Teologia Latino Americana - José Miguel Mendoza Aguilera - UNIGRAN
Aula 07 TEOLOGIA DA PROSPERIDADE
Nesta aula apresentaremos uma linha teológica que tem marcado as últimas décadas do movimento evangélico: A Teologia da Prosperidade. Embora não seja desenvolvida no “pensamento latino-americano” esta teologia tem promovido o crescimento numérico de algumas denominações. Muito divulgada por meio da mídia, a teologia da prosperidade tem alcançado popularidade dentro das igrejas de cunho neopetencostal. O seu avanço no Brasil e na América Latina tem chamado a atenção de diversos estudiosos da Sociologia da Religião. A promessa de grandes realizações financeiras e conquistas de bens de consumo têm atraído não somente as classes necessitadas, mas também aquelas que aparentemente vivem com suas necessidades supridas. A mensagem de prosperidade financeira, de bens, do sucesso, tem cativado multidões que lotam pequenos ou grandes templos. 67
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A Teologia da Prosperidade não reflete as circunstâncias sócio-históricas para criar comunidades que transformem a sociedade. A TP é um discurso de “espera”; discurso “do pode acontecer” e de “compra e venda”. Mas devido a sua popularidade e repercussão no mundo eclesial, tornam-se necessárias algumas informações básicas e centrais levando-nos a uma maior compreensão de nossa prática teológica.
1. RETROSPECTIVA HISTÓRICA DA TEOLOGIA PROSPERIDADE1 O evangelho da prosperidade é algo novo na história da igreja. Seu aparecimento, contudo, desenvolveu-se gradativamente e tem sua origem ligada a pessoas, épocas e lugares diversos. Estaremos aqui, lançando um fundamento histórico, que nos conduzirá a um melhor entendimento da sua expansão no Brasil. Mediante pesquisas realizadas nos Estados Unidos, duas raízes históricas e filosóficas foram identificadas: o pentecostalismo e as várias seitas metafísicas do início do século XX que floresceram na área de Boston. Dessas duas fontes, o pentecostalismo forneceu a base ou o grupo no qual a teologia encontrou a maior parte de seus adeptos, possivelmente pelo fato destes aceitarem os dons de profecia e os profetas dos dias atuais que afirmam exercer estes dons. Com essa abertura para visões, revelações e orientações contínuas extra-Bíblia cria-se um espaço que auxilia no crescimento desta teologia. Embora as igrejas pentecostais e carismáticas a acolhessem numa proporção maior, foram as seitas metafísicas que forneceram os ensinos e a base que deram forma ao evangelho da prosperidade. Dessa forma, podemos dizer, resumidamente, que os adeptos do movimento pentecostal foram o solo fértil para frutificar essa teologia, porém as seitas metafísicas ofereceram o referencial teórico para o seu alicerce teológico.
2. A RELAÇÃO COM O PENTECOSTALISMO No final do século XIX, vários pregadores na América do Norte começaram a afirmar que todos os cristãos tinham o direito à saúde como parte da expiação. Entre os tais destacaram-se A. J. Gordon, fundador de uma respeitada instituição de ensino teológico, e A. B. Simpson, fundador da Aliança Cristã e Missionária. Ambos escreveram livros sobre cura até hoje muito utilizados. Muito embora os ensinos de prosperidade não tivessem origem dentro do pentecostalismo, a tendência das denominações pentecostais de aceitarem afirmações de autoridade profética “extra-bíblicas” criou um espaço teológico no qual a doutrina da prosperidade pôde firmar-se e crescer. A conclusão histórica que aqui fazemos é que, embora portador da doutrina, o pentecostalismo não a tem como parte de suas crenças fundamentais. 1
PERATT, Alan B. O Evangelho da Prosperidade. S.Paulo Ed. Vida Nova 1995.
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No final do século XIX, o chavão “cura pela fé” tornou-se popular tanto na Europa como nos Estados Unidos. Evangelistas itinerantes que afirmavam ter dons de curar, de línguas, etc., dedicaram-se à divulgação desse ensino, e até compartilharam a ideia de não compactuar com o ensino formal teológico.
3. AS ORIGENS DAS SEITAS METAFÍSICAS O núcleo conceitual do evangelho da prosperidade está numa cosmovisão que remonta não à doutrina pentecostal, mas a alguns pequenos movimentos heterogêneos do início do século XX conhecidos como “seitas metafísicas”. As seitas metafísicas eram assim conhecidas por ensinarem que a verdadeira realidade é “meta-física”, ou seja, vai além da realidade física. Isso significa que a esfera do espírito não somente é maior do que o mundo físico, mas controla cada aspecto dele e é a causa de todos os efeitos por ele sofridos. Além da ênfase no “direito à cura”, essa teologia reivindica também o direito à “prosperidade” por meio da confissão positiva. A ligação doutrinária entre elas e o ensino do evangelho da prosperidade convergem para apenas dois homens: Kenneth Hagin e E. W. Kenyon. • Kenneth Hagin – Nascido em 1918, teve sua saúde debilitada durante a infância. Foi educado num ambiente de relativa pobreza, uma vez que foi uma época difícil na história dos Estados Unidos e também pelo fato de seu pai ter abandonado a família quando Hagin tinha seis anos de idade. Ao atingir a adolescência, sua saúde piorou. Aos 16 anos de idade foi confinado a uma cama com perspectivas de pouco tempo de vida. Segundo seu testemunho, ele ficou ali durante 16 meses, “antes que sua vida mudasse radicalmente para melhor”. Ainda, segundo ele narra, duas coisas aconteceram para mudar a sua sorte: Primeiro, afirma ter recebido uma série de visões nas quais foi levado primeiro ao inferno e depois ao céu, três vezes em seguida. Segundo, ele diz aos seus seguidores que, logo depois disso, recebeu uma revelação do “verdadeiro” significado de Marcos 11.23, 24 e da natureza da fé cristã. A essência dessa revelação era que, para obter resultados da parte de Deus, o fiel deve confessar em voz alta seus pedidos e nunca duvidar de que tenham sido respondidos, mesmo que as evidências físicas não indiquem que a oração foi atendida. Uma vez feita a oração, o fiel deve afirmar constantemente a resposta, até que surja a prova. Essa é, por certo, a essência daquilo que é hoje ensinado como “confissão positiva”. Hagin afirma que a fonte disso não foi outra senão o próprio Senhor. Hagin não teve nenhum treinamento teológico formal. Assim como o apóstolo Paulo, afirmava que nenhum homem lhe ensinou sua doutrina, uma vez que ele a recebeu diretamente de Cristo. (Em contraste com isso, temos Paulo, que antes de se converter, era um rabino judeu altamente treinado). • E. W. Kenyon – Tudo indica que Kenyon foi a verdadeira fonte dos ensinos de Hagin. Kenyon foi pastor em várias igrejas e tornou-se evangelista itinerante sem nenhum 69
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vínculo denominacional. Com o passar dos anos iniciou suas atividades como radialista e produziu 18 livretos sobre seus ensinos. Assim como Hagin, Kenyon não frequentou um seminário teológico. Estudou numa escola de nível inferior ao universitário. Matriculou-se no Emerson College, em Boston, núcleo do movimento “transcendental” do final do século XIX e início do XX. As sociedades filosóficas desse tempo são reunidas sob o título de “seitas metafísicas”, das quais podemos citar como exemplo: “Escola da Unidade do Cristianismo”; “Ciência Divina”; “Igreja da Ciência Religiosa”; “Lar da Verdade”; “Igreja da Verdade” ; “Liga da Igreja de Cristo”. Apresentaremos a seguir algumas marcas teológicas dessas seitas. Primeiro: eram conhecidas como “metafísicas” por ensinarem que a verdadeira realidade é “metafísica”, ou seja, vai além da realidade física. Isso significa que a esfera do espírito não somente é maior do que o mundo físico, mas também controla cada aspecto dele e é a causa de todos os efeitos por ele sofridos. A ideia da seita metafísica é ensinar que a ação deve ser “tratada”, “conquistada”, “desenvolvida” no mundo espiritual, antes de qualquer ação humana ou até divina. Para eles, a esfera espiritual pode ser controlada pela mente humana e, se o homem entender corretamente as leis espirituais da vida e tiver fé para agir segundo elas, poderá atingir resultados espantosos. Em segundo lugar, para eles a cura constitui o principal ponto de destaque. A Enciclopédia Britânica, em seu artigo que aborda essas seitas metafísicas, descreve-as como um movimento de “cura pela mente”. O ensinamento central do “Novo Pensamento” foi que o pensamento evolui e desabrocha, cria e modifica nossa experiência nesse mundo. O movimento coloca bastante ênfase no pensamento positivo, na autoafirmação, na meditação e na oração. Para esse movimento, se pensarmos de modo certo, podemos controlar nossa saúde e, se nossa capacidade mental for especialmente grande, podemos dar forma a cada aspecto de nossa vida, decidindo-nos por ter saúde e prosperidade. Essa teologia ensina que a “prosperidade financeira” é um direito do cristão, pois faz parte da expiação efetuada por Cristo. É comum ouvirmos os pregadores da teologia da prosperidade afirmarem que “Deus quer que seus filhos comam a melhor comida, vistam as melhores roupas, dirijam os melhores carros e tenham as melhores coisas”. Observemos o que afirmou Hagin, citado por Pierratti: “... muitos crentes confundem humildade com pobreza. Um pregador certa vez me disse que fulano possuía humildade, porque andava em um carro muito velho. Repliquei: ‘Isso não é ser humilde – isso é ser ignorante!’ A idéia que o pregador tinha de humildade era a de dirigir um carro velho. Um outro observou: ‘Sabe, Jesus e os discípulos nunca andaram num Cadilac.’ Não havia Cadilac naquela época. Mas Jesus andou num jumento. Era o ‘Cadilac’ da época – o melhor meio de transporte existente. Os crentes têm permitido ao diabo lesá-los em todas as bênçãos que poderiam usufruir. Não era intenção de Deus que vivêssemos em pobreza. Ele disse que éramos para reinar em vida de reis. Quem jamais imaginaria um rei vivendo em estrita pobreza? A idéia de pobreza simplesmente não combina com reis” (Autoridade, 48). “...ainda seus ensinos, a pobreza é fruto da falta do conhecimento de seus direitos, falta de fé para afirmar tais direitos ou o diabo o está impedindo de 70
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recebê-los. Se houver uma suspeita de que a última causa é o problema, uma sonora repreensão irá liberar tudo aquilo que o cristão tem por direito: “...tudo quanto você precisa fazer é dizer ; Satanás, tire suas mãos do meu dinheiro” (Limiares, 67).
4. BASES DA TEOLOGIA DA PROSPERIDADE Na análise feita dos livros de Kennet Haggin pode-se observar as bases que sustentam de forma coesa a pregação prospera dessa teologia. Os escritos de Haggin fazem sentido pois eles estão organizados sobre as bases de Autoridade Profética, Saúde, Prosperidade e Confissão Positiva. 4.1. Autoridade Profética Na leitura e exame dos livros de Hagin evidenciase a reinvidicação de uma autoridade profética. As experiências relatadas por Hagin, relacionadas a visões, sinais e maravilhas, são fornecidas para dar substância e firmeza à alegação de que Hagin é um profeta de Deus, o qual recebeu uma revelação nova para os últimos dias. O selo de aprovação aos seus ensinos, por meio dessas ações sobrenaturais, justifica o seu ministé rio público. Ainda deve ser dito que Hagin não permite que seus ensinos sejam questionados. As suas visões não podem ser objeto de discussão pelos seus seguidores, nem mesmo por sua esposa. Alguns autores oferecem relatos de confronto de Hagin com a sua esposa por esta ter questionado suas posturas. 4.2. Saúde Para a TP a doença não é da vontade de Deus para o cristão e este não tem necessidade de se confrontar com ela durante a vida. A experiência pessoal de Hagin conduz nos seus livros a sua teologia. Para Hagin o “sofrimento” indicado nos textos bíblicos não se refere às doenças. Há sofrimento, mas não doenças. Para ele, os relatos bíblicos que apresentam as doenças, referem-se a falta de fé das pessoas. 4.3. Prosperidade Para Hagin a prosperidade financeira é um direito do cristão, pois faz parte da expiação efetuada por Cristo. Hagin acha importante modificar o ensino que a igreja tem dado ao lado espiritual da salvação e isso pode ser feito dando-se o destaque ao lado financeiro. Nesse ponto Hagin segue a mesma argumentação relacionada à saúde. 4.4. Confissão Positiva Sem nos delongarmos este tópico, podemos colocar as regras que orientam essa complexidade da confissão positiva: 71
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• O conhecimento dos direitos do fiel • A firmeza da fé do cristão • O uso adequado do Nome de Jesus • A ausência da dúvida • A confissão do fato já consumado Conclusão Embora não de forma sistemática, Hagin transforma-se (e conduz outros pregadores e cristãos) num “cristão dualista”: 1. Dualismo do Corpo e do Espírito: essa distinção não é a distinção clássica da linha cristã conhecida como dicotomista ou tricotomista. Para Hagin o verdadeiro valor está no espírito, pois é ele que se relaciona com Deus. O corpo é apenas um invólucro. Esse dualismo possibilita a confissão positiva 2. Dualismo no conhecimento: Para Hagin somente o lado espiritual do homem pode ter percepção do conhecimento mais elevado. Por esse motivo, a razão deve ser rejeitada em questões de fé. Hagin apresenta a verdade revelacional que não se refere as Escrituras Sagradas, mas às próprias experiências místicas ou as de qualquer cristão que “sentiu” ter essa revelação. Para ele, este seria um “ conhecimento superior”. O conhecimento físico é conhecimento inferior e chamado “conhecimento dos sentidos”. Nesse dualismo, a TP e Hagin aproximam-se muito mais dos ensinos gnósticos, condenados pelos apóstolos Paulo e João e das religiões de mistérios do segundo e do terceiro século. 3. Dualismo na salvação: Para Hagin, o sofrimento físico de Cristo podia fazer expiação por nossa natureza física, mas nosso espírito precisava de algo mais. Por isso, Hagin conclui que Jesus precisava morrer duas vezes, uma fisicamente e outra espiritualmente. Na cruz morreu a sua morte física e ele desceu para o inferno onde sofreu e morreu sua morte espiritual. Em seu livro “Nome”, citado por Pieratt, Hagin declara que a morte espiritual significa mais que a separação de Deus: “a morte espiritual significa ter a natureza de Satanás”. O processo de morte para Hagin está baseado na frase de Atos:13:33 “hoje eu te gerei é assim”. • Jesus vai à cruz com sua natureza divina intacta; • Quando Jesus pergunta por que foi desamparado, assume a natureza satânica, a mesma do homem decaído; • Depois que a expiação estava encerrada tanto fisicamente quanto espiritualmente, a natureza divina de Jesus lhe é restaurada.; 4. Dualismo de deuses: Por ser Satanás o deus deste mundo, todos os problemas da humanidade são frutos da sua natureza negativa. Por isso, para Hagin, quando o cristão fala de doença, a exaltação recai sobre Satanás. Ele é a origem da natureza humana decaída, pois quando Adão pecou, ele morreu espiritualmente e recebeu a natureza de Satanás. Finalizando, recomendo a cada aluno aprofundar-se no conhecimento deste ensino 72
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que está no meio da igreja cristã. Muitos pregadores, até de forma inocente, ignoram que estão transmitindo esses ensinos “dualísticos e metafísicos” numa roupagem de pregação cristã. Na sistemática do ensino da TP não há como extrair uma parte desse ensino como sendo mais coerente biblicamente, sem trazer o rescaldo das marcas do gnosticismo dualístico e da diminuição da obra e pessoa de Cristo. Esse é um fator que se impregnou nos púlpitos evangélicos; na tentativa de serem teologicamente contemporâneos, acabaram por ficar de fora do alvo bíblico. Na visão cristã não há dualismo: O Verbo se fez carne. BIBLIOGRAFIA PIERATT, Alan B. O Evangelho da Prosperidade. São Paulo: Vida Nova, 1993. ROMEIRO, Paulo. SuperCrentes: o evangelho segundo Kenneth Hagin, Valnice Milhomens e os profetas da prosperidade. 6 ed. São Paulo: Mundo Cristão, 1998.
ATIVIDADES As atividades referentes a esta aula estão disponibilizadas na ferramenta “Atividades”. Após respondê-las, envie-nas por meio do Portfólio- ferramenta do ambiente de aprendizagem UNIGRAN Virtual. Em caso de dúvidas, utilize as ferramentas apropriadas para se comunicar com o professor.
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