contato cotidiano:
o homem e seu exterior
Trabalho de Graduação Integrado II (TGI II) Caderno de apresentação do projeto
Júlia Coelho Kotchetkoff Instituto de Arquitetura e Urbanismo (IAU) Universidade de São Paulo (USP) São Carlos, Novembro de 2013
Agradeço e dedico A Deus, meu Pai, e ao meu pai André À minha mãe Maria Santíssima e à minha mãe Maria Angélica Ao meu irmão Paulo Aos mestres e amigos que contrubuíram para a minha formação A todos os que buscaram compreender meu mar de ideias quando estas não estavam nem claras nem organizadas. Também aos que não procuraram entender, pois me forçaram a perseguir a clareza e a organização.
Índice Processo: formulação de questões 10 Objeto de trabalho 16 Conceito 20 Aproximação com os dois externos na história da arquitetura 42 Referências de projeto de arquitetura 45 Relato pessoal: hipóteses e conclusões 52 Introdução ao projeto 55 Escolha da cidade e do terreno 56 O terreno em si e seu entorno 60 O projeto: programa 68 O projeto: pensar cada espaço 84 Bibliogra a e Webgra a 131
CYMK, por Skurtur
1 Processo: formulação de questões
O processo deste trabalho não se deu de maneira linear e contínua. Mais que o aprofundamento em um único projeto, o andamento foi proporcionando diversas ideias que se sobrepunham, se ajustavam e se excluíam, e dessa maneira algumas propostas foram criadas, cada uma carregando um pouco da anterior junto ao resultado de novas re exões. As primeiras preocupações que surgiram, na disciplina de 'Introdução ao TGI', tratavam da in uência e percepção da luz. Questão que apareceu nesse momento com caráter prioritariamente estético e formal, depois se desdobrou no tema da importância do contato do homem com a luz natural. Não em termos de conforto luminoso, nem de sustentabilidade, mas no que toca ao não fechamento do ser humano em si mesmo. Por tal razão, o item do relacionamento com a luz do Sol foi expandido
para a comunicação com o ambiente externo. Nesse momento surge uma pergunta: o que é externo a cada homem? Formulo uma resposta que classi ca o externo 'natural', que corresponde aos fenômenos e
elementos não-humanos e não fabricados pelo homem, e o externo 'humano', que corresponde a toda relação com as outras pessoas e entre atividades humanas. Durante a elaboração dessas categorias, me atentei para notar o quanto faltam, nos espaços cotidianos, locais em que se pode ter de fato um contato tanto com o exterior 'natural' quanto com o 'humano'. Claro que há espaços de convivência e abertos nas cidades, mas reparei que eles pouco se ligam às atividades rotineiras de morar, trabalhar ou estudar, se alimentar. A maior parte do tempo as pessoas passam em locais que as fecham para seu exterior. Será que isso não poderia ser diferente? Ao re etir sobre tais questões percebi que estava tratando claramente de um contexto de vida urbana. De como se dá o dia-a-dia na cidade, ora dentro de espaços lacrados para
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Objeto nal da disciplina de Introdução ao TGI
as 'obrigações' rotineiras, ora em espaços abertos e de convívio para o descanso e o lazer. Ou então nem estas últimas atividades se dando em espaços ligados ao externo, ao se trocarem os parques pelos shoppings. Assim, se tratando de um caráter urbano, mas a intenção de trabalhar na escala do edifício, decidi que trabalharia com torres. Por serem elas símbolo da cidade e por, ao mesmo tempo, mostrarem com frequência e intensidade os problemas levantados, e abrigarem grande potencial para resolvê-los. A nal, uma torre normalmente contém um grande número de pessoas, mas que não se conhecem e não convivem, e (como insistia Le Corbusier) seu levantamento do solo pode permitir ampla visão e aberturas. Acerca de tais categorias foi pensado o projeto. O resultado nal é, por certo, apenas um modo dentre todos os em que poderiam ser
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trabalhadas tais questões. Por considerar que seria pertinente que, na vida real, se dedicasse a tais quesitos na construção dos edifícios que preenchem as cidades abrigando as funções cotidianas, ou seja, dos edifícios 'banais', criei também edi cações 'banais', situadas em um terreno 'banal', mais próximo do que seria um terreno 'padrão', e não em um sítio diferenciado ou especial. Demonstrando dessa maneira uma preocupação com o que ocupa cada ordinário lote da cidade, e atestando que os questionamentos que levantei poderiam ser elaborados em praticamente qualquer terreno ou prédio, e não só no lugar especí co em que estou projetando. As coisas ordinárias contêm os mistérios mais profundos (...). Ainda não temos a coragem de confrontar o ordinário como tal Robin Evans
Pranchas apresentadas durante o processo da disciplina de TGI, sobre o conceito e primeiras ações projetuais. Fragmentos ampliados na página seguinte.
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Nesta pĂĄgina e na anterior: Imagens da versĂŁo do projeto apresentada na prĂŠ-banca de TGI, posteriormente modi cada.
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2 Objeto de trabalho
Iniciou-se este trabalho de nindo-se qual seria seu objeto de projeto. Antes da procura por um local em especí co, foi determinado o tipo de edi cação e primeiros usos, uma vez que o tema sugeria tal procedimento. Dessa forma, foi estabelecido que se trabalharia com edifícios torres, destinadas a suprir usos cotidianos, em um contexto urbano e contemporâneo. Para estabelecer um recorte, o trabalho lida com o quadro das cidades brasileiras da região sudeste. A torre foi escolhida, como já explicitado no texto acerca do processo, devido ao seu simbolismo do caráter urbano, e por ser onde pouco veri ca-se contato do homem com os exteriores 'humano' e 'natural'.Em construções de baixo gabarito a aproximação com o 'lado de fora' parece mais simples de ocorrer, por estarem os 'pisos' junto ao 'chão' e haverem poucos 'tetos' para se
superar até alcançar o 'céu'. Foi importante para o desenvolvimento do trabalho a noção de que uma das principais sensações de 'exterioridade' está baseada na existência de um 'chão', térreo (não 'piso'), cuja
cobertura é somente o 'céu' (e não um 'teto').
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Interessante notar como a percepção da existência dessa dualidade é fundamental para a formação da noção de 'habitar' de Heidegger, esta conectada ao princípio de construir e também a alguma ordem espiritual: "Sobre essa terra" já diz, no entanto, "sob o céu". Ambos supõem conjuntamente "permanecer diante dos deuses" e isso "em pertencendo à comunidade dos homens". Os quatro: terra e céu, os divinos e os mortais, pertencem um ao outro numa unidade originária. A terra é o sustento de todo gesto de dedicação. A terra dá frutos ao orescer. A terra concentra-se vasta nas pedras e nas águas, irrompe concentrada na ora e na fauna. Dizendo terra, já pensamos os outros três. Mas isso ainda não signi ca que se tenha pensado a simplicidade dos quatro. O céu é o percurso em abóbadas do sol, o curso em transformações da lua, o brilho peregrino das estrelas, as estações dos anos e suas viradas, luz e crepúsculo do dia, escuridão e claridade da noite, a suavidade e o rigor dos climas, rasgo de nuvens e profundidade azul do éter.
Como poderia se dar essa noção tão profunda do habitar quando distante física e psicologicamente da terra 'da fauna e da ora' e da experiência das mudanças do céu? Ou seja, de um 'exterior natural'? A altura da torre e sua lógica de ter o piso sempre repetido, na função de teto, di culta a conexão com o céu e com o chão. Os modos possíveis de se retrabalhar tais relações foi alvo deste trabalho. Para tal, procuraram-se referências que contemplassem os aspectos citados, e a maioria que apresentava espaços interiores que se uniam ou
conectavam aos exteriores eram as de baixo gabarito. Posteriormente, principalmente ao pesquisar as propostas de 'torres verdes' contemporâneas, foram encontradas estratégias pensadas pelos arquitetos para tal tarefa em altura. Embora haja muitos projetos com tal caráter (a maioria não realizada, em especial os que plantam altas árvores nos seus múltiplos andares, e inclusive são amplamente criticados por isso), em poucos foi encontrado o outro fator importante para este trabalho: que o espaço voltado para o exterior natural também fosse palco para o contato de um homem com outros homens, e das várias atividades cotidianas destes seres humanos. De modo análogo, quando encontrava-se dentre as referências certos locais nas torres em que era propiciado convívio e conexão entre o morar e o trabalhar, por exemplo, muitas vezes
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tais ambientes não aproveitavam o seu 'lado de fora', e fechavam-se com vidros ou paredes. Vale ressaltar que as diversas ideias de jardins (abertos, descobertos) de descanso em torres, que começam seu legado a partir dos tetos-jardim do Movimento Moderno, são locais que, normalmente, não estão sicamente junto à agitação do dia-adia. Parece haver uma noção comum de que o ambiente do jardim denota sempre calma e pausa, que é análoga ao pensamento de que a natureza só pode encontrar-se no 'rural', no ambiente externo à cidade. Dessa maneira, os espaços abertos encontrados nas referências de torres pouco conectavam-se com o caminho e as ações do dia-a-dia, não se comportando como, por exemplo, o quintal (dos fundos ou da frente) de uma casa térrea, mas como uma segunda circulação, ou um segundo ambiente, para o qual é necessário dirigir-se a. Ou então, quando tais espaços mostram-se contíguos aos locais onde se dão as ações do dia-a-dia, eles con guram-se como varandas particulares, as quais somente propiciam o convívio entre os moradores dessa única unidade, e no máximo seus convidados, ou seja, de maneira limitada e controlada. Assim sendo, pareceu interessante procurar maneiras de ultrapassar os obstáculos que a torre oferece, e criar espaços que unissem a proximidade dos fenômenos e elementos naturais com a convivência entre os seres humanos. Se eu quero uma torre, como vou ter um jardim? Nossa arquitetura atual não combinou isso bem até hoje. É preciso transformar a arquitetura nessa direção para combinar essa densidade e o desejo humano por espaço. Winy Maas - MVRDV O interesse pelo cotidiano é proveniente de uma preocupação com os espaços em que as pessoas passam a maior parte de seu tempo. Não que a visita a espaços culturais, esportivos, e de lazer não possa ser bastante frequente, contudo é inegável que é no espaço de morar e de trabalhar/estudar que se constitui a rotina diária. E como encontram-se tais ambientes na contemporaneidade? Inclusive contando com as facilidades disponibilizadas pela comunicação via internet, é necessário que a habitação e o trabalho estejam distantes? E não seria favorável que eles estivessem também contíguos a espaços de lazer, descanso e esporte? Essa é notadamente uma questão contemporânea, já abordada em diversos projetos e teorias (de edifícios 'comerciais' multifuncionais em cidades de pequeno porte brasileiras, como Patos de Minas (MG), a novos planos de Paris pensados pelos maiores escritórios internacionais), e que se comunica com a problemática dos meios de locomoção, bastante discutidas devido ao estado crítico de trânsito e poluição em que se encontram diversas cidades. Contudo, a
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temática da união de funções em um mesmo ou próximos edifícios, em seu limite chegando à autossu ciência, já foi abordada em outros momentos da história da arquitetura do urbanismo, por exemplo nos
falanstérios utópicos de Charles Fourrier, que inclusive eram como uma cidade construída no campo, e buscavam unir as vantagens propiciadas pelos avanços técnicos com a vida em comunidade.Neste trabalho é adotado o contexto urbano contemporâneo, e deseja-se obter dele traços mais gerais que especí cos. Ou seja, extrair características que não sejam próprias de uma ou outra cidade, e que sejam encontradas, até certo limite, em uma maioria delas, tanto nas de maior população e porte quanto nas de menor. Claro que o peso do dia-a-dia urbano é maior conforme aumenta o tamanho da cidade, contudo tomou-se o cuidado de não dar a impressão que as questões levantadas só existem em contextos metropolitanos, e por isso foi evitado São Paulo, que possui características únicas no panorama brasileiro.
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3 Conceito
Se a arquitetura é a projeção da sociedade e é iniciada por ela, não se pode construir algo que não seja a imagem do que já está presente, mas ao mesmo tempo há o desejo de criar possibilidades para uma nova sociedade (Walker; Tschumi) A arquitetura é o resultado do estado de espírito de uma época , dizia Le Corbusier. Ele comenta, e critica, que a produção arquitetônica de sua época não estava re etindo o 'espírito do tempo' e que suas próprias propostas o fariam. O arquiteto dizia ser urgente observar como as recentes mudanças na organização política, social, econômica alteravam o modo de vida das pessoas, em suas rotinas e percepções. E, desse modo mostrava a importância de fazer com que seu trabalho respondesse às problemáticas
geradas por tais circunstâncias. Como se realiza a relação entre um suposto 'espírito do tempo' e o que produzem os arquitetos hoje? Há diversas respostas e debates, simultâneos e por vezes contraditórios,
uma vez que a contemporaneidade é marcada pela pluralidade. Há discussões acerca de se, de fato, a produção de arquitetura deva partir dos princípios de sua era ou então tratar de valores da tradição. Também, questiona-se se é possível falar realmente em um 'zeitgeist' de modo uni cado. Qualquer que seja a opinião dentro de tais pontos, é difícil negar que, usualmente, existe uma certa uniformidade nos costumes e nos modos de pensar de um tempo. Além disso, que na atualidade há, inclusive, tentativas de uniformização destes, contando com os esforços da globalização e as possibilidades da comunicação instantânea. Assim sendo, pode-se a rmar que, mesmo que não houver um 'espírito da época' uni cado, há uma certa repetição de necessidades, desejos, crenças e modos de pensar atuais. Seria interessante buscar conhecer tais
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consonâncias de comportamento, de ni-las, para posteriormente analisar como a arquitetura refere-se a elas. Pesquisar sobre os comportamentos humanos de modo total parece uma tarefa extremamente ampla. Por isso foi de nido nesse trabalho o recorte pelo qual serão questionadas as necessidades, desejos e modos de pensar. Tal foco escolhido pode ser resumido na dualidade 'dentro fora', presumindo analisá-la em sentido denotativo e conotativo. Ou seja, como o homem contemporâneo vive, pensa, percorre, sente o 'dentro' e o 'fora'? O que signi ca cada um dos termos, o que os delimita? Lembrando que esta dupla pode extrapolar para outras: interior exterior, fechado aberto, individual coletivo, privado público, coberto descoberto, lacrado destrancado, impermeável - permeável. Que valores são atribuídos a cada um destes fatores ultimamente? Antes de responder a tal questão, por se tratar da associação de conceitos em duplas, pode-se indagar quais as maneiras possíveis de um dos atributos relacionar-se com seu par. Ao listar as possibilidades encontradas, temos que: no limite, pode ser que um fator seja tão forte que exclua o aparecimento do outro; também, existe a chance de que o primeiro abafe o segundo, em diversos graus de intensidade (sem excluí-lo, porém); é possível que os dois tenham pesos semelhantes de modo que um não se sobreponha tanto, ou o tempo todo ao outro; há a alternativa, ainda, de ambos exercerem a mesma in uência um sobre o outro; por m, pode ser que essa dualidade não exista de maneira tão exata, e que um fator esteja inserido dentro do outro, ou que exista um intermédio entre as duas categorias. Elencadas as vinculações possíveis entre os dois
componentes dos pares, chega-se à indagação: de qual ou quais maneiras as duplas citadas associam-se na contemporaneidade? Está claro que essa resposta não poderá ser dada em de nitivo, ou para todas as situações possíveis. Há somente a possibilidade de buscar sintomas que demonstrem caminhos para certas conclusões. Onde procurar tais indícios? Como separar o que é 'puramente' exposição do espírito do tempo do que já é crítica a ele? Será apresentado a seguir um caminho de pensamento para se chegar a tal resposta. Partindo do preceito, então, de que existe, se não um 'espírito da época' ao menos uma consonância de comportamentos, logo a arquitetura contemporânea tem de se comportar de alguma maneira em relação a ela: ou lidar com esta, ou não. No caso da negativa, não signi ca que o assunto da produção arquitetônica seja aleatório,
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mas normalmente designa que a produção ainda está relacionada a um 'espírito do tempo' anterior, ou seja, que está desatualizada (como era a crítica de Le Corbusier à produção de seu tempo que, segundo ele, 'construía bonitos castelos de areia enquanto a casa pegava fogo'). Já a parte da produção que atenta ao modo de viver atual pode ou ir ao encontro dele, atendê-lo somente, ou também criticá-lo. Devido à crescente in uência da lógica do mercado capitalista em diversos âmbitos, inclusive no modo de se construir e habitar, foi criada, empiricamente, uma distinção entre o que é arquitetura (ou um arquiteto) 'comercial', e arquitetura 'de arquitetos', 'verdadeira', 'de valor'. Percebe-se essa diferenciação clara durante o período do Movimento Moderno de arquitetura, no Brasil. Grandes arquitetos desse momento, inclusive, omitiam do conjunto nobre de suas obras seus edifícios que eram voltados para atender a demanda do mercado imobiliário. Um exemplo é o 'Edifício e Galeria Califórnia', no centro de São Paulo, projetado por Oscar Niemayer nos anos 50. Um prédio de escritórios do qual pouco se encontra referência, e cuja discussão acerca somente se observa nos últimos anos. Essa diferenciação proposta, dividida em uma oposição, é cada vez mais difícil de ser considerada válida na conjuntura atual. As explicações para isso vão das proposições de Robert Venturi de aceitar o que o mercado oferece e o tomar como ponto de partida até a ligação de grandes nomes da arquitetura, respeitados internacionalmente, com corporações privadas e voltadas para a obtenção de lucro. Que se pode dizer das lojas para a Prada de Rem Koolhaas e Herzog & De Meuron? E da obra de Renzo Piano para a Hermès? São comerciais, naturalmente, e ainda mais, voltadas para o mercado de alto luxo. Entretanto, há como taxar tais realizações com 'menor valor'? Acríticas? Vários questionamentos podem ser levantados baseando-se nesse panorama. Será possível continuar classi cando o que serve a interesses particulares de 'simplesmente comercial'? Será que o critério de categorização, se continuar existindo, não poderia ser repensado? E também considerada a possibilidade de se realizar as tais críticas ao 'espírito do tempo' sem ter de fugir aos programas que o mercado imobiliário abrange? Somente os espaços culturais, os parques e praças, os centros comunitários, podem ser críticos? Sendo assim, podem-se sugerir outros parâmetros de divisão entre a arquitetura 'comercial' e a 'de arquitetos, de valor', que não se baseie somente em quem será o cliente, qual o uso proposto, e o envolvimento ou não com o mercado capitalista. Uma opção é a seguinte maneira: a produção 'comercial'(este termo poderia ser questionado) seria aquela que ou somente re ete o 'espírito do tempo', ou está desatualizada com ele; a 'não comercial' seria aquela que, além de expor e responder à época, ou de estar em desacordo temporal com ela, pode oferecer um conteúdo de crítica ou re exão acerca do 'espírito do tempo'. Ainda assim é
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um procedimento do juízo xar onde há crítica e onde não há. Ou seja, a de nição de uma 'arquitetura comercial' e uma que seja seu oposto não poderá ser precisa ou consensual, contudo pode-se partir de posições majoritárias e continuamente revisálas.
Acima: loja Prada Nova york, projeto de Rem Koolhaas Ao lado: loja Prada Tokyo, projeto de Herzog and de Meuron
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Concluído tal pensamento, pode-se propor uma maneira de atender à indagação de qual ou quais maneiras a dupla resumo 'dentro-fora' associa-se na contemporaneidade. Vale ressaltar que, conforme foi levantado anteriormente, tal associação será pensada com signi cado denotativo e conotativo, e assim tanto em caráter material quanto imaterial. Não se refere somente ao que é externo ou interno a um espaço, mas também o que o é ao próprio homem. Tal maneira proposta constitui-se da observação, empírica, de alguns exemplos de edifícios 'comerciais'. Isso devido ao fato de, retomando, eles não demonstrarem um nível de crítica, e, consequentemente, exprimirem de modo mais transparente quais os desejos e necessidades (impostos pela mídia, pelo capitalismo, pelo consumismo, ou não) da sociedade de hoje. A investigação de tais edi cações inclui a comparação entre amostras de diferentes padrões econômicos, visando mostrar que as conclusões resultantes não são especí cas de um ou outro setor social (embora não se possa englobar necessariamente todos eles). Também, busca explorar edifícios localizados em cidades menores e maiores, para demonstrar que as questões levantadas não se encontram somente nos grandes centros urbanos, ou seu contrário. Assim sendo, a partir do que foi possível perceber com a exploração de exemplos recolhidos, foi realizada uma classi cação segundo certos fatores, sempre analisando com base nas duplas levantadas anteriormente. Chegou-se a algumas conclusões, lembrando que estas não constituem verdades irrevogáveis, mas interpretações provenientes de dados empíricos. Seguem portanto, as características principais depreendidas: 1. Desejo de não divisão, individualismo: Evidenciados em primeiro lugar pela
importância dada às suítes. Estas estão entre as primeiras qualidades de uma habitação ressaltadas pelas propagandas. A suíte permite que seu usuário realize as funções oferecidas pelo 'quarto' e pelo 'banheiro' com menor interferência dos outros com quem compartilha a moradia. Tal distanciamento é valorizado e dá crédito à a rmação de que 'quanto mais suítes uma casa possuir, mais luxo e qualidade de vida será proporcionado'. Não fosse por tais motivos de cunho social, a suíte não seria uma primeira escolha lógica, em especial nas residências menores, uma vez que, necessariamente, acarreta que mais de um banheiro na casa precise possuir chuveiro. Quanto menor a habitação, maior a perda relativa de espaço com tal situação, já que a área proporcional que um 'box' para banho ocupa, em relação ao banheiro todo, aumenta conforme diminui o tamanho total do ambiente, e em geral abrange quase metade da área do banheiro. A opção pelo individualismo contemporâneo também pode ser
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atestada pelo crescente número de habitações com somente um quarto, o que mostra a tendência da fuga do contato e da necessidade de dividir os espaços com outras pessoas.
Acima: Notar que o anúncio dá importância à suíte e a churrasqueira, esta sendo uma peça típica de uma atividade que se dá em ambientes externos, mas que nesse caso encontra-se no interior da cozinha. Ao lado: Notar como o luxo está relacionado à presença de suítes. Atentar para o hall individualizado e separado entre social e de serviço . Este exemplo demonstra que as questões levantadas não são especí cas das grandes cidades, pois o apartamento localiza-se em Patos de Minas, MG, uma cidade de cerca de 130 mil habitantes.
2. Fechamento às outras pessoas (vizinhos): Materializado pela pouca atenção dada aos 'hall' de entrada dos elevadores e escadas. Esses espaços não são aproveitados como momentos de encontro entre os vizinhos, e muitas vezes nem mesmo são representados nas plantas dos apartamentos, tamanha desvalorização lhes é conferida. Nos casos dos apartamentos de luxo cada um possui seu próprio 'hall', evitando assim qualquer tipo de contato com quem mora ao lado. Interessante notar que isso eventualmente ocorre mesmo quando há mais de um apartamento por andar.
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Acima: Notar hall individualizado mesmo em torre com dois apartamentos por andar. Ao lado: Embora cada habitação conte com uma grande årea de varanda, o local do encontro entre os vizinhos limita-se a um corredor fechado.
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Acima: Notar não representação de algum hall de entrada, o que passa a noção que só importa o que encontra-se dentro do apartamento. Pode-se perceber também a presença dos dois banheiros com box para banho e o tamanho, em relação à área do apartamento, conferido à varanda, e o seu formato discutível para que haja uso real.
3. Busca e negação do espaço externo: Encontrados nas contradições relacionadas às varandas e terraços dos apartamentos. Nota-se que há uma procura por espaços externos, o que se demonstra pela proporção de área que as 'varandas' ocupam na planta da habitação. Estas mostram-se, entrementes, de uso individualizado da unidade, fugindo da divisão do espaço com vizinhos. Situação que ocorre tanto nos padrões luxo quanto nos apartamentos menores, nos quais a varanda com frequência resulta em um espaço demasiado pequeno para ser de fato utilizável. O paradoxo também mostra-se no desejo de envidraçar tais terraços, eventualmente até colocar persianas, qualquer que seja o seu tamanho. A ação do Sol, do vento (de fato mais intenso nos andares altos, mas poderia ser ltrado em invés de bloqueado) e da chuva apresentam-
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se como perturbadores destes espaços. Porém, não é exatamente a presença deles que os diferencia dos cômodos internos? A repercussão desse tema apareceu em discussões devido às opiniões referentes ao edifício '360º', de Isay Wein eld (por alguns taxado de 'comercial' e por isso de valor diminuto): Com a onda de envidraçamento que ocorre na cidade, um grupo de moradores convocou uma reunião de condomínio para discutir a prática no prédio. (ARCOWEB) Segundo relatos desse grupo, a força com que o vento atinge o prédio inviabiliza o uso da área externa da maneira como eles gostariam de utilizá-la. A ventania é ainda mais acentuada nos andares mais altos, caso das duas coberturas, onde venta sem parar tudo isso ainda segundo relatos. O prédio está no topo de uma colina, cercado apenas por sobrados. As varandas são profundas e com metragens equivalentes a cerca de um terço da área. Desempenham o papel de um jardim ou de um quintal de verdade. E em jardins e quintais de verdade venta, faz parte do conceito de área externa (embora estejamos acostumados a considerar áreas externas os aquários acoplados aos apartamentos). O fato é que até agora pouquíssimos moradores mudaram-se para lá. A maioria ainda está encarando a fase de acabamentos, decoração e preparação para mudança, ou seja, não houve tempo hábil para testar as varandas. Talvez a manobra para emplacar o envidraçamento tenha sido prematura. (site HABITE SP, por MARIANA BARROS). Pode-se inferir que talvez o que se busque não seja um espaço externo, pelo julgamento de que ele ofereça desconfortos, mas o sentimento de abertura e iluminação que uma varanda proporciona, ao contrário do que usualmente oferecem as janelas dos ambientes.
Notar a presença da varanda mesmo quando suas dimensões não incentivam o uso efetivo de seu espaço.
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4. Desejo de não divisão, individualismo e fechamento às outras pessoas (vizinhos e outros habitantes da cidade): Destacado pelos térreos das torres. Em primeiro lugar, toda a área dos térreos dos edifícios é fechada para a cidade, não permitindo que outros cidadãos usufruam de nenhum de seus espaços, nem circulem por ali. Embora constituam espaços para, teoricamente, convívio entre pessoas. Ou seja, a portaria que separa quem tem permissão para adentrar e quem não possui localiza-se, com frequência, no alinhamento da calçada. O que poderia ser diferente, vide teorias do Movimento Moderno acerca da questão do térreo. Fora tal questão, a própria divisão dos espaços neste pavimento usualmente mostra a pouca preocupação existente com a real utilização destes como promotores de convívio. É comum, inclusive, na exposição do prédio para a venda, o plano geral do pavimento não ser nem apresentado, mas somente os espaços individualizados e especí cos para cada utilização. O que expressa que o lazer proposto deve ocorrer em locais delimitados e sicamente separados, e com frequência também fechados. O 'playground' em que a criança pequena brinca está longe da 'academia' que frequentam seus pais, e também do salão de jogos onde estão as crianças mais velhas. Estes espaços, que poderiam conferir oportunidades para que os vizinhos se conhecessem e travassem laços, ou são pouco utilizados ou causam desconforto ao serem divididos. Isso porque, de fato, o sentimento é que se está dividindo o espaço, e não compartilhando.
Notar os espaços de lazer, convívio e prática de exercícios separados entre si, e desvalorizados em sua localização: nos recuos das edi cações ou em meio ao estacionamento. O térreo é de uso único dos moradores, não expandindo-se para a cidade.
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Imagens das áreas de lazer do térreo de dois edifícios residenciais. Notar como, mesmo em diferentes padrões econômicos, as áreas de lazer e convívio são representadas e existem apartadas umas das outras.
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Alguns dos aspectos observados empiricamente vão ao encontro das preocupações de Le Corbusier sobre o tema do contato com o externo. O arquiteto prioriza em seu discurso as qualidades do distanciamento com o 'lado de fora'. Por exemplo, exalta as possibilidades do uso do vidro vedar completamente o ambiente e de se morar em uma célula mínima, com uma lógica de adquirir os serviços para a vida diária sem a necessidade de intimidade com a pessoa que o realiza: A casa é hermética! De agora em diante, nem o menor grão de poeira penetrará nela, nem as moscas e pernilongos. Nenhum ruído! ; Não me preocupo com meu cozinheiro, ele não me causa o menor aborrecimento, não lhe dou ordens nem dinheiro para ir ao mercado. . De certa maneira, pode-se inferir que o quadro que encontramos hoje já vem mostrando suas feições há algum tempo. En m, a partir dos dados empíricos levantados, e das re exões de Le Corbusier, pode-se depreender que as duplas de conceitos levantadas anteriormente relacionam-se, mais constantemente, de forma que uma categoria se sobrepõe à outra. Deste modo, os conceitos 'dentro', 'interior', 'fechado', 'individual', 'privado', 'coberto', 'lacrado' e 'impermeável' formam o conjunto que é com maior frequência e intensidade valorizado e almejado na sociedade atual, imposto até como sinônimo de qualidade. Para o desenvolvimento deste trabalho, que é uma proposta de leitura da realidade e resposta a ela, considerar-se-á essa conclusão como um fato, mesmo que isso possa causar eventuais discordâncias. Não se está a rmando que o que foi constatado é uma verdade absoluta, mas somente um modo de análise. Assim sendo, prosseguir-se-á com a
interrogação do motivo pelo qual a situação mostra-se dessa maneira. A causa elementar que pode ser apontada é a busca incessante do ser humano por conforto e proteção, ambos compreendidos de uma maneira ampla, que englobe, por exemplo, o desconforto que existe em ter de conviver com outras pessoas. Tal sentimento é próprio do homem, e provém dos tempos primitivos em que ele buscava domar tanto a força da natureza quanto a relação entre seus pares, a m de garantir sua sobrevivência. Com o desenvolvimento de ferramentas e tecnologias, técnicas ou sociais (da construção de abrigos a regras de comportamento) foi-se conseguindo maiores condições de propiciar conforto e proteção. Nos tempos atuais há mecanismos para se alcançar tais qualidades que chegam a altos níveis de e ciência. Contudo, as pessoas em geral
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sentem-se, na maior parte das ocasiões, confortáveis e protegidas? Primeiramente discorrendo acerca do conforto, analisar-se-á a relação entre as condições de propiciar conforto, e o conforto e desconforto de fato sentidos. Não existe a impressão de que quanto mais conforto se pode ter, menores fatos causam desconforto? Há algumas gerações caminhar trajetos a pé, levantar-se para ligar a televisão ou abrir um portão ao invés de fazê-los via controles remotos, ou dividir com muitas pessoas um banheiro não signi cavam grandes incômodos. O que não parece ocorrer hoje, contando com a variação de intensidade conforme o padrão econômico. O resultado disso é que talvez na contemporaneidade os sentimentos de desconforto sejam tão frequentes e decorrentes inclusive de pequenos fenômenos, e a necessidade de conforto e proteção sejam tão grandes que o sentimento resultante do balanço entre conforto e desconforto experenciados não sejam proporcionais ao avanço tecnológico alcançado. A nal a busca pelo sentimento de conforto nunca atinge o nível que pode ser proporcionado, mas parece ser sempre maior. Ou seja, seguindo nessa tendência, por mais que a tecnologia esforce-se para garantir maiores condições de conforto, a sensação de conforto 'resultante' não é crescente, visto que para se sentir confortável precisa-se de cada vez mais (e além do que é oferecido) e para se sentir desconfortável precisa-se de cada vez menos. Observando os grá cos esquemáticos apresentados, úteis não como dados reais, mas como demonstração ilustrada de um pensamento, pode-se perguntar quais caminhos existem para se seguir, considerando tais fatos.
Tendência representada pelo grá co (ilustrativo somente): Tolerância tende a zero Conforto resultante tende a constância Necessidade e busca do Busca e necessidade de conforto homem pelo conforto tende ao in nito Conforto resultante , produto do conforto e do desconforto experenciados Condição (tecnologia) de propiciar conforto
Conclusão: embora a capacidade de se produzir conforto aumente sempre, tendendo ao in nito, o conforto resultante , provindo da combinação dos sentimentos de Tolerância ao desconforto conforto e desconforto, mantém-se praticamente constante.
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Um primeiro caminho é aquele que o 'mundo' parece já ter escolhido: a tentativa de acabar com qualquer forma de desconforto. Muitas são as ferramentas, do arcondicionado ao automóvel individual, passando pelas suítes e pelas compras pela internet. Sem incorrer no julgamento de bom ou ruim, qual o limite dessa linha de pensamento? Que cada pessoa possua estritamente os seus pertences e ambientes, e não tenha de dividir absolutamente nada? Que os deslocamentos no espaço não causem nenhum desgaste? Que o clima seja totalmente controlado, arti cialmente? Que o convívio entre as pessoas seja estritamente selecionado? O lme Wall-e ,Walt Disney Pictures, representa este extremo cogitado. Interessante notar que o personagem principal (mesmo sendo um robô) parece um tanto desconcertado ao visualizar toda a situação.
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Acima e na página anterior: Cenas do lme «Wall-e», Walt Disney Pictures.
Outro caminho existente é aquele que tenta retrabalhar os níveis de tolerância ao desconforto e necessidade de conforto. Certamente esta opção é de difícil aceitação e compreensão direta. Também, provavelmente estará fadada ao fracasso se for levada ao extremo, aplicada de forma radical. Os valores necessitariam de ser estimulados de forma gradual, para que, aos poucos, as pessoas fossem enfrentando e reacostumando-se com pequenos desconfortos. Ou seja, não se trata de passar para o outro extremo, o da falta total de conforto, mas de perseguir um equilíbrio entre as categorias daquelas duplas antes apresentadas.
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Cenas do lme Into the Wild . Acima: Retrata o 'abrigo' que o personagem encontra, onde habita por certo tempo. O lme apresenta a história de um rapaz que deseja desvincular-se totalmente do mundo civilizado e parte para uma jornada rumo ao contato intenso com a natureza e as condições naturais de vida. A intenção do personagem é de caráter radical, diferentemente da deste trabalho. Abaixo: Apesar das condições de vida extremas nas quais o rapaz encontrava-se, sua mensagem nal antes da morte diz que ele agradece a Deus por ter vivido uma vida feliz. Essa aparente contradição choca e remete à noção de que o 'desconfortável' não é necessariamente ou sempre ruim , nem o confortável o bom . A nal conforto e desconforto , e bom e ruim podem ser compreendidos de outras maneiras que não como conceitos opostos.
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Conforto resultante , produto do conforto e do desconforto experenciados
Necessidade e busca do homem pelo conforto Condição (tecnologia) de propiciar conforto
Tolerância ao desconforto
Grá co representativo das tendências do segundo caminho apresentado. Ao serem trabalhados os níveis de tolerância ao desconforto e necessidade de conforto, precisaria-se de menos para se sentir confortável, e de mais para ter a sensação de estar desconfortável de modo que isso seja um incômodo. Dessa maneira, o conforto resultante pode passar a ter um valor crescente.
É nessa linha que se apresenta este projeto. Se existe desconforto no contato com o ambiente natural externo e com o externo 'humano', é válido que eles sejam encarados (o quão desconfortável realmente são?), inclusive possibilitando alcançar outras sensações positivas para os homens. Para relembrá-los, em algum grau, de sua conexão praticamente perdida com o funcionamento da natureza, que contava com elevado nível de percepção de ambientes e fatos. E assim, também dos símbolos que o 'natural' gera, e importância destes.
Ao lado e na próxima página: Trabalhos de Richard Long, exibem a sensibilidade do homem em relação à natureza. Inclusive a própria percepção da jornada, do caminho do homem por meio dos elementos naturais.
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Lembrando que os desconfortos propostos no projeto não geram incômodos absurdos. Trata-se, por exemplo, de percorrer alguns metros a mais que o usual para se chegar do elevador à casa, de atravessar outros poucos metros descobertos, de compartilhar com outras pessoas uma área de estar e lazer, a qual está a mercê da chuva, do vento e do Sol. A questão deste projeto é, portanto, propor espaços nos quais a relação com os externos 'natural' e 'humano' sejam retrabalhadas. E já que uma maior abertura ao externo causa algum grau de desconforto, que este seja enfrentado. Tanto para retrabalhar o nível de tolerância ao desconforto, como para a quebra da barreira contra o desconforto e veri cação de que muitas vezes o que se julgava muito desconfortável não o é tanto assim. E, principalmente, para a percepção de que, embora haja algum desconforto, a experiência com o externo humano e natural pode ser proveitosa, salutar e positiva.
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Gra te de Banksy. Primeiro separamos o que estรก ligado, para depois voltar a ligar (George Simmel)
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Quanto à questão da segurança, está claro que ela não será resolvida por meio da arquitetura. Contudo, este projeto procura trabalhar fugindo do ciclo vicioso no qual cada pessoa ou grupo fecha-se em sua unidade e a área comum ca desabitada, tornando-se então ainda menos protegida (pelos olhares dos outros, retomando Jane Jacobs). A aposta está em repovoar áreas de uso compartilhado, a m de que um vigie o outro, de forma que a presença das pessoas gere sensação de segurança, convidando assim a presença de mais pessoas. O vigiar alheio parece não garantir a segurança, e de fato não a assegura. Contudo, pode-se questionar, por exemplo, qual a função de um porteiro na entrada de uma edi cação. Geralmente esses funcionários não portam ferramentas que possam de fato impedir um ato violento, o que lhes dá o propósito único de ser os 'olhos da rua' dos quais fala Jane Jacobs. Dessa maneira, será então que o movimento de pessoas nos locais de entrada e saída dos espaços já não gera boa parte da sensação de segurança?
Keller Fountain Park, Portland, Oregon. Projeto de Lawrence Halprin. O espaço convida ao uso, e a presença de pessoas gera sensação de segurança e convida ainda mais ao uso.
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O homem sempre viveu em conjunto, em comunidades. Por que hoje nega isso, voltando-se para o individualismo e pretendendo não precisar mais da colaboração do próximo? A possibilidade de maior contato com uma multidão de pessoas diferentes é marca da urbanização. Por que então, nas cidades, as pessoas não se conhecem e não convivem? O ser humano também sempre possuiu certa conexão com os elementos naturais, com o funcionamento da natureza. Por mais que buscasse proteger-se dela, ele se sentia de alguma forma ligado, parte de um conjunto maior. Esse sentimento foi tornando-se menos frequente e intenso com o crescimento e preponderância do meio urbano, até chegar ao ponto atual.
Por Banksy: A new york deliver truck converted into a mobile garden .
Hoje a cidade parece querer ser a antítese do 'rural' como se ainda se precisasse fugir de qualquer in uência ou semelhança a ele. Será que não se poderia buscar uma relação mais equilibrada? O contato com o 'natural' só pode ser realizado fora do contexto urbano? E hoje pode-se falar ainda em uma dualidade cidade campo, quando o campo é dominado por autoestradas e maquinizado? Interessante o que Argan
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explica sobre a relação entre o limite entre natureza e a cidade, que não mais existe. O autor diz que a natureza encontrava-se fora dos horizontes e capacidades exploratórias e operativas do homem, era a região das potências incontroláveis do mito e do sagrado. Depois que se consegue por meio do desenvolvimento das tecnologias, controlar a natureza, a própria técnica, a máquina torna-se o mito. E a cidade que antes era o local da segurança torna-se o local da insegurança, eliminando o valor do indivíduo, do ego, ao eliminar o seu correspondente, a natureza. Para concluir, a intenção desse projeto é, em edifícios torres situadas em um contexto urbano e contemporâneo, propor oportunidades de contato do 'homem' com o 'externo ao homem', sendo que essa última categoria é dividida em duas: 'fenômenos e elementos naturais' e 'diferentes pessoas e atividades humanas'. É propósito, dessa maneira, expor e tencionar o 'espírito da época': aceitar a existência desse e intentar repensá-lo sem contar com a possibilidade ou desejo de sua ruptura total. Uma posição radical, de ruptura, que buscaria o contrário oposto do que é existente, poderia ter sido um caminho, mas não foi o modo escolhido para tratar das questões neste trabalho. Procurou-se tatear um equilíbrio ao invés de almejar o extremo. Essa posição se dá porque o homem já encontra-se, segundo a visão deste trabalho, em um dos extremos. Encontra-se tão distante e foge tanto do contato com seu externo que elementos simples, com o caso emblemático da 'passagem descoberta entre duas torres', já causam grande repercussão. A proposta desse trabalho é, logo, somente propor a convivência entre o ser humano e o seu externo, sem que um destes se sobreponha demasiadamente sobre o outro.
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4 Aproximação com os dois ‘externos’ na história da arquitetura
Cada uma dessas aproximações propostas já foi trabalhada em diferentes contextos na história da arquitetura. Buscaram um maior contato com a natureza as cidades de Le Corbusier, as Cidades-Jardim e outras 'cidades verdes', como a de Moscou no Plano Quinquenal. Hoje várias propostas de 'torres verdes' povoam o cenário das publicações de arquitetura. Quanto à interação entre os homens, o edifício ou conjunto multifuncional é tema abordado dos falanstérios de Fourrier até os grandes empreendimentos imobiliários atuais, que unem partes corporativas, escritórios, hotéis e moradias, passando pelas unidades de vizinhança modernas. Como elas relacionamse com a proposta deste trabalho? Le Corbusier criticava as cidades com morfologia medieval, apertadas e mal iluminadas. Para tal, propôs novos planos para diversas
centros urbanos, os quais contariam com altos arranha-céus que liberariam o solo para a vegetação. Assim, o caminhar na cidade não se daria mais pela 'rua-corredor', mas por entre as árvores. Uma
proposição que pensa a cidade com um plano geral, totalizador. Uma ação cirúrgica, como Corbusier próprio diz, típico do pensamento moderno e contraposto por teorias pós-modernas que defendem a intervenção fragmentada nos centros existentes, e com a qual o presente projeto se assemelha. Além disso, Corbusier propunha o contato com o verde somente no térreo ou no teto-jardim, ou seja, nos momentos extra rotineiros ou de deslocamento. O morar e o trabalhar ganharam ampla visão e iluminação, do alto dos prédios, uma grande conquista, contudo permaneceram atrás dos vidros duplos que isolam o acesso ao ambiente externo, e teoricamente até a in uência da temperatura do outro lado. As Cidades-Jardim eram propostas de criação de novas cidades, visto o caos que a superpopulação criou nas existentes, tornando-as insalubres
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e distantes da natureza. O que Howard, autor do livro Garden-cities of To-morrow , propunha era unir as qualidades do urbano, que são as oportunidades de emprego, cooperação e socialização, com as do campo, o espaço da natureza e da produção de alimentos. Essa união geraria um espaço que não corresponde nem ao da cidade nem ao rural, mas a uma 'cidade-campo', que utilizando de diversas estratégias se estabeleceria em um terreno rural e iria se expandindo até um limite de população, momento em que outra cidade deveria ser criada próxima à primeira. Essa ideia do século XIX não intenta em intervir no espaço existente da cidade e também possui caráter de plano geral, ao contrário deste trabalho. Além disso, apesar de unir os conceitos de proximidade da natureza com os de socialização, assim como o presente trabalho, a Cidade-Jardim propõe mudanças bastante radicais na forma de organização da sociedade, e seu correto funcionamento depende de um planejamento e cumprimento aos padrões pré-de nidos de maneira rígida. O projeto aqui proposto é pensado para a realidade existente, visando mudanças leves e graduais nas ações cotidianas. Há ainda outras cidades-verdes. Aquela pensada para Moscou durante o Plano Quinquenal é um espaço anexo à cidade existente na qual encontram-se as atividades cotidianas. Trata-se de um lugar para o descanso, que se contrapõe à agitação. Uma vez que separa a natureza do movimento urbano rotineiro, essa ideia é
diferente do projeto aqui colocado, já que o intuito deste é mostrar que tais valores não precisam estar necessariamente distantes. Quanto às 'torres verdes' contemporâneas, em primeiro lugar elas costumam
propor espaços arborizados mais buscando atender padrões de sustentabilidade que relembrar ao homem a importância da proximidade com a natureza. Tampouco tais espaços costumam ser adjacentes às habitações ou escritórios, mas em andares separados, tal como o teto-jardim. Já os problemas relativos ao plantio de árvores nas alturas, tanto criticados, pessoalmente não acredito serem limitadores, uma vez que poderão ser resolvidos com tecnologias futuras, genéticas inclusive. Os falanstérios e falanges utópicos prõpoem, como as Cidades-Jardim, mudanças estruturais na sociedade e seu modo de produção. Constituem radicais críticas ao espírito do tempo. O ideal de Fourrier é alcançar a autossu ciência, mérito não almejado pelo presente projeto, já que ele deseja ainda participar da vida da cidade, oferecendo alguns usos e
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necessitando de buscar outros em edifícios diferentes. A ideia é abrir, e não fechar. O caso das unidades de vizinhanças também trabalha criando o novo, e não intervindo no pré-existente, e em planos de maior área. Propõem certa auto-su ciência para uma proximidade, e espaços ligados à natureza, novamente, não logo ao lado das atividades agitadas do dia-a-dia, mas em um segundo ambiente, no qual ocorrem as funções de lazer e circulação. O caso é semelhante nos grandes empreendimentos multifuncionais contemporâneos, com a diferença que as unidades de vizinhança tinham térreo, e portanto a área aberta, com acesso livre à população, e estes novos costumam fechar aos usuários de suas unidades suas amplas instalações ao ar livre. E seus edifícios continuam a ser torres com vidros expostos ao Sol, alimentadas por ar-condicionado e com poucos ou nulos espaços de encontro e convivência.
Acima, à esquerda o esquema de ímas de Howard para justi car as Cidades-Jardim. À direita, um croqui de plano urbano de Le Corbusier, valorizando a vegetação entre os caminhos percorridos no solo. Abaixo um modelo de falanstério de Fourier.
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5 Referências de projeto de arquitetura
As referências de outros projetos de edifícios arquitetura, neste trabalho, foram utilizadas mais enquanto pesquisa espacial, formal, material do que histórica. Como o conceito do trabalho, suas questões, foram aos poucos se esclarecendo a partir inquietações de princípio empírico, não foi adotada uma linha teórica de um autor ou alguns deles, mas unidos pensamentos de vários, em diversos momentos do andamento do trabalho. Nos projetos que foram pesquisados e analisados buscava-se compreender quais estratégias tinham sido utilizadas pelos arquitetos para alcançar algum objetivo. Por exemplo, para se conseguir permeabilidade, que foi realizado? Se foram trabalhadas as vedações, como isso foi feito? Com quais materiais, com quais tipos de abertura, com que possibilidades de mover ou de manter xo, com que
tamanhos e proporções de peças, em que proporção de permeabilidade? Nesse caminho buscou-se formar uma 'mais completa possível' 'cidadela de formas', como diz Aldo Rossi, para que se pudesse, depois,
pensar o projeto em si. Por isso, as referências foram divididas, para serem apresentadas neste caderno, segundo as estratégias mais frequentes que foram encontradas, e que serviram para a elaboração do pensamento do projeto. Relembrando mais uma vez, pois isso pode causar confusão, há projetos de diferentes épocas, usos, relações com o mercado imobiliário e intenções teóricas, colocados juntos porque não é segundo nenhuma dessas categorias que eles estão separados, mas sim conforme aproximações de estratégias espaciais, formais e de materialidade. As categorias formadas são: Deslocamento vertical e horizontal; Inserção de elementos naturais ; Exploração dos limites, enquanto vedações e fechamentos; Percepção do céu e do chão; Re exão do 'estar fora' e do 'estar dentro'.
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1 2
3 4
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Deslocamento vertical e horizontal 1. Vincent Callebout 2. UCX Architects 3. MVRDV 4. Emilio Ambasz 5. Andrade Morettin
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O edifício de Stefano Boeri, chamado Bosco Verticale é a primeira torre que conta com árvores de grande porte (3,6 e 9 metros de altura) a iniciar a ser construída, em Milão.
1 3
2 4
Inserção de elementos naturais 1. Andrade Morettin 2. Christian Pottgiesser 3 e 4. Stefano Boeri
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Exploração dos limites, (fechamentos e vedações) 1. Marcio Kogan 2. WEAK! 3. Edouard François 4. Sou Fugimoto 5. RDAI 6. Vo Trong Nghia 1 2
4 3 6
5
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Página seguinte: Percepção das características do chão 1, 2 e 3. SITE ( James Wines) 4. Toyo Ito 1
2
3
4
1 2 3 Estar dentro ou estar fora? 1 e 3. Shigeru Ban 2. Tadao Ando
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6 Relato pessoal: hipóteses e conclusões
Minha hipótese inicial de existência de afastamento, medo e até repúdio do homem de hoje ao seu exterior foi veri cada ao longo da realização do trabalho, demonstrada pela reação das pessoas a quem expunha os espaços propostos. Os efeitos negativos causados pelos pontos, no projeto, que propõem um maior contato com o 'externo', foram fortemente citados, na massiva maioria das vezes. Quando percebidos os efeitos positivos isso se deu após uma primeira crítica, ou seja, após o choque inicial com o que é 'estranho'. Por muitas vezes o medo ou repúdio do exterior foi demonstrado de maneira tão grande que a cogitação de enfrentamento de um único grande desconforto (sem riscos de vida ou de perda de bens) provindo do contato com o exterior se sobrepunha fortemente à possibilidade de obter várias situações interessantes e
positivas. Será que as gotas de chuva andam tão ácidas assim? Talvez por não experienciarmos os nossos externos, hoje em dia, nos esqueçamos das qualidades que eles oferecem, e em um primeiro
momento somente enxerguemos os perigos e os efeitos negativos. Por vezes o enfrentamento do externo é mais complicado que a fuga deste, mas nos esquecemos de que ele também não é tão negativo como nos acostumamos a vê-lo. Este trabalho se propõe a repensar a ideia de um 'externo' sempre ofensivo, noção esta que parece remeter à imagem da natureza como local do desconhecido e moradia das feras, localizada depois dos limites da cidade medieval, como apresenta Argan. Dessa maneira, este projeto não busca o mal-estar, mas desconstruir tal única forma de bemestar que parecemos acreditar hoje, que é a arti cializada e protegida de in uências externas imprevistas, pensando em outras formas possíveis.
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I think everyone can bene t from a journey to someplace they already are (Christopher Robbins) Talvez se a proposta tivesse sido projetar de maneira radical, rompendo com os laços da lógica da produção de arquitetura real, não tivessem sido tão impactantes algumas proposições. Parece que cogitar estabelecer pequenas mudanças cabíveis na vida real e cotidiana das pessoas, só pelo fato de sua realização ser mais possível que uma proposta radical, gera inquietação. As perguntas 'quem moraria neste lugar?' ou ainda 'quem compraria isso?' surgiram com frequência e cogitavam invalidar o projeto, raciocinando em uma lógica de que uma vez que a proposta encontra-se voltada para um contexto real, ela deveria ser totalmente aceita dentro a lógica deste. Tais perguntas não parecem ser válidas, entrementes, para uma proposição radical, a qual não teria intenção alguma de ser aceita e somente desejaria se contrapor ao existente. Respondendo a tais perguntas levantadas, temos que, por se tratar de uma mediação entre a lógica existente e uma proposta radical, existem pontos que serão aceitos, pelo modo de vida da sociedade em geral, e outros que não o serão prontamente. A nal, se tudo o que foi proposto fosse logo aceito, o projeto não teria um componente crítico nem se trataria de uma mediação, mas da própria resposta às necessidades e crenças do tempo. O ser humano costuma ser contrário ao que desconhece, que não está acostumado, e àquilo que critica suas crenças, em um primeiro momento. O ato de repensar costumes, pensamentos e desejos, costuma se dar, então, após o contato com diferentes modos de pensar, para que do con ito resulte uma nova posição. Por tais razões este projeto é compatível com a maioria das características do modo de vida contemporâneo urbano, e propõe, com uma ação que pode primeiramente chocar para que depois se re ita sobre, algumas mudanças, as quais ainda são perfeitamente factíveis. É provável que o constante contato com possibilidades de arti cializar nos tenha acostumado com 'condições ótimas e constantes', como desejava Le Corbusier, com sua 'temperatura constante e umidi cação regular'. Claro que por hora tal intenção fora muito válida, a nal, como exempli cou o arquiteto, algumas vezes está se falando de lidar com os 42 graus negativos do inverno de Moscou. Mas será que há a mesma necessidade de solução para todos os outros climas existentes? Será que o ser humano precisa estar tão circundado assim, e não possa por vezes lidar com o inesperado e enfrentar adversidades? O contínuo combate, com o aprimoramento das tecnologias e da industrialização, ao imprevisto e ao espontâneo, é análogo ao combate ao modo de funcionamento da própria natureza, incontrolável, e também da natureza humana, muitas vezes inesperado. Posicionamentos pós-modernos como o de Jacques Derrida,
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que buscam terminar com a lógica de opor dois conceitos como um contrário ao outro, vão ao encontro da noção de que não há porque fugir do desconforto, ou do incontrolável, ou do 'ruim', uma vez que cada um desses está contido no seu oposto, e vice-versa. Como re exão nal deixo um relato de uma moça que, após molhar os pés em uma poça em meio a uma chuva, e em um primeiro momento incomodar-se com tal fato, acabou por concluir que isso 'faz parte'.
Richard Long: A line in Scotland A natureza organiza-se de um modo diferente do modo de organizar-se o homem. Na obra de Long é fácil distinguir o que é produto da ação de cada um desses. Ao menos no ocidente, o ser humano vem lutando para sobrepor a sua maneira de funcionar sobre a da natureza, tentando comandá-la, condicioná-la. Será que essa intenção tem de ser levada ao extremo? Até que ponto é necessário domesticar o natural e até que ponto pode-se buscar conviver com ele do modo com que ele apresenta-se?
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7 Introdução ao projeto
Vivemos a maior parte de nossas vidas abrigados. O piso, as paredes e a cobertura protegem das interpéries exteriores e conferem conforto. No entanto, até que proporção o abrigo deve ser fechado ao que acontece do lado de fora? Até que ponto isso é confortável? Fora isso, quando há aberturas, por que elas são feitas praticamente sempre da mesma maneira? Como trazer o contato com o ambiente natural para o contexto da cidade? É já de praxe que arquitetos criem projetos ligados à natureza em terrenos deslocados do cenário urbano, para usos extra-cotidianos e em baixos gabaritos. Pode-se pensar na possibilidade de tal conexão ocorrer no meio da cidade, na verticalização, abrangendo usos mistos? De que forma a con guração dos espaços in uencia no comportamento das pessoas? Espaços segregados não reforçam o
isolamento e o individualismo? Pode-se pensar em mudar a postura do edifício em relação à cidade, em seu acesso? E cogitar que com isso o posicionamento das pessoas quanto a tais fatores também seja alterada?
O intuito desse projeto é conceber um edifício que possa servir de referência em suas estratégias: no modo que permite o homem ter maior contato com seus 'externos' humano e natural. Dessa maneira, questionar a realidade das torres hoje. A implantação em um lote urbano comum mostra que os anseios apresentados não precisam de um terreno espetacular ou único para serem materializados.
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8 Escolha da cidade e do terreno
A morfologia urbana vem transformando-se, gerando cada vez mais restrições para o acesso aos espaços. Empreendimentos chamados condomínios, tanto verticais como horizontais, geram quilômetros de barreiras nas cidades brasileiras. Por onde eles passam, as ruas tornam-se somente acessos, e portanto vazias de pedestres e repletas de automóveis. Fato que é reforçado pela usual distância entre pontos de interesse cotidiano na cidade, o que di culta meios alternativos de locomoção. Que seria, ou será, da cidade se funcionasse como um todo dentro dessa lógica? Não é possível ocupar a cidade almejando retomar ou criar um funcionamento que a rme o livre acesso, a mistura e o dinamismo próprios de um contexto urbano? E em que tipo de cidade isso pode ser cogitado? Para escapar das paradigmáticas metrópoles, ponderou-se projetar
em uma cidade 'média'. Ao se pesquisar uma escolha interessante, perseguiu-se em especial uma que apresentasse alto, e muitas vezes rápido, crescimento, em população e importância. No geral, nesse tipo
de cidade ocorre intensa expansão horizontal, com condomínios horizontais e verticais de vários padrões econômicos. A expansão é problemática pois, além de criar gastos com infraestrutura, di culta o dinamismo da cidade. Se o que se busca com o afastamento é segurança, e mais vida ao ar livre, a proposta deste trabalho é buscar outras maneiras de propiciá-los, e juntar a tais aspectos às facilidades que a proximidade da cidade em si oferece. Ribeirão Preto apresenta de forma abundante as características citadas acerca das cidades médias. Situa-se no Nordeste do Estado de São Paulo, à 313 km da capital. Em 2010, a população do município foi contada pelo Instituto Brasileiro de Geogra a e Estatística (IBGE) em 604 682 habitantes, apresentando uma densidade populacional de 930,42 habitantes por km². Em 2013 sua
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população foi estimada pelo IBGE em 649 556 habitantes, com 99,7% de seus habitantes vivendo na zona urbana. O município foi o que mais cresceu entre as maiores cidades do Estado de São Paulo. A área total do município é de 650.00 mk², sendo 157.50km² de perímetro urbano, 172.18km² de área urbanizável, passível de expansão urbana, e 320.32km² de área rural. Fora o crescimento populacional, é notável a quantidade de obras com impacto e importância, em especial na linha da expansão horizontal. Um visível número de torres com cerca de trinta pavimentos estão em construção na fronteira urbana, no eixo sul, que leva ao shopping que está sendo construído. Além disso novos condomínios horizontais nascem para acrescer aos existentes, variando o padrão econômico. Segundo a descrição da wikipedia: Em contraste com as áreas subdesenvolvidas, Ribeirão Preto passa atualmente por uma grande expansão urbana, focada principalmente em cinco polos nas regiões sul, leste e oeste da cidade: as avenidas Maurílio Biagi, Dr. Celso Charuri, Caramuru, Wladimir Meirelles Ferreira e Braz Olaia Acosta, o bairro Jardim Botânico, a charmosa Avenida Professor João Fiúsa (que será prolongada até o Distrito de Bon m Paulista) e os entorno do Golfe, como os bairros Nova Aliança Sul e Jardim Nova Aliança. O principal eixo de desenvolvimento de Ribeirão Preto que representa a grande onda que vem tomando conta da cidade nas últimas duas décadas. Esse eixo é a avenida Presidente
Vargas, que começa junto à região central e se estende por toda a Zona Sul. No trecho que vai do cruzamento com a avenida Nove de Julho marco inicial da Pres. Vargas até o Anel Viário Sul, formou-se um
importante corredor urbano cuja maior vocação é o comércio e os serviços. Nesta região situam-se dois importantes shoppings, o tradicional e completo Ribeirão Shopping e o novíssimo e luxuoso Shopping Iguatemi Ribeirão Preto. Ao mesmo tempo que há tal movimento, existem vários bairros consolidados com pouca densidade ou dinâmica urbana que possa ser vista nas ruas, devido ao fechamento de cada habitação ou estabelecimento, visando a segurança. O adensamento e abertura nesses locais seriam alternativas à expansão. Não só isso, como a ocupação de alguns grandes vazios urbanos existentes. O clima da cidade é conhecido por ser bastante quente. É classi cado como tropical com verão chuvoso e inverno seco, com temperaturas médias de 25ºC no verão e 19ºC no inverno. A altitude da cidade é de
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518m, a precipitação pluviométrica média em um ano de 1.426,80 mm de chuva e a umidade relativa do ar de 71% como média anual. XuxÑà4wÅ}ÇuâÑÅ´ { }wÑà4Öuáu4f }vy}áüÑ4dáyâÑ Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Ano
Mês Temperatura E máxima média GD GD GD FM FK FJ FK FM GD GE GD GD FM@ (°C) h yÇÖyáuâäáu4 mínima média 20 20 19 17 15 13 13 14 16 18 19 19 16,9 (°C) Precipitação 265 206,8 156,6 69,1 47,8 28,6 20,9 21 51,9 128,8 168,5 257,5 1 422,5 (mm) Fonte: Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura (CEPAGRI);33 acessado em 1º de março de 2011
Situação de Ribeirão Preto no Estado de São Paulo e em relação à capital e à outras grandes cidades.
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Avenida Presidente Vargas
Shopping Ribeirão Preto
Shopping Iguatemi em construção
Eixo de expansão Sul
Atual eixo de expansão da cidade. Estão sendo construídos não somente condomínios horizontais, mas altas torres no limite da fronteira urbana. Pode-se observar na foto que a paisagem logo atrás das edi cações já é rural .
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9 O terreno em si e seu entorno
O terreno para projeto pertence a um bairro existente, Vila Santana, no Subsetor Leste 3, com as dimensões de 38 x 50m, e cerca de 6% de inclinação. Encontra-se no limite deste bairro, tendo a sua frente a rua Arnaldo Victaliano e ao fundo o Córrego dos Catetos, cercado de vegetação, e logo depois um grande vazio urbano cuja ocupação já está planejada. Trata-se da gleba adjacente ao Parque Municipal Prefeito Roberto Jábali, 'o último grande terreno no coração da cidade' segundo notícia da revista da cidade. Portanto, a escolha do local valoriza a ação de ocupar o interior do tecido urbano ao invés de somente expandi-lo. Não deixam de ser interessantes as propostas para a futura urbanização da área: uso misto, com foco maior em escritórios, combinação de diferentes gabaritos, e um maior contato com a natureza. Isso devido à lógica da
proximidade com o parque. Essa implementação tem diretrizes semelhantes àquelas deste trabalho, em escalas diferentes. O terreno e seu entorno:
Avenida Presidente Vargas
Shopping Ribeirão Preto
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61
1 4
5
2 3
1
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2
3
63
4
5
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Escala 1:7500 10 30 50 20 40
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200 100
Diagramas de gabarito das edi cações. Em cima o que representa a situação atual, e embaixo o que apresenta as modi cações com a urbanização da gleba.
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Diagramas de uso das edi cações. Em cima o que representa a situação atual, e embaixo o que apresenta as modi cações com a urbanização da gleba.
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10 O projeto: programa
O terreno escolhido irá atuar na conversa entre gleba a ser urbanizada, córrego acompanhado de mata e bairros existentes, uma vez que se situa na fronteira entre tais espaços. Para tal, o projeto propõe tanto que se crie um parque, com seu início já dentro do terreno (Figuras Projeto,1), aproveitando do cenário natural local, como que seja feita uma passarela de pedestres, passando pelo então parque e pelo terreno, a m de ligar a gleba e o bairro.(Figuras Projeto,2) O projeto constitui-se de duas torres de térreo mais 15 pavimentos, uma abrigando habitações e outra escritórios ou serviços em geral. A primeira comporta 42 habitações de aproximadamente 76m², com dois quartos, um banheiro, sala e cozinha. A lavanderia é coletiva e inclusive aberta a uso de outras pessoas da cidade, e situa-se no térreo. Não há varandas particulares nos
apartamentos, mas um grande terraço de 168 m² para ser compartilhado entre cada seis unidades. A torre de escritórios contém 14 salas de 76m², e uma sala de cerca de 20m² para cada unidade de habitação. Ou seja,
cada apartamento éAvenida composto da habitação e de uma sala para uso de serviços. Neste Presidente Vargas edifício também há um terraço de 124m² a ser compartilhado por cada dois escritórios maiores e seis salas menores. As coberturas de ambas torres contém espaços para confraternizações, eventos, festas, encontros e uso de lazer em geral. Os dois espaços podem ser utilizados em conjunto ou separadamente, sendo que um deles ainda possui a exibilidade de conter até quatro pequenos acontecimentos diferentes simultâneos, pela separação de ambientes. O térreo é aberto para o uso da cidade (1.1), e contém Shopping Ribeirão Preto a lavanderia citada e equipamentos de apoio e uma lanchonete-restaurante-bar, incentivo ao uso do parque adjacente, pensando especialmente na realização de atividades físicas. Dentre estes estão um espaço com equipamentos para a preparação
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e nalização de esportes e ginásticas (alongamento, aquecimento, etc), um vestiário e um guarda-volumes urbano, para guardar pertences durante o uso do parque ou armazenar objetos necessários para o usufruto deste.
Figuras Projeto,1
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Acima e abaixo à esquerda: Figuras Projeto, 2 Abaixo à direita: Figura Projeto, 3
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Escala 1:7500 10 30 50
Implantação com entorno, escala 1:7500
20 40
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200 100
Escala 1:2000 10
50
30 20
40
200 100
Implantação com entorno, escala 1:2000
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Escala 1:500 1 3 5 2 4
20 10
Planta tĂŠrreo, escala 1:500
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Escala 1:500 1 3 5 2 4
20 10
Modulação dos pilares e das vigas, estrutura metálica, escala 1:500
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Os andares funcionam em pares: um inferior possui laje em toda a sua extensão, e por isso os terraços de uso comum (representado acima) e um superior, no qual não há laje na área de projeção do terraço, mas somente passarelas (representado ao lado).
Escala 1:500 1 3 5 2 4
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Plantas pavimentos tipo, escala 1:500
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Escala 1:500 1 3 5 2 4
Planta da cobertura, escala 1:500
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20 10
Escala 1:200 1
5
3 2
4
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Corte perpendicular ao rio e Ă rua, escala 1:200
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Escala 1:75 1
5
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10 Planta tipo da habitação, escala 1:75
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Escala 1:75 1
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4 2 Planta tipo das salas de escrit贸rio, escala 1:75 79
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Escala 1:200 1
5
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Na próxima página: montagem da fachada dos edifícios, vista a partir da rua
Corte paralelo ao rio e à rua, escala 1:200
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11 O projeto: pensar cada espaço
Para organizar os espaços e a lógica de funcionamento do conjunto, buscou-se analisar o modo de vida contemporâneo urbano, suas facilidades e di culdades. O que se realiza no cotidiano, e como as ações relacionam-se entre si e no espaço. O dia-a-dia constituise basicamente do morar, trabalhar e realizar alguma atividade física e/ou de lazer. É importante notar, na atualidade, a maior necessidade da prática de esportes e ginásticas, devida a rotinas que envolvem cada vez menos esforço físico (o que se intensi ca desde o início da industrialização) e à grande importância dada ao culto do corpo e da beleza. Claro que essas últimas características parecem mais intensas nos níveis sociais mais abastados, contudo os meios de comunicação têm razoável êxito em expandir tais modos de vida a diversas classes, gerando certa padronização. Devido
aos frequentes problemas urbanos relativos ao deslocamento físico na cidade, muitos projetos contemporâneos estão buscando reaproximar usos diversos, colocando em cheque o zoneamento proposto pelo
Movimento Moderno. É em tal linha que encontra-se este projeto, com a nalidade de Avenida Presidente Vargas permitir deslocamentos a pé ao menos para uma parte das funções cotidianas. Claro que não se deseja que as pessoas não precisem utilizar do resto da cidade, e exatamente para que não seja entendido isso que não se incluiu no programa mais usos que os encontrados no cotidiano comum. Assim sendo, o projeto constitui-se de duas torres, conectadas a cada dois andares, sendo que em uma situa-se o 'morar' e na outra o 'trabalhar'. As torres são interdependentes, uma vez que a circulação principal que Shopping Ribeirão leva até as habitações antesPreto de chegar até elas passa pela torre de serviços (Figura Projeto,4), de forma a propiciar contato entre quem trabalha e quem mora. Também pelo fato de as salas menores da torre de escritórios fazerem parte das habitações
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Figuras Projeto, 4
(Figura Projeto, 5), sugerindo e possibilitando que a pessoa que ali mora ali também trabalhe. Essas salas são pensadas para abrigar diferenciados propósitos, voltados para o serviço. Podem abranger de escritórios para pro ssionais autônomos, como advogados, arquitetos, engenheiros a clínicas para médicos, dentistas, ou também ateliers para artistas e costureiras, ou ainda o cinas para conserto de eletrônicos, por
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exemplo. Os espaços abertos contíguos às unidades, voltados para o lazer, estar e circulação, são de uso comum dos usuários do andar (Figuras Projeto, 6). O projeto procura, com tais ações, reforçar nas pessoas o contato com o seu externo 'humano'. Seja por conviver no mesmo espaço que os vizinhos de moradia, e reforçar esse convívio pelo fato de eles também serem vizinhos de trabalho, seja por aproximar a realidade do trabalho, inclusive com a presença dos escritórios maiores, com a da casa. Fora o 'morar' e o 'trabalhar', as atividades físicas podem ser realizadas tanto nos terraços comuns quanto, e principalmente, no parque proposto, adjacente ao terreno. No térreo encontram-se Figuras Projeto, 5
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Figuras Projeto, 6
equipamentos de apoio à realização de exercícios físicos, pensando tanto nos moradores das torres quanto na população em geral. Em especial aquela que reside e trabalha tanto no bairro já existente, no qual o terreno do projeto encontra-se, como a que irá ocupar as futuras instalações da gleba vizinha, com a qual o projeto cria comunicação através do parque. A lanchonete existe para servir os moradores diretos e os da vizinhança, porém sua função não está necessariamente ligada ao uso do parque, e inclusive pode ser pensada com uma duração de manhã, tarde e noite. O vestiário e o guarda-volumes são usos que pensam na conexão entre realizar um esporte antes ou depois do horário de trabalho, e na di culdade de se realizar isso sem voltar para casa. O guarda-volumes possibilita tanto que se proteja ali o que se carrega para ser usado no trabalho, durante o uso do parque, como que se armazene os objetos relativos à prática de exercícios, para que não se tenha que carregá-los todos os dias (Figuras Projeto, 7). Esses ambientes de apoio facilitam que a prática de esportes e
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Figuras Projeto, 5
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ginásticas possam se dar no parque aberto, e não somente dentro de academias fechadas. A lavanderia comunitária (Figuras, Projeto, 8), também no térreo, permite tanto que se combine a duração da utilização de seus serviços com a dos exercícios, como o contato não planejado com outros moradores do prédio e dos bairros da redondeza. Nas torres, os andares funcionam em duplas. O andar de baixo possui laje em toda sua extensão: tanto nas habitações e salas como no 'terraço' de convivência,
Figuras Projeto, 7
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isso em ambas torres. O de cima somente possui lajes nas residências ou salas. No espaço entre estas existem somente passarelas, fazendo com que as lajes do andar de baixo tornem-se de pé-direito duplo. As habitações e salas de serviço de dois andares compartilham os terraços das duas torres (Figuras Projeto, 9).
Figuras Projeto, 8
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Figuras Projeto, 9
Estes terraços são os pontos chave destes edifícios, pois representam os locais onde é propiciado mais fortemente contato com os externos 'humano' e 'natural'. São espaços abertos, compartilhados pelos vizinhos, com alto pé-direito e árvores plantadas em
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mobiliário xo que contempla a altura necessária para o crescimento de raízese também servem de bancos ou mesas. Compensam a não existência de varandas em cada apartamento com uma grande área, que pode ser utilizada para descanso, lazer, exercícios, e momentos de encontro. É uma parte da residência fora da casa, como acontece nos quintais ou jardins de casas térreas. Pode funcionar também como a calçada (com cadeiras) da rua da cidade pequena ou antiga, já que existe certa segurança e tranquilidade, e movimento para ser observado. Há uma in nidade de situações que surgem a partir da existência desse espaço. Por não ser propriedade de nenhum dos moradores em particular, pode ser mais fácil e informal que os vizinhos encontrem-se nesse lugar intermediário, para tomar uma bebida ao m do dia depois do momento da atividade física, ou no m de semana. Ou então para que as crianças sentem-se para tomar sorvete depois de brincarem juntas. Ali se está nem dentro nem fora de casa, ou do ambiente de trabalho. Pode-se pensar na importância desse espaço intermediário ao se questionar como as pessoas passam a se conhecer. Primeiro é necessário que elas criem alguns laços, para que depois adentrem uns nas casas dos outros. E mesmo quando já há intimidade, há vezes que, por diversos motivos, preferese que se encontre do lado de fora da residência, e por isso esse local intermediário, que é de todos e particularmente de ninguém, é relevante. É o lugar onde dão curtos e diários passeios as pessoas mais idosas e os carrinhos de criança. Onde se toma algum Sol, e mais vento quando o dia está muito quente. Onde se pode avistar as estrelas de noite, e as nuvens de dia. O fato de as torres serem próximas a ponto de se conseguir enxergar com facilidade entre os dois terraços permite que ambos ambientes de trabalho e moradia vigiem-se e conheçam-se. A mãe no trabalho pode ir ver seus lhos com facilidade, e as salas de escritórios, que normalmente não são usadas no m de semana, cam guardadas pelos olhares dos residentes. Este também é o período em que os moradores têm mais tempo para utilizar destes espaços abertos, e é quando os de ambas as torres estão disponíveis. Esse espaço também abarca uma ação corriqueira cujo ambiente em que ocorre normalmente é desvalorizado, que é o 'esperar o elevador'. Esse ato, que ocorre tantas vezes durante um dia, possui um potencial para permitir o contato entre as pessoas, que usualmente não é aproveitado. Ao inserir o local da espera junto ao terraço aberto da torre mais movimentada, que é a de serviços, espera-se que possa haver uma interação maior, tanto entre os que esperam como com alguém que trabalhe nas salas e esteja momentaneamente utilizando o espaço de fora. Existe a noção de que, usualmente, as pessoas compreendem um modo de agir proposto pelo espaço e pelas outras pessoas que já o estão utilizando, e o seguem. Quando trata-se do hall de espera do elevador é comum
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que se adote o comportamento conhecido (por senso comum e experiência) para tal lugar: não se comunicar e até evitar o contato com os outros que estão ali pelo mesmo motivo. A hipótese desse trabalho é que mesclando esse local da espera com um espaço maior destinado ao encontro e a conversa seja possível retirar essa premeditação de como agir, mesmo por tirar do usuário a leitura de que 'isto é um saguão de espera do elevador' (Figuras Projeto, 10).
Figuras Projeto, 10
Nas coberturas das duas torres existem espaços para eventos, festas, reuniões. Sobre a torre de habitações o espaço é mais informal, com um bloco central e três 'jardins', que podem ser utilizados separadamente ou em conjunto. De modo que possa ocorrer ali tanto uma grande festa quanto três ou quatro churrascos de m-de semana simultâneos. Sobre a torre de serviços há um lugar que pode ser usado em reuniões, convenções, palestras, en m funções ligadas ao trabalho. Compõe-se de uma grande sala e um jardim. (Figuras Projeto, 11).
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Os espaços das duas torres podem ser utilizados ao mesmo tempo, ou caso haja um grande evento, seja ele de cunho pro ssional ou pessoal, é possível usar ambos conjuntamente, pois são interligados por uma passarela.
Figuras Projeto, 11
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Figuras Projeto, 11
Os apartamentos em si buscam obter um caráter de 'dentro' e 'fora' ao mesmo tempo. Essa opção é proveniente do entendimento de que ambos ambientes interno e externo são necessários ao homem. Em um contexto rural, se vivia a maior parte do tempo, o tempo do trabalho, no ambiente externo. Isso se balanceava com o dentro da casa, o qual ainda contava com a importância do aproveitamento das varandas, nas emblemáticas casas de fazenda. Hoje, em um contexto urbano, vive-se quase que o tempo todo em espaços internos. O que propor para balancear? A compensação desse fato pode se dar com áreas totalmente abertas parques e praças, tentando fazer com que elas participem do dia-a-dia das pessoas, e não sejam somente o passeio do m de semana. Ainda assim, as muitas horas de trabalho e ações do 'morar', em cada dia, se dariam em espaços internos. Assim, uma segunda opção é tornar estes espaços internos um pouco menos fechados, mais conectados ao exterior, além de trazer a sensação da 'praça' para mais participante dos pequenos momentos do dia a dia - de chegar em casa a esperar o elevador. A nal, uma grande praça ou parque a 200,300, 500 metros do seu caminho de todo dia, ou de sua casa ou trabalho é uma grande vantagem. Entrementes, talvez poucas vezes aproveite-se de fato destes pelo simples
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Joseph Beuys: Actions, Vitrines, Environments . Como realizar uma mescla entre elementos do interno e do externo?
fato da necessidade de separar um tempo para nos dirigir-se até lá. Uma proposta alternativa a tal situação, neste trabalho, é que a sensação de praça torne-se tão próxima e parte do caminho e ações de todo dia que ela se mescle ao quintal. Formando assim um espaço que é uma união, mistura de quintal dos fundos, jardim da frente e praça. Com o intuito de promover um interior que é menos fechado e mais envolvido com o exterior, foram trabalhados os tratamentos das vedações. Estas foram pensadas em camadas, verticais e horizontais, que variam o grau de permeabilidade. (imagem camadas)Começando das verticais, a camada mais externa funciona como um brise. Opera como o principal ltro para o vento e para o Sol, e compõe-se de quadros metálicos com preenchimento de peças de madeira rústicas, quase galhos em si, próximas mas não encostadas umas nas outras. Tais quadros são mesclados com outros que têm uma folha de vidro no lugar da madeira, a m de, em alguns pontos, permitir uma visualização mais clara, e enquadrada, do exterior. A segunda camada é composta de cobogós, um ltro muito mais brando para os fatores já citados, que possui como função principal limitar até onde extende-se piso da habitação ou sala. Essas duas camadas citadas são xas, enquanto a terceira, mais interna, é móvel. Ela é compreendida por folhas de vidro que correm em vários trilhos, de forma que se possa usá-las praticamente sempre abertas, e fecha-las em ocasiões extremas de vento e chuva. As camadas horizontais são duas. Primeiro há como um brise ou pergolado, que utiliza dos balanços da estrutura metálica para se estruturar e assim poder alcançar os 2 metros de projeção. Parte dele encontra-se por fora do brise vertical, de quadros, e parte entre este brise e os cobogós. Sua vedação é de vegetação, trepadeiras que se
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seguram em estruturas leves. Essa peça protege do Sol e da chuva, e promove certo frescor pela presença da vegetação. Do lado de dentro da 'parede' de cobogós está a segunda camada horizontal, um canteiro para plantas de pequeno porte. Este permite que o contato com a vegetação se dê dentro de casa, promove frescor e é um receptáculo de eventuais gotas de chuva e raios solares que passem pelas outras camadas. Dessa maneira, a habitação ou local de trabalho torna-se protegida sem o uso de nenhuma superfície totalmente opaca ou impermeável, que vede completamente. A não ser pelas ocasiões que se feche totalmente as portas de vidro. Devido a tal possibilidade, a priori o projeto não continha nos apartamentos essa camada com vidro. Contudo, por tratar-se do abrigo foi decidido conferir ao usuário a possibilidade de se proteger, e a seus bens, em ocasiões extremas. Esperando que ao proporcionar um ambiente agradável com as diversas camadas permeáveis, o morador não sinta a necessidade de se lacrar com o vidro nas condições normais do clima, mesmo quando há chuva sem vento.
Imagens desta página e da seguinte: lógica das camadas de vedação, e seu efeito visual.
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Foi feita uma re exão sobre o uso do vidro, pois ele é elementar quando o assunto é conexão do interior com o exterior, contudo carrega uma série de paradoxos. Primeiro foi questionado se ele é a única solução para tal intenção. Foi buscado no trabalho encontrar outras maneiras, com vedações semi-permeáveis e que permitem ver fora, com menos abrangência que quando se utiliza vidro, contudo também evitando que do lado de fora se consiga enxergar tanto o lado de dentro, fornecendo maior privacidade. O funcionamento dessas vedações é semelhante ao dos muxarabis, tão presentes nos países orientais quentes. Ao se pensar então no clima surge outra contradição quanto ao uso do vidro. Em países quentes e com alta incidência solar, como o Brasil, existe o problema de este material aumentar a temperatura do ambiente interno, por causar o funcionamento semelhante ao de uma estufa, e deixar que os raios solares incidam diretamente sobre os usuários e objetos, prejudicando-os. É aconselhável que o uso de vidros seja sempre acompanhado de anteparos que promovam sombras, sejam estes brises, anexos, ou a própria cobertura, pelo ato de se recuarem as paredes. Essas recomendações, no entanto, nem sempre são seguidas, e por isso é tão comum no cenário das cidades brasileiras o quadro de uma superfície com vidro acompanhada de uma cortina por trás. Por vezes esta também é utilizada para promover maior privacidade. Existem ainda outras noções, um tanto simbólicas, do uso do vidro. Embora não seja regra geral, é muito comum que a sua utilização procure possibilitar lacrar o ambiente.
Daniel Libeskind. Embora se possa enxergar totalmente o outro lado e o ambiente possua elementos naturais , o sentimneto ainda é de estar em um ambiente interno.
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Ao lado SANAA, abaixo Vincent Callebaut. Ambas utilizam-se do vidro par a lacrar o ambiente, tornando-o claramente fechado apesar da ammpla visao.
imagens camadas
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Essa situação reforça a soberania da visão, ponto questionado por teóricos pósmodernos como Pallasmaa, pois sugere que para se ter contato com o exterior basta enxergá-lo. Os outros sentidos são subjulgados, já que o vidro, inerte a interferências externas, não permite que se sinta cheiros, que se ouça ou se sinta na pele o ambiente do lado de fora. O vidro parece querer trocar a experiência total, de fato, do externo, a qual pode gerar alguns incômodos a nal nem todos os cheiros, sons, ventos, calores e frios são agradáveis, por um contato que tende ao virtual. A natureza por trás do vidro não é tão distante daquela por trás da tela (ainda mais com a qualidade cada vez mais perfeita das reproduções virtuais). O vidro permite que o ambiente natural seja exposto como em um museu, gerando a sensação de que se está 'tão perto e tão longe'. Claro que o vilão não é o material em si, mesmo porque ele contém muitas qualidades, mas o uso que se faz dele. Talvez o que este trabalho deseje repensar é a suposta necessidade absoluta de lacrar, e a ilusão que o vidro traz de que enxergar o lado de fora é o bastante e que uma imersão no ambiente externo seria desnecessária e incômoda.
Ao lado, Casa Azuma. Abaixo, Igreja da água. Ambas projetos de Tadao Ando. Na casa Azuma o contato com o exterior ocorre de fato, e no interior da casa, até desa ando a noção xa do abrigo. Já na Igreja da água, apesar de o projeto ser impressionante, a natureza é tratada como uma imagem por trás do altar.
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Por m, o térreo das torres intenta aproveitar das qualidades que só existem, pelo menos até hoje, no chão. Pois por mais que se queira e eventualmente se consiga reproduzir suas características, o que aliás foi parte do almejado por este trabalho nos terraços dos andares, o nível do solo ainda é especial. É ali, na superfície in nitamente contínua, que crescem as grandes árvores, vive maior parte da fauna, escorre a água da chuva. O que se quis neste projeto foi manter a noção de superfície contínua do solo, fazendo com que os caminhos e espaços propostos se elevassem sobre ele. Assim permitindo duas situações: tanto o contato direto com o solo, e com as bases das árvores, quanto uma aproximação com o nível das copas, nesses espaços elevados. Dessa forma o cobrimento do solo permaneceu sendo terra e vegetação, e há dois caminhos, no nível do chão, para o parque. Um pavimentado, pensando principalmente em questões de acessibilidade, que leva à ponte que atravessa o córrego e chega à gleba que será urbanizada em breve, e um sem pavimento, que já é parte e leva diretamente ao parque que é proposto pelo projeto. É importante ressaltar que o parque e ponte fazem parte do pensamento como um todo, contudo não foram projetados, mas somente propostos, devido a uma questão de abrangência e foco do trabalho. Uma última questão do projeto é sua materialidade. Apesar de ainda utilizar de madeira e pedra, por exemplo, chegou-se a conclusão de que não é necessário construir com 'materiais naturais' para se ter o contato com o exterior que se desejava. Essa sensação almejada não é dependente tanto da materialidade, mas muito da organização dos espaços e da qualidade de permeabilidade das superfícies. Claro que a textura, cor, temperatura dos materiais in uencia muito na percepção do espaço, contudo foi veri cado, ao longo do trabalho, o quão frágil pode ser falar em materiais 'naturais', por essa de nição poder ser extremamente imprecisa. Até que ponto uma peça poderia ser manipulada pelo homem para continuar sendo 'natural'? O manejamento artesanal ainda preserva tal característica enquanto o industrial não? Esse questionamento surgiu pois o primeiro pensamento para o projeto era recuperar técnicas antigas e fabricar de modo mais voltado ao artesanal, em cada andar, nas vedações, combinando isso a uma estrutura industrializada, para alcançar altura. Contudo, esse caminho foi criticado pelas di culdades práticas de construção na cidade e na torre, devido a custos, transporte e mão de obra. Houve a sugestão de mesclar um modo produzir industrial (emblemático no caso 'painel') com materiais naturais (painéis de barro, de taipa, de madeira), contudo essa opção parece um tanto contraditória. Pois se a escolha é pela facilidade da construção, pela praticidade, então que se busquem materiais que re itam isso. Foi re etido que adotar o trabalho artesanal já existente em barro, por exemplo, seria mais fácil que criar uma indústria da construção em barro. Devido a tais contradições e
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di culdades, embora buscar uma produção artesanal e com técnicas antigas sobre/dentro de uma estrutura totalmente industrializada, que é a da construção metálica, pudesse ser um caminho interessante a ser trilhado tentou-se encontrar um outro, no qual os resultados nais fossem menos dependentes dessas materialidades e mais da con guração do espaço. En m, o projeto é uma mescla de estratégias para enfrentar questionamentos sobre como se lida hoje, no espaço urbano, com a questão do dentro fora. Acredito que o modo encontrado de solucionar tais problemáticas, em forma de projeto de arquitetura, seja somente um resultado dentro dos in nitas possibilidades. Não é intenção que se consiga agradar a todos os modos de viver nem que somente haja ganhos, a nal isso nem mesmo é possível. Se a proposta apresenta soluções questionáveis, isso é justi cável exatamente por ela estar repensando padrões já estabelecidos, e os colocando em cheque. Não há (nunca) certezas sobre que efeitos surtirão de proposições realizadas, contudo a própria tentativa já é o início do caminho para se chegar a boas soluções.
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