Lazer e Cultura na Mooca

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LAZER E CULTURA NA MOOCA: requalificação da antiga fábrica Labor

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LAZER E CULTURA NA MOOCA: requalificação da antiga fábrica Labor

aluna Karina Loekmanwidjaja professora orienadora Joana Carla Soares Gonçalves

Junho 2015 3


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agradecimentos Agradeço à professora Joana Carla Soares Gonçalves, na qual tenho muita admiração, pelo apoio e aprendizado ao longo desse último ano e por sempre acreditar no meu trabalho; aos professores da banca: Antônio Carlos Barossi, pelos atendimentos e por lecionar com tanta paixão; e Roberta Kronka Mulfarth, que foi minha orientadora de Iniciação Científica e agora tenho o prazer de ser avaliada por ela novamente; aos amigos da FAU, Heron, Maísa, Mariana e Rodrigo, pelos momentos de risadas, companheirismo e aprendizado ao longo desses 5 anos; à Anna, minha grande parceira arquiteta que me acompanhou nas visitas ao terreno; e à Lara, que meu deu muito auxílio no final deste trabalho; ao Koji, que me apoia desde o início e está sempre ao meu lado; ao meu pai, Hermawan, pela compreensão e apoio; à minha mãe, Regina, que sempre foi uma grande fã dos meus trabalhos e me incentivou durante todos esses anos.

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Estrutura do galp達o anexo das caldeiras Fonte: Arquivo da autora, 2014

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índice INTRODUÇÃO

A REGIÃO

pág. 7

REFERÊNCIAS •

SESC Pompéia

LX Factory

pág. 9

inserção urbana

qualidades urbanas

PROPOSTA

história

primeiros estudos

usos

programa

rotas acessíveis e transposição das

matriz ambiental

barreiras

projeto

pág. 59

pág. 67

síntese da análise

O LUGAR •

história

aspectos construtivos

cronologia construtiva

levantamento fotográfico

ANÁLISE •

demolir/ preservar

mapeamento estrutural

estudos de iluminação:

conclusão

pág.107

bibliografia

pág. 108

pág. 31

pág. 47

máscaras, insolação e iluminância

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introdução

Como trabalho final de graduação propõe-se um centro de lazer e cultura

atrelado ao patrimônio industrial abandonado na Mooca. São Paulo é uma cidade

A proposta para o objeto de estudo tem como objetivo conciliar a memória e a história

com alta densidade construtiva na região central, mas que apresenta diversos espaços

local com a demanda atual da população, por meio de intervenções que preservem e

inutilizados que poderiam ser reaproveitados. Tendo em vista a quantidade de galpões

valorizem a construção original existente, mas que também crie espaços de qualidade

e fábricas abandonados nesta região e o valor histórico que eles apresentam, é clara

social e ambiental associados aos novos usos que terá o lugar.

a necessidade da preservação destes. Apesar de muitos bens estarem tombados, eles

estão fora de uso e não possuem uma manutenção adequada, privando a população de

de informações em escala regional e do edifício; (ii) análise aprofundada do conjunto

entrar em contato com a riqueza histórica desses edifícios.

Labor e estudos de referências com princípios semelhantes que propuseram

intervenções em edifcícios existentes; e (iii) proposta de projeto, com aprimoramentos e

O bairro da Mooca foi escolhido como área de intervenção partindo-se da

premissa de ser uma região carente de áreas culturais, de lazer e convívio, e que está passando por uma transformação - antes parte de um eixo industrial e atualmente se tornando cada vez mais residencial e comercial - mas que ainda carrega uma forte história da cidade de São Paulo. Com a especulação imobiliária na região, tende-se a aumentar o número de residentes e a demolição das fábricas e galpões industriais. Dessa forma, a instalação de um equipamento cultural de referência para a comunidade vinculado ao patrimônio histórico industrial se mostra de extrema relevância para conservar o mesmo e atender às necessidades da população local.

A partir dessas premissas, foram realizadas visitas na região, com o auxílio do

mapeamento dos galpões industriais realizado pela Manoela Rosetti Rufinoni em sua tese de doutorado em 2009. A possibilidade de visitas ao terreno e a sua inutilização foram fatores relevantes para a escolha do edifício. Ao entrar no complexo industrial que abrigava a antiga fábrica Labor, foi possível observar a riqueza do espaço quanto ao seu valor histórico e arquitetônico. A fachada voltada para a Rua da Mooca marca a paisagem urbana e caracteriza a região, fazendo do complexo uma referência local. No entanto, o acesso restrito ao lote de 16 mil m2 impede que a população tenha contato com a construção fabril original de 1904.

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tivesse acesso ao espaço, dando novo uso ao complexo e criando sinergias com a região.

Dessa forma, foi clara a necessidade de uma intervenção para que a comunidade

O trabalho foi estruturado nas seguintes etapas: (i) mapeamento e levantamento

novas instalações no antigo complexo industrial.


Vista por entre o port達o original da Rua da Mooca para dentro do terreno Fonte: Arquivo da autora, 2015

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Vista aĂŠrea Fonte: Google Eart, 2010

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a região O bairro da Mooca faz parte da Subprefeitura da Mooca, junto com os bairros do Brás, Pari, Água Rasa, Belém e Tatuapé, os bairros mais antigos a leste do rio Tamanduateí. O edifício estudado encontra-se no limite entre os bairros da Mooca, Brás e Cambuci, além de estar próximo da subprefeitura da Sé. Ele se localiza próximo à Avenida do Estado (a oeste) e à linha férrea que liga Santos a Jundiaí (a leste). Mais especificamente, entre a Rua da Mooca e a Avenida Alcântara Machado (Radial Leste). Sua localização é estratégica e peculiar ao mesmo tempo, devido ao fato de se posicionar em uma região central, mas também com poucos entrantes no espaço com as diversas barreiras ao redor. Para analisar as principais caraterísticas econômicas, sociais e morfológicas da região atualmente, foram utilizados: o Relatório Final do Plano Diretor Regional da Mooca, desenvolvido pelo Instituto Polis, com a participação da comunidade, que orientou o desenvolvimento do Plano Diretor Regional da Subprefeitura da Mooca (PDRM); a tese de mestrado da Maria Elizabet Paes Rodrigues, onde ela faz um recorte em suas análises para uma área que abrange o entorno próximo do Conjunto Labor; e as visitas ao campo que foram registradas em fotografias.

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inserção urbana

De modo geral as características mais marcantes hoje são o uso do espaço

de forma diversificada: (i) o comércio especializado de vestuário e de ferragens, em particular no bairro do Brás, (ii) as indústrias de pequeno porte relacionadas também ao setor têxtil além de indústrias de maior porte no bairro da Mooca (iii) a existência de restaurantes e locais ligados à gastronomia. Nos últimos anos, vem ocorrendo forte investimento do mercado imobiliário que, visando atender a demanda, tem construído grandes condomínios habitacionais. A área ainda é marcada pela sua ocupação do começo do século XX. No que se refere ao tipo de construções, existe uma grande heterogeneidade, assim como nos tamanhos de lotes, que abrigavam desde as pequenas vilas operárias até os grandes centros fabris.

Quanto às indústrias que ainda permanecem na região, a Mooca é o bairro que

abriga as empresas de maior porte, que ainda se beneficiam da proximidade dos trilhos para escoar a produção. Porém, a maioria das indústrias são de menor porte, voltadas ao setor têxtil, não poluentes e compatíveis com o uso residencial. Grande parte da indústria se mudou aos novos polos industriais, deixando inúmeros galpões e fábricas de grande porte disponíveis, os quais estão sofrendo uma reconversão de uso através da implantação de grandes equipamentos em suas estruturas. Alguns exemplos de equipamentos institucionais são a Universidade Anhembi-Morumbi, na antiga indústria têxtil Alpargatas, na Mooca; e a instalação do SESC Belenzinho onde funcionava o Lanifício Santista, no bairro do Belenzinho.

Infelizmente, em sua maioria, o mercado imobiliário vem demolindo esses

complexos industriais e construindo grandes condomínios habitacionais. Tais condomínios seguem os padrões do resto da cidade, sendo murados em todo o Mapa identificando a subprefeitura da Mooca Fonte: Prefeitura de São Paulo

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perímetro, muitos deles com vários andares de garagem acima do solo, criando uma segregação entre os espaços utilizados.


VIA CO DUT STA O E E S LEV ILV AD O A

BRÁS E

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B

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O

O

MOOCA EST AD

principais vias

D

E

JU

O

ferrovia

AV. 23 DE MAIO

AV .9

E .R AV

E LL

linhas de metro

CAMBUCI

área de intervenção

1 Km

IPIRANGA

Inserção urbana do objeto escohido. Fonte: arquivo da autora, 2014.

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Outro fenômeno a se refletir é o das barreiras urbanas. A ferrovia, a linha verde

A Lei nº 16.050, de 31 de Julho de 2014, define a zona de centralidade:

do metrô, a Avenida do Estado e a Avenida Radial Leste são algumas delas. São vias de

‘‘ Art. 36. As Zonas de Centralidades - ZC são porções do território destinadas à localização

grande importância para a cidade e facilitam o acesso à diversas regiões, contudo, a nível

de atividades típicas de áreas centrais ou de subcentros regionais ou de bairros,

local comprometem a mobilidade, geram vazios urbanos e principalmente no que se

caracterizadas pela coexistência entre os usos não residenciais e a habitação, porém

refere às avenidas, diminuem significativamente a qualidade ambiental dos bairros por

com predominância de usos não residenciais, podendo ser subdivididas em zonas de

onde passam.

centralidades de baixa, média e alta densidade.

Os principais problemas apontados pela população local são: (i) a falta de áreas

verdes, responsável pelos maiores índices de temperatura da cidade de São Paulo; (ii) conflitos de zoneamento na área de comércio especializado, com a necessidade de preservação e reconversão de uso das antigas indústrias, carência de equipamentos de cultura e lazer; e (iii) inundações em determinadas áreas devido à canalização obsoleta e a presença de cortiços. Devido ao alto percentual de população idosa, particularmente no bairro da Mooca e Tatuapé, em áreas residenciais, foi apontado pela leitura comunitária “a vontade de fomentar a atração da população jovem para a

Classificação Plano Diretor Macroárea de Estruturação Metropolitana

Zona de Centralidade Macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana

região, acreditando que essa população possa dar vida urbana, povoar as ruas à noite,

Parâmetros de Ocupação

ocupar os vazios, etc.” (Relatório PDRM, 2003). Também foi sugerida a implantação de equipamentos de educação, cultura e lazer para colaborarem com esse fomento.

Os objetivos gerais do Plano Regional Estratégico da Subprefeitura da Mooca

mín. 0,3 C.A

uso, como, por exemplo, de galpões industriais subutilizados; estímulo ao uso misto;

Gabarito máximo

reparcelamento de lotes e quadras; incentivo à implantação de usos diversificados; equipamentos de lazer, cultura, educação e saúde. Quanto ao terreno, onde está localizada a fábrica de tecidos, o Plano Diretor

Estratégico indica que ele está inserido em uma Macroárea de Estruturação Urbana, e a Lei de Zoneamento o define como uma Zona de Centralidade.

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T.O

0,7

28m

Recuos Mínimos

5m Frente 3m Fundos e Laterais

Perímetro de Qualificação Ambiental

estímulo ao comércio e serviços de pequeno e médio porte e à criação de áreas verdes e

básico 1 máx. 2

(PRE MO) são a manutenção do uso industrial, gerador de empregos e produtos, porém focando em tipologias menos incomodas ao uso residencial; reconversão de

Classificação Lei de Zoneamento

PA 1

Taxa de permeabilidade

0,25

Pontuação QA mínima

0,7

Cobertura Vegetal (alfa)

0,5

Drenagem (beta)

0,5


0

0,25 0,50

1 km

Mapa de zoneamento da cidade de São Paulo fonte: Prefeitura do Município de São Paulo. Secretaria Municipal do Desenvolvimento Urbano

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qualidades urbanas

A existência de inúmeros exemplos de antigas “vilas” de uso residencial e de

“casas em série” é uma característica do período da formação dos bairros operários que faz parte do desenvolvimento industrial da cidade e representa a memória do cotidiano que deve ser valorizada como patrimônio histórico e cultural da vida da população, apesar dessas áreas residenciais não se caracterizarem como monumentos.

A vila é a principal característica habitacional do bairro. O levantamento de

uso do solo aponta a existência de 20 vilas na área, sendo que 14 delas já constavam no mapa desde 1930. A sua maioria apresenta bom estado de conservação, mas sua arquitetura está descaracterizada por uma série de modificações nas edificações. A sua preservação se explica pela qualidade do desenho urbano dela resultante. A definição de vila, de acordo com relatório da EMURB de 1978, realizado em função do impacto da implantação da linha leste - oeste do Metrô, diz o seguinte: ‘‘Agrupamentos de habitações originalmente semelhantes, com acesso através de um espaço comum de uso local. Caracterizam um tipo de ocupação de solo urbano, definido pela ocupação de áreas internas às quadras do tecido urbano através do conjunto de pequenos lotes com acesso a uma área de uso comum que pode apresentar diferentes tipos (travessa ou rua particular, viela, corredor, viela com pátio). Cada domicílio ocupa um imóvel com lote subdividido, sendo que os jardins, pátios ou corredores de acesso, são comuns a todos os domicílios.’’

Apesar da sua localização em uma área central da cidade, as características

originais do bairro se preservaram nessa região. Uma evidência disso é o tecido urbano que, com exceção da Av. Radial Leste, permanece quase o mesmo nos últimos 70 anos. Esta morfologia, encontrada nas vilas operárias remanescentes do período industrial, traz qualidades urbanas que devem ser conservadas e muitas vezes até replicadas em outros projetos de intervenção na região, como forma de valorizar a história e oferecer aos usuários mais espaços com esse tipo de qualidade.

Tal morfologia, que possui ruas internas ao lote, também pode ser encontrada

em galpões industriais, sendo uma via estratégica de circulação dos funcionários e escoamento dos produtos dentro dos enormes lotes que eles se situam. Além disso, Armazéns Piratininga Arquivo da autora, 2014.

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essas ruas trazem qualidade ambiental para estes espaços, permitindo a entrada de luz e ventilação natural para funcionários.


Viela na Rua dos Cientistas, Mooca. Arquivo da autora, 2014. Viela na Rua da Mooca, Mooca. Arquivo da autora, 2014.

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história

Para traçar diretrizes e projetar em um local com tanto valor para a cidade de São

Paulo, é necessário estudar os processos que levaram ao seu desenvolvimento, desde a sua morfologia urbana até a população que já habitou a região, de forma a levantar os valores culturais, urbanos e históricos da região, e potencializá-los na escala do projeto de intervenção.

Em 1810, como é possível observar no mapa ao lado, o adensamento da cidade

ficava restrito ao centro histórico, confinada entre os rios Anhangabaú e Tamanduateí, que ainda possuía seu traçado original. Ao leste do Tamanduateí, só existiam algumas chácaras e grandes loteamentos. Seu acesso pelo centro se dava pelo “Caminho da Corte” mais ao norte ou pelo “Caminho da Mooca”, atual Rua da Mooca, que começa a aparecer no mapa mais ao sul. O tipo de construção da época nesse local ficava restrito a grandes fazendas construídas com taipa cuja mão de obra era provavelmente escrava e por encomenda. A população era metade branca e metade negra ou parda e essencialmente rural.

Depois da Guerra do Paraguai e da Lei do Ventre Livre (1871), a população

da cidade foi afetada pela urbanização dos fazendeiros de café, que se transferiram para a capital, compraram terras e formavam as chácaras urbanas ao redor do centro urbano, cujos propietários eram fazendeiros mais ricos. Depois, vieram as chácaras mais distantes, nos arredores da cidade, no espigão da Paulista, Bela Vista, Consolação, Mooca e Vila Buarque (Rodriguez, 2006). A partir de meados do século XIX, o sucesso da produção cafeeira no interior paulista impulsionou a industrialização em São Paulo.

Em 1867, foi implantada a ferrovia São Paulo Railway, em direção ao leste, a

qual marcou o vetor de crescimento e industrialização da cidade. Concomitantemente, a fins do século XIX, imigrantes, principalmente italianos, começaram a se estabelecer na região, para servir de mão de obra nas novas fábricas. Eles se alojavam em cortiços precários, próximos às fábricas, formando a nova classe operária. Esses fatores fizeram Mapa de São Paulo 1810 Fonte: Prefeitura de São Paulo

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com que o bairro da Mooca adquirisse sua identidade particular e sua configuração de bairro operário industrial do qual hoje, ainda há resquícios.


Os bairros ao leste começaram a sofrer transformações com a implantação de

outras ferrovias, como a de Santos-Jundiai e das primeiras fábricas próximas a essas ferrovias, além da implantação de grandes construções para atender a elite paulistana, que já não encontravam lugar suficiente no centro da cidade.

No fim do século XIX, junto ao declínio do café, a cidade já era um pólo comercial,

com um parque industrial consolidado e serviços diversificados. A cidade continuou a crescer, seguindo modelos europeus de traçados ortogonais às ferrovias e aos caminhos existentes. Contudo, os loteamentos foram surgindo próximos às paradas das ferrovias, deixando grandes áreas vazias entre si.

Em 1890, o Brás já apresentava parte de seu território subdividido em quadras,

cortado pela Rua Piratininga e a Rua Carneiro Leão, enquanto a Mooca ainda era formada por chácaras, área de várzea e a Rua da Mooca.

Em 1914, Brás e Mooca já tinham seu território subdividido em quadras. Pelo

traçado viário, é possível perceber que aproximadamente um terço das quadras ainda

Mapa de São Paulo 1895 Fonte: Prefeitura de São Paulo

eram abertas, ou seja, não estavam totalmente consolidadas, principalmente as que faziam limites com as ferrovias e o Rio Tamanduateí.

O traçado viário da

área de estudo já apresentava o mesmo desenho que permaneceu até o momento da implantação da Av. Alcântara Machado, no fim da década de 1950. Este sistema viário alterou significativamente esse traçado viário e o tecido urbano como um todo.

Do início do século 20 até a década de 1930, a cidade se desenvolveu a partir do

movimento de industrialização e exportação. O excedente de mão-de-obra qualificada e infra-estrutura gerada para a cafeicultura - como as ferrovias para o escoamento da produção de café - migraram para a indústria, juntamente com os investimentos dos cafeicultores. Em meados do século 19, São Paulo já contava com diversificado quadro de pequenas e médias indústrias instaladas em bairros industrializados da cidade como Lapa, Pari, Brás e Mooca.

Em 1930, Brás e Mooca já apresentavam tecidos urbanos praticamente

consolidados, com pequena parte de seus terrenos ainda a construir e o restante ocupado por sobrados de alvenaria, vilas de casas em renqe e galpões industriais de

Mapa de São Paulo 1914 Fonte: Prefeitura de São Paulo

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tijolos com cobertura tipo lanternin. A malha urbana já tinha as características que mantém hoje, incluindo as pequenas passagens onde se construíram as vilas operárias.

Em 1950, como se pode observar no mapa, o traçado viário da área objeto

já apresentava seu desenho final antes da implantação da Avenida Radial Leste. O Hipódromo era ainda o nome do trecho do bairro da Mooca onde anteriormente estava instalado o Jockey Club São Paulo. O tecido urbano totalmente consolidado apresentava variado leque de tipologias arquitetônicas, formado por vilas operárias, galpões industriais, pequenos prédios residenciais com andar térreo destinado a armazéns e pequenos comércios, construções que abrigavam as instalações ferroviárias e equipamentos para fornecimento de gás e energia elétrica.

Na década de 50, iniciou-se a escassez dos pedidos de aprovação de loteamentos,

arruamentos e passagens junto à prefeitura da cidade, cujas obras eram financiadas Mapa de São Paulo 1924 Fonte: Prefeitura de São Paulo

pelas indústrias que atuavam como promotores imobiliários na produção de moradias para a classe média e operária.

Em 1972, o traçado viário e consequentemente o tecido urbano da região do Brás

e Mooca foram fortemente alterados para dar lugar à construção da Avenida Alcântara Machado, trecho do conjunto da Radial Leste, uma das artérias do Plano de Avenidas. Com a implantação desta avenida, as ruas foram interrompidas e a mobilidade local, consequentemente, também. No fim da década de 1970, o Brás já tinha implantada a Linha Leste do Metrô, inaugurado entre 1979 e 1981, entre a Avenida do Estado e o Viaduto Bresser; comprometendo ainda mais a mobilidade local.

Mapa de São Paulo 1952 Fonte: RODRIGUEZ, 2006

20


Mapa de S達o Paulo 1972 Fonte: RODRIGUEZ, 2006.

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temperatura

O mapa de temperatura aparente indica uma clara associação entre os

microclimas existentes, a presença de vegetação e tipo de uso do solo. Percebe-se que Brás e Mooca apresentam as temperaturas mais altas da cidade (de 31,5 °C a 32 °C), em virtude da falta de arborização, da extensa área de solo impermeabilizado, da poluição atmosférica, e das coberturas das fábricas que geram uma ilha de calor sobre elas. A qualidade ambiental dessa região é uma das piores da cidade, pois congrega uma série de fatores que a predispõem a isso. As áreas verdes são inexistentes, exceto pelos pequenos jardins da Estação Bresser do metrô. Não existem praças no Brás e Mooca, sendo que nos trechos em questão a arborização é quase inexistente. No lugar de um rio com margens ajardinadas, tem-se um canal de concreto, com um rio encarcerado que não contibui para a boa ventilação e refrescamento da área. Praças: em toda região de estudo existem apenas as sobras de terrenos decorrentes da implantação do metrô leste no Brás, revestidas com gramados sem manutenção adequada. Áreas verdes e espaços abertos: Assim como no caso das praças, não existem espaços livres abertos para lazer ou contemplação. Os dois tipos de espaços públicos são vitais para garantir a qualidade da população de 60 anos ou mais e da população de zero a 19 anos, que tem mais tempo ocioso e representam, respectivamente, 15,8% e 26,6% da população total contida na região.

24º

25

26º

27º

28º

29º

30º

31º

[ºC]

Mapa de temperatura aparente Fonte: Atlas Ambiental

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Vista aĂŠrea Fonte: Google earth, 2010

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usos

Neste mapa de uso, que abrange um raio de até 12 km em relação ao terreno da

antiga Fábrica Labor, em direção ao sentido Mooca e Água Rasa, percebe-se uma grande predominância de edifícios residenciais em meio aos galpões industriais - ao longo da linha férrea - e os comércios e serviços, na direção do Brás e parte do Cambuci.

Nas visitas in loco, pode-se perceber que grande parte desses conjuntos

residenciais na Mooca são recentes e ainda há muitos lançamentos desses empreendimentos, os quais muitas vezes não respeitam o patrimônio industrial existente. No entanto, é possível perceber também que a região onde se encontra o terreno de estudo, cercada pela Av. Alcântara Machado, Av. do Estado e a Linha Férrea, apresenta uma morfologia diferente, tanto da Mooca quanto do Brás. Trata-se de uma região mais consolidada, cujo tecido urbano, como já descrito anteriormente, se mantém o mesmo desde a década de 50. Por esse motivo, foi feito um recorte do entorno mais

Residencial horizontal

próximo do terreno para uma análise mais precisa dos usos.

Residencial vertical

Comércio e serviços Indústria e armazéns Residencial + comércio/ serviços

4 km

Residencial + indústria/ armazéns Equipamentos públicos Escolas

6 km

sua tese de mestrado: ‘‘Radial leste, Brás e Mooca: diretrizes para requalificação urbana.’’ O bairro do Brás apresenta intenso uso comercial e serviços diversificados e

especializados. O bairro da Mooca baixa conta também com grande diversidade de usos, porém a predominância residencial em algumas quadras é maior do que no Brás.

Outros

Nos dois bairros, o comércio e serviço de âmbito local ocorrem de forma dispersa, sem

Sem predominância Sem informação

loco, foi utilizado como base o levantamento feito por Maria Elizabet Paes Rodriguez em

Comércio/ serviços + indústria/ armazéns

Para entender melhor os usos do entorno próximo ao terreno, além das visitas in

8 km

centralidades. Em ambos os bairros, a presença de galpões industriais ainda é forte, mas a grande maioria deles teve seu uso alterado para serviço ou para depósitos logísticos de

0

1 km

2 km 10 km

apoio ao comércio especializado de couro, plásticos e máquinas operatrizes.

Observando-se a distribuição dos imóveis com uso exclusivamente residencial,

percebe-se que o uso é mais intenso na Mooca baixa que no Brás. Por outro lado, no Mapa de Usos Fontes: Secretaria Municipal de Finanças/ Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano

24

12 km

Brás se encontram os dez condomínios residenciais verticais produzidos pela COHAB na década de 1980. Na Mooca baixa, a verticalização é rarefeita. Exceto pela produção


estatal de moradias por parte da COHAB e CDHU, o restante dos imóveis residenciais existentes no local datam do período entre a década de 1920 e 1950. Analisando a distribuição dos imóveis com uso misto, observa-se que esse tipo de uso é frequente em ambos os bairros. A maioria dos imóvies de uso misto com andar térreo e um ou dois andares superiores foi construída durante a década de 1930 ou pouco depois.

A verticalização dessa área de entorno é muito pouca. A maioria das edificações

são de 2 e 3 andares, sendo de uso residencial, ou misto com comércio no térreo.

comércio

áreas verdes

predominantemente residencial com térreo comercial predominantemente residencial com térreo de serviços

residencial

serviços

indústrias

Mapas de Usos Fontes: RODRIGUEZ, 2006

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transposição das barreiras e rotas acessíveis D. PEDRO

RADIAL LESTE

A área de intervenção, apesar de estar situada em uma região com caráter de

bairro, está cercada por grandes vias de ligação regional, que se tornam uma barreira urbana à acessibilidade local, já que dificultam o trânsito entre os bairros. Percebese que essa região é fraccionada pelo conjunto de sistemas viários composto pela linha vermelha do metrô, linha de trens metropolitanos, Av. do Estado e Radial Leste. A presença desta avenida - a qual não apresenta nenhuma relação com o entorno,

legenda:

pois desde sua criação serve para ligar o centro histórico e o centro expandido ao

R. DA MOOCA

extremo leste da cidade - contribuiu para o afastamento dos pedestres das ruas e para a dificuldade de circulação local nestes bairros, reafirmando mais uma vez o isolamento desta área da cidade e consequentemente contribuindo também para a degradação

transposições barreiras

AV. DO ESTADO

do entorno. Por outroAV.lado, a disponibilidade de transporte público no âmbito local e PAES DE BARROS regional é grande, fazendo parte de todo um sistema de ligação regional (avenida de

Barreiras urbanas e transposições Fonte: Arquivo da autora, 2014

MOOCA

alto tráfego + linhas de ônibus + metrovias). A área de intervenção pode ser acessada pelas estações de metrô Brás, Bresser e Dom Pedro II ou pela estação de trem Mooca. Além disso, as linhas de transporte público de ônibus são muitas na Radial Leste, Rua da Mocca e Av. do Estado. Apesar do objeto de estudo estar bem localizado, servido de transporte público e grandes avenidas, o caminho do pedestre na região não é muito agradável, sendo árido, sem sombreamento e muitas vezes com calçadas estreitas. As transposições das barreiras (Av. Alcântara Machado e linha férrea) também não oferecem qualidade urbana e podem apresentar perigo ao pedestre devido à falta de manutenção. O espaço embaixo do viaduto Alcântara Machado, mais próximo ao terreno, encontrase atualmente repleto de moradores de rua e lixo. Por estar localizado apenas a 150 metros do mesmo, o projeto de requalificação da antiga Fábrica Labor deverá incluir também um programa para esse espaço. Um pouco mais em direção a linha férrea, ainda sob o viaduto, encontra-se uma academia de boxe que atende os moradores da região, inclusive os de rua. Ela começou com equipamentos feitos de sucata, e depois recebeu um patrocínio ganhando equipamentos novos. A expansão de espaços como este, mantidos pela própria população, é uma possibilidade para o restante do viaduto que se encontra em estado de degradação.

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Caminhos do pedestre 1. Metro D.Pedro II: 1,4 km - 13 minutos 2. Metrô Brás:

BRESSER

1,1 km - 13minutos 3. Mooca CPTM 1,4 km - 17 minutos

BRÁS

D. PEDRO

2 1

AV. ÂLCANTARA MACHADO

3 R. DA MOOCA

BRESSER

Metrô e CPTM Vias principais

AV. DO ESTADO

BRÁS

Caminhos de acesso

MOOCA

Área de intervenção

D. PEDRO

AV. PAES DE BARROS 0

AV. ÂLCANTARA MACHADO

100 200

Rotas acessívies de transporte público. Fonte: Arquivo da autora, 2014

27


transposição das barreiras e rotas acessíveis percurso 2 Viaduto Alcântara Machado

percurso 2 Academia de box sob viaduto Alcântara Machado

Fonte: Google Earth, 2014

28


percurso 1 - Rua visconde de Paranaíba. Vista da passarela que atravessa a Av. Alcântara Machado - Av. Alcântara Machado: calçada larga com alguma arborização

percurso 3 - Passarela da Rua da Mooca que transpõe a linha férrea. Não possui manutenção e iluminação adequada. - Rua da Mooca: calçada estreita (1,00m) em frente ao terreno de intervenção.

Fonte: arquivo da autora, 2014.

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síntese da análise 1. Ponte para pedestres que cruza a

2. Armazéns Piratininga: um dos

3. Av. Radial Leste: via arterial de alto

linha férrea: em estado precário e sem

exemplos de arquitetura remanescente

fluxo de carros tangente ao lote de

manutenção.

do período industrial encontrado no

intervenção.

bairro.

Fontes: Arquivo da autora, 2014 Google Earth, 2010

30

4. Escola na Rua da Mooca: foram

5. Malha urbana consolidada. bem

identificadas 2 creches e 1 escola de

servida de transporte público, de uso

ensino fundamental e médio em um raio

misto (comercial, residencial, serviços e

de 2 km do terreno.

industrial)


BRÁS

D. PEDRO

avenida do estado

avenida alcântara machado

rua da mooca

pontos de ônibus

estações de metrô

área de intervenção

EMEI e EMEF (4 a 18 anos) creche

0 10

50

100

Fonte: Arquivo da autora, 2014

31


Foto da entrada principal do conjunto. Fonte: Arquivo da autora, 2014

32


a fรกbrica de tecidos

33


história

hp de força, são de Westinghouse. O fornecimento de vapor para as seções de preparação,

As informações mais antigas tratam do lote onde hoje está situado o

conjunto da fábrica era do Coronel José Ferreira de Figueiredo, importante cafeicultor

tinturaria etc. é feito por uma caldeira de 200 hp, do fabricante Franco Tossi, Itália. As

da região de Bauru e fora vendida em 1907 para G. Crespi & Companhia, representado

diferentes seções da fábrica são: fiação, tecelagem, tinturaria, acabamento, oficina

pelo sócio Giovanni Crespi (irmão de Rodolfo Crespi, proprietário do Cotonifício Crespi).

mecânica para consertos de máquinas etc. O funcionamento de todas as seções exige para

A publicação de 1913, Impressões do Brasil no Século Vinte, traz um breve relato sobre o

cima de 1.000 pessoas, entre homens, mulheres e crianças, que diariamente trabalham na

funcionamento e formação da tecelagem, que se dedicava a fiação e à tecelagem de lã e

fabricação de artigos de algodão, lã, linho, colchas, xales, brins e cretones. Na Exposição do Rio de Janeiro de 1908 recebeu a fábrica um grande prêmio e uma medalha de ouro pelos

algodão:

artigos expostos. Para propaganda e venda dos seus produtos, tem a fábrica agentes em quase todas as principais cidades do país”.

“A fábrica, situada à Rua da Moóca, 155, a cinco minutos do centro da cidade, ocupa uma área de 20.000 m². Os prédios que acabam de ser edificados são magníficos e de primeira

ordem; os maquinismos neles instalados realizam todas as exigências que o crescente

progresso da indústria impõe a estabelecimentos deste gênero. A instalação completa

onde possivelmente recebe o nome de Indústria Têxtil Supertest. Há também dados

comporta 600 teares e 10.000 fusos, movidos por eletricidade. Os diversos motores, de 600

Em 1939, a fábrica foi comprada pelas famílias Vidigal, Mattar, Zarzur e Mafuz,

referentes ao uso da fábrica como depósito da Fábrica de Cadeados Pado, porém tais

Fundação da Fábrica de Tecidos Labor S.A.

1907

1939

1987

2009

Terreno é vendido para

A fábrica é comprada pelas

As atividades da Fábrica de

Entrada com pedido

G. Crespi & Companhia,

famílias Vidigal, Mattar, Zarzur

Tecidos Labor foram formalmente

de tombamento

representado pelo sócio

e Mafuz, onde possivelmente

extintas. Período de decadência da

pelo Condephaat.

Giovanni Crespi (irmão de

recebe o nome de Indústria

tradicional atividade fabril do bairro

Rodolfo Crespi, proprietário

Têxtil Supertest.

da Mooca.

do Cotonifício Crespi).

34

1910


informações não foram confirmadas.

que teve muitos dos vãos cobertos por alvenaria. Ainda hoje é propriedade particular e

seu acesso, proibido.

De acordo com a Minuta de tombamento do Condephaat, processo 59448/2009,

as atividades da Fábrica de Tecidos Labor foram formalmente extintas em 13/08/1987,

Há alguns anos, próximos da realização do Relatório Final do Plano Diretor

período em que começou a decrescer a atividade fabril do bairro da Mooca, devido ao

Regional da Mooca, a prefeitura e a população local listaram alguns imóveis da região

deslocamento das indústrias a outros pólos. Após sua extinção, o conjunto fabril nunca

que deveriam ser tombados, dada a importância da preservação da paisagem urbana

fora reutilizado em sua totalidade mas partes dele receberam diferentes usos como casa

característica. O conjunto em questão, a antiga Fábrica de Tecidos Labor, na época

noturna, mais especificamente a “Fábrica 5”, que ocupou a área voltada à Radial Leste,

apontado como “Edificações que abrigam hoje o Fábrica 5” foi uma das indicações da

e construiu alguns anexos para atender às necessidades. O casarão foi ocupado como

leitura comunitária. O levantamento foi encaminhado para o COMPRESP, e em 2009

ateliê de artes e sala de exposições e o galpão principal, como estacionamento. Na

deu-se início ao seu processo de tombamento. Ele já está em caminho de aprovação

sequência deste trabalho é apresentada uma planta com o histórico de construção.

mas ainda não foi oficializado. Foi estudado a minuta de tombamento e, pensando

Hoje o conjunto não se encontra em bom estado de conservação, provavelmente devido

na preservação e valorização da construção original existente, muitos itens foram

à falta de uso e de manutenção. Após ter sido desativado, o espaço passou por várias

considerados no projeto. Mas, a proposta de intervenção não contempla o conjunto

alterações, não só no interior para se adaptar aos novos usos, como também na fachada,

como um bem tombado.

1895 QUADRA DE ESTUDO

1930 QUADRA DE ESTUDO

1973 QUADRA DE ESTUDO

2010 QUADRA DE ESTUDO

Quadra de grandes dimensões confinada

Novas ruas dividem a grande quadra

Avenida Alcântara Machado (Radial

Atual configuração

entre a Rua da Mooca e Visconde de

original. A Fábrica de Tecidos Labor já

Leste) corta a quadra original

Parnaíba (hoje faz parte do bairro do

construida

modificando a configuração dos bairros

Brás)

do Brás e da Mooca

Mapa de São Paulo, 1895. Fonte: Prefeitura de São Paulo Mapa de São Paulo, 1930. Fonte: Prefeitura de São Paulo Mapa de São Paulo, 1973. Fonte: Prefeitura de São Paulo Foto aérea, 2010 Fonte: Google Earth

35


aspectos construtivos

A arquitetura fabril do período de consolidação da indústria e conformação

dos bairros industriais operários na cidade de São Paulo, é visível nas estruturas remanescentes do conjunto arquitetônico da antiga fábrica em estudo. A estrutura metálica aparente e modular utilizada no galpão principal e anexos revela uma arquitetura característica da atividade industrial da época. A facilidade de montagem e os grandes vãos, permitem espaços amplos, térreos, com um programa flexível. As paredes são de tijolos cerâmicos sem revestimento e as aberturas são rítmicas e numerosas, visto a necessidade de iluminação e ventilação, sendo comum nas coberturas soluções como sheds.

Os terrenos industriais dessa época na região da Mooca eram grandes e deviam

comportar ampliações e anexos, conforme fossem necessárias. As chaminés tinham uso particularmente indispensável ao setor de produção têxtil, pois eram necessárias ao funcionamento da caldeira a vapor. As indústrias localizavam-se próximas aos trilhos de trem, dada a necessidade de transporte de grandes cargas e muitas tinham um ramal/ trilho secundário ligado ao seu lote, para facilitar o escoamento da produção.

A Tecelagem Labor é um exemplo típico dessa arquitetura e acompanhou todas

as evoluções tecnológicas do setor têxtil, situação que pode ser bem ilustrada por meio das plantas e pedidos de alterações e ampliações junto à prefeitura da cidade de São Paulo, consultadas no Arquivo Histórico Municipal Washington Luís. Atualmente, o conjunto fabril não se encontra em bom estado de conservação, provavelmente devido à falta de manutenção e abandono, além de ter passado por muitas alterações e modificações. Externamente, percebe-se a abertura de inúmeros vãos e revestimentos cobrindo a alvenaria aparente. O espaço já foi utilizado para exposições artísticas e ateliê de arte, e as construções na esquina da Av. Alcântara Machado e a Rua Barão de Jaraguá eram aparentemente usadas como escritórios. Os galpões voltados para a Av. Alcântara Machado foram ocupados por uma casa noturna até 2002, que foi responsável pela construção de uma pequeno anexo, que funcionava como um aquário humano e o galpão principal foi usado como estacionamento. Apesar da falta de conservação e dos usos posteriores não ligados a prática industrial, a maior parte do conjunto arquitetônico não foi modificada estruturalmente, podendo sua sua riqueza e valor histórico serem resgatados por meio de técnicas de restauro.

36


Vista do interior da fábrica e esquina da Rua da Mooca e Barão do Jaguará, 1930. Fonte: Minuta de tombamento, Condephaat.

Vista do interior da fábrica e esquina da Rua da Mooca e Barão do Jaguará. Fonte: Arquivo da autora, 2014

37


cronologia construtiva 01 e 02 - galpão principal

B’

03 - residência

A’

04, 05 e 22 - oficinas 06, 21, 26 e 27 - cocheira e edificação 07 - belvedere e tinturaria 08 - respirador 09 - caixa d’água 10 - depósito 11 e 18 - chaminés 12 - caldeiras 13 - ampliação 14 - carpintaria 15 e 16 - depósito e administração 17 e 19 - galpões 20 - caixa d’água 23 - refeitório 24 - edifício de três pavimentos 25 - aquário humano 28, 29 e 32 - acréscimos 30 e 33- coberturas Datas de projeto: 1910 a 1913 1914 a 1919 1920 a 1929

C

C’

1930 a 1939 1940 a 1949 1950 a 1959 após 1959 data indefinida 0

10

20

B Fonte: Minuta de tombamento e ZAFFALON, 2013

38

A


0

10

20

Cortes e Fachadas da construção existente Fonte: Levantamento feito pelo Condephaat, 2010

39


fachadas

Rua da Mooca A fachada do galpão principal está em contato direto com a rua, apresentando um grande valor histórico e arquitetônico. No entanto, a calçada estreita, dificulta o caminho do pedestre. Encontra-se também nessa fachada, o portão da construção original, que apesar da falta de manutenção ainda está em bom estado.

40


Av. Alcântara Machado O muro de alvenaria faceando a avenida impede que a fachada do conjunto seja vista da rua. Apesar da via movimentada, a calçada desse lado é ampla e possui algumas árvores, sendo mais convidativa ao caminho do pedestre.

Rua Barão de Jaguará Desta rua é possível ter uma visão parcial, por trás do muro de alvenaria, do conjunto fabril. Faceia diretamenta a rua um galpão anexo de 1910.

41


rua interna ao complexo

A rua interna ao lote era utilizado para fins logísticos de produção. Ela relembra as qualidades urbanas citadas anteriormente, como visto no Armazéns Piratininga. Sua cobertura foi colocada posteriormente a construção original da fábrica.

42


casarão

No primeiro pavimento da casa , encontra-se um terraço de 50m2 . Dele pode-se avistar toda cobertura da fábrica, o bairro do Brás, do outro lado da Av. Alcântara Machado, e o centro de São Paulo, inclusive a Catedral da Sé. É visto no conjunto diversas pixações que foram feitas a o longo do tempo posteriormente ao uso da fábrica.

43


galpão principal

O galpão principal de aproximadamente 6.000 m2, possui principal estrutura em ferro fundido ainda em bom estado apesar da falta de conservação. Já a estrutura do galpão que faceia a Rua da Mooca, é em madeira com paredes de alvenaria auto portantes.

44


galpões anexos

Nos galpões anexos, construídos após 1914, percebe-se uma predominância da estrutura em madeira em tesouras. Para entrada de iluminação natural, foi feito aberturas zenitais em alguns pontos. Nota-se também que a maioria dos caixilhos e portas originais encontram-se em bom estado.

45


caldeira existente

A caldeira existente permanece no seu lugar original, mesmo com a falta de manutenção. Assim como as chaminés, ela é um símbolo do uso têxtil fabril do início do século XX, por ser muito utilizada para aquecimento de grandes quantidades de água para alvejar e tingir tecidos, bem como para realizar a secagem em estufas.

46


galpões anexos

A fachada voltada para a Av. Alcântara Machado não pode ser vista da mesma pois há um muro de alvenaria que separa ambas. Ela já é mais recortada, criando pequenos espaços que pode ser explorados para convivência. Há uma parte do galpão que desmoronou confome o tempo.

47


Vista aĂŠrea Fonte: Google Earth, 2010

48


análise do conjunto

Por meio do relatório de tombamento encontrado no Condephaat (processo

59448/2009) e visitas in loco, foi possível compreender melhor o conjunto arquitetônico e sua história. A partir dessa base de dados levantada, foi realizada uma análise do conjunto que abordou os seguintes temas: (i) valorização arquitetônica e histórica dos edifícios, (ii) sistemas construtivos e (iii) diagnóstico ambiental luminotécnico do conjunto.

Para começar a projetar, foi necessário determinar o que deveria ser preservado

e o que deveria ser demolido. Como já mostrado anteriormente, as construções foram feitas em épocas diferentes, criando-se anexos, muitas vezes sem planejamento. A demolição de alguns desses anexos, valoriza as construções originais e permite a criação de espaços interiores ao lote que remetem a qualidade urbana das vilas operárias e outros loteamentos industriais encontrados na Mooca.

Os critérios adotados para a escolha dos elementos a preservar no conjunto

foram o período de construção e os sistemas construtivos. Por se tratar de diversas construções, deu-se prioridade às originais de 1914 até o ano de 1930. Pensando que nesse intervalo de tempo a Fábrica de Tecidos Labor estava se consolidando naquele lugar e há elementos muito simbólicos que foram instalados até a década de 30, como por exemplo a caldeira. Após esse período, pode-se observar no mapa de cronologia construtiva que foram construídas diversas pequenas edificações anexas que não possuem tanto valor arquitetônico e histórico. Com relação ao sistema construtivo, destaca-se a estrutura do galpão principal em ferro fundido, tipicamente característica da atividade industrial na época, que apesar da falta de manutenção encontra-se em bom estado para preservação devido à qualidade dos materiais.

49


demolir / preservar

230 m² 420 m²

290 m²

870 m² 300 m² 5.220 m² a demolir a preservar ( ≈ 9.300 m²)

600 m² 1.285 m²

Plantas definindo edificações a serem preservadas e demolidas; e croquis conceituais Fonte: Arquivo da autora, 2014

50


51


mapeamento estrutural tipo A ‘‘Paredes: de alvenaria de tijolos. Forro e armação: O telhado é feito com armação de ferro e coberto com telhas francesa, nacional, e vidros, para dar claridade. Forro e armação: As duas colunas C são cilíndricas de ferro fundido, altura 5m, diâmetro 150M/m e espessura de 15m/m. tipo A

Vigas metálicas do telhado de A=7m e B=8.

tipo B

para dar claridade ao depósito.

tipo C

O telhado de madeira é construído com vigotas de madeira de lei de 160X60m/m. As

Temos, além disso, um vidro de 1m por 52cm de altura, em toda a largura da construção

telhas são de Marselha. Parte de telhado de ferro construída similar ao já utilizado na

tipo D

fabrica.”

tipo E Documento de pedido de ampliação da fábrica

Por ser uma sobreposição de construções e técnicas construtivas, o mapeamento

das estruturas existentes foi necessário para compreender melhor o complexo fabril. Nessa primeira análise foi dividido por tipologias os sistemas construtivos, baseado nas visitas feitas ao terreno e os desenhos técnicos. Os critérios utilizados foram basicamente os materias (madeira ou metal) e formas construtivas.

- Estrutura em ferro fundido pré-fabricada aparente e modular, original de 1910. - Cobertura: telhas cerâmicas e material translúcida nos sheds. Algumas partes foram removidas com o vento e devem ser trocadas, principalmente o material translúcido.

52


tipo B

tipo C

Vista do interior da fábrica Fonte: Arquivo da autora, 2014

- Estrutura da cobertura de madeira apoiada na alvenaria. Vãos variam de 12m à 6,5m de

- Estrutura mista com vigas metálicas (continuidade do galpão principal) e tesoutas de

acordo com os ambientes. O pé direito livre segue o mesmo padrão do galpão principal,

madeira. A diferença de altura entre a laje de concreto e a cobertura de telha cerâmica

de 5m, e a altura da tesoura varia entre

resulta em duas grandes aberturas laterais.

53


análise luminotécnica

Pensando no projeto de intervenção que visa proporcionar aos usuários uma

quantidade de luz natural adequada para as atividades que acontecerão nesse galpão principal, foi realizado um estudo prévio de iluminação dessa cobertura com o software Ecotect. Neste primeira etapa foram levantadas os seguintes elementos: •

máscaras de cada face da cobertura

quantidade de radiação solar (W/m2) incidente em cada face da cobertura.

quantidade de luz (lux) que chega na superfície de um observador sentado (1m do chão) em diversas épocas do ano (equinócios e solstícios).

A proposta de intervenção na cobertura visa trabalhar com os materiais opacos e

translúcidos, variando a penetração da luz em toda a área do galpão, de forma a valorizar a construção por meio da luz natural, criar espaços variados e trazer ao usuário uma compreensão diferente da estrutura fabril existente.

Após essas primeiras simulações com a estrutura existente, estas foram refeitas

com uma nova proposta, aumentando a área dos materiais translúcidos na superfície da cobertura. Este estudo tem como objetivo verificar analiticamente se o que foi desenvolvido em projeto está dentro das condições reais de conforto luminotécnico para o usuário.

54


1

Ponto A

2

3

Ponto B

1 2 3

A

B Simulaçþes feitas com o programa Ecotect Fonte: Arquivo da autora, 2015

55


cobertura: radiação incidente

A cobertura existente em shed possui 3 inclinações diferentes, sendo que

atualmente apenas a face vertical é translúcida, permitindo um pouco da entrada da iluminação natural e a visão parcial do céu por parte de quem está dentro do galpão.

Com a intenção de valorizar essa estrutura por meio da iluminação natural, o

projeto de intervenção deseja aumentar a área translúcida da cobertura. Para isso, foi calculado a quantidade de radiação que chega em cada face da cobertura, no ponto médio de cada uma, ao longo do ano. Os valores mostrados são feitos com base no dia 15 de cada mês. Essas análises servirão de bases para as propostas de abertura que serão feitas posteriormente.

Por meio dos gráficos, percebe-se que a face da cobertura mais exposta à

radiação solar incidente é a 3. Devido à sua inclinação para o Norte, ela possui altos índices de radiação na Primavera e no Verão. As intervenções a serem feitas nessa face devem ser cautelosas e concentradas da metade de sua superfície para a parte inferior, pois as outras faces da cobertura funcionam como brise para essa área.

A face 1 recebe índices de radiação solar tão altos quanto a face 3. No entanto,

elas se concentram no verão, nos meses de Janeiro e Dezembro. Considerando que nesses dois meses entrará mais luz no ambiente, é recomendável o aumento da área transúcida nessa face.

Já a face 2, vertical e voltada para o sul, é a única hoje totalmente translúcida

e possui indência de radiação solar mais baixo. É a face mais apropriada para permitir a entrada de luz natural no galpão e será mantida translúcida com ventilação natural permanente.

56


1

Face 1 Radiação solar incidente (W/m²) máx. radiação = 900 W/m² (Jan. e Dez. - 12h)

2

Face 2 Radiação solar incidente (W/m²) máx. radiação = 500 W/m² (Setembro - 12h)

3

Face 3 Radiação solar incidente (W/m²) máx. radiação = 900 W/m² (Jan., Fev, Out, Nov Dez. - 12h)

Simulações feitas com o programa Ecotect Fonte: Arquivo da autora, 2015

57


chão: iluminância (lux)

solstício de verão

Após o cálculo da radiação incidente na cobertura, o próximo passo da análise

luminotécnica foi calcular a quantidade de luz que chega na superfície de leitura e atividade do usuário. Assim, a simulação foi feita com base em um grid à 1,10m de altura do chão. As simulações foram feitas para 3 datas diferentes em 3 horários. Os dias foram escolhidos considerando os períodos mais críticos do ano (solstício de verão e solstício de inverno) e um período intermediário (equinócio de primavera).

Comparando os valores médios com a tabela que define a quantidade de lux

para cada ambiente, percebe-se que, para a atividade que era realizada nesse local indústria de tecidos - somente no período de maior insolação do ano (solstício de verão às 12h) o lugar é adequadamente iluminado apenas com iluminação natural. Nos outros

22/12 - 9h valor médio = 806.93 lux

dias o valor é um pouco inferior, mas está dentro do valor delimitado para fábricas. Considerando que também é utilizado iluminação artificial, conclui-se que a iluminação natural pelo shed era adequado para tal atividade.

Na parte do galpão cuja estrutura de tesoura de madeira e telhado de duas águas

se difere do restante, nota-se baixíssimos valores de iluminância. É clara a necessidade de propor aberturas zenitais nessa cobertura para permitir maior entrada de luz.

22/12 - 12h valor médio = 1077.38 lux

22/12 - 15h valor médio = 820.48 lux

Tabela: Iluminância por classe de tarefas visuais Fonte: NBR 5413

58


solstício de inverno

equinócio de primavera

Legenda:

22/06 - 9h

22/06 - 9h

valor médio = 452.58 lux

valor médio = 703.31 lux

22/06 - 12h

22/06 - 12h

valor médio = 742.25 lux

valor médio = 991.45 lux

22/12 - 15h

22/09 - 15h

valor médio = 507.47 lux

valor médio = 709.81 lux

Simulações feitas com o programa Ecotect e Radiance Fonte: Arquivo da autora, 2015

59


Rua interna ao complexo, Lx factory Fonte: Arquivo da autora, 2013

60


referências SESC POMPÉIA, São Paulo Projeto de readequação da antiga fábrica de tambores. Lina Bobardi, 1986. Área total: 23.571 m2

LX FACTORY, Lisboa Projeto de readequação da antiga Compania de Fiação e Fábrica de Tecidos Lisboense. 2005 Área total: 23.000 m2

61


sesc pompéia PROGRAMA 1. Conjunto desportivo com piscina, ginásio e quadras ( 5 pavimentos) [área= 1.200x5 = 6.000 m²] 2. Lanchonete, vestiários, salas de ginástica, lutas e dança (11 pavimentos) [área= 225x11 = 2.475 m²] 3. Torre da caixa d’água 4. Grande Deck Solarium [área= 745 m²] 5. Espaço de exposições [área= 585 m²] 6. Atelieres de cerâmica, pintura

(2 pavimentos) [área= 125x2 = 300 m²]

passagem de pedestres

13. Grande espaço de estar, jogos de salão, espetáculos e mostras expositivas com grande lareira e espelho d’água

AV .P

[área= 1.560 m²]

OM

14. Biblioteca de lazer, lajes abertas de

PE

leitura e videoteca [área= 1.220 m²] 15. Pavilhão de grandes exposições [área= 705 m²] 16. Administração [área= 600 m²]

marcenaria, tapeçaria, gravura e tipografia. [área= 1.256 m²] 7. Laboratório fotográfico, studio de música e sala de dança (3 pavimentos) [área= 266x3 = 800 m²] 8. Teatro com 12000 lugares [área= 940

acesso principal

m²] 9. Foyer [área= 400 m²] 10. Restaurante self service para 2000 refeições e choperia (noite) [área= 945 m²]

uso coletivo de acesso ao público espaço privado de acesso ao público espaço privado de acesso restrito aos usuários do SESC uso dos funcionários

62

RUA CL

12. Vestiário e Refeitório dos funcionários

ÉLIA

11. Cozinha industrial [área= 385m²]

RUA BARÃO DO BANANAL

serviços (carga e descarga)

IA


PROPORÇÃO comparação com a área do projeto SESC Pompéia área do terreno = 23.000 m

Antiga Fábrica de Tecidos ‘Labor’ 2

área do terreno = 16.000 m2

63


O projeto do Sesc foi desenvolvido para que as pessoas pudessem usufruir de

um espaço amplo e público com utilização coletiva de maneira igualitária. Na área da fábrica que foi requalificada, percebe-se muitos espaços livres de estar, sem um uso específico permanente, mas que são ocupados pelos usuários com muita naturalidade. Com relação à restrição de acessos e programa dos ambientes, a análise destaca as seguintes áreas do Sesc: 1. Acesso principal – A entrada das pessoas é feita pela Rua Clélia, esta da acesso ao grande corredor que caracteriza o eixo principal de circulação. A requalificação dessa rua interna traz a urbanidade para dentro do conjunto, dando importância à escala do pedestre. 2. Espaço privado de acesso público – É formada pelo pavilhão de exposições, teatro e restaurante. Estes espaços, apesar de oferecem atividades muitas vezes gratuita, são de acesso ao público em horários específicos de eventos ou refeições. 3. Uso coletivo de acesso público – Composto pelos ambientes da biblioteca de lazer, espaço de estar com lareira, espelho d’água, foyer e deck solarium. Esses locais oferecem ao público em geral a possibilidade de momentos de lazer, diversão e contemplação, onde é possível interagir com as pessoas e com os elementos. Eles são acessíveis em qualquer horário do funcionamento do SESC, tanto pelos usuários, quanto pelos transeuntes que passam por perto e procuram um momento de descanso. 4. Espaço privado de acesso restrito à usuários do Sesc – as áreas exclusivas para usuários são constituídas por um edifício esportivo 29 com 5 pavimentos e outro edifício para atividades diversas 30 com 11 pavimentos, além dos ateliês 31 e dos laboratórios 32. ‘‘A rua aberta e convidativa, os espaços de exposições, o restaurante público com mesas coletivas, o automóvel banido com rigor, as atividades a céu aberto culminando com a “praia do paulistano” em que se transformou o deck de madeira no verão, tudo fez do SESC Pompéia uma cidadela de liberdade, um sonho possível de vida cidadã. O Centro é como um verdadeiro oásis em maio à barbárie de desconforto urbano de nossa sofrida São Paulo.’’ Rua interna de entrada Fonte: Arquivo da autora, 2014

64

Marcelo Ferraz, [Vitruvius.Numa velha fábrica de tambores. SESC-Pompéia comemora 25 anos.]


Em relação aos aspectos construtivos é evidente a valorização da estrutura existente e a diferenciação do projeto de intervenção. Lina Bo Bardi indica que não transformou o espaço da fábrica e sim permitiu uma nova realidade: “Ninguém transformou nada. Encontramos uma fábrica com uma estrutura belíssima, arquitetonicamente importante, original, ninguém mexeu... O desenho de arquitetura do Centro de Lazer Fábrica da Pompéia partiu do desejo de construir uma outra realidade. Nós colocamos apenas algumas coisinhas: um pouco de água, uma lareira.” Segundo Marcelo Ferraz, houve um processo de desnudamento da antiga fábrica a la Matta Clarck, com a retirada dos rebocos e a aplicação de jatos de areia nas paredes, em busca da essência de sua tectônica. Dessa forma, fica claro o cuidado da recuperação em deixar todos os vestígios da antiga fábrica evidentes aos olhos dos freqüentadores – seja nas paredes, nos pisos, telhados e estruturas, seja na linguagem das novas instalações –, de modo que o espaço iniciasse sua nova vida de Centro de Lazer já pleno de calor e animação. Com alma e

Mezaninos para leitura no galpão, Sesc Pompéia. Fonte: Arquivo da autora, 2014

personalidade. A própria linguagem arquitetônica das novas edificações reforça o lado fabril e industrial do conjunto cobertura transparente

elemento vazado permite a ventilação natural

Corpo d’água dentro do gapão, Sesc Pompéia. Fonte: Arquivo da autora, 2014

65


lx factory

A Lx Factory se encontra em uma antiga Compania de fiação e Fábrica de tecidos

Assim como mostrado anteriormente no Armazéns Piratininga, destaca-se

Lisboense, em um terreno de aproximadamente 23.000 m2. O seu programa de indústria

também neste conjunto a mesma estrutura de ruas internas ao lote e galpões. Essas

criativa e cultural, aborda atividades contemporâneas, ao mesmo tempo que torna a

vias, de aproximadamente 7m de largura, predominantemente para pedestres, são

história e arquitetura do lugar essenciais para a valorização do espaço.

amplamente utilizadas pelos usuários (feirinhas, shows..), e proporcionam um ambiente

mais confortável ao usuário.

As indústrias criativas e culturais remetem para as atividades económicas que

combinam a criação, a produção e a distribuição de bens e serviços que são culturais por natureza, e que são protegidos pelos direitos de propriedade intelectual. Segundo a Unesco, estas actividades vão desde sectores fortemente industrializados como a publicidade e o marketing, a rádio e a televisão, o cinema, a música, o livro e os videojogos, até aos setores tradicionais das artes visuais (pintura e escultura), das artes do espectáculo (teatro, ópera, concertos, dança), dos museus e das bibliotecas. Outras actividades como o artesanato, a moda, o design, a arquitectura, o turismo cultural e até o desporto são incluídas nestas indústrias.

‘‘A LX Factory criou uma unidade de produção, conseguindo naquele espaço cheio de histórias da indústria portuguesa, juntar uma nova realidade industrial – a indústria criativa do século XXI. Um centro empresarial que proporciona a transacção de produtos culturais. O que pode fazer este projecto resultar é a simplicidade e autenticidade. Autenticidade em preservar o local, e utilizar como imagem de marca toda a realidade industrial existente, sem que seja forçada uma outra imagem.’’ Engenheiro Queirós Carvalho (administrador da empresa de investimentos Mainside, responsável pelo espaço da Lx Factor)

66


1. Rua interna ao complexo 2. Restaurante 3. Livraria em uma antiga grรกfica Fonte: Arquivo da autora, 2013

67


68


proposta

O projeto se desenvolveu em 4 escalas diferentes: (i) edificação existente a ser

conservada, (ii) implantação, (iii) programa e (iv) proposta de intervenção.

Como já apresentado anteriormente, a escolha por demolir algumas edificações

se deu visando a valorização das construções originais, permitindo a criação de microclimas urbanos de qualidade ambiental dentro do lote.

Já a implantação e programa foram definidos a partir do estudo preliminar feito

da região, de forma a atender a população do bairro e valorizar a história do mesmo. A intenção inicial da implantação é de requalificar o entorno imediato, permitindo o contato do conjunto com a população local, e, ao mesmo tempo, criando espaços de convivência para a mesma.

A definição do programa teve como primeiro partido a revitalização e

preservação do conjunto por meio de um novo uso. Optou-se por usos que preservem a memória do bairro industrial, tradicional e imigrante, onde a prática industrial é um traço marcante. O segundo partido é uma tentativa de sanar parte das demandas atuais da população. O projeto visa atender a carência de áreas verdes, equipamentos de lazer e cultura. A terceira premissa parte da necessidade de promover o encontro de pessoas, com diferentes idades, interesses e objetivos, configurando um espaço de convívio e trocas, misturando os usos educacional, de lazer, comércio e serviço.

No âmbito da proposta de intervenção, a iluminação natural foi muito estudada

com a intenção de se criar um ambiente luminoso diferente do original fabril. Também foi proposto uma estrutura secundária que permite vãos livres maiores, criando um espaço ainda mais flexível. Além disso, os desníveis foram utilizados diversas vezes, como estratégia para distinguir os ambientes sem criar um bloqueio visual entre eles. Essas soluções de projeto foram pensadas respeitando o conjunto de galpões, para readequálos ao novo uso, de forma que o usuário tenha a clara distinguibilidade entre o proposto e o existente.

69


implantação: primeiros estudos Retirada do muro de alvenaria existente e colocação de gradil em ‘zig

A

AV. ALCÂNTARA MACHADO

zag’, permitindo a visualização parcial da fachada e criando espaço de convivência dentro e fora do lote.

Área de apoio conectada com a praça. Equipamentos: bicicletário, vestiários, centro de informações.

RUA BARÃO D E

JAGUARÁ

D

Retirada do muro de alvenaria existente, criando uma pequena praça na esquina e valorizando a fachada do casarão.

B

C

RUA DA MOOCA

Legenda: áreas verdes novas edificações ruas internas ao lote para pedestres Implantação de estudo Fonte: Arquivo da autora, 2014

70

Recuo do edifício proposto em relação

Criação de uma rua paralela

Preservação da fachada e portão

a fachada existente da fábrica para

interna à construção com área

original na Rua da Mooca

valorização da mesma e ampliação da

comercial.

área de convivência da calçada


atualmente

proposta: primeiros estudos

Corte A Av. Alcântara Machado - retirada do muro e colocação de gradis em ‘zig zag’ criando espaços de descanso e alargamento da calçada em algumas partes. - plantação de árvores ao longo da 7,80

4,50

8,00

12,30

8,00

calçada

Corte B Rua da Mooca - retirada do muro, mantendo o portão original e a árvore existente, colocando um gradil baixo na varanda da casa. 1,45

10,00

1,60

1,45

10,00

6,5

Cortes de estudo mostrando relação com as ruas Fonte: Arquivo da autora, 2014

71


programa 1. edifício novo (4.000 m2)

- banheiros

- galeria de arte - lanchonete

6. Teatro (335 m2)

- ambientes de trabalho

- plateia

- espaço para eventos

- palco

- 3 salas de oficinas

- camarim

- 3 salas de dança

- foyer

- 3 salas de música 7. Apoio (165 m2) 2. Comércio e Serviços (1.360 m2)

- bicicletário

- 20 módulos de

- vestiários - centro de informações

3. Galpão principal (5..400 m ) 2

- áreas livres (exposição, leitura, jogos infantis, tabuleiro..)

8. Museu da memória da Mooca (2.700 m2)

- auditório aberto 9. Espaços de transição (1.200 m2) 4. Livraria (1.900 m ) 2

- ruas internas/ áreas abertas

- foyer auditório aberto - espaço leitura

10. Áreas verdes e permeáveis (2.100 m2)

- livros

- praça de chegada Rua da Mooca - praça de chegada Barão de Jaguará

5. Restaurante (700 m )

- praça do Casarão

- cozinha

- praça interna das chaminés

2

- triagem - lavagem - armazenamento - espaço para servir (buffet) - carga e descarga - lixo - salão para refeições - caixa

72


7 5

1

4 6

3

2

8

73


matriz ambiental

A proposta de requalificação deste conjunto tem como uma das principais

premissas a criação de um microclima melhor, possiblitando uma adaptação ambiental para os usuários por meio da versatilidade dos espaços.

Dessa forma, o projeto visa criar diversos espaços cujo o usuário possa se adaptar

Exemplo A estrutura móvel para controle da insolação cenário 1

cenário 2

de acordo com suas necessidades de acordo com três variáveis: estrutura física, tempo de permanência e adptação.

ESTRUTURA FÍSICA

COBERTA DESCOBERTA Em um dia de sol, que o usuário deseja sombra ele pode abrir o guarda-sol para se LONGO

TEMPO DE

MÉDIO

PERMANÊNCIA

proteger da insolação. Nos dias nublados, o guarda-sol não é necessário.

Exemplo B estrutura móvel para controle acústico e espacial

CURTO divisória móvel

IMEDIATA LOCAL mobiliário móvel

ADAPTAÇÃO MOBILIDADE ESPACIAL

Planta (sem escala)

74

Se tratando de um edifício de programa público, a estratégia predominante de

Em um espaço aberto onte acontecem diversas atividades, fica a disposição do usuário

adaptação é a mobilidade no espaço. Com relação a adaptação imediata local, será

organizar o mobiliário conforme suas necessidades. Se for necessário um espaço mais

utilizado como dispositivo estruturas móveis que possibilitam o controle da insolação

restrito, para reuniões, palestras, conferências, o espaço dispõe de divisórias móveis que

(guarda-sol) e acústica (painel móvel).

dividem o espaço e funcionam também como uma barreira acústica.


SESC Pompéia Galpão principal Este espaço de leitura localizado em um nicho elevado dentro de um grande galpão que acontecem também outras atividade se caracteriza por ser uma área coberta, de longa permanência com adaptação flexível. Dentro deste contexto, as condições de conforto variam conforme o dia e as atividades que ocorrem ao seu entorno.

SESC Pompéia Deck Esta área de deck pode servir tanto como uma rua de passagem para pedestres, conectando a Av. Pompeia e a Rua Barão do Bananal, quanto uma área de estar. Mesmo sendo um local predominantemente descoberto, oferece dispostivos para adaptação imediata do usuário, como por exemplo os guardas-sol, e permite também a adaptalçao flexível do usuário por proporcionar espaços sombreados pelo edifício. Dessa forma, a flexibilidade do espaço permite várias atividades, de acordo com a necessidade de cada usuário.

Sesc Pompéia, 2014. Imagens da autora

75


matriz ambiental ÁREA

1. Indústria Criativa - ambientes de trabalho - ateliers e studios

4.000 m²

+++

+++

+++

+++

2. Comércio

1360 m²

++

+

+

+

3. Galpão principal - área de exposição, jogos, leitura e estar

5.400 m²

++

++

++

++

4. Livraria

1.900 m²

++

++

+++

+++

5. Restaurante

700 m²

++

++

+

+

6. Teatro

335 m²

++

++

+++

+++

7. Lanchonete/ Café

165 m²

+

+

+

+

+

+

+

+

+++

+++

++

+++

+++

+

+

++

8. Apoio - bicicletário - vestiários - centro de informações 9. Museu da memória da Mooca 10. Espaços de transição áreas abertas, ruas internas e áreas verdes

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QUALIDADES

ILUMINAÇÃO

165 m²

1.200 m²

5.100 m²

TÉRMICA

ACÚSTICA

PROGRAMA

INSOLAÇÃO

+ fator menos importante como critério de

++ fator importante como critério de

+++ fator mais importante como critério de

projeto

projeto

projeto


APOIO

RESTAURANTE

LIVRARIA

TEATRO

COWORKING E OFICINAS

GALPÃO PRINCIPAL

MUSEU

COMÉRCIO

77


planta térreo preservação e valorização da estrutura fabril existente Após a definição das edificações a serem demolidas para a preservação das outras, é importante deixar em evidência o perímetro de cada uma, valorizando principalmente seus aspectos construtivos e fachadas.

novas edificações O projeto das novas edificações teve a cautela de não se sobrepor a arquitetura industrial existente. Em relação à fachada principal na Rua da Mooca, o novo edifício de 12m de altura foi recuado 10m. Sua implantação foi pensada de forma a convidar o pedestre a conhecer o conjunto, permitindo a visualização de toda fachada lateral do galpão principal e a rua interna parelela à Rua da Mooca.

aumento da área permeável e vegetação Como foi constatado na análise da região, a Mooca carece de áreas verdes e permeáveis, sendo uma das áreas mais quentes da cidade. Dessa forma, foi uma das prioridades do projeto é a implementação de árvores para sombreamento, amenizando a temperatura aparente.

expansão da rua para o interior do lote Devido a dimensão do lote, encontrou-se a necessidade de estender o caminho do pedestre para o interior do mesmo, melhorando as possibilidades de passeio público para os transeuntes.

criação de espaços de convência e áreas de estar Uma das principais premissas do projeto foi criar espaços de encontro e convivência para os usuários do equipamento. Dessa forma, parte do terreno não possui um programa rígido, podendo abrigar diversas atividades, sendo espaços de adaptação flexível para os usuários.

78


AV. ALCÂNTARA MACHADO

apoio

restaurante

livraria

oficinas

galpão principal museu da memória

lanchonete

galeria de arte

RUA BARÃO DE JAG

UARÁ

teatro

comércio

RUA DA MOOCA

Planta térreo esc 1:500

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planta piso grama:

praças e áreas externas

Apesar de ser um revestimento que exige mais manutenção, a grama é necessária pela qualidade ambiental que ela porporciona ao espaço. Além disso, sua superfície macia e maleável é um lugar seguro e econômico para a prática de esportes e recreação.

intertravado com grama:

praças

São peças de concreto que apresentam orifícios para o desenvolvimento da grama, proporcionando um efeito permeável e drenante do solo. É um piso de fácil aplicação, alta resistência e durabilidade.

cimento queimado:

calçadas, ruas internas e galpão principal

Por ser flexível, durável e de fácil manutenção, este material foi escolhido para toda área de circulação externa e interna. Sua extensão para dentro do galpão acompanha o conceito do programa, que propõem um grande espaço de lazer, como se fosse a extensão da rua.

madeira:

praças, áreas de sentar

Este material passa uma sensação de conforto mais aconchegante, além de apresentar grande durabilidade e fácil manutenção.

vinílico:

restaurante, livraria e alguns lugares do galpão.

A durabilidade, juntamente com a facilidade de instalação, são características desse material. Além disso, ele contribui para o melhor conforto térmico e higienização do ambiente, sendo um material de baixa temperatura superficial aparente de fácil manutenção.

carpete

teatro

Será utilizado na área do teatro, que exige um conforto acústico maior. Este tipo de material abafa o som e é o mas recomendado para áreas de evento.

80


Planta piso

esc 1:500

81


planta cobertura enfatizar as áreas de circulação/ ruas internas Como mostrado na planta do térreo, devido ao tamanho do lote foram criadas diversas ruas internas. Estas, nem sempre acontecem ao ar livre, podendo passar pelo interior da edificação existente. Para diferenciá-las, a estratégia utilizada foi o aumento da área translúcida nessas áreas, trazendo a sensação de exterior e a visão de céu mesmo para quem está dentro do edifício.

criar praças cobertas utilizando a estrutura existente Existem algumas estruturas de cobertura que estão parcialmente desabadas e com muitas telhas danificada. Foi escolhido, em um edifício que não é original de 1904, conservar a estrutura da forma como ela se encontra atualmente, trocando as telhas cerâmicas por telhas translúcidas, e deixando também espaços sem cobertura, somente com as tesouras em madeira, criando-se praças sob elas.

transformar a iluminação homogênea da fábrica em uma luz orgânica e lúdica Atualmente, a iluminação na antiga fábrica é bem marcada pela luz homogênea e regular dos sheds, correspondendo a uma necessidade da atividade que lá se realizava. O novo programa para o galpão principal visa a flexibilidade da utilização do espaço, sendo um ambiente de conviência e lazer onde diversas atividades podem acontecer. A proposição de 3 grandes aberturas orgânicas criam um jogo dinâmico de luz no nível do usuário que se modifica e pode ter diversas funções ao longo do dia.

permitir a ventilação por efeito chaminé permanente Juntamente com a proposição de diversas aberturas, foi necessário pensar em mecanismos de ventilação natural permanente. Nos ambientes cujo programa não demandava um controle tão restrito de temperatura, como mostrado na matriz ambiental anteriormente, foi adotado esse esquema de ventilação, aproveitando a estrutura dos sheds existentes, posicionando tijolos de vidro inclinados.

82


Planta cobertura esc 1:500

83


chão: iluminância (lux) e sombras 12 h

Com essas novas aberturas foi feito novamente a simulação no programa Ecotect

para obter a quantidade de luz que chega na altura do usuário. Percebe-se que há um

dia típico de verão 03/01

espaço mais fluído, que quebra a luz homogênea da fábrica, além de permitir maior entrada de luz no galpão.

As três aberturas orgânicas, foram projetadas pensando em um contraste para

criar um ambiente luminoso ‘animado’ e lúdico que motiva o uso diferenciado desse espaço. Como citado anteriormente na matriz ambiental, o critério de projeto adotado para o projeto do galpão, é que o usuário tenha uma adaptação de mobilidade espacial. Dessa forma, essas aberturas proporcionam espaços bem iluminados, mas se o usuário desejar menos luz, ele pode se deslocar alguns metros e ter um ambiente diferente

valor médio = 4.137,58 lux

com relação à luminosidade. Perecebe-se pelas imagens da simulação do Ecotect, que esses nichos de luz possuem diversas variações. Ao longo do dia, elas se movimentam dependendo da posição do sol; e ao longo do ano, sua intensidade varia: criando manchas difusas no inverno e situações mais definidas de luz e sombra no verão.

Já as aberturas homogêneas na rua paralela à Rua da Mooca, e na rua central

equinócio de primavera 20/03

interna ao galpão, permitem uma visão de céu mais ampla nesses pontos, enfatizando a ideia de circulação.

valor médio = 3.790 lux

dia típico de inverno 03/07

valor médio = 2.866 lux

84


09 h

13 h

17 h

Simulaçþes feitas com o programa Ecotect e Radiance Fonte: Arquivo da autora, 2015

85


galpão principal e rua interna identificar e recuperar a fachada original da primeira construção Grande parte da fachada original foi mudada conforme os usos posteriores que teve a edificação. Por meio da análise do levantamento feito pelo Condephaat e visitas in loco, foi possível deduzir e recompor a fachada do galpão baseado na estrutura modular. A recomposição desta e o reconhecimento do seu perímetro é importante para informar ao usuário a construção orginal.

trazer para dentro da edificação as ruas internas ao lote Como já mostrado anteriormente, a premissa da implantação do projeto é a criação de ruas internas que também se estendem para dentro do galpão principal. Essas ruas são enfatizadas pelas aberturas nas fachadas que se diferem das outras. A rua interna projetada paralela à Rua da Mooca permite que o pedestre tenha a opção de fazer seu trajeto em um lugar coberto, sombreado e mais largo. Ela também funciona como um espaço de transição entre o espaço externo (Rua da Mooca) e o interno (galpão principal).

conservar a maior parte da estrutura existente e distinguir as intervenções feitas na mesma As intervenções feitas na estrutura se distinguem pelo material da viga de aço corten e pilares de concreo. Elas foram necessárias para criar vãos livres maiores., permitindo maior liberdade de usos do galpão. Mesmo com essas novas intervenções, a maior parte da estrutura foi mantida para que o usuário tenha a leitura clara de como era a estrutura metálica existente, que está em muito bom estado.

trabalhar com desníveis e mobiliário flexível, criando possibilidades de usos diferentes do espaço Além da rampa e do anfiteatro, foi criado um desnível de 0,50 m sob a estrutura proposta. Este permite a criação de um ‘nicho’ no grande espaço livre que pode abrigar diversas atividades informalmente servindo de área de estar, leitura, ou até mesmo uma área lúdica

86


1. Espaços de leitura na Livraria cultura, Conjunto Nacional 2. La Redonda, Argentina 3. Mobiliário flexível da universidade de Ørestad, Copenhagen. 4. Bright Undulating Benches. BAMscape by Faulders Studio Fosters Social Interaction

Planta Galpão nível 0,00 esc 1:500

87


Proposta: rua interna paralela Ă Rua da Mooca 88


Proposta galp達o principal 89


galpão principal e livraria

A estrutura proposta tem como objetivo criar mais espaço livres entre pilares. Atualmente, a distância entre pilares tem 4m e 7m. Com a nova estrutura será possível criar até até 25m de vão livre. O projeto mantém as vigas e tesouras existentes, retirando apenas os pilares. O grande vão é ‘vencido’ por uma viga metálica I que se difere do resto pela cor por ser uma intervenção, e esta é sustentada por pilares de concreto. de 60cm de diâmetro. Essa estrutura foi projetada para dois lugares do galpão, uma maior que permitiu a abertura de um subsolo com anfiteatro, e outra um pouco menor com desníveis no chão que delimitam um espaço de estar. Mesmo com essa intervenção, foram mantidos os pilares originais na metade do galpão, de forma que o usuário possa ter o claro discernimento entre a intervenção e a construção original.

Corte A

esc 1:250

90

rua interna paralela à Rua da Mooca

rua interna

auditório aberto

livraria


A’

A’

Planta nível 0,00

Planta nível -3,50

esc 1:250

esc 1:250

A

A

91


Atualmente: foto galp達o principal 92


Proposta: galp達o principal 93


livraria e restaurante área externa

acessos lanchonete

carga e descarga

acessos livraria

entrada restaurante

saída restaurante

galpão principal

CIRCULAÇÃO E RUAS INTERNAS Na parte dos galpões anexos, que vieram posteriormente à construção original de 1910, optou-se por conservá-los devido ao seu bom estado e valor arquitetônico. O recorte desse volume foi feito por meio da cobertura, criando áreas translúcidas para identificar os corredores de circulação e até mesmo retirando totalmente a telha da cobertura para permitir a existência de jardins internos à livraria. Além disso, no projeto do restaurante foi necessário projetar a circulação técnica na cozinha, depósito e lixo; e a circulação dos usuários no salão de refeições ( entrada, buffet, área de lavagem dos pratos e saída).

Corte B

esc 1:250

94

adm. e vestiários

cozinha

buffet + salão para refeições

rua interna

livraria


B

B’

auditório aberto

Planta nível 0,00 esc 1:250

95


Atualmente: galp達o anexo 96


Proposta: livraria 97


teatro e apoio

C’

bicicletário

centro de informações

A área do teatro é cercado por praças de chegada que funcionam também como uma extensão e do foyer e da bilheteria. A localização desse programa neste edifício perimetral ao terreno foi pensada de forma a permitir o acesso mesmo quando o resto do conjunto estiver fechado. Já a localização do bloco de apoio, onde se encontram um centro de informações e bicicletário com vestiários, foi projetada com base no estudo de rotas acessíveis que foi feito numa etapa preliminar. Por meio desse estudo concluiu-se que o acesso dos pedestres que vem de metrô bilheteria

também pode ser por essa esquina. Logo ela se torna um ponto estratégico para quem chega ao conjunto.

foyer teatro camarim

Planta nível 0,00 esc 1:250

98

C


Praรงa de chegada e foyer

museu da memรณria

camarim

teatro

foyer

vestiรกrios + bicicletรกrio

Corte C

esc 1:500

99


Atualmente: fachada voltada para Av. Alc창ntara Machado 100


Proposta: fachada voltada para Av. Alc창ntara Machado 101


edifício novo 1. o recuo de 10m em relação a fachada existente na Rua da Mooca foi pensado para valorização da mesma. Ele permite a visualização da fachada lateral do galpão principal e convida os pedestres à passarem pela rua coberta proposta paralela à Rua da Mooca.

5

2. a PRaça de chegada está integrada com o edifício novo por uma lanchonete e a visualização da galeria de arte no subsolo

4

3

3. o acesso principal é a continuação da rua interna ao galpão, marcado por uma estrutura metálica que também funciona como cobertura.

2

6

4. o bloco de circulação central distribui os outros dois blocos em níveis intercalados, optimizando o espaço com pés direitos duplos e permitindo a ventilação natural permanente.

5. oficinas, sala de dança e música constituem o programa desse bloco, sendo uma extensão do galpão principal.

1

6. coworking e indústria criativa é o programa do outro bloco que tem um conceito semelhante ao do galpão principal - planta livre, desníveis e mobiliário flexível - mas em outra escala.

Elevação Rua da Mooca sem escala

102


E’

E’

salas de dança

oficinas

lanchonete

galeria de arte

D

coworking

D’

E

Planta nível 0,00 esc 1:250

D

D’

E

Planta nível 3,50 esc 1:250

103


edifício novo

A relação do edifício novo com o galpão existente é dada pela praça de chegada, que se localiza entre ambos. Este espaço está

interligado com a lanchonete no edifício proposto e possui um desnível que permite o usuário ter uma visão parcial da galeria de arte no subsolo. Outra relação forte entre a construção proposta e a existente são os pórticos de aço corten que delimitam a continuação da rua interna ao galpão. O programa do térreo do edifício em frente aos pórticos é uma extensão das atividades que acontecem no galpão, mas que precisam de um espaço mais fechado. São salas onde podem acontecer workshops e oficinas.

O programa de coworking voltado para a indústria criativa que acontece no outro bloco é inspirado no projeto de referência

estudado Lx Factory. A definição desse uso específico criará uma circulação constante de usuários que naturalmente também irão frequentar outras atividades do complexo. Além disso, o princípio de produção de cultura, que é um dos conceitos de todo projeto, está intrínseco à esse programa, criando uma sinergia entre todas as atividades.

+12,25 terraço jardim

+ 8,75 reuniões e eventos

+5,35 coworking

+1,25 coworking -0,90 lanchonete e praça

104

-3,50 galeria de arte

Corte DD’ esc 1:125


vista da continuação da rua interna ao galpão

+12,25 terraço jardim +10,50 terraço jardim + 8,75 reuniões e eventos +7,00 salas de música +5,35 coworking +3,50 salas de dança +1,25 coworking 0,00 oficinas

-0,90 lanchonete e praça -3,50 galeria de arte

Rua da Mooca

Corte EE

esc 1:250

105


Praรงa de chegada interligada com o foyer e teatro 106


Praça de chegada da rua da Mooca interligada com o edifício novo 107


fotos maquete

108


109


110


111


112


conclusão

A proposta de intervenção exigiu uma sensibilidade para analisar e compreender

o antigo conjunto Labor. Para isso, foram fundamentais as visitas in loco, que permitiram o contato imediato com a riqueza histórica e arquitetônica do lugar e motivaram o desenvolvimento do projeto. Além disso, o levantamento do Condephaat feito em 2010 também foi de extrema importância para entender as dimensões do espaço e estudar as tipologias construtivas dos edifícios.

No âmbito do projeto, foram utilizadas as ferramentas de simulações de

iluminação junto com o ato de projetar. Hoje em dia, muitos desses softwares são utilizados apenas para conferência, ao final do projeto, separando o projeto das questões de conforto. A tentativa de integrar os estudos de iluminação ao projeto foi feita no galpão principal, visto que é o espaço de maior intervenção na cobertura.

Ao longo do desenvolvimento da proposta, também foram estabelecidas

diretrizes pensando na relação do usuário com o espaço: o tempo de permanência, tipo de adaptação e estrutura física. Essas foram de grande relevância para conceituar e direcionar o projeto.

Outro desafio na escala de projeto foi a proposição de grandes espaços sem um

programa específico. Foram definidas muitas áreas livres de convivência e lazer pelo terreno, sendo que um dos ambiente mais relevantes é o galpão principal. Os primeiros estudos de intervenção delimitaram espaços que descaracterizaram o conceito de planta livre e flexível original do galpão. No projeto final, tendo como uma das referências um espaço que faz parte cotidiano de ensino na FAU USP - o salão caramelo - percebeu-se que o arquiteto deve considerar no projeto elementos que contribuam para a qualidade social e ambiental, mas, na prática, são os usuários que dão vida ao lugar e se apropriam do espaço de diversas formas.

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bibliografia RUFINONI, Manoela. Preservação e Restauro. Teoria e Prática de Intervenção em Sítios Industriais de Interesse Cultural. FAUUSP. São Paulo, 2009 KULH, Beatriz Mugayar. Preservação do patrimônio arquitetônico da industrialização. São Paulo. Ateliê Editorial, 2008 MIRANDA, Rosana. Mooca: Lugar de Fazer Casa. FAUUSP. São Paulo, 2002 RODRIGUEZ, Maria Elizabet Paez. Radial leste, Brás e Mooca: diretrizes para requalificação urbana. FAUUSP. São Paulo, 2006. São Paulo (Município). SEMPLA. Plano Regional Estratégico. Subprefeitura da Mooca, 2004. CARVALHO, Gonçalo José Veloso Queirós de. A Reciclagem dos Usos Industriais e as Novas Tipologias de Actividades e Espaços de Cultura. Caso de estudo: LX Factory. Universidade Técnica de Lisboa, 2009. SUBPREFEITURA DA MOOCA/ INSTITUTO POLIS. Plano Diretor Regional da Subprefeitura Mooca – Relatório Final – vol.1.São Paulo.2003. Cartas patrimoniais : Carta de Veneza, ICONOS, 1964. Disponível em: www.iphan.com.br Processo CONDEPHAAT número 59448/2009_Parecer técnico UPPH número GEI – 400- 2010 Impressões do Brasil no Século Vinte, 1913. Disponível em: http://www.novomilenio.inf.br/santos/h0300g32d.

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Sites: PREFEITURA DE SÃO PAULO. Disponível em: http://portal.prefeitura.sp.gov.br/ PORTAL DA MOOCA. Disponível em: http://www.portaldamooca.com.br/ CESAD FAUUSP. Disponível em: http://www.cesadweb.fau.usp.br/ Plano Regional Estratégico da Subprefeitura da Mooca, Capitulo II, Seção II – Das Zonas Mistas – ZM. Disponível em: http://www3. prefeitura.sp.gov.br Lei nº 13.885, de 25 de agosto de 2004. Disponível em: http://www.secovi.com.br/legislacao-nel/ Plano Regional Estratégico da Subprefeitura da Mooca, Capitulo II, Seção II – Das Zonas Mistas – ZM. Disponível em: www.prefeitura. sp.gov.br

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