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Voa, voa, passarinho: percursos de uma investigação com as crianças - Michele Sperotto Nogueira

VOA, VOA, PASSARINHO:

PERCURSOS DE UMA INVESTIGAÇÃO COM AS CRIANÇAS

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Michelle Sperotto Nogueira 10

Quando trabalhamos com crianças pequenas, sabemos que elas estão em busca de conhecimento, de entender como funciona esse mundo tão grande e com diversos materiais não estruturados. Então, oferecemos para elas muitas opções, entre elas as sucatas, para que possam explorar e criar. Foram muitas as ideias, mas o mais interessante foi de uma casa de papelão para bonecas, ideia da qual surgiu a sugestão de fazermos uma casinha para passarinhos. As crianças pediram para que fosse feita uma casa de bonecas mas, diante de uma observação, perceberam que deveriam mudar o projeto para a construção de uma casa de passarinhos. Onde entra a escuta do professor?

Espaço de relações e escuta

O conceito de escuta proposto por Rinaldi (2016) fundamenta as relações entre crianças e adultos na escola Despertar. Isto é,

a escuta exerce um importante papel no alcance a um objetivo: a busca por signi cado. É uma busca difícil, especialmente para as crianças que têm tantos pontos de referência em suas vidas: a família, a televisão, a escola e os locais que frequentam. Ainda assim, não podemos viver sem signi cado, porque isso deixaria nossas vidas sem identidade, esperança ou noção de futuro. (RINALDI, 2016, p. 235)

Assim, entramos no mundo da imaginação e, junto com as crianças, fomos atrás da casinha de passarinhos, ouvindo suas ideias e oferecendo possibilidades. “Profe, ela precisa ter portinhas, janela e também precisamos pendurar no alto”, sugeriu uma criança.

Protagonismo infantil

A criança traz consigo diversos conhecimentos prévios e curiosidades, imprimindo suas intenções a cada gesto, movimento e interações. Acreditamos na sua potencialidade e capacidade de traçar seu próprio percurso de aprendizagem ancorado na mediação sensível e cuidadosa do adulto.

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Repensando o material

Após a colocação da casinha e apreciação das crianças, tivemos um imprevisto: a chuva levou a casinha ao chão, cando esta destruída. Naquele momento foi preciso se afastar, deixando as crianças pensarem o que poderia ter acontecido com aquela casa. Se desde o momento eu mostrasse para elas que aquele material não caria preservado com as chuvas, perderia o encanto, o interesse e a aprendizagem.

As crianças se reuniram e, entre resmungos e trocas de ideias, perceberam que aquele material não poderia ser colocado ao ar livre, com a possibilidade de pegar chuva. Então, quando começaram a me perguntar o que poderia ter acontecido, sentei-me e comecei a fazer alguns questionamentos:

O que pode ter acontecido com a casa? Porque ela não resistiu? Será que o papelão pode ser molhado? Qual o tipo de material que poderia ser resistente às chuvas?

A escuta é uma atitude sensível, atenta e contínua do educador para compreender as necessidades, os con itos, os interesses que as crianças manifestam, percebendo detalhes e estabelecendo conexões entre estes conhecimentos e as ações a serem planejadas e concretizadas nas práticas cotidianas. Assim, após escolherem o material para a nova casa, que seria agora de madeira, fomos criando possibilidades para que tudo fosse possível. Madeiras, sorriso no rosto, vontade de criar e um adulto para mediar e cuidar. Mãos à obra!

E não paramos por aí: começamos, então, uma longa viagem de pesquisas por tipos de pássaros, seu habitat e a criação de ninhos. Os livros nesses momentos também foram alicerces para dar continuidade à nossa caminhada, assim buscamos trabalhar a forma poética com o livro Passa –passa passarinho, de Cleonice Bourscheid; e de forma sensível com As cores dos pássaros, de Lúcia Hiratsuka.

A empolgação das crianças fazia com que eu pensasse ainda mais em materiais que pudessem enriquecer essas pesquisas e suas curiosidades. Assim, pensamos num passeio ao Museu do Anchieta, onde se encontram diversos exemplares de pássaro empalhados de diferentes espécies, abrindo um leque para pensarmos em ainda mais tipos de aves e suas características.

Percebemos, também, o envolvimento das famílias neste projeto, buscando informações junto com as crianças e participando das pesquisas. Por exemplo, um de nossos alunos pediu para que pudesse trazer a sua calopsita para a escola junto de sua mãe, para que então pudesse falar um pouco mais sobre esse tipo de ave. A participação da família ocorreu a partir de uma proposta de interação e parceria, proporcionando momentos de trocas de experiências e de informações. Observando o quanto esses momentos são importantes para as crianças e em conversa com eles, resolvemos envolvê-los (famílias) novamente em pesquisas referentes aos pássaros escolhidos pelas crianças, ideia que resultou em uma linda apresentação entre a turma em sala.

Assim, em busca de informações, as crianças tentavam entender como os pássaros constroem seus ninhos, como fazem isso com tanta habilidade, entre outras questões que tinham. Disponibilizamos, então, alguns materiais para que fosse possível imaginar e montar um ninho de passarinho, como algodão, gravetos, folhas, lã e argila. Com isso foi possível explorar as texturas, aguçar a imaginação e criação.

Na Escola Despertar consideramos a criança como um ser atuante, como produtora de cultura, capaz, competente e que constrói conhecimentos por meio das experiências e desa os. Nesse sentido, buscamos utilizar estratégias metodológicas que viabilizem às crianças protagonizarem seus processos de investigação, pois acreditamos em suas capacidades de escolha, de diálogo e explicitação de suas ideias e opiniões sobre o mundo e sobre si mesmas.

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