Os 198 Maiores Memes Brasileiros que Você Respeita

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Nissim Ourfali e a polêmica com o Google

Os melhores memes da Copa do Mundo no Brasil Batman Feira da Fruta e outros clássicos pré-redes sociais As dicas para falar tiopês O verdadeiro nome de Claudia, do "Aham! Claudia, Senta Lá" As piadas e os virais que marcaram a política brasileira Melody, Aretuza, Pedrão Pão de Batata e outros ídolos que a web criou

edição 1

OS 198 MAIORES MEMES BRASILEIROS QUE VOCÊ RESPEITA

Entrevistas exclusivas com Gretchen, Luisa Marilac e Andrea Mello

34,90

Os fenômenos mais criativos e malucos que bombaram online e provaram que o melhor do Brasil é o brasileiro

KLEYSON BARBOSA Capa_final_livro.indd 1

6/1/17 2:47 PM


OS 198 MAIORES MEMES BRASILEIROS

S

QUE VOCÊ RESPEITA

APRESENTAÇÃO

e você manda e-mails, tem perfil em rede social ou mesmo usa o WhatsApp, provavelmente já teve contato com algum meme. Memes são aqueles vídeos, fotomontagens ou frases que aparecem de repente, como uma brincadeira, e se espalham numa velocidade absurda, sofrendo mutações e ganhando novos contextos e significados. Às vezes, você os utiliza sem nem saber sua origem, talvez por influência daquele seu amigo que vive repetindo “Olha ela”, “Vem, gente”, “Todos chora” ou “Eita Giovana”. Bem-vindo: você foi assimilado pela cultura dos memes. O termo “meme” foi empregado pelo renomado etólogo Richard Dawkins em seu best-seller O Gene Egoísta. O livro, escrito em 1976, explicou a teoria da evolução de forma clara o bastante para convencer a bancada evangélica do Congresso norte-americano de que o darwinismo estava certo. Mas, lá no meio, introduzia também o conceito dos memes, os análogos culturais dos genes. Para Dawkins, assim como os genes eram os principais responsáveis por replicar o conteúdo geracional dos organismos vivos, os memes seriam uma outra unidade de replicação, diferente dos genes, responsável pela seleção e transmissão de conteúdos escritos em nossa cultura. Dessa forma, Dawkins propõe um evolucionismo cultural. Um bordão que se populariza, um estilo de corte de cabelo que vira moda, uma imagem replicada nos perfis das redes sociais, por exemplo, são memes. O meme da internet é imensamente ligado a esse conceito bolado por Dawkins. Em essência, ele segue a mesma lógica de uma informação a ser passada adiante proposta pelo etólogo. Nesse contexto, a palavra foi usada online pela primeira vez em 1988, quando Joshua Schachter criou o site Memepool, um agregador de links legais. No começo dos anos 2000, festivais na web promovidos por Jonah Peretti, criador do Contagious Media (um centro de pesquisas que fazia experimentos com conteúdo viral), retomaram o termo como sinônimo de disseminação das informações pela internet. 10

(Por falar em “viral”, é importante frisar que todo meme é viral, mas nem todo viral é um meme. Para ser classificada assim, é necessário que a piada tenha sido assimilada, retrabalhada ou “customizada” por outros internautas. Quando você compartilha uma propaganda profissional, aquela propaganda não vira um meme. Mas se você a remixar em forma de funk, sim.) Desde 2011, aumentaram as pesquisas pela palavra “meme” no Google. No Brasil, o termo passou a ganhar mais espaço após o meme “Luiza, que está no Canadá”, um dos primeiros a serem discutidos por veículos da mídia tradicional, tentando explicá-lo ao grande público. Desde então, virou tema de estudos acadêmicos e já há pesquisadores que defendem que a memética se torne uma ciência. Existem ambientes conhecidos por serem “berço” de várias dessas montagens, vídeos, bordões e gírias. São espaços mais propícios para fomentar esse tipo de linguagem, onde usuários trocam informações de forma bem-humorada e livre. Um deles é o 4chan, maior fórum de imagens do mundo, com mais de 13 milhões de visitantes por mês. O site é também o berço do Anonymous, que ficou conhecido pelo hacktivismo e pelos protestos a favor da liberdade na Internet e da liberdade de expressão. No Brasil, além do extinto Orkut (origem de memes como “Fica, vai ter bolo”), destacam-se o Twitter, com uma lógica de hashtags e trending topics que incentiva a replicação, e alguns fóruns parecidos com o 4chan. O maior deles é o “Vale tudo”, do UOL Jogos (de onde veio o meme “Tá tudo bem agora”, por exemplo). Alguns têm origem ainda mais estranha ou imprecisa. Numa variação daquele velho ditado “Quando o fato vira lenda, publicase a lenda”, estimula-se a replicação da piada, mesmo que não se conheça o contexto de como ela surgiu. Especialmente no Brasil, quando o fato vira humor, publica-se o humor. Mas esse princípio escondido pode revelar muito de valor cultural do meme – e da própria cultura brasileira. Prepare-se para descobri-los – e dar muita risada no caminho. 11


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GRETCHEN A cantora e dançarina, conhecida como a rainha do rebolado, é sucesso desde os anos 1980 e já vendeu mais de 10 milhões de discos em cerca de quatro décadas de carreira. Mas foi graças à sua participação em diversos reality shows a partir de 2010 que sua imagem passou a ser associada aos memes. Os criadores sabem muito bem aproveitar sua expressividade, sinceridade e olhares versáteis. O primeiro a se popularizar foi a montagem em formato de biografia (ou CV) conhecido como biogif, criado em 2013. Nele, uma sucessão de imagens de sua carreira é acompanhada de legendas com suas qualidades, como “dançarina”, “humilde”, “lota shows”, “não é homofóbica”, “cantora”, “amada”. Mas foi em 2016 que essa “fase” da sua carreira se consolidou. Quando menos se esperava, a diva estava em todo tipo de montagem: jogando Pokémon Go, comentando as séries do Netflix, fazendo cobertura ao estilo “Freak Le Boom Boom” do impeachment da presidenta Dilma Rousseff... Fãs ainda criaram uma página em que ela especificamente explicava a personalidade dos signos do zodíaco. Até a rapper internacional Nicki Minaj (outra musa do rebolado) descobriu os memes de Gretchen e ficou encantada. 80

QUE VOCÊ RESPEITA UM PAPO COM GRETCHEN Maria Odete Brito de Miranda Marques é conhecida como Maria do Brasil em Mônaco, cidade-estado soberana onde mora no sul da França, e participa de apenas dois grupos no WhatsApp: o do seu núcleo familiar e o da turma de seu curso de francês, com três russos, um estoniano, um cabo-verdiano e um português. “Só a esposa de um aluno da minha sala conhecia o meu trabalho”, conta. Sua rotina desde que se mudou para o exterior em 2012 com o marido, o empresário português Carlos Marques, é típica da de “uma dona de casa”, afirma. “Preciso ter a minha vida pessoal, isso pra mim é muito importante. Eu tenho que ter o meu dia a dia, a minha rotina. Quando eu vou pro Brasil, eu faço meus shows, mas sempre com vontade de voltar”, diz. Ela tomou conhecimento do sucesso de seus memes há cerca de dois anos e rapidamente entrou na brincadeira. “Acho que ninguém sabe como eles começaram. Mas a partir do momento que comecei a entender fui me atualizando, procurando e aí adorei. Meu público até rejuvenesceu”, diz. Ela só não gosta quando utilizam suas cenas em filmes pornôs. Mas isso raramente tem acontecido – Gretchen garante que “em 90% dos casos, [os criadores] me pedem autorização antes de fazer qualquer meme”. Por isso, ela se comunica frequentemente com os fãs pelas redes sociais. “Converso muito com os meninos do perfil @Gifboardbrasil. Pelo que sei, são três e eles são sempre educados comigo”. Além dos próprios memes, ela diz que adora os de outra rainha das redes sociais: Nicole Bahls (vide página 128). Desde que começou a publicar vídeos em seu canal do YouTube, a cantora procura desmitificar a imagem em torno da personagem Gretchen, mostrando sua rotina considerada “comum”. “Gosto da mídia, mas não vivo mais para isso, como antigamente”, diz. Ela também passou por uma mudança na relação com o corpo. “Não me cuido para ser a Gretchen, me cuido porque gosto de ser assim. Meu marido não é obrigado a acordar do lado de uma baranga. Tenho que me cuidar e estar com o corpo legal, mas com saúde.”

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QUE VOCÊ RESPEITA

LEONA ASSASSINA E VINGATIVA

“LOGO EU?”

É fácil entender o fascínio do YouTube quando se analisam histórias como a do Leandro Olin dos Santos. Em 2009, com apenas 13 anos, ele era apenas mais um garoto em Belém (PA). Porém, diante da câmera do celular emprestado de um amigo, ele era outra pessoa: uma assassina fria e vingativa, que tentava fugir para Paris após cometer maldades. Mais do que isso: ele havia se tornado uma estrela viral. Os vídeos foram gravados com a ajuda do amigo Paulo Josué Ferreira Sosinho, que contracenava com ele, dando vida à personagem Aleijada Hipócrita. A produção era completamente amadora e os diálogos improvisados. A primeira aventura de Leona (nome inspirado na personagem de Carolina Dieckmann em Cobras e Lagartos, da Rede Globo) foi registrada em 2008. Compartilhada entre colegas apenas via Bluetooth, só foi parar no YouTube alguns meses depois, bombando em 2009. Os bordões da personagem, especialmente o mais famoso deles, “Eu vou acabar com a raça dela”, ganharam fotomontagens, tanto com a imagem de Leandro quanto com a de outras personalidades. Com o sucesso, Leona passou a se apresentar como DJ e fazer presença vip em festas. Em 2015, lançou o clipe de “Frescáh no Círio”, uma versão da música “Get Lucky”, do Daft Punk, mas que remetia à tradicional cerimônia religiosa do Círio de Nazaré. No mesmo ano, foi detido e autuado por furto. Em 2016, Leona voltou a atacar. Gravou uma paródia bem-humorada da vinheta de Carnaval da Rede Globo, em que sambava ao som de uma música cheia de referências a situações típicas do Carnaval do Pará, como os blocos de Vigia e os Pretinhos do Mangue de Curuçá. Novamente, no mesmo ano, voltou a ser detido, desta vez em flagrante ao tentar furtar roupas em uma loja em Belém. Nos dois momentos em que foi detido, Leandro tentou se aproveitar das câmeras de televisão que cobriam o ocorrido para fazer performances, cantar e fazer movimentos de dança, mas também alertou para o fato de não possuir identidade social da personagem e ainda ser identificado pelo nome de registro em seus documentos.

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Considerada uma das vilãs mais emblemáticas da novela brasileira, Nazaré Tedesco é uma “fábrica” de memes – mesmo tendo ido ao ar mais de uma década atrás, na novela Senhora do Destino, da Rede Globo, em 2004. A personagem de Renata Sorrah estrela o gif “Nazaré confusa” (vide na pág. 127), mas é também a origem do meme “Logo eu...” Em certa cena do folhetim, ela ironiza a escada onde assassinava seus desafetos: “Tentou me derrubar? Logo eu, Nazaré Tedesco”. Na segunda semana de janeiro de 2017, um usuário do Twitter adaptou a citação e a frase começou a pegar fogo nas redes sociais. Os internautas a utilizavam para narrar situações cotidianas em que se mostravam mais espertos (ou bem-sucedidos, ou fracassados) do que os outros imaginavam. Uma página no Facebook reunindo as melhores criações atingiu mais de 350 mil curtidas em um dia.

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“NÃO SOU CAPAZ DE OPINAR”

“NÃO FECHA A PORTA, TÁ? TRANQUILO?” Durante o nascimento, a pequena Isabela, de Montenegro (RS), sofreu uma lesão grave nos nervos do braço direito, impossibilitando seus movimentos. Com menos de 2 anos, ela passou por uma cirurgia delicada para corrigir o problema. Os pais ainda estavam pagando o procedimento quando a menininha ganhou fama após um vídeo com ela ser publicado no YouTube, em 2010. Seu pai, Felipe Horst, a filmou bastante irritada por ele ter fechado a porta do quintal onde ela estava brincando. Durante uma tentativa de negociação, ela demonstra uma articulação (e uma frustração) surpreendentemente adulta. Até que pede, de um jeito bravo porém fofo: “Não fecha a porta, tá? Tranquilo?” A gravação e a frase se espalharam. A boa notícia é que o vídeo alcançou, até hoje, 17 milhões de views, gerando dividendos da publicidade do YouTube mais do que suficientes para pagar a cirurgia e o tratamento de Isabela. Para aproveitar a exposição, seu pai também passou a postar novos vídeos, que somam mais de 30 milhões de visualizações. Infelizmente, porém, as publicações foram descontinuadas em 2014. Uma hora toda estrela mirim tem que crescer – mesmo na internet. (Mas, se ela quiser voltar, a porta está aberta, tá?) 124

Uma atriz nacional foi o grande destaque da noite do Oscar 2016 no Brasil. Mas ela não concorria em nenhuma das categorias: era a comentarista escolhida (aparentemente, de última hora) pela Rede Globo para opinar sobre a cerimônia. Mas mal imaginavam os produtores que Glória Pires seria tão comedida na sua “capacidade de opinar”. Durante a transmissão, a atriz não teve medo de revelar desconhecimento do evento e não ter visto alguns dos filmes indicados. Ao ser questionada sobre a participação da cantora Lady Gaga, Glória disse a frase que repetiu algumas outras vezes e ficou famosa: “Não sou capaz de opinar”. Não teve para Alicia Vikander (eleita melhor coadjuvante, por A Garota Dinamarquesa) ou para Brie Larson (escolhida melhor atriz por O Quarto de Jack): no Twitter, quem mais recebeu citações no Brasil foi Glória. O meme mais compartilhado trazia a imagem da atriz com cara de poucos amigos, seguida do famoso bordão. Foi um excelente coringa nas discussões online. Mas houve também versões usando Ruth e Raquel, as gêmeas interpretadas por Glória em Mulheres de Areia, e uma fusão com outro meme: “Você pode substituir o textão por ‘Não sou capaz de opinar’” (vide pág. 190). Surfando na repercussão, a atriz lançou, dois meses depois, camisetas com os novos bordões.

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“QUERIA ESTAR MORTA” “QUE DESELEGANTE!” Foi o início do longo “namoro” que tornou a jornalista Sandra Annenberg uma das queridinhas da internet hoje. A apresentadora criou (sem querer) esse meme ao vivo, durante uma das edições do Jornal Hoje em 31 de outubro de 2010. Uma dupla de arruaceiros interrompeu a cobertura ao vivo preparada pela repórter Monalisa Perrone sobre o primeiro dia do tratamento do ex-presidente Lula contra o câncer, no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo. Surpresos, Sandra e seu companheiro de bancada Evaristo Costa começaram a comentar a “invasão”. Restou a ela exclamar: “Que deselegante!” A repercussão foi instantânea: em apenas uma hora, “Monalisa Perrone” foi citado mais de 6,5 mil vezes no Twitter, enquanto a frase de Sandra teve mais de 36 mil menções. Em fevereiro do ano seguinte, Sandra comentou pela primeira vez o ocorrido em um depoimento em suas redes sociais, explicando sua escolha de palavras no momento e levantando preocupações sobre a exposição que ganhou com o caso. “Diante de uma atitude tão covarde e absurda, e para manter o respeito ao telespectador, o único adjetivo possível naquela fração de segundo foi o ‘Que deselegante’. Muita gente me perguntou se não tinha nada melhor pra dizer. Hoje respondo com tranquilidade: “Não”, declarou. 158

Em uma entrevista ao jornal inglês The Guardian em junho de 2014, Lana Del Rey, então com 28 anos, afirmou que “Queria estar morta”, como seus ídolos Amy Winehouse e Kurt Cobain, falecidos aos 27 anos. Dias depois, a cantora disse ter se arrependido da declaração, mas a internet obviamente não esqueceu. Por aqui, a frase virou meme alguns meses depois. A expressão inspirou montagens curiosas no Twitter e no Facebook para simbolizar aqueles momentos em que a gente não está lá muito bem e sem vontade de sair da cama. Entre as várias montagens criativas, destaca-se o uso do emoji de estrela (“star”, em inglês) em substituição ao verbo “estar”. Ganhou força novamente em fevereiro de 2017, quando uma jovem postou a frase em um grupo de WhatsApp da família e precisou se explicar à mãe. A filha até tentou explicar a piada para a mãe, mas, segundo o printscreen que circulou por aí, ela não entendeu muito bem.

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QUE VOCÊ RESPEITA

KLEYSON BARBOSA Nascido em Coronel Fabriciano (MG), em 22 de setembro de 1983, Kleyson Barbosa é jornalista, formado pela Universidade Federal de Minas Gerais. Trabalhou como repórter no jornal Agora SP e no site das revistas Superinteressante e Mundo Estranho. Foi editor do G1, MdeMulher e Guia do Estudante e editor-chefe da Playboy Brasil. É ganhador do prêmio Award of Excellence do SND e foi indicado ao Prêmio Esso de Jornalismo em 2015, com a matéria “Mergulho nas Profundezas”, da Mundo Estranho. Começou a usar internet em 1997 e, desde os tempos de mIRC, já era interessado em interagir com a web e entender os processos de replicação dos traços culturais. Adora memes, embora considere os sobre seu signo um tanto quanto simplificadores. Mas, como bom virginiano, adorou a proposta de organizar em verbetes alguns dos memes mais populares no Brasil.

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