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10 ANOS DO APARECIDOS POLÍTICOS



10 ANOS DO APARECIDOS POLÍTICOS Ana Cecília Soares e Júnior Pimenta (Orgs.)

1ª edição / Fortaleza Abrail, 2021


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Esta publicação é o agrupamento de dez anos de atuação político-artística dos Aparecidos Políticos, assim como a concentração de muitas vozes. O coletivo nasceu em 2010, quando alguns de seus integrantes presenciarem a chegada dos restos mortais do militante político, Bergson Gurjão Farias; após 37 anos de seu desaparecimento pela ditadura militar brasileira. A cidade de Fortaleza conhecia pouco de Bergson, homenageando, inclusive, torturadores com nomes de ruas, prédios públicos, creches e mausoléu. Diante desse contexto e com o intuito de revertê-lo, os Aparecidos resolvem de fato iniciar sua atuação. Ao longo desses 10 anos, realizaram intervenções urbanas como escrachos, grafites, lambe-lambe, rádio, publicações e cartografia da memória da repressão em Fortaleza, na luta por memória, verdade e justiça. E é exatamente a ideia da cartografia que nos serviu como guia para nortear o projeto editorial deste livro. Porém, buscamos pensá-la de uma maneira que não se prenda a uma linearidade temporal. Outro aspecto importante, consiste na relação do tempo e de como a violência e os resquícios da ditadura ainda seguem nas práticas em nossa sociedade, a exemplo do tenebroso e recente golpe exercido contra a presidenta Dilma Rousseff. Apesar das muitas dificuldades, acreditamos na força das muitas vozes que se somam ao coletivo e desejamos muitos e muitos anos de luta, afinal somos os que foram. Ana Cecília Soares e Júnior Pimenta organizadores


Dados internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) de acordo com ISBD S582 Silêncio das coisas, O: Herbert Rolim/ Organização de Ana Cecília Soares, Júnior Pimenta. – Fortaleza: Editora Reticências, 2019. 168 p.: il. Textos em Português e Inglês ISBN 978-65-81223-00-7 1. Artes visuais. I. Rolim, Herbert. II. Soares, Ana Cecília. III. Júnior Pimenta. IV. Título. CDU 7

Editora Reticências Rua Monsenhor Otávio de Castro Nº 435, Sala 01, Bairro de Fátima Fortaleza - Ceará www.editorareticencias.com.br

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Aparecidos Políticos Nome do trabalho, ano Créditos de foto ( Isso em todos trabalhos)

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Em Outubro de 2009 a nossa familia

enfrentou momentos de extrema dor, felicidade, angústia e alegria, sentimentos emaranhados como um novelo, sem que pudessemos separar a intensidade de cada um. Nessa ocasião se realizava o velório e enterro do meu irmão Bergson Gurjão Farias que desapareceu na Guerrilha do Araguaia em 1971. Fazia 40 anos que procurávamos o Bergson. Através dos anos, várias testemunhas locais diziam que o Bergson estaria enterrado no cemetério de Xambioá. Familiares de outros guerrilheiros levaram uma equipe de cientistas Argentinos para tentar identificar os 3 corpos que habitavam o mesmo túmulo. Na ausência de resultados conclusivos, foram reenterrados e um deles foi batizado com o nome de X2. Passaram-se muitos anos até que o X2 foi morar dentro de uma caixa, em um escritório do Ministério da Justiça, em Brasilia, onde permaneceu por mais alguns anos. Quando estive em Fortaleza em 2008, li um artigo publicado na revista Veja, que mostrava a fotografia de uma caveira dentro de um saco de papel. O artigo identificava a foto como sendo o X2 e, possivelmente, o Bergson. Não há como descrever a ira da família. Escrevi um artigo para o jornal O Povo, expressando a nossa revolta sobre o tratamento dos restos mortais dos nossos entes queridos. Depois de muitos e-mails, contactos com várias organizações de familiares dos desaparecidos e órgãos governamentais, o X2 foi finalmente identificado como sendo o Bergson através da comparação com o DNA materno. Depois de uma longa viagem, o filho querido voltou para casa. Fomos esperá-lo na Base Aérea de Fortaleza. A nossa mãe Luiza, com seu jeito calado de chorar, recebeu a urna contendo o filho por quem esperou tantos anos. Suas lágrimas partiram o coração de todos nós. A identificação do Bergson destruiu os ultimos resquícios de esperança que a nossa mãe guardava. Por outro lado, fechou o parêntese e nos


permitiu continuar a nossa jornada com os olhos para o futuro. O velório do Bergson na Reitoria da UFC foi uma ocasião alegre apesar das lágrimas. Lá encontramos amigos do tempo de estudantes, professores e politicos, todos prestando homenagem ao guerreiro que se sacrificou por um Brasil livre, sem torturas e sem censuras. Foi emocionante ver tantos jovens universitários que conheciam a sua história e levantaram a Bandeira da Democracia em nome dele. Desses jovens nasceu o coletivo Aparecidos Políticos que juntaram arte com ativismo politico e que até hoje se empenham em lembrar aqueles que ainda não apareceram. Eles são a nossa memória. São os arautos que, sem palavras, proclamam os nomes dos nossos desaparecidos pelos 4 cantos da cidade em forma de arte . É gratificante saber que existe um grupo de jovens que, numa explosão de talento , não nos deixa esquecer a Jana, o Teodoro e tantos outros desaparecidos. Eu poderia ter falado das lembranças boas que guardo do meu irmão, do quanto ele alegrou as nossas vidas. Poderia ter falado do Bergson criança, adulto, guerreiro, mas preferi falar dos momentos que mais tiveram impacto nas nossas vidas. O momento em que ele chegou e foi depositado ao lado do nosso pai, no Parque da Paz. A nossa mãe nos olhou com um olhar tranquilo e nos disse: “Agora eu já posso ir”. E se foi quatro meses depois. Ielnia Farias Johnson¹ Alexandria, 11 de Janeiro de 2021

¹ Ielnia Farias Johnson, é irmã de Bergson Gurjão Farias, Brasileiro assassinado pela ditadura militar brasileira. Bergson foi morto na região do Araguaia, em 1972, onde vivia na clandestinidade após ser condenado pela Justiça Militar por participar do movimento estudantil.

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Entrevista com Paulo Abrão

Ex-secretário executivo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e ex-presidente da Comissão de Anistia Como você conheceu o coletivo aparecidos políticos? Conheci algumas pessoas que fundariam o coletivo durante a sessão oficial de devolução dos restos mortais de Bergson Gurjao na UFC do projeto memória e verdade da SDH da Presidencia da República. Nesse dia também houve uma caravana da anistia para pedir desculpas oficiais do Estado para a sua familia. Em seguida fomos observando o surgimento do coletivo e sua vanguarda na identificação de novas formas de mobilização social pela memória, em particular pelo uso de intervenções artísticas urbanas. Não tivemos dúvida em organizar a seguinte Caravana da Anistia no Ceará junto com eles e foi a primeira vez que se agregou na agenda do evento um conjunto estruturado de atividades artísticas. Foi um fato muito marcante a organização da procissão da Caravana da Anistia pelas ruas de Fortaleza e as atividades plásticas, musicais e teatrais. O coletivo, portanto, teve incidência sobre a (re)concepção do projeto educativo da Comissão de Anistia porque se afirmou como uma experiência e referência sobre como poderíamos ampliar o alcance militante do trabalho oficial de preservação da memória históricos do país que estava sendo desenvolvido pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça para outras linguagens, em muitos contextos, muito mais efetivas que as solenidades típicas do Estado brasileiro. Você é umas referências nas políticas públicas de memória e justiça de transição no Brasil e no mundo. Em um artigo, escrito com marcelo torelly, você cita o coletivo como pertencente a uma terceira onda de movimentos por justiça de transição, seguido do levante popular da juventude, coletivo politico quem. Como você analisa o trabalho do coletivo aparecidos políticos no contexto de hoje.


Dos novos movimentos sociais que se engendraram ao redor do novo movimento por justiça de transição, o Coletivo Aparecidos Politicos se manteve sustentável e atuante por todos estes anos. O que demonstra a solidez dos fundamentos do trabalho de base ali realizado e a dedicação dos seus integrantes. Aqueles jovens que se deixaram tocar pela consciência de que a memória tem um efeito transformador para disputar politicamente uma sociedade mais democrática, mais humana e mais solidária hoje são “veteranos” que multiplicam para outras novas gerações a memória e verdade como valores fundamentais. Essa dedicação tem impacto para a resistência democrática do presente. Enquanto que o país vive graves retrocessos democráticos e de direitos humanos, a importância do Coletivo Aparecidos Politicos está em ser um lugar privilegiado e preparado para se fazer as pontes entre o pasado ditatorial e o presente autoritário. Tanto pelo aspecto da resistência quanto pelo aspecto da capacidade de uma refinada leitura política que alerta para as deteriorizações do campo das liberdades públicas que o governo Bolsonaro representa. Qual a importância que você vê de um coletivo formado por pessoas que não vivenciaram a ditadura atuarem no campo da justiça de transição? A luta contra o autoritarismo é transgeracional. Toca a cada geração identificar seus desafios e saber atuar. Para ser consistente, esse trabalho deve acumular a experiência dos períodos anteriores e deve ajusta-las, transformá-las e amplia-las às particularidades do seu próprio tempo. A democracia é um processo, requer cuidado permanece. Condenar, denunciar e conhecer sobre as ditaduras e as suas consequências para os direitos humanos é uma responsabilidades tanto da geração que a viveu quanto da geração que não a viveu. Os processos traumáticos perduram e seu processamento também. Por exemplo, a luta por justiça para as

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vítimas de tortura levam décadas para consolidar-se. Muitas vezes seus resultados são usufruídos apenas pela geração seguinte. Então é um pouco isso: dar continuidade às lutas sociais por liberdade é uma ação histórica que transcende gerações. O sr é uma figura pública que atua muito no campo do direito internacional e no âmbito jurídico. Qual a importância que você vê no trabalho de um coletivo que traz a arte para uma interlocução com a memória e a justiça de transição? A união da arte e da militância é uma tradição forte no mundo e especialmente na América Latina. Quantas de nossas melhores expressões artísticas não proveem dessa tradição? De significar a produção artística ao local onde o trabalho foi realizado, ao tema escolhido, à composição alcançada e a quem o executou. Muitas pessoas presas e perseguidas políticas também canalizaram sua resistência pela expressão artísticas. Muitos artistas produzem a arte dos direitos humanos e para os direitos humanos. Esses vínculos me fazem crer que não existem direitos humanos sem arte. Porque defender direitos humanos implica defender processos de emancipação, processos de indignação e de imaginação de outros mundos possíveis. A arte dos direitos humanos promove a perplexidade e por isso explora a potência emancipatória que está em cada um, no plano individual e coletivo. 5) você poderia dar uma pequena análise sobre o momento político brasileiro pós golpe parlamentar de 2016? Nunca tivemos tanta censura às artes e tantos riscos a democracia. Como você analisa isso? O Brasil está em transe. A exploração política e a manipulação midiática das denúncias de corrupção sistêmica provocaram um grande trauma social, abrindo as portas para as novas expressões e experiências autoritárias.


É neste contexto que o pensamento facista tupiniquim sai de novo do armário. E retoma sua força histórica. As elites econômicas, por sua vez, estão se aproveitando para aprofundar seu projeto concentrador e, por isso, dando conveniente sustentação ao projeto político autoritário. Hoje temos em vigência um anti-governo, com um projeto de Estado autoritário anti-social, anti-esfera publica, anti-emancipatorio e anti-solidário. Este projeto autoritário só se sustenta no tempo reduzindo os espaços da sociedade civil e das liberdades publicas, ou seja, oprimindo. Atualmente não são mais apenas riscos, são retrocessos concretos. Temos que viver um novo ciclo de acumulação de forças sociais e humanistas para ter condições de modificar essa realidade. E o uso da memória é um instrumento privilegiado para estabelecer esta nova fase da luta social no Brasil.

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Esse auditório, dentro desse Instituto Superior de Educação, Ciência e Tecnologia, possui o nome do primeiro Ditador do maior regime militar da história do Brasil: a Ditadura Militar (1964-1985). Acreditamos que batizar um espaço com o nome de um ditador, dentro de uma instituição educacional, é de certa forma, referenciar um regime político autoritário que cometeu crimes de lesa humanidade, assassinatos, desaparecimentos, estupros, torturas e perseguições políticas. O golpe de estado que colocou o desprezível Castelo Branco no poder e que provavelmente batizou esse auditório só devem tornar-se dignos de lembrança, apenas como fatos históricos vergonhosos de um passado que não deve se repetir. Aproximam-se os tempos em que nossos homenageados sejam aqueles que trazem os ventos da memória, justiça e verdade, aproximam-se os tempos de homenagear nossos mortos e desaparecidos políticos. Os Aparecidos Políticos Fortaleza, 11 de Junho de 2012

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CENTRO BENFICA AUDITÓRIO CASTELO BRANCO IFCE

ESCULACHO AUDITÓRIO CASTELO BRANCO Rebatismo no auditório do Instituto Federal do Ceará que leva nome de ditador. Intervenção realizada no dia 11 de junho de 2012 no Auditório Central do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia em Fortaleza-CE.

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BARRA DO CEARÁ AV. CASTELO BRANCO

AVENIDA LESTE OESTE Avenida Leste Oeste em 1973, presita avenida teve seu nome alterado para Avenida Presidente Castelo Branco. Contudo, no cotidiano dos moradores, a avenida contuava como Av. Leste Oeste.

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Entrevista com Renato Roseno Em virtude dos 10 anos de atuação do Coletivo Aparecidos Políticos e da divulgação da campanha para angariar verba para a produção do livro comemorativo foi realizada uma série de lives intitulada de Arte Livre. Nesta conversa, ocorrida no dia 7 de janeiro de 2021, os integrantes Alexandre Mourão e Stella Maris conversaram com o Deputado Estadual Renato Roseno (PSOL-CE). Dentre os assuntos abordados estavam: a justiça de transição, a memória, a verdade e a justiça relacionada a ditadura militar. Além disso, o diálogo girou em torno de uma importante lei, criada por Roseno, cuja finalidade é proibir que agentes violadores de direitos humanos sejam homenageados no Estado do Ceará. A ideia deste projeto partiu do trabalho Conexões Cartográficas da Memória, idealizado pelo próprio Coletivo, que consiste na denúncia a partir da elaboração de um mapa da cidade de Fortaleza com mais de 30 logradouros públicos “batizados” com nomes de ditadores. Abaixo segue alguns dos principais trechos da conversa.

Projeto de lei 136/16

Fico muito feliz com a caminhada do Aparecidos Políticos. Eu acho ousado, corajoso e queria logo no início dessa nossa conversa dizer que é fundamental você que está nos vendo aí apoiá-los, sobretudo, em um momento como este, em que é necessário fortalecer os sujeitos coletivos alto organizados em defesa da democracia. Bom, primeiro eu queria dizer que tudo que nós estamos fazendo é processo, então, não tem um autor só. E toda vez que eu falo dessa lei, eu digo que ela foi muito inspirada no movimento de memória, verdade e justiça e cito muito os Aparecidos Políticos, as associações de ex-presos políticos e anistiados,


como a 64/68 e outros movimentos, não só daqui do Ceará, mas em outras partes do país também foram e são fundamentais. Na verdade, é tributo à memória, é recuperação de um pedaço da história brasileira que o poder quer ver esquecido. Eu sempre lembro aquela frase monumental do Milan Kundera, no livro do “Riso e do Esquecimento”, que a luta contra o poder é a luta da memória contra o esquecimento. O poder nos quer desmemoriados, o poder nos quer fazer esquecer, por isso mesmo é tão importante nessa ideia de processo as leis de rebatismo, as leis de memória, as leis de vedação a homenagem a torturadores, elas estão presentes em várias expressões da luta pela democracia. Muito recentemente você teve, por exemplo, lá em Liverpool, Brighton e Bristol, três cidades britânicas que entre os séculos XVII e XIX, sobretudo nos XVII e XVIII tiveram crescimento econômico muito importante por causa do tráfico negreiro, você tem lá a substituição de várias homenagens que eram feitas a mercadores de homens e mulheres escravizados. Então a luta pela memória e à luta pelo rebatismo, a luta pela vedação, é a própria luta por fazer história, por uma interpretação da história que acabe nos permitindo a movimentação em favor da democracia. Não é que nós estamos aqui reescrevendo fatos, mas estamos interpretando os fatos com os valores que nós achamos são os valores fundamentais para a democracia, para a dignidade humana, para a liberdade humana. Compreender que aquilo que em algum momento foi considerado normal entre aspas, não pode ser considerado normal depois. Sempre que eu estou dando aula, em especial sobre direitos humanos, logo na primeira aula, eu coloco para os alunos, a leitura do primeiro

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código penal, o código penal do império e vou falando do crime de sedição escrava, quando lutar pela própria liberdade era sancionado com pena de enforcamento, inclusive para brancos, que por ventura tivessem participação em sedições abolicionistas. Eu dou esse exemplo, quando eu coloco o artigo e pergunto para as pessoas: vocês acham que lutar pela sua própria liberdade no momento em que está sendo escravizado é um crime? As pessoas de pronto respondem: claro que não! Pois é, mas no direito brasileiro do princípio do século XIX, no primeiro império isso já foi um crime. Eu acho que toda a nossa luta é uma luta para sobretudo afirmar estes nossos valores e foi assim no interior da Assembleia. Inicialmente, a nossa proposta de lei era muito mais abrangente, ela foi muito reduzida, porque houve uma tentativa de desidratar o projeto, isso acabou acontecendo em alguma medida, mas a gente conseguiu fazer valer, a gente conseguiu que ele fosse ele fosse aprovado, isso para nós foi super importante. A conjuntura na verdade foi muito em razão do diálogo e tem que ter muita paciência histórica, veja tanto essa lei, como a lei Zé Maria do Tomé, que proíbe a pulverização aérea, são frutos de bandeiras históricas de vários movimentos. Elas só são possíveis como expressão jurídica depois que o caminho político com os movimentos e no diálogo, inclusive com essas forças, conseguiu, digamos assim, movimentá-las. Não é que elas passaram, digamos assim, a concordar plenamente com a nossa concepção, com o nosso programa, mas, sobretudo, o pêndulo da política, naquele momento, pendeu para o lado do reconhecimento dessas nossas bandeiras.


Fascismo no Brasil

Eu atribuo o que aconteceu de 2016 para cá, é que o pêndulo em especial da correlação de forças, da luta de classes, da história, esse pêndulo, ele está vindo em especial para aquilo que pode ser chamado de neofascismo, fascismo e autoritarismo. Tal autoritarismo está baseado, dentre outras coisas, a defesa da ditadura militar, a criação de mistificações, de fantasias como se na ditadura o Brasil fosse o paraíso, isso não é verdade. E todas as minhas falas são no sentido de dizer o seguinte: Olha nós não podemos homenagear aquilo que foi fruto de violência, de ruptura democrática e de uma mistificação histórica. Dizer que a ditadura militar não tinha corrupção, isso é uma grande mistificação histórica, na verdade você não tinha liberdade para saber das coisas, essa é uma diferença muito grande. Então a conjuntura naquele momento foi baseado em conjugação de muitos elementos digamos de força social, ou seja, você tem uma trajetória anterior a nós e ela tem que ser sempre reafirmada. Ela tem que ser homenageada e valorizada, nós temos que dar relevância aqueles que estiveram sempre nessa luta da memória, verdade e justiça e a paciência de fazer a articulação necessária. Essa junção de articulação, paciência, força, é fundamental para grandes feitos históricos. Eu acho que o que a gente viu nos Estados Unidos, ameaça hoje o que o Bolsonaro faz, nos orienta no seguinte, nós vamos precisar de uma grande conjugação de saber lutar, fazer a unidade e ter paciência para ampliar a força para derrotar o autoritarismo.

Arte, política e censura

A política e o teatro nascem no mesmo lugar. Eu gosto muito desse encontro que a humanidade produziu. A política é a dis-

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puta das expectativas sobre nós e sobre o mundo. Ou seja, a política não é só eleição, partido e voto. A cultura popular diz assim: chegou o tempo da política, e eu sempre digo: o tempo da política é todo dia! A arte é a ativação do sensível sobre nós e sobre o mundo, portanto, a arte e a política se relacionam nos mesmos campos, elas se relacionam nos campos entre, sobre o significado da nossa própria existência. Acho que os significados e os significantes da nossa existência estão a todo momento sendo debatidos em grandes distâncias: a estância da arte, a estância da política, a estância da religião, também né. Estão todo tempo debatendo a nossa existência e é exatamente para não ativar o sensível, é que o autoritarismo ele não permite uma arte livre. Veja, nada causa mais horror ao autoritário do que o pensador livre. Você citou Mário Pedrosa, em 1934, salvo engano, ele vai conhecer a União Soviética e volta rompido com o stalinismo, monta o grupo comunista Lenin com um grande cearense, lamentavelmente poucas pessoas conhecem, o Lívio Barreto Xavier, nascido em Granja, uma figura absurdamente genial, advogado e tradutor do Trótski aqui... Mário Pedrosa está para crítica de arte visual como o Lívio está para a crítica literária. O Lívio era da geração de Antônio Cândido, que inclusive veio a Granja a convite daquele. Ele tem um livro lindo chamado “Minha Infância em Granja”, onde aparece com Antônio Candido... O Lívio e o Mário entenderam o seguinte: olha nós não queremos nem o autoritarismo do varguismo, porque o Estado Novo já se apresentava, e nem o autoritarismo do stalinismo. Por isso que eles eram solitários revolucionários, em alguma medida nós continuamos essa trajetória da solidão revolucionária, porque não nos interessa nenhum tipo de totalitarismo, e isso é muito im-


portante, porque nós nos perfilamos pela oposição de esquerda e nós compreendemos que em nome dos programas políticos, por exemplo, a arte não pode ser tutelada. Por exemplo, quando você pega o Manifesto pela Arte Revolucionária do Trótski e do Breton, encontramos esta colocação: “sejamos socialistas na política e anarquistas na arte”. Quando dizem isso significa o seguinte: olha, nós queremos ter uma arte que ela não esteja vinculada a um determinado programa político. Nesse mesmo texto o Trótski ainda pergunta: Por que o operário não pode ter acesso ao romantismo alemão do século XIX? Claro que pode ter, ele pode ouvir o Beethoven e pode gostar... Ele tinha asco do realismo socialista porque achava ser o mesmo bastante redutor. Ele dizia assim: e se o operário gostar de Beethoven? O cara não pode gostar? Agora o que precisamos é ampliar as possibilidades de acesso. Por que as pessoas gostam de um determinado tipo de música que é sexista e machista? Porque lhes é apresentado aquilo, então entramos no outro debate que é o da indústria cultural e do digamos assim, da diminuição do sensível. Ou seja, a indústria da cultura de massa, os meios de cultura de massa, eles vão, dentre outras coisas, diminuir esse sensível, tanto é que nós hoje somos uma sociedade de autômatos. Veja, nós estamos em pleno século XXI, na era da robótica, da quarta revolução industrial, da revolução informacional da sociedade completamente modificada e nós vivemos hoje sob a égide do trabalho desregulado. As pessoas trabalham 14/15 horas por dia, tem até aqueles que estão lutando para trabalhar 14/15 horas por dia, ou seja, o sistema hoje ele nos embrutece, mais do que nunca. Diferentemente do princípio do século XX/XXI, a ideia que o sistema iria ampliar as possibilidades humanas e lá no século XIX, os operários dis-

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seram o seguinte, nós queremos 3 oitos: 8 horas de trabalho, 8 horas de educação e cultura, 8 horas de descanso. Se passaram 150 anos das greves dos 3 Oitos e Fortaleza ... Olha a memória aí, olha como a memória é importante, pouca gente sabe que Fortaleza teve a greve dos 3 Oito. Em 1899, o Partido Operário Cearense fez esta greve. A Suécia teve a greve dos 3 Oito, Londres, Chicago, Nova York ... O mundo inteiro teve! Passaram-se praticamente 120 anos e nós estamos ainda sob a égide de um mundo que retira o sensível e nos obriga, nessa nova “matrix”, a trabalhar incessantemente até exaustão. Você pega os estudos do Novaes, as pessoas estão morrendo de exaustão... Antigamente se morria de exaustão nos campos dos boias-frias cearenses de 18 anos que iam morrer lá em Presidente Prudente, interior de São Paulo, no corte da cana. Eles eram escravizados pelo tráfico. Hoje são os “uberizados” ... Sabe aquele filme do Ken Loach, “Você não estava aqui”, onde um homem morre de tanto trabalhar, ou seja, o capitalismo ele não nos dá nem sentido para vida, coisa que a arte busca. Ele não nos dá sentido de viver, ele não dá expectativa, é por isso que ele tem que ser superado, para achar um sentido para viver.

Assista entrevista completa através do Qr code:


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BARRA DO CEARÁ AV. CASTELO BRANCO

AVENIDA LESTE OESTE Avenida Leste Oeste em 1973, presita avenida teve seu nome alterado para Avenida Presidente Castelo Branco. Contudo, no cotidiano dos moradores, a avenida contuava como Av. Leste Oeste.

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COLÉGIO JUSTINIANO DE SERPA

CENTRO

COLÉGIO JUSTICIANO DE SERPA O Colégio Estadual Justiniano de Serpa foi um foco de luta e resistência do movimento secundarista. Adísia Sá | Em maio de 1968, Mirtes, então com 16 anos, foi expulsa do Colégio Justiniano de Serpa por decisão da diretora Adísia Sá, em função de sua atuação como presidente do Grêmio, ao opor-se à cobrança de taxas no estabelecimento.

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