VERDEPERTO - Revista de paisagismo / Landscape gardening magazine

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INHOTIM paisagem singular

linguagem paisagística e conservação ambiental

Julho 2018 | N. 0 |

ALBERTO NEGRINI a diversidade primordial

entrevista com o arquieto e paisagista da Costa Rica

JARDIM VERTICAL

e concreto verde

grandes cidades mais belas, frescas e ambientalmente equilibradas


EXPEDIENTE VERDEPERTO julho 2018 n1 Editor: Kainã Pacheco Santos Projeto gráfico-editorial: Kainã Pacheco Santos

TEXTOS - Raul Canovas. "Raul Cânovas entrevista o paisagista costarriquenho Alberto Negrini" 28 Ago 12.Jardim Cor. Acessado 21 Jun 2018. <http://www.jardimcor.com/paisagismo/raul-canovasentrevista-o-paisagista-costarricense-alberto-negrini/> - Inhotim. "Gestão Ambiental". Inhotim. Acessado 21 Jun 2018. <http:// www.inhotim.org.br/inhotim/jardim-botanico/gestao-ambiental/> - Julio Lamas / Conexão Planeta. "Todas as paredes podem ser vivas com o concreto verde" 28 Dez 2015. ArchDaily Brasil. Acessado 21 Jun 2018. <https://www.archdaily.com.br/br/779408/todas-as-paredespodem-ser-vivas-com-o-concreto-verde> - Franco, José Tomás. "Em Detalhe: Jardim Vertical na Clínica USP Sagrado Corazón, Sevilla / Terapia Urbana" [En Detalle: Jardín Vertical en Clínica USP Sagrado Corazón, Sevilla / Terapia Urbana] 02 Dez 2012. ArchDaily Brasil. (Trad. Britto, Fernanda) Acessado 21 Jun 2018. <https:// www.archdaily.com.br/84048/em-detalhe-jardim-vertical-naclinica-usp-sagrado-corazon-sevilla-slash-terapia-urbana>

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- Eduardo Souza. "Entenda um pouco sobre permacultura construindo sua espiral de ervas" 30 Mai 2017. ArchDaily Brasil. Acessado 21 Jun 2018. <https://www.archdaily.com.br/br/872344/ entenda-um-pouco-sobre-permacultura-construindo-sua-espiralde-ervas> - Centro Educativo Burle Marx / Arquitetos Associados [Centro Educativo Burle Marx / Arquitetos Associados] 08 Jan 2012. ArchDaily Brasil. (Trad. Sambiasi, Soledad) Acessado 21 Jun 2018. <https://www. archdaily.com.br/18858/centro-educativo-burle-marx-arquitetosassociados> IMAGENS - da contracapa: Dmitry Dzhus Esse trabalho é experimental, sem fins lucrativos e de caráter puramente acadêmico, desenvolvido pelo acadêmico Kainã Pacheco Santos como exercício de projeto gráfico-editorial para a disciplina de Laboratório de Produção Gráfica do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) no semestre 2018-1. Não será distribuído, tampouco comercializado.


EDITORIAL Estar próximo a natureza é uma dádiva. Para o profissional que busca harmonizar o articial ao natural, as construções aos orgânicos, o contato com o meio ambiente é das melhores inspiraçôes. A Revista Verde Perto compila mensalmente reportagens, fotos, idéias, notas, dicas, desenhos, e outros insumos para sua imaginação florescer. Na edição deste exemplar, a conversa fluirá com Alberto Negrini. As águas escorrerão para os lagos de Inhotim, refrescarão os jardins verticais e matarão a sede de inovação de Burle Marx. Entre outros, grandes artistas dos espaços, dos entres, nunca acabados, meios, divertem-se e divertam-se.

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FOTO: DMITRY DZHUS

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FOTO: DANIEL MANSUR FOTO: ANGELLO LOPEZ

FOTO: KAINÃ PACHECO SANTOS

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FOTO: UGUR AKDEMIR

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PALAVRE seis doze

Alberto Negrini, diversidade primordial

PAISAGEM Inhotim, beleza rara

PERMACULTURA vinte

construa seu espiral de ervas

PAISAGĂ?STICO vinte e dois vinte e nove

jardim vertical, concreto verde

PROJETO BRASIL

Centro de Educativo Burle Marx

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PALAVRE

Alberto Negrini, d Da primera geração de arquitetos graduados na Costa Rica, um dos melhores exemplos de sustentabilidade e preservação ambiental da atualidade no mundo O costarriquenho Alberto Negrini é paisagista, arquiteto e professor reconhecido internacionalmente Raul Cânovas – Qual é a sua formação e em qual faculdade você estudou? Alberto Negrini – Formei-me como arquiteto, na Escola de Arquitetura da Universidade da Costa Rica. Faço parte da primeira graduação. Esta foi uma entidade que mudou paradigmas importantes na educação e que, além disso, impulsionou tendências de inovação e criatividade em todos os sentidos. Devo reconhecer que, desde o ano que antecedeu a minha entrada na Universidade, eu já sabia que queria estudar nessa área, mesmo que a carreira ainda não existisse naquele momento e eu não sabia que iriam abri-la. Quando chegou o momento, eu duvidei na escolha entre Arquitetura e Biologia. A primeira, por causa da criatividade, meu gosto pela especialidade (ainda que, neste momento, eu não o sabia); e a segunda, pela vida, pelas plantas. A primeira prevaleceu. No momento de concluir a carreira, minha tese foi uma síntese da arquitetura e da natureza. Uma vez concluído, pouco tempo depois, decidi “ligar os motores”, apesar de o paisagismo ser quase desconhecido no país (Costa Rica), decidi-me por este ramo. Há 20 anos, fundamos, com outras pessoas, a Associação de Paisagistas costarriquenses. O resto, é história.

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Por que você decidiu se lançar no paisagismo? Acho que foi a síntese natural entre meus campos de interesse: o design e a natureza. Desde meu nascimento, tenho estado em contato com a natureza. Meus pais me ensinaram a apreciá-la e admirá-la; sempre estive em contato com ela, ficava maravilhado. Este sentimento e a emoção, pouco a pouco, alimentaram a intenção de compreendê-la e de entendê-la; assim que se de uma coisa com a outra não se pode resultar outra coisa que uma caldeira de emoções, de criatividade e o desejo de projetá-lo para as pessoas. Qual é a importância da riqueza florística da Costa Rica em seus projetos? Na Costa Rica, vivemos rodeados pela vegetação, mesmo nas cidades, de qualquer lugar, podem-se ver as montanhas. Em todas as casas, há uma árvore, e, em qualquer sala ou corredor, há plantas. Estamos rodeados e vivemos entre espécies de índoles diversas, desde algumas, que, apenas, podem ser notadas, até outras, espetaculares, altas, baixas. Isto, para uma pessoa com suficiente sensibilidade, é levado ao apreço, e, desde então, a diversos níveis de envolvimento. Quando há a intenção de compreendê-la e, logo, de emulá-la através do desenho, a diversidade é a característica primordial do trabalho. O exercício profissional do paisagismo no nosso país tem diversas influências externas, algumas, formais, outras, estilísticas e, poucas vezes, conceituais; isto poderia levar, em alguns casos, a produtos


, diversidade primordial

que se afastam da nossa paisagem. Creio que, no meu caso, nunca deixei de sentir o chamado “emocional da natureza” e, cada vez, mais trato de compreendê-lo através do meu trabalho, desde o micro, até o macro. Com o passar dos anos, passei pela botânica, até a ecologia, e pela ética e a filosofia. Quem são os seus clientes? Você trabalha mais com particulares, com empresas ou com o governo? Na Costa Rica, a demanda do paisagismo, mesmo que tenha aumentando, ainda é pobre. Nossos principais competidores são os viveiristas. Portanto, nossos clientes são pessoas com certo nível de sensibilidade ou com um certo grau de cultura ge-

FOTO:

San Carlos, Costa Rica

Nunca deixei de sentir o chamado “emocional da natureza” através do meu trabalho, desde o micro até o macro.” Julho 2018 | N. 0 | Revista VerdePerto | 7


Não se pode tratar de um assunto, sem tratar dos outros de forma simultânea, pois os eixos são transversais”

ral para conhecer a profissão. Devido ao que o país estabeleceu em grande parte do seu desenvolvimento turístico em torno do ecoturismo, alguns projetos nessa área são clientes potenciais, mas, creio que constituem, principalmente, a segunda residência turística, ou mais, no geral, o desenvolvimento imobiliário paralelo a esse aspecto, principalmente o sol e a praia. No meu caso particular, meus clientes são muito variados: hotéis, residências, alguns projetos imobiliários… Às vezes, o desenho paisagístico é solicitado pelo proprietário, outras, pelo arquiteto; em algumas ocasiões, trabalhei como consultor para estudos de impacto ambiental, em outras, para o desenho de piscinas. Já realizei projetos para os parques nacionais e outras áreas protegidas, públicas ou privadas, que, em especial, são projetos que desfruto muito. Qual é a importância de praticar a filosofia sustentável em um jardim? Para impulsionar, realmente, a sustentabilidade, deve-se aceitar como premissa básica, a integridade do nosso mundo refletida no trinômio ambiental: o social, o econômico e a intersetorização, que define que não se pode tratar de um assunto, sem tratar dos outros de forma simultânea, pois todos são eixos transversais. A sustentabilidade se pode entender como a busca da eficiência ecológica do sistema, onde o ser humano interage com a paisagem da qual forma parte com seu aparelho cultural, econômico e tecnológico, sua espiritualidade e aspirações. Esta eficiência deve garantir a perdurabilidade do sistema, das suas relações e da qualidade de vida que sustenta. O objetivo é que se possam satisfazer as necessidades fundamentais da sociedade: de materiais, de educação, culturais, espirituais, etc. Deve-se entender o ser humano em todas as suas dimensões e não, unicamente, nas suas necessidades materiais. Não se deve pensar no ser humano, ou no seu crescimento, como consequência da elevação financeira.

Monte Verde, Costa Rica

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FOTO: ISABELLA JUSKOVA

Como você faz para convencer os seus clientes da importância de respeitar um ecossistema? Pelo meu trabalho, em particular, não tenho que convencer os clientes em nada a respeito do ecossistema, geralmente, esta é a razão pela qual eles me procuram. Em algumas ocasiões, tive que “ven-

der” a ideia da responsabilidade ambiental, mas não a faço com justificativas financeiras, mas, mostro-lhes as vantagens para o meio ambiente. Ressalto a importância para algum tipo de certificação, sobretudo, se são projetos turísticos e, além disso, destaco a conveniência entre a imagem que o estabelecimento projeta e o ambiente que gera. Se, mesmo assim, não há um convencimento, recorro às vantagens financeiras como o baixo custo da manutenção, ou que o lugar faz parte do atrativo (se são projetos turísticos). O que pode um país como a Costa Rica, do o ponto de vista de um paisagista, mostrar ao Brasil? Por se tratar de um país pequeno, entendemos bem o sentido e a importância da diversidade. Em um espaço reduzido, aprendemos a ver distintos habitats e ecossistemas a se interagir. Por isso, creio que podemos mostrar-lhes como é que um jardim pode fazê-lo. Temos a possibilidade, também, de mostrar como converter caçadores e depredadores em guias turísticos; fazendas de gados, em projetos ecoturísticos; fazendas agrícolas, em paisagens agradáveis, diversos, interessantes, complexos; e o principal de tudo, é que a paisagem deve ser interessante, variada e complexa, a resgatar as características de cada lugar, o valor do detalhe e da micropaisagem.

O desenho deve ensinar que é possível ser responsável ambientalmente e, ao mesmo tempo, criar algo belo, saudável e funcional” Julho 2018 | N. 0 | Revista VerdePerto | 9

FOTO: ISABELLA JUSKOVA

Então, o desenho do paisagista sob estas premissas, deve envolver, em primeiro lugar, uma atitude pedagógica, deve ensinar que é possível ser responsável ambientalmente e, ao mesmo tempo, criar algo belo, saudável e funcional. A eficiência do sistema deve passar, necessariamente, pela economia dos recursos e pela minimização da manutenção, para evitar o uso de produtos nocivos ao ar, ao solo, à água e outras formas de vida. Em especial, o desenho dos jardins nos permite aproximar as pessoas à natureza, e nos autoriza a mostrar que é possível outras formas de nos relacionarmos com ela do que a depredação ou à destruição. O uso das plantas nativas da zona onde estamos trabalhando é indispensável para cumprir estes objetivos, igualmente, a compreensão e o respeito dos fluxos da água, das correntes de ar, de energia ou dos corredores biológicos. Vejo isso, mais como uma responsabilidade para com o planeta e para com a zona, que uma alternativa. Ou somos sustentáveis agora ou não seremos mais. Claro, que isto inclui responsabilidades com o proprietário ou com os usuários, mas devemos ver mais além.


O desenho dos jardins nos permite aproximar as pessoas à natureza” Como é a sua atividade acadêmica com paisagismo na Universidade Veritas? Na Universidade, sou professor de Arquitetura. Concretamente, estou em dois cursos e uma oficina de design, além de ser tutor ou leitor em teses de graduação. Os cursos são: Paisagismo e Convergência e Intercâmbio. Este último é um curso no qual abordamos o espaço urbano, residual ou de interfase, subutilizado, para ressemantizá-lo, dar-lhe um novo carácter, mas, partindo da realidade de um país subdesenvolvido, não vamos fazer uma nova cidade, pois não há recursos para as complexas transformações. Mas deve-se fazê-la, resgatando, respeitando e potencializando o caráter do lugar e promovendo as culturas locais. Enfim, entender que a globalidade na localidade trabalha o design do paisagismo urbano. A oficina de Design aborda o problema da relação entre o ser humano e a natureza, a procurar por lugares com dinâmicas particulares, para compreender o íntimo e o universal. Partimos do princípio que o design nasce do entorno, não se pode desenhar um lugar que não se compreende à cabalidade. Portanto, devemos conhecer as dinâmicas passadas e presentes, as tendências, os fatores de mudança, as ameaças, tanto naturais, como antrópicas. Também se propicia a compreensão particular e se enfatiza a percepção como elemento de entendimento e identidade. Ensinamos que o objetivo do design é o ser humano em todas as suas dimensões, no território. Conte-nos um pouco sobre as suas participações internacionais, como em “Bilbao Jardim 2009”. Bom, já participei em alguns concursos. Creio que é importante fazê-los para a formação profissional. A nível nacional, já ganhei um de design de um espaço e recebi menções de honra em vários outros.

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Em 2009, decidi participar no concurso “Bilbao Jardim 2009”, com uma proposta que refletia sobre a necessidade de voltar a colocar a vegetação na cidade e me propus que fosse uma ponte entre essa latitude e o meu país. Eu quis mostrar um pouco da paisagem nacional. A proposta foi selecionada como finalista e tive que realizá-la, em Bilbao. Isto me permitiu conhecer uma cidade sumamente interessante, mas também, me possibilitou perceber que tínhamos um nível internacional. Não cabe dúvidas de que a experiência foi extraordinária. Ainda sou o único latino-americano que esteve entre os finalistas e, até aquela data, o único não europeu. O problema é que, para nós, estas aparições são caras, pois implicam horas de trabalho, e além disso, o envio do material também é de alto custo. Você gostaria de vir ao Brasil para nos dar uma palestra mais ampla sobre tudo isto? Me encantaria ir ao Brasil, pois tenho muitas boas lembranças deste país. Ao parecer a nossa experiência e os assuntos que estamos desenvolvendo, podem ser de grande interesse, e estou certo de que, o conhecimento que vocês têm aí, pode se potencializar ao conhecerem o nosso.


FOTO: ANNA GONCHAROVA

Cachoeira La Fortuna, Costa Rica

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PAISAGEM

Inhotim

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FOTO: KAINÃ PACHECO SANTOS

Os jardins do Inhotim são singulares, com uma beleza rara e um paisagismo que explora todas as possibilidades estéticas da coleção botânica. Para além da contemplação, os jardins são campo para estudos florísticos, catalogação de novas espécies botânicas, conservação e ações de educação ambiental. Julho 2018 | N. 0 | Revista VerdePerto | 13


FOTO: KAINÃ PACHECO

O acervo botânico do Instituto Inhotim é representado por grupos com valor paisagístico e expõe uma significativa representatividade filogenética. Ao todo, são cerca de 5.000 acessos, representando 181 famílias botânicas, 953 gêneros e pouco mais de 4.200 espécies de plantas vasculares. Tamanha diversidade faz do Jardim Botânico Inhotim (JBI) um espaço único, possuindo a maior coleção em número de espécies de plantas vivas entre os jardins botânicos brasileiros.

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O paisagismo, isto é, a disposição do acervo botânico dentro da área de visitação, explora os padrões estéticos como um instrumento de sensibilização popular sobre a importância da biodiversidade. Ainda que não possa ser enquadrado em um estilo único, alguns princípios podem ser observados no paisagismo do Inhotim, como a preferência pelo uso de grandes maciços ou manchas de espécies que tiram vantagem do efeito causado pelo agrupamento.


FOTO: KAINÃ PACHECO

Com uma das mais relevantes coleções de palmeiras do mundo, são aproximadamente 1.400 espécies, mais de 1.800 acessos e um total de mais de 20 mil indivíduos (entre plântulas e indivíduos adultos). A coleção de Araceae, família que inclui imbés, antúrios e copos-de-leite, é a maior da América Latina, com mais de 600 acessos e cerca de 450 espécies. As orquídeas estão representadas por aproximadamente 420 acessos e têm mais de 330 espécies.

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A curadoria botânica organiza o crescimento do acervo do Jardim Botânico Inhotim, tanto em relação à conservação das espécies e à disposição do acervo existente quanto à definição estratégica das diretrizes para novas aquisições de espécies. De forma articulada com a curadoria de arte, arquitetos e área técnica, a

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curadoria botânica participa ativamente dos projetos de instalação de novas obras a céu aberto, galerias e pavilhões, definindo o projeto botânico e paisagístico do entorno do acervo artístico. A integração dessas áreas garante uma relação absolutamente harmônica entre a natureza e a arte contemporânea.


FOTO: KAINÃ PACHECO

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A surpresa como linguagem paisagística também é outro princípio bastante utilizado, com curvas ou passagens que, subitamente, desfraldam novas perspectivas. Há também a busca permanente de se ampliar o vocabulário paisagístico. A introdução de espécies pouco conhecidas nos jardins também é uma prioridade para apresentar plantas que, apesar da rara beleza, quase não são usadas em projetos paisagísticos no mundo. Desta forma, mesmo que o paisagismo do Inhotim obedeça claramente a padrões estéticos, a variedade de espécies é simultânea e amplamente utilizada nas atividades de educação ambiental.

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FOTO: KAINÃ PACHECO

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PERMACULTURA

PLANEJAR, ATUALIZAR E MANTER SISTEMAS AMBIENTALMENTE SUSTENTÁVEIS, SOCIALMENTE JUSTOS E FINANCEIRAMENTE VIÁVEIS

ESPIRAL DE ERVAS

FOTO: IANA LUA DIAS DA CRUZ

A permacultura é uma filosofia de trabalhar com, e não contra a natureza; de observação prolongada e pensativa em vez de trabalho prolongado e impensado, e de olhar para plantas e animais em todas as suas funções, em vez de tratar qualquer área como um sistema único. Bill Mollison 20 | Revista VerdePerto | N. 0 | Julho 2018


Uma estrutura espiralada propicia

ILUSTRAÇÃO: ARCHDAILY

a criação de diversos microclimas em um espaço pequeno, possibilitando o cultivo de espécies com necessidades diversas de luz, água e nutrientes. No topo, há maior exposição ao sol, ao mesmo tempo que o substrato tornase mais seco, já que é drenado para as partes mais baixas. Quanto mais inferior, mais úmida a terra torna-se. Além disso, há partes mais sombreadas e outras mais expostas ao sol.

Para sua construção,

ILUSTRAÇÃO: ARCHDAILY

é interessante ter um espaço plano, ensolarado e facilmente acessível, de preferência próximo de onde são preparadas as refeições. As paredes podem ser construídas com uma infinidade de materiais, podendo-se usar a criatividade e os recursos disponíveis. Pedras, tijolos, troncos, bambus, ou até mesmo telhas ou garrafas podem funcionar. É importante que o raio da espiral não seja tão grande, para que seja possível alcançar facilmente todas as suas partes. Por isso, reserve um espaço entre 1,00 m a 1,60m, e pelo menos, cerca de 60 cm em volta dela para circulação.

ILUSTRAÇÃO: ARCHDAILY

A primeira fiada é imprescindível para dar a forma da estrutura. Após isso, os blocos devem ser emparelhados, retirando alguns de cada uma das camada, para tornar a estrutura escalonada. Após chegar à altura desejada, de cerca de 1 metro, a estrutura deve ser preenchida com terra. É interessante que esse substrato tenha uma boa drenagem e uma boa adubação. Por Isso, considere incluir areia e húmus de minhoca na mistura.

No topo, sol pleno e solo seco

Alho - Pimentas - Boldo - Alecrim Sálvia - Manjericão - Cebolinha ILUSTRAÇÃO: ARCHDAILY

No meio, sombra e solo pouco úmido

Capim Limão - Manjerona Camomila - Losna

Embaixo, sombra e solo úmido

Gengibre - Coentro - Melissa Poejo - Hortelã

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PAISAGÍSTICO

VER TIC AL

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FOTO: RAFFAELLA FAVERZANI

Além de serem sinais de sofisticação e consciência ambiental, atualmente telhados verdes e jardins verticais são alvos de políticas públicas e subsídios nas grandes cidades globais. As vantagens nisso são mais que estéticas e vão desde a mitigação da poluição atmosférica até a redução do consumo de energia com ar condicionado por conta do resfriamento natural das edificações. Julho 2018 | N. 0 | Revista VerdePerto | 23


FOTO: EUROPA PRESS/USP/EDUARDO BRIONES

O futuro em certa medida é otimista e a tendência é que a natureza seja cada vez mais incorporada ou introduzida nas skylines. Mas o que está sendo desenvolvido hoje na vanguarda da arquitetura e da engenharia civil é ainda mais promissor. Grupos multidisciplinares de pesquisa na Espanha e na Inglaterra estão numa corrida para lançar materiais de construção biorreceptivos, que, graças à sua composição física, são capazes de receber e estimular o crescimento de musgos, microalgas e fungos liquenizados em seus interiores, tornando qualquer estrutura em um jardim vertical.

“O que acontece normalmente é que as pessoas gastam muito dinheiro com soluções anti-musgo e afins, pois relacionam o seu surgimento com sujeira e decadência. Mas o contrário é mais interessante, quando, na verdade, poderiam abraçar essas espécies insurgentes no concreto como uma pintura ecológica ou adorno natural. Nossa ideia é aproveitar e integrar a função desses seres vivos como filtros naturais do CO2 e controladores térmicos nas construções urbanas”, conta Ignácio Segura Pérez, chefe de pesquisa do Grupo de Tecnologia Estrutural da Universidade Politécnica da Catalunha. Desde 2010, ele e sua equipe trabalham na criação de painéis de “concreto verde”.

FOTO: TERAPIA URBANA

O posicionamento das plantas segue uma adaptação do desenho do arquiteto paisagista Burle Marx, chamada "Hanging Garden"

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FOTO: TERAPIA URBANA

Estrutura formada por pequenos vasos de tecido especial feito á partir de material reciclado. Funciona como uma manta geotextil (bidim), tecido permeável e resistente, evita o escoamento da terra

Fernando Hidalgo Romero, do Terapia Urbana nos forneceu seu projeto do jardim vertical de 40 m2, incluído na ampliação da Clínica Coração Sagrado USP de Sevilha, realizada pelos arquitetos do estúdio Penteado Arquitetos Este é o primeiro jardim vertical localizado em um centro hospitalar em toda a Europa e sua implementação foi concluída no início de setembro. Este jardim vertical, o primeiro de seu tipo instalado em Sevilha, tem uma área de 40 m2 e um sistema de controle remoto de alta tecnologia que regula o funcionamento correto das plantas, medindo a temperatura e a umidade do ambiente e o pH da água de irrigação mediante o uso de sondas. Além disso, a irrigação funciona em um circuito fechado que otimiza o consumo de água. O paisagismo é composto por mais de 1400 plantas selecionadas a partir de 40 espécies com especial adaptação para as condições específicas de sua localização. Esta composição natural é inspirada por um desenho do arquiteto paisagista Burle Marx, chamada "Hanging Garden", que foi concebida para ser vista de cima, e que foi reinterpretada para atender ao sistema de jardim vertical do Terapia Urbana. O escritório de arquitetura Peinado Arquitectos, que realizou o projeto de ampliação da clínica, pensou desde o início em instalar um elemento natural no piso térreo do edifício a fim de melhorar a paisagem visual que desfrutariam os visitantes. Assim, decidiu-se ocupar o muro esquerdo, que recebe todas as linhas visuais a partir do átrio, com este exuberante sistema vivo que traz um ambiente natural renovado à entrada deste novo edifício. Projeto de Terapia Urbana Clínica USP Sagrado Corazón: (Peinado Arquitectos) Sevilha, Espanha 31/08/2012 Julho 2018 | N. 0 | Revista VerdePerto | 25


Além de serem sinais de sofisticação e consciência ambiental, atualmente telhados verdes e jardins verticais são alvos de políticas públicas e subsídios nas grandes cidades globais. É o caso em São Paulo, Nova York e Paris, onde já há lei que obriga os prédios comerciais a instalarem essas estruturas, além de placas solares, como parte do esforço para uma transição energética sustentável. As vantagens nisso são mais que estéticas e vão desde a mitigação da poluição atmosférica até a redução do consumo de energia com ar condicionado por conta do resfriamento natural das edificações. Um telhado verde, por exemplo, pode diminuir a temperatura interna de um projeto em até 30%. O futuro em certa medida é otimista e a tendência é que a natu-

reza seja cada vez mais incorporada ou introduzida nas skylines. Mas o que está sendo desenvolvido hoje na vanguarda da arquitetura e da engenharia civil é ainda mais promissor. Grupos multidisciplinares de pesquisa na Espanha e na Inglaterra estão numa corrida para lançar materiais de construção biorreceptivos, que, graças à sua composição física, são capazes de receber e estimular o crescimento de musgos, microalgas e fungos liquenizados em seus interiores, tornando qualquer estrutura em um jardim vertical. “O que acontece normalmente é que as pessoas gastam muito dinheiro com soluções anti-musgo e afins, pois relacionam o seu surgimento com sujeira e decadência. Mas o contrário é mais interessante, quando, na verdade, poderiam abraçar essas espécies insurgentes no concreto como uma pintura ecológica ou adorno natural. Nossa ideia é aproveitar e integrar a função desses seres vivos como filtros naturais do CO2 e controladores térmicos nas construções urbanas”, conta Ignácio Segura Pérez, chefe de pesquisa do Grupo de Tecnologia Estrutural da Universidade Politécnica da Catalunha. Desde 2010, ele e sua equipe trabalham na criação de painéis de “concreto verde”. Os pesquisadores estão utilizando a combinação de dois tipos de materiais conhecidos na construção civil para obter no concreto verde as propriedades necessárias de pH, porosidade e rugosidade que facilitam o crescimento das espécies. O primeiro é um concreto composto de fosfato de magnésio, oMPC, geralmente usado em reparos estruturais dos prédios por secar rapidamente. O segundo, por sua vez, é o

FOTO: WIKIMEDIA COMMONS

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FOTO: ALL THINGS PLANTS

FOTO: PEXELS

Um telhado verde pode diminuir a temperatura interna de um projeto em até 30%

CONCRETO VERDE


FOTO: ALL THINGS PLANTS

A idéia é que a própria natureza cuide do sistema fotossintético sem a necessidade de interferência Materiais de construção biorreceptivos, que estimulam o crescimento de musgos, microalgas e fungos em seus interiores, tornando qualquer estrutura em um jardim vertical concreto tradicional de cimento Portland, com o diferencial de ser tratado com dióxido de carbono (CO2) em um ambiente controlado com 65% de umidade relativa do ar. “Essa composição é feita para deixar o concreto verde menos ácido, o que acelera o crescimento dos musgos, líquens e fungos. Feito isso, nós aplicamos o material nos painéis, que possuem três camadas específicas para suportar o sistema vegetativo. A primeira é impermeável para impedir a entrada de umidade no material estrutural. A segunda capta água para criar um ambiente apropriado para a colonização das plantas e fungos, enquanto a terceira faz a impermeabilização inversa, ou seja, evita que a água escape para nutrir esse pequeno habitat dentro do material”, explica Ignacio. Segundo o pesquisador, o apelo da nova tecnologia vai além da sustentabilidade, a intenção é permitir que arquitetos, designers e artistas plásticos possam personalizar suas construções, novas e antigas, com padrões ecológicos que podem variar conforme o clima, a época do ano e os tipos de organismo e vegetação desejados. “Isso vai estimular a adoção por paisagistas e arquitetos, criando novos conceitos de jardins verticais. Já mandamos amostras do material para diversas universidades e pesquisadores, inclusive no Brasil, para ser testado

com espécies locais de plantas e fungos. O próximo passo é lançar o concreto verde comercialmente, o que não deve passar de 2016”, comenta o pesquisador. Em 2015, o projeto foi premiado no Beyond Building Barcelona-Construmat, que reconhece tecnologias inovadoras em construção. Com o mesmo propósito dos catalães, o BiotA Lab, um laboratório de pesquisa em arquitetura, engenharia e microbiologia da London College University, está trabalhando no conceito de materiais biorreceptivos. “Jardins verticais e paredes vivas precisam de sistemas mecânicos de irrigação e manutenção, que tor-

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A arquiteta Gabriella Ornaghi optou pela criação de ilhas de conservação de biodiversidade vegetal nesta cobertura em São Paulo (através dos jardins verticais). Consiste em replicar os arranjos vegetacionais do meio natural em áreas de concepção paisagística em meio urbano de maneira organizada

FOTO: RODRIGO BORDIGONI

nam sua instalação inacessível para a maioria das pessoas. Nossa ideia é que a própria natureza cuide do sistema fotossintético sem a necessidade de interferência”, afirma Richard Beckett, um dos diretores do projeto. “Há um potencial gigantesco para aplicações e ganho de escala neste momento. A proposta, além de ser mais barata a longo prazo, é uma resposta para a demanda crescente nas cidades por mais verde e qualidade de vida no contexto do combate à poluição e àsmudanças climáticas”, ressalta ele. O Biota Lab está trabalhando com “concreto verde” semelhante ao espanhol, mas a composição utilizada varia para receber diferentes espécies, que crescem dentro de desenhos geométricos prédeterminados e tornam as futuras fachadas e paredes mais bonitas e biodiversas. “Esse aspecto certamente torna mais complexa a nossa pesquisa. Como controlar musgos e fungos que crescem de

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maneira caótica? Queremos que os arquitetos e também as pessoas parem de ver essas espécies como elementos de prédios mal cuidados ou abandonados”, comparando o concreto verde com a casca dos troncos das árvores. “A casca é mais que uma proteção, é um hospedeiro. Ela permite que outras espécies cresçam e se integrem a ela. Qualquer parede pode se tornar um potencial receptáculo da natureza com essa tecnologia, uma casca protetora”, diz Beckett.


PROJETO BRASIL

FOTO: MARCELO COELHO

Centro Educativo Burle Marx

O exíguo espaço disponível e a vontade de mimetizar o edifício na paisagem sugeriram a conformação de um extenso pavilhão horizontal, em apenas um pavimento, sobre o lago, levemente rebaixado em relação ao entorno. Sua cobertura atua como ponte unindo diferentes partes do museu além de conformar ampla praça elevada com espelho d’água ajardinado, destinada ao encontro e a contemplação, promovendo forte integração entre arquitetura e paisagismo.

O pavilhão integra o parque Inhotim, na cidade de Brumadinho, em Minas Gerais

O acesso principal ao edifício se dá através de uma praça que se desdobra em um amplo anfiteatro conduzindo o público à área de acolhimento. Do acolhimento pode-se acessar diretamente biblioteca, ateliês e auditório. A cobertura é também uma opção de acesso ao museu através de sua praça elevada. Tanto no percurso sobre o espelho d’água quanto nos percursos entre os diferentes programas do edifício, a circulação é sempre feita através de varandas e espaços de convívio. Neste edifício a experimentação da arquitetura se funde ao exuberante paisagismo local.

Julho 2018 | N. 0 | Revista VerdePerto | 29


Arquitetos: Alexandre Brasil, Paula Zasnicoff 1705.0 m2

Cálculo estrutural: Marcello Teixeira, Sigefredo Saldanha

FOTO: MARCELO COELHO

Arquitetos colaboradores: Edmar Ferreira, Ivie Zappellini, Rosana Piló

Construção: Felipe Salim, Frederico Grimald

A cobertura é constituída por três lajes nervuradas em concreto aparente, moduladas em 80cm, o que proporciona organização e racionalização dos materiais utilizados. A própria organização do programa solucionou a necessidade técnica das juntas de dilatação entre as lajes, tornando independentes as lajes da biblioteca, a dos ateliês e a do acolhimento/auditório. O único volume que se eleva sobre a cota da praça elevada é o urdimento do auditório, também construído em laje nervurada. FOTO: DANIEL MANSUR

No piso inferior os visitantes caminham sobre o lago, nos corredores suspensos.

Neste setor estão a maioria dos serviços básicos, como a área de alimentação e os banheiros

30 | Revista VerdePerto | N. 0 | Julho 2018

PLANTA: PAULA ZASNICOFF

PLANTA: ALEXANDRE BRASIL

Construído em 2009

Nesta nova versão da escultura-chave de Yayoi Kusama, de 1966, 500 esferas brilhantes de aço inoxidável flutuam nos espelhos d’água da cobertura do Centro Educativo Burle Marx, em Inhotim. Esta obra matricial da arte feminista é uma escultura em grande formato que, no entanto, se desmaterializa, movendo-se organicamente em reação ao vento e refletindo a natureza ao seu redor.


FOTO: TAKAHIRO TAGUCHI

r r e o v lh .. i v e . m om c


verd e per to.


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