Isabela. Biografia de um cão.
1- O começo Alguns amigos são tão especiais na vida da gente que depois que partem deixam além da saudade, um vazio enorme. Os cães são sem sombra de dúvida, os melhores amigos que temos. Eu passara por aquela rua todas as tardes, era o meu caminho para a padaria. Um dos melhores lugares entre tantos, para comprar pães e bolos perto de casa. Aquela seria mais uma tarde comum, se não fosse por uma cena que eu jamais esqueceria e que marcaria a minha vida para sempre. Numa das casas da periferia onde vivíamos havia uma casa com um pátio enorme na frente com grama alta, cerca de madeira e portão sempre aberto para traz. Naquela casa um garotinho brincava com uma filhote amarela de mais ou menos dois meses. Desajeitado, aquela criança não sabia brincar com o cão, pois as vezes as brincadeiras dele pareciam meio brutas. Juro que tentei não me importar mas no fundo sabia que não iria esquecer aquela cena tão facilmente. Aquelas pessoas jamais tiveram um cão ao qual realmente se dedicassem e cuidassem de verdade. Todos os animais que eu havia visto ali até então e posteriormente também, sempre andavam na rua, sarnentos, magrelos, com fome, sede, sem casinha, cuidados.. Definitivamente aquelas pessoas não seriam bons donos para animal nenhum neste mundo. Eu nem poderia sonhar em adotar mais um cão, já tinha treze cães em casa e para alguém que sobrevivia de trabalhos temporários, ficaria difícil adotar mais uma boquinha. Pra ajudar, nossos vizinhos sempre que podiam, largavam animais em nosso portão como se nossa casa fosse terra de ninguém. Sempre tivemos amor aos animais mas tem pessoas muito sem noção da coisas. Alguns dias mais tarde uma agente de saúde do posto e amiga da família à muitos anos veio nos visitar, uma visita de rotina para saber como estava a saúde de minha mãe (com quem eu morava) já que ela tinha vários problemas. - Meninas! Vou entrar de férias!! Disse ela com um sorrisão nos lábios. E logo em seguida comentou: - Uma das minhas colegas de trabalho do posto quer adotar um cachorro. Vocês não sabem de algum cachorro que esteja para adoção?? Realmente eu não sabia. Mas fiquei de informá-la caso soubesse de algo nesse sentido. Ela se despediu e eu fiquei ali, pensando no assunto.
2- O encontro Dias mais tarde fazendo o mesmo caminho para a padaria passei pela casa de uma amiga, protetora de animais e ficamos ali conversando na cerca por vários minutos. Ela era protetora à muitos anos e conhecia muito bem cada pessoa daquela vizinhança, sabia de tudo o que ocorria e conhecia muita gente, muitos cães, muitos gatos.. Conversar com ela sempre foi muito bom e muito instrutivo. Ela cuidava dos cães dela naquela casa que na verdade pertencia ao cunhado dela, que vivia em outra cidade, ela não morava ali, mas morava próximo daquele local. Mas todas as tardes ela estava ali cuidando dos animais, limpando a casa.. E era ali que muitas vezes a gente se encontrava e conversávamos por horas. De repente falei sobre a cachorrinha amarela que havia visto outro dia no pátio daqueles vizinhos; foi então que ela me disse: - Aquela cachorrinha anda na rua catando comida, nem água eles dão, tadinha! E aquela pretinha com filhotes que você viu no outro dia, também é deles. Está sempre grávida, é uma cria atrás da outra. Eles não cuidam de nada, são uma gente relaxada com os bichos, precisa ver! É uma pena! Mas aquela cachorrinha amarela que eles ganharam, se ninguém adotar, vai ter o mesmo destino dos outros.. Vai andar na rua passando fome. Naquela hora eu soube que não seria bem assim. Só não sabia que o destino dela não seria bem aquele que eu estava imaginando. - Pode deixar! Eu disse. - Essa eu vou roubar e levar para uma amiga que tem uma colega que quer adotar um cachorro. Tenho certeza de que ela irá adorar! Sim, naquele dia eu me transformaria numa ladra de cachorros mal cuidados. Ainda bem que certos planos não dão certo como nós planejamos. Fiquei de vigiar aquela casa sempre que passasse em direção à padaria e na primeira oportunidade, iria levar a cachorra embora. Pelo menos eu tinha certeza de que ela seria bem tratada, teria um lar de verdade e não passaria necessidade. Num dia de chuva eu estava á caminho da padaria no horário de sempre para comprar pão, ao passar pela frente da casa, não vi a filhote amarela no pátio. Fiquei imaginando onde ela estaria. O portão como de costume, estava aberto para trás mas nem sinal da cachorrinha. Não demorou muito e antes que eu dobrasse a esquina avistei ela na rua, procurando comida, pulando uma pocinha dágua. Quando vi aquela coisinha amarela, tão linda, indefesa ali na minha frente, não tive dúvidas. Abaixei bem devagar e a chamei. Ela me olhou com aquela carinha tão linda de bebê, parou por um instante, negaceou, deu três passinhos em minha direção e pulou em meus braços. Foi amor à primeira vista. Aproveitei a ocasião e levei ela para minha casa, nem lembrei de ir á padaria. Mostrei ela para a minha mãe e menti que alguém havia dado ela para mim, pois caso minha mãe soubesse que ela era de rua , talvez eu tivesse que devolver para o mesmo lugar onde á encontrei. Também jurei que havia pego ela para encaminhar para adoção para que minha amiga levasse ela para a colega que queria um cãozinho. Porém lá no fundo, eu queria ela para mim. Dias mais tarde minha amiga nos visitou e ao saber das novidades sobre a cachorrinha ela disse que a amiga dela não queria um cachorro de rua pulguento, ela queria um cachorro limpinho do pet shop, de raça e pequeno. afff Que amiga mais chata essa dela. Ora!! Onde é que já se viu isso?? Que preconceito é esse? Amigo não tem pedigree.
Lamentei a notícia e jurei pra minha mãe que a cachorrinha seria adotada, até lá ganharia um nome provisório: Isabela (Bella ou Belinha) para os íntimos. ;) Minha mãe não gostou muito da história, pois já tínhamos treze cães e mais um no orçamento não sairia nada barato. Porém não falou mais no assunto.
3- Finalmente em casa A Isabela era o centro das atenções, dormia numa caixinha de papelão no meu quarto, ao lado da minha cama, fazia pose pra fotos (ela se prestava para isso) e adorava brincar com tudo: sapato, chinelo, jornal, potinhos... Ela não era muito fotogênica, mas para mim isso não tinha a menor importância. Também não era muito de latir, mas adorava pular, brincar e morder tudo o que via pela frente. Em 2010 entrei numa escola para fazer um curso técnico e levei as fotos da Bella para a professora e os meus colegas verem. Eles ficaram encantados. Ela era muito bonita e à medida que crescia, ficava ainda mais encantadora. Ela era uma cachorra grandalhona, tinha patas enormes e era meio desajeitada, mas muito linda. Nós passamos ótimos momentos juntas. Eu adorava acordar e ir brincar com ela. Mesmo ela querendo morder meus dedos o tempo todo. Depois que a Bella cresceu um pouco, dei a casinha do Sansão para ela. O Sansão era um de nossos cães, grandão e de pêlo caramelo que alguém teve a capacidade de desmamar e jogar ele junto com seu irmão, com dias de vida e olhos ainda fechados, numa caixa de papelão dentro do nosso pátio. O irmão dele morreu dias depois e ele, o Sansão durou 7 anos. Infelizmente ele era epilético e por mais cuidados que tivéssemos, ele tinha uma saúde frágil. Vindo a falecer dia 28 de Dezembro de 2009. A Bella era carinhosa e brincalhona, sempre se deu bem com todos os nossos cães e gatos. Desde a infância sempre tivemos cães e gatos em nossa casa, não tantos como atualmente, mas eles sempre estiveram presente fazendo a alegria do ambiente. Eu sou louca por animais, não sei viver sem tê-los em volta de mim. A Isabela não era mais uma, ela era única, dócil, brincalhona, sempre pulando feito um grilo... linda. Ela ficou algum tempo no pátio, na frente de casa, mas depois por ela ser brava e mostrar os dentes para as pessoas que chegavam no portão, mudei ela com casinha e tudo para o pátio, nos fundos da casa, embaixo de um pé de árvore onde ela pudesse dormir á sombra. Meu sonho sempre foi construir um canil, mas com pouco espaço e pouco dinheiro, nada foi feito.
4- Refletindo É engraçado o modo egoísta como algumas pessoas pensam. Elas olham para você, vêem que você trabalha de dia pra comer á noite, mora numa casa simples, tem dois ou três cães no pátio. Mas na primeira oportunidade de jogarem a responsabilidade de mais três, quatro, cinco cães na sua porta para você cuidar, o fazem sem pensar e sem perguntar se você tem condições , se precisa de alguma ajuda, dinheiro, ração, casinhas... Muitas vezes deixamos de comprar comida, para comprar remédios, ração.. Levar no veterinário. Tudo isso custa dinheiro! Nada vem de graça. Lembro de uma vez em que uma mulher veio no portão me chamar para conversar um pouco. Lá pelas tantas, no meio da conversa ela me disse: - Sabe? Minha sogra achou um cachorrinho na rua, com coleira e juntou ele para você, pois ela sabe que você adora cães de rua. Fiquei pasma! Quase nem consegui responder que não poderia ficar com ele. Imagina!! Ela não tinha mais que um cão no pátio, por que eu que tinha treze precisava juntar mais??? Será que essas pessoas não param pra pensar que é mais uma boquinha pra sustentar? Se era difícil para ela que tinha apenas um, imagina para mim, que tinha um batalhão! Mas, hein? Quem falou que eu adoto cães de rua?? Muitos dos cães que estiveram e ainda estão aqui em casa foram largados de caixa, na frente do meu portão, como se aqui funcionasse algum tipo de abrigo. Muitos consegui doar, mas outros, os que não morreram criei-os, mesmo sem muitas condições. Deveria ser notória minha cara de espanto. Por que as pessoas não largam em meu portão alguns sacos de ração? Algumas casinhas? Só pra variar!! Ou mesmo algum dinheiro para as despesas com veterinários? Ou será que elas acham que tudo isso sai de graça? Que obrigação eu tenho de cuidar dos animais que dão cria no pátio de pessoas irresponsáveis que não vacinam ou não castram seus animais?? Por acaso eu sou parente dessas pessoas? Devo favores à elas?? Nós nunca pensamos em ter tantos cães, mas aqueles que temos sempre lutamos muito para cuidar, amar e proteger da melhor forma possível. E a gente não junta cães de rua. Muitos dos cães que tínhamos e temos ainda, alguns nasceram aqui e outros, infelizmente vieram de mala e cuia largados por criaturas irresponsáveis e totalmente sem noção. A Isabela foi uma exceção à regra.
5- Vivendo um dia por vez A Isabela era carinhosa, companheira e feliz. A casinha do Sansão que eu havia dado pra ela, durou pouco e começou a apodrecer, logo ela estava sem casa para se abrigar da chuva. Justamente no meio do inverno de (2011) a casinha dela veio abaixo e ela passou a noite inteira sentada na chuva, sem dar um latido. Foram vários dias em que ela tomou banhos de chuva por que não tínhamos dinheiro para comprar uma casinha para ela e não tínhamos onde abrigá-la da chuva, pois nossa casa quando chovia, enchia de água com lama e não podíamos fazer nada, também. Eu precisava urgente de um emprego. Passados alguns dias, chegou meu cartão de crédito pelo correio, aproveitei a oportunidade e corri para a loja mais próxima e parcelei uma casinha pra Bella em diversas vezes. Nunca vi ela tão
feliz com algo como ficou com aquela casinha de plástico. Ela dormia direto lá dentro, nem dava mais bola pra sombra da árvore que tanto havia lhe abrigado do calor do sol, no verão. Ela cresceu muito rápido, de um bebê grandalhão e fofo se transformou em uma cachorrona de latido forte, patas grandes, atitudes desajeitadas. Chamava a atenção pela beleza e pelo porte majestoso. Todo mundo se encantava com a grande Isabela. Ela era amiga de todos os animais, cresceu brincando com os gatos e também com alguns de nossos outros cães. Consegui emprego como executiva do Avon em Agosto de 2011, o salário não era fixo, nem tinha carteira assinada, nem pagavam INSS ou coisa do tipo, ou seja: (sem nenhum vínculo empregatício), porém trabalhava-se com metas. O salário era sempre uma surpresa e variava muito entre: R$ 250,00, R$180,00, R$ 112,00, R$ 65,00.. Nessa época eu ficava fora de casa a maior parte do meu dia, prospectando e cadastrando novas revendedoras, auxiliando as revendedoras de minha equipe, vendendo pronta entrega e resolvendo diversos outros pepinos da profissão. Eu tinha uma equipe com 60 revendedoras e o trabalho era árduo. Tanto por telefone, de porta em porta ou por e-mail eu precisava ir e fazer o que era necessário. Crescer a equipe e ainda sair pra revender não era tarefa fácil. Minhas vendas caíram muito nesse tempo. O que me dava ânimo e me motivava era chegar em casa e ver a alegria de meus cães. A Isabela pulava, grania.. Era uma felicidade só. Todos os dias a minha rotina era sempre a mesma: acordar e ir direto dar comida e água para meus cães e gatos para então tomar banho, tomar café e sair para o trabalho. Eu não havia trabalhado fora de casa em nenhum momento da minha vida, aquele era meu primeiro emprego fixo e embora eu não tivesse experiência na área a ajuda das gerentes e das outras executivas foi essencial para que eu aprendesse depressa o que eu tinha que fazer e como fazer. Eu adorava aquele trabalho.
6- Dias complicados As coisas em minha vida sempre aconteceram fora de época. Terminei meus estudos e passei a trabalhar em serviços temporários, as vezes ganhando bem, noutras ganhando pouco.. Teve uma época em que comecei a revender cosméticos para ajudar no orçamento da casa. Nem sempre ajudava, pois muitas pessoas compravam e não pagavam, esqueciam as dívidas e eu precisava usar o lucro de 30% e adicionar mais alguma quantia (geralmente emprestada), para pagar a dívida dos perfumes que elas tiravam de minhas mãos, mentindo que pagariam tal dia. Muitas dessas pessoas se perfumavam e se embelezavam ás custas da comida de nossa mesa. Outras queriam sempre os 30% de tudo o que compravam e eu acabava trabalhando de graça e não ganhava nada com a venda dos cosméticos. Aqueles eram realmente tempos difíceis. Sou partidária da seguinte frase: "quando a gente não tem dinheiro, não devemos fazer compras", principalmente de coisas que não são de primeira necessidade. As pessoas como eu, que vendem cosméticos, vende por que precisa daquele dinheiro. Não se vende cosméticos por esporte. Esse é um trabalho como qualquer outro. Só eu sei quantas vezes precisei de dinheiro para pagar as faturas e as pessoas me deviam,
passavam por mim na rua e não vinham me pagar. Definitivamente eu estava ficando bem cansada daquela vida de miséria. Terminei meus estudos e alguns anos mais tarde entrei em um curso técnico que ficou pela metade por falta de recursos. Então juntei com muito custo algum dinheiro e paguei um curso à distância para poder enfim terminar meus estudos. Cursos á distância são bem mais baratos, mas isso não significa que o empenho deva ser menor, muito pelo contrário. É aí que a gente precisa se dedicar.
7- As provações No dia 27 de Janeiro de 2012 ao dar comida e água para meus cães notei que a Isabela estava estranha. Parecia assustada, arredia, por horas dava a impressão de não estar vendo direito.. e começou a ter medos absurdos dos meus carinhos, se esquivava.. Naquela hora fiquei chocada e estranhei a atitude dela. Não compreendia o que se passava. Alguns dias atrás a Madonna uma cachorra de pêlos vermelhos e baixinha, havia se soltado e como ela sempre foi briguenta resolveu brigar com a bobona da Bella. Foi uma briga horrível! Sempre mantive presos os meus cães justamente por esse motivo. Por serem muitos e não se darem tão bem, precisava sempre estarem presos. A Bella não era de brigar, desistiu da luta logo em seguida, mas a Madonna com os olhos vermelhos de raiva não largava o pescoço da Bella. Precisei intervir e separar a briga, joguei água gelada na Madonna mas ela se esquivou e dei um banhão na Bella. Não sei se isso causou algum problema na Belinha.. Naquele dia em que notei a Bella toda estranha fiquei apreensiva e durante o tempo em que fiquei em casa tentei várias vezes chamá-la, acalmá-la, fazer cafuné. Mas ela se mostrava arredia e estranha querendo á todo momento entrar em sua casinha. Naquele instante meu coração batia desenfreado, meu sangue gelou nas veias e eu sabia que algo não ia bem. Temi pelo pior. Era uma Sexta-feira, eu tinha uma reunião marcada com a gerente do Avon, na casa dela.. Mas na hora eu não pensava mais em nada. A Bella era mais importante que tudo naquele momento. Corri dentro de casa, vasculhei minhas coisas e encontrei em meio à receitas de vários veterinários a de uma clínica bem no centro da cidade que tinha tele-busca. Na hora nem o nome da clínica eu sabia dizer, tanto era o meu nervosismo. Geralmente entro em pânico e perco a noção de tudo quando algo de ruim acontece. Liguei para o primeiro número que encontrei na frente e logo marquei a consulta para a primeira hora á tarde. Naquele momento eu estava assinando minha carta de demissão do Avon cosméticos como executiva e teria o ódio eterno da nova e substituta gerente do Avon, naquela época. Quando entrei para ser executiva a gerente estava grávida e logo saiu de licença maternidade deixando em seu lugar uma outra gerente que também dois meses depois saiu pois conseguiu se estabelecer como gerente na cidade em que residia, deixando em seu lugar uma outra gerente de setor. E foi com esta que a equipe de vendas da Avon trabalhou durante algum tempo. Voltei aos fundos do pátio peguei a Isabela em meus braços e levei-a para frente da casa, próximo do portão. Deixei-a deitada embaixo de um enorme pé de Ingá
sempre rezando para que não fosse nada grave.. Mas algo dentro de mim estremecia e dizia que não seria bem assim. A Isabela e eu sempre tivemos uma ligação muito forte. Eu sempre sabia quando ela não estava bem, mesmo quando o seu problema era apenas uma dor de barriga. Notei que ela estava ficando boba das pernas, caminhava e caía sentada. Fiquei aterrorizada quando vi a cena dela tentando dar uns passinhos. Meu coração queria sair pela boca. Meus olhos não acreditavam naquilo que viam e eu queria crer que tudo não passava de uma miragem. Eu não queria acreditar naquilo que estava diante de mim, era terrível demais! Aquela cachorra linda e forte que adorava pular e brincar, do nada, estava ficando paraplégica. Não era possível!
8- Na clínica, a primeira consulta O tempo parece uma eternidade quando temos pressa ou quando o sofrimento se anuncia. O tele-busca parecia demorar séculos. Levou 1h e 45min para chegar o carro que levaria a Bella para a sua consulta com a veterinária. A Isabela nunca havia viajado de carro para lugar algum, nem mesmo dentro de uma gaiola, no exato momento em que ela percebeu que a gaiola servia para levá-la a algum lugar, logo tentou em vão, fugir. Mas como ela já não estava conseguindo mais ficar em pé sem fazer um esforço enorme, não fez mais do que se arrastar. Meu coração estava partido, com jeitinho e ajuda do rapaz do tele-busca colocamos a Isabela na gaiola e lá fomos nós para a consulta agendada. Durante a viagem tentei esconder meu nervosismo o máximo que pude, tagarelando sem parar sobre o estado de saúde da Bella. Ela parecia tensa na gaiola, na parte de traz da van. Queria à todo pano sair de dentro daquele lugar onde ela mal cabia. Várias vezes virei-me para traz para conversar com ela, alisar seu pêlo na esperança de tentar consolá-la que tudo seria bem rápido e logo estaríamos de volta á casa. Ao chegarmos na clínica retiramos ela da van e em seguida da gaiolinha e colocamos ela deitada na grama á espera de sua hora de atendimento. Em poucos minutos a veterinária veio e eu peguei a Bella e levamos ela para a sala de consulta. A veterinária fez diversas perguntas e pediu um teste de detecção de cinomose. O teste foi feito na hora (daqueles testes de caixinha). Enquanto aguardávamos o resultado fiquei ali, rezando para que desse negativo. Minhas preces foram ouvidas e o teste deu negativo, graças a Deus. Ainda na clínica tive que ouvir um sermão da médica veterinária sobre vacinas pra cinomose, arquiliose.. vacinas essas, que eu deveria dar em meus cães ao menos uma vez ao ano para prevenir essas e aquelas doenças. Vacinas que custam em torno de R$ 65,00 reais a dose. Ou seja: imagina eu, que na época tinha 14 cães. A conta exata daria: 14 x 65 = R$ 910,00 reais. De onde eu tiraria tanto dinheiro assim??? Talvez se eu deixasse de comer durante uns três meses a fio, eu pudesse pagar isso em vacinas para todos os nossos cães. Para quem na época ganhava menos da metade de um salário mínimo (não fixo), era uma verdadeira fortuna! Uma fortuna que meus pobres peludos amados, nunca tiveram. Não por falta de vontade, mas por falta de dinheiro mesmo. Até a ração a gente comprava da mais barata. E olha que a mais barata era em torno de R$ 33,00 o saco de 25kg. Eram 7 sacos de ração todos os meses. Naquela hora fiquei pensando que julgar os outros é muito fácil. Fiquei ali parada em silêncio, ouvindo todo aquele discurso e me sentindo a dona mais fracassada da face da terra. Naquele momento percebi que o dinheiro faz tanta falta, quanto o
amor na vida da gente. Enfim, a veterinária passou-me a receita dos remédios para babésia, uma vitamina B12 e uma injeção de dose única para a doença que até aquele momento nem a veterinária sabia ao certo de que se tratava. Paguei com cartão de crédito, lógico. Nessas horas o dinheiro de plástico ajuda um monte. Isto foi numa Sexta-feira.. Chamei um táxi coloquei a Bella na minha frente sentadinha no chão, com a cabeça sobre meus joelhos e viemos embora. Ao chegar em casa tive trabalho para tirar ela de dentro do táxi mas enfim consegui pegá-la e levá-la até a frente da casa e acomodá-la embaixo da sombra do ingazeiro confortavelmente em cima de umas folhas de papelão das minhas caixas do Avon.
9- O tratamento Comecei logo em seguida a seguir à risca seu tratamento. A vitamina era de 12 em 12 horas e o comprimido também, nesse mesmo espaço de tempo. Notei que a Isabela fazia muito esforço para ficar em pé nas patas traseiras e tentava em vão dar dois passinhos, caindo em seguida, sentada no chão. Ela se esforçava o máximo que podia, tentava de tudo mas mal saía do lugar. O máximo que ela conseguia era ficar ofegante. Não era nada fácil para mim ver aquela grandalhona que criei com tanto carinho, sofrendo daquele jeito. Eu queria arranjar um modo de curá-la mas não sabia como, nem o que deveria fazer. Nessas horas a gente se sente impotente diante das doenças e da vida. Fiquei arrasada ao vê-la se esforçando em vão. Muitas vezes nessas horas, eu ia até ela pegava e tentava ajudá-la a caminhar, a dar no mínimo três passos que fossem. E nós duas fazíamos exercícios para tentar fortalecer suas patas. Porém eu sempre ficava cansada e ela também, afinal não é todos os dias que precisamos ajudar um cão de 22kg a voltar andar. Porém parecia que nada adiantava, era inútil todo aquele esforço e tempo perdido. Eu não sabia mais o que fazer. Esperar que o tratamento surtisse o efeito era a única coisa que me restava. No Domingo, notei que a Isabela não demonstrava qualquer tipo de melhora, o quadro se agravava cada dia mais. Decidi então levá-la em outra clínica, não poderia mais deixá-la assim, sofrendo daquele jeito. Na Segunda-feira fui trabalhar pela manhã com prospecção na frente de uma loja. A gerente já havia combinado conosco naquele local específico. Fui de carona com uma de minhas colegas de trabalho. Por mais que eu tentasse, eu não conseguia parar de pensar na Isabela. Eu havia dado comida e água limpa para ela, mediquei-a e deixei-a sentada em cima de umas folhas de papelão bem ao lado da casa, na sombra. Era Janeiro, o forte do verão, mas ali a Bella ficaria bem. Só tinha um detalhe que depois que estávamos no meio do caminho foi que me lembrei, as 11:30hs começa a dar sol daquele lado da casa e era justamente ali que eu havia deixado o meu bichinho. Como nós voltaríamos cedo não fiquei tão preocupada. Naquele dia, por mais que eu tentasse, eu não conseguia me concentrar no trabalho, eu não estava ouvindo o que as pessoas diziam e por conseqüência não falava coisa com coisa. Meu coração estava apertado e doía demais. Eu tinha a sensação de que nada fazia sentido. A preocupação pelo estado de saúde da Bella estava me consumindo. Eu queria sair depressa dali, queria que o tempo passasse rápido para que eu pudesse voltar para casa e ver como a Bella estava.
10- O desespero Minha chefe naquele dia estava muito chateada, por que na Sexta-feira algumas colegas e eu não havíamos comparecido à reunião que ela havia previamente marcado em sua casa. Eu não fui e não consegui avisar e as explicações que eu dei naquele dia, foram apenas coisas sem sentido pois minha preocupação e meus pensamentos estavam focados em casa, mais precisamente na minha cachorra. Ao se aproximar as 11:30hs eu já estava aflita para vir para casa. Pois havia me lembrado que daquele horário em diante bate o sol naquele local e a Bella estaria em apuros debaixo do sol forte sem poder caminhar, sem poder correr para a sombra mais próxima. Daquele momento em diante eu já não raciocinava mais, não lembro o que eu disse, o que fiz.. Minha razão foi embora e minhas emoções estavam á flor da pele. Finalmente entrei no carro com minha colega e viemos embora, apenas alguns minutos de casa mas para mim, pareceram longas horas na estrada. Chegamos em casa às 12:30hs. Saí do carro correndo feito uma louca, achava em meus pensamentos aflitos que a Bella pudesse estar desmaiada, morta.. Nessas horas a gente pensa coisas horríveis. Era a consciência culpada me acusando sem dó. Cheguei ao portão gritando: - Bella! Bella! Cadê a filhota da mamãe?? Era o desespero que tomava conta de mim. Espichei o pescoço para dentro olhando rapidamente na direção em que a havia deixado e lá estava ela, alguns centímetros longe do local exato. Com o calor ela havia tentado se arrastar para longe do sol. Ofegante e de língua de fora, arfando de calor.. derretendo no sol de 30º. A me ver começou a gritar, fez um esparramo. Queria correr, pular e não podia, tentou se arrastar um pouco abanando a cauda como um leque de tanta felicidade. Entrei feito um raio portão adentro, abracei a Bella me sentindo culpada por tê-la deixado num local que dava sol e aliviada ao mesmo tempo por ela estar bem, arrumei seus papelões embaixo da sombra do Ingazeiro, peguei a Bella no colo quase morrendo de remorsos e coloquei-a sentadinha debaixo da árvore para se refrescar á sombra. Fiquei uns minutos ali me punindo por ter sido tonta. Dei água limpa e fui em seguida despedir-me de minha colega que havia ficado no carro. Daquele momento em diante resolvi priorizar a razão da minha vida: a minha família e em especial a Isabela. Ela precisava de mim mais do que nunca.
11- Em outra Clínica, outro diagnóstico As 13:00hs daquele mesmo dia, uma vizinha veio até o portão e conversamos um pouco sobre a vida, o tempo e também o problema de saúde da Bella. Então ela nos indicou uma clínica na Morada do Vale I, me deu o número e disse que eu ligasse o mais rápido possível. Fiz isso imediatamente, marquei com eles a consulta e a tele-busca para as 15:00hs daquele mesmo dia. Esse era o melhor horário que eles tinham disponível naquele momento.
No horário marcado o motorista da van estacionou em frente de casa, era o rapaz da clínica. Olhei para ele com a caixa de transporte na mão e pensei: - Finalmente uma clínica com caixas para transporte de animais de grande porte. Como no outro dia, a Bella deu trabalho para entrar dentro da caixa de transporte. Mas com jeitinho ela acabou cedendo. Entramos na van e lá fomos nós rumo á primeira consulta dela nessa nova clínica. Em menos de 30 minutos chegamos ao local. Um ótimo lugar, bem localizado, uma clínica de porte médio, muito bem equipada com farmácia e serviços de pet shop e hospedagem. Os funcionários eram bem atenciosos, sorridentes e o lugar era agradável e bem estruturado. Em menos de 10 minutos a veterinária veio nos atender e nos levou para seu consultório. Ela fez a ficha da Bella, examinou-a fora da caixa, verificou a febre, coletou sangue para exames e passou medicação para cinomose e algumas vitaminas. E em dez dias ela queria ver a Bella novamente, mas antes no dia seguinte eu deveria ligar para saber o resultado dos exames de sangue. Depois da consulta, com as receitas na mão, dirigi-me para a farmácia da clínica onde comprei todos os remédios que a Bella iria precisar. Entramos na van e voltamos para casa. Na chegada, ao descer da van, retiramos a gaiola e ela já se esforçava para sair por si mesma, se arrastando. Ajudamos ela a sair e levei-a no colo até a sombra do ingazeiro. Em casa a Bella começou seu novo tratamento. A médica em todo momento achou que a doença da Bella era cinomose e não babésia como achava a primeira veterinária que a atendeu na outra clínica no centro da cidade. A cada 12 horas a Bella precisava tomar seus remédios, suas vitaminas.. eram três qualidades de remédios ao todo. Naquele dia passamos o restante da tarde sem nenhuma novidade aparente. A Bella nem melhorava, nem piorava. No terceiro dia após a consulta, liguei para a clínica para saber o resultado dos exames de sangue. A veterinária que me atendeu disse que deu negativo o teste para cinomose e também o de babesia mas que eu deveria continuar com o tratamento pois esse era á princípio, o problema da Belinha. Estanhei. Mas como não sou formada em medicina veterinária e sou uma completa leiga nesse assunto, continuei cega com o tratamento na esperança de ver a Bella melhorar. Os dias foram passando e a Bella as vezes parecia melhorar e reagir bem ao tratamento, como sempre, comia e bebia água normalmente, arrastava-se e aos poucos tentava se levantar usando toda a energia de seu corpo, caindo logo em seguida exausta das tentativas fracassadas. Mas ela não desistia. Várias vezes ao dia eu limpava-a, pois ela se urinava toda, pois como ela não conseguia se levantar para fazer as necessidades, ficava suja. Preparei para ela um balde com água limpa, um paninho e sempre que ela precisava eu ia até lá e limpava-a, deixando ela o mais confortavelmente possível. Também comprei pomada para as assaduras, pois ela começava a ter escarras na parte de baixo da barriga, virinha e perninhas. Não somente devido á se arrastar mas pela própria urina que causava diversas feridinhas. Eu não conseguia esconder minha preocupação. De dia ela ficava na rua, á sombra de uma árvore na frente de casa, á tarde ficava na grama, ao lado da janela e á noite eu á trazia para dentro de casa para dormir na cozinha em cima de papéis e papelões.
12- Lutando pela vida Dia 1º de Fevereiro levei minha carta de demissão á reunião do Avon cosméticos e entreguei em mãos da gerente substituta, que á leu e aceitou numa boa a minha saída. Eu não poderia mais continuar, a Bella precisava muito de mim e eu não poderia atendê-la de modo satisfatório tendo que trabalhar o dia inteiro como executiva. Também não conseguiria cumprir com minhas funções com os pensamentos envolto em preocupações. Naquela tarde entreguei minha equipe com 80 revendedoras (minha equipe havia crescido) para a nova executiva, deixei com ela os novos cadastros para que ela fosse visitar, captar pedidos e estabelecer. Apresentei ás revendedoras que foram á reunião á sua nova executiva e deixei elas à par da minha saída. Em pouco tempo a nova executiva já estava mais que á vontade com a equipe e fazia o trabalho com desenvoltura e seriedade. Saí dali com a sensação de dever cumprido. Daquele momento em diante eu já poderia me dedicar única e exclusivamente à minha casa, à minha família e especialmente dos cuidados com a Isabela. Nada mais para mim importava, o mais importante era estar com ela o máximo de tempo possível. Não demorou muito e precisei voltar á clínica, um dos meus gatos por nome Amarelo ficou muito doente e levei-o para uma consulta para tratamento urgente. Ele ficou doente do nada, não fazia cocô, nem xixi e eu não sabia o que fazer com ele. O gato miava, miava, fazia buraquinhos, se espremia todo e nada... Marquei consulta e levei-o, porém chegou em óbito na clínica. Mas seja lá o que fora que ele tivesse tido não deu tempo para fazer nada por ele, nem um diagnóstico decente do problema. Mesmo correndo em cima do fato, nada pode ser feito. O Amarelo era o gato mais mimado da face da terra. Eu não sei criar os bichos sem estragá-los, é verdade. Encho-os de mimos e vontades e depois acabo criando "verdadeiros monstrinhos mimados". Lembro de várias vezes em que eu ia dar comida para eles e o meu gato estava sentado e ao me ver aproximar o danado se atirava no chão de barriga pra cima para ganhar carinhos. Coisa de cinema!! Era um vira lata amarelo gordo e sem vergonha, o gato. Senti muito a morte dele, principalmente por que não esperava perdê-lo tão cedo, ele tinha pouco mais de 1 ano de vida e era o xodó aqui de casa. Sinto saudades dele, de suas peripécias, seus miados, seu pêlo listado de amarelo. Saudades eternas. Fiquei arrasada! Temi naquele momento pela Bella que parecia responder muito pouco pelo tratamento, também.
13- Problemas á vista Eu estava sem computador em casa, sem créditos no celular para enviar os pedidos do Avon pela internet.. juntei umas moedinhas e fui á tarde numa lan house perto de casa para fazer meu pedido. Aquele dia de verão estava lindo, quente, com um solão de quase 40º graus á sombra. O calor era de derreter. Deixei a Bella na sombra e saí rapidinho. Lá estava eu na lan house digitando meus últimos códigos quando de repente o tempo vira,
o sol desaparece, as nuvens negras correm céu afora e o vento forte invade a lan house.. era chuva que vinha chegando com toda a força. Não deu tempo nem de pensar.. As gotas caíam pesadas fazendo um barulhão no asfalto. De sobressalto levantei da cadeira, a Bella estava na rua, pegando aquela chuva toda.. paguei a conta, e saí correndo da lan house. Cheguei em casa toda ensopada, olhei para o lado da casa onde não tem piso e lá estava ela feito um pinto molhado, encharcada até os ossos e puro barro, tadinha. Balançando a cauda de faceira pra mim. Chorei de ódio por ter deixado ela na rua, na chuva.. Mesmo sem saber que poderia chover, fiquei com ódio de mim. Que dó que eu senti de ver a coisa mais preciosa do mundo ali, toda encharcada, tremendo de frio. A Bella havia tentado se arrastar para se proteger da chuva, mas não tinha conseguido ir muito longe, estava ela no meio do pátio, com a barriga cheia de machucadinhos causados pela tentativa de se proteger. Peguei minha coisinha no colo, levei para dentro do banheiro e dei um banho morno nela. Ficamos ali embaixo daquela água quente por diversos minutos. Tirei ela de lá sequei-a bem com uma toalha e depois com o secador de cabelos. Deitei ela nos papelões na cozinha e ali fiquei um tempão alisando seu pêlo amarelo e macio, passando pomada em suas feridas e conversando com ela. Antes de dormir, todas as noites eu ia diversas vezes acariciar a Bella e conversar com ela em seu leito, no canto de nossa velha cozinha. Bella sinto saudades de nossas conversas. Dias mais tarde, armou-se o tempo para chuva, corri para a rua, peguei a Bella no colo e trouxea correndo para dentro de casa. Não era nada fácil caminhar com a Bella no colo, ela era uma cachorrona enorme de 22kg pesada e gordinha.
Á tarde fui no mercado perto de casa comprar uns alimentos para a Belinha, comprei ração, biscoitos, fígado de boi, comprei ração em pasta.. Tudo para que ela tivesse uma recuperação rápida. Um dos problemas de saúde da Bella era justamente anemia e eu sabia disso, então tentei de tudo para que ela melhorasse rápido. Á noite ao conversar com a Belinha na cozinha notei que pela primeira vez sua barriga estava ficando grande, parecia inchada. Minha preocupação com a saúde dela aumentara ainda mais. Dei á ela uma pequena porção de ração misturada com o fígado cru picadinho e a comida em pasta.. nessa hora notei que ela não estava com muito apetite. Nem água ela queria beber. Problemas á vista.
14- O tratamento errado Mal dormi á noite de tanta preocupação, logo pela manhã liguei para a clínica para falar com a veterinária, porém ela não estava no local, tinha entrado em férias e a outra vet que ali estava de plantão falou comigo pelo telefone. Expliquei o caso da Bella, ela procurou naquele momento a ficha de atendimento e disse-me que a Belinha realmente não tinha cinomose e que não entendia os motivos de um tratamento desse tipo. Perguntei á ela se era normal a Bella estar ficando com a barriga inchada e ela disse que não, e marcou uma reconsulta para aquele dia mesmo. Á tarde as 14hs o rapaz da clínica veio nos
buscar. A Bella já estava se acostumando com sua rotina de consultas. Na última reconsulta depois dos exames ela já entrava tentando se arrastar sozinha na caixinha de transportes. A veterinária que nos atendeu na clínica naquele dia não entendeu por que eu estava dando remédios para a cinomose se este não era o problema de saúde da Isabela. Nem nos exames havia sido diagnosticado tal problema. Para ela o que a Bella tinha era uma anemia e alguma outra doença que ela não conseguia saber de fato o que era. Naquele momento fiquei cheia de dúvidas, já não sabia mais o que eu estava fazendo ali, as veterinárias daquela clínica tinham problemas com o diagnóstico de saúde da Isabela, elas com certeza não sabiam nada. A veterinária em questão havia me passado outra receita bem diferente das primeiras com remédios para babésia e também vitaminas para a anemia.
15- O começo do fim Voltei para casa e decidi ligar para a outra clínica que eu conhecia desde que o Sansão havia tido problemas de saúde. Meu cachorro era epilético e um dia teve uma crise muito grave da doença o que me obrigou a procurar uma clínica melhor e consultar com um especialista. Uma das minhas amigas da escola trabalhava nessa clínica e disse que era uma das melhores da cidade, pois muitos cães antes desenganados, depois de irem á uma consulta com esta veterinária voltavam sãos e salvos para casa. Não! Definitivamente ela não faz milagres, mas entende muito bem e se dedica á profissão á qual escolheu. Um profissional assim, faz a diferença na vida da gente. A Isabela naquele momento não era mais a cachorra linda e gorda que eu criara, ela era agora o meu bebê, precisava de atenção o tempo todo, mijava-se a cada 20 minutos, fazia suas necessidades ali mesmo sem condições de se levantar para nada. Nem para comer. Ela precisava mais do que uma enfermeira, ela precisava de uma mãe em tempo integral. Pois bem.. ela teve essa mãe. Larguei meu emprego, meus estudos, tudo! Para cuidar daquela que um dia havia me dado tantas alegrias e tinha sido a coisa mais linda que Deus já me permitiu ter. Não me arrependo nem um pouco de ter cuidado dela com tanto amor e dedicação. Ela merecia, pois não pediu para vir para a nossa casa, não pediu que eu a criasse e não tinha culpa de ficar doente. Liguei para a clínica e marquei uma consulta e o tele-busca para o primeiro horário da tarde. Eu não agüentava mais ver a Bella sofrer daquele jeito. Isso tudo estava me consumindo mais a cada dia. Passei a manhã inteira ao redor da Bella, abracei-a, conversei com ela, tirei fotos, filmei nossa conversa.. Alisei seu pêlo macio... Ela sabia que era amada, sabia que era a coisa mais linda e mais preciosa da face da terra e que por ela eu faria até o impossível. Eu amo cães de todo o meu coração. Não sei viver sem eles. Todos os meus cães, os amo da mesma forma que amei a Isabela, trato-os da mesma forma e cuido da melhor maneira possível. Faço por eles o que for possível e impossível. Só não posso fazer milagres. Tenho consciência disso. Mas eu precisava justamente de um milagre. Pois o estado da Bella era muito grave e eu ainda não tinha um diagnóstico correto de seu problema. E isso me angustiava, pois não sabia mais o que fazer e se o que eu fazia estava realmente sendo o correto a fazer.
Na noite anterior ela não comeu mais do que uns grãos de ração de gato o que me deixou ainda mais preocupada. Naquele dia depois de uma noite mal dormida tentei alimentá-la com bifinho, biscoitinhos, comida de cachorro em lata.. mas ela não queria comer. Não tinha apetite para mais nada. Na hora marcada a van da clínica veio buscá-la. Ela foi sentada, solta, dentro da van. Estava tranqüila. Chegamos na clínica e enquanto o rapaz levava-a no colo para o atendimento, eu preenchia a ficha de cadastro dela. Logo em seguida o rapaz passou com ela no colo para ser pesada na balança que ficava ao lado dos bancos na salinha de espera. Foi um auê só. A Bella fez o maior sucesso. O pessoal da clínica ao verem a Bella, exclamaram: - Que cachorra mais linda!! Olha só, que linda! A Bella realmente chamava a atenção por ser grandona e bonita. Mesmo doente ela dava ares de majestade. O Orgulho da mamãe. Preciosa!! Em seguida o rapaz a levou novamente para dentro e eu fiquei ali sentada, rezando para que tudo desse certo. A Clínica era grande, espaçosa, bem localizada num bairro nobre do centro da cidade, numa construção de luxo. Ali funcionava além de uma clínica, um pet shop, farmácia, hotelzinho e ambulatório. O local era agradável. Os atendentes bem educados e carinhosos com os animais. Uns 40 minutos depois a veterinária me chamou em sua sala. Ela queria saber à quanto tempo a Bella estava assim, se eu havia levado ela á algum outro veterinário antes, se ela estava tomando algum medicamento.. Puxei da bolsa todos os prontuários médicos das outras clínicas, mostrei para ela, as receitas, os exames.. tudo! Expliquei o problema da Bella nos mínimos detalhes e que já era a 3ª clínica que avaliava o estado da cachorra e era a 4ª veterinária que a estava atendendo. Contei também que cada veterinário dava um diagnóstico diferente e que eu já estava sem esperanças, pois não sabia mais o que fazer. Estava dando medicação pra cinomose e em todos os exames não havia dado traços desta doença na Isabela. Ela tinha apenas 2 anos e cada dia ficava pior, o tratamento não surtia efeito nenhum. A Veterinária então explicou que o caso da Isabela era muito, muito grave. Ela estava com problema renal, barriga d água, problema de coração e uma anemia muito profunda. Eles estavam tentando reverter este quadro e estabilizá-la. A médica havia feito uma punção na barriga da Belinha e colocado um dreno para retirada da água e também havia colocado ela no soro. E caso ela melhorasse precisaria fazer no mínimo cinco sessões de hemodiálise, pois todo o seu problema era renal por isso ela não conseguia caminhar. Descobri naquela hora que a Isabela nunca teve cinomose, nem babésia.. eu estava matando a minha cachorra com o tratamento errado. A veterinária pediu novos exames de sangue, coletou líquido para examinar.. e avisou-me que a Bella ficaria internada.
16- A despedida Antes de ir embora pedi para ver a Belinha. Estava ansiosa para vê-la, queria acariciar seu pêlo e conversar com ela. Fomos então até a sala de atendimento, ela estava sentada de lado, na maca, com a cabeça erguida. Quando me viu, arregalou aqueles olhões castanhos pro meu lado. Fui até ela, fiz carinho, conversei um pouco. A veterinária deu mais algumas explicações técnicas e eu me despedi, na saída da sala, olhei pra traz e a Bella que já previu que eu ia embora, tentou se levantar, como se dissesse: - Já vai indo, e não vai me levar??? A veterinária a abraçou e disse: você fica! E eu saí.. Já eram 17hs e tantas da tarde. Saí da clínica e fui pra casa. A noite não conseguia dormir, resolvi assistir televisão no quarto da minha mãe, com ela.. eu estava em cima da cama dela, sentada, já passava da meia noite, quando senti uma dor horrível no coração, um aperto no peito, uma angústia sem razão de ser. Temi pela Belinha. Algo estava acontecendo naquela hora, não sabia dizer o que era. Algum tempo depois fui dormir, orei pela Bella e me deitei. De manhã, era umas 8 horas o telefone tocou. Era a atendente da clínica, eu ainda estava deitada quando peguei o telefone, e ela me deu a pior de todas as notícias. A Bella havia morrido naquela madrugada, não resistiu à doença. Aquele foi o ultimo olhar da Bella para mim. Fiquei pensado comigo que eu deveria ter dito que eu não a havia abandonado na clínica, que eu voltaria para buscá-la, que ela deveria melhorar depressa para voltar para casa comigo. Mas eu não disse nada. Isabela, eu te amo!! Sinto muito a sua falta... saudades eternas. Deus nos dá lindas bênçãos todos os dias. A Isabela foi mais que uma benção em minha vida, ela foi um presente de Deus. Ela era de fato, muito preciosa.
História escrita por: Juliana St mesma autora de Marcos de León – detetive. https://www.clubedeautores.com.br/book/142292--Marcos_de_Leon__detetive#.VKA3zV4BVc Blog: http://juliana-editions.blogspot.com.br/ Contato: juliana-gatto@bol.com.br
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