pauta do Senado. Um perfeito toma-lá, dá-cá. A turma dos procuradores da Operação Lava Jato e o juiz Sérgio Moro foram os primeiros a respirar aliviados. Mas a tranquilidade durou pouco. A equipe de advogados e juristas que integra a defesa do ex-presidente Lula tem trabalhado duro. Tanto que Moro está às voltas com consistentes denúncias de abusos de poder contra Lula no âmbito da Comissão de Direitos Humanos da ONU, sem falar nas denúncias que o juiz estaria cometendo crime de

lesa-pátria ao permitir e estimular que delatores, sobretudo altos dirigentes de empresas públicas e privadas brasileiras, forneçam dados estratégicos dessas empresas para suas concorrentes estadunidenses e do Reino Unido. Moro estaria extrapolando suas funções e entrando no perigoso terreno onde circulam os traidores da pátria e os espiões. Moro pode estar se aproximando, aceleradamente, de outro nome que marcou época, nos idos do outro golpe, o civil-militar de 1964. Anselmo era um sargento da Marinha, que começou a ter enorme destaque na mídia de então por insuflar a rebelião nas Forças Armadas contra o presidente João Goulart. Apelidado de “cabo”, ele jogava com as forças de esquerda, mas a história revelou que nada mais era que um agitador infiltrado pelos setores de direita e a serviço da CIA. Anselmo também se dizia contra a corrupção. Sua atuação acabou contribuindo, em muito, para jogar o Brasil numa noite escura, que durou 21 anos. Moro é apresentado pela mídia corporativa, onde também faz muito sucesso e sempre tem ampla cobertura (Globo à frente), como o “inimigo número um da corrupção”. Mas, até agora, suas ações contribuíram somente para derrubar uma presidente democraticamente eleita, arruinar a economia nacional e deixar um saldo de mais de dois milhões de desempregados. *Jornalista e professora da UFMG.

O golpe foi dado para reinstalar o neoliberalismo Emir Sader* Desde sua derrota em 2002, a direita brasileira se colocou como objetivo fundamental desalojar o PT do governo, para reinstalar o modelo neoliberal. Este foi adotado como seu programa desde Collor e FHC. A primeira vitoria do Lula representou a perda do controle do governo pela direita e a instalação de um programa que rompia, em pontos essenciais, com o neoliberalismo. Rompia ao erigir as políticas sociais como seu eixo fundamental, no lugar do ajuste fiscal. Ao priorizar os projetos de integração regional ao invés dos Tratados de Livre Comercio com os EUA. E ao recuperar o papel ativo do Estado, no lugar da centralidade do mercado. Nas campanhas eleitorais de 2006, 2010 e 2014, com as candidaturas de Alckmin, Serra, Aecio e Marina, a direita voltou a propor o modelo neoliberal, ponto comum das forcas que compõem o campo da direita no Brasil. E foi derrotada. Sempre que se contrapuseram o modelo colocado em pratica pela direita nos anos 1990 e pelos governos do PT, nas campanhas eleitorais, a maioria dos brasileiros preferiu esta alternativa, a do desenvolvimento econômico com distribuição de renda. Frente à possibilidade de seguir perdendo eleições, a direita buscou o atalho do golpe, para retomar seu modelo, fracasso nos anos 1990 e, por isso, derrotado sempre

posteriormente em disputas democráticas. O objetivo fundamental do golpe é o de retomar esse modelo, como se vê pelas medidas fundamentais tomadas pelo governo golpista. Com a derrota dos seus candidatos em 2014, Aecio e Marina, tentaram a recontagem dos votos, ou acusações de corrupção contra a Dilma. Tentaram invalidar as eleições, para finalmente apelarem para o golpe via impeachment. Para esta via tinham que contar com a traição do Michel Temer, que embarcou, de forma aventureira, nessa via, por lhe possibilitar chegar à presidência e, a partir dali, tratar de se safar das acusações de corrupção. A gangue que o Temer reuniu tem em comum essas acusações e a disposição de apoiar o retorno do modelo neoliberal. O eixo central do governo é a equipe e econômica, coordenada pelo Henrique Meirelles, ponte de apoio do grande empresariado, especialmente dos bancos, que ocupa os cargos econômicos fundamentais. A FIESP nem sequer indicou o ministro de indústria e comercio, confirmando que se trata de um governo para aplicar, de forma dura, o ajuste fiscal, que favorece o capital financeiro e inviabiliza qualquer retomada do crescimento econômico.

A Lava Jato contribuiu decisivamente para criar o clima de desestabilização dos governos do PT. Sua atuação absolutamente unilateral e partidária visa sempre o PT e o governo, sendo parte integrante do golpe. Busca ainda inviabilizar a candidatura do Lula, pela possibilidade de uma vitoria eleitoral deste representar a retomada do modelo aplicado com grande sucesso desde 2003. Temer e/ou os tucanos ou outra qualquer via servem a esse fim: reinstalar o modelo neoliberal, com o desmonte do Estado, o corte radical dos recursos para as políticas sociais, com o ataque frontal aos direitos dos trabalhadores, com o fim da política externa soberana. Tudo se subordina a esses objetivos. A Lava Jato ataca a quadros politicamente mortos da direita, como o Eduardo Cunha e o Sergio Cabral, poupando os que ainda servem ao objetivo central de restauração neoliberal. Podem cair ainda políticos como o Renan Calheiros ou outros, conforme sua utilidade ao projeto neoliberal do golpe. Mas a reinstalação do neoliberalismo é o objetivo central do golpe. Não nos enganemos. *Professor e escritor, publicado no site 247


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Os estudantes querem um outro Brasil e um outro tipo de política Leonardo Boff* Seria ingênuo pensar que o movimento dos estudantes ocupando escolas e universidades se esgota na crítica de um dos mais vergonhosos projetos já havidos, da reforma do ensino médio ou no protesto contra a PEC 241 da Câmara e agora PEC 55 do Senado, PEC da brutalização contra os mais vulneráveis da nação. O que se esconde atrás das críticas é algo mais profundo: a rejeição do tipo de Brasil que até agora construimos e de política, corrupta feita por parlamentares em proveito próprio. Junto vem o lado mais positivo: a demanda por uma outra forma de construir o Brasil e de reinventar uma democracia, não de costas para o povo, mas com ele particpando nas discussões e decisões das grandes questões nacionais. Já abordei neste espaço este tema, a propósito do movimento dos jovens de 2013. Este movimento retorna com mais vigor e mais capacidade de se impôr aos responsáveis pelos destinos de nosso país. Três autores continuam a nos inspirar, pois sempre lutaram por um outro Brasil e sempre foram derrotados. O primeiro é Darcy Ribeiro num texto de 1998 como prefácio ao meu livro O caminhar da Igreja com os oprimidos:”Nós brasileiros surgimos de um empreendimento colonial que não tinha nenhum propósito de fundar um povo. Queria tão-somente gerar lucros empresariais exportáveis com pródigo desgaste de gentes”. Esta lógica do ultraliberalismo atual se radicalizou no Brasil. O segundo é de Luiz Gonzaga de Souza Lima na mais recente e criativa interpretação do Brasil:”A refundação do Brasil: rumo à sociedade biocentrada (São Carlos 2011):”Quando se chega ao fim, lá onde acabam os caminhos, é porque chegou a hora de inventar outros rumos; é hora de outra procura; é hora de o Brasil se refundar; a refundação é o caminho novo e, de todos os possíveis, é aquele que mais vale a pena, já que é próprio do ser humano não economizar sonhos e esperanças; o Brasil foi fundado como empresa. É hora de se refundar como sociedade”(contra-capa). Essa hora chegou. O terceiro é um escritor francês François-René de Chateaubriand (1768-1848):”Nada é mais forte do que uma ideia quando chegou o momento de sua realização”. Tudo indica

que este momento de realização está a caminho. Os jovens que estão ocupando os lugares de ensino estão revelando mais inteligência, a exemplo da jovem Ana Júlia Ribeiro, falando na Câmara Legisliva do Paraná, do que a maioria dos representantes sentados em nossas casas parlamentares, interessados mais em seus negócios e na própria reeleição do que no destino do povo brasileiro. Sem definição partidária, com seus cartazes incisivos ,os estudantes nos querem dizer:: estamos cansados do tipo de Brasil que vocês nos apresentam, com democracia de baixa intensidade, que faz políticas ricas para os ricos e pobres para os pobres, na qual as grandes maiorias são feitas invisíveis e jogadas nas periferias, sem estudo, sem saúde, sem segurança e sem lazer Queremos outro Brasil que esteja à altura da nossa consciência, feito de povo misturado e junto, alegre, sincrético e tolerante. Efetivamente, até hoje o Brasil foi e continua sendo um apêndice do grande jogo econômico e político do mundo. Mesmo politicamente libertados, continuamos sendo reconolizados, esta é a palavra exata, recolonizados, pois as potências centrais antes colonizadoras, nos querem manter colonizados, condenando-nos a ser uma grande empresa neocolonial que exporta commodities: grãos, carnes, minérios. Desta forma nos impedem de realizarmos nosso projeto de nação independente, soberana e altiva. Diz com fina sensibilidade social Souza Lima:”Ainda que nunca tenha existido na realidade, há um Brasil no imaginário e no sonho do povo brasileiro. O Brasil vivido dentro de cada um é uma produção cultural. A sociedade construíu um Brasil diferente do real histórico, o tal país do futuro, soberano, livre, justo, forte mas sobretudo alegre e feliz”(p.235). No movimento atual renasce este sonho exuberante de Brasil. Caio Prado Júnior em sua A revolução brasileira (Brasiliense 1966) acertadamente escreveu: ”O Brasil se encontra num daqueles momentos em que se impõem de pronto reformas e transformações capazes de reestruturarem a vida do país de maneira consentânea com suas neessi-

dades mais gerais e profundas e as espirações da grande massa de sua população que, no estado atual, não são devidamente atendidas”(p. 2). Com os personagens que estão aí na cena política, grande parte acusada de corrupção ou feita réu ou condenada, não podemos esperar nada senão mais do mesmo. Devem ser democraicamente alijados da história para termos campo limpo para o novo. Sobre que bases se fará a Refundação do Brasil? Souza Lima nos diz que é sobre aquilo que de mais fecundo e original que temos: a cultura nacional tomada no seu sentido mais amplo que envolve o econômico, o politico e o especificamente cultural: ”É através de nossa cultura que o povo brasileiro passará a ver suas infinitas possibilidades históricas. É como se a cultura, impulsionada por um poderoso fluxo criativo, tivesse se constituído o suficente para escapar dos constrangimentos estruturais da dependência, da subordinação e dos limites acanhados da estrutura socioeconômica e política da empresa Brasil e do Estado que ela criou só para si. A cultura brasileira então escapa da mediocridade da condição periférica e se propõe a si mesma com pari dignidade em relação a todas as culturas, apresentando ao mundo seus conteúdos e suas valências universais”(p.127). Por este texto, Souza Lima se livra da crítica justa de Jessé Souza, feita à maioria de nossos intérpretes do status quo histórico: “A tolice da inteligência brasileira”(Leya 2015), completada com “A readiografia do golpe”(Leya 2016). A maioria destes clássicos intérpretes, olharam para trás e tentaram mostrar como se construíu o Brasil que temos. Souza Lima, como os jovens de hoje, olha para frente e tenta mostrar como podemos refundar um Brasil na nova fase planetária, ecozóica, rumo ao que ele chama “uma sociedade biocentrada”. Ou o Brasil diferente nascerá destes jovens estudantes, ou corremos o risco de perdermos novamente o carro da história. Eles podem ser os protagonistas daquilo que deve nascer. * Leonardo Boff é teólogo e filósofo, articulista do JB on line

Democracia e participação social da juventude Carlos Nicodemos* Afirmam os mais sábios que da crise, o essencial é extrair oportunidades. É desta premissa que podemos analisar a decisão do Juiz Federal Eugenio Rosa de Araújo na Ação movida pelo Ministério Público Federal na 17ª Vara Federal da Seção Judiciária no Rio de Janeiro contra o “Movimento de Ocupação dos Estudantes do Colégio Pedro II”, visando esvaziar os jovens manifestantes das unidades. Como é público e de ampla visibilidade, o país vive um momento de grave crise de institucionalidade em variadas dimensões políticas. Nas fases e etapas deste processo de redemocratização do Estado brasileiro, tivemos o marco legal da Constituição Federal de 1988 que consolidou um conjunto de cidadanias, entre elas de crianças e adolescentes. Esta Carta Política, a partir do Art.227, passou a reconhecer a população infanto-juvenil como sujeitos de direitos em peculiar processo de desenvolvimento pessoal, social e político, colocando a família, a sociedade e o poder público responsáveis pela proteção integral dos pequenos brasileiros. No conjunto das normas nacionais e internacionais que constituiu verdadeira “Era dos Direitos” para crianças e adolescentes, tivemos ainda a Convenção dos Direitos das

Crianças da ONU sancionado no Brasil(1989) e o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8069/90. Este conjunto normativo assegurou entre outros direitos, a “participação social” e o “direito a livre manifestação” das crianças e adolescente, organizados ou não em movimentos sociais. O “Movimento de Ocupação dos Estudantes do Colégio Pedro II” em defesa da educação, contrários a PEC 241(Câmara de Deputados) /PEC 55(Senado) do Congresso Nacional, é resultado deste avanço democrático de reconhecer a cidadania de crianças e adolescente, inclusive na luta por seus direitos. Neste norte a CDHAJ da Ordem dos Advogados do Brasil da Seção do Rio de Janeiro promove a assistência ao combativo movimento, visando assegurar este consagrado direito constitucional. A decisão do magistrado da Justiça Federal negando o pedido de reintegração de posse em via de liminar ao Ministério Público Federal é um suspiro de alento. Como se vê, ainda resistem às conquistas recentes da moderna e combalida democracia brasileira, dando voz e vez a luta por direitos de crianças e adolescentes. *Membro da Comissão de Direitos Humano da OAB


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Ainda não encontrou o presente de Natal? Márcio Bueno* Pronto, sua angústia acabou. O livro que lancei este ano, “Faíscas verbais: A genialidade na ponta da língua”, tem tudo para se tornar a solução . E digo isso não é por estar na minha presença, não. Trata-se de uma coletânea de mais de 500 frases magistrais ditas de improviso, na lata, na bucha, no calor de um debate, de uma discussão, uma entrevista e algumas numa conversa informal. É humor fino, inteligente, sem ser hermético. São lampejos da mente humana produzidos

por personagens públicos de várias áreas, como escritores, artistas, políticos, esportistas, economistas, etc. Segundo a editora, as vendas têm crescido bastante nos dias que precedem datas festivas. Para exemplificar, posso citar o ‘desempenho’ de Aparício Torelly, quando estudava medicina em Porto Alegre. Em uma das aulas, o professor de ortopedia, com vários ossos sobre a mesa, apanha uma tíbia, chama-o e pergunta: – O senhor conhece esse osso? Sua reação causa uma explosão de gargalhadas na sala, deixando possesso o tal professor. Aparício segura na outra extremidade do osso e, sacudindo, diz: – Muito prazer! Mais tarde, ele viria a se tornar humorista profissional, com o título de Barão de Itararé.

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– Dias Rúbia

Elimine os criadouros do mosquito transmissor da Conheça mais sobre essa e outras histórias nos nossos canais /minsaude /minsaude /MinSaudeBR

saude.gov.br/combateaedes

dengue, zika e chikungunya.

Vamos a mais um exemplo. O jornalista José Hamílton Ribeiro foi escalado pela antiga revista Realidade para fazer a cobertura da guerra do Vietnam. Um dia, acompanhando uma tropa norte-americana, pisou numa mina, que explodiu arrancando-lhe metade de uma perna. Alguns anos mais tarde, participava de um programa de televisão quando um repórter – inconveniente, para dizer o mínimo – pergunta a ele: – É muito difícil ser repórter com uma perna só? Resposta de José Hamílton, na bucha: – Olha, ser repórter com uma perna só é mais difícil do que com duas. Mas é muito mais fácil do que com quatro. Pra finalizar, esqueça o ano e tenha muito boas festas! *Jornalista e escritor


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Estado de Barbárie O Rio não pode continuar convivendo com tanta dor. Não podemos continuar assistindo passivamente a perda de tantas vidas, na grande maioria jovens negros, moradores de favelas, como se elas não importassem e fossem descartáveis. E o mesmo deve ser dito em relação à vida dos jovens policiais que morrem nesses confrontos, nessa guerra irracional e totalmente ineficiente no combate ao crime e na garantia da segurança. A perda dessas vidas deveria importar para toda a sociedade e não apenas aos seus parentes. Estamos nos aproximando perigosamente de um estado de barbárie civil, que precisa ser revertido imediatamente. Atila Roque, diretor executivo da Anistia Internacional Brasil

Letalidade As operações policiais no Rio de Janeiro seguem um padrão de alta letalidade, deixando centenas de pessoas mortas todos os anos, inclusive policiais no exercício de suas funções. Em geral, são operações altamente militarizadas, que seguem uma lógica de guerra (neste caso, guerra às drogas), que enxerga as áreas de favelas e periferias como territórios de exceção de direitos e que resultam em inúmeros outros abusos além das execuções, tais como invasão de domicílio, agressão física e verbal, e cerceamento do direito de ir e vir. De uma lado, o Estado do Rio de Janeiro e sua política de segurança pública estão falhando em proteger os moradores da cidade e o próprio direito à vida. Em 2015 foram pelo menos 1.250 pessoas mortas vítimas de crimes violentos como homicídio e latrocínio na cidade do Rio de Janeiro. Por outro lado, este mesmo Estado está violando o direito à vida quando seus agentes da segurança pública e as intervenções policiais resultam em mortes. No ano passado, pelo menos 307 pessoas foram mortas em operações policiais na cidade. Em ambos os casos, as vítimas são em sua maioria jovens, negros, do sexo masculino. As autoridades do Rio de Janeiro devem repensar urgentemente a política de segurança pública que está sendo implementada e devem adotar medidas urgentes para garantir que as operações policiais respeitem os direitos humanos e garantam a segurança de todas as pessoas. Nota da Anistia Internacional

Solidariedade Nossa equipe está em contato com moradores da Cidade de Deus e acompanhando as investigações sobre as mortes dos quatro

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policiais militares e dos sete jovens encontrados na Comunidade do Caratê. Vamos também recebê-los em nosso gabinete. É lamentável que, em pleno dia 20 de novembro, o Rio de Janeiro esteve vivenciando estes episódios. Toda solidariedade às famílias das vítimas. Marcelo Freixo, deputado estadual PSOL e presidente da Comissão de Direitos Humanos da ALERJ

Cabral O ex-governador Sérgio Cabral foi preso devido a esquemas de corrupção que nós denunciamos desde que assumimos o primeiro mandato de deputado estadual, em 2007. Nossa equipe sempre fiscalizou a atuação de Cabral e apresentou várias ações exigindo a investigação das denúncias, que incluem viagens com Fernando Cavendish a Paris, uso ilegal de helicópteros do governo e ilegalidades cometidas na privatização do Maracanã. Marcelo Freixo

CPI das isenções Esse governo só pode estar de brincadeira com a população! No dia seguinte que o Cabral é preso, e uma das denúncias é justamente a lavagem de dinheiro com joalherias, o governo publica uma portaria autorizando mais uma isenção fiscal para a Sara Joias. De acordo com levantamento do nosso gabinete, esta joalheria já recebeu, entre 2008 e 2013, R$21.798.078,15 em incentivos fiscais. Essa portaria publicada, cheia de coisas obscuras, comprova que não há nenhuma transparência na concessão dos benefícios. A CPI é urgente para abrirmos essa caixa preta. A joalheria pertence a família Zylberman, e tem lojas em Ipanema, Leblon, São Conrado e Barra da Tijuca. Eliomar Coelho

Isenção para joalherias A passagem do furacão Matthew pela América Central, especificamente pelo Haiti, provocou uma catástrofe humanitária. Mais de mil pessoas já foram dadas como mortas, outras estão hospitalizadas e centenas de milhares estão sem ter onde morar. O braço da ONU sobre a saúde emitiu um alerta para o risco de epidemias se alastrarem, devido às más condições de saneamento básico e às inundações. Esse problema não pode ser invisibilizado. A comunidade internacional precisa ajudar. Temos que chamar atenção para o que acontece no Haiti. Não são suficientes os anúncios feitos até agora por organismos internacionais e pelos governos das Américas a respeito da situação. O chanceler José Serra, apesar de enrolado com as

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investigações da Operação Lava-Jato, que sugerem que ele teria sido um dos maiores recebedores de propina nas últimas eleições, precisa se engajar em algum tipo de solução negociada com outros países. No Haiti estão militares brasileiros, que lideram os capacetes azuis, como são chamados os soldados da missão de paz da ONU. Por desempenhar um papel relevante junto à garantia da missão internacional, o Brasil tem inclusive mais condições de colaborar com a recuperação das condições humanitárias. À sociedade civil também cabe um papel importante. Além de pressionar politicamente os governantes, podemos colaborar com alguma das diversas organizações que realizam trabalhos de amparo. São os casos, por exemplo, dos Médicos Sem Fronteiras e da Cruz Vermelha. Toda ajuda nesse momento é bem vinda. Precisamos fazer mais pelo Haiti! Jean Wyllys, deputado federal (PSOL-RJ).

Os caminhos do exílio O livro Os Caminhos do Exílio, de José Maria Rabêlo e Thereza Rabêlo, pais de Ricardo Rabelo, editor do Bafafá, lançado pela Geração Editorial, é uma obra rigorosamente atual, ao mostrar as extremas semelhanças entre os golpes contra Getúlio Vargas, em 1954, João Goulart, em 1964, e Salvador Allende, no Chile, em 1973, e o recente processo de impeachment de Dilma Rousseff. “Houve, naqueles episódios – diz Rabêlo – um conluio das forças conservadoras para deter o avanço das conquistas sociais”. O livro reconstitui fatos até hoje desconhecidos ou pouco conhecidos, como o assassinato do então presidente João Goulart em um comício programado para Belo Horizonte, reproduzindo a tragédia da morte do presidente John Kennedy nos EUA, ocorrida poucos meses antes. O crime só não aconteceu porque o golpe o tornou desnecessário. Revela também os planos dos golpistas para uma guerra prolongada, caso houvesse resistência por parte de Goulart e seus aliados, que poderia ter levado à divisão do Brasil em dois países, “uma Coreia de dimensões continentais”, nas palavras de um de seus idealizadores. O livro, que já está nas principais livrarias do País, descreve igualmente os problemas que José Maria e Thereza, hoje falecida, enfrentaram em sua permanência compulsória de quase 16 anos no exterior, como as dificuldades com línguas estranhas, a adaptação a realidades tão diferentes da nossa, a busca de trabalho, a educação dos filhos, o distanciamento dos amigos e parentes, as saudades do Brasil. Redação do Bafafá

Modesto Vive Perdemos Modesto da Silveira, o advogado que salvou muitas vidas durante a Ditadura. Sua memória ficará viva para sempre e sua figura entre os brasileiros mais dignos e corajosos do século XXI. Redação do Bafafá


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Rio de Janeiro - Dezembro / 2016

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Lula entrevistado por Oliver Stone “Cometemos o erro de não fazer a regulação dos meios de comunicação.” O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi entrevistado pelo laureado cineasta norte-americano Oliver Stone que veio lançar, em São Paulo, seu novo filme “Snowden – Herói ou Traidor”. No encontro, Lula falou sobre o reflexo da operação Lava Jato e da atuação da TV Globo no processo de impeachment de Dilma Rousseff. Segundo ele, houve um processo de violência contra a democracia. “Há uma quantidade enorme de mentiras, as coisas mais absurdas, que nem uma criança de parque infantil admitiria”, assegura Lula. E vai mais longe: garante que quando assumiu o governo em 2002 a Rede Globo estava quase quebrada. “Nós ajudamos a salvá-la”. Bafafá reproduz a entrevista publicada pelo blog Nocaute, do jornalista Fernando Morais. Questionado se os seus sonhos acabaram, Lula assegurou: “Enquanto estiver vivo continuarei sonhando”. Oliver Stone – Temos uma guerra aqui no Brasil? Aconteceu um processo de violência contra a democracia? Lula – Quando nós dois nos encontramos em Caracas, não, em Maracaibo, era um momento de muito otimismo na América Latina. Nós acreditávamos que estávamos construindo uma estrutura política mais duradoura. Mas aí veio a morte do Chávez, a morte do Kirchner, a minha saída da Presidência. E aí o trio que tentava organizar a América do Sul não existia mais. Foi uma pena. Uma pena. E eu sei que você tinha muita esperança, muita expectativa, mas precisamos começar tudo outra vez. Eu queria lhe dar os parabéns pelo novo filme, espero que tenha muito sucesso, como os outros. Bem-vindo ao Brasil. Oliver Stone – Muito obrigado. Eu gostaria muito de ver o senhor ser presidente novamente. Lula – Olha, temos uma guerra aqui no Brasil. No Brasil aconteceu um processo de violência contra a democracia. Há todo um trabalho de construção de uma teoria mentirosa para justificar o afastamento da Dilma e a criminalização do PT. Eu fico pensando: não teria sentido eles darem o golpe parlamentar que deram e dois anos depois me devolverem a Presidência. Eu acho que neste momento eles trabalham com a ideia de tentar evitar que eu tenha qualquer possibilidade de participar das eleições de 2018. E como eles não podem evitar a decisão do povo, eles estão tentando via Poder Judiciário. Há uma quantidade enorme de mentiras, as coisas mais absurdas, que nem uma criança de parque infantil admitiria. E há uma combinação perfeita da imprensa, da Policia Federal e do Ministério Público que constroem, cada um a seu tempo,

as mentiras. Só para você ter uma ideia, de março a agosto o principal canal de televisão aqui do Brasil, no seu principal jornal, teve 14 horas de matérias negativas contra mim. Em cinco meses. Oliver Stone – O Sr. se refere à TV Globo? Lula – E eu não sei como é que isso vai terminar, porque eu tenho desafiado a provarem que algum empresário tenha me dado dinheiro. Eu vou até pedir a ajuda da CIA, para ver se conseguem descobrir uma conta minha no exterior (riso). Agora, por falta de prova, eles dizem o seguinte: não peçam provas, porque o Lula criou um partido, esse partido é uma organização criminosa, o Lula indicou os ministros para roubar, portanto Lula é o chefe. Não temos provas, eles dizem. Nós não temos provas, mas temos convicção. Então o que deixa todos eles preocupados é que quando fazem pesquisa de opinião pública eu apareço em primeiro lugar para 2018. Então eu não sei como é que vai ficar. Por enquanto, paciência.

republicana. A Rede Globo estava quase quebrada. E nós ajudamos a salvá-la. Cometemos o erro de não fazer a regulação dos meios de comunicação. A TV Globo, em parceria com a Netflix, pretende fazer um documentário sobre a Lava Jato sem sequer esperar encerrar o processo. Eu serei o Pablo Escobar. Não precisa ser culpado, basta ter uma denúncia que o juiz manda prender. Todos os dias sai uma manchete nos jornais e a pessoa não pode nem ser absolvida pela justiça. O poder executivo está com medo, o poder judiciário está com medo, o poder legislativo também. Hoje no Brasil tem um juiz de primeira estância e um grupo d e procuradores messiânicos que se acham ungidos por Deus. E com uma imprensa que transforma mentiras em verdades. Eles construíram a doutrina de desmoralização da oposição. O PT era o partido mais forte do Brasil e eles trataram de desmoralizar o partido. E nada melhor para isso do que falar em

Oliver Stone – O senhor tem grandes parceiros com quem pode contar, que lhe deem apoio? Lula – Nós entramos com um processo nas Nações Unidas, em Genebra, temos um movimento sindical internacional fazendo campanhas de denúncias, e vamos trabalhar agora os processos juridicamente. Oliver Stone – O senhor tem algum parceiro na mídia? Lula – Nenhum. Só os blogs. Quando fui presidente, eu governei de forma

corrupção. E realmente tivemos companheiros do PT que fizeram bobagem. Ainda assim, o PT é o partido mais enraizado na sociedade brasileira. Agora tivemos uma derrota muito grande nas eleições municipais, pois utilizaram a operação Lava Jato contra o PT. Oliver Stone – E no campo interna-

cional como viu a atuação de Hillary Clinton? Lula – Não gosta da América Latina. Eu tive dois atritos com ela. Na cúpula do clima em Copenhagen, depois de passar dois dias fazendo reuniões com outros países, ela chega atrasada e quer tomar conta da reunião. Então disse para ela que aquela era uma reunião de presidentes e que ela não era presidente e que esperasse sua vez de falar. O outro atrito, também em Copenhagen, foi numa reunião dos Brics, entre o Brasil, China, Índia e África do Sul. A Hillary tentou entrar na reunião e os chineses não deixaram. Por minha interferência, o Obama teve acesso e acabou muito criticado. Foi ali que descobri que a secretária de Estado Hillary Clinton não gostava da América Latina, apesar de o Brasil poder ser um parceiro privilegiado. Mas, a verdade é que eles nunca aceitaram que o Brasil tivesse protagonismo no continente. Eu sonhei que o Brasil pudesse ajudar a encontrar um outro comportamento político no mundo. O Brasil não tem contencioso com nenhum país. Tanto que fui convidado para todas as reuniões do G8 e era tratado com muita deferência por todos eles. Sonhei que era possível criar uma nova política internacional. Lamentavelmente descobri que nos Estados Unidos o presidente pode muito pouco e que a política europeia está terceirizada. Quem governa são funcionários e não presidentes eleitos. Oliver Stone – Os seus sonhos acabaram? Lula – Enquanto estiver vivo continuarei sonhando. Eu tenho muita capacidade de resistência. O único medo que tenho é de trair as expectativas de milhões de brasileiros e brasileiras.


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