Julia Murad e Silva
MORAR NO CENTRO A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
Trabalho final de graduação apresentado ao curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Orientadora: Prof. Dra. Denise Antonucci
São Paulo Novembro de 2013
Ă€ Clarinha e ao Leo.
AGRADECIMENTOS Todos sabem o quanto este curso exige inúmeras e árduas horas de trabalho e impossíveis de serem trilhadas sozinha. Queria começar agradecendo à Denise, minha orientadora. Sem ela não existiria este trabalho. Obrigada pela orientação, inúmeras correções e por toda atenção que extrapolou os atendimentos apenas referentes ao trabalho em questão. Ao escritório Espaço e Tempo que tornou-se uma família para mim. Obrigada Regina e a toda a equipe, Valter, Waltinho, Nat (minha chefa preferida), Bibi, Gabi, Celinha e Eudália. Ao Rafael, companheiro de todas as horas. Ao Guti-Guti, my brother, que por inúmeras vezes me buscou de madrugada nas inacabáveis noites de projeto e suportou minhas maquetes e papéis espalhados por toda a casa. À minha avó que sempre achou que os meus projetos estavam sendo realmente construídos. À Ciça que, mesmo já formada, ainda me fez companhia algumas noites me ajudando a acabar tudo a tempo. Obrigada também pela amizade de sempre. Ao anjo, Allan, por me escutar quando desato a falar sem parar, pelas discussões partidárias que eu adoro, por ouvir as minhas crises existenciais no jardim. Á Estefânia que, apareceu neste ultimo ano para acalorar as minhas ideologias e sonhos. À Carolina Visconti, minha irmã postiça, a todo o seu companheirismo durante todos estes anos, mesmo quando estávamos longe. Não poderia deixar de agradecer aos seus pais – Cristina e NILDO que, além de me mimarem muito, participaram intensamente desta fase e sem a menor sombra de dúvida contribuíram para ser bem mais agradável. Obrigada à família toda pelo amor e carinho e cafés e chocolates.
À minha comadre e amiga para vida inteira Monica Tomin Pimentel que, mesmo muito longe, ainda escuta os meus longos desabafos por mensagens! Você faz falta por aqui... Ao Renato, meu pai. Não agradeço apenas por ter sempre me apoiado, mas por ter me criado da forma como o fez e, proporcionado eu ser quem sou hoje. Obrigada por tudo, obrigada por ser meu Pai. Agradeço também pelo enorme carinho e amor da Fabiana e, pela imensa paciência em me ver fazendo maquetes no chão, justo na passagem da cozinha para sala e não se incomodar e ainda fazer comida para mim. Ao Felipe que apareceu na minha vida para fazer todos os dias mais felizes Obrigada pela paciência com as minhas ausências e a atenção em me ajudar, mesmo quando nem eu mesmo sabia o que me ajudaria. Obrigada gorducho, não apenas pelo amor e carinho mas, por estar ao meu lado me apoiando sempre. E, sem a menor sombra de dúvidas, à minha Mãe. Sem ela eu não chegaria de forma nenhuma até aqui. A minha gratidão, o meu amor e o meu orgulho são eternos. Todo o seu empenho e dedicação para me fazer chegar até aqui foram inúmeros. Obrigada por aprender a fazer maquete para me ajudar, obrigada por digitar os meus textos, obrigada por corrigir os meus trabalhos, obrigada pela dedicação, obrigada por ser a pessoa mais dedicada e companheira deste mundo. Obrigada por ser a minha mãe. Se eu estou aqui, é porque você estava do meu lado, sempre. Obrigada Mãe! Obrigada a todos!
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SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................. 13 Parte I......................................................................................................... 17 1. O Processo Histórico da Habitação Social no Brasil............................ 19 2. O Cortiço como Alternativa ................................................................... 29 2.1. Marcos Regulatórios dos Cortiços................................................ 36 3. O Esvaziamento e os Vazios ................................................................. 42 4. A Ocupação como Alternativa ............................................................... 51 4.1. Os Movimentos por moradia ......................................................... 51 4.2. A Lógica de ocupação .................................................................... 57 4.2. Pormenores de uma Ocupação ..................................................... 59 4.3. Edifícios Ocupados ........................................................................ 64 4.3.1. Edifício Plínio Ramos ............................................................. 64 4.2.2. Edifício Paula Souza .............................................................. 68 5. O Edifício Prestes Maia ......................................................................... 71 5.1. O Edifício e o Processo de Ocupação ........................................... 71 5.2. A Ocupação .................................................................................... 72 5.3. A Reintegração de Posse ............................................................... 76 5.4. O Edifício Hoje ................................................................................ 83 6. Os resultados das Ocupações .............................................................. 87 6.1. A importância dos movimentos na luta por moradia ................... 87 6.2. Uma alternativa ao caso Prestes Maia ......................................... 94 7. Considerações Finais ............................................................................ 99 8. Estudos de Caso................................................................................. 105 7
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8.1. Programa Morar no Centro ......................................................... 105 8.1.1. O Hotel São Paulo ................................................................. 107 8.1.2. Senador Feijó. ....................................................................... 108 8.1.3. Edifício LABOR ...................................................................... 110 8.1.4. Residencial Conego Vicente Marino .................................... 111 8.2. Conjunto Jardim Edith (2008/2012 ) ........................................ 112 8.3. Conjunto Ponte dos Remédios (2011/_) ................................... 113 8.4. Residencial Diogo Pires (2011/_) .............................................. 113 9. Projeto ................................................................................................. 115 9.1. Os desenhos ................................................................................ 117 Bibliografia............................................................................................... 147
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LISTA DE IMAGENS E MAPAS 1.Área urbanizada em 1881..................................................................... 19 2 Área urbanizada em 1882-1914 .......................................................... 19 3.Área urbanizada em 1915-1929 .......................................................... 19 4.Imigrantes vindos da Bahia 1936 ......................................................... 20 5.Inauguração da Vila Maria Zélia 1917 .................................................. 21 6. Propaganda da tipologia A .................................................................... 23 7.Propaganda da tipologia D .................................................................... 23 8. Implantação do IAP da Mooca .............................................................. 24 9.Conjunto do IAP Mooca .......................................................................... 24 10. Porta de um cortiço. Foto Fabio Knoll ................................................ 28 11. Cortiços na Santa Efigênia ................................................................. 30 12. Cortiços - cozinha improvisada .......................................................... 30 13.Interior de um cortiço. Foto Fabio Knoll.............................................. 33 14. Cozinha de um cortiço. Foto Fabio Knoll ........................................... 33 15. Quarto de um cortiço .......................................................................... 33 16. Interior de um cortiço. Foto Daniel Marenco ..................................... 34 17.Cortiço no Brás - 1950. Foto Peter Scheile ........................................ 36 18. Propostas pioneiras de habitação operária....................................... 37 19. Relatório de exame de cortiços – 1893 ............................................ 37 20.Umidade do cortiço. Foto Fabio Knoll ................................................. 38 21. Mapa do centro de São Paulo ............................................................ 41 22. Expansão da área urbanizada............................................................ 42 23. Distribuição dos vazios no centro de São Paulo em 2004 ............... 45 24.Ocupação Tentente Pena– 2005. Foto Antonio Brasiliano ............... 50 25. Porta "lacrada" de predio vazio no centro ......................................... 52 26. Sede do MSTC ..................................................................................... 55 27. Passeata por luta por moradia ........................................................... 55 28. Ocupação do FLM ............................................................................... 55 29. Ocupação no centro de São Paulo ..................................................... 56 30 Intervenção do Coletivo Elefante – 2005 ........................................... 56 31. Ocupação Rua Mauá 340 .................................................................. 57 9
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32. Entrada da biblioteca Prestes Maia -2005........................................ 58 33. Escada - Plinio Ramos ........................................................................ 60 34.Apresentação de dança no Plinio Ramos ........................................... 60 35. Assembleia Prestes Maia ................................................................... 61 36. Portaria do Prestes Maia .................................................................... 61 37. Prédios da Rua Plínio Ramos ............................................................. 64 38. Severino no Ateliê de Costura - Plínio Ramos ................................... 65 39. Sala de reuniões - Plínio Ramos ........................................................ 65 40.Policias jogam spray de pimenta na Reintegração de Posse ............ 66 41. Policiais sem identificação durante despejo da ocupação Plinio Ramos ................................................................................................................... 66 42. Móveis dos moradores despejados ................................................... 66 43. Acampamento na Rua Plínio Ramos, armado após o despejo, diante do prédio vazio e lacrado | 2005 ............................................................. 67 44.Planta da ocupação do Plínio Ramos ................................................. 67 45. Ocupação Paula Souza – 2005 ......................................................... 68 46. Varanda utilizada com varal ............................................................... 68 47. Despejo da Ocupação Paula Souza – 2005...................................... 68 48. Planta da ocupação Paula Souza ...................................................... 69 49. Janela da ocupação Prestes Maia. Foto Júlio Bittencourt ................ 70 50. Intervenção na ocupação ................................................................... 72 51.Entrada da ocupação Prestes Maia .................................................... 72 52. Vista geral do edifício ......................................................................... 73 53.Lavanderia coletiva.............................................................................. 74 54. Salão central como área comum - sofas e convivência.................... 74 55. Assembleia no salão comum ............................................................. 75 56. Identificação do 14°andar ................................................................. 75 57. Reintegração de Posse ....................................................................... 80 58. Reintegração de Posse ....................................................................... 80 59. Edificio Prestes Maia – 2013............................................................. 82 60. Janela Preste Maia ............................................................................. 84 61. Janela Prestes Maia ........................................................................... 84 62. Janela Prestes Maia com parabólica ................................................. 84 10
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63. Acesso ao Edifício Preste Maia – 2013 ............................................. 85 64.Edifício Prestes Maia - acesso Rua Brigadeiro Tobias ....................... 85 65. Moradora depois da ordem de despejo do Plínio Ramos -2005 ...... 86 66. Planta desenvolvida para proposta de intervenção do Prestes Maia ................................................................................................................... 96 67.Ampliação da proposta ........................................................................ 97 68. Foto aérea de centro de São Paulo.................................................. 104 69. Planta original do pavimento tipo do Hotel São Paulo .................... 107 70. Planta do Pavimento tipo Hotel São Paulo ...................................... 107 71. Fachada do Hotel São Paulo ............................................................ 108 72. Acesso ao Hotel São Paulo ............................................................... 108 73. Planta do pavimento-tipo original Edifício Senador Feijó ............... 109 74. Planta do pavimento-tipo reformado do Edifício Senador Feijó ..... 109 75. Vista lateral Edifício Labor ................................................................ 110 76.Planta pavimento-tipo Edifício Labor ................................................ 110 77. Vista geral do projeto ........................................................................ 111 78. Vista interna do projeto .................................................................... 111 79. Vista geral do conjunto ..................................................................... 112 80. Vista interna ...................................................................................... 112 81. Implantacao do projeto executado .................................................. 112 82. Croqui do conjunto da Ponte dos Remédios ................................... 113
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INTRODUÇÃO O presente trabalho tem por objetivo analisar as diferentes maneiras de morar no centro de São Paulo, bem como a forma como estas se estabelecem no espaço. Visa entender a relação dos edifícios que hoje se encontram abandonados e que possuem potencial para serem reconvertidos em moradia, assim como, utilizar os terrenos “vazios” para promover habitação e usos que apoiem a população. Terá como base a relação de ocupação do Edifício Prestes Maia que, desde 2002, passa por diferentes processos e diferentes formas de ocupação. Esta referência se estabelecerá principalmente por esclarecer a forma como esta população ocupa o edifício, quantas famílias residem, o formato destas famílias e, a partir desta lógica de ocupação, propor um edifício multifuncional, visando diminuir o déficit habitacional na cidade, bem como potencializar o desenvolvimento do projeto em questão, estabelecendo usos que complementem e modifiquem as deficiências desta região e a demanda exigida a partir de um aumento populacional. Estes diferentes usos se referem a salas de aulas que viriam a dar apoio a ocupação Prestes Maia uma vez que é premissa dos movimentos de moradia a realização de aulas, palestras e assembleias para a população filiada ao movimento. No que se refere ao desenvolvimento deste estudo, na PARTE I, foi de suma importância o entendimento de como se estabeleceu o histórico da habitação na cidade de São Paulo e como este processo excluiu a população de baixa renda dos seus programas. Desta forma, a alternativa neste momento foi habitar os diferentes e insalubres cortiços existentes no centro de São Paulo. É neste contexto de descaso e exclusão que os movimentos de moradia surgem para atuar também nas áreas centrais. A existência de inúmeros edifícios vazios e o alto déficit habitacional fizeram com que os movimentos se fundamentassem na premissa de que ocupar estes vazios é uma forma de lutar por moradia, abrigando
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emergencialmente famílias denunciando estes vazios.
desalojadas
e,
ao
mesmo
tempo,
“Foi diante do elevado estoque imobiliário ocioso e das dificuldades para conseguir avançar nos debates sobre as políticas habitacionais para a população de baixa renda no centro de São Paulo que, a partir de 1997, movimentos de moradia e sem-teto passaram a utilizar a ocupação de imóveis vazios naquela região da cidade como principal estratégia de pressão.” (Neuhold, 2009, p. 41).
Foram estas lutas e resistências que proporcionam a atenção que hoje estes edifícios vazios estão recebendo das novas propostas de política habitacional, assim como a inclusão da camada mais pobre da população na aquisição destas unidades. Este estudo possibilitou a percepção da importância dos movimentos neste processo. A luta por moradia permitiu que um diálogo se abrisse para estruturar-se uma proposta democrática e diversificada para a questão relacionada a MORAR NO CENTRO. A análise do Prestes Maia foi essencial para o entendimento da lógica de um processo de ocupação. Entender como se estabelecem as relações entre os moradores, entre os moradores e o edifício e, entre os moradores e os coordenadores dos movimentos é de suma importância para o entendimento da forma como se estabelece as ocupações e suas intrínsecas relações. Devido a este caráter singular de extremas relações e aliado à existente proposta da Prefeitura do Município de São Paulo em reformar 42 edifícios ocupados no centro de São Paulo e destinar parte para os movimentos, a conclusão desta Parte I se dá com uma proposta de intervenção no Prestes Maia, considerando-o como propriedade da prefeitura e servindo de habitação transitória entre não ter um teto para morar e ser inserida em programas como o Minha Casa Minha Vida. Este processo foi importante para o entendimento das peculiaridades de uma lógica de 14
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ocupação que não está inserida nos contextos estudados nas salas das universidades. No que se refere a Parte II é apresentado o projeto desenvolvido ao longo deste ano em que, neste caso específico, se estabelece como um objeto que vem dar suporte ao Prestes Maia e, ao mesmo tempo, contribuir com a diminuição de déficit habitacional e a diversidade de moradia no centro de São Paulo. O programa deste edifício, assim como a escolha do próprio uso, está fundamentado em diferentes estudos preliminares sobre a área em questão proporcionando o entendimento de quais são suas deficiências e potencialidades. Desta maneira, a análise da ocupação do Prestes Maia também proporcionou o entendimento de quais eram os espaços precários ou inexistentes que poderiam ser transferidos para outro edifício. Foi, neste contexto, que o objeto se fundamentou e assim, propõe um programa embasado na lógica de ocupação do centro de São Paulo, das necessidades da ocupação do Prestes Maia (localizado na mesma avenida) e, no desenho de unidades habitacionais que visam à qualidade de vida e o acesso por parte da população de baixa renda.
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Parte I 17
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1. O Processo Histórico da Habitação Social no Brasil
1.Área urbanizada em 1881 Fonte: Prefeitura Municipal de São Paulo
2 Área urbanizada em 1882-1914 Fonte: Prefeitura Municipal de São Paulo
3.Área urbanizada em 1915-1929 Fonte: Prefeitura Municipal de São Paulo
A cidade de são Paulo passou por um rápido processo de crescimento principalmente com a explosão da produção cafeeira possibilitando os primeiros passos para o crescimento urbano. A população era formada principalmente por trabalhadores que atraídos pelo novo mercado e por novas possibilidades migraram para a cidade. Esta população era em sua maioria, imigrantes que se mudaram com suas famílias, em busca de uma nova possibilidade de vida e de mercado de trabalho. Porém, esta ficou aquém do desenvolvimento da infraestrutura da cidade. Não existiu planos habitacionais que priorizavam a qualidade de vida e salubridade desta população ou atendessem a demanda existente em função do rápido crescimento da cidade. A primeira crise habitacional da cidade de São Paulo aconteceu ente 1896-1990 (MORSE 1970) quando a falta de moradia fez com que famílias se mudassem para o interior paulista, facilitando o processo de expansão da população para as áreas periféricas permitindo novos loteamentos e a criação de diferentes bairros. A alternativa para as inúmeras famílias que permaneceram na cidade e não se interessaram em se mudar para a então periferia, resultou na moradia em cortiços, tema que será abordado adiante. O governo ausente na produção de habitação de qualidade para estes imigrantes, passou apenas a propagar uma política higienista que, além de controlar e fiscalizar a população residente em cortiços, tranquilizou a elite paulistana que estava preocupada com a propagação das diferentes doenças existentes em função da falta de salubridade nestas moradias (Bonduki, 2004). Algumas medidas foram tomadas no que se refere a controle habitacional, principalmente questões higienistas. Em 1984 (Bonduki, 2004) o Código 19
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Sanitário foi desenvolvido para regulamentar algumas questões referentes a intervenções necessárias. A maior interferência se deu na eliminação de inúmeros cortiços existentes no bairro da Santa Efigênia pois, dividia o espaço físico com a classe média que preferia “erradicar os moradores das áreas centrais” (Piccini, 2004, p.46). Em um outro momento, segundo ROLNIK (1981), a demolição dos cortiços para o embelezamento da cidade torna-se comum e passa a ser considerado uma política de atuação higienista e uma forma de encaminhar a população de baixa renda para a periferia. Os cortiços eram habitações permitidas, estavam inseridos nas regras de uso estipuladas no Código de Posturas do Município. Porém o fato de estar regulamentado não mudou o quadro da situação insalubre uma vez que as regras mínimas não eram respeitadas. A produção da habitação ficou sob responsabilidade do setor privado que viu na locação uma atividade altamente rentável. Segundo Bonduki (2004, p.45), foram construídos 38 mil novos prédios e cerca de 80% eram destinados ao aluguel. O mesmo setor privado proporcionou diferentes modalidades de aluguel, uma delas se refere às vilas operárias que muitas vezes eram construídas pelas próprias indústrias para manter os funcionários, principalmente de manutenção de máquinas, próximo à área do trabalho e, não possuíam o intuito de atrair mais trabalhadores, por isso o número reduzido de unidades (Bonduki, 2004, p.48). “Executados os casos em que era essencial a proximidade constante e o controle dos trabalhadores, as outras vilas em São Paulo, mesmo algumas de empresas, eram edificados por serem uma alternativa segura de investimento. Muitas vezes, o empresário que a construía destinava as casas aos seus operários com a intenção de conseguir vantagens adicionais, negociando uma redução nos alugueis em troca de menores salários,
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4.Imigrantes vindos da Bahia 1936 Fonte: Acervo Museu do Imigrante
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exigindo que outros membros da família se empregassem na empresa e contam com a relutância do operário em buscar outro emprego melhor remunerado, pois a demissão implicaria perda da casa.” (Bonduki, 2004, p.49)
Estas situações descritas acima tornavam a produção de vilas operárias extremamente vantajosas para empresários até quando comparada com as vantagens dos trabalhadores e isso se deve pelo fato da produção deste tipo de moradia ser realizada pelo poder privado e não por propostas de habitação pública. Um exemplo importante da produção das vilas de empresas se refere ao caso da Vila Maria Zélia, situada no Belenzinho em São Paulo. No que se refere a vila rentista, um bom exemplo é a Vila Economizadora, situada no bairro da Luz (BONDUKI, 2004). No que se refere à produção e à intervenção estatal no problema da habitação para os trabalhadores da cidade é apenas na Era Vargas (19301945) que o “problema da moradia emergiu como aspecto crucial das condições de vida do operariado, pois absorvia porcentagem significativa dos salários e influía no modo de vida e na formação ideológica dos trabalhadores” (Bonduki, 2004, p.73). Atesta-se que o mercado privado não seria capaz de resolver o problema da habitação precária na cidade e este, passa a ser responsabilidade das políticas públicas. A população trabalhadora via como única possibilidade de aquisição da casa própria a autoconstrução na periferia da cidade ou, alternativas como os cortiços que, apesar de serem próximos de áreas com infraestrutura, possuíam suas instalações precárias e insalubres. Uma das questões era a viabilidade de projetos que permitissem a aquisição de imóveis por parte da classe trabalhadora e, com isso ficar livre da exploração dos abusivos aluguéis. 5.Inauguração da Vila Maria Zélia 1917 Fonte: http://www.saopauloantiga.com.br
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Vale ressaltar que o problema da moradia, associado ao fato da maioria viver em aluguel, não se restringia apenas as classes mais baixas e sim a população de um modo geral. Também por este motivo entendeu-se que promover programas de aquisição da casa própria fariam com que o governo fosse bem visto por ambas as classes. Também seria uma forma de materialização dos esforços dos trabalhadores, uma forma de entender que o seu trabalho estaria dando frutos. O maior ganho para o governo estava atrelado ao fato do trabalhador não ser mais considerado uma ameaça para o governo. As questões referentes a insalubridade e às política higienistas ficam no discurso do passado e ainda segundo Bonduki (2004, p.75): “A ampliação do ensino superior e da burocracia estatal nos anos Vargas propiciou novos enfoques, que tiveram como resultado não só um diagnóstico das condições habitacionais e dos obstáculos para sua melhoria, como também a elaboração de propostas que levavam em conta os aspectos físicos, institucionais, urbanísticos, econômicos, jurídicos, sociais e ideológicos da questão. Tudo isso com o objetivo de viabilizar soluções habitacionais alternativas para a população de baixa renda, sobretudo a casa própria” (Bonduki, 2004, p.75)
Questões relacionadas à redução dos acabamentos, redução do pé direito, padronização de unidades e principalmente mudanças no Código de Obras foram itens importantes para a viabilidade da redução dos custos para tornar a casa própria um item acessível aos trabalhadores. A urbanização das áreas periféricas tornou-se uma solução para a implementação de programas habitacionais e com isso, necessário a criação de transportes coletivos de qualidade como forma de atrair os trabalhadores que deixariam de morar nas áreas centrais da cidade. Alguns problemas referentes à urbanização horizontal não se limitaram aos transportes. Questões referentes ao fato de levar água, esgoto e iluminação para periferia, assim como organizar este crescimento 22
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cicatrizaram esta expansão e tornaram-se problemas existentes até os dias de hoje. Como alternativa para esta situação, a proposta de financiamento para a aquisição de imóveis é concretizada pelo surgimento dos IAP´s - Instituto de Aposentadoria e Pensão. Os institutos de previdência tiveram grande importância na expansão do Brasil viabilizando o consumo da classe de menor renda e elevando a capacidade dos assalariados. (BONDUKI, 2004, p.103). É a partir de 1937 com o Decreto 1.749 que a atuação dos IAP’s se torna concreta nesta área. A possibilidade de criar as carteiras prediais e ainda “destinar até metade de suas reservas para o financiamento das construções”, segundo Bonduki (2004, p.104.): “Além disso o decreto estabelecia condições de financiamento habitacional tendentes a ampliar a demanda, com a redução das taxas de juros de 8% para 6%; a ampliação dos prazos de pagamento de 10 para 25 anos; a elevação do limite máximo de financiamento, e a autorização para a concessão do benefício para associados que já possuíssem casa própria.” (Bonduki, 2004, p.104.)
6. Propaganda da tipologia A Fonte: BONDUKI, 2004, p.178
Esta medidas viabilizaram a aquisição de imóveis por parte da população de baixa renda assim como aumentaram consideravelmente a rentabilidade das reservas dos IAP’s. Diferentes institutos usaram a forma e condições de financiamento deste instituto como modelo de aplicação e, foram poucas as alterações até meados de 1964 (VERAS, 1980). Os planos existentes nos IAP’s segundo Bonduki, (2004 p. 104) se referem, a saber:
7.Propaganda da tipologia D Fonte: BONDUKI, 2004, p.178
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Plano A: Locação ou venda de unidades habitacionais em conjuntos residências adquiridos ou construídos, com o objetivo de proporcionar aos associados moradia digna. Plano B: Financiamento aos associados para a aquisição da moradia ou construção em terreno próprio. Plano C: Emprestimos hipotecários feitos a qualquer pessoa física ou jurídica, bem como outras operações imobiliárias que o instituto julgasse conveniente, no sentido de obter uma constante e mais elevada remuneração de suas reservas. Os itens A e B podem ser encarados como planos que atingem a população de baixa renda e, o item C já se refere à população que possui um fundo considerável. Vale ressaltar que os IAP’s foram responsáveis pelo processo de verticalização das grandes cidades do Brasil até 1945 e até 1950 a produção esteve voltada para a questão social, embutida nos planos A e B. (Bonduki, 2004, p.107). Vale ressaltar que segundo Bonduki (2004, p.106) a ênfase durante o governo Dutra em produzir habitação social está associada à ideia de conter o “avanço do Partido Comunista do Brasil (PCB) nos grandes centros, temendo-se que a insatisfação gerada pela crise de habitação e de abastecimento em geral pudesse causar perigosas rebeliões” (Bonduki, 2004, p.106). Uma das críticas à produção do IAP’s se refere ao fato da adoção do aluguel como forma de acesso as unidades, indo em confronto com a ideologia inicial de sua concepção. Com o fim do Estado Novo e com aumento do déficit habitacional, os IAP’s chegaram ao fim. Estes institutos tiveram grande importância na produção de unidades habitacionais, marcando com a significativa qualidade arquitetônica. “A despeito disso, realizara uma produção significativa, de grande valor arquitetônico e urbanístico, que marcam as origens da habitação social no Brasil” (Bonduki, 2004, p.115). 24
8. Implantação do IAP da Mooca Fonte: BONDUKI, 2004, p.187
9.Conjunto do IAP Mooca Fonte: BONDUKI, 2004, p.187
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No período posterior em um contexto de ditadura, são inúmeros as propostas do poder público para atender o déficit habitacional da camada mais pobre da população. O problema é que não tinha como objetivo sanar o problema em prol da população e sim, conter e evitar a possibilidade de revolta por parte das classes baixa assim como impulsionar economicamente o país. O crescimento populacional acelerado com altos índices de inflação e taxas de juros fixas aumentou o déficit habitacional. Neste contexto surgiu o SFH – Sistema Financeiro de Habitação regulamentado pela Lei 4.380/64. Tinha por objetivo organizar o sistema e financiamento de moradia utilizando as cadernetas de poupanças através do BNH- Banco Nacional de Habitação. Para atender a demanda existente, o SFH foi dividido em dois ramos, sendo um ligado à construção civil para a classe média e outro para a classe baixa que era operado por agências estatais com o COHABCompanhia Habitacional de São Paulo (fundada em 1965) e CDHU – Companhia de Desenvolvimento Habitacional Urbano. O que se manteve igual para ambas as frentes de atuação foi o autofinanciamento, prejudicando a população de baixa renda que não poderia comprovar a renda necessária para incluir-se no programa e com isso o SFH lucrou muito mais com as unidades destinadas à classe alta (Mendes, 2011) O BNH, entre 1964 – 1986 (quando foi extinto), financiou 4,8 milhões de novas unidades sendo este valor, 25% de toda a produção neste período. O problema é que apenas 20% do total de 4,8 milhões foram destinados à população de baixa renda (Mendes, 2011, p. 25). A expansão das áreas ilegais entre 1970 e 1980 esta atreladatambém ao colapso do sistema de crédito habitacional e ao fim do BNH (1968) onde a população de baixa renda passa a procurar alternativas para morar. Normalmente estas alternativas se referem a áreas irregulares, sem estruturas tanto nas periferias da cidade quanto nos cortiços da região central. (Bonduki, 2004)
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Assim como todo o processo de desenvolvimento da cidade, este programa visava principalmente direcionar privilégios de arrecadação de dinheiro, tanto para o estado quanto para a classe alta, assim como promover uma cidade “moderna”. Desta forma, possibilitou a verticalização dos novos centros financeiros e dinamizou a produção imobiliária. Efetivamente, para a população de baixa renda, o que existiu, se restringiu aos condomínios-dormitórios, longe do centro, dos empregos e de qualquer infraestrutura básica (Mendes, 2011). O que existe é uma valorização às áreas centrais pois receberam melhores investimentos públicos (saneamento, iluminação, pavimentação de ruas e etc.). Devido a isso a valorização imobiliária impediu que os trabalhadores adquirissem imóveis nesta região e com isso, a população que poderia pagar morava na “cidade formal” e quem não poderia na “cidade informal” (Maricato, 2000) Com a criação do Ministério da Cidade, em 2003, novas discussões sobre políticas habitacionais são colocadas em pauta, principalmente no que se refere a programas que proporcionem moradia digna para a camada mais pobre da população e, em 2009 é lançado o projeto “Minha Casa Minha Vida” e a proposta é de executar um milhão de unidades habitacionais em todo o país, destinadas as famílias que ganham entre 0 a 10 salários mínimos. A vantagem deste programa está no foco da população que mais sofre com o déficit habitacional e no fato de não restringir a construção a promoção pública como a CDHU, deixando que a oferta privada também produza neste programa. Estas duas características diferenciam este programa dos outros existentes até hoje. Nada impede que a lógica da construção na periferia e a consequente segregação social mantenham-se nos projetos deste programa, como já foi identificada em alguns casos de construções do Minha Casa Minha
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Vida, porém, o que vale é a quantidade de unidades destinadas à população de baixa renda.1 Mesmo que diferentes planos tenham sido desenvolvidos, o déficit habitacional brasileiro é de 7.223 milhões de domicílios sendo destes, 84% referentes às famílias de até 3 salários mínimos. (Ministério das Cidades, Outubro 2005). Estes dados precisam entrar efetivamente na pauta das discussões e dos desenvolvimentos dos projetos de habitação social, principalmente quando temos 6 milhões de domicílios vagos no Brasil (IBGE, 2010)
Segundo FERREIRA (2012, p.39) a produção do Minha Casa Minha Vida depois de 2 anos de lançamento é de 1 milhão de unidades. 1
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10. Porta de um cortiço. Foto Fabio Knoll Fonte: Por dentro dos Cortiços
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2. O Cortiço como Alternativa “...nos primórdios da industrialização, os cortiços se transformaram no modo mais viável para o capitalismo nascente reproduzir a baixo custo a classe trabalhadora da cidade. Localizados nas proximidades das fábricas, tornaram-se a única modalidade de habitação que poderia ser financiada pelos baixíssimos salários dos trabalhadores e permitir suas longas jornadas de trabalho.” (Neuhold, 2009, p. 30)
O cortiço foi uma das primeiras formas de habitação da população que imigrou paras as diferentes cidades em busca de trabalho. Tem início aproximadamente em 1870 (Mendes, 2011) com o processo de industrialização e está atrelada ao processo desordenado de urbanização da cidade de São Paulo que, devido ao crescimento econômico, teve a população aumentada em 22 vezes em quase 50 anos (Piccini, 2004, p.43). Em 1872 são Paulo tinha 26.040 habitantes e em 1920 a população passou a ser 580 mil (Piccini, 2004 p, 27). O processo que desencadeou a alta demanda de habitação em cortiços foi um reflexo da dinâmica que se estabeleceu na cidade, precária em relação ao estoque de habitação para os ex-escravos e imigrantes que, devido a diferentes fatores, eram impossibilitados de adquirir um imóvel em condições mínimas de localização e salubridade. O cortiço surgiu como uma alternativa. “O poder público esteve sempre desaparelhado e com grande dificuldade para enfrentar os problemas do crescimento urbano ligados ao desenvolvimento econômico da cidade, além de ter em grande parte uma postura de laissez faire em relação à ocupação do território, em particular dos bairros mais populares. Na pratica, atuava na região central da cidade, deixando a cargo da iniciativa privada o
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desenvolvimento das regiões periféricas” (Piccini, 2004, p.44).
O cortiço aparece como resposta a esta questão que se instaurou na cidade de são Paulo que, além de ter mínimas condições como será apresentado adiante, caracteriza a segregação social existente na “nova” cidade. Esta moradia se estabelece próximo ao trabalho porém, separada espacialmente do empregador. Com o passar do tempo, tornou-se um negócio lucrativo para os empreendedores e desta maneira, não eram apenas casarões antigos ou lugares já existentes, mas casas eram erguidas com a finalidade deste uso (Neuhold , 2009, p. 30). No que se refere a tipologia e forma organizacional, algumas classificações foram atribuidas para o entendimento das diferentes lógicas de ocupações de cortiços e, segundo PICCINI (2004, p.21), a classificação se estabelece da seguinte maneira, a saber: Cortiço de quintal: ocupava o centro do quarteirão com acesso através de um pequeno corredor. De face para a rua, ao lado do portão de entrada, havia quase sempre um predio de uso comercial; Cortiço casinha: construção independente com frente para a rua, também chamado de pensão;
11. Cortiços na Santa Efigênia Fonte: distritorepublica.blogspot.com.br
Casa cômodo: sobrado com várias subdivisões internas; Cortiços improvisados: ocupação precária de fundo de depósito, fundo de bares, armazéns, cocheiras e estábulos, sempre no centro do quarteirão; Hotel-cortiço: tinha uso de restaurante, de dia, e no mesmo local à noite, as pessoas se reuniam para dormir. (aput. Motta, 1894; ANT, Kowarick e Véras, 1981; e Bonduki, 1994) O que caracteriza um cortiço é fundamentalmente a definição de Habitação Coletiva de Aluguel (Piccini, 2004 p.24) sendo que está se estabelece de diferentes maneiras no espaço da casa e, segundo a única 30
12. Cortiços - cozinha improvisada Fonte: distritorepublica.blogspot.com.brl
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definição e Lei sobre o assunto, a chamada Lei Moura, Lei Municipal 10.928 de 1991, o cortiço se define por: “...unidade usada como moradia coletiva multifamiliar, apresentando, total ou parcialmente, as seguintes características: a) Constituída por uma ou mais edificações construídas em lote urbano; b) Subdividida em vários cômodos alugados, subalugados ou cedidos a qualquer título; c) Várias funções exercidas no mesmo cômodo; d) Acesso e uso comum dos espaços não edificados e instalações sanitárias; e) Circulação e infraestrutura, no geral precária; f) Superlotação de pessoas.”
Algumas outras definições também podem ser encontradas. A característica que se estabelece comum a todas se refere a “habitação precária coletiva de aluguel, as moradias das classes mais pobres, de baixo preço de aluguel, com específicos problemas de superlotação de moradores e coabitação forçada, localizadas principalmente em áreas próximas ao centro, de alta concentração espacial, sem verticalização e com instalações sanitárias em comum” (Piccini, 2004, p.25). Os cortiços eram moradias precárias, insalubres e sem nenhuma qualidade de vida, porém, era a única alternativa encontrada pelos trabalhadores das inúmeras indústrias da cidade de São Paulo e isto se dá pela ausência de uma política pública de investimento em moradia central e de qualidade, principalmente com o crescimento industrial e a vinda de imigrantes para a cidade. Diferem-se dos loteamentos e das favelas principalmente pela insalubridade, centralidade e alta exploração do aluguel. Os bairros que concentravam a maioria dos cortiços eram aqueles em que se desenvolveram as indústrias como é o caso do Bom Retiro, Água
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Branca, Barra Funda, Santa Cecília, Luz, Liberdade e etc. (Piccini, 2004, p.27). Vale ressaltar que 1/3 da população paulistana vivia em cortiços no ano de 1906 (MENDES, 2011, pg.18). Já em 1930, começa um processo de expansão para a periferia em função do avanço do sistema de transporte e dos loteamentos clandestinos. Na década de 50, o padrão da moradia de baixa renda é o padrão periférico da autoconstrução e normalmente na clandestinidade. Isso se dá principalmente pela mudança no eixo econômico da cidade que passa a se estabelecer nas regiões periféricas em função da construção das auto estradas e, em função do valor do terreno. “A periferia da cidade se faz comandada pela lógica do mercado e de uma selvagem especulação imobiliária” (MENDES, 2011, 21). Este tipo de habitação, mesmo sendo a única alterativa da camada mais pobre da população, foi discriminado pela elite paulista dada à associação a focos de doenças e pestes assim como a própria desordem “principalmente após episódios como a epidemia de febre amarela de 1893 e as greves gerais de 1917” (Neuhold, 2009, p. 30). “Sua sujeira e prosmiscuidade é, desde o século passado, apontada como responsavel pelas epidemias. Sujeira pela falta de água ou esgoto, prosmicuidade pelos hábitos ‘bárbaros’, ‘não civilizados’ de seus moradores. Assim, cortiços e cortiçados são imediatamente identificados com sujeira, peste, imoralidade e barbárie....Em nome da saúde dos cidadãos, os moradores dos cortiços passam a ser pesquisados, suas casas invadidas e remexidas, seus doentes de toda espécie removidos.” (Rolnik, 1988, p.81 aput Neuhold, 2009, p.31)
O fato dos cortiços serem foco de pestes e doenças, sempre fez com que recebessem atenção do poder público, principalmente pela pressão que a elite paulistana exercia. A população que encontrou no cortiço uma alternativa de moradia, mesmo que em situações precárias, correspondia, 32
MORAR NO CENTRO
segundo SEMPLA (2000), em 1993 há 600 mil pessoas (6% da população) distribuídas em 23.688 imóveis encortiçados e, segundo a CDHU (2002), no ano de 2000 a população diminuiu para 391.800 pessoas morando em cortiços, o que representava 4% da população total. Apesar da população em cortiços diminuir ao longo dos anos, em 1961 ainda representava 18% da população. (MENDES, 2011). Vale ressaltar que a estimativa da população residente em cortiços é difícil de ser realizada, uma vez que é uma situação clandestina e tanto os proprietários dos imóveis quanto os moradores, preferem o anonimato. 13.Interior de um cortiço. Foto Fabio Knoll Fonte: Por dentro dos Cortiços
15. Cozinha de um cortiço. Foto Fabio Knoll Fonte: Por dentro dos Cortiços
14. Quarto de um cortiço Fonte: Por dentro dos Cortiços
“Em São Paulo, os cortiços continuam sendo uma atividade imobiliária vantajosa. Sabe-se que o aluguel do metro quadrado desse tipo de moradia é o mais alto da cidade (Manso, 12 de abr. 2009). Os seus moradores pagam, em média, entre R$ 21 e R$ 28 por metro quadrado, nos distritos da subprefeitura da Mooca e da Sé respectivamente; enquanto isso, em bairros como Jardim Paulistano, Moema e Morumbi, considerados os mais caros da cidade, o metro quadrado de um apartamento com quatro dormitórios custa em média R$ 23 (Manso, 12 abr. 2009). A diferença é que os cômodos dos cortiços possuem cerca de 11,9m² (Kohara, 1999, p.6), atendem um público sem acesso ao mercado formal e a possibilidade de comprovação de renda, sem carteira de trabalho assinada nem fiador” (Neuhold, 2009, p. 33).
A alternativa da população de baixa renda em morar nos cortiços insalubres se refere ao fato da proximidade com as áreas centrais com um preço acessível, à ausência de burocracias no contrato de aluguel que, por muitas vezes é inexistente, e também ao anonimato. São estas as características que atraiam e, ainda atraem a população de baixa renda que precisa ter acesso diário às áreas centrais. (Mendes, 2011). Em função desta alta demanda e da ausência de programas habitacionais nas áreas centrais, destinados a população que ganha entre 0 e 3 salários 33
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mínimos, os cortiços sempre se mantiveram como uma alternativa devido à falta de opção, criando regras próprias e aluguéis abusivos, chegando a comprometer 50% do salário dos habitantes (Kohara, 2009 apud Neuhold, 2009, p. 33). Poucas foram as políticas realizadas2 utilizando os cortiços como foco de atuação. As medidas em sua maioria se limitavam a expulsão e o despejo dos moradores. A ausência da atuação sempre se justificou pela complexidade e problemática existente nas relaçãoes no cortiço e, principalmente, por sua ilegalidade que o obrigava a se esconder diante dos olhos da sociedade. Ponto este que também se difere das favelas que, compõem a paisagem urbana e por isso são inúmeros os programas de atuação, discussões e reflexões sobre a moradia em favelas (Mendes, 2011). “Com relação aos cortiços do centro, a constante foi sempre a política de remoções para a periferia quando a administração municipal devia enfrentar despejos de moradores ou problemas emergenciais ocorridos em algum cortiço” (Piccini. 2004, p.49)
Esta situação descrita acima também viabilzou que os cortiços obtivessem grande rotatividade da população e, além do carater locatário, o temporário também se enquadrou nas características desta moradia. Um exemplo desta forma de morar trata-se do cortiço que se encontrava na Rua Madre de Deus, onde se dispunham 54 quartos com no máximo 12m² e aproximadamente 200 moradores. Estes dividiam apenas dois banheiros e dispunham de alguns tanques para lavar as roupas, escovar os dentes e etc. Se não bastasse a péssima qualidade de vida proporcionada para estes habitantes, eram comuns os relatos de violências, mortes e abusos por parte do administrador deste cortiço, As políticas referentes aos cortiços apenas tiveram relevância no governo da Luiza Erundina. Estas questões serão tratadas no próximo item em Marcas Regulatórias. 2
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16. Interior de um cortiço. Foto Daniel Marenco Fonte: noticias.uol.com.br/album/110429
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Paulo Moretti, que andava armado como forma de intimidação dos moradores e, caso alguma famílias atrasasse o aluguel, a punição era a entrada no quarto e o “roubo” de itens que compensariam o valor do atraso. Devido a estes problemas que extrapolavam as questões relacionadas a péssima qualidade de vida, os moradores passaram a se organizar em reuniões e, junto com a Prefeitura, descobriram o verdadeiro dono do casarão. (Associação dos trabalhadores da Mooca, 1993, pp. 4145 ) Este foi intimado e, descobriu-se que o administrador era contratado por uma segunda hierarquia de locação. Ficou acordado que melhorias seriam feitas, não apenas na infraestrutura, mas na relação entre o administrador e os moradores. Esta situação permaneceu apenas no discurso e as reuniões ainda foram proibidas pois, achava-se que o assunto não sairia mais do estabelecimento. Porém, os moradores escreveram uma carta em junho de 1989 (Neuhold, 2009, p. 43) endereçada para Luiza Erundina então prefeita da cidade de São Paulo. As reinvindicações eram claras e simples onde, “...solicitavam recursos do Fundo de Atendimento à População Moradora em Habitações Sub-normais (FUNAPS) para desapropriar o casarão encortiçado, reconstruí-lo em regime de mutirão, transferir suas propriedade para os moradores e alojar as famílias em local adequado até o término das obras” (Neuhold, 2009, p. 44) A desapropriação ocorreu e 45 apartamentos foram construídos no lugar do casarão (Neuhold R. , 2009, p. 44). Estas reinvindicações tornaram-se cada vez mais comuns e, a partir na década de 1990, começa um processo em que os movimentos populares buscam pressionar o poder público para a moradia na região central. Este processo culminou com a ocupação de edifícios abandonados, denominados por muitos como sendo cortiços verticais – porém, não existe a principal característica dos cortiços que se refere a “habitação 35
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precária coletiva de aluguel”. Os moradores não pagam aluguel e sim, uma taxa mínima para a manutenção da limpeza que é administrada pelos próprios movimentos. A luta por moradia através das ocupações vem obtendo resultados em relação aos novos projetos e programas de moradia como será analisado adiante.
2.1. Marcos Regulatórios dos Cortiços “Os instrumentos urbanísticos promovidos e implementados nas várias administrações ao longo das últimas décadas eram baseados no conceito de que o problema dos cortiços nas áreas centrais da cidade tinha caráter temporário e poderia ser resolvido, quando fosse necessário, por meio da remoção e do reassentamento dos moradores em conjuntos habitacionais na periferia, sem haver preocupação com o fato de que essa população estava sendo afastada das oportunidades do mercado de trabalho e das áreas bem equipadas com os principais serviços e infraestrutura.” (Piccini. 2004, p.49)
De acordo com o Piccini, nunca se pensou em uma política efetiva de atuação em cortiços como leis que regularizassem o uso, criando regras que beneficiassem a população de baixa renda. As intervenções sempre apresentaram como proposta a remoção para a periferia colocando-as longe da área central, diferentemente da proposta dos cortiços. A primeira marca regulatória se deu no final do século XIX, no âmbito higienista, tendo como objetivo políticas sanitárias. O cortiço foi alvo desta política em função de ser considerado o foco de doenças e epidemias desencadeadas pela insalubridade – a falta de esgoto, água potável, iluminação e ventilação contribuíam para esta situação. Alguns autores citam que o cortiço foi escolhido como sendo o objeto a ser combatido, uma vez que o poder público sofria pressão da população de alta renda 36
17.Cortiço no Brás - 1950. Foto Peter Scheile Fonte: colecaopirellimasp.art.br/autores/192
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para expulsar a classe baixa das áreas centrais e, o discurso da política higienista foi utilizado como forma de legitimar esta expulsão (Mendes, 2011, p. 24). Com o aumento gradativo dos cortiços e a insatisfação da elite nas possíveis doenças advindas das moradias coletivas, a “Polícia Sanitária” foi colocada em prática para fiscalizar a cidade e os possíveis focos de doenças e, segundo Piccini (2004, p.28), esta polícia atuou como controladora social.
18. Propostas pioneiras de operária Fonte: BONDUKI, 2004, p.59
habitação
“Invadia-se, assim, a privacidade dos moradores para a desinfecção dos focos de epidemia, algumas vezes destruindo-se até o tugúrio, como era chamado, obrigando os moradores a se afastar para a periferia ou muitas vezes a redistribuir em cortiços no centro da cidade onde depois de um tempo reaparecia a mesma situação”. (Piccini, 2004, p. 28)
Os cortiços estavam regulamentados no Código de Posturas do Município de São Paulo de 1886 e questões como as dimensões mínimas eram estabelecidas. “A área mínima de um cômodo de cortiços deveria ser de 5,50m², com pé direito entre 4,00 e 4,50, que a cada cinco habitações deveria ser construído um poço de água e um tanque para lavar roupa e um sanitário com agua a cada duas habitações...” (Piccini, 2004, p.28) porém, isso valia apenas para cortiços regulares. Eram proibidos cortiços nas áreas comerciais e o centro de São Paulo era uma área comercial o que significa que todos os cortiços existentes nesta região estavam a margem de qualquer regra existente. É a partir da década de 20 que aparecem políticas com atuação pública iniciando com desenvolvimento do zoneamento e uso e ocupação do solo. Com isso, fica evidente que a produção de moradia ficou a cargo da iniciativa privada, culminando em uma segregação espacial e uma desigualdade social existente até os dias de hoje. 19. Relatório de exame de cortiços – 1893 Fonte: BONDUKI, 2004, p.58
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A OCUPAÇÃO DOS EDIFICIOS VAZIOS
Os programas habitacionais, como a Fundação da Casa Popular (1946), Banco Nacional de Habitação (1964)3 e as Companhias Metropolitanas de Habitação (COHAB´s) não se estendiam à população dos cortiços pois estas não tinham condições de entrar em um programa de financiamento (trabalhos informais e baixos salários). Outra questão importante é que a procura pelo cortiço se refere a área central em que se localiza e, estes programas propunham novas unidades nas áreas periféricas da cidade. (Neuhold, 2009, p. 34). O fato é que o problema do cortiço nunca foi encarado de fato até a gestão da prefeitura da Luiza Erundina (19891992). A tentativa do reconhecimento da existência desta forma de morar se deu em 1991 – dentro do período de prefeitura da Luiza Erundina - com a criação da Lei Moura n. 10.928 “definindo condições mínimas de habitabilidade para moradias em cortiços, tenta reconhecer, admitindo de forma jurídica, a existência deste tipo de moradia.” (Piccini, 2004, p. 37). Com a criação desta lei, além da regularização e da oficialização da existência de um problema que, mesmo complexo, necessita ser discutido. Condições mínimas para uma moradia digna são novamente definidas como forma de impedir a insalubridade. E, segundo Puccini (2004, p.37), questões como a segurança do imóvel, instalações hidráulicas e elétricas, ventilação e iluminação mínimas e adensamento máximo de 2 pessoas a cada 8m² são tratadas no corpo desta lei. A criação desta foi de suma importância para a regularização, principalmente para a abertura do diálogo sobre esta complexa forma de morar. O problema é que cada vez mais as regras dos códigos de obras impediam este tipo de moradia, privilegiando a moradia isolada. Esta BNH: Financiou 4,8% de novas unidades entre 1964 – 1986. E foi desenvolvido com o intuito de atender a população com a renda mais baixa. Quanto a produção, foram responsáveis por 25% das novas moradias produzidas porém, apenas 20% destinada a população de baixa renda. (MENDES, 2011) 3
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20.Umidade do cortiço. Foto Fabio Knoll Fonte: Por dentro dos Cortiços
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postura se refere ao desejo público de “expulsar a população marginalizada, das favelas e cortiços do centro da cidade, para áreas circundantes, se não diretamente para a periferia, cada vez que se torna necessário requalificar uma área para operações imobiliárias”. (Puccini, 2004, p.39) O maior avanço na discussão deste problema se deu no âmbito da necessidade da permanência das famílias no imóvel e não do despejo para as áreas periféricas da cidade de São Paulo. O problema é que esta intenção acaba por lidar com questões pontuais, ficando a desejar a definição de uma real política pública de intervenção de cortiços. Mesmo que programas sejam desenvolvidos, a maior questão se refere ao fato de não existir financiamento de cortiços, pois é necessário primeiro lidar com a questão da propriedade e da clandestinidade para depois investir em programas que melhorem a qualidade de vida da população que reside nestes locais (Mendes, 2011). Em 1995, a Secretaria da Justiça articula o Fórum das Cidades. As propostas discutidas na ocasião deram origem ao PAC - Programa de Atuação em Cortiços. O financiamento para este programa era do BID Banco Interamericano de Desenvolvimento - e em parceria com a CDHUCompanhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo - com contrato firmado até 2010 (Relatório Geral do Programa de Atuação em Cortiços, 2012). O PAC tem atuação direta nos cortiços e na revitalização da área central da cidade, com a premissa da não expulsão da população do lote em que reside e com a proposta de atuar diretamente na concessão de créditos e subsídios, “capazes de assegurar, de um lado, a oferta de moradia em áreas centrais para a população que hoje mora nos cortiços, e, de outro, intervir sobre a realidade dos cortiços, promovendo ou induzindo operações de renovação urbana de forma integrada” (Relatório Geral do Programa de Atuação em Cortiços, 2012, p. 3).
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No momento em que o PAC foi estruturado, no ano de 2000, a área central possuía 24 mil cortiços abrigando 160 mil famílias e 596 mil pessoas 4 – correspondente a 6% da população total 5. Número expressivo e importante para o desenvolvimento da forma de atuação do programa que, em 2011, cumpriu a sua meta de atender 2.390 famílias – 1.919 atendidas com a produção de novas unidades e 1011 por meio da carta de crédito. A intimação foi utilizada em 1.927 imóveis encortiçados e 319 foram reformados e enquadrados na Lei Moura, 678 foram erradicados e 120 tiveram o uso alterado. (Relatório Geral do Programa de Atuação em Cortiços, 2012, p. 65). O programa marcou as políticas públicas de ações em cortiços, pois realizou intervenções pontuais ao mesmo tempo em que expôs a real situação com análises e coletas de dados importantes para as futuras intervenções não apenas pontuais, porém estruturais. São estes moradores dos cortiços que são organizados por movimentos de moradia atuantes no centro e que passam a lutar por moradia digna, reivindicando seus direitos e atuando em ocupações de vazios como forma de pressão ao poder público e teto iminente para aqueles que são desalojados. Hoje, segundo o CENSO (2010), o Brasil possui 296 mil habitações coletivas e o Estado de São Paulo possui 86,5 mil moradias e, de acordo com Prefeitura Municipal de São Paulo (Cortiços, a experiência de São Paulo, 2012) entre 2005-2010 foram vistoriados 1.01 cortiços entres a região da Sé e Mooca.
Destes moradores dois terços não poderiam comprovar renda para participar de um financiamento comum e 54% ganhavam entre 1 e 3 salários mínimos – o que também dificultava a entrada em programas habitacionais. 5 Dados obtidos no SEADE – Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados 4
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21. Mapa do centro de São Paulo Fonte: Moradia é Central
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3. O Esvaziamento e os Vazios
22. Expansão da área urbanizada Fonte: RAMOS, 2009, p.28
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Com o deslocamento do eixo econômico da cidade, a partir de 1970 conforme análise do mapa ao lado (Ramos, 2009,p.28) para a região sudoeste, o centro de São Paulo sofreu um processo constante de esvaziamento (por parte das empresas, bancos, grandes comércios, etc.) e um relativo abandono por parte do Estado, desencadeando a situação que pode ser denominada por “cidade ilegal” (MARICATO, 2000). Esta se refere ao fato de que, mesmo com este deslocamento econômico, a população, principalmente de baixa renda, permaneceu trabalhando no centro e tendo como alternativa a moradia em cortiços, pensões, ocupações e outras onde a situação é precária e não cumpre qualquer legislação urbanística, comprometendo a qualidade de vida dos moradores. A popularização, a concentração de trabalhos informais/ilegais, o grande número de moradores de rua, catadores de papel, ambulantes e etc levaram a midia e a elite paulistana associar a esta região uma imagem de degradação, sujeira e periculosidade responsáveis em parte pela falta de interesse do mercado imobiliário. Ainda, foram estes mesmos adjetivos utilizados para as diferentes propostas de “revalorização” ou “revitalização” do centro (Ramos, 2009, p. 31). Para alguns dos proprietários, os edifícios estão vazios temporariamente aguardando planos de revitalização e incentivos por parte do poder público para assim, investirem em reformas de adequação. A especulação imobiliaria é justificada pela “degradação” e falta de propostas de melhorias (Ramos, 2009, p.34). No que se refere ao caso do proprietário, segundo Devecchi (2010, p.126), existem algumas opções para os imóveis vazios como, aguardar o mercado se interessar, fechar o imóvel (teoricamente sem deixar passar 2 anos para não ser enquadrado na aplicação do IPTU progressivo), reformar, modificar para atender as exigências do mercado ou demolir. De todas as opções, aguardar o mercado se interessar é o processo que vem sendo realizado pela maioria dos edifícios que estão vazios. A reforma ou 43
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a modificação apenas se apresentam interessantes quando possui alguma intenção de intervenção pública – como planos, operações, melhorias, incentivos – e com isso, viabilizando a especulação imobiliaria. O “esvaziamento” e a vacância imobiliária6 podem ser encarados como uma das consequências “...das mudanças no dinamismo da área central e, apesar de não representar uma exceção na dinâmica paulista, tem sido bastante significativa naquela região...” (Neuhold R. , 2009, p. 29). Esta situação influenciou diretamente a relação de vazios existentes no centro de São Paulo, assim como a utilização da infraestrutura existente. De dia, quando o comércio e trabalhadores estão presentes, chega a ter 400% (Neuhold R. , 2009, p. 28) a mais de circulação do que no período noturno. Um dos fatores que também contribuiu para este “esvaziamento” se refere ao fato destes edifícios não se adequarem mais às necessidades contemporâneas. “De acordo com os dados da Bolsa de Imóveis, constata-se que a região central apresenta um processo de esvaziamento por seu estoque de edilício não apresentar as características procuradas” (Devecchi, 2010, p. 127)
Esta relação de vazios existentes pode ser exemplificada com o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistca -IBGE de 2000 que aponta que a cidade de São Paulo possuia 3.554.820 domicílios e 420.327 domicílios estavam vazios. Apenas no distrito da Sé, o numero é de 40.0007 imóveis abandonados, a maioria corresponde a edifícios de escritórios (RAMOS, 2009, p.31). Estes numeros são de suma importância uma vez que ilustram a vacancia imobiliaria no centro de São Paulo, assim como a subutilização da estrutura existente pois, é cediço a oferta de transporte, creches, escolas, lazer e cultura existentes nesta região. Vacância imobiliária significa “a relação entre os espaços edificados vazios e o total de espaços edificados de uma determinada área” (RAMOS, 2009, p.31) 7 Valor referente ao ano de 2001 segundo Ramos (2009, p. 31) 6
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“Cabe enfatizar que, nesse estoque imobiliario vago ou semi-ocupado, há edifiicações que podem ser reformadas (conservando o uso original) ou recicladas ( modificando o uso original), e até mesmo demolidas para a produção de unidades habitacionias” (Neuhold , 2009, p. 28).
Segundo Bomfim (2004, p.87), 65% dos edifícios vazios na região central possuem único proprietário e, apesar da deteriorização estética podem vir a ser reciclados para a serem reutilizaçãos e, desta maneira “demostram que o problema da vacância não pode ser justificado por questões de problemas jurídicos ou de deterioração” (RAMOS, 2009, p.33). Segue abaixo mapa com relação de porcentagem com estimativa de edifícios vazios na região central de São Paulo segundo Bomfim (2004, p.69)
23. Distribuição dos vazios no centro de São Paulo em 2004 Fonte: BOMFIM, 2004, p.69)
Trazer habitação para os vazios existentes no centro é de suma importância para a democratização do espaço, assim como a diminuição 45
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do deficit habitacional (BONDUKI, 2004) existente na cidade de São Paulo, principalmente na camada mais pobre da população. Também é importante destacar o fato de que trazer a população da periferia para o centro é uma alternativa para dimunuir a intensa utilização do transporte público e aumentar a qualidade de vida da população que, deixaria de perder horas diárias de circulação assim como, impediria que a população se expandisse para areas perifericas de riscos ou de proteção de manancias como é de costume nesta expansao desordenada e ilegal. De acordo com Estatuto da Cidade, lei federal 10.257, alguns instrumentos, como a aplicação do IPTU progressivo em imóveis vazios a mais de dois anos, foram criados para evitar estes vazios, muitas vezes associados à especulação imobiliária. “Esses prédios ficam abandonados as vezes por causa de entraves jurídicos, outras por processos de herança mal resolvidos, mas, muitas vezes por pura especulação dos proprietários, à espera de uma valorização imobiliária que lhes favoreça” (FERREIRA. Cidades para quem? - 20 mil habitações no centro expandido: é possível? Parte 2 – acessado em 02/10/2013)
Apesar de diferentes políticas públicas e programas habitacionais desenvolvidos ao longo dos anos no centro da Cidade, pouco foi o resultado em relação a viabilidade da utilização destes edifícios ociosos para a reconversão em habitação, principalmente social. Isto se deve ao controle do mercado imobiliário no que se refere ao desenvolvimento do espaço e ao interesse em determinadas áreas. A existência de diferentes graus burocráticos na aquisição destes edifícios por parte do poder público também são fatores que dificultam tal processo. Vale ressaltar que mesmo com a existência de inúmeros mecanismos no Estatuto da Cidade que foram criados para facilitar estas políticas, não estão sendo utilizados de maneira recorrente (FERREIRA 2012).
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Segundo os dados do Plano Municipal de Habitação (PMH, 2010) 11.086 edificações encontram-se encortiçadas no centro de São Paulo e 42 edifícios estão ocupados por movimento de moradia (Portal da Prefeitura da Cidade de São Paulo. Prefeitura Mapeia 42 prédios ocupados no Centro – acessado em 09/08/2013). Esta é uma alternativa8 para aqueles que desejam ou necessitam morar nesta região, uma vez que a ausência de uma efetiva política pública de produção de habitação (principalmente voltada para a população que constantemente imigra para São Paulo em busca de trabalho em diferentes áreas) culminou na situação que hoje se estabelece – a ausência de moradia paradoxalmente em uma região que possui alto índice de vacância imobiliária. Estes valores referentes à quantidade de unidades encortiçadas podem vir a variar, devido à dificuldade de cadastrar os cortiços, principalmente por sua ilegalidade. De acordo com o Censo (IBGE, 2010), o Estado de São Paulo possui 1,112 milhão de domicílios vagos e, uma população de 1,127milhao de famílias sem tetos ou morando inadequadamente já no que se refere a cidade, o número de domicílios é de 3.935.645 e a quantidade de domicílios vazios na cidade é de 293.621 (IBGE, 2010) Diante deste elevado estoque de edifícios ociosos no centro de São Paulo e a falta de interesse tanto público quanto privado em destinar algum uso, é a partir de 1990 que diferentes movimentos de moradia passaram a utilizar a ocupação como forma de pressão ao poder público (Neuhold, 2009). Os movimentos de moradia atuam na ocupação destes edifícios vazios como forma de promover teto para aqueles que não têm e ao mesmo tempo pressionar o poder público tanto para a criação de unidades habitacionais quanto pela proporia denúncia da existência de vazios.
Os movimentos de moradia não ocupam os prédios apenas como alternativa de moradia emergencial mas, como forma de luta política e, este assunto será abordado no próximo capítulo. 8
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“Não existe vantagem em estarem vazios ou ocupados de maneira irregular, tornando-se ao mesmo tempo um resíduo e um perigo para a cidade, principalmente para aqueles que o ocupam “(Quintão, 2012, p. 97).
Estes edifícios precisam ser reformados e/ou reciclados com finalidade no uso da habitação social para que esta oferta de moradia na região central torne-se concreta e adequada às necessidades da sociedade e com isso o número de vazios diminua gradualmente. Os movimentos já se adiantaram. “Se a certeza do uso habitacional parece clara, resta definir o padrão de produção dessas habitações. Processos de gentrificação (?) parecem não ser ameaças no caso dos distritos Sé e República, onde a diversidade de usos parece garantir a permanência das populações menos favorecidas. Resta desenhar um programa urbano que possa equacionar todas as variáveis presentes no problema de re-ocupação da área central considerando as particularidades do estoque na área central.” (Devecchi, 2010, p. 137)
Os movimentos de moradia que a muito lutavam pela reinvindicação de moradia digna para os moradores dos cortiços perceberam nestes edifícios vazios a possibilidade da luta e reinvindicação, colocando na agenda da cidade e nas discussões sobre o destino destes edifícios a viabilidade da reciclagem como forma de promover habitação popular. Segundo o PMH (2009) o déficit habitacional da cidade de São Paulo é de 227 mil domicílios e o número de domicílios vazios na cidade é de 293.621 (IBGE, 2010). De acordo com os dados apresentados é de suma importância que politicas publicas intervenham nestes valores na medida em que os movimentos de moradia demostraram ao longo de anos que é possível viver nestes edifícios. A reinvindicação a partir da ocupação dos vazios apenas tornou-se possível pelo fato da existência destes. 48
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Figura 24. Janela da ocupação Prestes Maia – 2013 Fonte: Julia Murad
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25.Ocupação Tentente Pena– 2005. Foto Antonio Brasiliano Fonte: Centro Vivo
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4. A Ocupação como Alternativa “Foi diante do elevado estoque imobiliário ocioso e das dificuldades para conseguir avançar nos debates sobre as políticas habitacionais para a população de baixa renda no centro de São Paulo que, a partir de 1997, movimentos de moradia e sem-teto passaram a utilizar a ocupação de imóveis vazios naquela região da cidade como principal estratégia de pressão.” (Neuhold, 2009, p. 41).
4.1. Os Movimentos por moradia É a partir da década de 1970 que surgem os movimentos de luta por moradia, sendo que as primeiras ocupações ocorreram na década de 1980 e, em construções abandonadas na periferia da cidade. Já no centro de São Paulo, o movimento apenas ganha espaço a partir da década de 1990 (Gohn, 1991), como será analisado adiante. Os movimentos sociais de luta por moradia se inseriram no contexto de inúmeros movimentos sociais do pós 1970 que defendiam, de modo geral, as mudanças urbanas que reivindicavam uma melhoria na qualidade de vida da população, o que incluía a luta por moradia. Neste momento, os movimentos sociais passaram a ter um caráter de sujeitos do processo de desenvolvimento das políticas públicas (Neuhold, 2009, p. 39) e é a partir deste contexto que será conduzida esta análise. Antes da década de 1970 as reinvindicações tinham como foco, principalmente, a qualidade de vida dos moradores (neste caso tinham como única opção o cortiço) e o fim do intermediário de cobrança (se estabelecia entre o locatário e o proprietário) uma vez que, normalmente, se colocava como uma pessoa violenta. Estas primeiras manifestações da população em relação aos seus direitos não eram organizadas por um movimento específico de moradia, e sim por associações de trabalhadores, pastorais, etc. (Neuhold,2009, p. 40)
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Uma das associações que se tornou importante nesta luta foi a Associação dos Trabalhadores da Região da Mooca que, além de realizar estudos9 sobre a qualidade de vida dos moradores dos cortiços, se empenhou em organizar assembleias e reuniões onde a população, em sua maioria constituída de mulheres, se encontrava para reivindicar os seus direitos. A partir de 1984, passou a ser denominada Movimento dos Quintais da Mooca (Neuhold, 2009, p. 41). As primeiras reinvindicações (que foram os primeiros passos na luta por moradia) aconteceram no ano de 1984 (Neuhold, 2009, p. 41) quando o prefeito da cidade de São Paulo era Mario Covas (1982-1986), representante do PMDB - Partido Movimento Democrático Brasileiro. Terrenos nos bairros da Mooca e Brás foram reivindicados para a construção de moradia popular. Além disso, reivindicavam o financiamento do material de construção. Vale ressaltar que funcionaria como uma autoconstrução, organizada por uma liderança e autorizada pela gestão. O problema é que tal reinvindicação não foi aceita. Desta forma, a partir deste momento, a ocupação passou a ser uma forma de pressionar o estado. “Na ausência de resposta, em maio de 1985 o movimento ocupou durante 5 dias a Secretaria do Bem Estar Social (FABESB); saiu de lá somente com a promessa do governo de disponibilizar lotes...” (Neuhold, 2009, p. 41) A lógica de ocupação em que a população de baixa renda é expulsa para a periferia, acontece desde sempre e, neste caso não foi diferente. Ela foi expulsa para terrenos afastados, na periferia, sem nenhuma estrutura, ao Vale ressaltar que estes estudos chegaram a conclusões de que o trabalhador que vivia no cortiço ganhava em média até 2 salários mínimos, era imigrante e exercia trabalho não qualificado. Dividia o banheiro com aproximadamente 15 pessoas e, perdia boa parte do tempo em filas (para usar o banheiro, a área de lavar roupas e etc.) (Neuhold, 2009, pp. 39-40) 9
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26. Porta "lacrada" de predio vazio no centro Fonte: Ramos, 2009, 130.
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mesmo tempo em que os terrenos que eles reivindicavam, ainda que permanecessem vazios, não seriam destinados à população de baixa renda, pois, não era desejado a presença desta população em tal região e, de acordo com o então Secretário da Habitação (Arnaldo Madeira) eram terrenos “file mignon” (Neuhold, 2009, p. 41) e, não poderiam ser destinado aos pobres. Quando a população é “levada” à periferia, que não conta com nenhuma “adaptação” ou “reforma” para recebê-la, a reinvindicação muda de caráter e, deixa de ser a luta por moradia e passa a ser pela infraestrutura - asfalto, ônibus, saneamento básico, creches, unidades de saúde e etc. Mesmo que morando em cortiços, havia grandes vantagens em se viver na Mooca e por isso a insistência na reinvindicação. Aceitar ir para a periferia esteve mais associada ao fato do movimento de moradia ainda não ter tanta força, do que uma desistência, conforme reforça este relato: “...nunca nos conformamos com essa segregação, esse “apartheid” que só é diferente da África do Sul porque não é só de raça mas, principalmente econômico, isto é, separa as pessoas e os bairros onde elas moram de acordo com a renda” (Associação dos Trabalhadores da Mooca, 1993).
Estas famílias que se mudaram para os bairros afastados, se organizaram para fundar o Movimento Sem-Terra da Região Leste I, que passou a reivindicar infraestrutura, ao mesmo tempo em que questionava a forma como se estabelecia a propriedade privada, através da ocupação e do questionamento. Em paralelo, o Movimento dos Quintais da Mooca passou a realizar uma série de ocupações como forma de pressão ao poder público. Uma de suas primeiras conquistas, em 1990, foi a desapropriação de dois cortiços para a execução de unidades habitacionais para a população de baixa renda. “Eram casarões encortiçados, um na Av. Celso Garcia, 849 e o outro na Rua Madre de Deus 769, Mooca” (Neuhold, 2009, p. 42). 53
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Na medida em que o grupo da Mooca passou a ganhar espaço e obter “atenção” em função das ocupações e reinvindicações, os moradores de diferentes cortiços passam a se organizar e formar diferentes grupos. Foi a partir deste momento que surgiu a necessidade da criação de um único movimento, que englobasse todos os existentes e facilitasse na articulação das ideias, uma vez que as reinvindicações estavam sempre voltadas para a melhoria da qualidade de vida e para o acesso à moradia. Foi em um dos atos envolvendo esta população que, em 15 de junho de 1991, surgiu a ULC - Unificação das Lutas de Cortiços (Bloch, 2008). As discussões se intensificaram e foi a partir deste momento que a atenção se voltou para os inúmeros edifícios vazios no centro de São Paulo, conforme relato: “Começamos a lutar por moradia, ai, nesse meio tempo a gente foi vendo que na cidade de São Paulo, principalmente no centro de São Paulo, (havia), vários prédios desocupados, ociosos, e muita gente sem moradia sendo despejada porque o preço do aluguel do cortiço é muito alto e as famílias ganhavam um salário e não podiam pagar, tinham seus filhos e não podiam pagar. Foi quando nós decidimos fazer a primeira ocupação, foi junto a ULC, foi um prédio da Secretaria da Fazenda aqui na rua do Carmo” (depoimento dado pela coordenadora do MMC – Movimento de Moradia no Centro em 2005 apud Neuhold, 2009, p. 44)
Já no mesmo ano de formação, a ULC se organizou para escrever uma carta ao poder público com a proposta de desapropriação de terrenos, prédios vazios e quarteirões inteiros de cortiços com o intuito de destinálos à população que ganhasse entre zero e cinco salários mínimos, excluída de qualquer programa de financiamento. A proposta se estendeu também para a criação de uma política específica voltada para os cortiços e para os reais problemas encontrados como a falta de salubridade, o risco iminente de incêndio e as péssimas acomodações e qualidade de vida. 54
MORAR NO CENTRO
A ULC foi de fundamental importância para a concentração dos movimentos de luta por moradia porém, com o passar dos anos, organização interna, às estratégias de luta e de negociação, às relações político-partidárias” (Neuhold, 2009, p. 45). Vale ressaltar que Neuhold (2009, p. 45) ainda comenta que ficou claro durante a entrevista realizada com membros da ULC que as questões fundamentais para a cisão do movimento estavam muito mais relacionadas ao desentendimento dos coordenadores do que a questões políticas especificamente.
29. Sede do MSTC Fonte: Tadeu Breda/ RBA
28. Passeata por luta por moradia Fonte: FLM
Esta divisão originou, em 1993, o Fórum de Cortiços e Sem Teto (em 1997 e em 1998 também se dividiram e surgiram, respectivamente o MTSTRC – Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto da Região Central e o MSTC – Movimento Sem-Teto do Centro) e, em 1997 de uma nova dissidência surge o MMC – Movimento de Moradia do Centro. Deste movimento, 150 famílias se desentenderam com a coordenação e fundaram, em 2003, o MMRC – Movimento de Moradia da Região do Centro (Neuhold, 2009, p. 46). Mesmo com tal discordância, estes movimentos estavam sempre ligados e/ou associados a entidades maiores como UMMSP - União dos Movimentos de Moradia de São Paulo ou a FLM – Frente de Luta por Moradia, entre outros. Cabe salientar que estas duas organizações surgiram também de uma dissidência. Entre 1980 e 2004 apenas existia a UMMSP (englobava grande parte dos movimentos de luta por moradia). Em função de algumas divergências internas, alguns movimentos se desligam da UMMSP e passam a formar a FLM (Neuhold, 2009, p. 47). No que se refere à efetiva ocupação, a primeira foi realizada em 1997, no casarão da Rua do Carmo. A organização partiu do ULC e contou com o apoio de 1.500 famílias. Este processo impulsionou diferentes ocupações e, segundo Neuhold (2008, p. 6), mais de 70 ocupações ocorreram entre 1997-2007 organizadas por diferentes movimentos de moradia.
27. Ocupação do FLM Fonte: FLM
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Com o passar do tempo, os movimentos começaram a se inserir na discussão da política de moradia e receberam atenção do governo, como o acordo e convênio no programa PAC – Programa de Arrendamento de Cortiço - e com parceiros não governamentais, como escritórios de arquitetura, engenharia, advocacia, etc. que, deste então, possibilitaram um suporte técnico para a existência destes movimentos. O convênio com programas governamentais foi de suma importância para a institucionalização dos movimentos e, “necessidade de constituir não apenas uma pessoa jurídica, mas de manter sede, desenvolver projetos, capturar recursos, etc.” (Neuhold, 2009, p. 50). Esta “estrutura” acabou viabilizando maior investimento de particulares e credibilidade. Porém, a relação entre as propostas feitas e o que realmente desencadeou uma mudança na política pública de moradia possui uma grande lacuna. A reivindicação foi um importante instrumento na questão habitacional, principalmente quando gerou diferentes ocupações, deixando de ter o caráter específico de abrigar as famílias, passando a ter um caráter de luta política. Esta luta se estendeu além das questões habitacionais, passando a englobar em seu discurso o direito à cidade, a reforma urbana, o morar com qualidade, negando a especulação imobiliária, ou seja, inúmeras questões que compõem uma política urbana que comtemple a população de baixa renda.
30. Ocupação no centro de São Paulo Fonte: FLM
O papel da população foi de fundamental importância, principalmente depois que esta passou a entender a sua força, a importância da união na luta por morar com qualidade, e da necessidade da pressão ao poder público para a solução do déficit10 habitacional principalmente das classes mais baixas. Segundo Ramos (2009, p.42) “A ocupação organizada pode reivindicar a correta distribuição de infraestrutura urbana”. Vale destacar que os Hoje o déficit habitacional é de 890 milhões de unidades, segundo IBGE (2010). 10
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31 Intervenção do Coletivo Elefante – 2005 Fonte: Centro Vivo
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movimentos de moradia disputam áreas consolidadas com grande potencial de lucros e por isso, grande valor simbólico. A disputa com grandes proprietários torna-se uma guerra dos lugares e, o alto valor do imóvel justifica, em alguns casos, a repressão violenta tanto no momento da reintegração de posse quanto no discurso sobre as famílias que ocupam edifícios vazios. A grande questão é que estes movimentos disputam áreas privilegiadas, dominadas por uma lógica de especulação imobiliária em que o grande dominador é o mercado imobiliário. Não obstante, são movimentos que ocupam edifícios vazios como forma de proporcionar habitação para a camada que não tem, bem como reivindicam uma política pública de qualidade. Ao mesmo tempo em que há muita infraestrutura no centro e pouco uso destinado à habitação – utilização pouco eficaz e eficiente dos investimentos – há uma ausência de infraestrutura na região da periferia. Este desequilíbrio dificulta ainda mais uma política pública voltada para a habitação social.
4.2. A Lógica de ocupação Os edifícios que passaram a serem alvos de reivindicações eram locais desocupados (alguns a mais de décadas), normalmente com dívida de impostos acumulados e eram antigos casarões, galpões industriais, hotéis e edifícios comerciais que não atendiam mais as necessidades da vida contemporânea e, por isso o abandono. A organização destas ocupações varia de acordo com a lógica de cada movimento, porém, algumas questões se mantêm comuns como a escolha da população que participará deste processo. Normalmente se referem àqueles que estão morando em cortiços e que já possuem ordem
32. Ocupação Rua Mauá 340 Fonte: FLM
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de despejo ou, que já residem em uma ocupação que recebeu a reintegração de posse (Neuhold, 2009, p. 49). Em algumas ocupações montavam-se “casas” provisórias enquanto as famílias aguardavam serem chamadas em programas habitacionais. A lógica da ocupação está atrelada à exclusão e ao abandono. A exclusão está associada à expulsão da população que não pode pagar o valor do aluguel do cortiço e o abandono se refere à falta de investimentos e o desinteresse do mercado em relação aos edifícios que fizeram história e que hoje não se adaptam mais às necessidades contemporâneas (Neuhold, 2009, p. 41). O que se torna muito importante e válido a atuação dos movimentos de luta por moradia, principalmente aqueles do centro de São Paulo, se refere ao fato de que ao mesmo tempo em que denunciam a quantidade de imóveis ociosos no centro, possibilitam a pressão ao poder público em relação à falta de moradia para a camada mais pobre da população. Vale ressaltar que as ocupações existiam antes dos relatos apresentados no item acima, como é o caso do casarão da rua Madre de Deus onde os moradores se juntaram e conseguiram entrar em um programa de reabilitação de cortiços ainda em 1990 (Neuhold, 2009, p.51). O marco do início dos movimentos em 1997 se refere ao fato de que, a partir deste momento, as ocupações passam a ser organizadas, coordenadas e com uma pauta de reinvindicações. Foi a partir deste momento que os apoiadores e até mesmo os coordenadores passaram a produzir um discurso voltado não apenas para a ocupação em si mas, principalmente, associado ao direito da população de baixa renda em fazer parte da cidade consolidada e com infraestrutura. “Enquanto ocupavam os prédios vazios, os movimentos negociavam com o poder público, reivindicavam programas habitacionais e o controle da sociedade civil sobre essas políticas. Tinham ainda o apoio de assessorias técnicas, organizações não governamentais e de universitários que realizavam
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33. Entrada da biblioteca Prestes Maia 2005 Fonte: Grupo Risco/ Eduardo Costa
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estudos sobre as políticas habitacionais e o controle social, sobre o direito à moradia e à cidade” (Neuhold, 2009, p. 51).
A grande importância dos movimentos de moradia se dá em um âmbito uma forma de pressão ao poder público, de participação nas decisões referentes à população de baixa renda e, principalmente de dar voz a esta camada da população que, além de ver um movimento lutar pelos seus direitos, tem a possibilidade de apreender quais são estes e passar a ter representatividade.
4.2. Pormenores de uma Ocupação Todas as ocupações tratadas neste trabalho estão inseridas na mesma área, a Região do Bairro da Luz, por isso possuem características semelhantes, como a mesma classe social como alvo. A ocupação também pode ser encarada como uma alternativa para morar não apenas no que se refere ao espaço físico, mas, uma nova forma de como morar. Dentro do processo de uma ocupação são diferentes a maneira como se estabelecem as relações entre os moradores – a solidariedade e o convívio coletivo são elementos intrínsecos para o sucesso de uma ocupação – incomuns em um condomínio convencional. O que se percebe é que a própria carência estrutural, como a falta de elevador, defeitos elétricos e hidráulicos, entre outras questões, forçam uma organização e uma coletividade ainda maior, produzindo uma nova consciência na população que faz parte da ocupação. Toda a estrutura gira em torno do coletivo, atrelado à necessidade da criatividade dos moradores em solucionar e criar alternativas para problemas particulares de uma ocupação. Algumas questões foram observadas ao longo dos estudos sobre as ocupações, que se repetem em quase todos os edifícios aqui tratados e que serão analisadas a seguir.
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A OCUPAÇÃO DOS EDIFICIOS VAZIOS
O papel do corredor e das escadas, por exemplo, extrapola a questão de fluxo ou de papel estrutural comum. Agregam o valor da “rua”11. Pessoas se cruzam, se encontram, permanecem e criam relação com o espaço. Em alguns casos, estes locais de convívio improvisados também viram playground das crianças. Em função das ocupações manterem a lógica de que os barracos12 devem ficar nas janelas e, assim manter a área iluminada e ventilada para os cômodos das famílias, a área de convivência é conformada pelo corredor que, quase sempre, adquire a forma de um pátio. Neste a convivência é grande. Em muitos deles, os sofás são colocados nos “corredores”13, estendendo-se as salas intimas, assim como, quase sempre, as portas se mantém abertas para esta área. Vale ressaltar que, em alguns casos, as festas de aniversários e confraternizações são realizadas nestes pátios (Ramos, 2009, p. 74). A rua também se estabelece como extensão dos barracos e ainda cria “sociabilidade com o restante da cidade” (Ramos, 2009, p. 85). É também u m local que permite experiências e relações de encontros e acontecimentos. Existe ainda uma relação interessante onde alguns moradores tiram da própria rua o seu sustento, como acontece com catadores de lixo, ambulantes, guardadores de carros. Ainda, utilizam os corredores das ocupações (que por muitas vezes assume o papel da “rua”) como área de produção de suas mercadorias (Ramos, 2009, p. 87).
34. Escada - Plinio Ramos Fonte: Grupo Risco, foto Eduardo Costa
A maioria das ocupações leva o nome da rua e isso demostra que “...a luta pela moradia é uma luta também pelo direito à cidade, pelo direito ao urbano, é uma luta pelo “teto” e pela “rua””. (Ramos, 2009, p. 93)
Conceito encontrado na tese de Ramos (2009, p. 70-89) Barraco é a denominação dada a área destinada a cada família dentro da ocupação. 13 A questão da relação dos moradores e dos corredores também é relatada em Ramos (2009, p.70-89) 11 12
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35.Apresentação de dança no Plinio Ramos Fonte: Integração sem Posse
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Esta configuração só se mantém caso haja harmonia e sintonia entre os moradores e, no caso de uma ocupação onde a coletividade é o motriz da organização, estes elementos são fundamentais. É de suma importância na organização da ocupação a definição de quais famílias ocuparão quais andares, pois, é desta forma que se iniciam as teias e relações (Affonso, 2010, p. 85). “Outro fator são as relações sociais encontradas em cada andar. Em geral os moradores do mesmo andar possuem algum laço social: são pessoas da mesma família, ou com alguma outra conexão social, como no caso de um dos andares do Ed. Prestes Maia, onde todos os moradores do andar eram imigrantes bolivianos” (Ramos, 2009, p. 77).
Esta distribuição também contribui para o acontecimento de relações sociais em cada andar. Além de manterem a proximidade física, possuem relação ou de origem ou empregatícia ou associadas a alguma característica específica. São vínculos que facilitam o andamento da ocupação e a distribuição vertical das famílias. 36. Assembleia Prestes Maia Fonte: RAMOS, 2009. 82.
37. Portaria do Prestes Maia Fonte: Grupo Risco, foto Eduardo Costa
Se pararmos para analisar o corredor, ele adquire valores de um local semi público, sendo “público para o grupo social comum ao mesmo “andar”, e caráter privado para todas as pessoas que não pertencem ao “andar” (Ramos, 2009, p. 78). Desta maneira, os limites entre público e privado se mantém difusos e, neste caso, facilitam a relação do homem e o edifício e, contrarias as relações mantidas nas propriedades convencionais onde há uma inflexibilidade de limites. Esta mesma lógica se repete em favelas ou cortiços ou em bairros de baixa renda. A ocupação por si só já é uma forma de criticar a moradia clássica. Ainda, coloca outras questões fundamentais como a possibilidade de criar as próprias regras, a autogestão – principalmente porque as decisões ficam a cargo dos moradores – e, principalmente, o poder político que uma ocupação tem na discussão sobre habitação social. 61
A OCUPAÇÃO DOS EDIFICIOS VAZIOS
O próprio morador “sai do papel de explorado e pagador de aluguel de propriedade alheia, para um sujeito parte do processo decisório da gestão do seu espaço de convívio e moradia” (Ramos, 2009, p. 79) e, desta maneira, ganha espaço, ganha voz e, se envolve em uma causa que também faz parte da sua vida. Diferentes pessoas se unem para construir coletivamente o espaço não vazio. Segue abaixo, relato apresentado por Ramos (2009, p.80) referente a como Jornarina Pires Fonseca percebe a ocupação. É uma das coordenadores dos 22 andares ocupados do Edifício Prestes Maia: “Tem gente, ai a gente pensa assim né, ai vamos pra bolsa aluguel, vamos, cada um vai ter sua pia dentro de casa, seu banheiro dentro de casa, mas isso ai também a gente até se preocupa, nossa, a gente vai até sentir falta da área comunitária, tenho certeza, porque hoje em dia eu falo assim não consigo mais viver assim sozinha né, por isso que a minha vida é bem agitada, to aqui em baixo, to lá em cima, desço, subo, sai né. Eu não consigo mais, se for pra mim alugar, pegar a minha bolsa aluguel e lugar um lugar sozinha, uma casa sozinha, eu acho que eu não consigo. E a maior parte das pessoas não consegue mesmo ...todo mundo vai sentir falta disso, de viver na comunidade” (Ramos, 2009, p. 80).
No caso de algumas ocupações, as famílias se acostumam a esta nova forma de morar e não se veem mais morando sozinhas ou em edifícios cujas plantas são convencionais. No caso do Edifício Prestes Maia, passeios e excursões são feitas para a Pinacoteca, comitivas são feitas para levar as crianças nas escolas e, estes pormenores deixariam de existir em outro lugar. (Ramos, 2009, p. 80) A população aos poucos aprende a viver em comunidade e passa a se informar, se politizar, aprende o poder da reinvindicação e passa a ter noções dos seus direitos mínimos.
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MORAR NO CENTRO
A ocupação passa a ter um caráter de organização e de formação política pois, é dentro das ocupações que os moradores aprendem e ganham interesse pela política. Não é apenas uma questão de moradia mas, uma questão de política pública. Quando a ocupação é liderada por algum movimento de moradia, a formação do morador é parte integrante do processo de ocupação. Esta formação se refere a alfabetização, reforço escolar, cursos e livros a nas assembleias onde se discute o futuro das suas respectivas famílias. “Neste caso, a carência por moradia funciona em primeira instância como núcleo articulador para, nas outras atividades cotidianas, resultar numa indagação sobre sua condição dentro do sistema capitalista” (Ramos, 2009, p. 83).
Uma das dificuldades dos movimentos é manter a formação da população e não apenas a ocupação por si só. Esta formação ajuda na gestão coletiva do espaço, no envolvimento e na reinvindicação de cada membro da ocupação, extrapolando a relação inicial de buscar moradia digna e sim, “modificando de fato sua maneira de ver a si mesmo e a sociedade em que está inserido” (Ramos, 2009, p. 84) No que se refere a portaria também existem pormenores interessantes onde se estabelece a relação entre o prédio e a cidade e, automaticamente, se transforma em um local de espera, conversa e encontros. A fachada do prédio funciona como uma vitrine que apresenta a ocupação e a causa pela luta por moradia a sociedade. Os edifícios ocupados que possuem lojas ou comércio voltados para a rua, normalmente não são coordenados por um movimento pois, este acredita que a “rentabilidade” através de lojas, bares e comercio em geral enfraquece o movimento (Ramos, 2009, p. 84).
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A OCUPAÇÃO DOS EDIFICIOS VAZIOS
4.3. Edifícios Ocupados Os edifícios que serão tratados abaixo são de grande importância no processo de ocupação e de visibilidade dos movimentos, assim como de grande importância para a discussão sobre o direito à moradia. Cabe ressaltar que estão localizados em uma área de grande especulação imobiliária, o que explica as “brigas” por reintegração de posse que, por muitas vezes, coincidem com as épocas de intervenções de revalorização da área (Ramos, 2009, p. 45). A escolha destes está associada à importância que possuem na luta por uma política habitacional voltada para a população de baixa renda, associado ao fato de que cada um deles foi ocupado de diferentes maneiras. O edifício Plinio Ramos foi organizado pelo Movimento de Moradia da Região do Centro (MMRC). Já o edifício Paula Souza funcionou como autogestão coletiva. Desta forma, um panorama geral será apresentado antes da análise do objeto principal deste estudo, que é o edifício Prestes Maia.
4.3.1. Edifício Plínio Ramos O edifício Plinio Ramos está localizado na rua de mesmo nome, n° 112. Estava abandonado a mais de 10 anos quando foi ocupado, no início de 2003 por 80 famílias, que se distribuíram em 5 pavimentos, coordenadas pelo Movimento de Moradia da Região do Centro (MMRC). A ocupação durou dois anos e oito meses e, em agosto de 2005 foi executada a ordem de reintegração de posse, sob a ação da ação da Tropa de Choque (D'Angelis, Ramos, Higuchi, , & Terra, 2013). O coordenador desta ocupação era Nelson da Cruz Souza, que resistiu a reintegração de posse e foi preso por formação de quadrilha. Construído na década de 1970 para fins comerciais, limítrofe à linha do trem e, por este motivo, desvalorizado deste a sua execução – alto ruído 38. Prédios da Rua Plínio Ramos Fonte: Centro Vivo/Henrique Para
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produzido pela ferrovia. De acordo com as mudanças no centro de São Paulo, os edifícios que não suportaram ser readaptados para os diferentes usos necessários hoje, permaneceram vazios, como é o caso deste edifício. Durante os dez anos que permaneceu vazio, foi depósito de materiais reciclados e de carrinhos de catadores. Foi uma das ocupações mais importantes devido ao tempo em que resistiu. Em função disto, possibilitou um grande envolvimento das famílias, que lutavam não apenas por um teto (espaço físico), mas, para reivindicar e protestar por uma política pública. Na época da ocupação as famílias filiadas (cerca de 2500 famílias) ao movimento e, que moravam na ocupação, doavam de um a dois reais para ajudar na manutenção da ocupação e do movimento como um todo (Ramos, 2009, p. 46). Esta forma também era uma das técnicas utilizadas pelo movimento para manter as famílias envolvidas nas discussões que extrapolavam o edifício Plinio Ramos. 39. Severino no Ateliê de Costura - Plínio Ramos Fonte: Integração sem Posse / Antônio Brasiliano
40. Sala de reuniões - Plínio Ramos Fonte: Integração sem Posse/Antônio Brasiliano
Vale ressaltar que não apenas esta, mas todas as ocupações, para obterem sucesso precisam ser organizadas antes, durante e depois. É de suma importância a organização e a participação das famílias. Quanto maior a união, melhor a organização da ocupação, como dito anteriormente. Neste caso, cada andar possuía uma tabela com as tarefas referentes a cada morador. A divisão era feita de tal maneira que cada um era responsável pela limpeza das áreas comuns de um andar todos os dias. Desta forma, todos se mantinham envolvidos com a limpeza e organização do andar em que residia. Este modo de organizar a limpeza e a retirada do lixo também era considerado estratégia dos movimentos em geral, de modo que aumentavam o envolvimento das famílias com o espaço e com as outras famílias do mesmo andar (Affonso, 2010, p. 76). 65
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Assim como em outras ocupações, as assembleias são reuniões corriqueiras. Sempre possuem um caráter democrático e são obrigatórias para os moradores. Nestas reuniões, decisões importantes são tomadas e a opinião de todos é considerada na hora das decisões. Todas as ocupações destinam um espaço dentro do edifício ocupado para estas reuniões (Ramos, 2009, p. 47). Alguns elementos são característicos de cada ocupação e, neste caso, hortas verticais com garrafas pet foram desenvolvidas para a utilização de todas as pessoas. Outra curiosidade desta ocupação, e que mostra o quanto a relação das famílias é importante para seu êxito é que algumas pessoas ganharam destaque entre as quase 2000 mil. Uma era a cozinheira, a “Pequena” que em dias de festas e assembleias cozinhava para todos. Utilizou seus conhecimentos laboratoriais em química para desenvolver shampoos, condicionador, sabonetes e outros produtos para todas as famílias (Ramos, 2009, p. 47). Assim como em outras ocupações a denominação da área destinada para cada família é de “barraco” – nada mais é do que a casa de cada um dentro de uma ocupação. Normalmente um cômodo do edifício é adaptado para ser subdividido em todos os cômodos secos que a família precisa. É a junção do conceito do barraco da favela e das casas provisórias do Movimento Sem Teto (MST). Possuem o mesmo caráter efêmero e transitório.
41.Policias jogam spray de pimenta na Reintegração de Posse Fonte: Centro Vivo / Isadora Lins
42. Policiais sem identificação durante despejo da ocupação Plinio Ramos Fonte: Centro Vivo / Isadora Lins
O banheiro, a cozinha e a lavandeira são comuns a todos da ocupação e, normalmente estão localizados em cada andar. Neste caso, são diferentes da lógica de ocupação dos cortiços que improvisam a cozinha dentro dos ambientes de quarto e sala e, por isso, tornam a moradia com alto risco, além disso, não mantém o espirito de coletivo, diminuindo a limpeza e o envolvimento com os “vizinhos” locais. Alguns ambientes da ocupação também são particulares e se estabelecem de acordo com o projeto original do edifício. Neste caso, um ateliê de costura coletivo, sala de administração, sala de reuniões, de 66
43. Móveis dos moradores despejados Fonte: Centro Vivo/Isadora Lins
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cursos de reforço escolar, de alfabetização de adultos e salas de aulas eram oferecidos não apenas para os moradores da ocupação, mas de toda a região. Estas questões são importantes, pois é necessário que os movimentos se preocupem também com a população do entorno e permitam que o edifício se abra para a rua. Segue abaixo desenho das plantas do Plinio Ramos sendo, no momento da violenta reintegração de posse era de 79 famílias que resistiram 2 anos e 8 meses (Ramos, 2009, p.48) 44. Acampamento na Rua Plínio Ramos, armado após o despejo, diante do prédio vazio e lacrado | 2005 Fonte: Centro Vivo/ Mariana Cavalcante
45.Planta da ocupação do Plínio Ramos Fonte: RAMOS, 2009, 48.
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4.2.2. Edifício Paula Souza Projetado em 1955 por Rino Levi, originalmente nomeado de Ed. Concordia – Localizado na Rua Paula Souza 365 -, é de grande importância arquitetônica, principalmente pela fachada composta por brise-soleil. Inicialmente construído para abrigar a parte administrativa da empresa Concordia, no térreo possuía lojas, no 1° pavimento estacionamentos e, nos outros três andares escritórios. Atualmente, o proprietário é a Transbrasil S.A. (Ramos, 2009, p. 60) Diferentemente da ocupação do Plinio Ramos, esta não foi coordenada por nenhum movimento de moradia e os moradores se organizaram para autogestão. A ocupação efetiva ocorreu em 11 de novembro de 2003, e a reintegração de posse no dia 06 de outubro de 2005: “como as famílias não puderam negociar com o governo, acamparam na própria rua Paula Souza, onde também se encontravam remanescentes da ocupação vizinha, o edifício Plinio Ramos” (D'Angelis, Ramos, Higuchi & Terra, 2013). Vale ressaltar que o prédio permanecia vazio há apenas dois anos.
46. Ocupação Paula Souza – 2005 Fonte: Centro Vivo / Tranca Rua
O fato de ser autogestora, algumas coisas mudam na organização interna com a necessidade da união entre as famílias e da capacidade destas de se organizarem sem que alguém determinasse as regras. Os próprios moradores se organizavam para revezar na limpeza, portaria e a manutenção do próprio prédio (Ramos, 2009, p. 61). No que se refere à configuração espacial, o primeiro andar do prédio, que antes era ocupado por um estacionamento, deu lugar a uma mercearia e a um bar, tornando–se um local de encontro tanto de moradores quanto de pessoas do entorno. O problema é que isso dificultava um pouco o controle de entrada e saída e, o próprio uso do bar também foi bastante criticado segundo artigo do Vitruvius (D'Angelis, Ramos, Higuchi & Terra, 2013). Quanto à disposição, o prédio possui a planta livre – baseada na arquitetura moderna- e, devido a isso, a ocupação foi feita aproveitando 68
47. Varanda utilizada com varal Fonte: Grupo Risco/Eduardo Costa
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as janelas e usando a lógica do pátio central como área de convivência e extensão dos barracos. De acordo com a planta original e a quantidade de banheiros existentes na planta tipo, alguns barracos possuíam banheiros próprios. A varanda, original do prédio, ficou livre e destinada a uso comum para secar roupas, guardar bicicletas e etc. No que se refere aos dados da ocupação foram, 70 famílias e 350 pessoas. (Ramos, 2009, pp. 61-62) 49. Planta da ocupação Paula Souza Fonte: RAMOS, 2009, p.61
Segue abaixo planta da ocupação.
50. Planta da ocupação Paula Souza Fonte: RAMOS, 2009, p.61.
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51. Janela da ocupação Prestes Maia. Foto Júlio Bittencourt Fonte: http:/misturaurbana.com/2011/04/
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5. O Edifício Prestes Maia A escolha deste edifício para análise do processo se deu pelo fato dele ter passado, desde a negociação da aquisição, por diferentes momentos, o que permite a avaliação dos mecanismos, processos e viabilidade da reconversão, da ocupação; o número de famílias, a estrutura organizacional e a forma adequada de intervenção para a melhoria da qualidade de vida, bem como o processo de como estas famílias se relacionam com a demanda por trabalho, lazer e cultura na área em que estão inseridas.
5.1. O Edifício e o Processo de Ocupação O edifício Prestes Maia foi construído para ser a sede de uma fábrica de tecidos, que o manteve em funcionamento até 1978 quando se mudou para o interior, em função da descentralização industrial na cidade de São Paulo. A única memória deixada pela fábrica se refere ao letreiro de entrada: “Companhia Nacional de Tecidos”. Este passa a ser propriedade do Banco Citibank S.A. que o mantém vazio. Rapidamente passa a ser um local de ponto de uso de drogas e de moradia para alguns moradores de rua (Ramos, 2009, p. 50). Durante algum período foi utilizado pela Secretaria das Finanças do Estado de São Paulo. E, num leilão foi adquirido pelo empresário Jorge Hamuche. Porém, só passou a ter um uso quando, em 3 de novembro de 2002, foi ocupado por famílias lideradas pelo MSTC (Affonso, 2010, p. 81). O MSTC optou pelo edifício em questão, entre inúmeros edifícios vazios no Centro de São Paulo, em função de sua dívida de 5 milhões de reais (Ramos, 2009, p. 51) referente ao IPTU do imóvel. Entendia-se que, por
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esta razão, a negociação seria mais razoável, o que não aconteceu como será observado adiante. O interesse do MSTC pelo edifício se deu em meados da década de 90 e, entre este período e a efetiva ocupação, houve, em 1999, um período de negociação com os proprietários – Jorge Hamuche e Eduardo Amorim intermediado pela Prefeitura do Município de São Paulo. O objetivo da negociação era que a Prefeitura adquirisse o edifício e o destinasse à população de baixa renda que, no caso, se referia as famílias cadastradas no MSTC. O maior problema se deu pelo fato dos proprietários não quererem vender o edifício pelo valor da diferença entre a dívida e o valor real do edifico que era de R$ 7 milhões, sendo que receberiam apenas R$ 2 milhões (Affonso, 2010, p. 80). O próprio movimento tem por objetivo que a ocupação só se dá efetivamente quando a situação do imóvel é levantada e levada à mesa de negociação (Aquino, 2008) e, “com isso compreendemos que o ato da ocupação não é o primeiro recurso por parte dos movimentos para a obtenção de prédios que possam ser reformados e transformados em moradias populares, e, sim, a estratégia usada quando não há mais recursos por meio de negociação deliberada” (Affonso, 2010, p. 81). Decidido que a ocupação seria a única opção – não se referia apenas a destinar teto a algumas famílias, mas como forma de protesto político - o MSTC passa a decidir entre as 7.000 famílias cadastradas, quais iriam para o Prestes Maia. Vale ressaltar que todas as famílias cadastradas contribuíam, por ocasião da ocupação, com a quantia que variava entre um e dois reais para o caixa do MSTC (Ramos, 2009, p. 53).
52. Intervenção na ocupação Fonte: Centro Vivo/Antônio Basiliano
5.2. A Ocupação Em 3 de novembro de 2002, às 01:45 h da madrugada, o edifício foi ocupado pela Rua Brigadeiro Tobias. A quantidade de entulho, de lixo, de 72
53.Entrada da ocupação Prestes Maia Fonte; Centro Vivo / Antônio Brasiliano
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ratos, insetos e esgoto represado encontrado forçou as famílias a trabalharem pesado na limpeza do edifício e se concentraram nos primeiros andares onde uma cozinha comunitária e um banheiro foram improvisados. Cerca de 200 caminhões de lixo e entulhos foram tirados durante a madrugada. (Ramos, 2009, p. 54). As famílias só puderam ocupar os andares superiores quando a caixa d’agua foi instalada no topo do edifício e “até a distribuição de agua e luz se concretizar, algumas famílias ficaram na ocupação Plinio Ramos, coordenada pelo MMRC, o que também nos demostra o fluxo entre os movimentos e a cooperação entre eles” (Affonso, 2010, p. 84). Um item curioso, segundo Ramos (2009 p.52): o morador Severiano Manuel de Souza, responsável pela criação e manutenção da Biblioteca Popular Prestes Maia, localizada no local onde originalmente seria o estacionamento, foi o responsável, durante o processo de reforma para a acomodação das famílias, pela reestruturação elétrica dos quadros de luz que ficou a seu encargo justamente pelo fato de ter trabalhado no edifício, quando ele ainda era uma fábrica, como técnico elétrico do prédio. No que se refere à ocupação, são diferentes as informações de número de famílias que residiam no edifício, segundo as distintas fontes, mesmo porque, este valor era rotativo. Porém, no momento da reintegração de posse, que será descrito mais adiante, o número eram 468 famílias sendo, que cada uma delas “possuía” um barraco com aproximadamente 10m² - análise feita a partir dos desenhos das plantas em Ramos, (2009, p.55), sendo o total, 1.630 pessoas (Dossie de Centro Vivo , 2006, p. 70). Na estrutura da ocupação, em função da própria planta original, cada andar possuía uma lavanderia e banheiros coletivos – esta estrutura não se mantém padrão em todas as ocupações, pois variam de acordo com a planta de cada edifício. Cada família pagava uma taxa condominial de 54. Vista geral do edifício Fonte: Centro Vivo
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vinte reais14 (Ramos, 2009, p. 53). A coletividade dominava o ambiente e por este motivo, a ocupação foi exemplo por muitos anos. A divisão por andares foi realizada com base nos laços de parentescos ou origem dos ocupantes. Na estruturação vertical, nos andares mais baixos ficavam os mais idosos ou, as famílias com mais tempo de cadastro no movimento. O edifício possuía vinte e três andares e o elevador estava desativado. Desta maneira, sempre que uma pessoa e/ou família era incluída na ocupação, era locada nos andares superiores e, conforme o tempo e o desempenho, iria se mudando para os andares mais baixos. A simples tarefa de subir com compras diárias, tornava-se um fardo para quem morava no 23°andar.15 Assim como em outras ocupações, os moradores se distribuíam ao longo das janelas, deixando o miolo livre, como se fosse uma praça ou um pátio central. É nesta área que os encontros e as reuniões diárias aconteciam. Como os barracos possuíam dimensão mínimas – cerca de 10m² para cada família (Ramos, 2009, p. 54) – o corredor funcionava como uma extensão dos aproximadamente 14 barracos por andar. A lavanderia e o banheiro se distribuíam por andar. No caso do banheiro, dividido entre feminino e masculino. A própria configuração do prédio é particular e complexa. Possui duas portarias e dois blocos, sendo que o bloco da Rua Brigadeiro Tobias possui nove andares e o bloco da Av. prestes Maia, possui 23 andares (Ramos, 2009, p. 54).
55.Lavanderia coletiva Fonte: RAMOS, 2009, p.49
O subsolo, que originalmente era um estacionamento, durante a ocupação permaneceu como o local de reuniões, assembleias e cursos, Já em Affonso (2010, p. 85) o valor da taxa de condomínio é descrita como sendo de R$ 50,00 – cinquenta reais e, isso pode estar associado a diferença do ano da pesquisa. 15 Devido a isso, surgiu uma profissão na ocupação que seria do carregador de andares. Moradores cobrariam de 20 a 30 reais para subir os 23 andares carregando objetos, móveis, compras, galões de agua e botijão de gás. (Ramos, 2009, p. 53) 14
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56. Salão central como área comum - sofas e convivência Fonte: Grupo Risco / Eduardo Costa
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oferecidos tanto para moradores quanto para a população da região. Além disso, também era destinado ao estacionamento de carrinhos de catadores e da área de separação do material reciclado. Assim como funcionava na própria estrutura do MSTC, todas as decisões referentes ao edifício eram tomadas em assembleias coletivas e cada morador possuía a sua função. No caso especifico da ocupação Prestes Maia, cada andar possuía um coordenador e o prédio todo possuía um coordenador geral. Toda a limpeza16 era de responsabilidade dos moradores e uma escala de revezamento foi definida entre os moradores. Igualmente, a responsabilidade da portaria também entra em rodízio (Ramos, 2009, p. 55) Algumas regras são básicas de todas as ocupações como o horário de chegada. A portaria encerra entre 22 horas e 6 horas da manhã. Desta maneira, ninguém pode entrar neste horário. Sair é permitido, mas o retorno só poderá ser a partir das 6 da manhã do dia seguinte. Caso alguém seja pego usando drogas ou com porte de arma, independentemente do motivo, a pena é a expulsão da ocupação. Em alguns casos, como o não cumprimento da escala de limpeza, uma multa é aplicada, mas para casos mais graves, a expulsão é a única saída. 57. Assembleia no salão comum Fonte: Grupo Risco/Eduardo Costa
Os inúmeros colaboradores, sendo eles voluntários, estudantes, artistas e etc. foram responsáveis também pela visibilidade que o movimento e a ocupação tiveram. Alguns moradores chegaram a reclamar da quantidade de pessoas diferentes circulando o edifício, principalmente quando parte da Bienal de Cuba se instalou dentro do edifício ocupado. Porém, vale ressaltar que esta visibilidade ajudou a prolongar em dois anos a ordem
A limpeza se tornou o principal símbolo da luta do próprio movimento, “diziam ser a demonstração da organização e da capacidade de ocuparem adequadamente uma região valorizada e a construção da própria dignidade. Era inclusive proibido pendurara roupas para secar nas janelas e um varal improvisado foi erguido na área comum de cada andar” (Affonso, 2010, p. 86) 16
58. Identificação do 14°andar Fonte: Grupo Risco / Eduardo Costa
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de despejo. A reintegração de posse saiu em maio de 2007 e as famílias apenas deixaram o edifício em 15 de julho de 2007 (Affonso, 2010, p. 118), depois de muitos processos para impedir a reintegração de posse. “A ocupação se tornou um símbolo de resistência e organização: foi considerada a maior ocupação vertical da América Latina...” (Ramos, 2009, p. 51)
5.3. A Reintegração de Posse “Madrugada. Poucos carros insistem na avenida. A líder sem teto não prega o olho. Será hoje o despejo? Em suas pálpebras pesam três mil vidas saídas de cortiços, favelas, praças públicas, viadutos… Quanta promessa foi feita para que essa gente toda se aventurasse na peleja infame em busca de teto? No reflexo da janela o olho esbugalhado vê as caras-daspessoas:.. dona Romilda cozinheira...dona Idalina na costura...Manoel linha de frente...O vidro lhe espelha as caras todas e todas elas lhe exigem respostas. Mas não há respostas. Sabe só que a liminar despachada pelo juiz da 25° vara anuncia a reintegração de posse e despejo para hoje…Insônia...” (Affonso, 2010, p. 117)
No período em que se estendeu as relações que culminaram na reintegração de posse, o prefeito da cidade de São Paulo era Gilberto Kassab (2006-2008) que neste período estava substituindo o prefeito eleito em 2004, José Serra. O secretário da Habitação, Orlando de Almeida Filho, defendia a ideia de que o centro deveria ser ocupado pela classe média e, se colocava contra as ocupações da classe de baixa renda. Com estas declarações, associadas a da decisão do Juiz a favor da reintegração de posse, as “relações... de negociações e diálogos com o Grupo Prestes Maia estavam estremecidas” (Affonso, 2010, p. 118).
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A partir do momento em que a reintegração de posse foi anunciada, em dezembro de 2006, “os moradores do Prestes entraram em pânico diante da iminente ameaça de despejo” e, devido a esta situação tensa, que durou até fevereiro de 2007 (quando conseguiram um prazo maior para a desocupação que ocorre de fato em 15 de julho de 2007), rodízios de vigias noturnos e intensas reuniões para encontrar soluções e estratégias para a situação foram cenários comuns do edifício. (Affonso, 2010, p. 118) O anúncio da reintegração de posse foi feito por um policial, no dia 11 de dezembro de 2006, que declarou as seguintes palavras: “Foi favorável ao proprietário a desapropriação. Então isto é fato consumado, não dá para fugir disto, vocês só têm duas saídas: Ou sai ou sai! Nós temos que cumprir a determinação do juiz e estamos aqui reunindo os órgãos envolvidos para que isto ocorra da forma menos traumática possível (....) O problema é entre vocês, o dono do prédio, que pediu a reintegração, e nós”17
Durante a gravação, a Sra. Ana Maria, assistente social, afirma que o governo não teria condições de dar o bolsa aluguel de R$ 250,00 para todas as famílias que, naquele momento, seriam 429 famílias e 1037 pessoas. O clima da reunião foi extremamente tenso. Após o policial afirmar que tinha ciência que os moradores estavam se armando (com gasolina e cocos-da-baía) para receber os policias e um morador afirmar que só tinha pai de família na ocupação, o policial finalizou dizendo que iria se preparar para o pior. Os policiais informaram ao Juiz Carlos Eduardo Fontacine que o confronto seria perigoso e trágico pois haviam muitas crianças, idosos e Esta declaração foi filmada e está disponível em http://www.youtube.com/watch?v=C2qTWnIDm2U – acessão em 10 de maio de 2013. 17
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mulheres grávidas na ocupação. Porém, a decisão não foi alterada e em 8 de fevereiro de 2007 o mesmo major presente na reunião anterior foi até o edifício para novamente conversar com as famílias e explicar a necessidade de saírem: “Vocês tem 15 dias, vocês tem crianças, vocês tem idosos, vocês tem mulheres grávidas (...) E vocês já estão sabendo do que está acontecendo, não vão dizer depois que não estavam sabendo, daqui há 15 dias vai acontecer e este desgaste poderia ser evitado. A questão é: Vai sair. Ponto, não tem jeito, não depende de mim, eu só cumpro” (Affonso, 2010, p. 120)
Alguns moradores se pronunciaram e o sentimento comum era de que os moradores haviam perdido e não tinha nenhuma alternativa, a não ser que quisessem enfrentar os policiais, mas esta não era a ideia. Uma das moradoras ainda afirma “…não vamos entrar numa guerra porque nós somos trabalhadores, nós não somos bandidos. Não nos cabe o papel de brigar com a polícia. O que nós queremos é que quando vocês conseguirem entrar lembrem que nós somos trabalhadores que não temos aonde morar e que não haja violência desnecessária” (Affonso, 2010, p. 121). De acordo com o comentário da moradora e com o episódio em si, fica claro que não existia a possibilidade de negociação e mesmo com a conversa, os moradores não sairiam amigavelmente. A única opção foi o acampamento em frente à Prefeitura de São Paulo entre os dias 6 e 22 de fevereiro. Mesmo com todos estes pormenores, o Juiz decretou para o dia 25 de fevereiro a reintegração de posse forçada e, diante deste conflito, o então prefeito de São Paulo nomeia o senhor Walter Abraão
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Filho18 como mediador para tentar retomar o diálogo (Affonso, 2010, p. 122). Esse mediador teve fundamental importância na forma como a reintegração de posse aconteceu, conforme relata um morador: “... Ele é um dos responsáveis naquela negociação do Prestes Maia, porque se fosse o Orlando não tinha acontecido. O Kassab estava num momento difícil, que foi a época que ele chamou um trabalhador de vagabundo. Ele foi dialogando com todo mundo até a eleição do Kassab, ele diminuiu o atrito com o poder público, a ponto do Kassab ir lá dentro da Prestes Maia” (Affonso, 2010, p. 122).
O próprio juiz decretou que ficaria suspensa por 60 dias a decisão para que se tentasse uma negociação amigável. Diferentes reportagens saíram na mídia em geral, mostrando como o diálogo era bom e assim, levantar a imagem do Kassab. Porém, também permitiu que artistas e colaboradores divulgassem informações sobre a ocupação, ajudando assim a pressionar e viabilizar um possível novo acordo. Zé Celso (diretor do Teatro Oficina) e o senador Eduardo Suplicy, entre outras pessoas de apelo popular, visitaram19 a ocupação e tornaram-se pessoas importantes e articuladas a favor da causa. Foram constantes as notas e manifestações divulgadas a favor da ocupação. Vale ressaltar que Aziz Ab’Saber, Maria Rita Kehl e Pádua Fernandes escreveram um texto de grande apelo que foi muito divulgado no meio acadêmico. Intitulado “Revitalizar sem segregar: o direito à cidade”, divulgado em 12 de abril de 2007, representou um apelo Não possuía grande experiência neste assunto sendo, o maior contato com este tema foi na época em que era gerente da COHAB. Havia trabalhado com o Kassab a mais de 10 anos e, hoje estava ocupando o cargo de subprefeito da Casa Verde (Affonso, 2010, p. 122). 19 “Ocupações Prestes Maia tem semana decisiva em São Paulo” Carta Maior 21.02.2007 – Antonio Biondi 18
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fundamentalmente dirigido ao prefeito Gilberto Kassab, e alegava a necessidade da regularização da ocupação como forma de resolver o problema do despejo, a fim de não levar quase 2000 mil pessoas para rua e ainda, permitir a extensão desta experiência, que é a organização impecável da ocupação. Todas as mídias sempre comentam da importância da biblioteca Prestes Maia e seu acervo de quase 15 mil exemplares. Devido a toda esta exposição, a desocupação só começou em maio de 2007, de forma pacífica, após o acordo feito com algumas famílias que foram encaminhadas para Itaquera, no conjunto Jose Bonifácio H1 e H2, da CDHU. Somente no dia 15 de junho de 2007 o edifício foi entregue (Affonso, 2010, p. 126). Esta situação só foi possível devido ao apoio popular e ao Termo de Cooperação entre os diferentes níveis de governo. Assim, após 5 anos de ocupação, o edifício foi desocupado. Das 468 famílias, 178 aceitaram ser atendidas pela CDHU e foram transferidas para Itaquera, como dito acima. As restantes (cerca de 330) ficaram no centro e passaram a receber R$ 300,00 por mês (bolsa aluguel?) pelo período de seis meses. Com a verba destinada pela Secretaria Nacional de Habitação e o Ministério das Cidades a proposta é que a prefeitura compre um dos edifícios indicados pelo MSTC e o destine a população do Prestes Maia (Affonso, 2010, p. 127).
59. Reintegração de Posse Fonte: Centro vivo / Antônio Basiliano
A organização das famílias e o cadastro destas foram feitos pelo próprio Walter Abraão que acompanhou de perto as mudanças. Organizou os caminhões de mudança, fez a escolta e, ele mesmo afirma que “protegeu as pessoas do Prestes Maia da sociedade” (Affonso, 2010, p. 131). Também se manteve envolvido no desfecho das famílias: como as cartas de credito foram distribuídas e para onde cada família foi relocada. Alguns afirmaram que a reintegração foi um sucesso. Para o proprietário e para a imagem do poder público talvez tenha sido. Alguns problemas 80
60. Reintegração de Posse Fonte: Centro Vivo / Antônio Basiliano
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posteriores foram relatados como o fato de nem todas as famílias realmente conseguirem ficar no conjunto em Itaquera (apenas 153 famílias). Estas reclamavam da falta de infraestrutura, do fato das crianças terem perdido a escola e os postos de saúde, as inúmeras conduções até o centro e até mesmo, a falta de asfalto e o barro quando chove. Já as famílias que aceitaram a carta de crédito “estavam por viver outra grande luta, a concretização das possíveis compras e seu processo burocrático” (Affonso, 2010, p. 132). Neste caso, um posto de atendimento foi desenvolvido pela Sra. Ivana que ajudava a encontrar imóveis de acordo com a renda e orientar quais são as imobiliárias que trabalham com estes valores. O importante para que a operação dê certo é que o imóvel deve estar regularizado. Até mesmo os apartamentos da CDHU não possuem a regularização necessária para a utilização da carta de crédito, que possui a validade de 6 meses e a burocracia é tanta que, muitos dos que receberam a carta de crédito, tiveram que renova-la devido a todo o demorado processo. Um dos grandes problemas é que a população necessita da ajuda dos intermediários, os corretores, para dar entrada com a documentação necessária e isso se dá pelo fato de muitos deles não saberem como adquirir estes documentos e ainda, muitos são analfabetos (Affonso, 2010, p. 147). Nesta situação de dependência há grande exploração “existem casos em que a família chega a pagar R$ 2.000,00 para um corretor. Estas famílias não tem outra forma de conseguir seus imóveis…” (Affonso, 2010, p. 147).
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61. Edificio Prestes Maia – 2013 Fonte: Acervo próprio / Julia Murad
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5.4. O Edifício Hoje Depois de menos de três anos vazio, em outubro de 2010, o edifício é novamente ocupado por 378 famílias e 1.500 pessoas. Assim como na outra ocupação, esta também precisou da organização de um mutirão de limpeza em função dos anos que permaneceu vazio. Devido ao acúmulo de sujeira, alguns cômodos foram inutilizados e nestes armazenada toda a sujeira que não pode sair do prédio (Edifícios Abandonados, 2013)20 Hoje são ocupados apenas 20 dos 23 andares em função de uma grande infiltração nos andares superiores. Assim como em quase todas as ocupações, as ligações elétricas e hidráulicas são clandestinas e, neste caso específico utilizam o buraco do elevador para subir a tubulação hidráulica do prédio. O prédio encontrase em péssimo estado de conservação, porém, as paredes ainda demostram a longa vida que o edifício teve: “São dezenas de grafites, frases – O conhecimento transforma o homem – indicações dos andares e anúncios – Vendo balas, doces e bolos.” (Edifícios Abandonados, 2013)21 Os banheiros continuam coletivos e, neste caso, até 13 famílias dividem 1 banheiro. Assim como na ocupação anterior, as escadas e os pátios nos andares são pontos de encontro e de convivência entre os moradores. O que não se pode reclamar é a vista que as famílias têm e o tamanho da generosa janela que fica por conta de cada barraco. Alguns dos moradores que hoje moram nesta ocupação, já moraram na ocupação anterior – o que mostra que a solução do bolsa aluguel ou da carta de crédito não resolveu o problema de moradia para todas as famílias.
Referências retiradas do site www.edificiosabandonados.com.br – acessado em 20/07/2013. 21 (op.cit) 20
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A OCUPAÇÃO DOS EDIFICIOS VAZIOS
“Todos são como pequenas janelas de vida particular empilhadas em 20 andares de concreto. Individualidades que convivem obrigatoriamente com a individualidade de mais de mil pessoas no mesmo edifício” (Edifícios Abandonados, 2013) 22.
A vizinhança não se dá apenas pela semelhança do espaço que ocupam, mas, pela semelhança da luta por moradia. Todos lutam por um teto digno e estão na ocupação de maneira transitória, como forma de pressão ao poder público. O dono do edifício não é mais Jorge Hamuche (e do seu sócio Eduardo Amorim) que comprou o edifício em um leilão há 18 anos, com a ideia de investimento já que o preço era muito bom. Hamuche afirma que a demora em destinar um uso ao edifício não se dá pela especulação imobiliária e sim pelo descaso do poder público em relação à região da Luz e por isso não encontra interessados. O imóvel devia 5 milhões de reais de IPTU quando passou a ser de propriedade da Prefeitura do Município de São Paulo (Rede Brasil Atual, 2013). Declarou que a ideia era quando a região fosse valorizada, transformar em salas de escritório e na visão do antigo proprietário que manteve o edifício ou abandonado ou ocupado durante todos os anos de posse, o edifício não tem vocação para ser moradia, e para ele, seria um desperdício de potencial23.
63. Janela Preste Maia Fonte: Acervo próprio/Julia Murad
62. Janela Prestes Maia Fonte: Acervo próprio / Julia Murad
Hoje, quem coordena a ocupação é o mesmo movimento anterior, MSTC. Porém, a responsável é a Ivaneti Araújo, que tem por fundamento a luta contra a especulação imobiliária e contra a discriminação e principalmente, dar uma destinação aos 400 edifícios abandonados no centro de São Paulo (Papel Social Comunicação, acessado em 06/10/2013 ).
(op.cit) Informações retiradas da entrevista de Jorge Hamuche cedida ao site www.edificios abandonados.com.br acessado em 07 de setembro de 2013. 22 23
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64. Janela Prestes Maia com parabólica Fonte: Acervo próprio/Julia Murad
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A ocupação que começou com 378 famílias hoje possui 453 famílias e estão todas ameaçadas desde o dia 10 de outubro de 2013, quando o Ministério Público emitiu uma nota declarando o perigo iminente de incêndio, determinando a saída das famílias. O pedido foi encaminhado pelo promotor de Habitação e Urbanismo Carlos Alberto Amin Filho, baseado no laudo do Corpo de Bombeiro. As famílias têm mais medo de ficar sem um teto do que da evacuação em caso de incêndio. As famílias não se mostraram interessadas em sair do imóvel, pois não teriam para onde ir. Ficaram de instalar extintores de incêndio em cada andar do edifício para evitar pânico generalizado. O pedido de saída ainda não foi decretado, pois precisa ser julgado (Rede Brasil Atual, acessado em 14/08/2013). 65. Acesso ao Edifício Preste Maia – 2013 Fonte: Acervo Próprio/Julia Murad
A ocupação gera um estado de solidariedade necessário para a sobrevivência e muito bonito para quem olha de fora. Como conta Ivaneti, a população do prédio adotou uma mãe viciada em craque e seu filho, virando mascote e, hoje com 10 meses é cuidado por todos sob a responsabilidade da Ivaneti. Quando falta alguma coisa para ele, como fralda, um recado é deixado na portaria e logo alguém providencia. As pessoas quase não têm para elas, mas ajudam aqueles que têm menos ou que não podem correr atrás do seu dinheiro com um bebe. Caio foi apelidado de “Comunidade” e, alegra os dias na ocupação24.
66.Edifício Prestes Maia - acesso Rua Brigadeiro Tobias Fonte: Acervo próprio/Julia Murad
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Informações retiradas do documentário chamado OUT MY WINDOW visualizado em http://interactive.nfb.ca/#/OUTMYWINDOW/SAOPAULO, acessado em 1 de outubro de 2013.
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67. Moradora depois da ordem de despejo do Plínio Ramos -2005 Fonte: Centro Vivo / Antônio Brasiliano
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6. Os resultados das Ocupações 6.1. A importância dos movimentos na luta por moradia A ocupação como alternativa de moradia cada vez mais se torna importante pela pressão que exerce ao poder público no que se refere às mudanças nas políticas públicas habitacionais. É nítido que este processo de luta por moradia é longo e, mesmo com as intensas ocupações e estudos sobre a viabilidade de reconversão destes edifícios abandonados, o processo é burocrático e envolve não apenas o poder público e a população interessada, mas o proprietário do imóvel que, muitas vezes, não tem interesse em vender o imóvel. No final de fevereiro de 2013 a Prefeitura de São Paulo divulgou a seguinte informação, a saber: “Parceria entre prefeitura, Estado, União e iniciativa privada irá promover a revitalização da região central. O município investirá R$400 milhões. Segundo o prefeito, o projeto ajuda a trazer o trabalhar para perto do emprego e ajuda a corrigir o desequilíbrio na cidade. A prioridade é atender famílias com renda de até R$ 3.775 mil reais” (Prefeitura Municipal de São Paulo. Haddad e Alckmin anunciam a construção de 20 mil moradias no Centro – acessado em 09/08/2013).
Um dos pontos importantes de análise desta reportagem, conforme apresentado por FERREIRA em seu blog25, refere-se à dúvida sobre “para quem” se destinarão estas novas unidades habitacionais, questões estas que serão debatidas adiante.
25
www.cidadesparaquem.org
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A OCUPAÇÃO DOS EDIFICIOS VAZIOS
Em mapeamento realizado pela Prefeitura do Município de São Paulo, no começo do ano, foram apontados 42 prédios ocupados no centro de São Paulo, com aproximadamente 4.000 mil moradores. Vale ressaltar que dez destes prédios são públicos, sendo cinco do próprio município e cinco do INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social). Tais dados serviram para embasar um programa de Parceria Público Privado (PPP) em que a proposta é desapropriar estes edifícios a fim de reformá-los e transformálos em 20,2 mil unidades habitacionais (Portal da Prefeitura da Cidade de São Paulo , 2013). Dos edifícios ocupados e apontados pela proposta, 11 deles (cerca de 1.000 pessoas) já estavam com a reintegração de posse marcada. Com a intervenção do poder público, a população foi retirada de forma pacífica e recebeu o cadastramento com um prazo de quatro anos para ser atendido. Durante este período, as famílias receberão a bolsa auxílio (Última Instância , acessado em 14/08/2013). Alguns edifícios estão passando por um processo de análise para diagnosticar a viabilidade da desapropriação. Outros 9 já receberam o DIS – Decreto de Interesse Social26 que se estabelece como o primeiro passo da desapropriação. A proposta do prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT) prevê a entrega de 55 mil unidades habitacionais até 2016. Os edifícios que estão neste processo são: Rua Prestes Maia, 911 Rua Mauá, 340 Rua Cristina Tomas, 80 Av. Rio Branco, s°n. Rua Jose Bonifácio, 137 e 237 – Estes já estão em processo de desapropriação 26 O
DIS “identifica o imóvel como sendo objeto de interesse público do município. O interesse público sobrepõe o interesse privado, portanto a próxima etapa é a ação de desapropriação com base no valor venal do imóvel.” (Portal da Prefeitura da Cidade de São Paulo , 2013)
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Av. de Julho, prédio do INSS – Este está com um problema na matrícula que terá que ser resolvido antes do DIS. Quadrilátero da Rua Helvetia 1, 2 Alameda Dino Bueno Alameda Cleveland Uma das primeiras ações para a concretização da nova posposta de atender estas famílias e reformar estes prédios é revogando a resolução de 22 de fevereiro de 2006 que decreta que as famílias filiadas aos movimentos de luta por moradia que participam de ocupações estão proibidas de participar de programas habitacionais. A Prefeitura já emitiu uma nota dizendo que esta resolução será revogada (Ultima Instância , acessado em 14/08/2013). Algumas críticas referentes a este programa, apresentado pela então prefeitura, que visa diminuir o déficit habitacional e proporcionar maior qualidade de vida para a população de baixa renda que vive nas ocupações, se refere ao fato de que serão poucas as famílias que permanecerão no Centro de São Paulo, a saber: “Todas as famílias que se encontram vivendo nas ocupações estão cadastradas sendo que 25% dessas famílias serão atendidas dentro do programa de revitalização dos prédios do Centro, e as outras 75% serão contempladas com moradia definitiva em outros conjuntos habitacionais da cidade” (Declaração feita pelo secretário de Habitação José Floriano - Portal da Prefeitura da Cidade de São Paulo. Prefeitura Mapeia 42 prédios ocupadps no Centro – acessao em 09/08/2013 )
José Floriano ainda afirma que, como os prédios são antigos, a reforma custa caro e trazer a população da classe média seria uma alternativa de compensar o subsídio do valor do imóvel para a população de baixa renda e tornar possível a proposta em questão. 89
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Estas informações são de suma importância para o entendimento da situação que hoje se encontra. Devido à pressão feita pelos diferentes movimentos de moradia, intensificado em 1997, como analisado anteriormente, a intervenção pública atentou-se para a luta apresentada por estes. Com isso, entende-se a necessidade de trazer a população de baixa renda para o centro, na mesma proporção em que se legitima a necessidade de ocupar estes inúmeros edifícios vazios, destinando-os para moradia de baixa renda como os próprios movimentos já vêm fazendo ao longo dos anos. O poder público abriu espaço para os movimentos e para suas lutas. O maior problema é que, como dito em reportagem acima, apenas 25% destas 4.000 pessoas serão atendidas neste programa, o restante será destinado à população de renda média e com isso, pagar o investimento. A grande questão é - para onde estas quase 3.000 mil pessoas irão? Serão encaminhadas para programas habitacionais afastados do Centro de São Paulo e longe de infraestrutura, como aconteceu com a população da primeira ocupação do edifício Prestes Maia, que foi encaminhada para o conjunto da CDHU em Itaquera, descrito anteriormente. Para o entendimento em números e em crítica feita por FERREIRA em seu blog: “...das pouco mais 20 mil unidades habitacionais previstas, 12.500 iriam para a população com renda até 5 salários mínimos estaduais (R$ 755), ou seja R$ 3.775. As outras quase 8 mil unidades seriam para uma faixa mais alta, de quem ganha entre R$ 3.775 e R$ 10.848. E somente duas mil unidades seriam reservadas para associação de moradia, ou seja, para a população realmente mais pobre, embora seja ela a única que até hoje levanta a bandeira da moradia no centro, fazendo corajosas (e violentamente combatidas) ocupações de prédios que não cumprem sua função social” (FERREIRA. Cidades para quem? 20 mil habitações no centro expandido: é possível? Parte 2 – acessado em 02/10/2013)
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Ainda explica que, a ideia não é tornar o centro exclusivo de moradia de baixa renda, nem elitista como se propunha o projeto Nova Luz. A ideia é trazer a diversidade na ocupação e isto o projeto oferece. O que não pode ocorrer é o desequilíbrio em que “podemos estar frente a uma grande intervenção pública que deixará mais uma vez de lado a população realmente mais pobre, aquela que mais necessita de políticas habitacionais” (FERREIRA. Cidades para quem? - 20 mil habitações no centro expandido: é possível? Parte 2 – acessado em 02/10/2013). Este é um problema também recorrente dos projetos habitacionais. A população que ganha entre 0 e 3 salários mínimos normalmente não tem acesso a estes programas e, quando tem, são mínimas as quantidades de unidades, como é o caso deste programa lançado recentemente. Dizer que as unidades estão destinadas a quem ganha até 5 salários mínimos tem uma grande margem, pois há uma diferença entre ganhar 100 reais e viver em uma ocupação e 3.755 reais por mês e viver em um apartamento de 1 dormitório. A forma como será feito o financiamento para quem ganha até 1 salário mínimo ainda não foi apresentada de maneira clara e, é neste momento que a abertura do diálogo com os movimentos permite que vozes a favor desta população sejam ouvidas. Os líderes das ocupações estão reivindicando todas as vagas das unidades reformadas. Ivaneti Araújo (MSTC), coordenadora da ocupação do Prestes Maia, declara: “O movimento que cavou, que reivindicou seus direitos, que foi atrás de lugar para morar. Então, que sejam do movimento” (Carta Capital – acessado em 09/08/2013) e ainda demostra em conta que, o Edifício da Rua Mauá, 340 que hoje abriga 237 famílias, será desapropriado para a reforma. Com isto 160 unidades serão criadas. A proposta do movimento é que as 160 sejam ocupadas por moradores do movimento e, as outras 77 famílias sejam encaminhadas para programas habitacionais no Centro de São Paulo e não levadas para conjuntos afastados. Porém, a proposta da Prefeitura é que apenas 40 unidades sejam destinadas às famílias dos movimentos. Tudo isso ainda está em negociação, porém, o que é claro é que para pagar a conta desta 91
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proposta será necessário diminuir a quantidade de unidades destinadas aos movimentos sociais. Já o MMPT – Movimento de Moradia para Todos, que tem dois edifícios ocupados que já receberam o DIS, criticam a proposta como um todo. Edinalva Franco, líder do movimento, afirma que não deveria ser feito desta maneira, pois é como se as migalhas fossem destinadas aos trabalhadores de baixa renda. O que defende é que o programa deveria visar à locação social em que o edifício seria propriedade da Prefeitura que cobraria um baixo aluguel para as famílias continuarem ocupando o edifício. Desta maneira, o benefício não seria para as construtoras e sim para a luta por moradia (Carta Capital – acessado em 09/08/2013). A resposta do Secretário de Habitação é que seria inviável financeiramente usar a locação social em todos os edifícios, porém, não descarta que isso possa vir a acontecer em um ou outro edifício.
Ainda em relação ao aluguel social, se a prefeitura utilizasse estes prédios desapropriados para este fim, segundo FERREIRA: “Se há 28 mil pessoas morando com a bolsa aluguel, na prática significa que a prefeitura já faz aluguel social, com a diferença que não oferece ela mesma as habitações para alugar. Fazer locação permitiria à prefeitura constituir um parque habitacional próprio na área central, utilizável a longo prazo” (FERREIRA. Cidades para quem? Porque não fazer um parque municipal de locação social na área central – acessado em 02/10/2013).
Neste caso, conforme as famílias subissem de renda, participariam de outros programas e desta maneira o centro sempre teria uma grande oferta de moradia para baixa renda. Com isso, também impedindo a valorização imobiliaria em função da proposta do plano habitacional em discussão e, “...em suma, permitiria uma coisa que até hoje nenhuma 92
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prefeitura brasileira fez: constituir um estoque fundiário e imobiliário para garantir o acesso dos mais pobres à moradia....” (FERREIRA. Cidades para quem? Porque não fazer um parque municicpal de locação social na área central – acessado em 02/10/2013) Outra questão que também vem sendo criticada se refere ao fato de que a proposta de 55 mil unidades atende apenas 12,6% do déficit habitacional existente. Segundo declaração de José Floriano, Secretário da Habitação, seria necessária a construção de 200 mil unidades apenas para dar conta da população sem-teto e/ou que mora em área de extremo risco. O déficit de todo o Brasil é de 890 mil casas (R7 Notícias, acessado em 28/07/2013). Porém, a vantagem é que pela primeira vez está se utilizando a possibilidade de ocupar os edifícios vazios e/ou ocupados como forma de diminuir este déficit habitacional já que, existem em São Paulo 1,12 milhão de edifícios vazios e o número de pessoas sem teto na cidade de São Paulo é de 1.127.000 (IBGE, 2010). Os movimentos por moradia só possuem espaço para atuar, pois o poder público falhou no que se refere tanto a oferta de moradia quanto a administração da vacância imobiliária no centro de São Paulo. A ocupação não tem por regra tornar-se moradia fixa dos filiados, é uma situação transitória onde a pressão para que o poder público preste atenção na ausência de moradia é a premissa da luta destes movimentos. Hoje, vivemos em uma situação onde esta discussão está em pauta, o movimento tem voz e as suas reinvindicações, fruto de anos de lutas, estão sendo escutadas e levadas para dentro das discussões para se chegar a uma proposta, em parceria com o poder público e privado que, atenda em grande parte, os anseios das famílias de baixa renda. Mesmo com falhas e críticas, é considerado um avanço para os movimentos de moradia as notícias que vem sendo divulgadas, principalmente porque estas contribuem com a descriminalização do movimento. Esta foi a situação pela qual sempre lutaram para alcançar: a abertura para o diálogo. Estão avançando nas discussões para aumentar 93
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de 2.000 mil unidades para 5.000 unidades destinadas aos movimentos (Portal da Prefeitura da Cidade de São Paulo. Haddad e Alckmin anunciam a construção de 20 mil moradias no Centro – acessao em 09/08/2013), e isso demostra a força que hoje estes movimentos têm na luta por moradia. A conquista só se fez presente em função de todas as ocupações e reinvindicações feitas desde então. A ocupação é uma forma de lutar por moradia, de fazer política, de reivindicar os direitos básicos de uma população que não tem acesso a estas informações, ou, até mesmo, de denunciar o domínio do mercado imobiliário. “As ocupações de imóveis ociosos promovidas pelos movimentos de sem-teto objetivavam pressionar o poder público a viabilizar programas habitacionais para a população de baixa renda e mostrar para a cidade que havia uma série de prédios na área central sem cumprir sua função social. No período entre 1997, quando passaram a ser organizados de forma sistemática, e 2007, foram ocupados mais de setenta prédios e terrenos ociosos, apenas na área central da capital paulistana” (Neuhold, 2009, p. 126).
A reforma destes edifícios é uma alternativa a ser discutida para atender o déficit habitacional principalmente da camada mais baixa da população, assim como trazer para o centro de São Paulo uma população diversificada no que se refere à classe social. A reabilitação dos edifícios é uma maneira de diminuir estes altos números da falta de moradia, porém deverá estar atrelado a um programa amplo de infraestrutura para funcionar como um instrumento político eficiente.
6.2. Uma alternativa ao caso Prestes Maia As críticas em relação à proposta lançada pela Prefeitura de São Paulo estão nas diferentes esferas interessadas nesta situação. Até mesmo por parte dos movimentos algumas queixas foram apresentadas, principalmente relacionadas ao fato de que apenas 25% da população 94
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será atendida neste programa. Algumas alternativas foram apresentadas, até mesmo a possibilidade destes 42 edifícios funcionarem em locação social como apresentado no item acima. Os movimentos de moradia, em grande maioria, utilizam a ocupação como forma de luta política por moradia e como forma de proporcionar um teto iminente para as famílias que foram desalojadas ou correm este risco (tanto no despejo de cortiços quanto em áreas de risco). Em função destas características e atrelado ao fato da proposta apresentada pelo poder público, uma alternativa seria a utilização do Edifício Prestes Maia (que faz parte de um dos 42 ocupados por movimentos de moradia) como um edifício de moradia transitória, em que a organização seria de responsabilidade MSTC e a propriedade seria da Prefeitura de São Paulo. Nesta alternativa a lógica de ocupação do movimento poderia ser mantida. As unidades seriam menores e os banheiros, cozinhas e lavanderias seriam mantidos em comum, divididas em cada andar. Hoje, as unidades habitacionais na ocupação do Prestes Maia possuem cerca de 10m². No caso da proposta em questão, teria 35 m² e poderia ser dividida dependendo do tamanho das famílias. A cozinha seria ampliada e reformada e utilizando a lógica de ocupação existente, o salão central seria mantido e estruturado para ser uma grande sala de estar comum a todos. As partes elétrica e hidráulica seriam reformadas assim como o elevador colocado em uso. Nesta situação, o investimento cairia e consequentemente o retorno não precisaria depender de 75% das unidades. Abaixo, segue planta de proposta de ocupação do Prestes Maia.
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Lavanderia Duas possibilidades de layout
Vestiários
Circulação / área de estar
Cozinha comunitária e área de reuniões e encontros área para estender roupa
Deposito ou brinquedoteca
68. Planta desenvolvida para proposta de intervenção do Prestes Maia
Foram implantados 12 unidades por andar sendo que cada uma delas pode abrigar 5 a 8 pessoas dependendo da forma como está é feita. A substituição da cama por beliche – comum nas ocupações - é uma alternativa. Ao total o prédio possui 23 andares sendo 276 unidades apenas no bloco A. O total da ocupação hoje é de aproximadamente 350 famílias nos dois blocos. Algumas questões foram levadas em consideração para a realização desta proposta. Em diferentes estudos realizados para o desenvolvimento deste trabalho algumas reclamações sobre a ocupação por parte dos moradores foram apontadas sendo uma delas a dificuldade da utilização da cozinha. O fluxo é grande e complexo pois todos os barracos necessitam cozinhar e devido à alta quantidade de famílias é necessário uma organização. Devido a isso, a proposta aumenta a m² dos barracos e implanta uma mini-cozinha dentro da unidade como forma de diminuir 96
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este problema. Vale ressaltar que seria necessário a implantação do encanamento do gás de rua para evitar problemas com vazamento de botijões. A cozinha como área de convivência é mantida e expandida para também ser um local de reuniões. A lavanderia ganha um anexo para estender roupas. OS vestiários são amplos e com cabines estendidas para a troca de roupa mais confortável e os corredores, mesmo que diminuídos ainda possuem 4 metros de largura e correspondem a uma grande área de convivência. Neste caso os dois quartos possuem ventilação natural Apenas um dorm. tem janela
Espaço para uma mini cozinha
69.Ampliação da proposta
No que se refere a unidade em si, poderia ser de duas maneiras como apresentado acima. A proposta é seguir a lógica de ocupação existente e abrigar o maior número de pessoas com menor gasto e maior qualidade. Com esta proposta, todas as famílias poderiam permanecer morando no Edifício com qualidade de vida e salubridade. Na medida em que edifícios novos fossem construídos, de preferência nas áreas centrais, as famílias seriam transferidas e outras que estão em situação precária, seriam abrigadas no Prestes Maia. Ele cumpriria a função de moradia transitória e o movimento continuaria a luta por moradia reivindicando e ocupando outros prédios e levando a luta para as ruas. 97
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7. Considerações Finais É nítido que, ao longo do processo de desenvolvimento da cidade, a desigualdade se fez presente também no que se refere ao acesso da moradia digna. Como consequência, o que hoje existe é um grande déficit habitacional da camada mais pobre da população. Um paradigma interessante é o fato de que 1,127 milhão de pessoas na Cidade de São Paulo não possuem teto para morar (IBGE, 2010) e ao mesmo tempo existe 1,12 milhão de domicílios vazios na cidade. Essa lógica de desenvolvimento excludente também viabilizou o domínio do mercado imobiliário no crescimento da cidade de São Paulo 27. Com a mudança do eixo econômico da cidade, o centro de São Paulo esvaziou e não se manteve atrativo ao mercado. Aliando-se a falta de moradia e a oferta de edifícios vazios no centro, os movimentos de luta por moradia acreditaram ser nesta relação entre sem-teto e vazios, o ponto no qual deveriam intervir. A luta por moradia passaria a confrontar com a lógica de produzir habitação popular na periferia da cidade e segundo Neuhold (2009, p. 126) passariam a contestar os lugares estabelecidos pelo poder público: “A articulação dos movimentos de moradia da cidSão Paulo em uma única frente de luta surgiu da necessidade comum entre os movimentos de uma política de ação direta que desse visibilidade à urgência de um plano habitacional digno em São Paulo. Ações que de fato chamassem a atenção da sociedade e dos poderes públicos para os vazios urbanos que estão à espera de valorização imobiliário, enquanto pessoas, sem onde morar, são arrastadas para a periferia da cidade, muitas vezes
Processo apresentado no capitulo 3 que apresenta a forma como se estabeleceu os vazios na cidade de São Paulo. 27
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ocupando áreas de preservação ambiental.” (Frente de Luta por Moradia , 2010)
Estas decisões foram de suma importância para o rumo em que as questões ligadas à política habitacional se conduziram ao longo dos anos. Os movimentos desde a década de 1990 ocupam os edifícios vazios como forma de pressão ao poder público não apenas em relação a falta de moradia, mas também relacionado ao fato de que no determinado edifício poderia “viver gente”. As relações entre os movimentos de moradia e a Prefeitura de São Paulo ficaram vulneráveis aos diferentes mandatos de diversos prefeitos. Em algumas ocasiões a repressão foi maior por meio da violenta reintegração de posse (Affonso, 2010) e o movimento passou a ser criminalizado (Neuhold R. , 2009, p. 127) e até mesmo as famílias cadastradas foram proibidas de participar de programas habitacionais28. Em outras épocas, foi utilizado para melhorar a relação de determinado prefeito com a camada mais pobre da população ou até mesmo de campanha política. O importante disso tudo se refere ao fato de que hoje, as vozes do movimento (que são as vozes da população que ganha entre 0 e 3 salários mínimos) fazem parte das discussões políticas referentes a programas habitacionais. A população mais pobre e que não tem teto para morar, hoje tem representatividade e isso só se fez presente em função da resistência. A diferença de quando os líderes dos movimentos se envolvem em candidaturas, o que também aproximaria das discussões, é que nesta situação não são os partidos e sim a política habitacional que está sendo repensada e inserida no discurso do fim do déficit habitacional através da ocupação dos edifícios vazios, marcando o grande ganho neste processo.
Resolução de 22 de fevereiro de 2006 que, deverá ser revogada. (Rede Brasil Atual, 2013) 28
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A abertura do diálogo é o primeiro passo para o desenvolvimento de um programa que visa atender a todos, inclusive aos catadores de lixo e ambulantes da Rua 25 de março – trabalho da maioria dos ocupantes do Prestes Maia (Bloch, 2008), assim com o mapeamento dos edifícios ocupados pelo movimento e a utilização do DIS, proporcionam a consolidação desta parceria, fruto de uma luta de muitos anos. Este trabalho buscou analisar o processo e a situação em que apareceram os movimentos sociais de luta por moradia e quais foram as questões que fizeram com que a ocupação se tornasse uma alternativa. Apresentado este processo, o Prestes Maia foi escolhido para ser analisado em função da complexidade de sua ocupação em diferentes momentos e como forma de entender como se estabelece a lógica de uma ocupação, como ela se dispõe no espaço e, como se dão seus pormenores. Questões relacionadas às relações entre os moradores em si e os moradores e o edifico também foram abordadas uma vez que estas fazem parte intrínseca de uma ocupação bem sucedida. Devido a acontecimentos29 políticos no decorrer deste trabalho tornou-se possível analisar como se deu o resultado de todos estes anos de ocupações e quais foram os ganhos em função da luta por moradia e suas consequentes reinvindicações, assim como entender o funcionamento do processo burocrático da reforma dos edifícios e quais são os ganhos da população interessada neste estudo. A intenção do trabalho se fez presente na medida em que permitiu uma análise dos processos, objetivando entender a importância dos movimentos neste processo e como se estabelecem as relações dos
Proposta apresentada pelo governo do Prefeito Haddad em utilizar os 42 edifícios ocupados, reforma-los e gerar unidades habitacionais à serem negociadas também com os movimentos de moradia. (Portal da Prefeitura da Cidade de São Paulo , 2013) 29
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vazios e as ocupações, mesmo com dificuldade em acessar material técnico referente às ocupações. A reabilitação de edifícios, ocupados por movimentos de moradia, não é um tema recorrente principalmente no que diz respeito à utilização destes para diminuir o déficit habitacional da camada mais pobre da população. Esta ação pode ser considerada o primeiro passo para um diálogo coeso que busque realmente o aumento de oferta de moradia digna para esta população. Este trabalho buscou apresentar como conclusão de uma etapa de longos anos de ocupação, o processo em que se estabeleceu entre a ocupação como única alternativa e abertura do diálogo presente nas discussões atuais. OBSERVAÇÃO QUANTO A VISITA A OCUPAÇÃO PRESTES MAIA Até a finalização deste trabalho – 16 de novembro de 2013 - diversas foram as tentativas de visita e contato tanto a própria ocupação Prestes Maia como à coordenadora. Nenhuma sucedida até mesmo a realizada no dia de hoje. A própria visita foi protelada ao máximo devido ao fato da necessidade da imparcialidade na análise do resultado das ocupações porem em um determinado momento ela se fez necessária. Mesmo com este trabalho finalizado a tentativa da visita ainda se manterá como forma de aprofundamento da análise.
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70. Foto aérea de centro de São Paulo Fonte:.skyscrapercity.com/showthread.php?t=431868
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8. Estudos de Caso 8.1. Programa Morar no Centro O Programa Morar no Centro desenvolvido em 2003 pela SEHAB Secretaria da Habitação e do Desenvolvimento Urbano durante a prefeitura da Marta Suplicy (2001 -2004) visou a atenção quase que exclusiva para as moradias populares e a consequente reabilitação desta área. A premissas, segundo Prefeitura Municipal de São Paulo (2004) estavam baseadas em: 1.Melhorar as condições de vida dos moradores do centro; 2.Viabilizar moradia adequada para pessoas que moram ou trabalham na região; 3.Evitar o processo de expulsão da população mais pobre, que muitas vezes ocorre em politicas de reabilitação de centros; 4.Priorizar a reforma de prédios vazios; 5.Combinar soluções habitacionais em iniciativa de geração de renda; 6.Buscar a diversidade social nos bairros centrais. Neste programa, ocorre um atenção ao fato de que, em algumas experiências internacionais, os investimentos para reabilitar uma determinada área central ocasionou na valorização imobiliária e na consequente expulsão da camada mais pobre da população. Para isso, mecanismos e estratégias de incentivo e intervenção pública foram desenvolvidos, principalmente relacionadas ao que se refere ao incentivo a produção de habitação social. O centro de São Paulo no então momento (e até mesmo nos dias de hoje) possui grande oferta de terrenos vazios, edifícios vazios ou ocupados por 105
A OCUPAÇÃO DOS EDIFICIOS VAZIOS
movimentos e áreas encortiçadas, todas estas passiveis de atuação. As diferentes modalidades de atendimento se referiam a Locação Social, Moradia Transitória, Programa de Arrendamento Residencial – PAR, Carta de Credito Municipal entre outros, A grande quantidade de modalidades se refere ao fato da intensão de atingir diferentes classes sócias (Neto, 2006, p. 37) O programa foi de suma importância não apenas na criação de unidades habitacionais e a reforma de edifícios ocupados pelos movimento como será analisando adiante mas, pela possibilidade da discussão e a comprovação técnica da viabilidade do retrofit em edifícios ociosos. A inclusão de unidades para os movimento de moradia foi fruto da extensa luta destes movimentos que, além da reinvindicação, neste momento apontáramos edifícios capazes de serem reformados e fizeram parte integrante no desenvolvimento deste programa. Segue abaixo alguns estudos de caso referentes a edifícios que foram desapropriados pela Prefeitura no programa Morar no Centro, reformados e destinados a população de baixa renda, muitas delas integrantes dos movimentos de moradia e que viviam nas ocupações destes mesmos edifícios. Percebe-se que o programa tornou-se viável e atingiu efetivamente a população de baixa renda. Temos hoje uma situação na prefeitura que caminha para soluções parecidas com as estabelecidas no programa Morar no Centro e capazes de atingir uma população ainda mais carente e que não se incluía em nenhum programa habitacional, referente as famílias que ganham entre 0 e 3 salários mínimos.
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MORAR NO CENTRO
8.1.1. O Hotel São Paulo Todos as informações abaixo foram retiradas da publicação do LABHAB – SILVA, Helena M. Menna Barreto, 2007. Oportunidades e limites – Caderno de Estudo de Caso. p. 04 – 06. Localizado junto a Praça das Bandeiras, construído na década de 1940 para ser um hotel de alto padrão. Estava desocupado desde 1980 e um dos motivos deste vazio se refere ao difícil acesso para veículos, taxis e etc. A localização se tornou problemática para o uso hoteleiro mas interessante para Habitação de interesse social Com a organização do Fórum dos Cortiços, 400 famílias ligadas ao movimento ocuparam no final de década de 1990 o Hotel São Paulo como forma de pressão e reinvindicação na luta por moradia e proporcionando teto iminente para população desabrigada. A morte de uma criança que caiu das escadas e morreu marcou tragicamente esta ocupação. 71. Planta original do pavimento tipo do Hotel São Paulo Fonte: Fábrica Urbana Assessoria Técnica
No que se refere a aquisição do imóvel tornou-se um processo burocrático e demorado em função do custo da reforma e do seu porte. Este processo se deu no período do programa Morar no Centro (2001-2004) e questões como torna-lo locação social ou inclui-lo no PAR foram questões que também retardaram o processo. A prefeitura desapropriou o edifício em 2004 e em acordo com a Secretarias da Educação e Saúde os 3 primeiros pavimentos mais o térreo foram cedidos a unidade básica de saúde e creche sendo a obra destes pavimentos responsabilidade da própria secretaria. Quanto a negociação, feita por avaliação da COHAB/SP, o valor pago pela prefeitura foi de R$ 3.180.000,00 já com o desconto da dívida do IPTU de R$ 554.500,00. Este dinheiro foi repassado sem ônus ao Fundo de Arrendamento Residencial uma vez que foi incluído no programa PAR.
72. Planta do Pavimento tipo Hotel São Paulo Fonte: Fábrica Urbana Assessoria Técnica
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A OCUPAÇÃO DOS EDIFICIOS VAZIOS
No que se refere ao projeto aprovado o número de unidades é de 152 sendo 16 quitinetes, 111 apartamentos de 1 dormitório, 20 apartamentos de 2 dormitórios e 5 apartamentos adaptados para deficientes físicos. A metragem varia entre 25,9m² e 44,38m². Alguns elementos tiveram que ser adaptados como pode ser analisado nas plantas abaixo. Uma circulação vertical foi inserida no miolo do edifício para a segurança em caso de incêndio no Edifício. O projeto foi realizado pela própria COHAB e a construtora responsável foi Seta e Paez Lima. A localização do edifício dificultou o andamento da obra já que a retirada de entulho e entrega de matérias era feita pelo Vale do Anhangabaú e portanto, com horários restritos.
73. Fachada do Hotel São Paulo Fonte: colunas.revistaepocasp.globo.com/centroav ante/tag/hotel-sao-paulo/
O edifício hoje está quase que completamente ocupado, exceto pelas quitinetes que possuem a planta em triangulo o que dificulta o mobiliário. As famílias residentes são as que viviam na ocupação coordenada pelo Fórum de Cortiços e cadastradas na COHAB/SP com renda entre 4 e 6 salários mínimos. O valor do condomínio é de R$142,00 e a parcela da prestação está em torno de R$ 180 e R$ 200,00 par quitinetes, R$ 211, 00 a R$ 260 para 2 dormitórios. O custo da reforma foi de R$ 534,00 por metro quadrado o mesmo que seria uma nova construção.
8.1.2. Senador Feijó. Todos as informações abaixo foram retiradas da publicação do LABHAB – SILVA, Helena M. Menna Barreto, 2007. Oportunidades e limites – Caderno de Estudo de Caso. p. 12 – 14. Localizado na Rua Senador Feijó, ao lado da Praça de mesmo nome, foi construído na década de 1930 sendo originalmente de uso misto térreo 108
74. Acesso ao Hotel São Paulo Fonte: colunas.revistaepocasp.globo.com/centroav ante/tag/hotel-sao-paulo/
MORAR NO CENTRO
com comercio e 20 apartamentos distribuídos em 5 pavimentos. Convertido em hotel funcionou ate o começo do século. Foi desapropriado em 2003 e junto com mais 7 outros edifícios foi decretado o DIS- Decreto de Interesse Social (a ideia era a utilização deste edifício no programa de locação social), parte integrante do processo de desapropriação do programa “Morar no Centro”. A negociação demorou 3 anos e como a área de comercio já estava desmembrada, a negociação ficou restriada aos 5 andares. O valor de compra foi de R$ 1.003.000,00 e a divida de IPTU era cerca de R$ 11.000,00. Neste edifício foi necessário a utilização de recursos do PEHP – Programa Especial de Habitação Popular e, portanto, deverá atender famílias entre 0 e 3 salários mínimos por isso a locação social. Assim como o Hotel São Paulo, o projeto foi realizado pela COHAB e o executivo realizado pelo escritório Barbosa e Corbucci. O projeto aprovado possui 45 unidades de 1 dormitório e com área útil que varia entre 25m² e 35m² com existência de uma pequena área comum em cada andar. 75. Planta do pavimento-tipo original Edifício Senador Feijó Fonte: arquivo do GTAI / PMSP – 2001/2004
O valor de cada unidade custou já com o valor do edifício embutido de R$ 48.880 e o custo da obra ficou em R$ 568, 00 o m² e “o custo do Senador Feijó são absolutamente incompatíveis com uma política de HIS baseada em reformas” (Silva, 2001, p. 14). No período de análise realizada pela SILVA (2007) o edifício ainda estava em reforma. Diferentemente dos outros dois edifícios analisados neste item, o Senador Feijó não estava sendo ocupado por nenhum movimento no momento de negociação.
76. Planta do pavimento-tipo reformado do Edifício Senador Feijó Fonte: arquivo do GTAI / PMSP – 2001/2004
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A OCUPAÇÃO DOS EDIFICIOS VAZIOS
8.1.3. Edifício LABOR Todos as informações abaixo foram retiradas da publicação do LABHAB – SILVA, Helena M. Menna Barreto, 2007. Oportunidades e limites – Caderno de Estudo de Caso. p. 02 – 03. Foi construído em 1944 para abrigar a sede da Fundação Rede Ferroviária. Desde 1987 estava vazio e em 1997 foi ocupado por movimentos de moradia, MSTC e ULC e a partir deste momento a negociação começa entre a Caixa, o movimento e a Rede para a inclusão do edifício no programa PAR. Em 2002, no processo de aquisição do imóvel o proprietário ofertou um valor abaixo do avaliado pela prefeitura, valor este de R$ 800.000,00 porém, com a avaliação e a percepção que o reforço estrutural custaria 50% do valor do imóvel uma nova negociação conseguiu que o proprietário vendesse o edifício por R$ 420.000,00 e este valor só foi possível com a pressão por parte também dos movimentos de moradia.
77. Vista lateral Edifício Labor Fonte: Integra Assessoria Técnica
No que se refere ao projeto, um andar foi acrescido e o pé direito duplo do térreo foi modificado para ser um mezanino. O projeto foi desenvolvido com assessoria da equipe técnica INTEGRA e , posteriormente pela assessoria GRÃO que acompanhou as obras. O projeto chegou a 84 unidades com 34m² aproximadamente. A obra concluída em 2004 e as unidades foram destinadas as famílias filiadas ao MSTC e à ULC destinadas as famílias que ganham entre 3 e 4 salários mínimos. A administração do condomínio é feita pelos próprios moradores que se organizam na limpeza e inspeção e assim diminuem o valor do condomínio que, em 2007 era de R$ 70,00 e as prestações de R$ 241,00.
78.Planta pavimento-tipo Edifício Labor Fonte: Integra Assessoria Técnica
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MORAR NO CENTRO
8.1.4. Residencial Conego Vicente Marino O projeto se refere a um concurso realizado pela SEHAB, em 2003, dentro do programa MORAR NO CENTRO, chamado de concurso Habita Sampa. O projeto em questão do escritório UNA recebeu o 2° lugar. Este terreno, na Rua Cônego Vicente Marino, com a Rua Cruzeiro, possui o perfil plano, fazendo divisa com a linha férrea e, uma grande praça. As edificações no entorno são baixas, com dois pavimentos, sendo estas residências e galpões em sua maioria. O projeto é organizado a partir de 3 blocos, sendo estes: Habitacional, Centro de Capacitação Técnica e um platô com áreas livres. O espaço de lazer do conjunto foi elevado em relação a cota da linha férrea, resguardando a população residente em relação a circulação da rua e, criando um pavimento acima da linha de visibilidade. As laminas de apartamentos se encontram pousadas neste platô e possuem circulação com ventilação e iluminação natural e, os apartamentos estão implantados no eixo leste/oeste, o que difere do eixo da ferrovia e cria um distanciamento em relação a poluição sonora produzida por esta mobilidade. 79. Vista geral do projeto Fonte: UNA
No ponto da esquina, foi desenvolvida uma praça pública e uma creche e, um edifício horizontal de 3 pavimentos abriga o centro de capacitação. Estes diferentes usos e estas diferentes circulações, permitem manter o conjunto “animado” durante todo o dia, em diferentes horários. Esta referência foi de suma importância para a realização do objeto Projetual, apresentado no próximo capitulo, principalmente no que se refere ao programa exigido pela próprio programa Morar no Centro.
80. Vista interna do projeto Fonte UNA
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A OCUPAÇÃO DOS EDIFICIOS VAZIOS
8.2. Conjunto Jardim Edith (2008/2012 ) Mmbb arquitetos e H+F arquitetos Localizado em uma área valorizada da cidade, na esquina da avenidas engenheiro Luís Carlos Berrini e Jornalista Roberto Marinho, foi implantado em uma porção da favela que, chegou a abrigar, 900 famílias (Monolito, 2012, p. 81). O conjunto, se distribui em duas glebas que abrigam diferentes usos, como habitacional, institucional, serviços e áreas comunitárias. Vale ressaltar que o térreo encontra-se quase que completamente livre e de uso público, voltado para atender a demanda exigida com o adensamento. Estes usos se referem a posto de saúde, creche e restaurante-escola. Questões relacionadas a integração desta população com a existente no bairro foi de suma importância e, desta maneira, escritórios foram propostos, como forma de intensificar a relação entre estas (Monolito, 2012, p.81) O projeto se abre para a cidade e não restringe ou delimita aonde começa a porção pública e termina a privada. O passeio das calçadas foram alargados e delimitados pelos próprios edifícios. A área comunitária também delimitou o partido do projeto. Esta encontra-se no pavimento acima do acesso público e determina os diferentes usos em linhas horizontais. Os blocos de apartamentos surgem destes usos comunitários.
81. Vista geral do conjunto Fonte: Mmbb
82. Vista interna Fonte:Mmbb
Estes apartamentos se dividem em laminas, de 4 pavimentos e sem elevador e em torres, de 16 pavimentos. A circulação é generosa e se estabelece como sendo uma extensão dos apartamentos, um ponto de encontro, de parada e também de circulação. As relações de público e privado e como o projeto se estabelece no terreno assim como os diferentes usos que buscam atender a demanda da cidade real foram questões de suma importância e pontuadas no objeto desenvolvido neste trabalho final e sera apresentado adiante. 112
83. Implantacao do projeto executado Fonte: Mmbb
MORAR NO CENTRO
8.3. Conjunto Ponte dos Remédios (2011/_) Marcos Acayaba e H+F Arquitetos. Localiza-se em uma gleba, no encontro das marginais pinheiros e tiete, próximo a ponte dos remédios. Já a algumas décadas este espaço encontra-se abandonado já que, a siderurgia existente no local, construída na metade do século 20, está desativada (Monolito, 2012, p.128) O projeto preservou a memória deste uso, mantendo alguns elementos como a portaria, a chaminé e um dos galpões porem, serão destinados a outros usos. A malha viária foi estendida para que o novo conjunto se integre na malha da cidade. O projeto prevê 1300 unidades, espalhadas por diferentes edifícios, resultando de um caráter dinâmico, com diferentes alturas e formas de implantação (Monolito, 2012, p.128) A via que corta o conjunto recebera, no pavimento térreo, lojas e comércios, a fim de atrair uma maior circulação conferindo um partido com maior dinâmica, tanto estética quanto de uso. Tanto nos térreos dos edifícios habitacionais, como em elementos isolados, equipamentos públicos são propostos como serviços, creches e posto de saúde sendo, um destes equipamentos, construídos com material de demolição, com projeto realizado pelo arquiteto Solano Benitez (Monolito, 2012, p.128) 84. Croqui do conjunto da Ponte dos Remédios Fonte: Monolito, p. 128
8.4. Residencial Diogo Pires (2011/_) Boldarini Arquitetura e Urbanismo. Próximo à favela Nova Jaguaré na marginal pinheiros, está inserido em uma área que foi devastada por um incêndio ocorrido em 2009. O projeto se desenvolve em dois blocos, de 6 e 8 pavimentos, comercio e um núcleo de lazer, recreação e estudo que, tem como partido, a extrapolação da relação entre público e privado, propondo usos variados, concentrados no térreo e, enfatizando a essencial relação democrática da cidade, priorizando a importância da vida coletiva ( Monolito, 2012, p.53)
855. Implantação geral – Diogo Pires Fonte: Monolito, p. 54
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A OCUPAÇÃO DOS EDIFICIOS VAZIOS
Uma praça central articula estes diferentes blocos e os diferentes usos públicos e privados. A área de estudo se estabelece em um edifício que tem no ultimo pavimento uma praça suspensa, com vista para todo o complexo. É de uso público e ao mesmo tempo, funciona como uma extensão da parte privada dos apartamentos. A intenção desta área de estudo é proporcionar um convívio ligado ao conhecimento que, atende as diferentes faixas etárias oferecendo ações educativas visando o acesso ao ensino ao mesmo tempo que se estabelece o direito de morar (Monolito, 2012, p.53)
114
MORAR NO CENTRO
9. Projeto O projeto consiste em um Edifício Multifuncional localizado na Av. Prestes Maia quase que em frente ao Ed. Preste Maia 911, ocupado pelo movimento MSTC analisado acima. Tem como base um programa que dá apoio a esta ocupação atrelado ao programa exigido pelo concurso habita sampa realizado pelo programa MORAR NO CENTRO em 2004. Com base nas análises e estudos referentes a lógica de ocupação dos movimentos de moradia, nota-se que é comum que os movimentos de moradia disponibilizem na ocupação um andar, ou uma área considerável para ser destinada a salas de aulas, áreas de reuniões, assembleias e até mesmo biblioteca. Esta é uma forma que o movimento encontrou de aproximar a população da ocupação à sua realidade, através de aulas de cidadania, direito mínimos onde o objetivo é apresentar para as famílias quais são os seus direitos e porque estão ocupando. Isso faz com que a população se conscientize da sua força de ação e a capacidade de reinvindicação. Também são realizadas aulas de reforços e alfabetização. Desta maneira, o Projeto em questão dispõe de salas de aulas que foram propostas nos 2 primeiros pavimento resultando em um Centro de Capacitação. A Proposta é dar apoio tanto a população do Prestes Maia quanto a população da região em geral. As aulas são de alfabetização para adultos, línguas, computação e espaços para discussões e reuniões em geral. 115
A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
No térreo a proposta é manter a lógica de ocupação do centro de São Paulo e, portanto, lojas são dispostas ao longo do lote criando uma circulação interessante e tornando o local público. A partir do 4° pavimento o uso é residencial com apartamento de 1 e 2 dormitórios e ao total possuem 159 unidades. Quanto a metragem, são apartamentos de 35,10m² e 53.20m² respectivamente e as unidades duplex são de 58m². O programa definido neste terreno tem por base, atender as necessidades, tanto da população existente na ocupação do Ed. Prestes Maia quanto da população que circula, assim como diminuir o déficit habitacional existente na cidade. O terreno é dividido em cortes horizontais, abrigando: O projeto será apresentado e analisado adiante.
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MORAR NO CENTRO
9.1. Os desenhos
O terreno escolhido encontra-se na Avenida Prestes Maia, esquina com a Rua Paula Souza e, possui características especificas como a tendência de comércio voltado para o ramo da informática, a proximidade com a Rua 25 de Março e com o complexo da Estação da Luz e a Pinacoteca. Possui ao mesmo tempo grande marco no desenvolvimento “comercial” da área e a relação com áreas voltadas a cultura e lazer, É uma região que está em constante discussão em relação à promoção de habitação e diferentes usos, principalmente naqueles em que hoje se encontram ocupados por estacionamento e, coniventes com a lógica do mercado imobiliário, dificultam o desenvolvimento integrado da Cidade de São Paulo e, quando recebem atenção, se referem, em quase todas as situações, a projetos excludentes, voltados apenas para uma camada da população. A área já está em constante modificação devido ao novo acesso ao metro da Luz, referente a linha amarela. Porém, as edificações ainda se estabelecem nos lotes implantadas de forma padrão, sem nenhum recuo, tanto frontal quanto lateral. Inúmeras casas de interesse arquitetônico, que fizerem parte da economia cafeeira na cidade de São Paulo que, hoje abrigam lojas e sobre lojas, muitas delas abandonadas ou em péssimo estado de conservação.
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A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
Linha amarela
Estação da Luz
Pinacoteca
Ed. Prestes Maia
Rua Paula Souza
Área de intervenção
Acesso a 25 de março
Implantação Geral 118
Esc. 1:750
MORAR NO CENTRO
O Projeto está todo baseado nos alinhamentos existentes e na lógica de ocupação do centro de São Paulo. A implantação ao lado demostra bem esta questão uma vez que o alinhamento de todo o conjunto está associado ao já existente no centro de São Paulo através de um elemento vazado que funciona como uma espécie de pergolado correspondendo ao 3° pavimento, utilizado como área de convivência do Edifico residencial. Como pode ser observado o volume é recortado no miolo da quadra e com isso a iluminação no pavimento térreo, onde o uso são lojas e circulação, é natural. Assim como a iluminação a abertura também delimitou a circulação no 1° e 2° pav. como será analisado adiante assim como tornou-se parte do partido do projeto. 119
A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
Área de intervenção
Implantação com Planta de Cobertura 120
Esc. 1:500
MORAR NO CENTRO
O Projeto está todo baseado nos alinhamentos existentes e na lógica de ocupação do centro de São Paulo. A implantação ao lado demostra bem esta questão uma vez que o alinhamento de todo o conjunto está associado ao já existente no centro de São Paulo através de um elemento vazado que funciona como uma espécie de pergolado correspondendo ao 3° pavimento, utilizado como área de convivência do Edifico residencial. Como pode ser observado o volume é recortado no miolo da quadra e com isso a iluminação no pavimento térreo, onde o uso são lojas e circulação, é natural. Assim como a iluminação a abertura também delimitou a circulação no 1° e 2° pav. como será analisado adiante assim como tornou-se parte do partido do projeto. 121
A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
Planta do Pavimento Térreo 122
Esc. 1:500
MORAR NO CENTRO
O Térreo foi o pavimento que delimitou a conformação de todos os outros deste projeto. Possui uma forte ligação com o entorno. Para o entendimento da planta o primeiro ponto é analisar que existem 2 blocos de lojas e um no meio que funciona como circulação vertical. Na medida em que o bloco a direita “encosta” nos lotes existentes mantem o mesmo alinhamento como forma de manter a lógica de ocupação do centro e estabelecer harmonia na composição. Uma particularidade deste bloco é o rasgo que confere o estacionamento na Rua Florenço de Abreu e o acesso pela Av. Prestes Maia. Já o bloco a esquerda é solto do entorno e portanto, propõe um novo alinhamento com recuos mais generosos e com base na legislação atual. Esta conformação foi de extrema importância pois, aliado ao bloco de circulação vertical conferiu a circulação tanto publica quanto privada. Neste caso, a circulação publica, principalmente o fluxo da estação da luz a 25 de março foi priorizado. Com a implantação do térreo desta maneira existe há possibilidade de cortar caminho pelo interior do lote. O térreo é basicamente composto por lojas que podem ser dividas em diferentes tamanhos e adaptadas a diferentes momentos do Centro de São Paulo. O recorte no miolo da quadra permite que a luz natural entre na quadra e o local tornese mais agradável e claro. 123
A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
‘
1° e 2° Pav. – Centro de Capacitação 124
Esc. 1:500
MORAR NO CENTRO
Estes dois pavimentos foram desenvolvidos de acordo com o estudo realizado sobre os movimentos de moradia e a sua lógica de ocupação. Salas de aulas foram desenvolvidas para serem administradas pelo MSTC – Movimento Sem Teto do Centro – que hoje coordena a ocupação do Ed. Prestes Maia, na frente do lote em questão. Estas salas visam atender a demanda do movimento no que se refere ao ministro de aulas como: Alfabetização de adultos, reforços escolares, inglês, computação e etc. Porém, o mais importante para o movimento se refere aos espaços reservados para assembleia e reuniões onde o objetivo é explicar qual a força da população em uma ocupação e quais são os seus direitos em relação a moradia. Estas salas de aulas e assembleias são premissas para os movimento de moradia e de suma importância para a luta por moradia, Todo o pavimento é livre sendo que hoje são salas de aulas porem, conforme a necessidade do edifício pode vir a ser modificado para diferentes usos. A circulação é feita para dentro da quadra, delimitada pela abertura na laje sendo este, o mesmo que confere iluminação natural ao térreo. Todo o limite externo é em guarda-corpo. 125
A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
3° Pav. – Área de Convivência Residencial 126
Esc. 1:500
MORAR NO CENTRO
A transição estética do prédio ocorre neste pavimento onde o projeto deixa de estar associado aos lotes do entorno e passa a ter uma característica de edifício lamina que confere a parte residencial. A transição estrutural também é realizada neste pavimento. Este pavimento é de acesso privado tendo como uso a área de convivência do prédio. O que é importante é que este pavimento tem a função chave de alinhamento. É a conformação deste que permite a amarração entre os novos e antigos alinhamentos. 127
A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
Planta do 4/8/12° Pav. – Habitacional 128
Esc. 1:500
MORAR NO CENTRO
Os pavimentos habitacionais se estabelecem em um conjunto de 4 andares que se repetem 3 vezes completando 12 pavimentos. Um pav. é de apartamentos térreos e os outros 3 são duplex sendo a circulação feita pelo pavimento intermediário. O sistema de encaixe possibilitou um maior aproveitamento do sistema e um maior número de unidades. O Encaixe das tipologias como pode ser observado ao lado corresponde em módulos de 4x6 metros que se ligam 2 ou 3 vezes, tanto nos apartamentos térreos quanto nos duplex. No que se refere aos números das unidades: Lajes térreas (780 m²) – 3 pavimentos 21 apto de 53.20m² x 2,5 pessoas=53p 18 apto de 35.10m² x 3,5 pessoas= 63p 13 apartamentos por andar térreo. Total parcial de 39 apto e 116 pessoas nos apartamentos térreos. Lajes Duplex – 9 pavimentos 120 apto x 3,5 pessoas=420 pessoas TOTAL DE 159 UNIDADES 536 PESSOAS
Sistema de Encaixe das Tipologias
As unidades foram criadas para serem destinadas a população de baixa renda e incluídas na categoria HIS 129
A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
Planta do 5/9/13° Pav. – Habitacional Esc. 1:500
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Planta do 6/10/14° Pav. – Habitacional Esc. 1:500
MORAR NO CENTRO
ESQUEMA DO CORTE E DO ENCAIXE DAS TIPOLOGIAS Esc. 1:200
Ao lado estão as plantas dos pavimentos que correspondem ao duplex. Vale lembrar que é um sistema de 3 pavimentos que se encaixam em um sistema alternado de Sobe e Desce no duplex. Desta maneira a quantidade de janela e ventilação dos apartamentos foi maior do que se todas as unidades fossem térreas. 131
A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
Planta do 7/11/15° Pav. – Habitacional Esc. 1:500
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Salão de Festa e Convivência – Habitacional Esc. 1:500
MORAR NO CENTRO
Tipo 01 – 35.10m² / tipo 02 – 53.20m² Esc. 1:200
Duplex Tipo Desce 03 - 17m² / Duplex Que Sobe Esc. 1:200
Duplex Que Sobe – 41m² Esc. 1:200
A Planta habitacional confere o último nível destinado a habitação e corresponde a parte do duplex que sobe. A outra planta se refere a área de convivência e área técnica do Edifício. 133
A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
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Corte AA
Esc. 1:500
MORAR NO CENTRO
A estrutura do projeto se comporta de duas maneiras. O edifício residencial tem uma modulação econômica de 4/6/4 no sentido transversal e 6/6/6 no longitudinal.
Corte BB
Esc. 1:500
A transição é estabelecida no pavimento de convivência da habitação onde pilares “pé de galinha” apoiam os pilares que descem do prédio residencial e, deste pavimento em diante a modulação é de 10/10. O uso referente a salas de aula com planta livre e o térreo com grande circulação exigem um maior distanciamento e generosidade nos vãos. 135
A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
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Elevação Rua Prestes Maia
Esc. 1:500
MORAR NO CENTRO
Quanto as elevações é importante ressaltar que está ficou definida conforme as tipologias se encaixaram. A elevação da Rua Prestes Maia é a principal e notase a grande quantidade de janelas e as diferentes tipologias pela própria conformação dos caixilhos.
Elevação Rua Paula Souza Esc. 1:500
A elevação da Rua Paula Souza é uma empena cega com parede ventilada. 137
A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
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Elevação Rua Florenço De Abreu Esc. 1:500
MORAR NO CENTRO
Corte CC
Esc. 1:500
Este Ăşltimos dois desenhos finalizam os desenhos tĂŠcnicos e demostram a forma como o projeto se estabelece no terreno e a forma como foi relacionado com a cidades. 139
A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
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MORAR NO CENTRO
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A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
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MORAR NO CENTRO
9.2. Arquitetura na Construção “A boa arquitetura tem caráter emancipatório e papel fundamental na promoção da qualidade de vida e desenvolvimento humano” (FERREIRA, 2012, pag. 30).
O centro de São Paulo possui uma lógica de ocupação própria que, está enraizada no tempo e faz parte de um marco no desenvolvimento arquitetônico da cidade. Desta maneira, o edifício em questão, também procura respeitar esta
lógica de não ser uma arquitetura de cenário e sim um edifício que é contemporâneo e, atende às necessidades do homem no tempo. Ao mesmo tempo, se estabelece no terreno sem agredir o entorno, sem produzir uma arquitetura de cenário e foi concebido, respeitando esta
lógica do centro de São Paulo. As questões ditas acima foram responsáveis por definir a estética utilizada no desenvolvimento do projeto que, de certa maneira se deu de maneira linear e espontânea buscando manter e exaltar a relação das pessoas com o espaço. Esta preocupação se deu em níveis públicos e privados, buscando integrar as duas esferas e as diferentes classes. Desta maneira, o projeto não está voltado para o interior do terreno e sim
para a Cidade, fazendo parte desta e agregando-a valores ligados ao respeito das diferentes formas de circulação.
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A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
A estética, também limitada à forma como a arquitetura no centro é característica, não poderia ser implantada de maneira diferente. As diferentes tipologias propostas tem por base a real viabilidade de classes diversificadas permanecerem no mesmo espaço, assim como as diferentes formas de formar uma família e de suas necessidades. Os diferentes usos também acompanham a lógica onde a potencialidade do multiuso é enaltecida e propõe uma relação harmônica entre a permanência e a passagem, permitindo que está se confunda e se altere, dependendo daquele que a utiliza. É um projeto feito para pessoas e ocupado por estas que possuem vontade própria e definem a melhor forma de circular no edifício. Um dos marcos estéticos do projeto é definido pelo próprio fato de ser multiuso, sendo assim, os diferentes usos foram utilizados para demarcar a fachada do edifício. Distinguem-se claramente os pavimentos de circulação e lojas, salas de aula do centro de capacitação e habitação. Para tanto, estes usos foram demarcados com a lógica de sua implantação. O edifício habitacional possui diferentes tipologias demarcadas na fachada, através da utilizando de um elemento – o caixilho. Por tal situação, é possível que as pessoas que aí moram, reconheçam o seu apartamento facilmente da rua, dando a este uma característica de “individualidade” incomum em apartamentos, onde todas as plantas são iguais. Da mesma forma, o eixo de circulação vertical é um elemento que se destaca, como forma de valorizar o que também é público. 144
MORAR NO CENTRO
A área encontra-se no nível mais baixo do Centro de São Paulo e, por tanto, possui uma vista privilegiada de toda a extensão e das diferentes formas arquitetônicas expressas nos edifícios da região central. Esta vista privilegiada é a área pública definida de acordo com este elemento assim como uma arquibancada, a 15 metros do nível da rua foi proposto, como forma de permitir a contemplação. O terreno ao lado que, encosta a sua empena cega no terreno em questão, foi incorporado ao projeto com apoio à galeria que, será utilizado como painel de projeção de cinema e de painel de grafite, realidades vividas e exigidas pelos moradores e admiradores do centro de São Paulo. A relação do centro com a arquitetura particular nele existente, assim como a sua forma peculiar de circulação e de implantação foram fundamentais para o desenvolvimento deste projeto e buscam atender a demanda existente no centro, mas, principalmente propor áreas que extrapolem a relação do público e do privado e proporcionem diferentes relações de circulação e convivência.
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A OCUPAÇÃO DOS VAZIOS COMO ALTERNATIVA
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MORAR NO CENTRO
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